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Carta de Ano Novo | Canal DEB • BS • Ed.

2625 • 15/12/2022 • ()

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CANAL DEB

Carta de Ano Novo


Gosho para o Gongyo de Ano-Novo

Trecho do Gosho

Recebi cem bolinhos de arroz cozidos a vapor e uma cesta de frutas. O dia de Ano-
Novo representa o primeiro dia, o primeiro mês, o começo do ano e o início da
primavera.1 A pessoa que celebra esse dia acumulará virtudes e será amada por
todos, assim como a Lua vai aumentando de tamanho à medida que se move do
oeste para o leste,2 e assim como o Sol brilha mais intensamente enquanto se
desloca do leste para o oeste.

Em primeiro lugar, sobre a questão de onde exatamente se encontram o inferno e o


buda, um sutra diz que o inferno está abaixo da terra, e outro afirma que o buda
reside no oeste. No entanto, um exame mais cuidadoso revela que ambos existem
em nosso corpo de um metro e meio de altura. Isso deve ser verdade, pois o inferno
está no coração da pessoa que, em seu íntimo, despreza seu pai e ignora sua mãe.3

Cenário histórico

Nichiren Daishonin escreveu esta carta para a esposa de Omosu, em agradecimento


a ela pelos oferecimentos que lhe havia feito no início do ano.

O nome Omosu deriva da região onde sua propriedade estava localizada, na vila de
Omosu, distrito de Fuji, província de Suruga. O marido da destinatária da carta era o
sacerdote leigo Ishikawa no Hyoe. Ela era irmã mais velha de Nanjo Tokimitsu. E
havia perdido sua amada filha, acometida de uma doença, em 1278.

Essa filha havia enviado várias cartas a Nichiren Daishonin. Antes de morrer, ela
escreveu para ele dizendo que provavelmente seria sua última carta e expressou seu
estado de espírito sereno enquanto enfrentava a morte.4
Nessa carta, Nichiren Daishonin explica de maneira simples e poética a forma como
o princípio dos “dez mundos” opera. Daishonin revela que tanto o estado de buda
como o estado de inferno existem na vida de cada ser humano. Uma pessoa com o
coração cheio de ódio vive no mundo de inferno, enquanto aquela que tem fé no
Sutra do Lótus experimenta o mundo do estado de buda.

Embora não conste a data em que havia sido redigida, presume-se que a Carta de
Ano Novo tenha sido escrita em 1281, um ano antes do falecimento de Nichiren
Daishonin.

Tópicos da explanação do presidente Ikeda5

Os sinceros oferecimentos para o Ano-Novo

O título dessa carta em japonês é traduzido literalmente como Escrito dos Bolinhos
de Arroz Cozidos a Vapor. Nichiren Daishonin também menciona os bolinhos de
arroz em outros escritos, sempre próximo do Ano-Novo. Os bolinhos de arroz
cozidos a vapor eram marcados com um “X”, para que pudessem ser facilmente
divididos em porções menores. Eles faziam parte das celebrações na época de
Nichiren Daishonin, e são tradicionais até hoje no Japão.

Com certeza, a esposa de Omosu recebia cada novo ano com a determinação de
permanecer firme em sua prática budista como discípula de Nichiren Daishonin, não
somente para seu próprio bem, mas também em nome da filha que havia partido.
Como o ano-novo se aproximava, ela deve ter renovado sua decisão enviando esses
oferecimentos a Daishonin. Então, ele louva de todo o coração sua sinceridade e
vibrante determinação.

Fazer de cada dia uma renovada partida

O Ano-Novo marca o início de um novo dia, de um novo mês e de um novo ano. Por
isso, no Oriente, desde os tempos antigos, é conhecido como o dia dos “três
começos”. No Japão, de acordo com o antigo calendário lunar, o Ano-Novo também
marca o início da primavera. Enfim, é um dia muito festivo, de muitos novos
começos.
Todos podem recomeçar com revigorante determinação a jornada de 365 dias. É
uma excelente oportunidade para despertarmos para o espírito budista da
“verdadeira causa”6 — o espírito de sempre avançar a partir do presente momento.
Quando agimos assim, nossa vida certamente transbordará de incontida alegria.

Enquanto a Mãe Terra inicia uma nova jornada ao redor do Sol, os corajosos
bodisatvas da terra, inflamados com sentimento de nobre missão, entram em ação
com um grande juramento pelo kosen-rufu em 192 países e territórios.

Nesse escrito, Nichiren Daishonin afirma que uma pessoa que comemora esse dia,
com base na Lei Mística, acumulará constantemen­te virtude e benefício e será
amada por todos, assim como a lua cresce gradualmente ficando mais cheia e o sol
brilha ainda com mais intensidade à medida que sobe mais alto no céu.7

Por meio da nossa prática diá­ria da recitação do Nam-myoho-renge-kyo diante do


Gohonzon, assinalamos uma renovada partida, despertando poderosamente a força
da vida dentro de nós. O objetivo da nossa prática budista é conduzir uma existência
de completa realização, com o espírito de que todo dia é Dia de Ano-Novo, iluminado
pelo sol da manhã do “tempo sem início”.

O inferno e o estado de buda existem dentro de nós

Na passagem seguinte, Daishonin assegura à sua discípula que o Buda não pode
ser encontrado em algum lugar distante, mas dentro do próprio coração. E explica
de forma acessível a essência fundamental da vida, a “possessão mútua dos dez
mundos”8 — um dos conceitos budistas mais importantes.

Para ilustrar seu ponto de vista, Daishonin escolhe como exemplos o mundo do
inferno e mundo dos budas, os dois extremos dos “dez mundos”. Essas condições
de vida, que aos olhos de mortais comuns parecem as mais distantes da rea­lidade
cotidiana, estão, na verdade, ambas presentes em nosso coração. Do ponto de vista
dos ensinamentos que eram amplamente difundidos a respeito de inferno e buda
naquela época, essa foi uma quebra de paradigmas.

As escolas budistas então estabelecidas defendiam que o inferno era um reino


localizado em algum lugar debaixo da terra, e que o buda vivia em algum distante
reino — como no caso do buda Amida da escola Terra Pura (Nembutsu), que se dizia
residir na Terra da Perfeita Felicidade, localizada a oeste. Acreditava-se, portanto,
que, ao morrer, as pessoas cairiam num inferno subterrâneo ou renasceriam na
Terra Pura do buda Amida, a visão do paraíso. Ou seja, tanto inferno como buda
eram considerados mundos externos do ser, além da vida da pessoa.

Mas, nesse escrito, Daishonin afirma claramente que essas duas condições opostas
— inferno e buda — se manifestam no “nosso corpo de um metro e meio de altura”9
e “no coração da pessoa”.10 Em primeiro lugar, usando a palavra “nosso”, Daishonin
indica que esses mundos estão dentro de todos nós, inclusive dele próprio, sem
qualquer distinção ou discriminação. Em segundo, o mundo do inferno e o mundo
dos budas não estão distantes de nós. Eles existem em nossa vida, na vida de
pessoas reais aqui e agora.

A canção do triunfo da paz e dos “valores humanos”

Num recente artigo de Ikeda sensei,11 ele declara:

A Soka Gakkai sempre triunfará com a força dos


jovens. A organização sempre se desenvolverá e
prosperará pela eternidade com a força de jovens
capazes.

Hoje, jovens cidadãos globais Soka, abraçando os


princípios da “possessão mútua dos dez mundos”
e dos “três mil mundos num único momento da
vida”, estão revelando sua natureza de buda e
ajudando outros a fazer o mesmo. Com paciência e
perseverança, estão criando um movimento
popular de diálogo pautado pelo respeito a todas
as pessoas — emulando o espírito do bodisatva
Jamais Desprezar12 — em prol de um futuro mais
promissor.
Os bodisatvas da terra são os discípulos que
compartilham do mesmo espírito que o Buda; eles
se erguem com o mesmo juramento do seu mestre
e dão continuidade às ações corajosas e
perseverantes dele. Nós, da família Soka,
descortinamos o amanhecer de um ano novo
emocionante determinados mais do que nunca a
dar uma nova partida e avançar uma vez mais.

Neste ano 2023 que se inicia, “Ano dos Jovens e do


Triunfo”, vamos nos unir como a maior coletividade
de filósofos do mundo e fazer ressoar, vasta e
longinquamente, por todos os cantos, a canção do
triunfo da paz e dos valores humanos!

Notas:

1. De acordo com o calendário lunar japonês, a primavera começa com o primeiro


mês; isto é, por esse sistema oficial se inicia o novo ano. Pelo calendário gregoriano,
essa data corresponde a algum dia entre 21 de janeiro e 19 de fevereiro.

2. Refere-se ao fato de que a lua nova é vista pela primeira vez no oeste, logo após o
pôr do sol. Nas noites que se seguem, como a lua cresce mais cheia, tem-se a
impressão de que ela se desloca gradativamente para o leste.

3. Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II,
p. 405, 2018.

4. Cf. Ibidem, p. 166.

5. Terceira Civilização, ed. 577, set. 2016.

6. “Verdadeira causa”: Também chamada de princípio místico da “verdadeira causa”.


O Budismo de Nichiren Daishonin expõe diretamente a verdadeira causa para a
iluminação, como o Nam-myoho-renge-kyo, a lei da vida e do universo. Ele ensina
uma forma de prática budista de sempre avançar a partir do presente momento e
superar todos os problemas e dificuldades com base nesta Lei fundamental.

7. Coletânea dos Escritos de Nichoren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II
p. 405, 2019.

8. “Possessão mútua dos dez mundos”: Segundo esse princípio, cada um dos dez
mundos possui o potencial inerente a todos os dez. “Possessão mútua” significa
que a vida não se fixa a um ou outro dos dez mundos, mas pode manifestar
qualquer um dos dez — do mundo do inferno ao mundo dos budas — a qualquer
momento. O ponto fundamental desse princípio é que todos os seres, em quaisquer
dos nove mundos, possuem a natureza de buda. Assim, cada pessoa tem o
potencial para manifestar o estado de buda, da mesma forma que um buda também
possui os nove mundos, não sendo, portanto, separado ou diferente das pessoas
comuns.

9. Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II,
p. 405, 2019.

10. Ibidem.

11. Brasil Seikyo, ed. 2.624, 10 dez. 2022, p. 3.

12. Bodisatva Jamais Desprezar. Descrito no capítulo 20, “Bodisatva Jamais


Desprezar”, do Sutra do Lótus, esse bodisatva — Shakyamuni numa existência
anterior — viveu no fim dos Médios Dias da Lei, depois da morte do buda Rei do Som
Imponente. Ele se curvava respeitosamente a todos com quem se encontrava e
dizia: “Eu os reverencio profundamente, jamais ousaria tratá-los com desdém ou
arrogância. Por quê? Porque todos estão praticando o caminho do bodisatva e
infalivelmente atingirão o estado de buda” (Lotus Sutra and its Opening and Closing
Sutras [Sutra do Lótus e seus Capítulos de Abertura e Conclusão]. Tradução: Burton
Watson. Tóquio: Soka Gakkai, cap. 20, p. 308). Porém, ele era atacado por pessoas
arrogantes, que o agrediam com varas e bastões e atiravam pedras nele. O sutra
explica que essa prática se tornou a causa para o bodisatva Jamais Desprezar
atingir o estado de buda.

Foto: GETTY IMAGES

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