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Baleeiro
Cleber A. S. Baleeiro1
RESUMO
Para Vattimo secularização tem sentido de enfraquecimento do ser, o que
desfundamenta qualquer idéia de fundamentação. Secularização, para ele,
tem um sentido diferente do habitual, pois não é privatização da religião,
muito menos perda de plausibilidade. Ela tem origem na mensagem cris-
tã, a partir do anuncio da encarnação como kénosis, quando Deus se
encarna em Jesus destituindo-se de sua transcendência. A secularização
enquanto característica ontologia hermenêutica possibilita a total
pluralidade de interpretações, ademais, nela há um “limite” que possibi-
lita o diálogo, a caritas, o amor.
Palavras-chave: Gianni Vattimo – secularização – enfraquecimento –
religião – modernidade.
ABSTRACT
For Vattimo secularization has the meaning of impairment of the being that
take apart any idea of fundamental. Secularization has a different meaning
that we are used to, for it is not a religion privatization, neither the lost of
plausible things. It has origin in the Christian message, from the
announcement of the incarnation as kenosis, when God incarnates in Jesus
suspending from its transcendence. Being a hermeneutic ontological feature,
the secularization makes the diversities of interpretations possible, where
there is a limit that makes possible the dialogue, the carista, the love.
Keywords: Gianni Vattimo – secularization – impairment – religion –
modernity.
1
Mestre em ciências da religião pela UMESP.
Introdução
2
Este ensaio que compõe O fim da modernidade, de 1985, foi publicado origi-
nalmente em 1983, na Rivista di Estetica.
filosofia: afeta o ser mesmo que ‘se dá’ finalmente, na época do final da
metafísica, como aquele que se retrai e se desvanece” (VATTIMO, 1991,
p. 53). Sendo assim, a história da filosofia é filosofia da secularização
(VATTIMO, 1991, p. 52), ou seja, a rememoração que fazemos da história
do ser com o objetivo de interpretar somente o que dele se manifesta (suas
transmissões) deve ser sempre uma atitude secularizante.
Em outro ensaio intitulado A filosofia e o declínio do Ocidente,
que trata da dissolução da idéia de história como curso linear e, conse-
qüentemente, da descentralização do Ocidente – sempre tido como o
mais alto grau de evolução política, cultural, econômica, intelectual,
etc. – Vattimo (1999a, p. 48) interliga modernidade, cristianismo, Oci-
dente e secularização, para chegar à seguinte conclusão: “O Ocidente,
pode-se dizer, declina porque declinar constitui a sua vocação histórica.
Em outras palavras, a história, no único modo que o Ocidente consegue
concebê-la e vivê-la, é a história da secularização”. Para isso ele parte
da teoria weberiana do nexo entre ética cristã, capitalismo e racionali-
zação e diz que não se pode pensar em modernidade sem ter em mente
a herança cristã expressa nos dogmas e na ética. Em linhas gerais o que
Vattimo quer mostrar é que tanto a secularização como o Ocidente são
indissociáveis porque têm como origem a mesma modernidade que
nasceu da herança cristã.
De um ponto de vista bastante genérico, secularização tem em
Vattimo sentido de enfraquecimento, de perda das categorias fortes da
metafísica como radicalização de sua própria essência, isso ficou percep-
tível nos três ensaios. Esse enfraquecimento tem sua origem na história
da salvação, especificamente na kénosis como um esvaziamento de Deus.
Há, portanto, entre secularização e modernidade um nexo decorrente de
suas origens cristãs. Nesse sentido mais genérico é possível falar de
secularização da filosofia, de um pensamento que, superando a noção de
ser como presença, se compreende sempre como uma interpretação.
3
Pierucci (1998) afirma que a preferência de Weber seria pelo termo desencan-
tamento, no lugar de secularização. Na obra weberiana, secularização seria a
diminuição do status religioso, enquanto desencantamento seria um tipo de se-
cularização da religião, em que a magia deixaria de ser o meio de salvação,
dando lugar à ética.
aqui existe uma religião do livro que concentra toda a sua atenção sobre
o fenômeno da interpretação; mas porque esta religião tem como seu
fundamento a idéia da encarnação de Deus, que concebe como kénosis,
como abaixamento, e, traduzimos nós, como enfraquecimento”.
Se Vattimo compreende secularização como enfraquecimento, por
que continuar utilizando um termo tão genérico e polissêmico? Mesmo
diante do risco de empregar mal ou esvaziar seu conteúdo semântico
sua opção pelo termo secularização está no destaque que dá ao caráter
religioso do processo de dissolução da metafísica. “Secularização”
aponta para a herança cristã presente na ontologia hermenêutica pós-
metafísica, enquanto enfraquecimento não expressa a totalidade dessa
compreensão. Ele continua argumentando:
3. Kénosis e secularização
Para a filosofia, uma concepção de si própria como leitura dos sinais dos
tempos, sem que isso se reduza a puro registro passivo do curso dos tem-
pos, só parece ser possível à luz da doutrina cristã da encarnação do filho
de Deus. “À luz” da encarnação, mais uma vez, é uma expressão que pro-
cura entender uma relação cuja problematicidade irresolvida constitui o
próprio cerne da experiência da eventualidade: a encarnação de Deus, de
que aqui se trata, não é apenas um modo de expressar em termos míticos
o que a filosofia finalmente descobre como resultado de uma busca raci-
4. O limite: caritas
Referências bibliográficas
HICK, John. A metáfora do Deus encarnado. Petrópolis: Vozes, 2000.
PIEPER, Frederico. A vocação niilista da hermenêutica: Gianni Vattimo e
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Metodista de São Paulo. São Bernardo do Campo, 2007. (Tese de Doutorado
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______. Secularização em Max Weber: Da contemporânea serventia de voltar-
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SCOPINHO, Sávio Carlos Desan. Filosofia e sociedade pós-moderna: Crítica
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2001.