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Williane Tibúrcio Facundes

mostra de artigos
(organizadora)

TOMO I

CIÊNCIAS JURÍDICAS
na Amazônia Sul-Ocidental

EAC
Editor
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Copyright © by autores, 2023.


All rigths reserved.

Todos os direitos desta edição pertencem aos autores. Nenhuma parte desse
livro poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a autorização
prévia da organizadora pelo e-mail <willitiburcio@gmail.com >. A violação
dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo art.
184 do Código Penal. As informações contidas em cada capítulo são de inteira
responsabilidade dos autores, bem como o alinhamento dos textos às normas
da ABNT e da ortografia gramatical da língua portuguesa.

CAPISTA E DIAGRAMADOR
Eduardo de Araújo Carneiro
eac.editor@ gmail.com

CONSELHO EDITORIAL DA OBRA


Dr. Eduardo de Araújo Carneiro
Dr. Elyson Ferreira de Souza
Me. Adriano dos Santos Lurconvite
Esp. Simmel Sheldon de Almeida Lopes
Esp. Arthur Braga de Souza
Esp. Ícaro Maia Chaim

E-BOOK

S729c FACUNDES, Williane Tibúrcio (Org.).


Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental: mostra de
artigos / Williane Tibúrcio Facundes (organizadora). – 1.
ed. – Rio Branco: EAC Editor, 2023. 200 p.; il. 14,8x21
cm. Tomo I; Vol. 7.
ISBN: 978-65-00-70994-0
1. Ciências Jurídicas; 2. Direito; 3. Amazônia ; I. Título.
CDD 340.07
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

SUMARIO

APRESENTAÇÃO 05

1. ENCARCERAMENTO FEMININO NO SISTEMA 07


PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE
ACERCA DA DESIGUALDADE DE GÊNERO
Ana Cristina da Silva Coelho
Kevin Oliveira Mendonça

2. CRIMES VIRTUAIS: CONSCIENTIZANDO À SO- 44


CIEDADE PARA PRÁTICAS SEGURAS DO USO
DA INTERNET NO BRASIL
Thais Marques da Silva Abreu
Williane Tibúrcio Facundes

3. AS PRÁTICAS ABUSIVAS DOS PLANOS DE 90


SAÚDE EM RECUSAR PROCEDIMENTO NÃO LIS-
TADOS NO ROL DE SERVIÇOS DA AGÊNCIA NA-
CIONAL DE SAÚDE
Edilson Itani Carneiro Júnior
Alynne Jandayra Eliamen da Costa

4. CLÁUSULAS ABUSIVAS EM CONTRATOS DE 133


RELAÇÃO DE CONSUMO E AFETAÇÃO AOS
PRINCÍPIOS DO ÂMBITO CONSUMERISTA
Isabelle Freitas Nascimento
Alynne Jandayra Eliamen da Costa

5. DIREITO Á VIDA VERSUS EUTANÁSIA 166


Nathalin Krishna Rocha de Assunção
Alynne Jandayra Eliamen da Costa
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“O fim do Direito não é abolir


nem restringir, mas preservar e
ampliar a liberdade.”
John Locke
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

APRESENTAÇÃO

A
presente obra reúne 05 (cinco) artigos de con-
cludentes do curso do direito do Centro Univer-
sitário Uninorte, sob a organização da profes-
sora especialista Williane Tibúrcio Facundes, tendo também a
colaboração dos professores especialistas Kevin Oliveira
Mendonça e Alynne Jandayra Eliamen da Costa. Os textos fo-
ram escritos em coautoria com a organizadora e abordam re-
levantes temas jurídicos.
Dentre os temas analisados temos o do encarcera-
mento em massa das mulheres, fator importante que requer
discussão e análise, haja vista que a realidade atual é crítica
à medida que o número de mulheres encarceradas aumenta
significativamente ao longo dos anos

Outra temática estudada é o direito à saúde é a base


de suas garantias constitucionais e a discussão de questões
que surgem na assinatura de planos privados de saúde, que
geralmente se devem à falta de seguro médico para determi-
nados abusos e práticas de operadoras de planos de saúde
privados.
Segue tratando acerca das cláusulas abusivas em con-
tratos de relação de consumo e afetação aos princípios do âm-
bito consumerista, com ênfase na sua evolução histórica e nos

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aspectos principiológicos formadores do código de defesa do


consumidor, com o objetivo de evidenciar o tema, visto que,
padece de discussão no seio dos operadores do Direito que
atuam no campo da ciência jurídica.
Prossegue abordando sobre o direito à vida que é invi-
olável, essa inviolabilidade é garantida na Constituição Fede-
ral e no Código Penal como direito fundamental e prevê san-
ções aos indivíduos que a violarem.
E por fim, uma análise acerca dos crimes virtuais e a
implementação da lei nº 14.533 de 2023 que instituiu a Política
Nacional de Educação Digital, com objetivo de demonstrar que
tais regulamentações do ordenamento jurídico brasileiro não
têm sido suficientes na garantia da segurança pública, neces-
sitando, assim, da adoção de outras medidas, tais como de
cunho Educacional.
Trata-se de uma obra coletiva e plural, que debate te-
mas interessantes à sociedade e, sem esgotar os assuntos,
promove reflexões a respeito de situações vivenciadas diaria-
mente em nosso corpo social. Daí se extrai a sua relevância.

Prof. Esp. Williane Tibúrcio Facundes


Docente do Curso de Bacharelado em Direito pelo
Cento Universitário Uninorte. Graduada em Direito pela
U:Verse. Especialista em Psicopedagogia. Graduada em Le-
tras Vernáculas pela Universidade Federal do Acre - UFAC.

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ENCARCERAMENTO FEMININO NO SISTEMA PRISIONAL
BRASILEIRO: UMA ANÁLISE ACERCA DA
DESIGUALDADE DE GÊNERO

FEMALE INCARCERATION IN THE BRAZILIAN PRISON


SYSTEM: AN ANALYSIS OF GENDER INEQUALITY

Ana Cristina da Silva Coêlho1


Kevin Oliveira Mendonça2

COÊLHO, Ana Cristina da Silva. Encarceramento feminino


no sistema prisional brasileiro: uma análise acerca da de-
sigualdade de gênero. Trabalho de Conclusão de Curso de
graduação em Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio
Branco, 2023.

1
Discente do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
2
Docente, advogado, graduado em Direito pela Faculdade Barão do Rio
Branco. Pós-graduado em Direito Civil e Tributário pela Universidade
Anhanguera. Pós-graduando em Direito Penal pelo IBMEC.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo trata do encarceramento em massa das mu-


lheres, fator importante que requer discussão e análise, haja
vista que a realidade atual é crítica à medida que o número de
mulheres encarceradas aumenta significativamente ao longo
dos anos. Por conseguinte, realizou-se uma análise histórica
do sistema prisional brasileiro, juntamente com às leis que am-
param os direitos das detentas, às condições sanitárias esta-
belecidas pelo sistema e a perspectiva envolta à desigualdade
de gênero. Nessa concepção, procedeu-se o estudo com base
na Constituição Federal de 1988, na Lei de Execução Penal
1984, no Código Penal de 1940, bem como, nos Tratados de
Bangkok, Mandela e Tóquio.

Palavras-chave: encarceramento; desigualdade; mulheres;


sistema.

ABSTRACT

This article deals with the mass incarceration of women, an


important factor that requires discussion and analysis, given
that the current reality is critical as the number of women incar-
cerated increases significantly over the years. Therefore, a his-
torical analysis of the Brazilian prison system was carried out,
together with the laws that support the rights of inmates, the
sanitary conditions established by the system and the perspec-
tive involved in gender inequality. In this conception, the study
was carried out based on the Federal Constitution of 1988, the
Penal Execution Law 1984, the Penal Code of 1940, as well as
the Treaties of Bangkok, Mandela and Tokyo.

Keywords: incarceration; inequality; women; system.

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INTRODUÇÃO

Este artigo abordará a importância do encarceramento


feminino no Brasil e a desigualdade existente na esfera prisio-
nal. Embora haja uma evolução legislativa e a introdução de
penas alternativas, a criminalidade e o encarceramento conti-
nuam a aumentar no Brasil, e as mulheres são cada vez mais
protagonistas de atos criminosos. Em relação à supremacia
social masculina sobre a qual a prisão foi fundada, este estudo
busca analisar a posição desigual das mulheres nesse sistema
e os motivos que aumentaram a proporção de mulheres en-
carceradas em relação aos homens.
Nesse sentido, é essencial examinar as condições pri-
sionais em que as mulheres são mantidas e assegurar que o
local respeite todos os direitos garantidos a elas, conforme es-
tipulado no ordenamento jurídico. Cabe salientar, que a efeti-
vação da dignidade humana é essencial para todas as pes-
soas no quadro de uma democracia constitucional, dado que
viver uma vida digna, estando preso ou não, é considerado um
direito mínimo assegurado a todos os cidadãos.
Além disso, a supressão de direitos e garantias básicas
dos presos está profundamente enraizada nas práticas sociais
cotidianas. No caso do confinamento feminino, a privação é
desproporcionalmente maior. Esse descaso se evidencia na

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

falta de uma política pública que reconheça as presidiárias


como pessoas de direitos cuja privacidade decorre de suas re-
lações de gênero.
Ressalta-se a ausência do Estado em relação ao encar-
ceramento de mulheres, uma vez que os presídios são precá-
rios para atender todas as demandas e necessidades das mu-
lheres encarceradas, motivo pelo qual o Estado alega que não
há recursos suficientes para garantir o mínimo para as deten-
tas.
Diante disso, e para refletir sobre o assunto, este artigo
apresentará problemas relacionados à omissão do Estado no
enfrentamento do encarceramento feminino. Desta feita, ten-
taremos entender os detalhes revendo brevemente a evolução
das prisões femininas, as leis que protegem os direitos das
presas, os problemas relacionados, como instabilidade estru-
tural, sanitária, bem como, as consequências negativas, como
o abandono familiar, apontando todos os problemas enfrenta-
dos pelas presas diante da superlotação e desigualdade.

1.1 SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

As sanções penais são imprescindíveis para a socie-


dade e para o Estado em função das suas finalidades retribu-

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tivas e preventivas. A retributiva tem o objetivo de punir os in-


fratores pelos danos causados às vítimas, suas famílias e à
coletividade. Por outro lado, a preventiva tem o intuito de inti-
midar e impedir que um crime seja cometido. Vale ressaltar
que, são espécies de sanção penal, a pena e a medida de se-
gurança.

A pena é utilizada aos criminosos que praticam uma


conduta típica e ilícita, visando puni-los e ressocializá-los,
como também, preveni-los contra a realização de novos deli-
tos. Em contrapartida, a medida de segurança possui caráter
preventivo e visa proteger a sociedade do perigo que repre-
senta uma pessoa ativa com insanidade mental, quando é de-
clarado inimputável ou semi-imputável.

Insta destacar que as espécies de penas permitidas no


Brasil, são: as privativas de liberdade, as restritivas de direitos,
e de multa. Assim sendo, as penas privativas de liberdade ob-
jetivam aprisionar o infrator, que ao ser condenado pelo fato
típico penal que praticou, ficará sujeito a pena de detenção ou
reclusão, e assim, terá seu direito de liberdade de ir e vir pri-
vado.

Vale salientar que, as penas restritivas de direitos são


sanções impostas que podem substituir a pena privativa de li-
berdade e consiste na remoção ou limitação de um ou mais

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direito do culpado, sendo uma punição alternativa, que deverá


ser aplicada em delitos com nível de responsabilidade menor.
Por fim, a pena de multa inclui a obrigatoriedade do infrator ao
pagamento de certa quantia ao fundo penitenciário, sendo fi-
xada a quantia na forma de dias-multa.

Segundo o Mestre e Doutor Guilherme Nucci (2021, p.


625) a prisão é “a privação da liberdade, tolhendo-se o direito
de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cár-
cere”. Por outro lado, o pai do iluminismo penal, Cesare Bec-
caria (2000, p. 25) entende que: “a prisão, entre nós, é antes
de tudo um suplício e não um meio de deter um acusado”. A
prisão, ao ser instituída no Brasil, utilizava como métodos de
punições, a vingança e a tortura, no que diz respeito a tortura,
Beccaria (2000, p.34) preceitua que:

É uma barbárie consagrada pelo uso na


maioria dos governos aplicar tortura a um
acusado enquanto se faz o processo, seja
para que ele confesse a autoria do crime,
seja para esclarecer as contradições em que
tenha caído, seja para descobrir os
cúmplices ou outros crimes de que não é
acusado, porém dos quais poderia ser
culpado, seja finalmente porque sofistas
incompreensíveis pretenderam que a tortura
purgava a infâmia.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Até 1830, o Brasil não tinha código penal próprio, por-


tanto estava sujeito às normas Filipinas. Com isso, o Código
Filipino, em seu quinto volume, definiu os crimes e penas utili-
zados no ordenamento jurídico brasileiro. Inicialmente, utili-
zava as sentenças de penas corporais, pena de morte e até
humilhação pública. Destarte, no início do século XIX, a insta-
bilidade dos presídios brasileiros se apresentava como fator
de superlotação e o número de presos superava o número de
vagas.
Apesar deste cenário, as mudanças começaram a sur-
gir em 1824, durante a era colonial, quando foi promulgada a
primeira Constituição Federal Brasileira, na qual foram propos-
tas mudanças e reformas, buscando a extinção da utilização
da tortura como pena. Além disso, foi declarado a inviolabili-
dade dos direitos civis e políticos e definido que as penitenci-
árias separassem os réus por tipo de crime e sentença, de
modo que as prisões fossem limpas e seguras, bem como,
adequadas para o trabalho do prisioneiro.
O Código Penal Imperial, ratificado em 1830, introduziu
as penas de prisão no Brasil, dividindo-as em dois tipos: prisão
simples e prisão com trabalho e, apesar dessa ratificação, o
trabalho forçado e a pena de morte permaneceram em vigor.
No entanto, foram adotados métodos considerados menos
cruéis e mais sociais.

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Em 1890, um novo Código Penal foi promulgado, abo-


lindo a pena de morte, prisão perpétua e açoitamento, inici-
ando, assim, uma nova fase no direito penal brasileiro. A Pro-
clamação da República de 1889 e o Código Penal de 1890
introduziram as instituições progressistas que sustentam o
atual sistema penal. Assim, a atual lei penal instituída pelo De-
creto Legislativo 2.848/1940 mantém um sistema progressivo
que apresentou um enorme avanço na aplicação das penas.
Contudo, apesar do novo ordenamento jurídico assegu-
rar que os direitos e garantias dos presos são reforçados pela
Lei de Execução Penal, Constituição Federal, e tratados inter-
nacionais de direitos humanos, ainda existe uma grande vio-
lação desses direitos e garantias.
Com base nas comparações existentes entre a lei e a
realidade, pode-se concluir que dificilmente são atendidas as
obrigações mínimas estabelecidas pela legislação penal bra-
sileira para considerar a prisão em circunstâncias razoáveis.
Para constatar isso, basta ver a realidade nos presídios exis-
tentes no Brasil. Com isso, a Constituição da República Fede-
rativa do Brasil, promulgada em 1988, estabelece a dignidade
da pessoa humana como princípio fundado no Estado Demo-
crático de Direito, sendo dever do Estado manter-se em fun-
ção do indivíduo brasileiro e garantir um ambiente digno ao
preso.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.1.1 PERFIL DA MULHER ENCARCERADA

A princípio, as mulheres eram vistas como incapazes


de cometer crimes, todavia, ao longo dos anos, essa imagem
frágil e sensível foi se fragmentando. A mulher é aprisionada
em um ensinamento que visa sua libertação moral e a reduz a
um patamar padronizado da sociedade.
Com cerca de 919 mil presos, o Brasil ocupa o terceiro
lugar no ranking mundial de prisões, atrás da China e dos Es-
tados Unidos. Dados do Departamento Penitenciário Nacional
junto ao Ministério da Justiça mostram uma mudança no nú-
mero de mulheres presas, passando de cerca de 5.600 (cinco
mil e seiscentos) no ano de 2000 para 33.000 (trinta e três mil)
no ano de 2021.
Insta salientar, que existem inúmeras mulheres no
mundo do crime. O número de detentas privadas de liberdade
aumentou acentuadamente, mas elas representam apenas
6,4% do total da população detida. A evolução dos dados so-
bre o número de detentas reflete não apenas a progressão dos
crimes cometidos por elas, mas também avanços na conde-
nação de mulheres infratoras pelo sistema de justiça criminal.
Segundo dados do Levantamento Nacional de Informa-
ções Penitenciárias de 2014, a maioria das mulheres encarce-
radas estavam presas por tráfico de drogas ou crimes correla-

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

tos e eram consideradas “mulas” por traficar pequenas quan-


tidades de drogas para seus companheiros. Cerca de 50%
(cinquenta por cento) dessas mulheres têm entre 18 e 29 anos
de idade e não concluíram o ensino fundamental.
Usando os mesmos dados coletados pelo INFOPEN
em 2014, foi verificado que 68% (sessenta e oito por cento)
das prisões femininas são de mulheres negras, apenas 31%
(trinta e um por cento) são de mulheres brancas e quase 1%
(um por cento) são de mulheres amarelas. Esses números são
realistas, pois há 2 negros para cada 3 presos. Desse modo,
mesmo a escravidão sido abolida há cerca de 120 anos, os
negros ainda vivem na pobreza e buscam formas ilegais de
sobreviver.
Dessa forma, o aumento de presidiárias no Brasil é ali-
mentado pelas diversas vulnerabilidades que enfrentam, como
baixa escolaridade, falta de empregos, acesso à educação e
a grande responsabilidade de sustentar uma família. Além
disso, as mulheres enfrentam dificuldades no retorno ao con-
vívio social. Isso se reflete na falta de recursos para formular
políticas, nos problemas de frequência de cursos e até de in-
serção no mercado de trabalho. Desempregadas ou em em-
pregos precários de curto prazo, com pouca renda para sus-
tentar suas famílias, as mulheres tendem a cometer crimes no-
vamente.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.2 APLICAÇÃO DAS LEIS QUE PROTEGEM OS DIREITOS


DAS PRESAS: LEI Nº 7.210/84, DECRETO LEI 2.848/40 E
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Da previsão dos direitos das mulheres presas no Orde-


namento Jurídico, além do imediato ostracismo social, do so-
frimento familiar e das possíveis consequências judiciais im-
posta pela prisão de um indivíduo por ato tipificado por lei
como crime, a primeira punição imposta ao infrator, mesmo
que fosse inocentado e liberado posteriormente, foi a privação
de liberdade. Nessa perspectiva, mesmo privados de sua li-
berdade, os presos gozam dos direitos de cidadão como edu-
cação, saúde e assistência jurídica.
Para mais, a Constituição Federal, promulgada em 05
de outubro de 1988, trouxe consigo políticas, objetivos, nor-
mas e, sobretudo, direitos e garantias individuais garantidos a
todos os cidadãos brasileiros. É também a primeira constitui-
ção que reconhece explicitamente o princípio da dignidade da
pessoa humana previsto no artigo 1º, inciso III da Constituição
e prova que não há diferença entre os seres humanos. Da
mesma forma, o artigo 5º da referida constituição garante di-
versos direitos a todos os cidadãos, independentemente de

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sua condição, inclusive aos privados de liberdade, como o di-


reito de não ser torturado e não ser submetido a tratamento
desumano e degradante.
É importante ressaltar que a Lei de Execução Penal de
1984 é outra norma que protege o direito dos presos, tendo
como objetivo recuperar, ressocializar, readaptar, reeducar e
dentre outros fatores que influenciem os presos a não praticar
novos delitos, com o intuito de fazer com que eles possam
estudar e trabalhar e, assim, se reintegrar na sociedade. Ou-
trossim, juntamente com as normas da Constituição Federal
de 1988, pode-se dizer que o Código Penal de 1940 e a Lei de
Execução Penal de 1984 também dispõem acerca da integri-
dade física e moral dos condenados e presos provisórios.
Além desses dispostos, a Lei de Execução Penal cons-
titui mais direitos aos presos, tais como: alimentação suficiente
e vestuário; atribuição de trabalho e sua remuneração; Previ-
dência Social; constituição de pecúlio; proporcionalidade na
distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recrea-
ção; exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísti-
cas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a
execução da pena; assistência material, à saúde, jurídica, edu-
cacional, social e religiosa; visita do cônjuge, da companheira,
de parentes e amigos em dias determinados.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.2.1 TRATADO DE TÓQUIO

As Regras de Tóquio, endossadas pela Organização


das Nações Unidas (ONU) em 1990, estabelecem princípios
básicos destinados a reger o uso de medidas não privativas
de liberdade e a proteger os sujeitos a essas medidas em vez
da prisão. O objetivo básico é estabelecer salvaguardas me-
nores. Assim, as condições políticas, econômicas, sociais e
culturais de cada país devem ser levadas em conta na aplica-
ção destas regras.
Nos termos do Tratado de Tóquio, as Nações Unidas
têm interesse na humanização, no avanço do direito penal e
em sua aplicação e, por isso, buscam prevenir o crescimento
da população carcerária, levando em consideração a grande
população e estabelecendo políticas. Na verdade, isso viola a
legalidade e a dignidade da execução ao não reabilitar os pri-
sioneiros. Vale ressaltar que a falta de prisões existe na soci-
edade há algum tempo, corrompendo os presos em vez de re-
abilitá-los, por isso, para penalizar, é importante implementar
soluções com custos mínimos e seguros.
O objetivo da Regra de Tóquio é buscar maneiras de
evitar a superlotação das prisões, contando com métodos re-
lacionados a uma abordagem judicial mais direta para reduzir
a prevalência dessas regras existentes na sociedade. Essas

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

regras juntamente com a Declaração Universal dos Direitos


Humanos de 1948 e as Regras Mínimas para o Tratamento do
Preso, asseguram a justiça e observância na execução das
penas e garantem o cumprimento das penas e crimes cometi-
dos. Atribui, portanto, uma função social à reabilitação dos re-
clusos.
De acordo com as Regras de Tóquio, as leis e os siste-
mas rígidos não contribuem para o controle do crime ou para
a reabilitação dos infratores, pois visam punir os criminosos
proporcionalmente aos crimes que cometeram, de modo que
a pena deverá ter fundo educacional, moral e social.
Conforme o exposto, o Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) denunciou que os espaços prisionais brasileiros conti-
nuam como uma forma de punição baseada em métodos de
execução. A estrutura está em péssimo estado de conserva-
ção, as celas estão superlotadas, úmidas e instáveis, a falta
de condições sanitárias continua presente no local e o sistema
não possui comprometimento com as presas.

1.2.2 REGRAS DE BANGKOK E REGRAS DE MANDELA

Celebradas em 2010 e traduzidas para o português


apenas em 2016, as Regras de Bangkok visam fornecer nor-
mas para que as instituições penais sejam organizadas de

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

forma justa, tendo em vista que cada preso tem necessidades


próprias e, além disso, propor o tratamento adequado aos pre-
sos. Isto posto, devem existir recursos disponíveis para os re-
clusos, incluindo a distribuição gratuita de absorventes, de-
vendo ser assegurados programas de apoio à reabilitação e
reintegração dos reclusos.
O Tratado de Bangkok sobre Regulamento de Higiene
Pessoal 5, dispõe que o alojamento para mulheres presas in-
cluirá as instalações e materiais necessários para atender às
necessidades sanitárias especiais delas. Inclui absorventes hi-
giênicos gratuitos e abastecimento regular de água para a hi-
giene pessoal das mulheres e crianças, especialmente das
que trabalham na cozinha e das mulheres e crianças grávidas,
lactantes ou menstruadas.
É importante que seja reconhecido as diferentes neces-
sidades das mulheres presas e tomadas iniciativas para alcan-
çar a igualdade de gênero sem discriminação. A existência da
Regra de Bangkok está relacionada ao desrespeito que as mu-
lheres enfrentam quando estão em uma posição vulnerável,
como quando uma mulher está prestes a dar à luz. Essas re-
gras, com o objetivo de alcançar a igualdade entre homens e
mulheres, são projetadas para garantir que as necessidades
das mulheres encarceradas sejam levadas em consideração,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sejam consideradas determinantes de suas necessidades e


de seu tratamento.
Um princípio fundamental das Regras de Bangkok é
que elas devem acomodar as diversas necessidades das pre-
sidiárias. De fato, são estipuladas normas para ingressar, re-
gistrar, alocar, higiene pessoal, cuidados com a saúde, aten-
dimento médico, cuidados com a saúde mental, prevenção de
doenças sexualmente transmissíveis, cuidados com gestantes
e lactantes, dentre outros.
Por conseguinte, as detentas devem ser mantidas em
prisões perto de suas famílias, receber assistência para con-
tatar seus parentes, ter acesso a aconselhamento jurídico, an-
tes, durante e após a detenção. Deve ser dada permissão para
tomar as providências necessárias para a criança, incluindo a
possibilidade de suspensão, um período razoável, tendo em
conta o superior interesse da criança.
Cabe destacar, que as acomodações devem fornecer
os equipamentos e materiais necessários para atender às ne-
cessidades específicas de higiene das mulheres e outras pes-
soas. Após a admissão na instalação, deve ser fornecida tria-
gem médica com uma avaliação abrangente para determinar
cuidados básicos, como a presença de infecções sexualmente
transmissíveis, cuidados de saúde mental, histórico de saúde
reprodutiva, presença de dependência de drogas e agressão

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sexual ou outro abuso que ela possa ter sofrido antes da ad-
missão.
Os Estados e as instituições devem projetar buscas,
realizar planejamento e proporcionar uma avaliação para me-
lhor compreender a natureza dos crimes cometidos, os moti-
vos de conflito com a justiça, os crimes secundários, as con-
sequências do encarceramento feminino, as características
das mulheres e o número de filhos que têm.
Isto posto, a implementação das Regras de Bangkok é
uma obrigação internacional assumido pelo Brasil que não
deve haver mais atrasos. De fato, o uso de revisões de direti-
vas como forma de harmonizar padrões domésticos com tra-
tados e convenções internacionais de direitos humanos deve-
ria ter sido mais amplamente aplicado, especialmente em um
sentido abstrato.
Pouco se fala sobre esses controles e a necessidade
de adequar os sistemas jurídicos nacionais aos tratados e con-
venções de direitos humanos. Embora as Regras de Bangkok
tenham sido aprovadas em 2010 e o governo brasileiro tenha
participado fortemente de sua preparação, por exemplo, no
Supremo Tribunal Federal, elas foram aplicadas com muita
cautela.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Para mais, criada pela Organização das Nações Uni-


das em 1955, as Regras de Mandela se aplicam universal-
mente a todos os presos e fornecem orientações adequadas
para lidar com o abandono pelo Estado, respeitando a digni-
dade da liberdade privada, voltando à essência da humani-
dade e protegendo os presos de tratamentos considerados de-
sumanos.
Essas regras podem ser utilizadas como um serviço à
jurisdição e têm o potencial de alterar o padrão de confina-
mento praticado pelo sistema judiciário brasileiro. Elas foram
criadas para garantir efetivamente os direitos dos detentos e,
como no caso da saúde, a norma estabelece que o Estado
deve garantir que os detentos tenham acesso aos cuidados
médicos necessários.
Seguindo essa concepção, as Regras de Mandela de-
vem ser aplicadas de forma justa, para que não haja discrimi-
nação baseada em raça, cor ou sexo, e com respeito às cren-
ças religiosas dos prisioneiros. Assim, para que a não discri-
minação seja aplicada na prática, é preciso levar em conside-
ração as necessidades de cada preso, principalmente os mais
vulneráveis. Deve-se notar que a higiene pessoal de acordo
com a Regra 18.1 exige que o preso se mantenha limpo e,
portanto, ele deve ter acesso a água e suprimentos sanitários
necessários para higiene e saúde.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Portanto, as Regras de Bangkok complementam as Re-


gras de Mandela, fornecendo orientação sobre como as mu-
lheres devem ser tratadas na prisão e descrevendo as neces-
sidades delas. Dentre vários assuntos existentes, o Regula-
mento estabelece normas para higiene pessoal e serviços re-
lacionados à saúde.
Estes incluem cuidados médicos específicos para mu-
lheres, como prevenção do HIV, tratamento de usuários de
drogas e atendimento a mulheres grávidas e lactantes. À vista
disso, ainda que essas regras façam parte do ordenamento
jurídico brasileiro, sabe-se que as prisões representam uma
realidade que está longe de aderir a todas as regras previstas
na Convenção.

1.3 DESIGUALDADE DE GÊNEROS NA PRISÃO

O sistema carcerário brasileiro envolve diversas carac-


terísticas, incluindo a criminalidade, a justiça e a desigualdade
social. Além disso, mesmo as mulheres sendo minoria dentro
do sistema prisional, a desigualdade de gênero também é um
aspecto importante a ser discutido, pois as presas enfrentam
desafios específicos, uma vez que as penitenciárias são mar-
cadas pela superlotação, a violência e a falta de acesso a ser-

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

viços básicos, como a educação e trabalho, tais desafios in-


cluem o aumento da vulnerabilidade à violência e exploração
sexual, bem como, a ausência de políticas públicas que levem
em conta as necessidades das presas e a discriminação de
gênero dentro do sistema. Por isso, essa superlotação é um
dos graves problemas relacionados ao abuso enfrentado por
presidiários no Brasil, pois gera implicações na proteção, na
administração prisional e no combate à desigualdade de gê-
nero, afetando tanto as mulheres presas quanto suas famílias
e a sociedade em geral.
A desigualdade no sistema penal se manifesta a partir
do momento em que uma mulher é presa. No caso de crime
em flagrante, a mulher deve ser acompanhada até a delegacia
por uma policial do sexo feminino, e não por um homem. Em
alguns casos, isso não ocorre com frequência e as mulheres
só são conduzidas quando acompanhadas por homens, tor-
nando o momento desconfortável e até intimidante. Ainda, re-
cebem os mesmos subsídios que os presos do sexo mascu-
lino, tornando suas necessidades extras ignoradas. Para
exemplificar, em geral, cada mulher recebe dois rolos de papel
higiênico por mês, quantidade que é suficiente para um ho-
mem, mas não para uma mulher que atende a várias necessi-
dades ao mesmo tempo, usando-os para duas necessidades
diferentes.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ao ser presa, a mulher é duplamente punida, haja vista


que ao praticar um delito, sofrerá a reprovação social e a apli-
cação de punição. Ainda, sofre por ter descumprido o papel
que é atribuído a mulher pela sociedade, enfrentando uma
grande discriminação das pessoas.
Enquanto as presas que desafiaram as normas legais
recebem poucas visitas, estando dependentes a fortes medi-
das de observação, vigilância, controle e abandono familiar,
por outro lado, os homens têm suas esposas e mãe indo visitá-
los com frequência, que não medem esforços para que a vida
deles seja facilitada.
Vale ressaltar que, a sociedade “aceita naturalmente” a
prisão dos homens e, para as mulheres, o crime é considerado
inaceitável. Por isso, a desigualdade de gênero maior é o
abandono, pois as mulheres ficam desamparadas por suas fa-
mílias, diferentemente dos homens que recebem todo o apoio
necessário.
Ao contrário das prisões masculinas, onde a visita ín-
tima é mais informal e até moralmente aceitável, as prisões
femininas permitem a visita íntima, mas estão sujeitas a con-
troles rígidos e características prisionais exclusivas discrimi-
natórias, pois os direitos à sexualidade das mulheres presas
são considerados, na maioria das unidades prisionais, um pri-
vilégio e não um direito, sendo proibido exercê-los dentro dos

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

muros. Embora o Brasil preveja em diversas leis inúmeros di-


reitos aos presos, ele não cumpre rigorosamente esses direi-
tos, haja vista que a realidade no país é totalmente diferente
do que ditam as leis.
Insta salientar que, em algumas prisões, é fornecido um
pequeno pacote de absorventes com no máximo oito unida-
des, destinado para o uso das mulheres durante a menstrua-
ção, o que não é suficiente para um ciclo menstrual que dura
cinco dias, pois uma mulher que menstrua por cinco dias ou
mais, precisa usar três ou mais absorventes por dia.
Em casos extremos, quando os absorventes não estão
disponíveis durante a menstruação, as presidiárias improvi-
sam com miolos de pão como tampões, e aquelas que têm
muito fluxo, utilizam lençóis, toalhas e camisetas durante o pe-
ríodo menstrual, tendo em vista que não há mais nada para
escolher e usar. Desta feita, a menstruação relaciona-se com
a saúde pública e é um direito de todas as mulheres ter acesso
a produtos menstruais, haja vista que é uma necessidade bá-
sica de higiene.
A saúde é um dos principais problemas existentes den-
tro das prisões, e quando este tema diz respeito às mulheres,
torna-se gradativo, tanto por falta de cuidados específicos,
quanto por falta de prioridades. Exames que devem ser reali-
zados pelo menos uma vez ao ano, como o Papanicolau,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nunca foram realizados pela grande maioria das instituições


prisionais, do mesmo modo que outros exames não são reali-
zados, as mulheres não sabem os resultados dos que já foram
feitos. Isso, de fato, não é um problema que os homens devem
enfrentar.
As restrições aos direitos humanos nas prisões femini-
nas aumentaram com a eclosão da pandemia da Covid-19,
haja vista que o governo suspendeu visitas, restringiu o
acesso de visitantes, interrompeu atividades educacionais e
religiosas e paralisou todas as atividades que gerassem aglo-
merações.
Esse isolamento piorou a saúde dos detentos em geral,
contribuindo para a precariedade da saúde, a grande perda de
peso e problemas respiratórios, tendo em vista que alguns pre-
sos dependem de alimentos, roupas e medicamentos levados
pela família durante a visita. Além disso, as mulheres que já
não recebiam tantas visitas antes da pandemia, durante a pan-
demia ficaram completamente abandonadas por seus familia-
res, vivendo em uma situação crítica.
Nessa perspectiva, o encarceramento feminino é visto
como um julgamento social, no qual a mulher é julgada tanto
pelos crimes que cometeu, quanto pela omissão no cuidado
da casa e dos filhos, sendo isto, uma importante questão so-
cial existente nas prisões femininas. Esses fatos que existiam

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

antes mesmo da pandemia, foram fortalecidos por medidas to-


madas pelo Estado.
Além dessa exposição, as mulheres estão expostas a
sobreviver em ambientes de detenção com condições estrutu-
rais instáveis, no qual são colocadas em maior risco de con-
trair uma variedade de doenças infecciosas. Essa estrutura
está associada ao acesso limitado à água, ventilação inade-
quada e falta de saneamento básico, resultando em altas ta-
xas de mortalidade.
Por isso, é importante entender as especificidades das
mulheres, encarar suas dificuldades, os problemas à medida
que surgem, proporcionar uma perspectiva distinta dos admi-
nistradores penitenciários e, deste modo, compreender os di-
reitos já presumidos para a formação de políticas públicas, que
objetivam circunstâncias melhores para esse segmento.
Partindo do fato de que é dever do Estado concretizar
o princípio da dignidade humana, a concepção do mínimo
existencial retrata o direito às condições mínimas de uma exis-
tência digna, classificado como o mínimo sem o qual o ser hu-
mano não pode viver.
O Estado não só é obrigado a abster-se de praticar
ações que violem a dignidade humana, mas também a promo-
ver essa dignidade humana por meio de um comportamento
ativo e garantir um mínimo existencial para cada pessoa em

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

seu território.
Assim, a dignidade humana é diminuída não só quando
é privada de algumas liberdades básicas, mas também
quando é privada de alimentação, educação básica, cuidados
de saúde e habitação. O padrão mínimo de vida para os pre-
sos inclui aspectos como celas desertas com condições sani-
tárias adequadas, condições de segurança e saúde, acesso a
água potável, alimentação adequada, assistência médica e
assistência jurídica.
Por isso, denegar todos esses direitos desrespeita o mí-
nimo existencial. Com base nessa premissa, tais direitos são
acompanhados de obrigações que não são restringidas pelo
Estado. Isso porque essas posições jurídicas fundamental-
mente incorporadas satisfazem o princípio da dignidade hu-
mana do preso quanto ao seu conteúdo e, por um lado, forne-
cem direção.
Ao lutar pela efetivação de certos direitos fundamentais,
os Estados justificam a impossibilidade devido às suas restri-
ções econômicas, levando à teoria da reserva do possível.
Essa teoria foi concebida com o propósito de justificar a au-
sência do Estado na efetivação dos direitos garantidos consti-
tucionalmente. A falta de recursos constitui um limite econô-
mico e prático para a validade jurídica dessas normas. Aten-
dendo ao fato de o Estado garantir condições dignas de vida

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aos seus cidadãos e às acusações de falta de financiamento


público, estes direitos não têm sido concretizados devido a
acusações de ausência de recursos financeiros para o efeito.
É importante salientar que o princípio da igualdade ma-
terial, na prática, concretiza a igualdade, que deveria ser im-
posta nas penitenciárias brasileiras. Para o filósofo grego Aris-
tóteles, os iguais devem ser tratados de maneira igual e os
desiguais de maneira desigual, na exata medida da sua desi-
gualdade.
Com isso, a igualdade material, por sua vez, significa
que o Estado além de não discriminar aleatoriamente, deve
prevê a elaboração de leis e implementar políticas públicas
destinadas a eliminar ou reduzir as desigualdades existentes,
partindo da reivindicação de que a igualdade deve ser promo-
vida, proporcionando, assim, um tratamento melhor para as
presas.
Os Estados são, portanto, obrigados a garantir um mí-
nimo existencial e uma igualdade material no tratamento dos
presos, cumprindo os seus direitos fundamentais. Este é um
pré-requisito absoluto para assegurar o princípio da dignidade
humana e outros direitos fundamentais. Assim, parece não ha-
ver nenhum poder discricionário dado aos administradores do
sistema prisional e às instituições públicas que não têm esco-
lha válida, a não ser, cumprir a lei.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando o estudo realizado, de fato, o número de


mulheres encarceradas cresce constantemente, o que é es-
sencial para estabelecer regras que visam o tratamento dos
presos. Apesar da existência de leis e tratados que garantem
os direitos das presas, as normas raramente são observadas
e praticadas.

Um dos fatores que caracteriza o descumprimento des-


sas regras é a construção de presídios brasileiros destinados
apenas para homens, o que por consequência não atendem
as necessidades das mulheres, haja vista que seus direitos
são frequentemente violados e sua realidade é totalmente con-
trária ao disposto no ordenamento jurídico.

Observa-se que a desigualdade de gênero no sistema


prisional brasileiro é um problema complexo que envolve di-
versas questões relacionadas à violência, criminalidade, jus-
tiça e desigualdade social. A solução para esse problema re-
quer um esforço conjunto de políticos, funcionários do sistema
prisional e da sociedade em geral.

Somente assim daria para garantir que as mulheres


presas recebam um tratamento adequado e que possam ter
oportunidades de reintegração social após a prisão. Somente

33
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

através de um esforço conjunto e comprometido, será possível


promover a igualdade de gênero e construir um sistema prisi-
onal mais justo e igualitário.

Frisa-se que o Estado tem a responsabilidade objetiva


de garantir aos presos o respeito à integridade física e moral,
bem como, os direitos fundamentais. No entanto, o baixo in-
vestimento do Estado nas prisões brasileiras tem contribuído
para o declínio dos estabelecimentos prisionais. Por isso, é la-
mentável que os recursos para manter uma prisão apropriada
para os detentos são escassos.

Portanto, conclui-se que o Estado deve fornecer aos


presos uma garantia mínima, isso porque a segurança neces-
sária para a sobrevivência deve assegurar os direitos básicos
essenciais de todas as pessoas. Com isso, sua ausência
pode, portanto, degradar a vida, o que vai de encontro ao que
defende o Estado.

Isso por entender o princípio da dignidade da pessoa


humana como fundamento de seu ordenamento jurídico. Com
isso, o mínimo existencial refere-se à dignidade humana e às
responsabilidades que os Estados devem ter para fazer cum-
prir o conceito de justiça social em particular. E por isso, os
presos não devem ser privados do mínimo existencial.

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43
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2
CRIMES VIRTUAIS: CONSCIENTIZANDO À SOCIEDADE
PARA PRÁTICAS SEGURAS DO USO DA
INTERNET NO BRASIL

VIRTUAL CRIMES: RAISING AWARENESS TO SOCIETY


FOR SAFE PRACTICES OF INTERNET USE IN BRAZIL

Thais Marques da Silva Abreu3


Williane Tibúrcio Facundes4

ABREU, Thais Marques da Silva. Crimes Virtuais: conscien-


tizando à sociedade para práticas seguras do uso da in-
ternet no Brasil. Trabalho de Conclusão de Curso de gradu-
ação em Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio
Branco, 2023.

3
Técnica em Informática pelo Instituto Federal do Acre – IFAC. Discente
do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Universitário
Uninorte.
4
Graduada em Direito pela U:VERSE. Docente do Centro Universitário
Uninorte. Especialista Psicopedagogia pela Universidade Varzeagran-
dense.

44
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo busca possibilitar uma análise acerca dos


crimes virtuais e a implementação da lei nº 14.533 de 2023
que instituiu a Política Nacional de Educação Digital, com ob-
jetivo de demonstrar que tais regulamentações do ordena-
mento jurídico brasileiro não têm sido suficientes na garantia
da segurança pública, necessitando, assim, da adoção de ou-
tras medidas, tais como de cunho Educacional. Nessa pers-
pectiva, trata-se de pesquisa quali-quantitativa, realizada por
método dedutivo, aplicando o critério bibliográfico, por meio de
pesquisa em material teórico e jurídico para auxiliar na cons-
trução da tese deste estudo. Com vista a fomentar debates
críticos-reflexivos acerca das vulnerabilidades no ambiente
virtual a partir das perspectivas educacionais, que contribuem
na prevenção dos crimes virtuais, reduzindo o número de in-
flações e de processos do Poder Judiciário nessa seara, con-
forme relatório do Conselho Nacional de Justiça.

Palavras-chave: crimes virtuais; educação digital; políticas


públicas; segurança pública.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This article seeks to enable an analysis of virtual crimes and


the implementation of law 14,533 of 2023 that established the
National Digital Education Policy, In order to demonstrate that
such regulations of the Brazilian legal system have not been
sufficient to guarantee public safety, thus requiring the adop-
tion of other measures, such as Educational. In this perspec-
tive, it is qualitative-quantitative research, carried out by de-
ductive method, applying the bibliographic criterion, through
research in theoretical and legal material to assist in the con-
struction of the thesis of this study. In order to foster critical-
reflective debates about vulnerabilities in the virtual environ-
ment from educational perspectives, which contribute to the
prevention of virtual crimes, reducing the number of inflations
and processes of the judiciary in this area, as reported by the
National Council of Justice.

Keywords: virtual crimes; digital education; public policies; pu-


blic security.

46
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

A escolha do presente trabalho deu-se pela importante


temática que é a criminalidade virtual, na medida em que se
tornou pauta de intensos debates no esfera jurídica nacional,
no qual abrange desde a relevância social, política e econô-
mica. Nessa conjuntura, convém destacar que o ordenamento
jurídico brasileiro deu um salto evolutivo considerável nos últi-
mos anos, no tocante as normas vigentes, mas tal evolução
legislativa não tem sido suficiente para proporcionar a manu-
tenção da ordem pública quanto aos delitos praticados no âm-
bito virtual.
Por conseguinte, a presente pesquisa enfatiza ao legis-
lador que a adoção de outras medidas, a partir das perspecti-
vas educacionais, como a aplicação da lei que institui a Polí-
tica Nacional de Educação Digital, contribui no combate e pre-
venção no que concerne aos crimes virtuais praticados no ter-
ritório brasileiro.
Nesse sentido, para atuar em um conflito que se desen-
volve incessantemente em nosso meio, faz-se necessário que
o Estado atue de forma incisiva a coibir essas práticas delitu-
osas, pois é nesse contexto que surge a necessidade primor-
dial de que o direito tenha que se adaptar, desmitificando a

47
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

perspectiva que o único meio de intervenção do Estado é apli-


car a prerrogativa sancionadora, pelo jus puniendi que apa-
rece por meio do cometimento de ilícito penal.
Isto posto, a fim de repudiar tal conjuntura e prevenir
futuras infrações, o Estado pode adotar o aspecto educativo,
tendo em vista que o sistema jurídico brasileiro compreende
que o uso dos ditames do direito criminal é em última ratio,
logo, porque não optar pela tomada de outras alternativas
como forma de enfrentamento à criminalidade, na qual inte-
gram um ambiente virtual seguro, uma sociedade mais instru-
ída e consciente quando se trata do uso da internet, e conse-
quentemente, corroborar na mitigação destes delitos.

2.1 DEFINIÇÃO, CONCEITUAÇÃO E BREVE HISTÓRICO


DO USO DA INTERNET NO BRASIL E DOS CRIMES
VIRTUAIS

O mundo globalizado destacou-se pela vinda de tecno-


logias que possibilitaram a realização das mais diversas ativi-
dades, onde através de um provedor por meio da internet que
tem um grande alcance na transmissão de informações, as
pessoas passaram se comunicar de qualquer lugar do planeta.
É certo que diante das necessidades de adaptação ao
meio em que se vive, desde os tempos mais remotos o homem

48
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

busca constantemente atender as insuficiências individuais e


sociais, surgindo sempre com novas habilidades, novas inven-
ções e ideias para poder desvendar e adequar as complexida-
des a sua volta.
Atualmente, a vida moderna denominada de “era digi-
tal” continua acontecendo grandes avanços tecnológicos no
meio da comunicação, dando importância e extrema relevân-
cia nos campos sociais, econômicos e políticos. No entanto,
por mais que a internet favoreça a população mundial em seu
cotidiano, ela conta com suas próprias desvantagens, pois o
crime se moldou a informática e com isso criminosos encon-
traram na internet um meio de praticar tais condutas, surgindo
então novos tipos de delitos.

2.2.1 INTERNET

Em dado momento histórico, diferentes tecnologias da


informação foram desenvolvidas, cada qual com sua lingua-
gem própria e com sua forma de codificar as informações.
Num paralelo reverso com a figura bíblica da Torre de Babel,
as tecnologias inicialmente eram montadas em linguagens di-
ferentes e eram incapazes de trocar informações, relaciona-
rem-se e compreenderem-se automaticamente por incompati-
bilidade de linguagem.

49
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O primeiro conceito de Internet surgiu nos Estados Uni-


dos na década de 1960 por meio de um projeto do Departa-
mento de Defesa americano, que criou um sistema para inter-
ligar diversos centros de pesquisa militar com o objetivo de
trocar informações entre pessoas geograficamente distantes,
o nome por trás desta criação foi o cientista da computação
estadunidense, Joseph Licklider, que a princípio sobreveio
para atender as necessidades tecnológicas dos norte-ameri-
canos para combater ataques aéreos à época de Guerra Fria.
Desse modo, como os dados não estavam fixos em
uma única base e sim na rede, proporcionava aos pesquisa-
dores de diversos centros de pesquisa que pudessem com-
partilhar recursos, sem risco de ter os dados e as informações
perdidos.
Foi em meados de 1969 que a primeira versão do sis-
tema americano de interligação de computadores ficou pronta,
no qual foi batizada de ARPANET - Advance Research Pro-
jects Agency Network (Rede da Agência de Pesquisa de Pro-
jetos Avançados), sendo um sistema interligado, mas não de-
pendente, pois não possuía um comando central. E passou a
ser denominada como internet anos depois, quando a ARPA-
NET começou a ser utilizada nas faculdades americanas.

50
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Logo depois, no final da década de 1980, o uso da tec-


nologia da Internet expandiu-se para além dos preceitos mili-
tares, culturais ou acadêmicos, e atingiu a sociedade, possibi-
litando com o auxílio de códigos a leitura de documentos, não
apenas para o propósito original para o qual foi criada, mas,
provendo a comunicação de computadores para Universida-
des e laboratórios de pesquisa norte-americanos.
Em 1989, Tim Berners-Lee, um cientista inglês, que tra-
balhava na European Organization for Nuclear Research (Or-
ganização Europeia para Pesquisa Nuclear) na Suíça, come-
çou a desenvolver um projeto para possibilitar a interconexão,
levando o usuário a trafegar por diversos ambientes e plata-
formas, como um sistema de documentos que misturava texto,
imagem, som, mídia e se inter-relacionava em uma única e
enorme rede mundial, através da Internet.
Após o fim da década de 80, a internet chega ao Brasil
por intermédio da Bitnet, uma rede de universidades. Este im-
portante evento se deu devido a troca de informações que uni-
versidades brasileiras tiveram com as universidades dos Esta-
dos Unidos da América, por meio de um fio de cobre dentro de
um cabo submarino conectado a Fundação de Amparo à Pes-
quisa do Estado de São Paulo (FAPESP), no qual teve seu
avanço com a Rede Nacional de Pesquisa (RNP), ao ser pro-
posta uma melhoria pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e

51
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Inovação (MCTI) objetivando um suporte de serviços de Inter-


net que fosse abrangente em todo o território brasileiro. Segui-
damente, o MCTI em conjunto com o Ministério da Educação
(MEC) em 1990 criou o Backbone, que é a rede nacional de
pesquisas a qual interligava 11 (onze) estados.
Entretanto, apenas em 1991 que a sociedade em geral
começa utilizá-la, a partir da ECO-92, tornando-se de fato
acessível aos brasileiros, quando impulsionado pelos ativistas
do terceiro setor (ONGs) que já conheciam a Internet e parti-
cipavam do evento, pediram que essa ferramenta de comuni-
cação estivesse disponível no evento, por conseguinte, os em-
presários ao perceberem que havia interesse de muitas pes-
soas, logo, passaram a oferecer este serviço comercialmente.
Outrossim, a internet ganhou notoriedade pelo mundo
somente após o desenvolvimento da World Wide Web (larga
teia mundial), criada em 1990 pelo programador inglês Tim
Berners-Lee, palavras que dão origem da sigla “WWW”, no
qual foi lançada em 1992 com o objetivo de facilitar o compar-
tilhamento das informações entre computadores, para que o
conteúdo pudesse ser acessado de qualquer lugar do mundo,
sendo possível obter acesso público à internet, conquistando
vários usuários por sua versatilidade.
A popularização foi tamanha que a nova ferramenta fez
com que, em 3 (três) anos, a Internet atingisse a marca de 50

52
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

(cinquenta) milhões de usuários, a princípio essa rede limi-


tava-se apenas para as áreas de educação e pesquisa, porém,
em Abril de 1995 a internet comercial se consolidou para os
demais ramos da sociedade, pois o Governo reconhecendo a
importância desse serviço, chamou os interessados em apri-
morar o modelo de governança da Internet no Brasil e assim
tomou a decisão de criar o Comitê Gestor da Internet no Brasil
(CGI.BR).
E desde então a busca pelo aperfeiçoamento tecnoló-
gico foi aumentando para atender aos mais diversos interes-
ses, nascendo assim o que conhecemos hoje como internet,
conforme expressa a Lei do Marco Civil da Internet, em seu
Artigo 5°, I:

Art. 5º Para os efeitos desta Lei, considera-se:


I - internet: o sistema constituído do conjunto de
protocolos lógicos, estruturado em escala mun-
dial para uso público e irrestrito, com a finalidade
de possibilitar a comunicação de dados entre ter-
minais por meio de diferentes redes.

É muito difícil sabermos exatamente quantas pessoas


acessam à Internet, levando-se em conta que esse percentual
muda constantemente. Mas segundo dados da Associação
Brasileira de Internet (ABRANET), no Brasil, nos últimos três
anos, entre 2019 e 2021, o cenário de domicílios com acesso
à internet foi fortemente impactado em decorrência do mo-

53
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mento pandêmico pela Covid-19, conforme apresenta a pes-


quisa TIC Domicílios 2021, lançada dia (21/06/22) pelo Comitê
Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por Roberta Prescott, a
Conexão à internet avançou muito.
Na zona rural, a penetração passou de 51% em 2019
para 71% em 2021 e na área urbana a porcentagem também
cresceu de 75% em 2019 para 86% em 2020 e reduziu para
83% em 2021. O levantamento estima que, em 2021, 81% da
população de dez anos ou mais usou a Internet nos últimos
três meses, conforme apresentado no (Gráfico 1) abaixo:

Gráfico 1 - Pesquisa sobre o uso das tecnologias nos domicílios


brasileiros - TIC Domicilios

Fonte: CGI.br. (2022).

54
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

E segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de


Domicílios (PNAD), divulgados dia 16 de setembro de 2022,
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em
cooperação com Ministério das Comunicações (MCom), veri-
ficou-se um acréscimo no número de domicílios com internet
inerentes ao ano de 2021, o que equivale a 65,6 milhões de
pessoas conectadas.
Por fim, o desenvolvimento tecnológico, sem dúvidas,
proporcionou avanços, mas, paralelamente, vale dizer que o
mundo virtual não é permeado apenas de benesses, pois tam-
bém concorreu na aparição de novas formas de degradação
da coletividade, se por um lado a Internet perfaz um dos mai-
ores instrumentos de propagação da informação e da comuni-
cação, concomitantemente, se tornou um lugar de grande in-
cidência da criminalidade, pois atualmente, inúmeros tipos de
crimes que são praticados na seara virtual e de consequências
incalculáveis à sociedade.

2.1.2 OS CRIMES VIRTUAIS

A internet, exemplo emblemático desta contemporanei-


dade, tornou-se uma faca de dois gumes, pois, com a difusão
da informação passou a ser um ambiente fértil para prática de
novos crimes, os chamados crimes virtuais, em virtude disso,

55
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o Direito precisou se adaptar à nova realidade a fim de garantir


segurança jurídica aos usuários e passou a atuar no combate
aos crimes praticados no ambiente virtual. Texeira (2022, p.
223) conceitua, como:

Crime de informática é aquele que, quando pra-


ticado, utiliza-se de meios informáticos como ins-
trumento de alcance ao resultado pretendido, e
também aquele praticado contra os sistemas e
meios informáticos. Por meios informáticos deve-
mos compreender os hardwares e softwares de
computadores, tablets, smartphones, entre ou-
tros dispositivos que possam ser utilizados para
a prática delitiva.

Assim, no que concerne o Uso da Internet no Brasil, os


crimes praticados no ambiente virtual estão há cada momento
mais constantes e sendo aperfeiçoados, devido ao aumento
significativo do uso de meios eletrônicos entre os usuários,
atingindo aos mais diversos bens jurídicos e direitos funda-
mentais da sociedade.
Neste sentido, cumpre esclarecer que, de acordo com
a doutrina há diversas terminologias para conceituar crimes
virtuais, tais como: crimes digitais, crimes eletrônicos, crimes
cibernéticos, dentre outros. Nesse entendimento, Silva (2015,
p.39) assegura:

56
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Que não há uma nomenclatura sedimentada pe-


los doutrinadores acerca do conceito de crime ci-
bernético. De uma forma ou de outra o que muda
é só o nome atribuído a esses crimes, posto que
devem ser observados o uso de dispositivos in-
formáticos, a rede de transmissão de dados para
delinquir, o bem jurídico lesado, e ainda deve a
conduta ser típica, antijurídica e culpável.

Outrossim, acredita-se que os crimes virtuais vêm


sendo praticados no mundo por mais de cinco décadas, desde
as primeiras referências até agora, propagando e se desen-
volvendo conforme a globalização dessa nova era digital. Os
doutrinadores Jesus e Milagre (2016, p. 22) explicam que a
doutrina divaga acerca do primeiro delito informático, assim,
podendo ter ocorrido no ano de 1964 em Massachusetts Insti-
tute of Technology (MIT), onde um aluno de 18 anos teria co-
metido um ato que ficou classificado como cibercrime.
Entretanto, para maioria dos doutrinadores o primeiro
caso de que se tem notícia, ocorreu na Universidade de Oxford
em 1978, onde um estudante invadiu os computadores da uni-
versidade para poder copiar uma prova, sendo uma invasão
seguida de cópia, até essa data não existia nenhuma lei que
versasse sobre o Direito Digital nos Estados Unidos, mas em
seguida, no mesmo ano a Flórida formulou leis sobre o Direito
Digital, sendo o primeiro estado Americano a promulgá-las.
Logo, a primeira iniciativa internacional sobre ci-
bercrime deu-se em 1974, em Estrasburgo na França, onde

57
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ocorreu a primeira Conferência Internacional sobre Cybercri-


mes do mundo, nessa conferência, foram discutidos temas re-
levantes acerca dos “Aspectos Criminológicos do Crime Eco-
nômico”.
Inicialmente, o termo “Cibercrime” surgiu a partir da dé-
cada de 90 em uma reunião do G-8 pelos países Reino Unido,
Estados Unidos, Japão, Itália, França, Alemanha, Canadá e
Rússia, que foi voltada especificamente para a discussão de
formas de combate as práticas ilícitas na rede.
Mas o ponto crucial dessa questão é, algo que, antes
parecia ser inofensivo e tido como um grande salto revolucio-
nário da humanidade, passou a ser difusora de opiniões, pois
trouxe consigo também, a criminalidade, ao ponto de as prin-
cipais organizações internacionais se mobilizarem para regu-
lamentarem tais práticas ilícitas e se adaptarem a nova reali-
dade tecnológica que se aproximava.
No Brasil, apesar de sempre terem ocorridos diversos
tipos de delitos relacionados aos hackers, só se percebeu a
grande importância da criação de leis relacionadas ao tema
internet, a partir de 2012, quando a atriz “Carolina Dieckmann”
teve seu computador invadido por hackers, que furtaram e va-
zaram suas fotos íntimas em sites de organizações públicas

58
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Ce-


tesb) sendo amplamente divulgado, e foi a partir de então, que
ganhou notoriedade jurídica.
Portanto, é difícil assegurar quando necessariamente
surgiram os crimes cibernéticos, mas sabemos que nos últi-
mos anos os ataques a computadores ou por meio destes, to-
maram uma proporção imensa, gerando grandes dificuldades
quando se trata do combate a esses crimes e criminosos da
internet, pois, caminham em perfeita sintonia com as novas
tecnologias, aprimorando cada vez mais seus conhecimentos,
e criando novas formas do cometimento desses delitos virtu-
ais, nessa seara, o autor Higor Jorge (2022, p. 07) aduz que:
“a contemporaneidade nos trouxe não apenas avanços tecno-
lógicos significativos e positivos, como também a preocupação
com a segurança”.

2.2 INOVAÇÕES LEGISLATIVAS E JURÍDICAS REFEREN-


TES A CRIMINALIDADE VIRTUAL NO BRASIL

O Brasil começou a dar importância sob esse assunto


especialmente a partir das últimas décadas, com o aumento
da popularização tecnológica que despertou uma maior preo-
cupação com os crimes desta especialidade, promulgando, na

59
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Constituição Federal de 1988, leis relativas à competência do


Estado sobre questões de informática.
No Brasil a Lei 9.609 de 19 de fevereiro de 1998, subs-
tituiu a Lei 7.646 de 18 de dezembro de 1987, tratava sobre o
amparo intelectual e comercialização de programas de com-
putadores no Brasil, reconhecendo como crime suas viola-
ções, com vistas a proteção do bem jurídico em âmbito virtual
e suas relações no meio.
A mencionada legislação dispôs ainda acerca de prote-
ção aos direitos de autoria e do registro de programas virtuais,
de garantias aos usuários de programas de computador, de
contratos de licença de uso, comercialização e transferência
de tecnologia, e ainda, dispôs sobre “infrações e penalidades”,
podendo ser considerado como primeira tipificação notada-
mente voltada à crimes virtuais.
Após o ataque do 11 de setembro das torres gêmeas
do World Trade Center (WTC), em Nova York, a comunidade
europeia criou a Convenção sobre Crime Cibernético, cele-
brada em Budapeste, no dia 23 de novembro no ano de 2001,
sendo a convenção que designou uma política de combate
para que os países signatários, tivessem um padrão para jul-
gar e controlar delitos cometidos na rede, protegendo a socie-
dade contra crimes virtuais, mediante legislação específica e

60
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

do apoio internacional, uma vez na época isto era o mais pró-


ximo que havia de uma legislação em âmbito mundial sobre a
internet.
Outrossim, em 2012 surgiu à primeira lei brasileira cri-
ada exclusivamente para tipificação de crimes cibernéticos,
sendo um importante avanço legislativo no refere-se à promul-
gação da Lei 12.737 de 30 de novembro de 2012, intitulada
como Carolina Dieckmann, assim, originou-se o tipo penal in-
vasão de dispositivo informático.

[...] a Convenção de Budapeste consiste num


acordo internacional para combater os crimes in-
formáticos, aderido por diversos países. O Brasil
não aderiu, mesmo assim o pacto internacional
serviu de base para que fossem criadas normati-
vas penais brasileira para coibir os cibercrimes,
como por exemplo a Lei 12.737/2012 [...] (BER-
THOLDI, 2020).

Observa-se que o dinâmico ambiente virtual e a cons-


tante ampliação do seu acesso, fez com que à legislação e aos
legisladores passasse a reconhecer outros valores pertinen-
tes, elaborando normativas que impõem limites à práticas de-
litivas na internet, foi então, que se deu início a uma discussão
sobre normas protetoras dos direitos dos indivíduos frente às
novas tecnologias, uma vez que encargo do Estado democrá-
tico de direito garantir a sociedade o desenvolvimento pacífico
e agir como mantedor da ordem social.

61
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nesta perspectiva e pretendendo adequar a ciência ju-


rídica às mudanças tecnológicas que continuamente transfor-
mam a sociedade (ubi societas, ibi jus), admite-se que o sis-
tema jurídico brasileiro, avançou consideravelmente com o
passar dos anos, a princípio com a promulgação de leis rele-
vantes, como as Leis 12.735/2012, 12.737/2012 (Lei Carolina
Dieckmann), Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) e a Lei
13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados), que marcam
a visão do legislador sobre a importância de ter leis que tute-
lem os bens jurídicos informáticos, com objetivo de proteger
os direitos fundamentais dos usuários.
Assim como, pela promulgação da Emenda Constituci-
onal n° 115/2022, que acrescenta ao artigo 5° da Constituição
Federal o inciso LXXIX, e assegura, nos termos da lei, “o di-
reito à proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digi-
tais”, um direito fundamental a proteção de dados pessoais
afim de que seja tratado com a devida segurança jurídica.
Logo, compreende-se que a ciência do direito é uma
área do conhecimento humano que alude sobre normas e prin-
cípios que disciplinam os atos praticados dentro de uma soci-
edade, buscando zelar pela harmonia social, resolver conflitos
utilizando-se de estratégias para mitigar os riscos e responsa-
bilizar aqueles que estão em desacordo com as leis.
Posto isso, convém ressaltar que o Brasil deu um salto

62
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

evolutivo considerável nos últimos anos, no tocante as normas


já vigentes, uma vez que o Direito precisa se adequar aos fe-
nômenos sociais, na medida que há mudanças constantes no
seio social e é nesse contexto que surge a necessidade pri-
mordial de que a ciência do direito tenha que se adaptar para
garantira manutenção da ordem pública, identificando os ris-
cos inerentes à segurança da informação.

2.2.1 LEI 12.737/2012 – LEI CAROLINA DIECKMANN

Conforme já mencionado, não foi nada fácil aprovar


uma legislação que tipificasse os crimes virtuais no Ordena-
mento Jurídico Brasileiro. Para isso, somente após um caso
de grande comoção, no qual uma atriz famosa foi vítima de
invasão em seu dispositivo informático, para que enfim o le-
gislativo concluísse uma discussão repercutida por anos no
Congresso Nacional, e assim resultou na aprovação da Lei
12.737/2012, de tal modo o seu texto normativo, culminou na
pauta de novas figuras delitivas do Código Penal.
Mais notadamente, o fato ocorrido em maio de 2012,
impulsionou a visibilidade sobre o tema, quando a atriz Caro-
lina Dieckmann, sofreu invasão em seu dispositivo por crimi-
nosos e teve conversas e fotos íntimas divulgadas, e segundo
as investigações da Delegacia de Repressão aos Crimes de

63
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Informática (DRCI) da Polícia Civil do Rio de Janeiro, o crime


foi iniciado por crackers do interior de Minas Gerais e de São
Paulo, que lhe enviaram um e-mail, servindo-lhe como isca,
mas que no conteúdo carregam vírus e ao ser aberto liberou
uma porta de acesso para a invasão dos criminosos, e desta
forma tiveram alcance aos arquivos do computador.
Logo, o caso repercutiu até o Congresso Nacional de
modo que levou a Câmara dos Deputados a aprovar o projeto
de lei e no dia 3 de dezembro 2012, foi publicada no Diário
Oficial da União, com vigência a partir do dia 02 de abril de
2013.
Diante disso, a PL tornou-se a Lei 12.737/2012 e ficou
conhecida como “Lei Carolina Dieckmann”, tipificando como
crime, ações como esta sofrida pela atriz, prevendo punições
para os delitos como violação de senha, invasão de computa-
dores e de outros dispositivos de informática. Interessante res-
saltar, que a referida lei transitou pela Câmara desde o ano de
1999, porém, somente foi sancionada após a grande comoção
do caso da atriz. Sobre isso aduz Masson (2017, p. 671):

Como de praxe, os debates sobre uma legislação


específica para os crimes ligados à internet (cri-
mes cibernéticos) se arrastavam há anos, em ve-
locidade de conexão discada. Mas a atividade
dos congressistas, impulsionada pela opinião pú-
blica, recebeu imenso upload depois da invasão
do computador pessoal de Carolina Dieckmann.

64
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Em termos sociológicos, foi fator determinante para


aprovação da Lei, a ocorrência de escândalos de vazamento
de dados que passaram a afetar um número cada vez maior
de vítimas. A Lei de invasão de dispositivo informático precei-
tua sobre a tipificação criminal dos delitos informáticos, trouxe
uma singela modificação no Código Penal Brasileiro, acres-
centando ao Código de 1940 os artigos 154-A e 154-B e alte-
rou a redação dos artigos 266 e 298.
Todavia, ainda que a Lei 12.737 tenha representado
uma significativa inovação normativa relacionada à prática cri-
minosa virtual, não produziu grandes mudanças ao ordena-
mento jurídico sendo necessário uma legislação mais aprofun-
dada para evidenciar e restringir de forma eficaz os inúmeros
crimes informáticos que não foram destacados na Lei, o que
forçou aprovação de novas normas como a Lei do Marco Civil
da Internet.

2.2.2 LEI 12.965/2014 – MARCO CIVIL DA INTERNET

Posteriormente, em 23 de abril de 2014, com entrada


da Lei 12.965 o Marco Civil da Internet foi sancionada, regu-
lando o uso da Internet no Brasil, de maneira sistematizada
elaborado pelo Comitê Gestor da Internet Brasileira, com um

65
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de seus principais objetivos, definir em lei os direitos proveni-


entes da utilização da internet, abrangendo desde a previsão
de princípios, como também tratando das garantias e ver-
sando sobre direitos e deveres, outrossim, o Marco Civil da
Internet também contribuiu, na esfera cível, ao passo que de-
terminou as diretrizes de atuação aos Entes da federação.
Neste diapasão o aspecto marcante da Lei 12.965/2014
é o de ofertar maior segurança jurídica para os usuários da
internet, como um todo, abrangendo desde os usuários leigos
até a administração pública, com o escopo de evitar decisões
contraditórias proferidas pelo Judiciário envolvendo tecnologia
da informação.
Tal circunstância tem levado a ciência jurídica a tomar
um rumo para melhor adaptação ao contexto atual, fazendo-
se presente no ambiente virtual e originando-se então o cha-
mado: direito digital. De tal modo que foi promulgada a Lei nº
12.965/2014 oficialmente chamada de Marco Civil da Internet.

Assim, surgiu o direito digital, que busca a regu-


larização desse mundo tecnológico, definindo di-
reitos e deveres. Para tanto, surgiu a ideia do
Marco Civil da Internet, que trata da construção
dos direitos dos cidadãos dentro dessa rede, ou
seja, não se fala apenas de crimes na internet,
mas de tudo que for necessário ser discutido e
regulamentado em todas as áreas em que a tec-
nologia da informação se faça presença. (BOM-
FATI e KOLBE, 2020, p.67)

66
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O Marco Civil da Internet é o responsável por estipular


os princípios e garantias normativas da relação civil virtual na
rede de computadores. Tem como objetivo, prever condutas
criminosas nos sistemas de informática, bem como prezar pe-
los ideais da imparcialidade da rede, da privacidade dos usu-
ários, da liberdade de se expressar e dos direitos humanos.
O texto normativo está longe de ser perfeito, pois o le-
gislador ainda há um longo percurso a ser conhecido para fin-
dar os delitos virtuais, todavia, é nítido o avanço legislativo so-
bre o tema, de modo que a Lei do Marco Civil da Internet foi
de grande relevância no desenvolvimento doutrinário do di-
reito informático brasileiro.
Ele visou promover o que a Constituição Federal já tra-
zia como direito fundamental, mas no âmbito da internet, tais
como a inviolabilidade das comunicações, o direito à privaci-
dade, assim como a proteção aos dados pessoais.

2.2.3 LEI 13.709/18 – LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE


DADOS

Diante do tratamento dos dados pessoais, seja no meio


digital ou no material, outro marco de valor imensurável foi a
Lei Geral de Proteção de Dados do Brasil (LGPD) publicada
em 2018, com objetivo de proteger os direitos fundamentais

67
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de liberdade, da privacidade e o livre desenvolvimento da per-


sonalidade da pessoa natural, direcionada a diferentes setores
e serviços, e a toda sociedade brasileira, seja no papel de in-
divíduo, empresa ou governo, que a partir então protegem os
dados pessoais de todo cidadão.

A intensificação de usuários nas plataformas digitais,


desde as pessoas físicas às empresas públicas ou privadas,
surgiu uma maior preocupação em estabelecer regulamentos
para obter a máxima segurança jurídica para os usuários. Com
isso, a Lei Geral de Proteção de Dados sobreveio para tal fi-
nalidade, de dá um tratamento jurídico adequado aos dados
particulares no que tange ao uso de ferramentas digitais, para
normatizar todas as operações efetivadas com as informações
pessoais.

Proteção de dados é uma das formas para se


proteger a privacidade da pessoa. Esse direito é
parcela do Direito à Privacidade que está positi-
vado em nossa Constituição Federal. É impor-
tante destacar que em 2020 o STF já se posicio-
nou informando que o direito à proteção de da-
dos é um direito fundamental e no final de 2021,
a PEC n. 17/2019 incluiu este direito expressa-
mente no art.5º, da Carta Magna, em razão da
sua previsão difusa atualmente no texto constitu-
cional. (GALERA, 2021, p. 9)

68
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2.2.4 AGÊNCIA NACIONAL DE PROTEÇÃO DE DADOS

A Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) é o


órgão federal com prerrogativa fiscalizadora no que se refere
a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais
(LGDP), detendo a responsabilidade de regular e zelar pelos
dados pessoais, em razão da sua incumbência de promover a
proteção ao titular. O Congresso Nacional promulgou dia 25
de outubro de 2022 a Lei nº 14.460, convertendo a Medida
Provisória nº 1.124/22 em lei ordinária, que transformou a
Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) em autarquia
e conferiu-lhe autonomia de natureza administrativa. Para o
Senado Federal, (2022):

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados é o


órgão federal responsável por dar efetividade à
LGPD no País. As principais competências da
ANPD são zelar, implementar e fiscalizar o cum-
primento da LGPD, além de orientar e explicar
para a população como a Lei Geral de Proteção
de Dados Pessoais é aplicada no Brasil.

Em vista disso, com promulgação da lei à Autoridade


poderá atuar nos mais diversos contextos públicos e privados
e fortalecer a proteção de dados pessoais, de tal modo, ao ser
tornar independente à Presidência da República, atuará de
forma autônoma, não havendo mais a subordinação hierár-
quica, assim como, as demais autarquias do país e estando

69
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

alinhado conforme inicialmente proposto desde 2019 pelo pro-


jeto da LGPD em seu artigo 55-A.
Deste modo, indubitável é que o Direito, possui a ne-
cessidade se adaptar para acompanhar as transformações da
sociedade, e ao legislador cabe buscar compreender a reali-
dade global e se adequar as outras formas de interpretações,
para evitar que lacunas apareçam e às ilicitudes realizadas no
meio virtual ocorram, promovendo segurança social e jurídica,
pois é responsabilidade do Estado, atuar como regulador e fis-
calizador, cumprindo assim, o seu mister.

A rapidez do avanço tecnológico trouxe aos indi-


víduos uma gama enorme de formas de agir den-
tro de uma sociedade e, por consequência, exi-
giu do direito uma nova linha de pensar e atuar,
de modo que se adaptasse a essa nova reali-
dade. (BOMFATI e KOLBE, 2020, p.66)

2.3 RISCOS INERENTES À SEGURANÇA DA INFORMA-


ÇÃO, CONSCIENTIZANDO À SOCIEDADE ACERCA DAS
VULNERABILIDADES

A expansão da tecnologia da informação trouxe uma


maior celeridade quanto as demandas da sociedade contem-
porânea, fazendo com que os indivíduos utilizem cada vez
mais o ambiente virtual, todavia, também se tornou um campo
fértil para a criminalidade, uma vez que, a popularização do

70
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ambiente digital foi crescendo de forma desorganizada, inici-


almente sem adequação dos limites e sem normas específicas
para a punibilidade em âmbito universal.
Por conseguinte, o número de denúncias ocorrentes é
grande, conforme levantamentos da SaferNet que é uma das
principais parceiras do Ministério Público Federal, para o com-
bate de sites criminosos que ocupam grande parte da internet
submersa, registrou por meio de sua central nacional de de-
núncias, mais de 4.441.595 denúncias envolvendo exclusiva-
mente crimes contra direitos humanos, no qual foram recebi-
das e processadas no ano de 2006 a 2021, conforme (Tabela
1) a seguir:

Tabela 1 - Número das principais denúncias no Brasil –


Indicadores da Safernet.

Fonte: Datasafer. (2022)

71
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sendo as principais violações para as quais os inter-


nautas brasileiros requerem ajuda, crimes como “pornografia
infantil, sigilo de dados pessoais, fraudes e golpes, cybers-
talking, apologia e incitação à violência, crimes contra a vida”,
e diversos outros.
A posteriori, evidenciando também no aumento do nú-
mero de processos de crimes contra direitos humanos de
acordo com dados divulgados pelo Conselho Nacional de Jus-
tiça, do Sistema de Estatística do Poder Judiciário – SIESPJ,
e da Base Nacional de Dados do Poder Judiciário – DataJud,
relativos a todos os processos dos tribunais indicados nos in-
cisos II a VII do art. 92 da Constituição Federal.
O Relatório Justiça em Números 2022, divulgou que
houve um aumento no número de casos novos sobre Direitos
Humanos tanto em 2020, como seguiu a mesma tendência de
crescimento no ano de 2021, tendo em vista se tratar de um
período de pandemia global (COVID-19).
Logo, observa-se que não foram apenas as demandas
de saúde pública que impactaram o judiciário, mas as demais
demandas sobre Direitos Humanos também apresentaram um
aumento no período de pandemia e no pós-pandemia, assun-
tos estes respectivamente concernentes ao ramo das garan-
tias constitucionais, e no que pese principalmente a proteção
da intimidade o sigilo de dados, conforme (Figura 1) a seguir:

72
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Figura 1 - Assuntos sobre Direitos Humanos mais


demandados (ano-base 2021)

Fonte: Conselho Nacional de Justiça, 2022.

O doutrinador Bertholdi (2020, pág.11) argumenta que


a razão pelo qual houve um aumento significativo dos crimes
virtuais no Brasil, deu-se diretamente pelo fato de que o ambi-
ente virtual permite que os criminosos tenham acesso fácil a
vários usuários, tornando-se um ambiente fértil para a crimi-
nalidade, especificamente por se tratar de uma nação que
pouco se preocupa com educação básica de uso e de segu-
rança na internet.

73
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2.3.1 SEGURANÇA À INFORMAÇÃO

Neste diapasão, o termo segurança da informação re-


mete, mais precisamente no que tange o universo virtual, co-
nhecido por muitos doutrinadores como ciberespaço, em que
envolve padrões, modelos e técnicas, a fim de minimizar os
possíveis riscos e tornar o ambiente virtual seguro para o usu-
fruto.
Segundo dados da própria da Federação Brasileira de
Bancos (FEBRABAN, 2020) 70% das fraudes que acontecem
estão vinculadas a engenharia social, ou seja, não é só aquele
“Malware, Spyware, Trojan Horse, Ransomware, Keylogger”;
(software malicioso) e entre outros que o usuário baixa em seu
celular, mas nos dia atuais a grande maioria dos golpes que
vemos sendo noticiado na mídia, também ocorrem em razão
dos usuários que são enganados ou convencidos, assim, le-
vando ao conceder o acesso a seus dados. Logo, compre-
ende-se que o risco está arraigado muito mais nas pessoas do
que somente na própria tecnologia.
Por exemplo, conforme levantamentos feitos pela FE-
BRABAN, durante o período de isolamento social da Covid-19,
houve um elevado crescimento na modalidade de fraudes fi-
nanceiras, em que as instituições apontaram o aumento de
80% nas tentativas de ataques de phishing, nessa vereda,

74
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

trata-se de uma engenharia social que na maior parte dos ca-


sos iniciam pelo simples recebimento de e-mails, mas que em
seu conteúdo carregam vírus ou links.
O relatório da Verizon Data breach Investigations Re-
port, apresentam em sua estatística no ano de 2022 que a
grande maioria dos incidentes no ambiente virtual é decorrente
de ações ou decisões que o próprio ser humano atribui-se, ou
seja, o lado humano é o maior fator que resulta em aplicação
de golpes, exposição na internet, vazamento de dados e entre
outros, do que necessariamente o lado tecnológico, ou seja,
faz-se necessário proteger os usuários deles mesmos, pois
não se trata só de uma proteção técnica, mas trabalhar o uso
consciente como um todo.

Gráfico 2 - 37º encontro do GTS - Anchises Moraes

Fonte: GTERGTS, 2022

75
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O diretor da Comissão Executiva de Prevenção a Frau-


des da Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN), Adriano
Volpini, alerta que nos tempos atuais cerca de 70% das frau-
des estão associadas diretamente à engenharia social, no qual
baseia-se na teoria da manipulação psicológica do cliente, fa-
zendo com que o usuário forneça informações confidenciais
aos criminosos. Volpini evidência que: “Seja pelo telefone, por
e-mail, pelas mídias sociais, o fraudador solicita dados pesso-
ais do cliente, como números de cartões e senhas, em troca
de algo, ou ainda induz o usuário a ter medo de alguma situa-
ção”.
Além do mais, adverte que no refere-se a sessão de
segurança, a sociedade comporta-se no mundo digital de ma-
neira diversa ao do mundo físico, uma vez que têm uma com-
preensão intuitiva do que é e do que não é aceitável no mundo
real, assim como, tomar cuidado com seus pertences quando
estão em locais de grande movimentação, nessa vereda, pru-
dência essa não tão habitual no mundo digital.
Deste modo, vale salientar que é preciso criar uma forte
cultura de proteção de dados no Brasil e realizar constante-
mente ações de conscientização, pois são fundamentais para
fomentar a educação digital a toda sociedade brasileira.

76
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nessa perspectiva, o território brasileiro dispõe da Re-


solução 369 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que insti-
tui a Estratégia Nacional de Segurança Cibernética do Poder
Judiciário, afirmando que é imprescindível garantir a segu-
rança cibernética do ecossistema digital brasileiro. Outrossim,
considera-se que é de suma importância estabelecer objeti-
vos, princípios e diretrizes de Segurança, alinhados às reco-
mendações constantes da norma em conformidade com a Lei
do Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados
Pessoais.

2.3.2 EDUCAÇÃO DIGITAL

À medida que as práticas delituosas foram aumen-


tando, tornou-se necessária a elaboração de normas no sis-
tema jurídico brasileiro que regulasse o uso dos meios digitais,
desse modo, foram elaboradas as diversas leis que hoje regu-
lam e tipificam os crimes virtuais, protegendo os direitos dos
usuários. Não obstante, a recorrência dessas infrações, fez
com que também fosse relevante elaborar políticas públicas
para auxiliar na prevenção e combate à tais práticas.
Dado que, a Era Digital vivenciada atualmente, resulta
como uma de suas várias consequências, a facilidade de inte-
ração entre diversas pessoas, tornando a vida dos usuários

77
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

alvo fácil e podendo ser expostos a ataques online, sejam eles


na esfera patrimonial ou moral, para evitar esses episódios a
educação digital dos usuários torna-se fundamental.
De acordo com a advogada em Direito e Educação Di-
gital, Carolina Teixeira de Aguiar Mendes, 2006, em seu artigo
“Novo Papel das Escolas”:

A escola exerce importante papel na formação


da consciência ética e moral dos alunos, de-
vendo se adequar à nova realidade na qual o
acesso aos meios digitais está cada vez mais di-
fundido entre crianças e adolescentes, ensi-
nando sobre temas como responsabilidade digi-
tal, prevenção contra roubo de dados, assédio
virtual, e também sobre as consequências jurídi-
cas do uso inadequado da internet, criando usu-
ários mais éticos no ciberespaço.

Em vista disso, abordar a importância da Educação Di-


gital para a sociedade brasileira como uma das formas de
conscientização e prevenção, apresenta bons resultados, uma
vez contribui para prevenir outras ofensivas e mitigar riscos
dos ataques online, ao promover o ensino dinâmico e intera-
tivo para práticas seguras da navegação no ambiente virtual.
Assim, como se vê, é necessária inteligência e sabedo-
ria na navegação online, vez que ela nos permite ínfimas pos-
sibilidades, sejam elas boas ou más, e o baixo nível de cons-
cientização em relação à segurança da informação são fatores

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que criam brechas para que essas violações aconteçam. Por-


tanto, sendo dever de todos saber utilizá-la de maneira segura
a fim de usufruir todas as suas vantagens e evitar que os cri-
mes virtuais sejam proliferados. Para Bertholdi (2020, p. 11)

O aumento significativo da criminalidade ciberné-


tica em nosso país tem duas causas básicas: a
primeira está relacionada diretamente com o fato
de que a web permite que os criminosos tenham
franco acesso a um número significativo de víti-
mas, sendo inegável a grande escalabilidade
dessa atividade criminosa, especialmente em
uma nação que pouco se preocupa com educa-
ção básica de uso e de segurança na internet.

Por isso, a relevância de aplicar à educação digital con-


forme estabelece a Lei do Marco Civil da Internet, em seu ar-
tigo 26, contempla as variadas ações de caráter preventivo da
segurança pública, uma vez que é dever constitucional do Es-
tado a prestação de educação para uso responsável da inter-
net, e fica também sob sua responsabilidade proporcionar fer-
ramentas de capacitação para atingir tal objetivo, tornando a
tecnologia aliada a promoção da cultura e ao exercício da ci-
dadania.

Art. 26. O cumprimento do dever constitucional


do Estado na prestação da educação, em todos
os níveis de ensino, inclui a capacitação, inte-
grada a outras práticas educacionais, para o uso
seguro, consciente e responsável da internet

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como ferramenta para o exercício da cidadania,


a promoção da cultura e o desenvolvimento tec-
nológico. (BRASIL, 2014)

Consequentemente, desmitificando essa perspectiva


que o único meio de intervenção do Estado é pelo jus puniend
que aparece por meio do cometimento de ilícito penal, à qual
impõe desde o princípio uma reação jurídica, assim, a fim de
repudiar tal conjuntura e prevenir futuras infrações, a respos-
tas ao problema, seria no lugar de recorrer desde logo a tipifi-
cação penal, o Governo Brasileiro implementasse práticas
Educacionais do uso da internet em todos os níveis de ensino,
colocando em ação as estratégias já mencionas e obediência
a legislação em vigor, com o intuito maior conscientizar à so-
ciedade acerca das vulnerabilidades que consequentemente,
fazem inúmeras vítimas.
Ressalta-se, que no Brasil, o projeto de lei (PL 4513/20)
de autoria da deputada Angela Amin (PP-SC), que institui a
Política Nacional de Educação Digital (PNED), foi aprovado
pelo Congresso Nacional, e sancionado pelo presidente da
República, Luiz Inácio Lula da Silva, sendo publicado a Lei
14.533 no Diário Oficial da União na data do dia 11 de janeiro
de 2023, com o objetivo de assegurar novos conhecimentos e
promover a capacitação a população brasileira na era digital.
Logo, para mitigar os possíveis riscos decorrente do

80
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

segmento virtual, melhorar a conscientização e a formação di-


gital em todo território brasileiro é um dos grandes desafios
para os próximos anos, fato esse que a medida que a tecno-
logia evolui, maior é importância em saber utiliza-la de forma
adequada, mas não por acaso o artigo 3º, inciso III da lei
14.533/2023 (PNED), estabelece como um dos princípios bá-
sicos da educação, o uso seguro, consciente, crítico e respon-
sável da internet.

Art. 3º O eixo Educação Digital Escolar tem como


objetivo garantir a inserção da educação digital
nos ambientes escolares, em todos os níveis e
modalidades, a partir do estímulo ao letramento
digital e informacional e à aprendizagem de com-
putação, de programação, de robótica e de ou-
tras competências digitais, englobando:
III - cultura digital, que envolve aprendizagem
destinada à participação consciente e democrá-
tica por meio das tecnologias digitais, o que pres-
supõe compreensão dos impactos da revolução
digital e seus avanços na sociedade, a constru-
ção de atitude crítica, ética e responsável em re-
lação à multiplicidade de ofertas midiáticas e di-
gitais e os diferentes usos das tecnologias e dos
conteúdos disponibilizados.

Neste interim, o Estado necessita adotar medidas es-


tratégicas, de cunho educativo, no sentido de fazer valer a
norma gerada pela lei 14.533/2023 que é voltado para o apri-
moramento de competências e habilidades, com uso de tec-
nologias, no ambiente escolar.

81
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Diante do exposto, mudar essa realidade depende de


ações estruturantes, como o investimento em programas fe-
derais. Podendo as plataformas serem utilizadas como ferra-
mentas de grande valia, a fim de instrui-los, permitindo ao usu-
ário reconhecer os possíveis riscos ou ataques.
Com a sua base em segurança no ambiente virtual
possa aplicar práticas seguras do uso da Internet, garantindo
assim a sua própria proteção e saiba como proceder no caso
de ser vítima, por intermédio de interatividade e abordagens
nas instituições de ensino e em parceria aos órgãos respon-
sáveis pela segurança pública.
Um exemplo na prática foi a palestra sobre a Segurança
na Internet ministrada pela equipe da Delegacia de Repressão
aos Crimes Cibernéticos (DRCC) da Polícia Civil do Distrito
Federal (PCDF) aos alunos do Colégio Marista na campanha
em alusão ao Dia da Internet Segura, recordado no mês de
fevereiro.
No qual abordaram a importância de evitar a troca de
informações com desconhecidos, a segurança de senhas e
acessos, dicas de como evitar o phishing e entre outros pon-
tos, mas com o principal objetivo de conscientizar e sensibili-
zar sobre o uso de um ambiente virtual responsável e seguro.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Figura 2 - DRCC ministra palestra sobre segurança na Inter-


net a alunos do Colégio Marista

Fonte: Polícia Civil do Distrito Federal, 2023.

Isto posto, no que concerne a obrigação constitucional


do Estado na prestação da educação e na gestão ordinária
dos problemas sociais nos ambientes virtuais, espera-se que
medidas como essas contribuam a fim de estabelecer um am-
biente virtual seguro, com o objetivo de orientar e sensibilizar
todos aqueles usuários, mas em especial dar mais enforque
na conscientização às crianças e adolescentes, implemen-
tando métodos de conscientização, aprendizado e prevenção
por meio da Educação Digital nas escolas.
Por fim, baseando-se no que foi apresentado no pre-
sente capítulo, é possível concluir que a lei 14.533/2023, que

83
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

institui a Política Nacional de Educação Digital, tornou- se um


importante instrumento aliado no combate aos crimes virtuais,
principalmente quando são implementadas por meio de ações,
conferências, seminários, congressos em conjunto com Insti-
tuições da sociedade civil com órgãos públicos sobre temas
relevantes e pertinentes à conscientização dos usuários da in-
ternet de modo geral, se mostram eficazes na construção de
uma sociedade progressivamente mais responsável quanto ao
uso das ferramentas digitais, tanto para não serem vítimas,
quanto para não se tornarem futuros agressores, acarretando,
assim, na diminuição da criminalidade no meio digital e o nú-
mero de processos no judiciário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Inicialmente, tendo como fundamento essencial deste


trabalho uma abordagem da legislação brasileira vigente, que
busca reprimir a prática dos crimes virtuais no Brasil, também
foi realizado o estudo acerca das políticas públicas implemen-
tadas pelo Estado, ao passo que devem ser explorados todos
os meios alternativos para mitigar a incidência dos crimes pra-
ticados no ambiente virtual.

84
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Por conseguinte, compreendendo que o tema abordado


é de extrema relevância, à medida em que a criminalidade
vem se difundindo rapidamente em ambiente virtual. O que
cria a oportunidade do surgimento de novas práticas crimino-
sas, conforme constatou-se nos dados levantados, dos indica-
dores da Safernet Brasil e do relatório do Conselho Nacional
de Justiça.
Consiste que a prerrogativa sancionadora do Estado no
tocante a legislação vigente, não têm sido suficientes para pro-
porcionar a manutenção da ordem pública, e é nesse contexto
que surge a necessidade primordial de que a ciência do direito
tenha que se adaptar e melhorar quanto as medidas já exis-
tentes de caráter preventivo, a fim de evitar os riscos que pro-
movem insegurança jurídica e social.
Em face do exposto, o presente estudo salienta que se
faz necessário reforçar a aplicabilidade e implementação da
lei 14.533/2023, que institui a Política Nacional de Educação
Digital, ao passo que a falta de aplicação de Políticas Públicas,
como a Educação Digital em todos os níveis de ensino, são
ferramentas estatais que não estão sendo postas em prática.
Em virtude disso, faz-se necessário que essa temática
seja evidenciada e tratada de forma emergente, considerando
o que a norma gerada postura, para que não fiquem só na letra

85
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fria de lei.
Nesse ínterim, o objetivo essencial deste trabalho é re-
forçar acerca da importante atuação do Estado na Política Na-
cional de Educação Digital, podendo delinear condições em
que o direito conseguirá se aproximar da realidade social e
garantirá uma efetiva manutenção da ordem pública, com a
conscientização da sociedade, por meio da Educação Digital,
a fim de estabelecer um ambiente virtual seguro, uma socie-
dade mais instruída e consciente quando se trata do uso da
internet, de modo, a contribuir como medida alternativa para
mitigar a incidência dos crimes praticados e no número de pro-
cessos do Poder Judiciário.

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89
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3
AS PRÁTICAS ABUSIVAS DOS PLANOS DE SAÚDE EM
RECUSAR PROCEDIMENTO NÃO LISTADOS NO ROL DE
SERVIÇOS DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE

ABUSIVE PRACTICES OF HEALTH PLANS IN REFUSING


PROCEDURE NOT LISTED IN THE LIST OF SERVICES
OF THE NATIONAL HEALTH AGENCY

Edilson Itani Carneiro Júnior 5


Alynne Jandayra Eliamen da Costa 6

JÚNIOR, Edilson Itani Carneiro. As práticas abusivas dos


planos de saúde em recusar procedimento não listados no
rol de serviços da agência nacional de saúde. Trabalho de
Conclusão de Curso de graduação em Direito – Centro Uni-
versitário UNINORTE, Rio Branco, 2023.

5
Discente do 9º período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
6
Graduada em Direito pela Faculdade Barão do Rio Branco (Acre). Pós-
graduada em Ciências Forenses pela Uninorte - Acre e em Advocacia Tra-
balhista pela Universidade Anhanguera - São Paulo. Diretora-Geral Ad-
junta da Escola Superior da Advocacia da OAB/AC

90
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O direito à saúde é a base de suas garantias constitucionais e a


discussão de questões que surgem na assinatura de planos priva-
dos de saúde, que geralmente se devem à falta de seguro médico
para determinados abusos e práticas de operadoras de planos de
saúde privados. Nesse processo, o foco da pesquisa será nos sis-
temas privados e nessas práticas, o que tem levado muitos usuários
a formalizarem queixas e procedimentos de gestão à Agência Naci-
onal de Saúde e, caso não haja soluções, eles buscarão seus direi-
tos por meio contencioso. O objetivo da pesquisa é analisar como
as práticas abusivas e negativas dos planos de saúde privados vem
apresentando um aumento nas reclamações e processos adminis-
trativos. Na metodologia utilizada para este tipo de pesquisa foi o
qualitativo e quantitativo, ou seja, a partir dos conceitos e proposi-
ções trazidas pelas obras selecionados, é que se deu início a dis-
cussão do tema. Os resultados se basearão na análise das decisões
judiciais do Brasil sobre esses novos conflitos, ou seja, com base na
legislação privada, políticas públicas e programas vigentes, para
apurar os principais problemas enfrentados pelos beneficiários de
planos de saúde em juízo. Podemos concluir que um dos fatores
desse fato pode ser atribuído à aparente incapacidade do Sistema
Único de Saúde em atender efetivamente toda a demanda, por ser
um contrato de plano de saúde um contrato típico de consumo, pois
atende ao conteúdo estabelecido pelo Código de Defesa do Consu-
midor para caracterizar as relações.

Palavras-chave: saúde; planos; direito; legislação.

91
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

The right to health is the foundation of its constitutional guarantees,


and the discussion of issues that arise in the signing of private health
insurance plans, which are often due to the lack of medical insurance
for certain abuses and practices of private health insurance provi-
ders. In this process, the focus of the research will be on private sys-
tems and these practices, which have led many users to file com-
plaints and management procedures with the National Health
Agency, and if there are no solutions, they will seek their rights
through litigation. The objective of the research is to analyze how the
abusive and negative practices of private health insurance plans
have led to an increase in complaints and administrative procee-
dings. The methodology used for this type of research was qualita-
tive and quantitative, meaning that the discussion of the topic was
based on the concepts and propositions brought by the selected
works. The results will be based on the analysis of Brazilian court
decisions on these new conflicts, that is, based on private legislation,
public policies, and current programs, to determine the main pro-
blems faced by health insurance beneficiaries in court. We can con-
clude that one of the factors contributing to this phenomenon may
be attributed to the apparent inability of the Unified Health System to
effectively meet the entire demand, as a health insurance contract is
a typical consumer contract, as it complies with the content esta-
blished by the Consumer Protection Code to characterize the rela-
tionships.

Keywords: health; planes; law; legislation.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como tema geral, o direito à sa-


úde, ao qual será desenvolvido com base na discussão acerca
da sua garantia constitucional e os problemas advindos na
contratação de um plano de saúde do sistema privado, decor-
rentes geralmente da falta de cobertura médica para algumas
situações, por parte das operadoras de planos de saúde pri-
vado.
Nesse processo o foco do estudo será o sistema pri-
vado, que tem levado muitos usuários a formalizar reclama-
ções e processos administrativos junto a Agência Nacional de
Saúde Suplementar (ANS), e na eventual falta de solução
busca seus direitos através de ações judiciais.
Analisaremos a saúde sob o prisma da atuação por
meio dos planos de saúde privados, especialmente nos casos
de recusas de tratamentos médicos e outras práticas. A impor-
tância do tema reside em sua atualidade e relevância social,
especialmente pela recente discussão judicial sobre a taxativi-
dade do rol de procedimentos da ANS. De igual modo, sobre-
pesa o fato de que o acesso à saúde no Brasil – no plano dos
prestadores de serviços médicos privados – é excludente e
pesa sobre esses contratos com cláusulas abusivas que ge-

93
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ram diversas reclamações e processos administrativos enca-


minhados para a ANS.
Com objetivo geral de analisar como as práticas abusi-
vas e negativas dos planos de saúde privados ensejaram o
aumento das reclamações e processos administrativos, bem
como comparar o acesso à saúde na rede pública e privada.
A metodologia utilizada traça o caminho para a realiza-
ção de uma pesquisa de natureza básica, com método cientí-
fico dedutivo. Dessa forma, para o desenvolvimento da pre-
sente pesquisa o objetivo se realizará uma pesquisa explora-
tória sobre o assunto, será realizado sendo empregado a téc-
nica do referente, das categorias, dos conceitos operacionais
e do seu procedimento documental escritos em leis, senten-
ças, jurisprudências, sites e bibliográfico em são livros, artigos,
teses etc.
Nossa abordagem se inicia com a contextualização his-
tórica do direito à saúde, seus princípios tanto constitucionais
e consumeristas, e a efetividade do direito. Em segundo mo-
mento, adentraremos na saúde suplementar, legislação e os
contratos de plano de saúde privado. E, por fim, abordaremos
no ponto chave da pesquisa, que versa sobre a judicialização
da saúde, desencadeada pelas práticas abusivas em questão.

94
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO CONSTITUCIONAL


DO DIREITO À SAÚDE

Neste capítulo procurou-se fazer uma análise sobre a


Legislação Magna, o direito à saúde é elevado a direito subje-
tivo público, logo, as pessoas reconhecem que esse sujeito é
titular do direito que o estado é obrigado a garantir. Portanto,
o estado tem a responsabilidade de proteger a saúde dos ci-
dadãos e das comunidades. Porém, os sujeitos não perderão
a responsabilidade de cuidar da sua própria saúde e contribuir
para a saúde do coletivo.

Lenir Santos (2010) explica que em vista do conceito


reconhecido na Constituição, a saúde é direito de todas as
pessoas e responsabilidade do estado, e é garantida por polí-
ticas sociais e econômicas que visam a redução dos riscos de
doenças e demais enfermidades e o acesso universal e igua-
litário à saúde e serviços.

A sua promoção, proteção e recuperação, no sentido


de limitar ou prevenir a propagação de doenças que põem em
risco a saúde da comunidade, acabou abandonando o sistema
que só considera a saúde pública como responsabilidade do
estado, e acredita-se que, além da prestação de serviços pú-
blicos de promoção, prevenção e recuperação da saúde, a

95
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

responsabilidade do estado pela proteção à saúde também in-


clui a formulação e implementação de políticas econômicas e
sociais (SANTOS, 2010).

Na visão de Santos (2010) a epidemiológica das ques-


tões de saúde/doença torna um privilégio a pesquisa sobre os
fatores sociais, ambientais, econômicos e educacionais que
podem causar a doença, que passaram a fazer parte do direito
à saúde. Esse novo conceito de saúde leva em consideração
seus determinantes e condicionantes (alimentação, moradia,
saneamento, meio ambiente, renda, trabalho, educação,
transporte etc.), e impõe o reconhecimento dessas responsa-
bilidades socioambientais às instituições que o compõem o
sistema de saúde. Fatos esses, que o governo formula políti-
cas públicas a partir da melhoria do estilo de vida da popula-
ção.

A Carta Magna incluiu o direito à saúde no rol dos direi-


tos sociais, que em textos constitucionais anteriores, apenas
os trabalhadores que contribuíam para a previdência social ti-
nham direito à saúde pública. Antes da Constituição Cidadã,
quem não atendia às exigências dos entes públicos para obter
assistência à saúde (renda e emprego) dependia inteiramente
da iniciativa privada.

96
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Apropriadamente apontado, o texto constitucional foi


inovador e incluiu o direito à saúde no rol dos direitos humanos
básicos, constituindo-se em cláusula pétrea. Também é pos-
sível estabelecer um nexo entre o direito à saúde e o direito à
proteção social, sendo a saúde objeto de proteção da segu-
rança, conforme dispõe o artigo 194 da legislação.

Porém, ao se referir explicitamente ao direito à saúde,


o artigo 196 do mesmo diploma determina que a saúde é di-
reito de todas as pessoas e responsabilidade do estado, sendo
garantida por políticas sociais e econômicas que visam reduzir
os riscos de doenças e outras doenças universais e de iguais
acesso à saúde, promovendo proteção e restauração as ope-
rações e serviços disponíveis, de acordo com Santos (2010).

O texto constitucional considera as ações e serviços de


saúde publicamente relevantes em seu artigo 197. Nesse
caso, fica claro que a saúde também está relacionada princi-
palmente, a outros aspectos relevantes como: as políticas pú-
blicas (sociais e econômicas), o bem-estar social e os princí-
pios da igualdade, universalidade e solidariedade. Tudo isso
está relacionado à busca da efetivação do direito à saúde.

Ressalte-se, por fim que para Santos (2010), os princí-


pios de igualdade, universalidade, solidariedade e até liber-
dade (por falta de saúde física e mental, os indivíduos não têm

97
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

real liberdade de ação) também podem ser vistos nas disposi-


ções constitucionais que zelam pelo sistema público, denomi-
nado Sistema Único de Saúde (SUS) e pessoas privadas de
saúde, como expresso nos artigos 198 a 200, e preocupação
dos membros tripartidos em garantir o direito à saúde para to-
dos, sem qualquer privilégio ou distinção.

Por fim, cabe destacar que é possível apontar a cone-


xão entre outras questões constitucionais e o direito à saúde,
mas por refletirem outras conexões, optou-se por não as elen-
car, tais como: proteção da liberdade de iniciativa e exercício
dos profissionais indiretamente relacionados com a prestação
de serviços de saúde públicos e privados; o principal elo
aponta que a proteção dos consumidores, famílias, idosos, mi-
norias étnicas, crianças e adolescentes inclui logicamente a
proteção da saúde desses grupos e, portanto, é apoiada por o
direito à vida; direito à moradia, direito ao trabalho e outros
direitos sociais, a reencarnação do direito à vida, aliada à dig-
nidade humana, também é considerada o principal elo.

Destarte, deve-se ressaltar que o direito à saúde é um


ramo do próprio direito à vida e pode ser vinculado a quase
todos os direitos constitucionais, pois sem saúde não há vida,
sem vida nenhum direito pode ser exercido.

98
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.1.1PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS JURÍDICOS DO DI-


REITO À SAÚDE

Além dos princípios constitucionais aplicáveis aos direi-


tos fundamentais e à seguridade social, conforme o artigo 194
parágrafo único da CF/88, existem princípios específicos esti-
pulados nela e no artigo 7º da Lei nº 8.080/90, que se aplicam
a todas as ações e serviços públicos do SUS, incluindo redes
públicas, contratos privados ou serviços contratados.
A igualdade é o princípio orientador que rege as cate-
gorias de direitos básicos, e não deve haver nenhum precon-
ceito ou privilégio de qualquer forma na prestação de serviços
médicos. A utilização dessa norma em casos específicos cau-
sará constante debate, ocasionado pela frágil fronteira entre
igualdade e privilégio, principalmente no caso de expansão de-
sequilibrada de benefícios, o que distorce as normas básicas
do SUS e, portanto, prejudica o sistema. Visto que o aprofun-
damento dessa questão requer uma digressão teórica, além
da análise de jurisprudência, a judicialização do direito à saúde
(LIMA, 2019).
O artigo 5º, caput da Carta Magna aduz que todos são
iguais diante a lei. Logo, para Ingo Wolfgang Sarlet (2018) é
compreensível, que além do nivelamento dos indivíduos pe-
rante as normas legais, esse princípio também determina que

99
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a própria lei não pode ser editada sem ser inconsistente com
a sinonímia.
Desta forma, além da função formal de todas as pes-
soas serem iguais perante a lei, que visa impor a obrigação de
tratar todas as pessoas com justiça no ordenamento jurídico,
o texto constitucional de 1988 também reconhece o direito à
igualdade, tentando impor a igualdade entre os indivíduos as
suas condições físicas, conforme Sarlet (2018) explica.
No entendimento de Lima (2019) a igualdade é uma
meta a ser perseguida diuturnamente, em certa medida, logo
é vista como o ideal de harmonia entre indivíduos por se ter
situações semelhantes na vida social, ou seja, representa jus-
tiça, por ser a igualdade um tratamento igual em termos de
necessidades. Visto isso, a igualdade existente entre duas
pessoas seja considerada justa, existe um padrão de justiça
que visa estabelecer que duas pessoas devem ser iguais.
Já na visão de Sarlet (2018), conforme dito alhures, o
artigo 196 da Constituição incorpora normas para o uso de re-
cursos públicos gerais para a saúde. Nessas circunstâncias,
não importa se há diferenças, todos têm direito à saúde sem
exceção, esta é uma obrigação do estado. Além do padrão
universal, os membros tripartites também incluíram o padrão
de necessidade, que determina se deve ser atribuído a cada
pessoa de acordo com suas necessidades. De acordo com os

100
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

padrões exigidos, as pessoas que sofrem de determinada do-


ença fornecerão suporte para diversos recursos para o trata-
mento da doença.
O acesso universal existente nos serviços de saúde
deve ser garantido em todos os níveis de atenção. Isso é re-
sultado da própria estrutura previdenciária, que separa a sa-
úde da previdência social. Este mandamento reforça a ideia
central de garantir a igualdade de tratamento, o respeito à dig-
nidade e o sistema de não discriminação.
De acordo com Vieira (2014), o princípio da universali-
dade, o indivíduo tem direito a todos os serviços públicos de
saúde e aos serviços abrangidos por todos os níveis de assis-
tência, sem privilégios ou preconceitos. No entanto, o usuário
se refere ao escopo dos serviços mediados por profissionais
médicos e/ou conhecimento, que pode ser descrito como um
privilégio e, portanto, tem acesso a sujeitos individuais (profis-
sionais), ao invés de serviços médicos.
Já no entendimento de Lima (2019) em geral, o princí-
pio da reserva do possível acondiciona a possibilidade e a
aquisição da ação do estado na efetivação de determinados
direitos sociais e fundamentais, como o direito à saúde, condi-
cionando a provisão do estado à existência de fundos públicos
disponíveis.

101
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Para o doutrinador Sarlet (2018) é especialmente ao


criar condições para o exercício e gozo da dignidade, que é
tarefa do país, a dignidade humana exige que este oriente as
suas ações no sentido de preservar a dignidade existente e
visando a promoção da dignidade.
Neste ponto, no que diz respeito à Constituição, o entu-
siasmo da dignidade como princípio básico não chega nem
mesmo para promover sua verdadeira eficácia e prevenir vio-
lações pontuais à dignidade das pessoas (VIEIRA, 2014).
Em razão disso, ressalte-se que o reconhecimento de
que a dignidade humana está relacionada apenas à efetivação
dos direitos básicos está previsto na Constituição de 1988 e é
fundamental para a compreensão da relação entre a efetivi-
dade do direito à saúde e a intervenção da jurisdição. Em ter-
mos de realização de direitos sociais e respeito ao princípio da
igualdade.
Aduz Barcellos (2002) que o princípio da dignidade hu-
mana envolve os requisitos básicos da pessoa humana, por-
tanto, especificamente, fornece ao ser humano os recursos
necessários para manter a dignidade. Portanto, o que impõe o
respeito incondicional pela dignidade humana é o valor pes-
soal humano, ou seja, a dignidade humana. De acordo com as
disposições claras da CRFB/88 em seu artigo 1, inciso III.

102
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A característica básica do princípio da dignidade hu-


mana é garantir o mínimo de respeito pelas pessoas, simples-
mente porque são seres humanos, porque, em essência, to-
dos gozam da mesma dignidade e têm direito a uma vida digna
de seres humanos.
Partindo-se deste pressuposto, o efeito esperado desse
princípio, é que essencialmente as pessoas desfrutem de uma
vida digna. O princípio do pensamento voltado para as pes-
soas tem uma obrigação negativa de não prejudicar ninguém,
bem como uma obrigação positiva de implementar políticas
públicas de relevância econômica e social.

3.1.2 PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMI-


DOR APLICADOS AOS CONTRATOS DE PLANOS DE
SAÚDE

Antes de analisar esses princípios, o mais importante é


apresentar o disposto no artigo 2º do Código Defesa do Con-
sumidor (CDC), que dispõe sobre a identidade do consumidor.
Os consumidores são considerados como o destinatário final
toda pessoa física ou jurídica que compra ou utiliza produtos
e serviços (BRASIL, 1990).
Consoante a Constituição, considera a proteção ao
consumidor um direito básico. Conforme estipulado no artigo

103
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1º, na Lei nº 8.078/90, que dispõe sobre a proteção e defesa


do consumidor, tem ordem pública e interesse social conforme
expresso na carta constitucional do País.
Para Pereira (2019) que por meio do CDC, diversas ins-
tituições foram criadas para regular as relações de consumo e
buscar promover a proteção do consumidor diante de relações
contratuais abusivas (como cláusulas contratuais excessiva-
mente onerosas). Nesse sentido, o artigo 6º, inciso V, explana
que: “é direito do consumidor a modificação das cláusulas con-
tratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua
revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem ex-
cessivamente onerosas” (BRASIL, 1990).
Nesse ínterim, também se faz imperioso adentrar aos
princípios do CDC aplicáveis aos contratos de planos de sa-
úde. O princípio da vulnerabilidade é inerente às relações de
consumo porque acredita-se que os consumidores sejam sus-
cetíveis à influência de seus fornecedores. Por meio da formu-
lação da Política Nacional de Relações com o Consumidor, o
CDC busca proteger direitos importantes para atender às ne-
cessidades do consumidor e princípios como a dignidade hu-
mana nas relações de consumo.
No entendimento de Pereira (2019), o contrato de con-
sumo celebrado entre o consumidor e o fornecedor, o fornece-

104
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

dor é visto como a parte mais forte da relação, que é repre-


sentado principalmente pela sua força econômica no mercado
consumidor. Dessa forma, as vulnerabilidades são sempre
uma característica de quem compra um serviço ou produto. No
entanto, essa afirmação merece um pouco de atenção, e sua
postura jurídica deve ser considerada na definição de quem é
o consumidor final.
Insta salientar, que para finalistas simplificados, o con-
sumidor final é a pessoa física que utiliza o serviço para fins
pessoais e a pessoa jurídica que adquire o produto ou serviço
para sua produção comercial. Porém, para as pessoas jurídi-
cas, para a aplicação do CDC em suas relações de consumo,
é necessário comprovar sua vulnerabilidade nas relações con-
tratuais. Vale ressaltar que para que o consumidor seja consi-
derado vulnerável, sua vulnerabilidade deve ser técnica, jurí-
dica e factual, pelo que esta consideração também se aplica
às pessoas coletivas, na visão de Pereira (2019).
Comprovada a insuficiência e autenticidade das alega-
ções, o ônus da prova pode ser invertido nas relações de con-
sumo. Para garantir a máxima eficácia dos princípios do con-
traditório e das amplas defesas, a inferência do cumprimento
do devido processo legal deve obedecer também ao princípio
da cooperação.

105
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O princípio do consumo insuficiente está gravado no ar-


tigo 6º, inciso VIII da Lei nº 8.078/90, é um fato de uma situa-
ção específica e não uma condição jurídica. Devido à falta de
conhecimento sobre o produto ou serviço adquirido, pode ser
técnico e atrair a atenção na maioria dos casos. Considera a
situação socioeconômica do consumidor em relação ao forne-
cedor (PEREIRA, 2019).
Dito isso, para Pereira (2019), caracteriza-se também
pelo fato de, nas circunstâncias jurídicas, ser imprescindível
que o consumidor se encontre impedido de obter a certificação
e responsabilizar o fornecedor pelos danos causados. A falsa
insuficiência é um diferencial, e traz outro benefício ao consu-
midor, ou seja, o benefício, que é a possibilidade de defesa na
esfera judicial, que é a inversão do ônus da prova prevista no
artigo 6, inciso VIII do CDC.
Por outro lado, considerar que o ônus da prova também
é um código de conduta, que orienta a atuação das partes no
processo de investigação, ou seja, o magistrado já anunciou a
atribuição da responsabilidade pela liberdade condicional com
antecedência no início da investigação. O palco é imprescin-
dível, portanto, o litigante deve estar ciente de suas próprias
responsabilidades e dos riscos que cada pessoa pode correr
antes.
Presentemente, as organizações são vistas oferecendo

106
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

programas de bem-estar de forma autoadministrada, que é


considerada a forma mais tradicional de complementar o es-
pectro de bem-estar. Nele, a gestão é realizada pelos próprios
colaboradores da organização, seja em benefício próprio ou
para gerir os serviços de saúde de outras empresas. Os servi-
ços autogestão destinam-se a grupos fechados de uma
mesma classe trabalhadora e seus respectivos dependentes.
Segundo Oliveira (2019), a autogestão é um modelo
muito diversificado porque existem múltiplas formas de criar e
manter essas entidades. Esse modelo acaba por flexibilizá-lo
na forma como é executado e planejado financeiramente.
Isso porque a operadora de plano de saúde que presta
serviços de saúde e aparece como prestadora de plano de sa-
úde, enquanto o beneficiário obtém o plano que lhe é oferecido
e, assim, aparece como consumidor. Portanto, existe uma re-
lação de consumo entre as operadoras de planos de saúde,
se esta não for de autogestão, e seus beneficiários, e as leis
do consumidor se aplicam para discutir eventuais ações judi-
ciais.
Conforme definido por Maria Stella Gregori (2019), um
modelo de autogestão representa uma entidade que opera um
programa em sistema fechado, com um público específico,
que pode ou não estar associado a empresas públicas e pri-

107
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

vadas, sindicatos ou associações, e em alguns casos os pla-


nos são executados pelo departamento ao qual estão associ-
ados (geralmente, nos Recursos Humanos).
Essas operadoras também são obrigadas a submeter
anualmente suas demonstrações financeiras a uma auditoria
independente, divulgá-las aos beneficiários e encaminhá-las à
ANS. Da mesma forma, o artigo 10 da referida resolução nor-
mativa nº 137/06 exige que as entidades com autogestão en-
viem periodicamente à ANS suas informações econômico-fi-
nanceiras, cadastrais e operacionais. No que se refere à ma-
nutenção financeira do plano, ela pode ser feita por meio da
agência patrocinadora, da empresa associada ou de ambas,
em regime de participação conjunta (GREGORI, 2019).
Em razão da finalidade não lucrativa de contrato de
plano de saúde para entidade com autogestão, a ANS não li-
mita o percentual de seu reajuste e apenas a autoriza a solici-
tar financiamentos nos termos exigidos pelo plano de saúde
no recebimento de uma declaração informando o operador. A
importância das operadoras com autogestão é aqui evidente,
porém, os consumidores têm o direito de prever a magnitude
dos aumentos de preços, o que deve ser feito de forma justa
entre as partes contratantes, principalmente nos contratos de
parcelamento consecutivos. Muitas vezes, sob o pretexto de

108
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

reequipar o aplicativo, os consumidores são sobrecarregados


pela má gestão do operador.

3.2 SAÚDE SUPLEMENTAR BRASILEIRA

A saúde suplementar brasileira, de acordo com Figuei-


redo (2006) surgiu nas décadas de 1920 e 1930 o qual, deu
início da saúde suplementar em todo o país, quando foram cri-
adas as primeiras organizações privadas de saúde para quem
trabalhava. É um conjunto de ações e serviços desenvolvidos
por operadoras de planos e seguros privados de saúde não
vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A fiscalização
dessas atividades é realizada pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS).
A saúde é um elemento básico do bem-estar da popu-
lação, da competitividade corporativa e do desenvolvimento
econômico e social nacional. No Brasil, o direito à saúde é
exercido pelo SUS, que se propõe a proteger a assistência
médica, a hospitalização e o bem-estar da população.
Aduz Figueiredo (2006), como o setor público não su-
porta o número de pessoas que utilizam esse recurso de forma
qualitativa, a assistência médica suplementar é um importante
pilar do sistema nacional de saúde e é fundamental para o
país. Na década de 1960, com o crescimento da economia

109
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

brasileira e o avanço do trabalho formal, as empresas passa-


ram a oferecer aos empregados programas de assistência mé-
dica e surgiu a saúde suplementar no país.
No entanto, essa atividade só foi regulamentada em
1998, por meio da Lei nº 9.656, supervisionam planos de sa-
úde e empresas da área, ou seja, operadoras. Desde o início
da formulação da lei, foram estabelecidos os principais requi-
sitos e diretrizes para o melhor funcionamento do departa-
mento.
A saúde suplementar é um ramo das atividades que en-
volve as operações de planos e seguros privados de saúde,
supervisionada e fiscalizada pela ANS e composta por opera-
doras, profissionais e beneficiários. As ações e serviços que
desenvolve não estão vinculados ao SUS. O sistema médico
complementar brasileiro é um dos maiores sistemas médicos
privados do mundo. Devido à saúde suplementar, o plano de
saúde atende para que os cidadãos não percam o direito de
receber atendimento SUS.
O aumento do preço dos planos de saúde aumentou os
custos das empresas no atendimento aos trabalhadores, mas
não melhorou a qualidade e os resultados. Para Figueiredo
(2006) este problema é um dos principais desafios que este
segmento de mercado enfrenta atualmente. Uma solução é
melhorar a gestão da indústria para garantir que eles possam

110
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

manter esses benefícios para os trabalhadores. Tanto as em-


presas quanto as operadoras precisam desenvolver estraté-
gias eficazes para contribuir para a melhoria dos resultados e
da experiência do usuário.
O basilar objetivo dos cuidados médicos complementa-
res é ajudar a garantir que as pessoas tenham acesso a segu-
ros de saúde e cuidados hospitalares. No modelo atual, o foco
está no tratamento de uma doença estabelecida, seja para cu-
rar ou melhorar os sintomas.
A saúde suplementar inclui as ações privadas e os ser-
viços prestados por meio de planos de saúde. Dedica-se à
prestação de serviços no setor privado. A atuação do setor pri-
vado no campo da saúde pública, o SUS é denominada saúde
complementar. Este serviço é prestado de acordo com contra-
tos ou acordos de direito público, com prioridade para entida-
des beneficentes e sem fins lucrativos. Em outras palavras, o
Estado utiliza a iniciativa privada para aumentar e complemen-
tar o desempenho de seu interesse público (FIGUEIREDO,
2006).
Portanto, procedimentos caros podem ser agregados
às pessoas cobertas pelo plano, mas seus benefícios de sa-
úde e previdência são baixos, dificultando o acesso aos dados
agregados de saúde dos beneficiários do plano coletivo cor-
porativo.

111
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Uma operadora de plano de saúde suplementar pode


ser definida como a pessoa jurídica cadastrada na ANS que
administra, comercializa ou oferece planos de saúde. Normal-
mente, as operadoras vendem esses planos e realizam dife-
rentes tipos de atendimento ao cliente.
Além disso, a operadora continuará a fornecer serviços
ou seguro para garantir assistência médica após o pagamento
ao administrador do plano. Explica Figueiredo (2006), que as
operadoras podem ser divididas em diferentes modelos de ne-
gócios no mercado, como tratamento médico em grupo, se-
guro saúde profissional, cooperação médica, autogestão etc.
Por fim, alguns exemplos de operadoras brasileiras de
planos de saúde são: Amil Assistência Médica Internacional,
Bradesco Saúde, Sul América, Unimed etc. Regular os prove-
dores e provedores de serviços de saúde é o principal desafio
enfrentado pelas operadoras.

3.2.1 LEGISLAÇÃO DOS PLANOS DE SAÚDE

A legislação dos planos de saúde no Brasil, é oferecida


pelo Estado e está previsto no texto constitucional em seu ar-
tigo 198, a saber: “as ações e serviços públicos de saúde inte-
gram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um

112
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretri-


zes [...]” (BRASIL, 1988).
Portanto, para o desenvolvimento de serviços e ações,
foi desenhado um sistema único, formado por redes estratifi-
cadas e regionais, de acordo com as seguintes diretrizes: des-
centralização única de governos em todos os níveis, atenção
integral priorizando ações preventivas e não impactando os
serviços de assistência e da participação da comunidade.
Dessa forma, foi criado um SUS, com receita de todos
os entes federados (Artigo 198, parágrafo único da Carta
Magna). Nesse sistema, cada uma dessas entidades atua de
forma regionalizada e descentralizada dentro de sua jurisdição
para que todos os cidadãos possam obter serviços de saúde
de qualidade (GREGORI, 2019).
Dito isso, as operadoras de planos de saúde participam
dos serviços de saúde prestados por instituições médicas de
forma complementar ao governo, na modalidade privada.
Com isso, Gregori (2019) explica que os serviços de sa-
úde privados são fornecidos através dos chamados esquemas
de planos de saúde ou seguro de saúde, em comparação com
os serviços prestados pelo estado, proporciona aos cidadãos
melhores serviços médicos e de hospitalização sem grandes
despesas imediatas, que são compensadas pelos prémios

113
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mensais, sendo o serviço modal e a rede de referência do con-


trato determinados de acordo com regulamentos nacionais.
Com isso, esta modalidade de contrato, torna-se um se-
guro em que, uma Operadora de Planos e/ou Seguros de Sa-
úde, mediante um determinado pagamento mensal, indenizará
o consumidor, ou terceiros interessados, sobre os prejuízos
resultantes de riscos futuros.
A Lei nº 9.656, promulgada em 3 de junho de 1998, é a
estrutura regulatória do setor de saúde suplementar no Brasil.
Como mencionado acima, para Gregori (2019) nem o setor
privado nem o governo possuem informações específicas so-
bre os problemas enfrentados pelos consumidores. A reali-
dade da indústria foi desenvolvida por mais de 40 anos sem
estar vinculada a nenhuma regulamentação específica, por-
que o CDC não tem escopo para certos aspectos da indústria
Desta vez, o surgimento da Lei nº 9.656/98, e o poste-
rior surgimento da ANS, responsável pela fiscalização e regu-
lação do setor, deram-lhe maior visibilidade na busca satisfa-
tória da relação jurídica entre as operadoras de planos de sa-
úde e consumidores. A lei traz uma série de inovações para o
departamento, como o sistema de planos de referência, que
contém os requisitos mínimos que deve atender (GREGORI,
2019).

114
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No entanto, embora o referido diploma seja a primeira


norma que regulamenta especificamente o departamento de
planejamento em saúde, ele não tem a força e a abrangência
necessárias para resolver todas as discussões existentes so-
bre o assunto, pois sua vigência começa em 3 de janeiro de
1999. Portanto, não está vinculado ao escopo do contrato.
Diante da instabilidade, diversos processos foram mo-
vidos contra as operadoras de planos de saúde, e o judiciário
declarou nulas certas cláusulas desses contratos por, teorica-
mente, colocarem o consumidor em desvantagem nas rela-
ções jurídicas.
Obviamente, a concepção da ANS também teve um pa-
pel importante no processo de início da regulação do setor pri-
vado de saúde. No entanto, a aplicação desta lei aos contratos
de planos de saúde merece destaque porque uma série de
contratos foram assinados antes da sua entrada em vigor e
estes contratos não estão a ela vinculados.
Ressalte-se que, Gregori (2019) explica que a fiscaliza-
ção do setor de saúde suplementar teve início com a promul-
gação da Lei nº 9.656/98. Abordou a um consenso sobre a
necessidade de intervenção do Estado no desempenho da
operadora de planos de saúde. Desentendimentos envolvem
apenas objetivos e limitações a esta intervenção. No entanto,

115
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

só em 1998, com a promulgação da lei, é que é iniciado o pro-


cesso de supervisão do departamento.
Outra forma, é a autogestão, que não tem fins lucrati-
vos, pois a própria empresa administra os planos de saúde de
seus empregados ativos, aposentados, pensionistas e seus
dependentes. É o modelo dominante para empresas estatais
e administrações públicas. O custo é compartilhado pelo be-
neficiário e geralmente é proporcional ao salário e descontado
diretamente na folha de pagamento.
Os modelos autogestão representam entidades que
executam esquemas em sistema fechado, com públicos espe-
cíficos que podem ou não estar associados a corporações,
empresas públicas e privadas, sindicatos ou associações e,
em alguns casos, executados por meio de programas de de-
partamentos, geralmente RH, para quais estão ligados inter-
namente (GREGORI, 2019).
Na autogestão, não há restrições quanto a problemas
de saúde pré-existentes, e aqui estão incluídos não só os titu-
lares (funcionários da empresa), mas também seus dependen-
tes. Os planos são os mesmos em todos os níveis da empresa
e, normalmente, as contribuições são proporcionais à remune-
ração do funcionário. Para racionalizar o uso do programa, al-
guns usam números de coparticipação para eventos de baixo
risco.

116
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Por meio da resolução RDC nº 39 da 2000, a ANS clas-


sifica a autogestão como a entidade autoadministrada que
opera serviços de assistência à saúde ou um modelo em que
uma empresa, por meio de seu departamento de recursos hu-
manos ou similar, é responsável pelo planejamento de um
plano de saúde privado para empregados ativos, aposenta-
dos, pensionistas ou ex-empregados, bem como seus respec-
tivos grupos familiares definidos, limitam-se a parentes de ter-
ceiro grau ou afins em uma ou mais empresas, ou ainda parti-
cipantes e dependentes de pessoas físicas ou jurídicas, fun-
dações, sindicatos, associações físicas profissionais curso ou
similar.
Com objetivo de prestar um serviço de qualidade a um
grupo específicos de pessoas com características semelhan-
tes. O plano de saúde de autogestão é regulamentado pela
ANS e deve seguir as mesmas regras dos demais planos de
saúde, com sua cobertura garantida. A diferença está na forma
como o regime é administrado, seja pela empresa ou pela pró-
pria entidade contratante, que pode ter mais autonomia para
definir as regras e o alcance do regime.
Desta vez, as leis acima mencionadas trouxeram uma
série de inovações, ansiosas por resolver alguns conflitos de
interesse entre consumidores e operadoras, e preencher algu-

117
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mas lacunas existentes no campo da saúde privada. No en-


tanto, estes não devem se aplicar a contratos assinados antes
disso, pois a validade da lei é determinada pelo STF.

3.3 O ROL DOS PLANOS DE SAÚDE SÃO EXEMPLIFICA-


TIVO OU TAXATIVO?

O rol da ANS é previsto na Lei nº 9.656/1998 – Lei dos


planos e seguros privados de assistência à saúde – que con-
fere à ANS a competência legal para eleger cobertura mínima
obrigatória como referência às operadoras, de acordo com o
artigo 10º, parágrafo 4º que explica que “a amplitude das co-
berturas no âmbito da saúde suplementar, inclusive de trans-
plantes e de procedimentos de alta complexidade, será esta-
belecida em norma editada pela ANS” (BRASIL, 1998).
O rol da ANS possui mais de três mil procedimentos lis-
tados, além de doenças listadas na Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a
Saúde (CID), e da Organização Mundial da Saúde (OMS). A
lista de procedimentos que estabelecem cobertura dos planos
de saúde foi atualizada desde sua criação em 1998 (STRIC-
KLAND; NOBERTO, 2022).
Desta forma, a ANS estabelece uma lista de procedi-
mentos, sendo eles dividido em rol taxativo (restrito e limitado),

118
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que não é possível mudanças e inclusão de novos tratamen-


tos, e temos também o rol exemplificativo (mais amplo) que
permite novas terapias e tratamentos.
O entendimento anterior era de apesar de haver contro-
vérsia em relação a cobertura de procedimentos pelos planos
de saúde, a jurisprudência majoritária (entendimentos dos tri-
bunais pátrios) considerava o rol da ANS exemplificativo
(STRICKLAND; NOBERTO, 2022).
Existem duas correntes a serem discutidas, a primeira
corrente é a do rol exemplificativo, que quer dizer basicamente
que o plano de saúde não se limita a cobrir apenas o que
consta no rol da ANS de forma fechada, pois essa lista passa
a servir como indicação dos tratamentos e dos procedimentos
que podem ser realizados. Com base no Acordão Nº
07440203120218070001 que tem por Relator Leonardo Ros-
coe Bessa, da 6ª Turma Cível, explana o seguinte no acordão
em questão:

3. Nos termos da jurisprudência consolidada do


Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal e Territórios, o rol da
ANS é meramente exemplificativo e, portanto,
não esgota os procedimentos que devem ser co-
bertos pelas operadoras dos planos de saúde. 4.
A Quarta Turma, ao julgar o REsp 1.733.013/PR,
alterou seu antigo entendimento e passou a de-
cidir que o rol de procedimentos e eventos em
saúde da ANS tem natureza taxativa. Contudo,

119
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

trata-se de posicionamento recente, se compa-


rado à consolidação histórica da linha anterior.
Ademais, no próprio julgamento do REsp
1.733.013/PR, a Quarta Turma ressaltou que o
magistrado deve ponderar a taxatividade do rol
de procedimentos da ANS com as peculiaridades
do caso concreto (BRASIL, 2022).

Do outro lado, temos o rol taxativo, por outro lado, cons-


titui apenas que coisas que não estão no rol não podem ser
cobertas pelas operadoras de saúde. De acordo com o Acor-
dão Nº 142953207041850520228070000 com seu Relator Di-
aulas Costa Ribeiro, em seu trecho explica que “2. O rol de
procedimentos e eventos em saúde obrigatórios, regulamen-
tado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), tem
natureza taxativa, segundo entendimento do STJ (Overruling)
proferido no REsp nº 1733013/PR” (BRASIL, 2022a).
No julgamento realizado em 08 de junho de 2022, a se-
gunda turma do STJ entendeu que o rol de procedimentos e
eventos elaborados pela ANS era taxativo e que, em geral, as
operadoras de saúde não eram obrigadas a cobrir os custos
do tratamento não listado em seu rol de procedimentos.
No entanto, a turma estabeleceu parâmetros para que,
em casos excepcionais, o plano pague por procedimentos não
especificados na lista, a exemplo de terapias com recomenda-
ções médicas, sem substituto terapêutico no rol, e que tenham

120
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições


que regulam o setor.
Pelas diretrizes estabelecidas no julgamento, na se-
gunda sessão entende no EREsp nº 1.886.929 que os planos
de saúde são obrigados a custear o tratamento não listado
para pacientes com diagnóstico de esquizofrenia, e que no
EREsp nº 1.889.704 as operadoras devem cobrir o auto trata-
mento de portadores de Transtornos do Espectro Autista
(TDA), pois o ANS reconheceu que a terapia ABA desempe-
nha um papel de saúde complementar em seu papel preten-
dido em um currículo de psicoterapia (STRICKLAND; NO-
BERTO, 2022).
Ao final da sessão de deliberação de 10 de agosto de
2022, os senadores aprovaram um pedido (RQS nº 606/2022)
para discussão em plenário do projeto de lei que obrigaria os
planos de saúde a cobrir tratamento não fornecido pela ANS.
Como se sabe, uma das principais características do
Código de Processo Civil é a valorização da jurisprudência dos
tribunais, instituída pelo artigo 926, que estabelece que “os tri-
bunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la está-
vel, íntegra e coerente” (BRASIL, 2015).
Ensinam que somente STF e STJ podem abrir prece-
dentes. Ambos os tribunais também são responsáveis por co-
operar com a jurisprudência, que pode regular a interpretação

121
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ou aplicação da lei. O TJ e TRF são responsáveis pela produ-


ção do caso.
Os legisladores agora optaram por isentar a necessi-
dade de duplicidade de sentenças como requisito de sua con-
figuração nos termos do artigo 927, inciso III do CPC/2015,
garantindo que as sentenças em duplicatas e eventos sejam
vinculantes e jurisdicionais, e um resumo (BRASIL, 2015).
Agora, no entendimento da segunda seção do STJ, no
dia 08 de junho de 2022, finalizou o julgamento da Ação
EREsp nº 1.886.929, que discutiu a natureza do Rol de Proce-
dimentos e Eventos em Saúde da ANS, entendendo que o rol
da ANS é, em regra, taxativo (STRICKLAND; NOBERTO,
2022).
Isso significa que, as operadoras de saúde não são
obrigadas a cobrirem tratamentos não previsto no rol da ANS.
No entanto, embora a decisão não seja benéfica aos usuários
de plano de saúde, devemos se ater aos pontos levantados
em razão das excepcionalidades à cobertura de tratamentos
indicados por médico e odontólogo assistente, que não este-
jam previstos no rol da ANS.
Contudo, o STJ entendeu também, que existem algu-
mas exceções, o que torna o rol taxativo-mitigado, possibili-
tando deste modo, o acesso à tratamentos não previstos na

122
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

lista da ANS. Porque existem algumas exceções que devemos


estar cientes.
Como resultado, o imposto acabou sendo reduzido. O
plano/seguro de saúde passa a não ser obrigado a pagar por
tratamento não previsto na lista se já existir na lista outro pro-
cedimento eficaz e seguro para o tratamento do paciente.
Além disso, foi determinado que os contratos de “cober-
tura ampliada” podem ser celebrados por meio de aditivos con-
tratuais para tais procedimentos não incluídos na lista taxativa
da ANS. Em nossa opinião, isso custará mais aos consumido-
res e provocará muita discussão jurídica.
É de se entender que, nos casos em que não houver
substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos da
ANS, poderá, os planos de saúde cobrir os tratamentos indi-
cados pelo médico ou odontólogo assistente, mas para isso,
no entanto, é preciso que a incorporação do tratamento à lista
da ANS não tenha sido indeferida expressamente; outro ponto
é que haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da
medicina baseada em evidências; por conseguinte, ainda te-
remos que haja recomendação de órgãos técnicos de renome
nacional (CONITEC, NATJUS) e estrangeiros; por fim, seja re-
alizado, quando possível, diálogo entre os magistrados e es-
pecialistas (STRICKLAND; NOBERTO, 2022).

123
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sobre a decisão do STJ podemos destacar que há pos-


sibilidade de contratação de cobertura ampliada ou aditivo
contratual para cobertura de procedimento que não esteja na
lista da ANS. Temos também, que não é uma decisão vincu-
lante (em casos de liminares deferidas, não há mudanças ime-
diatas). Por fim, o Ministro Salomão foi bem pontual na deci-
são, afirmando que a terapia ABA já consta no rol da ANS, que
podemos localizar na sessão de psicoterapia, inclusive, não
podemos esquecer da RN 469/21, que fala sobre as sessões
ilimitadas para autismo (STRICKLAND; NOBERTO, 2022).
O Projeto de Lei (PL) nº 2033/22 determina que os pla-
nos de saúde devem cobrir os tratamentos prescritos por mé-
dico ou dentista, desde que atendam a pelo menos um dos
requisitos: sejam comprovadamente eficazes, sejam recomen-
dados pelo Conselho Nacional de Consolidação Técnica (CO-
NITEC) ao Sistema Único de Saúde (SUS) ou por outra agên-
cia internacional de avaliação de tecnologia em saúde de re-
nome internacional (CRUZ, 2022).
De acordo com Cruz (2022) o PL 2033/22, aprovado em
agosto, derrubou o “rol taxativo”. Antes da decisão do STJ,
muitos usuários de planos de saúde buscavam (e consegui-
ram) na Justiça que as operadoras fossem obrigadas a pagar
por procedimentos ou tratamentos que ainda não constavam
na lista da ANS.

124
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Por sua vez, a agência criticou o fim do rol taxativo e


argumentou que a ampliação da abrangência dos procedimen-
tos médicos obrigatórios poderia encarecer os planos de sa-
úde para o consumidor final. É de suma importância, notarmos
que a taxatividade do rol da ANS implica no direito à saúde, e
apresenta sim um retrocesso. Certamente, caso permane-
cesse a taxatividade do referido rol estaríamos diante de um
retrocesso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Partindo da premissa que a saúde é um direito básico


partilhado por todos, não existindo diferença entre os usuários.
Assim, o Estado tem a obrigação de garantir a saúde para a
existência da vida humana, sendo uma condição primordial,
para o atingimento do tão defendido princípio da dignidade hu-
mana. A Carta Maior garante o acesso integral, gratuito, uni-
versal e igualitário ao direito à saúde. O contrato de plano de
saúde, por sua vez, se classifica como um contrato típico de
consumo, pois atende ao conteúdo estabelecido pelo CDC
para caracterizar as relações de consumo.
No Brasil, a discussão sobre a obtenção da saúde na
justiça tem se tornado um meio amplamente utilizado para fa-

125
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

zer valer o direito à saúde. O número de ações judiciais rela-


cionadas à legalização da saúde tem crescido exponencial-
mente. Esse aumento expressivo comprova que o judiciário
tem se tornado uma ferramenta eficaz para a efetivação do
direito à saúde.
A principal consequência da judicialização é que, por
meio da intervenção dos órgãos judiciais na gestão da saúde,
suas políticas, programas e princípios serão afetados, e difi-
cultará a gestão de recursos.
Em suas decisões, os tribunais reconheceram a aplica-
ção do CDC aos contratos de planos de saúde, desde que não
se enquadrem na modalidade de autogestão. O CDC se ba-
seia em um conjunto de princípios incorporados à teoria geral
dos contratos na Constituição, abrindo uma nova perspectiva
para a interpretação dos contratos de planos de saúde.
Apenas o conteúdo expressamente declarado no con-
trato não deve ser considerado como uma obrigação da ope-
radora. É necessário considerar os diversos princípios envol-
vidos nesta relação de consumo, tais como livre iniciativas, di-
reito à saúde, vulnerabilidade do consumidor, integridade ob-
jetiva etc., a fim de alcançar a coordenação dos interesses dos
participantes dessa relação.

126
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Os contratos de plano de saúde de autogestão, com


base na Súmula 608, deixaram de estar sujeitas ao CDC, im-
possibilitando a modificação dos contratos por cláusulas que
onerassem indevidamente os consumidores. Dessa forma,
aplicar-se-ia o disposto no artigo 478 do CC, ou seja, o funda-
mento para a realização desses pedidos seria ônus indevido
por fatos extraordinários e imprevisíveis.
Em suma, tudo o que o CDC prevê para a proteção do
consumidor constitui uma estrutura de proteção que pode e
deve ser aplicada aos contratos de plano saúde, no entanto,
os planos de saúde de autogestão são regidos pelo CC, que
nada mais é que a empresa ou entidade prestadora do plano
é responsável pela administração dos serviços de saúde. Ou
seja, é a que cria e administra um plano de saúde para seus
próprios empregados ou associados.
Ressalte-se que não se trata de dar superproteção ao
consumidor, nem de interpretar as regras do consumismo em
desacordo com as condições livremente pactuadas do mer-
cado de consumo, nem de onerar empresas ou instituições
contratadas com o ônus excessivo de operar riscos, mas usar
da melhor forma, restabelecendo o caráter sinalizador do con-
trato, que pode ser mantido por meio de ação modificativa
mesmo após alteração do entendimento proposto pelos tribu-
nais pátrios sobre a questão.

127
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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sobre a definição das modalidades de planos ou seguros sob
o regime de contratação individual ou coletiva, e regulamenta
a pertinência das coberturas às doenças e lesões preexisten-
tes e a exigibilidade dos prazos de carência nessas modalida-
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territó-


rios. 6ª Turma Cível. AC nº 0744020-31.2021.8.07.0001. Ape-
lação cível. Obrigação de fazer, ressarcimento e compensa-
ção por dano moral. Plano de saúde. Recusa de pet-ct base-
ada no não preenchimento dos critérios da dut. Conduta abu-
siva. Jurisprudência majoritária. Inobservância da natureza do
contrato. Ressarcimento integral devido. Dano moral. Nega-
tiva de cobertura. Desproporcionalidade. Redução. Recurso
conhecido e parcialmente provido. Relator: Leonardo Roscoe
Bessa, Brasília, Data de Julgamento em 8 de junho de 2022.
Disponível em: https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcor-
daos-web/sistj. Acesso em: 15 set. 2022.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territó-


rios. 8ª Turma Cível. AI 0704185-05.2022.8.07.0000. Agravo

129
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Plano/seguro de


saúde. Amil. Art. 300. CPC. Tutela de urgência. Exame pet-ct
ou pet-scan. Neoplasia benigna encéfalo infratentorial. Nega-
tiva de cobertura. Rol da ANS. Taxatividade. STJ. Mudança de
entendimento. Overruling. Violação à saúde. Função social
dos contratos. Subversão da função social. Caso concreto.
Custeio. Possibilidade. Hipóteses excepcionais. Relator: Diau-
las Costa Ribeiro, Brasília, Data de Julgamento em 7 de junho
de 2022. Disponível em: https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/Inde-
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nico.buscaindexada.apresentacao.VisaoBuscaAcordao&con-
troladorId=tjdf.sistj.acordaoeletronico.buscaindexada.apre-
sentacao.ControladorBuscaAcordao&visaoAnte-
rior=tjdf.sistj.acordaoeletronico.buscaindexada.apresenta-
cao.VisaoBuscaAcordao&nomeDaPagina=resultado&co-
mando=abrirDadosDoAcordao&enderecoDoServlet=sistj&his-
toricoDePaginas=buscaLivre&quantidadeDeRegis-
tros=20&baseSelecionada=BASE_ACORDAOS&numero-
DaUltimaPagina=1&buscaIndexada=1&mostrarPaginaSele-
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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5650/1/21171650.pdf. Acesso em: 2 nov. 2022.

132
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4
CLÁUSULAS ABUSIVAS EM CONTRATOS DE RELAÇÃO
DE CONSUMO E AFETAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO
ÂMBITO CONSUMERISTA

ABUSIVE CLAUSES IN CONSUMER RELATIONSHIP


CONTRACTS AND ALLOCATION TO THE PRINCIPLES
OF THE CONSUMER SCOPE

Isabelle Freitas Nascimento7


Alynne Jandayra Eliamen da Costa8

NASCIMENTO, Isabelle Freitas. Cláusulas abusivas em


contratos de relação de consumo e afetação aos princí-
pios do âmbito consumerista. Trabalho de Conclusão de
Curso de graduação em Direito – Centro Universitário UNI-
NORTE, Rio Branco, 2023.

7
Discente do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
8
Advogada. Docente do curso de Direito. Pós-Graduada em Advocacia
Trabalhista pela Universidade Anhanguera/SP. Pós-Graduada em Ciên-
cias Forense pela Uninorte/AC. Diretora-Geral Adjunta da Escola Superior
da Advocacia da OAB/AC.

133
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo trata das cláusulas abusivas em contratos


de relação de consumo e afetação aos princípios do âmbito
consumerista, com ênfase na sua evolução histórica e nos as-
pectos principiológicos formadores do código de defesa do
consumidor, com o objetivo de evidenciar o tema, visto que,
padece de discussão no seio dos operadores do Direito que
atuam no campo da ciência jurídica. Como aporte teórico pro-
cedeu-se uma análise histórica juntamente com uma pesquisa
dos conceitos, da construção e modificações introduzidas na
lei, da natureza jurídica e do papel realizado pelos princípios
envolta da sua colaboração nas relações consumeristas.
Nessa perspectiva, procedeu-se o estudo com base em pres-
supostos e conceitos do Direito do Consumidor, discorrendo
posicionamento de doutrinadores acerca desse instituto e de
sua relevância.

Palavras-chave: direito do consumidor; princípios; relação de


consumo; cláusulas abusivas.

134
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

This article deals with unfair terms in contracts of consumer


relations and their affectation on the principles of consume-
rism, with emphasis on its historical evolution and on the prin-
cipiological aspects of the consumer protection code, with the
aim of highlighting the issue, since it suffers from discussion
within the operators of law who work in the field of legal sci-
ence. As a theoretical contribution, a historical analysis was
carried out along with a research of the concepts, the construc-
tion and modifications introduced in the law, the legal nature
and the role played by the principles involved in their collabo-
ration in consumer relations. In this perspective, the study was
based on assumptions and concepts of Consumer Law, dis-
cussing the position of scholars about this institute and its re-
levance.

Keywords: consumer law; principles; consumer relationship;


abusive clauses.

135
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo aborda a importância dos aspectos princi-


piológicos acerca das cláusulas abusivas em contratos de re-
lação de consumo, mais detalhadamente o contexto histórico,
desde o começo da intensificação das relações de consumo
até a necessidade de uma elaboração de um código voltado a
esse objeto de estudo, relatando as cláusulas abusivas nes-
sas relações de consumo.
No Brasil, por ser um país subdesenvolvido a industri-
alização foi tardia, assim, a sua Revolução Industrial ocorreu
somente em 1930, culminando em uma intensificação nas re-
lações de consumo. Nesse contexto, com o aludido ocorrido
no ano de 1916 ocorreu a criação do código civil, que se ba-
seava em preceitos contratualistas liberais clássicos, que pre-
gava à autonomia da vontade e força dos contratos, mas não
acolhia questões relacionadas à tutela do hipossuficiente
como, por exemplo, a onerosidade excessiva, que eram exclu-
ídos.
Em 1972, por intermédio da Conferência Mundial do
Consumidor, em Estocolmo, fomentou-se a Comissão das Na-
ções Unidas sobre os Direitos do Homem, o que firmou a ide-
alização de alguns direitos fundamentais, com o objetivo de
ensejar a formulação de medidas geopolíticas com a finalidade
de garantir direitos básicos aos administrados, sendo um feito

136
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de suma importância, pois consolidou os direitos relativos à


seara consumerista à nível mundial.
O Código do Consumidor é considerado pela doutrina
de Almeida (2020) uma lei principiológica, formada por uma
série de princípios quem tem como principal fito garantir os di-
reitos aos consumidores, já que são as partes mais vulnerá-
veis na relação de consumo, com isso, os princípios têm a fun-
ção de impor deveres a serem seguidos pelos fornecedores, a
fim de estabelecer um equilíbrio permanente nas relações de
consumo.
Nesse sentido, o presente artigo pretende apresentar
por intermédio de pesquisas em revisões bibliográficas de
grade notabilidade jurídica nacional, como as cláusulas abusi-
vas em contratos da seara consumerista contrapõem, de
modo assíduo e pejorativo, os princípios concernentes ao Di-
reito do Consumidor.

4.1 BREVE APONTAMENTO HISTÓRICO DO DIREITO DO


CONSUMIDOR

Precipuamente, com o principal fito de endossar o as-


sunto a seguir delineado, faz-se mister consolidar um entendi-
mento histórico acerca do Direito que tutela as relações de
consumo, uma vez que ele versa sobre as normas concernen-
tes ao instituto jurídico das cláusulas abusivas.

137
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

É consabido que, sob o ponto de vista acadêmico e


doutrinário, compreender acerca dos mecanismos históricos
que contribuíram para com a formação de determinado insti-
tuto ou seara jurídica é, no mínimo, um exercício intelectivo de
suma importância, tendo em vista que promover qualquer tipo
de reflexão acerca dos processos que levaram e consubstan-
ciaram a criação das relações de consumo, acima de tudo,
forma um juízo de valor que acresce a tese delineada no pre-
sente trabalho acadêmico.
Entender, na essência, como se deu a formação histó-
rico-jurídica do tema em comento, incide em uma pesquisa ju-
rídica pautada em uma profundidade que agrega na comuni-
dade científica, haja vista que os mecanismos postos aos pes-
quisadores devem ser usados com responsabilidade e com a
primazia de inovar no campo de pesquisa, em especial, na se-
ara consumerista, tendo em vista que a norma principiológica
da vulnerabilidade irradia sobremaneira nos regramentos do
Código de Defesa do Consumidor.

4.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO CONSUMI-


DOR À NÍVEL MUNDIAL

Partindo para um contexto mundial no que diz respeito


à origem da intensificação das relações de consumo, a Revo-
lução Industrial se revela como um momento de considerável

138
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

relevância, haja vista que o aludido período contribuiu signifi-


cativamente para com o surgimento dos polos industriais e, de
modo solidificado, formou a ideia do capitalismo e o consu-
mismo desenfreado.
As significativas transformações provenientes da pri-
meira Revolução Industrial, além de modificarem o modo de
produção e as relações trabalhistas, consolidaram a formação
de novos empregos, com a criação de indústrias em grande
escala, o que incidiu em uma ascensão e aumento considerá-
vel dos consumidores e, por consequência, as relações de
consumo.
Neste sentido, Almeida (2020) relata que o modelo de
sociedade formado pela Revolução Industrial, reverberou em
produtores que se preocupavam com o atendimento das de-
mandas, que aumentaram em proporções consideráveis. En-
tretanto, a aludida preocupação só refletiu de forma superficial
nas relações de consumo, de modo que a qualidade dos ser-
viços fornecidos fora deixada para segundo plano, sendo certo
que a unilateralidade da produção – em que uma das partes,
doravante fornecedor, seria o responsável exclusivo por ditar
os caminhos da relação de consumo – preponderava.
Veja-se que, a inversão de valores concernentes à rea-
lização do serviço, originaram inúmeros problemas de con-

139
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sumo, uma vez que a prática de entregar um serviço, indepen-


dente da qualidade, causou significativos prejuízos ao consu-
midor. Todavia, mesmo diante de tantos óbices relacionados
à seara consumerista, o Direito vigente à época não era capaz
de solucionar efetivamente os conflitos oriundos de tais pro-
blemas.
Sendo assim, foi necessária a intervenção estatal, a fim
de elaborar e implementar legislações específicas, políticas
públicas e, sobremaneira, uma jurisdição especializada no
sentido de dirimir lides que versem sobre a defesa do consu-
midor no mundo.
A supramencionada intervenção de cunho estatal, se
revelou presente com a interferência de natureza legislativa,
em que foram criadas leis que protegeram os interesses do
consumidor. Em segundo plano, a administrativa, de modo a
implementar as leis criadas e, por fim, a intervenção do Es-
tado-juiz, com a apreciação das tutelas jurisdicionais concer-
nentes aos problemas de consumo.
A origem efetiva – no mundo – da manifestação jurídico-
política dos direitos do consumidor, segundo Miragem (2020),
se deu com o notável discurso consubstanciado pelo Presi-
dente à época dos Estados Unidos, John Kenedy, através do
Congresso norte-americano, em 1962, em que fora enunciada

140
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a necessidade de fomentar um protecionismo à parte mais vul-


nerável da relação de consumo, de modo a garantir aos con-
sumidores direitos básicos à segurança, informação, escolha
e, acima de tudo, dar razão e atenção aos problemas vivenci-
ados pelos mesmos. A partir do memorável discurso mencio-
nado, inúmeras leis concernentes à proteção da parte hipos-
suficiente da relação consumerista, nos Estados Unidos, em
meados dos anos 60, foram aprovadas.
Para além da situação histórica acima consignada, em
1972, por intermédio da Conferência Mundial do Consumidor,
em Estocolmo, fomentou-se a Comissão das Nações Unidas
sobre os Direitos do Homem, o que firmou a idealização de
alguns direitos fundamentais, que deveriam ser concedidos ao
consumidor, a saber, o Direito à segurança, informação sobre
os produtos e serviços, escolha de bens alternativos de quali-
dade satisfatória e, por fim, o direito de ser ouvido nos proces-
sos de decisão governamental, o que culminou na criação da
Carta Europeia de Proteção ao consumidor, sendo certo que
o preconizado momento histórico inspirou outros países, para,
no mesmo sentido, elaborarem e promulgarem leis com a
mesma finalidade.
Por fim e particularmente, Marques et al (2013, p. 32)
traz um outro momento histórico marcante para o Direito do
consumidor sob a perspectiva mundial, in verbis:

141
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A ONU (Organização das Nações Unidas), em


1985, estabeleceu diretrizes para esta legislação
e consolidou a ideia de que se trata de um direito
humano de nova geração (ou dimensão), um di-
reito social e econômico, um direito de igualdade
material do mais fraco, do leigo, do cidadão civil
nas suas relações privadas frente aos profissio-
nais, os empresários, as empresas, os fornece-
dores de produtos e serviços, que nesta posição
são experts, parceiros considerados “fortes” ou
em posição de poder (Machtposition)

Trata-se, portanto, de momento de suma importância


para com a consolidação dos direitos relativos à seara consu-
merista à nível mundial, uma vez que as mencionadas diretri-
zes, sob a égide da Organização das Nações Unidas, ganham
um palanque maior no tocante à extensão da influência do pro-
tecionismo ao consumidor, posto que a ONU, como organiza-
ção internacional, tem o principal fito de promover o desenvol-
vimento mundial e tornar linear a relação das nações, ense-
jando a formulação de medidas geopolíticas capazes de ga-
rantir direitos básicos aos administrados.
A partir dos marcos históricos acima dispostos, os Di-
reitos relativos à parte hipossuficiente, em relações de con-
sumo, ganharam força à nível mundial, inspirando a criação de
normativos jurídicos, leis e diretrizes, que orientavam e vincu-
lavam o comportamento dos consumidores e fornecedores a
uma garantia de direitos basilares.

142
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Neste sentido, o Brasil, como Estado-nação, inevitavel-


mente foi inspirado pelas significativas mudanças e inovações
no ordenamento jurídico relativas à seara do consumidor, o
que corroborou para com inúmeros marcos nacionais, os
quais, serão mais bem delineados no tópico a seguir.

4.1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO CONSUMI-


DOR NO CAMPO JURÍDICO BRASILEIRO

SOUZA (2018), de modo perfunctório, relata que o pro-


cesso histórico de evolução do direito do consumidor no Brasil
foi firmado de forma lenta, gradativa e demorada, isso porque,
como bem relacionado no tópico anterior, a Revolução Indus-
trial contribuiu, de maneira significativa, para com a intensifi-
cação das relações de consumo, o que originou a preocupa-
ção e necessidade de discussão acerca dos direitos do hipos-
suficiente, fazendo, desse modo, nascer inúmeras legislações
e diretrizes atinentes à seara do consumidor.
No Brasil -historicamente- a industrialização foi tardia,
culminando tão somente com o advento da Revolução de
1930, o que apenas intensificou as relações de consumo com
o aludido ocorrido. Além disso, o código civil consignado em
1916, irradiava preceitos contratualistas liberais clássicos, o

143
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que fortalecia os princípios concernentes à autonomia da von-


tade e força dos contratos, sendo certo que questões relacio-
nadas à tutela do hipossuficiente como, por exemplo, a onero-
sidade excessiva, não eram acolhidos.
Fato é que o preconizado clima insatisfazia os interes-
ses do consumidor, sabidamente porque estava desamparado
pela legislação vigente à época, mesmo quando entrava em
juízo requerendo a apreciação (por parte do judiciário) das tu-
telas jurisdicionais atinentes à problemas de consumo, sendo
que as primeiras aparições -tímidas- no escopo político rela-
tivo aos direitos do consumidor, foram a partir de 1970, onde
surgiram as primeiras associações que tutelavam os interes-
ses da parte hipossuficiente, como o Conselho de Defesa do
Consumidor, no Rio de Janeiro, em 1974, e o Procon, em São
Paulo, em 1976, entretanto, o efeito prático era, ainda, muito
pequeno diante das inúmeras problemáticas, que eram órfãs
de algum normativo jurídico correlato.
Somente, então, com o advento da Constituição Fede-
ral de 1988, doravante Constituição cidadã, que o Direito do
Consumidor ganhou proporções profundas no campo legisla-
tivo. Sobre o tema, Marques (2013, p. 33) et al relata o se-
guinte:

Note-se aqui a importância da Constituição bra-


sileira de 1988 ter reconhecido este novo sujeito

144
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de direitos, o consumidor, individual e coletivo, e


assegurado sua proteção constitucionalmente,
tanto como direito fundamental no art. 5. °, XXXII,
como princípio da ordem econômica nacional no
art. 170, V, da CF/1988. Em outras palavras, a
Constituição Federal de 1988 é a origem da co-
dificação tutelar dos consumidores no Brasil, pois
no art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias encontra-se o mandamento (Gebot)
para que o legislador ordinário estabelecesse um
Código de Defesa e Proteção do Consumidor, o
que aconteceu em 1990. É a Lei 8.078, de 1990,
que aqui será chamada de Código de Defesa do
Consumidor e abreviada por CDC.

Posto isto, é possível depreender que a Carta Magna


de 1988 foi o grande propulsor da criação Código de Defesa
do Consumidor, uma vez que o artigo 48 das Disposições Fi-
nais e Transitórias da CF, de modo categórico, determinava,
no prazo de cento e vinte dias, a criação de um código do con-
sumidor.
Ocorre que, a Lei n° 8.078, doravante CDC, foi apenas
instituída em 1990, se revelando como uma norma predomi-
nantemente principiológica, de ordem pública, que tipicamente
fornecia um protecionismo ao hipossuficiente, conforme en-
tendimento de Miragem (2020, p. 25):

No Brasil, o Código de Defesa do Consumidor vai


ser promulgado em princípio dos anos 90, cum-
prindo a determinação constitucional específica
sobre o tema (artigo 48, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias). Estabelece normas
declaradamente de ordem pública (artigo 1º),

145
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

conferindo-lhes efetividade através da atribuição


de competência jurisdicional cível, criminal e ad-
ministrativa a diversos órgãos do Estado, assim
como reconhece papel de destaque à auto-orga-
nização da sociedade civil, por intermédio das
associações de consumidores e demais entida-
des de defesa do consumidor.

Veja-se que, apesar de tardia, fora criada uma legisla-


ção que visa, de modo inequívoco, tutelar o interesse do vul-
nerável em relações de consumo, de modo que a aludida
norma se revela como um interessante modo de consolidar a
justiça social e atender, mesmo que de forma indireta, à prin-
cípios basilares do ordenamento jurídico, sobretudo os mag-
nânimos dispositivos de cunho constitucional, servindo de ins-
piração para legislações estrangeiras que, à época, ainda não
tinham firmado a codificação de dispositivos de leis atinentes
ao Direito do consumidor.

4.2 BREVES APONTAMENTOS ACERCA DOS ASPECTOS


PRINCIPIOLÓGICOS NORTEADORES DO CÓDIGO DE DE-
FESA DO CONSUMIDOR

4.2.1 O DIREITO DO CONSUMIDOR COMO UMA NORMA


PRINCIPIOLÓGICA

Primeiramente, no que diz respeito ao Direito do Con-


sumidor, como uma norma de natureza principiológica, faz-se

146
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

necessário preconizar que os princípios, como normativos no


ordenamento jurídico brasileiro, exercem relevância e influên-
cia demasiada, tendo em vista que conduzem o direito e se
revelam como valores fundamentais para com a aplicação da
norma jurídica.
Desta forma, é consabido que o CDC é, em sua essên-
cia, uma norma que irradia sobremaneira princípios, conso-
ante entendimento Souza (2018), ao relatar que a principiolo-
gia da Lei n° 8.078 de 1990 é inequívoca, uma vez que a alu-
dida tem a primazia de efetivar-se no plano infraconstitucional,
haja vista que fora criada uma estrutura jurídica multidiscipli-
nar, que tem a capacidade de interagir e exercer influência em
áreas correlatas ao Direito do Consumidor, isso porque a refe-
rida norma se alicerça em valores fundamentais, razão pela
qual está instituída, no bojo da mesma, a Política Nacional das
Relações de Consumo e outras medidas similares, de cunho
legislativo.
A doutrina de Almeida (2020) coaduna com o exposto,
uma vez que o referido doutrinador relata que o Código da se-
ara consumerista, como uma lei principiológica, constitui uma
série de princípios que têm o principal fito de conferir direitos
aos consumidores, que inevitavelmente são a parte mais vul-
nerável da relação, o que incide em imposições sérias e cate-
góricas de deveres aos fornecedores, a fim de estabelecer um
equilíbrio permanente nas relações de consumo.

147
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Tartuce e Neves (2021) prelecionam, ainda, que a Lei


nº 8.078 de 1990 fornece proteção constitucional aos hipossu-
ficientes, o que apenas reforça o caráter paternalista e princi-
piológico da preconizada legislação. Os dispositivos da
mesma possuem a característica de promover a ordem pública
e o interesse social, os princípios consubstanciados têm deve-
ras influência e são supervalorizados, ao passo que as leis es-
peciais setorizadas devem, sobremaneira, obediência e sub-
missão aos princípios e regramentos fundamentais, consigna-
dos no Código de Defesa do consumidor.
Observa-se que, considerando o caráter principiológico
da legislação em discussão, é possível depreender que os
princípios, além da considerável extensão dos seus efeitos e
a importância que exercem, de forma generalizada, no orde-
namento jurídico brasileiro, quando direcionados para com a
seara do consumidor, ganham ainda mais força, diante de li-
des de natureza consumerista ou situações que causem um
certo reflexo nas relações de consumo.

4.2.2 APONTAMENTOS PERFUNCTÓRIOS ACERCA DOS


PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO CONSUMIDOR.

Em um primeiro momento, antes de trazer um breve re-


lato acerca dos princípios formadores do Direito do consumi-
dor, faz-se mister sedimentar a ideia do que é, para o Direito,

148
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

um princípio. Sobre o tema, Filho (2019, p. 53) relata o se-


guinte:

Princípio etimologicamente quer dizer início, co-


meço, ponto de partida de alguma coisa. Do
ponto de vista jurídico não foge desse sentido.
Pelos princípios se inicia a análise do ordena-
mento jurídico e se afere para onde ele se nor-
teia. E na base da ordem jurídica, bem no seu
início, estão os valores éticos e morais abrigados
no ordenamento jurídico, compartilhados por
toda a comunidade em dado momento e em
dado lugar, como a liberdade, a igualdade, a so-
lidariedade, a dignidade da pessoa humana, a
boa-fé e outros tantos.

Destarte, enxerga-se que os princípios se revelam


como fontes de orientação interpretativa das normas, de tal
modo que exercem papel relevante suprimindo as lacunas dos
regramentos jurídicos, sobretudo agem no ensejo de dar uni-
dade, coerência e integram o sistema normativo. Logo, em-
bora os supramencionados exerçam fundamental importância
auxiliando os operadores do Direito na interpretação da
norma, a área consumerista é considerada pela doutrina ma-
joritária como um campo jurídico em que os princípios pos-
suem uma considerável presença e relevância, motivo pelo
qual a doutrina a denomina como lei principiológica, consoante
delineado no tópico anterior.

149
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

À vista disso, é possível expressar que investigar os as-


pectos principiológicos do âmbito consumerista implica em es-
tudos a respeito do arcabouço jurídico que protege o interesse
do hipossuficiente, de modo que viabilizar qualquer medida
neste sentido incide em um ato de insigne notabilidade, tendo
em vista que o Código do Consumidor é uma norma de inte-
resse social.
Desse modo, diante da importância do estudo dos prin-
cípios, faz-se necessário particularizar o aludido tema, para
com as relações de consumo e, assim, de modo perfunctório,
aperfeiçoar o presente trabalho acadêmico do ponto de vista
jurídico-doutrinário, sendo certo que o principal objetivo não é
de esgotar a aludida temática, mas sim consubstanciar quais
são os princípios que orientam o Código de defesa do hipos-
suficiente.
Um dos princípios que merece grande notabilidade é o
do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, isso
porque, conforme entendimento de Souza (2018), o referido
princípio é a própria essência do sistema de proteção, que
nele justamente se apoia. O artigo 4° da Lei n° 8.078, de 1990,
é categórico ao mencionar que o a Política Nacional de Rela-
ções de Consumo tem por um dos objetivos o reconhecimento
da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.

150
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A vulnerabilidade está apoiada na ideia de que as par-


tes, na relação de consumo, são desiguais. Trata-se, portanto,
de situação inerente aos consumidores, uma marca registrada
e uma presunção absoluta, o que acaba por justificar a adoção
das regras protetivas que o Código elenca.
Veja-se que o referido contexto desigual que o consu-
midor vivencia, manifesta-se no plano fático, o que decorre na-
turalmente da maior capacidade econômica e social dos agen-
tes envolvidos no mercado de consumo. Há, em segundo
plano, a vulnerabilidade técnica, que impede que o consumi-
dor tenha acesso às informações sobre o produto ou o serviço
que pretende adquirir. Por fim, há a vulnerabilidade jurídica,
representada pelo pouco conhecimento dos direitos do consu-
midor, e dos mecanismos para defendê-los. Em resumo, o
consumidor sempre estará em situação de desigualdade, ra-
zão pela qual o CDC, por intermédio de seus regramentos,
visa reestabelecer e corrigir essa relação fragilizada.
O segundo princípio, que merece a atenção da pre-
sente pesquisa, é a boa-fé objetiva, que se revela como um
dos pilares na construção dos imperativos de conduta que vi-
sam tutelar o interesse do vulnerável, sobretudo no âmbito dos
contratos. Neste sentido, Brito (2018) faz a distinção entre
boa-fé objetiva e subjetiva, sendo que a primeira diz respeito

151
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aos atos que devem traduzir os bons costumes, lealdade, res-


peito, sobretudo denotam o senso ínsito da conduta benévola
que os contratantes devem possuir. Por outro lado, a boa-fé
subjetiva é o sentimento pessoal e interno de que existe uma
observância a lei. À vista disso, Filho e Andreo (2015, p. 88)
revelam o seguinte sobre a boa-fé objetiva:

Podemos concluir que a boa-fé objetiva visa ga-


rantir a lisura e moralidade nos contratos de con-
sumo, sendo que o fornecedor deve sempre to-
mar precauções para nunca lesar seu consumi-
dor, realizando aprimoramentos para alcançar
essa meta, pois em caso de dano ao consumidor
esse estará agindo sem a referida boa-fé obje-
tiva, principalmente, quando inclui em seu con-
trato de adesão cláusula manifestamente desfa-
vorável e abusiva ao consumidor.

Nesta perspectiva, é possível exprimir que a boa-fé ob-


jetiva é deveras relevante para com os contratantes que estão
em uma relação de consumo, isso porque o referido princípio
compele às partes a necessidade e obrigatoriedade de agir em
conformidade com os valores éticos e morais vigentes na so-
ciedade, sendo por excelência uma norma que evita prejudicar
sobretudo a parte vulnerável da relação consumerista. Além
disso, no intento de proteger as relações contratuais no âmbito
consumerista, é possível invocar o princípio da transparência
contratual. Almeida (2020, p. 448), desse modo, preceitua so-
bre o supracitado, veja-se:

152
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A disciplina referente ao princípio da transparên-


cia contratual consta do teor do art. 46 da Lei n.
8.078/90, segundo o qual os “contratos que regu-
lam as relações de consumo não obrigarão os
consumidores, se não lhes for dada a oportuni-
dade de tomar conhecimento prévio de seu con-
teúdo, ou se os respectivos instrumentos forem
redigidos de modo a dificultar a compreensão de
seu sentido e alcance”. Com efeito, não basta dar
a oportunidade ao consumidor de ter acesso for-
mal ao contrato. O princípio em comento exige a
necessidade do acesso material, efetivo e real do
objeto contratual, isto é, que o contrato deve ser
redigido de tal forma que o consumidor ao lê-lo
será capaz de compreender o seu conteúdo.

Desse modo, nota-se que o princípio da transparência


contratual age no sentido de dar maior clareza aos dispositivos
descritos em sede de contrato. Logo, a desobediência ao re-
ferido normativo implica em cláusula abusiva, tendo em vista
que o contrato precisa refletir em um pacto que não seja pre-
judicial a nenhuma das partes. Isto é, quando existe dificul-
dade do entendimento, por parte do hipossuficiente, em rela-
ção às cláusulas contratuais, o que prejudica o sentido e o al-
cance, configura-se um ato que contraria os dispositivos le-
gais, sobretudo o imperativo principiológico da transparência
contratual, incidindo por consequência cláusula abusiva.
Para além dos princípios trazidos ao escopo do pre-
sente artigo científico, sobreleva discutir acerca da norma prin-
cipiológica da confiança, isso porque, conforme Filho (2019),

153
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

trata-se de uma irradiação normativa da boa-fé e está umbili-


calmente interligada com o princípio da transparência. Veja-se
que a confiança só prepondera nas relações de consumo,
caso a boa-fé esteja presente e reverberando seus imperati-
vos de conduta.
Neste sentido, percebe-se que o princípio em destaque,
como a etimologia da própria palavra sugere, remonta a ideia
de que a credibilidade do consumidor para com o produto ou
vínculo da relação contratual é o meio pelo qual alcançar-se-á
o equilíbrio e bons resultados nas relações de consumo, trata-
se, portanto, da lealdade e respeito entre o fornecedor e con-
sumidor, que corrobora para com o bom funcionamento da se-
ara atinente ao vulnerável que está na cadeia consumista.
Há, ainda, o princípio da função social dos contratos,
que consoante entendimento de Tartuce e Neves (2021), é um
reflexo da maneira como os contratos foram se amoldando
com o passar dos anos, uma vez que a preponderância do
capital e seus efeitos, modificaram sobremaneira a maneira
como os pactos são analisados, principalmente os concernen-
tes às relações de consumo, o que culminou na inevitável mi-
tigação do pacta sunt servanda, a fim de colaborar com a fun-
ção social dos contratos.
Veja-se que, em breves palavras, a função social em
contratos de relação consumerista, é a tentativa permissiva –

154
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

notadamente observada em outros princípios – de equilibrar


uma situação que sempre foi díspar, em que o consumidor
sempre foi vítima das abusividades da outra parte da relação
de consumo, em completa concordância com a essência do
Código de Defesa do Consumidor, que é a de, por intermédio
de seu caráter inequivocamente principiológico, dar importân-
cia e relevância aos problemas de consumo que, por muitas
décadas, foram ignorados pelo ordenamento jurídico brasi-
leiro.
Por fim e particularmente, em relação aos princípios –
gerais- orientadores do Código da área consumerista, con-
signa-se acerca dos princípios da informação e da segurança.
O primeiro, conforme Souza (2018), diz respeito a uma decor-
rência da boa-fé e, a consequência inevitável do princípio da
transparência, haja vista que tem o objetivo primordial de miti-
gar a vulnerabilidade técnica do consumidor.
Ao passo que visa trazer informações claras, concisas
e objetivas acerca dos produtos ou serviços, o que está intrin-
secamente relacionado com a publicidade e o fornecimento de
uma informação suficientemente precisa, em língua portu-
guesa, sendo reprimida a ideia de fornecimento dos elementos
sobre o produto ou serviço, de modo inadequado ou incom-
pleta, sendo tal ato equiparado à vício do produto ou do ser-
viço, gerando responsabilidade civil do fornecedor.

155
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Já o segundo -princípio da segurança – é o impedi-


mento que o Código de Defesa do Consumidor consolida
acerca dos produtos ou serviços defeituosos e perigosos,
sendo totalmente rechaçado pelo mesmo, uma vez que trazem
risco inerente. Veja-se que o direito à vida, à saúde e integri-
dade física e moral constitui hoje direito da personalidade, a
merecer proteção especial, pelo que são absolutos, irrenunci-
áveis, inalienáveis, impenhoráveis e imprescritíveis e, a bem
da verdade, a primazia do discutido princípio é firmar os aludi-
dos direitos, que inclusive estão colacionados na Carta Magna
de 1988.
Os princípios mencionados, de modo categórico, visam
trazer e dar razão ao consumidor, que por muito tempo sofreu
à luz dos princípios e regramentos vigentes à época, que não
corroboravam com o princípio constitucional da isonomia. Ob-
serva-se que é uma evolução jurídica considerável, ao passo
que o reconhecimento da vulnerabilidade, por si só, já conso-
lidou uma série de direitos à parte mais vulnerável das rela-
ções de consumo, os demais regramentos principiológicos, de
modo complementar, buscam sobremaneira equilibrar a as re-
lações consumeristas, sendo a discutida lei, sem sombra de
dúvidas, eivada de interesse social e reúne princípios forte-
mente capazes de superar os vícios provenientes de um orde-
namento jurídico falho.

156
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4.3. BREVE RELATO SOBRE AS CLÁUSULAS ABUSIVAS


EM RELAÇÕES DE CONSUMO

4.3.1 CONCEITO DE CLÁUSULA ABUSIVA EM CONTRA-


TOS DE RELAÇÕES DE CONSUMO

É consabido que as relações de consumo, que albergam


inúmeros princípios e regramentos, dispostos pelo próprio Có-
digo de Defesa do Consumidor, inevitavelmente discutirá
acerca das cláusulas abusivas em relações de consumo, um
dos assuntos mais relevantes da área. Sobre o tema, Tartuce
e Amorim (2021) prelecionam que o artigo 51 da Lei de n°
8.078/1990 estabelece um rol do tipo exemplificativo em se
tratando das cláusulas abusivas. Os referenciados célebres ju-
ristas expressam que se trata de um conceito moderno, à me-
dida em que substitui um termo arcaico pertencente ao Direito
Romano, o qual denominava-se “cláusula leonina”.
À vista disso, a abusividade em sede de contratos se
revela pelos atos que denegam a boa-fé, são situações de
abuso de Direito contratual observadas em cláusulas pontuais.
Importante notar, desse modo, que o consolidado ato incide
em nulidade absoluta, bem como o reconhecimento do dever
de reparar, isto é, gera-se um sistema de responsabilidade ci-
vil para com o fornecedor ou prestador de serviço.

157
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ademais, conforme Miragem (2020), notável doutrina-


dor da Seara Consumerista, a abusividade pertencente aos
Contratos que estão sob a égide da Lei de n° 8.078 de 1990,
são aquelas que geram desequilíbrio, de modo a prejudicar a
parte hipossuficiente. Há, desse modo, uma diferenciação
conceitual em se tratando do abuso no âmbito cível e o do Di-
reito do Consumidor, de modo que não se confundem. O pri-
meiro remonta às violações sofridas nos limites estipulados no
artigo 187 do Código Civil Brasileiro ou, até, mesmo antes da
nova lei, por contrariar veemente a boa-fé.
O abuso de Direito nas relações de consumo, todavia,
está adstrito a alguns requisitos essenciais para que seja iden-
tificado, como o status perante à Carta Magna do consumidor
diante dos Direitos fundamentais, bem como a vulnerabilidade
que está intrinsecamente consignada ao consumidor.
Além disso, é entendimento de Almeida (2020), que
toda cláusula contratual que tiver por fito dar superioridade ao
fornecedor em detrimento do consumidor, de modo a ofender
a vulnerabilidade, considerar-se-á como cláusula abusiva,
mesmo que não esteja disposto e consignado no rol - exem-
plificativo- do artigo 51 da Lei, tendo em vista que o conceito
genérico de abusividade no contexto acima discutido, fora rei-
teradamente discutido e evidenciado pela douta doutrina.

158
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Além disso, Júnior (2017, p. 255), relata que as cláusu-


las abusivas, quando praticadas, incidem em nulidade. Veja-
se o que o referido doutrinador preleciona sobre, in verbis:

As nulidades das cláusulas abusivas não são


algo que se possa singelamente avaliar apenas
pela interpretação da literalidade da norma legal.
Envolve sempre o contexto fático e sistemático
do negócio jurídico, tema que se não aconselha
resolver isoladamente pelo juiz. Esclarecimentos
de ambos os litigantes são preciosos e interes-
ses até mesmo do consumidor podem, eventual-
mente, justificar a cláusula que, à primeira vista,
o juiz teve como abusiva. Essa característica es-
pecial da nulidade dentro da relação consume-
rista, portanto, justifica o tratamento cauteloso
com que o STJ vem se orientando quanto à ma-
téria, ao estabelecer que a iniciativa da decreta-
ção da nulidade das cláusulas abusivas, embora
relacionada como matéria de ordem pública, não
deva ser deliberada sem prévia manifestação da
parte interessada.

Sendo assim, observa-se que a prática da abusividade


implica em um ato que contraria, de modo conciso, a boa-fé, o
que reverbera por consequência em nulidade. Entretanto, é
cediço na doutrina e na jurisprudência que para a existência
de julgamento justo e eficaz, faz-se necessário considerar as
especificidades do caso concreto.
Além disso, mesmo se tratando de norma de ordem pú-
blica, há a necessidade de uma anterior postulação da parte
interessada, mas não necessita ter a disposição expressa do

159
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ato, na forma da lei, para considerar como abusiva uma cláu-


sula contratual, sendo tão somente necessário estar em desa-
cordo com os ínsitos imperativos de conduta concernentes à
boa-fé, confiança, vulnerabilidade e correlatos.

4.3.2 EXEMPLOS PONTUAIS DE CLÁUSULAS ABUSIVAS À


LUZ DO ROL EXEMPLIFICATIVO DISPOSTO NO ARTIGO
51 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Diante do disposto em tópico anterior, percebe-se que


a incidência em cláusula abusivas, nos contratos de relação
de consumo, não está subordinado ao rol consolidado no ar-
tigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, sendo o mesmo
tão somente um rol do tipo exemplificativo, ou seja, toda a
cláusula que contrariar os princípios, em especial, a boa-fé,
vulnerabilidade, confiança, estará em total desacordo com a
essência do Código em comento, sendo certo que considerar-
se-á como abusiva.
Dessa maneira, muito embora não seja necessário
compreender, de modo detalhado, acerca do rol disposto na
Lei n° 8.078, faz-se necessário, a título de pesquisa cientifica,
trazer à baila alguns exemplos pontuais, a fim de corroborar
para com o bojo do presente trabalho, haja vista que são situ-
ações que estão descritas em lei, ou seja, são o reflexo do

160
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

entendimento legislativo da predominância de tais vícios na


sociedade brasileira.
Tartuce e Neves (2021), de modo científico, relatam
acerca do rol exemplificativo, relatando que há a vedação de
cláusula de irresponsabilidade para os contratos de consumo,
sendo, tal prática, nula de pleno direito. Um exemplo dessa
vedação seria a hipótese de um frequentador de academias
assina um termo de autorresponsabilidade, não se pode afas-
tar total ou parcialmente a responsabilidade da prestadora por
força do contrato.
Além disso, há a vedação às Cláusulas que subtraiam
ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, em
total respeito ao princípio da ilicitude do enriquecimento sem
causa, bem como situações que transfiram algum tipo de res-
ponsabilidade a terceiros, uma vez que afasta a ideia de risco-
proveito consagrado pelo CDC, sendo nula de pleno direito.
Por fim, cita-se que há o rechace às cláusulas que es-
tabelecerem obrigações iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou que sejam in-
compatíveis com a boa-fé ou a equidade. Tal medida, dessa
maneira, consolida um sistema totalmente aberto, que pode
englobar uma série de situações, em especial pelas menções
à boa-fé e à equidade.

161
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sendo assim, como já mencionado, trata-se de rol me-


ramente exemplificativo, consoante entendimento pacífico da
doutrina e jurisprudência, sendo, portanto, abusiva, toda a
cláusula que contrarie a boa-fé ou desabone algum princípio
orientador do Código de Defesa do consumidor.
Os exemplos pontuais acima consignados, apenas re-
forçam a ideia de mitigação da força obrigatória dos acordos,
doravante pacta sunt servanda, mas esse padecimento dessa
norma é para a redução substancial da desigualdade obser-
vada entre os consumidores e fornecedores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em síntese, é possível concluir que consolidar esfor-


ços com o principal fito de promover estudos a respeito das
cláusulas abusivas nas relações consumeristas é, de modo
inequívoco, demasiadamente relevante, uma vez que a refe-
renciada discussão científico-jurídica teve por primazia averi-
guar como o campo principiológico concernente ao Direito do
Consumidor é afetado por cláusulas no seio dos contratos que
incidem, de modo a lesar a parte hipossuficiente, a qual é ob-
jeto de proteção do Código do Consumidor.

162
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Consigna-se que o tema em evidência é pouco discu-


tido no âmbito científico, o que denota uma grande necessi-
dade de pesquisa científica no sentido de investigar, de modo
assíduo, acerca das cláusulas contratuais abusivas e, por con-
sequência, os princípios rechaçados em decorrência da pro-
blemática supra apresentada. Logo, não restam dúvidas se-
não dizer que o exercício acadêmico aqui consolidado foi ex-
tremamente notável, sobretudo necessário, tendo em vista
que padece de discussão no seio dos operadores do Direito
que atuam no campo da ciência jurídica.
Sendo assim, percebe-se que o Direito do consumidor
é uma norma principiológica, ou seja, existem inúmeros prin-
cípios que formam e constituem o Código de Defesa do Con-
sumidor, sendo pertencentes à sua essência, com o objetivo
maior de conferir direitos aos consumidores, que inevitavel-
mente são a parte mais vulnerável da relação, ou seja, eles
primam por rechaçar qualquer tipo de abuso de direito que de-
sequilibre a relação entre fornecedor e consumidor.
Diante da especificidade da norma em evidência, no
que pese essa situação irradiar sobremaneira em sua essên-
cia, que é umbilicalmente relacionada aos princípios existen-
tes, a conclusão é a de que todos os princípios, direta ou indi-
retamente, são afetados, em razão da natureza principiológica
da Lei nº 8.078.

163
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ocorre que, alguns princípios são mais afetados do


que outros, uma vez que incidência das cláusulas abusivas
depende de um rol meramente exemplificativo disposto em
Lei, mas que não exclui outras possibilidades não configura-
das no mesmo, o que denota uma amplitude acerca do seu
alcance, desde que se adeque aos requisitos ínsitos dispostos
na jurisprudência e doutrina.
Logo, é possível depreender que muito embora a mai-
oria dos princípios vigentes nas normas do Código de Defesa
do Consumidor sejam atingidas pela prática de abusividade
nos contratos em relações de consumo, a boa-fé objetiva, prin-
cípio da transparência contratual e o princípio da informação,
são afetados com maior perniciosidade, de modo que especi-
ficamente remontam aos aspectos contratuais evidentemente
relacionados e lidam diretamente com as relações de con-
sumo e as abusividades provenientes das cláusulas abusivas
de ordem contratual.

REFERÊNCIAS

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BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumi-
dor. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribu-
nais, 2013, p. 30

164
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ALMEIDA, Fabrício Bolzan de. Direito do Consumidor. 8ª.


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FILOMENO, José Geraldo Brito. Direitos do consumidor.


15ª. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Atlas, 2018. v. Único.

JÚNIOR, Humberto Theodoro. Direitos do Consumidor. 10ª.


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nual de Direito do Consumidor. 10ª. ed. rev. atual. e aum.
Rio de Janeiro - RJ: Forense; Método, 2021. v. Único.

SOUZA, Sylvio Capanema et al. Direito do Consumidor. [S.


l.: s. n.], 2018.

FILHO, Sergio Cavaliei. Programa de Direito do consumi-


dor. [S. l.: s. n.], 2019.

165
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5
DIREITO Á VIDA
VERSUS EUTANÁSIA

RIGHT TO LIFE
VERSUS EUTHANASIA

Nathalin Krishna Rocha de Assunção9


Alynne Jandayra Eliamen da Costa10

ASSUNÇÃO, Nathalin Krishna Rocha. Direito a Vida versus


Eutanásia. Trabalho de Conclusão de Curso de graduação
em Direito – Centro Universitário UNINORTE. Rio Branco,
2023.

9
Discente do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
10
Graduada em Direito pela Faculdade Barão do Rio Branco (Acre). Pós-
graduada em Ciências Forenses pela Uninorte - Acre e em Advocacia Tra-
balhista pela Universidade Anhanguera - São Paulo. Diretora-Geral Ad-
junta da Escola Superior da Advocacia da OAB/AC.

166
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O direito à vida é inviolável, ninguém pode privar a vida arbitraria-


mente, e deve ser investigado por responsabilidade criminal de
acordo com a lei. Essa inviolabilidade é garantida na Constituição
Federal e no Código Penal como direito fundamental e prevê san-
ções aos indivíduos que a violarem. No entanto, o Código Penal está
em processo de revisão e, na visão de alguns estudiosos, essa in-
violabilidade está sendo ameaçada na redação de seus anteproje-
tos, pois prevê a exclusão da ilegalidade dos indivíduos que prati-
cam a eutanásia. As opiniões sobre essa prática são provocativas,
polêmicas, muito antigas e polarizaram as opiniões de estudiosos
respeitados a favor e contra. Assim, este artigo busca lançar con-
cepções sobre a eutanásia no projeto de código penal e sua relação
com a Constituição Federal, no que diz respeito aos direitos e ga-
rantias fundamentais, em especial o direito à vida.

Palavras-Chave: direito; inviolabilidade; vida

ABSTRACT

The right to life is inviolable; no one can arbitrarily deprive someone


of life, and it must be investigated for criminal liability according to
the law. This inviolability is guaranteed in the Federal Constitution
and the Penal Code as a fundamental right, and it imposes sanctions
on individuals who violate it. However, the Penal Code is undergoing
a revision process, and according to some scholars, this inviolability
is being threatened in the wording of its draft proposals, as it includes
the exclusion of unlawfulness for individuals who practice euthana-
sia. Opinions on this practice are provocative, controversial, and
have a long history, polarizing the views of respected scholars who
are both in favor and against it. Thus, this article aims to present
different perspectives on euthanasia in the draft Penal Code and its
relationship with the Federal Constitution concerning fundamental
rights and guarantees, particularly the right to life.

Keywords: right; inviolability; life.

167
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Com base na constituição Federal de 1988, em seu ar-


tigo 5º, onde se presumem deveres individuais e coletivos, o
direito à vida é aquele que deve ser outorgado em relação ao
direito de nascer, ao direito de permanecer vivo e ao direito de
cumprir uma vida. Portanto, essa questão implica o questiona-
mento do direito mais importante do ser humano, que é o di-
reito à vida que está consagrado constitucionalmente, pois
consiste no direito à sobrevivência, à defesa da própria vida e
à busca de meios para se manter vivo com vida, com saúde e
dignidade, impedindo sua interrupção por qualquer meio que
não seja a morte natural e inevitável. O direito à vida é inviolá-
vel, ninguém pode ser arbitrariamente privado da vida sob a
ameaça de responsabilidade criminal.
Essa imunidade é garantida na Constituição Federal,
que a consagra como direito fundamental, e no Código Penal,
que prescreve penas para quem descumprir esse direito. A
eutanásia sempre foi um assunto polêmico e tabu associado à
prática, porque foi colocado por religiões cristãs e juristas, que
sempre a criticaram, por violar os direitos humanos. Visto seu
método, é sendo considerado por alguns como uma forma ter-
rível de acabar com a vida, pois é entendido como uma forma
de morte ingrata e tratado como desrespeitoso para com aque-

168
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

les que lhe deram a vida e, claro, como um hábito que desa-
grada a Deus e aos seres religiosos.
Por outro lado, não pode ser analisado como uma forma
ingrata de morrer, mas sim como uma forma de acabar com a
dor que aflige a quem convive com o sofrimento diário de
quem sofre de uma doença incurável e se encontra na situa-
ção de impossibilidade de desfrutar de uma vida plena, para
acabar com algo que sempre atrapalha a vida de uma pessoa,
seja uma doença incurável ou uma deficiência crônica. Em re-
lação ao posicionamento da lei brasileira sobre a eutanásia,
essa prática é considerada crime em nosso ordenamento jurí-
dico.
Mas há especialistas que criam a necessidade de ava-
liar esse crime e reexaminar os conceitos de dignidade da pes-
soa humana, sabendo o quanto esse princípio deixa o bem-
estar humano necessário, diante de uma situação dramática
em sua vida, onde tem uma doença ou 2 lesões que o incapa-
cita e até o mantém em estado vegetativo, decide se quer so-
breviver. A Constituição Federal trata do direito à vida sob o
título “Direitos e Garantias Fundamentais” e é consagrado
como um direito fundamental, pois dele decorrem todos os de-
mais direitos. É guiado pelos princípios constitucionais da in-
violabilidade e irreversibilidade, ou seja, que o direito à vida

169
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

não pode ser violado sob a ameaça de responsabilidade cri-


minal, e uma pessoa não pode renunciar a esse direito e pedir
sua morte.
O papel do Estado é garantir o direito à vida, e não se
trata apenas de permanecer vivo, mas dos meios de viver uma
vida valiosa. Por mais que o ordenamento pretende proteger
o ser humano de um suicídio que ultrapassa os valores sociais
e pretende defender o maior bem que alguém pode ter que é
a vida, o Estado leva em conta a opinião de alguém que pre-
tende acabar com sua vida de forma indolor e sem nenhum
tipo de sofrimento? O objetivo é analisar se viola o direito à
vida, e como isso afeta o princípio da dignidade da pessoa hu-
mana, que visa o uso adequado da eutanásia.

5.1 EUTANÁSIA E SEU RIGOR CONCEITUAL

A eutanásia inclui o mais alto direito humano, que é o


direito à vida previsto na constituição. Este, por sua vez, con-
siste no direito de sobreviver, de proteger a vida, de encontrar
meios de sobreviver com saúde e dignidade. A eutanásia está
consagrada em muitas legislações e éticas médicas vigentes
em todo o mundo e inclui a prática da morte com o objetivo

170
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de aliviar o sofrimento do paciente e de seus familiares, con-


siderando sua morte iminente e condição medicamente incu-
rável.
A palavra EUTANÁSIA é de origem grega (euthana-
tos). Em sua escrita, é possível dividi-la em duas partes: “eu”,
que significa bom, e “thanatos”, que significa morrer. Em tra-
dução livre, pode-se dizer "bom morrer" (RODRIGUES,
1993). Esta nomenclatura foi introduzida no século XVII
(1963) por Francis Bacon (filósofo nacionalidade britânica) em
sua obra "História Vitae Et Mortis". A partir de então, Bacon
começou a resguardar a ideia de que, o médico poderia en-
curtar a dor do paciente, que se encontrasse com enfermi-
dade incurável ou seja situações onde não há cura, todavia,
a morte deve ser dada de forma digna e indolor.
O conceito clássico de eutanásia é "tirar a vida de uma
pessoa por razões humanitárias" para um indivíduo ou socie-
dade (deficiente, idoso, incurável etc.). Da mesma forma, Ro-
xin (2008, p. 189) descreve a eutanásia como: “assistências
prestadas a uma pessoa gravemente doente a seu pedido, ou
pelo menos. Com base em sua suposta vontade, para que
morram de forma consistente com seu entendimento do ho-
mem dignidade". Quem defende uma morte justa entende que
o paciente deve estar em uma situação em que o tratamento
não é possível, ele deve estar na fase final (FRANÇA, 2003).

171
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A eutanásia é entendida principalmente como misericórdia.


Quem o pratica, ainda que o possa fazer com violência, acaba
com o sofrimento do doente, cujo sofrimento já não pode su-
portar, e pede o fim do seu estado de sofrimento. Nesse con-
texto, deve-se ressaltar que o homicídio privilegiado é típico
quando a pena é reduzida pelo valor moral correspondente
(BITENCOURT, 2003).
A eutanásia, uma boa morte, é o oposto da mistanásia,
que significa uma morte infeliz. Aquela pode ser classificada
por tipo de ato ou tipo de consentimento: a) Por ação, aquela
analisada pelo ponto de vista da ação medica, contendo as
espécies de “Ativa, Passiva e Duplo Efeito”, visto que a ,Eu-
tanásia ativa: o agente pratica atos a fim de abreviar o sofri-
mento de um paciente terminal; Eutanásia passiva ou indireta:
o paciente terminal vem a óbito por inação médica ou inter-
rupção de procedimento com o intuito de minimizar o sofri-
mento; Eutanásia de duplo efeito: o paciente terminal morre
em decorrência de procedimento médico para aliviar o sofri-
mento. Vale dizer, a finalidade do ato não é matar, mas sim
aliviar a dor, porém, indiretamente, ocorre o óbito. b) Por con-
sentimento aquela que é de acordo com a vontade do paci-
ente, onde o próprio paciente que toma á decisão e pede a
morte, pessoalmente ou por meio de documento que deixou
por escrito, sendo subdividas nas espécies de “Voluntaria e

172
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Involuntária”, a Eutanásia voluntária: provoca-se a morte a


pedido do paciente; já à Eutanásia involuntária: provoca-se a
morte contra a vontade do paciente; Eutanásia não voluntária:
provoca-se a morte sem consentimento do paciente.

5.2 OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DE MORTE SOB A ÓTICA


JURÍDICA

5.2.1 MISTANÁSIA

Assim como a eutanásia, a mistanásia é de origem


grega: “mys” significa infeliz e “thanatos” significa morte. Tam-
bém é chamada de eutanásia social quando a morte é pro-
movida. Ele é criado pela introdução de algum procedimento
que torna a morte dolorosa e miserável. Ao contrário da euta-
násia, em que uma pessoa intencionalmente causa a morte
de outra que está debilitada ou em sofrimento insuportável, a
mistanásia ocorre por má gestão da saúde pública e pela ne-
gligência dos responsáveis.
Este termo pode ser usado quando os pacientes mor-
rem de forma evitável por falta de assistência, insumos ou lei-
tos de qualidade, indicando que o direito à saúde garantido
pela constituição federal foi violado – que acontece frequen-
temente devido a superlotação nos hospitais – levando ao

173
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

atraso no diagnóstico e aumentando os riscos para pacientes,


acompanhantes e funcionários. Na maioria dos casos, a mis-
tanásia atinge pessoas marginalizadas da sociedade que de-
pendem de políticas públicas. Tal situação ocorre no pronto-
socorro dos hospitais quando seus especialistas e leitos não
são suficientes para o número de pacientes, de modo que o
tempo de espera ultrapassa o limite médio e aceitável.
É interessante notar que tanto a eutanásia quanto a
misantropia levam a mortes. No entanto, isso acontece com
calma e sem dor. Aqui acontece de forma dolorosa e despre-
zível (MARTINS, 1998). A Mistanásia dá às crianças, aos jo-
vens, aos adultos e aos velhos uma morte miserável, é uma
morte precoce, ou seja, antes do tempo. Nos países latinos,
a maioria dos casos de mistanásia é causada pela falta ou
insegurança dos serviços médicos. Essa condição negativa
afeta não apenas os doentes terminais, mas também os pa-
cientes que inicialmente não correm risco de morte, devido a
uma série de fatores.
Conforme Martins (1998) retrata essa realidade ao dis-
por que:

Na América Latina, de modo geral, a forma mais


comum de mistanásia é a omissão de socorro es-
trutural que atinge milhões de doentes durante
sua vida inteira e não apenas nas fases avança-
das e terminais de suas enfermidades. A ausên-

174
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

cia ou a precariedade de serviços de atendi-


mento médico, em muitos lugares, garante que
pessoas com deficiências físicas ou mentais ou
com doenças que poderiam ser tratadas morram
antes da hora, padecendo enquanto vivem dores
e sofrimentos em princípio evitáveis. Fatores ge-
ográficos, sociais, políticos e econômicos jun-
tam-se para espalhar pelo nosso continente a
morte miserável e precoce de crianças, jovens,
adultos e anciãos: a chamada eutanásia social,
mais corretamente denominada mistanásia. A
fome, condições de moradia precárias, falta de
água limpa, desemprego ou condições de traba-
lho massacrantes, entre outros fatores, contri-
buem para espalhar a falta de saúde e uma cul-
tura excludente e mortífera. (MARTINS, 1998,
p.175).

Assim, pode-se argumentar que as vítimas do caso são


pessoas que não possuem condições financeiras de arcar com
suas despesas de saúde e que dependem da assistência do
Estado. No mesmo sentido, pode-se dizer que também são
vítimas do equívoco pessoas que ainda podem pagar os pla-
nos de saúde, mas são privados de assistência médica porque
agentes políticos e privados sem coração, fazem uso indevido
de recursos públicos, eles mergulham no oceano da corrupção
e se envolvem em uma grande carnificina social. Desta vez, a
conduta negligente do Estado, quando deveria atuar na orga-
nização positiva de atividades voltadas para a garantia da sa-
úde pública, fere a dignidade da pessoa humana com a pena
de morte, prevista no artigo 1º III da Constituição Federal como
um direito fundamental do cidadão.

175
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial


fundem-se e tornam-se garantias inevitáveis de todo cidadão,
tanto que o artigo 170 da Constituição afirma que “Uma ordem
econômica baseada na valorização do trabalho humano e na
livre iniciativa visa assegurar a vida humana, existência para
todos segundo a justiça social...”. Portanto, o mínimo existen-
cial guarda relação com a dignidade da pessoa humana e com
o próprio Estado Democrático de Direito no dever que deve ter
para concretizar a ideia de justiça social (HÄBERLE, 2003, p.
356-362).
A saturação de todo o centro de saúde, principalmente
dos leitos de UTI, coloca a população pobre em risco de morte
brutal, sem sequer conseguir buscar tratamento ou sobreviver
nossa realidade. O Brasil possui um dos maiores sistemas pú-
blicos de saúde do mundo e isso é uma grosseira negligência
do poder público e viola sua responsabilidade de zelar pela
dignidade humana da população, que é a base de nossa go-
vernança democrática da lei.

5.2.2 ORTANÁSIA

Outro termo grego que se divide em duas partes: “orthos”


com o significado de direito e thanatos morte. A partir deste
conceito podemos concluir que é a verdadeira morte, ou seja.

176
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

morte que ocorre naturalmente. A ortotanásia, também cha-


mada de "eutanásia passiva", consiste em aliviar o sofrimento
de um paciente terminal, suspendendo o tratamento que pro-
longa a vida, mas não havendo cura ou cura da doença. Nesse
caso, a vida do paciente não é estendida, ou, meios artificiais
não são usados, porque o fim é certo. Então o Doutor só inter-
vém para prevenir a dor.
A ortotanásia, não é considerada crime porque trata-se
apenas da intervenção de drogas para aliviar a dor e sofri-
mento, sendo esta prática bem amparada pela Constituição,
pois sua finalidade é garantir uma morte digna um doente ter-
minal que tem autonomia para recusar o tratamento e, neste
caso, é natural. Portanto, tais atividades não podem ser clas-
sificadas como ilegais.
Dessa forma, na eutanásia passiva, o procedimento é in-
terrompido ou abandonado para matar, na ortotanásia, para
não prolongar desnecessariamente o sofrimento. Conside-
rando essa possível atividade médica, o Conselho Federal de
Medicina, em sua resolução 1805/2006, tentou limitar ou inter-
romper procedimentos que poderiam prolongar a vida de pa-
cientes terminais. A Resolução explica então que:

Na fase terminal de enfermidades graves e incu-


ráveis é permitido ao médico limitar ou suspen-
der procedimentos e tratamentos que prolon-

177
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

guem a vida do doente, garantindo-lhe os cuida-


dos necessários para aliviar os sintomas que le-
vam ao sofrimento, na perspectiva de uma assis-
tência integral, respeitada a vontade do paciente
ou de seu representante legal.

Os artigos 1º e 2º da Resolução, complementam, tra-


zendo a seguinte redação:

Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspen-


der procedimentos e tratamentos que prolon-
guem a vida do doente em fase terminal, de en-
fermidade grave e incurável, respeitada a von-
tade da pessoa ou de seu representante legal. §
1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao
doente ou a seu representante legal as modali-
dades terapêuticas adequadas para cada situa-
ção. § 2º A decisão referida no caput deve ser
fundamentada e registrada em prontuário. § 3º É
assegurado ao doente ou a seu representante le-
gal o direito de solicitar uma segunda opinião mé-
dica. Art. 2º O doente continuará a receber todos
os cuidados necessários para aliviar os sintomas
que levam ao sofrimento, assegurada a assistên-
cia integral, o conforto físico, psíquico, social e
espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da
alta hospitalar.

Percebe-se que, “Nesse ponto de vista, observe-se


que a morte é como um estado natural de cada pessoa, e o
ideal é tentar aceitar esse fato, que garante a dignidade do
falecido em casa, e é exaustivo; o paciente em questão pode
ter mais tempo e energia com os entes queridos para estar
junto e usá-lo para viver ativamente em suas circunstâncias.

178
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A proposta da ortotanásia não é apressar a morte, mas hu-


manizá-la.
A humanização, como aspecto mais humano do trata-
mento, coloca a pessoa no centro do processo, incentivando
a autonomia de suas escolhas, o que inclui solidariedade,
compaixão, aproximação e respeito” (Siqueira, Zoboli, Kipper,
2008). O diálogo deve ser facilitado pelo médico, não forçado
(Deslandes, 2004). Se alguém é afetado pela doença, ele
deve ser capaz de determinar qual tratamento é seguido ou
não, e qual é o tipo de morte e suas consequências. O obje-
tivo da ortotanásia é coopera no processo natural de morte,
sendo desenvolvida no seu curso natural.

5.2.3 DISTANÁSIA

Também de origem grega: “dis” significa problema e


thanatos significa morte. Ao contrário da eutanásia ou ortota-
násia, a distanásia prolonga o momento da morte tornando-o
doloroso. A distanásia, por outro lado, consiste no uso de me-
didas paliativas e médicas de forma que o paciente morra sem
dor e sofrimento, embora esteja ciente de que sua doença
não tem cura, o paciente concorda com o uso de medidas de
prolongamento da vida. A distanásia é o processo de morrer
por meio de tratamentos extraordinários, que visam apenas

179
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

prolongar a vida biológica do paciente.


O novo Código de Ética Médica Brasileiro, em vigor
desde abril de 2010, trouxe uma importante inovação para o
cuidado do fim da vida, assumindo um posicionamento que
evidencia os princípios básicos da atividade médica antidista-
násia: "Nas clínicas irreversíveis e terminais, o médico evita
procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e
presta todos os cuidados paliativos necessários aos pacien-
tes atendidos, comportamento denominado "ortotanásia".
Nesse caso, todo procedimento médico utilizado é inútil por-
que a morte do paciente é certa. Pode-se dizer que não é vida
que prolonga, mas morte que prolonga (PESSINI, 1995).
O direito à vida não inclui a obrigação de retardar inde-
finidamente a morte natural, utilizando todos os meios de re-
tardamento disponíveis, ainda que seja extremamente san-
grento e contraindicado. Não há dever artificial para sobrevi-
ver. Com base no princípio da dignidade da pessoa humana
e na autonomia do testamento, o Estado não pode e não deve
estabelecer incondicionalmente uma ditadura da vida que
proíba a eutanásia e a distanásia.
A distanásia responde à obstinação terapêutica ou in-
ternalização. Internação terapêutica, por outro lado, é uma
nomenclatura adotada pelos países europeus que vem da pa-

180
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

lavra francesa “l'acharnement thérapeutique” (também tradu-


zida como internação terapêutica), que surgiu na década de
para indicar o comportamento médico, processos terapêuti-
cos cujo efeito é mais danoso que o efeito do mal a ser tratado
ou inútil, porque a cura é impossível e o benefício esperado é
menor que o dano esperado.
Parar tratamentos desnecessários não encurta a vida,
mas deixa de prolongá-la artificial e irracionalmente, sobre-
carregando o paciente sem trazer nenhum benefício. Acres-
centar dias ou horas a uma existência que se tornou um fardo
e uma tortura para um indivíduo, às vezes contra sua vontade,
quando o organismo já está em falência global e incurável,
não pode ser visto como vantagem ou responsabilidade do
médico.
Segundo a definição de Borges, a obstinação terapêu-
tica é uma prática excessiva e violenta da medicina, que re-
sulta diretamente das possibilidades oferecidas. Por omis-
são/proibição, Franco e Stocco citam sem referência à obra
do mestre português Figueiredo Dias, entendendo que a vida
deve ser prolongada artificialmente sem referência se esta for
a vontade expressa do paciente. O uso da distanásia fere a
dignidade do paciente e até mesmo de seus familiares, pois
ambos sofrem com métodos inúteis de tratamento que não
beneficiam o quadro clínico apresentado.

181
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A distanásia não garante a qualidade de vida no pro-


cesso de morrer, mas a quantidade (prolongamento de data)
de vida, e que maior qualidade de vida significa maior sofri-
mento para o paciente, o que é uma clara e objetiva violação
da dignidade humana, pois o tratamento em si, incluindo o
custo gerado, irá ingressar um tratamento agressivo ao paci-
ente, causando muito sofrimento ao paciente, no qual não irá
trazer benefícios terapêutico nenhum ao mesmo, não de-
vendo ser como um objetivo médico.

5.2.4 SUICÍDIO ASSISTIDO

Há muitas razões pelas quais uma pessoa tira a própria


vida: falta de esperança, falta de respostas para os proble-
mas, ignorância da palavra de Deus. Não há dúvida de que o
suicídio é um ato extremo de desespero, em que um suicida
encontra uma maneira de acabar com seus problemas
(GRECO, 2017). A técnica do suicídio assistido é considerada
controversa por questões religiosas e éticas, e ocorre quando
a equipe médica administra a medicação para o procedi-
mento, mas o próprio paciente administra a dose letal de fár-
macos. O método difere da eutanásia, que ocorre quando a
própria equipe médica administra a dose.

182
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O suicídio assistido é definido como quando uma pes-


soa pede ajuda de pessoas para tirar a própria vida. Nesse
sentido, Diniz (2009) ensina que “suicídio é uma hipótese em
que a morte resulta de uma ação realizada pelo próprio paci-
ente, orientado ou assistido por terceiro ou médico”. O sis-
tema penal brasileiro, como mencionado anteriormente, não
pune quem comete suicídio, mas sim quem de alguma forma
ajudou, seduziu ou incentivou alguém a cometer suicídio.
Vale dizer, o artigo 122 do Código Penal Brasileiro prevê pe-
nas de prisão de dois a seis anos para suicídio; ou reclusão
de um a três anos, se a tentativa de suicídio resultar em lesão
corporal grave.
No suicídio medicamentoso ou assistido, é obrigatório
que a pessoa tenha plena capacidade mental e expresse vo-
luntariamente do desejo de morrer, e solicite uma dose de
medicamento que acabará com sua vida. Sendo recordado o
caso da sedação terminal, uma opção proposta em últimos
casos cujo sintomas não podem ser controlados, causando a
sedação no final da vida, em meios termos existe também a
sedação paliativa no qual tem a finalidade de aliviar os sinto-
mas refratários quando todas as outras intervenções falha-
rem, no entanto, é considerado um efeito colateral que se
causa a morte.

183
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Essa modalidade de suicídio assistido por médico é le-


galmente amparada na Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Ca-
nadá, Suíça, Colômbia, Alemanha e em sete Estados dos
EUA. Normalmente, uma pessoa deve estar em estado termi-
nal, com prognóstico de seis meses ou menos, antes de po-
der solicitar uma dose letal de medicamento que possa ser
autoadministrada para encerrar sua vida.
Os pacientes ou seus representantes legais têm o di-
reito de recusar o tratamento apenas com base em testa-
mento vital. No entanto, a exigência de tratamentos que sal-
vam vidas ou outros tratamentos é contestada em diferentes
jurisdições e depende muito de cada situação individual.
Diante disso, se a pessoa não puder mais decidir inter-
romper a sedação ou pedir comida ou água após a inconsci-
ência, a equipe clínica pode tomar decisões pela pessoa. Por
exemplo, sob a lei britânica, um padrão de vida pode emitir
uma diretiva que uma pessoa recusa "cuidados paliativos" ou
"sedação terminal" ou "qualquer medicamento que possa su-
primir a respiração".

5.3 A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À VIDA

5.3.1 EUTANÁSIA E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA


DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

184
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O elemento primitivo da questão da eutanásia é a dig-


nidade humana direta da vida e o sentido subjacente de toda
a sentença, pelo que é essencial abordar questões conexas
como o princípio da dignidade humana. Quando falamos em
dignidade humana, não é apenas um princípio ou uma garan-
tia, mas o fundamento da República do Brasil previsto no Artg.
1°, § 3º da Constituição Federal.
Atualmente, há muito debate sobre os direitos pesso-
ais (direitos universais, absolutos, inalienáveis, vitalícios, in-
transferíveis, inalienáveis e irrevogáveis) e seu impacto na
vida cotidiana, especialmente em questões fundamental-
mente humanas como a morte.
Os avanços da medicina possibilitaram a criação de
ferramentas, técnicas e métodos que podem prolongar a vida
até mesmo de um paciente incurável ou irreversível procedi-
mento chamado distasia. Além disso, incluía também a reti-
rada indolor da vida, como na eutanásia. O livre e pleno de-
senvolvimento da personalidade advém da vontade própria
do indivíduo, que é protegida pelo princípio da dignidade da
pessoa humana, fundamento da Constituição da República
Federativa do Brasil.
Dessa forma, a eutanásia levanta questões sobre os
limites da vontade humana na decisão de tirar a própria vida
artificialmente, em razão do valor moral correspondente. O

185
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fundamento da dignidade humana nos vincula à possibilidade


de uma pessoa conduzir sua vida e realizar sua personali-
dade de acordo com sua consciência, desde que não afete os
direitos de terceiros. Esse poder de autonomia atinge também
os últimos momentos da vida de uma pessoa. A dignidade da
pessoa humana não é uma criação constitucional porque é
um daqueles conhecimento prévio de todas as experiências
especulativas, como o próprio homem. A Constituição, reco-
nhecendo sua existência e valor, fez dela o valor máximo do
ordenamento jurídico. (José Afonso da Silva (1998, p. 91).
A Declaração da UNESCO (1997) reconheceu clara-
mente a dignidade humana como um princípio humano bá-
sico. Salienta de que todas as leis devem basear-se neste
princípio. A bem da verdade, o princípio da dignidade da pes-
soa humana é a base da pirâmide de todos os ramos do di-
reito, devendo todos os demais estar em harmonia com o que
garante a proteção do homem, desta e das futuras gerações.
Violando o direito de uma pessoa à dignidade humana, ela
teria o direito de insultar os outros. Portanto, proteger a digni-
dade humana é uma meta constante do Estado.
Ao conceber "dignidade humana", não é possível se-
parar a expressão "dignidade humana" do conceito de vida
digna, mesmo que esses conceitos não sejam considerados
idênticos na sociedade devido às diferentes regulamentações

186
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

religiosas e culturais. Uma percepção rígida da dignidade hu-


mana não sustenta o Estado Democrático de Direito. Em uma
sociedade democrática, é preciso ver que o conceito de dig-
nidade humana muda à medida que mudam as diretrizes éti-
cas e culturais.
O que é considerado valioso em um determinado mo-
mento da história pode assumir um significado diferente ao
longo do tempo. As aspirações sociais mudam de acordo com
o momento histórico, portanto, adaptar-se a essas mudanças
é uma questão de regras e princípios (SARLET, 1988 apud
GAMA, 2003, p. 132).
O conceito de dignidade humana não surgiu após sua
constituição, pois é algo peculiar ao homem. Não é criado
como tal por lei, mas é algo peculiar aos humanos. Hoje, a
dignidade humana é vista como central para todos os direitos.
As discussões sobre a dignidade da pessoa humana não en-
contraram consenso entre os juristas que tratam do assunto
devido à sua falta de objetividade.
No entanto, ainda é possível encontrar várias opiniões
não contraditórias. Na implementação deste princípio, o Es-
tado é responsável não apenas por assegurar que esta dis-
posição não seja violada, mas também por assegurar que ela
não seja violada. Do ponto de vista jurídico, a vida é um direito

187
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

natural e universal que pertence a todas as pessoas e, por-


tanto, merece proteção. O artigo 5º da Constituição Federal
prevê o direito fundamental e o direito à vida como garantia.
É um elemento básico de todos os outros bens jurídicos. Sem
esse direito, qualquer outra proteção seria inútil.
A relação entre ética e direito é fundamental e intima-
mente entrelaçada. A primeira, segundo Rivabemi (2017), se-
gue um ideal aspiracional de ação caracterizado pela livre es-
colha e autonomia da consciência do indivíduo, enquanto a
segunda segue a ação heterônoma sob compulsão justificada
pela imposição de autoridade.
Além disso, segundo Garcia (2015), “Ética e direito es-
tão relacionados porque dizem respeito ao comportamento
humano e ao comportamento em sociedade. A ética busca
estabelecer princípios gerais e leis que prescrevem compor-
tamentos sujeitos a sanções”. O texto da Constituição, garan-
tindo o direito à vida, impede a execução de tais ações desti-
nadas a encerrar o processo vital, exceto no caso de declara-
ção de guerra nos termos da lei.
Assim, conclui-se que a eutanásia é proibida pela
Grande Carta porque o direito humano fundamental à vida,
como outros direitos fundamentais, é irrevogável e irrevogá-
vel. Um indivíduo (ou alguém agindo em seu nome) não pode
terminar sua vida, mesmo que esteja nos estágios finais.

188
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5.4 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E O CONFRONTO COM


O DIREITO A MORTE DIGNA

Entre as incertezas da vida, a morte é a única certeza.


A religião conforta muitos sobre a morte e a vê como renasci-
mento. No entanto, o sofrimento e a dor sempre afetaram o
homem, não é de estranhar que a medicina tenha avançado
tanto ao longo dos anos, criando métodos e medicamentos
que visam aliviar a dor que as pessoas sofrem.
O desenvolvimento da tecnologia de tratamento possi-
bilitou prolongar excepcionalmente a vida do paciente. No en-
tanto, deve-se considerar quando é benéfico para o paciente
ou quando é hora de interromper o tratamento e permitir que
a pessoa aceite que sua hora de morte chegou para encerrar
uma vida mais digna e menos dolorosa. Daí a ideia da euta-
násia (uma boa morte, uma morte doce, suave, sem dor e so-
frimento), que alivia o sofrimento do moribundo.
Deve-se entender que uma morte digna começa com
a dignidade humana. Não é preciso falar em retardar a morte
por todos os meios possíveis de dor (distanásia), o que viola-
ria a dignidade humana e em alguns casos seria uma espécie
de tortura do indivíduo. Sem vida não há direito de viver. Um
moribundo perturbado psicologicamente, sem esperança de
sobrevivência, completamente dependente de máquinas e de

189
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

outras pessoas, sofrendo de sofrimento agudo e dor cons-


tante, só pode esperar a morte.
A lei trata a vida como uma mercadoria que não está
disponível, mas o que ocorre nesses casos é a compulsão da
vida. Se a dignidade humana acompanhou o paciente durante
sua vida, não pode ser ignorada nos momentos decisivos de
uma pessoa. Entende-se que na realidade se trata de um con-
flito de princípios, onde a dignidade humana com autonomia
privada se sobrepõe a uma vida de baixa qualidade baseada
em tratamento desumano e degradante proibido pelo texto da
Constituição.
A vida como objeto legítimo não pode ser desprezada,
nem o crime pode ser abandonado como punição responsá-
vel. No entanto, convém observar a presença de fatos rele-
vantes e que cada caso tenha seu próprio peso e dimensão,
pois assim o conceito de interferência na vida do direito pode
ser flexível. Em tese, não haveria necessidade de alteração
da legislação, pois o direito à liberdade e à dignidade da pes-
soa humana estão consagrados na Constituição Federal e de-
vem ser aplicados também à interpretação do direito penal.
No entanto, a disposição expressa na lei, segundo a qual a
ortotanásia é considerada uma circunstância atípica, encerra-
ria o debate sobre sua autorização.

190
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O papel do Estado é, de fato, proteger e defender o


direito à vida, considerado o maior interesse do indivíduo.
Contudo, este direito encontra um sério obstáculo quando se
trata dos limites do valor da vida humana continuada, pois
para o seu mínimo êxito é necessário assegurar uma existên-
cia digna. Não estamos falando aqui de necessidades bási-
cas, como discutido em outro lugar, mas de pequenos e talvez
insignificantes detalhes, como uma vida sem dor ou sofri-
mento desnecessário.
O doente terminal deve ter morte digna. É imperativo
que a qualidade de vida de uma pessoa seja tão saudável
quanto em um leito de hospital e que ela possa recusar um
tratamento que apenas prolonga seu sofrimento e dor e a leva
a uma existência indigna. Morrer é universal e a morte deve
ser um tempo de paz. O princípio do cuidado em fim de vida
é colocar a vida em primeiro lugar e pensar a morte como um
processo natural, sem tentar antecipá-la ou atrasá-la.
De acordo com a lei brasileira, a eutanásia (ativa ou
passiva) é considerada um assassinato privilegiado (se o va-
lor moral relevante for reconhecido). Existem vários argumen-
tos para essa prática, mas os contra-argumentos são válidos.
A própria realidade em torno do crime e seu aumento mostra-
ram que a chegada da eutanásia pode ser mais um meio para
cometer o crime. Proteger o direito a uma morte digna não

191
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

significa proteger o procedimento que causa a morte do paci-


ente, mas reconhecer a liberdade do paciente e o direito à
autodeterminação.
O artigo 5º da CR/88 garante, entre outras coisas, a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade e à segurança.
Acontece que tais direitos não são absolutos. E acima de
tudo, não são títulos. O artigo 5° não impõe obrigações à vida,
liberdade e segurança. As cláusulas deste contrato estipulam
as condições com base nas quais esses direitos são garanti-
dos.
Assim, é garantido o direito (não-obrigação) à vida, não sendo
aceito o dever do paciente de receber tratamento, sendo esse
direito de não receber tratamento ou de interrompê-lo decor-
rente de sua garantia constitucional. Liberdade de consciên-
cia, autodeterminação judicial, inviolabilidade de sua vida pri-
vada e intimidade e inviolabilidade da dignidade humana.
Assim, "A morte é uma parte inseparável da vida, tão
natural e previsível quanto o nascimento é inevitável." Assim
como Sá, Maria de Fátima, 2001, seguimos sua linha de raci-
ocínio para defender a eutanásia passiva legalmente prati-
cada pela medicina, mas os requisitos devem ser atendidos,
como um médico pode praticar esta prática. O único objetivo
é acabar com o quadro clínico de dor insuportável ou com-

192
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pleta desesperança. Vemos isso como libertar a pessoa afe-


tada e seus entes queridos para seguir em frente com suas
vidas. É claro que uma boa morte, ou seja, eutanásia, é uma
ação guiada pela compaixão, cujo objetivo é aliviar uma pes-
soa doente, por ação ou omissão, de sofrimento físico ou
mental que ela considera insuperável.
O direito à vida é considerado um direito fundamental,
mas abrange muito mais do que apenas viver, viver ou sobre-
viver. É o direito à vida digna e equipara-se a todos os demais
direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal
de 1988, podendo ser dispensado. No entanto, o princípio da
dignidade da pessoa humana é um princípio norteador que
tem um valor fundamental em relação aos demais direitos e
deveres fundamentais, bem como o lado negativo da liber-
dade pessoal, que pode ser entendido através da interpreta-
ção constitucional de que as pessoas não são punidas. prati-
cante de eutanásia.
Dizem que a vida acaba e só o paciente, titular desse
direito, pode decidir se continua em morte natural ou se inter-
vém, o que claramente não se vê nos hospitais brasileiros,
porque os médicos têm medo de serem punidos se o fizerem,
não insistem no tratamento de um paciente terminal e, por-
tanto, enfrentam a vontade do paciente e precisam de trata-
mento. No mesmo sentido, o projeto de lei 236/12, que alterou

193
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a lei penal, é um erro inconstitucional do legislador, prescre-


ver uma punição para o autor da eutanásia. no artigo. 122
parágrafo 2º do mesmo projeto, onde a pessoa que pratica a
ortotanásia está isenta de punição.
Por fim, é necessário um amplo debate político sobre
o tema, para que a lei sobre a eutanásia forneça claramente
os requisitos para sua prática, o que mostraria a motivação
favorável do comportamento e, assim, possibilitaria a prote-
ção de ambos. Direitos fundamentais à vida e a liberdade e
dignidade humana. A Constituição, como vimos, tem o direito
à vida para uso de outrem, e então uma pessoa não pode
mais exercer seus direitos sozinha ou mesmo gozar do direito
à vida. Logo o direito à vida dessa pessoa já está violado, pois
como falar de uma vida digna para uma pessoa que não pode
exercer seus direitos civis e cuja liberdade é retirada?
Nesses casos, a eutanásia pode ser aplicada como vi-
olação do direito à vida? A eutanásia não a ajudaria a se sentir
livre e valiosa nesses casos se ela pudesse optar por não
continuar sua sobrevivência? Porque sua vida não seria ti-
rada, porque a vida não é mais em sua plenitude, e ele ainda
seria poupado da violação de outros direitos fundamentais,
como a liberdade e a dignidade humana.
A verdade é que existem visões opostas na sociedade,
onde alguns são contra e outros são a favor. Os defensores

194
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da eutanásia acreditam que assim se evita a dor e o sofri-


mento das pessoas em fase de morte ou sem qualidade de
vida. Há vivências de doenças, sofrimento intenso, tratamento
clínico irreversíveis condições que privam algumas pessoas
de prazer e propósito na vida. O direito de sobreviver é certa-
mente um dos nossos direitos básicos.
Há quem defenda sob o argumento que se temos o di-
reito de viver, também temos o direito de decidir sobre a
nossa morte. Viver bem não é muito, mas uma vida de quali-
dade. Segundo Débora Diniz, professora de antropologia e
diretora da Associação Internacional de Bioética, “eutanásia
não é assassinato. Viver é sempre fazer escolhas, inclusive
morrer", ela lembra ainda que dois princípios éticos são am-
plamente utilizados na deliberação.
A morte da própria pessoa, que é o princípio da digni-
dade humana, caso em que devemos nos perguntar até que
ponto podemos considerar a vida de uma pessoa que não
pode mais cumprir suas tarefas essenciais sozinha e que não
percebe a sinergia, que é o princípio da dignidade humana. É
formado em torno dele, para ser valioso. E o segundo é o
princípio da autonomia, pois a eutanásia entendia como o
exercício de um direito individual é uma garantia de cuidado
ao qual as pessoas têm direitos, inclusive o direito de morrer.

195
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Do ponto de vista religioso, apenas o criador tem o direito de


recuperar sua vida.
Do ponto de vista médico e tendo em conta o Jura-
mento de Hipócrates, o dever do médico é socorrer o doente,
proporcionando-lhe todos os meios de vida, sendo também
uma preocupação dos médicos o eventual tráfico de seres hu-
manos, onde os pacientes são vistos como prateleiras de ór-
gãos itinerantes. Não podemos esquecer que a medicina pro-
grediu gradativamente e muitas doenças que antes eram con-
sideradas incuráveis agora são curáveis. O papel do Médico
na sociedade conforte o Juramento de Hipócrates consagrar
a vida a serviço da Humanidade, a vida deve ser priorizada
acima de todos os termos, tendo o direito de viver.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante desse cenário, a eutanásia prevista no projeto


constitui uma ameaça real à integridade do direito à vida?
Como exposto, a Constituição prevê o direito à vida para usu-
fruto de outrem, mas nesse caso o indivíduo não pode mais
exercer seu direito sozinho, mas sim maximizar seu direito à
vida, não podendo nem gozar, de uma vida habitável, essas
pessoas imediatamente teve seu direito à vida parcialmente
violado.

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Porque o que é uma vida humana para um indivíduo


cuja liberdade é restrita e impossibilitado de exercer seus di-
reitos de cidadão? Nesses casos, a eutanásia seria conside-
rada uma violação do direito à vida? Então, a eutanásia pode-
ria ajudar a pessoa a se sentir livre e digna e optar por não
continuar vivendo? Porque a vida perfeita não existe mais, ela
não pode ser privada da vida e outros direitos básicos, como
liberdade e dignidade, não são violados.
A questão da eutanásia é controversa e ainda não foi
resolvida. Porém, com o envelhecimento da população e a
busca por uma assistência médica mais humanizada, esse
problema se tornará cada vez mais agudo no cotidiano de
nossa sociedade.
Embora o sistema legal japonês não estipule especifi-
camente a eutanásia, uma revisão do Código Penal à luz das
premissas consagradas na Constituição de 1988 permite que
a eutanásia seja classificada como assassinato ou suicídio as-
sistido. Assim, o consentimento do paciente ou os motivos pi-
edosos de quem pratica a eutanásia não afastam a ilicitude do
ato, nem absolvem o autor da culpa.
Quanto às alternativas, o Código Penal não prevê exceções
claras, mas é melhor entender que tal tipificação não ocorre à
luz do princípio constitucional da dignidade da pessoa hu-
mana. Nesse sentido, a prática tem sido socialmente aceita e

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praticada pela comunidade médica. Alguns projetos de lei vi-


sam caracterizar a prática da eutanásia, enquanto outros vi-
sam declara.

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200
TOMO I

Este livro reúne cinco artigos, na


área de Ciências Jurídicas,
redigidos por concludentes do
Curso de Direito da UNINORTE –
Ac, sob a supervisão do Profa. Esp.
Williane Tibúrcio Facundes.
EAC
Editor .

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