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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS


FACULDADE DE FÍSICA

AS LEIS DA TERMODINÂMICA E O DESENVOLVIMENTO DA


MECÂNICA ESTATÍSTICA

DOCENTE: Marcelo Lima


DISCENTE: João Marcelo Ramos Alves

Belém, Pará
Dezembro 2022
1. Introdução
O presente trabalho tem como intuito trazer uma discussão histórica a respeito
do desenvolvimento das leis da termodinâmica como fator de fundamental
importância para a construção da mecânica estatística. Nesse viés, é debatido
historicamente e criticamente teorias que contribuíram para a construção das leis da
termodinâmica e seus autores. O debate histórico torna-se muito importante tanto
para o ensino de física em uma sala de aula, quanto para a formação como
pesquisador de um aluno de física, ao ver como os cientistas formularam teorias que
por eles são estudadas em sala de aula.
A física como uma ciência experimental encontra na termodinâmica grande parte
de sua construção em primeira ordem experimental para posteriormente uma
fundamentação teórica. Nesse intuito, é visto a criação inicial de teorias para explicar
fenômenos químicos da época como a teoria do flogisto e posteriormente o
questionamento dessa teoria por suas muitas contradições vistas e substituída pela
teoria do calórico de Lavosier que determina o calor como um fluido imponderável.
Apesar do calórico explicar bem diversos fenômenos que a teoria do flogisto não
conseguia explicar, por observações experimentais chega-se à conclusão que o calor
é uma forma de movimento e a partir de tais observações se torna possível encontrar
um equivalente mecânico do calor e consequentemente a uma formalização para
Primeira Lei da termodinâmica.
Nesse sentido, também é abordado sobre como com o avanço da revolução
industrial e do aperfeiçoamento da máquina a vapor a Segunda Lei da
Termodinâmica surgiu, o qual Sadi Carnot buscou um modo de determinar até que
ponto o rendimento de uma máquina a vapor poderia ser melhorado até a formulação
dessa lei por Clausius e Thomson. Nesse sentido, Clausius ao se preocupar com a
direcionalidade do fluxo de calor cunha o termo valor de equivalência que mais tarde
vêm-se a tornar o que conhecemos como Entropia. Entretanto, o estudo da Entropia
como uma função mecânica fica a cargo de Boltzmann que ao adotar a interpretação
probabilística de entropia trás seu maior legado para física, e inicia um novo ramo da
física chamado de Mecânica Estatística.
Desse modo, é perceptível como a construção da Primeira e Segunda lei da
termodinâmica foram de grande importância para a formulação da Mecânica
Estatística, esta que hoje é uma das grandes áreas de estudos da física e que
permanece em construção. Desse modo, a termodinâmica é uma ciência ainda em
evolução e o entendimento da sua criação é extremamente interessante e importante
para compreender as dificuldades encontradas em seu caminho para a formulação do
que hoje é um dos pilares científicos do estudo de física.
2. Desenvolvimento
A teoria do flogisto começou na busca de explicações a respeito do aumento de
peso dos metais durante a sua calcinação. Essa não “conservação do peso” observada
na combustão dos metais necessitava de uma explicação. A primeira teoria química
fundamentada capaz de descrever estas reações foi escrita pelo químico alemão Johann
Joachim Becher (1635 – 1682) em sua obra Subterranean Physics o qual apresentou a
ideia de que a combustão era devido à terra pinguis [2]. Para Becher, quando uma
substância queimava, era liberada a terra pinguis. Posteriormente, uma teoria mais
geral das terras pinguis foi formulada pelo médico e químico Alemão Georg Ernst
Stahl (1660 – 1734), às quais chamou de flogisto.
Para explicar por que os metais aumentavam de peso quando se calcinavam,
Stahl admitiu que o mesmo possuía a propriedade da leveza por ter peso negativo.
Desse modo, Stahl elaborou uma teoria que explicava os fatos até então conhecidos,
de maneira clara, embora se apoiasse numa hipótese contraditória que seria a
levitabilidade do flogisto [1].
Essas contradições exigiram adaptações continuas e a formulação de novas
hipóteses e explicações para o flogisto, levando-o a adquirir uma instabilidade e
complexidade o levou mais tarde ao desmoronamento. Nesse contexto, o famoso
químico Antoine-Laurent de Lavoisier (1743 – 1794) começou a desconfiar a respeito
da teoria do flogisto e em 1777 começou seu ataque a teoria ao começar a fazer
experiências sobre os fenômenos caloríficos. Assim é que, no mesmo ano, Lavoisier
atribuiu a causa do Calor a um fluido imponderável denominado por ele de “matière
du feu”. Contudo, a teoria do flogisto recebeu o golpe final por parte de Lavoisier em
sua obra intitulada “Réflexions sur le Phlogistique”. Posteriormente em um livro
publicado por Lavoisier e outros químicos franceses, denominado Méthode de
Nomenclature Chimie, a matière du feu lavoisierana recebeu o nome de calórico [1].
Assim como a teoria do Flogisto, a do calórico também encontrou algumas
dificuldades como por exemplo, explicar a dilatação anômala da água. Entretanto a
questão que mais intrigava os cientistas era a de saber a real natureza do calor, se era
consequência de alguma forma de movimento ou se era devido ao fluido calórico? Para
responder tais questionamentos o físico anglo-norte americano Sir Benjamin
Thompson, Conde Rumford (1753 – 1814), realizou experiências com as quais provou
que o calor é uma forma de movimento [1].
Rumford era Ministro da Guerra na Baviera, e por conta disto, viera sua primeira
evidência experimental de que o calor era uma forma de energia, ao observar que
durante a fabricação de canhões de bronze, na medida em que a broca os perfurava o
bronze continuava a esquentar mesmo que a broca não estivesse afiada. Segundo a
teoria do calórico, o bronze se esquentava ao receber o calórico da broca, uma vez que,
a broca afiada não tinha capacidade de reter o calórico, desse modo transferindo-o ao
canhão. Então como explicar que o canhão esquentava mesmo com a broca “cega”?
Assim, convencido de que o calor era gerado devido à fricção, Rumford realizou
a seguinte experiência. Mergulhou em água um canhão a ser perfurado, a fim de que
o calor produzido pela broca passasse a esse líquido (Figura 1). Depois de duas horas
e meia com a broca girando a água tinha fervido da mesma forma que fizera ao perfurar
o canhão. Em vista desse resultado, preparou um trabalho que foi comunicado à Royal
Society of London. Apesar dos trabalhos de Rumford mostrarem que o calor era uma
forma de movimento, a teoria do calórico sobreviveu até meados do sécula XIX.

Figura 1. Experimento Rumford

É também interessante ressaltar as experiências realizadas pelo químico inglês


Sir Humphry Davy (1778 – 1829) sobre a produção de calor por atrito, nos quais
friccionou pedaços de substâncias que se fundem em baixas temperaturas e concluiu,
em um livro publicado em 1799 que “o calor não é matéria... e é devido a um peculiar
movimento...das partículas dos corpos” [1]. Entretanto, apesar das experiências de
Rumford e de Davy indicarem que o calor é uma forma de movimento, não foi possível
um equivalente mecânico do calor, apesar de Rumford ter tentado, porém sem êxito,
muito por causa de não haver uma distinção entre força e trabalho realizado.
A tarefa de calcular o equivalente mecânico do calor só foi realizada na década
de 1840 pelos cientistas Julius Robert Mayer (1814-1878) e James Prescott Joule (1818
– 1889). A crença de que havia um equivalente mecânico do calor surgiu por acaso em
uma viagem em que ele observou a diferença entre a cor do sangue arterial e venoso
entre as pessoas que viviam nos trópicos e das zonas temperadas. Ao retornar a sua
cidade natal, Mayer procurou formalizar a sua idéia e também a maneira de medir o
equivalente mecânico do calor [1]. Como no início do século XIX já era observado
experimentalmente que, para os gases, o calor especifico a pressão constante (Cp) era
maior que o a volume constante (Cv) e visto que esse resultado era mal explicado pela
teoria do calórico, ao analisar tal fato, Mayer calculou o equivalente mecânico do calor
argumentando que tais experiências poderiam ser explicadas considerando o trabalho
realizado pelo gás nas respectivas expansões, e no dia 16 de junho de 1842 enviou seu
trabalho. Entretanto, por uma série de erros sobre conceitos básicos da mecânica [1].
Mesmo sendo recusado, Mayer não desistiu, melhorou seus conhecimentos
sobre mecânica e preparou, no mesmo ano, um novo artigo. Dessa vez o trabalho de
Mayer foi aceito, nesse trabalho, Mayer calculou o equivalente mecânico do calor pela
relação entre a quantidade de força (trabalho) de um peso que cai de uma altura
aproximada de 365m e a quantidade de calor necessária para aquecer um igual peso de
água de 0°C a 1°C. Desse modo, e com os dados experimentais disponíveis já na época
a respeito do Cp e Cv, Mayer obteve o equivalente mecânico do calor no valor de 3,65
joule/caloria, em unidades atuais [1].
Joule já demonstrava interesse em pesquisas relacionadas com o princípio da
conservação de energia. Já tinha realizados trabalhos a respeito de calor, esse os quais
são bem conhecidos hoje por livros didáticos. Joule demonstrou que há produção de
calor na passagem de corrente elétrica em um fio condutor e que a quantidade de calor
Q é proporcional à resistência elétrica R do fio, ao quadrado da intensidade da corrente
(I) e ao tempo (t) durante o qual a corrente circula condutor. Tal demonstração que
hoje é conhecida como lei de Joule. Em outro trabalho, Joule demonstrou que o calor
proveniente da combustão dos corpos é equivalente às intensidades da sua afinidade
ao oxigênio [1].
Portanto, Joule convenceu-se de que existia uma lei de conservação de natureza
geral. Sua linha de pensamento levou a considerar as relações entre calor e trabalho
mecânico, mas seu conhecimento superficial em matemática tornava suas observações
limitadas, o que também ocorria com suas atividades experimentais, que buscavam
uma relação simples entre às variáveis envolvidas. Joule, publicou uma série de artigos
sobre os resultados das suas investigações e inicialmente, assim como Mayer, os
trabalhos de Joule não foram imediatamente aceitos. Entretanto seus trabalhos
receberam apoio de William Thomson (que viria a se tornar Lorde Kelvin) que
percebeu em Joule uma obsessão em dar visibilidade fenomenológica para seus
resultados obtidos experimentalmente. No entanto, a consagração de Joule veio em
1849 quando o físico e químico Michael Faraday (1791-1862) apresentou um dos seus
trabalhos aos cientistas da Royal Society of London [1]. Desse modo, em 1850, Joule
publica seu famoso trabalho “On the Mechanical Equivalent of Heat” [3].
Vale a pena ressaltar que Joule se preocupa em descrever minuciosamente os
equipamentos utilizados, o modo como as medidas foram obtidas e apresenta várias
tabelas com os resultados. O método de experimentação foi muito simples (Figura 2),
a temperatura do aparato de fricção foi verificada e os pesos foram elevados e fixos
com ajuda do suporte h, o rolo estava preso ao eixo. A altura precisa dos pesos acima
do solo foi determinada pelas réguas de madeira k, k, e o rolo foi liberado e deixado
rolar até os pesos atingirem o chão do laboratório, o que correspondeu a uma queda de
63 polegadas. O rolo então foi removido do suporte, os pesos erguidos novamente, e a
fricção refeita. Após a repetição deste procedimento por 20 vezes, o experimento foi
concluído com outra observação de temperatura do aparato. A temperatura média do
laboratório foi determinada com medições feitas no início, meio e no término de cada
experimento [4].
Figura 2. (a) Duas polias e um rolo; (b) eixo do aparelho de atrito na vertical; (c) eixo
do aparelho de atrito na horizontal; (d) Vaso de cobre em que o aparelho girando firmemente
equipado com dois buracos na tampa, um para a inserção do eixo, e o outro para a inserção do
termômetro. Fonte: Souza el al.
Desse modo, na conclusão de sua experiência sobre a determinação do
equivalente mecânico do calor, Joule escreveu “A quantidade de calor capaz de
aumentar a temperatura de uma libra de água de 1°F, é equivalente à força mecânica
representada pela queda de 772 libras pelo espaço de um pé”, resultado este, que é
representado em várias tabelas em seu trabalho original [1].
Apesar da determinação do equivalente mecânico do calor representar um
aspecto do princípio geral da conservação de energia, este só foi formalizado
matematicamente pelo físico alemão Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz
(1821 – 1894) e que hoje o princípio da conservação da energia é também conhecido
como a Primeira Lei da Termodinâmica que tem o seguinte enunciado: “Todo sistema
termodinâmico possui, em estado de equilíbrio, uma variável de estado chamada
energia interna U, cuja variação é dada por: 𝑑𝑈 = 𝛿𝑄 − 𝛿𝑊, onde Q é a troca de calor
e W é o trabalho externo realizado sobre/pelo sistema” [1].
A Segunda Lei da Termodinâmica em ordem cronológica veio primeiro que a
Primeira Lei muito por conta dos estudos das máquinas a vapor, por conta da 1°
revolução industrial que estava começando. A primeira máquina a vapor é criada pelo
físico francês Denis Papin (1647-1712) ao perceber que a água fervida ao ser colocada
em um tubo oco faria com que o vapor resultante deslocasse uma espécie de êmbolo
colocado na outra extremidade desse tudo. Logo ao final do século XVII, a Inglaterra
passou a usar o carvão mineral como fonte de energia, por conta de praticamente
desmatar sua floresta, no entanto as minas de carvão eram constantemente inundadas
de água e seu esgotamento era feito manualmente, constituindo-se numa tarefa árdua
para quem a realizasse. Nesse momento o engenheiro inglês Thomas Savery (1650-
1715) inventa um dispositivo que aspirava a água. Esse dispositivo ficou conhecido
como amigo do mineiro e foi patenteado por Savery em 1698[1].
A máquina a vapor de Savery foi aperfeiçoada por outros engenheiros como
Thomas Newcomen (1663 – 1729) e o famoso James Watt (1736-1819). Entretanto a
eficiência das máquinas a vapor (mesmo com aperfeiçoamentos) era bastante baixa,
cerca de 5% a 7%. Assim, o Físico e engenheiro Sadi Carnot (1796-1832) procurou
então determinar até que ponto esse rendimento poderia ser melhorado. Assim em seu
livro publicado em 1824, descreveu uma máquina ideal sem atrito, que realiza um ciclo
completo de modo que a substância usada é levada de volta ao seu estado inicial, dessa
maneira chegando a seguinte conclusão: “A potência motriz do fogo é independente
dos agentes empregados para produzi-la; sua quantidade é determinada somente pelas
temperaturas dos corpos entre os quais, no resultado final, ocorre a transferência de
calórico”, hoje o que Carnot se refere como potência motriz do fogo é o chamado
rendimento de Carnot [1].
Carnot acreditava que sua máquina poderia trabalhar de modo reversível, desse
modo, ora deixando o calórico cair da fonte quente para a fonte fria, ora elevando-o da
fonte fria para fonte quente. No entanto, com os trabalhos de Rumford não havia um
ligamento com a conservação de calórico nos processos irreversíveis. Carnot estava
ciente dessas dificuldades, tanto que, em 1832, em uma série de notas que só foram
publicadas muito tempo após sua morte, descreve novas experiências nas quais procura
determinar um equivalente mecânico do calor baseado no mesmo raciocínio de Mayer.
Carnot já começava a desconfiar da materialidade do calórico! Infelizmente sua morte
prematura aos 36 anos de idade o impediu de ser hoje considerado o pai de toda a
Termodinâmica [1].
A Máquina de Carnot foi estudada pelo físico francês, Emile Clayperon (1799-
1864), em 1834, ocasião em que o ciclo de Carnot foi pela primeira vez representado
graficamente, sendo hoje esse gráfico conhecido como o diagrama P-V. De posse desse
gráfico e de sua famosa equação dos gases perfeitos, Clayperon demonstrou,
matematicamente, que a produção de trabalho da máquina de Carnot dependia somente
da diferença de temperatura entre os reservatórios térmicos considerados por Carnot
[1].
O ciclo de Clapeyron-Carnot foi também estudado por parte de William
Thomson em 1848, em seu trabalho que é proposto a ideia de uma escala absoluta de
temperatura, entretanto embora Mayer e Joule hajam determinado uma relação entre
calor e trabalho, o calor considerado por Thomson, em 1848, era o calórico de Black-
Lavosier-Carnot. A observação que se tratava da mesma grandeza física, isto é, o calor
de Thomson e o de Joule, se deve ao físico alemão Rudolf Julius Emmanuel Clausius
(1822 – 1888) em um trabalho apresentado à academia de Ciências de Berlin em 1850.
Basicamente nesse trabalho Clausius afirmou que a produção de trabalho nas máquinas
térmicas não resulta meramente do deslocamento do calor da fonte quente para a fonte
fria e sim, também por consumo de calor; afirmou mais ainda que o calor poderia ser
produzido às expensas de trabalho mecânico. Esses dois princípios fundamentais
afirmados por Clausius, quais sejam, que existe uma equivalência entre calor e trabalho
e que “é impossível realizar um processo cíclico cujo único efeito seja transferir calor
de um corpo mais frio para um corpo mais quente”, constitutem, respectivamente, a
Primeira e a Segunda lei da Termodinâmica [1].
Dessa maneira, estimulado pelo trabalho de Clausius, Thomsom em seu artigo
“On the Dynamical Theory of Heat” publicado em 1851 [1], apresenta uma nova
versão para a Segunda lei da termodinâmica, baseado na tese da irreversibilidade e
dissipação de calor. Em seus trabalhos, Clausius e Thomson aceitaram a idéia de
Carnot de que há conversão de calor em trabalho sempre que o calor flui de uma fonte
quente para outra fria, porém, rejeitaram a hipótese de que o calor(calórico por Carnot)
é conservado. Para esses físicos, portanto o trabalho convertido nada mais é do que a
diferença entre o calor gerado pela fonte quente e o entregue à fonte fria [1].
Entretanto, ao formular a Segunda lei da termodinâmica, Clausius ainda se
mostrava preocupado com a direcionalidade do fluxo de calor, isto é, a tendência do
calor de fluir de uma fonte quente para uma fonte fria. Em trabalhos subsequentes,
tentou definir um conceito que poderia medir essa direcionalidade e que considerasse,
ainda, a irreversibilidade como sua propriedade fundamental. Assim, a partir de 1854,
Clausius começou a pensar que a transformação de calor em trabalho e a transformação
de calor em alta temperatura para calor em baixa temperatura, poderiam ser
equivalentes. Em vista disso, propôs que o fluxo de calor de um corpo quente para um
frio deveria ser compensado pela conservação de trabalho em calor, de modo que o
calor deveria fluir do corpo frio para o quente. Clausius introduziu então o conceito de
“valor de equivalência” de uma transformação térmica e que era medido pela relação
de quantidade de calor (Δ𝑄) e a temperatura (T) no qual ocorre a transformação. Por
conta desse conceito físico, pôde Clausius fazer a distinção entre processos reversíveis
e irreversíveis. Desse modo, formulou a Segunda Lei da Termodinâmica como “A
soma algébrica de todas as transformações ocorrendo em um processo circular
somente pode ser positiva” [1].
Porém apenas em 1865 [1], Clausius propõe o termo entropia, denotando o por
S, em lugar do valor de equivalência. Retomando assim, suas ideias sobre esse novo
conceito físico, considerou um ciclo qualquer como constituído de uma sucessão de
ciclos infinitesimais de Carnot e chegou a seu célebre teorema:
Δ𝑄1 Δ𝑄2 Δ𝑄𝑖 𝛿𝑄
+ + ⋯+ =∮ = ∮ 𝑑𝑆 ≥ 0
𝑇1 𝑇2 𝑇𝑖 𝑇
Onde o sinal (>) ocorre para as transformações irreversíveis e o de igualdade
para as reversíveis.
A afirmação de Thomson de que o calor tinha uma base dinâmica, levou os
físicos a procurarem funções dinâmicas que descrevessem as grandezas físicas,
temperatura, entropia, quantidade de calor, dessa nova ciência térmica, bem como para
distinguir, também mecanicamente, processos reversíveis e irreversíveis. Esse foi o
trabalho de pesquisa que o físico austríaco Ludwig Edward Boltzmann (1833-1906)
adotou a partir de 1865, após o trabalho de Clausius. Desse modo propondo um modelo
mecânico no qual admitiu que as partículas de um gás se movem em órbitas periódicas,
Boltzmann deduziu em 1866, uma expressão analítica para a função entropia
dependente do período das partículas em suas órbitas, e que aumenta com o tempo.
Contudo, esse trabalho inicial de Boltzmann foi muito criticado, inclusive pelo próprio
Clausius e acabou sendo esquecido [1].
Em uma nova tentativa, e provavelmente, depois de ler o trabalho do físico e
matemático escocês James Clerk Maxwell sobre a distribuição de velocidades das
moléculas de um gás, Boltzmann convenceu-se da necessidade de considerar essa
distribuição. Desse modo, em 1868 e 1872, ao admitir colisões binárias entre as
moléculas constituintes de um gás, Boltzmann obteve uma nova expressão analítica
para a entropia [1].
No entanto, Boltzmann ainda foi criticado pelo químico austríaco Johann Joseph
Loschmidt (1831-1895), em 1876, a esses resultados, pois podemos entender
irreversibilidade aqui em seu sentido mais amplo: há na natureza um sentido
preferencial do tempo para a maioria dos processos naturais, a chamada “seta do
tempo”. Assim, o problema da segunda lei então torna-se mais claro: se quisermos
fundamentar a termodinâmica sobre uma teoria cinética, devemos ser capazes de
explicar a segunda lei em termos cinéticos, sem a necessidade de introduzir hipóteses
adicionais, ou seja, a irreversibilidade deve surgir naturalmente das leis da mecânica.
Mas se estas são reversíveis, então surge um paradoxo, esse paradoxo mais tarde
denominado de paradoxo da irreversibilidade. Assim, foi buscando uma resposta a essa
pergunta que Boltzmann fez aquilo que nas palavras de Schrödinger, representou seu
maior legado para a física: mostrar que aquilo que nos parece impossível, a
reversibilidade dos fenômenos naturais, na verdade não é impossível, mas sim
improvável. Nenhuma lei da física é violada se os pedaços de um copo estilhaçado se
juntarem novamente. Isso não ocorre apenas pelo fato que a probabilidade que isso
ocorra é muito pequena. A segunda lei é assim uma lei probabilística, e aí está uma
das maiores contribuições de Boltzmann a Física: a introdução do conceito de
probabilidade como ingrediente fundamental para a descrição da natureza [5].
Desse modo, em 1877 Boltzmann formula uma expressão para entropia em seu
trabalho “On the relation between the second law of mechanical theory of heat and
probability calculus with respect to the teorems on thermal equilibrium” (versão
traduzida em inglês do original) [5]. No qual a entropia é considerada como a medida
de desordem molecular, isto é 𝑆 ∝ 𝑙𝑛Ω onde Ω é o número de microestados do sistema
compatíveis com o macroestado observado [5]. Pode se dizer, então, que daí começou
um novo ramo da física, a chamada mecânica estatística, cuja amadureceu com o livro
Elementary Principles in Statistical Mechanics editado em 1902, e de autoria do físico
norte-americano Josiah Williard Gibbs (1839 – 1903) [1].
3. Conclusão
Portanto, é interessante ressaltar que a termodinâmica continua sendo uma
ciência em evolução permanente, onde iniciou-se com os adventos da 1° revolução
industrial e hoje permanece contribuindo para a 4° e atual revolução industrial. Desse
modo, percebemos historicamente até onde vai a capacidade da mente humana para
resolver os problemas da sociedade de tal modo que o avanço tecno-cientifico é
construído a partir dos mais básicos questionamentos aos mais complexos.
Dessa forma, vemos a partir do entendimento da história da termodinâmica
como sua evolução foi de extrema importância para a era em que vivemos atualmente,
pois, é perceptível que dos mais antigos cientistas até os atuais ela continua sendo
objeto de questionamento e conhecimento, dessa maneira, indubitavelmente a
termodinâmica continua como um pilar para sustentar uma base cientifica no mundo.
4. Referências
[1] BASSALO, José Maria. Crônicas da Física: Tomo 3. 1. ed. Universidade
Federal do Pará: UFPA, 1991. 1164 p. v. 3. ISBN 85-247-0057-2.
[2] PADRO, Letícia; CARNEIRO, Marcelo Carbone. O episódio histórico das
teorias do flogisto e calórico: criando interfaces entre a História e Filosofia da Ciência
e o Ensino de Química na busca pela humanização do trabalho científico, História
da ciência e Ensino, v. 19, p. 153-180, 19 set. 2018.
[3] CARVALHO, Bianca Cintra. ANÁLISE HISTÓRICA DO CONCEITO DE
CALOR NOS TRABALHOS DE JOULE E A TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA
DO EQUIVALENTE MECÂNICO DO CALOR NOS LIVROS DIDÁTICOS
DE FÍSICA. Orientador: Prof. Dr. Luciano Carvalhais Gomes. 2016. 166 p.
Dissertação (Mestrado em educação para ciência e matemática) - Universidade
Estadual de Maringá, Maringá - PR, 2016.
[4] SOUZA, R. DA S.; SILVA, A. P. B. DA; ARAUJO, T. S. James Prescott Joule e
o equivalente mecânico do calor: reproduzindo as dificuldades do laboratório.
Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 36, n. 3, set. 2014.
[5] DAHMEN, S. R. A obra de Boltzmann em Física. Revista Brasileira de Ensino
de Física, v. 28, n. 3, p. 281–295, 2006.
[6] PINHO TAVARES, Ana Helena Marques. Aspectos Matemáticos da Entropia.
2003. 83 p. Dissertação (Mestrado em Matemática) - Universidade de Aveiro,
Aveiro, 2003.

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