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Darwin
Darwin ― o criador da teoria da evolução ― é considerado o mais
brilhante pensador em toda história da ciência, acima de Newton e Einstein.
Vamos conhecer um pouco de sua história.
Nasceu em 12 de fevereiro de 1809. Desde criança, interessava-se
pela natureza, gostava de fazer longos passeios pelos campos das
cercanias e recolher conchas, ovos de aves, rochas, minérios e insetos para
suas coleções. Aos 16 anos foi mandado para faculdade de medicina da
Universidade de Edimburgo na Escócia, onde estudaram seu avô paterno
(Erasmus) e seu pai (Robert). Mas depois de assistir a uma operação
particularmente medonha em uma criança — que foi amarrada e cortada a
frio pois a anestesia ainda não havia sido inventada — Darwin fugiu no meio
da aula e nunca mais voltou a uma sala de cirurgia.
Não demorou muito, seu pai percebendo que o filho não tinha
vocação para médico, decidiu que ele entraria para a igreja anglicana para
levar uma vida respeitável. Darwin ficou satisfeito com a decisão, pois a vida
de clérigo rural lhe permitiria muitas horas de folga para se dedicar à história
natural. Na época, muitos cientistas eram clérigos, pois a ciência ainda era
atividade essencialmente amadora que exigia grande disponibilidade de
tempo, incomum à maioria das outras profissões.
Enquanto estudava para clérigo no Christ’s College em Cambridge,
Darwin conheceu dois clérigos-cientistas, o botânico John Stevens Henslow
e o geólogo Adam Sedgwick. Darwin passava tanto tempo acompanhando
as expedições científicas de Henslow pelos campos de Cambridge que
passou a ser conhecido como “o homem que anda com Henslow”.
Em 1831, aos 22 anos Darwin se formou e parecia pronto a ingressar
na plácida vida de clérigo do interior quando, em 29 de agosto, recebeu
uma carta. Henslow contava que o navio da marinha britânica Beagle seria
enviado para América do Sul para fazer levantamentos cartográficos
costeiros. Retornaria à Inglaterra dando a volta ao mundo pelos oceanos
Pacífico e Índico. O capitão do navio, Robert FitzRoy, de 26 anos, queria
alguém culto e bem-nascido para lhe fazer companhia durante os três anos
previstos para a viagem, pois a etiqueta naval impedia qualquer contato
social do capitão com os oficiais e a tripulação. Henslow recomendara
Darwin e perguntava se ele estaria interessado. Era uma excelente
oportunidade para o estudo de história natural mundo afora.
A viagem era perigosa e dispendiosa. Além de se sujeitar a morrer no
mar ou de doenças tropicais ― o que, na época, era comum ―, Darwin
ainda teria de pagar por seu equipamento científico e refeições. A princípio,
o pai não concordou, mas acabou dando o consentimento e dinheiro para
viagem.
Há quem se refira a Darwin como o naturalista do Beagle, mas na
verdade, ele não tinha qualquer cargo oficial na expedição, era apenas um
passageiro embarcado por capricho do capitão que queria companhia. Essa
situação mostra como a ciência no início do século XIX era, em grande
medida, apenas um passatempo de cavalheiros ricos.
O Beagle zarpou em 27 de dezembro de 1831. Passou quatro meses
no Brasil, parando em Salvador e no Rio de Janeiro. Darwin extasiou-se
com a profusão de vida vegetal e animal da mata atlântica. Numa única
caminhada matinal ele abateu 80 espécies distintas de aves e, em outro dia,
capturou 68 espécies de besouros. O Beagle costeou o litoral atlântico e
pacífico sul-americanos para completar o levantamento cartográfico da
região ― sua principal missão. Em todas as paradas Darwin fazia incursões
terrestres de pesquisa e escrevia entusiasmado para família e para
Henslow, para quem também mandava amostras de espécimes
encontrados.
Para se preparar para a longa viagem de volta, rumo oeste, o navio
ficou um mês estacionado no arquipélago de Galápagos, em setembro-
outubro de 1835, onde Darwin encontraria a chave para desvendar a
evolução das espécies.
Na volta o Beagle passou pelo Taiti, Austrália, Nova Zelândia e
novamente em Salvador na Bahia e, em 2 de outubro de 1836, depois de
quase cinco anos de viagem, aportou em Falmouth na costa da Inglaterra,
onde Darwin desembarcou com um diário de 770 páginas, volumosos
cadernos de anotações de geologia e zoologia e milhares de espécies de
aves, plantas, insetos e rochas.
As cartas, fósseis e espécies que Darwin enviara durante a viagem
haviam causado sensação entre os cientistas próximos a Henslow. Charles
Lyell, um geólogo famoso, ficara tão impressionado que patrocinou a
imediata admissão de Darwin na Sociedade Geológica de Londres.
O pai de Darwin era rico. Ao perceber que o filho encontrara sua
verdadeira vocação e que jamais seria um clérigo, destinou-lhe uma renda
satisfatória para que ele pudesse se dedicar integralmente à história natural.
Nos dez anos seguintes Darwin se casou com sua prima Emma
Wedgwood ― em janeiro de 1839 ― teve filhos e publicou um relato de
viagem, cinco livros de zoologia e três de geologia baseados no material e
nas observações que trouxe da viagem no Beagle. Mas sua grande obra
sobre a Origem das Espécies começou a ser desenvolvida privadamente
em 1837.
Nessa época, a população e a imensa maioria dos cientistas
acreditava no que hoje chamamos de criacionismo, ou seja, que Deus criou
o mundo em seis dias, inclusive o homem e todas as espécies que existem,
tal e qual as conhecemos no presente. Mas já havia inquietude quanto ao
criacionismo em alguns círculos científicos o que, certamente, era do
conhecimento de Darwin. Semelhanças de fósseis de espécies extintas com
espécies existentes indicavam a possibilidade de algum processo de
evolução. Também a existência de órgãos rudimentares, aparentemente
inúteis, como as azas pequenas de aves que não voam ― como o avestruz
― ou ossos de pernas encontrados no interior de certas serpentes
prenunciavam que estas espécies descendiam de espécies ancestrais que
haviam usado asas para voar e pernas para andar.
Em maio de 1837, o ornitólogo John Gould, que classificava aves
para Darwin, disse algo de que ele ainda não havia se dado conta: dentre
os pássaros recolhidos no arquipélago de Galápagos havia treze variedades
diferentes de tentilhão.
Resgatando anotações e memórias suas e de outros tripulantes que o
ajudaram a capturar os pássaros Darwin concluiu que cada variedade
habitava uma ilha ou um ecossistema próprio: uma variedade tinha o bico
curto e grosso para quebrar sementes, outra tinha bico estreito e curvo para
arrancar insetos de cactos e assim por diante. Provavelmente, todas
descendiam de uma única variedade que imigrara do continente sul-
americano. Darwin começou a se convencer de que as espécies, de alguma
forma, evoluíam, se adaptando ao ambiente. Em julho de 1837, quatro
meses depois de seu encontro com Gould, Darwin iniciou seu primeiro
caderno sobre a evolução.
Em busca de confirmação para hipótese da mutação das espécies,
durante anos a fio, Darwin recolheu uma montanha de dados sobre
variedades e espécies, estudando incontáveis publicações científicas e
correspondendo-se com cientistas e criadores de animais no mundo todo.
Ele próprio tornou-se um criador de pombos para acompanhar mais de
perto o fenômeno da transmissão hereditária de características. Se em
alguns anos, os criadores eram capazes de produzir uma variedade nova de
animal, em milhares de anos, uma variedade poderia se diferenciar tanto,
que se tornaria uma nova espécie. Os criadores, porém, forçam as
mutações que desejam, selecionando para cruza apenas os animais com as
qualidades desejadas. E na natureza, como se dariam as mutações?
Darwin ainda não tinha uma pista de como isso aconteceria.
E a pista surgiu por acaso. No outono de 1838, Darwin leu, “por
diversão” Ensaio sobre a População, um livro de 1798 do clérigo-
economista Thomas Malthus. Ele ressaltava que quase todas as espécies
produzem descendentes em número maior do que os que terão condições
de sobreviver, fato que os naturalistas já sabiam. A maioria desses
descendentes morre antes de conseguir se reproduzir; se assim não fosse,
a Terra logo estaria coberta por muitas camadas de tênia ― o verme
popularmente conhecido como solitária ― que pode chegar a 10 m. de
comprimento e que põe anualmente 60 milhões de ovos. Malthus
argumentou que as populações crescem mais rapidamente do que seu
estoque de alimento. O que contém o crescimento populacional na natureza
é a luta pelos meios de sobrevivência escassos, na qual, muitos perecem
prematuramente. Malthus era um estudioso da pobreza contrário às
políticas assistencialistas de governo. Ele defendia que sem controle de
natalidade, essas políticas apenas encorajariam os pobres a ter mais filhos,
tornando suas vidas ainda mais miseráveis e violentas.
Embora o argumento de Malthus, aplicado ao ser humano, fosse
impiedoso, Darwin percebeu imediatamente que ele se aplicava com
perfeição ao mundo das plantas e animais. Combinando a idéia da
competição pela vida, com o fato de que alguns indivíduos nascem com
variações que podem lhes dar alguma vantagem competitiva, Darwin
formulou o conceito da seleção natural, a força da natureza que ele
procurava.
Falando em linguagem moderna, as características hereditárias de
um ser vivo se transmitem pelos genes. Porém o processo de cópia
genética que acontece na concepção nem sempre é perfeito. Um erro no
processo de cópia pode gerar um gene inédito na espécie, que não estava
no pai, nem na mãe. Quanto mais vantagem competitiva esse gene der ao
indivíduo, mais chances ele terá de sobreviver, gerar filhos e passar este
gene adiante, dando origem a uma variação de sua espécie. Em milhões de
anos, inúmeras variações acumuladas podem dar origem à outra espécie,
muito diferente da inicial. Em contrapartida, genes desfavoráveis à
sobrevivência e procriação desaparecem com a morte de sujeitos que não
deixam descendentes.
Em 1842 Darwin escreveu um resumo de 35 páginas sobre evolução
e seleção natural. Em 1844 elaborou uma versão mais detalhada com 231
páginas. Mas teve medo de publicar as conclusões. A idéia da evolução das
espécies através de um mecanismo simples como a seleção natural, além
de contradizer a história da Criação relatada na Bíblia, evocava a idéia de
que a existência de Deus não poderia mais ser considerada necessária ou
inquestionável.
Em 1844 foi publicado anonimamente um livro chamado Vestígios da
Criação afirmando que todas as espécies de seres vivos eram aparentadas
entre si e que, juntamente com o universo, evoluíram segundo leis naturais.
O texto não explicava como nem porque a evolução ocorria. Cientistas e
Igreja cobriram o livro de insultos, dando a Darwin a certeza de que tinha
um tema explosivo nas mãos. Para postergar o inevitável confronto com a
Igreja e a sociedade vitoriana, Darwin, que já era um cientista famoso,
convenceu-se de que precisava de ainda mais respeitabilidade científica
antes de publicar seu trabalho. E dedicou os oito anos seguintes a estudar
as cracas ― aquele crustáceo que adere às pedras e cascos dos barcos.
Em 1853 Darwin recebeu uma medalha da Royal Society por suas
contribuições a história natural e, em 1855, depois de nove anos de
pesquisa, publicou quatro grossos volumes sobre espécies vivas e fósseis
de cracas. Foi imediatamente aclamado como a maior autoridade mundial
no assunto. Até hoje, seus livros são considerados obras-primas. Nem
assim, ele se decidiu publicar suas descobertas sobre evolução e seleção
natural.
Em junho de 1858 Darwin recebeu do biólogo Wallace — Alfred
Russel Wallace (1823-1913) — um pacote vindo das Ilhas Molucas na
Indonésia com o original de um artigo que resumia elegantemente boa parte
da teoria da seleção natural em que Darwin vinha trabalhando há vinte
anos. Wallace queria a opinião de Darwin sobre a teoria da seleção natural
que desenvolvera inspirado pela leitura de Vestígios da Criação e
fundamentada no Ensaio sobre a População de Malthus e na observação de
milhares de espécies em mais de 10 anos de expedições pela Amazônia,
Indonésia e Malásia.
Darwin não podia permitir que Wallace publicasse o artigo e lhe
tomasse o lugar na história, nem podia publicar sua teoria, ignorando o
artigo que Wallace lhe enviou. A solução encontrada por sugestão de seus
amigos, o consagrado geólogo Charles Lyell e o botânico Joseph Dalton
Hooker, foi apresentar a teoria Darwin-Wallace no encontro de julho de
1858 da Sociedade Lineana, uma associação londrina de história natural.
Preocupado com uma filha doente e com as repercussões do
trabalho, Darwin não compareceu ao encontro. Wallace, em excursão pelas
selvas da Indonésia, nem foi comunicado ― embora, posteriormente, tenha
aprovado a solução. A apresentação ficou a cargo do secretário da
sociedade e consistiu na leitura de partes do texto que Darwin escrevera em
1844, parte de uma carta que Darwin escrevera sobre o assunto para o
botânico americano Asa Gray em 1857 e o ensaio recém escrito por
Wallace. Finalmente, a seleção natural foi exposta ao mundo, oficialmente
como de Darwin e Wallace, mas as datas do material apresentado não
deixavam dúvida sobre a primazia da descoberta de Darwin.
Em novembro de 1859, Darwin publicou sua obra-prima sob o título
de A Origem das Espécies — On the origin of species by means of natural
selection, no original. O livro foi um sucesso. A polêmica instalou-se.
Darwin foi defendido por poucos e execrado por muitos. Em grande parte,
Darwin ficou afastado do público durante o furor em torno da evolução,
embora se mantivesse informado por seus colegas.
Darwin ainda escreveria mais de uma dezena de livros sobre plantas,
insetos e minhocas antes de falecer em 19 de abril de 1882. Esperava ser
enterrado no vilarejo de Down House, onde viveu os últimos quarenta anos
de sua vida, mas seus amigos cientistas persuadiram a família de que ele
deveria ser enterrado na abadia de Westminster, em Londres, junto aos
grandes heróis da pátria. Sua fama era tal que bispos e governo não
ousaram se opor a ideia já encampada pela imprensa. E assim, aquele que
fora vilipendiado pela maioria dos religiosos foi enterrado no coração da
Igreja anglicana, em concorrida solenidade pública, acompanhada por
autoridades, amigos, colegas e populares portadores de ingresso.
A Psicologia Evolucionista