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CURSO:

Cuidado farmacêutico
em doenças endócrinas
MÓDULO 1
Semiologia e fisiologia
endócrina e
fisiopatologia/farmacoterapia
dos distúrbios da tireoide

Autores:
Mariana Martins Gonzaga do Nascimento

Hágabo Mathyell Silva

Sandra Regina dos Santos

Carina de Morais Neves


SUMÁRIO

1 ESTUDO DIRIGIDO ................................................................................................................................ 4


2 SEMIOLOGIA CLÍNICA E ANAMNESE FARMACÊUTICA.......................................................................... 5
3 O PROCESSO DE EXAME CLÍNICO ......................................................................................................... 6
3.1 Identificação do paciente (ID) ....................................................................................................... 6
3.2 Queixa principal (QP) e história da moléstia atual (HMA) ............................................................ 7
3.3 Avaliação do histórico pessoal e familiar ...................................................................................... 8
3.4 Sinais e sintomas gerais e exame geral ......................................................................................... 8
3.5 Exame setorial e avaliação de sinais e sintomas específicos ........................................................ 8
4 FISIOLOGIA, SINAIS E SINTOMAS RELACIONADOS AO SISTEMA ENDÓCRINO ..................................... 9
5 ANATOMIA E FISIOLOGIA DA TIREOIDE.............................................................................................. 12
6 HIPOTIREOIDISMO .............................................................................................................................. 14
6.1 Sinais e sintomas do hipotireoidismo.......................................................................................... 15
6.2 Exames laboratoriais ................................................................................................................... 17
7 HIPERTIREOIDISMO E TIREOTOXICOSE............................................................................................... 19
8 FARMACOTERAPIA DO HIPOTIREOIDISMO E HIPERTIREOIDISMO ..................................................... 21
8.1 Farmacoterapia do hipotireoidismo............................................................................................ 21
8.2 Farmacoterapia do hipertireoidismo .......................................................................................... 22
1 ESTUDO DIRIGIDO

Este estudo dirigido tem como objetivo apontar aquilo que é mais relevante entre os conhecimentos
sobre a Semiologia e fisiologia endócrina e fisiopatologia/farmacoterapia dos distúrbios da tireoide e
seu manejo enquanto farmacêutico clínico. Por isso, ao final desse módulo, após assistir a aula,
proceder com a leitura da presente apostila e das leituras complementares, você deverá ser capaz de
responder as questões a seguir:

1) Quais são as glândulas e tecidos que contituem o sistema endócrino? Quais as suas funções e
hormônios correspondentes?
2) Quais são os principais sinais e sintomas relacionados às doenças endócrinas?
3) Explique a fisiologia do hormônio da tireoide.
4) O que é o hipotireoidismo? Descreva as suas causas, sinais e sintomas.
5) Quais são as perguntas que devem ser feitas ao paciente com suspeita de hipotireoidismo?
6) O que é o hipertireoidismo? Descreva as suas causas, sinais e sintomas.
7) E a tireotoxicose, o que é? Quais as diferenças e semelhanças entre ela e o hipertireoidismo?
8) Quais são as perguntas que devem ser feitas ao paciente com suspeita de hipertireoidismo?
9) Qual a farmacoterapia de escolha para hipotireoidismo? Quais são os parâmetros de
efetividade e de segurança que devem ser observados e monitorados durante o tratamento?
10) Orientações para o paciente sobre uso correto da levotiroxina são importantes para
tratamento adequado do hipotereoidismo. Quais são essas?
11) Quais os principais medicamentos usados na farmacoterapia do hipertireoidismo?
12) Em relação ao hipertireoidismo, além da farmacoterapia, quais outros tratamentos estão
disponíveis? Quais são as suas vantagens e desvantagens?

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Durante o curso, disciplinas essenciais para o cuidado ao paciente estarão entrelaçadas no conteúdo,
destacando-se: a semiologia, a fisiologia, a patologia e a farmacoterapia. Iniciamos o presente
módulo pela abordagem da semiologia.

2 SEMIOLOGIA CLÍNICA E ANAMNESE FARMACÊUTICA

Semiologia é a ciência geral dos signos ou sinais. Estuda todos os fenômenos culturais como se
fossem sistemas de signos (ex.: imagens, gestos, vestuários, ritos, etc.) e propõe sistemas de
significação. A semiologia clínica, por sua vez, é o estudo do conjunto de sinais e sintomas com a
finalidade de se realizar o diagnóstico ou diagnósticos clínicos. Neste âmbito é importante destacar
as diferenças entre sinais e sintomas:

SINTOMAS É O QUE O PACIENTE RELATA


 São individuais
 Não são absolutos
 Sofrem influência de múltiplos fatores, como: cultura,
comunicabilidade, desenvolvimento intelectual, vivência, etc.
 Exemplos: dor – diferentes limiares individuais.
SINAIS É O QUE O EXAMINADOR ENCONTRA
 Podem ser observados, como aspectos da pele, apresentando maior
variabilidade na avaliação individual.
 Podem ser aferidos e/ou quantificados, com ou sem auxílio de
instrumentos de mensuração.
 Exemplos: pele corada, sons, pressão arterial, saturação de O2.

A semiologia clínica é aplicada durante a anamnese, que é a entrevista clínica que visa a obtenção de
informações pertinentes às condições que levaram o paciente a procurar o atendimento, de forma
organizada e reprodutível. Em nosso âmbito, a anamnese farmacêutica, seria o procedimento de
coleta de dados sobre o paciente, realizada pelo farmacêutico por meio de entrevista, com a
finalidade de conhecer sua história de saúde, elaborar o perfil farmacoterapêutico e identificar suas
necessidades relacionadas à saúde.

A anamnese farmacêutica deve se iniciar com o devido acolhimento do paciente, que, alinhado com
sua percepção interdisciplinar, seria um processo construtivo que implica na responsabilização do
trabalhador e da equipe pelo paciente, desde sua chegada até a sua saída do estabelecimento de
saúde. O destaque proposital da palavra “responsabilização”, tem como objetivo estabelecer que o
farmacêutico, assim como a equipe, é responsável pelo paciente, sua vida e suas necessidades em
saúde. O farmacêutico deve, então, ouvir a queixa do paciente, considerar suas preocupações e
angústias, utilizando escuta qualificada que possibilite analisar a demanda, colocar os limites
necessários, garantir atenção integral, resolutiva e responsável.

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3 O PROCESSO DE EXAME CLÍNICO

O exame clínico deve seguir algumas etapas essenciais, conforme detalhado na figura a seguir, que
devem ser desenvolvidas conforme a habilidade individual:

Exame setorial
e avaliação de
sinais e Identificação
sintomas
específicos

Avaliação de
sinais e Avaliação da
sintomas gerais queixa principal
e exame geral

Avaliação do
Avaliação da
histórico
história da
pessoal e
moléstia atual
familiar

3.1 Identificação do paciente (ID)

A identificação do paciente possibilita ao farmacêutico saber quem é o paciente e documentar seus


dados, garantindo a continuidade do cuidado e o desenvolvimento de uma relação terapêutica e de
confiança. São itens importantes para identificação:
 nome;
 data de nascimento: a idade do paciente é importante para sua avaliação, uma vez que
adultos mais velhos e idosos têm, geralmente, maior chance de apresentarem diabetes e
hipotiroidismo, por exemplo;
 gênero: distúrbios da tireoide são mais comuns entre pessoas do sexo feminino;
 estado civil;
 cor/etnia;
 nome dos pais: importante para a identificação do paciente, diferenciando pessoas
homônimas ou com nomes semelhantes;
 encaminhamento: quem o encaminhou ou se houve busca espontânea de atendimento;

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 procedência: cidade ou local de onde está vindo no momento ou nos últimos meses e
anos;
 naturalidade: local aonde nasceu;
 residência: local aonde reside;
 profissão e ocupação: pode sinalizar situações de risco no ambiente de trabalho;
 perfil socioeconômico: permite identificação e avaliação de vulnerabilidades e
determinantes sociais em saúde.

3.2 Queixa principal (QP) e história da moléstia atual (HMA)

A queixa principal (QP) é o motivo que leva o paciente à consulta, seja por demanda espontânea ou
encaminhamento. Geralmente, ela orienta a atenção ao sistema acometido e deve prover um
registro curto por parte do farmacêutico, usando, se possível, as palavras do próprio paciente
(registrado com a sigla “SIC”, que representa “segundo informações colhidas” ou, do latim SICUT
”exatamente dessa forma”). Na avaliação da QP, deve-se proceder com a avaliação dos seguintes
fatores descritos na figura a seguir:

A caracterização do sinal ou sintoma referido na QP (ex.: dor, tosse) variará de acordo com o que é
esperado para tal na literatura, e, mais uma vez, dependerá dos conhecimentos semiológicos e
clínicos prévios do farmacêutico. Tais dados detalhados deverão ser colhidos e relatados em texto
um pouco mais extenso para a história da moléstia atual (HMA), também denominada história da
doença atual (HDA), que deve trazer a descrição da evolução da queixa principal, com apresentação
de dados acerca de como e quando a queixa e sinas/sintomas associados se iniciaram, como

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variaram ao longo do tempo, sua característica, intensidade, agravantes e sinais e sintomas
associados.

3.3 Avaliação do histórico pessoal e familiar

Na avaliação da história médica pregressa (HMP), história familiar (HF) e história pessoal e social
(HPS), deve-se avaliar e documentar todos os problemas de saúde e todos os medicamentos
utilizados. Além disso, alguns fatores devem sempre ser questionados como: estado de gestação,
hábitos de vida, histórico de cirurgias e histórico familiar de doenças. Para doenças cardiovasculares,
o histórico familiar, principalmente de primeiro grau, com hipertensão, diabetes ou histórico de
doenças coronarianas, aneurisma ou acidente vascular cerebral (AVC) são especialmente relevantes.

3.4 Sinais e sintomas gerais e exame geral

Alguns sinais e sintomas gerais devem sempre ser avaliados em todos os pacientes nos quais
procede-se com o exame clínico. Destacamos alguns deles:
 avaliação da presença e histórico de febre;
 presença de sudorese e calafrios;
 alterações no apetite;
 presença de fraqueza e fadiga;
 presença de tristeza e ansiedade;
 padrão de sono.
O exame geral quantitativo e qualitativo permite a avaliação de sinais e sintomas gerais
inespecíficos, mas relevantes para caracterização do quadro clínico. Alguns parâmetros serão
abordados na seção de sinais e sintomas relacionados ao sistema cardiovasculares neste módulo e
também nos módulos a seguir.

3.5 Exame setorial e avaliação de sinais e sintomas específicos

Durante o exame clínico, procede-se também com:


 A revisão de sistemas: no qual, geralmente, usa-se um formulário com sinais e sintomas
referentes a cada sistema e que permite o questionamento rápido sobre sua ocorrência;
 O exame clínico setorial: realizado por meio da avaliação dos setores do corpo (ex.: cabeça e
pescoço; tórax; abdome; membros) com inspeção, palpação, percussão e ausculta para
identificação de alterações;
 O exame por sistemas: permite a identificação de sinais e sintomas mais específicos por
meio do exame dos sistemas humanos, dentre eles, o sistema cardiovascular.

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4 FISIOLOGIA, SINAIS E SINTOMAS RELACIONADOS AO SISTEMA ENDÓCRINO

O sistema endócrino é constituído por inúmeras glândulas, tecidos e órgãos que regulam múltiplas
funções do organismo por meio da produção e secreção de mensageiros químicos. Esses
mensageiros são classificados em vários tipos distintos: neurotransmissores, hormônios endócrinos,
neuroendócrinos e citocinas. Os hormônios são liberados pelas glândulas ou células especializadas,
distribuídos na corrente sanguínea e se ligam aos receptores das células alvo. Alguns hormônios
afetam muitos tipos diferentes de células, como o hormônio do crescimento (GH); enquanto que
outros são tecido-específicos como o hormônio adrenocorticotrópico (ACTH), que estimula
especificamente o córtex adrenal, fazendo com que ele secrete hormônios adrenocorticais.

Fonte: Hall, 2017.

A secreção e duração da ação dos hormônios varia enormemente entre eles. Alguns, como a
epinefrina, são secretados e exercem sua ação em segundos. Outros, como a tiroxina (T4) e o GH,
terão seu efeito máximo após meses da sua secreção.

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Quadro 1 - Glândulas endócrinas, hormônios e suas funções
Glândula/
Hormônios Principais funções
tecido
Estimula a secreção de hormônio liberador de tireotropina e
Hormônio liberador de tireotropina
prolactina.
Hormônio liberador de corticotropina Causa liberação de hormônio adrenocorticotrópico.
Hormônio liberador do hormônio do
Causa liberação do hormônio do crescimento.
crescimento
Hipotálamo
Hormônio inibidor do hormônio do
Inibe a liberação do hormônio do crescimento.
crescimento (somatostatina)
Causa liberação de hormônio luteinizante e hormônio folículo-
Hormônio liberador de gonadotropinas
estimulante.
Dopamina ou fator inibidor da prolactina Inibe a liberação de prolactina.
Estimula a síntese proteica e o crescimento global da maioria
Hormônio do crescimento
das células e tecidos.
Estimula a síntese e a secreção dos hormônios da tireoide
Hormônio liberador de tireotropina
(tiroxina e tri-iodotironina).
Estimula a síntese e a secreção de hormônios adrenocorticais
Hormônio adrenocorticotrópico
(cortisol, androgênios e aldosterona).
Hipófise
Promove o desenvolvimento das mamas femininas e a secreção
anterior Prolactina
de leite.
Causa crescimento de folículos nos ovários e maturação de
Hormônio folículoestimulante
espermatozoides nas células de Sertoli dos testículos.
Estimula a síntese de testosterona nas células de Leydig dos
Hormônio luteinizante testículos; estimula a ovulação, a formação de corpo lúteo e a
síntese de estrogênio e progesterona nos ovários.
Aumenta a reabsorção de água pelos rins e causa
Hipófise Hormônio antidiurético
vasoconstrição e aumento da pressão arterial.
posterior
Ocitocina Estimula a ejeção de leite das mamas e contrações uterinas.
Aumentam as taxas de reações químicas na maioria das células,
Tiroxina (T4) e triiodotironina (T3)
elevando, assim, a taxa metabólica corporal.
Tireoide
Promove a deposição de cálcio nos ossos e diminui a
Calcitonina
concentração do íon cálcio do líquido extracelular.
Tem múltiplas funções metabólicas para o controle do
Cortisol metabolismo de proteínas, carboidratos e gorduras; também
Córtex
tem efeitos anti-inflamatórios.
adrenal
Aumenta a reabsorção de sódio renal, a secreção de potássio e
Aldosterona
a secreção do íon hidrogênio.
Medula
Norepinefrina, epinefrina Mesmos efeitos que a estimulação simpática.
adrenal
Promove a entrada de glicose em muitas células, controlando o
Insulina (células β)
metabolismo dos carboidratos.
Pâncreas
Aumenta a síntese e a liberação de glicose do fígado para os
Glucagon (células α)
líquidos corporais.
Controla a concentração do íon cálcio no soro por aumento da
Paratireoide Paratormônio absorção de cálcio pelo intestino e pelos rins e liberação de
cálcio dos ossos.
Promovem o desenvolvimento do sistema reprodutor
Testículos Testosterona
masculino e as características sexuais secundárias masculinas.
Promovem o crescimento e o desenvolvimento do sistema
Estrógenos reprodutor feminino, das mamas femininas e das características
sexuais secundárias femininas.
Ovários
Estimula a secreção de “leite uterino” pelas glândulas
Progesterona endometriais uterinas e promove desenvolvimento do aparelho
secretor das mamas.
Fonte: adaptado de Hall (2017).

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Os hormônios podem também ser classificados por sua estrutura química em:

 Proteínas e polipeptídeos: hormônios da hipófise, pâncreas (insulina e glucagon),


paratormônio e muitos outros.
 Esteroides: córtex adrenal (cortisol e aldosterona), ovários e placenta (estrógenos e
progesterona) e testosterona.
 Derivados do aminoácido tirosina: secretados pela tireoide (tiroxina e triiodotironina) e
medula adrenal (epinefrina e norepinefrina).

A concentração plasmática dos hormônios, em geral, é muito reduzida (picograma a micrograma), e


varia dentro de uma faixa considerada fisiológica, devido a fatores diversos. Para manter a
homeostasia das reações orgânicas estimuladas por hormônios, há um controle exercido por
mecanismos de feedback negativo. Isso significa que condições ou produtos decorrentes da ação do
hormônio tendem a suprimir sua liberação adicional, o que previne a ocorrência de hipersecreção
hormonal ou hiperatividade no tecido-alvo.

Maiores detalhes anatômicos e fisiológicos serão abordados conforme necessidades de cada


conteúdo dos módulos, e, a seguir, será descrita a avaliação de alguns sinais e sintomas relacionados
ao Sistema Endócrino. Esses sinais e sintomas também serão melhor detalhados ao longo dos
módulos à medida que forem abordadas condições clínicas específicas.

Quadro 2 - Sinais e sintomas comuns em doenças endócrinas


 Mudanças no apetite e alteração no peso corporal
 Alteração no funcionamento intestinal
 Sudorese
 Mudança na distribuição de pelos e cabelo
 Letargia
 Mudanças na pele
Principais
 Alterações de pigmentação
 Estatura
 Perda da libido, disfunção erétil
 Alteração no ciclo menstruação/perfil de menstruação
 Poliúria
 Protuberância no pescoço (bócio)
Fonte: adaptado de Talley e O’Connor (2018).

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5 ANATOMIA E FISIOLOGIA DA TIREOIDE

A glândula tireoide é uma estrutura única, com forma semelhante à da letra “H” ou a uma borboleta,
uma vez que é constituída por dois lobos laterais unidos por uma estreita porção de tecido,
denominada istmo. A tireoide se situa na base do pescoço, imediatamente abaixo da laringe e
anterior à traqueia (cada lobo lateral ocupa um dos lados da traqueia). O lobo piramidal, um
pequeno prolongamento na parte superior da tireoide, pode estar ausente. Em condições normais,
embora se encontre em um nível muito superficial, a tireoide não é palpável.

Fonte: www.msdmanuals.com

Cada lobo da glândula tireoide é constituído por vários lobos menores, e cada um deles, por lóbulos
compostos de até 40 células foliculares agrupadas. Cada folículo é formado por uma única camada
de células epiteliais, cujo interior é ocupado por uma substância, denominada coloide, que é
composto principalmente de um complexo de glicoproteína-iodo denominado tireoglobulina.
Durante a síntese de hormônios tireoideanos, o iodo liga-se a essas moléculas de tireoglobulina. Já as
células C parafoliculares secretam calcitonina, reguladora da homeostasia mineral óssea.

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O iodo ingerido na dieta é reduzido a iodeto no trato gastrointestinal e absorvido no intestino
delgado. Na corrente sanguínea, o iodeto é bombeado para dentro das células foliculares por
simporte de Na/I, onde, por sua vez, é oxidado para formar os resíduos de monoiodotirosina (MIT) e
di-iodotirosina (DIT). A combinação desses resíduos dá origem à tiroxina (T4) e tri-iodotironina (T3):
dois resíduos de di-iodotirosina são acoplados para formar T4; uma monoiodotironina e uma di-
iodotirosina são acopladas para formar T3.

Uma absorção diária de 150 a 200 µg de iodeto da dieta é suficiente para formar quantidades
normais de hormônios na tireoide, que são então liberados na circulação em diferentes proporções
(T4 - 90%; T3 - 10%). Como o T3 é a forma mais ativa do hormônio, o T4 é convertido na corrente
sanguínea em T3 para uma ação fisiológica mais representativa. O T4, entretanto, tem meia-vida
plasmática de cerca de 6 dias, enquanto que o T3, de apenas 1 dia.

Em um sistema de feedback, o hormônio de liberação da tireotrofina (TRH), produzido pelo


hipotálamo, controla a liberação de hormônio estimulante da tireoide (TSH) da adeno-hipófise. O
TSH aumenta a atividade da tireoide, promovendo um aumento liberação de hormônios tireoidianos
na corrente sanguínea, que, quando em níveis elevados, por sua vez, atuam na inibição do TRH ou
TSH por retroalimentação.

O T3 e T4 exercem efeitos em praticamente todas as células do organismo, regulando o crescimento,


metabolismo e o gasto de energia de uma forma geral. Sua ação celular é mediada pela ligação a
receptores de hormônio tireoideano (TR). Muitos dos efeitos dos hormônios tireoideanos
assemelham-se ao estímulo do sistema nervoso simpático, incluindo o efeito inotrópico e
cronotrópico positivos, excitabilidade, nervosismo e diaforese. Por outro lado, níveis baixos desses
hormônios proporcionam mixedema, que seria um estado hipometabólico caracterizado por letargia,
ressecamento da pele, voz áspera e intolerância a frio.

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6 HIPOTIREOIDISMO

A diminuição da produção e secreção dos hormônios tireoidianos pela glândula tiroide é conhecida
como hipotireoidismo. Trata-se de uma síndrome clínica que acomete, em sua maioria, mulheres e
adultos e se torna mais frequente com o avanço da idade. Em países com ingesta adequada de iodo,
como o Brasil, a prevalência de hipotiroidismo varia entre 1 e 2%, mas pode aumentar para até 7%
na faixa etária de 85 a 89 anos.

De maneira geral, as causas de hipotireoidismo (Quadro 3) podem ser classificadas de acordo com a
origem do problema. Correspondendo a 99% dos casos, é denominado hipotireoidismo primário,
quando a disfunção tem origem na própria tireoide, ocorrendo a perda permanente ou destruição da
glândula por processos como destruição autoimune ou dano por radiação.

A tireoidite de Hashimoto (tireoidite crônica autoimune) é a causa mais comum de hipotiroidismo


primário em adultos residentes em áreas com ingesta adequada de iodo. Nesse quadro,
autoanticorpos específicos atacam a tireoide, causando disfunção tireoideana. No início da tireoidite
de Hashimoto, a destruição das células foliculares tireoideanas pode ocasionar a liberação de
quantidades excessivas de coloide e um aumento transitório dos níveis de hormônios tireoidianos.
Eventualmente, a glândula é quase totalmente destruída, reduzindo a liberação de hormônios
tireoideanos e levando ao aparecimento dos sinais e sintomas de hipotireoidismo. Em consequência,
não ocorre inibição mediante retroalimentação do hipotálamo e da adenohipófise, e os níveis
plasmáticos de TSH se elevam.

Já no hipotireoidismo secundário, a etiologia é hipofisária, levando a uma diminuição na secreção do


hormônio estimulante da tireoide, ou tireotrofina (TSH). E quando há qualquer alteração na secreção
do hormônio liberador de tireotrofina, essa condição é conhecida como hipotireoidismo terciário. As
duas últimas condições são agrupadas em hipotireoidismo central e respondem por menos de 5%
dos casos de hipotiroidismo.

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Quadro 3 - Causas do hipotireoidismo
Primário Central (secundário/terciário)
Resposta crônica autoimune (tireoidite de
Insuficiência e/ou disfunção hipotalâmica
Hashimoto)
Disfunção hipofisária
Deficiência ou excesso de iodo na dieta
(macroadenoma e/ou apoplexia)
Iatrogênico: radioiodo ou cirurgia (geralmente para Resistência ao hormônio liberador de
tratar hipertireoidismo, bócio ou câncer de hormônio estimulante da tireoide (TSH) ou
tireoide) tireotropina
Genética (incluindo variações que causam Induzido por medicamentos (dopamina ou
hipotireoidismo congênito) somatostatinas, por exemplo)
Induzido por medicamentos que interferem com a
síntese/liberação de hormônios tireoidianos
(medicamentos antitireoidianos, amiodarona, iodo,
lítio, contrastes iodados, interferon alfa, sunitinibe,
sorafenibe, valproato de sódio)
Tireoidite transitória: pós-parto (infecção viral)
Infiltração tireoidiana: infecciosa, maligna (tireoide
primária ou metastática) e outras doenças
autoimunes, como sarcoidose e amiloidose
Fonte: adaptado de Taylor et al. (2018); Kronenberg et al. (2016).

Além disso, de acordo com o grau da disfunção tireoidiana, o hipotireoidismo primário pode ser
dividido em hipotireoidismo subclínico e hipotireoidismo declarado. Na primeira situação, a falência
da glândula é mínima, ocorrendo uma discreta diminuição dos hormônios tireoidianos, embora suas
concentrações se situem dentro da faixa de normalidade; no entanto, devido à elevada sensibilidade
hipofisária, ocorre elevação de TSH, na presença de tiroxina livre sérica normal (T4) e concentrações
de triiodotironina (T3). Já no hipotireoidismo declarado, existe uma diminuição mais acentuada da
produção hormonal pela tireoide, com consequente redução dos hormônios tireoidianos (abaixo da
faixa de normalidade) e elevação de TSH.

6.1 Sinais e sintomas do hipotireoidismo

O hipotireoidismo pode afetar todos os sistemas e órgãos humanos, e suas manifestações são, em
sua maior parte, independentes do distúrbio subjacente, apesar de se relacionarem ao grau de
deficiência do hormônio. Destaca-se, entretanto, que a presença de vários sinais e sintomas,
particularmente se de início recente, aumenta a probabilidade do diagnóstico. Os principais sinais e
sintomas relacionados ao hipotiroidismo encontram-se descritos no Quadro 4.

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Quadro 4 - Sinais e sintomas do hipotireoidismo
Pele e anexos: pele seca e fria, unhas quebradiças, queda de cabelos, edema palpebral.
Sistema gastrintestinal: constipação.
Sistema reprodutivo: distúrbios menstruais (podendo variar de amenorreia à menorragia),
anovulação, infertilidade, disfunção erétil, redução da libido.
Sistema cardiopulmonar: bradicardia, hipertensão arterial diastólica. Em alguns casos podem ser
encontradas dor anginosa, bulhas hipofonéticas, cardiomegalia (por derrame pericárdico), dispneia
e derrame pleural.
Sistema nervoso: parestesias, hiporreflexia, letargia, retardo no relaxamento do reflexo Aquileu,
síndrome do túnel do carpo.
Sistema musculoesquelético: fraqueza, câimbras musculares, mialgia, rigidez, astenia.
Outros: intolerância ao frio, ganho de peso, fraqueza, fadiga.
Em crianças: atraso do crescimento ou deficiência intelectual.
Fonte: adaptado de Kronenberg et al. (2016).

Em adultos, as manifestações típicas podem levar meses ou anos para aparecer. O desenvolvimento
gradual do estado do hipotireoidismo ocorre tanto pela lenta progressão da hipofunção tireoidiana
como pelas manifestações clínicas após a falência total da tireoide. Esse quadro gradual, entretanto,
não é observado quando a terapia de reposição é descontinuada em um paciente com
hipotireoidismo primário tratado ou quando a glândula tireoidiana de uma pessoa normal é retirada
cirurgicamente. Nesses pacientes, a manifestação do hipotireoidismo se apresenta em cerca de 6
semanas a 3 meses, e o mixedema é encontrado com maior frequência.

O termo mixedema, outrora usado como sinônimo do hipotireoidismo, refere-se ao quadro clínico de
redução na função energética e metabólica. O quadro é caracterizado, principalmente pela fácies
mixedematosa, na qual se observa edemas na face e nas pálpebras formando bolsas sob os olhos,
fisionomia apática, pele infiltrada, enoftalmia (retração anormal do olho em relação à órbita), e, às
vezes, língua protusa (macroglossia) (Figura 1A e 1B).

Figura 1A e 1B – Fácies mixedematosa. Fonte: adaptado de Kronenberg et al. (2016).

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Já o termo “coma mixedematoso” refere-se a uma consequência rara do hipotireoidismo
descompensado em estágios avançados que se manifesta por hipotermia, sinais e sintomas de
hipotireoidismo exacerbados e alterações sensoriais, que variam do delírio ao coma. O coma
mixedematoso se relaciona a taxas de mortalidade de 60 a 70% e exigem tratamento imediato e
intensivo.

Na prática clínica, é fundamental que o profissional esteja atento a algumas situações em que há
maior risco de desenvolvimento de hipotireoidismo: puérperas, mulheres acima de 35 anos,
pacientes com história prévia ou familiar de doença tireoidiana, pacientes submetidos à cirurgia de
tireoide, terapia prévia com iodo radioativo ou radiação externa no pescoço; diabetes tipo 1, história
pessoal ou familiar de doença autoimune, síndrome de Down e Turner, tratamento com lítio ou
amiodarona, depressão, dislipidemia e hiperprolactinemia.

PERGUNTAS AO PACIENTE COM SUSPEITA DE HIPOTIREOIDISMO

1. Você achou o clima frio mais difícil de suportar recentemente?


2. Você teve problemas com prisão de ventre?
3. Você ganhou peso?
4. Você notou que sua pele ficou seca?
5. Você acha que sua memória não é tão boa quanto antes? Você já se sentiu deprimido?
6. Você acha que sua voz ficou rouca? (Fala hipotireoidiana - caracteristicamente lenta e nasal -
ocorre em 1/3 dos pacientes.)
7. Você notou inchaço nas pernas?

Fonte: adaptado de Talley & O’Connor (2018).

6.2 Exames laboratoriais

As formas primárias de hipotireoidismo são diagnosticadas com a dosagem do hormônio tireo-


estimulante (TSH), que apresenta alta especificidade (95%) e sensibilidade (89%). Adicionalmente, o
exame é amplamente disponível, seguro e relativamente barato.

Com relação à determinação isolada de T4 livre em pacientes ambulatoriais, a sensibilidade e


especificidade se apresentam menores quando comparadas ao TSH. No entanto, a associação de
ambos (TSH e T4 livre) aumenta a precisão do diagnóstico. Assim, TSH e T4 podem ser utilizados
tanto para fins de diagnóstico quanto no acompanhamento farmacoterapêutico. Por sua vez, o T3
tem baixa acurácia para o diagnóstico de hipotireoidismo, já que a conversão aumentada de T4 para
T3 mantém a concentração sérica de T3 nos limites normais até o hipotireoidismo se tornar grave.

No hipotireoidismo primário, há inicialmente a elevação de TSH e, com a evolução do quadro, ocorre


a redução dos níveis de T4 e, posteriormente, dos níveis de T3. Entretanto, na forma subclínica do
hipotiroidismo, usualmente, só é detectado um aumento discreto de TSH (geralmente até 20 mUI/L),

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com T4 livre ainda dentro da faixa de normalidade. Deve-se suspeitar de insuficiência hipofisária
(hipotireoidismo central) em pacientes com níveis diminuídos de T4 livre associados a uma
concentração de TSH normal ou baixa.

Durante o diagnóstico, muitas vezes, é realizada a dosagem de anticorpos antitireoidianos:


antitireoperoxidase (anti-TPO, antes denominados antimicrossomais) e antitireoglobulina (anti-
TgAb). Quando estes estão presentes em altas concentrações no plasma, sobretudo o anti-TPO
(positiva em 80-100% dos casos de tireoidite de Hashimoto), reforça-se a possibilidade de tireoidite
autoimune. Esses parâmetros também possuem valor prognóstico considerável, sendo que, no
hipotireoidismo subclínico, quanto maior sua concentração plasmática, maior o risco de evoluir para
hipotireoidismo declarado.

A definição dos valores de referência (Tabela 1) ainda é um assunto de grande discussão. Mas sabe-
se que devem ser individualizados para populações específicas, incluindo as mulheres grávidas, com
valores diferentes para cada trimestre.

Tabela 1 - Resultados das provas de função tireoidiana no adulto


Hormônios
TSH T4 livre
Resultados
Valor de referência 0,4 - 4,5 mU/L 0,7 – 1,8

Hipotireoidismo primário

Hipotireoidismo central normal ou baixa


Fonte: adaptado de Dipiro et al. (2020).

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7 HIPERTIREOIDISMO E TIREOTOXICOSE

Tireotoxicose e hipertireoidismo são frequentemente utilizados como sinônimos, mas é importante


sabermos que há diferenças. A tireotoxicose é um termo mais amplo que se refere à manifestações
fisiológicas decorrentes de quantidades excessivas de hormônios tireoidianos na circulação corporal,
sejam elas decorrentes do dano à tireoide, hiperfunção glandular ou por ingesta de hormônios
tireoideanos. Porém, quando há hipersecreção sustentada de hormônios pela glândula tireoide, o
termo mais adequado é hipertireoidismo, que é uma doença com prevalência entre 0,2 a 1,3% em
diferentes partes do mundo. Sinais e sintomas de tireotoxicose afetam múltiplos sistemas orgânicos,
e, geralmente, apresentam-se prolongadamente antes que o diagnóstico seja realizado (Quadro 5).

Quadro 5 – Sinais e sintomas do hipertireoidismo


Sistema nervoso: tremor (mãos e língua projetada), reflexos tendinosos hiperativos.
Sistema cardiopulmonar: taquicardia em repouso, aumento da pressão de pulso e
sopro sistólico de ejeção.
Pele e anexos: pele quente, lisa e úmida, cabelo fino, onicólise (separação da ponta
Sinais
das unhas), ginecomastia em homens.
Visão: exoftalmia (apenas na doença de Graves), retardo da pálpebra.
Sistema musculoesquelético: mixedema pré-tibial (apenas na doença de Graves).
Tireoide: presença de tireomegalia (aumento do volume da glândula).
Sistema nervoso: nervosismo, ansiedade, labilidade emocional, anorexia, psicose,
coma.
Sistema cardiopulmonar: palpitações, fibrilação atrial (principalmente em idosos).
Sistema reprodutivo: distúrbios menstruais (fluxo escasso e irregular).
Sintomas
Sistema musculoesquelético: fadiga, fraqueza muscular proximal (percebido ao
subir escada e ficar em pé).
Sistema gastrintestinal: aumento dos movimentos intestinais.
Outros: intolerância ao calor.
Fonte: adaptado de Dipiro et al. (2020).

A B

Figura 2A - Paciente com onicólise e 2B - Paciente com exoftalmia (hipertireoidismo). Fonte: Talley & O’Connor (2018).

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A tireotoxicose pode decorrer do uso de medicamento com o hormônio tiroxina (levotiroxina). Além
disso, o medicamento amiodarona, um antiarrítmico, contém grandes quantidades de iodo e pode
levar a tireotoxicose em até 12% dos pacientes em regiões com baixa ingesta de iodo.

Diversos distúrbios também podem levar ao hipertireoidismo, como inflamações na glândula tireoide
(tireoidite), que geralmente são autoimunes ou pós-virais; e o bócio. Entretanto, a doença de Graves
é a causa de hipotiroidismo mais comum.

A doença de Graves caracteriza-se pela produção de um autoanticorco IgG específico para o receptor
de TSH. Esse anticorpo atua como agonista, ativando o receptor de TSH e, portanto, estimulando de
forma contínua a síntese e liberação de hormônios tireoideanos, sem ativação do feedback negativo.
Na doença de Graves, geralmente é identificado hipertireoidismo, aumento difuso da tireoide,
exoftalmia, e, menos comumente, mixedema pré-tibial (lesões cutâneas com aspecto de placas
brilhantes, vermelho-acastanhadas e rugosas na face anterolateral da perna).

PERGUNTAS AO PACIENTE COM SUSPEITA DE HIPERTIREOIDISMO

Legenda: ! - sintomas para um possível problema urgente ou perigoso.

1. Você tem histórico de problemas de tireoide?


2. Você tem histórico familiar de tireotoxicose? (caso na família de doença de Graves e
condições autoimunes associadas, como vitiligo, doença de Addison, anemia
perniciosa, diabetes tipo 1, miastenia gravis e insuficiência ovariana prematura)
3. Você já tomou amiodarona ou levotiroxina?
4. Você teve exposição recente ao iodo? (ex.: materiais de contraste iodados de raios-X
podem precipitar tireotoxicose, geralmente em pacientes com bócio multinodular
existente)
! Você já teve palpitações? (a tireotoxicose pode se manifestar com fibrilação atrial e
5.
insuficiência cardíaca)
6. Você notou insônia, irritabilidade ou hiperatividade?
7. Você teve perda de peso, diarreia ou aumento da frequência de fezes, aumento da
sudorese ou intolerância ao calor?
8. Você teve fraqueza muscular? (a fraqueza muscular proximal é comum, com sinais
como dificuldade para se levantar da cadeira, por exemplo)
9. Você já teve problemas nos olhos, como visão dupla, arenosidade, vermelhidão ou dor
atrás dos olhos?
Fonte: adaptado de Talley & O’Connor (2018).

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8 FARMACOTERAPIA DO HIPOTIREOIDISMO E HIPERTIREOIDISMO

O manejo clínico do hipotireoidismo e hipertireoidismo tem como objetivo melhorar a qualidade de


vida e reduzir os sinais e sintomas que ocasionam desconforto aos pacientes.

8.1 Farmacoterapia do hipotireoidismo


A levotiroxina sódica (L-tiroxina, T4) constitui o fármaco de escolha para reposição de hormônio
tiroidiano e terapia supressora, visto que é quimicamente estável e possui um custo relativamente
baixo. O objetivo do tratamento é normalizar as concentrações de hormônio, reduzir e aliviar os
sintomas, prevenir déficits neurológicos em recém-nascidos e crianças e reverter anormalidades
bioquímicas. Entretanto, é importante orientar o paciente quanto ao tempo na melhora dos
sintomas clínicos (pode levar 3-6 meses após a normalização do TSH) para não gerar falsas
expectativas no paciente.

Existe um extenso intervalo de doses de reposição, tornando necessário individualizar o tratamento


e efetuar o monitoramento adequado de TSH para determinar a dose adequada (Quadro 6).

Quadro 6 - Tratamento do hipotireoidismo


Parâmetros Parâmetros de
Apresentações Dose/posologia
de efetividade segurança
- Idade > 50 anos com
doença cardíaca: 12,5-
25 mcg/dia com
Reações adversas
incrementos graduais
comuns: palpitações,
de dose em intervalos Subjetivos:
alopecia, sudorese
LEVOTIROXINA 25 mcg de 4 a 6 semanas. Alívio dos
excessiva, perda de peso,
SÓDICA 50 mcg sintomas da
diarreia, ansiedade,
75 mcg - 50 mcg para demais doença.
® insônia.
Euthyrox 88 mcg pacientes.
(Merck) 100 mcg
Reações adversas graves:
Levoid® 112 mcg - Dose de manutenção Objetivos:
angina, arritmia, parada
(Aché) 125 mcg média para adultos: Manutenção
cardíaca, insuficiência
Puran®T4 150 mcg 125 mcg/dia. dos níveis de:
cardíaca, infarto agudo
(Sanofi) 175 mcg - TSH: 0,5 - 4,5
do miocárdio, dispneia,
Synthroid® 200 mcg - Reavaliar a cada 4-6 mU/L.
hipertireoidismo
(Abbott) semanas: ↑ ou ↓ em - T4 livre: 0,7 –
musculoesquelético
12,5-25 mcg/dia a cada 1,8 ng/dL.
(densidade mineral óssea
ajuste.
diminuída).
- Após ajuste, controle
anual.
Fonte: adaptado de Dipiro et al. (2020).

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As seguintes orientações devem ser fornecidas ao paciente quanto ao tratamento com levotiroxina:

 Ingerir o medicamento preferencialmente pela manhã, em jejum (aguardar pelo menos 30


minutos antes do café) e com água (1 copo pelo menos);
 Ingerir o medicamento 4 horas após alimento ou fármaco que interfere na sua absorção;
carbonato de cálcio, sulfato ferroso, hidróxido de alumínio e fibras, por exemplo, reduzem a
absorção da levotiroxina.

Sempre é importante reforçar essas orientações sobre o uso correto do medicamento, pois valores
aumentados de TSH podem ser consequência da não adesão ao tratamento ou de seu uso de forma
inadequada. Ademais, o uso de anticonvulsivantes, rifampicina e sertralina podem aumentar o
metabolismo da levotiroxina, reduzindo sua efetividade, devendo o manejo desse tipo de interação
ser individualizado. Caso os valores de TSH permaneçam elevados mesmo com o uso adequado e
após manejo de interação, é preciso reajustar a dose (Quadro 6).

8.2 Farmacoterapia do hipertireoidismo


Não há concordância de qual seja o tratamento ideal para tratar o hipertireoidismo. Normalmente, o
tratamento é planejado para impor restrições à secreção de hormônio pela glândula, seja com
medicamentos que inibem a síntese ou liberação hormonal, ou por meio da redução da quantidade
de tecido tireoidiano.

Os principais medicamentos usados no tratamento do hipertiroidismo são da classe das tionamidas,


como o tiamazol e o propiluracil. Esses agentes inibem a oxidação e ligação do iodeto tireoidiano,
levando a uma deficiência intratireoidiana de iodo, e reduzindo a disponibilidade de hormônios na
corrente sanguínea.

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Quadro 7 - Tratamento para hipertireoidismo na doença de Graves
Tratamento Dose/posologia Vantagens Desvantagens Monitoramento Comentários
Medicamentos antitireoidianos

 Efeitos adversos leves: rash, artralgia,


30-60 mg sintomas gastrointestinais, inflamação Primeira linha de tratamento para
Tiamazol 1 vez ao dia
Não invasivo (via oral). Baixa taxa de cura (40-50%)
da glândula salivar. crianças e adolescentes.
 Efeito adverso grave: agranulocitose.

 Via oral
 Baixo risco de  Tratamento inicial para casos graves
hipotireoidismo
Propiluracil
75-150 mg
permanente Adesão difícil  Artrite, lúpus, anemia aplásica, ou como preparação pré-operatória.
de 6/6 horas trombocitopenia, hepatite aguda.  Preferível na gestação e
 Possível remissão amamentação.
devido ao efeito
imune
Outros agentes
Exantema, febre, rinite, conjuntivite,
edema glândula salivares, ginecomastia,
Utilizado principalmente antes da
Consegue inibir a liberação de iodismo (gosto metálico e sensação de
Iodeto de Melhora dos sintomas cirurgia, para que o paciente entre em
120-400 mg hormônios por pouco tempo (1 queimação na boca e garganta,
potássio em até uma semana. um estado de produção normalizada de
a 2 semanas) hipersensibilidade nos dentes e gengivas,
hormônios da tireoide.
sintomas de resfriado, desconforto gástrico
e diarreia).

Propranolol: Manejo de alguns


 Não altera expressivamente
a produção/liberação Geralmente utilizado como terapia
20-80 mg/dia sintomas importantes:
β- hormonal. Frequência cardíaca, pressão arterial, adjuvante em conjunto com um agente
taquicardia, ansiedade,
bloqueadores Atenolol: tremor e intolerância  Não melhoram outros fadiga, cansaço, broncoespasmo. antitireoidiano ou na preparação para
sintomas de tireotoxicose cirurgia.
50-100 mg/dia ao calor.
periférica.

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Quadro 7 - Tratamento para hipertireoidismo na doença de Graves
Tratamento Dose/posologia Vantagens Desvantagens Monitoramento Comentários
 Hipotireoidismo
permanente.
 Pode haver piora na
Ablação oftalmopatia.
 Cura do

radioativa da
_______ hipertireoidismo.  Gravidez deve ser evitada Oftalmopatia em fumantes. É o melhor tratamento para nódulos
tireoide (iodo
 Baixo custo.
por 6-12 meses.  Hipotireoidismo secundário à ablação. tóxicos e bócio tóxico multinodular.
radiotivo - I¹³¹)  Não amamentar.
 Risco potencial pequeno de
exacerbação da
hipertireoidismo.

 Escolha potencial na gravidez (2º


trimestre) se efeitos adversos
 Rápido.  É o mais invasivo.
importantes aos medicamentos
 Tratamento efetivo  Hipotireoidismo
Cirurgia _______ especialmente em permanente.
Hipotireoidismo pós procedimento.  Complicações potenciais (dano ao
pacientes com bócio nervo laríngeo, hipoparatireoidismo)
multinodular.  Dor e cicatriz.
 Útil na coexistência de nódulo
suspeito
Fonte: adaptado de Dipiro et al. (2020).

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REFERÊNCIAS

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Metab., v. 57, n. 3, p. 193-204, 2013.

CFF. Conselho Federal de Farmácia. Prescrição farmacêutica no manejo de problemas de saúde


autolimitados: Semiologia farmacêutica e raciocínio clínico. Conselho Federal de Farmácia. Brasília –
DF, 2015. [Internet] [Acesso em 28/02/2021]. Disponível em:
http://www.cff.org.br/userfiles/Apostila%201(1).pdf.

DIB, A. S. et al. Arquivos brasileiros de endocrinologia e metabologia - Consensos em Tireoide. Arq


Bras Endocrinol Metab., v. 7, n. 3, p. 163-231, 2013.

DIPIRO, J. T. et al. Pharmacotherapy: A Pathophysiologic approach. 11ª edição. New York: McGraw-
Hill, 2020.

GOLAN, D.E. et al. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacologia. 3ª edição. Rio
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GUSSO, G.; LOPES, J. M. C.; DIAS, L. C. Tratado de Medicina de Família e Comunidade: princípios,
formação e prática. 2a edição. Porto Alegre: Artmed, 2018.

KRONENBERG, H. M. et al. Williams - Tratado de Endocrinologia. 11a edição. Saunders, 2016.

PORTO, C. C.; PORTO, A. L. Semiologia médica. 7ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

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physical diagnosis. 8ª edição. Sydney: Elsevier, 2018.

TAYLOR, P. N. et al. Global epidemiology of hyperthyroidism and hypothyroidism. Nature Reviews, v.


14, p. 301-316, 2018.

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