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A Ressocialização Dos Presos Na Penitenciária Agrícola De Monte Cristo

E Os Direitos Humanos.

INGRID MARIANA BARBOSA DE ALMEIDA1

MARIA LAIS DE ALENCAR SANTOS2

RUI MACHADO JUNIOR3

RESUMO: O trabalho tem o objetivo de analisar a presente situação de ressocialização na Penitenciaria


Agrícola de Monte Cristo – PAMC – e mostrar qual a eficácia das medidas adotadas pela instituição para
reeducar os presos que ali se encontram. Fazendo uma breve retrospectiva histórica para poder saber como se
chegou nas penas adotadas nos dias atuais e como certas penas deixaram de ser usadas no território
brasileiro. Comentando também a influência dos Direitos humanos e o que ele representa para a atual
situação da penitenciária, como ambientes totalmente degradados, medidas que não passam de o ditado “para
inglês ver”, praticamente sem acesso a saúde, sem alimentação digna, sem higiene básica e como isso afeta
diretamente a regeneração dos prisioneiros, além da crescente onda de facções que se formam dentro da
própria penitenciaria. A ressocialização tem o objetivo de recolocar o indivíduo na sociedade, o cidadão que
perdeu sua liberdade por determinado tempo para poder entender qual caminho deve seguir quando se vive
em sociedade, já que esta é uma necessidade do ser humano. Será possível a ressocialização de uma pessoa
em um estado totalmente inadequado para tal objetivo?

Palavras-chaves: PAMC. Ressocialização. Direitos Humanos

1 Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito do Centro Universitário Estácio da Amazônia, Marianaalmida112@gmail.com


2 Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito do Centro Universitário Estácio da Amazônia, lais_ia@hotmail.com

3 PROFESSOR ORIENTADOR. Mestrando em Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania (UERR), Especialista em Estudos
de Criminalidade e Segurança Pública (UFRR), Professor de Direito Penal e Direito Processual
Penal do Centro Universitário Estácio da Amazônia e Escrivão da Polícia Federal, Ruimachadojr01@gmail.com
INTRODUÇÃO

Atualmente é pacífico que, para desfrutarmos com segurança e garantia de determinados


direitos e de liberdades individuais e coletivas é preciso que abramos mão de outras. Sendo assim, é
importante destacar que compete ao Estado regular a fruição e/ou a restrição dessas liberdades, bem
como assegurar, por meio de suas instituições, o cumprimento dessa regulação. A origem do direito
de punir surgiu quando o homem decidiu abrir mão da própria vingança e cedeu parte da sua
liberdade, tendo que viver de acordo com as leis do Estado, para que este por sua vez pudesse
garantir a ordem e a segurança da comunidade. Segundo Beccaria (2014, p. 15), “nenhum homem
fez gratuitamente a doação de uma porção de sua liberdade visando unicamente ao bem público. ”

E é assim que surge os mais diversos tipos de sanções, como a pena de banimento, de
tortura, de reclusão, de mutilação e até mesmo a de morte. Inicialmente, em razão da quase
inexistência de limites ao poder de punir, a pena capital era utilizada com bastante frequência,
normalmente executada por carrascos de notável crueldade e na presença de plateias, supostamente
para assegurar que os membros daquela sociedade se sentissem desmotivados à prática de delitos.
Com o passar do tempo e, sobretudo, com o surgimento de movimentos como o iluminismo, as
reprimendas corporais foram cedendo lugar a sanções menos traumáticas como, por exemplo, à
pena restritiva da liberdade individual, que atualmente é um dos principais meios de reeducar um
indivíduo para que ele possa retornar ao convívio social (FOCAULT, 2004).

A partir desses movimentos e com a crescente internalização de regras sobre direitos


humanos, as penas corporais não só deixaram de ser aplicadas, mas passaram a ser proibidas. No
Brasil, sanções dessa natureza são vedadas pela Constituição Federal de 1988 por força do art.5°,
XLVII, “a”. Por outro lado, atualmente diversos países, como o Brasil, enfrentam uma crise sem
precedentes no sistema prisional, ocasionado, especialmente, pela superlotação dos presídios. De
acordo o jornal O Globo (2017), no ano de 2017, o Brasil tinha a terceira maior população
carcerária do mundo, ficando atrás apenas de Filipinas e Peru, e o mais preocupante, a
criminalidade só aumenta.

A penitenciária Agrícola de Monte Cristo, localizada em Boa Vista, capital do estado de


Roraima, é um exemplo bem claro da decadência do sistema ressocializador. Com saúde precária,
alimentação fora do eixo e sem acesso a higiene básica, os detentos são mantidos basicamente pelas
suas famílias. As medidas voltadas para a reeducação são escassas para a transformação dos
criminosos que ali se encontram, dificultando assim a realização do objetivo dessa instituição. É
notório que o problema prisional no Brasil não é apenas um problema de um Estado. Começa desde
a ineficiência da lei de execução penal, e em seguida, o Estado transparece um sistema onde apenas
deve encarcerar o delinquente, sem o cuidado mínimo com o básico para ter-se a dignidade humana,
afastando-se completamente a questão da ressocialização

2 FUNÇÃO DA PENA

Desde o surgimento institucionalizado do jus puniend, o Estado vem exercendo esse


poder/dever com acentuada variação, possivelmente em razão dos inúmeros e constantes
movimentos políticos e revolucionários. Mesmo assim, para Beccaria (2014), a pena sempre foi um
modo de se fazer justiça.

Nas palavras de Greco, (2010, p.2) “A pena, portanto, é simplesmente o instrumento de


coerção de que se vale o Direito Penal para a proteção dos bens, valores e interesses mais
significativos”. A pena em si tem o poder não só de reeducar o prisioneiro, mas também de dar à
sociedade uma certa satisfação em meio a injustiça de um crime. (FOCAULT, 2004)

Existem diversos autores que falam sobre a eficácia da pena, entre eles, Cunha (2017, p.32)
“Nessa tarefa (controle social) atuam vários ramos do Direito, cada qual com sua medida
sancionadora capazes de inibir novos atos contrários à ordem social.” Ressalta que as sanções
servem para inibir atos que vão contra a ordem social. Entretanto, a doutrina majoritária aponta três
teorias que, segundo ela, conceituam de maneira completa e eficaz a finalidade dessa modalidade de
sanção estatal: Teoria retributiva, teoria preventiva e teoria mista.

A teoria retributiva defende o combate à criminalidade de uma forma violenta e única,


tem o objetivo de aplicar a sanção como forma de castigo. Para melhor compreensão é
importante destacar que essa corrente era apenas um reflexo do governo absolutista, onde quem
possuía o governo do Estado nas mãos também influenciava a igreja. Sendo assim, a aplicação
da pena restringe-se apenas à forma legal e/ou positiva da lei. A teoria justifica a forma como o
Estado retalhava ao crime quando alguém que tinha se submetido ao contrato social e
concordado em viver de acordo com as leis. (NETO, 2003).

Já a teoria preventiva se subdivide em duas, prevenção geral e prevenção especial, mas


apesar da divisão, a função da pena é inibir o ato criminoso. (NETO, 2003, p. 21). Na preventiva
geral a função da pena seria voltada para o desestímulo dos cidadãos perante o crime. Não serviria
para o indivíduo em si, mas sim para mostrar aos outros que tais coisas não deveriam ser feitas. Já a
especial defende que a função da pena está diretamente ligada ao infrator como modo de corrigi-lo,
e inibir a possibilidade de o mesmo cometer o delito pela segunda vez. (GRECO, 2010)

Na teoria mista ou unificadora, atualmente adotada aqui no Brasil pelo art.59 do Código
Penal, consiste em unir os dois objetivos das duas últimas correntes, sendo assim, essa teoria de
caráter retributivo e preventivo. (JESUS, 2013)

3 DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

Conforme visto no capítulo anterior, a aplicação da pena, enquanto sanção imposta pelo
Estado, faz parte de praticamente todo o nosso contexto histórico, quiçá por se revelar um
importante e necessário mecanismo no controle social. No ordenamento jurídico brasileiro há
diversos tipos de penalidades. Segundo Jesus (2013, p. 564) “as doutrinas classificam a penas em:
corporais, privativas de liberdade, restritivas de liberdade, pecuniárias, privativas e restritivas de
direitos”. Por fidelidade ao tema desse trabalho, a pena privativa de liberdade será o foco principal
da pesquisa, pois é por meio dela que pessoas chegam até a PAMC. Não custa relembrar que
somente os ilícitos penais mais relevantes são apenados com a restrição da liberdade individual,
tendo em vista que o nosso ordenamento jurídico adota a teoria da última ratio para o direito penal,
a regra, portanto, é a liberdade. (CUNHA, 2017)

De acordo com Jesus (2013, p.565), “as penas privativas de liberdade deverão ser
executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado”. Assim, o condenado inicia o
cumprimento da pena no regime mais rigoroso, aplicável no caso concreto, e depois pode progredir
para regime mais brando, de acordo com os critérios estabelecidos no código penal e na lei de
execuções penais. Nesse contexto, o legislador penal brasileiro instituiu três regimes de
cumprimento da pena privativa de liberdade, conforme leitura do Art. 33, caput, do CP, a saber:
regime fechado; regime semiaberto e regime aberto. É importante destacar que nossa legislação faz
clara distinção entre reclusão e detenção. “A pena de reclusão deve ser cumprida em regime
fechado, semiaberto e aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade
de transferência ao regime fechado. ” (GRECO, 2010, p. 473)

Por expressa previsão legal, precisamente o Art.59, II, do Código Penal, ao fixar a pena, o
juiz determinará o regime inicial para o seu cumprimento.

“Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à


personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para
reprovação e prevenção do crime:
I - As penas aplicáveis dentre as cominadas;
II - A quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; 
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;
IV - A substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se
cabível. ” (BRASIL, 1940)
Para fixar a pena, o juiz deve passar por três fases até chegar ao veredicto final. Um dos
pontos fortemente defendido por Beccaria (2014) é que a penalidade deve ser equivalente ao delito,
caso contrário, cria-se um conflito injusto. Aplicando-se corretamente a sanção, parte-se para o
fundamento da pena privativa de liberdade: ressocialização, cuja qual tem o foco na reinserção do
indivíduo à sociedade.

4 FACÇÕES

O Brasil encontra-se com déficit na segurança pública nacional, automaticamente a


população fica à mercê da criminalidade, que a cada dia vai aumentando. Em todas as camadas da
sociedade, a violência vem aumentando drasticamente, o perigo, o medo, apreensão toma conta do
corpo social. O exercício da prática criminosa, como tráfico de drogas e armas, amplia suas
fronteiras. Para a organização desse processo, criou-se facções, para coordenar e desenvolver
atividades criminosas. Gerando consequências para a sociedade e de forma negativa. O Brasil tem
maior número na quantidade de cidades mais violentas do mundo segundo dados oficiais da ONU
(VIEIRA, 2017)

A princípio as facções surgiram para trabalhar e adquirirem direitos dos internos


dentro dos presídios. Ao passar do tempo, esse princípio foi sendo esquecido, e atualmente as
facções criminosas que eram grupos pequenos, cresceu de forma absurda. Responsáveis por
fiscalizar as práticas criminosas, explorando-as e controlando todo esse sistema. (CAMARGO, 2006).
A má estruturação dos presídios, a ausência de legislação para acabar ou até mesmo moderar seu
progresso. São os fatores responsáveis pelo aumento dessas organizações criminosas. No ano de
1988, Queiroz público uma obra Crime Organizado no Brasil, nota-se que naquela época o crime no
Brasil era tão organizado que poderia ser comparada com o crime na colômbia. Queiroz, discorre
“órgãos governamentais e legisladores federais começam, neste fim de século, a preocupar-se com a
poderosa estrutura empresarial” (QUEIROZ, 1998). E foi no final do século derradeiro que se
iniciou a elaboração de legislação que analisassem os crimes realizado por membros das facções
criminosas. Dentre tantas, a LFC, Lei das facções Criminosas no ano de 2001, foi colocada em
prática, porém não foi o suficiente para consumar-se. Numerosos são os problemas de algumas
nações, e um dos mais cruciais está no crime, nas facções criminosas, vejamos:

“O crime organizado, induvidosamente, é, na atualidade, um dos mais cruciais


problemas brasileiros, principalmente face à globalização dos meios de comunicação, do
fluxo e refluxo de capitais internacionais, e ao avanço da tecnologia que coloca o crime
sempre à frente da Polícia e da Justiça. ” (QUEIROZ, 1998)

O problema não está somente nos grupos de facções criminosas, o crime organizado está
difundido por vários pontos da sociedade, o que afeta o combate das facções é o crime organizado
está dentro do poder público, assim essa contenda fica mais difícil. E as organizações criminosas
estão atuantes, pois acabam comprando os funcionários públicos para que eles fiquem a serviço
destas organizações. O câncer da segurança pública começa com a corrupção dos agentes públicos.

“A ausência do Estado contribui para que o crime organizado se instale nos


bolsões de pobreza das grandes cidades. As necessidades básicas da população são
atendidas pelos criminosos em troca do silêncio e da cumplicidade. ” (SILVEIRA, 2014)

A própria penitenciara não tem controle do seu funcionamento:


“A Presidente afirmou que identifica inércia do estado de Roraima, pois não há
sistema de identificação dos presos, o estado não tem controle da localização dos presos e
existem alas na Penitenciária Monte Cristo sem qualquer controle do estado. A Presidente
afirmou que a estrutura da Penitenciária é terrível e que a Penitenciária abriga presos
indígenas, estrangeiros e crime organizado, fator de muita preocupação.” (GEMF, 2017)

O desaparecimento do Estado contribui para o crescimento de forma absurda das facções,


como citado acima pelo José Braz da Silveira. A Penitenciaria agrícola Monte Cristo comporta duas
das grandes facções do Brasil, Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV). As
duas originaram em São Paulo e Rio de Janeiro e são compostas por grandes empresários e
autoridade públicas, mais conhecida como ‘’máfia do colarinho branco’’. Nesse presidio, a facção
com maior porcentagem de detentos é o PCC. (JÚNIOR, 2016)

As facções afetam em tamanho grandioso a PAMC, é comprovado através dos relatórios


feitos pelo Grupo Especial de Monitoramento:

“Em 16 outubro de 2016, ocorreu uma rebelião na Penitenciária Agrícola de


Monte Cristo (PAMC), na qual dez detentos foram mortos durante um confronto entre
facções rivais, e familiares foram feitos reféns. Os integrantes do Primeiro Comando da
Capital (PCC), durante o horário de visita, teriam quebrado o muro que separava a ala da
facção do Comando Vermelho (CV). Alguns dos mortos foram queimados e outros
decapitados. A época, a polícia apontou 50 suspeitos e os sobreviventes do CV foram
transferidos para a Cadeia Pública de Boa Vista. Além disso, sete presos considerados
líderes da facção PCC foram enviados para o sistema penitenciário federal e foram
reduzidos os horários e dias de visitas. A partir daí os presos anunciaram retaliações e dois
outros detentos foram vitimados de forma cruel, bem como um agente de segurança pública
dentro de sua residência.” (GEMF, 2017)

4.1 REBELIÕES

No Brasil teve muitas rebeliões, uma das maiores e a segunda, foi o Massacre do
Carandiru, ocorreu em São Paulo, no dia 2 de outubro de 1992, quando a Policia Militar interveio
uma rebelião na casa de Detenção do Estado. Causou a morte de 111 detentos. (CAMARGO, 2017)
É válido observar, que foi após esse cenário que o PCC foi formado, e em seguida mudou todo o
princípio do que seria a função do PCC. Então forma um grupo de detentos em resposta a esse
massacre, logo os ataques começam, contra os policiais.

Depois dessa rebelião, teve muitas outras, em Roraima, uma das maiores do Estado, foi
registrado no dia 6 de janeiro de 2017, total 31 assassinados. (CARMO, 2017)

A rebelião começa com um ataque entre uma facção e outra, os integrantes do Primeiro
Comando da Capital (PCC), durante o horário de visita, teriam quebrado o muro que separava a ala
da facção do Comando Vermelho (CV). A partir daí os presos anunciaram retaliações e uns detentos
são vitimados de forma cruel, alguns são mortos outros decapitados.

5 PAMC E OS DIREITOS HUMANOS

No contexto atual no qual o Brasil está passando, vale ressaltar a importância dos Direitos
Humanos hoje, que é de reverter ou amenizar a exclusão e o encarceramento seletivo, daqueles considerados
invisíveis e sem a menor importância para o meio social, assim como alguns os tratam. No artigo publicado
na Revista Internacional de Direito e Cidadania, o autor Oscar Vilhena Vieira, cita que são as desigualdades
sociais “que causam a invisibilidade daqueles submetidos à pobreza extrema, a demonização daqueles que
desafiam o sistema e a imunidade dos privilegiados”, minando assim o próprio Estado de Direito e a
observância das leis. (VIEIRA, 2008). Em diversos tratados e nas constituições, o direito humano tem grande
relevância, e se faz necessário uma preocupação maior nesse aspecto. (SOUZA, 2017) Todos esses direito
descritos nos tratados e nas constituições são direitos comuns a todos os seres humanos, diferenciação de
classe social, raça, etnia, sexo, religião entre outros. (OLIVEIRA, 2010). Um dos sistemas que mais afronta
os Direitos Humanos é o sistema penitenciário, foge totalmente do que deveria ser cumprido pelo direito
humanos. São fornecidas condições desumanas para os presos. (MURARO, 2016). Uma citação da Ana
Paula Barcellos, no seu artigo Violência Urbana, Condições das Prisões e Dignidade Humana. Mostra que
para o Direito Humano a dignidade da pessoa humana não pode ser equiparada com suas condutas, suas
práticas criminosas e sim a sua condição inerente de ser humano. A visão que o encarceramento mostra é que
os presos não são digno ou titulares dos direitos. E assim entra a repreensão da sociedade, o preconceito
ainda muito presente.

“Nesse sentido, os direitos humanos exerceriam duas funções: uma função


negativa, pois os direitos humanos atuariam como limitação ao poder do Estado de punir,
limitando igualmente as condições da punição; e uma função positiva, que seria a de
definição do objeto da tutela penal, ou seja, limitando a criação de leis e a sua aplicação,
direcionada não somente àqueles chamados de invisíveis, ou inimigos. ’’ (MURARO,
2016)

O sistema prisional não está obedecendo com sua efetiva finalidade, na qual é punir os
comportamentos e civilizar o preso a fim de ressocializa-lo para o corpo social. É possível observar isso
através dos indicies de reincidência criminal no Brasil.

‘’A população carcerária do Brasil cresceu 83 vezes em setenta anos. É o que


demonstrou um mapeamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública com o
apoio do Ipea, com base nos dados publicados no Anuário Estatístico do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE). O total de apenados condenados no sistema prisional
passou de 3.866 pessoas em 1938 para 321.014 em 2009. Se considerarmos informações
mais recentes, e que 38% da população carcerária encontra-se em situação provisória, a
realidade adquire contornos ainda mais dramáticos: o Brasil possuía, em 2012, 515.482
pessoas presas para apenas 303.741 vagas, déficit de 211.741 vagas. ’’ (IPEA, 2015)

A criminalidade no Brasil só aumenta, apesar de ser o pais que mais encarcera no mundo, segundo
o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2012). Ressocialização nas prisões e a reincidência criminal são
assuntos que precisam de estudos mais profundados para que sua função tenha sua efetividade. (IPEA, 2015) .
Assim, o obstáculo para aqueles que saem do cárcere, com objetivo de restituírem ao mercado de trabalho
torna-se um desafio gigantesco. Visto a visão difamatória que o maior percentual da sociedade ainda tem
sobre os ex-detentos. A situação piora quando se analisa o número de reincidentes, segundo pesquisa do
IPEA:

“A proporção de observações é diferenciada entre os estados, impossibilitando


comparações entre eles. Entre os 817 processos válidos para o cálculo da taxa de
reincidência, foram constatadas 199 reincidências criminais. De tal modo, a taxa de
reincidência, calculada pela média ponderada, é de 24,4%.” (IPEA, 2015)

O grave problema é como o poder público e a sociedade representa a atual política de execução
penal, fazendo elevar o reconhecimento a obrigação de reconsiderar essa política, que, na prática, tem
projetos para a construção de novos presídios, e para criação de mais vagas nos neles, que privilegia o
encarceramento maciço. A Comissão Parlamentar de Inquérito, no seu relatório apontou que nenhum
presidio dos estados brasileiros cumpria com as exigências legais descritas na Lei de Execução Penal
Brasileiros (CPI, 2009). A CPI do Sistema Carcerário, constatou sobre Roraima:
“Roraima abriga 1.255 presos em 504 vagas, havendo um déficit de 751 e uma
superlotação de mais de 100%. Há 203 agentes com salário inicial de R$ 1.540,00,
incumbidos da vigilância e segurança da população carcerária. O Estado é dividido em 15
municípios, com 7 comarcas. Conta com 28 Juízes (com salário inicial de R$ 16.119,10),
31 promotores (com salário inicial de R$ 19.603,41) e 38 Defensores Públicos (cujo salário
inicial é de R$ 11.000,00). A Capital dispõe de 1 uma Vara de Execuções Penais. ” (CPI,
2009)

Uma das regras básicas de aplicação geral dos tratados internacionais de direito humanos, é: “O
regime prisional deve procurar minimizar as diferenças entre a vida no cárcere e aquela em liberdade que
tendem a reduzir a responsabilidade dos presos ou o respeito à sua dignidade como seres humanos.”
(JUSTIÇA, 2016). O déficit desse sistema está na desunião do Sistema Prisional e do Direito Humanos.
Muitos são os fatores que colaboram para tal, e a superlotação aflige ainda mais o cenário. (MURARO,
2016)

6 A RESSCIALIZAÇÃO NA PAMC

Na conjuntura atual que se encontra o Estado de Roraima, é evidente que a ressocialização


na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo é inviável. O sentido da pena privativa de liberdade foge
da realidade. A Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, não tem estrutura para um sistema de
ressocialização, pouco se tem estrutura para o cumprimento da pena. Segundo relata o relatório do
CNJ, Grupo Especial de Monitoramento e Fiscalização – GEMF. (GEMF, 2017)

Na última inspeção do GEMF na Penitenciária Agrícola Monte Cristo, o cenário que seus
integrantes encontraram foi muito pejorativo, goteiras, restos de comida espalhados pelo chão, falta
de energia, presos amontoados em celas apertadas, esgoto correndo a céu aberto e um cheiro pútrido
que toma conta do ambiente. Nessa situação descrita a cima, é possível notar nitidamente que os
meios para a ressocialização dos detentos encontram-se impossível. (GEMF, 2017). O conselheiro
Rogério Nascimento, coordenador do GEMF, disse:

“O que nós pudemos ver é que a penitenciária agrícola não tem a menor
condição de ser uma unidade penitenciária. Ela funciona precariamente, está em escombros.
É absolutamente inadequada.” (CIEGLINSKI, 2017)
Deve haver boas condições para proporcionar à condenada integração social na sua
retomada a sociedade, como a lei de execução penal tenta deixar claro em seu artigo primeiro.
(BRASIL, 1984). Em um conceito mais objetivo, a ressocialização é o processo, de longo prazo,
onde trabalha o retorno do indivíduo, seja seu primeiro ato inflacionário ou reincidente, para o meio
social. Do qual, se faz necessário o isolamento do meio social. Privando-o de sua liberdade.
(MELO, 2013). É possível notar através de pesquisas e documentários, do qual mostra-se a escassez
que encontram as penitenciarias brasileiras, a falta de higiene, lixos e esgotos aberto, com perigo de
adquirir doenças. Não é possível ressocializar alguém que vive a mercê dessas doenças e em locais
que auxiliam no desenvolvimento de doenças psicológicas. (ROSSINI, 2014)

Em Roraima há uma grande dificuldade no sistema penitenciário. Visto recentemente, a


empresa que fornece alimentos para as penitenciarias de Boa Vista, suspendeu a alimentação dos
presos por um dia, e assim os reeducando foram pegos de surpresa. (MARQUES, 2018)

“A Presidente afirmou que identifica inércia do estado de Roraima, pois não há


sistema de identificação dos presos, o estado não tem controle da localização dos presos e
existem alas na Penitenciária Monte Cristo sem qualquer controle do estado. A Presidente
afirmou que a estrutura da Penitenciária é terrível e que a Penitenciária abriga presos
indígenas, estrangeiros e crime organizado, fator de muita preocupação.” (GEMF, 2017)

A precariedade prevalece na PAMC, homens perdem a esperança com todo esse caos
vivido, nesse lugar onde ele deveria está sendo trabalhado para voltar a viver com a sociedade.
Outro fator que colabora para que o processo da ressocialização não funcione, é a superlotação
nesses presídios, onde o acumulo de processo do judiciário aumenta presos e paralelamente o índice
de prisão. (CPI, 2009)

Em uma das obras do autor Cesare Beccaria, 2014, mostra sua opinião a favor da
proporcionalidade das penas e castigos aos delitos, como um sistema mais humanitário, um sistema
que previna os delitos a ter de puni-los. Onde todo o corpo social deve usufruir igualmente de
privilégios da sociedade. Os privilégios e o poder, geralmente são concentrados nas mãos de
poucos, e na sua maioria a mazela e a fragilidade fica exposta. Segundo Beccaria, a má
interpretação da lei, na verdade há desconhecimento dela, como cita no seu livro:
“Enquanto o texto das leis não for um livro quase particular e doméstico,
enquanto forem escritas numa língua morta e ignorada do povo, e enquanto forem
solenemente conservadas como misteriosos oráculos, o cidadão, que não puder julgar por si
qual será o destino de sua liberdade, ou a de seus membros e mesmo as consequências que
devem ter os seus próprios atos sobre os seus bens, ficará na dependência de um pequeno
número de homens depositário e intérpretes das leis.” (BECCARIA, 2014, p. 22)

Para Michel Foucault, a prisão é o meio onde se deve estudar o indivíduo e seu
comportamento, vigia-lo. Para a ressocialização, o poder da disciplina é essencial e serve de técnica
para moldar o comportamento do detento. Utopia do pudor judiciário: tirar a vida evitando de deixar
que o condenado sinta o mal, privar de todos os direitos sem fazer sofrer, impor penas isentas de
dor. (FOUCAULT, 1999). Para ele, a disciplina detém o poder da ressocialização, acrescentado a
isso a vigilância e a punição a todo tempo. Como Foucault fala em sua obra, dos delitos e das e
penas, deve haver ocupação no momento da punição, algo precisa distrai-los, o confinamento total
não resolverá o problema pode até aumentá-lo, criando expectativas para sua liberdade, são longas
horas de ansiedade para aquele momento, agregando pensamentos de vingança, ou acumulando
ódio pela sociedade. Porém, é necessário que haja falta de comunicação entre os presos, e Foucault
explica:

“Se o preso é condenado, não corre o risco de ser contagiado pelas ideias de outro preso,
uma vez que está sozinho em sua cela. Assim, o preso sabe que está sempre sendo
observado, ele deixa de tentar fugir, de rebelar-se, de tramar, pois pode estar sendo vigiado.
Os presos têm a constante ideia de que estão sendo observados. O detento nunca deve saber
se está sendo observado; mas deve ter certeza de que sempre pode sê-lo”. (FOUCAULT,
1999).

A partir do discutido, pode-se notar que muitos fatores contribuem para a


não inclusão dos detentos ao convívio social, pelo contrário, há aumento no número de reincidentes.
Somente tendo oportunidade de voltar a contribuir com a sociedade, através de estudos e
trabalhando, eles poderão chegar à finalidade da prisão.
7 CONCLUSÃO

A ressocialização é algo possível em um ambiente estável que realmente ofereça condições


para tal finalidade. A penitenciária do Brasil, como a PAMC, sofre falta de estruturas, constantes
rebeliões e facções que acabam por atrapalhar o sistema, e de problemas que vão além dos muros do
presídio, como a falta de oportunidade de empregos quando os presidiários saem do sistema
prisional. A forma como os detentos são tratados é desumano e ilegal, porém, passa despercebido
aos olhos da justiça. Esse padrão de encarceramento não tem capacidade de devolver par sociedade
um ser humano ressocializado.

São fatores como esse que pode trazer como efeito condutas para que os detentos se torne
reincidentes. Não basta apenas prender, tirar a liberdade, tem que oferecer condições para que esses
indivíduos voltem para sociedade de forma com que não regressem ao mesmo local. Assim, há
dificuldade na recolocação social e profissional. A questão da ressocialização vai além, ela precisa
chegar ao âmbito da educação, da capacitação do detendo. A ausência do estado na implementação
de políticas públicas para reintegração é um dos problemas. A Penitenciária Agrícola de Monte
Cristo precisa ser reformada para poder reformar os criminosos.
Bibliografia

BALDIN, L. O. F. Emporio do Direito. Emporio do Direito, 03 nov 2016. Disponivel em:


<http://emporiododireito.com.br/leitura/a-participacao-privada-no-sistema-prisional-brasileiro-por-luiz-
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BECCARIA, C. Dos Delitos e da pena. Leme : CL Edijur, 2014.

BITENCOURT, C. R. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 20ª. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2014.

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Acesso em: 28 set. 2018.

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