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RESUMO: E. EVANS-PRITCHARD, Edward.

“Apêndice IV: Algumas Reminiscências e


Reflexões sobre o Trabalho de Campo”. In: Bruxaria, Oráculo e Magia entre os Azande. Rio de
Janeiro: Zahar. (1976). (pp. 298-314)

Por Ewerton Tuma (PPGA-UFPA) em 01/04/2022

Como citar: TUMA-MARTINS, Ewerton D. Resumo do “Apêndice IV: Algumas Reminiscências e


Reflexões sobre o Trabalho de Campo”. In: Bruxaria, Oráculo e Magia entre os Azande. Rio de
Janeiro: Zahar. (1976). (pp. 298-314), in https://pt.scribd.com/, postado em 29/03/2023.

A obra Bruxaria, oráculos e magia entre os Azande, do antropólogo britânico Edward Evan Evans-
Pritchard (1902-1973), teve sua primeira publicação em 1937, traduzida pelo também antropólogo
Eduardo Viveiros de Castro na década de setenta, é o resultado de vinte meses de trabalho de
campo, realizado entre 1926 e 1929 junto aos povos Azande na África Central. Esta etnografia teve
como foco os costumes mágicos e de crenças religiosas dos Azande. No apêndice IV da Obra,
destinado à análise discente, o autor nos demonstrará como seu trabalho de campo foi desenvolvido
e como ele pode nos ajudar, mesmo nos dias de hoje, a nos posicionar ante a incursão em
determinadas realidades étnicas/outras.

Para iniciarmos esta análise, seguiremos a ordem da escrita de Pritchard, onde o autor aponta que
sobre como se comportar em seu futuro trabalho de campo com os Azande, mesmo indagando com
antecessores como Haddon, Seligman, Flinders Petrie e Malinowski, não existe uma resposta
determinante neste fazer1, pois muito dependerá de diversos fatores que vão desde o próprio
pesquisador e suas várias condições, até o contexto dos acontecimentos locais e outros que possam
influenciar de alguma forma este trabalho e ainda os costumes da sociedade estudada.

Nesta passagem ao menos uma orientação é bastante exata, não se pode ir a campo sem ao menos
ter feito um estudo teórico “rigoroso”. Para ir a campo, os seus objetivos devem estar muito bem
definidos quanto à coleta de dados. Fazer a relação do seu trabalho de pesquisa com base em outros
autores, mesmo que em outras sociedades, pode ajudar a desenvolver melhor a pesquisa. O autor
ainda aponta o fato de que nossas próprias condições como seres humanos (ideias, conceitos e
vivências próprias) vão influenciar no que “se traz de um trabalho de campo”. Desvela-se aí então
que no processo que engloba o todo deste fazer antropológico, a tarefa mais árdua e decisiva não é o
campo em si, mas sim o retorno desse e o momento de escrever sobre as informações que foram
trazidas.

O Dr. Pritchard, sobre conhecer os costumes dos Azande no sentido de se desenvolver uma
“observação participante”, decide então que o melhor a se fazer é realmente participar das
atividades laborais dos mesmos. Para mim, como morador de uma região de Unidade de
Conservação, foi inevitável fazer uma associação com a minha experiência de morar em uma
comunidade tradicional e por muitas vezes desenvolver atividades com as pessoas da comunidade
como a pesca de escora na praia, pesca de linha de mão no mangal, extração de sarnambi, turu entre
outras. Atividades que me serviriam posteriormente para desenvolver meu pré-projeto de pesquisa
para o mestrado.

1
Malinowski disse a Pritchard “não seja um completo idiota”.
Mesmo que quase que inconscientemente e por uma questão de me colocar numa posição de não
nascido na comunidade, durante minhas incursões laborais locais, mantive o que o Dr. Pritchard
apontou como importante, que é o “manter distância”. Esta atitude se torna essencial, pois no final
de todo o processo, “seremos nós mesmos e nada mais”. E, ainda, sobre a questão “objeto de
estudo”, o autor nos situa quanto ao fato de que devemos nos despir de nossas crenças (no caso dos
Azande) para melhor versar sobre o entendimento daquilo que é do outro. Não é “minha crença” em
oposição à “crença do outro”, mas o meu olhar de pesquisador colhendo informações a respeito
daquilo que não é comum a minha realidade.

Sobre a relação do pesquisador e as regras (por assim dizer) de uma determinada sociedade, o Dr.
Pritchard elucida o fato de que na sua experiência na África Central, no que diz respeito as suas
conversas com os nativos, sua presença entre as mulheres Azande, se desenvolveu sem nenhum tipo
de objeção, porém se o mesmo fosse feito por um nativo “não parente”, uma confusão
generalizada poderia se desencadear. Isso demonstra que por parte dos Azandes, apesar do convívio
do autor e mesmo a participação dele nas atividades laborais, o Dr. Pritchard ainda era o “outro”,
um ser a parte das regras locais. Para os dias de hoje, isso nos deixa a dica importante de buscar um
conhecer prévio sobre as regras, posicionamentos e costumes locais, para que possamos melhor ser
aceitos no meio que pretendemos entrar/estar.

A partir deste ponto para o final do Apêndice IV, o autor vai versar sobre as várias dificuldades do
trabalho de campo. Ele aponta o cuidado quanto às visões de técnicos agrícolas, por exemplo,
estrangeiros dando informações sobre a agricultura Azande, onde a informação poderia ser muito
divergente se vinda de um próprio agricultor Azande que é o detentor da informação mais acertada.
Em seguida o autor fala sobre o status da Antropologia na época, num contexto de questões
políticas onde a Antropologia era vista de forma negativa e hostilizada por parecer fazer prevalecer
em seus estudos a sua superioridade ante aos povos estudados, os rebaixando a categoria de “povos
inferiores”.

Ademais o autor fala sobre a necessidade de tempo estendido de pesquisa de campo e termina com
a ideia de que não há uma receita mágica para se entender as pessoas, já que é isso que a
antropologia faz, e que muito dependerá da capacidade de sociabilidade do antropólogo em saber
estar e conviver com elas. O questionamento do Dr. Pritchard se estende ainda as outras produções
da época onde vigoravam o distanciamento dos povos estudados. Numa clara alusão a Malinowski,
estas outras produções eram desprovidas de “carne e sangue”, o que compõe o levantamento das
informações referentes aos hábitos e a vida cotidiana do objeto estudado. O autor assume então uma
contraposição a estes tipos de produção, aceitando para si a “pecha”, a falha, a tida imperfeição,
porém mantendo sua posição mesmo correndo o risco de ser taxado como um “romantizador” em
seu fazer antropológico por estreitar seus laços sociais com os Azande.

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