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Williane Tibúrcio Facundes

mostra de artigos
(organizadora)

E-book
Vol. 3

CIÊNCIAS JURÍDICAS
na Amazônia Sul-Ocidental

EAC
Editor
Copyright © by autoras, 2023.
All rigths reserved.

Todos os direitos desta edição pertencem aos autores. Nenhuma


parte desse livro poderá ser reproduzida por qualquer
meio ou forma sem a autorização prévia da organizadora pelo e-
mail <willitiburcio@gmail.com>. A violação dos direitos autorais
é crime estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo art. 184 do
Código Penal. As informações contidas em cada capítulo são de
inteira responsabilidade dos autores, bem como a ortografia deles.

EDITOR GERAL,
CAPISTA E DIAGRAMADOR
Eduardo de Araújo Carneiro
eac.editor@ gmail.com

CONSELHO EDITORIAL DA OBRA


Dr. Eduardo de Araújo Carneiro
Dr. Elyson Ferreira de Souza
Esp. Arthur Braga de Souza
Esp. Ícaro Maia Chaim

F143c FACUNDES, Williane Tibúrcio (Org.).


Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental: mostra de
artigos / Williane Tibúrcio Facundes (organizadora). – 1.
ed. – Rio Branco: EAC Editor, 2023. 189 p.; il. 14,8x21
cm. Tomo I; Vol.3 (E-book)
ISBN: 978-65-00-67663-1
1. Ciências Jurídicas; 2. Direito; 3. Amazônia ; I. Título.
CDD 340.07
SUMARIO

APRESENTAÇÃO 06
Williane Tibúrcio Facundes

1. O POLICIAMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR E 08


O COMBATE À VIOLÊNCIA E AO USO DE
DROGAS
Mirele Silva Araújo e
Williane Tibúrcio Facundes

2. A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO 41


TRABALHO EM CASOS DE TRABALHO NO
BRASIL EM CONDIÇÃO ANÁLOGA AO DA ES-
CRAVIDÃO
Matheus Mesquita da Silva e
Williane Tibúrcio Facundes

3. A IMPORTÂNCIA E COMPETÊNCIA DO 75
CONTROLE INTERNO E EXTERNO NA PROTE-
ÇÃO DO ERÁRIO PÚBLICO
Marco Aurélio dos Santos Telles
Marcos Paulo Pereira Gomes
Williane Tibúrcio Facundes

4. ESTADO LAICO E OS LIMITES LEGAIS DA 103


(IN)TOLERÂNCIA
Virginia Vasconcelos da Costa
Gilberto Jorge Ferreira da Silva
5. ANÁLISE DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA 137
DO DESCENDENTE NA CENA DO CRIME DE
FEMINICÍDIO
Karoline da Cunha Gomes
Arthur Braga de Souza
“A injustiça em qualquer lugar é uma

ameaça à justiça por toda a parte".

Martin Luther King Jr.


Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

APRESENTAÇÃO

A presente obra reúne 05 (cinco) artigos de concluden-


tes do curso do direito do Centro Universitário Uninorte. Eles
forame escritos sob a supervisão dos professores especialis-
tas Williane Tibúrcio Facundes e Arthur Braga de Souza e con-
tou com a colaboração dos professores mestres Marcos Paulo
Pereira Gomes e Gilberto Jorge Ferreira da Silva.
Os textos abordam relevantes temas jurídicos, a saber:
policiamento escolar; atuação do Ministério Público do Traba-
lho em casos de trabalho em condição análoga à escravidão
no Brasil; a importância e competência do controle interno e
externo na proteção do erário público; análise da causa de au-
mento de pena relativa ao descendente na cena do crime de
feminicídio e Estado laico e os limites legais da (in)tolerância.
De início, é tratada a temática do policiamento escolar
identificando as características das violências junto às escolas
de ensino fundamental da rede pública, desenvolvendo ações
e políticas públicas de prevenção às violências no ambiente
escolar.
Em seguida, é estudada a atuação do Ministério Público
do Trabalho em casos de trabalho em condição análoga ao da
escravidão no Brasil que apesar da abolição da escravidão em
1888, ainda existem situações vergonhosas como estas no

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nosso território. Depois, trata da importância e competência do


controle interno e externo na proteção do erário público.
Prossegue abordando sobre a análise da causa de au-
mento de pena relativa ao descendente na cena do crime de
feminicídio, que configura uma triste estatística recorrente em
nosso país. Ao fim, discorre sobre Estado laico e os limites
legais da (in)tolerância.
Trata-se de uma obra coletiva e plural, que debate te-
mas interessantes à sociedade e, sem esgotar os assuntos,
promove reflexões a respeito de situações vivenciadas diaria-
mente em nosso corpo social. Daí se extrai a sua relevância.

Profa. Williane Tibúrcio Facundes


Especialista em Psicopedagogia pela Universidade
Varzeagrandense (2004). Graduada em Letras/
Vernáculo pela Universidade Federal do Acre (2000)
e em Direito pela Faculdade da Amazônia Ocidental
FAAO (2010). É professora da UNINORTE (Ac).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1
O POLICIAMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR E O COM-
BATE À VIOLÊNCIA E AO USO DE DROGAS

POLICING IN THE SCHOOL ENVIRONMENT AND COM-


BATING VIOLENCE AND DRUG USE

Mirele Silva Araújo1


Wiliane Tibúrcio Facundes2

ARAÚJO, Mirele Silva. O policiamento no ambiente escolar


e o combate à violência e ao uso de drogas. Trabalho de
Conclusão de Curso de graduação em Direito – Centro Uni-
versitário UNINORTE, Rio Branco, 2023.

1
Discente do 9º Período do Curso de Bacharelado em Direito pelo Centro
Universitário Uninorte. Funcionária pública da Polícia Militar do Estado do
Acre.
2
Docente do Curso de Direito do Centro Universitário UNINORTE. Gradu-
ada em Direito pela U:VERSE, Especialista em Psicopedagogia pela Fa-
culdade Varzeagrandense. Graduada em Letras Vernáculas pela Universi-
dade Federal do Acre-UFAC.
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O país sempre enfrentou a grande problemática da violência,


sejam nas ruas ou em qualquer outro lugar. Entretanto, a vio-
lência e o consumo de drogas chegaram nas escolas o que
necessita de um novo olhar do Poder Público, e para tanto,
têm-se vistos ótimos resultados com a implantação do policia-
mento nas escolas. Objetiva-se analisar as vantagens que o
policiamento escolar proporciona para a instituição de ensino
e para a sociedade em geral, mostrar também os meios utili-
zados como o Programa Educacional de Resistência às Dro-
gas (PROERD). A presente pesquisa trata-se de uma pes-
quisa de método dedutivo, sendo uma revisão integrativa da
literatura científica, ou seja, totalmente bibliográfica, com a fi-
nalidade de reunir e sintetizar informações que já estão dispo-
nibilizadas em bases de dados eletrônicos, para complemen-
tar o campo informacional de lacunas a respeito do tema em
evidência. Após o término da pesquisa não restam dúvidas
que o reforço da polícia militar seja na administração do ensino
pedagógico ou juvenil, é de extrema importância para garantir
uma aproximação entre a comunidade, a escola e a Polícia
Militar.

Palavras-chave: policiamento escolar; violência; drogas.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

The country has always faced the great problem of violence,


whether on the streets or anywhere else. However, violence
and drug use have arrived in schools, which requires a new
look from the Public Power, and for that, excellent results have
been seen with the implementation of policing in schools. The
objective is to analyze the advantages that school policing pro-
vides for the educational institution and for society in general,
also showing the means used as the Educational Program of
Resistance to Drugs (PROERD). This research is a deductive
method research, being an integrative review of the scientific
literature, that is, fully bibliographical, with the purpose of
gathering and synthesizing information that is already available
in electronic databases, to complement the informational field.
of gaps regarding the topic in evidence. After the end of the
research, there is no doubt that the reinforcement of the mili-
tary police, whether in the administration of pedagogical or
youth education, is extremely important to guarantee a rappro-
chement between the community, the school and the Military
Police.

Keywords: school policing; violence; drugs.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

A violência e o consumo de drogas não são problemas


recentes no meio social, todos os dias as famílias brasileiras
testemunham fatos horripilantes, seja pela televisão, nas ruas
ou através da internet. Por mais que o Estado implemente po-
líticas públicas voltadas ao combate dessas práticas, ainda as-
sim parece que não são suficientes. Diante disso, busca-se
fazer uma política preventiva, isto é, já que o combate não está
sendo suficiente, necessita evitar que as crianças possam se
tornarem adultos violentos ou dependentes químicos.
Para se alcançar esse objetivo o lugar mais indicado
seria as escolas, pois, é lá que se inicia a construção social do
indivíduo. Importante frisar nesta última frase porque real-
mente as escolas da atualidade (principalmente as públicas e
periféricas) tem o poder de construir cidadãos honrados e res-
peitados na sociedade.
Entretanto, existe um lado sombrio nessa história, no
qual seria o contanto de muitas crianças com a violência e as
drogas dentro do ambiente escolar. Nesse contexto, o pre-
sente trabalho busca falar sobre o policiamento no ambiente
escolar e o combate à violência e ao uso de drogas nas esco-
las públicas.
Como norteador da presente pesquisa, a ideia é res-

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ponder a seguinte problemática: qual a importância do policia-


mento escolar no combate a violência e as drogas? Para al-
cançar essa resposta de forma clara, objetiva-se analisar me-
didas e programas voltados ao combate dessas práticas crimi-
nosas, acessoriamente objetiva-se ainda, relatar as dificulda-
des que a equipe gestora enfrenta para defrontar essas maze-
las.
A respeito da metodologia usada nesse trabalho ela é
de caráter totalmente bibliográfico, utilizando-se de livros, arti-
gos científicos, sites, entre outros documentos que possua ve-
racidade e respaldo para embasar este. Mediante a várias lei-
turas, dividimos o artigo em três capítulos, no qual o primeiro
está voltado para o ambiente escolar, abordando seu conceito
e narrando um pouco da mudança social, em que as escolas
perderam a sua pacificação e controle diante do alastramento
das facções.
A pesquisa se divide em três capítulos, no qual o pri-
meiro busca explanar sobre o ambiente escolar e juntamente
abordar a violência e o consumo de drogas que acontecem
dentro deste lugar que é destinado apenas para o desenvolvi-
mento educacional de crianças e adolescentes.
O segundo capítulo é voltado para o policiamento esco-
lar sendo considerado uma modalidade de policiamento que

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

foi instituído pela polícia militar, tendo como finalidade aproxi-


mação da polícia militar da comunidade escolar. Já o último
busca-se demonstrar os benefícios e a importância deste ser-
viço dentro das instituições, não limitando-se apenas num fa-
vorecimento escolar, mas toda a comunidade ganha com a
aplicação deste acompanhamento policial.

1.1 O AMBIENTE ESCOLAR: VIOLÊNCIA E O CONSUMO


DE DROGAS

Antes de adentrar-se ao mérito do assunto é preciso


definir o conceito de ambiente escolar para que assim, possa
haver uma limitação espacial, tornando mais fácil a compreen-
são. Para isso, usamos uma definição encontrada na Redação
Connect Escolas (2022):

O ambiente escolar se refere a todos os es-


paços da escola e a dinâmica que acontece
nesses locais. No período de escola os alu-
nos estão em constante evolução, mas o
meio escolar ruim pode interromper esse
processo. Para criar um bom ambiente o pri-
meiro passo é começar pela sala de aula.
Uma sala com carteiras em bom estado, boa
iluminação e com circulação de ar. Um am-
biente que atende as necessidades de quem
usa irá parecer mais estimulante. Evitar
comportamentos que causam conflitos entre

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os alunos é uma forma de manter o um bom


ambiente. (online)

Então, pode-se dizer que o ambiente escolar é o local


no qual estão dispostas as salas de aula. Esse local é desti-
nado ao acolhimento de alunos de diferentes faixas etárias,
crianças, adolescentes, jovens e adultos. O objetivo da escola
é gerar o desenvolvimento do aluno, garantindo a este a for-
mação básica para que ele possa exercer sua cidadania de
forma integral, conquistando qualificação para executar traba-
lhos e estudos.
Como qualquer Instituição a escola possui diversas di-
ficuldades, como podemos observar, a educação no Brasil en-
frenta uma gigantesca malha de obstáculos. Além do baixo ní-
vel de recursos, do pouco uso de tecnologia, o sistema de en-
sino ainda enfrentou uma pandemia de proporções gigantes-
cas. Mas, diante de toda dificuldade, os profissionais que exer-
cem suas atividades com total desempenho, nunca desistiram
da lide.
Dentre todos esses problemas, existe um velho e corri-
queiro que se destaca, principalmente nas escolas públicas, a
violência e o consumo de drogas no ambiente escolar. Há
muito tempo a escola deixou de ser aquele perfil de ordem e
obediência aos professores e gestores.
Em um passado não muito distante, as crianças eram

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doutrinadas, em seus lares, a obedecerem aos seus professo-


res, como se eles fossem os seus pais. Entretanto, com algu-
mas mudanças sociais, desigualdade, fome, aumento do trá-
fico e do uso de drogas, as escolas passaram a enfrentar o
problema da violência dentro do seu espaço.
Com a contaminação do corpo social com o sistema
faccionado, essa violência alcançou índices que até hoje pre-
ocupa a segurança pública. Logo, a violência tornou a maior
preocupação da sociedade, ninguém escapa dela, seja nas
ruas, nos seus lares, ambientes de trabalho ou escolar, todos
estão reféns desse sistema paralelo.
Já é de conhecimento social a grande violência e con-
sumo de drogas nas escolas públicas, o que resta aos gover-
nantes e a comunidade em geral é encontrar as raízes desse
problema para implementarem políticas de contenção. De
acordo com o Eric Debarbieux, pedagogo, doutorado em filo-
sofia na Universidade Pierre Mendes (rance - Grenoble II), a
família possui grande responsabilidade diante dessa mazela,
na qual, pais violentos geram filhos violentos, tornando-se um
círculo vicioso:

São muitos os fatores familiares que prenun-


ciam violência futura. Joan McCord (1979),
em seu acompanhamento de 250 meninos
de Boston, no estudo Cambridge-Somer-
ville, verificou que os principais indicadores
de futuras condenações por atos violentos
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

(até a idade de 45 anos) eram supervisão


parental deficiente, pais agressivos (inclu-
indo disciplina severa e punitiva) e conflitos
entre os pais. A ausência do pai era um fator
quase tão decisivo quanto os anteriormente
citados, embora a falta de afeto da mãe não
fosse significativa. Ela demonstrou também
que pais que haviam sido condenados por
violência tendiam a ter filhos também conde-
nados por violência (McCord, 1977). Em
suas análises subsequentes, Joan Mc-Cord
(1996) mostrou que os acusados de crimes
violentos tinham menores probabilidades
que os acusados de crimes não-violentos de
terem recebido afeição de seus pais e de te-
rem contado com boa disciplina e supervi-
são, embora a probabilidade de seus pais vi-
verem em conflito fosse igual para ambos os
grupos. (DEBARBIEUX, 2002, p.34)

Como foi possível observar, a família é fator fundamen-


tal que determinará a disciplina das crianças, cabendo destaca
que durante a pesquisa com 250 meninos, foi possível obser-
var que a ausência do pai significava muito na vida deles, pois,
quando esse não se fazia presente os meninos tinham uma
maior predisposição a violência.
É possível afirmar que a violência é reflexo da socie-
dade onde o indivíduo cresce, para corroborar a presente afir-
mativa, pode-se citar a famosa frase do filósofo Jean-Jacques
Rousseau, “o homem nasce bom por natureza, mas a socie-
dade o corrompe” (UOL).

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Apesar dessa natureza boa, como afirmou o filósofo Su-


íço, aparentemente o homem possui uma predisposição a re-
solver seus problemas de forma violenta, como se fossem ani-
mais selvagens que para disputar o controle necessitam saber
qual é o mais forte fisicamente.
De acordo com o Mestre em Modelos de Sistemas So-
ciais, Senge (2003, p. 27) ‘’uma educação deficiente recebida
na infância, apresentará seus reflexos, anos mais tarde’’, logo
percebe-se que o segredo para diminuir toda essa violência se
encontra na educação recebida na infância, ela será capaz de
definir o caráter e a personalidade do indivíduo.

1.1.2 OS TIPOS DE VIOLÊNCIAS

Como acima mencionado, o ambiente familiar e o esco-


lar devem agir em sincronia para que a criança possa receber
a educação adequada para tornasse um adulto de sucesso e
qualificado, logo, essa parceria é capaz de construir uma iden-
tidade, repassando valores e construindo um grupo de pes-
soas capazes de pensar e refletir sobre os caminhos certos.
Quando se fala em violência escolar, podemos compre-
endê-la em duas formas, a física e a psicológica. A física pode
ser classificada como aquelas em que existem chutes, espan-
camento, socos, entre outros. Já a psicológica, podemos citar

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os xingamentos, apelidos vexatórios, chantagens emocionais,


entre outros.
Apesar de que a violência no âmbito escolar se mani-
festa nas duas formas, física e psicológica, ela afeta diversas
outras áreas, pois, no ambiente escolar a ela tomou propor-
ções que influencia a todos, atingindo diretamente a vida par-
ticular e social, causando prejuízos muitas das vezes irrepará-
veis.
A presença da violência no âmbito escolar se torna evi-
dente em pelo menos cinco espécies diferentes, na qual é pos-
sível fazer breves apontamentos acerca de cada uma delas.
Primeiramente inicia-se com a mais comum, a violência física,
essa está relacionada a empurrões, chutes, murros, e em ca-
sos mais graves, poderá ter como resultado a própria morte de
algum indivíduo.
Ainda sobre esse tipo de violência, poderão ser incluí-
dos artifícios como armas brancas e armas de fogo. A segunda
espécie é a psicológica, englobando insultos, ameaças, humi-
lhações, um forte terror mental ou moral em cima de alguém.
Nesses casos, está incluído o famoso e preocupante Bullying,
nas palavras da professora Daniela Diana, graduada em le-
tras, essa prática pode ser definida como:

O bullying corresponde à prática de atos de


violência física ou psicológica, intencionais e

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repetidos, cometidos por um ou mais agres-


sores contra uma determinada vítima. Em
outros termos, significa todo tipo de tortura
física ou verbal que atormenta um grande
número de vítimas no Brasil e no mundo. O
termo em inglês "bullying" é derivado da pa-
lavra "bully" (tirano, brutal). (TODAMATE-
RIA, online)

A terceira, é uma das mais graves, ainda que não haja


como medir a gravidade entre nenhuma delas, mas a violência
sexual também é um fator preocupante, quando estamos di-
ante de milhares de crianças e adolescentes que são vítimas
dessas mazelas sociais, englobando atos violentos de cunho
sexual, como o assédio, a importunação e o estupro.
Como quarta espécie, traz-se a violência patrimonial,
abraçando práticas como furtos, destruição de objetos pesso-
ais, depredação de bens, entre outros. E, por fim, a quinta es-
pécie, a negligência consiste na omissão, na falta de cuidado
e na inobservância de deveres e obrigações.
É importante, ainda, destaca que a violência não acon-
tece somente de professores contra alunos, mas também de
alunos contra professores e alunos contra alunos. O fato é que
a violência tem contaminado as escolas brasileiras e as de ou-
tros países, prejudicando assim o processo de aprendizagem.
Criança e adolescente demonstram, em seus compor-
tamentos, sinais de que estão sendo vítimas do referido crime.

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Muitas vezes, uma criança que era extrovertida passa apre-


sentar os seguintes sintomas:

• recusa de ir para a escola;


• tendência ao isolamento;
• falta de apetite;
• insônia e dor de cabeça;
• queda no desempenho escolar;
• febre e tremor.

O agressor também é capaz de dar sinais, criando um


perfil próprio, pois, sente prazer na dor alheia, e é capaz de
fazer tudo conscientemente, mesmo assim, não alimenta o
sentimento de compaixão. Geralmente, mantém um padrão
nas suas vítimas, buscando por aqueles alunos mais tímidos,
novatos, que possua alguma particularidade física ou psicoló-
gica.
No mesmo ano da produção deste artigo, aconteceu na
data de 27 de março, um horrendo crime que apenas corro-
bora com a ideia da grande necessidade do policiamento es-
colar. O fato acorreu em São Paulo, numa escola chamada
Thomazia Montoro, um aluno de 13 anos de idade matou sua
professora a golpes de facas e deixou mais cinco pessoas fe-
ridas.

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A professora Elisabete tenreiro, de 71 anos de idade, já


era aposentada e voltou a ministrar aulas com uma ideologia
de contribuir de alguma forma com a sociedade, todavia, após
ser atingida ela sofreu uma parada cardíaca e morreu no Hos-
pital universitário da USP. Os pais do estudante relataram para
CNN Brasil, que notaram que nos últimos dias o filho andava
muito violento e que planejavam conversar com ele.
Histórias como essas poderiam deixar de existir ou di-
minuir drasticamente com aplicação de uma educação voltada
não somente para o ensino das ciências, mas também de uma
educação voltada para a vida, para a evolução do homem en-
quanto um ser social que necessariamente tem que conviver
em sociedade.
Outro caso muito interessante que auxilia na composi-
ção desta pesquisa, ocorreu em 31 de março de 2023, uma
menina autista e órfã sofreu bullying sendo humilhada por ou-
tras garotas no Colégio Estadual Flávio Ribeiro de Rezende,
localizado no município de Natividade, noroeste do Estado do
Rio de Janeiro.
O caso ganhou grandes proporções ao ser gravado e
seu vídeo alcançado o primeiro lugar nas plataformas de redes
sociais. É uma história bastante triste na qual as pessoas pre-
ferem filmar ao invés de intervir, aparentemente não sabe-se
qual caminho as crianças e os adolescentes estão seguindo,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mas sabe-se que existe uma grande necessidade de interven-


ção.

1.1.3 CONSUMO DE DROGAS NAS ESCOLAS

As drogas entraram na vida da humanidade há muitos


séculos, sejam elas lícitas ou ilícitas. De maneira incontrolável
elas se arrastam na confusão de crenças, religiões, fármacos,
ou simplesmente pelo bel-prazer. Mas, o presente trabalho vai
se limitar a falar sobre as drogas ilícitas que são consumidas
dentro das escolas no Brasil.
Essas substâncias psicoativas, além de causarem pro-
fundos problemas na sociedade, também acentua um forte
empecilho para a saúde pública. O dependente ou usuário,
acarreta problemas na sua vida pessoal, ocupacional, escolar,
entre outras diversas áreas.
O consumo de álcool e maconha são os mais comuns,
entretanto, existem outra diversidade de drogas que também
fazem parte do cotidiano de vários adolescentes. Numa pes-
quisa (2019) realizada por Manoel Messias Gomes3, com 90
alunos de duas escolas da rede pública, na cidade de Antônio

3
Mestre em Ciências da Educação pelo Instituto Superior de Edu-
cação de Brasília, doutorado pela Universidade Grendal do Brasil
(Unigrendal)
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Martins-RN, constatou-se altos índices de consumo de álcool


pelos alunos.
De acordo com os dados revelados nessa pesquisa,
como se pode ver logo abaixo, a maioria das pessoas que con-
sumiu álcool, possuía uma renda familiar menor do que 1 (um)
salário-mínimo. Com isso, pode-se dizer que, em muitos ca-
sos, esse consumo exagerado de bebidas alcoólicas acontece
por fatores sociais e econômico.

Figura 01: percentual de alunos que já ingeriram bebida alcoólica

Fonte: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/7/consumo-de-
drogas-licitas-e-ilicitas-entre-jovens-nas-escolas-da-cidade-de-antonio-
martins-rn

Outro ponto interessante de se abordar é que dos en-


trevistados 70% dos que consumiram álcool era do gênero
masculino, e apenas 30% eram do gênero feminino. Possivel-
mente, traços culturais de um patriarcado em que o homem
necessita mostrar algo para se destacar entre os outros.
23 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nessa mesma pesquisa, também foram analisados os


dados relativos ao consumo de drogas ilícitas, e 80% afirma-
ram conhecer alguém viciado em crack, 14% disseram que co-
nhece alguém viciado em maconha, e apenas 6% disseram
não conhecer ninguém que use drogas. São dados preocu-
pantes, pois 94% dos alunos estão expostos ao consumo de
drogas, e isso acaba em alguns casos, sendo levado para den-
tro da escola, pois, o tráfico está crescendo todos os dias.

Figura 02: consumo de drogas ilícitas

Fonte: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/7/consumo-de-
drogas-licitas-e-ilicitas-entre-jovens-nas-escolas-da-cidade-de-antonio-
martins-rn

1.2 O POLICIAMENTO ESCOLAR

O policiamento comunitário escolar é uma modalidade


de policiamento que foi instituído pela polícia militar, tendo

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como finalidade aproximação da polícia militar da comunidade


escolar. O policiamento escolar no Brasil não possui uma data
unificada, pois, cada estado passou a montar seu grupo de
patrulhamento escolar.

De forma geral, a militarização das escolas sempre


existiu, quando não era parcial, era uma escola totalmente mi-
litar. Entretanto, durante o período de ditadura no Brasil, o mi-
litarismo tomou rumos repreensivo, atrapalhando a educação
com sua censura. Foi com o final da ditadura que os militares
diminuíram sua presença nas escolas, como um símbolo de
liberdade e democracia.

Mas, sua ausência foi sentida quando professores e


gestores perderam a voz e o comando em alguns casos, os
alunos passaram a ser insubordinados e já não obedeciam às
regras das instituições. Com o aumento de casos de consumo
de drogas e de violências nas escolas, seja de aluno-aluno ou
aluno-professor, a polícia militar sentiu a necessidade de criar
projetos que pudessem coibir ou amenizar essas situações ad-
versas.

Para sustentar bibliograficamente esse trabalho, vamos


usar como referência a Patrulha Escolar Comunitária do es-
tado do Paraná. Nas palavras de Daniel Neumann:

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A Patrulha Escolar, que surgiu no Paraná no


ano de 1994, teve par objetivo inicial a redu-
ção da criminalidade no ambiente escolar,
isto par meio do patrulhamento e de perma-
nência em áreas internas, externas e adja-
centes dos estabelecimentos de ensino, di-
recionando a ação da Polícia Militar a prote-
ção das crianças e adolescentes. Com seu
aperfeiçoamento para "projeto de governo",
o policiamento escolar foi reciclado e melhor
estruturado dentro da filosofia de policia-
mento comunitário, passando a ser doutrina-
riamente denominado Patrulha Escolar Co-
munitária, a qual hoje atua na prevenção
(ações proativas), e supletivamente, na re-
pressão, da criminalidade e da violência,
dando ênfase, porém, na atividade de as-
sessoramento e consultoria no que se refere
a segurança no ambiente escolar e fora
deste. (NEUMANN, 2005, ONLINE)

Para chegar ao modelo que hoje se encontra, esse pro-


grama passou por diversas modificações, tendo como autor o
Capitão José de Oliveira, atualmente Major. Esse programa
abraça 163 escolas no estado do Paraná.

1.2.1 O PROGRAMA EDUCACIONAL DE RESISTÊNCIA ÀS


DROGAS E À VIOLÊNCIA (PROERD)

O PROERD é um programa educacional de resistência


às drogas e à violência, ele foi criado nos Estados Unidos, na

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

década de 80, é desenvolvido em mais de 58 países. Estudan-


tes do quinto ano do ensino fundamental das redes pública e
particular são os alvos do programa, que tem como lema
“Manter Nossas Crianças Longe das Drogas”.
O objetivo era promover uma ação que procurasse le-
var a população o conhecimento de que suas crianças e jo-
vens estavam cada vez mais cedo se envolvendo com o con-
sumo de drogas, sendo necessário uma intervenção para que
algo pudesse ser feito antes do primeiro contato com drogas,
então, necessitava-se cortar o mal pela raiz.
Foi assim que alguns pedagogos e psicólogos se junta-
ram para desenvolver um programa que pudesse ser aplicado
nas escolas, com a presença do policial fardado, de uma forma
que fosse possível uma proximidade entre polícia, escola e fa-
mília, trabalhando essa parte educacional de ensinar as crian-
ças a resistirem e a dizer não a esse grande mal.
De acordo com os dados do Ministério da Educação:

O Proerd promove curso de quatro meses,


ministrado por policiais militares voluntários,
capacitados pedagogicamente, em parceria
com pais, professores, estudantes e comu-
nidades. Com ênfase na prevenção ao uso
de drogas, as aulas mostram ao estudante
como se manter longe de más companhias,
a evitar a violência, a resistir às pressões di-
retas ou indiretas e a sempre acionar os pais

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ou responsáveis quando necessário. Na Es-


cola-Classe 401 do Recanto das Emas, ci-
dade-satélite do Distrito Federal, o Proerd é
aplicado desde 2004. De acordo com a su-
pervisora pedagógica Ana Caroline da
Costa, os estudantes envolvem-se com o
curso de tal maneira que mesmo após a con-
clusão mantêm atuação em sala de aula, em
forma de trabalhos e produção de textos. “A
escola é um agente transformador da socie-
dade”, constata Ana Caroline. “Colaborar
para que as crianças tomem uma decisão
consciente é fundamental.” O coordenador
do Proerd no Distrito Federal, Eduardo Ma-
tos de Souza, salienta que os ensinamentos
transmitidos pelo programa permitem aos jo-
vens tomar decisões inteligentes. “Contribu-
ímos com a solução de um problema que
está cada vez mais evidente na sociedade”,
afirma. As escolas interessadas em partici-
par do Proerd devem entrar em contato com
a Polícia Militar da cidade na qual se locali-
zam (MEC)

No Brasil, foi apenas em 1992 que aconteceu a implan-


tação deste programa, iniciado através da polícia militar do Es-
tado do Rio de Janeiro, possuindo a finalidade de alcançar o
mesmo sucesso que foi atingido nos Estados Unidos com a
incrementação desse programa. Seu tema principal era “diga
não as drogas”, introduzido por meio da parceria entre milita-
res e escolas.
Após bons resultados no Rio de Janeiro, em 1998, po-
liciais militares do Estado do Rio Grande do Sul se deslocaram

28 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

até São Paulo para receberem a capacitação necessária, tor-


nando-se assim instrutores do PROERD. O bom desempenho
no Sul do país repercutiu tanto que houve reconhecimento in-
ternacional, quando a instituição precursora DARE, centro
educacional americano criado pela Professora e Psicopeda-
goga Ruth Rich dos Estados Unidos, reconheceu e atribuiu o
título de Centro MERCOSUL de Formação PROERD.
O programa possui uma série de objetivos em prol de
uma reeducação às crianças e adolescentes que já tiveram e
as que não tiveram contato com o mundo das drogas. De
acordo com o portal da polícia militar de Santa Catarina, além
da visão de obter a aprovação da sociedade no êxito de suas
ações em prol do controle e resistência às drogas e conse-
quentemente da violência, o PROERD objetiva:

a. Conscientizar as crianças e os adolescen-


tes quanto aos efeitos negativos do uso de
drogas lícitas, ilícitas e prevenção às violên-
cias; b. Fortalecer a autoestima das crianças
e adolescentes, mostrando opções de vida
saudável, longe das drogas e da violência; c.
Sensibilizar as crianças e adolescentes para
valores morais e éticos, que visualize a
construção de uma sociedade mais justa sa-
dia e feliz; d. Esclarecer aos pais e/ou res-
ponsáveis quanto aos efeitos negativos das
drogas e da importância do fortalecimento
da estrutura familiar; e. Prevenir a criminali-
dade, uma vez que, segundo dados estatís-

29 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ticos, uma grande parte dos crimes, especi-


almente os mais graves, com destaque para
os homicídios, estão relacionados às dro-
gas, direta ou indiretamente; f. Preparar os
Policiais Militares com técnicas pedagógicas
adequadas para ministrarem aulas para cri-
anças, adolescentes e pais e/ou responsá-
veis; g. Ensinar e aprofundar os conheci-
mentos dos Policiais Militares quanto às dro-
gas lícitas e ilícitas; h. Fortalecer a interação
entre a Polícia Militar e a comunidade, propi-
ciando um clima de parceria e confiança, ge-
rando informações e o cumprimento do pa-
pel social da Instituição (PORTAL DA POLI-
CIA MILITAR DE SANTA CATARINA, 2021).

Por meio desses objetivos podemos perceber que o


programa não busca somente envolver as crianças, mas tam-
bém a família, abordando os efeitos negativos que as drogas
trazem, sendo essas consequências físicas e sociais. Usando
valores éticos e morais, buscam construir uma sociedade justa
por meio da educação entre crianças e adolescentes.
Utilizando uma filosofia mediadora, o programa Educa-
cional de Resistência as drogas e a violência se diferem por
viabilizar uma educação com valores dentro do ambiente es-
colar, proporcionando uma nova visão a respeito dos conflitos,
envolvendo estudantes e professores em prol da prevenção à
violência escolar.
Pode-se afirmar que o Proerd é um programa de forma-

30 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ção filosófica e humanista, tendo sua construção em dados ci-


entíficos, preparando crianças e adolescentes para tornarem-
se adultos com melhores oportunidades e condições de vida.
Após alcançar seus objetivos de exposição de valores morais
e de relações interpessoais, o programa satisfaz sua função
social que é promover esse novo modelo de educação.

1.3 A IMPORTÂNCIA DO POLICIAMENTO NAS ESCOLAS

Não é de hoje que todos sabem a importância da polícia


para a sociedade, a polícia militar, municipal ou comunitária é
a base que sustenta a segurança pública, pois, todos os dias
estão nas ruas enfrentando a violência expressiva que se ar-
rasta no cotidiano de toa a sociedade. Prestando serviços para
manter o bem-estar social, em todos os lugares que se encon-
tra uma guarnição, já passa a sensação de maior segurança.
No ambiente escolar também não é diferente, a pre-
sença da polícia militar ou comunitária é capaz de passar essa
segurança e servir como uma espécie de repelente contra a
violência, pois, só o fato de estarem presente naquele ambi-
ente as pessoas passam a ter medo de realizar algum ato ilí-
cito ou gerar algum tipo de tumulto.
Melhorando a relação entre os alunos e entre professo-
res e alunos a presença do policiamento escolar é capaz de

31 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

desmistificar a falsa imagem que a polícia é violenta e que faz


uso indevido da força, pois, ao crescer junto com a polícia a
comunidade se aproxima dos ideais da segurança pública, en-
tendendo que os militares não lutam contra pessoas e sim con-
tra o crime.
De fato, a polícia militar não disciplina os estudantes so-
mente com sua presença, mas através das realizações de pa-
lestras, encontros com a comunidade, até mesmo levando en-
tretenimento para as crianças e adolescentes, como por exem-
plo: realizando gincanas e dinâmicas capazes de trazem uma
reflexão sobre a vida e os caminhos mais corretos a serem
seguidos.
Em parceria com ações pedagógicas e ações da Polícia
Militar, ao desenvolver um trabalho intervencional em parceria
com as instituições de ensino, por meio do Programa Educa-
cional de Resistência às Drogas e à Violência, existe um bom
resultado numa perspectiva social.
Nesse sentido, os principais desafios foram quanto à
forma de orientação mais adequada ao público-alvo e a inser-
ção da família como base fundamental para o sucesso do pro-
grama. As ações desenvolvidas estão ajudando a minimizar
riscos, de forma a propiciar melhores condições para o exer-
cício da cidadania, na direção de uma transformação social.

32 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O PROERD criado há mais de 20 anos com esse obje-


tivo de prevenir uso de drogas e reduzir a violência em nossa
sociedade, em duas décadas já atendeu quase milhares de
alunos. No Maranhão o programa atende estudantes da edu-
cação de jovens e adultos, entre 35 e 40 anos de idade, com
deficiência física e mental. Observamos que o impulso é o
amor a segurança e a vida, não importando em qual circuns-
tância o agente se encontre.
Não há dúvida que o papel do instrutor do Proerd é de
uma relevância incomensurável, a sociedade está acostu-
mada a observar o policial como uma pessoa rude, e isso já é
um estereótipo criado pela mídia. Ser instrutor do programa é
torna-se alguém altamente preparado, com uma qualificação
humana bem visível, para poder contribuir com a formação in-
tegral dos jovens.
As escolas que optaram por essa via de controle de vi-
olência e drogas, puderam constatar a diminuição radical do
número de ocorrências dentro da instituição, fundamentando
essa afirmativa, citaremos um trecho de uma revista eletrônica
do Estado do Amazonas, chamada Nova Hileia:

Entre os anos de 2015 e 2017, situações


como agressão verbal e física, ameaças,
porte de arma e uso de drogas e bebidas al-
coólicas dentro de escolas de São Luís caí-
ram gradativamente. Em 2015, por exemplo,
33 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

foram 191 ocorrências de furto em escolas –


contra apenas 33 no ano de 2017. Uma
queda de 83%. Isso se dá ao fato dos polici-
ais ministrarem palestras mais informais, ri-
cas em conteúdo que fazem com que os jo-
vens entendam que têm direitos e também
obrigações (SILVA, ZOGAHIB, 2017, p.11).

A primeira vista, esses são os resultados benéficos que


a presença da polícia acarreta na vida da comunidade escolar,
entretanto, os efeitos a longo prazo podem ser observado fora
nas instituições educacionais, estendendo-se até a comuni-
dade acerca.
Explicando de forma mais objetiva, crianças e adoles-
centes crescendo bem conscientizados são capazes de se tor-
narem adultos que guardam os princípios aprendidos durante
a infância, valorizando a moral e a ética. Com uma comuni-
dade formada por pessoas bem instruídas, o número de agen-
tes que se desvirtuam socialmente, reduz drasticamente.
Cada pessoa é capaz de repassar o que tem, quando o
adulto possui uma base educacional bem desenvolvida ele
busca repassar isso para seus filhos, e assim, como se esti-
vesse contido no DNA, a educação tornasse um fator cultural
positivo, diante das mazelas que a sociedade enfrenta todos
os dias.
O governo tem investido bastante nessa política pú-
blica, investindo em tecnologia de ponta, Iluminação diferente,
34 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

rádio digital, rastreamento via satélite, são essas característi-


cas de novas viaturas, e muitas delas são destinadas à esco-
las. Apesar desse grande esforço, esse programa de policia-
mento não é o salvador da pátria, capaz de resolver tudo so-
zinho, seria utópico falar que isso seria o bastante. Ele funci-
ona como um auxiliador das políticas públicas que visam a se-
gurança e a diminuição da violência, do consumo e do tráfico
de drogas.
De uma maneira preventiva a polícia militar busca coibir
a presença de infratores e delinquentes nas imediações e in-
ternamente das escolas. Isso gera uma maior segurança aos
alunos e aos professores. Fora o trabalhou interno, a polícia
também faz ronda durante os horários de entrada e saída dos
colégios. Isso porque as vezes na saída da escola o adoles-
cente se depara com pessoas má intencionadas que buscam
inibir alunos e servidores com a intensão de cometer furtos e
roubos no local. Existem vários relatos de pais que ao chegar
na porta do colégio para buscar os filhos, tem seus pertences
levados, como carros, celulares e carteiras.

1.3.1 RELATO PESSOAL DE EXPERIÊNCIA COM PROERD

No ano de 2022, após a conclusão do meu Curso de


Formação para Policial Militar, tive o privilégio de trabalhar no

35 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violên-


cia. Trabalhei em várias escolas durante esse ano, e sempre
tive a certeza de que as aulas não eram em vão, pois pude ver
nos rostos das crianças que elas queriam um mundo melhor e
mais calmo para elas e seus familiares. A foto acima foi tirada
em setembro de 2022, na Escola de Ensino Infantil Terezinha
Kalume, com o 3º ano.

Figura 03: PROERD

Fonte: arquivo pessoal

Defino que a Polícia Militar dentro do ambiente escolar


é modelo de política preventiva e intervencional, agindo em
parceria na resolução de conflitos. Não existe maneira melhor
de combater à violência e às drogas do que com a união de
todos os setores da sociedade: escola e segurança pública.

36 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Essa é a combinação perfeita para enfrentar esse pro-


blema social, melhorando ainda a imagem dos policiais que,
muitas vezes, são vistos pela comunidade apenas como uma
instituição repressora. Após o envolvimento dos agentes de
polícia nas escolas, eles passam a ser vistos como educado-
res e não mais como um inimigo da comunidade.
Eu amo a minha farda, a comparo como minha segunda
pele, em todos os momentos eu sei o que represento e quem
represento, estou pronta para ajudar quem precisa, principal-
mente as crianças de nosso Estado, que serão o futuro de
nosso país. É um amor social, por isso escolhi trabalhar com
PROERD em favor dessas crianças.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a conclusão da presente pesquisa compreende-


mos que o ambiente escolar é um local destinado a educação
infantil, jovens e adultos, com a finalidade do desenvolvimento
do aluno, construindo assim uma formação básica. Entretanto,
com o passar dos tempos a violência e o consumo de drogas
invadiu essas instituições tentando desvirtuar sua finalidade,
mas o Estado, como representante da Lei e da segurança, pro-
move políticas públicas através da Polícia Militar e seus pro-
gramas.

37 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sem dúvida alguma a importância do policiamento es-


colar é nítida aos olhos da sociedade, pois, por ser um pro-
grama desenvolvido por psicólogos, pedagogos e agentes de
segurança pública americana, possui esse respaldo científico
que permite tratar com seriedade os problemas sociais esco-
lares em evidência na presente pesquisa.

De fato, essa violência e predisposição ao uso de dro-


gas é visto como um problema social e cultural, por isso o pro-
grama de policiamento escolar não busca somente o envolvi-
mento com alunos, mas sim com toda a comunidade.

Podemos concluir que o policiamento escolar pode não


resolver todos os problemas, mas possui eficácia suficiente
para transmitir um novo modelo de educação que servirá não
somente para a vida profissional desses alunos, mas para o
seu desenvolvimento pessoal como cidadão cheio de direitos
e deveres.

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las.com.br/blog/importancia-de-um-ambiente-escolar-sauda-
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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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Disponível em: https://educapes.capes.gov.br/bitstream/ca-
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sença da polícia militar nas escolas de Curitiba e seus re-
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erj.edu.br/artigos/19/7/consumo-de-drogas-licitas-e-ilicitas-
entre-jovens-nas-escolas-da-cidade-de-antonio-martins-rn.
Acesso em: 26 fev. 2023.

SENADO NOTÍCIAS. Violência nas escolas: especialistas


reforçam importância de acolhimento de estudantes
Fonte: Agência Senado. Disponível em: https://www12.se-
nado.leg.br/noticias/materias/2022/06/08/violencia-nas-escola
s-especialistas-reforcam-importancia-de-acolhimento-de-es-
tudantes. Acesso em: 1 fev. 2023.

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SENGE, Peter Michael. A Quinta Disciplina: Arte e Prática


da Organização que aprende. 15. ed. São Paulo: Best Seller,
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ronda escolar como modalidade de policiamento comunitário.
In: Nova Hileia, Manaus, v. 3, n. 3, p. 11, jul./2017. Disponível
em: http://repositorioinstitucional.uea.edu.br/bitstream/riuea
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TODA MATÉRIA. Bullying. Disponível em: https://www.toda-


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UOL. É preferível praticar ou sofrer uma injustiça? Dispo-


nível em: https://educacao.uol.com.br/bancoderedacoes/reda-
coes/ o-homem-nasce-justo-a-injustica-o-corrompe.htm.
Acesso em: 6 mar. 2023

40 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2
A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
EM CASOS DE TRABALHO NO BRASIL EM CONDIÇÃO
ANÁLOGA AO DA ESCRAVIDÃO

THE PERFORMANCE OF THE PROSECUTION OFFICE OF


LABOR IN LABOR CASES IN BRAZIL IN A CONDITION
ANALOGOUS TO SLAVERY

Matheus Mesquita da Silva4


Williane Tibúrcio Facundes5

SILVA, Matheus Mesquita da. A atuação do Ministério Pú-


blico do Trabalho em casos de trabalho em condição aná-
loga à escravidão no Brasil. Trabalho de Conclusão de
Curso de graduação em Direito – Centro Universitário UNI-
NORTE, Rio Branco, 2023.

4
Discente do 9º período do curso de Bacharelado em Direito pelo Centro
Universitário UNINORTE.
5
Docente do Curso de Direito do Centro Universitário UNINORTE. Gradu-
ada em Direito pela U:VERSE, Especialista em Psicopedagogia pela Fa-
culdade Varzeagrandense. Graduada em Letras Vernáculas pela Universi-
dade Federal do Acre-UFAC.

41 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente artigo trata sobre a atuação do Ministério Público


do Trabalho frente aos casos de trabalho em condição análoga
à escravidão no Brasil. Como auxílio teórico procedeu-se uma
análise histórica dos meios de trabalhos em condições análo-
gas à escravidão no Brasil, em conjunto com a pesquisa das
atribuições e recursos utilizados pelo Ministério Público do
Trabalho no combate a essas práticas delituosas, com base
no ordenamento jurídico brasileiro. Nessa perspectiva, proce-
deu-se o estudo com base em pressupostos e conceitos do
Direito Penal, Direito do Trabalho e Direito Constitucional, dis-
correndo o parecer de doutrinadores e de informações apre-
sentadas por meios de comunicação.

Palavras-chave: Ministério Público do Trabalho; trabalho aná-


logo a escravidão; direitos individuais indisponíveis.

ABSTRACT

The present article deals with the actions of the Public Prose-
cution Office of Labor in cases of work in conditions analogous
to slavery in Brazil. As a theoretical aid, a historical analysis of
the means of work in conditions analogous to slavery in Brazil
was carried out, together with research on the attributions and
resources used by the Public Prosecution Office of Labor in
combating these criminal practices, based on the Brazilian le-
gal system. In this perspective, the study was based on as-
sumptions and concepts of Criminal Law, Labor Law, and Con-
stitutional Law, discussing the opinion of doctrinators and in-
formation presented by the media.

Keywords: Public Prosecution Office of Labor; labor analo-


gous to slavery; unavailable individual rights.
42 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda a atuação do Ministério Pú-


blico do Trabalho diante dos casos de trabalho em condição
análoga a escravidão no Brasil, prática delituosa que fere o
ordenamento jurídico brasileiro, nos âmbitos Penal, Traba-
lhista e Constitucional.
Com a proibição da prática do escravismo, com a as-
sinatura da Lei Áurea em 1888, surgiu no Brasil uma nova mo-
dalidade de trabalho forçado, denominado: “trabalho em con-
dição análoga à escravidão”, a qual pode ocorrer de diversas
formas, como por exemplo com jornadas exaustivas; supres-
são da liberdade; em decorrência de dívidas; e dentre outras.
Ademais, o Brasil ratificou a Convenção N. 29 da OIT
(Organização Internacional do Trabalho), na qual o Brasil se
compromete a combater o trabalho em condição análoga à es-
cravidão, possuindo, os acordos internacionais ratificados pelo
Brasil, status de norma constitucional.
Em decorrência da ofensa ao Estado de Direito com a
existência de trabalhos em condições análogas à escravidão
no Brasil, urge-se, por parte do Ministério Público do Trabalho,
a supressão de tais delitos, o qual possui legitimidade ativa
para propor ações perante a Justiça, com o fim de resguardar
os direitos individuais indisponíveis.

43 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A atuação do Ministério Público do Trabalho se dá,


dentre outras formas, por meio da criação de coordenadorias
nacionais temáticas, como a CONAETE, que é a Coordenado-
ria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrenta-
mento ao Tráfico de Pessoas, e do GEFM que é o Grupo Es-
pecial de Fiscalização Móvel.

2.1 O TRABALHO EM CONDIÇÃO ANÁLOGA A ESCRAVI-


DÃO

A escravidão no Brasil existiu, sem oposição definitiva


do Estado, por mais de 300 anos, deixando cicatrizes que per-
duram até a atualidade, sendo uma delas, o trabalho análogo
a escravidão, que leva milhares de pessoas a viverem em con-
dição de submissão forçada, com jornadas exaustivas, baixa
ou nenhuma remuneração e em condições insalubres.
A assinatura da Lei Áurea em 1888 não foi o suficiente
para extinguir por completo o serviço forçado no Brasil. Por
mais que legalmente seja extremamente proibido qualquer
tipo de trabalho forçado, o Brasil ainda registra grande número
de pessoas em condição análoga à escravidão.
Diferentemente da escravidão existente precedente-
mente a assinatura da Lei Áurea, a escravidão contemporânea

44 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

não fere apenas a dignidade humana, mas também as leis vi-


gentes no Estado que asseguram a liberdade, a vida e a sa-
úde, sendo as pessoas aliciadas, forçadas a exaustivas jorna-
das de trabalho em péssimas condições, englobando pratica-
mente todos os ramos de trabalho, como por exemplo agricul-
tura, trabalhos domésticos e construção (Organização Interna-
cional do Trabalho, 2022).
O ordenamento jurídico brasileiro trata sobre o crime de
imposição do trabalho análogo a escravidão a outrem, e as
sansões para esse ato delituoso que apresenta diversas faces,
constando no art. 149 do Código Penal (BRASIL, 1940) que:

Art. 149. Reduzir alguém a condição aná-


loga à de escravo, quer submetendo-o a tra-
balhos forçados ou a jornada exaustiva, quer
sujeitando-o a condições degradantes de
trabalho, quer restringindo, por qualquer
meio, sua locomoção em razão de dívida
contraída com o empregador ou preposto:
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa,
além da pena correspondente à violência.
§ 1 o Nas mesmas penas incorre quem:
I - cerceia o uso de qualquer meio de trans-
porte por parte do trabalhador, com o fim de
retê-lo no local de trabalho;
II - mantém vigilância ostensiva no local de
trabalho ou se apodera de documentos ou
objetos pessoais do trabalhador, com o fim
de retê-lo no local de trabalho.

45 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

§ 2 o A pena é aumentada de metade, se o


crime é cometido:
I - contra criança ou adolescente;
II - por motivo de preconceito de raça, cor,
etnia, religião ou origem. (BRASIL, 1940)

No Brasil, popularmente, o trabalho forçado é lembrado


na sua forma anterior a abolição da escravatura, como por
exemplo com a compra e venda de pessoas, uso de chicotes
e troncos, porém, o art. 149 do Código Penal do Brasil apre-
senta quatro formas de classificação do trabalho forçado na
atualidade, que vão além das condições historicamente co-
nhecidas:

1. Supressão da Liberdade: são atos que impossibili-


tam a dissolução do elo existente entre o empregador e
o trabalhador, quando este não tem mais interesse na
continuidade do serviço, podendo ocorrer por meio de
agressões físicas, retenção de documentos ou de salá-
rios, pelo isolamento como consequência da localiza-
ção geográfica e amedrontamento. Com práticas como
essas o vínculo entre o trabalhador e o empregador são
prolongados pela imposição da força;
2. Condições degradantes de trabalho: ocorre quando
o local de trabalho não é adequado, quando o trabalho

46 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ocorre sob agressões físicas e psicológicas, com baixa


qualidade e quantidade de comida e bebida, colocando
a vida e a saúde do trabalhador em risco. O ambiente
de trabalho deve ser propicio para o bom exercício das
funções e evitando a insalubridade e como consequên-
cia os riscos para os trabalhadores.
3. Servidão em decorrência de dívida: se dá diante da
a imposição do trabalho forçado mediante cobrança de
dívidas ilegais contraídas com os empregadores e pre-
postos, como por exemplo a cobrança fraudulenta de
transporte, hospedagem, alimentação e instrumentos
de trabalho. A cobrança fraudulenta de dívidas gera um
ciclo vicioso e uma dívida crescente, pois em muitos
dos casos os valores cobrados aos trabalhadores não
são compatíveis com a remuneração que recebem dos
empregadores.
4. Jornada exaustiva: ocorre ao ser imposto ao traba-
lhador uma jornada de trabalho excessiva, gerando pre-
juízo a saúde em decorrência do esgotamento físico e
mental, podendo ocasionar até o risco a vida. Muitos
são os entendimentos sobre o que é necessário para se
considerar a ocorrência do trabalho em condição aná-
loga à escravidão, como a existência de coação física

47 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da liberdade, privação do direito de ir e vir, dentre ou-


tros, porém, de acordo com o Ministério do Trabalho e
Previdência o trabalho em condição análoga à escravi-
dão ocorre da seguinte forma:

Considera-se trabalho realizado em condi-


ção análoga à de escravo a que resulte das
seguintes situações, quer em conjunto, quer
isoladamente: a submissão de trabalhador a
trabalhos forçados; a submissão de traba-
lhador a jornada exaustiva; a sujeição de tra-
balhador a condições degradantes de traba-
lho; a restrição da locomoção do trabalha-
dor, seja em razão de dívida contraída, seja
por meio do cerceamento do uso de qual-
quer meio de transporte por parte do traba-
lhador, ou por qualquer outro meio com o fim
de retê-lo no local de trabalho; a vigilância
ostensiva no local de trabalho por parte do
empregador ou seu preposto, com o fim de
retê-lo no local de trabalho; a posse de do-
cumentos ou objetos pessoais do trabalha-
dor, por parte do empregador ou seu pre-
posto, com o fim de retê-lo no local de traba-
lho. (BRASIL, 2020).

2.1.1 O TRABALHO ANÁLOGO A ESCRAVIDÃO E A ECO-


NOMIA

De acordo com Consolidação das Leis do Trabalho


(BRASIL, 1943), é uma obrigação do empregador o paga-
mento do salário; 13º salário; rescisão em caso de demissão
48 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ou licenças; férias; e o Fundo de Garantia por Tempo de Ser-


viço, além do tempo máximo de trabalho semanal de 44 horas,
sendo estes, direitos dos trabalhadores que aumentam os gas-
tos na contratação de mão de obra e que diminuem a produ-
ção.
A economia é o principal fator para a continuidade dos
trabalhos em condição análoga a escravidão, pois a grande
competitividade econômica gera pela parte dos aliciadores de
trabalhadores, o desejo de mão de obra barata, e o desejo de
uma produção em massa maior em um espaço de tempo me-
nor, possibilitando a entrada no mercado econômico com pre-
ços mais atrativos para os compradores em decorrência do
baixo custo de produção.
Conforme elenca SAKAMOTO (2020), o trabalho aná-
logo a escravidão na atualidade não é um vestígio das formas
remotas de produção que perduraram no meio capitalista, mas
sim um meio de se empreender de modo a alavancar a produ-
ção e a propagação dos produtos, sendo a exploração exces-
siva do trabalho, por meio do trabalho análogo a escravidão, a
mais cruel das ferramentas de produção, possibilitando a ne-
gócios ultrapassados um modo de se mantem competitivo em
um mercado globalizado. Dessa forma, empregadores atrasa-
dos, deslealmente, utilizam de artifícios ilegais para que os lu-
cros de seus empreendimentos sejam aumentados.

49 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Com a globalização e as redes de serviço terceiriza-


dos, na qual a fabricação e a customização de roupas e de-
mais objetos ocorrem em diversos lugares diferentes, com leis
trabalhistas diferentes, grandes empresas acabam por envol-
ver-se em casos de trabalho análogo a escravidão, como foi o
caso da empresa espanhola Zara que possuía como fornece-
dor um confeccionador que utilizava de mão de obra ilegal
para entregar os produtos (BERTÃO, 2014).
Referente ao tempo de jornada de trabalho, conforme
determina o art. 58 da CLT (BRASIL, 1943), a jornada normal
de trabalho na área privada não será superior as oito horas
diárias, porém há muitos casos de trabalhadores que excedem
esse limite preestabelecido, como é o caso de 25 trabalhado-
res bolivianos que trabalhavam mais de 12 horas por dia em
uma oficina de costura em Indaiatuba-SP (BAND, 2022).

2.1.2 DADOS REFERENTES AO TRABALHO ANÁLOGO AO


DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL

De acordo com o Ministério Público do Trabalho em Ala-


goas (2021), estimasse que entre os 1995 e 2020, mais de 55
mil pessoas foram resgatadas pelo Grupo Especial de Fiscali-
zação Móvel (GEFM) de trabalhos em condição análoga à es-
cravidão no Brasil, sendo esse, um número preocupante, não

50 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

apenas pela quantidade de pessoas, mas também pela gravi-


dade de tal condição e a afronta que ela representa para o
ordenamento jurídico brasileiro.

Segundo o G1, no ano de 2021 foram resgatadas 1.937


pessoas do trabalho em condição análoga à escravidão no
Brasil, um aumento de mais de 100% em comparação com o
ano de 2020 que teve 942 casos. No ano de 2022 foram res-
gatadas do trabalho forçado mais de 100 pessoas somente em
São Paulo, demonstrando que esse não é um problema que
se restringe apenas áreas menos densamente povoadas, mas
também a grandes centros urbanos.

De acordo com dados apresentados pelo Repórter Bra-


sil em parceria com a OIT (Organização Internacional do Tra-
balho), entre os anos de 2003 e 2018 foram resgatados 35.943
trabalhadores no Brasil, dentre o número de pessoas resgata-
das de trabalho em condição análogos a escravidão, aproxi-
madamente 95% desses eram homens e apenas 5% ou 1.889
eram mulheres, demonstrando uma grande disparidade numé-
rica entre os dois gêneros.

Porém, o número de mulheres em condição de trabalho


forçado é muito maior, conforme afirma a coordenadora naci-
onal de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas, do MPT, Lys Sobral Cardo ao R7 (2022):

51 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

“o número de mulheres é maior que o de homens, e elas estão


inseridas no mundo do trabalho como um todo”.

Isso se dá pelo grande número de casos de tráfico de


pessoas, o trabalho escravo doméstico e de exploração sexual
que não entram na conta total dos casos, não sendo o tráfico
de pessoas considerado uma forma de escravidão contempo-
rânea no Brasil, gerando o aumento da diferença porcentual
entre os casos de homens e de mulheres.

Além disso, outro ponto que interfere na aferição de da-


dos do número de mulheres em condição de trabalho análogo
a escravidão, é o fato de o trabalho sexual não ser por si só
um crime, dificultando o conhecimento da exploração exces-
siva nesses casos. Quanto essa questão, Lys Sobral Cardo
fala ao R7 (2022): “É um pouco diferente de chegar ao traba-
lhador rural, que está ali, sofrendo, e com a situação de escra-
vidão constatada. Na exploração sexual, há muitos casos que
passam batido”.

2.1.3 O HISTÓRICO DO TRABALHO EM CONDIÇÃO ANÁ-


LOGO AO DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL

De acordo com o Gazeta do Povo, na década de 1940,


durante a Segunda Guerra Mundial, mais de 50 anos após a

52 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

abolição da escravatura, brasileiros vivenciaram a realidade


do trabalho análogo ao da escravidão, ao serem convocados
para o serviço militar, atundo na extração do látex na Amazô-
nia, para a produção da borracha.

Os mais de 55 mil brasileiros que trabalharam com a


extração da seringa durando a Segunda Grande Guerra, esta-
vam submetidos, como classifica Oliveira (2015, apud Anto-
nelli, 2016), a “um sistema feudal escravocrata”.

O grupo de brasileiros que ficou conhecido como “Sol-


dados da Borracha” saiam de suas casas com as promessas
de enriquecimento, porém em muitos dos casos, ao chegarem
na Amazônia já se viam endividados, pois necessitavam pagar
pela alimentação, transporte e até pelos instrumentos de tra-
balho, gerando uma dívida crescente com os donos dos serin-
gais.

Em paralelo, há os casos de trabalhos análogos a es-


cravidão que ocorrem nos garimpos, no qual as pessoas vão
a esses locais em busca de riquezas, porém, se deparam com
trabalhos em péssimas condições, com água e comida de
baixa qualidade, sem instrumentos de proteção e altos valores
devidos aos donos dos garimpos. Desde o de 2008 foram res-
gatados mais de 300 garimpeiros que trabalhavam em condi-
ções ilegais (ANGELO, 2021).

53 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2.2 A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABA-


LHO NO COMBATE AO TRABALHO ANÁLOGO Á ESCRA-
VIDÃO

O Art. 127 da Constituição da República Federativa do


Brasil de 1988, define o Ministério Público da seguinte forma:
“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à fun-
ção jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e in-
dividuais indisponíveis.” (BRASIL, 1988), ou seja, é responsá-
vel por resguardar e tomar medidas em prol da ordem jurídica.
Quanto as atribuições do Ministério Público, GARCIA
(2017) afirma que é de competência do Ministério Público, em
decorrência do art. 1º da Lei n. 8.625/1993, a defesa da ordem
jurídica, devendo fazer a avalição das práticas dos órgãos que
compõem o Estado, sendo possível, para combater atos ile-
gais, que tome medidas pertinentes, mantendo assim todos os
atos dentro dos limites impostos pela Constituição Federal.
Segundo AMARAL (2019), O MP é o titular da ação
penal pública dentro do processo penal, surgindo como um
meio de demonstrar a responsabilidade do Poder Público não
é somente o de informar qual é o Direito, mas aliado a isso,
apresentar as denúncias, mantendo a imparcialidade mesmo
exercendo o dever de denunciar, agindo.

54 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

De acordo com Ministério Público do Trabalho (BRA-


SIL), o MPT é uma ramificação do Ministério Público da União
que possui como atribuição a defesa da ordem jurídica, do re-
gime democrático e dos interesses sociais e individuais indis-
poníveis no tange ao trabalho, atuando na defesa da ordem
jurídica no âmbito trabalhista e afirma que:

a Consolidação das Leis Trabalhistas dispôs


sobre o Ministério Público do Trabalho, que
tinha como função zelar pela observância da
Constituição Federal, das leis e demais atos
emanados dos poderes públicos.

2.2.1 MEIOS DE ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO


TRABALHO

O Ministério Público do Trabalho criou oito coordena-


dorias nacionais temáticas para tratar de casos mais sensí-
veis, que são: COORDINFÂNCIA, coordenadoria temática re-
lacionada a Crianças e Adolescentes; COORDIGUALDADE
pela promoção da igualdade; CONAFRET voltada para as
ocorrências de fraudes trabalhistas; CODEMAT relacionada
ao Meio Ambiente do Trabalho; CONAP voltada para a Admi-
nistração Pública; CONATPA relacionada ao Trabalho Portu-
ário e Aquaviário; e CONALIS voltada para a Liberdade Sindi-

55 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

cal e a CONAETE que é a Coordenadoria Nacional de Erradi-


cação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de
Pessoas, possuindo como finalidade o combate ao trabalho
escravo no Brasil.
Segundo o Ministério Público do Trabalho (BRASIL),
a CONAETE possui como principal missão a erradicação de
todas as modalidades de trabalho em condição análoga à es-
cravidão no Brasil, garantindo o direito a dignidade, liberdade
e os direitos inerentes as relações empregatícias, além da in-
tegração entre as Procuradorias Regionais do Trabalho a nível
nacional, sendo o combate feito de forma hegemônico e siste-
matizado, promovendo entre as promotorias um câmbio de in-
formações, assim como uma pronta ação onde for necessário.
Ademais, quanto os objetivos da Coordenadoria Naci-
onal de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas, MENEZES e MIZIARA (2020, p. 140) afir-
mam que: “A CONAETE tem como objetivo estabelecer um
plano nacional, uniforme e coordenado para combate ao tra-
balho análogo ao escravo e ao trabalho degradante, ao tráfico
de pessoa...”.
De acordo com o MPT (BRASIL), a atuação da CO-
NAETE se dá por meio de fiscalizações em ambientes de tra-
balho, ocorrendo de forma interna com equipes compostas
por: “Membros do Ministério Público do Trabalho, Auditores-

56 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Fiscais do MTE, servidores do MPT e do MTE, policiais fede-


rais ou policiais militares ambientais e, algumas vezes, por in-
tegrantes de organizações não governamentais”, atuando a
Coordenadoria nas áreas de enfrentamento ao trabalho es-
cravo contemporâneo; investigando os casos de obreiros em
condições de trabalho análogo a escravidão; servidões ocasi-
onadas por conta de dividas; períodos excessivos de trabalho
e condições de trabalho insalubres, relacionados ao estado do
ambiente de trabalho, da alimentação e da água, da segu-
rança dos trabalhadores e dos registros do funcionários.
O Ministério Público do Trabalho (BRASIL) fez a cria-
ção de grupos para auxiliar no combate ao trabalho escravo
contemporâneo como Grupo de Altos Estudos do Trabalho
(GAET) que foi criado no ano de 2019 com o objetivo de aferir
o mercado de trabalho do Brasil observando a modernização
das relações de trabalho, para assim realizar a promoção de
debates e diagnósticos sobre a economia e trabalho; direito do
trabalho e segurança jurídica; trabalho e previdência; e liber-
dade sindical. Dentre as ações do GAET estão:

1. Capacitação da rede de atendimento às vítimas de


escravidão contemporânea: tem o objetivo de capaci-
tar os profissionais da área de acolhimento e auxílio
as pessoas regatadas dos trabalhos em condições

57 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

análogas à escravidão, realizando essas capacitações


nas cidades com índices superiores de naturais res-
gatados;
2. Liberdade no ar: tem o objetivo de auxiliar na pro-
pagação de informações sobre o tráfico humano e tra-
balho análogo a escravidão, tocando os funcionários
dos aeroportos e empresas aéreas, portos e rodoviá-
rias, assim como os passageiros, por meio de várias
ações, como cursos, capacitações e seminários, ge-
rando aliados no combate a essas práticas criminosas;
3. Reação em Cadeia: atuação do MPT em cadeias
produtivas: tem como objetivo a elaboração de um re-
latório para análise, possuindo dados sobre as infor-
mações obtidas durante o projeto, por meio de deba-
tes com colaboradores internos e externos, para que
ocorra o empreendimento de soluções para o combate
as infrações no trabalho em cadeias produtivas de
maior relevância.

O Ministério Público do Trabalho realizou também a


criação do GT que são Grupos de Trabalho e o GE que são
Grupos de Estudo para a promoção de ações como:

58 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1. GT Fluxo migratório da Venezuela: tem como obje-


tivo o acompanhamento da Força-Tarefa Operação
Acolhida, além do oferecimento de apoio as regio-
nais possuam métodos de investigações que envol-
vam violações de direitos de trabalhadores vindos
da Venezuela;
2. GT Povos Originários, Comunidades Tradicionais
Quilombolas, de Terreiros, Ribeirinhas e Periféri-
cas: o objetivo desse grupo de trabalho é a siste-
matização da atuação do MPT, na promovendo o
respeito pelas Comunidades Tradicionais, resguar-
dando a essas comunidades o direito à liberdade;
3. GT Garimpo: possui como objetivo a promoção de
dignidade e segurança nos garimpos do Brasil,
além de coibir todos os tipos de trabalho escravo
contemporâneo nos garimpos brasileiro;
4. GE Escravidão, gênero e raça: grupo de estudo
para o incentivo ao estudo referente a escravidão,
gênero e raça, e suas convergências.

A Subsecretaria de Inspeção do Trabalho ou SIT é


uma subsecretaria subordinada à Secretaria de Trabalho e
possui como missão: “organizar, coordenar, avaliar e controlar

59 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

as atividades de auditoria e as auxiliares da inspeção do tra-


balho, bem como elaborar o planejamento estratégico para a
atuação da Inspeção do Trabalho.” (BRASIL, 2020).
A Inspeção do Trabalho do Brasil foi criada no ano de
1891, disciplinando a fiscalização de fabricas, locais nos quais
ocorriam trabalhos de crianças e adolescentes, e determinou
quais seriam os meios de segurança que deveriam ser toma-
dos e as condições para manter a saúde dos trabalhadores.
Ademais, com o passar do tempo, Inspeção do Traba-
lho do Brasil vem se desenvolvendo, buscando alcançar o
equilíbrio entre trabalhadores e empregadores, para que
desse modo o trabalho seja exercido em condições “seguras,
sadias, dignas e decentes, propiciando o desenvolvimento
sustentável das empresas e preservando a prosperidade fu-
tura da pátria” (BRASIL, 2020).
Na Convenção n° 81 da OIT, de 1947, foi estabelecido
os critérios para a Inspeção do Trabalho, no qual os inspetores
do trabalho possuem como missão assegurar que os direitos
dos indivíduos, referentes as condições de trabalho, sejam
resguardados, e que os trabalhadores no exercício dos seus
ofícios sejam protegidos, principalmente no que tange “à du-
ração do trabalho, aos salários, à segurança, à higiene e ao
bem-estar, ao emprego das crianças e dos adolescentes e a
outras matérias conexas.” (BRASIL, 2020)

60 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), cons-


tituído pela Subsecretaria de Inspeção de Trabalho da Secre-
taria de Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência, é
responsável por realizar inspeções com vista de resgatar víti-
mas em condição de trabalho análogo a escravidão, sendo
resgatadas mais de 40 mil pessoas desde a sua criação em
1995 (CONFORTI, 2013). O GEFM possui atuação de âmbito
nacional, englobando todo o território brasileiro, não estando
a sua atuação vinculada apenas a Delegacia Regional do Tra-
balho, conforme entendimento do Juiz Eduardo Tonetto Pica-
relli:

ADMINISTRATIVO. GRUPO ESPECIAL


DE FISCALIZAÇÃO MÓVEL DO MINISTÉ-
RIO DO TRABALHO. COMPETÊNCIA
PARA CRIAÇÃO, PLANEJAMENTO E CO-
ORDENAÇÃO. PORTARIAS Nº 549/95 E
369/96 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO.

Nos termos do art. 1º da Portaria nº 549/95,


do Ministério do Trabalho, a competência
para criar Grupo Especial de Fiscaliza-
ção Móvel e convocar Agentes de Inspeção
para integrá-lo é da Secretaria de Fiscaliza-
ção do Trabalho - SEFIT, após ouvida a Se-
cretaria de Segurança e Saúde do Trabalho
- SSST. 2. O planejamento e a coordenação
das ações dos Grupos Especiais de FISCA-
LIZAÇÃO MÓVEL é feito pelas Coordena-
ções Regionais, submetidas à Coordenação
Nacional, vinculada à SEFIT, a qual atua em
conjunto com a SSST, consoante dispõem
61 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os arts. 1º e 2º da Portaria nº 369/96 do Mi-


nistério do Trabalho.
3. As Portarias nº 549/95 e nº 369/96 não
afrontam a sistemática de fiscalização fi-
xada no Decreto nº 55.841/65, visto que res-
paldadas pela Lei nº 7.855/89, que, em seu
art. 7º, institui o Programa de Desenvolvi-
mento do Sistema Federal de Inspeção do
Trabalho e atribui ao Ministro do Trabalho a
competência para estabelecer os princípios
norteadores do referido Programa.
Nos termos do art. 1º da Portaria 369/96, o
planejamento e a coordenação das ações
dos Grupos Especiais de Fiscalização Mó-
vel pertencem às Coordenações Nacionais
e Regionais. Já a Coordenação Nacional é
vinculada à Secretaria de Fiscalização do
Trabalho.
No caso em tela, nos termos do documento
da fl. 82, a fiscalização ocorreu por determi-
nação da Secretaria de Fiscalização do Tra-
balho, que é o órgão hierarquicamente supe-
rior, à qual está vinculada a Coordenação
Nacional, não se vislumbrando ilegalidade
quanto à emanação da ordem.
Por outro lado, nos termos art. 2º da Portaria
549, de 14 de junho de 1995, a fiscaliza-
ção móvel tem atuação fiscal em todo o ter-
ritório nacional.
Gize-se que os apelantes, apegando-se à
delegação de competência prevista do De-
creto 55.841/65, fulcram a suposta ilegali-
dade da atuação da fiscalização móvel no
fato de que a Delegacia Regional do Traba-
lho não teve ciência da operação.
Relatam nas suas razões de apelo: “Tais fis-
cais intitularam-se integrantes de refe-
rido grupo Móvel de Fiscalização (...) sem
qualquer tipo de ciência ou participação dos

62 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fiscais lotados e designados na Delegacia


Regional do Trabalho do Paraná”.
E afirmam “. resultou desta fiscalização (irre-
gular no entender do Recorrente), inúmeras
autuações que desprezavam todas as ca-
racterísticas regionais da atividade laboral
desenvolvida, ignorando as peculiaridades
típicas e exclusivas de nosso estado”
As alegações são, sem dúvida, infundadas.
Ora, se o Grupo de Fiscalização Móvel é de
âmbito nacional, não vinculado a esta ou
aquela região, não se pode pretender que te-
nha que haver cientificação ou aprovação de
um órgão regional para que a fiscaliza-
ção de cunho maior, já que de âmbito nacio-
nal, seja realizada, mormente, quando insti-
tuída com o fim coibir a prática de formas de-
gradantes de trabalho em quaisquer recan-
tos do território nacional.
Por outro lado, a proteção ao trabalho é um
direito do empregado e um dever do Estado,
nada a tendo a ver com as peculiaridades re-
gionais. Por óbvio, que as normas de prote-
ção ao trabalho são aplicáveis em todo o ter-
ritório nacional, independente das caracte-
rísticas da região, e que a fiscalização do
trabalho atua no sentido de verificar o cum-
primento das referidas normas.
Desta forma, a portaria 369/96 não afronta a
sistemática de fiscalização fixada no De-
creto nº 55.841/65, não merecendo reforma
a sentença. (Brasil. Tribunal Regional Fede-
ral da 4ª Região. Apelação Civil nº
2000.04.01.088853-6/PR - AC. Juiz Eduardo
Tonetto Picarelli. Data de Julgamento:
27/11/2001, Terceira Turma, Data de Publi-
cação: DJ 30/01/2002).

63 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O Ministério Público do Trabalho faz a publicação do


Cadastro de empregadores, que também é conhecido como
“lista suja”, sendo responsável pela ampliação do conheci-
mento referente as condenações no âmbito administrativo em
consequência do uso do trabalho em condição análoga a es-
cravidão no Brasil, apresentando no cadastro a identificação
da pessoa que fez uso do trabalho escravo (BRASIL, 2018)
O Cadastro de empregadores é de grande importância
para o combate do Trabalho em condição análoga à escravi-
dão, pois garante a ampliação do conhecimento para casos de
ocorrência do trabalho análogo ao escravo, possibilitando que
haja transparência e auxiliando no controle social do combate
as práticas de trabalho ilegal.
Além disso, serve para auxiliar na organização dos ca-
sos que já ocorreram, fortalecendo formulação técnica da lista,
possibilitando que a do da “lista suja” seja mais técnica e me-
nos política, tornando-se assim, um dos meios mais importan-
tes para o combate ao trabalho escravo no Brasil (BRASIL,
2018)
Dentre os setores que mais apresentam casos de no-
mes constando na “lista suja” estão a agricultura e a criação
de animais, demonstrando que os setores que mais movimen-
tam a economia exterior do Brasil, são também os que mais

64 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

se utilizam do trabalho análogo a escravidão, além de apre-


sentar a maior ocorrência dessa pratica nos locais mais afas-
tados dos grandes centros urbanos, sendo o número de casos
na agricultura duas vezes maior que os casos na construção,
conforme apresentado no gráfico apresentado pela PÚBLICA
(2017):

Gráfico 01. Setores que figuram na Lista “Suja”

Fonte: Pública. (2017)

2.3 DOS DIREITOS INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS

A vida e a liberdade são direitos inerentes a pessoa


humana, resguardados pela maior lei do Brasil, a Constituição
65 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Federal. O Art. 5 da Constituição da República Federativa do


Brasil, de 1988, determina que todos são iguais perante a lei,
não havendo distinção de qualquer natureza, sendo garantido
a inviolabilidade do direito à vida, a liberdade, a igualdade e a
segurança aos brasileiros e aos residentes estrangeiros.
(BRASIL, 1988). MORAES (2021) conceitua como:

E quando se reporta a “direitos da pessoa


humana” e até dos “direitos e garantias indi-
viduais” como cláusula pétrea está falando
de direitos e garantias do indivíduo-pessoa,
que se faz destinatário dos direitos funda-
mentais “à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade”, entre outros di-
reitos e garantias igualmente distinguidos
com o timbre da fundamentalidade (como o
direito a saúde e ao planejamento fami-
liar. (MORAES, 2021. Posição 1638)

2.3.1 O COMBATE AO TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVI-


DÃO E A CONSTITUIÇÃO

O Governo do Brasil ratificou a Convenção N. 29 da


OIT (Organização Internacional do Trabalho), convenção que
ofereceu proposições em relação ao trabalho forçado ou obri-
gatório. Sobre as convenções ratificadas pelo Bra-
sil, SOUZA (2006. p. 463) afirma que: “No que tange aos re-

66 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

flexos das Convenções da Organização Internacional do Tra-


balho no ordenamento jurídico pátrio, podemos concluir afir-
mando que tais normas serviram e até hoje servem para a me-
lhoria das relações patrão-empregado”
O Art. 127 da Constituição da República Federativa do
Brasil (1988), define Ministério Público da seguinte forma, “O
Ministério Público é instituição permanente, essencial à fun-
ção jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e in-
dividuais indisponíveis.” (BRASIL, 1988), ou seja, é responsá-
vel por resguardar a ordem jurídica e os direitos individuais in-
disponíveis que compõem esse ordenamento.
Conforme redação do Art. 1º, do Anexo XIV, do Art.
2, do Decreto nº 10.088, de 5 de novembro de 2019: “os Mem-
bros da Organização Internacional do Trabalho que ratificam
a presente convenção se obrigam a suprimir o emprego do
trabalho forçado ou obrigatório sob todas as suas formas no
mais curto prazo possível” (BRASIL, 2019).
De acordo com o referido artigo, o Brasil se compro-
mete a suprimir todas as formas de trabalho forçado ou obri-
gatório no menor tempo possível, exigindo assim, uma rápida
e eficiente atitude por parte do Brasil. Conforme o Art.
5, § 3º da Constituição da República Federativa do Brasil de

67 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1988, os acordos internacionais sobre direitos humanos assi-


nados pelo Brasil possuem status de norma Constitucional
(BRASIL, 1988). Dessa forma, a convenção da OIT assinada
pelo Brasil possui a condição de norma Constitucional.
Quanto as atribuições do Ministério Público do Traba-
lho, pode-se destacar a intervenção em casos de contratos
que violem direitos individuais indisponíveis dos trabalhado-
res. Conforme prevê o art. 83, da Lei Complementar nº 75
(BRASIL, 1993), a proposição de ações cabíveis para o esta-
belecimento de nulidade em acordos ou contratos que firam
os direitos individuais indisponíveis dos trabalhadores, é de
competência do MPT.
Um dos direitos individuais indisponíveis do trabalha-
dor é o direito ao gozo de férias anuais, sem que ocorra o pre-
juízo na sua remuneração, conforme consta no Art. 129 da Lei
nº 5.452 de 01 de maio de 1943, “Todo empregado terá direito
anualmente ao gozo de um período de férias, sem prejuízo da
remuneração.” (Brasil, 1943).
Dessa forma, o direito a férias é apenas um dos direi-
tos individuais indisponíveis afrontados pela prática do traba-
lho análogo a escravidão, sendo uma violação a vida, a saúde,
a liberdade e ao ordenamento jurídico brasileiro, demons-
trando dessa forma, a grande necessidade da intervenção do
Ministério Público do Trabalho.

68 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entende-se que o trabalho em condição análoga à es-


cravidão está além do serviço forçado, caracterizando-se tam-
bém com a supressão da liberdade, com condições degradan-
tes de trabalho, servidão em decorrência de dívida e com a
ocorrência de jornadas exaustivas.
O Ministério Público do Trabalho exerce um papel de
grande importância no combate aos casos de trabalhos em
condições análogas a escravidão no Brasil, atuando como de-
fensor do ordenamento jurídico brasileiro e dos interesses in-
dividuais indisponíveis, os quais são afrontados com a prática
dos trabalhos forçados, conforme exposto no presente artigo.
De acordo com a menção a artigos e doutrinas apre-
sentados ao longo do trabalho, fica evidente a importância e a
necessidade da atuação do Ministério Público do Trabalho
frente as ocorrências de trabalhos em condições análogas à
escravidão.
Considerando a análise realizada, a prática do traba-
lho em condição análoga a escravidão no Brasil não afronta
somente as leis trabalhistas, mas também ao Código Penal
em seu Art. 149, o qual configura como crime reduzir alguém
a condição análoga a de escravo, e a Constituição Federal que

69 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em seu Art. 5 garante igualdade e liberdade a todas as pes-


soas indistintamente.
A atuação do Ministério Público do Trabalho por meio
da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Es-
cravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (CONAETE) e
do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) tem apre-
sentado resultados positivos com o trabalho de informação so-
bre o trabalho em condição análoga a escravidão no Brasil, e
no resgate de várias pessoas em condição de trabalho for-
çado.
Portanto, o Ministério Público do Trabalho desempe-
nhou e desempenha um papel essencial na defesa do ordena-
mento jurídico brasileiro e dos direitos individuais indisponí-
veis.

REFERÊNCIAS

AMARAL, Claudio. Ministério Público: Alguns detalhes so-


bre um dos sujeitos processuais mais importantes do Direito
Processual Civil e Penal. Jusbrasil. Pouso Alegre, MG. 2019.
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cravid%C3%A3o.%20Nos,a%20ser%20foco%20e%20as%
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74 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3
A IMPORTÂNCIA E COMPETÊNCIA DO CONTROLE
INTERNO E EXTERNO NA PROTEÇÃO DO ERÁRIO PÚBLICO

THE IMPORTANCE AND COMPETENCE OF INTERNAL


AND EXTERNAL CONTROL IN PROTECTING
THE PUBLIC TREASURY

Marco Aurélio dos Santos Telles 6


Marcos Paulo Pereira Gomes7
Williane Tibúrcio Facundes8

TELLES, Marco Aurélio dos Santos. A importância e compe-


tência do controle interno e externo na proteção do erário
público. Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em
Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio Branco, 2023.

6
Discente do 9º período do curso de Bacharelado em Direito pelo Centro
Universitário UNINORTE.
7
Advogado. Mestre em Direito pela Unimar/SP. Especialista em Direito
Processual Civil pela Faculdade Anhanguera/SP. Especialista em Direito
Constitucional pela FAAO.
8
Docente do Curso de Direito do Centro Universitário UNINORTE. Gradu-
ada em Direito pela U:VERSE, Especialista em Psicopedagogia pela Fa-
culdade Varzeagrandense. Graduada em Letras Vernáculas pela Universi-
dade Federal do Acre-UFAC.
75 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O controle dos atos é fundamental para a manutenção do Es-


tado democrático de direito, já que promove o direcionamento
adequado dos recursos e a fiscalização das atividades admi-
nistrativas, sendo interesse público um Estado eficiente, tendo
em vista o povo ser detentor da soberania. Logo, para a ela-
boração deste trabalho, apresenta-se o seguinte questiona-
mento: qual é o papel do controle interno e externo para a pro-
teção do erário público? Para responder à pergunta, o objetivo
geral deste trabalho é verificar a importância dos controles in-
terno e externo da administração pública e, de forma especí-
fica, analisar a formação do Estado Moderno e do sujeito, por
meio de uma pesquisa histórica; verificar o controle do Estado,
de modo geral; e, por fim, classificar os tipos de controle. Para
o delineamento do trabalho, foi utilizado o método qualitativo,
que, por meio de uma revisão bibliográfica, permitiu a análise
do tema para que fosse expresso de forma coesa, sendo fun-
damentado em artigos científicos, doutrinas, jurisprudências e
leis.

Palavras-chave: erário; controle; atos administrativos.

76 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

The control of acts is fundamental for the maintenance of the


democratic rule of law, as it promotes the proper allocation of
resources and the supervision of administrative activities, an
efficient State being in the public interest, with a view to the
people being holders of sovereignty. Therefore, for the elabo-
ration of this work, the following question is presented: what is
the role of internal and external control for the protection of the
public treasury? To answer the question, the general objective
of this work is to verify the importance of internal and external
controls of the public administration and, specifically, to ana-
lyze the formation of the Modern State and the subject, through
a historical research; verify the control of the State in general;
and, finally, classify the types of control. For the design of the
work, the qualitative method was used, which, through a bibli-
ographic review, allowed the analysis of the theme so that it
was expressed in a cohesive way, being based on scientific
articles, doctrines, jurisprudence and laws.

Keywords: treasury; control; administrative acts.

77 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Para o funcionamento do Estado, a Carta Magna apre-


senta mecanismos que permitem verificar a validade dos atos
administrativos. A lei determina todas as atividades que devem
ser exercidas pelo agente público, sendo que o ato pode ser
vinculado ou discricionário.
Contudo, o controle dos atos é fundamental para a ma-
nutenção do Estado democrático de direito, já que promove o
direcionamento adequado dos recursos e a fiscalização das
atividades administrativas, sendo interesse público um Estado
eficiente, tendo em vista o povo ser detentor da soberania.
Logo, para a elaboração deste trabalho, apresenta-se o
seguinte questionamento: qual é o papel do controle interno e
externo para a proteção do erário público?
Para responder à pergunta, o objetivo geral deste tra-
balho é verificar a importância dos controles interno e externo
da administração pública e, de forma específica, analisar a for-
mação do Estado Moderno e do sujeito, por meio de uma pes-
quisa histórica; verificar o controle do Estado, de modo geral;
e, por fim, classificar os tipos de controle.
Esta pesquisa se justifica em razão da importância de
proteção do interesse público e do Estado democrático de di-
reito, que determina a distribuição adequada de recursos e a

78 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

boa-fé da administração pública. Sendo assim, tem relevância


para a sociedade e para a comunidade científica.
Para o delineamento do trabalho, foi utilizado o método
qualitativo, que, por meio de uma revisão bibliográfica, permi-
tiu a análise do tema para que fosse expresso de forma coesa,
sendo fundamentado em artigos científicos, doutrinas, juris-
prudências e leis.

3.1 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

3.1.1 O SUJEITO E A FORMAÇÃO DO ESTADO MODERNO


– BREVE HISTÓRICO

A concepção do Estado moderno teve como conse-


quência a mudança nas relações sociais, as quais foram fruto
do processo de evolução da sociedade. Também fizeram com
que o mercado tivesse novos moldes e com que diferentes
perfis de pessoas compusessem um lugar que, por sua vez,
se tornaria competitivo (MOREIRA, 2010).
As pessoas, que antes precisavam trabalhar apenas
para o seu próprio sustento, cada um com as sua posição so-
cial e contribuindo, à própria maneira, com a economia, tive-
ram de buscar melhores qualificações para que se mantives-
sem ativas no mercado de trabalho (FREITAS, 2013).

79 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Havia uma percepção de que, para que a raça humana


tivesse condições de subsistir, era necessário que tivesse os
seus ideais com fundamento na racionalidade. Isto é, deveria
abandonar, em certa parte, os próprios instintos, com o fim de
manutenção da própria sobrevivência no campo social (MEN-
DES, 2017).
Cada sujeito tinha um papel bem estabelecido dentro
da sociedade, o que era respeitado pelos demais, que, em
tese, conviviam com suas diferenças, dentro dos seus limites
e do que era considerado como ideal para aquela época. To-
davia, com o capitalismo e os ideais democráticos cada vez
mais evidentes e presentes dentro da sociedade, isto deu es-
paço para que as minorias tivessem uma relevância mais am-
pla nas lutas sociais, o que foi importante para a definição do
homem na modernidade (JUSTEN FILHO, 2006).
O homem como fim é caracterizado por todas aquelas
prerrogativas que são essenciais para que possa sobreviver
dentro da sociedade, ao passo que o homem como instru-
mento se trata da sua contribuição econômica, do que é capaz
de fazer para que a humanidade, como um todo, prospere,
tendo um papel importante para o interesse público, ainda que
as atividades que exerça sejam em benefício próprio (MAF-
FINI, 2005).
As relações sociais tinham como base o poder que cada

80 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

indivíduo tinha perante a sociedade. Isto podia ser definido de


acordo com diversos fatores, como, por exemplo, político.
Logo, as pessoas que detinham influência sobre as demais em
razão de tais condições, eram privilegiadas, pois eram priori-
zadas pelo Estado ao dispor de seus recursos (SGARBOSSA,
2018).
O capitalismo fez com que o sujeito tivesse mais auto-
nomia sobre suas ações. Se antes, a sua posição social de-
pendia da família a que pertencia, das tradições que seguia,
da religião de que era adepto, hoje o homem é visto sob pers-
pectiva individual, já que o capitalismo conferiu independência
nas relações sociais (MOREIRA, 2010).
Contudo, é importante apontar que a liberalidade é ape-
nas uma simbologia, já que as relações sociais, a partir do ca-
pitalismo, passaram a ser regidas por um regime contratual,
sob a imposição de regras que, apesar de serem revestidas
de vontade, determinam as ações dos sujeitos, que são parte
da relação. O fator que estimulou as pessoas a migrarem de
uma relação social contemporânea para moderna foi justa-
mente o atrativo de que teriam seus direitos fundamentais
como prevalência no mercado (JUSTEN FILHO, 2006).
Havia a percepção de que era necessário que a popu-
lação movimentasse a economia do país, o que era fomentado
através do hábito de consumo. Por isto, compreendia-se que,

81 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a partir disso, com os lucros auferidos, seria possível ter um


poder maior de compra. Tal ciclo era positivo para a geração
de empregos e salários que eram acrescidos gradativamente.
Isto fazia com que as pessoas se sentissem mais satisfeitas e,
por conseguinte, tinha reflexo na produtividade, assim como
na atuação estatal para proteção desses empregados, o que
foi perceptível em meados dos anos 1950.
Deste modo, como os trabalhadores tinham uma condi-
ção financeira positiva e que era crescente, era possível ad-
quirir bens como, por exemplo, casa própria, entre outros, o
que era fruto do aumento do poder aquisitivo. Partia-se da pre-
missa de que era necessário que a renda fosse distribuída de
forma igualitária, com a finalidade de que todas as pessoas,
além daquelas que eram privilegiadas, tivessem acesso aos
recursos do Estado (PRONI, 1997).
O fator que estimulou as pessoas a migrarem de uma
relação social contemporânea para moderna foi justamente o
atrativo de que teriam seus direitos fundamentais como preva-
lência no mercado. O que conferia eficácia a essa transição
estava além da promoção de uma vida com mais riquezas, já
que, mais do que isso, as pessoas queriam ser vistas e ter as
suas vozes ouvidas pela sociedade, em geral. Essa ocupação
de espaços foi fundamental para a formação do homem neoli-

82 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

beral, prevalecendo a primazia da dignidade nas relações hu-


manas, fator essencial para o equilíbrio contratual e para a
convivência em comunidade (SMITH, 1996).
Elucida-se que o neoliberalismo tem como princípio que
os valores do homem girem em torno do interesse do mer-
cado, tendo a empresa como elemento para o fundamento das
ações humanas. O sujeito neoliberalista é aquele que tem as
relações trabalhistas como um precursor para os seus objeti-
vos. Ele deixa de pensar sob o ponto de vista de seus direitos
essenciais, e tem o trabalho como o pilar para todas as rela-
ções sociais.
O sujeito neoliberal é fruto de um ser racional, que pri-
oriza aquilo que é necessário para o avanço da sociedade, em
prol das próprias necessidades. Trata-se de uma ideologia que
era adotada por quem detinha poder político, assim como pe-
las pessoas, de modo geral, que viam benefícios a partir disso.
As empresas atuavam com a finalidade de se destacarem no
mercado, sempre para estarem acima dos concorrentes
(DARDOT; LAVA, 2016).
É visto como aquele que entende a necessidade de se
sacrificar para que possa ocupar um bom lugar no mercado de
trabalho, ainda que isso lhe custe outros direitos. Então, a em-
presa é prioridade, tornando-o objeto social para uma mão de
obra qualificada, fruto dos ideais neoliberalistas de gestão

83 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

(SIEYES, 2003).
Em contraponto, encontra-se a gestão lacaniana do Es-
tado, em que o interesse público prevalece sobre o privado.
Isto se dá, pois o Estado é garantidor dos direitos fundamen-
tais. Para que os direitos que são essenciais à humanidade
sejam protegidos, é importante que o Estado figure como uma
terceira parte nas relações sociais, fazendo com que preva-
leça a dignidade humana, para que as pessoas tenham condi-
ções de se alimentar, se vestir, de saúde, educação, entre ou-
tros (JUSTEN FILHO, 2006).

3.4 O CONTROLE DO ESTADO

As relações humanas são eivadas de direitos que ad-


vém das necessidades básicas das pessoas. Entre as carac-
terísticas evidenciadas, encontra-se a essencialidade (BRA-
SIL, 1988), tendo o Estado papel garantidor para que seja as-
segurada a incidência de tais prerrogativas em todos os vín-
culos sociais que se estabelecem. Sob esta perspectiva, tem-
se como objetivo precípuo o interesse público, que deve pau-
tar todos os fatos que são originados pelas relações sociais
(FREITAS, 2013).
Nisto, o controle surge como uma ferramenta de cunho

84 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

social, que permite ao Estado o exercício de seu papel. O li-


miar jurídico deve ter como fundamento o fato de que a socie-
dade está em constante evolução. Logo, é importante a cria-
ção de mecanismos que assegurem que o direito tenha a ca-
pacidade de intervir em todas as relações (MOREIRA, 2010).
As inovações são um pressuposto de uma sociedade
democrática. Essa autonomia, determinada pelo capitalismo e
pela formação moderna de Estado, é primordial para que as
pessoas lutem por seus direitos sociais, já que tem liberdade
para fazê-lo (MAFFINI, 2005). O significado de controle é do-
mínio. Nesta seara, é necessário o surgimento de mecanismos
para que a administração tenha possibilidade de governar, fis-
calizando e orientando seus órgãos e promovendo pela pros-
peridade do interesse público, dando eficácia para os atos ad-
ministrativos que tem como foco o benefício de toda a popula-
ção (JUSTEN FILHO, 2006).
Para que o Estado tenha condições de exercer esse
controle, é necessário que sua organização seja estruturada
com órgãos cujas atribuições tenham a finalidade de atender
às necessidades da população. Isto permite que as atividades
que são destinadas ao Poder Público sejam devidamente
cumpridas. Essa comunicação é importante para a eficiência
dos atos, já que todos têm como principal objetivo atender ao

85 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

interesse público. A coordenação do trabalho em equipe é fun-


damental nesse processo (MOREIRA, 2010).
Fayol (1981, p. 139) aponta que o controle “tem por ob-
jetivo assinalar as faltas e os erros, a fim de que se possa re-
pará-los e evitar sua repetição. Aplica-se a tudo: às coisas, às
pessoas, aos atos.” Essa distribuição de funções administrati-
vas é essencial para o funcionamento do Estado, sendo dire-
cionada aos órgãos de cada setor, considerando uma série de
mecanismos que podem ser adotados pelo órgão para sanar
as lacunas e promover a eficiência do serviço realizado.
Os princípios da administração pública estão acondici-
onados no artigo 37 da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
O princípio da legalidade elucida que todos os atos adminis-
trativos devem ser pautados em lei. É importante para que seja
mantida a isonomia do órgão, fundamental para um Estado
democrático de direito, o que também é corroborado pelos
princípios da impessoalidade, moralidade, publicidade e efici-
ência (MINTZBERG; AHLSTRAND; LAMPEL, 2000).
Para que os atos administrativos sejam revestidos de
validade é importante que atendam a tais princípios, que ga-
rantem um funcionamento adequado dos órgãos públicos. O
servidor tem responsabilidade quanto a suas funções, de-
vendo prestá-las com zelo e probidade para que nenhum ci-
dadão seja lesado. Quando há um equívoco, é necessário que

86 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

responda por seus atos, o que é determinado de acordo com


a gravidade do erro (DOMINGUES, 2000).
A prestação de contas é importante para a manutenção
de uma democracia, tendo em vista que os atos administrati-
vos tem o condão de sanar as necessidades de interesse pú-
blico. O controle da administração pública analisa o quadro,
como um todo. Por conseguinte, tanto as verbas públicas,
quanto a forma de gestão é analisada pelo sistema de freios e
contrapesos (CHIAVENATO, 2000).
Os princípios existem para nortear os atos da adminis-
tração pública. Logo, é visto como um mecanismo que permite
a fiscalização desses atos para verificar se estão respeitando
os preceitos constantes em texto constitucional. É importante
que os serviços prestados aos cidadãos sejam de qualidade e
respeitem os direitos fundamentais daqueles que compõem
uma determinada sociedade (COSTA; RUTHER, 2006).
As pessoas que administram os recursos públicos são
passíveis de equívocos. A prestação de contas é essencial em
uma democracia, já que o Estado tem papel garantidor frente
às necessidades da população. Por isso, um servidor que re-
presenta um determinado órgão administrativo tem responsa-
bilidade objetiva, ou seja, presta serviços em nome do Estado
(FONSECA; ANTUNES; SANCHES, 2002).

87 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sob esta perspectiva, em caso de alguma irregulari-


dade de conduta, deve ser punido de acordo com as sanções
estabelecidas e a gravidade do ato. Apesar de todo o forma-
lismo que reveste o ato administrativo, ainda carece de meios
que sejam eficazes para a sua punibilidade. Enfatiza-se que o
controle da administração pública tem suas limitações. A dis-
cricionariedade dos atos que, por si só, tem essa natureza,
deve ser respeitada.
Martins (1989) define alguns pontos sobre a ideia de
controle de atos dentro de um Estado democrático de direito,
elucidando que a República, seja de qual tipo for, é exercida
em consonância com os sistemas que derivam do instituto, ao
passo que os torna eficazes. O controle dos atos é uma ferra-
menta incompatível, todavia, com regimes que se fundamen-
tam em preceitos autocráticos, pois há uma inobservância de
direitos fundamentais.
O autor afirma que as ferramentas de controle não são
passíveis de ferir a democracia presente em um Estado, ape-
sar de contrapor com algumas características que são contrá-
rias aos preceitos democráticos. Ainda, estabelece que esse
controle deva ser realizado tanto pelo Estado, quanto pela pró-
pria população.
Como parte importante da sociedade, os cidadãos de-
vem ser orientados quanto a seus direitos para que tenham

88 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

plena capacidade de reivindica-los, quando perceberem a pre-


sença de algum tipo de violação. A Carta Magna confere par-
ticipação ativa da comunidade por meio de instrumentos que
promovem a eficácia do controle administrativo (GUERRA,
2003).
Evidencia-se, ainda, que o próprio Estado exerce con-
trole. Esses controles podem ser compreendidos sob três ver-
tentes, sobre si mesmos e de forma passiva e ativa, ou seja, o
Estado pode ser objeto de controle da sociedade e vice versa
com função de objeto controlado ou como autoridade contro-
ladora (FIGUEIREDO, 2001).

3.5 CONTROLE INTERNO E EXTERNO DA ADMINISTRA-


ÇÃO PÚBLICA

3.5.1 CLASSIFICAÇÃO

Para compreender a diferença entre ambos os tipos de


controle, é salutar sublinhar que a administração pública tem
capacidade de sanar os próprios vícios, sendo isto chamado
de controle interno. Em contrapartida, a intervenção de um
controle externo é necessária para que o cumprimento da or-
dem seja efetivo. O Poder Legislativo tem a função atípica de
fiscalizar o poder executivo, assim como o Tribunal de Contas

89 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da União (TCU), conforme preleciona o artigo 70 e seguintes


da Constituição Federal de 1988 (CF/88).
Determina-se que:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Con-


gresso Nacional, será exercido com o auxílio
do Tribunal de Contas da União, ao qual
compete:
I - apreciar as contas prestadas anualmente
pelo Presidente da República, mediante pa-
recer prévio que deverá ser elaborado em
sessenta dias a contar de seu recebimento;
II - julgar as contas dos administradores e
demais responsáveis por dinheiros, bens e
valores públicos da administração direta e
indireta, incluídas as fundações e socieda-
des instituídas e mantidas pelo Poder Pú-
blico federal, e as contas daqueles que de-
rem causa a perda, extravio ou outra irregu-
laridade de que resulte prejuízo ao erário pú-
blico;
III - apreciar, para fins de registro, a legali-
dade dos atos de admissão de pessoal, a
qualquer título, na administração direta e in-
direta, incluídas as fundações instituídas e
mantidas pelo Poder Público, excetuadas as
nomeações para cargo de provimento em
comissão, bem como a das concessões de
aposentadorias, reformas e pensões, ressal-
vadas as melhorias posteriores que não al-
terem o fundamento legal do ato concessó-
rio;
IV - realizar, por iniciativa própria, da Câ-
mara dos Deputados, do Senado Federal,
de Comissão técnica ou de inquérito, inspe-

90 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ções e auditorias de natureza contábil, finan-


ceira, orçamentária, operacional e patrimo-
nial, nas unidades administrativas dos Pode-
res Legislativo, Executivo e Judiciário, e de-
mais entidades referidas no inciso II;
V - fiscalizar as contas nacionais das empre-
sas supranacionais de cujo capital social a
União participe, de forma direta ou indireta,
nos termos do tratado constitutivo;
VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recur-
sos repassados pela União mediante convê-
nio, acordo, ajuste ou outros instrumentos
congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou
a Município;
VII - prestar as informações solicitadas pelo
Congresso Nacional, por qualquer de suas
Casas, ou por qualquer das respectivas Co-
missões, sobre a fiscalização contábil, finan-
ceira, orçamentária, operacional e patrimo-
nial e sobre resultados de auditorias e inspe-
ções realizadas;
VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de
ilegalidade de despesa ou irregularidade de
contas, as sanções previstas em lei, que es-
tabelecerá, entre outras cominações, multa
proporcional ao dano causado ao erário;
IX - assinar prazo para que o órgão ou enti-
dade adote as providências necessárias ao
exato cumprimento da lei, se verificada ile-
galidade;
X - sustar, se não atendido, a execução do
ato impugnado, comunicando a decisão à
Câmara dos Deputados e ao Senado Fede-
ral;

91 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

XI - representar ao Poder competente sobre


irregularidades ou abusos apurados (BRA-
SIL, 1988).

Importante salientar que a competência para fiscaliza-


ção interna é comum a todos os Poderes em que se estrutura
o Estado, seja Legislativo, Judiciário ou Executivo. Apesar dos
demais órgãos não terem como principal função a gestão or-
ganizacional, é essencial para que sejam respeitados os pre-
ceitos constitucionais e para que tenham capacidade de exe-
cutar, inclusive, os atos que lhes são próprios. Logo, vez que
exerce função administrativa, ainda que atipicamente, devem
fiscalizar os atos administrativos de seus servidores, em prol
da democracia e do interesse público (CASTRO, 2004).

3.5.2 CARACTERÍSTICAS DO CONTROLE INTERNO DA


ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A estrutura organizacional do Estado é importante para


a manutenção da democracia dentro da sociedade moderna.
Os órgãos públicos exercem suas funções de acordo com os
preceitos normativos, podendo os atos administrativos serem
vinculados ou discricionários. O ato administrativo vinculado é
aquele que segue estritamente aquilo que está previsto em lei.
Em contraponto, o discricionário permite uma ponderação

92 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

acerca da medida a ser tomada (COSTA; RUTHER, 2006).


De toda forma, a função administrativa permite que os
atos que estão eivados de vício devem ser sanados, propondo
mecanismos para que os próprios órgãos tenham autonomia
para exercê-la. Isto é possível em razão do controle interno,
que determina a fiscalização das ações que são realizadas pe-
los órgãos de cada Poder.
Frisa-se que todos os poderes têm funções típicas e atí-
picas. Entre aquelas estranhas à função principal, encontra-se
a de controle interno ou externo. O controle interno é quando
a fiscalização é exercida pelo próprio órgão, ao contrário da
externa, que fiscaliza outro Poder. Isto se dá em razão dos
sistemas de freios e contrapesos, que permitem uma gestão
democrática de Estado, garantidora dos direitos fundamentais
da humanidade (JUSTEN FILHO, 2006).
A controladoria é importante para a gestão organizaci-
onal da administração pública, ao passo que permite a orien-
tação, inclusive, dos gastos que são realizados, o que possi-
bilita que os recursos financeiros da administração pública se-
jam utilizados com prudência, conferindo efetividade aos atos
administrativos.
Os processos de auditoria são essências para que o
controle interno seja exercido, já que estuda minuciosamente

93 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os atos administrativos constantes em determinado órgão a


que pertence (MEIRELLES, 2004).
É denominado pelos preceitos normativos (BRASIL,
1991) como sendo “atividades, planos, métodos e procedi-
mentos interligados, visa assegurar que o objetivo dos órgãos
e entidades da administração pública seja alçado de forma
confiável e concreta”. Para que a gestão organizacional seja
eficaz, é importante que os recursos utilizados tenham uma
quantidade menor de gastos, o que protege o erário e garante
que seja distribuído de maneira adequada (GUERRA, 2003).
A qualidade do serviço realizado pela administração pú-
blica é de interesse público, já que o povo é quem os usufrui.
O cidadão é o maior beneficiado por uma gestão eficiente,
sendo fundamental a fiscalização para que o princípio da pri-
mazia do interesse público prevaleça sobre os individuais (RI-
BEIRO, 1997).
O serviço público deve sempre ter como objetivo precí-
puo atender às necessidades da população. A prevalência do
interesse público incorre em improbidade administrativa, indo
de encontro, entre outros, ao que apregoa a CF/88. O controle
interno pode ser preventivo, concomitante ou corretivo, ou
seja, antes, durante ou depois da execução do ato administra-
tivo (MEIRELLES, 2004).

94 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.5.3 CONTROLE EXTERNO DA ADMINISTRAÇÃO


PÚBLICA

Para a garantia de manutenção de um Estado demo-


crático de direito, o controle externo é importante para que a
destinação dos recursos públicos tenha como molde os prin-
cípios constitucionais, principalmente o de eficiência, que
pressupõe o uso inteligente das verbas públicas. A fiscaliza-
ção permite verificar a legitimidade do ato administrativo.
Quando tais recursos são utilizados para uma finalidade dife-
rente da qual se destinam são caracterizados como atos de
improbidade (SPECK, 2000). Cita-se que:

Art. 75. O controle da execução orçamentá-


ria compreenderá:
I - a legalidade dos atos de que resultem a
arrecadação da receita ou a realização da
despesa, o nascimento ou a extinção de di-
reitos e obrigações;
II - a fidelidade funcional dos agentes da ad-
ministração responsáveis por bens e valores
públicos; e
III - o cumprimento do programa de trabalho
expresso em termos monetários e em ter-
mos de realização de obras e prestação de
serviços.
Art. 76. O Poder Executivo exercerá os três
tipos de controle a que se refere o artigo 75,
sem prejuízo das atribuições do Tribunal de
Contas ou órgão equivalente (BRASIL,
1988).

95 | P á g i n a
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A CF/88 confere ao Poder Legislativo, em conjunto com


o TCU, a competência para a fiscalização por meio de controle
externo. O TCU tem como finalidade a análise das contas, fis-
calizando os recursos financeiros dos órgãos para verificar se
corresponder aos preceitos elucidados pela Carta Magna (CI-
TADINI, 1995).
Conta com ministros e conselheiros, que tem a função,
inclusive, de analisar o cabimento jurídico de determinados
atos. Essa fiscalização acontece por meio de uma auditoria,
que resulta em um instrumento que permite a verificação da
validade dos atos administrativos e dos recursos orçamentá-
rios. Evidencia-se o artigo 4° da Instrução Normativa do TCU,
n° 9 de 16/02/1995, que conceitua o processo de auditoria,
esclarecendo que:

Art. 4º Auditoria é o procedimento de fiscali-


zação utilizado pelo Tribunal para, com a fi-
nalidade de subsidiar a instrução e o julga-
mento de processos de tomadas e presta-
ções de contas dos responsáveis pela apli-
cação de recursos públicos federais, atender
a pedidos do Congresso Nacional ou de
qualquer de suas Casas ou Comissões, e
assegurar a eficácia do controle:
I - obter dados de natureza contábil, finan-
ceira, orçamentária e patrimonial, quanto
aos aspectos técnicos, de legalidade e de le-
gitimidade da gestão dos responsáveis pelo
órgão, projeto, programa ou atividade audi-
tados, com vistas a verificar a consistência

96 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da respectiva prestação ou tomada de con-


tas apresentada ao Tribunal e esclarecer
quaisquer aspectos atinentes a atos, fatos,
documentos e processos em exame;
II - conhecer a organização e o funciona-
mento dos órgãos e entidades da Adminis-
tração direta, indireta e fundacional dos Po-
deres da União, inclusive fundos e demais
instituições que lhe sejam jurisdicionadas,
no que respeita aos aspectos contábeis, fi-
nanceiros, orçamentários e patrimoniais;
III - avaliar, do ponto de vista de desempe-
nho operacional, as atividades e sistemas
desses órgãos e entidades, e aferir os resul-
tados alcançados pelos programas e proje-
tos governamentais a seu cargo.

O TCU tem 8 funções precípuas, de acordo com Cam-


pelo9, quais sejam fiscalização, judicante, sancionadora, con-
sultiva, informativa, corretiva, normativa e de ouvidoria. Toda-
via, é importante destacar que a demasiada burocracia no Bra-
sil vai de encontro ao princípio da eficiência, já que confere
menor flexibilidade para a utilização dos recursos públicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O exercício do controle administrativo é importante para


a manutenção do Estado democrático de direito. A atividade

97 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pública tem suas funções regulamentadas por lei, sendo fun-


damental a observação dos preceitos normativos para a exe-
cução do ato administrativo.
Logo, isso demanda uma fiscalização dos órgãos públi-
cos, para que a população tenha garantia de que as atividades
estão sendo executadas de maneira adequada. Sendo assim,
o papel do controle externo e interno é promover o atendi-
mento ao interesse público, que deve ter seus interesses res-
guardados, já que o povo detém a soberania.
Há dois tipos de controle administrativo, o interno e o
externo. O controle interno é a fiscalização do próprio órgão e
de seus agentes públicos para a verificação de irregularida-
des. Já o externo, é feito pelo TCU e pelo Poder Legislativo,
tendo em vista o sistema de freios e contrapesos, que é es-
sencial para o bom andamento do Estado.

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102 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4
ESTADO LAICO E OS LIMITES LEGAIS
DA (IN)TOLERÂNCIA

LAICO STATE AND THE LEGAL


LIMITS OF (IN)TOLERANCE

Virginia Vasconcelos da Costa10


Gilberto Jorge Ferreira da Silva11

COSTA, Virginia Vasconcelos da. Estado Laico e os li-


mites da (in)tolerância. Trabalho de Conclusão de Curso
de graduação em Direito – Centro Universitário UNI-
NORTE, Rio Branco, 2023.

10
Acadêmica do 10º período do curso de bacharel em Direito pelo Centro
Universitário Uninorte.
11
Graduado em Direito pela Universidade Federal do Acre (UFAC), defen-
sor público do Estado do Acre, professor do centro universitário Uninorte,
pós-graduado em processo civil (UCAM) e mestre em direito pela Univer-
sidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) defensor público – Defensoria Pú-
blica do Estado do Acre, com atuação no TJAC e Tribunais Superiores.
Professor do Centro Universitário Uninorte.
103 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

O presente trabalho aborda a respeito da religiosidade no con-


texto da contemporaneidade, colocando em pauta alguns con-
ceitos preliminares que são relevantes à concepção da tole-
rância e da intolerância religiosa. Definiu-se como objetivo ge-
ral do presente estudo, verificar sobre a laicidade do Estado
brasileiro, a intolerância religiosa e seus desdobramentos sob
a égide do Direito brasileiro. Como objetivos específicos foram
definidos: conhecer os conceitos de estado laico, tolerância e
liberdade religiosa, dentre outros; analisar a legislação brasi-
leira no que se refere à liberdade religiosa; e, descrever alguns
casos de intolerância religiosa que foram registrados no Brasil
e seus desdobramentos. Trata-se de uma revisão da literatura,
método que examina artigos, textos relacionados ao tema es-
tudado e que já foram publicados, para se conhecer a forma
como esse assunto foi abordado e avaliado em estudos ante-
riores. É um estudo descritivo, onde há um aprofundamento
da realidade específica por pesquisa. A intolerância religiosa
não é um fato novo, ela ocorre devido à falta de conhecimento
das leis, do temor, a ignorância, incompreensão e incerteza,
dentre outros.

Palavras-chave: Estado laico; intolerância religiosa; liberdade


religiosa

104 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

The present work approaches religiosity in the context of con-


temporaneity, putting on the agenda some preliminary con-
cepts that are relevant to the conception of tolerance and also
religious intolerance. It was defined as the general objective of
the present study, to verify about the laicity of the Brazilian
State, religious intolerance and its consequences under the ae-
gis of Brazilian law. Specific objectives were defined: to know
the concepts of Secular State, Tolerance and Religious
Freedom, among others; to analyze Brazilian legislation on Re-
ligious Freedom; and, to describe some cases of religious in-
tolerance that were recorded in Brazil and its consequences.
This is a literature review, a method that examines articles,
texts related to the theme studied and that have already been
published, to know how this subject was approached and eva-
luated in previous studies. It is a descriptive study, where there
is a deepening of the specific reality through research. Reli-
gious intolerance is not a new fact, it occurs due to lack of
knowledge of laws, fear, ignorance, misunderstanding and un-
certainty, among others.

Keywords: secular State; religious intolerance; religious free-


dom.

105 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

O tema do presente trabalho versa a respeito da laici-


dade do Estado brasileiro e os limites da tolerância que a lei
acata. É um tema significativo e atual, portanto, sua aprecia-
ção é necessária, para que se desmitifique, conscientize e pro-
voque uma transformação comportamental da sociedade, com
embasamento no ordenamento jurídico brasileiro.
O trabalho aborda a respeito da religiosidade no con-
texto da contemporaneidade, uma vez que ela pode ser assi-
nalada como um dos principais aspectos na cultura do Brasil,
para tanto, sendo colocados em pauta alguns conceitos preli-
minares que são relevantes à concepção da tolerância e da
intolerância religiosa, bem como as concepções de laicidade
estatal, liberdade religiosa, analisando a questão da tutela da
liberdade religiosa em tempos e constituições distintas do
país.
Na contemporaneidade a temática religiosa tem se des-
pontado, quer seja no plano nacional como também internaci-
onal, como uma das extensões da cultura que no dia a dia é
muito afetada, em decorrência das práticas de discriminação
e intolerância. Diante do exposto, definiu-se o seguinte pro-
blema: “Quais as consequências jurídicas para quem reprime
uma manifestação individual ou coletiva da fé?”

106 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Definiu-se como objetivo geral do presente estudo, ve-


rificar sobre a laicidade do Estado brasileiro, a intolerância re-
ligiosa e seus desdobramentos sob a égide do Direito brasi-
leiro. Como objetivos específicos foram definidos: conhecer os
conceitos de estado laico, tolerância e liberdade religiosa, den-
tre outros; analisar a legislação brasileira no que se refere à
liberdade religiosa; e, descrever alguns casos de intolerância
religiosa que foram registrados no Brasil e seus desdobramen-
tos.
Justifica-se a presente pesquisa pela importância que o
tema da religiosidade, tem adquirido na história do Brasil, es-
pecialmente na atualidade. É importante buscar a identificação
de aspectos e exigências ocasionados pelo desafio fundamen-
tal de se harmonizar a salvaguarda da laicidade do Estado
com o amplo exercício do livre arbítrio religioso em conformi-
dade com o disposto nas leis brasileiras.
Trata-se de uma revisão da literatura, método que exa-
mina artigos, textos relacionados ao tema estudado e que já
foram publicados, para se conhecer a forma como esse as-
sunto foi abordado e avaliado em estudos anteriores. É um
estudo descritivo, onde há um aprofundamento da realidade
específica por meio de pesquisa. Gil (2010) afirma que a pes-
quisa bibliográfica envolve tanto a leitura, como também a
análise e ainda a interpretação de periódicos, livros, e também

107 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

documentos tais como mapas, imagens e manuscritos, dentre


outros.

4.1 ESTADO LAICO – VISÃO GERAL

A humanidade é carregada de pessoas que são todas


distintas umas das outras, neste sentido, a tolerância é o fun-
damento para que todos possam conviver harmonicamente.
Reverenciar os direitos, os ideais e as práticas dos outros in-
divíduos desde que estas não depreciem, não prejudiquem, ou
não gerem mal a alguém, é o mínimo que se pode fazer de
modo a contribuir para uma convivência amistosa.
A intolerância religiosa não é um fato novo, sendo tão
remota quanto o estranhamento humano no que se refere ao
diferente. Ela ocorre devido à falta de conhecimento das leis,
do temor, a ignorância, incompreensão e incerteza, dentre ou-
tros.
Ainda que haja prerrogativa constitucional que garanta
a liberdade de crença, certificando o franco exercício dos cul-
tos religiosos e na forma da lei, assegurando a proteção aos
lugares de realização de cultos e suas liturgias, como também
a proteção penal que procura tutelar o privilégio da liberdade
de crença, tais dispositivos não têm sido de maneira satisfató-
ria no que diz respeito a prevenção bem como no combate a

108 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

intolerância religiosa no país (SILVA; SANTOS, 2019).


De acordo com Porfírio (2022, p. 1):

O Brasil é, ao menos teoricamente e do


ponto de vista jurídico, um país laico. Nós
respeitamos, enquanto Estado Nacional, as
predisposições estabelecidas na Declaração
Universal dos Direitos Humanos. O artigo 5º
da Constituição Federal de 1988 também
assegura a igualdade religiosa e reforça a
laicidade do Estado brasileiro.

Além das garantias previstas na Constituição Federal,


bem como em conformidade com da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, (a qual dispõe que todos os seres huma-
nos podem invocar os direitos e as liberdades, sem qualquer
distinção, quer seja de raça, de cor, de sexo, de língua, de
religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou
social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situa-
ção).
A Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997, na qual que
prevê no seu art. 1º a repreensão para os crimes que tiverem
como motivação a discriminação quer seja por cor, raça, reli-
gião, etnia ou procedência de nação. Qualquer indivíduo que
induzir, cometer ou estimular a discriminação qualquer um dos
citados motivos, pode ser penalizado com aplicação de multa

109 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

e um (01) a três (03) anos de reclusão (BRASIL, 1997; POR-


FIRIO, 2022).

4.1.1 CONCEITO DE ESTADO

Os seres humanos nem sempre estiveram organizados


politicamente na forma que atualmente se conhece como Es-
tado. O ser humano começou a se estabelecer em comunida-
des, tendo interesses comuns, quando se deparou com a ne-
cessidade de se fixar sobre um lugar, estabelecer-se, produzir
seus mantimentos, para assim tornar suas existências segu-
ras.
O núcleo, neste formato de sociedade, era as ativida-
des da genitora, e essa então, era a família poligâmica matri-
arcal. Desse modo, a união das famílias com a finalidade de
conservação originou as Gens, que estrategicamente ligadas
para defesa, manutenção e fins reprodutivos, originaram os
clãs, que juntos determinaram as tribos, que, no que lhe con-
cerne, evoluíram e deram origem aos impérios (OLIVEIRA,
2018).
Hobbes defendia que os homens necessitavam de um
Estado forte, porque a falta de um poder superior tinha como
resultado a guerra. Por ser egoísta, o ser humano, “[...] sub-
metia a um poder maior, somente para que pudesse viver em

110 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

paz e também ter condição de prosperar [...]” (BEZERRA,


2020, p. 1).
Não por acaso, Hobbes denomina o "Estado" de Levi-
atã, que é uma das alcunhas que o diabo recebe na Bíblia,
tendo assim, a finalidade de reforçar o caráter perverso do in-
divíduo que o leva a procurar a união com os outros homens.
Por sua vez, o Estado, terá a obrigação de impedir os
conflitos entre os seres humanos, zelar pela segurança e res-
guardar a propriedade privada. Deste modo, apenas o rei, que
concentrava o poder tanto das armas como também da reli-
gião, poderia assegurar que os homens convivessem em har-
monia (BEZERRA, 2020).
Foi diante da constituição dos impérios que se deu a
modificação da família, que começou a forma monogâmica pa-
triarcal, e que, possibilitou em seguida o aparecimento das
classes sociais. De modo sistemático, o conceito de Estado
surge na concepção dos impérios (SILVA JUNIOR, 2001).

4.1.2 CONCEITO DE RELIGIÃO

O termo “religião” tem sua origem na língua latina e de-


riva da expressão “religio”, que faz alusão ao conceito de reli-
gar. Portanto, a religião significaria uma maneira de do homem
religar-se com o sagrado. Refere-se a um leque de crenças

111 | P á g i n a
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como também de “visões de mundo” que abrangem a concep-


ção espiritual da raça humana. Desde a antiguidade que a ex-
periência religiosa é um costume presente, sendo esta, uma
das formas empregadas para explicar e também se conectar
com os acontecimentos naturais (BENTO, 2021).
Conforme Maçalai (2015), o conceito de religião é múl-
tiplo, pois, todo sistema de doutrinas, toda crença tem o seu
conceito e práticas para alcance do mesmo. Diante disto, o
correto é expor um conceito científico, que não seja determi-
nado de qualquer dogma, ainda que qualquer posição funda-
mentalmente tenha alguma doutrina como baseada em al-
guma doutrina.
Neste sentido, Reimer (2013, p. 26) afirma que:

É difícil definir claramente o que é religião.


No Ocidente, acostumamo-nos a conceber
religião como um conjunto de ideias e práti-
cas por meio das quais as pessoas expres-
sam a sua relação com algo transcendental,
com o mundo espiritual ou simplesmente
com Deus.
Isso vem expresso a partir da raiz latina do
termo religião, religare, que significa algo
como ‘religação’ com uma realidade ausente
ou distante, ou com a qual, supostamente, o
ser humano perdeu a sua relação essencial.
Por isso a prática de religião estaria sempre
numa dimensão de busca, de religação.

112 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Com a utilização diversificada das formas de linguagem


originárias da experiência religiosa de cada sujeito, cada prin-
cípio de religião ou de fé, dispõe à sua maneira o meio para
manifestar suas afirmações essenciais e convicções. Reimer
(2013, p. 29) ainda faz comparação do mundo religioso com o
universo da produção cultural, onde, se origina à “[...] diversi-
dade cultural, que deve(ria) ser tida como patrimônio, riqueza,
algo extremamente necessário para a constituição da identi-
dade, para a promoção dos direitos e da paz”.

4.1.3 LIBERDADE RELIGIOSA

A liberdade religiosa é uma garantia fundamental, ou di-


reito fundamental, que começou a ser representado nos escri-
tos constitucionais apenas a partir da Modernidade (REIMER,
2013).
A liberdade religiosa está dentre os direitos fundamen-
tais do cidadão nos Estados democráticos de direito – que é a
forma predominante de organização constitucional da maior
parte dos Estados contemporâneos ocidentais). Sendo assim,
frequentemente é concebida dentre os direitos básicos de “pri-
meira geração”, com sua positivação em meados séc. XVII em
conformidade com as declarações francesas e norte-america-
nas (BENTO, 2021).

113 | P á g i n a
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A liberdade religiosa é:

Garantia fundamental que passou a integrar


o texto constitucional justamente para a pro-
teção de elementos derivados do foro íntimo
da pessoa humana. Estando assentado em
texto constitucional, trata-se de uma garan-
tia que figura entre as ‘liberdades públicas’,
podendo ser invocada pelo cidadão em qual-
quer momento, até mesmo contra o Estado
(REIMER, 2013, p. 29).

Através do livre arbítrio religioso é possível assegurar a


não discriminação, acarretando que o Estado bem como os
demais sujeitos que compõem a sociedade, conserve uma re-
lação básica de igualdade. Deste modo, combater a discrimi-
nação é um atributo das democracias atuais, já que a “[...] so-
ciedade democrática se diferencia por ser uma sociedade apta
a processos de inclusão social” (BENTO, 2021, p. 24).

4.1.4 LAICIDADE

Com o advento do Iluminismo e da Reforma Protes-


tante, teve o início da ideia de se separar o Estado e a religião.
Hegel (2000) assinalou a respeito da necessidade do ser hu-
mano declarar a fé. Contudo, assentou acima de todos os cre-
dos, o Estado. Sendo assim, mesmo que todos fossem subor-
dinados ao domínio estatal, o mesmo poder, traz o encargo de
114 | P á g i n a
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constituir a probabilidade de existência das religiões, as quais


devem abordar as demandas humanas de foro íntimo. A não
intervenção dentre os poderes do Estado e a religião gera o
Estado laico.
A laicidade é definida no Art. 4º da Declaração Univer-
sal da Laicidade no Século XXI (OLÉ, 2008) como:

[...] A harmonização, em diversas conjuntu-


ras sócio-históricas e geopolíticas, dos três
princípios já indicados: respeito à liberdade
de consciência e à sua prática individual e
coletiva; autonomia da política e da socie-
dade civil com relação às normas religiosas
e filosóficas particulares; nenhuma discrimi-
nação direta ou indireta contra os seres hu-
manos.

No art. 5º da Constituição Federal (CF), institui-se a li-


berdade como sendo um direito básico, e este não pode ser
barrado, fazendo ainda da liberdade um dos cinco valores es-
senciais que agregam seus incisos, em conjunto com a “[..]
vida, igualdade, segurança e propriedade”.
Sendo assim, a liberdade constitucional é a que con-
densa a “[...] liberdade individual – autonomia – e liberdade
política – participação política. Só essa harmonia permite o
exercício verdadeiro das liberdades e sua realização com-
pleta” (FERRAZ FILHO, 2021, p. 16).

115 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Bento (2021) afirma que pode se entender o princípio


da laicidade como sendo a autonomia dentre a religião e a po-
lítica, assim como, é uma ferramenta de neutralidade que as-
segura a declaração de diferentes concepções, podendo ser
de agnósticos, religiosos, ateus, dentre outras. Seja qual for a
igreja, não tem o poder de se colocar no lugar do Estado e
nem pode lhe influenciar, entretanto, tem o direito de expres-
sar-se de modo livre (BENTO, 2021).
De acordo com Fischmann (2012, p. 16):

Assim, o caráter laico do Estado, que lhe


permite separar-se e distinguir-se das religi-
ões, oferece à esfera pública e à ordem so-
cial a possibilidade de convivência da diver-
sidade e da pluralidade humana. Permite,
também, a cada um dos seus, individual-
mente, a perspectiva da escolha de ser ou
não crente, de associar-se ou não a uma ou
outra instituição religiosa. E, decidindo por
crer, ou tendo o apelo para tal, é a laicidade
do Estado que garante, a cada um, a própria
possibilidade da liberdade de escolher em
que e como crer, enquanto é plenamente ci-
dadão, em busca e no esforço de construção
da igualdade.

O Brasil, de acordo com a história, assiste até à atuali-


dade, a muitas discussões pertinentes a impedimento de o Es-
tado intervir ou emitir opinião sobre temas religiosos, como,
por exemplo, a veiculação (bem antiga e ainda constante) de

116 | P á g i n a
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símbolos religiosos afixados em locais públicos (ex.: escolas,


prédios públicos do legislativo e do executivo, fóruns, dentre
outros) (PEREIRA; MIRANDA, 2017).
O princípio da isenção não outorga a qualquer indiví-
duo, nem tão pouco ao Estado, o direito de deter o franco exer-
cício de nenhuma religião, pois, em um Estado laico, os códi-
gos religiosos das várias confissões são “conselhos dirigidos
aos seus fiéis e não comandos para toda a sociedade” (PE-
REIRA; MIRANDA, 2017, p. 105).
Entende-se então, que é vedado ao Estado Laico, a as-
sunção a uma expressão religiosa, pois, correria o risco de se
assumir um particularismo irrompendo com a pressuposição
pluralista a qual abrange não apenas a reverência a todas as
religiões, como ainda o direito à opção da direção religiosa ou
ainda à alternativa de não orientação religiosa.
Na Constituição Federal (QUADRO 1) não há nenhuma
alusão ao monoteísmo, portanto, sendo o Estado, imparcial no
que diz respeito à teologia bem como à fé individual (PE-
REIRA; MIRANDA, 2017).

Quadro 1 – Constituições Outorgadas no Brasil


Constituições do Brasil
Constituição Imperial
Constituição outorgada em nome
Promulgada em 25 de
da Santíssima Trindade, onde a
março de 1824

117 | P á g i n a
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religião Católica Romana foi legiti-


mada, e o culto doméstico aos se-
guidores de outras religiões foi au-
torizado.
Nos artigos 156, 157 e 158, tor-
Constituição da Repú-
nava ilegal a prática da medicina,
blica dos Estados Uni-
da magia e proibia o curandei-
dos do Brasil Promul-
rismo, e as práticas de religiões
gada em 24 de feve-
afro-brasileiras ainda eram consi-
reiro de 1891
deradas feitiçaria
No artigo 113, inciso V desta
Constituição da Repú- Constituição, afirma ser inviolável
blica dos Estados Uni- a liberdade de consciência e de
dos do Brasil promul- crença, o exercício de cultos reli-
gada em 16 de julho giosos passa a ser livre desde que
de 1934 não ferissem a ordem pública e os
bons costumes.
Durante a sua vigência foi promul-
Constituição da Repú- gada a Lei de Contravenções Pe-
blica dos Estados Uni- nais em 1941, que trazia a ideia
dos do Brasil promul- de perturbação de sossego, que
gada em 10 de no- foi criada por conta dos batuques
vembro de 1937 e tambores, criminalizando outra
vez as religiões.
Dispositivo que garantia a assis-
Constituição da Repú-
tência religiosa aos militares con-
blica dos Estados Uni-
forme a Constituição de 1934 re-
dos do Brasil promul-
torna, juntamente com a previsão
gada em 18 de setem-
de efeitos civis no casamento reli-
bro de 1946
gioso.

118 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Fruto da Ditadura Militar, estabe-


leceu através de um texto de
Constituição da Repú- Ementa Constitucional a inviolabi-
blica Federativa do lidade dos direitos relacionados a
Brasil 1967/1969 vida, liberdade, segurança e pro-
priedade, e assegurou ainda
igualdade de todos perante a lei.
Diferentemente das Constituições
de 1891 e de 1937, esta, invoca a
figura de Deus como nas demais
Constituições. Não é usada a ex-
pressão liberdade religiosa, po-
rém, disserta sobre o livre e ga-
rantido exercício de cultos, crença
Constituição Federal
e religião, para os brasileiros e es-
de 1988
trangeiros aqui residentes. Em re-
lação ao livre exercício religioso, a
nova carta se difere das anterio-
res por não assegurar o fato de
que o exercício religioso não po-
deria ser contrário à ordem pú-
blica e aos bons costumes.
Fonte: Adaptação de Bento, 2021, p. 13-19.

4.2 TOLERÂNCIA

O conceito de tolerância exerce um papel principal no


discurso político moderno, porém, ambivalente, visto como
sempre se busca moldar a “[...] própria posição como tolerante

119 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

e a dos outros como intolerante, estando além dos limites ade-


quados da tolerância [...]” (OLIVEIRA, 2018, p. 4).
Forst (2009, p. 20), define a tolerância como sendo:

[...] uma relação entre uma autoridade ou


uma maioria e uma minoria dissidente, "dife-
rente". Tolerância significa, então, que a au-
toridade (ou maioria) concede uma permis-
são qualificada aos membros da minoria
para viverem de acordo com suas crenças,
na condição de que a minoria aceite a posi-
ção dominante da autoridade (ou maioria).
Contanto que a expressão de suas diferen-
ças permaneça dentro de limites, isto é, um
assunto "privado", e contanto que não reivin-
diquem status público e político iguais, eles
podem ser tolerados tanto em termos prag-
máticos como de princípio - em termos prag-
máticos porque essa forma de tolerância é
considerada a menos custosa de todas as
alternativas possíveis e não perturba a paz
civil e a ordem conforme o grupo dominante
a define (ao contrário, contribui para a
mesma); e em termos de princípio porque se
considera moralmente errado (e, de todo
modo, infrutífero) forçar as pessoas a aban-
donarem certas crenças ou práticas arraiga-
das.

4.2.1 INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

As pessoas diferem entre si. A base para um convívio

120 | P á g i n a
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harmonioso é a tolerância. O respeito aos ideais assim como


às práticas dos outros indivíduos desde que não causem pre-
juízos e não acarretem mal a alguém, é o mínimo que se pode
fazer de modo a colaborar para uma convivência amistosa.
É imprescindível haver tolerância, sobretudo no que diz
respeito a fé, esfera na qual as visões dos sujeitos são confli-
tantes entre si, estabelecendo, portanto, uma condição de
ponte dentre a aceitação integral e uma oposição imprópria
(BENTO, 2021).
Para Forst (2009, p. 20)

A tolerância é uma relação entre uma auto-


ridade ou uma maioria e uma minoria dissi-
dente, "diferente". Tolerância significa, en-
tão, que a autoridade (ou maioria) concede
uma permissão qualificada aos membros da
minoria para viverem de acordo com suas
crenças, na condição de que a minoria
aceite a posição dominante da autoridade
(ou maioria). Contanto que a expressão de
suas diferenças permaneça dentro de limi-
tes, isto é, um assunto "privado", e contanto
que não reivindiquem status público e polí-
tico iguais, eles podem ser tolerados tanto
em termos pragmáticos como de princípio -
em termos pragmáticos porque essa forma
de tolerância é considerada a menos cus-
tosa de todas as alternativas possíveis e não
perturba a paz civil e a ordem conforme o
grupo dominante a define (ao contrário, con-
tribui para a mesma); e em termos de princí-
pio porque se considera moralmente errado

121 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

(e, de todo modo, infrutífero) forçar as pes-


soas a abandonarem certas crenças ou prá-
ticas arraigadas.

Nos séculos XVII e XVIII houve um intenso debate a


respeito da tolerância. De acordo com Bento (2021), Voltaire
e John Locke divulgaram documentos célebres fazendo alu-
são ao tema, a saber, A Carta Acerca da Tolerância e o ‘Tra-
tado sobre a Tolerância’, respectivamente.
Bento (2021) afirma que na visão de Locke, a igreja é
composta por homens e mulheres, sendo uma sociedade livre,
que se unem por ação própria tendo como objetivo a adoração
a Deus. Os que declaram a fé, porém não exercitam a tolerân-
cia com os que são de diferentes religiões, demonstram não
terem zelo aos princípios de Deus.
Nenhuma pessoa, independente de sua liberdade e li-
vre pensar, pode agredir ou discriminar outras pessoas, ou até
mesmo grupos por optarem por outras crenças ou formas de
culto, já que cada indivíduo tem direito para optar por qual re-
ligião almeja adotar e praticar.
A carta a respeito da tolerância apresenta ser admissí-
vel existirem os diversos ramos religiosos sem ocasionar dis-
criminação. Infelizmente, isso não se viu isso acontecendo na
história, tão pouco na atualidade, pois, para muitas pessoas
trata-se ainda de uma empreitada penosa e complexa o ato de

122 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

respeitar as diferenças, especialmente quando o tema é a fé,


a religião (FISCHMANN, 2008; BENTO, 2021).
Em se tratando da intolerância, é importante destacar
que isso não é um fato atual, numerosos registros de insultos
e opressão em nome da intolerância foram registrados em di-
versas ocasiões da história humana, principalmente por as-
suntos religiosos. Para que ocorra o ato efetivo de intolerância,
o passo inicial é o preconceito, possuidor de uma compreen-
são que admite que uma certa tradição, prática ou fé é superior
à de outras comunidades.
Deste modo, o preconceito tem analogia direta com o
etnocentrismo12, uma vez que a diferença é avaliada a partir
de padrões culturais característicos. A intolerância por sua
vez, é uma maneira particular de injustiça, em compensação
a tolerância é algo imprescindível para que haja justiça
(BENTO, 2021).
Informações obtidas demonstraram que entre os anos
de 2015 e 2017, a cada 15 horas no Brasil, ocorreu uma de-
núncia a respeito de intolerância religiosa. O “disque 100”, que
é número estabelecido para se fazer denúncias de intolerância

12
Etnocentrismo - é um conceito da Antropologia definido como a visão de-
monstrada por alguém que considera o seu grupo étnico ou cultura o centro de
tudo, portanto, num plano mais importante que as outras culturas e sociedades. O
termo é formado pela justaposição da palavra de origem grega "ethnos" que signi-
fica "nação, tribo ou pessoas que vivem juntas" e centrismo que indica o centro
(HEXAG EDUCAÇÃO, 2021).
123 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

religiosa, até mesmo quando for cometida quaisquer agentes


públicos, tem a maior parte dos seus registros feitos respecti-
vamente em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais (POR-
FIRIO, 2022).
Porfírio (2022) ainda destaca com base em estatísticas
que:

• 25% da totalidade dos agressores, são identifica-


dos como brancos;
• 9% dos eventos relacionam-se a ações praticadas
dentro de casa;
• Os católicos que perfazem um total de 64,4% dos
brasileiros, registram 1,8% das denúncias de into-
lerância;
• Os protestantes que totalizam 22,2% da população,
registram 3,8% das denúncias relacionadas a into-
lerância religiosa;
• Os cidadãos que são adeptos de religiões de matriz
africana, ou seja, candomblé, umbanda dentre ou-
tras, que, são 1,6% da população do Brasil, repre-
sentam aproximadamente 25% das denúncias de
crimes relacionados a intolerância religiosa e ódio.

124 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4.2.2 ALGUNS REGISTROS DE INTOLERÂNCIA RELIGI-


OSA

Os registros expostos a seguir, foram captados nos por-


tais de notícias, G1 do Estado do Ceará e G1 do Estado do
Paraná.

4.2.2.1 Invasão em Templo da Igreja Evangélica Assem-


bleia de Deus em Tauá - CE

No dia 23 de fevereiro de 2022, um homem invadiu um


templo da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, no municí-
pio de Tauá – Ceará. O indivíduo quebrou diversos itens tais
como equipamentos de som e ornamentações do referido tem-
plo (FIGURA 1). De acordo com alguns policiais que operaram
no episódio, o homem apresentava sinais de transtorno mental
(G1-CE, 2022)
Costa (2022, p. 1) em post publicado, afirma que R. C.
L. (o invasor) é militante de determinado partido político, e em
sua ação, “[...] danificou o púlpito, uma mesa e objetos meno-
res, como um laptop, caixas de som, jarros e suportes de vi-
dro, com prejuízo estimado de R$ 15 mil”.
Diversos vídeos foram divulgados em diversas redes
sociais, onde se poder verificar que itens tais como jarros e
arranjos de flores foram quebrados ficando espalhados por

125 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

toda a extensão do referido templo. Diversos equipamentos


eletrônicos tais como caixas de som e notebook foram também
danificados. Não houve notificação de pessoas feridas, pois
no momento havia poucos indivíduos no local (G1-CE, 2022).
Ainda conforme o portal G1-CE (2022) o autor da inva-
são foi conduzido à Delegacia Regional de Tauá, que faz parte
da Polícia Civil do Estado do Ceará, pelos policiais militares.
Lá o invasor assinou um Termo Circunstanciado de Ocorrên-
cia (TCO) (G1-CE, 2022).

Figura 1 – Invasão do templo da Igreja Assembleia de Deus


em Tauá (CE)

Fonte: G1-CE, 2022.

4.2.2.2 Invasão na Igreja Matriz de São Mateus do Sul, na


Região Sul do Paraná

No dia 10 de outubro de 2022, ocorreu uma invasão na


Igreja Matriz de São Mateus do Sul, município que localizado
126 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

na região sul do Paraná. De acordo com o portal G1-PR (2022)


cerca de 30 (trinta) imagens sacras foram danificadas, no en-
tanto, nada foi retirado (FIGURA 2).
O padre da citada igreja, afirmou que dentre as imagens
danificadas, está uma imagem de Nossa Senhora das Graças
que era centenária tendo, portanto, um relevante significado
para toda a cidade, pois, de acordo com o padre, “[...] a santa
está com a comunidade desde a antiga capela, que fez parte
da formação do município [...]”. Este não foi o único item alve-
jado, foram ainda quebradas outras imagens, como, por exem-
plo, de Jesus, de outros santos e ainda de outras aparições de
Nossa Senhora (G1-PR, 2022).

Figura 2 – Invasão na Igreja Matriz de


São Mateus do Sul - PR.

Fonte: G1-PR, 2022.

127 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Foi registrado pelo padre um Boletim de Ocorrência


(B.O.) a respeito da invasão e as imagens que foram feitas
pelas câmeras de segurança da própria igreja bem como de
comércios da vizinhança, estão sendo analisadas pela Polícia
Civil (G1-PR, 2022).

A matéria divulgada, ressaltou que após o ocorrido


não se encontrou no local nenhum objeto, como, por exemplo,
martelos ou pedras, situação essa que a comunidade suspeita
que a pessoa que praticou o ato de vandalismo, subiu no altar
para derrubar as imagens (G1-PR, 2022).
De acordo com Silva e Santos (2019) a aquiescência
da diferença entre as religiões, tem se verificado que a cada
dia está mais distante, diversos episódios têm sido retratados,
apontando o contrário da tolerância, e isso não somente no
Brasil, mas em todo o mundo.
Neste sentido, Gonçalves (2011, p. 129) afirma que:

O problema é que as próprias crenças acir-


ram essa adoração ao ponto de incutir no
pensamento do fiel que este deve defender
a sua religião a todo e qualquer custo e que
apenas esta possui a palavra de Deus, uma
forma mascarada de intolerância, isto é, ao
valorizar a própria religião o líder deprecia as
demais e os fiéis, nessa toada tendem a dis-
criminar, agredir e a agir irracionalmente

128 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

contra aquilo que não conhece e não são


instigados a ter contato.

4.3 O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E A PRO-


TEÇÃO PENAL CONTRA A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

O Direito Penal, é o seguimento na esfera jurídica de-


signado para regular os comportamentos proibidos que cau-
sam lesão aos bens mais valiosos dos seres humanos e da
coletividade, bens que dentre estes fazem parte: a vida, a
honra, a integridade pública, o patrimônio e a concepção reli-
giosa (BENTO, 2021).
No grupo de preceitos do direito brasileiro, em se tra-
tando da esfera penal do amparo à liberdade religiosa, relaci-
ona-se no Título V que versa a respeito dos “Crimes contra o
sentimento religioso e contra o respeito aos mortos”, desmem-
brado em dois (2) capítulos; no primeiro capítulo tem-se a re-
ferência aos “crimes contra o sentimento religioso” e o se-
gundo capítulo alusivo aos “crimes contra o respeito aos mor-
tos”.

TÍTULO V
DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO
RELIGIOSO E CONTRA O RESPEITO AOS
MORTOS
CAPÍTULO I

129 | P á g i n a
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DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO


RELIGIOSO
Ultraje a culto e impedimento ou perturbação
de ato a ele relativo
Art. 208 - Escarnecer de alguém publica-
mente, por motivo de crença ou função reli-
giosa; impedir ou perturbar cerimônia ou
prática de culto religioso; vilipendiar publica-
mente ato ou objeto de culto religioso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou
multa.
Parágrafo único - Se há emprego de violên-
cia, a pena é aumentada de um terço, sem
prejuízo da correspondente à violência
(BRASIL, 1940).

Quanto a tipificação do crime, é mista cumulativa, uma


vez que detém três (3) aspectos incriminadores autônomos.
Neste sentido, Nucci (2009, p. 865 apud BENTO, 2021, p. 28)
afirma que praticar mais de uma desses aspectos, implica na
penalidade que deve ser imposta também por mais de um
crime. Portanto, é plausível “[...] que o agente responda, em
concurso material, por escarnecer de alguém, por perturbar
culto e por vilipendiar objeto religioso”.
No que se refere ao exercício judicial não é infre-
quente que o amparo ao livre-arbítrio religioso seja deficiente
e insatisfatório. Bento (2021, p. 28) cita uma decisão que foi
proferida pelo juiz federal da 17.ª Vara Federal da cidade do
Rio de Janeiro, no qual ao verificar um pedido por parte do
130 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ministério Público Federal que versava em excluir do YouTube


alguns vídeos onde se hostilizavam as religiões do candomblé
e da umbanda.
O juiz se pronunciou pelo indeferimento da petição ar-
gumentando que as referidas seitas “[...] não continham traços
necessários de uma religião. Mais tarde, após o surgimento de
grupos religiosos na imprensa, o juiz mudou seu entendi-
mento”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A concretização do estado laico, assim como a Intole-


rância são assuntos muitos estimulantes. A presente pesquisa
analisou esses temas na perspectiva do Direito brasileiro. No
Brasil, de forma diferente do que ocorre em outros países, se-
gue uma atitude que valoriza o livre-arbítrio religioso, os cida-
dãos têm assegurado através da Constituição Federal, em seu
art. 5.º, o direito de livremente escolher a qual religião quer
seguir.
Verificou-se através da pesquisa exposta que a intole-
rância religiosa é um fenômeno social que já ocorre há muito
tempo, ocorrendo pelo medo, pela incerteza, incompreensão,
ignorância e pela necessidade de certezas. Em diversas oca-

131 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

siões na história, aconteceram inumeráveis episódios de pre-


conceito, intolerância, perseguição, desrespeito e aniquila-
mento tendo como motivador a crença.
Embora haja direito constitucional assegurando a li-
berdade de crença, garantindo o franco exercício de culto reli-
gioso e, na forma da lei, garantindo a preservação aos locais
de culto bem como às suas liturgias, e a proteção penal que
procura tutelar o direito do livre-arbítrio de consciência e de
crença, verificou-se que tais institutos ainda não são total-
mente válidos no resguardo bem como para combater a into-
lerância religiosa no país.
Assim, diante do exposto, esta pesquisa buscou con-
tribuir, mesmo que de forma sutil, com o tema em discussão,
a fim de desmistificar, conscientizar e exibir os conflitos sociais
que comportamentos preconceituosos podem desencadear.
Todo ato que inflige o limite do radicalismo religioso,
contribui para o intransigência e, por isso, precisa ser comba-
tido. Assim fazendo, colaboramos para proteção e paz social.

REFERÊNCIAS

BENTO, Gabriela de Oliveira. O Estado laico, a intolerância


e o fanatismo religioso. Monografia (Curso de Bacharel em
Direito) 2021, 46 fl. Escola de Direito e Relações Internacio-
nais. Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC. Goiás,
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136 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5
ANÁLISE DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA DO DES-
CENDENTE NA CENA DO CRIME DE FEMINICÍDIO

ANALYSIS OF THE CAUSE OF INCREASE OF PENALTY


OF THE DESCENDANT IN THE CRIME
SCENE OF FEMINICIDE

Karoline da Cunha Gomes 13


Arthur Braga de Souza14

GOMES, Karoline da Cunha. Análise da causa de aumento


de pena do descendente na cena do crime de feminicídio.
Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em Direito –
Centro Universitário UNINORTE, Rio Branco, 2023.

13
Discente do 9º Período do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro
Universitário Uninorte. Pós-Graduada em Direito Administrativo pela Facul-
dade Campos Elíseos; Perícia, Auditoria e Gestão Ambiental pelo Centro
Universitário Uninorte e Inteligência Policial pela Faculdade Campos Elí-
seos. Graduada em Ciências Biológicas Centro Universitário Uninorte.
² Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido
Mendes. Graduado em Direito pelo Centro Universitário Uninorte. Servidor
Público Federal do TRF da 1ª Região. Professor Universitário no Centro
Universitário Uninorte.

137 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Este artigo pretende analisar de que forma é aplicada a causa


de aumento de pena ao autor do crime de feminicídio quando
este o comete na presença dos descendentes da vítima. Para
o embasamento teórico foi feita uma análise histórica da forma
como a sociedade, a justiça e a religião julgavam, tradicional-
mente, casos de feminicídio durante o decorrer do tempo. Bem
como a inovação legislativa que foi possível com a busca in-
cessante de movimentos de direitos humanos para garantir a
punição de crimes violentos contra a mulher. Destaca-se que
subsidiaram ainda o estudo o posicionamento de importantes
doutrinadores de direito penal e a aplicação jurisprudencial em
casos concretos de feminicídio no Brasil.

Palavras-chave: feminicídio, mulher, causa de aumento, des-


cendente.

ABSTRACT

This article intends to analyze how the cause of increased pe-


nalty is applied to the author of the crime of femicide when he
commits it in the presence of the victim's descendants. For the
theoretical basis, a historical analysis was made of the way in
which society, justice and religion traditionally judged cases of
feminicide over time. As well as the legislative innovation that
was possible with the relentless pursuit of human rights
movements to guarantee the punishment of violent crimes
against women. It is noteworthy that the position of important
doctrinaires of criminal law and the jurisprudential application
in concrete cases of feminicide in Brazil also supported the
study.

Keywords: femicide, woman, cause of increase, descendant.


138 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo buscou analisar de que forma a causa de


aumento de pena é aplicada ao autor do crime de feminicídio
quando este o comete na presença dos descendentes da ví-
tima, o problema que objetivava ser respondido era: a pre-
sença de um descendente na cena de feminicídio precisa de
dolo específico para que o autor seja punido com mais rigor?
Os homicídios contra mulheres, popularmente conhe-
cido como feminicídio após a criação da Lei n.º 13.104, de
2015, que incluiu no Código Penal o feminicídio em seu artigo
121, são um fato que perdura durante os séculos na socie-
dade, e em diversos aspectos, sejam eles culturais, religiosos
ou históricos além de reiterado, foi legitimado e somente após
muitos esforços e lutas reivindicando garantias básicas às mu-
lheres vítimas de violências, estas alcançaram visibilidade
para defesa dos seus direitos passando o Estado a cumprir
com a obrigação legal de garantir punibilidade mais severa em
tais crimes.
Apesar de atualmente contarmos com um arcabouço le-
gal que pretende adequar proporcionalmente a sanção penal
ao ato cometido pelo autor da violência contra a mulher, como
no caso da Lei Maria da Penha e demais leis que complemen-
taram o Código Penal, os índices de violência continuem cres-
cendo, muitas das vezes mesmo com a aplicação de medidas
139 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

judiciais o agressor não se intimida. Tal fato pode ser confir-


mado pelas estatísticas, pois, de acordo com o atlas da violên-
cia ano 2021, em 2019 foram registradas 3.737 mulheres as-
sassinadas no Brasil, tal número inclui tanto as circunstâncias
em que as mulheres foram vitimadas em razão de sua condi-
ção de gênero feminino, ou seja, em decorrência de violência
doméstica ou familiar ou quando há menosprezo ou discrimi-
nação à condição de mulher, como também em dinâmicas de-
rivadas da violência urbana.
Estudos indicam que as taxas de homicídios de mulhe-
res em suas residências cresceram mais de 10% entre os
anos de 2009 a 2019, o que revela que seus algozes eram
pessoas conhecidas e de sua intimidade, o que vai de encon-
tro às circunstâncias que aplicam a causa de aumento de pena
a ser analisada neste artigo. Outro dado importante a ser ana-
lisado é que os estados que aumentaram suas taxas de homi-
cídio contra a mulher foram das regiões Norte e Nordeste, e
que fazendo uma análise superficial poderíamos inferir que os
aspectos culturais e históricos estejam diretamente relaciona-
dos com os altos índices de feminicídio nessas regiões, bem
como o difícil acesso às instituições e meios de denúncias.
Diante disso, o dolo do agente que comete o feminicídio
perante descendentes da vítima seria um fator a ser conside-
rado quando da aplicação da causa de aumento no cálculo da

140 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sentença, fato que por si só já implica substancial diferença na


pena do réu, ou não se deveria suscitar tal questionamento
deixando assim reverberar o acréscimo em desfavor do réu
pela simples acomodação ao tipo penal, de forma objetiva?

5.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO FEMINICÍDIO

Podemos entender a violência contra a mulher como


uma ofensa à dignidade humana, aos seus direitos e garantias
que advém historicamente de uma relação de poder entre o
homem e a mulher, no qual o homem espera subordinação e
obediência por parte da mulher e com ela mantém uma rela-
ção desequilibrada. Esta relação é possível analisar cultural-
mente principalmente nas relações familiares onde o homem
exercia o poder familiar e de mando desde o início da socie-
dade que conhecemos.
A violência de gênero sempre esteve presente na soci-
edade, não importa a classe econômica, raça, nível cultural,
religião ou outra característica que diferencie um homem do
outro, seja lá em que grupo a mulher esteja inserida, ela já
sofreu algum tipo de violência ao longo de sua vida.
De acordo com a Convenção Interamericana para Pre-
venir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, adotada

141 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em 1994 em Belém do Pará, entender-se-á por violência con-


tra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que
cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico
à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada. Com
o advento da Lei Maria da Penha foram somados mais dois
tipos de violência: a moral e patrimonial. Ou seja, qualquer ato
que cause à mulher potencial sofrimento em detrimento do seu
sexo pode ser entendido como violência contra a mulher e
deve ser prevenido dentro da sociedade e punido pelo Estado.
Acredita-se que a prevenção de atos de violência contra
a mulher subsidiará um potencial desenvolvimento físico e psi-
cológico desta desde a infância até a vida adulta, caso contrá-
rio continuaremos a ver a vinculação nos noticiários de mais
tantos outros casos de violência até os casos mais graves e
fatais como é o feminicídio.
O feminicídio é o crime de homicídio praticado contra
mulher dolosamente pela simples condição de ser mulher, o
qual o agente agressor o comete desconsiderando e menos-
prezando o gênero feminino e sua dignidade e na maioria dos
casos foi tido como o autor do crime o companheiro ou alguém
de sua convivência. Veremos mais adiante que apesar de o
termo jurídico ser novo no ordenamento brasileiro, o feminicí-
dio é uma prática que ocorre no mundo há muito tempo e por

142 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

diversas vezes foi chancelado pelo próprio direito, estado e


sociedade.

5.1.1 ANTES DE CRISTO

Viajando na história do homem, mais precisamente no


tempo das escrituras, em Levítico, um dos livros do antigo tes-
tamento da Bíblia Sagrada, existia uma punição de morte às
esposas acusadas de adultério. “Disse o Senhor a Moisés: Se
um homem cometer adultério com a mulher de outro homem,
com a mulher do seu próximo, tanto o adúltero quanto a adúl-
tera terão que ser executados” (Lev, 20, 1.10).
A morte ocorria por apedrejamento, quando a mulher
era pega em flagrante pelo marido, tanto ela quanto o amante
seriam levados à porta da cidade, perante o tribunal e ali, com
testemunhas que os flagraram, ambos seriam apedrejados.
Aqui percebemos que o aval para o homicídio da mulher é
dado pela religião, apesar de se tratar de um mandamento re-
ligioso, os povos da época o tinham como sua própria lei.
Atualmente, a depender da religião seguida, já não ve-
mos os mesmos ensinamentos e difusão de ideias punitivistas
como antes ocorria. Porém, ainda se considera que no relaci-

143 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

onamento conjugal a mulher deve subordinação, agir com ser-


vidão ao seu marido e deixar que ele seja o tomador de deci-
são do lar.

5.1.2 NO BRASIL (COLÔNIA E IMPÉRIO)

Seria de extrema ingenuidade e desconhecimento su-


por que a mulher que passou por todas as transformações do
país recém descoberto não tenha encontrado fortes obstácu-
los em seu desenvolvimento e preconceitos inerentes à sua
época, pois o Brasil seguia o modelo de sociedade advinda do
seu reino em Portugal, em que a mulher daquele tempo ainda
era vista como um ser destituído de maiores direitos e tendo
no homem o seu dono, possuidor e responsável a quem devia
respeito e obediência, assim eram com as esposas, filhas e
principalmente as escravas.
O Brasil colônia perdurou entre meados de 1530 a
1822, quando não existiam ainda leis e normas locais criadas
para a sociedade que aqui habitava, com isso fora regido, den-
tre outras normas, pelas Ordenações Filipinas (um apurado de
normas antes existentes que foram compiladas e editadas no
ano de 1603 e abordava diversas matérias como direito civil,
comercial, direito agrário e além da organização do Estado e

144 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

seu Livro V tratava de normas semelhantes a um código pe-


nal). Este compilado de leis se aplicava tanto a Portugal
quanto a suas colônias.
Como exposto anteriormente, este compilado de leis
regrava a sociedade daquele tempo, machista, arcaica e que
subjugava e oprimia as mulheres que não tinham defesa ou a
quem recorrer. As Ordenações Filipinas aplicadas no Brasil
colônia dava ao homem o direito, sem qualquer risco de puni-
ção, de cometer homicídio contra sua mulher caso a flagrasse
em adultério ou apenas suspeitasse que a mesma estivesse
cometendo traição. Havia um único caso de punição conhe-
cido caso fosse consumado o homicídio, seria quando o
amante fosse pessoa mais valorizada que o marido traído,
neste caso o homicida era condenado a 3 anos de isolamento
na África.
Outro fato que remonta ao antepassado misógino da
época e que selava a relação arbitrária entre o Estado e o clero
contidas nas ordenações eram as regras de punição às mu-
lheres que se envolviam amorosamente com os padres, suas
amantes e ‘esposas’. Apenas as mulheres eram sentenciadas,
a pagamento de multas, a degredo para locais distantes do
clérigo infiel por 1 ano, cabendo ainda açoite em via pública.
O religioso nada sofreria, jamais poderia ser preso ou respon-
der pelo crime, ou pecado.

145 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5.1.3 BRASIL (REPÚBLICA)

Somente depois de mais de 300 anos durante o período


republicano que o Brasil passou a ter um código penal próprio,
porém as mulheres não podiam esperar muito das novas nor-
mas aqui alicerçadas, muito pelo contrário nem mesmo a
constituição da época tratava as mulheres com mais cortesia
e dava-lhes a proteção necessária.
O primeiro Código Penal de 1830, trazia em alguns ar-
tigos punição diferenciada entre homens e mulheres nos ca-
sos de adultério, para os homens a pena só seria aplicada
quando o mesmo tivesse uma relação comprovada no qual
mantivesse financeiramente a amante, já a mulher pelo sim-
ples fato de traição seria punida.
O código de 1890 se utilizava de classificações às mu-
lheres como: as de família, honesta, prostituta e teria proteção
diferenciada dada por lei. Uma novidade que pôde trazer al-
guma relevância foi a inclusão da agravante para crimes co-
metidos contra ascendente, descendente, cônjuge, irmão,
com demonstrada familiaridade entre o agente e a vítima, não
se especificava ainda a condição do gênero para atribuir maior
gravidade ao crime, isso só ocorreu muitos anos depois.

146 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ainda assim, o Código Penal de 1890 perdoava e exi-


mia da condenação os homicidas passionais, aqueles que ma-
tavam e em sua defesa alegavam a “violenta paixão e emo-
ção”. Esta alegação era amplamente aceita pela justiça e so-
ciedade da época e perdurou por bastante tempo como motivo
de defesa dos maridos assassinos.
Tal aberração só foi excluída no código de 1940, que
eliminou a excludente de ilicitude para os casos de crimes pas-
sionais. Porém, a referida lei, apesar de não perdoar os casos
passionais, incluiu uma diminuição de pena, criando o homicí-
dio privilegiado - art. 121, § 1º - que se adequava perfeita-
mente ao homicídio cometido por violenta emoção, relevante
valor social ou moral. Teoria de defesa amplamente utilizada,
assim como a anterior.
Mais tarde outra novidade no âmbito jurídico foi criada,
a tese da legítima defesa da honra, que novamente daria o
perdão ao homem que tirasse a vida da mulher. Pois com essa
teoria o homem teria direito de defesa à honra - esta asseme-
lhando-se a qualquer outro bem jurídico. Aqui a mulher perde
o status de vítima, e passa a ser a culpada pela quebra da
honra masculina, dando ao marido o direito de restabelecer
perante a sociedade aquilo que lhe é de maior valor.
Em seu livro “A paixão no banco dos réus — casos pas-

147 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sionais célebres: de Pontes Visgueiro a Pimenta Neves” a es-


critora e procuradora de justiça Dra. Luiza Nagib Eluf traz à
tona diversos casos de feminicídio ocorridos ao longo do
tempo, um de grande repercussão à época é o cometido pelo
desembargador do Maranhão José Cândido Pontes Visgueiro,
de 62 anos, que, em agosto de 1873, matou Maria da Concei-
ção, conhecida por Mariquinhas, que aos 17 anos foi assassi-
nada por não querer se casar com Pontes Visgueiro.
A moça era linda, porém, muito pobre, passava dias
sem ter o que comer. Além disso, a moça desde nova era ex-
plorada sexualmente por sua mãe, que lhe obrigava a ser
prostituta. Mariquinhas mantinha diversos casos com homens,
os quais eram de conhecimento de toda a cidade, inclusive do
desembargador por quem era apaixonado e lhe demonstrava
imensa paixão, a ponto de expor publicamente seu interesse
em manter com a moça relacionamento, porém sem receber
dela qualquer reciprocidade.
Pontes Visgueiro planejou todo o crime, o qual teve
ajuda de várias testemunhas do ocorrido, muitas delas por
consideração. O desembargador confessou o crime durante a
fase de investigação e sua defesa alegou “desarranjo mental”,
provocado pelo “mais violento ciúme inspirado por uma mulher
perdidíssima”. Mas foi sentenciado pelo crime de homicídio
qualificado, cometido com abuso de confiança e de surpresa.

148 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No caso acima, além de vítima, Mariquinha ainda é co-


locada como culpada pelo próprio fim, tendo a defesa do autor
atribuído sua embaraçosa vida íntima como motivação pelo ci-
úme cego de seu algoz, que nunca teve retribuído sentimento
público confiado. Como visto, tais alegações são contumazes
e culturais, quando se imputa à vítima o resultado de tais
ações descabidas tidas por homens que não aceitam ou res-
peitam as mulheres em sua plenitude.
Apenas com os crescentes movimentos de gênero em
âmbito mundial passou-se a vislumbrar a busca por direitos,
igualdade e proteção, uma grande conquista foi o direito à
igualdade defendido pela Constituição Federal de 1988, em
que fez abrir as portas para um Estado com vistas a uma nova
posição social igualitária.
Mas só recentemente a tese de legítima defesa da
honra foi declarada inconstitucional, pois ia em confronto com
norma maior, não sendo mais aceita tal defesa aos homicidas
que a alegam para fugir da punição dos crimes cometidos con-
tra suas parceiras. Apenas em 2021, após ajuizamento
de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamen-
tal (ADPF n.º 779), o Supremo Tribunal Federal, por unanimi-
dade, confirmou uma liminar já concedida pelo Ministro Dias
Toffoli, no âmbito da ADPF e decidiu que:

149 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a) a tese da legítima defesa da honra é in-


constitucional, por contrariar os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa, da
proteção à vida e da igualdade de gênero; b)
deve ser conferida interpretação conforme à
Constituição ao art. 23, II e 25, do Código
Penal e ao art. 65 do Código de Processo
Penal, de modo a excluir a legítima defesa
da honra do âmbito do instituto da legítima
defesa; c) a defesa, a acusação, a autori-
dade policial e o juízo são proibidos de utili-
zar, direta ou indiretamente, a tese de legí-
tima defesa da honra (ou qualquer argu-
mento que induza à tese) nas fases pré-pro-
cessual e processual penais, bem como du-
rante julgamento perante o tribunal do júri,
sob pena de nulidade do ato e do julga-
mento; d) em que pese o art. 483, III, § 2º,
do Código de Processo Penal prever a pos-
sibilidade de, no Tribunal do Júri, ocorrer a
absolvição genérica ou por clemência, o
acusado de feminicídio não pode ser absol-
vido, na forma do referido artigo, com base
na tese da “legítima defesa da honra”; e) em
regra, o Ministério Público não pode recorrer
de decisão absolutória do tribunal do júri ba-
seada em quesito de absolvição genérico
(art. 483, III, c/c § 2º) alegando que a deci-
são foi manifestamente contrária à prova
dos autos (art. 593, III, “d”, CPP), mas, se a
defesa lançar mão, direta ou indiretamente,
da tese da legítima defesa da honra no ple-
nário do júri e o réu for absolvido, será pos-
sível que o Ministério Público interponha
apelação, mas não com base no art. 593, III,
“d”, do CPP (decisão manifestamente con-
trária à prova dos autos) e sim com funda-
mento na nulidade do julgamento (art. 593,
III, “a”, do CPP).

150 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Com o decorrer do tempo, foram surgindo novas leis,


como na Lei n.º 8.072 de 1990 - a Lei dos Crimes Hediondos,
que ampliava a punição e retirava a possibilidade e perdão,
anistia e graça para casos de crimes lá descritos, como o ho-
micídio qualificado.
A partir da Lei n.º 13.104, de 2015, que incluiu no Có-
digo Penal o feminicídio em seu artigo 121, o Brasil passou a
punir mais severamente tais crimes. Com a nova alteração
passa a vigorar o seguinte texto do código:

Art. 121. Matar alguém:


(...)
Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
(...)
Feminicídio
VI - Contra a mulher por razões da condi-
ção de sexo feminino
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
§ 2º -A Considera-se que há razões de con-
dição de sexo feminino quando o crime en-
volve:
I - Violência doméstica e familiar;
II - Menosprezo ou discriminação à condi-
ção de mulher.

Além da qualificadora em questão, a lei supracitada in-


cluiu ainda causas de aumento de pena quando houver a qua-
lificadora do feminicídio, são elas:
151 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Aumento de pena:
§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de
1/3 (um terço) até a metade se o crime for
praticado:
I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses
posteriores ao parto;
II - contra pessoa menor de 14 (catorze)
anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com
deficiência;
III - na presença de descendente ou de as-
cendente da vítima.

O arcabouço legal contou ainda com nova lei em 2018


para dar mais efetividade a crimes praticados contra a mulher
e demais minorias com advento da Lei n.º 13.771 de 2018. O
art. 121, § 7º passou a vigorar com o seguinte texto:

§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de


1/3 (um terço) até a metade se o crime for
praticado:
I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses
posteriores ao parto;
II - contra pessoa menor de 14 (catorze)
anos, maior de 60 (sessenta) anos, com de-
ficiência ou portadora de doenças dege-
nerativas que acarretem condição limi-
tante ou de vulnerabilidade física ou men-
tal;
III - na presença física ou virtual de descen-
dente ou de ascendente da vítima;

152 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

IV - em descumprimento das medidas


protetivas de urgência previstas nos inci-
sos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº
11.340, de 7 de agosto de 2006.
(Grifo nosso)

Antes das Leis n.º 13.104/2015 e 13.771/18, o homicí-


dio praticado contra mulher em razão do seu gênero era pu-
nida comumente, ou seja, de forma genérica, pelo artigo 121
do Código Penal, a depender da circunstância poderia tão so-
mente ser qualificado pelas qualificadoras genéricas contidas
no bojo do artigo, tais como motivo torpe (inciso I do § 2º do
art. 121), fútil (inciso II) ou, ainda, em virtude de dificuldade da
vítima de se defender (inciso IV).
O aumento de pena é uma circunstância prevista no
próprio Código Penal, em que o julgador irá se utilizar das me-
didas possíveis na lei para aumentar a sentença do autor do
crime no momento do cálculo da pena deste, somando à pena
base as causas de aumento, tornando mais severa a conde-
nação de acordo com reprovação do crime cometido.

5.2 LEI MARIA DA PENHA: DE BANALIZAÇÃO DA VIOLÊN-


CIA À AMPLITUDE DA PROTEÇÃO À VIDA

Esta lei é resultado de um caso emblemático, conhe-


cido nacionalmente, onde a cearense Maria da Penha Maia
153 | P á g i n a
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Fernandes, que por anos passou por diversas violências em


seu casamento, e teve seu ponto focal nas tentativas de homi-
cídio tendo como autor seu marido à época, o que a deixou
paraplégica.
Apesar das diversas leis existentes no ordenamento ju-
rídico brasileiro e composição de algumas convenções de di-
reitos de proteção à mulher, não havia ainda nenhuma lei que
se voltasse à particularidade de casos de violência doméstica
e familiar contra a mulher.
Em conjunto com instituições de âmbito internacional,
Maria da Penha buscou seus direitos e denunciou perante a
Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organiza-
ção dos Estados Americanos - CIDH, gerando uma condena-
ção ao Brasil por não possuir métodos para combater a violên-
cia contra a mulher.
Os esforços de Maria da Penha foram decisivos para a
criação de políticas públicas voltadas à proteção e subsídio de
mecanismos efetivos contra a violência doméstica e familiar
vivida por mulheres.
Como explicitado no capítulo anterior, caracteriza vio-
lência doméstica e familiar contra mulher todo é qualquer ato
ou omissão que baseada no gênero cause morte, lesão, sofri-
mento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimo-

154 | P á g i n a
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nial à mulher no âmbito doméstico com ou sem vínculo fami-


liar, no âmbito da família, em qualquer relação íntima de afeto
independentemente de coabitação.
Destaca-se que a vítima sempre será mulher, e a juris-
prudência ampliou às transexuais a cobertura protetiva, e figu-
rará como autor da violência tanto homem quanto mulher, in-
dependente de orientação sexual, podendo o casal homoafe-
tivo feminino figurar como autora e vítima da violência domés-
tica e familiar na Lei Maia da Penha.
Vale destacar ainda que a lei tem caráter protecionista
quando trata das medidas de proteção e também assistencia-
lista ao prever especialização do tratamento à vítima, além de
prever tais finalidades o descumprimento das medidas proteti-
vas elencadas no bojo da lei causará ainda caracterização do
crime por seu descumprimento e ensejar decretação de prisão
preventiva nos casos previstos.
Pode-se dizer que a Lei Maria da Penha é o ápice da
luta contra a violência sofrida pelas milhares de mulheres no
Brasil. A partir dela pudemos ver a atuação de diversas insti-
tuições em favor da proteção à mulher, agindo com mais rigo-
rosidade frente a seus algozes.
Essa lei permitiu que o Estado passasse a punir mais
severamente aqueles que infringissem inadvertidamente os di-
reitos humanos das vítimas desses crimes. Casos de violência

155 | P á g i n a
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contra a mulher eram tratados como crimes de menor poten-


cial ofensivo. Ao deparar-se com um caso concreto de violên-
cia na maioria das vezes a penalidade aplicada se resumia
em: trabalho comunitário e entrega de cestas básicas.
Provavelmente por serem banalizados, não havendo
uma tipificação penal compatível com a importância real e com
a punição para os infratores, os crimes contra a mulher, como
foi o caso de Maria da Penha, tiveram tanta reincidência com
o passar dos anos.

5.3 O AUMENTO DA PUNIÇÃO NO CRIME DE FEMINICÍDIO

Somente após a criação da Lei Maria da Penha passou-


se a punir rigorosa e adequadamente os autores de crimes
contra a mulher. Além da tipificação adequada, não sendo
mais atribuída como infração de menor potencial ofensivo e
passando a ‘status’ de crime como é agora o feminicídio.
Atualmente o homicídio praticado contra a mulher se
encontra tipificado no artigo 121 do Código Penal e é uma qua-
lificadora do crime de homicídio, podendo ter sua pena comi-
nada de doze a trinta anos de prisão.
É indiscutível os benefícios que foram pactuados após
a criação da Lei Maria da Penha no Brasil, o estabelecimento

156 | P á g i n a
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de procedimentos e devido processo legal para quem deve so-


frer a imposição da lei. Sua tipificação e as demais formas que
ajudam a adequar o caso concreto ao crime praticado, como
no caso das causas de aumento de pena que somados à qua-
lificadora, conseguem ajustar ainda mais o crime ao tipo penal
objeto da ação.
O feminicídio possui atualmente quatro situações que
podem agravar a pena do autor de crime de homicídio contra
a mulher, são elas, as causas de aumento de pena, que caso
sejam invocadas no processo podem aumentar, cada uma, um
terço até a metade da pena.
Mas para entendermos as causas de aumento faz-se
necessário conhecer o que de fato são essas causas de au-
mento e de que forma ela vai modificar a sentença judicial.
A pena é o método judicial utilizado pelo juiz para atri-
buir punição ao autor de infrações penais, devendo a penali-
dade ser individualizada para cada agente, e apesar de ser
discricionária a análise pelo juiz, ela é vinculada e deve obe-
decer ao que a legislação fixa, a princípios e regras constituci-
onais. Ao final da análise judicial, o juiz decidirá como a pena
será aplicada e o tempo que o infrator responderá por ela.
O Brasil adotou o sistema trifásico para o cálculo da
pena privativa de liberdade o que significa dizer que a pena
será analisada em 3 fases distintas.

157 | P á g i n a
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Na 1ª fase o juiz fixará a pena-base, o juiz começará o


cálculo da pena, com a pena mínima prevista na lei, após isso
serão analisadas circunstâncias judiciais previstas no art. 59
do CP, por exemplo se o réu possui antecedentes criminais,
ou sua culpabilidade, ao todo são 8 as circunstâncias judiciais
a serem analisadas, cada uma no valor de 1/6. Tais aspectos
não configuram apenas condições desfavoráveis ao réu, pode
até mesmos favorecê-lo, ajudando a diminuir a sentença.
Estando presente a circunstância o juiz somará ou sub-
trairá cada uma à pena base. No crime de feminicídio a pena
base é de 12 anos (mínimo) a 30 anos (máximo).
Após a fixação da pena base feita, na 2ª fase têm-se a
pena intermediária, neste momento incidindo ao cálculo a va-
loração das agravantes (arts.61 e 62 do CP) e atenuantes
(Arts. 65 e 66 do CP). Importante ressaltar que caso nesta fase
não seja observada nenhuma agravante, apenas atenuantes,
manterá a pena base da 1º fase não devendo ficar abaixo do
mínimo legal previsto para o crime.
A respeito das agravantes, estas sempre agravarão a
pena, desde que não constituam ou qualifiquem o crime. A
exemplo de agravantes da pena temos a reincidência e o
crime praticado para assegurar a ocultação de outro crime. As
atenuantes serão analisadas após o esgotamento das agra-

158 | P á g i n a
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vantes, a regra é que elas sempre atenuarão a pena. A meno-


ridade e o desconhecimento da lei são atenuantes previstas
no CP. O Código Penal traz essas circunstâncias genéricas
apenas em sua parte geral, podendo ainda a legislação extra-
vagante vir a prever alguma agravante ou atenuante. E não há
previsão legal definida para o quantum (valor) de cada circuns-
tância.
Após a obtenção da pena na primeira e segunda fases,
o juiz partirá para a 3º e última fase do cálculo da pena. Sendo
analisadas nesta etapa as causas de aumento ou diminuição
da pena ou majorantes e minorantes. Esses aspectos estão
previstos tanto na parte geral (arts. 69 a 71) quanto na parte
especial do Código Penal vinculadas ao tipo penal específico,
e ainda podem estar descritas nas leis extravagantes.
A causa de aumento ou diminuição pode ter um valor
fixo como - ¼, 1/6 ou uma quantidade variável - 1/3 até me-
tade, por exemplo, ficando discricionário ao juiz a estipulação
quando não for determinado pela lei o valor exato. Nesta fase
o juiz pode elevar a pena além do valor máximo ou fazer o
inverso reduzindo a pena além do mínimo legal. Um exemplo
que pode ocorrer nesta fase é a causa de diminuição quando
houver tentativa que será reduzida de 1/3 a 2/3.
O crime de feminicídio possui 4 causas de aumento
como já mencionado anteriormente, a causa de aumento aqui

159 | P á g i n a
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estudada, disciplina o que trata do crime de feminicídio prati-


cado na presença física ou virtual de descendente, ou de as-
cendente da vítima, foi inserida na parte especial do Código
Penal através de uma lei e prevê o aumento de 1/3 (um terço)
até a metade (do valor já somado na fase anterior).

5.2.1 DO DOLO ESPECÍFICO QUANTO À CAUSA DE AU-


MENTO DE PENA

Como visto anteriormente a Lei Maria da Penha trouxe


em seu bojo diversas alterações que foram adicionadas ao Có-
digo Penal para penalizar de forma satisfatória o agente crimi-
noso.
Um exemplo foram as causas de aumento de pena cri-
adas para o referido crime, buscando aplicar de forma equita-
tiva a pena, considerando a gravidade do crime. Porém, há
casos em que a jurisprudência diverge sobre a aplicação do
aumento de pena.
Faremos uma abordagem à causa de aumento tipifi-
cado no artigo 121, § 7º, III, do Código Penal, que trata da
presença de descendente ou de ascendente da vítima no
crime de feminicídio. A abordagem não irá analisar quanto à
forma que ocorrer seja ela na presença física ou virtual do pa-
rente, aspectos que fazem parte da qualificadora.

160 | P á g i n a
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A problemática em questão é: para ser aplicada a causa


de aumento, o autor deve ter o dolo de cometer o crime na
presença do descendente da vítima do crime de feminicídio?
O autor do crime deve ter consciência real de haver no mo-
mento do crime os parentes da vítima para que lhe seja apli-
cada a pena mais gravosa?
Para ilustrar de que forma os tribunais estão julgando
tais processos, traremos dois casos reais. Um julgado pelo Tri-
bunal de Justiça de São Paulo e outro pelo Tribunal de Justiça
de Pernambuco. Importante ressaltar que a qualificação dos
crimes nas Ações Criminais fora de acordo com a redação do
Código Penal da época em que ocorreram, não havendo ainda
a incrementação da qualificadora trazida pela Lei n.º 13.771
de 2018 que alterou o texto, comportando além da presença
física do ascendente ou descendente na cena do crime tam-
bém poderá ser virtual.
O primeiro caso julgado é um recurso no Tribunal de
Justiça de São Paulo, o réu em violência doméstica e familiar
contra a mulher, por razões de condição de sexo feminino e
mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, teria ma-
tado sua companheira Daiane R. D. Consta ainda que, no
mesmo local e horário, em violência doméstica e familiar con-
tra a mulher, por razões da condição de sexo feminino e

161 | P á g i n a
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agindo para assegurar a execução de outro crime, teria ten-


tado matar sua sogra Roselene S. R., não consumando o de-
lito por circunstâncias alheias à sua vontade. De acordo com
a denúncia, por fim, os delitos teriam sido praticados diante da
descendente da vítima, a criança Laura.
O caso remonta ao feminicídio na cidade de Iguapé no
ano de 2016 que teve como vítima fatal Daiane R. D. e seu
parceiro e algoz Gelber B. G. que cometeu o crime na pre-
sença da filha do casal, a menor de idade Laura. A mãe da
vítima e também vítima Roselene S. R. testemunhou que pre-
senciou o genro brigando fisicamente com a filha que viu que
o mesmo havia batido a cabeça da vítima contra parede na
presença da menor que estaria gritando, e que o réu teria ten-
tado estrangular a criança que desmaiou.
Ao perceber que o réu retirara um canivete e que iria
ferir Daiane, Roselene tentou impedir a agressão para prote-
ger a filha Daiane e com isso teria sido lesionada no braço e
na cabeça ao momento que o réu começou a desferir golpes
de canivete contra Daiane, a avó após receber o golpe perpe-
trado pelo autor teria retirado a criança do local e ouviu o réu
dizer de forma fria que havia matado Daiane.
A mãe contou ainda que o réu já teria histórico de agres-
sões a seus familiares e ameaçado uma amiga da vítima e

162 | P á g i n a
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sido expulso da polícia militar na cidade onde morava, que era


ciumento e mexia no celular da vítima.
No referido caso fatídico, a defesa buscava a impronún-
cia por alegar falta de provas e desclassificação do crime de
feminicídio para lesão corporal de natureza grave com resul-
tado morte, e tentativa de feminicídio por lesão corporal leve,
fato este que retiraria do júri o poder de julgamento.
O Tribunal negou provimento ao recurso pretendido e o
réu foi pronunciado com a tipificação nos artigos 121, § 2º, in-
cisos IV e VI, e §2º-A, inciso I, do Código Penal e § 7º. Inc. III
da Lei 11.340/06; e art. 121, §2º, incisos V e VI, e § 2º-A, inciso
I e § 7º, III da Lei 11.340/06 c/c. art.14, inciso II do Código
Penal.
Incidiram a tipificação do Feminicídio, uma qualificadora
pela impossibilidade de defesa da vítima, além da causa de
aumento de pena pela presença da filha da vítima e da mãe
da vítima, além da tentativa de feminicídio da mãe da vítima
para assegurar a ocultação do crime cometido anteriormente,
onde esta acabou por sair lesionada pelo autor.
Neste caso foi aplicada fielmente a causa de aumento
de pena ao crime de feminicídio pela presença da mãe e da
filha da vítima, a mãe de Daiane que além de presenciar a
morte da filha ainda foi lesionada pelo réu, o qual acredita-se
que houve uma tentativa de feminicídio que foi combinado com

163 | P á g i n a
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mais uma qualificadora, por tentar ocultar o crime primeiro. E


a criança que além de ter presenciado toda a cena terrível de
agressões e homicídio da própria mãe ainda teria sido vítima
do próprio pai ao momento que o réu tentou estrangular a
mesma.
O segundo caso ocorrido na cidade de Olinda, Pernam-
buco em 2015, teve Maria Marcia P. como vítima de feminicí-
dio com emprego de meio cruel, comprovada como causa da
morte traumatismo craniano-encefálico após ser brutalmente
espancada por seu companheiro que de acordo com as teste-
munhas estava bêbado e drogado.
O crime ocorreu no fim da noite na presença do seu filho
adolescente e de vizinhos, Marcia após sofrer as primeiras
agressões, buscou por socorro na vizinhança ao que seu
agressor a perseguiu e além de continuar agredindo a vítima
frente aos vizinhos e filho ainda os ameaçou com intuito de
não ser denunciado, após o ocorrido teria levado a vítima fe-
rida para casa.
Mesmo com as diversas agressões sofridas, a vítima por
medo não quis denunciar o réu e buscar ajuda por atendi-
mento hospitalar. Ao amanhecer, após passadas as horas, o
filho da vítima buscou por parentes e uma vizinha também
contatou familiares para socorrer a vítima. Testemunhas afir-

164 | P á g i n a
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mam que o réu com intuito de não ser descoberto pelos fami-
liares da vítima e ser denunciado, juntamente com a mãe, es-
taria tentando levar Márcia para casa de sua mãe e escondê-
la, porém os familiares a resgataram e buscaram o socorro
dela, mas sem sucesso, pois a vítima não chegou a receber
atendimento a tempo e faleceu.
Relatos dos familiares contaram que os filhos de Márcia
que conviviam com o réu já haviam presenciado outras tantas
agressões e que a mesma por medo do companheiro ser
preso não mencionava tais agressões sofridas apesar de he-
matomas e ferimentos expostos à mesma costumava descon-
versar, visto que o réu estava em temporariamente em liber-
dade por haver cometido outro crime e ela não queria que ele
fosse prejudicado, contam ainda que os filhos passaram a ter
comportamento abalado após a morte da mãe.
Neste caso, a defesa buscava retirar a qualificadora por
acreditar não estar comprovada o meio cruel praticado, a ex-
clusão da causa de aumento de pena pela presença do filho
da vítima no momento do crime e diminuição da pena base
aplicada acima do mínimo legal sem haver fundamentação da
dosimetria.
O acórdão negou provimento ao recurso da defesa,
confirmando a decisão em condenar o apelante nas penas do
crime previsto no artigo 121, §2°, incisos III e VI, §2°-A, inciso

165 | P á g i n a
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I, e §7°, inciso III, do Código Penal. O réu foi sentenciado à


pena de 18 anos e 6 meses de reclusão.
No feminicídio de Maria Márcia incidiu a causa de au-
mento estudada, visto que foi comprovado através dos vários
testemunhos que presenciaram as agressões à vítima a pre-
sença física do filho, o qual ainda teria sido ameaçado pelo réu
para que não fosse denunciado e não interferisse na briga, e
ainda assim o menor não se esquivou em buscar ajuda dos
parentes com fins de socorrer e salvar a própria mãe.
Os casos acima são apenas dois das centenas que
ocorrem em todo o país que tem como vítimas não somente
as mulheres que sofrem a violência direta, como também seus
filhos, pais e parentes, que continuam vivendo com a dor da
ausência de suas mães, filhas, irmãs, netas.
De acordo com o que foi visto, podemos concluir que
existe uma escalada de violência, os dois réus já tinham co-
metido agressões contra as companheiras antes do cometi-
mento do homicídio, o fizeram na presença de várias pessoas,
incluindo os filhos e genitora que além de vítimas, foram tes-
temunhas do crime, o que ainda assim não foi obstáculo para
o assassinato das mulheres que diante da injusta agressão e
sem conseguirem impedir e defender-se de seus algozes vie-
ram à morte.

166 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Portanto, a causa de aumento de pena, qual seja crime


de feminicídio cometido na presença física ou virtual de des-
cendente, ou de ascendente da vítima, se amolda perfeita-
mente aos casos concretos analisados, tendo em vista a pre-
sença física dos filhos/ascendente das vítimas no exato mo-
mento do cometimento do crime, fato que em nenhum mo-
mento foi motivo de sustação dos atos criminosos pelos auto-
res do crime, muito pelo contrário. Não sendo aplicado porque
a lei penal não retroage.
Voltando à análise da causa de aumento quanto ao
dolo do agente, alguns doutrinadores do Direito Penal corro-
boram com a aplicação da causa de aumento, porém com res-
salvas. Para Guilherme de Souza Nucci, (2022, p. 670), a
causa de aumento de pena analisada deve ser aplicada obe-
decendo ao caso concreto, porém deve ser comprovada que
houve grande trauma para o ascendente ou descendente da
vítima para que seja aplicada esta causa de aumento:

[...] Essa circunstância, quando ocorria, era


tratada como consequência do crime, pre-
vista no art. 59 do CP, por traumatizar os
descendentes. Passa, agora, a contar com
uma causa de aumento específica, incluindo
os ascendentes da vítima, que também po-
dem sofrer um trauma. A presença implica
visualização do momento da conduta lesiva,
geradora da morte. Não envolve, por óbvio,
o momento do resultado (morte), pois este

167 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pode dar-se muito tempo depois da agres-


são. O grau da elevação obedece ao caso
concreto, como a efetiva prova de que o des-
cendente ou ascendente sofreu um trauma
visível e medicamente atestado em face da
violência presenciada, provocando um au-
mento maior. A modificação introduzida pela
Lei 13.771/2018 concentrou-se na forma em
que se dá a presença, podendo ser física (no
mesmo ambiente estão agente, vítima e es-
pectador ascendente ou descendente) ou
virtual (acompanha-se o crime por meio de
visualização concretizada pela Internet ou
qualquer outro modo de exibição em tempo
real). (2022, p. 670).

Para GRECO (2021, p.283), para que ocorra a aplica-


ção da referida causa de aumento de pena o autor do femini-
cídio deverá ter conhecimento real de que quem estava pre-
sente eram ascendentes ou descendentes da vítima, sendo
necessário ainda que se comprove o parentesco através de
documentos no processo.
Analisando a redação da causa de aumento, CABETTE
(2019), levanta o questionamento se para ser aplicada haveria
a necessidade de simultaneidade/ sincronia dos atos e fotos
ou vídeos para o caso de caracterizar a presença virtual dos
parentes, sejam ascendentes ou descendentes da vítima e
que sua morte fosse mostrada ainda que a distância em sin-
cronicidade ou bastaria que imagens fossem enviadas após o

168 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ato criminoso. Ele entende que deve, sim, haver a simultanei-


dade entre o crime e a presença dos parentes, pois a redação
da lei traz a ‘presença’ seja física ou virtual, por exemplo, se o
agente matasse a mulher e após dias levasse aos filhos da
vítima as imagens da morte não poderia se aplicar a causa e
dizer que o feminicídio foi praticado na presença dos filhos,
pois estaria usando indevidamente a analogia “in malam par-
tem”.
Os comentários dos doutrinadores anteriores tratam de
uma aplicação objetiva da causa de aumento aqui estudada.
NUCCI e CABETTE partiram para uma análise mais aprofun-
dada da forma em que a visualização do crime acontecer, ou
seja, quando o crime for cometido na presença física ou virtual
de descendente ou de ascendente da vítima. NUCCI comenta
ainda que o grau de punição pode variar ainda quando anali-
sado o caso concreto em que se tenha uma comprovação do
grau de trauma sofrido pelos observadores do crime. CA-
BETTE questiona que a presença física ou virtual deve ser si-
multânea ao momento do delito, não cabendo a causa de au-
mento se ocorresse em outro momento posterior, o qual não
evidenciaria a ‘presença real’ ao momento dos fatos.
Já para GRECO, este tece seus comentários sobre apli-
cação da causa de aumento a que se refere o § 7º, III, em que

169 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

para ser aplicada deva se demonstrar que o agente tenha co-


nhecimento do parentesco da vítima e os ascendentes ou des-
cendentes e ainda que seja comprovado esse parentesco por
meio de documentação hábil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar tanto a jurisprudência aplicada às ações pe-


nais de feminicídio quanto a doutrina percebemos que os fe-
minicídios praticados na presença dos ascendentes ou des-
cendentes estão sendo agravados utilizando a causa de au-
mento estudada, no qual os réus recebem uma sentença
acima da pena base somada com o aumento de 1/3 (um terço)
até a metade previsto na lei.
Com efeito, a aplicação do aumento está sendo obje-
tiva, não vindo a ser questionado o dolo do réu em praticar o
crime na frente do descendente para lhe causar maior dor e/ou
abalo psicológico.
Graças à incansável luta pelos direitos das mulheres,
em busca de garantir os direitos inerentes a todo ser humano
que foram negados no decorrer do tempo e das mudanças de
uma sociedade que minimizava todo o sofrimento sentido pela
mulher, vem sendo conquistado através de incansáveis lutas,
inovações legislativas como no caso trazido pela lei Maria da

170 | P á g i n a
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Penha, e leis complementares, redefinindo entendimentos ju-


risprudenciais, que resulta diretamente nas sentenças, que se
servindo de novos dispositivos, estão punindo severamente os
agressores.

REFERÊNCIAS

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121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Có-
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lificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de
25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes
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art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2018.
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Este livro reúne cinco artigos, na área
de Ciências Jurídicas, redigidos por
concludentes do Curso de Direito da
UNINORTE – Ac, sob a supervisão da
Profa. Esp. Williane Tibúrcio Facundes.
EAC
Editor

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