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Melchioretto 2022 Relato de Caso
Melchioretto 2022 Relato de Caso
CAMPUS CURITIBANOS
DEPARTAMENTO DE BIOCIÊNCIAS E SAÚDE ÚNICA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA
Karina Melchioretto
Curitibanos
2022
Karina Melchioretto
Curitibanos
2022
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Karina Melchioretto
Este Trabalho Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título de “Bacharel
em Medicina Veterinária” e aprovado em sua forma final pelo Curso de Medicina Veterinária.
________________________
Prof. Dr. Malcon Andrei Martínez Pereira
Coordenador do Curso
Banca Examinadora:
________________________
Prof.ª Dra. Sandra Arenhart
Orientador(a)
Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Prof. Dr. Erik Amazonas de Almeida
Avaliador
Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
M.V. Lucas Marlon Freiria
Avaliador
Universidade Federal de Santa Catarina
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente gostaria de agradecer aos maiores apoiadores deste sonho: meus pais.
Claudinei José Melchioretto, que nunca mediu esforços para me ajudar e incentivar e Marlene
Erdmann Melchioretto que sempre foi tão pronta para fazer tudo o que estivesse ao seu alcance
para que eu pudesse chegar até aqui. Não existem palavras para expressar tamanha grat idão.
Aos meus avós Clara Fachini Melchioretto, Mario Melchioretto e Iracema Erdmann,
que com palavras e gestos sempre tão doces me deram incentivo e suporte durante esta jornada.
Agradeço à minha namorada, Luana Caetano, que esteve de perto me abraçando,
apoiando e incentivando em cada momento.
Ao longo deste caminho encontrei pessoas incríveis, as quais eu pude contar em muitos
momentos desta trajetória: Amanda Ferri, Caroline de Deus e Liandra Kulika. Pessoas com
quem dividi moradia e me ajudaram a deixar os momentos difíceis mais leves, e os momentos
leves ainda mais felizes.
Não posso deixar de citar os meus animais de estimação, Aurora, Dandara e Theodore.
Sempre que olho para eles, lembro o porquê estou aqui. Minha fonte diária de felicidade, sou
imensamente grata.
A minha orientadora, Sandra Arenhart, que embora a sua rotina intensa de vida
acadêmica, aceitou me orientar. Seu conhecimento, paciência, e o seu lado profissional
admirável que conta com tanta competência, seriedade, e responsabilidad e fizeram com que
este trabalho fosse possível.
Agradeço à equipe do Hospital Veterinário Santa Vida e ao Hospital Veterinário
Florianópolis, por todos os dias de estágio tão proveitosos, onde adquiri tanta experiência e que
fizeram me encantar ainda mais pela medicina veterinária.
E claro, a todos os professores que, de forma tão qualificada, dedicaram seu tempo
para o ensino. Sou imensamente grata por cada professor que repassou um pouco de seu
conhecimento para mim. Agradeço pela grande atenção dispensad a que foi imprescindível para
concluir o meu sonho de me tornar médica veterinária.
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RESUMO
O hipertireoidismo é a doença endócrina mais comum em felinos de meia idade a idosos. Esta
enfermidade é resultante da alta concentração de hormônios tireoidianos circulantes produzidos
por um funcionamento anormal da glândula tireoide. Embora a etiopatogenia não esteja
esclarecida, suspeita-se de fatores nutricionais, ambientais e genéticos. As principais alterações
clínicas incluem diarreia, êmese, irritabilidade, hiperatividade, perda de peso, polifagia,
poliúria, polidipsia e o diagnóstico se baseia na dosagem do T4 total associado às manifestações
clínicas do paciente. O prognóstico depende do tratamento escolhido, podendo ser
medicamentoso, cirúrgico, por radioiodoterapia e dieta restrita em iodo (ainda não
comercializada no Brasil). O presente trabalho objetiva trazer uma revisão de literatura sobre
esta patologia e relatar um caso de hipertireoidismo em uma gata, SRD, de 10 anos e dois
meses, apresentando êmese, polidipsia, perda de peso e restrição alimentar. O diagnóstico de
hipertireoidismo foi confirmado através da mensuração de tiroxina total e do hormônio
tireoestimulante. Como tratamento foi instituído o uso de metimazol transdérmico, contudo,
houve piora do quadro clínico. Foi recomendado o reajuste de dose, entretanto a tutora e a
paciente não retornaram ao hospital veterinário, não havendo informações sobre a progressão
do quadro.
ABSTRACT
Hyperthyroidism is the most common endocrine disease in middle-aged to elderly cats. This
disease results from the high concentration of circulating thyroid hormones produced by an
abnormal functioning of the thyroid gland. Although the etiopathogenesis is not clear,
nutritional, environmental and genetic factors are suspected. The main clinical alterations
include diarrhea, emesis, irritability, hyperactivity, weight loss, polyphagia, polyuria,
polydipsia and the diagnosis is based on the dosage of total T4 associated with the patient's
clinical manifestations. The prognosis depends on the treatment chosen, which can be drug,
surgical, radioiodine therapy and an iodine-restricted diet (not yet marketed in Brazil). The
present work aims to review the literature on this pathology and report a case of
hyperthyroidism in a female cat, SRD, aged 10 years and two months, with emesis, polydipsia,
weight loss and food restriction. The diagnosis of hyperthyroidism was confirmed by measuring
total thyroxine and thyroid-stimulating hormone. As treatment, the use of transdermal
methimazole was instituted, however, there was a worsening of the clinical picture. A dose
adjustment was recommended, however, the tutor and the patient did not return to the veterinary
hospital, with no information on the progression of the condition.
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
% – Percentual
µg – Micrograma
ALT – Alanina transaminase
AMPc – Adenosina de monofosfato cíclico
AST – Aspartato aminotransferase
BID – Duas vezes ao dia
DIT – Diiodotirosina
FA – Fosfatase alcalina
I¹³¹ – Iodo 131
IM – Via intramuscular
IV – Via intravenosa
Kg – Quilograma
LDH – Lactato desidrogenase
mCi – Milicurie
mg – Miligrama
MIT – Monoiodotirosina
mL – Mililitro
ng – Nanograma
SID – Uma vez ao dia
SRD – Sem raça definida
T3 – Triiodotironina
T4 – Tiroxina
TG – Tireoglobulina
TGF – Taxa de filtração glomerular
TRH – Tireotropina
TSH – Hormônio tireoestimulante
TSHc – Hormônio tireoestimulante canino
VO – Via oral
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SUMÁRIO
4 DISCUSSÃO ........................................................................................................ 38
REFERÊNCIAS................................................................................................... 42
12
1 INTRODUÇÃO
2 REVISÃO DE LITERATURA
Figura 3 – Corte de uma tireoide mostrando os folículos cuja parede é formada por um
epitélio simples cúbico de células foliculares (setas). Os folículos são preenchidos por um
material amorfo – o coloide (C). Células parafoliculares (PF), produtoras de calcitonina, se
situam entre folículos (Micrografia. HE. Aumento médio).
2.2 FISIOLOGIA
Para a síntese dos hormônios da tireoide são necessárias duas moléculas: a tirosina e o
iodo. A tirosina é parte da molécula da tireoglobulina, formada na célula folicular e secretada
no lúmen folicular (GRECO e STABENFELDRT, 2014). O iodo é convertido em iodeto no
trato intestinal, através da tireoperoxidase (TPO), e transportado para a tireoide, onde as células
foliculares capturam o iodeto através de um processo de transporte ativo. Conforme o iodeto
passa através da parede apical da célula, esta molécula se liga a tirosina. Cada anel de tirosil da
molécula de tirosina pode acomodar de uma a duas moléculas de iodeto. Caso apenas uma
molécula de iodeto se ligue, forma-se a monoiodotirosina (MIT), e se duas se ligam, é
denominada diiodotirosina (DIT). Esta reação também é catalisada pela tireoperoxidase
(SCOTT-MONCRIEFF, 2010). A junção de duas moléculas de tirosina iodadas resulta na
formação dos principais hormônios tireoidianos: triiodotironina (T3) e tiroxina (T4). A T3 é
resultante da junção de uma molécula de monoiodotirosina e uma de diiodotirosina, já a T4 é
formada por duas moléculas de diiodotirosina (GRECO e STABENFELDT, 2014). Estes
hormônios permanecem ligadas à tireoglobulina (Tg) no lúmen extracelular até à secreção
(SCOTT-MONCRIEFF, 2010).
Para que os hormônios tireoidianos sejam liberados pela glândula tireoide, a
tireoglobulina volta à célula tireoideana por meio da endocitose. Posteriormente, a
tireoglobulina sofre hidrólise a partir de enzimas lisossômicas, liberando T3 e T4 através da
membrana celular basal. A MIT e a DIT são deiodadas, pela enzima deiod inase, para a
reciclagem do iodo na glândula, enquanto T3 e T4 saem para a corrente circulatória por difusão
simples (SCOTT-MONCRIEFF, 2010).
uma maior concentração de substâncias na circulação dos gatos do que o esperado, contribuindo
para o desenvolvimento do hipertireoidismo (NEBBIA, 2007; PETERSON e WARD, 2007;
MOONEY, 2005).
Podem estar associadas ao desenvolvimento do hipertireoidismo também a aplicação
de produtos tópicos contra ectoparasitas ou produtos químicos presentes no meio ambiente. No
entanto, nenhum estudo foi ainda capaz de identificar quais produtos ou componentes estão
associados com este risco (PETERSON, 2012).
Em relação a aspectos moleculares, outra importante causa de hipertireoidismo está
relacionada à proteína G. Em gatos hipertireoideos a expressão da proteína G inibitória é
significantemente reduzida, levando a uma diminuição da inibição da cascata de adenosina
monofosfato cíclica (AMPc) em resposta ao TSH, provocando uma hipersecreção de tiroxina
pela tireoide (HAMMER, 2000; SOUZA et al., 2017).
2.6 DIAGNÓSTICO
Nesta técnica o gato deve ser contido na posição sentada com os membros anteriores
imobilizados. Com o pescoço do paciente estendido e inclinado para trás, o clínico deve
posicionar o polegar e o dedo indicador ambos os lados da traqueia e movê-los ventralmente
em direção à entrada do tórax. A palpação de um nódulo subcutâneo móvel ou de um som de
“blip” determina a existência de bócio (FELDMAN e NELSON, 2004).
Para realizar a palpação da tireoide, o clínico deve se posicionar atrás do paciente, que
se encontra em decúbito esternal ou sentado, elevando o queixo a 45 graus e virando o pescoço
no sentido contrário ao do lobo que se queira palpar, colocar o dedo ao lado da traqueia e
avançá-lo desde a laringe até à entrada do tórax. Caso o lobo tireoideo esteja aumentado, será
possível sentir um “blip” característico conforme o dedo indicador passa sobre o bócio
(NORSWORTHY et al., 2004).
2.6.11 Cintilografia
A B
C D
As doenças mais comuns que devem ser consideradas como diagnóstico diferencial
incluem doença renal crônica, doenças gastrointestinais, diabetes mellitus, neoplasias (em
especial linfoma alimentar) e parasitismo (CARNEY et al., 2016).
2.7 TRATAMENTO
Necessidade de
Tireoidectomia Possível 1-10 dias Intermediário
Recomendado cirurgião hábil
antes do
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tratamento
cirúrgico
Tratamento Pode ser
Não há Sempre
medicamentoso a Comum 3-15 dias relevante a
necessidade disponível
longo prazo longo prazo
Fonte: Adaptado de MOONEY e PETERSON, 2015.
O tratamento medicamentoso é uma opção terapêutica com baixo custo, não exige
necessidade de instalações específicas para sua realização, tem a capacidade de retornar o
animal a condição de eutireoideo rapidamente, não necessita de internação e nem mesmo de
intervenção anestésica e cirúrgica (SCOTT-MONCRIEFF, 2007). Entretanto, o inconveniente
dessa terapia é que há a necessidade de administração contínua da medicação e de
monitoramento constante dos hormônios tireoideos. Além disso, o tratamento medicamentoso
não ocasiona a diminuição do lobo tireoideo, e seu uso pode gerar efeitos colaterais, como
anorexia, vômitos e letargia (CUNHA et al., 2008).
O metimazol e o carbimazol são recomendados para o tratamento medicamentoso a
longo prazo. Estas drogas inibem a síntese dos hormônios da tireoide, onde atuam bloqueando
a ligação do iodo dentro dos grupos tirosil na tireoglobulina, impedindo a formação de T3 e
T4. Contudo, devido ao fato de não haver efeito antitumoral, a glândula tireoide continua
aumentando de volume (SOUZA et al, 2017). Tanto o metimazol quanto o carbimazol podem
ser utilizados para estabilizar pacientes que serão submetidos a tireoidectomia e para pacientes
que estão aguardando terapia com iodo radioativo (NELSON e COUTO, 2015).
O metimazol por via oral tem a meia-vida de 4-6 horas no sangue, porém no tecido
tireoidiano atua por até 20 horas. A dose recomendada é de 2,5 mg/gato a cada 12 horas ou 5
mg/gato a cada 24 horas (MOONEY e PETERSON, 2015).
O carbimazol administrado por via oral é convertido em metimazol rapidamente e
assim ocorre o efeito sob a produção do hormônio tireoidiano. A dose recomendada é de 5
mg/gato a cada 12 ou 24 horas para o tratamento de longa duração (MOONEY e PETERSON,
2015).
Nos tratamentos de longa duração, deve-se monitorar o T4 total 3 semanas após o
início da terapia, e depois a cada ajuste de dose até obter a estabilidade monitorando a partir
desse momento a cada 3- 6 meses (RUTLAND et al., 2009). O objetivo é manter a concentração
sérica do T4 total próximo ao limite inferior de normalidade para a espécie.
29
O iodo radioativo como terapia é simples, efetivo e seguro. Contudo, seu uso requer
infraestrutura para um manejo adequado dos radioisótopos, conhecimento técnico e internação
do paciente geriátrico por 7 a 10 dias após a radioiodoterapia.
O princípio básico desse tratamento se baseia na ausência de distinção, por parte das
células tireoidianas, entre o iodo estável e o iodo 131 (I¹³¹), assim, este é aplicado a tireoide o
captura e armazena igualmente ao iodo natural. Quando aplicado em um gato hipertireoideo, o
iodo 131 se concentra primariamente nas células hiperplásicas ou neoplásicas, promovendo
irradiação e destruição destas (MOONEY, 2001).
O tratamento consiste na administração IV, VO ou SC de iodo 131 em uma dose que
estabeleça o eutireoidismo e evite o hipotireoidismo, avaliando a quantidade sérica de T4,
estado geral do animal e seriedade dos sinais clínicos. Com base nisso, as doses empregadas
podem ser baixas (2,5 a 3,5 mCi), moderadas (3,5 a 4,5 mCi) e altas (4,5 a 6,5 mCi). A
administração de uma dose única de I¹³¹ restaura o eutireoidismo no paciente, sem que haja
hipotireoidismo. Caso o estado hipertireoideo perdure por 3 meses após a primeira aplicação, o
paciente pode receber uma nova dose de iodo radioativo. Em pacientes com carcinoma
tireoidiano a dose deve ser mais alta, sendo de 10 a 30 mCi (SOUZA et al, 2017).
2.7.3 Tireoidectomia
Atualmente há disponível como dieta seca restrita em iodo a Hill’s Prescription Diet
y/d Thyroid Care ®, todavia, não está disponível no Brasil.
2.7.4.2 Ipodato
2.8 PROGNÓSTICO
3 RELATO DE CASO
No dia 16 de abril de 2022, uma paciente felina, fêmea, sem raça definida, com 10
anos e 2 meses, castrada e pesando 2,800kg, foi atendida no Hospital Veterinário Florianópolis,
apresentando êmese, emagrecimento progressivo, polidipsia e seletividade alimentar, relatados
pela proprietária. Não apresentava aumento de volume na região correspondente à tireoide.
No histórico clínico, a tutora relata que levou a paciente a um médico veterinário em
julho de 2021 e a diagnosticou com hepatopatia. Foi prescrito SAME (S-Adenosil-L-
Metionina) e o tratamento seguiu até dezembro do mesmo ano, havendo melhora das enzimas
hepáticas. Foi recomendado pela médica veterinária que a paciente retornasse a cada 10 dias
para realizar fluidoterapia, entretanto a tutora não concordou com o tratamento.
Já no Hospital Veterinário Florianópolis, durante o atendimento, foram solicitados
ultrassonografia abdominal, hemograma, bioquímica sérica (ALT, FA, creatinina, ureia,
bilirrubinas, colesterol total, triglicerídeos, glicemia e lipase específica felina) e mensuração de
TSH e T4 total específico.
Foi pedido que a tutora retornasse em consulta quando os exames estivessem
prontos, para que fosse instituído o melhor tratamento da paciente. Para o controle da êmese
foi receitado Ondansentrona, 0,5 mg/kg, na dose de 0,3ml, VO, BID, durante quatro dias; e
para estimular o apetite, receitou-se Cobavital®, 5 mg/kg, VO, BID, durante cinco dias.
O resultado dos exames solicitados no dia 16 de abril de 2022 se encontra na tabela
abaixo:
Mielócitos 0 0
Metamielócitos 0 0
Bastonetes 0 0-300
Segmentados 8.415 2.500-12.500
Linfócitos 7.480 1.500-7.000
Monócitos 187 50-850
Eosinófilos 2.618 0-1.500
Basófilos 0 0-150
Fonte: Hospital Veterinário Florianópolis, 2022.
Rim direito (Figura 9), medindo cerca de 3,92 cm, com contornos regulares,
ecogenicidade mantida, definição córtico-medular preservada, relação de espessura córtico-
medular com moderado espessamento cortical, sem sinais de dilatação da pelve e litíases.
Rim esquerdo (Figura 10), medindo cerca de 3,66 cm, contornos regulares,
ecogenicidade mantida, definição córtico-medular preservada, relação de espessura córtico-
medular com moderado espessamento cortical, sem sinais de dilatação da pelve e litíases.
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4 DISCUSSÃO
A paciente do presente relato tem 10 anos de idade e dois meses, o que está de acordo
com FELDMAN e NELSON (2004), que afirmam que 95% dos felinos com hipertireoidismo
possuem mais de 10 anos de idade. Os sinais clínicos de êmese, polidipsia, perda de peso e
perda de apetite são compatíveis com aqueles descritos por SCOTT-MONCRIEFF (2007) para
auxiliar no diagnóstico de hipertireoidismo felino.
O aumento do hematócrito obtido no hemograma é relatado em 40 a 50% dos gatos
acometidos pela doença (VASKE et al., 2014). Essa alteração ocorre devido a uma estimulação
do sistema adrenérgico na medula óssea por hormônios da tiroide e a um aumento da prod ução
de eritropoietina secundária em consequência do aumento do consumo de oxigênio. No
leucograma a paciente apresentou linfocitose e eosinofilia, ocasionalmente relacionadas a falta
de cortisol devido ao excesso de hormônios tireoidianos (MOONEY e PETERSON, 2015).
Nos exames bioquímicos estavam aumentados a fosfatase alcalina, ureia, bilirrubina
total, bilirrubina direta, colesterol total e triglicerídeos.
A ureia sérica pode estar elevada em gatos hipertireoideos em decorrência do
excessivo catabolismo proteico, contudo, pode estar diminuída como consequência do aumento
da taxa de filtração glomerular que ocorre no hipertireoidismo (GRAVES, 1997).
Aumentos na bioquímica sérica de colesterol e bilirrubina geralmente não estão
associados ao hipertireoidismo em felinos (MOONEY et al., 2006). Todavia, altos níveis de
hormônios tireoidianos podem acarretar em alterações hepáticas, como esteatose, lipidose,
degeneração hidrópica, hiperplasia e hipertrofia dos hepatócitos, depleção de glicogênio nos
hepatócitos, infiltrado mononuclear e polimorfonuclear, hiperplasia das células de Kupffer e
necrose (VIDELA et al., 1995; ENGELMAN et al., 2001; ZABLITH, 2004). Isso ocorre devido
ao fígado atuar ativamente no metabolismo central e dos hormônios tireoidianos, logo, níveis
séricos adequados de T3 e T4 são necessários para a preservação da função hepática (HUANG
e LIAW; 1995).
A lipidose hepática felina é a doença hepática mais comum em felinos
(NORSWORTHY, 2011). Pode ter caráter primário onde a síndrome é ocasionada por períodos
de estresse associados à anorexia. A restrição severa de proteínas e carboidratos acarreta em
uma grande mobilização de energia do tecido adiposo para o fígado através da lipólise. Assim,
a deficiência de proteínas impede a união de ácidos graxos com as apoproteínas, culminando
em acúmulo de gordura nos hepatócitos (GRIFFIN, 2000). Além disso, o estresse provoca a
liberação de catecolaminas, podendo também ativar o hormônio sensível a lipase e a
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volume (SOUZA et al, 2017). Os efeitos adversos do metimazol incluem vômito, anorexia,
depressão, alopecia autoinduzida, discrasia sanguínea e hepatopatia em até 18% dos animais
(VASKE et al., 2014). A dose inicial escolhida para a terapêutica com o metimazol é de 2,5
mg/gato, BID, durante 2 semanas. Quando há preocupação com os efeitos adversos, alguns
pesquisadores recomendam a dose de 2,5 mg/gato, SID, ou 1,25 mg/gato, BID (FELDMAN e
NELSON, 2004). A terapêutica com o metimazol transdérmico foi escolhido por ser uma
alternativa segura de tratamento a longo prazo, embora por vezes demore mais para obter
concentrações normais de hormônio tireoidiano, em comparação a administração oral
(SARTOR et al., 2004). Além disso, o metimazol transdérmico está associado à menores efeitos
colaterais gastrointestinais em comparação à via oral (TREPANIER, 2006).
No dia 06 de julho, 81 dias após o início do tratamento, a tutora retornou relatando que
não notou melhora clínica na paciente. Foi realizada a mensuração de T4 total e TSH
novamente. resultou em um valor acima do esperado para o valor de referência (29,90 µg/dL).
Já o TSH específico se mostrou abaixo da primeira mensuração (0,04 ng/mL). Isso se deve ao
aumento dos hormônios tireoestimulantes circulantes, os quais suprimem a secreção pituitária
de TSH através da retroalimentação negativa (LARSEN, 1982).
Pode-se observar que o metimazol não resultou em um controle adequado dos
hormônios da tireoide. Segundo Boretti et al. (2014), a dose inicial de metimazol transdérmico
recomendada para o tratamento do hipertireoidismo é de 2,5 mg SID a 5 mg BID. Caso não
haja normalização das concentrações hormonais tireoidianas, altera-se a dose com aumentos de
2,5 a 5 mg, avaliando o paciente após duas a três semanas. Uma vez obtida concentrações
eutireoidianas, ajusta-se a dose diária, visando a menor dose possível que mantenha tal condição
(MOONEY et al., 2015).
Foi solicitado retorno para o reajuste de dose, entretanto não foi possível entrar em
contato com a tutora e o tratamento não teve prosseguimento até o momento da publicação
deste relato de caso. Portanto, o prognóstico da paciente tende a ser desfavorável, já que felinos
hipertireoideos sem tratamento adequado são mais predispostos a doenças concomitantes, assim
como visto neste relato de caso (GUNN-MOORE, 2005).
41
5 CONCLUSÃO
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