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mostra de artigos Williane Tibúrcio Facundes (org.

CIÊNCIAS JURÍDICAS
na Amazônia Sul-Ocidental

EAC
Editor
Copyright © by autoras, 2023.
All rigths reserved.

Todos os direitos desta edição pertencem aos autores. Nenhuma


parte desse livro poderá ser reproduzida por qualquer
meio ou forma sem a autorização prévia da organizadora pelo e-mail
<willitiburcio@gmail.com>. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo art. 184 do Código Pe-
nal. As informações contidas em cada capítulo são de inteira respon-
sabilidade dos autores, bem como a ortografia deles.

EDITOR GERAL,
CAPISTA E DIAGRAMADOR
Eduardo de Araújo Carneiro
eac.editor@gmail.com

CONSELHO EDITORIAL DA OBRA


Dr. Eduardo de Araújo Carneiro
Dr. Elyson Ferreira de Souza
Esp. Arthur Braga de Souza
Esp. Ícaro Maia Chaim

E-BOOK

F143c FACUNDES, Williane Tibúrcio (Org.).


Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental: mostra de
artigos / Williane Tibúrcio Facundes (organizadora). – 1.
ed. – Rio Branco: EAC Editor, 2023. 185 p.; il. 14,8x21
cm. Tomo I; V.2.
ISBN: 978-65-00-67222-0
1. Ciências Jurídicas; 2. Direito; 3. Amazônia ; I. Título.
CDD 340.07
SUMARIO

APRESENTAÇÃO 05
Arthur Braga de Souza

1. O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO NA “ERA 07


DIGITAL”
Samara Leite Fonseca e
Williane Tibúrcio Facundes

2. INQUÉRITO POLICIAL SIGILOSO 43


Aldenor Lucas Barbosa Albuquerque e
Williane Tibúrcio Facundes

3. ABUSO SEXUAL INFANTIL NO ÂMBITO FAMI- 77


LIAR
Tailine Vieira da Cruz
Williane Tibúrcio Facundes

4. TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS DE ESTIMA- 115


ÇÃO: A PROTEÇÃO JURÍDICA DOS ANIMAIS DE
ESTIMAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO
Jéssica Texeira Ramos
Williane Tibúrcio Facundes

5. A POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO POR 154


DANOS MORAIS EM RAZÃO DA INFIDELIDADE
NO MATRIMÔNIO E UNIÃO ESTÁVEL
Robério Costa de Araújo
Williane Tibúrcio Facundes
“A justiça não consiste em ser neutro en-

tre o certo e o errado, mas em descobrir o

certo e sustentá-lo, onde quer que ele se

encontre, contra o errado".

Theodore Roosevelt
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

APRESENTAÇÃO

A presente obra reúne 05 (cinco) artigos redigidos por


concludentes do Curso de Direito do Centro Universitário UNI-
NORTE, sob a coordenação e coautoria da Professora Espe-
cialista Williane Tibúrcio Facundes. Eles abordam relevantes
temas jurídicos, a saber, o acesso à justiça, o inquérito policial,
a proteção aos animais, os crimes contra a dignidade sexual e
a possibilidade de condenação por danos morais em razão da
infidelidade no matrimônio e na união estável.
De início, é tratada a temática dos crimes contra a dig-
nidade sexual contra crianças e adolescentes, diante do triste
cenário brasileiro em que grande parte do ilícitos é praticada
no lar e por pessoas próximas às vítimas.
Segue tratando do inquérito policial a importância do si-
gilo nesta peça inaugural, sem olvidar das prerrogativas do in-
vestigado de constituir defesa, já nesta fase administrativa e
acessar os dados ali juntados.
Depois, trata do acesso ao Poder Judiciário na era digi-
tal, considerando os desafios que cercam uma parcela da po-
pulação que mais carece de acesso aos serviços judiciários e,
algumas vezes, não tem acesso à internet.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Prossegue abordando o tema da proteção constitucio-


nal aos animais, tema atual e caro à sociedade, porque a
busca pelo reconhecimento de direitos aos animais marca a
atual trajetória de muito doutrinadores e legisladores.
Ao fim, discorre sobre a possibilidade de condenação,
na obrigação de pagar danos morais, em caso de infidelidade
no casamento ou na união estável, promovendo reflexões so-
bre a responsabilidade civil aplicada a estes casos.
Estamos diante de uma obra coletiva e plural, que de-
bate temas interessantes à sociedade e, sem esgotar os as-
suntos, promove reflexões a respeito de situações vivenciadas
diariamente em nosso corpo social. Daí se extrai a sua rele-
vância.

Prof. Esp. Arthur Braga de Souza


Graduado em Direito pelo Centro Universitário Uni-
norte. Pós-Graduado em Direito Processual Civil
pela Universidade Cândido Mendes. Servidor Pú-
blico Federal do TRF da 1ª Região. Professor Uni-
versitário no Centro Universitário Uninorte.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1
O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO NA “ERA DIGITAL”

ACCESS TO THE JUDICIARY IN THE “DIGITAL AGE”

Samara Leite Fonseca1

Williane Tibúrcio Facundes2

FONSECA, Samara Leite. O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO


NA “ERA DIGITAL”. Trabalho de Conclusão de Curso de gradu-
ação em Direito - Centro Universitário UNINORTE, Rio Branco,
2023.

1 Discente do 9º período do curso de bacharelado em Direito pelo


Centro Universitário Uninorte.
2 Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduada em Direito

pela U: Verse. Graduada em Letras Vernáculas pela Universidade


Federal do Acre-UFAC. Especialista em Psicopedagogia pela Uni-
versidade Varzeagrandense.
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Antes de tudo é preciso evidenciar o teor do presente estudo,


isso é, trazer à tona melhores considerações a respeito do
Poder Judiciário em um novo âmbito e como este se portará
perante as mudanças e novas tecnologias, ao ponto de
abranger todos aqueles que anseiam por justiça. Assim, fora
feito um estudo detalhado sob os conteúdos que abordam o
tema, desde conceitos genéricos aos mais específicos, bem
como, análises não só históricas, mas sociais com dados
recentes de pesquisas oficiais. Também houve busca em
artigos científicos, livros doutrinários, leis, jurisprudências e
outros meios que abordassem o tema aqui estudado. Do
exposto, mediante Lei Magna, Doutrinadores Renomados e
demais conteúdos reunidos, fora concluído o entendimento de
que o acesso ao Poder Judiciário é um direito fundamental,
que de maneira algum pode ser tolhido daqueles que o devem
exercer instantaneamente.

Palavras-chave: Poder Judiciário; acesso; direito


fundamental; tecnologias; pandemia.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

First of all, it is necessary to highlight the content of the present


study, that is, to bring out better considerations about the
Judiciary in a new context and how it will behave in the face of
changes and new technologies, to the point of covering all
those who yearn for justice. Thus, a detailed study was carried
out on the contents that address the subject, from generic to
more specific concepts, as well as not only historical but also
social analyzes with recent data from official research. There
was also a search in scientific articles, doctrinal books, laws,
jurisprudence and other means that addressed the topic
studied here. From the above, through the Magna
Law,Lecturers and other contents gathered, the understanding
was concluded that access to the Judiciary is a fundamental
right that in no way can be hampered by those who must
exercise it instantly.Keywords: Anticrime Project. Criminal non-
persecution agreement. Confession.

Keywords: Judiciary; access; fundamental right; technologies;


pandemic.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

A partir do momento em que uma novidade jurídica


surge, de imediato traz consigo brechas para debates,
dúvidas e questionamentos a respeito de tal,
consequentemente, elevando a importância do estudo deste
tema o tornando relevante para contexto social e o colocando
em pauta de estudos específicos como este.
É bem verdade que com uma breve análise dos
primeiros artigos da Constituição Federal é possível tomar
para si que há certa clareza quando esta diz que todos os
indivíduos são iguais perante a Lei, sem distinção de
qualquer natureza.
Desse modo, o objetivo principal desse estudo é
analisar o acesso ao Poder Judiciário em uma nova era
digital, com as suas características e particularidades, assim
como, averiguar a sua eficácia perante todos aqueles que
anseiam por esse acesso ao avaliar a eficácia dos novos
métodos adquiridos pelo Poder Judiciário.
Em ato contínuo a evidenciação das consequências
de um acesso dificultoso ou até mesmo ineficaz à um serviço
essencial, também se torna pauta, pois, a partir do momento
em que o próprio sistema obstaculiza o acesso de um
cidadão à um direito que lhe é garantido por Lei Maior,
10 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

instantaneamente a Constituição Federal está sendo ferida.


Sem mais, é um estudo que visa a comprovação da
eficácia dos serviços prestados pelo Judiciário, para que
assim haja uma execução por excelência desse órgão,
portanto, dentre as linhas e entrelinhas desse artigo o
propósito primordial será apresentar um estudo claro e coeso
a respeito do Poder Judiciário dentro de um âmbito digital e
como seu comportamento se deu perante tantas mudanças.

1.1 AS PARTICULARIDADES DO PODER JUDICIÁRIO NO


ÂMBITO DIGITAL

Nesse momento, é preciso analisar com acuidade as


particularidades do Poder Judiciário inserido na esfera e
campo digital e como este se esforçou para se adequar e an-
dar em conformidade com o progresso da modernização, pois,
de modo igual aos demais órgãos, instituições etc. o Poder
Judiciário também se rendeu aos encantos digitais tornando-
se adepto às ferramentas tecnológicas.
A referida adequação já era algo previsto há um tempo,
afinal, essa modernização é algo natural que com o decorrer
dos avanços tecnológicos e demais situações e fatores super-
venientes é inevitável que se suceda.
Não se pode perder de vista a quarentena decretada

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em solo brasileiro dentre o ano de 2020, ocasionada pelo co-


ronavírus (COVID-19), seja, uma doença infecciosa causada
pelo vírus SARS-CoV-2, que conforme o Ministério da Saúde
- Governo Federal do Brasil acometeu cerca de 34.815.258 de
pessoas, acumulando exatas 687.962 mortes pelo contato
com o vírus no Brasil.
Fatalidade, a qual, desencadeou e alavancou o amol-
damento da prestação dos serviços judiciários para a modali-
dade digital, quando, este órgão se viu impossibilitado de for-
necer seus serviços presencialmente por conta de todo caos
implantado pela chegada de um novo vírus, impossibilitando
que os litigantes e partes envolvidas no processo participas-
sem presencialmente dos demais atos do litigio, nesse ínterim,
a rendição e consequente adequação às ferramentas digitais
fora medida necessária naquele período.
Importante ressaltar que para Margareth Vetis Zaga-
nelli, Adrielly Pinto dos Reis e Bruna Velloso Parente, autores
do artigo científico com tema: “A Aplicabilidade Do “Online Dis-
pute Resolution” (Odr) No Sistema Jurídico Brasileiro: A Reso-
lução De Conflitos Pelo Poder Judiciário Em Meio Digital E Os
Seus Reflexos Durante O Isolamento Social”, com a chegada
da pandemia mundial ocasionada pelo coronavírus (COVID-
19), surgiu consigo a necessidade da adequação de novos
meios capazes de sanar os conflitos jurídicos que o isolamento

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

trouxe para o Poder Judiciário, seja, a utilização de novos ins-


trumentos advindos dos avanços tecnológicos.

1.1.1 A PANDEMIA E O PODER JUDICIÁRIO

Por meados de março de 2020 o cenário mundial fora


repentinamente transtornado com o surgimento do novo coro-
navírus (COVID-19), que trouxe consigo uma das maiores cri-
ses existentes em todos os países afetados pelo vírus, ao im-
plantar imensurável caos nas regiões em que vírus se espa-
lhou, incluindo, o Brasil.
O dano ocasionado pelo vírus fora tanto que a Organi-
zação Mundial da Saúde – OMS declarou a situação de pan-
demia em relação ao coronavírus (COVID-19), quando, a qua-
rentena e isolamento social fora medida necessária para que
diminuísse ao máximo a proliferação do novo vírus que até
então não havia outro método de prevenção.
Por consequência, aos poucos as escolas e universida-
des foram se fechando, assim como, os comércios locais e to-
dos aqueles serviços que não eram considerados essenciais,
onde, naturalmente apenas as farmácias e supermercados
permaneceram com as suas portas abertas ao público, isso,
desde que cumprida as medidas de segurança impostas pela
OMS.

13 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Além disso, outras áreas além da saúde foram afetadas


pela situação, seja, a economia quando a atividade empresa-
rial teve uma baixa drástica nesse período pandêmico gerando
reduções salariais e desemprego, não deixando de lado o Po-
der Judiciário que assim como os outros órgãos também foi
abalado pela crise ocasionada pelo coronavírus (COVID-19).
Considerando todo o caos vivenciado, fora necessária
a adequação nas prestações de serviço, assim como, no sis-
tema educacional, os quais, aderiram o home office e o ho-
meschooling, em situação semelhante o Poder Judiciário não
viu uma alternativa a não ser se render à modernização na
prestação de seus serviços e passar a atender virtualmente,
realizar audiências online etc.
Portanto, é possível associar a modernização dos ser-
viços judiciários ao momento pandêmico que fora o grande im-
pulsionador para tal evolução tecnológica, que obrigou o Po-
der Judiciário a se adequar à nova realidade e aderir novas
ferramentas para que a prestação de seu serviço continuasse
sendo oferecida aos cidadãos que naquele momento estavam
impossibilitados de deixarem as suas residências por motivos
de força maior.
Nesse momento, a frase “a justiça não pode parar” é
levada bem a sério quando fica evidente o esforço do Poder
Judiciário em tomar as medidas necessárias para garantir a

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

prestação de seu serviço a aqueles que necessitam em um


momento tão conturbado como foi a pandemia do coronavírus
(COVID-19).
Para alguns a verdade é que um dos únicos benefícios
que a pandemia trouxe consigo fora essa reinvenção em uma
prestação de serviço arcaica que poderia ser facilmente rea-
daptada como realmente foi nesses últimos anos, sendo afir-
mado que o rito processual se tornou célere e mais eficiente
se comparado com a anterior modalidade de prestação.
Inclusive, impulsionando o Poder Judiciário a evoluir e
hoje vivenciar uma nova era em sua prestação de serviço com
a inovação tecnológica que para diversos doutrinadores, juí-
zes e conhecedores do Direito é incomparavelmente superior
à antiga fase do Poder Judiciário que ainda precisa estar
aberto a constante evolução tecnológica.

1.1.2 DA ADESÃO DAS FERRAMENTAS DIGITAIS NA


PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS JUDICIÁRIOS

“O Judiciário não pode mais ser visto como um prédio,


mas como um serviço”, é uma declaração de Dorotheo Bar-
bosa Neto que é Juiz auxiliar da Presidência do Conselho Na-
cional de Justiça (CNJ), relato, a respeito da evolução tecno-
lógica presente no Poder Judiciário.

15 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A declaração de Dorotheo é o pensamento dominante


dentre os juízes, doutrinadores, escritores etc., senão, veja-
mos Airton José Ruschel, Aires José Rover e Juliete Schneider
que partilham de mesmo entendimento ao dissertar quanto ao
“Governo Eletrônico: O Judiciário Na Era Do Acesso” e dispor
que as novas ferramentas eletrônicas serão demasiadamente
benéficas para a prestação dos serviços judiciários, pois, a sua
utilização tende a acelerar e simplificar o rito processual.
Naturalmente, as pessoas tendem a relutar e estranhar
aquilo que é novo e que de certa forma é diferente, isso, por-
que há constante medo de sair da zona de conforto e encarar
a nova realidade, ou, o medo de simplesmente não se adequar
e se acostumar com algo que pode ser surpreendentemente
melhor se comparado ao antigo.
Contudo, a modernização do Poder Judiciário sobre-
veio de um momento conturbado em diversos aspectos e não
trouxe brecha para o seu questionamento, pois, há de ser con-
siderado todo o contexto da sua inserção, seja, um período de
isolamento social, onde, a prestação desse serviço mediante
outros métodos se tornou inviável, logo, nesse caso uma ad-
versidade obrigou o Poder Judiciário a buscar outros meios
para a sua efetivação. A modernização das ferramentas digi-
tais nos procedimentos judiciais possui certas particularida-
des, que podem ser mais bem evidenciadas.

16 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.1.2.1 Processo físico versus eletrônico

O processo físico irrefutavelmente era a parte do proce-


dimento mais arcaico e antiquado, o qual, rogava por uma
substituição mais moderna e proveitosa para melhor presta-
ção dos serviços judiciários e certamente uma das primeiras
mudanças consideradas relevante e que surgiu antes do coro-
navírus.
O processo físico consiste em sua integralidade im-
pressa por meio de papéis que se conectam uns aos outros
de acordo com o andamento da ação judicial, consequente-
mente, amontoando pilhas de pastas e papéis nos cartórios.
Com o avanço tecnológico aos poucos o Poder Judici-
ário foi adotando determinadas mudanças, a primeira mu-
dança significativa ocorreu no ano de 2007, quando, aos pou-
cos houve a transição dos processos físicos para os eletrôni-
cos, posteriormente, fora promulgada a lei nº 11.419, de de-
zembro de 2006, lei, esta que garantiu a validade dos docu-
mentos eletrônicos como originais para todos os efeitos legais.
Por meio da referida lei que sobreveio a transição do
método físico, seja, papel (impresso) para o eletrônico que em
suma significa que toda as informações processuais que antes
se encontrava em papéis, passaria a ser armazenada em ban-
cos de dados digitais.
17 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Essa mudança afetou diretamente na prestação de ser-


viço de alguns profissionais que até então estavam habituados
com uma modalidade e repentinamente precisaram se adaptar
com uma outra forma de colaboração, mas, que de certa forma
facilitou como um todo para estes profissionais.
O acompanhamento processual também sofreu altera-
ções com a chegada do processo eletrônico que passou a ser
assistido em modalidade online pelo próprio sistema judiciário
que fornece todas as informações processuais às partes do
processo. A protocolização das petições iniciais também pas-
sou a ser realizada perante o próprio sistema, afastando a ne-
cessidade de deslocamento ao fórum para esse protocolo, que
pode ser efetivado por meio de quaisquer aparelhos com
acesso à internet, de qualquer lugar e em qualquer hora.
A Fundação Getúlio Vargas (FGV) realizou um estudo
comparativo dentre o processo eletrônico e o processo físico
o qual levantou dados e demonstrou os ganhos com a moder-
nização dos processos eletrônicos e ali fora constado que o
percentual dos processos eletrônicos que tramitam até 4 anos
é de 25%, enquanto, 50% dos processos físicos tramitam e
tramitaram por mais de 4 anos.
Ainda, apresenta que o tempo cartorário do processo
diminuiu, quando, os processos eletrônicos passaram a ter

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

uma média de 97,36 dias e o processo físico de 144,19 dias


de tempo cartorário, de cara é possível presenciar que o rito
se tornou célere com a chegada do processo eletrônico.
Sem mencionar toda a fragilidade que um processo fí-
sico apresenta, pois, por se tratar de folhas impressas e ser
um material físico, pode ser facilmente corrompido por inúme-
ras adversidades, seja, a dificuldade em organizar os proces-
sos em geral, principalmente, aqueles de maiores proporções
que demandavam mais atos e consequentemente requisitava
mais folhas nos autos.
As folhas dos autos eram armazenadas em um local es-
pecífico junto a diversos outros processos que rapidamente
poderiam se misturar e até mesmo se perderem perante as
pilhas de folhas presentes nas salas físicas em que eram ar-
mazenados os processos físicos, também, há de ser conside-
rada os fenômenos naturais e pestes que poderiam rapida-
mente corromper todo o material guardado.
Ademais, torna-se indiscutível que esse avanço tecno-
lógico nesse ramo específico trouxe mais benefícios do que
malefícios, aqui, demonstrando do que se trata uma mudança
necessária e natural perante a oferta dos serviços do Poder
Judiciário.

19 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.1.2.2 Do acesso à informação

A internet é a grande responsável por viabilizar o


acesso à informação e comunicação entre as pessoas princi-
palmente a longa distância, hoje, pessoas que se encontram
em lonjuras extremas podem facilmente se comunicar por
meio de mensagens de textos, ligações, aplicativos etc., isso,
em questão de segundos com apenas um clique.
Isso posto, é indubitável que a plataforma digital en-
curta distâncias e facilita nas movimentações das informa-
ções, pois, o uso da internet possibilita uma difusão rápida de
informações permitindo a sua propagação a todos aqueles que
possuem os mecanismos para o seu recebimento.
Dessa maneira, surge uma das maiores utilidades da
nova adequação que é tornar os trâmites do litígio céleres por
meio da simplicidade do acesso à informação em um sentido
amplo, quando, para a parte envolvida acompanhar o anda-
mento de seu processo judicial basta uma simples consulta
junto a plataforma digital do Poder Judiciário Brasileiro.
De mesmo modo que os meios de comunicação, princi-
palmente, os telefones celulares com a utilização do aplicativo
de mensagens “WhatsApp” quebraram uma barreira existente
e facilitou a comunicação dentre as partes e o Poder Judiciário

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que durante um atendimento virtual pelo próprio aplicativo vi-


abiliza as informações necessárias para aquele solicitante.
Destarte, o acesso à informação fora um dos maiores
prós da modernização das ferramentas digitais da prestação
dos serviços ora discutidos, isso, para aqueles que possuem
os mecanismos necessários para tal.

1.1.2.3 Da audiência online

Mediante a declaração da pandemia no ano de 2020, a


audiência online surgiu como uma providência necessária
para que os serviços judiciários continuassem sendo ofereci-
dos em um momento tão problemático, todavia, apesar de su-
perada a pandemia é bem verdade que as audiências virtuais
continuam sendo utilizadas na maioria das vezes que é desig-
nada uma nova audiência.
O embasamento legal que permite essa nova modali-
dade de audiência está na resolução 314 do CNJ, de
20/04/2020, a qual, prevê as sessões de julgamento serem re-
alizadas virtualmente.
Inconsequentemente a audiência online simplificou
esse ato do processo, pois, a audiência realizada virtualmente
pode ser executada em qualquer lugar e a qualquer hora,
desde que esteja com um aparelho eletrônico em mãos e com

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

acesso à internet, assim, dispensando o deslocamento do in-


divíduo até o fórum para poder participar da audiência.
Outro ponto benéfico é a celeridade da designação das
audiências que são marcadas com mais rapidez, visto, que a
audiência online traz mais flexibilidade quanto aos horários di-
recionados, permitindo que os juízes possam realizar mais au-
diências durante um mesmo dia sem que se torne exaustivo
para o magistrado e para a sua equipe.
Essa disponibilidade também inclui os advogados que
com essa adaptação conseguem participar de um número
maior de audiências, seja, de clientes variados em varas dife-
rentes em um único dia, o que antigamente era extremamente
dificultoso hoje se tornou uma realidade simples de muitos ad-
vogados.
Para tanto, apesar das vantagens também há as des-
vantagens dessa mudança que trouxe maiores questionamen-
tos quanto a eficácia da audiência online, aqui, sem mencionar
os desafios sociais de classe, é a necessidade da conexão
com a internet.
Esta é extremamente instável em âmbito nacional,
sendo, que ao momento do início da audiência a parte interes-
sada corre o iminente risco de a internet não estar disponível
para uso, assim como, a falta de um aparelho de telefone ce-

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

lular, tablet ou computador, etc. são alguns dos pontos nega-


tivos do uso da audiência virtual.

1.2 AS SOLUÇÕES PARA O RESGUARDO DOS DIREITOS


DOS CIDADÃOS EM SITUAÇÃO DE POBREZA

Primeiramente, aqui, torna-se indiscutível o quão im-


porte é que a prestação dos serviços oferecidos pelo Poder
Judiciário seja plenamente capaz de abranger todos os cida-
dãos brasileiros, isso, considerando que aqui não se trata de
mera facultatividade de uma prestação de serviço, mas, de um
direito fundamental devidamente disposto em Lei Magna, a
qual deve ser minuciosamente cumprida e efetivada a todos.
A partir do texto constitucional em seu caput do artigo
5º é possível tomar para si o conhecimento de que todos os
indivíduos são iguais perante e lei, sendo vedado quaisquer
tipos de distinção.
Nesse ato a implantação da tecnologia nos meios judi-
ciários não entra em mérito, isso, porque essa modernização
já é a realidade do Judiciário Brasileiro há alguns anos, por-
tanto, aqui, o que deve ser analisado e considerado é o cená-
rio brasileiro no âmbito social, quando, a desigualdade social
dentre os brasileiros é algo alarmante e evidente ao ponto de
que notável parcela da população brasileira vive em estado de

23 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pobreza ou de extrema pobreza, os quais, sequer possuem


recursos para a sua subsistência, seja, alimentação e higiene
básica.
Em mesma toada a conclusão de que estes indivíduos
menos afortunados não possuem capacidade financeira e até
mesmo técnica para usufruir plenamente da prestação desses
serviços modernizados é algo presumido, pois, se esses não
conseguem manter a sua subsistência resta-se manifesto e in-
questionável que estes não poderão arcar com custos do
acesso regular à internet e nem aos aparelhos e dispositivos
tecnológicos, isso, devido a inúmeros fatores, seja, aos custos
elevados, à falta de infraestrutura e etc., consequentemente,
dificultando e frustrando o acesso aos serviços judiciários
desta parcela da população que acaba por ser excluída de um
serviço essencial e fundamental que por Lei Maior deve ser
garantido a todos.
Portanto, o único propósito desse tópico é melhor dis-
secar e patentear a necessidade da criação de novos meca-
nismos capazes de englobar e incluir todos os indivíduos, prin-
cipalmente, aqueles que vivenciam e sofrem consequências
pela desigualdade social ao melhorar a prestação de serviço
do Poder Judiciário e o tornar acessível a todos aqueles que
necessitarem deste fornecimento, bem como, garantir que as

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

inovações tecnológicas nos serviços prestados pelo Poder Ju-


diciário sejam para melhorar a aplicação de Direito e da Jus-
tiça e não a utilização de mais um dispositivo de acesso de
poucos privilegiados, o qual irá excluir determinados grupos
sociais, que mais uma vez estarão em desvantagem perante
os demais.

1.2.1 DA FACULTATIVIDADE DO JUDICIÁRIO AO USO DA


FERRAMENTA DIGITAL

Em primeiro momento urge trazer à tona que a adesão


da ferramenta digital perante o Poder Judiciário não se trata
de um remédio jurídico que agora deve ser utilizada como
única medida de acesso à justiça, verdadeiramente, há mais
de anos a Justiça vem sendo efetivada no Brasil sem a implan-
tação integral dessas ferramentas, portanto, é passível de en-
tendimento que a utilização desses métodos tecnológicos não
é medida que se impõe perante a todos os cidadãos.
Natan Figueredo Oliveira em seu artigo científico dispõe
sobre o tema, ao expor que:

Nesse cenário, torna-se relevante tratar das


dificuldades das pessoas em situação de po-
breza terem acesso à justiça, pois tal dificul-
dade pode decorrer da privação de capaci-

25 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

dades e da falta de acesso a um pacote bá-


sico de insumos para sobrevivência e, simul-
taneamente, como faces de uma mesma
moeda, a dificuldade de acesso à justiça
pode aumentar tais privações (de capacida-
des e necessidades). (OLIVEIRA, 2021).

A generalização da ferramenta digital na prestação dos


serviços do Poder Judiciário acarretará mais uma privação aos
indivíduos que vivem em situação de pobreza, logo, algo que
deveria ser motivo de progresso e melhora será apenas mais
um mecanismo utilizado para reprimir e excluir a parcela mais
vulnerável e desassistida da população brasileira, ainda, evi-
denciando cada vez mais a desigualdade social existente no
Brasil. A esse respeito, Luciana Yuki Sorrentino e Raimundo
Silvino da Costa Neto dissertam em seu artigo:

Destarte, a finalidade de continuidade da


prestação jurisdicional não justifica a aplica-
ção uniforme da solução digital para todos
os casos, sob pena de se gerar situações
ainda mais injustas e aumentar o abismo
que existe entre o Poder Judiciário e a parte
mais vulnerável da sociedade, que se sabe,
tem inúmeras demandas reprimidas, mas
não tem noção de como resolvê-las. A ideia
da prestação jurisdicional pelos meios digi-
tais é criar pontes e não fortificar o castelo,
tornando-o cada vez mais hermético, como
aquela imagem que nos vem à mente na
“Parábola da Lei” de KAFKA (2006, pp. 261-

26 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

263), segundo a qual o homem do campo


tem a certeza de que “a lei deve ser acessí-
vel a todos e a qualquer hora”, mas perma-
nece anos à espera da permissão do por-
teiro e, sem sucesso, morre sem nem
mesmo conhecer os seus meandros como
tanto almejava.(2020)

Portanto, a utilização desses meios tecnológicos deve


ser algo opcional e não algo imposto pelo poder judiciário, ao
ponto de que o indivíduo tenha a liberdade de escolher o meio
que melhor se adeque as suas condições, ou seja, que o poder
judiciário seja adepto do sistema hibrido, onde, audiências,
atendimentos e demais procedimentos continue sendo dispo-
nibilizados para os cidadãos em modalidade presencial, bem
como, seja oferecido também em modalidade digital e virtual
para aqueles que optarem.
A efetivação total dos meios tecnológicos é um longo
processo a ser trabalhado que somente deve ser executado
em sua integralidade pelo Poder Judiciário quando este gozar
de plena capacidade e ferramentas jurídicas para abranger
não somente a minoria da população, mas, todos aqueles que
a quaisquer momentos ansiarem pela prestação desse ser-
viço, independentemente de sua classe social.

27 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.2.2 DA ADAPTAÇÃO DE LOCAIS PARA A PRESTAÇÃO


DE UM SERVIÇO ESSENCIAL

Nesse momento não há discussão quanto as vantagens


e melhorias que a modernização nas prestações de serviço no
Poder Judiciário se aplicada da maneira correta pode trazer
para a sociedade de Direito.
No entanto, a partir do momento em que um cidadão
que faz jus à prestação desse serviço passa a ter seus direitos
negligenciados não há o que se falar em eficiência e todos
aqueles outros benefícios tornam-se ineficaz, isso, porque to-
dos são iguais perante a lei e necessariamente devem gozar
e usufruir dos mesmos direitos de maneira igualitária.
Assim, considerando que ao momento em que a ferra-
menta digital alcançar todos os interessados essa moderniza-
ção será plenamente eficiente a todos, quando, todos poderão
desfrutar de tais melhorias o que se pode concluir é que a cri-
ação de locais adaptados com toda uma estrutura necessária
para aqueles que apesar de terem anseio por uma moderniza-
ção não possuem os aparelhos e dispositivos necessários
para tal, poderem fazer uso da ferramenta digital.
Isso é, aqueles indivíduos que quiserem participar de
uma audiência ou demais procedimentos que necessite de
meios tecnológicos poderá ir até esses locais e fazer uso dos

28 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

serviços ali oferecidos.


Esses locais devem ser em regiões de fácil acesso,
onde, todos que almejarem a prestação de serviço em moda-
lidade digital possa chegar ali com facilidade, ou seja, o mais
indicado seria zonas centrais de conhecimento de todos ou
para melhor acessibilidade, em bairros que possuem maior
ocupação de pessoas ao ponto de que os moradores de bair-
ros vizinhos possam se locomover até ali sem grandes adver-
sidades.
Deve ser oferecido não só os aparelhos, mas, o con-
junto de atendimento e instrução de pessoas devidamente ca-
pacitadas e entendedoras das técnicas digitais para que ali
possa fornecer os ensinamentos necessários aos indivíduos
que necessitarem desses serviços. Luciana Yuki Sorrentino e
Raimundo Silvino da Costa Neto abordam sobre em seu ar-
tigo:

Nesse sentido, o Judiciário deve se atentar


para não perder de vista o significado que
permeia a finalidade de manutenção de suas
funções essenciais, qual seja, a de obtenção
da paz e do bem-estar social que precedem,
inspiram e devem orientar todas as iniciati-
vas de inovação e transformação da ativi-
dade jurisdicional. Para tanto, devem ser
consideradas as especificidades e necessi-
dades dos jurisdicionados ao planejar e gerir
a prestação jurisdicional, de modo que a via
digital seja recepcionada de forma natural e,

29 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

não simplesmente imposta no modelo top-


down. Dessa forma, agrega-se valor ao ser-
viço sem desviar-se da satisfação do usuário
final, trazendo-o para mais perto da institui-
ção e cooperando ativamente com a exce-
lência do serviço a ele prestado. (2020)

Ainda, Mauro Cappelletti e Bryant Garth possuem opi-


nião própria quanto ao acesso à justiça.

O enfoque do acesso à Justiça tem um nú-


mero imenso de implicações. Poder-se-ia di-
zer que ele exige nada menos que o estudo
crítico e reforma de todo o aparelho judicial.
Obviamente, qualquer projeto comparativo,
mesmo que se beneficie do montante de
contribuições com que conta o Projeto de
Florença, não pode no presente estágio da
pesquisa nesse campo fazer muito mais do
que oferecer uma vista geral. Apesar disso,
algumas idéias e tendências básicas podem
ser distingui das, e a sua discussão permitirá
mostrar as realizações e potencial - bem
como alguns dos perigos e limitações -
desse esforço criativo mundial. (2002)

Desse modo, incluindo e abrangendo todos aqueles in-


divíduos que apesar de não possuir condições financeiras
para arcar com os custos de aparelhos tecnológicos, seja, ce-
lulares, notebook e até mesmo com a internet, também, dese-
jam utilizar as ferramentas digitais juntamente ao Poder Judi-
ciário, portanto, a efetivação de uma estrutura de apoio nas

30 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

dependências do Poder Judiciário é medida necessária.

1.3 DA IMPLANTAÇÃO DA TECNOLOGIA NOS SERVIÇOS


JUDICIÁRIOS E OS LIMITES DA JUSTIÇA

A inserção dos meios tecnológicos e a modernização


da ordem jurídica é uma realidade no Poder Judiciário, ou seja,
aqui não há o que se falar em um planejamento futuro para a
implantação de uma ferramenta digital nos serviços judiciários,
considerando que já houve a repentina modernização.
Aqui, o que se é discutido é a maneira a qual essa im-
plantação se sucedeu, seja, a sua impositiva e robusta inser-
ção perante a prestação de um serviço essencial e fundamen-
tal que deve ser oferecido de modo mais acessível possível.
Implantação, a qual de forma alguma deveria exceder
os limites do que a própria justiça impõe e em momento algum
excluir determinados grupos sociais os deixando em situação
vulnerabilidade, afinal, a finalidade desse avanço tecnológico
deve ser de progresso e não algo que retarde e dificulte a apli-
cação da justiça.

1.3.1 DA MODERNIZAÇÃO DOS SERVIÇOS JUDICIÁRIOS

A princípio é preciso refletir quanto ao atual cenário em

31 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que o Brasil se encontra, principalmente no que se refere às


transformações e evoluções tecnológicas e sociais com a che-
gada da “era digital” e todas as suas ferramentas eletrônicas.

Essa chegada trouxe consigo toda a influência da inter-


net e de seus meios digitais e tecnológicos que diretamente
afetou na vivência de grande parcela dos indivíduos, que, hoje,
veem esses métodos virtuais como algo indispensável em
suas vidas, ao ponto de inclui-las em todos os seus afazeres
cotidianos, bem como, as instituições de ensino, empresas e
até mesmos os órgãos públicos se tornaram adeptos à esta
modernização.

Para tanto, torna-se inevitável a necessidade do orde-


namento jurídico e os órgãos públicos estarem abertos às no-
vas relações formadas pelos indivíduos, isso, considerando
que a sociedade está em constante evolução, portanto, a mo-
dernização nos serviços oferecidos pelo próprio Estado, atual-
mente é uma realidade.

Diversos doutrinadores veem essas ferramentas digi-


tais como uma válvula de escape, como Margareth Vetis Za-
ganelli, Adrielly Pinto dos Reis e Bruna Velloso Parente, veja-
mos:

32 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Todo esse contexto também influencia signi-


ficativamente nos custos finais de anda-
mento e manutenção da máquina jurídica
brasileira, tanto em relação ao Poder Judici-
ário quanto no que se refere aos litigantes,
que ainda suportam gastos com os seus
deslocamentos frente ao Estado-juiz. Assim
sendo, pode-se dizer que o modelo tradicio-
nal de resolução de conflitos, seja autocom-
positivo ou heterocompositivo, é insuficien-
temente estruturado para desempenhar a
devida tutela jurisdicional de forma célere e
efetiva. Por isso é precisa a busca de novos
mecanismos que supram tais questões,
sendo o ODR uma possível alternativa.
(2022)

Com a chegada da era digital perante o Poder Judiciário


os seus ritos processuais se tornaram mais céleres, isso é,
houve evidente melhoria em aspectos referentes à agilidade,
eficiência, comunicação e até mesmo em redução dos gastos
operacionais, isso porque o processo judicial deixou de ser fí-
sico e passou a ser eletrônico.

As publicações no Diário Oficial e as intimações são fei-


tas por meio de editais, e-mails e WhatsApp. Em julho de
2021, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania
(CCJ), da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei
1595/20, o qual altera o Código de Processo Civil, possibili-
tando a intimação judicial por aplicativo de mensagens.

33 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Todavia, a inserção da evolução tecnológica dentre os


serviços oferecidos pelo Poder Judiciário deve servir como um
mecanismo de melhoria no que se refere a aplicação dos di-
reitos de todos os cidadãos, independentemente do grupo so-
cial que este é pertencente e não como um sistema que forta-
lece ainda mais a desigualdade de classes sociais em um país
que tanto sofre com esse desequilíbrio.

Luciana Yuki Sorrentino e Raimundo Silvino da Costa


Neto abordam sobre em seu artigo:

Toda transformação demanda alteração no


padrão de comportamento antes estabele-
cido, o que acaba sempre encontrando certa
resistência. Contudo, o Direito deve acom-
panhar a evolução dessa sociedade mo-
derna, sob pena de tornar-se estático. Preci-
samos, indiscutivelmente, de respostas com
maior imediatidade, trazendo para a reali-
dade esses mecanismos que ajudam na re-
alização de audiências virtuais e interação
digital. A internet, inquestionavelmente, traz
uma melhoria substancial nas condições de
acesso aos serviços jurisdicionais, em que
todos possam reivindicar os seus direitos
mais básicos. Um ambiente virtual mais de-
mocrático auxilia diretamente no aperfeiçoa-
mento da imagem estrutural do Judiciário,
ao buscar encurtar as desigualdades soci-
ais. Decerto “a efetivação das liberdades de-
pende sobretudo de condições sociocultu-
rais e institucionais” (2020).

34 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.3.2 DESAFIOS PARA ALCANÇAR TODOS OS CIDADÃOS

O artigo 5º da Constituição Federal de 1988 em seu in-


ciso XXXV, assegura que “a lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” portanto, o acesso
à justiça, além de ser um direito fundamental, também, é um
princípio constitucional previsto em Constituição Federal.
O disposto nesse artigo é que a Lei garante o amplo
acesso ao Poder Judiciário que é o órgão competente para
julgar e decidir conflitos de maneira imparcial mediante o ex-
presso em legislação vigente, à vista disso o Estado é quem
carrega a incumbência de assegurar que todos os cidadãos
brasileiros e estrangeiros que residem no país consigam exigir
os seus direitos por meio do Poder Judiciário.
A relevância desses textos legais é incontestável, afi-
nal, a falha na prestação do serviço judiciário ao ser incapaz
de garantir o absoluto acesso à justiça a todos os cidadãos
brasileiros poderá acarretar diversos transtornos e adversida-
des, incluindo a privação da democracia no País. A partir do
texto de Bruno Araújo França e Matheus Silveira, resgatamos
o estudo do Inciso XXXV – Princípio Constitucional Do Acesso
À Justiça, o qual expõem em artigo, que:

35 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nesse sentido, o acesso à justiça é um dos


pilares do que chamamos de estado demo-
crático de direito, onde todas as pessoas in-
seridas nesse contexto estão subordinadas
à lei de maneira igual para que a ordem seja
mantida. Isso significa, por exemplo, que
caso um governante queira tomar alguma
medida, esta deve estar em concordância
com a legislação. (ARAÚJO FRANÇA, SIL-
VEIRA. 2020).

Em mesmo ato que sobreveio melhorias também vie-


ram à tona debates sociais e questões que reforçaram dema-
siadamente a desigualdade social e excluíram uma parcela da
população, sendo aqueles com desvantagens econômicas.
Pois, há de ser considerado que a pobreza é uma rea-
lidade no Brasil, tendo em vista que de acordo com a FGV So-
cial, quase 28 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da
pobreza no Brasil, automaticamente, estes encontram-se im-
pedidos de reivindicar os seus direitos mais básicos através
de um sistema de justiça, por razões de exclusão social e po-
lítica.
Mediante Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação 2021, a
Pnad TIC, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), são cerca de 28,2 milhões de brasileiros de
10 anos ou mais de idade que não usavam a internet.

36 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Os dois motivos mais mencionados para a exclusão di-


gital foram não saber usar a internet (42,2%) e falta de inte-
resse (27,7%), todavia, 20% apontaram motivos financeiros
para a falta de acesso, onde, 14,0% disseram que o acesso à
rede era caro e 6,2%, que o equipamento eletrônico necessá-
rio era caro, ou seja, mesmo que queiram, não conseguem
contratar um pacote de internet.
Esse fato advém de inúmeros fatores, seja, aos custos
elevados que o acesso à internet exige ou aos preços dos apa-
relhos, bem como, a falta de infraestrutura etc., consequente-
mente, dificultando e frustrando o acesso aos serviços judiciá-
rios destes indivíduos que acabam por ser excluído de um ser-
viço que lhe é garantido por direito.
Ademais, passa a ser cristalina a necessidade da cria-
ção de novos mecanismos capazes de englobar e incluir indi-
víduos que vivenciam e sofrem consequências pela desigual-
dade social ao ponto de melhorar a prestação de serviço do
Poder Judiciário que deve ser acessível a todos aqueles que
necessitarem deste fornecimento, onde, não há espaço para
quaisquer que seja limitações de justiça, a qual, deve ser am-
pla a todos aqueles que necessitarem.
Sem mais, garantir que as inovações tecnológicas nos
serviços prestados pelo Poder Judiciário sejam para melhorar
a aplicação de Direito e da Justiça e não a utilização de mais

37 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

um dispositivo de acesso de poucos privilegiados, o qual irá


excluir determinados grupos sociais, que mais uma vez esta-
rão em desvantagem perante os demais é medida que se im-
põe.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo exposto, pode-se concluir que o avanço


tecnológico dentre os serviços prestados pelo Judiciário é
algo esperado, tendo em vista que a sociedade está em
constante transformação e evolução, contudo, o
posicionamento do Poder Judiciário e sua postura conforme
essas mudanças é o que fora demasiadamente explorados
nesses capítulos.
Trata-se de um tema relevante em uma proporção
imensa que não pode se privar a ser foco apenas dentre os
juristas, doutrinadores, estudiosos, etc. é preciso que tema
se propague em dimensões maiores ao ponto de que todos
os cidadãos sem quaisquer distinções, principalmente
aqueles de pouco poder de aquisição tenham seus direitos
resguardados e assim mantendo o imposto na Constituição
Federal.
Mediante o conteúdo aqui reunido, seja, todas as
citações de doutrinadores, leis expressas, princípios e
38 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

classificações de artigos científicos, tornou-se claro e


manifesto, não havendo brecha para dúvidas de que o Poder
Judiciário precisa se adequar com as necessidades da
sociedade, logo, se hoje há a tendência a utilização de meios
tecnológicos é possível um ajustamento.
No entanto, é preciso ter ciência de que o Brasil é um
país onde a desigualdade social é uma realidade, por isso
alguns cidadãos possuem capacidades técnicas e
financeiras para acomodar-se a um novo cenário
tecnológica, contudo, existe uma realidade paralela onde
indivíduos sofrem com a pobreza e sequer possuem
condições para suprir suas necessidades básicas.
É preciso ter em mente que essa adequação vai muito
além de abrir um link no aplicativo e entrar na audiência ou
mandar uma mensagem por WhatsApp para o órgão, pois,
para que esses atos se concretizem é necessário todo um
estruturamento com aparelhos compatíveis, acesso à
internet e conhecimento técnico para tal, isso é, custos
elevados para um cidadão de classe média e fora de alcance
para aqueles em condições de pobreza.
Sem mais, o avanço tecnológico dentre as prestações
de serviços públicos é bem-vindo desde que se adeque a
realidade do próprio país, afinal, não há vantagem em
generalizar+ um serviço que irá beneficiar apenas uma

39 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

parcela da sociedade e oprimir e calar a outra parte que mais


uma vez sentirá na pele a dor da desigualdade, mas dessa
vez em um direito que lhe é garantido por Lei e em tese
deveria ser efetivado em sua totalidade.

REFERÊNCIAS

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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42 | P á g i n a
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2
INQUÉRITO POLICIAL SIGILOSO

POLICE INVESTIGATION CONFIDENTIAL

Aldenor Lucas Barbosa Albuquerque3


Williane Tibúrcio Facundes4

ALBUQUERQUE, Aldenor Lucas Barbosa. Inquérito policial


sigiloso. 17 páginas. Trabalho de Conclusão de Curso de gra-
duação em direito – Centro universitário UNINORTE, Rio
Branco – AC,2023.

3 Discente do 9º período do período do curso de bacharelado em


Direito do Centro Universitário Uninorte.
4 Docente do Curso de Direito do Centro Universitário Uninorte. Gra-

duada em Direito pela U:VERSE e Letras vernáculas pela UFAC.


Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Varzeagran-
dense.
43 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo trata sobre o inquérito policial e a importân-


cia de se manter o sigilo durante a diligencia das investiga-
ções, tal sigilo este que é garantido pelo código de processo
penal em seu artigo 20°, tendo em vista que o vazamento de
informações a respeito de investigações atrapalha a diligencia
do inquérito policial, sigilo este que é de fundamental impor-
tância por ser através dele que podem ser colhidas provas por
conta do elemento surpresa que pode ser empregado, tra-
zendo assim o sucesso nas investigações para apuração de
infrações penais. Contudo o sigilo no inquérito não é absoluto
podendo o investigado e/ou advogado, desde que seja nome-
ado pelo investigado por meio de uma procuração, ter acesso
as provas já documentadas em documento oficial, porém as
diligencias durante a investigação ainda são sigilosas não po-
dendo ser violadas nem pelo princípio da publicidade.

Palavras – chave: inquérito policial; sigilo; diligências;


apuração.

44 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This article deals with the police investigation and the impor-
tance of maintaining secrecy during the investigations, such
secrecy that is guaranteed by the criminal procedure code in
its article 20, considering that the leak of information about in-
vestigations hinders the diligence of the police investigation,
secrecy that is of fundamental importance because it is through
it that evidence can be collected due to the element of surprise
that can be used, thus bringing success in investigations for
the investigation of criminal offenses. However, secrecy in the
investigation is not absolute and the investigated person and/or
lawyer, as long as he is appointed by the investigated person
through a power of attorney, have access to the evidence al-
ready documented in an official document, but the steps taken
during the investigation are still confidential and cannot be vio-
lated or by the principle of publicity.

Keywords: police inquiry; secrecy; due diligence; calculation.

45 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo aborda sobre as características do inquérito


policial, mais precisamente em seu caráter sigiloso, a aborda-
gem desse tema, visa evidenciar sua importância da atividade
investigativa para a sociedade e para a elucidação da veraci-
dade e do envolvimento de pessoas e artefatos mencionados
em uma queixa crime, trazendo assim uma averiguação de fa-
tos mais verdadeiras e comprovados para que sejam anexa-
dos no documento oficial para ser usado em julgamentos.
O fato de ter como característica sigilosa, do qual este
é o foco do artigo, nada mais é como um meio de surpreender
os investigados, pois se não houvesse tal característica seria
muito mais complicado a averiguação dos fatos visto que, sem
o sigilo das diligencias, seria mais fácil a ocultação e até
mesmo a destruição de provas importantíssimas bem como a
fuga de suspeitos de atos infracionais.
A legislação atual do código de processo penal, de-
fende o sigilo das diligencias das investigações tornando-o as-
sim, um direito que pode ser usado pelo delegado de polícia
durante as investigações, sendo este direito não sendo violá-
vel pelo principio da publicidade, visto que tal procedimento
investigativo não pode ter a determinada transparência como
visto em outros órgãos.

46 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2.1 INQUÉRITO POLICIAL

O inquérito policial é instrumento fundamental na for-


malização da investigação, com isso delimita-se a respeito de
suas características e a importância do sigilo no processo de
inquérito policial.
O Inquérito Policial é um procedimento de suma im-
portância para a polícia investigativa, consequentemente inter-
ligada a outros setores relacionados aos 4 processos crimi-
nais, onde geralmente se originam de uma fase investigativa
e baseada em provas concretas para que possam ser finaliza-
dos adequadamente, dando início a Ação Penal, lembrando
que esse procedimento é realizado pela polícia e ao ingressar
a ação penal se torna do âmbito judicial
Outro ponto importante que precisa ser relatado é que
o Inquérito Policial não é a Ação Penal, ele antecede esse pe-
ríodo, uma investigação realizada por uma autoridade policial,
e que ele é apresentado de forma escrita, com peças elabora-
das adequadamente, no qual precisa de tempo para a elabo-
ração das peças para a investigação, e essa forma escrita de-
verá ser bastante revisada para que não haja nenhum tipo de
interpretação equivocada o que poderia trazer problemas nas
investigações ou até mesmo complicações no decorrer do pro-
cesso penal.

47 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A abordagem deste tema é de grande relevância de-


vido a condicionar e evidenciar a importância do inquérito po-
licial, um instrumento de grande validade para o Direito e a
sociedade, como forma de persuadir o crime, por meio das
sanções, dessa forma, o inquérito policial é uma peça inquisi-
tiva que são utilizados os métodos adequados, como a perícia
para acariciar as provas, em ressalva desse procedimento que
não cabe mais ampla defesa e nem o contraditório que são os
direitos básicos garantidos pela Constituição Federal de 1988,
o que se trata de uma fase investigativa exigindo o seu sigilo.
Ainda na justificativa para a escolha deste tema que é
relevante quanto a resolução de diligências fundamentais para
o descobrimento dos fatos criminosos, assim como as circuns-
tâncias que acarretaram para com tal situação, além dos de-
mais autores envolvidos, assim a polícia investiga o crime para
o que Estado possa ingressar em juízo, fazendo jus a tal ato.
O Inquérito Policial é um procedimento administrativo
no qual o Estado delega poderes para seus agentes, no caso
o delegado federal em casos de investigações contra crimes
no âmbito nacional e civil para investigações no que tange os
limites de seu estado, com o intuito de dar subsídios por meio
de uma investigação preliminar, para dar início a uma ação
penal, depois de todo pronto, será entregue a denúncia ao Mi-

48 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nistério Público, desde que haja elementos para dar prosse-


guimento a ação penal. Segundo Mirabete, a respeito do con-
ceito de inquérito policial a autora descreve como sendo:

Inquérito policial é todo procedimento poli-


cial destinado a reunir os elementos neces-
sários à apuração de uma infração penal e
de sua autoria. Trata-se de uma instrução
provisória, preparatória, informativa, em que
se colhem elementos por vezes difíceis de
obter na instrução judiciária, como auto de
flagrante, exames periciais etc. (MIRABETE,
2013, p. 193).

É perceptível a repercussão a respeito do Inquérito Po-


licial, sendo uma peça chave para a investigação, e que possui
benefícios para com a sociedade, quando provas pertinentes
são colhidas é possível a ação penal, mas isso não significa
que o acusado já será culpado, devendo ser respeitado não
apenas o texto legal, mas aos seus princípios (MIRABETE,
2013).

2.1.1 CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL


SIGILOSO

Vale apresentar que o Estado é detentor de poderes


para a punibilidade no qual é praticada a infração penal se

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concretizando por meio do processo, antes que essa ação pe-


nal seja ajuizada é necessária uma análise sobre os fatos, com
levantamento de provas e uma investigação.
Isso significa que são elementos probatórios que ense-
jam com uma ocorrência de que realmente existe uma infração
penal e que esse tenha um autor, esse procedimento é conhe-
cido como Inquérito Policial, que não é um simples ou fácil pro-
cedimento, muito pelo contrário, precisa de uma atividade in-
tensa para colher dados que comprovem a realidade (PA-
CHECO, 2017).
Para que possamos compreender melhor o tema inqué-
rito policial é indispensável, que se pesquise a respeito de
suas características, tendo em vista que são através delas que
se é formado o elemento constitutivo, formador do conceito in-
quérito policial, dentre estas características serão abordadas
no presente estudo á: escrito, oficialidade, oficiosidade, auto-
rítariedade, discricionaridade, inquisítoriedade e sigiloso, este
do qual será o foco da pesquisa.

2.1.1.1 Escrito

Tendo em vista que, a finalidade do inquérito policial se


baseia em apurar atos de infração penal e apurar os autores
de tal infração, por ser um procedimento de investigação oficial

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a forma verbal não é aceita, apenas será aceita de forma es-


crita, datilografada e deverá ser rubricada pela autoridade.
Conforme o artigo 9° do código de processo penal (De-
creto de lei n° 3689, de 03 de outubro de 1941) “Todas as
peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzi-
das a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela
autoridade”.

2.1.1.2 Oficialidade

Tal procedimento além de ser redigido de maneira for-


mal escrito, deve ser realizado por órgãos oficiais, tal procedi-
mento investigativo é conduzido pelo estado pela autoridade
pública, não podendo este, ser realizado por órgãos particula-
res. Conforme disposto no art. 144 da Constituição Federal.

Art. 144. A segurança pública, dever do Es-


tado, direito e responsabilidade de todos, é
exercida para a preservação da ordem pú-
blica e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - Polícia federal;
II - Polícia rodoviária federal;
III - Polícia ferroviária federal;
IV - Polícias civis;
V - Polícias militares e corpos de bombeiros
militares.
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VI - Polícias penais federal, estaduais e dis-


trital. (Redação dada pela Emenda Consti-
tucional nº 104, de 2019)

Contudo não há impedimentos para que o ministério


público tendo conhecimento acerca de ilícitos penais, instaure
procedimento investigatório criminal que tramitará sob sua
presidência, conforme a resolução 181 de 2017 do Conselho
nacional do ministério público.

2.1.1.3 Oficiosidade

A oficiosidade do inquérito policial, tem por significado


que não há necessidade de provocação, sendo sua instaura-
ção obrigatória (garantida pelo princípio da legalidade) desde
que haja uma notícia a respeito de cometimento de infração
penal. Salvo os casos de ação penal publica condicionada e
ação penal privada como descritos no art. 5° do código de pro-
cesso penal § 4° e 5°.

Art. 5° Nos crimes de ação pública o inqué-


rito policial será iniciado:
§ 4° O inquérito, nos crimes em que a ação
pública depender de representação, não po-
derá sem ela ser iniciado.

52 | P á g i n a
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§ 5° Nos crimes de ação privada, a autori-


dade policial somente poderá proceder a in-
quérito a requerimento de quem tenha quali-
dade para intentá-la. (BRASIL,1941. s/p)

2.1.1.4 Autoritariedade

A autoritariedade é uma característica prevista no texto


da nossa constituição federal em seu artigo 144 §4° que prevê:
“§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de
carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as
funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais,
exceto as militares.”
Tal citação estabelece as polícias civis, os delegados
de polícia de carreira a função de polícia judiciária e apuração
de infrações penais, ou seja, cabendo o inquérito policial ser
realizado por uma autoridade pública de polícia judiciaria, re-
presentado pelo delegado de polícia.
Em âmbito estadual, são os delegados de polícia civis.
Já no âmbito nacional, são os delegados federais, onde são
munidos de autoridade responsável para cuidar de interesses
jurídicos da união. Tal característica também é vista por Fer-
reira Filho que também fala a respeito das autoridades respon-
sáveis pela instauração do inquérito.

53 | P á g i n a
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Cabe ao Estado por meio de seus agentes públicos que


façam com que o Inquérito Policial seja realizado e mais pro-
piciamente apontando o delegado (Federal para âmbito naci-
onal e civil para representar o âmbito estadual), por meio de
provas concretas obtidas e com análise e investigação da de-
núncia ou do levantamento do caso, com essa apreciação po-
derá oferecê-la ou não (FERREIRA FILHO, 2018).

2.1.1.5 Discricionariedade

A palavra discricionaridade está atrelada a forma de


como se conduz as investigações do inquérito, que se refere
tanto a natureza dos atos investigatórios quanto a ordem de
sua realização, ou seja, a autoridade policial aplicará as dili-
gencias necessárias a cada caso em especifico, tais diligen-
cias essas que são responsabilidade da autoridade policial
mas não obrigatórias.

Estão descritas nos artigos 6 e 7 do código de processo


penal, dado início ao inquérito policial o delegado de polícia
tem certa liberdade para tomar decisões que logrem êxito na
investigação do qual a doutrina se refere como sendo juízo de
prognose dado o final da investigações do inquérito a autori-
dade policial irá realizar a confecção de um relatório onde

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neste será relatado as conclusões da apuração da qual foi re-


alizada, tal ato a doutrina chama de juízo de diagnose.

Um grande autor e jurista, tendo como nome Renato


Brasileiro de Lima, descreve em seu livro que:

A discricionariedade implica liberdade de


atuação nos limites traçados pela lei. Se a
autoridade policial ultrapassa esses limites,
sua atuação passa a ser arbitraria, ou seja,
contraria a lei. Logo, não se permite a auto-
ridade policial a adoção de diligencias in-
vestigatórias contrarias a Constituição Fe-
deral e a legislação infraconstitucional. As-
sim, apesar de o delegado de polícia ter dis-
cricionariedade para avaliar a necessidade
de interceptação telefônica, não poderá
fazê-lo sem autorização judicial. Nos mes-
mos moldes, por ocasião do interrogatório
policial do investigado, devera adverti-lo
quanto ao direto ao silencio (CF,
art. 5º, LXII). (2013, p. 85)

Conforme a citação do autor fica claro que embora o


delegado tenha liberdade para atuar, até mesmo para ele que
é uma autoridade policial ainda há limites a serem respeita-
dos, não podendo agir de maneira equivocada, e respeitando
os limites impostos pela legislação vigente.

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2.1.1.6 Inquisitoriedade

Tomando como base a Constituição Federal que con-


sagrou as garantias penais e processuais, em que o direito de
não produzir provas contra si, mas o delegado, com a autori-
dade que lhe é repassada, analisará as provas produzidas du-
rante a investigação preliminar criminal, com base inquisitória
(SALES, 2014).
O inquérito policial, desde que não instaurado pela po-
lícia federal com intuito da expulsão de indivíduos estrangeiro,
se tratando de um elemento inquisitivo é de maneira essencial
voltado para apuração de elementos que possam auxiliar no
oferecimento de denúncias ou queixas de infrações penais.
Tal característica não se aplica aos princípios do con-
traditório nem da ampla defesa, pois nessa fase o investigado
não é acusado, afinal o investigado é apenas um indivíduo que
está sob investigação, mas o mesmo não está sendo acusado
de nada, pois o inquérito nada mais é do que um procedimento
administrativo e não processual. A característica de inquisito-
riedade está em conflito perante o surgimento da lei
13.245/2016 que altera o texto normativo do artigo 7°, XXI, da
lei n°8.906/94 do Estatuto da OAB, onde prevê:

XXI- assistir a seus clientes investigados du-


rante a apuração de infrações, sob pena de
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nulidade absoluta do respectivo interrogató-


rio ou depoimento e, subsequentemente, de
todos os elementos investigatórios e proba-
tórios dele decorrentes ou derivados, direta
ou indiretamente, podendo, inclusive, no
curso da respectiva apuração:
a) apresentar razões e quesitos;

A presente alteração apenas recaiu em cima do Esta-


tuto da ordem dos advogados, onde temos uma certa precari-
edade no que tange a característica inquisitiva do inquérito,
mas também não podemos dizer que por conta dessa altera-
ção não se tem a inquisitoriedade pois ela ainda está la,
mesmo perdendo sua notoriedade com o passar dos anos e
com as mudanças da legislação, ela não deixa de existir.

2.1.1.7 Sigiloso

Diferentemente do que ocorre no processo criminal


onde tem toda uma questão envolvendo o princípio da publici-
dade no inquérito isso não ocorre, essa possibilidade de reali-
zar o inquérito policial de forma sigilosa se deve ao fato de que
o sucesso das investigações se dá pelo desconhecimento da
diligencia por parte dos investigados, tal confidencialidade do
inquérito policial está citada no art. 20 do código de processo
penal que descreve que, a autoridade assegurará no inquérito

57 | P á g i n a
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o sigilo necessário a elucidação do fato ou exigido pelo inte-


resse da sociedade, essa característica sigilosa não atinge o
juiz nem o ministério público e não alcança também o defensor
que tem como dever conforme art. 7°, XIV, Estatuto da OAB:

XIV - examinar, em qualquer instituição res-


ponsável por conduzir investigação, mesmo
sem procuração, autos de flagrante e de in-
vestigações de qualquer natureza, findos ou
em andamento, ainda que conclusos à auto-
ridade, podendo copiar peças e tomar apon-
tamentos, em meio físico ou digital; (Reda-
ção dada pela Lei nº 13.245, de 2016)

O presente texto apresentado abrange tanto procedi-


mentos físicos quanto procedimentos digitais, sendo assim
mesmo o inquérito policial sendo, um procedimento de carac-
terística principal sigilosa, o advogado responsável não é im-
pedido de acessar os autos do inquérito, porém, embora tenha
acesso aos autos do processo, o mesmo não é irrestrito.
Ou seja, o advogado tem sim, o direito de acessar os
autos, desde que esse acesso não interrompa ou atrapalhe as
investigações, o mesmo possuirá acesso à provas já incorpo-
radas no inquérito, mas não as providencias investigatórias
que ainda estão em execução para que assim não se quebre
a característica sigilosa das investigações e comprometa sua
eficácia.

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2.2 A IMPORTÂNCIA DO SIGILO NO INQUÉRITO


POLICIAL

De acordo com Ferreira Filho (2018) o Inquérito Policial


é um instrumento utilizado de grande importância para a Jus-
tiça Criminal, com inúmeros benefícios que serão apontados
minuciosamente, devido as suas atribuições para juntar todas
as provas possíveis que estão envolvidas em um delito, con-
siderada uma peça “meramente informativa” para com a jus-
tiça criminal, procedidas mediante o procedimento investigató-
rio policial.
O Inquérito Policial é um instrumento processual de
suma importância para o ordenamento jurídico criminal brasi-
leiro, ele existe com o intuito de realizar uma investigação de-
talhada a respeito dos fatos para garantir se realmente são
verdadeiros, caso sejam, e depois de todo o seu procedimento
(fases) ele poderá ser enviado formalmente ao Ministério Pú-
blico para que possa impetrar justamente a ação penal (NU-
CCI, 2018).
Em nosso código de processo penal em seu artigo 20°
é assegurado o sigilo necessário para elucidação do fato,
tendo em vista o princípio da publicidade onde todos tem o
direito de receber de órgãos públicos informações de seu inte-
resse garantida por norma constitucional, o mesmo não se

59 | P á g i n a
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aplica ao inquérito, pois a realização do inquérito de forma si-


gilosa se torna de extrema importância para que se logre êxito
nas investigações.
Tal êxito que depende bastante de um elemento sur-
presa este que, não seja possível o conhecimento da parte in-
vestigada sobre as diligencias e providencias investigatórias
utilizadas para elucidação dos fatos, sem a confidencialidade
do sigilo seria muito fácil distorcer os fatos o que acarretaria
em atraso e até mesmo fracasso tanto na apuração de atos
infracionais como de sua autoria.
Não somente temos o artigo 20° do CPP, como objeto
de estudo relacionado ao sigilo no inquérito policial, mas tam-
bém vemos a regulamentação do caráter sigiloso no texto da
lei n° 12.527/2011 (Lei de acesso à informação) que nos revela
em determinado artigo que:

Art. 23. São consideradas imprescindíveis à


segurança da sociedade ou do Estado e,
portanto, passíveis de classificação as in-
formações cuja divulgação ou acesso irres-
trito possam:
VIII - comprometer atividades de inteligên-
cia, bem como de investigação ou fiscaliza-
ção em andamento, relacionadas com a
prevenção ou repressão de infrações.

60 | P á g i n a
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O presente artigo, apenas reforça, a analise que já ti-


vemos a respeito do art.20° do CPP, trazendo consigo a de-
monstração de como o acesso a informações dos autos do
inquérito já publicado em registro oficial, desde que, esse
acesso não comprometa as investigações em andamento.
Isso traz indica, de forma clara e concisa, que o acesso
à informação dos autos do inquérito é permitido, porém não
é irrestrito, deve seguir regras que estão presentes nos mais
diversos regimentos jurídicos, tanto no regimento de código
de processo penal, como também já é visto também na nossa
carta magna, também conhecida como constituição federal.
Alguns exemplos bem comuns no dia a dia policial nos
mostram como o uso dessa característica sigilosa é importante
para a diligencia das investigações, como o cumprimento de
um mandado de busca e apreensão, visando achar uma arma
utilizada para cometimento de um crime, ou o cumprimento de
um mandado de prisão preventiva, nestes casos o sigilo é uma
ferramenta indispensável para que possa lograr êxito nas dili-
gencia.

2.2.1 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE

O princípio da publicidade garantido pela nossa consti-


tuição federal no corpo de seu artigo 5°, XXXIII, descreve que:

61 | P á g i n a
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XXXIII - todos têm direito a receber dos ór-


gãos públicos informações de seu interesse
particular, ou de interesse coletivo ou geral,
que serão prestadas no prazo da lei, sob
pena de responsabilidade, ressalvadas
aquelas cujo sigilo seja imprescindível à se-
gurança da sociedade e do Estado; (Regula-
mento) (Vide Lei nº 12.527, de 2011)

Tal princípio garante a todos terem informações, o que


nos permite ter uma certa transparência da administração pú-
blica, porém no caso do inquérito policial é diferente, pois
como o próprio texto de lei nos apresenta o sigilo torna-se in-
dispensável para a segurança da sociedade e do Estado.
Além do que, preserva a identidade do investigado ga-
rantindo assim seu direito de intimidade e de imagem, visto
que a quebra desse sigilo pode extinguir os preceitos morais,
materiais e, em casos mais graves, por em risco a integridade
física do indivíduo, do qual está sendo investigado.
Afinal, durante o inquérito o indivíduo é investigado,
mas não acusado de algo, como também o sigilo tornaria mais
viável para apuração de atos infracionais.

2.3 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO SE TRATANDO DO


SIGILO NO INQUÉRITO POLICIAL

Neste tópico será abordado o entendimento que a dou-


trina de antigamente tinha a respeito do inquérito e como ela

62 | P á g i n a
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entende atualmente essa forma de sigilo para com as investi-


gações, de modo que seja apresentado como o entendimento
doutrinário a respeito das características do inquérito foi mu-
dado, trazendo assim com essa mudança, uma nova visão de
preceito jurídico.

2.3.1 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO CLÁSSICO

Quando nos referimos ao inquérito policial na doutrina


clássica, não vemos uma vasta diversidade de conteúdos lite-
rários falando a respeito deste assunto, o que remete uma
certa falta de aprofundamento neste conteúdo que é de grande
relevância para nosso ordenamento jurídico.
Contudo, mesmo esse tema não sendo tão aprofun-
dado como deveria na doutrina clássica, podemos achar al-
guns doutrinadores que relatam como eram os preceitos jurí-
dicos de antigamente como exemplo podemos citar Nestor Tá-
vora que em seu livro nos descreve que:

O inquérito é inquisitivo: as atividades per-


secutórias ficam concentradas nas mãos de
uma única autoridade e não há oportuni-
dade para o exercício do contraditório ou da
ampla defesa. Na fase pré-processual não
existem partes, apenas uma autoridade in-
vestigando e o suposto autor da infração
normalmente na condição de indiciado (TÁ-
VORA, ALENCAR, 2016, p. 147)
63 | P á g i n a
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No que diz respeito ao princípio do contraditório, nada


mais é do que a contraposição da prova e a corroboração de
fato verídico, onde o mesmo possui duas vertentes a infor-
mação e a reação, já o princípio da ampla defesa tem como
conceito a acessão de direito ao investigado no inquérito.
Isso para que se possa, por parte do investigado, am-
plos e extensos métodos, para que possam ser utilizados em
sua defesa contra as acusações imputadas a sua pessoa,
ambos princípios embora diferentes estão interligados, atra-
vés do contraditório surge a execução da defesa, a defesa
garante o contraditório mas é através desta que surge a ma-
nifestação e ocorre a garantia do procedimento .
No que tange o caráter inquisitivo pelo entendimento
doutrinário essa premissa vem sendo alterada com o passar
dos anos devido mudanças na legislação essa etiquetação
vem se enfraquecendo.
Não dizendo que essa característica está deixando de
existir, mas, conforme os anos passam e a nossa legislação
sofre alterações e com isso algumas características até de-
terminado momento eram bem fortes, em determinados pro-
cedimentos, vão perdendo sua força como visto no caráter
inquisitivo.
Atualmente é mais preferível chamar de apuratório,

64 | P á g i n a
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visto que o termo inquisitivo traz a memória o período da in-


quisição onde o poder de realizar o julgamento, a acusação
e investigação estava na responsabilidade de uma única pes-
soa, o que sabemos que no inquérito policial não funciona
assim, o poder investigar, acusar e julgar não depende de
uma só pessoa mas de todo um processo envolvendo várias
autoridades não somente o delegado de polícia.

3.2 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO MODERNO

A doutrina mais atual além de ter uma análise mais


profunda a respeito do tema inquérito policial, não vê mais
esse procedimento como sendo inquisitivo e sim apuratório,
com o passar dos anos as mudanças no ordenamento jurí-
dico outro tema que passou a comentado com mais frequên-
cia, é o relacionado ao sigilo em investigações que segundo
o doutrinador Henrique Hoffman descreve em seu livro:

Essa vantagem se traduz no elemento sur-


presa, materializada no sigilo inicial das
medidas investigativas da polícia judiciária;
ao serem efetivadas sem prévia notificação
do suspeito, as diligências podem ter um
mínimo de eficácia na colheita de elemen-
tos informativos e probatórios. O segredo
não é absoluto, não afetando o direito de o
investigado ter ciência dos atos de investi-
gação já concluídos e documentados nos

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autos, para que possa se defender. (HO-


FFMAN, 2019, p.29)

Hoffman descreve que o sigilo não é absoluto, ou seja,


o investigado pode ter ciência dos autos já concluídos e do-
cumentados, porém as informações a respeito da forma
como irá ocorrer as investigações, quais métodos serão utili-
zados e quando irão ser feito tais procedimentos.

O investigado não poderá saber, pois o conhecimento


de informações como essas faz com que se perca a caracte-
rística confidencial das investigações, acabando com o ele-
mento surpresa, o que pode resultar em uma brecha para es-
conder e/ou adulterar provas materiais que seriam indispen-
sáveis para apuração de infrações penais, bem como preju-
dicar de forma parcial ou completa as investigações.

Como visto acima, o sigilo não é absoluto, podendo o


investigado tomar ciência dos autos documentados no inqué-
rito, o Supremo Tribunal Federal visando que o investigado
possa exercer sua ampla defesa durante o inquérito sancio-
nou a sumula vinculante de número 14° de 09/02/2009 regida
pelo texto de que:

É direito do defensor, no interesse do repre-


sentado, ter acesso amplo aos elementos

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de prova que, já documentados em proce-


dimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, di-
gam respeito ao exercício do direito de de-
fesa.

Onde através da leitura da sumula, vemos que o Su-


premo Tribunal Federal, entende que o investigado, tem o di-
reito de ter acesso ao elementos de prova já documentados,
e mais que isso, a sumula também nos mostra que não so-
mente ele, mas seu advogado também poderá ter acesso a
esses elementos no procedimento de apuração.
Desde que seu cliente permita ao mesmo esse acesso,
esse direito é garantido aos advogados conforme o artigo 7°
, inciso XXI, da lei 8.906 de 1994, do Estatuto da Ordem dos
Advogados do Brasil, já citado no começo deste estudo.

2.4 A JURISPRUDÊNCIA DO CARÁTER SIGILOSO NO


INQUÉRITO POLICIAL

Neste tema será abordado a forma como o conjunto


das decisões, aplicações e interpretações legislativas, se
comportam com o caráter confidencial do inquérito policial, o
que nos proporciona apreciar a forma como esse sigilo é in-
terpretado nas decisões.

67 | P á g i n a
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2.4.1 POSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DE CÓPIAS DE TO-


DOS OS ELEMENTOS DE PROVA JÁ DOCUMENTADOS,
INCLUSIVE DAQUELES EM FORMATO AUDIOVISUAL

No que tange a obtenção de provas documentadas, já


mencionado a respeito disso neste estudo, é assegurada pela
sumula vinculante de número 14°, mas vejamos como esse
tema é colocado mediante a jurisprudência:

Nada, absolutamente nada, respalda ocultar


de envolvido – como é o caso da reclamante
– dados contidos em autos de procedimento
investigativo ou em processo alusivo a ação
penal, pouco importando eventual sigilo do
que documentado. Esse é o entendimento
revelado no verbete vinculante 14 (...).
Tendo em vista a expressão “acesso amplo”,
deve-se facultar à defesa o conhecimento da
integralidade dos elementos resultantes de
diligências, documentados no procedimento
investigatório, permitindo, inclusive, a obten-
ção de cópia das peças produzidas. O sigilo
refere-se tão somente às diligências, evi-
tando a frustração das providências impos-
tas. Em síntese, o acesso ocorre considera-
das as peças constantes dos autos, inde-
pendentemente de prévia indicação do Mi-
nistério Público. 3. Defiro a liminar para que
a reclamante, na condição de envolvida, te-
nha acesso irrestrito e imediato, por meio de
procurador constituído, facultada inclusive a
extração de cópia, aos elementos constan-
tes do procedimento investigatório (...).
[Rcl 31.231 MC rel. min. Marco Aurélio,

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dec. monocrática, j. 20-8-2018, DJE 174 de


24-8-2018.]

A presente jurisprudência, diz respeito a uma ação im-


petrada com o objetivo de se fazer cumprir o disposto na su-
mula vinculante 14° de 09/02/2009 onde a impetrante não teve
o acesso amplo as provas já documentadas o que é ilegal,
sendo assim necessário a impetração de uma ação para ga-
rantia do cumprimento desse direito.

2.4.2 JURISPRUDÊNCIA APLICADA AO ACESSO DO AD-


VOGADO AOS AUTOS DO INQUÉRITO POLICIAL

O acesso do advogado, às provas já documentadas é


permitido, assim como é para o investigado, seguindo o
mesmo principio de que só terá acesso as provas já constadas
em documento oficial, não antes disso para que não possa ha-
ver o risco de comprometer o sigilo das investigações, as apli-
cações a respeito desse tema são:

(...) verifico que, in casu, a irresignação do


reclamante não merece acolhida. Isso por-
que o entendimento adotado no ato recla-
mado não constitui ato que ofendam a tese
firmada no enunciado 14 da Súmula Vincu-
lante do Supremo Tribunal Federal (...). De-

69 | P á g i n a
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veras, o direito de acesso aos dados de in-


vestigação não é absoluto, porquanto o le-
gislador ordinário trouxe temperamentos a
essa prerrogativa, consoante se infere da
exegese do artigo 7º, §§ 10 e 11, da lei
8.906/1994 – Estatuto da Advocacia e a Or-
dem dos Advogados do Brasil - OAB, com a
redação conferida pela Lei 13.245/2016,
(...). Nesse contexto, cabe referir que o es-
pectro de incidência do Enunciado 14 da Sú-
mula vinculante do Supremo Tribunal Fede-
ral não abrange diligências ainda em anda-
mento e elementos ainda não documenta-
dos, mormente se considerados os disposi-
tivos legais supramencionados, além de se
fazer necessária a apresentação de procu-
ração nas hipóteses de autos sujeitos a si-
gilo. (...) verifico que sequer se negou à de-
fesa o direito de acesso a autos de investi-
gação, razão pela qual não merece prospe-
rar o presente intento reclamatório.
[RCL 30.957, rel. min. Luiz Fux, dec. mono-
crática, j. 10-8-2018, DJE 164 de 14-8-
2018.]

Como podemos ver nessa citação em especifico, não


só foi utilizada a sumula 14° de 09/02/2009, como também po-
demos ver a aplicabilidade do art. 7°, § 10 e 11 do estatuto de
advocacia da OAB, onde a mesma descreve que:

§ 10. Nos autos sujeitos a sigilo, deve o ad-


vogado apresentar procuração para o exer-
cício dos direitos de que trata o inciso XIV.
(Incluído pela Lei nº 13.245, de 2016)
§ 11. No caso previsto no inciso XIV, a auto-
ridade competente poderá delimitar o

70 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

acesso do advogado aos elementos de


prova relacionados a diligências em anda-
mento e ainda não documentados nos au-
tos, quando houver risco de comprometi-
mento da eficiência, da eficácia ou da finali-
dade das diligências. (Incluído pela Lei nº
13.245, de 2016)

Conforme disposto no artigo supracitado, o advogado


só poderá ter acesso aos autos do inquérito que estejam su-
jeitos ao sigilo, se o mesmo apresentar uma procuração,
sendo assim o advogado só poderá ter acesso a essas infor-
mações se for do interesse do investigado que o mesmo tenha
acesso aos autos do inquérito, e ainda pode ser delimitado o
acesso do advogado pela autoridade competente, se for ob-
servado que há riscos de comprometer as investigações.
Contudo não se pode deixar de falar do abuso de auto-
ridade, que ocorre quando a autoridade policial, negligencia o
acesso do advogado aos autos do inquérito, ação essa da qual
configura o crime de abuso de autoridade, crime este que se
configura com o fornecimento incompleto dos autos ou até
mesmo o fornecimento dos autos, mas com algumas partes
dele retiradas do caderno investigativo, previsto no artigo n° 7,
§12, da lei n° 8.906/94 que descreve:

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

§ 12. A inobservância aos direitos estabelecidos


no inciso XIV, o fornecimento incompleto de au-
tos ou o fornecimento de autos em que houve a
retirada de peças já incluídas no caderno inves-
tigativo implicará responsabilização criminal e
funcional por abuso de autoridade do responsá-
vel que impedir o acesso do advogado com o in-
tuito de prejudicar o exercício da defesa, sem
prejuízo do direito subjetivo do advogado de re-
querer acesso aos autos ao juiz competente. (In-
cluído pela Lei nº 13.245, de 2016)

Por mais que o inquérito policial seja um, procedimento


investigativo de caráter sigiloso, o advogado do investigado,
desde que seja da vontade deste, tem autorização garantida
por lei para ter acesso aos autos do inquérito, porém caso
ocorra uma determinada situação em que lhe seja negada
esse acesso sem quaisquer prerrogativa legal.
O advogado poderá comunicar a ordem dos advogados
do Brasil, a qual designará um advogado de prerrogativas, que
irá ajudar o advogado a entender e executar suas prerrogati-
vas de advogado, se até mesmo, depois disso, persistir a ne-
gligencia de entregar os autos do inquérito, o ocorrido devera
ser registrado e o documento confeccionado servirá de prova,
para representação nos órgãos de controle, o mesmo docu-
mento poderá ser utilizado para ajuizamento em uma reclama-
ção constitucional criminal no supremo tribunal federal, ou
mesmo para expedição de mandado de segurança exigindo
que sejam entregues os autos negados.

72 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O inquérito policial é um instrumento da segurança pú-


blica importantíssimo para elucidação dos fatos de notícias
crime e infrações penais, visto que através dele é que se tem
as reais comprovações de veracidade sobre tais fatos, tal im-
portância esta, que nosso ordenamento assegura essas inves-
tigações por meio de leis especificas para tratar de tal assunto
e que as regulamentem para que não hajam abusos de auto-
ridade, afinal não é porque é um instrumento investigativo que
o mesmo irá poder ser feito tudo de maneira irregular e sem
ordem.
Conforme podemos ver no artigo o procedimento inves-
tigatório ele tem um caráter sigiloso, mas esse sigilo não é ab-
soluto, pois também vemos que as diligencias devem ser sigi-
losas para não comprometer o elemento surpresa das investi-
gações, mas também vemos que as provas juntadas aos autos
oficiais não devem ser escondidas do investigado e muito me-
nos do advogado do investigado desde que este nomeado por
meio de uma procuração para ter acesso a esses autos.
A negligencia de entregar esses autos ao advogado,
nomeado pelo investigado, devera ser registrada e o docu-

73 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mento servira de prova para uma futura reclamação constitu-


cional criminal podendo ser julgada no Supremo Tribunal Fe-
deral.
Embora o sigilo do inquérito seja amparado por lei,
ainda há muito o que se discutir sobre manter o sigilo nas in-
vestigações, por mais que não seja a única característica das
investigações com certeza é uma das mais importantes para
se descobrir a verdade e realizar a apuração dos fatos, para
este tipo de procedimento, as leis deveriam abranger mais as
situações que ocorrem durante o processo.
Deveriam ser mais rígidas para que se mantenha o si-
gilo das investigações e deveriam ser mais claras em relação
ao que se pode ter acesso e a quem pode acessar determina-
das informações investigativas, bem como também deixar
claro o momento certo de ter essas informações, pois por mais
que se tenha leis sobre esse tema, ainda é um assunto bas-
tante abstrato e de pouca clareza.

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76 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3
ABUSO SEXUAL INFANTIL NO ÂMBITO FAMILIAR

CHILD SEXUAL ABUSE WITHIN THE FAMILY

Tailine Vieira da Cruz 5

Williane Tibúrcio Facundes6

CRUZ, Tailine Vieira da. Abuso Sexual Infantil no Âmbito


Familiar. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacha-
relado em Direito) – Centro Universitário UNINORTE. Rio
Branco – ACRE, 2021.

5 Discente do 9º período do curso de Bacharel em Direito pelo Cen-


tro Universitário UNINORTE.
6 Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduada em Direito

pela U: Verse. Graduada em Letras Vernáculas pela Universidade


Federal do Acre-UFAC. Especialista em Psicopedagogia pela Uni-
versidade Varzeagrandense
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Esse trabalho tem como objetivo abordar o tema de assédio


sexual infantil no âmbito familiar. É sabido que desde a anti-
guidade até no momento atual, crianças e adolescentes so-
frem abusos sexuais em locais que eram para ser referência
de afeto e segurança, pessoas que deveriam fornecer estabi-
lidade para o seu pleno desenvolvimento, são as mesmas que
violam seus direitos e destroem sonhos somente para satisfa-
zer os seus impulsos sexuais. Esses constantes acontecimen-
tos levou o Estado a criar normas de proteção, auxílio e defesa
das crianças e adolescentes, mas apesar de previsto na Cons-
tituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no
Código Penal, os abusos no âmbito familiar não cessaram,
cabe os profissionais envolvidos buscar, então, formas de
amenizar os efeitos negativos que surgem partir dessa expe-
riência traumática, é preciso sempre escolher o melhor trata-
mento para ajudar esses sofredores de abuso sexual no ceio
familiar.

Palavras-Chaves: abuso sexual; criança; direto penal; ECA;


família.

78 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This work aims to address the issue of child sexual harassment


within the family. It is known that from antiquity to the present
time, children and adolescents suffer sexual abuse in places
that were supposed to be a reference of affection and security,
people who should provide stability for their full development,
are the same people who violate their rights and destroy dre-
ams just to satisfy your sexual urges. These constant events
led the State to create norms for the protection and defense of
children and adolescents, but despite what is provided for in
the Federa Constitution, the Child and Adolescent Statute and
the Penal Code, abuses in the family sphere have not ceased,
it is up to the professionals involved to seek, then, ways to al-
leviate the negative effects that arise from this traumatic expe-
rience, it is always necessary to choose the best treatment to
help these victims of sexual abuse in the family setting.

Keywords: criminal law; ECA; family; kid; sexual abuse.

79 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Mesmo que a Constituição da República Federativa do


Brasil de 1988 tenha consagrado em seus artigos a doutrina
da proteção integral à infância, crianças e adolescentes conti-
nuam sendo expostos de inúmeras maneiras a vários tipos de
violência, a um exemplo dessas violências está o abuso se-
xual.
As denúncias de abuso sexual no Brasil, na maioria dos
casos, ocorrem no ambiente familiar, ou o autor do abuso é
um parente direto da vítima. Hoje em dia existe uma crescente
movimentação acerca dos direitos das crianças e adolescen-
tes, uma necessidade de percepção e precaução com a saúde
tanto física como mental das crianças, o abuso sexual é um
crime que envolve essas duas questões.
O Objetivo deste artigo é identificar as vítimas do abuso,
como o abuso afeta diretamente a vida das vítimas, o perfil do
abusado e por qual motivo esses são levados a cometer esse
tipo de crime e como esse crime é punido no ordenamento
jurídico brasileiro. Para a elaboração desse artigo foi usado o
método de pesquisa bibliográfico.
O estudo é dividido em três capítulos principais. Primei-
ramente, será feito uma contextualização histórica do abuso
sexual e o seu conceito, a perspectiva do gênero e o perfil da

80 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

vítima e a descrição da família e o perfil do abusado. Em um


segundo momento será abordado sobre as implicações do
abuso no desenvolvimento físico e psicológico da criança,
mostrando em como o abuso interfere para o seu desenvolvi-
mento mental e nos relacionamentos futuros. Por fim, será
abordado todos os aspectos jurídicos do tipo penal do abuso
sexual contra vulnerável, bem como o que dispões o Estatuto
da Criança e do Adolescente sobre o tema e as previsões
constantes do Código Penal Brasileiro.

3.1 O ABUSO SEXUAL

3.1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS

Durante toda a história o abuso na infância e na adoles-


cência sempre ocorreu, a violência é um fenômeno complexo,
a sua definição está relacionada ao contexto cultural de cada
sociedade e cada período da história. O abuso sexual é uma
das formas mais danosas de violência, o procedimento abu-
sivo consegue ser mais grave que o maltrato físico porque as
vítimas tendem por aceitar a situação e acabam se adaptando
a ela para sobreviver, em outras palavras, o abusador se sente
desculpado e a vítima sempre sente culpa e vergonha.
Durante o século XIX até o início do século XX o abuso

81 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sexual era um quadro difícil de ser contestada, mas nessa


época a preocupação era em entender os processos mentais,
questões de saúde, a preocupação maior não era com o os
direitos das crianças. Foi nessa época também que surgiram
os primeiros reformatórios sociais, mas muitos tinham como
orientação a religião.
Em 1959 houve a Declaração dos Direitos da Criança,
em decorrência disso houve uma elevação no número de cri-
anças nos serviços pediátricos dos Estados Unidos, as lesões
eram definidas como não acidentais fazendo com que as aten-
ções fossem voltadas para esse problema e levantando uma
necessidade de conscientização da sociedade. Apesar disso,
somente na década de 1980 é que a violência sexual na infân-
cia e na adolescência começou a ser estudada no Brasil.
A ideação do Estatuto da Criança e do Adolescente –
ECA, trouxe mudanças significativas tanto no meio social
quanto nas políticas ocorridos no último século. O ECA passar
a considerar as crianças e jovens como pessoas de direitos
que devem ser garantidos de forma absoluta pela família, pelo
Estado e pela sociedade. A violência contra criança e adoles-
cente, que em sua maior parte ocorre no âmbito intrafamiliar,
deixa de ser um assunto privado e passa a ser um problema
de toda a sociedade.
De acordo com Furniss (2002), nos tempos atuais a

82 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

uma crescente preocupação com a saúde física e mental da


criança. Segundo o autor, essa atenção crescente se deu por
causa de dois aspectos: o movimento dos direitos das crianças
e a preocupação com a saúde mental e física. Diante desses
dois aspectos é necessário a atuação de dois diferentes pro-
fissionais, um da área jurídica e um da área da de saúde, de-
vendo atuar de forma conjunta para uma intervenção eficaz e
menos danosa para a vítima. (FURNISS, 2002).
O abuso sexual pode ter diferentes definições, podendo
se diferenciar entre à violência sexual doméstica ou incesto, à
exploração sexual infantil, entre outros. Dessa forma, diferen-
tes aspectos devem ser considerados, por exemplo, cariciais
intimas, relações orais, anais, vaginais com penetração ou
não. Apesar da difícil tarefa de definir o que é um abuso sexual
infantil, é relevante lembrar que a prática abusiva está sempre
acompanhada do não consentimento da vítima e a violência
física e/ou psicológica. A violência sexual pode ser definida
como:

Violência sexual na infância/adolescência


significa os contatos entre crianças/adoles-
centes e um adulto (familiar ou não) nos
quais se utiliza a criança e o adolescente
como objeto gratificante para as necessida-
des ou desejos sexuais do adulto, causando
danos para aqueles” (Ferrari & Vecina,
2002, pp. 83-84).

83 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

De acordo com a Organização Mundial de Saúde –


OMS, o abuso sexual é:

Envolvimento de uma criança em atividade


sexual que ela não compreende completa-
mente, para a qual ela não é capaz de dar
consentimento informado, ou que viole as
leis ou tabus sociais. Abuso sexual infantil é
evidenciado por esta atividade entre uma cri-
ança e um adulto ou outra criança que, pela
idade ou desenvolvimento, está numa rela-
ção de responsabilidade, confiança ou po-
der, sendo a atividade realizada com inten-
ção de gratificar ou satisfazer as necessida-
des da outra pessoa. (OMS, 2021).

Além do tema envolver questões psicológicas e sociais,


é preciso ver o problema a partir de questões jurídicas e legais,
dessa forma, a definição da OMS é mais normativa, não fa-
zendo referência as consequências, embora essas não sejam
difíceis de se perceber. Este tipo de violência não respeita o
desenvolvimento da criança, sua imaturidade, ou seja, acaba
causando uma confusão a respeito do que é confiança e os
papeis sociais que estão envolvidos.

3.1.2 A PERSPECTIVA DO GÊNERO E PERFIL DA VÍTIMA

A violência sexual é um problema de gênero, é um fator


preponderante para que a violência ocorra tanto nas relações
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

interpessoal como nas relações familiares. Em uma escala so-


cial de dominação-exploração que busca a legitimação do po-
der e a imposição da violência tem-se o homem branco, adulto
e rico agindo de forma predominante sobre as mulheres, cri-
anças, pobres e negros. (ARAÚJO, 2021).
As principais vítimas de abuso sexual são mulheres e
crianças do sexo feminino, vale lembrar que isso não exclui os
homens e meninos, estes sofrem violência, mas em menor
proporção, apenas 19,1% das vítimas. Além de um problema
de gênero, a violência sexual também é uma questão de
idade, 72% das vítimas de estupro são do sexo feminino e com
menos de 18 anos. O risco se torna maior quando essas cri-
anças estão na faixa de 10 a 13 anos, sendo 28,6% dos casos.
(FOLHA DE SÃO PAULO, 2021).
Uma em cada quatro meninas e um em cada 10 meni-
nos acaba sendo vítima de violência sexual antes de comple-
tar os seus 18 anos, é importante destacar que esses tipos de
abusos possuem uma dinâmica, em muitos casos é guardado
em segredo por vários anos, isso ocorre porque o abuso pos-
sui uma relação ascendente, ou seja, desencadeia quando a
criança é muito pequena (tem entre 5 a 10 anos) e através de
caricias sutis, com o decorrer do tempo, se torna mais explícito
e ocorre uma manipulação psicológica com a vítima para que

85 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o abuso seja mantido em segredo através de ameaças do abu-


sador e sentimentos de vergonha e medo da vítima. (HABI-
GZANG, 2021).
Estudos mais recentes mostram que alguns grupos de
criança são mais vulneráveis para sofrer violência, por exem-
plo, crianças portadoras de deficiências, crianças pertencen-
tes a grupos minoritários ou grupos marginalizados, crianças
de rua, crianças em conflito com a lei e crianças que são ne-
gligenciadas pelas suas famílias. (RANGEL, 2011).
Maria Regina Azambuja discorre que:

A criança que participa de cenas de violên-


cia sexual costuma expressar forte senti-
mento de culpa, independentemente do grau
de cooperação e da vontade de participar do
abuso, o que exige atenção nos cuidados da
área da saúde mental. Embora nem todas as
crianças submetidas à violência sexual apre-
sentem problemas emocionais, é necessá-
rio, em todos os casos, proceder à avaliação
e encaminhá-las para acompanhamento
sempre que a medida se mostrar necessá-
ria, como forma de minorar os danos que a
violência costuma causar ao seu desenvol-
vimento. A avaliação da criança é medida
que se impõe e tem com o objetivo oportuni-
zar um espaço para que possa se expressar
e, ao mesmo tempo, para ser ouvida, exi-
gindo, sempre que possível, a participação
do grupo familiar. (AZAMBUJA, 2011, p. 133).

Lembrando que a faixa etária não é padronizada ou tem

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

grupos sociais certos, a violência pode alternar e ocorrer de


acordo com o perfil do abusador e a oportunidade na qual ele
se encontra.

3.1.3 DESCRIÇÃO DA FAMÍLIA E PERFIL DO ABUSADOR

Não existe uma possibilidade de definir um perfil fami-


liar propenso a ocorrer o abuso sexual contra a criança. Algu-
mas situações podem facilitar que a violência ocorra, ou seja,
famílias com problemas entre casal, condições precárias de
saúde, uso de substâncias entorpecentes e horários diferentes
de trabalho para os membro da família que favorece para que
o abusador fique sozinho com a vítima.
Vale mencionar que um histórico de negligência e
abuso físico e/ou sexual durante a infância dos genitores ou
responsáveis pela criança podem acarretar desvios futuros e
devem ser averiguados, dessa forma toda deturpação precisa
ser avaliada e tratada para que não possibilite uma revitimiza-
ção. (SOUSA, 2021).
Nas famílias em que a violência sexual está presente, é
comum que as crianças se sintam incompreendidas e não am-
paradas por seus pais ou responsáveis. Como são emocional-
mente imaturas, acabam ficando em silencio e aceitando a
submissão do abuso por terem medo de serem castigadas. A

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

violência ocorre em todas as condições sociais, embora as si-


tuações mencionadas no primeiro parágrafo sejam apontadas
como fatores que aumentam a possibilidade de ocorrência, o
que caracteriza um fator de risco social.
Na maioria das vezes o abusador é alguém do convivo
familiar da vítima, que está sempre no convívio desta, po-
dendo ser qualquer um: pai, mãe, avô, tio, primo, etc. O que
nunca falta nesses casos é a relação de autoridade entre a
vítima e o abusador, este sempre tem vantagem sobre a vítima
por ter uma idade mais avançada e na maioria dos casos faz
uso da força física.
Santos e Alves explicam que:

Mais comumente quem abusa sexualmente


de crianças são pessoas que a criança co-
nhece e que, de alguma forma, podem con-
trolá-la. De cada dez casos registrados, em
oito o abusador é conhecido da vítima. Esta
pessoa, em geral, é alguma figura de quem
a criança gosta e em quem confia. Por isso,
quase sempre acaba convencendo a criança
a participar desses tipos de atos por meio de
persuasão recompensa ou ameaça. (SAN-
TOS; ALVES, 2010).

A grande número dos casos, quase que em sua totali-


dade, acontece com abusadores do sexo masculino, entre-
tanto existem casos em que o abusador é uma figura feminina
e a vítima é do sexo masculino, pode haver relatos de casos
88 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em a vítima e o abusador são do mesmo sexo. Apesar do es-


forço para definir um perfil bem específico para o abusador, na
maioria das vezes, estes se apresentam como pessoas nor-
mais, comuns, que não possui qualquer perfil criminoso. Maria
Regina Fay de Azambuja APUD Telles, explica que:

Segundo Telles (2006), os criminosos sexu-


ais podem ser divididos em três grupos: psi-
cóticos, portadores de personalidade antis-
social e parafílicos. As principais categorias
de parafilias são: exibicionismo, fetichismo,
frotteurismo, pedofilia, masoquismo sexual,
sadismo sexual e voyeurismo. Pedofilia é
definida como a preferência sexual por cri-
anças e raramente é identificada em mulhe-
res, podendo ser entendida como “uma pre-
ferência sexual por crianças, usualmente de
idade prépuberal ou no início da puberdade”
(p. 277). Alguns pedófilos são atraídos ape-
nas por meninas, outros apenas por meni-
nos e outros, ainda são interessados em am-
bos os sexos. Um dado importante a ser as-
sinalado é que a pedofilia não exclui a res-
ponsabilidade penal e tampouco a diminui. A
maior parte dos pedófilos não recebe me-
dida de segurança e a inimputabilidade fica
subordinada à condição de psicótico.
(AZAMBUJA, 2011, p. 134).

Pode-se concluir que aquele que pratica esse tipo de


violência busca sempre demonstrar que é um indivíduo cor-
reto, sem impureza nas suas condutas e isso facilita o seu
contato e aproximação com a vítima.
89 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.2 IMPLICAÇÕES DO ABUSO NO DESENVOLVIMENTO


FÍSICO E PSICOLÓGICO DA CRIANÇA

O abuso sexual no âmbito familiar é uma violência que


afeta o desenvolvimento psíquico normal de uma criança e
atinge de forma brusca todas as relações sociais dentro da
esfera familiar. Dependendo de como cada família lida com
essas questões, os familiares podem ignorar ou valorizar a
ocorrência dessa violência com estratégias de fuga ou silen-
cio, ou podem procurar estratégias para contornar essa situa-
ção procurando confrontar o sofrimento através de um serviço
especializado.
Ao nascer uma criança precisa de um âmbito ao seu
redor para sobreviver, isso causa uma relação de dependên-
cia que é decisiva para o seu desenvolvimento e formação, ou
seja, estabelecer os seus primeiros vínculos são de grande
importância porque a criança necessita de outro para crescer
e formar sua individualidade, precisa de uma figura afetiva de
forma estável para pode construir o alicerce do seu caráter, se
o ambiente em que se desenvolve não for de proteção a sua
identificação será deturpada. (ALMEIDA, 2021).
Quando acontece um caso de violência sexual contra
criança ou adolescente no âmbito familiar, ocorre uma grande
problematização na relação entre os pais e filhos, a partir daí

90 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nasce uma hierarquia danificada. Para Almeida nós podemos


considerar o corpo da seguinte forma:

O corpo é a referência física do sujeito: nele


está a história genética, a marca da heredi-
tariedade; está também a expressão da inte-
ligência, o registro das vivências e a possibi-
lidade das ações/opções. Nele estão as coi-
sas particulares ao indivíduo e também as
próprias da espécie. Ontogenia e filogenia aí
se encontram. Ele contém a sexualidade e a
agressividade. No corpo está o fisiológico e
o instintivo, o não-consciente, o espontâneo,
os papéis psicossomáticos. Nele se imprime
o condicionado, o cultural, o educado, o ro-
botizado, a conserva, os papéis psicodramá-
ticos e sociais. É pelo corpo que o Eu, ex-
pressão psicológica do ser global, integra-se
em seus vários níveis (emocional, intelec-
tual, vivencial). Nele o ser habita e com a
morte biológica desaparece ou transcende.
A vivência do corpo é a vivência de impul-
sos, sentimentos, pensamentos, movimen-
tos; é a consciência do Ser. Consciência
muitas vezes silenciosa e muda. O corpo é
sujeito e objeto do desejo. É a casa do sim-
bólico. O corpo intermedia a percepção, a
emoção e o ato conativo. (ALMEIDA, 1998,
p.58).

Assim o corpo de uma criança expressa os seus senti-


mentos vividos a partir da ocorrência do abuso, quanto mais
cedo acontece o fato de violência física e sexual, mais com-
prometida fica a sua corporalidade, todo o Eu fica desestrutu-

91 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

rado podendo começar a mostrar traços de quadros como sin-


tomas de psicose, todo o corpo é visto como fragmentado, per-
furado, passível de invasões, ou seja, o corpo fica imóvel, pe-
trificado, em estado catatônico.
A maturidade fisiológica e psíquica da vítima determina
as consequências, quanto mais cedo o abuso ocorre, maior é
a chance de as feridas serem inconversíveis, afetando a evo-
lução psicoativa e sexual da criança, afetando relações que
ela poderia construir e impedindo que o período das adoles-
cência seja um período construtivo.
Se essa violência ocorrer entre os 3-4 anos de idade,
as características são definidas como quadros traumáticos,
por exemplo, distúrbio de estresse pós-traumático; sintomas
físicos como problemas alimentares, gravidez indesejada, do-
ença sexualmente transmissíveis; sintomas psicológicos como
dificuldade para dormir, depressão, ansiedade, fugas de casa
e até mesmo tentativas de suicídio. (ALMEIDA, 2021).
O Transtorno de Estresse Pós-traumático – TEPT, é a
consequência mais grave e drástica dos abusos sexuais, Al-
meida explica que:

Com o rompimento constante da intermedi-


ação da realidade o paciente fica sujeito à
inadequação do processamento da informa-
ção e do processo de resolução de proble-
mas em nível cognitivo. Acrescentam que as
92 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

manifestações do TEPT são divididas em


três grupos: 1) reexperimentação dos fenô-
menos (lembranças intrusas, sonhos trau-
máticos, jogos repetitivos, comportamento
de reconstituição, angústia nas lembranças
traumáticas); 2) evitação psicológica (fuga
de sentimentos, pensamentos, locais e situ-
ações, interesse reduzido em atividades ha-
bituais, sentimento de estar sozinho, âmbito
emocional restrito, transtorno de memória,
perda de habilidades já adquiridas, alteração
na orientação com respeito ao futuro); 3) es-
tado de excitação aumentado (transtorno do
sono, irritabilidade, raiva, dificuldade de con-
centração, hipervigilância, resposta exage-
rada de sobressalto e resposta autônoma a
lembranças traumáticas). (ALMEIDA, 2021,
p. 19).

As consequências podem ocorrer a curto e longo prazo,


os imediatos que ocorre nos dois primeiros anos em 80% dos
casos, crianças apresentam distúrbio de alteração de humor,
DST, conduta sexual anormal, angústia, agressões e delin-
quência. Os efeitos a longo prazo afetam a autoestima, a ha-
bilidade para ter relacionamentos, principalmente quando en-
volve relação sexual, e falta de ajuste emocional, fobias, crises
de pânicos, distúrbio alimentares, é possível observar que al-
guns efeitos a curto prazo perduram e continuam a longo
prazo, mas extensão desse dano depende das relações pos-
teriores da vítima.

93 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

É muito comum que crianças abusas estejam aterrori-


zadas, confusas e com muito medo para contar sobre o que
aconteceu, dessa forma, essas crianças permanecem em si-
lencio porque não desejam prejudicar o abusador ou promover
uma fragmentação da família, pois temem que sejam conside-
radas culpadas ou até mesmo castigadas. Algumas atitu-
des e sintomas podem ser observadas e consideradas para
perceber que algo de estranho está acontecendo, como mu-
danças bruscas de comportamento, falta de apetite, insônia,
isolamento ou a criança fica muito perturbada quando deixada
sozinha.
Nos casos de assédio no âmbito familiar ocorre o fenô-
meno conhecido como “segredo e silencio”, ou seja, os abusos
acontecem em segredo, um segredo guardado mediante vio-
lência ou ameaças, para manter a coesão familiar e assim for-
mar uma barreira para que não seja recebida a crítica ou jul-
gamento do meio social e, assim, as crianças ou adolescentes
abusados se calam, mesmo que isso traga efeitos psicológi-
cos e físicos irreversíveis.
Por isso, é importante sustentar com firmeza e segu-
rança a palavra da vítima, fornecendo sempre o apoio neces-
sário, caso isso não aconteça a vítima pode se fechar porque
não tem uma perspectiva de receber ajuda, pois já passou

94 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pela experiência do abuso, falta de respeito e a relação de po-


der exercida por um adulto.
Na ocorrência do abuso a vítima está sozinha com o
abusador, é uma experiência aterrorizante e o silencio é man-
tido através de ameaças como “não diga nada para sua mãe,
se ela souber vai matar você”, na maioria das vezes, além das
ameaças a vítima também é chantageada com presente para
manter o silencio, causando uma confusão e fazendo-a enten-
der que de alguma forma é querida pelo abusador.
O temor da criança pode ser associado ao chamado fe-
nômeno desqualificação da comunicação, a vítima se comu-
nica de uma forma que vai invalidar sua própria comunicação
ou a do outro, podendo ser através de falas contraditórias, in-
coerências, bruscas mudanças de assunto, comentários lite-
rários e interpretações literárias de metáforas. Esse comporta-
mento ocorre porque a vítima está em uma situação que quer
se comunicar, mas quer evitar um compromisso efetivo na co-
municação por ter receio e medo. (ALMEIDA, 2021).
Podem ocorrer, ainda, fatores psicológicos como culpa,
negação e dissociação, ou seja, a criança ou adolescente se
sente culpa pelo que ocorreu porque carrega um senso de ter
sido responsável pelo abuso. A negação é uma defesa desen-
volvida de forma inconsciente, impedindo que vítima veja o

95 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ocorrido como um abuso, é uma atitude que visa negar a rea-


lidade. A dissociação também é um mecanismo de defesa, é
a separação do abuso sexual dos sentimentos, tem como ob-
jetivo fazer com que a situação traumática não interfira na sua
vida futura. (FURNISS, 2002).
O abuso sexual da criança causa uma ruptura na sua
sequência normal de organização da saúde mental, física e
sexual, causando um desenvolvimento forçado e falho, fa-
zendo com que as suas necessidades legitimas e as expres-
sões mentais saudáveis sejam ignoradas.

3.3 ASPECTOS JURÍDICOS

3.3.1 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A luz do princípio do melhor interesse da criança e do


adolescente, a criança e o adolescente passam a ser conside-
radas como um sujeito de direitos, com prioridade na tutela do
ordenamento jurídico. A partir do reflexo de uma nova Consti-
tuição, a promulgação do Estatuto da Criança e do Adoles-
cente – ECA, promulgado em 13 de julho de 1990, foi um ponto
de partida decisivo para que a criança e o adolescente deixas-
sem de ser um objeto de ação opressiva do Estado.
Na leitura dos primeiros artigos já é possível visualizar

96 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a proteção integral reafirmando a responsabilidade da família,


da comunidade, da sociedade em geral e do poder público,
que tem como objetivo assegurar, com prioridade absoluta, a
efetivação e garantia dos direitos previstos às crianças e ado-
lescentes que constam no art. 227 da Constituição Federal/88,
in verbis:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e


do Estado assegurar à criança, ao adoles-
cente e ao jovem, com absoluta prioridade,
o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade
e à convivência familiar e comunitária, além
de colocá-los a salvo de toda forma de negli-
gência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.
(...)
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a vi-
olência e a exploração sexual da criança e
do adolescente.

Podemos observar que a proteção integral desses su-


jeitos está entrelaçada com a condição de indivíduo em de-
senvolvimento que necessita de um olhar mais ampliado e de
proteção em diferentes formas e aspectos no seu ciclo familiar
e social. Em outras palavras, esses sujeitos estão em período
de formação que compreende todos os aspectos como, físi-
cos, emocionais e intelectuais, ou seja, a formação incompleta
97 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os torna incapaz de exercer e lutar por seus direito, ou, ainda,


garantir a sua própria proteção, assim fica sob a responsabili-
dade de um adulto exercer e assumir esse papel de proteção
por direitos constitucionalmente previstos, salvando esses cri-
anças e adolescente de qualquer forma de violência e negli-
gencia.
Analisando os dados do Disque 100, só no ano de 2017
foram mais de 95.000 (noventa e cinco mil) denúncias envol-
vendo violação de direitos de crianças e adolescentes, ga-
nhando destaca a violência física, psicológica, sexual e insti-
tucional. Em se tratando da violência sexual, o Boletim Epide-
miológico do Sistema de Informação de Agravos de Notifica-
ção – SINAN, apresentou um relatório usando como referência
os anos de 2011 a 2017, onde se teve um total de 184.524
registros de violência sexual, 31% dos casos eram de violência
contra criança e 45% desses casos envolviam violência sexual
contra adolescente. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018).
A Lei n º 13.431/17, alterou o Estatuto da Criança e do
Adolescente instituindo o Sistema de Garantia de Direitos da
Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência.
Isso representou um grande avanço, podendo destacar entre
alguns, as definições dos tipos de violência, além da criação
de mecanismos para prevenir as violações de direito e esta-

98 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

belecimento de protocolos para medidas de proteção e assis-


tência a esses sujeitos em situação de testemunha ou vítima
de violência.
A nova lei conceitua os tipos de violência da seguinte
forma: violência física, é todo ato cometido contra a criança ou
adolescente que agrida sua integridade ou saúde corporal e
que provoque danos físicos; violência psicológica, é todo con-
duta que envolva difamação, depreciação ou desrespeito, po-
dendo, ainda, ser acompanhada de ameaça, agressões ver-
bais, humilhações, isolamento, ridicularizações ou intimidação
que cause danos psicológicos e emocionais; violência institu-
cional, é a conduta violenta que pode ser pratica por institui-
ções ou entidades públicas e conveniadas, podendo gerar re-
vitimizações; violência sexual, qualquer conduta que exponha
a criança ou adolescente a viver diretamente ou indiretamente
conjunção carnal, ou qualquer ato libidinoso, seja de modo
presencial ou eletrônico. (BRASIL, 2021).
Antes do ECA, as leis brasileiras não mencionavam
qualquer mecanismo para proteção de crianças ou adolescen-
tes que sofriam com situações de abuso e exploração sexual.
Vejamos o art. 130 do ECA:

Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tra-


tos, opressão ou abuso sexual impostos pe-

99 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

los pais ou responsável, a autoridade judici-


ária poderá determinar, como medida caute-
lar, o afastamento do agressor da moradia
comum.
Parágrafo único. Da medida cautelar cons-
tará, ainda, a fixação provisória dos alimen-
tos de que necessitem a criança ou o ado-
lescente dependentes do agressor.

Noutrora o abuso sexual não era nem mencionada, o


crime era definido por maus tratos, castigos imoderados ou si-
tuações que ofendiam a moral, hoje, além da definição, o ECA
define as penalidades para quem pratica esse tipo de crime.
Outra atualização foi a definição e punição para exploração
sexual e a proteção no mundo virtual, de acordo com os arts.
241 e 241D, in verbis:

Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia,


vídeo ou outro registro que contenha cena
de sexo explícito ou pornográfica envol-
vendo criança ou adolescente: (Redação
dada pela Lei nº 11.829, de 2008)
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito)
anos, e multa.
(...)
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou
constranger, por qualquer meio de comuni-
cação, criança, com o fim de com ela praticar
ato libidinoso:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos,
e multa.
100 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre


quem:
I – facilita ou induz o acesso à criança de
material contendo cena de sexo explícito ou
pornográfica com o fim de com ela praticar
ato libidinoso;
II – pratica as condutas descritas no caput
deste artigo com o fim de induzir criança a
se exibir de forma pornográfica ou sexual-
mente explícita.

A exploração sexual não era aborda assim de forma ex-


plicita pelo Código, a única menção existe era de “exploração
em atividade contrária aos bons costumes”, mas sem muitas
especificações do que de fato isso significaria. A ampliação
para proteção no meio virtual também é um grande avanço,
passando a ser considerado como crime, e agentes do go-
verno devem trabalhar para fornecer uma rede proteção na in-
ternet. Essas alterações são para garantir a proteção integral
das crianças e adolescentes para prevenir, superar e reparar
as violências que envolvem esses sujeitos, que infelizmente
ainda é uma grande parcela da população afetada por várias
formas de violações de direito. (VICINGUERA, 2021).
O art. 130 do ECA já foi utilizado para embasar um caso
de abuso sexual de uma criança de nove anos, para que fosse
concedido a aplicação das medidas de proteção previstas no
Estatuto da Criança e do Adolescente:

101 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DA CRIANÇA


E DO ADOLESCENTE. ABUSO SEXUAL.
MEDIDAS DE PROTEÇÃO. CABIMENTO.
RELATÓRIO DO CONSELHO TUTELAR
CORROBORANDO OS FATOS. INDEPEN-
DÊNCIA COM A INSTÂNCIA CRIMINAL.
CAUTELAR DE AFASTAMENTO DO LAR
DO PADRASTO. POSSIBILIDADE. ART.
130 DO ECA. RECURSO PROVIDO. DECI-
SÃO REFORMADA.1. Versa o efeito sobre
pedido formulado pelo Ministério Público,
em favor de criança em situação de risco,
para aplicação das medida de proteção pre-
vistas no Estatuto da Criança e do Adoles-
cente (ECA). 2. In casu, como se depreende
da peça inicial, corroborada pelo relatório do
Conselho Tutelar, a criança, quando contava
com 9 (nove) anos de idade, teria sofrido
abuso sexual por parte do seu padrasto, fato
este narrado à sua professora e confirmado
em vista das conselheiras, acompanhadas
de uma psicóloga, além do relato de vizinhos
atestando o comportamento repugnante do
possível ofensor. 3. Nas hipóteses de violên-
cia sexual, a legislação minoril determina
que “Verificada a hipóteses de maus-tratos,
opressão ou abuso sexual impostos pelos
pais ou responsável, a autoridade judiciaria
poderá determinar, como medida cautelar, o
afastamento do agressor da moradia co-
mum” (art. 130). 4. (...). (BAHIA, 2021).

O ECA é um avanço importante para a proteção dos


direitos de crianças e adolescentes, estabelecendo a respon-
sabilidade do Estado, da familia e da sociedade para garantir
102 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

uma infância e uma adolescência digna, livre de qualquer vio-


lência, pode-se dizer que é uma superação de uma ausência
de direitos.

3.3.2 CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL NO CÓ-


DIGO PENAL

O abuso sexual intrafamiliar praticado contra criança é


tutelado no art. 217-A do Código Penal Brasileiro e é definido
como “estupro de vulnerável”, tutela a dignidade sexual do me-
nor de 14 anos ou qualquer pessoa enferma ou portadora de
doença mental. A partir da Lei nº 12.015/09, cometer estupro
contra esses sujeitos deixou de ser tutelado pelo art. 213 do
Código Penal e passou a configurar crime grave nomeado “es-
tupro de vulnerável”, previsto no art. 217-A, in verbis:

Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar
outro ato libidinoso com menor de 14 (ca-
torze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze)
anos.
§1º Incorre na mesma pena quem pratica as
ações descritas no caput com alguém que,
por enfermidade ou deficiência mental, não
tem o necessário discernimento para a prá-
tica do ato, ou que, por qualquer outra

103 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

causa, não pode oferecer resistência.


§2º (vetado)
§3º Se da conduta resulta lesão corporal de
natureza grave:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte)
anos.
§4º Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta)
anos.

Essa alteração fez uma harmonização com o título


constante na Constituição Federal de 1988, no qual, em seu
artigo 1º, III, estabelece como fundamento da República Fede-
rativa a dignidade da pessoa humana, sendo um valor abso-
luto e fonte de toda a ordem social.
A vulnerabilidade pode ser definida de várias formas, é
um conceito bastante amplo e leva em consideração a prote-
ção do Estado com determinadas pessoas e determinadas si-
tuações, ou seja, pode-se considerar como vulnerável qual-
quer pessoa que esteja em uma situação de fragilidade. Fer-
nando Capez explica o que é uma relação de vulnerabilidade:

A lei não se refere aqui à capacidade para


consentir ou à maturidade sexual da vítima,
mas ao fato de se encontrar em situação de
maior fraqueza moral, social, cultural, fisioló-
gica, biológica etc. Uma jovem menor, sexu-
almente experimentada e envolvida em

104 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

prostituição, pode atingir às custas desse


prematuro envolvimento um amadureci-
mento precoce. Não se pode afirmar que
seja incapaz de compreender o que faz. No
entanto, é considerada vulnerável, dada a
sua condição de menor sujeita à exploração
sexual. (CAPEZ, 2012, p.117).

É muito comum que o judiciário receba várias deman-


das de estupro envolvendo menores de quatorze anos, na
maioria desses casos a defesa alega o consentimento da ví-
tima, com intuito de afastar a ilicitude da conduta. Mas a juris-
prudência majoritária entende pela condenação do autor do
crime, uma vez que o consentimento é irrelevante quando se
trata de uma pessoa vulnerável. Vejamos uma decisão do Su-
premo Tribunal Federal:

EMENTA HABEAS CORPUS. ESTUPRO.


VÍTIMA MENOR DE QUATORZE ANOS.
CONSENTIMENTO E EXPERIÊNCIA AN-
TERIOR. IRRELEVÂNCIA. PRESUNÇÃO
DE VIOLÊNCIA. CARÁTER ABSOLUTO.
ORDEM DENEGADA. 1. Para a configura-
ção do estupro ou do atentado violento ao
pudor com violência presumida (previstos,
respectivamente, nos arts. 213 e 214, c/c o
art. 224, a, do Código Penal, na redação an-
terior à Lei 12.015/09), é irrelevante o con-
sentimento da ofendida menor de quatorze
anos ou, mesmo, a sua eventual experiência
anterior, já que a presunção de violência a
que se refere a redação anterior da alínea a

105 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

do art. 224 do Código Penal é de caráter ab-


soluto. Precedentes (HC 94.818, rel. Min. El-
len Gracie, DJe de 15/8/08). 2. Ordem dene-
gada. (BRASIL, 2021).

Antes havia a chamada presunção de violência em ca-


sos de estupro de menores de quatorze anos, alienados ou
débeis mentais ou contra quem não pudesse oferecer resis-
tência, mas o STF consolidou o entendimento de que a violên-
cia presumida foi eliminada pela Lei nº 12.015/09, ou seja, a
simples conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com pes-
soa vulnerável é suficiente para que seja consubstanciado o
crime de estupro.
Para o crime previsto no art. 217-A, a pena é de reclu-
são é de no mínimo 8 anos, enquanto no antigo art. 213 a pena
mínima era de 6 anos. O elemento subjetivo do crime é o dolo,
consolidado pela vontade de ter conjunção carnal ou praticar
ato libidinoso com um indivíduo nas condições previstas no
caput ou no §1º do art. 217-A, e não é exigida nenhuma finali-
dade especial, ou seja, é suficiente a vontade de submeter a
vítima à prática de relações sexuais. (CAPEZ, 2010).
Os sujeito ativos do delito podem ser autores ou partí-
cipes, o autor é aquele que pratica a conjunção carnal ou o ato
libidinoso com o vulnerável, o partícipe é aquele que não exe-
cuta os núcleos do crime definidos como “ter” ou “praticar”,
mas concorre de outra maneira para que alguém pratique o
106 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

tipo penal, ao partícipe é aplicado o art. 132, §2º, do CP, que


constitui o crime de omissão e incidem as causas de aumento
previstas no art. 226, II, do CP. É importante salientar que a
presença de violência e/ou grave ameaça, que não são inte-
grantes do tipo penal, não exclui o estupro de vulnerável e po-
dem servir de causa de aumento ou, se for o caso, servir para
o reconhecimento do concurso de crimes.
O crime será qualificado caso resultem lesões corporais
graves ou gravíssimas ou morte, de acordo com o os parágra-
fos 3º e 4º do art. 217-A do CP, mas vale lembrar que a lei
ignora o fato de que podem ocorrer lesões emocionais, que
deixam marcas definitivas na vítima e que se não forem trata-
das de forma correta deveriam servir como um elemento para
a qualificação do delito. (NAKATANI, 2021).
Em relação a consumação, ela ocorre com a conjunção
carnal ou com a prática do ato libidinoso na vítima vulnerável,
mas se o agente pratica atos preparatórios à conjunção carnal
e por razões alheias a sua vontade, não consiga pratica o
crime, a doutrina entende que o delito será consumado, uma
vez que para a pratica de atos libidinosos é suficiente para que
fique caracterizado o tipo penal.
Os crimes de abuso sexual contra vulneráveis é proces-
sado mediante ação pública incondicionada de acordo com os

107 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

termos do art. 225, parágrafo único, do Código Penal, in ver-


bis:

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos


I e II deste Título, procede-se mediante ação
penal pública condicionada à representação.
Parágrafo único. Procede-se, entretanto,
mediante ação penal pública incondicionada
se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou
pessoa vulnerável.

Antes das alterações trazidas pela Lei nº 12.015/09, a


ação para crimes contra a liberdade sexual era de inciativa pri-
vada do ofendido, mas podendo ser pública a depender da si-
tuação específica, como por exemplo quando o crime fosse
cometido com abuso do pátrio poder, tutela ou curatela. De-
pois das alterações, a regra é ação penal pública condicionada
a representação para os crimes contra a dignidade sexual e
ação penal pública incondicionada para os crimes sexuais pra-
ticados contra vulneráveis, esse também é o entendimento da
Súmula nº 608 do STF: “No crime de estupro, praticado medi-
ante violência real, a ação penal é pública incondicionada”.
O Código Penal Brasileiro ainda prevê mais três tipos
penais sobre crimes sexuais contra pessoas vulneráveis: Art.
218, mediação de vulnerável para satisfazer lasciva de ou-

108 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

trem, ou seja, o crime é praticado por terceiro; Art. 218-A, sa-


tisfação de lasciva mediante a presença de criança ou adoles-
cente, aqui o bem jurídico tutelado é a psique da criança e
menor que embora não participe do crime, presenciou o fato
praticado; e Art. 218-B, favorecimento da prostituição ou outra
forma de exploração sexual de vulnerável, punisse a atividade
de quem tira vantagem da prostituição ou de outra forma de
exploração de pessoa vulnerável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O abuso sexual intrafamiliar é uma realidade que não


pode ser ignorada, fazendo parte de grande parte da popula-
ção brasileira. É perceptível que a cada ano várias crianças e
adolescentes são vítimas de abusos nos seus próprios lares.
O lar e as pessoas que estão no convívio desses sujeitos im-
plicam muito para o seu desenvolvimento e a sua personali-
dade, esse meio é uma parte fundamental para o desenvolvi-
mento social e psicológicos dessas crianças.
Um grande avanço para tratar o problema foi o reconhe-
cimento da criança e do adolescente como sujeito de direito, a
preocupação com a suas vulnerabilidades fazem jus com essa
proteção especial. Mesmo com esses avanços, no Estatuto da
Criança e do Adolescente e no Código Penal Brasileiro, ainda
109 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

vemos muitas noticiais de casos em que crianças são vítimas


de abuso sexual, ou seja, a atuação do direito precisa ter como
parceria outros ramos de conhecimento para que sejam feitos
meios de prevenção.
A prevenção pode ser feita de várias formas como a
educação de crianças e adolescente para que aprendam au-
todefesa contra o abuso, conhecimentos de regras que permi-
tam que esses sujeitos consigam identificar até que ponto é
aceitável o comportamento de um adulto.
É preciso conscientização da sociedade através de
campanhas, enfatizando a importância da denúncia, qualifica-
ção de profissionais que trabalham diretamente com esses su-
jeitos para que possam identificar possíveis casos de abuso,
atuação do Poder Judiciário na apuração de crimes contra vul-
neráveis e a condenação do agressor e garantindo sempre a
proteção e direitos das vítimas. Por último e não menos impor-
tante, é de extrema importância o tratamento psicológico e psi-
quiátrico para as vítimas para que se evite, por exemplo, o
transtorno de estresse pós-traumático.
É importante destacar que mesmo com previsão no Có-
digo Penal Brasileiro como estupro de vulnerável, esse delito
não tem solução apenas com a privatização da liberdade do
autor, essa medida é um efeito meramente paliativo para afas-

110 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

tar a vítima do seu agressor e da sociedade, para um verda-


deiro combate é preciso pensar além das normas do direito, o
abuso sexual não pode ser cercado por silencio e ignorância.

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nal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que
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113 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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24 nov. 2021.

114 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4
TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO:
A PROTEÇÃO JURÍDICA DOS ANIMAIS DE
ESTIMAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO

LEGAL PROTECTION OF PET: THE LEGAL


PROTECTION OF PET ANIMALS IN THE CONSTITUTION

Jéssica Texeira Ramos7


Williane Tiburcio Facundes8

RAMOS, Jéssica Teixeira. Tutela Jurídica Dos Animais De


Estimação: A Proteção Jurídica Dos Animais De Estima-
ção Na Constituição. Trabalho de conclusão de Curso de
graduação em Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio
Branco, 2022.

7
Discente do 9º Período do Curso de Bacharelado em Direito pelo Centro
Universitário Uninorte.
8
Graduada em Direito pela U:VERSE. Especialista em Psicopedagogia
pela Universidade Varzeagrandense. Graduada em Letras Vernáculas pela
Universidade Federal do Acre-UFAC.
115 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo tem o intuito de analisar a tutela jurídica


dos animais de estimação a proteção jurídica destes a
luz da constituição, dessa forma, o estudo teórico foi de
acordo com uma vasta análise literária, preceitos históricos,
previsões na legislação vigente, além de artigos e pensamen-
tos de autores a respeito do tema em relação a segurança
jurídica. Portanto, o estudo foi baseado em conceitos e acon-
tecimentos em relação aos fatos que norteiam a tutela jurídica
dos animais, como estes são protegidos a luz da constituição
no meio em que se encontra em relação ao Direito Constitu-
cional, Direitos Fundamentais, evidenciando o posiciona-
mento de doutrinadores natos no que diz respeito a esse as-
sunto e sua importância. O presente artigo tem o intuito de
gerar uma reflexão na vida dos leitores e agregar mais co-
nhecimento em relação a este assunto, de fundamental im-
portância.

Palavras-Chaves: tutela jurídica; animais; Constituição Fe-


deral; proteção.

116 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This article aims to analyze the legal protection of pets the legal
protection of these in the light of the constitution, in this way,
the theoretical study was in accordance with a vast literary ana-
lysis, historical precepts, provisions in the current legislation, in
addition to articles and thoughts of authors on the subject in
relation to legal certainty. Therefore, the study was based on
concepts and events in relation to the facts that guide the legal
protection of animals, as they are protected in the light of the
constitution in the environment in which it is in relation to Cons-
titutional Law, Fundamental Rights, evidencing the position of
indoctrinators born with regard to this subject and its impor-
tance. This article aims to generate a reflection on the lives of
readers and add more knowledge in relation to this subject,
which is of fundamental importance.

Keywords: legal guardianship; animals; Constitution; protec-


tion.

117 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

O presente projeto de pesquisa é apresentado à disci-


plina de metodologia científica, do Centro Universitário do
Norte, da cidade de Rio Branco. O objeto da pesquisa é a aná-
lise da tutela jurídica dos animais de estimação a proteção ju-
rídica destes a luz da constituição, fazendo uma abordagem
sobre o Direito Civil e Constitucional, como os animais estão
descritos nessa seara do direito.
Em uma primeira abordagem elucidou-se sobre a capa-
cidade jurídica e civil no direito brasileiro, o direito civil encai-
xou o conceito de capacidade ao de personalidade jurídica,
pois, se completam, sendo a personalidade reconhecida como
um valor e a capacidade jurídica como a medida desse valor,
tornando a capacidade plena para alguns e limitada para ou-
tros.
Neste presente artigo busca mostrar ao leitor, uma linha
de raciocínio que buscar demonstrar através do direito a dis-
tinção entre pessoas e coisas, a capacidade e incapacidade
civil, mostrando que há um viés de entendimento que animais
apesar de não possuírem discernimento e serem racionais,
são sujeitos de direito.
Foi nessa luta de mudar a visão antológica dos seres
humanos em relação a animais serem visto como coisas, que

118 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

muito projetos de lei foram criados, porém nem todos aprova-


dos, o presente estudo aborda leis que demonstram a mu-
dança de paradigma dos direitos de animais.
No sentido de elucidar o porquê de um direito tido como
de suma importância pois animais merecem todo respeito e
estes são sujeitos de direito, e apesar de ser um assunto
fundamental e está estabelecido na constituição e nas leis,
muitas vezes em todo Estado brasileiro não é aplicado a
devida proteção aos animais, bem como a tutela jurídica deste.
O presente trabalho está embasado em pesquisas
bibliográficas que buscam apresentar aspetos históricos da
evolução da tutela jurídica dos animais de estimação a
proteção jurídica destes a luz da constituição.

4.1 DA CAPACIDADE JURÍDICA NO DIREITO CIVIL BRA-


SILEIRO

A capacidade Jurídica é associada aos direitos e deve-


res da ordem civil, é o ato de contrair direitos e obrigações e
poder exercê-los, sem precisar ser representado por um ter-
ceiro, o sujeito de direito é o indivíduo dotado com a capaci-
dade plena de agir dentro dos limites ao qual a lei estabelece,
diferente de quem detêm personalidade jurídica, que é adqui-

119 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

rida logo no nascimento, não podendo ser recusada ao ser hu-


mano, este não pode abrir mão de tal capacidade pois está é
ligada a ele com o seu nascimento.
Nessa vertente, todo ser humano é dotado de perso-
nalidade Art. 1º, Código Civil, “toda pessoa é capaz de direitos
e deveres na ordem civil”.
O novo Código Civil dedica o capítulo II a uma determi-
nada categoria dos direitos. Na legislação, concerne tanto a
jurisprudência quanto a doutrina para identificar e definir os di-
reitos de personalidade, onde estão constantemente se ex-
pandindo.
Dessa forma, o direito civil encaixou o conceito de ca-
pacidade ao de personalidade jurídica, pois, se completam,
sendo a personalidade reconhecida como um valor e a capa-
cidade jurídica como a medida desse valor, tornando a capa-
cidade plena para alguns e limitada para outros.
Se fazendo necessário o preenchimento de alguns re-
quisitos, para que haja por si só, também intitulada como ca-
pacidade de exercício, de ação ou capacidade civil, alguns dos
requisitos necessários são, desenvolvimento mental, saúde e
maioridade, que no Brasil é a partir dos 18 anos:

Art. 3º São absolutamente incapazes de


exercer pessoalmente os atos da vida ci-
vil os menores de 16 (dezesseis) anos.

120 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 4º São incapazes, relativamente a cer-


tos atos ou à maneira de os exercer: (Reda-
ção dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vi-
gência)
I - os maiores de dezesseis e menores de
dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tó-
xico; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)
III - aqueles que, por causa transitória ou
permanente, não puderem exprimir sua von-
tade; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos indíge-
nas será regulada por legislação especial.
(Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)

4.1.1 INCAPACIDADE ABSOLUTA E INCAPACIDADE


RELATIVA

A incapacidade absoluta refere-se a pessoas que não


podem praticar seus atos jurídicos sozinhas, mas que repre-
sentadas podem dispor de direitos e obrigações, os únicos ab-
solutamente incapazes segundo o art. 3° do código civil de
2002, são os menores de 16 anos também denominados como
menores impúberes, isso depois da mudança feita pelo esta-
tuto da pessoa com deficiência Lei 13.145/2015, onde revogou
todos os diplomas legais que se referiam as pessoas com de-

121 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ficiência como absolutamente incapazes o que era conside-


rado um ato de discriminação, gerando muitas polêmicas e
discursões desde sua entrada em vigor.
Tratando-se do menor impúbere entendesse que não
há a necessidade de nenhum processo de interdição ou da
nomeação de um curador levando em consideração o critério
etário (presunção absoluta de incapacidade), eles são consi-
derados absolutamente incapazes por não ter a idade onde se
é possível atingir o discernimento do que é certo e errado na
ordem privada, não protegendo assim seus interesses.
A incapacidade relativa por sua vez, obtiveram algumas
poucas alterações pelo Estatuto de pessoa com deficiência,
em seu art. 4° do código civil de 2002, onde em seu inciso II
teve a retirada da menção aos que por serem portadores de
alguma deficiência mental teriam seu discernimento reduzido,
sendo substituído por (pessoas que em causa transitória ou
definitiva que não puderem exprimir vontade), o intuito foi a
plena inclusão das pessoas com deficiência.
São consideradas pelo código civil brasileiro pessoas
relativamente incapazes de exercer certos atos da vida civil:
os maiores de dezesseis anos e menores de dezoito anos; os
ébrios habituais e os viciados em tóxicos; aqueles que, por
causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua
vontade; ainda faz menção em seu parágrafo único a capaci-
dade dos indígenas.

122 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A incapacidade relativa na maioria dos casos é tida


como temporária, como quando um menor atingi a maioridade
civil, que no ordenamento brasileiro é a partir dos 18 anos de
idade, entretanto mesmo se tratando de menores relativa-
mente incapazes, existem atos jurídicos que podem ser reali-
zados por eles, mesmo sem uma assistência, como contrair
matrimonio se casando, necessitando apenas da autorização
de seus pais ou responsáveis, ser eleitor, ser empresário e até
mesmo elaborar testamento.
Esses são alguns dos vários atos jurídicos que podem
ser exercidos pelos relativamente menores; em alguns casos
específicos também é possível a antecipação dos efeitos da
maioridade civil, a chamada emancipação que está prevista
em seu art. 5° parágrafo único do código civil brasileiro.
Todavia existem pessoas relativamente incapazes que
não são de maneira transitória podendo durar por muito
tempo, como é o caso do alcoólatra contumaz, nesses casos
deverá haver um processo especifico para nomeação de um
curador.

4.1.2 DIFERENÇA ENTRE PESSOAS E COISAS

Pessoas são sujeitos de direitos e deveres enquanto


coisas são objetos de direitos deveres, isso se deve ao fato de
que as pessoas têm personalidade jurídica que é a capacidade

123 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de ser sujeitos de deveres; capacidade essa adquirida com o


nascimento com vida.Por serem desprovidas de tal capaci-
dade jurídica, bens são então considerados objetos abetos a
apropriação do ser humano.
Para o código civil Brasileiro de 2002 os animais de es-
timação são enquadrados como coisas, bens semoventes:
“Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento pró-
prio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da subs-
tância ou da destinação econômico-social.”
O Código Civil Brasileiro encontra-se relapso, em rela-
ção a uma definição correspondente aos animais e sua tutela
jurídica, tendo então que se trabalhar com conceitos espaça-
dos e jurisprudências:

O Direito Civil Brasileiro encontra-se de-


satualizado em relação às demais normas
vigentes que abordam o respectivo tema da
tutela animal, há, de um lado, normas que
visam proteger e garantir o bem-estar dos
animais, como a Constituição Federal de
1988 e a Lei dos Crimes Ambientais, e, de
outro, a legislação civil que conceitua os
animas como coisas, ignorando que es-
tes são seres dotados de sensibilidade,
sentimentos e capacidade de raciocínio.
A atualização da conceituação dos animais
no Código Civil brasileiro é urgente, sendo
fundamental que, para isso, ocorra um
debate técnico aprofundado sobre a
correta caracterização dos animais e defi-
nição da abrangência de sua tutela pelo
124 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Direito Civil contemporâneo. Assim este


segmento do direito passará a acompa-
nhar as mudanças nos paradigmas jurídi-
cos globais, guiando-se por jurisprudências
e costumes contemporâneos, de forma a
abranger eficaz e adequadamente todos os
seres vivos que compõem a sociedade e o
meio ambiente, considerando este como o
conjunto de condições, leis, influências e in-
terações de ordem física, química e bio-
lógica, que permite, abriga e rege a vida
em todas as suas formas, nos termos do
artigo 3° da Lei nº. 6.938/81(FARIA;ME-
DONÇA 2020)

Os animais serem considerados como coisas foi o mo-


tivo de várias, discursões, pois se sustenta o fato de serem
sujeitos de direito, afastando a visão antropocêntrica que ca-
racteriza eles no mesmo patamar, atualmente os animais de
estimação são considerados como parte da família, e sendo
tratados como tal, uma vez que a relação de seres humanos e
animais se tem como base o sentimento, se fazendo então ne-
cessário corrigir essa injustiça com o intuito de impedir a tirania
e zelando pelo bem está e proteção desses seres.
Foi pensando nisso que a câmara dos deputados apro-
vou o projeto de lei n.27/2018, alterando assim a forma como
o ordenamento jurídico brasileiro se refere a eles, sendo então
considerados sujeitos de direito despersonificados, conce-
dendo-lhes natureza jurídica sui generis, dos quais devem go-
zar e obter tutela jurisdicional em caso de violação alterando o
125 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

positivo à Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 (leis de


crimes ambientais), buscando penas mais graves aos maus
tratos, impedindo que continuem sendo tratados como coisa.
É um pequeno passo, mas com um avanço significativo
para os direitos dos animais no Brasil, pois passaram de coisa
para sujeitos de direitos personificados perante o ordena-
mento jurídico brasileiro, dessa forma mesmo sendo conside-
rados como sujeitos de direitos não possuem deveres, são se-
res sencientes, dotados de inteligência emocional e passiveis
de sofrimento.
Com essa vitória os animais ganham mais uma defesa
jurídica contra os maus tratos, pois agora fora reconhecido que
são seres passiveis de sentimento, sofrimento emocional e
dor, é uma nova visão legislativa a esses seres.
Regulamento do novo dispositivo a seguir:

Art. 1° - Esta Lei estabelece regime jurídico


especial para os animais domésticos e sil-
vestres.
Art. 2° - Constituem objetivos fundamentais
desta Lei:
I. Afirmação dos direitos dos animais e sua
respectiva proteção;
II. Construção de uma sociedade mais cons-
ciente e solidária;
III. Reconhecimento de que os animais pos-
suem personalidade própria oriunda de sua

126 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

natureza biológica e emocional, sendo seres


sensíveis e capazes de sofrimento.
Art. 3º - Os animais domésticos e silvestres
possuem natureza jurídica sui generis,
sendo sujeitos de direitos despersonifica-
dos, dos quais podem gozar e obter a tutela
jurisdicional em caso de violação, sendo ve-
dado o seu tratamento como coisa. (BRA-
SIL, 2013)

4.2 O DIREITO DE PERSONALIDADE

Os direitos de personalidade, antecipadamente a


positivação do Estado, já seriam motivos de uma proteção
jurídica, que de forma franca, fica inserido entre o Direito
Natural. Bem no início do liberalismo e a motivação de Escola
de Direito Natural, onde já estudava sobre o direito positivo,
onde incentivaram uma noção dos direitos originários,
irrenunciáveis e inatos do ser humano.
O direito geral de personalidade, ocorreu no século
passado, na segunda metade, quando acabou a segunda
guerra. A repercussão foi muito grande pelo desastre ocorrido
nesse conflito. Além disso, o aumento social no consumismo
resultou em uma ideia para aplicar a tutela de personalidade
humana.
Essa tutela, possui muitas características individuais,
o que aparentou insatisfatório para proteger o ser humano na
atual sociedade. Textos infraconstitucionais e constituições
127 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

passaram por diversos lugares, para mostrar que existe um


direito geral de personalidade, não deixando de exaltar certas
expressões individuais.
Ao seguir essa situação do mundo, a Constituição
Federal, como já viram, estabelece em seu art. 1º, inciso III,
sobre a dignidade da pessoa humana como um de seus
fundamentos, que atribuem a alguém e exige respeito do
próximo, em todos os quesitos e diversas opiniões a respeito.
Além do mais, em seu inciso X do art. 5º da
Constituição da República, faz referência dos direitos
especiais, sobre a vida privada, imagem, intimidade. Outros
métodos constitucionais juntam formas especiais da
personalidade, e no inciso III, ressalta bem quando fala que
nenhuma pessoa será torturada, e nem algum outro tipo de
intervenção.
A cada momento, aparece uma nova forma dessa
personalidade, e se sobressai à momento de interesse
jurídico. Portanto, seja qual for as chances de tentar
enumerar, estará diante da desistência. Não sendo possível
essa enumeração das mais variadas peculiaridades
suscetíveis a serem protegidos, de certa forma poderá
decorrer de que a personalidade não seja um direito em si,
mas sim um valor.

128 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4.3 PERSONALIDADE JURÍDICA DOS ANIMAIS AO


LONGO DA HISTÓRIA

É de conhecimento que a relação humana com os ani-


mais é bem antiga, anterior a qualquer visão filosófica, econô-
mica ou política, sendo retratada por historiadores e até
mesmo por pinturas rupestres, desde então nota-se o cuidado
e o carinho com os animais de estimação sendo descritas vá-
rias práticas culturais de endeusamento desses seres, ficando
também em evidencia a dominância do homem aos demais
seres por conta de sua racionalidade, com a ideia de que o
homem passa a ser superior ao restante dos animais por uma
visão antropocêntrica, o que deixa claro que a relação apesar
de antiga nunca foi tranquila, pois o medo e o endeusamento
caminham lado a lado.
Para o cristianismo os animais eram seres sem alma,
consequentemente sem direitos ou passivos de sentimentos,
servindo apenas para a apropriação do homem, destinados a
lhes serem submissos, com diversos fins humanísticos, como,
consumo, locomoção, vestuário e entre outros, já os egípcios
tinham em sua cultura o ato de raspar as sobrancelhas como
um sinal de aflição e comoção quando um gato falecia, che-
gando a raspar o corpo por inteiro quando se tratava de um

129 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

cachorro, uma forma de transparecer todo seu sofrimento evi-


denciando o quão doloroso e significativo foi essa perda, per-
cebesse a diferença de tratamento com o passar dos anos e a
relação com a cultura de cada pais e suas respectivas épocas.
No Brasil, desde o início da história é retratado o quão
profunda eram as relações dos índios com os animais, pois os
tratavam como membros da família, vivendo como iguais, in-
seridos na intimidade de seus lares e inclusos em sua rotina,
uma relação estruturada de afeto e companheirismo, o que
não se difere da relação dos dias atuais, pois existem várias
famílias que optam por tratar os animais de estimação como
filhos, e não fazendo distinção entre eles e seus filhos consan-
guíneos.
A chegada do código civil Brasileiro de 1916 teve uma
grande influência do código civil alemão de 1896 o qual clas-
sificava os animais originalmente como coisas, o que não
trouxe nenhum avanço significativo na tutela dos seres anima-
dos e inanimados, consequentemente sem qualquer menção
de seus direitos.
Como já mencionado o código de 2002 encontra-se de-
fasado pois ainda se refere aos animais como bens semoven-
tes apesar das várias previsões constitucionais e da compro-
vação cientifica que os animais são seres sencientes pos-
suindo a capacidade de ter sentimentos e emoções sendo

130 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

passiveis de sofrimento, que assim como os humanos sentem


sede, fome, frio, medo e entre outros, são seres que possuem
seus interesses próprios e que devem ser levados em consi-
deração como sujeitos de direitos.
De fato, não houve mudanças relevantes entre os Có-
digos de 1916 e 2002, o que se pode notar é que a relação
entre humanos e animais vem evoluindo com o passar do
tempo, dessa forma automaticamente as leis e ordenamentos
que os resguardam também devem ser passivas de evolução,
pois é de conhecimento que os animais são de suma impor-
tância para economia do país, o reconhecimento destes como
sujeitos de direitos acarretará em mudanças significativas na
produção, principalmente para o Brasil um local que tem como
principal base da economia os frutos da agropecuária.

4.3.1 ANIMAIS COMO OBJETOS NA RELAÇÕES JURÍDI-


CAS

Quando falamos dos animais como objetos, estamos di-


zendo que são objetos passiveis de domínio, ou seja de apro-
priação, segundo uma finalidade social, onde atualmente são
inseridos os animais.
Dessa forma, os animais são vistos e considerados
como bens moveis por natureza, Clóvis Beviláqua (2003,
p.166) diz que os bens móveis por natureza “são os bens que,
131 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sem deterioração na substância, podem ter transportados de


um lugar para outro, por força própria ou estranha”.
Podemos ainda classificá-los como seres semoventes
os animais, por serem dotados de movimentos próprios. Con-
tudo, diante do Código Civil vigente os animais possuem sta-
tus de coisa, sendo assim um bem que possui valor econô-
mico, ou seja, passiveis de apropriação pelos seres humanos.
Conforme o artigo 1.228 do Código Civil, o direito à proprie-
dade se exercer através da faculdade de usar, gozar e dispor
da coisa, mesmo que este seja limitado.
Para o filosofo Tom Regan são três concepções pelas
quais os seres humanos interagem com os animais, são co-
nhecidas como teoria conservadora, no qual é usada pelo
nosso atual sistema, sendo antropocêntrica e colocando os
animais como objetos na relação jurídica, em outras palavras
garantindo somente o mínimo de direito para os animais.
Já o filosofo Peter Singer, defende a teoria utilitarista,
essa teoria diz que o homem continuar usando o animal, como
um meio para fim, contudo, de forma limitada. Dessa forma, o
bem-estar dos animais está acima dos direitos individuais do
homem, Peter Ginger ainda considera o princípio da igualdade
considerando os interesses deles.
Todavia, o fato dos animais possuírem direito não se
leva em consideração a sua capacidade de falar ou pensar,

132 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como afirmava Descartes. Portanto, a busca que ocorre para


reconhecer os direitos dos animais, ocorre que assim como os
animais, os homens são um fim em si mesmo, não sendo um
objeto caráter utilitário.
Apesar desse tema ser muito debatido no Brasil, este
direito que é inerente aos animais já possui mudanças legisla-
tivas importantes em muitos países, dentre eles a Alemanha,
Áustria, França, Suíça.

4.3.2 MAUS TRATOS EM FACE A LEGISLAÇÃO INFRA-


CONSTITUCIONAL COM A PROTEÇÃO AOS ANIMAIS PRE-
VISTA NO DECRETO 24.645/34

O conceito de animal é definido como “todo ser irracio-


nal, quadrupede ou bípede, doméstico ou selvagem, exceto os
daninhos”, conforme artigo 17 do decreto 24.645/34, assim
sendo o Decreto não estabelece apenas os animais existentes
no País como tutelados pelo Estado, como também definiu um
plano normativo infraconstitucional do que seriam maus tratos.
Dessa forma, os animais existem no nosso ordenamento jurí-
dico desde 1934, foi quando Getúlio Vargas promulgou este
Decreto Lei.
Assim, para a norma jurídica em seu artigo 3º, conside-
ravam-se maus tratos como:

133 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 3º Consideram-se maus tratos:


I - praticar ato de abuso ou crueldade em
qualquer animal;
II - manter animais em lugares anti-higiêni-
cos ou que lhes impeçam a respiração, o
movimento ou o descanso, ou os privem de
ar ou luz;
III - obrigar animais a trabalhos excessívos
ou superiores ás suas fôrças e a todo ato
que resulte em sofrimento para deles obter
esforços que, razoavelmente, não se lhes
possam exigir senão com castigo;
IV - golpear, ferir ou mutilar, voluntaria-
mente, qualquer órgão ou tecido de econo-
mia, exceto a castração, só para animais do-
mésticos, ou operações outras praticadas
em beneficio exclusivo do animal e as exigi-
das para defesa do homem, ou no interêsse
da ciência;
V - abandonar animal doente, ferido, extenu-
ado ou mutilado, bem coma deixar de minis-
trar-lhe tudo o que humanitariamente se lhe
possa prover, inclusive assistência veteriná-
ria;
VI - não dar morte rápida, livre de sofrimen-
tos prolongados, a todo animal cujo extermi-
nio seja necessário, parar consumo ou não;
VII - abater para o consumo ou fazer traba-
lhar os animais em período adiantado de
gestação;
VIII - atrelar, no mesmo veículo, instrumento
agrícola ou industrial, bovinos com equinos,
com muares ou com asininos, sendo so-
mente permitido o trabalho etc conjunto a
animais da mesma espécie;

134 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

IX - atrelar animais a veículos sem os ape-


trechos indispensáveis, como sejam balan-
cins, ganchos e lanças ou com arreios in-
completos incomodas ou em mau estado, ou
com acréscimo de acessórios que os moles-
tem ou lhes perturbem o funcionamento do
organismo;
[...]

No ano de 1994 foi editada a Lei de Contravenções Pe-


nais, no qual tipificou o artigo 64 a prática de crueldade contra
os animais como contravenção penal, este artigo revogado
posteriormente pela Lei dos Crimes Ambientais. Mas a Cons-
tituição em 1988 trouxe grandes avanços no que diz respeito
a legislação ambiental pois no artigo 225, trata do meio ambi-
ente, no §1, VII, diz que é de incumbência do Poder Público
proteger a fauna e flora, sendo vedadas na forma da lei as
práticas que coloquem em risco as suas funções ecológicas,
que provoquem a extinção de espécies ou submetam os ani-
mais à crueldade.

4.3.3 PROJETO DE LEI PL 6054/2019

O Projeto de Lei nº 6054/2019, tem autoria dos deputa-


dos federais Ricardo Izar e Weliton Prado, incialmente foi

135 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aprovado na Câmara dos deputados sob nº 6799/2013 e apro-


vada, com emenda, pelo Senado, sob nº 27/2018, no qual é
conhecida como PL Animais Não São Coisas.
Alguns juristas do Direito, interpretaram o texto consti-
tucional artigo 225, § 1º, VII, da Constituição Federal de 1988,
que os animais são sujeitos de direitos, e que ao tempo do
projeto estava longe de ser um consenso na comunidade jurí-
dica. Há quem diga que os profissionais nas demais áreas do
direito não concordam com este posicionamento.
Contudo, as leis e atos normativos federais elucidam
exatamente o contrário, ou seja, tratam todos os animais como
coisas, bens ambientais, semoventes, como é o exemplo do
Código Civil, a Lei Arouca nº 11.794/2008, em conformidade
ao uso de animais nas pesquisas cientificas, assim a Lei
13.364/2016, no qual foi alterada pela Lei 13.873/2019, e a EC
96/2017, em relação aos animais nos quais são explorados
em vaquejadas, rodeios e demais atividades afins, além de vá-
rias outras leis e atos normativos que foram editados sob o
artigo 23, VIII, da Constituição Federal, que faz relação aos
animais que são usados em produção na agropecuária.
Apesar de existir julgados no qual reconhecem a natu-
reza sensível dos animais e, consequentemente por deriva-
ção, a sua dignidade existencial, até um tempo atrás não havia
posição consolidada nos tribunais superiores e os tribunais de

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

apelação afirmam que os animais são sujeitos e detentores de


direitos.
Por isso, fica evidente a discussão do projeto lei, pois
não basta somente dizer que os animais não são coisas, deve
haver o respaldo jurídico. Os países da Alemanha, Suíça, al-
teraram seus Códigos Civis estabelecendo que “os animais
não são coisas”, já a França e Portugal, passaram a definir os
animais “como seres dotados de sensibilidade”, assim perma-
necem submetendo os animais no regime jurídico de proprie-
dade.
Mesmo que a competência legislativa sobre a fauna
seja concorrente entre o Estado e a União, conforme artigo 24,
VI, da Constituição Federal, legitimando que os Estados afir-
mem que os animais são sujeitos de direitos e possuem pro-
teção em grau máximo, contudo é possível dizer que somente
a união pode legislar sobre requalificação, no qual seria em
matéria de Direito Civil, previsto no artigo 22, I, da Constituição
Federal.
Afirmar que todos os animais possuem a natureza jurí-
dica sui generis, significa que os animais não são como os hu-
manos, nem mesmo são coisas, diante do reconhecimento
que possuem “natureza biológica e emocional e são seres
sencientes, passiveis de sofrimento” assim diz o artigo 2º, III,

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do projeto de lei. Posterior a isso, significa dizer que o legisla-


dor se posicionou em qualificar os animais como sujeitos de
direitos, entretanto em categoria diferente de coisas e pes-
soas, ou seja, como sujeitos de direitos, mas sem personali-
dade jurídica.
É evidente que, mesmo que os animais não tenham
personalidade jurídica, há um progresso no projeto de lei em
qualificar todos os animais como sujeitos de direitos. Quando
incluído “dos quais devem gozar e, em caso de violação, obter
tutela jurisdicional” é importante porque, ao mesmo tempo que
o projeto de lei faz a requalificação dos animais como sujeitos
de direitos, ele também garante aos mesmos o acesso a jus-
tiça, sendo dotados de capacidade se ser parte. Sendo assim,
a tutela jurisdicional traz a possibilidade de fazer valer os seus
direitos subjetivos por intermédio da jurisdição e do processo.
Contudo, o projeto de lei ainda não foi aprovado, dessa
forma tende a manter o seu valor e sua relevância, pois como
dito, todos os animais passarão a ser classificados como su-
jeitos de direitos, até mesmo os animais da agropecuária, os
que são submetidos a pesquisas cientificas e também os de
manifestações culturais, a serem determinadas pelos traba-
lhos hermenêuticos na doutrina brasileira.
De todo modo, ainda que seja declara a inconstitucio-
nalidade dessa emenda não seja declarada, os animais que

138 | P á g i n a
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são mencionados permanecerão podendo gozar da proteção


jurisdicional, utilizando os meios tradicionais para a tutela do
meio ambiente ecologicamente equilibrado, podendo ingres-
sar com ação civil pública ambiental.
O Direito dos animais, entendido pelo ponto de vista do
direito positivo, nada mais é do que o conjunto de regras e
princípios no qual estabelece os direitos de todos os animais
não-humanos, independentemente de sua função no ambi-
ente ou ecológico.

4.4 JURISPRUDÊNCIAS DO SUPREMO TRIBUNAL SOBRE


OS DIREITOS DOS ANIMAIS

Segundo Reale (2014, p.167), as normas jurídicas “a


todo instante, exigem um esforço de superamento de entendi-
mentos contrastantes, para que possam ser aplicadas em con-
sonância com as exigências da sociedade em determinado
momento e lugar".
Diante disso, faz necessário no nosso ordenamento ju-
rídico a existência de jurisprudência, que corresponde a reite-
radas decisões harmônicas de tribunais acerca de uma norma,
através de interpretação desta, quando não houver, em caso
concreto, em uma única apreensão intelectual.

139 | P á g i n a
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Sendo assim, para que uma decisão atinja o status de


precedente jurisprudencial, não faz necessário somente uma,
duas ou três sentenças, deve haver uma serie de julgados que
possuam entre si uma coerência e continuidade. Consequen-
temente, fica também na responsabilidade da jurisprudência a
missão de inovar no âmbito jurídico, pode assim estabelecer
normas pelas quais não estão previstas expressamente em
leis, completando dessa forma o sistema objetivo das normas
jurídicas. Como é o caso do Habeas Corpus nº 50.343 que
teve seu grande marco na luta a favor dos animais, pois, foi
apreciada inicialmente pelo Supremo Tribunal Federal das
causas e interesses não estritamente dos humanos.
Este habeas corpus tratava da liberdade ambulatorial
dos pássaros que se encontravam engaiolados, seja ele para
fins comerciais ou de utilização, sendo estendido contra a caça
e captura ilegal. Destarte, foi impetrado por Fortunado Benchi-
mol e também pela Associação de Protetora dos Animais no
ano de 1972, na jurisdição do estado de Guanabara, sendo
município do Rio de Janeiro, apontava ainda como autoridade
coatora aquele que por algum motivo provar ilegalmente a li-
berdade dos animais em questão.
Contudo, a decisão da instância de origem entendeu
que não era cabível uma impetração de habeas corpus, tendo
em vista que esse instituto só alcança os seres humanos,

140 | P á g i n a
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apontaram também que havia diversos erros no processo,


como o fato de não ter um coator determinado. E quando en-
caminhado para a Suprema Corte Constitucional, foi mantido
o entendimento de que os animais não poderiam ser pacientes
para o habeas corpus, uma vez que seriam objetos de direito,
mas não sujeitos.
Anos após, precisamente em 1997, foi imposto uma
Ação Civil Pública promovida por algumas organizações de
proteção animal, sendo elas a Associação Amigos de Petró-
polis. A Proteção aos Animais; a Sociedade Zoológica Educa-
tiva; e a Associação Protetora dos Animais, em face do Estado
de Santa Catarina, trazendo como requerimento a proibição
da chamada “Farra do Boi”.
Na primeira instancia, o Estado no qual era o requerido
alegou que a festa possuía caráter cultural, sendo realizada há
mais de duzentos anos, o Tribunal de Justiça julgou improce-
dente a ação, pois entendeu que a prática não caracterizava
crueldade.
Consequentemente, reconheceu e entendeu que deve-
ria haver uma necessidade de proteção contra os abusos que
poderiam acontecer por estas práticas tradicionais. Tomou
grande repercussão pois foi impetrado um recurso extraordi-
nário 153.531-8, que tratou da Ação Civil Pública.

141 | P á g i n a
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Houve ainda no ano de 1998, duas ações de inconsti-


tucionalidade, em face das leis estaduais de número 2.895/98
de origem no Rio de Janeiro e número 7.380 do Rio Grande
do Norte, as mesmas normatizavam a preservação dos “galos
combatentes”.
Foram promovidas pela Procuradoria-Geral da Repú-
blica, e que pugnou pela inconstitucionalidade total dos dois
atos normativos, tendo em vista o Decreto nº 50.620, de 1961,
vedava a prática das rinhas, que consiste na briga de galos
com equipamentos afiados, lâmina de metal, com um único
intuito de satisfazer os apostadores.
Nesta Ação de Inconstitucionalidade, foi reconhecida a
ofensa expressa da lei estadual ao artigo 225, §1º, da Consti-
tuição Federal. Entretanto o Procuradoria Geral da República
ajuizou uma Ação de Inconstitucionalidade nº 4.983, em face
a lei estadual nº 15.299/2013, do Ceará, que tratava sobre a
vaquejada, ou seja, os bois soltos em uma arena e dois va-
queiros montados em cavalos, no qual tentam derrubar os bois
pelo rabo.
O relator Ministro Marco Aurélio, da Ação Direta de In-
constitucionalidade, votou pela inconstitucionalidade da lei es-
tadual, e assim seguiu a votação, mesmo que não unanime
sendo seis a cinco. Após todo o tramite legal, a conhecida ban-
cada do boi pressionou o Congresso Nacional para aprovar a

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Lei nº 13.364/2016, que trata sobre a elevação de rodeio e


vaquejada como patrimônio cultural imaterial.
Posterior a isso a bancada ruralista conseguiu que
fosse aprovada a Emenda Constitucional 96, de 2017, que
acrescenta um parágrafo no artigo 225, da Constituição Fede-
ral, que versa sobre a elevação da vaquejada como patrimônio
imaterial cultural brasileiro e previsto na constituição. No Rio
Grande do Sul o Ministério Público do Estado, impetrou com
um Recurso Extraordinário nº 494601, após o Tribunal de Jus-
tiça desta jurisdição negar a solicitação de declaração de in-
constitucionalidade da Lei Estadual 12.131 de 2004.
Esta referida lei afastou a proibição aos sacrifícios de
animais nos rituais das religiões de origem africana. Na época,
o Ministério Público estadual alegou que esta matéria era de
competência exclusiva da União, e que o dispositivo restringia
as exceções, devendo a mesmo ser declarada inconstitucio-
nalidade. Contudo, o Supremo Tribunal Federal foi unanime e
decidiu pela constitucionalidade da lei.
O Ministro Marco Aurélio, relator da ação, considerou a
constitucionalidade do sacrifício de animais nos rituais religio-
sos, de qualquer natureza, os Ministros Gilmar Mendes e Ale-
xandre de Morais acompanharam o voto do relator, discor-
dando que dos atos são constitucionais independentes do
consumo de carne.

143 | P á g i n a
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4.4.1 DA CARACTERIZAÇÃO DO AGENTE CAUSADOR DO


DANO E DA RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DA PESSOA FÍ-
SICA

Interpreta-se como dano ambiental o prejuízo no qual é


causado ao meio ambiente por alguém, e que se vê obrigado
ao ressarcimento. Inicialmente, o dano era aceito apenas
como um prejuízo patrimonial, contudo, sabe-se que a sua
conceituação é bem ampla, incluindo até o direito extrapatri-
monial. Dessa forma, o meio ambiente é considerado como
bem jurídico, e que não pode ser compreendido como simples-
mente um conjunto de fauna, flora e recursos minerais, como
bem diz Milaré, 2007, p.110 “é constituído por seres abióticos
e suas relações e interações”
As práticas de maus-tratos estão previstas no artigo 32
da Lei de Crimes Ambientais, onde consideram-se maus-tra-
tos toda a prática de abuso ou crueldade contra qualquer que
seja animal, incluindo-se ferir, golpear, mutilar, castigar, aban-
donar ou que haja ação ou omissão que sem um proposito
venha a expor o animal a um nível considerável de dor ou so-
frimento. Pessoa física é compreendida como qualquer pes-
soa natural, no qual comete um ato ilegal e assume a condição
de causador desta lesão a um bem jurídico, desse ponto,

144 | P á g i n a
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surge a necessidade de responder juridicamente por esta ação


cometida.
No nosso ordenamento jurídico pátrio está estabelecido
todo os fundamentos para que uma pessoa física responda
por tais condutas errôneas. Conforme a Constituição federal,
todas as pessoas físicas estão sujeitas a sanções penais pelas
condutas e atividades por elas praticadas, consideradas lesi-
vas ao meio ambiente.
A Lei 9.605/98, elenca alguns requisitos para que o Juiz
em sua aplicação leve em consideração, e ainda de acordo
com o artigo 79 da mesma lei, utiliza de maneira subsidiaria a
aplicação da pena, antecedente, critérios de culpabilidade,
conduta social, motivos, circunstâncias, personalidade do
agente, consequências do crime, assim como o comporta-
mento da vítima.
Diante disso, em consonância com o artigo 32 da lei de
crimes ambientais, elas são aplicáveis para as pessoas físicas
em decorrência de maus-tratos a animais, e as penas privati-
vas de liberdade são usadas somente em caráter excepcional,
já as penas restritivas de direito no caso em que houver subs-
tituição de pena, e multa.
Para esses crimes de maus-tratos contra animais nati-
vos, domésticos ou exóticos pode haver pena de detenção de
três meses a um ano e multa, no qual é considerada uma pena

145 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

branda, ainda assim, a detenção só é aplicada em raríssimos


casos, sendo predominante a transação penal.
Portanto, quando um cidadão presencia atos cruéis e
que exponha a vida de animais a risco, ele pode realizar a de-
núncia junto a uma delegacia, e solicitando um Termo Circuns-
tanciado de Ocorrência ou Boletim de Ocorrência, contudo, o
fato deve ser narrado a autoridade invocando o artigo 32 da lei
de crimes ambientais e o infrator deve ser identificado. O de-
legado nessa situação não poderá se recusar a lavrar o termo,
pois conforme o artigo 319 do Código Penal, aquele que rece-
ber a notícia de um crime não o cumpre com as suas obriga-
ções incorre em crime de prevaricação.

4.4.2 A PARTICIPAÇÃO DAS ONG’S E AS SOCIEDADES


PROTETORAS DOS ANIMAIS

As Organizações Não Governamentais, são organiza-


ções que surgem por iniciativa da sociedade civil com intuito
de participar e complementar as áreas sociais que são defici-
tárias de atenção do Estado, assim, não obtém lucros e seu
único objetivo é a resolução de sanar algumas dificuldades so-
ciais, seja econômica, educacional, ambiental e outras, pode
ainda participar de reivindicações de direitos e melhoria por
meio de fiscalização do poder público.

146 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Contudo, podem ter natureza particular ou publica, a


depender de seus respectivos estatutos, dessa forma a finali-
dade primordial destas organizações como dito não é a gera-
ção de lucros, mas sim uma forma de supressão de falhas na
atuação do poder público.
A luta ambiental possui grandes forças por meio das
ONG’S, em nosso cenário mundial as que mais possuem um
destaque são as que visam desenvolver projetos em beneficio
do meio ambiente, desenvolvendo ações que o beneficiem, e
inúmeras são essas ONG´S mudo a fora.
O fato de existir esse tipo de organizações sociais já
mostra o quão falho é a atuação dos Estados em suas respon-
sabilidades no apoio ao cidadão, mas por outro lado, desper-
tam o desejo em outras pessoas de ajudar, cooperar e disse-
minar a consciência política com as devidas participações dos
mesmos.
Na cidade de Rio Branco, no Estado do Acre, entre es-
parsos e corajosos defensores de causas animais, a socie-
dade conta com a Associação da Patinha Carente, que desen-
volve um admirável e árduo trabalho protegendo os direitos
dos animais, exaltando valores como o respeito, cuidado,
amor, tratado de maneira digna e justa todos os animais que
são maltratados e abandonados, repudiando qualquer tipo de
violência que venha a ser cometida contra os mesmos, o que

147 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fica claro e evidente o seu alto grau de responsabilidade so-


cial.
O trabalho desenvolvido por estas organizações e seu
empenho na proteção da vida do animal, sendo formalizados
ou não, são essenciais para o desenvolvimento e a sua efeti-
vação deste ramo social, contudo, o Poder Público apesar de
traçar caminhos legais, são omissos quanto ao tratamento dos
animais abandonados e as práticas cruéis em animais.
Assim sendo, estas organizações não se limitam ape-
nas em receber os animais abandonados e maltratados, mas
passa pelo apoio físico e afetivo destes, pois vai muito além,
busca principalmente a conscientização da população de
modo geral a respeitar as necessidades e cuidados, fornece
informações quanto o bem-estar dos animais e a guarda res-
ponsável, fazendo o controle populacional por meio da esteri-
lização.
A maior parte dos recursos obtidos para o tratamento
dos animais, são dados pelas pessoas que se solidarizam com
a situação de cada animal em sua individualidade e necessi-
dade naquele momento.
Combater e eliminar o problema se torna fundamental
e importante, mas faz necessário não permitir que aconteça.

148 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Considera-se que todos precisam ter seus direitos e principal-


mente a vida como seres humanos, dessa forma, os animais
também merecerem ter respeito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou fazer uma breve análise


em relação a tutela jurídica dos animais de estimação a
proteção jurídica destes a luz da constituição, dessa
forma, o estudo teórico foi de acordo com uma vasta análise
literária, preceitos históricos, previsões na legislação vi-
gente, além de artigos e pensamentos de autores a respeito
do tema.
Em uma primeira abordagem elucidou-se sobre a capa-
cidade jurídica e civil no direito brasileiro, o direito civil encai-
xou o conceito de capacidade ao de personalidade jurídica,
pois, se completam, sendo a personalidade reconhecida como
um valor e a capacidade jurídica como a medida desse valor,
tornando a capacidade plena para alguns e limitada para ou-
tros, foi importante a compreensão de capacidade jurídica e
civil, para a compreensão de como os seres humanos são vis-
tos como sujeito de capacidade jurídica e se tal capacidade
poderia ser estendida aos animais, frisa-se que não pois este

149 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

são seres detentores de direitos em relação ao seu bem co-


mum, porém não são detentores de deveres, pois a racionali-
dade não está empregadas em seu organismo, tão logo, não
detém o discernimento civil.
Pessoas são sujeitos de direitos e deveres enquanto
coisas são objetos de direitos deveres, isso se deve ao fato de
que as pessoas têm personalidade jurídica que é a capacidade
de ser sujeitos de deveres; capacidade essa adquirida com o
nascimento com vida.
Ao longo do presente trabalho buscou-se demonstrar
que muitas vezes os animais são vistos como coisas e isso
perante a sociedade foi alvo de profundas discussões, pois a
um discernimento de que os animais são sujeitos de direito,
tão logo não coisas, pois não são objetos, afastando a visão
antropocêntrica que caracteriza eles no mesmo patamar, atu-
almente os animais de estimação são considerados como
parte da família, e sendo tratados como tal, uma vez que a
relação de seres humanos e animais se tem como base o sen-
timento, se fazendo então necessário corrigir essa injustiça
com o intuito de impedir a tirania e zelando pelo bem está e
proteção desses seres.
Foi nessa luta de mudar a visão antológica dos seres
humanos em relação a animais serem visto como coisas, que

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

muito projetos de lei foram criados, porém nem todos aprova-


dos, o presente estudo abordou leis que demostraram a mu-
dança de paradigma dos direitos de animais, entre eles des-
taca-se o projeto de lei n.27/2018, alterando assim a forma
como o ordenamento jurídico brasileiro se refere a eles, sendo
então considerados sujeitos de direito despersonificados, con-
cedendo-lhes natureza jurídica sui generis, dos quais devem
gozar e obter tutela jurisdicional.
Ao longo da leitura deste trabalho verificou-se que em
pequenos passos, acarretaram um avanço significativo para
os direitos dos animais no Brasil, fazendo uma abordagem de
que mesmo sendo considerados como sujeitos de direitos os
animais, não possuem deveres, são seres sencientes, dota-
dos de inteligência emocional e passiveis de sofrimento.
Foi possível perceber que ainda há muito que se desen-
volver e combater e eliminar o problema se torna fundamental
e importante, mas faz necessário não permitir que aconteça.
Por fim, cabe a sociedade exigir e fiscalizar a aplicação
de seus direitos, em contrapartida deve o Estado efetivar a
educação de todos em relação aos animais como um direito
fundamental e obrigatório, a fim de que as próximas gerações
d e a n i m a i s desfrutem deste direito de maneira plena.

151 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Considera-se que todos precisam ter seus direitos e principal-


mente a vida como seres humanos, dessa forma, os animais
também merecerem ter respeito.

REFERÊNCIAS

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Governamental (ONG)"; Brasil Escola. Disponível em:
https://brasilescola.uol.com.br/geografia/organizacao-nao-go-
vernamentalong.htm. Acesso em: 05/06/2022.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5
A POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO POR DANOS
MORAIS EM RAZÃO DA INFIDELIDADE NO
MATRIMÔNIO E UNIÃO ESTÁVEL

THE POSSIBILITY OF CONDEMNATION FOR MORAL


DAMAGES DUE TO INFIDELITY IN MARRIAGE AND
COMMON-LAW MARRIAGE

Robério Costa de Araújo9


Williane Tibúrcio Facundes10

ARAÚJO, Robério Costa de. A possibilidade de condena-


ção por danos morais em razão da infidelidade no matri-
mônio e união estável. Trabalho de Conclusão de Curso de
graduação em Direito – Centro Universitário UNINORTE,
Rio Branco, 2023.

9 Discente do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Uni-


versitário – UNINORTE.
2
Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduada em Direito pela
U:VERSE. Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Varzea-
grandense. Graduada em Letras Vernáculas pela Universidade Federal do
Acre-UFAC.

154 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo trata de análise sobre a doutrina e a juris-


prudência a fim de verificar a possibilidade de condenação por
danos morais em razão da infidelidade no matrimônio e união
estável no Brasil. Trabalha-se acerca de conceitos com o ob-
jetivo de elucidar o leitor e promover uma reflexão ao raciocí-
nio final. A começar por um breve histórico da família e da ins-
tituição casamento, em sequência, buscando a percepção po-
sitiva do instituto, abrangendo a sua consumação e seus de-
veres, bem como da união estável. A pesquisa também se põe
ao âmbito da responsabilidade civil e o cometimento do dano
moral sobre o fundamento da proteção constitucional do abalo
psíquico e prejuízo moral do afetado, dando alicerce a possi-
bilidade da reparação moral ao cônjuge traído não somente
pela infidelidade e pela quebra de deveres do casamento, mas
pela relação entre a traição e suas consequências.

Palavras-chave: danos morais; infidelidade; traição; casa-


mento; união estável.

155 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This article deals with the analysis of doctrine and jurispru-


dence in order to verify the possibility of conviction for moral
damages due to infidelity in marriage and stable union in Brazil.
Concepts are worked on with the aim of elucidating the reader
and promoting a reflection on the final reasoning. Starting with
a brief history of the family and the marriage institution, in se-
quence, seeking a positive perception of the institute, covering
its consummation and its duties, as well as the stable union.
The research also addresses the scope of civil liability and the
commission of moral damages on the basis of the constitutio-
nal protection of the psychic shock and moral damage of the
affected person, providing the foundation for the possibility of
moral reparation to the betrayed spouse not only for infidelity
and breach of duties marriage, but by the relationship between
betrayal and consequences.

Keywords: moral damages; infidelity; betrayal; marriage;


common-law marriage.

156 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo versa sobre a possibilidade de responsabili-


zação do parceiro infiel que constituir matrimônio ou união es-
tável, melhor dizendo, no momento que divórcios estão muito
mais presentes na nossa vida cotidiana, se fez necessário sua
facilitação no direito civil e mediante via extrajudicial tornou-se
mais célere e por vezes mais eficiente, todavia, ainda não há
solução para todos os problemas, e portanto, tema deste ar-
tigo é uma abordagem sobre uma das problemáticas atuais,
cujo o objetivo é extrair informações que elucidem respostas
sobre o tema.
A infidelidade se faz presente por diversos períodos na
história, vista em mandamentos religiosos, na filosofia, socio-
logia e também claramente no direito. Tratada como vergo-
nhoso e passível de diversas punições mais severas com as
mulheres na sociedade antiga, o adultério, desde o Brasil co-
lônia, quando leis portuguesas ainda vigorava sobre nosso
país, era lícito o marido executar sua esposa infiel e o amante
quando pegos em flagrante.
Entretanto, com o progresso da sociedade, do direito,
sociologia e matérias afins, o adultério cada vez mais foi tra-
tado com menos gravidade e em contrapartida retirando certo
poder do traído. Exemplo do código criminal do Brasil de 1830

157 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

quando imputava pena de um a três anos ao homem ou mu-


lher casado que cometesse o adultério. E ainda que evoluís-
sem os códigos criminais, somente deixou de ser crime no bra-
sil em 2005 com a lei 11.106, dessa forma, fazendo-se neces-
sário pesquisar sobre os reflexos atuais da lei e como o adul-
tério pode interferir na vida civil dos parceiros.
É neste cenário que o presente artigo estuda, com base
na doutrina e jurisprudência, as variáveis da condenação de
danos morais em razão do adultério, sendo necessário enten-
der a problemática e suas razões da condenação ou não, onde
entra a responsabilidade, deveres e direitos dos companheiros
com atenção especial ao traído e as inúmeras consequências
que a infidelidade poderá trazer a este.
Também se faz necessário entender a relação da viola-
ções dos deveres do casamento sem esquecer do poder de
livre escolha sobre o indivíduo insatisfeito com a relação e a
sua busca de realização afetiva sem qualquer sanção de cu-
nho vingativo pelo outro, isto é, analisar e refletir sobre quando
o adultério pode ser um rompimento de relacionamento ou
quando a traição poderá lhe ofender moralmente de forma
mais agressiva capaz de naturalmente impossibilitar a vida di-
ária do outro parceiro, assim entendendo e identificando os
motivos que em alguns casos é possível e em outros não a
sua condenação de reparação de danos morais.

158 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5.1 CASAMENTO

O conceito de família é algo que nos parece simples,


pois quando pensamos nessa palavra, automaticamente nos
vem à cabeça os nossos parentes, os nossos parceiros de re-
lação conjugal e aqueles que chamamos de irmãos sem ne-
cessariamente ter o laço de sangue, e historicamente, assim
como é hoje, a instituição da família é variada desde muito
tempo nas tribos primitivas quando os homens trocavam de
variadamente de parceiras a fim de variar também os genes e
aumentar a chance do nascimento de uma criança saudável.
Fato é que existe a união entre o macho e a fêmea de
seus semelhantes desde tempos imemoráveis e por conse-
quência dessa ação, surge a cria e a formação da família. Tal
instituto tão primordial para perpetuação da espécie foi e con-
tinua sendo defendido pelo Direito em todo o mundo, e deste
modo, com a evolução do homem e das relações entre os ho-
mens, junto com a diferenciação do homem dos outros ani-
mais, a sociedade valorizou a família, que se tornou sinônimo
de casamento cujo este produziu tantos efeitos, desde a divi-
são de tarefas na família rural arcaica, a interesse político, tal
como reforçar alianças entre famílias poderosas na idade mé-
dia ou mesmo, para procriação e perpetuidade da família ou,

159 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como comumente é hoje, reforçar sentimentos e responsabili-


dade para com o parceiro e de todo modo resultando na for-
mação de uma família.
Hoje, amparada com proteção especial do Estado, a
nossa Constituição Federal é clara em seu art. 226: “A família,
base da sociedade, tem proteção especial do Estado. (BRA-
SIL, 1988). Rolf Madaleno explica que “a convivência humana
está estruturada a partir de cada uma das diversas células fa-
miliares que compõem a comunidade social e política do Es-
tado” (2018, p. 81). Percebida tamanha importância da enti-
dade familiar na sociedade, a nossa constituição atual se pre-
valece em prol da família com igualdade entre os cônjuges,
bem como para seus filhos dentro e fora do casamento, e a
concepção de sua diversidade e liberdade de constituição fa-
miliar.
O Código Civil Brasileiro diz em seu art. 1.514: “O ca-
samento se realiza quando o homem e a mulher manifestam,
perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal,
e o juiz os declara casados.” (BRASIL, 2002). Portanto a de-
claração de vontade entre os cônjuges de constituir o matri-
mônio perante a autoridade presente é a certeza da sua con-
cretização. Porém, em vias práticas a consumação do casa-
mento é o compartilhamento de vidas entre duas pessoas,
dois sujeitos capazes e livres se sujeitam por vontade própria

160 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a dividirem suas vidas e se cuidarem mutuamente em momen-


tos bons e ruins, até o fim de suas vidas.
Na doutrina, Silvio de Salvo Venosa (2013, p. 25) cita
Guilherme Borda (1993, p. 45) para definir casamento: “é a
união do homem e da mulher para o estabelecimento de uma
plena comunidade de vida”. Portanto, quando aprofundamos
mais no direito de família, a doutrina nos apresenta a natureza
jurídica acerca do matrimônio duas vertentes, uma com natu-
reza institucional pois a lei advinda do Estado predetermina
normas delimitando direitos e deveres entre o casal para insti-
tuir o matrimônio. Sendo breve por Madaleno:

Portanto, a família organizada a partir do ca-


samento obedeceria a um conjunto de nor-
mas imperativas, objetivando uma ordem ju-
rídica e social do matrimônio, com forma es-
pecial e solenidades a serem rigorosamente
observadas para conferir validade e eficácia
ao ato conjugal. (MADALENO, 2018, p. 163)

Enquanto outra parte da doutrina defende o casamento


como um contrato bilateral entre os cônjuges, onde por força
de vontade das partes, isto sendo essencial para a concretiza-
ção do contrato, se obrigam a cuidarem-se mutuamente com
efeitos também na lei. Em suma, Venosa (2013, p. 26) simpli-
fica ao dizer que “pode-se afirmar que o casamento-ato é um
negócio jurídico; o casamento-estado é uma instituição”.
161 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Jesualdo de Almeida Junior cita João Andrades Carva-


lho para defender a tese do casamento como contrato:

Na realidade, o casamento é uma instituição


do ponto de vista dos valores sociais e reli-
giosos. Mas no campo do direito, isto é, de
ponto de vista estritamente jurídico, não há
como não considerá-lo contrato, pelas ca-
racterísticas que apresenta. O ordenamento
jurídico define modelo aos quais se adapta
todo ato jurídico realizado de acordo com
esse mesmo ordenamento jurídico. Não
existe maneira de fugir de tais paradigmas,
a menos que a lei os defina de modo diverso.
O que, aliás, não é caso do casamento, por-
que o próprio Código Civil trata o casamento
como sociedade conjugal. (JUNIOR, apud
CARVALHO, 2010, p. 17)

Com o entendimento sobre as principais vertentes da


doutrina, e partindo da assunção da vertente contratualista do
casamento, como para Jesualdo Junior, o casamento é defini-
tivamente um contrato, haja vista que há um concurso de von-
tade explicitamente previsto em lei para determinado fim
(2010, p. 16), ficará de melhor entendimento quanto os seus
deveres.

5.1.1 DEVERES DO CASAMENTO

Aos cônjuges, no momento que contraem o matrimônio,


é instituído um conjunto de direitos e deveres ao casal pelo
162 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nosso Código Civil Brasileiro, afim de dar segurança, digni-


dade e proteção familiar se exercido mutuamente. São eles:

Art. 1.566. São deveres de ambos os cônju-


ges:
I - Fidelidade recíproca;
II - Vida em comum, no domicílio conjugal;
III - Mútua assistência;
IV - Sustento, guarda e educação dos filhos;
V - Respeito e consideração mútuos. (BRA-
SIL, 2002)

Madaleno afirma:” Os deveres conjugais são comuns a


ambos os cônjuges e não poderia ser diferente diante da pre-
visão constitucional de igualdade dos consortes e dos gêneros
sexuais” (2018, p. 255) e considerando que o casamento de
legítimos e capazes se perfaz com plena consciência, ainda
que implícita na vida cotidiana, todos os incisos serão presen-
tes na vida do casal.
Vejamos que, em tese, todo casal será monogâmico,
cumprindo assim o primeiro dever predeterminado pelo artigo,
e a sua violação seria o adultério. Ainda por Madaleno, o adul-
tério ainda continua por ter o status da mais abjeta causa de
separação, repugnada pela natureza humana dos povos oci-
dentais, pois apesar de ter sido descriminalizada, ainda segue
sendo umas das mais dolorosas causas de separação (2018,
p. 257)
163 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Tratando-se ainda do artigo 1.566, sobre o segundo in-


ciso, Venosa diz: “A vida em comum no domicílio conjugal é
decorrência da união de corpo e de espírito” (2013, p. 163). É
necessário a vida em comum para a satisfazer o débito conju-
gal, necessário para o recíproco gozo das necessidades sexu-
ais, (Venosa, 2013, p. 163) deste modo, salvo raras exceções
consentidas pelos cônjuges, seja por trabalho, seja por do-
ença, viagens etc., que outra maneira há para eficácia de ma-
nutenção do matrimônio? Quando, ressalvados a liberdade in-
dividual, a não coabitação poderá inclusive cominar em sepa-
ração de fato, no qual o casal apenas não se divorciou oficial-
mente, entretanto a sua relação, em prática, é divórcio.
Ao se tratar de mútua assistência, precisamos nos aten-
tar que este não se resume exclusivamente ao quesito finan-
ceiro de satisfação econômica, é também sobre a assistência
imaterial, abrangendo tudo que se pode imaginar. O possível
que o parceiro puder fazer para reerguer o outro decaído, este
o fará, seja emocionalmente, financeiramente e em qualquer
área em que este possa ser socorrido. Estes atos são pilares
para salvaguardar qualquer relação pessoal, e ainda impor-
tante a conservação dentro do matrimônio, afinal este é ape-
nas mais uma das promessas conscientemente feitas um para
o outro.

164 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O inciso quarto do mesmo artigo é reflexo do que nossa


Constituição Federal é hoje. Momentos em que no século pas-
sado era de comumente apaziguado na sociedade que o ho-
mem era o provedor de todo o sustento material da cria, en-
quanto a mulher era a responsável pela sua educação e zelo
na casa.
Hoje o código é claro, pois não se trata de um ou outro,
mas de ambos os cônjuges serem responsáveis igualmente
por todas as funções que levam a sua cria na formação de
indivíduos. Tamanha a importância da assistência prestada
por ambos, o Estatuto da Criança e Adolescente (Lei n.8.069,
de 13 de julho de 1990), em sua especialidade, reafirma a obri-
gatoriedade em seu artigo 22: “Aos pais incumbe o dever de
sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-
lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer
cumprir as determinações judiciais.” (BRASIL, 1990)
Respeito e consideração mútuos referente ao último in-
ciso diz como imprescindível para a boa convivência do casal.
Como há de se falar de casamento perfeito onde este não se
tem respeito? Madaleno considera o respeito como a condição
mínima para um convívio social, consubstanciada diretamente
com a noção de decência e pudor, uma vez que a dignidade
humana inadmite qualquer transigência ou gradação (2018, p.
266). Deste modo o referido inciso dispõe a proteção da honra

165 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sobre tudo que lhe couber esteja o parceiro presente ou não,


este tem o dever moral e legal do respeito.

5.2 UNIÃO ESTÁVEL

O Direito Civil Brasileiro do século XX, como já falamos


aqui, tratava a família como exclusivamente núcleo advindo do
casamento, deste modo toda a sua proteção estava centrada
dentro do matrimônio, de tal maneira que era impossível o re-
conhecimento de filhos bastardos, isto é, fora do casamento.
Adiante, toda relação conjugal era denominada concubinato.
Segundo Tânia Nigri, quanto a confusão no meio social
e jurídico que o concubinato causara, foi definido duas formas,
sendo elas o concubinato puro, sendo este duas pessoas li-
vres, seja solteiros ou viúvos, não tinham qualquer impedi-
mento para casarem-se mas não o faria, e o segundo denomi-
nado como concubinato impuro, caracterizado com uma ou
duas pessoas com impedimentos legais para contrair matrimô-
nio, por exemplo um ou os dois já eram casados, e o seu novo
casamento caracterizaria como bigamia (2020, p. 11).
Rolf Madaleno descreve acerca da evolução histórica
do concubinato a união estável de forma poética ao citar Vir-
gílio de Sá Pereira:

166 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Que é que vedes quando vedes um homem


e uma mulher, reunidos sob o mesmo teto,
em torno de um pequenino ser, que é o fruto
de seu amor? Vereis uma família. Passou
por lá o juiz, com a sua lei, ou o padre, com
o seu sacramento? Que importa isto? O aci-
dente convencional não tem força para apa-
gar o fato natural (PEREIRA, apud MADA-
LENO, 2018, p. 1.432)

Portanto, a formação da família se perfaz como algo na-


tural antes de instituição de leis, antes do Estado, antes do juiz
e com isso foi largamente aceita a sua evolução, de modo que
hoje o concubinato puro foi convertido em união estável, en-
quanto as relações de parceiros impedidos de casarem-se, de-
nomina-se concubinato.
Em palavras simples, a união estável é aquele quando
parceiros livres e desimpedidos comprometem-se publica-
mente a terem relação com objetivo de constituir família, toda-
via para o seu reconhecimento o Código Civil expressivamente
diz (BRASIL, 2002) que a configuração deve ser na convivên-
cia pública, para Tânia Nigri, isto é dizer que o relacionamento
íntimo, ainda que por opção do casal seja discreto, sua convi-
vência deve ser ostensiva, não podendo ser clandestina com
encontros furtivos sendo indispensável o conhecimento da re-
lação no meio social (2020, p. 15).
Também é dizer que a relação deverá ser contínua e
duradoura, se referindo a sua estabilidade e eliminando em
167 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sua maioria as relações com separações longas ou relações


com encontros eventuais. Por fim, com o objetivo de constituir
família, este se define sobre a mesma luz com o que já debru-
çamos aqui no início ao falar do casamento, que é dizer que é
a junção entre dois indivíduos que decidem compartilhar suas
vidas entre si com respeito e lealdade, seja com interesse ou
não de terem filhos. Ademais, causas suspensivas do casa-
mento não impedem a configuração da união estável, bem
como os casados que sejam separados de fato.

5.3 RESPONSABILIDADE CIVIL E DANO MORAL

No início deste capítulo, devemos tratar sobre uma


breve introdução entre conceito e pressupostos que instituem
juridicamente a responsabilidade civil e dano moral para pos-
teriormente discutirmos sobre o dano moral e a infidelidade no
matrimônio.
O Código Civil em seu capítulo sobre obrigação de in-
denizar no título responsabilidade civil, estabelece imposição
de limites do direito quanto ao exercício de sua liberdade em
seu artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187),
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” (BRASIL,
2002), combinado com o artigo 187 do mesmo código que diz
“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao

168 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo


seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costu-
mes.” (BRASIL, 2002), isto é, a responsabilidade civil é a obri-
gação positivada em que aquele que por ventura, seja intenci-
onal ou não, causar efetivo prejuízo a alguém, este contrairá o
dever de indenização sobretudo a aquele que sofreu o fato da-
noso, assim então deverá ser reparado a vítima objetivando a
restauração de sua vida anterior ao prejuízo.
Em sua obra, Responsabilidade Civil de Silvio de Salvo
Venosa, é dito que toda ação humana está sujeita ao dever de
indenizar se ocorrer desta, um prejuízo (2013, p. 2), e comple-
menta ao dizer:

Os princípios da responsabilidade civil bus-


cam restaurar um equilíbrio patrimonial e
moral violado. Um prejuízo ou dano não re-
parado é um fator de inquietação social. Os
ordenamentos contemporâneos buscam
alargar cada vez mais o dever de indenizar,
alcançando novos horizontes, a fim de que
cada vez menos restem danos irressarcidos.
(VENOSA, 2013, p. 3)

5.3.1 DANO MORAL

Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal


do Brasil, foi admitido uma importante instituição do direito de

169 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

personalidade, a honra e a moral do cidadão, sendo reconhe-


cido de forma substancial o dano exclusivamente moral e as-
segurando indenização a aquele que tiver o seu direito e sua
dignidade violada. Posteriormente sendo tratado sobre o dano
moral também no Código de Defesa do Consumidor e no Có-
digo Civil Brasileiro.
No livro de Silvio de Salvo Venosa, o autor define cate-
goricamente o dano moral como aquilo que abala profunda-
mente o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima, de modo
que seja impossível viver a vida comum anterior ao dano cau-
sado (2013, p. 47).
Vale salientar que aqui estamos a falar do homem mé-
dio, aquele resiliente o suficiente para que não se deixe abalar
por sua sensibilidade excessiva, que não se deixa enganar por
um mero aborrecimento, mero dissabor cujo a ofensa não
fosse além do aceitável perante a rudez e grosseria comum do
cotidiano. Bem como aquele que ainda que lhe aconteça algo
muito extraordinário, este segue como se pedra fosse, com
pouca ou nenhuma sensibilidade consigo próprio, ou mesmo
incapaz de perceber os limites entre o simples estresse diário
da vida e a ofensa pessoal capaz de causar-lhe raiva, dor e/ou
vexame em razão do constrangimento do outro.
O legislador visando ratificar a preservação sobre o di-
reito de personalidade, tratou de escrever especificamente no

170 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Código Civil art. 186 que: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.” (BRASIL, 2002) assegurando na lei, o direito de perso-
nalidade ao cidadão e evitar que a sua honra, imagem e priva-
cidade sejam desrespeitadas, o protegendo de situações ve-
xatórias e humilhantes que possam gerar danos irreparáveis
ainda que não seja exclusivamente patrimonial.
Desta forma, é possível perceber que ao tratar sobre
este assunto, o Direito foi bastante meticuloso em razão dos
princípios da Constituição e da constante evolução de deci-
sões na jurisprudência.
O dano moral, ainda que não tenha a ver diretamente
com prejuízo patrimonial por quem sofre, este por muitas ve-
zes devido seu abalo psicológico, fica impossibilitado de exer-
cer sua vida normalmente acarretando assim também algum
eventual dano patrimonial.
Portanto a indenização cabe caso a caso, dependerá
sempre de cada caso concreto onde o magistrado será defini-
tivo e deverá ser sensitivo uma vez que sua margem para jul-
gar é extremamente subjetiva. O juiz não consegue ter o real
conhecimento do que sofreu a vítima, do quanto aquele fato
atingiu, do quanto lhe deixou de marcas da vida e talvez o
quanto sofrerá futuramente ainda pelo fato a ser superado.

171 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Tudo depende, e nesse depender o magistrado tam-


bém poderá incorrer em erro se porventura a vítima quiser be-
neficiar-se do fato ocorrido para lesar o ofensor, não para ter
o seu dano reparado mas para que agora o ofensor seja pu-
nido com valores extremamente incondizentes com a reali-
dade, de forma que este agora será o ofendido, isto é, a vítima
nesse momento torna-se o ofensor com o propósito de puni-lo
injustamente com o seu patrimônio. Venosa é muito preciso ao
dizer que nesse meio não há fórmulas, parâmetros ou súmulas
que deem segurança ao juiz para auxiliar com precisão (2013,
p. 47) e conclui que:

Será moral o dano que ocasiona um distúr-


bio anormal na vida do indivíduo; uma incon-
veniência de comportamento ou, como defi-
nimos, um desconforto comportamental a
ser examinado em cada caso. Ao se analisar
o dano moral, o juiz se volta para a sintoma-
tologia do sofrimento, a qual, se não pode
ser valorada por terceiro, deve, no caso, ser
quantificada economicamente. (VENOSA,
2013, p. 47)

Por fim a garantia do dano moral ao ser pleiteado de-


verá sempre compensar a dor ou distúrbio sofrido por alguém
que ainda que não tenha incidência em cima de seu patrimô-
nio, deverá ser ressarcido com acréscimo em seu campo ma-

172 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

terial, e que o ofensor tenha os reflexos do agravo em seu pa-


trimônio afim de desestimular que este torne a ofender nova-
mente.

5.4 A POSSIBILIDADE DE DANO MORAL EM RAZÃO DA


INFIDELIDADE

Como já nos foi esclarecido tantos assuntos em seus


respectivos capítulos, é cabível o entendimento agora quanto
a infidelidade e eventual indenização no direito de família. É
importante frisar que a infidelidade a se tratar neste artigo é
sobre aquela em que há dois indivíduos plenamente capazes,
seja sobre qualquer gênero, raça ou cor, em seus principais
institutos que constituem família, isto é, no casamento e na
união estável, família esta, consoante a definição dada pela
Constituição Federal. E infidelidade é esta que se traduz em
um indivíduo em qualquer das relações aqui apontadas como
aquele que comete adultério, aquele que ainda que tenha o
seu parceiro fixo e assumido perante a sociedade, o trai com
terceiro fora da relação.
Em outras palavras, é o parceiro que na sua relação
conjugal, viola o princípio da monogamia e comete o ato se-
xual de fato com outro fora de sua relação, porém, há de con-
siderar também a traição virtual, uma vez que esta, em razão

173 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da sua fácil vulnerabilidade a exposição social, poderá causar


transtorno a ambos os parceiros e a terceiro.
Precisamos dar atenção sobre a revogação do artigo
240 do Código Penal Brasileiro que trata sobre a extinção do
crime de adultério, ocorrendo desta maneira uma abolitio cri-
minis pela Lei nº 11.106 de 2005, isto é, o que antes era puní-
vel criminalmente, hoje não há mais a se falar na seara penal.
E neste diapasão trataremos sobre o adultério no âmbito civil,
e desconsideraremos possibilidade ou não da dissolução do
vínculo conjugal, pois o principal objetivo é tratar da infideli-
dade e quando desta puder ocorrer transtornos e conflitos pas-
síveis de indenização.
Silvio de Salvo Venosa é muito assertivo, e com uma
reflexão belamente filosófica ao dizer que é no âmbito familiar,
base da sociedade e do Estado, que busca-se a tutela da per-
sonalidade, e a proteção da dignidade humana (2013, p. 298),
ou seja, todos os envolvidos na célula familiar estão direta-
mente ligados, responsáveis e dependentes com a preserva-
ção da imagem e honra para com os outros, seja filhos com os
pais, pais com os filhos e cônjuges entre si.
Portanto, estabelecido a decisão de ficarem juntos, seja
matrimônio ou união estável, há a suposição que ambos se
desejam, ambos se querem bem e ambos preservarão a boa

174 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

convivência e afeto apesar de conflitos e dificuldades no de-


correr da relação, e assim todos assumem este relaciona-
mento como algo que possa contribuir com a sua realização
pessoal, sua felicidade e desenvolvimento pessoal no geral, e
pressupondo que ambos têm o cuidado da preservação e
guarda da manutenção do relacionamento.
Todavia quando há o rompimento, além dos sentimen-
tos abalados, há quebra de expectativas ora traçadas no início
da relação, sonhos ora possíveis ao lado do seu parceiro pa-
recem se esvaecer, e com isso surgindo o sentimento do tra-
ído, a dor, a aflição e angústia juntamente com o possível fim
do relacionamento.
Porém, certo momento deste artigo, nos foi mostrado
que aquele constrangimento é relativo, isto no sentido em que
apesar deste evento não ser corriqueiro, e que até certo mo-
mento possa expor o cônjuge a certo vexame, cabe ao juiz ser
razoável quanto a qualificação dos sentimentos do homem
médio, isto é, ser razoável contra o homem sensibilíssimo e
contra o homem de pedra sem nenhuma sensibilidade, porque
somente a traição, apesar de todo sentimento ruim que possa
trazer consigo, não é o bastante para causar irreparáveis da-
nos a honra e imagem, danos que quando acontecidos, a sua
reparação seja impossível bem como a sua plena convivência

175 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em sociedade conforme a decisão do Tribunal de Justiça do


Estado de Goiás:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO


C/C GUARDA DE MENOR E ALIMENTOS.
PARTILHA VERBAS RESCISÓRIAS TRA-
BALHISTAS E FGTS. IMPOSSIBILIDADE.
DANO MORAL POR INFIDELIDADE CON-
JUGAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1- O
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço -
FGTS por ser verba indenizatória persona-
líssima, de origem trabalhista, está excluído
do rol de bens partilháveis, conforme enten-
dimento desta Corte de Justiça, não sendo,
portanto, considerado patrimônio comum do
casal. 2- Embora a rescisão do contrato de
trabalho do apelante tenha se dado na cons-
tância do casamento, as verbas trabalhistas
são personalíssimas, motivo pelo qual não
há que se falar em meação, nos termos do
artigo 1.659, inciso VI, do Código Civil. 3- A
infidelidade conjugal, por si só, embora
constitua violação dos deveres do casa-
mento, não gera o dever de indenização por
danos morais. A reparação compensatória
pela infidelidade conjugal, somente tem lu-
gar em caso de ofensa à honra objetiva da
vítima. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. (TJ-
GO - APL: 03049109820158090113, Rela-
tor: JAIRO FERREIRA JUNIOR, Data de Jul-
gamento: 18/09/2019, 6ª Câmara Cível,
Data de Publicação: DJ de 18/09/2019)

Ora dito neste capítulo que o casamento e união estável


tem o objetivo de os companheiros contribuírem mutuamente
176 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em favor do relacionamento e do outro, também ascenderem


como pessoas na vida espiritual, pessoal, material, etc., e em
tudo que lhes for possível almejar a felicidade. Pois então se
ambos procuram serem felizes, não seria contraditório o sim-
ples adultério gerar alguma sanção?
Vejamos, se ambos cuidam acerca da manutenção do
relacionamento e se por ventura um está infeliz, deduz-se que
não apenas um, mas ambos são reciprocamente culpados da
situação embora apenas um tenha tido a iniciativa de compen-
sar a sua infelicidade fora da relação.
De mesmo modo, aquele que é infiel, ainda que seja
exclusivamente culpado, isto é, o único que não se atenta aos
cuidados com o parceiro e com a relação está, queira bem ou
queira mal, exercendo a sua liberdade e a busca da felicidade
de sua maneira ainda que possa gerar um mal sentimento no
outro, portanto, ainda que possa surgir alguma outra questão
passível de indenização, a simples ruptura da família ali for-
mada não gera o dever de indenização, afinal o êxito da pros-
peridade recaem sobre os dois e não somente sobre um.
É impossível viver em um relacionamento onde se vive
exclusivamente para a felicidade do outro como se fosse o
bobo da corte, sem que este próprio possa decidir o momento
em que não é mais feliz. E a decisão do Tribunal de Justiça do

177 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Distrito Federal e Territórios TJ-GO também é bastante pre-


cisa e resoluta neste assunto:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZA-


ÇÃO. INFIDELIDADE CONJUGAL. DANO
MORAL. AUSENCIA DE EXPOSIÇÃO PÚ-
BLICA DO CONJUGE TRAÍDO. INOCOR-
RENCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITOS DA
PERSONALIDADE. INEXISTENCIA DE
DANO INDENIZÁVEL. 1.O dano moral, pas-
sível de ser indenizado, é aquele que, trans-
cendendo à fronteira do mero aborrecimento
cotidiano, a que todos os que vivem em so-
ciedade estão sujeitos, e violando caracte-
res inerentes aos direitos da personalidade,
impinge ao indivíduo sofrimento considerá-
vel, capaz de fazê-lo sentir-se inferiorizado,
não em suas expectativas contratuais, mas
em sua condição de ser humano. 2. o dano
moral, previsto no art. 5º, inc. X, da Consti-
tuição Federal e no art. 186 do Código Civil,
revela-se diante de uma ação ou omissão de
outrem que, atingindo valores subjetivos da
pessoa, provoca injusta dor, sofrimento, ou
constrangimento. 3. Dispõe o art. 1.566 do
Código Civil, que são deveres de ambos os
cônjuges a fidelidade recíproca (inc. I), bem
como o respeito e consideração mútuos (inc.
V). Por outro lado, não há que se falar em
dever de indenizar quando ocorrer o des-
cumprimento dos deveres acima tracejados,
porquanto necessita existir uma situação hu-
milhante, vexatória, em que exponha o con-
sorte traído a forte abalo psicológico que, fu-
gindo à normalidade, interfira de sobrema-
neira na situação psíquica do indivíduo. As-
sim, a traição, por si só, não gera o dever de

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indenizar. 4. No caso em apreço, as informa-


ções dos autos não evidenciam a exposição
da apelante em situação vexatória, com ex-
posição pública, já que, a toda evidencia, a
alegada infidelidade conjugal, não teria ex-
trapolado o ambiente doméstico. 4.1 Isso
porque, não há provas concretas que ratifi-
que a tese de que o demandado teria envi-
ado às imagens do relacionamento extra-
conjugal a terceiros, configurando assim a
exposição da requerente. 5. É evidente que
a ruptura de laços afetivos gera mágoas, tris-
teza, dores, raiva, sensações ríspidas, e até
mesmo frustrações de sonhos e expectati-
vas; sentimentos estes que se tornam ener-
gizado quando o rompimento matrimonial
originar da descoberta de infidelidade conju-
gal. Todavia, a quebra da união em razão da
alegada infidelidade não é apta a caracteri-
zar, por si só, os requisitos da indenização
por danos morais, se não existir relato de ex-
tremo sofrimento ou situações humilhantes
que ofendam a honra, a imagem, a integri-
dade física ou psíquica do indivíduo, fato
que, nos autos, não revelam que o constran-
gimento ou o abalo emocional noticiado pela
apelante teria sido apto a gerar o sofrimento
extremo para caracterizar a ruptura do bem
estar. 6. A reparação patrimonial (dano mo-
ral), não é o meio eficaz para tentar cicatrizar
a dor do fim de um relacionamento, ou
mesmo a não concretização dos sonhos de
uma vida a dois, quiçá a melhor forma de cu-
rar mágoas, feridas e sonhos não vividos. O
ordenamento jurídico possui meios eficazes
para resguardar a autora, caso queira, como
o Direito de Família. 6.1 As frustações na re-
alização dos sonhos a dois, buscado pela

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apelante, não caracteriza o dever de indeni-


zar, pois o rompimento do relacionamento
não configura prática de ato ilícito ensejador
do dever de indenizar. 7. Não há que se falar
em dano moral em razão do término do rela-
cionamento entre as partes, pois o rompi-
mento de uma relação não é capaz, por si
só, de ensejar o direito a tal pretensão. 8.Re-
curso conhecido e desprovido. (TJ-DF
00064619720168070020 - Segredo de Jus-
tiça 0006461-97.2016.8.07.0020, Relator:
GISLENE PINHEIRO, Data de Julgamento:
08/08/2018, 7ª Turma Cível, Data de Publi-
cação: Publicado no DJE : 14/08/2018 .
Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Um tanto cirúrgica a decisão exemplificando exata-


mente do que estamos a tratar, quando um cônjuge está de-
cepcionado com a descoberta da traição e seus sentimentos
são aflorados a potência máxima e laços ora reforçados e
prósperos, se rompem as vezes de forma tão repentina que
esses sentimentos faz parecer ao parceiro traído como o fim
do mundo, a dor e a frustração causada é tamanha que até
faça sentido a argumentação do abalo psíquico e insulto a sua
dignidade, entretanto se não houver a comprovada exposição
a situações humilhantes e vexatórias por circunstâncias diver-
sas da somente infidelidade do caso, não há de se falar em
indenização já que a reparação pecuniária não é o melhor mé-
todo para curar feridas da relação.

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5.5 HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE INDENIZAÇÃO

Solucionada os questionamentos acerca da não confi-


guração do ato ilícito no fim da relação conjugal em razão do
adultério, fica claro que argumentar apenas sobre a infideli-
dade é insuficiente e descaracteriza a configuração do dever
de indenizar. Mas o que exatamente poderá ser pleiteado por
dano moral se houver a traição?
A resposta é mais simples do que parece pois, para to-
dos os efeitos, apesar da problemática pairar no campo do di-
reito de família toda afronta ou desrespeito com o parceiro se-
gue os mesmo moldes da indenização moral comum da seara
cível, uma vez que ocorreu a infidelidade e desta surgiu a
ofensa a imagem do cônjuge, sendo um o ponto de partida e
outro o que gerou sequelas e desafetos.
Isto é, apesar da infidelidade ser a discussão principal,
não necessariamente o faz como chave ao processo de inde-
nização, mas sim os efeitos colaterais dela, como por exemplo
a sentença do Tribunal de Justiça do Amapá TJ-AP sobre ex-
posição social da vítima:

APELAÇÃO CÍVEL. INFIDELIDADE CON-


JUGAL. SUCESSIVOS CASOS EXTRA-
CONJUGAIS DO MARIDO. FILHO FORA
DA RELAÇÃO MATRIMONIAL. ABALO PI-

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SICOLÓGICO DA ESPOSA TRAÍDA. DA-


NOS MORAIS CONFIGURADOS. CRITÉ-
RIO BIFÁSICO ADOTADO. NÃO PROVI-
MENTO. 1) A infidelidade conjugal, como
causa isolada, não gera dever de indenizar
o cônjuge traído. 2) Configura dano moral,
no entanto, a comprovação de nexo de cau-
salidade entre as condutas e o dano experi-
mentado. 3) No caso, ocorreram sucessivas
condutas infiéis do marido ao longo da rela-
ção matrimonial, uma das quais gerou um fi-
lho fora do casamento, no que resultou ex-
posição social da esposa, incluindo conver-
sas de terceiros em redes sociais atribuindo
alcunhas depreciativas a ela, humilhação e
dano psicológico suportado. 4) Critério bifá-
sico de quantificação do dano adotado. 5)
Apelações não providas. Sentença mantida.
(TJ-AP - APL:
00440165120188030001 AP, Relator: Juiz
Convocado MARIO MAZUREK, Data de Jul-
gamento: 01/10/2020, Tribunal)

Como bem representado no caso prático, é de fácil per-


cepção a ratificação de que a infidelidade por si só não deter-
mina o dever de indenização, assim como também fica claro o
ponto central deste capítulo, que é a incidência danosa a ima-
gem como efeito colateral advindo da infidelidade do casa-
mento ou da união estável.
Que como exemplificado seria a exposição a imagem
da esposa traída por meio de redes sociais cujo comentários
pejorativos refletem sobre sua imagem na sociedade, impos-
sibilitando a boa convivência social sem vez ou outra acabar
182 | P á g i n a
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escutando comentários e relembrando todo o caso que além


deste tê-la causado algum transtorno, e desta situação acabar
se submetendo a ouvir comentários indesejáveis e sentir-se
humilhada perante a sociedade, assim portanto, perfeitamente
configurada a ocorrência do dano moral.
Mas inúmeras são as possibilidades dos colaterais da
infidelidade, podendo até mesmo em ocorrência dos comentá-
rios pejorativos se agravarem para danos psicológicos perma-
nentes que a faça ser depender de acompanhamento psicoló-
gico para reverter tal situação, ou mesmo a possibilidade de
piorar para um quadro dependência química psiquiátrica, pode
citar também que cônjuges a partir de novo relacionamento
fora da relação conjugal possam contrair doenças físicas pela
falta de zelo do outro, isto é, prevenção sexual contra doenças
sexualmente transmissíveis que possam atingir o parceiro tra-
ído entre várias outros exemplos que suportam os mesmos
moldes do dano moral comum.
Desse modo, entendemos que a reparação deverá
sempre ser ponderada para não ter a infidelidade como razão
principal do processo, pois o corpo do artigo 1.566 do Código
Civil que trata do dever de fidelidade recíproca traz consigo a
dissolução da sociedade conjugal devido a quebra da obriga-
ção e somente isto, nada se fala sobre indenização. Também

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há de se falar que o cúmplice da relação extramatrimonial não


responderá conjuntamente com o parceiro infiel.
Os deveres do casamento são contraídos e obrigados
a cumpri-los somente entre os cônjuges, e ainda que se diga
em obrigação de não fazer, novamente esta recai sobre o par-
ceiro, não tendo terceiro adquirido obrigação nenhuma para-
lelamente. A possibilidade de recair responsabilidade ao cum-
plice da traição será se este causar diretamente o desrespeito
e a humilhação ao outro por quaisquer meios possíveis, desde
que comprovada de fato a configuração do dano.
Por fim, direitos de reparação em razão do desenlace
do matrimônio se estabelecem de outra maneira, sendo pos-
sível em casos que requeiram a manutenção contínua ou tem-
porária pelos parceiros, exemplos podemos citar como a repa-
ração moral e material de rompimento de noivado que por al-
gum motivo um dos nubentes decide não concretizar o matri-
mônio causando o prejuízo da preparação e a humilhação da
espera por alguém que não chegou ao casamento. Bem como
aqueles que exigem de um dos cônjuges a pensão alimentícia,
seja para os filhos ou seja para o outro parceiro que é finan-
ceiramente dependente por infindas razões.
Contudo, mesmo que seja traçado inúmeras formas de
argumentações acerca da indenização sobre infidelidade, é
importante observar que não há fórmulas seguras para seguir,

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cada caso tem a sua peculiaridade e sua particularidade sendo


necessário a profunda investigação adequada do processo. E
ainda que consiga concluir com justiça, deve-se estar atento
as mudanças sociais e acompanhá-las, uma vez que o Direito
acompanha nuances e controvérsias sociais para buscar a
melhor solução de caso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa sobre quais as causas que implicam a con-


denação de danos morais em razão do adultério, teve como
objetivo primeiramente entender o que exatamente é a consti-
tuição do casamento e união estável e quais os reflexos para
o casal, como também sobre a anuência voluntária de direitos
e deveres em prol do bem comum do casal ou da família.
Após o entendimento sobre cada um dos institutos que
podem constituir família, vimos que ao contrair matrimônio, os
parceiros abertamente anuem com o artigo 1.566 do Código
Civil, que tratam dos deveres do casamento, que são o de fi-
delidade recíproca, vida em comum no domicílio conjugal, mú-
tua assistência, sustento, guarda e educação dos filhos e o
respeito e consideração mútua.

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Entretanto, também vimos que isso não se trata de cláu-


sula contratual, sua violação de deveres não indica automati-
camente a obrigação de indenizar, mas talvez as consequên-
cias do ato, sim. Desta forma, fez-se necessário também co-
nhecer sobre o dano moral, pois também há de se falar que o
casal tem o dever moral de proteção e guarda a dignidade de
seus familiares, tal como parceiros entre si, pais com filhos e
filhos com os pais.
Referente ao dano moral, aprofundamos o suficiente
para entender a linha tênue entre o mero dissabor e o dano
capaz de abalar profundamente os ânimos psíquicos, moral e
intelectual do indivíduo, e para isso precisamos levar em con-
sideração o homem médio, aquele não tão frágil bem como
aquele não tão rude. Quanto o ofensa moral sobre a infideli-
dade, entendemos que o acontecimento pode ser por vezes
decepcionante em virtude da quebra de confiança, de expec-
tativa e por vezes sendo até traumatizante, entretanto, há de
se considerar que ainda que os indivíduos que se relacionem,
muito provavelmente não tenham em mente a traição do seu
parceiro, ainda assim é necessário entender que as circuns-
tâncias de vida podem levar a uma traição, que isso pode
acontecer com qualquer casal e portanto essa condição pode
ser suportável o cidadão médio da sociedade.

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Contudo, o dano moral paira sobre o nexo causal entre


a infidelidade, e circunstâncias colaterais do ato, isto quer di-
zer que, ainda que você seja traído e experimente no âmago
do seu ser a profunda tristeza, isso não o faz especial para
uma indenização, uma vez que o cidadão comum é constan-
temente também ameaçado na média de suas relações, mas
se por ventura condutas infiéis possam trazer vexame, humi-
lhação, exposição social que te abale psicologicamente, po-
derá enfim ter o direito a ser reparado pela dor que lhe cause,
entendendo que não pela traição, mas pelo sofrimento em ra-
zão dela. Todavia, há de se deixar claro que em todo caso
dependerá do caso concreto, do cuidado e do entendimento
do magistrado sobre as circunstâncias para que não se olhe
ao traído com vitimismo e possa ceder ao desejo de vingança
deste.

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pelo descumprimento dos deveres pessoais no casa-
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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Este livro reúne cinco artigos, na área
de Ciências Jurídicas, redigidos por
concludentes do Curso de Direito da
UNINORTE – Ac, sob a supervisão da
Profa. Esp. Williane Tibúrcio Facundes.
EAC
Editor

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