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II SEMANA

SEMANA ACADÊMICA
ACADÊMICA DA DA PSICOLOGIA
PSICOLOGIA
UEMG
UEMG -- ITUIUTABA
ITUIUTABA
A
A diversidade
diversidade do
do fazer
fazer psicológico
psicológico no
no

enfrentamento
enfrentamento à
à vulnerabilidade
vulnerabilidade social
social

Organizadores:
Bettieli Barboza da Silveira
Anderson Mesquita do Nascimento
Larissa Guimarães Martins Abrão
Copyright© 2022 by Universidade do Estado de Minas Gerais
Capa: Lúcia Cardoso Santos
Organizadores(as) da obra: Bettieli Barboza da Silveira, Anderson Mesquita do
Nascimento, Larissa Guimaraes Martins Abrão
Conselho editorial: Alyssa Magalhães Prado; Ana Carolina Rimoldi de Lima; Ana Cláudia
Almeida Machado; Anderson Mesquita do Nascimento; André Masão Peres Tokuda; Bettieli
Barboza da Silveira; Débora Ferreira Bossa; Eleusa Gallo Rosenburg; Evaldo Batista
Mariano Junior; Fabiana Batistucci de Lima; Fabíola Rodrigues Matos; Isabella Drummond
Oliveira Laterza; Larissa Guimarães Martins Abrao; Mak Alisson Borges de Moraes;
Nadyara Regina de Oliveira; Nei Vinícius Hércules Rodrigues Miranda; Telma Sara Queiroz
Matos.

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técnica ou institucional dos(as) Organizadores(as), Conselho editorial e da Universidade do
Estado de Minas Gerais. Da mesma forma, o conteúdo de cada trabalho publicado na
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bibliográficas são prerrogativas de cada autor(a).

Os trabalhos que compõe esta obra foram submetidos à dupla avaliação cega (double-
blind review) por pareceristas ad hoc, pós-graduados.

Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG)

Anais da I Semana Acadêmica de Psicologia da UEMG Ituiutaba / organizadores(as),


Bettieli Barboza da Silveira, Anderson Mesquita do Nascimento, Larissa Guimaraes Martins Abrão. –
Dados eletrônicos. – 1. ed. – Ituiutaba: UEMG, 2022.
207 p.: fig., tabs.

Inclui bibliografia
E-book (PDF)
ISBN: 978-65-594-1689-9

1. Psicologia. 2. Clínica. 3. Psicossocial. 4. Saúde. I. Silveira, Bettieli Barboza da. II. Nascimento,
Anderson Mesquita. IV. Abrão, Larissa Guimaraes Martins.

Este livro está sob a licença Creative Commons, que


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devidos créditos de autoria. Não é permitida nenhuma
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comerciais. br.creativecommons.org
COMISSÃO ORGANIZADORA DO EVENTO

Docentes organizadores(as)
Anderson Mesquita do Nascimento
Bettieli Barboza da Silveira
Larissa Guimaraes Martins Abrão

Discentes líderes da organização – representando o Centro Acadêmico de Psicologia da


UEMG Ituiutaba
Laila Thaíssa da Silva Menezes
Amanda Vieira Simolini

Equipe discente organizadora


Aline de Carvalho Ciriaco
Anna Laura Decarlos Gonçalves
Carolina Teodoro Franco
Eduardo de Carvalho Fiorin
Eduardo Henrique Freitas Franco
Erika Palis Alves
Geovanna Fernandes Silva
Ivana Tomaz Parreira Silva
Jéssica Ohanna Duarte Pereira
Laura Silveira
Leticia Ghisloti Araujo
Lúcia Cardoso Santos
Mariel Navarro Palma
Pedro Almeida Forini
Raffaella Eminy Andrade da Mata
Telmo Rodrigues Batista Filho
Vanessa Vieira Martins
SUMÁRIO
RESUMOS

ANDANÇAS E DESESPERANÇA: ESTUDO DE CASO ........................................................ 11


Priscila Aguiar Silva; Bettieli Barboza da Silveira

INSERÇÃO SOCIAL DE PACIENTE COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA EM UMCENTRO


DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA .......................................... 12
Rafaela Queiroz Cunha Souto; Bettieli Barboza da Silveira

INTERCÂMBIO AU PAIR: UMA ANÁLISE DAS PROPAGANDASPROMOVIDAS PELAS


AGÊNCIAS DE VIAGENS ........................................................................................................ 13
Laís Soares da Silva; Ana Cláudia Almeida Machado

OFICINA TERAPÊUTICA MUSICAL EM UM CENTRO DE ATENÇÃOPSICOSSOCIAL:


RELATO DE EXPERIÊNCIA ................................................................................................... 14
Laila Thaíssa da Silva Menezes;Rafaela Queiroz Cunha Souto;Bettieli Barboza da Silveira

POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL: COMO O CAPS


BENEFICIA A COMUNIDADE ................................................................................................. 15
Amanda Vieira Simolini;Rafaella Freitas Marques;Alyssa Magalhães Prado

RELATO DE EXPERIÊNCIA: O IMPACTO DA PANDEMIA NO CAPS ............................. 16


Amanda Dias Ribeiro;Bettieli Barboza da Silveira

RELATO DE UM ENCONTRO DA RODA DE TERAPIA COMUNITÁRIASOBRE


AUTOCUIDADO ........................................................................................................................ 17
Vitória Silva Rezende;Maria Gabriella Coradini Barbosa;Fernanda Cubas

TRANSTORNO DE OPOSIÇÃO DESAFIANTE - UM RELATO DE CASO ........................ 18


Isabelle Corrêa Teles; Bettieli Barboza da Silveira
SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA E SITUAÇÃO DE RUA EM UM CENTRO DEATENÇÃO
PSICOSSOCIAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA .................................................................... 19
Laila Thaíssa da Silva Menezes; Bettieli Barboza da Silveira

ANSIEDADE E DEPRESSÃO: O PROCESSO “DE APRENDER A LIDAR” ....................... 20


Mayara Cristina Silva Alves;Bettieli Barboza da Silveira

SÍNDROME DO PÂNICO E AGORAFOBIA: UMA ANÁLISE DE CASO CLÍNICO ........... 21


Sabrina Lins Batista;Bettieli Barboza da Silveira

PROCESSOS CLÍNICOS EM TERAPIA COGNITIVA COMPORTAMENTAL ................. 22


Rafaela Marques de Oliveira; Bettieli Barboza da Silveira

O APOIO DAS FAMÍLIAS NA MINIMIZAÇÃO DE COMPORTAMENTOS


INTERNALIZANTES E EXTERNALIZANTES DE CRIANÇAS COM TEA ....................... 23
Pedro Almeida Forini;Amanda Vieira Simolini;Laura Della Antonia Silveira;Ana Paula Silva
Cantarelli Branco

RELATO DE CASO CLÍNICO: ABSTINÊNCIA DE COCAÍNA E CRACK ......................... 24


Bruna Ramos Medeiros;Bettieli Barboza da Silveira

ESTUDO DE CASO CLÍNICO EM UM CENTRO DE ATENÇÃOPSICOSSOCIAL ........... 25


José Aguinaldo Barbosa Costa; Bettieli Barboza da Silveira

PERSPECTIVA DO TREINAMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO DE SENSO


PERCEPÇÃO ............................................................................................................................. 26
Luísa Vieira Belarmino de Oliveira; Nathaly Mayra Ferreira Borges de Souza;Ana Paula Silva
Cantarelli Branco

RELATO DE CASO CLÍNICO SOBRE IMPULSIVIDADE EM UM CENTRO DE


ATENÇÃO PSICOSSOCIAL..................................................................................................... 27
Lara Carolina dos Reis Soares; Bettieli Barboza da Silveira
TRABALHOS COMPLETOS

ATENÇÃO BÁSICA E O SERVIÇO-ESCOLA DE PSICOLOGIA: BUSCAS POR UM


TRABALHO EM REDE ............................................................................................................ 29
Ana Luísa Rodrigues Ferreira;Dhanyella Ribeiro de Oliveira;Ewerton Donis de Melo;Geovanna
Fernandes Silva; Steffany Isadora Felix da Silva; Alyssa Magalhães Prado

PRÁTICAS DE ESTÁGIO E ACOLHIMENTO DE DEMANDAS DE SOFRIMENTO


PSICOSSOCIAL EM UM CONTEXTO DE PANDEMIA ....................................................... 38
Ana Luísa Rodrigues Ferreira; Dhanyella Ribeiro de Oliveira; Ewerton Donis de Melo; Geovanna
Fernandes Silva; Steffany Isadora Felix da Silva; Alyssa Magalhães Prado

PROJETO CARTAS SOLIDÁRIAS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO


PSICOSSOCIAL ......................................................................................................................... 47
Laís Soares da Silva; Carolyne Santos Alves; Diovana Mendes Vasconcelos;Maria Luiza Mamede
Crespo; Paloma Borges de Oliveira; Rayane de Freitas Martins; Vanessa Vieira Martins; Vitória
Paula Silva; Ana Cláudia Almeida Machado

PSICOLOGIA DO ESPORTE COMO RECURSO TERAPÊUTICO DE


TRANSFORMAÇÃO SOCIAL NAS LUTAS ........................................................................... 55
Priscila Queiroz Messias; Telma Sara Queiroz Matos

UEMG COMO UMA UNIVERSIDADE PROMOTORA DE SAÚDE .................................... 65


Eduarda Katyene Oliveira Santos;Ana Carolina do Nascimento e Azevedo Ferreira; Carlos Rodrigo
Muniz Franco; Marcela Martins Vilela; Poliana Silva da Cruz; Ana Cláudia Almeida Machado

ALIANÇAS INCONSCIENTES NAS RELAÇÕES FAMILIARES......................................... 76


Camila Martins Dos Santos; Débora Ferreira Bossa

APRENDIZAGEM DE NOVAS HABILIDADES SOCIAIS A PARTIR DO CRESCENTE


AUMENTO DE REPERTÓRIO COMPORTAMENTAL ÂMBITO CLÍNICO...................... 86
Laura Jeniffer Silva de Oliveira;Ana Paula Silva Cantarelli Branco
DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES SOCIAIS COM FOCO EM COMPONENTES
VERBAIS E COGNITIVO-AFETIVOS .................................................................................... 95
Sergiane Nogueira de Souza; Ana Paula Silva Cantarelli Branco

DEPRESSÃO ASSOCIADA AO HIPOTIREOIDISMO .........................................................104


Amanda Vieira Simolini;Rafaella Freitas Marques; Allisson Rodrigues de Rezende

MASCULINIDADE E CONTEMPORANEIDADE: UM ESTUDO DE CASO DAS QUEIXAS


DE UM HOMEM NOS DIAS ATUAIS ................................................................................... 115
Jorge Luís Quirino dos Santos; Débora Ferreira Bossa

O CASO MICHELLE: UMA COMPREENSÃO FENOMENOLÓGICA EXISTENCIAL . 126


Isabella da Costa Santos; Evaldo Batista Mariano Júnior

O IMPACTO PSICOLÓGICO DA PANDEMIA DA COVID-19 E A CLÍNICA


PSICANALÍTICA ..................................................................................................................... 136
Bárbara Heliodora Oliveira; Camila Fernandes Araújo; Isabella Drummond Oliveira Laterza Alve

TÉCNICAS PARA O MANEJO DE ANSIEDADE NA CLÍNICA PSICOLÓGICA: UM


RELATO DE EXPERIÊNCIA ................................................................................................. 144
Carla Arielle de Oliveira Severino; Kellyane Sousa Resende; Priscila Queiroz Messias; Ana Carolina
Rimoldi de Lima

PSICOLOGIA DO ESPORTE: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIADE ESTÁGIO ...........155


Andressa Aparecida de Souza; Camila Baltazar de Freitas; Caroline Cristine Melo Queiroz; Cinthia
Gabrielle do Vale Paiva; Maressa Santos de Paula; Rebeca Freitas Queiroz; Telma Sara Q. Matos

APRENDIZAGEM PSICOEDUCATIVA E O DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES


SOCIAIS EM PROCESSO PSICOTERÁPICO ...................................................................... 165
Silvania Silva de Souza; Ana Paula Silva Cantarelli Branco
O FAZER CLÍNICO DE UM CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL AOLONGO DA
PANDEMIA: DEMANDAS E REFORMULAÇÕES .............................................................. 175
Camila Ponsoni Candido; Marcella Ventoso Luciano Pereira; Ana Flávia Freitas Rodrigues
Martins; Gabriele Nunes Santos; Sarah Miguel Rodrigues; Gabriela Franco de Almeida

PSICOLOGIA ESCOLAR EM TEMPOS DE PANDEMIA: O GRUPO DE PAIS COMO


ESTRATÉGIA PARA ATUAÇÃO NAPERSPECTIVA CRÍTICA ....................................... 186
Camila Silva Barbosa Sadala; Marília Gouveia Saad; Célia Regina da Silva

IDENTIDADE E APEGO AO LUGAR EM CONFRONTO COM A SAÚDE MENTAL .....198


Laila Thaíssa da Silva Menezes; Priscila Aguiar Silva; Rafaela Queiroz Cunha Souto; Bettieli
Barboza da Silveira
Resumos
ANDANÇAS E DESESPERANÇA: ESTUDO DE CASO

Priscila Aguiar Silva 1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Este estudo de caso detalha um atendimento realizado em serviço da Rede de Atenção Psicossocial -
RAPS da cidade de Ituiutaba, Minas Gerais (MG). Paciente Valdir (nome fictício), 50 anos, sexo
masculino, analfabeto e se intitula andarilho. Chegou ao serviço encaminhado do albergue local após
chegar da cidade de Uberlândia - MG, trajeto feito caminhando, o que deixou seus pés feridos. Valdir
solicitou medicação e encaminhamento para Comunidade Terapêutica - CT, relatando que passou por
vários serviços de saúde metal em diversos estados e cidades por que já passou. Por meio de uma
breve busca de informações por telefone em locais que ele havia ido, tais como o Centro de Atenção
Psicossocial - CAPS, Hospital Psiquiátrico e CT, foi mapeado que o mesmo possuía histórico de uso
de medicações e internações. Relatou que não consegue se controlar e que “sai andando pelo mundo”.
Faz uso de cocaína há mais de 20 anos, com aumento gradativo. Acredita que o fato de ter sido
abandonado na infância e, posteriormente, ter visto familiares morrerem (mãe e irmã), influenciaram
seu quadro atual. Acrescentou ideias de morte recorrente por ver-se desesperado. Valdir passou por
avaliação psiquiátrica no serviço, sendo medicado e encaminhado à CT em seguida, onde permanece
até o momento. Valdir possui histórico de procurar ajuda em órgãos de assistência social ou saúde
quando chega em alguma cidade nova, fala sobre internação em CT como um auxilio momentâneo
durante suas andanças, porém, não se prende a nenhum lugar, dizendo que apenas uma vez
permaneceu por dois anos em uma cidade do estado de Minas Gerais. A ideia de “liberdade” passada
em seu discurso é empregada com desesperança e desconexão, questionando-se sobre seus impulsos
e os porquês de sua andança. Este breve relato busca contribuir academicamente por meio da
proposição de reflexões sobre como pacientes psiquiátricos estabelecem ou não suas relações com o
meio, sobre dificuldades de senso de pertencimento e de identidade de lugar.
Palavras-chave: Comunidade Terapêutica; Medicação; Internação; População de rua.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
INSERÇÃO SOCIAL DE PACIENTE COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA EM UMCENTRO
DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Rafaela Queiroz Cunha Souto1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Este é um relato de um atendimento realizado no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) em
Ituiutaba, Minas Gerais, sendo parte da prática do estágio profissionalizante com ênfase psicossocial
em Psicologia e seus diálogos multiprofissionais. O paciente Matheus (nome fictício), sexo
masculino, 21 anos, compareceu ao CAPS por demanda espontânea, acompanhado de sua mãe. No
atendimento, a mãe de Matheus informou que na infância seu filho foi diagnosticado com deficiência
intelectual leve, hiperatividade, e teve a perda gradual da audição - com isso faz o uso de uma
medicação controlada desde de muito novo. Durante a adolescência de Matheus seus pais se
divorciaram e o mesmo ficou sob os cuidados do pai em São Paulo. Nesse período, concluiu o ensino
médio e o curso de libras, mas sua mãe relatou que não possui muitas informações além disso e quais
foram as condições em que Matheus vivenciou nesse período. Em 2020, o paciente se mudou para
Ituiutaba para morar com a mãe, mas sua volta para cidade levou parentes a questionaram sobre o uso
da medicação do paciente, então, sua mãe decidiu suspender o uso sem consultar um médico,
desencadeando-lhe um acesso de raiva e uma crise de ansiedade. Diante disso, a mãe de Matheus
procurou o CAPS para uma consulta. A médica do serviço receitou medicação para o tratamento do
paciente e informou à mãe sobre a importância de buscar informações com um profissional.
Atualmente, o paciente está com dificuldade de se adaptar à cidade e ter vínculo social, o que lhe
gerou uma tristeza profunda e seu isolamento social. Ao final do atendimento, o paciente se interessou
em iniciar um tratamento com Acompanhamento Terapêutico e participar da oficina terapêutica
de música. Dessa forma, o seu projeto terapêutico singular possibilita um impacto positivo no
tratamento, pois permite a interação entre os usuários do serviço.

Palavras-chave: Saúde mental; Centro de Atenção Psicossocial; Acompanhamento Terapêutico.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
INTERCÂMBIO AU PAIR: UMA ANÁLISE DAS PROPAGANDASPROMOVIDAS PELAS
AGÊNCIAS DE VIAGENS

Laís Soares da Silva1


Ana Cláudia Almeida Machado 2

RESUMO
Contexto. O programa Au Pair é uma modalidade de intercâmbio no exterior destinado a jovens
acolhidas por famílias estrangeiras para trabalharem 45 horas semanais no cuidado doméstico e de
crianças da casa em troca de acomodação, alimentação e uma ajuda de custo semanal. Este trabalho
apresenta os resultados preliminares de uma pesquisa exploratória conduzida com o objetivo de
comparar as verdadeiras experiências proporcionadas pelo programa Au Pair com as expectativas
criadas pelas agências credenciadas para atrair postulantes brasileiras. Detalhamento das atividades.
Compararam-se os argumentos presentes nos sites das agências que comercializamvagas no programa
Au Pair com o conteúdo de artigos de pesquisa nacionais e internacionais sobre a temática, publicados
na área da psicologia e outras ciências humanas. Análise e discussão. A análise de conteúdo permitiu
identificar unidades de discurso que apelam para a caracterização do intercâmbio cultural como sendo
prioritariamente uma experiência de inclusão e acolhimento familiar. Destacaram-se propagandas
sedutoras, sugerindo que a au pair será recebida como um membro da família, como a irmã mais
velha das crianças de quem a contratada irá cuidar. Apesar de incluir serviços domésticos dentre as
responsabilidades das participantes, o Au Pair é prioritariamente apresentado como sendo um
programa de intercâmbio cultural, e não de trabalho. O apelo para um possível laço familiar também
visa obter benefícios econômicos, marcados por aspectos que merecem ser debatidos à luz da
economia moral do trabalho. Considerações finais. Diante desse complexo fenômeno, a psicologia
encontra um campo fértil para contribuir com esse debate, não apenas por meio da investigação dos
processos que marcam a escolha e as vivências desse intercâmbio de trabalho, mas também,
construindo e disseminando informações que rompam com discursos propositalmente idealizados
para satisfazer às necessidades do sistema capitalista exploratório, o qual, nesse caso, inclui a
exportação da força de trabalho de jovens brasileiras.
Palavras-chave: Intercâmbio; Programa Au Pair; Psicologia do trabalho.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
OFICINA TERAPÊUTICA MUSICAL EM UM CENTRO DE ATENÇÃOPSICOSSOCIAL:
RELATO DE EXPERIÊNCIA

Laila Thaíssa da Silva Menezes1


Rafaela Queiroz Cunha Souto2
Bettieli Barboza da Silveira3

RESUMO
Relato de experiência de um encontro da Oficina Terapêutica Musical feito no Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS) de Ituiutaba, Minas Gerais, sendo parte da prática do estágio profissionalizante
com ênfase psicossocial em Psicologia e seus diálogos multiprofissionais. A oficina teve duração de
duas horas e cinco participantes usuários frequentes do serviço compuseram o grupo, sendo uma
mulher e quatro homens. Como atividade inicial, foi proposta a reprodução de uma playlist musical
enquanto os participantes expressavam artisticamente suas emoções e sensações evocadas através de
pintura, desenvolvida individualmente. A segunda atividade foi a roda musical desenvolvida na parte
externa do CAPS em que os usuários, juntamente com as mediadoras do grupo e de outros
funcionários do serviço, cantaram músicas que marcaram suas trajetórias de vida. A cada música, um
breve relato do participante sobre as razões da escolha musical. No final da primeira ação cada pessoa
apresentou sua pintura e falou sobre como se sentiu ao desenvolver a obra. Durante todas as atividades
os participantes cantaram as músicas da vez e interagiam entre si e com a equipe. Com o desenrolar
das dinâmicas, observou-se que um dos participantes tocava violão, e então ele protagonizou a
coordenação da roda musical seguinte, tocou e cantou diversas músicas memorizadas. A oficina teve
um impacto positivo no processo terapêutico dos usuários, pois permitiu a interação entre os
participantes, possibilitou o desenvolvimento de potencial de expressões subjetivas pelo usuário,
além de incluir no tratamento a desenvoltura de potenciais recursos psicomotores. Assim, ter
proporcionado um momento aprazível em que as subjetividades foram respeitadas, os transtornos
mentais e síndrome de dependência não estavam em foco, mas sim, o partilhar e cada um vivenciou
o encontro da sua maneira.
Palavras-chave: Oficina terapêutica; Música; Saúde mental; Processos grupais.

1 Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2 Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
3 Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL: COMO O CAPS
BENEFICIA A COMUNIDADE

Amanda Vieira Simolini1


Rafaella Freitas Marques2
Alyssa Magalhães Prado3

RESUMO
A reforma psiquiátrica no Brasil se deu por uma série de movimentos e teve início por volta da década
de 70, entrando em vigor com a aprovação da Lei Paulo Delgado em 2001 (Lei° 10.216). No entanto,
desde 2016 o governo brasileiro tem tentado mudar a Política Nacional de Saúde Mental por meio de
uma série de recursos que visamrestabelecer os hospitais psiquiátricos como modelo de cuidado, além
de aumentar as comunidades terapêuticas em substituição às redes de atenção psicossocial que
existem pelo SUS. Dessa forma, o presente trabalho visou ressaltar a importância do Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS) de Ituiutaba, Minas Gerais, sobre o cuidado e tratamento terapêutico
eficaz, sendo base para reforçar a importância desse serviço no país e considerando sua importância
na reforma. O método utilizado foi uma análise documental focada no documento “Reflexões sobre
as oficinas temáticas em saúde mental” escrito por alunas da Psicologia UEMG-Ituiutaba e suas
práticas no CAPS Tio Doc-Ituiutaba, dividindo o relato em categorias para interligar com a temática
dos desmontes das políticas públicas de saúde. Os resultados se dividiram em quatro categorias: 1)
CAPS e seu papel; 2) Oficinas e grupos terapêuticos; 3) Importância na participação da comunidade;
e 4) Dificuldades e desafios. O trabalho apresentou o CAPS como recurso extremamente necessário
para a saúde da comunidade, sobre as oficinas temáticas como recursoterapêutico eficaz, o quão a
comunidade é importante para a legitimação do serviço, e como o financiamento, falta de participação
da família e valorização da comunidade são grandes desafios da unidade. A experiência ofereceu uma
compreensão acerca dos malefícios sobre o desmonte à saúde pública, visto que o CAPS apresenta
resultados positivos e importantes nos quesitos desinstitucionalização, humanização, reabilitação e
reinserção social em conjunto à comunidade. Reforça-se que a reimplementação dos modelos antigos
de tratamento fere os preceitos da Reforma no Brasil.
Palavras-chave: Reforma psiquiátrica; CAPS; Comunidade.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
3
Mestra docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
RELATO DE EXPERIÊNCIA: O IMPACTO DA PANDEMIA NO CAPS

Amanda Dias Ribeiro 1


Bettieli Barboza da Silveira 2

RESUMO
O Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) é um serviço de saúde mental que busca promover o
acolhimento de pessoas com transtornos mentais, oferecendo cuidadosclínicos e desenvolvimento de
autonomia e liberdade. Esse trabalho é feito através de oficinas, grupos terapêuticos, psicoterapia
individual, atendimento psiquiátrico, entre outras atividades que podem ser desenvolvidas. A partir
do novo cenário enfrentado com a pandemia do coronavírus, novos desafios foram vivenciados pela
equipe do CAPS ao se depararem com a necessidade de reestruturar todo o serviço, considerando a
necessidade do isolamento social. Aconteceu então a suspensão por tempo indeterminado de oficinas
e grupos terapêuticos, permanecendo apenas os acolhimentos e escutas; o que acabou resultando uma
quebra parcial de vínculo com pacientes, que já estavam acostumados com a rotina e o espaço do
CAPS. O cansaço mental da equipe também é algo constantemente presente, visto que a demanda de
procura pelo serviço aumentou consideravelmente e o sistema não estava pronto para esse
adoecimento em massa. Com o passar dos meses e o avanço da vacinação, aos poucos, as atividades
estão retornando e os pacientes estão voltando a frequentar o CAPS. O centro ainda está funcionando
em número reduzido de atendimenos e com casos mais graves, mas, de forma gradual, algumas
oficinas já estão acontecendo, assim como acompanhamento terapêutico e visitas domiciliares. A
tendência é que cada vez mais atividades voltem à normalidade.

Palavras-chave: Saúde mental; Pandemia; CAPS; Psicossocial.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
RELATO DE UM ENCONTRO DA RODA DE TERAPIA COMUNITÁRIASOBRE
AUTOCUIDADO

Vitória Silva Rezende1


Maria Gabriella Coradini Barbosa2
Fernanda Cubas3

RESUMO
A “Roda de terapia Comunitária Integrativa Online” é realizada pelo grupo Interfaci, fundado e
coordenado por Marilene Grandesso, o qual vem desenvolvendo suas atividades desde o ano 1988.
Os encontros acontecem às terças-feiras e dispõem de um número variado de participantes e
mediadores. Nos inícios dos encontros os mediadores explicam para os participantes que é um
ambiente para falarem sobre suas inquietações. Em um dos encontros foi levantado o tema
“autocuidado”, em que uma participante relatou que, no momento da pandemia, deixou de ser ativa,
de aproveitar o momento, que não se cuida mais e sente receio de não conseguir ser a mesma pessoa
que praticava o autocuidado. Está ciente de que precisa voltar a se movimentar agora, e não somente
quando a pandemia acabar. A partir do seu relato, os outros participantes que já passaram por uma
situação semelhante, relataram que, para sair dessa situação, foram buscar as coisas boas da vida,
tirar o proveito dos mínimos detalhes do presente momento, sempre mantendo a calma para conseguir
fazer aquilo que precisa. Assim, é proposto ao participante focar no agora, sem se preocupar tanto
com o futuro e fazer apenas o que pode ser feito no momento. Deste modo, são realizadas intervenções
por mediadores e demais participantes, de modo a acolher os anseios dos participantes e seus fatores
psicológicos.

Palavra-chave: Inquietação; Relato; Autocuidado

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
3
Mestre em Psicologia da Saúde
TRANSTORNO DE OPOSIÇÃO DESAFIANTE - UM RELATO DE CASO

Isabelle Corrêa Teles1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Relata-se o caso de um usuário do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), da cidadede Novo
Horizonte, São Paulo, com hipótese diagnóstica de Transtorno de Oposição Desafiante. Objetivou-se
acompanhar e compreender a evolução do caso, as hipóteses diagnósticas e a forma como a
intervenção psicoterapêutica foi abordada. Trata-se deum adolescente de 13 anos, sexo masculino e
estudante. O contato iniciou-se com matriciamento realizado na unidade básica de saúde. O
adolescente foi acompanhado por uma psicóloga do Núcleo de Atenção à Saúde da Família desde que
sua mãe procurou ajuda, relatando desencadeamento de “surtos”, paralelos ao desrespeito da
autoridade materna, quebra de objetos, ameaça de tirar a própria vida, além de se trancar em
determinado cômodo da casa. Foi relatada a separação conjugal dos pais, o que levantou a hipótese
de comportamentos advindos da possível não aceitação do fato. O adolescente foi encaminhado ao
CAPS, passando por visita domiciliar, atendimento domiciliar, acompanhamento psiquiátrico e
psicoterapia. Ao longo das sessões, notou-senecessidade em fazer acompanhamento também com a
mãe, pois, o adolescente relatou que ambos (mãe e filho) não confiavam um no outro e percebeu-se
que mãe poderia estar reforçando alguns comportamentos inadequados do filho. Assim, na
psicoterapia, os métodos utilizados visavam ajudar o paciente a como reagir antes de “surtos” e a
desenvolver mecanismos para mudanças comportamentais e a visita domiciliar serviu como
mecanismo importante para aproximar-se do caso de forma desintitucionalizada. O adolescente
também foi inserido em grupo terapêutico com outros jovens, apresentou interação com demais
pacientes, ainda que sempre tentando voltar a atenção para seus comportamentos. Assim, como
resultados, tem-se a evolução do paciente, o qual está em processo de autoconhecimento e
autoconfiança no grupo terapêutico e na psicoterapia.

Palavras-chave: Transtorno de Oposição Desafiante; Centro de Atenção Psicossocial; Adolescência.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA E SITUAÇÃO DE RUA EM UM CENTRO DEATENÇÃO
PSICOSSOCIAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Laila Thaíssa da Silva Menezes1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Este é o relato de um típico atendimento feito no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) de Ituiutaba,
Minas Gerais (MG), que enfatiza a prática do estágio profissionalizante com ênfase psicossocial em
Psicologia e seus diálogos multiprofissionais. Roberto(nome fictício) é um homem de 42 anos de
idade, em situação de rua, que caminhou do município de Uberlândia (MG) a Ituiutaba, atualmente
está alojado no albergue da cidade. Objetiva-se compartilhar uma rotina de atendimento e interação
entre paciente e profissionais da rede de saúde e assistência social. O paciente foi ao CAPS
encaminhado pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social e passou por um
atendimento individualizado. Apresentou demanda de acompanhamento psiquiátrico e medicações
para continuar o tratamento de Síndrome de Dependência. No atendimento, Roberto relatou sobre seu
receio de recaídas, dificuldades para dormir, medo de passar a noite na rua por nem sempre conseguir
vaga no albergue, e sobre sua insatisfação com sua situação atual. Foi feito acolhimento diurno - ele
participou das atividades desenvolvidas naquele dia no serviço, a equipe tentou contato com o CAPS
de outra cidade que ele mencionou ter sido atendido, porém, sem sucesso, tendo em vista que os dados
do paciente haviam sido descartados. Roberto foi atendido pela médica psiquiatra do serviço nesse
mesmo dia, devido a um encaixe na agenda da profissional. A médica receitou medicações para
retirada na farmácia básica para que ele desse continuidade com seu tratamento. Dessa forma, como
encaminhamento final, foi realizado contato com um membro da família de Roberto em outra cidade,
que se dispôs acolhê-lo e encaminhá-lo para o CAPS dessa cidade para dar seguimento ao tratamento
e desenvolvimento de seu projeto terapêutico singular. O atendimento proporcionou a experiência na
articulação entre serviços de saúde e assistência social em caráter emergencial.

Palavras-chave: Saúde mental; Rede de saúde mental; Centro de Atenção Psicossocial.

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
ANSIEDADE E DEPRESSÃO: O PROCESSO “DE APRENDER A LIDAR”

Mayara Cristina Silva Alves1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Milena (nome fictício), mulher, 24 anos de idade, casada, faz acompanhamento desde 2017 no Centro
de Atenção Psicossocial Tio Doc II. Hipótese Diagnóstica: Transtorno de Personalidade com
Instabilidade Emocional (Borderline) e Transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave sem
sintomas psicóticos. Faz uso das seguintes medicações: Diazepam, Lítio, Depakene, Risperidona,
Sertralina, Neozine. Está empsicoterapia há cerca de 19 sessões, tendo como queixas principais:
ansiedade constante, humor deprimido, sentimentos de desvalia, desamor, ansiedade constante,
dificuldade em seus relacionamentos interpessoais. Durante todo o processo terapêutico realizado,
buscou-se trabalhar o progresso por meio da abordagem de temas concernentes ao autocuidado, às
relações interpessoais, e à idealização de novos projetos, como o ingresso em um curso de graduação.
Ademais, trabalhou-se o equilíbrio entre pensamentos e emoções e o foco em situações que visam ao
bem-estar, com vistas ao autoconhecimento e reconhecimento de capacidade, força e disposição para
realização de suas ações. Aplicaram-se técnicas da Terapia Cognitivo-Comportamental, tais como:
técnica do relaxamento,roda da vida, cartões de enfrentamento, baralho das atitudes e baralho dos
problemas, com foco maior em seu processo depressivo e ansioso. Milena também leva algumas
“tarefas de casa” para serem realizadas no decorrer de seus dias, objetivando auxiliar, principalmente,
no enfrentamento de suas queixas. Os principais avanços perpassaram o “diário das emoções e dos
pensamentos”, com relato dos acontecimentos, pensamentos, emoções e ações cotidianos. Apesar da
constante instabilidade de humor, nota-se maior autoconfiança em Milena, especialmente ao lograr
cursar uma faculdade. Estima-se constantes evoluções, pois Milena é bastante participativa e
protagonista em seu processo terapêutico.

Palavras-chave: Depressão; Ansiedade; Terapia Cognitivo-Comportamental.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
SÍNDROME DO PÂNICO E AGORAFOBIA: UMA ANÁLISE DE CASO CLÍNICO

Sabrina Lins Batista1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
O caso aqui narrado se desenvolveu no Centro de Atenção Psicossocial, compreende o processo
psicoterapêutico de Júlia (nome fictício), de 45 anos, casada e mãe de três filhos. Há alguns anos
relata ter ataques repentinos de medo, medos de ter crises e de desmaiar (apesar de nunca ter
desmaiado) e de morrer, embora diga que a morte talvez seja a resolução para o fim de sua dor. Os
principais gatilhos para a paciente são filas de supermercado, filas de banco e lugares com
aglomerações. Júlia se queixa de não ter apoio familiar, tendo apenas sua irmã como apoio à demanda
psicológica. Seu marido e sua filha mais velha não a compreendem, acreditam que suas demandas
psicológicas são “frescura”. Júlia evita viajar e sair de casa com medo de que tenha ataques de pânico,
faz uso de medicamentos, mas reclama que os mesmos a fazem se sentir inchada, o que afeta sua
autoestima, além dos comentários que recebe do marido de que está “feia” e “gorda”. Júlia tem medo
de “enlouquecer” além do intenso medo de morte. A hipótese diagnóstica é síndrome do pânico com
agorafobia e síndrome da ansiedade generalizada. As técnicas de intervenção terapêutica utilizadas
até o momento foram baseadas na terapia cognitivo comportamental. A respiração diafragmática foi
empregada para auxiliar no manejo da paciente diante de uma crise de pânico e ansiedade, por meio
de desenho de esquema levando em consideração a falta de concentração apresentada. Ademais,
foram trabalhadas técnicas para alterar o foco da atenção dos sintomas em uma crise e concentrar nos
cinco sentidos, os quais resultaram em boa resposta de Júlia, que incluso solicitou que escrevesse em
um papel para que ela lembrasse da técnica. Júlia segue em psicoterapia, estima-se avanços constantes
articulados, principalmente por sua alta disposição e engajamento terapêutico.

Palavras-chave: Síndrome do pânico; Agorafobia; Ansiedade; Terapia Cognitivo-Comportamental.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
PROCESSOS CLÍNICOS EM TERAPIA COGNITIVA COMPORTAMENTAL

Rafaela Marques de Oliveira1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Discorre-se sobre uma prática em estágio clínico no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Tio Doc
II, com Amanda (nome fictício), mulher de 22 anos, usuária do serviço há quatro anos, diagnosticada
até o momento com transtorno de personalidade borderline. Amanda tem em seu prontuário inúmeras
tentativas de suicídio relatadas, queixa-se muito da sua relação com a mãe e como isso a afeta
diretamente. A paciente relata um episódio ocorrido no CAPS em que portava uma lâmina para se
cortar e isso fez com que a polícia tivesse que intermediar a situação, que se findou após contensão
com uso de força. Amanda afirma ter desenvolvido síndrome de pânico, agitando-se toda vez que vê
algum policial se aproximando, causando diversas crises de ansiedade e lhe deixando muito mal
ultimamente. Amanda aponta estas como suas queixas centrais, embora ainda existam demandas
ligadas ao diagnóstico de borderline, como a dificuldade em controlar seus sentimentos e a
intensidade em todas as suas relações. Os sintomas derivados deste diagnóstico comumente vêm à
tona durante a terapia semanal. Devido ao diagnóstico precoce, Amanda sofreu muito preconceito em
relação ao seu transtorno e ainda sofre. Relata que sua família e conhecidos sempre disseram que ela
nunca conseguiria trabalhar, devido a sua instabilidade, de modo que encara o trabalho que recém
iniciara sentindo que necessita provar o quão é capaz. Foram trabalhadas técnicas para que a paciente
consiga compreender suas emoções antes de tomar alguma atitude e o objetivo é incentivar que a
Amanda consiga por si só agir de forma saudável nas suas relações. A paciente está em processo
psicoterapêutico por meio da TCC, atualmente os esforços se concentram em auxilia-la no processo
de inserção no novo trabalho e do medo excessivo de polícia. Estima-se evolução em ambos os
objetivos visto que a paciente tem enorme engajamento terapêutico, porém segue sendo necessário
o acompanhamento terapêutico para a mesma além da inserção de Amanda em grupos terapêuticos
para que se mantenha a evolução da mesma.

Palavras-chave: borderline, Terapia Cognitiva Comportamental, psicologia clínica.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
O APOIO DAS FAMÍLIAS NA MINIMIZAÇÃO DE COMPORTAMENTOS
INTERNALIZANTES E EXTERNALIZANTES DE CRIANÇAS COM TEA

Pedro Almeida Forini1


Amanda Vieira Simolini2
Laura Della Antonia Silveira3
Ana Paula Silva Cantarelli Branco 4

RESUMO
A quarentena causou um isolamento social que gerou turbulência na rotina da população. Ela afetou
vários fatores nas condições psicológicas e sociais, e ao olhar para a criança com Transtorno do
Espectro Autista (TEA), o impacto se expande consideravelmente. O objetivo deste estudo foi
compreender os comportamentos internalizantes e externalizantes das crianças identificados como
disfuncionais – pela família – no ambiente de replicação dos treinos de atividades. O método utilizado
foi uma observação naturalística para descrever, com diários de campo, a realidade das famílias
executando instruções sobre a condução dos comportamentos disruptivos. As observações foram
feitas pela plataforma Zoom, semanalmente, com grupos de pais que relatavam as tarefas feitas com
as crianças. Os resultados abordam dois tópicos: (i) análise dos comportamentos externalizantes e (ii)
análise dos comportamentosinternalizantes. O primeiro tópico apresentou casos de agressão física e
a intervenção para retirar a obstinação da criança. O segundo tópico apresentou casos de
comportamento social restritos à companhia do reflexo no espelho; propondo reconhecer possíveis
reforçadores positivos no autoconhecimento corporal da criança e considerando a dificuldade de
dissociação com o espelho. As conclusões trazem a importância de a família compreender o
desenvolvimento da criança e as habilidades sociais, dificuldades como a falta de aderência de alguns
pais aos treinos, faltas, entre outras causas externas.

Palavras-chave: Comportamentos Internalizantes e Externalizantes; Treinos com famílias;


Reforçadores positivos.

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Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
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Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
RELATO DE CASO CLÍNICO: ABSTINÊNCIA DE COCAÍNA E CRACK

Bruna Ramos Medeiros1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo relatar o caso e o processo psicoterapêutico de um paciente
do Centro de Atenção Psicossocial-CAPS II, sexo masculino com 29 anos de idade, que está passando
pelo processo de abstinência de cocaína e crack. Fábio iniciou o processo psicoterapêutico relatando
que fez uso de drogas durante 9 anos, já foi internado involuntariamente e tentou parar o uso das
substâncias diversas vezes, semsucesso. Foi preso duas vezes, ao sair procurou ajuda no CAPS. Fábio
faz uso de fármacos e psicoterapia na abordagem da terapia cognitiva comportamental (TCC) há cerca
de 3 meses. Trabalhou-se acerca dos fatores que reforçam o uso de substâncias, seus pensamentos e
crenças, a fissura e a esquiva de ambientes reforçadores, a análise de custo-benefício com lista de
vantagens e desvantagens das drogas, além de recursos para potencializar a fala com auxílio dos
baralhos. Após algumas sessões, Fábio relatava que não sentia vontade de fazer o uso das
substâncias, porém, estava ficando bastante ansioso e comendo compulsivamente. Por meio da
psicoeducação, foram discutidos temas tais como a ação da droga no cérebro e o afeto da alimentação
exagerada no funcionamento cerebral. Foram traçadas estratégias para que o cérebro ganhe o prazer
e libere hormônios que eram antes fornecidos somente pelas drogas, de modo que a prática da corrida
foi iniciada. Após 12 sessões de psicoterapia e 4 meses sem o uso das substâncias - o maior período
de tempo até o momento - Fábio já tem enxergado grandes mudanças na sua vida e conseguiu evoluir
para criar objetivos futuros. Além dos ganhos terapêuticos e perspectivas a frente ao paciente, esta
experiência aporta ganhos positivos para a formação e desenvolvimento da pesquisadora.

Palavras-chave: Drogas; Psicoterapia; Substâncias; Abstinência.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
ESTUDO DE CASO CLÍNICO EM UM CENTRO DE ATENÇÃOPSICOSSOCIAL

José Aguinaldo Barbosa Costa1


Bettieli Barboza da Silveira2

RESUMO
Narra-se o caso de Zélia (nome fictício), 56 anos, sexo feminino, divorciada e aposentada. Zélia é
usuária do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e está empsicoterapia à luz da Teoria Cognitivo
Comportamental. Apresenta-se as seguintesqueixas: depressão recorrente, alucinações, isolamento
social e tentativas de suicídio. Zélia passava os dias trancada em seu quarto e não praticava exercício
físico. O processo terapêutico foi iniciado com o questionamento socrático, no qual a paciente
apresentou comportamento autoritário e controlador, com baixo repertório de habilidades sociais. A
cada sessão, Zélia relatava uma série de eventos estressores, geralmente nas relações familiares, por
não ter controle sobre elas e com isso se sentia impotente e frustrada. Decidiu-se trabalhar,
primeiramente, a aceitação com vistas a amenizar a angústia que a consumia, introduzindo sempre
algum conteúdo psicoeducativo. Aos poucos, Zélia foi tomando consciência de que esse modo de agir
só aumentava seu sofrimento e começou a voltar o seu olhar para si mesma. Todavia, os conflitos
familiares continuavam existindo, sobretudo, as brigas constantes do filho mais velho com o pai, o
que continuava sendo o principal gatilho para desencadear nela irritabilidade e crises depressivas.
Este filho foi convidado a acompanhá-la em sessão, buscando cooperação no processo terapêutico.
Utilizou-se psicodrama e roleplay, treinando suas habilidades sociais, buscando melhorar a
comunicação e empatia. Com a aplicação da ativação comportamental, progressivamente, Zélia foi
retomando algumas atividades como: caminhada, crochê, tricô, ornamentação em sandálias e pinturas
em tecido. Analisando a evolução do caso Zélia, que permanece em psicoterapia, nota-seum
considerável avanço concernente à tomada de consciência possibilitando fazer escolhas mais
assertivas e tomar decisões mais conscientes. Seu humor melhorou consideravelmente,
ressignificando os acontecimentos. Enquanto estagiário, este caso vem me propiciando uma escuta
mais aguçada, maior sensibilidade às demandas da cliente e efetivar intervenções mais assertivas.

Palavras-chave: Depressão; Consciente; Relações; Terapêutico.

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Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
PERSPECTIVA DO TREINAMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO DE SENSO
PERCEPÇÃO

Luísa Vieira Belarmino de Oliveira1


Nathaly Mayra Ferreira Borges de Souza2
Ana Paula Silva Cantarelli Branco3

RESUMO
Durante o estágio básico, as estudantes entraram em contato com famílias de crianças com Transtorno
do Espectro Autista (TEA) por meio da Associação de Amigos do Autista(AMA). Foram realizadas
reuniões semanais, a fim de observar os treinos (e seus respectivos objetivos) passados pela psicóloga
da instituição às famílias, assim como as interações e desenvolvimentos em cada caso. As reuniões,
que também eram agendadas pela psicóloga da instituição, ocorriam em diferentes dias da semana,
cabendo a cada estagiária participar de, ao menos, uma reunião semanal, de acordo com sua
disponibilidade. Os treinos, por sua vez, faziam parte de uma ficha a ser preenchida pelos familiares
dadas as respostas das crianças aos critérios estipulados em cada item disposto, visando o
desenvolvimento das crianças, com o auxílio dos familiares amparados pela psicóloga em cada
reunião, nas habilidades de percepção visual. Ao assistirem às reuniões, as estudantes puderam
observar a importância da família no processo de desenvolvimento das crianças, principalmente sob
o diagnóstico de transtorno do neurodesenvolvimento - nesse caso específico, TEA -, além da forma
como as crianças respondem aos estímulos propostos nos treinamentos, dadas suas características
individuais. Também se notou a importância do profissional de psicologia no amparo familiar
enquanto mediador e auxiliador nos treinos, esclarecedor de dúvidas individuais e coletivas e suporte
capacitado e especializado, considerando as dificuldades das famílias em realizar os treinamentos elas
mesmas e em casa, especialmente tendo em vista o período pandêmico vivido.

Palavras-chave: TEA; Percepção; Estímulos; Treinos.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
3
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
RELATO DE CASO CLÍNICO SOBRE IMPULSIVIDADE EM UM CENTRO DE
ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

Lara Carolina dos Reis Soares1


Bettieli Barboza da Silveira 2

RESUMO
A Paciente Mariana (nome fictício) tem 59 anos, natural de Ituiutaba e reside em um sítio a 20
quilômetros da cidade de Ituiutaba, aposentada, casada há 25 anos e mãe de dois filhos e vó de um
neto. Baixo nível socioeconômico, possui ensino médio completo e toma as medicações Fhmoxtinon;
Riss; Diozemam. Suas queixas principais são a depressão, ansiedade e a impulsividade. Relata-se
aqui uma sessão (quarta), na qual se ilustra o modo de comportamento tipicamente apresentado por
Mariana, além do manejo e encaminhamentos em terapia. Na quarta sessão de psicoterapia Mariana
chegou instável emocionalmente e muito chorosa pedindo a internação, o motivo do pedido foi
decorrente de conflito com a nora, o que a desestabilizou, de acordo com sua percepção. Observou-
se o comportamento, frequente, por busca impulsiva a recursos imediatos. Na escala de humor indicou
o índice 3, e relatou que estava muito triste e que a internação seria benéfica. Mariana disse que uma
das suas queixas é a que não pode ser contrariada, pois se desestabiliza e fica triste. Relatou que pediu
para seu marido lavar o quintal e ele não lavou no momento que ela pediu e isso a estressou, resultando
em briga do casal. Ela reage a impulsividade com agressividade e, nessa briga, teve emoções como
raiva e nervosismo que a fez destruir seu jardim. Há histórico de tentativa de suicídio com veneno de
rato e com automutilação na adolescência. Além disso, apresenta profunda tristeza, isolamento social,
autolesão (ideação), dorme somente com medicação e se apresenta como muito sensível.
Diagnosticada com Transtorno Depressivo recorrente, episódio atual grave sem sintomas psicóticos.
No decorrer da psicoterapia este tipo de narrativa se mostrou infrequente, Mariana apresentou
melhora constante e compreendeu não ser necessária a internação, relata bem-estar e boa disposição,
atualmente.

Palavras-chave: Impulsividade; Depressão; Psicoterapia.

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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
Trabalhos completos
ATENÇÃO BÁSICA E O SERVIÇO-ESCOLA DE PSICOLOGIA: BUSCAS POR UM
TRABALHO EM REDE

Ana Luísa Rodrigues Ferreira 1


Dhanyella Ribeiro de Oliveira 2
Ewerton Donis de Melo 3
Geovanna Fernandes Silva4
Steffany Isadora Felix da Silva 5
Alyssa Magalhães Prado6

RESUMO
O presente artigo é resultado das experiências compartilhadas durante as práticas de estágio
psicossocial no Núcleo de Pesquisas Aplicadas à Psicologia (NEAP), direcionado a saúde da família
no município de Ituiutaba (MG). Sendo assim, tem como objetivo verificar as especificidades da
futura prática psicológica articuladas com as percepções do Programa de Saúde da Família (PSF) na
atenção básica com foco na assistência em saúde mental, possibilitando uma visão ampliada no
processo de saúde/doença com intervenções de maior impacto e significação social no sentido de
romper com os velhos paradigmas da psicologia tradicional e com os muros da unidade, indo ao
encontro de onde os indivíduos vivem, trabalham e se relacionam. Com isso em vista, é possível estar
mais envolvido no trabalho interdisciplinar, na prevenção e promoção da saúde mental, na abordagem
psicossocial, no trabalho em Rede, e na singularidade e coletividade de outra forma de fazer clínica.
Esse trabalho em Rede proporciona um reconhecimento da importância de construir uma formação
acadêmica adequada e com competências suficientes para atender as demandas do serviço de saúde
coletiva e aguçar cada vez mais o espaço de escuta e acolhimento, para que estes sejam coletivos,
criativos, críticos, inovadores, éticos e condizentes com a realidade e a necessidade dos sujeitos,
atendendo aos ideários do SUS e da Reforma Sanitária.

Palavras-chave: Atenção básica; atenção psicossocial; SUS; serviço-escola, território.

INTRODUÇÃO
O presente artigo é fruto das experiências vivenciadas durante as práticas de estágio no Núcleo
de Estudos e Aplicações em Psicologia (NEAP) em conjunto com a Atenção Básica de saúde do
município de Ituiutaba (MG). As práticas foram guiadas pelas diretrizes e princípios do Sistema
Único de Saúde, e modeladas pela dimensão do cuidado territorializado. Portanto, o trabalho em rede

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
5
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
6
Mestre docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
é a proposta central no nosso estágio, sendo necessário a revisão de alguns conceitos ligados à saúde
pública. Dessa forma, buscaremos discutir as possibilidades de atuação, bem como, a importância da
psicologia no Sistema Único de Saúde.
Sabe-se que a Atenção Básica em saúde no Brasil é fundamental para a construção de uma
sociedade democrática, que visa a universalização dos direitos civis. Em conformidade com essa
assertiva, o movimento da Reforma Psiquiátrica tem como objetivo a descolonização dos manejos
em saúde mental e a adequação para as políticas brasileiras. Segundo Sampaio e Junior (2021), os
atravessamentos da reforma psiquiátrica permeiam as diversas instâncias sociais proporcionando um
novo modelo em saúde mental no Brasil. Assim, a Reforma Psiquiátrica brasileira “[...] buscou
estabelecer novas relações entre sociedade, sofrimento mental e instituições com o propósito de
desconstrução do modelo manicomial” (SAMPAIO e JUNIOR, 2021, p.2).
Dessa forma, a construção do Sistema Único de Saúde (SUS) esteve diretamente implicada
com os avanços da reforma psiquiátrica nacionalmente. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) se
originou com os avanços simultâneos entre SUS e luta antimanicomial, com base nisso, Sampaio e
Junior (2021) afirmam que a RAPS é criada como proposta de organização em saúde no país.
Fundamentada pela lei 18.080/1990, nomeada como Lei Orgânica em Saúde, a lei descreve os
princípios doutrinários e diretrizes que fundamentam o SUS. Os princípios doutrinários são:
universalidade, integralidade e equidade, e ofertam o acesso a diferentes públicos. Dessa maneira, a
universalidade compete a não exclusão do uso de qualquer sujeito em qualquer condição. E ainda,
de forma complementar, a integralidade vêm como proposta de permanência ao usuário, ofertando
assim um cuidado territorializado e prolongado.
Com base na estrutura organizativa do Sistema Único de Saúde, o Ministério da Saúde(2009)
compreende que a RAPS oferta serviços em diferentes aspectos, uma vez que a mesma está na atenção
primária, secundária e terciária. Segundo a cartilha do governo federal (Brasil, 2009), as subdivisões
dos serviços são: atenção básica, atenção psicossocial estratégica, atenção de urgência e emergência,
atenção residencial de caráter transitório, atenção hospitalar, estratégia de desinstitucionalização, e
por fim, estratégias de reabilitação psicossocial.
Tendo em vista o cuidado territorializado, e em conformidade com os objetivos do artigo,
direcionaremos as discussões do presente trabalho para a Atenção Básica. Afinal, a proposta é
centralizada nos atendimentos psicossociais estruturados a partir de um cuidado regionalizado. Para
tanto, exploraremos o conceito de território, entendendo que é nessa dimensão que a vida acontece.
A Atenção Básica está presente em todo o território nacional, funcionando como porta de
entrada ao sistema único de saúde. Segundo Faria (2020), é a partir dos acordos intermunicipais e dos
sistemas regionais que os usuários dispõem da possibilidade para acessar os níveis de cuidado
secundário e terciário. Sendo designado como responsabilidade a cada município traçar uma porta de
entrada ao sistema, seguindo os princípios descritos constitucionalmente.
Segundo Faria (2020), o conceito de território em saúde precisa ser entendido através de três
movimentos políticos, são eles: “[...] municipalização-distritalização; municipalização-
regionalização e municipalização-regionalização-redes de atenção” (FARIA, 2020, p.4523). Tais
movimentos políticos, compreendem a evolução do conceito de território dentro de uma linha
cronológica que permitiu a construção política do termo. Com base nisso, Faria (2020) compreende
que o lugar de território dentro da atenção básica em saúde é um projeto inacabado, que tramita entre
os movimentos políticos.

Denominamos territorialização, em saúde, o processo de reconhecimento do


território. Pode ser visto como uma prática, um modo de fazer, uma técnica que
possibilita o reconhecimento do ambiente, das condições de vida e da situação de
saúde da população de determinado território, assim como o acesso dessa população
a ações e serviços de saúde, viabilizando o desenvolvimento de práticas de saúde
voltadas à realidade cotidiana das pessoas (COLUSSI; PEREIRA, 2016, p.29).

Dentre os três movimentos políticos mencionados acima, vamos enfatizar a estrutura de


municipalização-regionalização-redes de atenção, que são responsáveis por operar as práticas de
saúde pública desde meados de 2006. Concomitantemente à municipalização, surge a diretriz de
regionalização, que foi proposto a estruturação de unidades organizacionais mínimas do SUS,
denominadas Distritos Sanitários. Cada distrito sanitário necessitaria de uma base territorial
delimitada geograficamente, a partir de uma rede de serviços que se adequem às características
tecnológicas apropriadas aos aspectos epistemológicos de sua comunidade (COLUSSI e PEREIRA,
2016).
Assim, em concordância com a Política Nacional de Atenção Básica (BRASIL, 2004), a saúde
da família se torna a estratégia fundamental que norteia a reorganização da atenção básica em saúde.
A Estratégia de Saúde da Família (ESF) proporcionou uma nova proposta deprática em contrapartida
ao modelo médico-hospitalocêntrico, ao introduzir a concepção de saúde ampliada, abrangendo os
aspectos referentes à qualidade de vida dos usuários, ao efetivar ações individuais e coletivas para
promoção, proteção, recuperação e cura, através de intervenções das equipes multidisciplinares
mediante a construção do vínculo, o que possibilita um melhor acesso da população aos serviços e ao
acolhimento adequado às queixas levadas (COLUSSI e PEREIRA, 2016).
Assim, o Programa tem sido denominado, mais recentemente, de Estratégia, e constitui a
ampliação da perspectiva de um programa de ações em saúde, para que fique explícita a proposta
como uma forma de reorganizar o modelo de atenção que visa a integralidade pois viabiliza o cuidado
com a rede familiar, redefinindo modalidades de intervenções que capacitem o usuário a atuar sobre
a recuperação e proteção da vida, incluindo o sujeito como provedor do seu bem-estar. Também é
uma forma de produzir um novo pensar sobre saúde ao possibilitar uma ampliação na educação e
prevenção em saúde, essa prática também está totalmente atrelado a uma perspectiva que busca
contribuir para o avanço no cuidado da saúde mental e das relações comunitárias no território. Dessa
forma, abrem-se espaços de trabalho para a psicologia, que passa a problematizar a aplicação das
práticas tradicionais em um novo cenário de atuação.
Dimenstein (1998) afirma que é recente a inserção da psicologia no campo da saúde pública
e teve como fator favorável, às transformações ocorridas no sistema de saúde no paíse o crescimento
da profissão no Brasil. Outro fator que contribuiu para a inserção da psicologia nesse contexto é o
momento em que a saúde mental passa a ser percebida como fator crucial de cuidado. Conforme o
texto publicado pelo Ministério da Saúde, onde relata que "[...] a saúde mental não está dissociada da
saúde geral e, por isso, faz-se necessário reconhecer que as demandas de saúde mental estão presentes
em diversas queixas relatadas pelos pacientes que chegam aos serviços de Saúde, em especial da
Atenção Básica" (BRASIL, 2013, p.11). Dimenstein (2001) afirma que o SUS vem exigindo a
mudança dos profissionais que atuam na área para que se tornem 'sujeitos dinamizadores' e que
possam alinhar suas práxis às diretrizes e fundamentos do sistema. Ou seja, o papel da psicologia
na atenção à saúde pública, vai se moldando e dando forma às necessidades da demanda e
redescobrindo novas formas de colaborar nas transformações sociais. Ferreira Neto (2011) refere que
o SUS apresenta aos psicólogos uma conjuntura amplamente diferente da encontrada nos consultórios
particulares, devido ao encontro com uma clientela oriunda de segmentos mais pobres da população
e o encontro com outros saberes mais antigos da saúde pública, o que promove novos
questionamentos e a busca de uma articulação entre a prática clínica e o novo contexto da saúde
pública.
Por isso, essa pesquisa tem como objetivo a construção de saberes e fazeres, para que assim
se alcance a potência do cuidado em Rede para a produção da saúde, articulando práticas de um
estágio psicossocial no Serviço-Escola Núcleo de Pesquisa Aplicada à Psicologia (NEAP) juntamente
ao Programa de Saúde da Família (PSF) na Atenção Básica visando contribuir para a perspectiva da
mudança que vem acontecendo na área, na busca de uma assistência menos tecnicista, mais
humanizada e acolhedora.

OBJETIVO
Discutir sobre as práticas de atuação entre serviço-escola de psicologia e atenção básica de
saúde do município de Ituiutaba (MG). E de forma complementar, mapear as características dos
sujeitos que buscam o serviço escola e as possibilidades de encaminhamento do município.

MÉTODO
O presente trabalho acontece a partir de práticas de um Estágio Obrigatório, que é
acompanhado de discussão teórica e supervisões em grupo. Desde a proposta inicial, buscou- se
demarcar a saúde pública como preceito e fundamento importante, especialmente na utilização de
documentos como a Cartilha de Acolhimento nas Práticas de Produção de Saúde do HumanizaSUS
(BRASIL, 2010), em que se enfatiza o acolhimento e a escuta como vias de acesso aos sujeitos, grupos
e comunidade.
É importante ressaltar também que o Estágio estabeleceu uma parceria com a Coordenação
de Atenção Básica do Município, compreendendo que tal vínculo significa muito, especialmente para
o grupo que acolhe e é demandando a responder queixas da população, mas também de um serviço,
que ao se interessar pelas possibilidades de oferta de cuidado que podemos construir, sinaliza
também a importância da presença da psicologia na Atenção Básica.
Devido à Pandemia da COVID-19, o grupo de Estágio, compreendendo inclusive esse cuidado
enquanto uma dimensão essencial do trabalho psicossocial, sempre trabalhou atendendo aos
protocolos de segurança como distanciamento social, uso do álcool gel e máscaras. Na recepção do
Serviço-Escola, foram repassadas informações aos pacientes sobreo serviço e ao entrarem na sala
com estagiárias e estagiários, firmados combinados e abertura ao diálogo a partir da pergunta inicial
sobre os motivos da procura do atendimento.
Enfatizamos tal questão direcionada e destinada a nós no acompanhamento, como uma
pergunta fundamental e que implica um conhecimento sim, sobre quem chega na busca por um
cuidado individual, mas também social, quando nos conta de onde vem, por que, como, de que
comunidade. Essa escuta qualificada permite uma escuta também de que lugar e o que esperam
aqueles que procuram um Serviço-Escola de Psicologia e consequentemente, do profissional que está
disponível e buscando se capacitar para a oferta do cuidado.
O grupo optou por trabalhar especialmente com a região Sul de Ituiutaba, entendendo que,
ainda que possamos falar de demandas municipais, precisamos também trabalhar com certos recortes
territoriais. Desta forma, o cuidado em rede articula os sofrimentos sociais, específicos da
comunidade, para que a partir da escuta seja possível o levantamento de demandas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com base nas discussões construídas durante as práticas de estágio, foi possível considerar
marcadores importantes, tais como: o trabalho em Rede e as possibilidades de atuação entre Serviço-
Escola e Atenção Básica; a dificuldade no encaminhamento dos usuários; a sobrecarga da Rede; o
cuidado multiprofissional como prática de saúde fundamental; a efetivação das políticas de saúde
mental no município, e por fim, a medicalização como proposta de uma solução rápida para o
sofrimento social.
Pensando o trabalho em Rede como proposta central do estágio e buscando atender os sujeitos
de forma integralizada, o grupo propôs dentro do manejo dos casos ofertar um papel informativo
dentro dos acompanhamentos clínicos desenvolvidos no NEAP. Dessa forma, muitas vezes foi
preciso redirecionar os pacientes a cuidados múltiplos ofertados pela RAPS.
O encaminhamento foi necessário em alguns casos, mas em outros o Serviço-Escola e
Atenção Básica se complementaram a fim de ofertar uma dimensão de cuidado voltada para a
integralidade. Tal trabalho demandou tentativas de identificação de quais são os serviços que podem
ser parceiros e possuem propostas e políticas voltadas para o cuidado e estratégias de enfrentamento
do adoecimento psicossocial.
Dessa forma, entendendo o cuidado integralizado como ferramenta fundamental das práticas
de estágio, o grupo percebeu que os usuários da Clínica-Escola traziam demandas relacionadas ao
desconhecimento da equipe multidisciplinar ofertada pelo SUS, bem como, as maneiras de buscar
pelas especialidades na atenção básica. De modo que, a busca por um cuidado especializado parece
estar distante e de difícil acesso a muitos que chegam à Clínica- Escola. Por esse motivo, os
acompanhamentos tiveram o intuito de orientação e manejo dentro de uma lógica operacional entre
Atenção Básica de Saúde, Atenção Psicossocial estratégica.
Ainda assim, gostaríamos de enfatizar a compreensão quanto aos profissionais,
principalmente que estão na porta de entrada como fundamentais para a primeira escuta, mas que
também estão situados, ainda mais em um momento de pandemia, em um contexto de sucateamento
público e de sobrecargas. É importante considerar que os profissionais em políticas públicas são
também sujeitos sociais, trabalhadores e vinculados a um trabalho socialmente organizado, ou seja,
não buscamos trabalhar com uma ideia romântica dos profissionais de saúde, mas sim em uma
proposta em saúde que perpassa o projeto e a efetivação.
Na busca por informar e conversar com os pacientes, percebemos que muito se fez também
em supervisão na sensação presente de esgotamento e sobrecarga que estamos vivendo. Em alguns
momentos, o grupo falou de como pacientes nos chegam sobrecarregados, esgotados, com demandas
de cansaço e com questões intensificadas e agravadas. Percebemos como a nossa direção e
encaminhamento eram importantes também em um tratamento, no conversar com o paciente sobre
onde e em que lugar eles poderiam ter uma equipe multiprofissional e teria uma visão e propostas
mais voltadas para aquelas questões, em especial em casos que possuam questões ligadas a violação
de direitos.
Tendo em vista as violações dos direitos mencionados acima, durante as práticas de estágio
na Clínica-Escola pudemos mapear alguns marcadores sociais específicos, os quais são: questões
de gênero, vulnerabilidades sociais e medicalização da vida e do sofrimento social. Quando nos
referimos sobre questões de gênero, falamos dos atravessamentos da mulher sobrecarregada, que é
chefe de família e a única mantenedora financeira do lar. Esse processo de chegada na clínica parte
em muitos casos de situações extremas, acompanhado deum esgotamento psicológico e físico.
É possível perceber que as vulnerabilidades são marcadas pelo não acesso precoce à atenção
especializada. Que culminam ao agravamento do quadro. Outro ponto importante discutido pelo
grupo é a medicalização da vida e dos processos de sofrimentos psicossociais. Freitas e Amarante
(2017), descreve que o conceito de medicalização como a idealização do uso dos fármacos como
solução prática e integral frente aos problemas da vida. É importante ressaltar a diferença entre
medicação e medicalização, já que a primeira pode ser descrita como o uso correto dos psicofármacos,
em acompanhamento pela equipe especializada. Enquanto que a medicalização, é conceituada pelo
uso indevido de psicofármacos sem prescrição médica.
Segundo Carvalho e Dimenstein (2004), os psicofármacos ofertam a ideia de superação e
resposta ao mal-estar, e são colocados pelo imaginário social como solução rápida frente aos
atravessamentos das questões sociais na saúde mental dos usuários. Desse modo, o não-dito e as
entrelinhas da exclusão e das vulnerabilidades são operacionalizadas através da medicalização.
É importante ressaltar, que a discussão proposta pelo trabalho não tem o objetivo de apontar
falhas no Sistema Único de Saúde, muito menos responsabilizar os profissionais que se encontram
constantemente sobrecarregados. Mas sim fortalecer o sistema. Uma vez que, os pilares da
universidade pública são: ensino, pesquisa e extensão. Com base nisso, a interlocução do Serviço-
Escola e a rede de Atenção Básica de saúde se justifica pela estreita relação entre pesquisa e
fortalecimento da RAPS. Com objetivo de complementar o trabalho entre as instituições públicas, e
fortalecer a emancipação das políticas públicas em saúde mental no Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista o cuidado em rede e a oferta de atendimento gratuito pelo Núcleo de Estudos
e Aplicação em psicologia, foi possível construir um trabalho de coparticipação em saúde mental.
Levando em consideração o cuidado territorializado, afinal, o mesmo é caracterizado pelo
reconhecimento do território e pela análise das condições sociodemográficas da região, visando
entender as condições de vida da população e a situação de saúde da região.
É preciso ressaltar que o trabalho em psicologia estará sempre vinculado as diversas outras
especialidades multiprofissionais que compõem a equipe das áreas de saúde e desenvolvimento
social. Afinal, não é possível falar em saúde mental sem falar das condições mínimas de saúde e bem-
estar.
Nas experiências desenvolvidas durante os acompanhamentos psicossociais, foi possível
perceber a indivisibilidade entre a psicologia e as diversas profissões ligadas a assistência comunitária
e a emancipação social. De modo que, a promoção e a ressocialização do indivíduo na sociedade
perpassam uma estrutura de estabilização financeira, política e cultural, a fim de construir autonomia
baseada na retomada dos direitos civis. Portanto, mesmo que a experiência em atendimento social
tenha sido restrita ao tempo estipulado pelo calendário acadêmico, foi possível construir caminhos.
Entendendo a clínica como ato político que se constrói a partir da escuta.

REFERÊNCIAS
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das práticas de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS. Brasília: Ministério da Saúde,
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Disponível em < http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/caderno_34.pdf> . Acesso
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Territorialização como instrumento do planejamento local na Atenção Básica [Recurso eletrônico] /


Universidade Federal de Santa Catarina. Organizadoras: Claudia Flemming Colussi; Katiuscia
Graziela Pereira. - Florianópolis: UFSC, 2016. 86 p. : il. color. (Série – Formação para Atenção
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PRÁTICAS DE ESTÁGIO E ACOLHIMENTO DE DEMANDAS DE SOFRIMENTO
PSICOSSOCIAL EM UM CONTEXTO DE PANDEMIA

Ana Luísa Rodrigues Ferreira 1


Dhanyella Ribeiro de Oliveira 2
Ewerton Donis de Melo 3
Geovanna Fernandes Silva4
Steffany Isadora Felix da Silva 5
Alyssa Magalhães Prado6

RESUMO
O presente trabalho é fruto das experiências compartilhadas durante as práticas em um estágio
psicossocial direcionado ao cuidado em saúde no município de Ituiutaba (MG). As práticas
aconteceram do Núcleo de Estudos e Aplicações em Psicologia – NEAP, da Universidade do Estado
de Minas Gerais. Tendo em vista os diversos atravessamentos da pandemia nos acolhimentos em
psicologia, o artigo tem objetivo de discutir sobre as demandas de sofrimento psicossocial
em contexto pandêmico, bem como, mapear as singularidades dos usuários que buscam o serviço-
escola de psicologia. O acolhimento e acompanhamento dos casos foi desenhado a partir da análise
integral do sofrimento social, e levando em conta os atravessamentos e consequências da pandemia
na vida dos usuários. O acompanhamento psicossocial objetivou a contextualização das práticas em
saúde ofertadas pelo município, especialmente as práticas da atenção primária, em conjunto com a
atenção psicossocial especializada. De modo geral, foi possível entender de que maneira estão
chegando os casos clínicos e em que dimensão estão adentrando no Serviço- Escola. Sendo
possível identificar marcadores sociais ligados as vulnerabilidades e fragilidades dos usuários que
procuram o serviço, e de modo complementar, a partir dessas identificações ofertar uma escuta
democrática, que traga as dimensões humanas e as reconfigurações do sofrimento a partir da
pandemia, sempre buscando acolhimentos humanizados e integralizados.

Palavras chaves: Acolhimento; sofrimento social; contexto pandêmico.

INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde declarou, em janeiro de 2020, que o novo
coronavírus (COVID-19) se tornava uma Emergência de Saúde Pública de
ImportânciaInternacional – o mais alto nível de alerta da Organização, conforme previsto no
Regulamento Sanitário Internacional. Em 11 de março de 2020, a COVID-19 foi caracterizada pela

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
5
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
6
Mestra e docente no Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
OMS como uma pandemia (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE, 2020).
Sabe-se que a pandemia COVID-19 se tornou no último ano um problema de saúde pública a
nível mundial. As restrições impostas pela doença reconfiguraram os diversos aspectos da vida
humana. A educação, cultura e lazer foram alvos de inúmeras modificações sanitárias. Franco (2021)
explica, que em consequência da pandemia as pessoas experienciam perdas, assim como a interrupção
da vida já conhecida, das regras sociais, dos rituais fúnebres e práticas referentes ao processo de luto.
A ameaça trazida pela pandemia do novo Coronavírus trouxe à população mundial uma nova
perspectiva sobre a vida e o significado das relações. O isolamento, o distanciamento e a morte se
tornaram uma realidade tão concreta quanto a profundidade das relações humanas, assim como a
saturação de ambientes hospitalares levantou a discussão sobre a importância de serviços voltados
para a saúde pública que alcance toda a população, de modo que o acesso à assistência de saúde de
qualidade não fique restrita a instituições privadas ou a planos de saúde.
Faggin (2020) constatou em sua pesquisa sobre as mudanças trazidas pela pandemia nos lares
brasileiros, que a perspectiva ameaçadora ocasionada pelo coronavírus despertou na população
brasileira uma visão mais atenta sobre os pensamentos e emoções, levando-os a recorrer à
psicoterapia. Essa nova perspectiva também trouxe a repercussão de como essa população enxerga
os serviços públicos, quando parte desses indivíduos se viram abandonados pelas agências
governamentais, e tiveram que buscar individualmente recursos para os cuidados com a saúde e a
família, nesse sentido esses indivíduos não conseguem mais imaginar um ambiente onde não exista
um Sistema Único de Saúde (SUS).
O Brasil foi um dos países fortemente atingidos pela letalidade e o forte avanço do Covid-19,
a força operacional do Sistema Único de Saúde foi uma resposta assistencial para parte da população
brasileira durante a pandemia, e isso se deu graças aos seus princípios e práticas e garantias em
legislações que possibilitaram o alcance e acolhimento de comunidades isoladas mais necessitadas.
Segundo a cartilha da Política Nacional de Humanização (CARTILHA PNH, 2010) o acolhimento
no campo da saúde é entendido como a diretriz ética, estética e política dos modos de oferecer e
produzir saúde e objeto de intervenção na qualificação da escuta, construção de vínculo garantia ao
acesso com responsabilização e resolutividade dos serviços.
A prática de acolher não se trata de um espaço, mas sim uma postura ética onde se implica a
responsabilidade de fornecer atenção necessária para as demandas apresentadas, entre suas diretrizes
operacionais está a atitude de dar o protagonismo aos sujeitos envolvidos no processo de produção
de saúde, tomando uma postura de estar atento às diversidades cultural, racial e estética. O conceito
de acolhimento no cotidiano das práticas de saúde por meio de uma escuta qualificada e da pactuação
entre a demanda do usuário e a possibilidade de resposta do serviço. Deve-se olhar essa prática como
um dispositivo técnico-assistencial que permite a consideração sobre mudanças nas formas de
fornecer assistência, “pois questiona os modelos de atenção e gestão e as relações de acesso aos
serviços.” (CARTILHA PNH, 2010, p. 4-46)
Desse modo, pensando nas possibilidades de atuação em psicologia ainda em um contexto
pandêmico, o trabalho pretende relatar as experiências de acolhimento, atendimento e
acompanhamento de demandas no município de Ituiutaba/MG. Essas experiências aconteceram no
ambiente institucional do Serviço-Escola NEAP (Núcleo de Estudos e Aplicações em Psicologia
da Universidade Estadual de Minas Gerais), com base no acolhimento presencial e remoto. O trabalho
fomenta a discussão de marcadores significativos do acolhimento em contexto pandêmico e algumas
questões principais que demarcam cenas de sofrimento psicossocial. Com base nisso, identificamos
como esses pacientes estão chegando para o atendimento, bem como, as vulnerabilidades e
fragilidades ligadas a questões sociais e pôr fim a elaboração do luto individual, mas também coletivo
que aflige no momento a história humana conjunta. Na produção de resgaste da memória, as pessoas
também retomaram intensamente as histórias de suas famílias e a vida no grupo como um lugar de
anseios.

OBJETIVO
Discutir sobre as demandas de sofrimento psicossocial em contexto pandêmico, bemcomo,
mapear as singularidades dos usuários que buscam o Serviço-Escola de Psicologia.

MÉTODO
A escrita se desenvolve a partir de relatos de experiência de estágio, discussão teórica e
reflexão em supervisão de grupo. As práticas se iniciaram a partir de uma fundamentação teórica
sobre o acolhimento e a escuta como ferramentas críticas de intervenção e análise com base na
literatura em saúde pública brasileira, apoiada pela lógica do trabalho humanizado e fundamentado
em noções de cidadania. Com a Pandemia da COVID-19 e as necessidades de isolamento social, o
grupo de Estágio trabalha com a limitação de circulação e protocolos de segurança como máscara,
álcool gel e distanciamento social.
Com isso, a possibilidade de intervenções grupais ficou limitada, ainda que o grupo perpasse
a lógica de trabalho, especialmente nas configurações grupais que os pacientes trazem, como a família
atualmente reunida em domicílio, ou como no próprio trabalho de reflexão conjunta em supervisão,
movimento importante na construção de uma linha de trabalho em parceria e equipe. Apesar da figura
do profissional diretamente envolvido como caso e da supervisora, engajou-se uma posição frente
aos casos de coletivo de cuidado.
Em conjunto com essas leituras, localizam-se também discussões teóricas de orientação
psicanalítica, especialmente a perspectiva que utiliza o método interpretativo como operação, mas em
relação com a sociologia, ciência política, da saúde e psicologia social. Para Debieux Rosa (2004),
a psicanálise extensa promove um “resgate a experiência compartilhada com o outro, escuta como
testemunho e resgate da memória” (ROSA, 2004, p. 344). Deste modo, promove-se a escuta sobre
como o sujeito carrega a história coletiva, ilustrando ao profissional implicado a importância e
sentidos que os contextos provocam. Na escuta de quem chega e procura o acolhimento e
acompanhamentopsicossocial, isso se amplia, na articulação do que se observa da experiência, com
o que o outro conta de sua vivência. Está posto o desafio de uma escuta implicada, em especial da
cena familiar, resgatando sentidos, histórias e memórias que produzam um mosaico que leve a
apreensão das lógicas e acontecimentos, sem que se exclua a dimensão social, política e econômica
do tempo passado e presente.
Na lida com os casos, buscou-se uma atuação frente às procuras a partir de demanda
espontânea, com a chegada de pessoas que vieram a partir de informações e especialmente, a partir
de um primeiro contato com o ESF (Estratégia de Saúde da Família) de seu bairro. A fim de uma
melhor inserção territorial, os casos buscaram ofertar e disponibilizar acompanhamento
principalmente para a região Sul da cidade, devido a parceria que foi formalizada com o Município.
Os atendimentos aconteceram no Serviço-Escola de Psicologia da Universidade, que compreendida
como clínica, oferta cuidado gratuito e relacionado com preceitos fundamentais da ética em cuidado
público.
Aos pacientes, além de algumas informações dadas na Secretaria do Serviço-Escola, as
estagiárias e estagiários buscaram explicitar a dinâmica dos acompanhamentos, como tempo,
compromissos e o início de uma avaliação primeira, complementando com a pergunta inicial sobre o
que levou a busca pelo serviço de psicologia.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para a produção de um recorte e produção escrita, destaca-se três aspectos muito discutidos
no grupo de Estágio: vulnerabilidades e fragilidades sociais; enlutamento e morte e anseios
familiares.
Primeiramente, falemos das vulnerabilidades e fragilidades sociais. Muitos dos casos
trouxeram uma experiência de cansaço extremamente relacionada à sobrecarga de trabalho, a
insatisfação com relação a organização da casa e uma não presença de atividades que possam
responder de forma mais responsiva e prazerosa a dinâmica da vida. Compreendemos aqui, que a
atuação efetiva de serviços de saúde, educação, cultura, lazer, segurança pública, trabalho e habitação
são políticas que funcionam a partir do singular edo coletivo. Deste modo, o grupo de Estágio
conversou e dialogou muito sobre essa falta que a política pública efetiva ressoava nas falas das
pessoas que foram e são acompanhadas. Estas, são demandas urgentes e futuras, na reflexão sobre um
atendimento que sim, busca responder ao hoje e especialmente tenta acalentar quem chega angustiado
e produzir, como colocou uma paciente, um lugar de certa “folga”, mas que em nosso trabalho, nos
movimenta na construção de como, enquanto psicologia implicada por uma ótica humanizada, pode
se organizar para a resposta ao Munícipio e grupos representativos. Em muitos momentos, nos
questionamos a grande importância de uma equipe multiprofissional em uma atuação de certo caso,
além da necessidade de um conhecimento em território a partir, por exemplo, de visitas domiciliares,
grupos, trabalho comunitário ou oficinas.
Outro aspecto importante, com a presença da escuta qualificada e busca de construção
vinculativa, os acompanhamentos trouxeram demandas diversas. A chegada e presença das pessoas
repercutiu de forma intensa tanto para os próprios pacientes, quanto para estudantes. Foi comum na
escuta o choro, o silêncio, a dúvida e a procura por respostas efetivas de como dar conta de tudo isso,
movimento digno de questionamentos na procura por uma fala voltada para a lida com as angústias
que advém de não somente um viver, mas o viver sob uma pandemia e uma governabilidade
negligente e violenta especialmente com minorias e populações em situação desigual. Lembrando
que o trabalho na universidade e em conjunto com o público, vive já há algum tempo literalmente
cortes, não só nas falas de um Brasil que ameaça e desrespeita a população que representa
principalmente no descaso com a pandemia, como na busca de contenção de legislações e
investimentos econômicos (que ocorrem inclusive já anteriormente ao atual governante).
Muito revisitado na escuta operada, foram questões ligadas a morte, ao morrer e ao
enlutamento. Devido à pandemia, temos um número assombroso de mais de 600.000pessoas que
faleceram, além do conjunto de pessoas que vivem as consequências da COVID-19 e dos que ficam
e sentem a falta de quem faleceu. Entretanto, também nos chamou a atenção muitos relatos trazidos
sobre a morte, inclusive não ligadas diretamente a pandemia. Em artigo da Fiocruz, pesquisadores
nomearam um trabalho como “A Pandemia de COVID-19 e a Naturalização da Morte” (MORENO
et al, 2020). Em supervisão, em vários dos casos, refletimos e consideramos como a morte passou a
se tornar um lugar muito ativo e reflexivo, coletivo, marcado não somente por quem diretamente
perdeu alguém durante a pandemia, mas também no lugar de quem já perdeu alguém e sente, se
sensibiliza a partir disso. Sendo assim, a morte acaba ficando extremamente vívida no exercício de
rememoração e elaboração que produz a escuta atual.
Ao passo em que direcionamos o olhar para a relação do sujeito com o trabalho, percebemos
uma sobrecarga que, além de uma ação que busca a sobrevivência, também é carregada por uma
cultura individualizante. Ou seja, o sujeito se vê diretamente responsável pelas suas condições sociais
e econômicas, o que produz um sentimento de culpa e fracasso, gerando, em alguns casos, o
adoecimento e o afastamento do trabalho, além de um isolamento e silenciamento do sujeito dentro
do seu próprio contexto familiar. Nesta perspectiva, o acolhimento se mostrou essencial para
diminuir a angústia do sujeito e abrir possibilidades para o realocamento do mesmo dentro de sua
queixa principal.

“O trabalho é constitutivo da espécie e estruturante do psiquismo, mas pode tornar-


se o contrário. Pode ser ocasião de superar os limites do corpo, condição de
subjetivação no mundo, de formação da engenhosidade. De modo que ser afastado
de seu exercício (em função de acidentes ou formas de adoecimento gerados ou
agravados no/pelo trabalho) pode gerar vivências complexas.” (SOUZA; MORAES,
2018, p.104-105)

Dentro da clínica, o trabalho também se apresentou como um aspecto central dentro da vida
de alguns pacientes que procuraram o serviço-escola da UEMG, o que nos levou a reflexões sobre
como e o que o trabalho representa na vida e na construção da subjetividade destes sujeitos. A escuta
de pacientes que foram afastados do trabalho revelou diversos sentimentos por parte destes sujeitos
como vergonha, culpa, frustração e autocobrança para uma melhora.
Seguindo esta linha de raciocínio, é possível relacionar tais situações com a cultura
individualizante e produtiva que opera dentro do tecido social. Tendo em vista que, diante de um
atual cenário sociopolítico que vem de constantes retiradas de direitos trabalhistas eo aumento do
trabalho informal, a insegurança, a produção excessiva e a responsabilização constante do trabalhador
sem considerar suas condições de trabalho, são fatores que levam diversos sujeitos ao adoecimento
psíquico e que, por outro lado, acabam não resguardados por nenhum direito trabalhista dentro da
informalidade.
Por fim, trouxemos a organização familiar como lugar essencial. Não compreendemos a
família como resposta pronta, como tentam alguns grupos nos embates sobre uma família tradicional
a ser protegida, mas a família como instituição histórico- social-subjetiva que envolve aqueles que
nos chegam. Especialmente no momento atual, emque as pessoas se veem com a necessidade de
isolamento, a família talvez produza ainda mais anseios: as tensões de relações parentais; questões
matrimoniais e conjugais; dúvidas com relação ao que filhos precisam; dificuldades de comunicação
no dizer pro outro o que se sente, o que se passa, o que está difícil; verbalização de culpas e desejos
que o que passou em tal contexto, pudesse ter sido diferente. A família, mesmo que não presente
fisicamente, vai sendo sempre questão fundamental no contato social e vínculos que as pessoas
possuem.
Tais processos sempre repercutiram em um trabalho psicossocial como conteúdos que
orientavam uma questão importante: como responderemos e atuaremos nessa situação? Como
analisaremos sim, o que vêm por uma ótica mais singular, mas também compreendendo o que é
trazido de forma sócio situada. O Brasil, como sujeito, vive hoje uma crise política e econômica que
repercute na desigualdade social e encarece o supermercado, o transporte, o lazer, a cultura, a saúde,
a educação. Diante disso, fazemos sim um trabalho psicoterapêutico de lidar com as angústias, mas
mapeando que essas angústias existem a partir desse sujeito social, que vive em um país injusto e que
precisa se movimentar para um trabalho de sensibilização frente a isso e consequentemente, atuar na
prática com políticas afirmativas, menos discriminatórias e anti-privilégios de diferentes ordens como
de classe, raça, gênero.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como exposto ao longo do trabalho, o contexto pandêmico transformou os aspectos das
relações humanas. A morte que antes ocupava o campo das ideias, se tornou uma realidade presente
na rotina dos cidadãos brasileiros. No Brasil, o Sistema Único de Saúde serviu como uma resposta
assistencial, possibilitando o alcance e o acolhimento de famílias em estado de vulnerabilidades,
além da ameaça do adoecimento e da morte eminente essas famílias desamparadas socialmente se
viram cercadas pela insegurança alimentar, medo, crise econômica e outros problemas sociais que
afeta diretamente o contexto familiar desses indivíduos.
Portanto, o presente trabalho conseguiu levantar alguns impasses enfrentados por esses
sujeitos e famílias que obtiveram acesso ao serviço terapêutico, como a vivência do luto durante a
pandemia, a dúvida do que se esperar diante dessa nova realidade, relatos de diferentes tipos de
violação de direitos e violências, o sentimento de culpa e a busca por respostas do que deveria fazer
para dar conta desses problemas sociais. Por mais que o serviço tenha sido realizado em alguns
momentos, houve uma incerteza de como agir em alguns casos, onde houve necessidade de realizar
encaminhamentos a outros profissionais e instituições, esse trabalho teria sido mais bem realizado se
os serviços ofertados pela rede do SUS conversassem entre si de uma forma mais homogênea.
Atualmente, o grupo de estágio planeja e aspira realizar práticas que possam produzir maior inserção
no território, além do fortalecimento e diálogo com a rede e profissionais sobre o trabalho que foi e
está sendo feito, mas de também como poderemos avançar, especialmente com um cenário melhor
com relação à COVID-19 devido especialmente a vacinação no país.
Baseado nisso se faz necessário ampliar o estudo do território e dos serviços que podem ser
ofertados para auxiliar no atendimento dessas famílias, afim de aumentar o acesso e
conhecimento da sociedade a esses serviços, que são vistos na maioria dos casos como inacessíveis
aos olhos daqueles que deveriam o utilizar, isso se dá principalmente pela falta de informação, muito
tanto se tem falado sobre uma prática mais humanizada e acessível a população carente que são
aqueles que menos acessam esses lugares, diante disso cabe a nós profissionais da saúde, prestadores
desse serviço exercer o vínculo entre a população e esses lugares que são vistos como utópicos pelos
mesmos.

REFERÊNCIAS
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ZAMBRONI-DE-SOUZA, P. C.; MORAES, T. D. Reflexões sobre a dinâmica psíquica de


trabalhadores afastados do trabalho. Fractal: Revista de Psicologia [online]. 2018, v. 30, n. 2, pp.
103-111. Disponível em: <https://doi.org/10.22409/1984-0292/v30i2/5866>. Epub May-Aug 2018.
ISSN 1984-0292. https://doi.org/10.22409/1984-0292/v30i2/5866. Acesso em; nov de 2021.
PROJETO CARTAS SOLIDÁRIAS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO
PSICOSSOCIAL

Laís Soares da Silva1


Carolyne Santos Alves2
Diovana Mendes Vasconcelos3
Maria Luiza Mamede Crespo 4
Paloma Borges de Oliveira5
Rayane de Freitas Martins6
Vanessa Vieira Martins7
Vitória Paula Silva8
Ana Cláudia Almeida Machado9

RESUMO
O presente trabalho relata uma experiência de estágio psicossocial denominado Projeto Cartas
Solidárias, desenvolvido nos dois semestres letivos de 2021. Serão apresentados sua forma de
execução e os principais resultados obtidos até o momento. Em razão da necessidade de
distanciamento social provocada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19), o trabalho foi
realizado de forma híbrida: supervisões realizadas via remota prepararam as estagiárias para a fase
de trabalho de campo, o qual foi desenvolvido em parte remota, e em parte presencialmente na
Unidade Mista de Saúde I de Ituiutaba-MG. Participaram oito estagiárias de diferentes semestres do
curso de psicologia. As atividades foram supervisionadas pela professora Ana Cláudia Machado, após
ter sido firmada parceria entre a Universidade do Estado de Minas Gerais e a Secretaria de Saúde
Municipal de Ituiutaba. As atividades basearam-se em discussões prévias realizadas em sala de aula
sobre conteúdos teóricos, com enfoque na temática da saúde mental do trabalhador. Após realizadas
reuniões de planejamento para o desenvolvimento do projeto, deu-se início à parte prática, marcada
pela coleta de cartas escritas por usuários dos serviços de saúde. As coletas foram realizadas tanto
presencialmente quanto por meio das redes sociais do projeto. Por meio dessa atividade, diversos
usuários da rede pública de saúde puderam manifestar seu reconhecimento e gratidão aos profissionais
que estiveram na linha de frente do atendimento durante a pandemia da Covid-19. Ao todo, 75
pessoas, dentre agentes de saúde, técnicos administrativos e equipe de apoio, receberão cartas
recolhidas pelo Projeto Cartas Solidárias. Espera-se que esse projeto favoreça com que os
trabalhadores experimentem consequências positivas do reconhecimento no trabalho, as quais,
segundo a teoria psicodinâmica do trabalho, que marcou a preparação teórica desse estágio, incluem
1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
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Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
9
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba
a transformação do sofrimento em vivências de prazer, contribuindo para a promoção da qualidade
de vida do trabalhador.

Palavras-chave: Cartas Solidárias; psicodinâmica do trabalho; estágio psicossocial.

INTRODUÇÃO
Para a Psicodinâmica do Trabalho (PdT), trabalhar implica sofrer, já que o sofrimento está no cerne
do trabalho (MACHADO e FACAS, 2020a). A gênese desse sofrimento original está no choque que o
trabalhador percebe existir entre suas escolhas pessoais e uma organização do trabalho passiva em relação aos
seus desejos (DEJOURS, 1992). Quando o sofrimento original se desloca para a busca de bem-estar e permite
vivências de sofrimento no trabalho, o mesmo passa a ser considerado sofrimento criativo. O sofrimento
criativo no trabalho, portanto, não depende de decisões que partem dos trabalhadores, mas, sim, de modos de
gestão organizacionais que permitam com que os trabalhadores, diante de situações de sofrimento, possam
lutar ou sair em busca da normalidade (MACHADO e FACAS,2020a).
Situações de trabalho favoráveis à saúde são aquelas que permitem que os trabalhadores adaptem suas
aspirações, ideias e desejos às cobranças que lhes são impostas. Isso é encontrado em organizações que
consentem com que os trabalhadores ajustem as exigências do trabalho às necessidades de seu corpo e às
variações de seu estado de espírito (DEJOURS, 1989). Quando não favorecem a saúde, essas situações de
trabalho podem conduzir ao que é conhecido por sofrimento patogênico no trabalho. Segundo Machado e
Facas (2020b), apesar de conceitualmente não se tratar de sinônimos, as denominações “sofrimento
patogênico” e “sofrimento no trabalho” são confundidas e usadas incorretamente, uma vez que “por sofrimento
patogênico entende-se o destino negativo (ou indesejável) do sofrimento no trabalho” (p. 416).
Tendo em vista o anteriormente exposto, o sofrimento é criativo quando a organização permite ao
trabalhador buscar soluções para vencer os desafios impostos pelo trabalho. Quando isso ocorre, há um
movimento do trabalhador em direção à saúde mental. Por outro lado, o sofrimento é considerado patogênico
quando o sofrimento original (aquele causado pela possibilidade de fracasso) não pode ser superado, ou quando
não há ambiente que favoreça com que os trabalhadores vençam as exigências que lhes foram impostas
(DEJOURS, 1996).
A transformação do sofrimento em prazer no trabalho ocorre em organizações que possuem duas
características. A primeira relaciona-se à oferta de uma margem de liberdade ao trabalhador que leva em
consideração seus desejos e necessidades pessoais. A segunda é ligada à presença de um ambiente que estimule
relações socioprofissionais abertas, democráticas e justas (MENDES, 2011). Para a PdT, trabalho saudável é
aquele que permite atransformação do sofrimento em prazer, e não aquele onde não há vivências de sofrimento,
uma vez que este está na gênese do trabalho. Outro aspecto importante para produzir vivências de prazer é o
reconhecimento. É por meio do sentimento se sentir reconhecido que otrabalhador constrói sua identidade no
trabalho (DEJOURS, 1992).
O reconhecimento é considerado elemento-chave na relação entre o trabalhador e a organização, já
que implica diretamente nos processos motivacionais, na percepção de valorização e no sentimento de justiça
dos trabalhadores (BENDASSOLLI, 2012). Além disso, o esforço que o trabalhador coloca sobre o trabalho
gera sobre ele uma expectativa de retribuição, que necessariamente passa pelo reconhecimento (MENDES,
2007). Se o reconhecimento não ocorre, o trabalhador não encontra sentido no trabalho, situação que pode
conduzi-lo a descompensações psíquicas e somáticas (DEJOURS, ABDOUCHELLI, 1994).
Diversos estudos em PdT têm associado a falta de reconhecimento no trabalho a processos de
sofrimento, adoecimento e despersonalização. Inversamente, sabe-se que o reconhecimento favorece a
construção de significados e contribuiu com a mediação da relação entre o trabalhador e seu coletivo,
permitindo, assim, com que os mesmos percebam os atributos de utilidade (valor) e beleza (qualidade) no
trabalho que realizam (BENDASSOLLI, 2012). É o reconhecimento que dará sentido ao esforço despendido
pelo trabalhador para transformar a organização do trabalho (SANTOS et al, 2018).
O reconhecimento de beleza é realizado pelos pares, pelos colegas de trabalho, uma vez que são esses
atores que verdadeiramente possuem condições, experiências, habilidades e competências para julgar o que foi
feito. A ausência do reconhecimento de beleza pode fazer com que o trabalhador viva intensamente um
sofrimento que pode se tornar patogênico, com graves consequências para sua saúde. Já o reconhecimento
da utilidade, igualmente geradorde vivências de prazer aos trabalhadores, não depende dos pares ou colegas,
mas sim, daqueles que se beneficiam direta ou indiretamente do trabalho realizado, como a chefia ou os clientes
atendidos por esses trabalhadores (SZNELWAR e UCHIDA, 2004).
Com base na teoria psicodinâmica do trabalho, anteriormente apresentada, foi desenvolvido o projeto
Cartas Solidárias. A inspiração para seu desenvolvimento sob os auspícios do curso de psicologia da UEMG
foi uma ação da mesma natureza que teve como pioneira a Universidade de Brasília (UnB). O objetivo do
projeto foi materializar o reconhecimento da população de Ituiutaba-MG em relação ao trabalho desempenhado
por profissionais que atuam na linha de frente de enfrentamento da Covid-19. Isso se deu por meio de
demonstrações espontâneas de afeto e gratidão, marcadas por textos disponibilizados em cartas.
Na UnB, essa iniciativa nasceu ao se perceber as consequências positivas que as cartas escritas pela
reitoria à comunidade acadêmica, logo quando da suspensão das atividades presenciais em razão da crise
sanitária, provocaram na comunidade acadêmica, em especial considerando-se o período de tantas incertezas.
As primeiras cartas foram escritas pelos estudantes universitários, o que meses após foi ampliado, graças a
uma parceria firmada como Jornal Correio Braziliense (DF), que ampliou o projeto permitindo a participação
da comunidade local, que publicou: ‘’Em tempos de tantas incertezas, inseguranças e medo, a carta provoca
um momento de solidariedade, de afeto e compromisso com esse humano’’(ANDRADE, 2020).

OBJETIVO
Este trabalho tem como objetivo geral apresentar o relato de experiência referente à prática do estágio
profissionalizante do eixo psicossocial, oferecido durante o ano letivo de 2021 pela professora Ana Claúdia
Almeida Machado do curso de Psicologia da UEMG, que contou com a participação das estagiárias Carolyne
Santos Alves, Diovana Mendes Vasconcelos, Laís Soares da Silva, Maria Luiza Mamede Crespo, Paloma
Borges de Oliveira, Rayane de Freitas Martins, Vanessa Vieira Martins e Vitória Paula Silva.
Como objetivos específicos, buscou-se: 1) demonstrar o processo de preparação para arealização do
estágio em termos de conteúdo teórico; 2) apontar como se deu a apresentação de experiências prévias servidas
de inspiração e relacionadas à proposta de estágio; 3) expor de que modo ocorreu a viabilidade para a
ocorrência do estágio.

MÉTODO
Como exposto acima, o projeto contou com a participação de oito estagiárias e uma professora
supervisora. Todos os encontros para discussão e elaboração do projeto aconteceram de forma on-line, pela
plataforma Teams. As reuniões iniciaram-se em 29 de junho de 2021 e seguiram acontecendo semanalmente,
das 10h30 às 12h00, durante o primeiro e segundo semestres letivos de 2021.
A princípio, as reuniões foram destinadas ao estudo de materiais necessários para realização do estágio.
Nessa fase de preparação, foram realizadas leituras e discussões de textos referentes ao projeto piloto que
inspirou a criação do estágio Cartas Solidárias. Além disso, a professora responsável pela disciplina ministrou
aulas sobre os fundamentos da psicodinâmica do trabalho, para que fosse possível às estagiárias compreender
de que forma a psicologia sustenta esse tipo de intervenção em prol da promoção da saúde mental no trabalho.
Foram lidos e debatidos outros relatos de experiências similares ao projeto Cartas Solidárias realizadas por
diferentes instituições brasileiras, tanto de ensino, como de outros tipos, utilizando-se o mesmo propósito do
estágio. Nesse momento, foi possível observar o potencial que as cartas carregam para o reconhecimento dos
trabalhadores. Ao final dessa fasede preparação, que durou aproximadamente um mês, partiu-se para a escolha
das instituições que poderiam receber o projeto. Dentre as possibilidades, a Unidade Mista de Saúde I de
Ituiutaba-MG demonstrou interesse em firmar a parceria e reconhecer a importância da iniciativa de estágio.
No dia 03 de agosto de 2021 foi realizada a primeira reunião entre a equipe do estágio e a gestora da
unidade, que apresentou a equipe à psicóloga da unidade, que contribuiu para a viabilidade das atividades.
Esse encontro ocorreu na própria instituição: parte das estagiárias puderam participar presencialmente e a outra
parte esteve virtualmente, assim como a professora orientadora, por meio de chamada de vídeo. A pauta do
encontro foi guiada pelo esclarecimento da proposta de estágio, da contribuição que seria prestada pela equipe
e dos benefícios esperados para a instituição. Felizmente, esse processo burocrático de estabelecer parceria
institucional foi realizado com êxito, e a reunião foi encerrada com a aceitação do projeto e com o fornecimento
da relação dos nomes dos funcionários da instituição, que somavam 75 pessoas, entre agentes de saúde e
técnicos administrativos.
A segunda parte do projeto consistiu em decidir por qual meio seria feita a coleta das cartas. Foi
necessário estabelecer uma forma que possibilitasse não só a participação das estagiárias que estavam na
cidade de Ituiutaba, mas também daquelas que, em decorrência da pandemia e do ensino remoto, estavam em
outras cidades. Decidiu-se utilizar dois planos de coleta das cartas: para o recebimento de cartas físicas, duas
urnas foram disponibilizadas na própria Unidade Mista, além de papel e caneta para a escrita. Paralelamente,
a divulgação do projeto ocorreu por meio das redes sociais Whatsapp, Instagram e Facebook, criadas
especificamente para essa finalidade. Além disso, as cartas também poderiam ser recebidas virtualmente por
uma conta de correio eletrônico criada no Gmail ou, ainda, pelo formulário criado no programa Google Forms,
cujo endereço e link, respectivamente, foram disponibilizados nas publicações das redes sociais.
Iniciou-se, então, a mobilização para colocar o plano em ação. O material para confecção das urnas
foi cotado e adquirido e, rapidamente, já se dispunha de duas urnas e cartazes utilizados para decoração e
divulgação do projeto dentro da instituição. Paralelamente a esse trabalho, as redes sociais davam forma e
identidade visual ao projeto queestava prestes a ser colocado em prática. Assim, a equipe se mobilizou para a
divulgação do projeto e recebimento de cartas, sendo que as coletas presenciais na Unidade Mista de Saúde I
aconteceram, em um primeiro momento, nos meses de agosto e setembro de 2021. A equipe de estágio
considerava ser fundamental que todos os funcionários recebessem, ao menos, uma carta cada, razão pela qual
o trabalho se estendeu até o início do segundo semestre. Ao final desse período, 86 cartas haviam sido
coletadas, de modo que todos os trabalhadores pudessemser contemplados. Aquelas enviadas por meios
eletrônicos foram transcritas pelas estagiáriase, em seguida, todas as cartas foram envelopadas e depositadas
nas urnas. Neste momento, as atividades estão sendo direcionadas para definir como será realizado o
encerramento do projeto, o que deve acontecer com a entrega das cartas aos trabalhadores, prevista para a
primeira semana de dezembro, e realização de supervisões em que os estagiários possam avaliar a experiência
de estágio em termos de contribuições para sua formação acadêmica e profissional.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A coleta de cartas presencialmente demandou o planejamento de um script que envolvia a organização
do material a ser utilizado e o planejamento de como ocorreriam as abordagens visando à coleta das cartas na
Unidade Mista de Saúde I. Parte da equipe estabeleceu cronogramas e responsabilidades para
acompanhamento da coleta de cartas por meio virtual.
Nas visitas presenciais, inicialmente a coordenadora local, também psicóloga da instituição, era
buscada para ser informada sobre a chegada da equipe no local e início do recolhimento de cartas naquele dia.
Em seguida, o espaço físico cedido era organizado, quando se colocava à mostra a urna e o cartaz do projeto.
Os usuários do serviço passavam por esse espaço e olhavam curiosos, porém, não eram numerosos aqueles
que paravam para saber do que se tratava. Como alternativa a essa baixa adesão espontânea, foi decidido que
eraválido que a equipe se dirigisse até os mesmos para apresentar a ação, explicar sobre o projetoe perguntar
se havia interesse em participar, numa verdadeira busca ativa pelos escrevedores das cartas. A partir desse
convite, muitas pessoas que aceitaram participar solicitaram que as cartas fossem escritas pelas estagiárias,
enquanto as mesmas as ditavam.
Com o tempo, quando a equipe notou que vários usuários escolhiam escrever suas cartas para um
mesmo colaborador da instituição, notou-se necessário alterar a técnica de abordagem, já que o objetivo era
fazer com que todos os trabalhadores da instituição recebessem ao menos uma carta. Dessa forma, os
participantes eram convidados a escrever uma carta a um profissional já previamente selecionado pelas
estagiárias com base na lista de nomes dos colaboradores que era constantemente acompanhada pela equipe in
loco e pela equipe acompanhando o recebimento remoto, como forma de garantir que cartas fossem destinadas
para todos.
As cartas remotas, enviadas por e-mail, mensagem de texto ou formulário, foram transcritas para um
papel A4 e dispostas em envelopes padronizados acompanhados por um selo personalizado. Uma logomarca
do projeto Cartas Solidárias foi criada e utilizada nos selos, tudo pensado com o intuito de remeter à escrita de
cartas de épocas passadas, quando esse era o meio por meio do qual as pessoas costumavam se comunicar à
distância ou demonstrar afeto, dedicando tempo e capricho na sua confecção manual. Atualmente, oprojeto
encontra-se em fase de conferência e organização das cartas recebidas, e as estagiárias, ansiosas pelo
momento da entrega aos funcionários, têm elaborado estratégias para tornar o evento para a entrega das cartas
o mais especial possível.
Enquanto isso, além de planejar esse momento, as estagiárias notaram que seria importante simbolizar
o encerramento do projeto com uma produção que reunisse os relatos dessa trajetória de aprendizado e
dedicação, principalmente porque foi possível às estagiárias vivenciar - tanto como grupo, quanto como
testemunhas durante as coletas - muitos dos conceitos teóricos que sustentaram esse projeto desde sua
concepção.
Durante todo o estágio, também foi possível ao grupo de estudantes vivenciar momentos de troca
importantes e de reconhecimento do valor de cada membro da equipe, que conseguiu se organizar para atuar
de forma dinâmica e complementar, sem sobrecargas de trabalho a umas em detrimento de outras. Sobretudo,
marca essa experiência o fato de que cada estagiária soube reconhecer o papel e a importância de cada
contribuição para o andamento das atividades e o sucesso de todo o grupo. Nos momentos de coleta presenciais
e virtuais era possível sentir que cada usuário também reconhecia a importância de contribuir com o projeto e
de agradecer aos profissionais não só pelo cuidado ofertado à comunidade de forma geral, mas, sobretudo pela
resiliência que esses trabalhadores demonstraram ter, em especial, nesse momento crítico de pandemia.
Por fim, e por falar na importância do apoio aos profissionais, um momento que marcou a experiência,
e que permitiu às estagiárias vivenciar no mundo real o valor do reconhecimento do trabalho foi justamente
quando do acolhimento da equipe pela instituição. Destaca-se que a receptividade, disponibilidade, gentileza
e interesse com que a diretora e a psicóloga receberam a equipe representam muito mais do que a
disponibilização de um espaço para que o estágio fosse posto em prática. Por meio de sua atitude empática e
solidária,elas enxergaram o valor do trabalho que viria a ser desenvolvido e, ao terem acreditado no potencial
de transformação da proposta que a elas foi levada, contribuíram de forma substancial para a formação de
todas as estudantes envolvidas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento do projeto na Unidade Mista de Saúde I mostrou-se o início promissor de uma
ação que tem forte potencial de crescimento e transformação da sociedade de Ituiutaba e região. Para os
próximos trabalhos, ou quem sabe para as próximas turmas que derem seguimento ao projeto Cartas Solidárias,
sugere-se a implementação de ações que busquem desenvolver também o reconhecimento dos profissionais
para com seus próprios colegas de trabalho. Acredita-se que, dessa forma, por meio da oportunidade de troca
entre os próprios servidores, a comunicação entre pares será ampliada para além dos fazeres enrijecidos pela
atividade laboral.
Baseando-se nos referenciais teóricos que sustentaram o planejamento e execução desse estágio, pelo
fato do fortalecimento do coletivo de trabalhadores ser um dos elementos capazes de promover saúde mental
entre trabalhadores, acredita-se que essa ampliação de espectro poderá contribuir para que o sofrimento no
trabalho seja convertido em vivências de prazer, ampliando-se, assim, a qualidade de vida desses profissionais.

REFERÊNCIAS
ANDRADE, Juliana. Projeto Cartas Solidárias leva carinho e esperança durante a pandemia: UnB
leva cartas para profissionais do Samu. Ação conta com a parceria do Correio. [S. l.], 16 jun. 2020.
Disponível em:
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2020/06/16/interna_cidadesdf,864
028/projeto-cartas-solidarias-leva-carinho-e-esperanca-durante-a-pandemia.shtml. Acesso em: 8
nov. 2021.

BENDASSOLLI, Pedro Fernando. Reconhecimento no trabalho: perspectivas e questões


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DEJOURS, Christophe. A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. 6. ed. São


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10 nov. 2021.
PSICOLOGIA DO ESPORTE COMO RECURSO TERAPÊUTICO DE
TRANSFORMAÇÃO SOCIAL NAS LUTAS

Priscila Queiroz Messias1


Telma Sara Queiroz Matos2
Programa de Apoio a Projetos de Extensão da UEMG - PAEx/UEMG

RESUMO
O projeto de extensão intitulado “Psicologia do Esporte como recurso terapêutico de transformação
social nas Lutas” tem por fundamento teórico-prático a Psicologia do Esporte (PE) na perspectiva dos
projetos sociais, os quais se utilizam do esporte como principal ferramenta no processo de educação
para a cidadania. Tem-se por objetivo aproveitar o potencial educativo da prática esportiva nas lutas
para favorecer o desenvolvimento global de crianças e adolescentes, ampliando seus horizontes e
perspectivas de vida. O projeto se desenvolve por meio de encontros semanais com crianças e
adolescentes, em um centro de treinamento e formação em Artes Marciais da cidade de Ituiutaba/MG,
o qual disponibiliza espaço e recursos para o respectivo trabalho social. A metodologia adotada é
composta por processos dinâmicos de observações participantes, reuniões de planejamento e ações
práticas por meio de jogos, brincadeiras e dinâmicas. Os primeiros resultados observados, em relação
ao comportamento manifesto de crianças e adolescentes, foram: desenvolvimento de vínculos de
confiança, criação de um ambiente de segurança, maior participação/colaboração observados a partir
do aumento da atitude espontânea, da expressividade verbal e do interesse nas atividades
desenvolvidas, maior grau de interação entre os alunos e desenvolvimento de novas relações de
amizade. Mediante estes apontamentos, verifica-se que esse projeto de extensão na área da PE,
propicia melhoria das relações humanas e processos desubjetivação/inclusão por meio da atividade
esportiva.

Palavras-chave: Psicologia do esporte; projeto social; lutas.

INTRODUÇÃO
Na busca por respostas aos desafios apresentados em decorrência do progresso social, a
Psicologia oferece novas possibilidades de ação e estratégias de enfrentamento para as adversidades
do cotidiano. Ao refletir acerca do lugar e papel da psicologia, no que diz respeito aos projetos sociais
esportivos, pode-se constatar que as pesquisas atestam para presença e atuação de Psicólogos do
Esporte nos projetos sociais que utilizam o esporte como principal ferramenta no processo de
educação para a cidadania, na perspectiva de planos de uma nova sociedade. Nesse sentido, o foco
do Psicólogo do Esporte atuante em projetos sociais seria a compreensão da forma como as
variáveis psicológicas intervêm no desempenho/performance motora, e ainda buscar entender o modo
como as atividades esportivas podem influenciar e retroagir sobre o desenvolvimento psicossocial,

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade
saúde e bem- estar dos sujeitos e coletividades (SILVA, 2018).
Conforme dispõe o Conselho Federal de Psicologia em sua resolução de Nº 02/01 (2001), a
Psicologia do Esporte “estuda, identifica e compreende teorias e técnicas psicológicas que podem ser
aplicadas ao contexto do esporte e do exercício físico, tanto em nível individual, como grupal. Sua
atuação é tanto diagnóstica, quanto interventiva”. Para além da otimização do desempenho esportivo,
visa ao bem-estar psicofisiológico e ao crescimento e desenvolvimento pessoal de atletas e praticantes
de atividades físicas. Seus campos de atuação incluem: iniciação esportiva, práticas de tempo livre
e/ou lazer, alto rendimento, projetos sociais, reabilitação esportiva e clínica do esporte (VIEIRA, et
al., 2010), configurando um cenário de amplas possibilidades de prática para estes profissionais.
O acesso ao esporte, atualmente, ainda se constitui como um movimento restrito, elitizado e
pouco educativo na formação de indivíduos. Na contramão das tendências impostas pelo modo de
produção capitalista, a Constituição Federal Brasileira de 1988 estabeleceu o reconhecimento e a
garantia à diversos direitos sociais, dentre eles ao esporte, atestando a atividade física como campo
de relevância para a educação cidadã e transformação social. Deste modo, na atualidade, o olhar do
psicólogo está cada vez mais voltado para as políticas públicas, para o compromisso com a maioria
da população e suas urgências, para a ética e seus desafios na sociedade moderna e sobretudo para os
Direitos Humanos (RUBIO e CAMILO, 2019). Sob uma visão multidimensional e
interdisciplinar, a Psicologia Social do Esporte, termo cunhado e fundamentado a partir da produção
teórico-científico de Kátia Rubio, aborda o esporte enquanto fenômeno social, canalde socialização
positiva e inclusão, efetivo no desenvolvimento de potencialidades e habilidades, na minimização do
impacto de fatores de risco vinculados às situações de vulnerabilidade social e na promoção de ações
educativas e de saúde (RUBIO e CAMILO, 2019). O esporte, sob a perspectiva social, deve superar
a representação de veículo para a ascensão social e formação de futuros atletas, deve ir além da
formação técnica e tática e privilegiar o fomento de valores como a cooperação, a participação, a
solidariedade e a criatividade (SILVA, 2007).
Em conformidade com Neto, Dantas e Maia (2015), são benefícios dos projetos sociais
esportivos, no contexto da infância e adolescência: inclusão social e socialização, estímulo ao
sentimento de pertencimento grupal, constituição de laços de amizade, estabelecimento de objetivos
comuns, responsabilização, apoio e cooperação, melhorias da autoestima, autoconfiança,
independência e autonomia, melhorias do desempenho psicomotor geral, reflexos positivos de
mudanças nos ambientes familiar, escolar, e até mesmo na comunidade em que vivem. Nesse sentido,
o projeto de extensão intitulado “Psicologia do Esporte como recurso terapêutico de transformação
social nas Lutas” tem por fundamento teórico-prático a Psicologia do Esporte (PE) na perspectiva dos
projetos sociais, os quais se utilizam do esporte como principal ferramenta no processo de educação
para a cidadania. Assim, tem-se por objetivo utilizar o potencial educativo da prática esportiva nas
lutas para favorecer o desenvolvimento global de crianças e adolescentes, ampliando seus horizontes
e perspectivas de vida.

OBJETIVO
Frente a esses pressupostos, este trabalho possui o objetivo de descrever as atividades
desenvolvidas com crianças e adolescentes no contexto de realização do projeto de extensão intitulado
“Psicologia do Esporte como recurso terapêutico de transformação social nas Lutas”. Como objetivo
geral, esse trabalho busca desvelar sobre o uso do potencial educativo do esporte, entendido enquanto
instrumento de socialização, de educação e de saúde, para favorecer o desenvolvimento cognitivo,
afetivo e comportamental de crianças e adolescentes praticantes de lutas, ampliando seus horizontes
e perspectivas de vida. O foco aqui não constitui o desenvolvimento de performance esportiva ou alto
rendimento, mas utilizar o esporte como recurso para a transformação social, em que vários
constructos são abordados e contextualizados no sentido de ampliar as aprendizagens adquiridas com
as lutas para a vida cotidiana.
Nesse sentido, os seguintes objetivos específicos foram traçados: 1) aproximar o fazer da
Psicologia do Esporte para a comunidade, 2) contribuir para novas reflexões acerca do esporte e
educação, 3) integrar teoria e prática por meio da inserção da discente extensionista no campo de
execução da Psicologia Social do Esporte, 4) proporcionar um espaço de formação e de exercício
prático na interseção entre Psicologia do Esporte e Projetos Sociais, oferecer espaços de escuta e
acolhimento às demandas institucionais relativas às atividades esportivas, assim como às
necessidades de pais e àquelas relativas às próprias crianças e adolescentes e 6) promover a
interdisciplinaridade e multiprofissionalidade na concretização das intervenções, contemplando a
saúde, educação, desenvolvimento humano, artes marciais e exercício físico.

MÉTODO
Trata-se de um relato das experiências vivenciadas pela discente do curso de Psicologia da
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Unidade Ituiutaba, enquanto bolsista de extensão
do projeto “Psicologia do Esporte como recurso terapêutico de transformação social nas Lutas”,
financiado pelo Programa de Apoio a Projetos de Extensão da UEMG - PAEx/UEMG. O projeto de
extensão se desenvolve em um centro de treinamento e formação em Artes Marciais da cidade de
Ituiutaba/MG, o qual disponibiliza espaço e recursos para o respectivo trabalho social. Os encontros
e atividades grupais com as crianças e adolescentes foram organizados e facilitados pela aluna bolsista
e acontecem semanalmente. As atividades são supervisionadas pela coordenação do projeto
(Professora do Curso de Psicologia da UEMG/Ituiutaba). Este projeto resulta da integração de ações
entre a Universidade do Estado de Minas Gerais, Unidade Ituiutaba, e a instituição supracitada. O
projeto iniciou-se em maio de 2021, e seu término está previsto para dezembro de 2021. Têm-se, até
o momento, sete meses de intervenção. A carga horária destinada a todas as atividades em média é
de 20hrs semanais.
As atividades da extensionista incluem: Realização de observações sistemáticas participantes,
levantamento contínuo das demandas e necessidades, participação em supervisão para discussão das
situações-problema e planejamento de intervenções. Dentre os procedimentos adotados, encontram-
se: 1) Reuniões para fins organizacionais, 2) realização de observações das aulas e treinamento de
Karatê com simultânea identificação e análise de demandas, 3) reuniões com a equipe técnica da
instituição para esclarecimentos quanto aos objetivos, propósitos e pressupostos da extensão, 4)
espaços de trocas formais e informais com membros da equipe, com posterior delineamento de
intervenções coerentes com a realidade observada. As atividades desenvolvidas contemplam o
planejamento de ações com respaldo em evidências científicas e intervenções já consolidadas na
área de Psicologia do
Esporte e projetos sociais. O planejamento das ações de intervenção levou em consideração o
contexto de ensino-aprendizagem das artes marciais, as especificidades do público-alvo e os objetivos
terapêuticos-pedagógicos que se pretendiam alcançar.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Academia onde se concretizaram as ações de extensão até o momento, apesar de ser da
iniciativa privada, se mostrou como um ambiente que buscou acolher as diversidades. Os praticantes
das modalidades de lutas, são oriundos de diferentes camadas sociais, gêneros, etnias e idades. É
válido ressaltar que as práticas dos esportes são realizadas coletivamente. Na mesma turma
encontram-se crianças, adolescentes, adultos, de todos os gêneros. Diferentemente de outros espaços
de treinamento com o foco no alto rendimento, a instituição em questão se volta à inserção, iniciação
e formação de sujeitos no universo das artes marciais. Para o conhecimento e incorporação real de
vários preceitos impregnados nas modalidades de luta oferecidas – Karatê e Muay Thai, a instituição
e seus agentes (instrutores) se ocupam, além da preparação física e técnica, das condutas, da filosofia,
da ética, história e cultura das artes marciais, aspectos que condizem com o desenvolvimento do
indivíduo como ser humano.
No que diz respeito ao Karatê, é notório um direcionamento da instituição para a formação e
desenvolvimento do “caráter” das crianças e adolescentes que dela fazem parte, em uma tentativa de
preservar e manter as tradições dessa luta milenar. Essas nuances contextuais foram percebidas como
potencializadoras das possibilidades de ação da Psicologia aplicada à essa modalidade esportiva.
Coerentemente, o esporte apontado neste projeto de extensão vem de uma abordagem social,
educativa e de participação. Deste modo, aintencionalidade pedagógica institucional, com ênfase nos
ensinamentos e doutrinas do Karatê, possibilitou que as intervenções da psicologia esportiva fossem
facilmente absorvidas, em uma relação de complementariedade.
Atendendo às dificuldades atencionais/motivacionais e psicomotoras no contexto de ensino e
aprendizagem de crianças e adolescentes para as artes marciais, as estratégias e intervenções de
caráter lúdico realizadas até o momento (brincadeiras, dinâmicas e jogos), buscaram contemplar os
objetivos centrais de: promover a abertura, exercitar a reflexão, a atenção e concentração, estimular
a escuta do outro, fomentar o sentimento de pertença e coesão grupal, estimular relações de
cumplicidade e atitudes de respeito, sociabilidade, solidariedade e ajuda mútuas.
Jogos e dinâmicas de grupo foram metodologicamente adotados por oferecerem contexto fértil
para a vivência de situações, emoções e experimentações múltiplas, por permitirem a participação
coletiva, criarem maior senso de responsabilidade grupal e promoverem o engajamento, participação
e, por consequência, o aumento da motivação para as atividades propostas (DO VALLE, 2008). Em
relação à aplicação das atividades, concebidas dentro de um programa de ações com intervenções da
Psicologia do Esporte, estas se deram a partir de cinco movimentos principais: interação inicial e
estabelecimento de vínculos, fornecimento de instruções e orientações a respeito das atividades
planejadas, prática propriamente dita (geralmente composta por uma dinâmicas de aquecimento e
outra central), discussões, com levantamento de sentimentos, emoções, vivências e troca de ideias,
bem como a proposição de associações, estimulando a conexão com a realidade do contexto esportivo
em questão e com a vida cotidiana e, por fim, o momento de fechamento, em que são elaboradas
sínteses das principais ideias e aprendizados do grupo. Para isso, o trabalho interdisciplinar foi
fundamental. O trabalho foi feito em conjunto com o instrutor que, a todo momento, fora receptivo e
proporcionou o suporte necessário. As informações sobre o comportamento e performance dos
karatecas trazidas pelo professor eram acolhidas e respeitadas. Este, ao observar demandas e desafios
do cotidiano da prática da arte marcial, que entendia poderem ser mais bem trabalhados pela
Psicologia do Esporte, comunicava à docente suas percepções e ideias, permitindo maior
aprofundamento e reflexão sobre o contexto.
A partir da interlocução com a Psicologia do Esporte e por meio de brincadeiras e dinâmicas
que evidenciaram o caráter socioeducativo do esporte e que estimularam a expressão e a reflexão,
diversas foram as temáticas abordadas, como: trabalho em equipe, autoestima, autoconfiança,
motivação, disciplina, responsabilidade, emoções, sonhos, concentração, autoconhecimento, respeito,
estresse, dentre outros temas adequados aos objetivos sociais e educacionais que permearam as
atividades trabalhadas. Também foram abordados temas como: o que motivou a estarem praticando
karatê, aspectos que gostavam e que não gostavam durante os treinamentos, manejo da frustração
pela perda, os objetivos com a prática do karatê, estabelecimento de metas, saúde mental e física,
dentre outros.
Um dos aspectos mais enfatizado pelos alunos nos últimos encontros foi a integração da
equipe, já que foi possível perceber inicialmente a formação de subgrupos, o que contribuía com a
pouca comunicação entre eles. Ademais, como forma de manter e fomentar as tradições orientais da
modalidade, ao mesmo tempo em que se mobilizavam aspectos da Psicologia do Esporte, o Ninjukun,
que constitui os vinte princípios/ensinamentos básicos e código de ética dentro do Karatê, postulado
e implementado por Funakoshi (NAKASONE, 2005), foi agregado às intervenções. Essa integração
de disciplinas foi facilitada pois, como pode-se observar, na própria construção, formação e
fundamentação introdutória da arte marcial, encontram-se, de forma evidente, aspectos psicológicos
e comportamentais para serem trabalhados de forma integrada com as práticas físicas, tornando o
karatê um esporte propício para se implementar a Psicologia do Esporte. Cabe destacar que os
recursos didáticosadotados em cada encontro foram selecionados segundo o critério da adequação ao
conteúdo aser trabalhado naquele dia. A partir da inserção da Psicologia do Esporte no contexto de
ensino e aprendizagem do Karatê, os primeiros resultados observados, em relação ao comportamento
manifesto de crianças e adolescentes, foram: desenvolvimento de vínculos de confiança, criação de
um ambiente de segurança, maior participação/colaboração observadosa partir do aumento da atitude
espontânea, da expressividade verbal e do interesse nas atividades desenvolvidas, maior grau de
interação entre os alunos e desenvolvimento de novas relações de amizade.
A proximidade afetiva estabelecida com o grupo viabilizou o desenvolvimento de atividades
contextualizadas e personalizadas, que contemplassem as preferências, desejos e vontades dos
participantes. Além disso, o caráter lúdico dos encontros fez com que os participantes se mantivessem
motivados, focados em seus objetivos e motivações pessoais para estarem ali, assim como
constantemente pensando sobre suas capacidades, potencialidades, limites e dificuldades. Respostas
coletadas reafirmaram essas inferências. No intuito de apurar as percepções das crianças e
adolescentes no que diz respeito às atividades de extensão desenvolvidas, as 26 crianças presentes no
respectivo dia foram questionadas e orientadas a registrarem suas repostas em folha de papel sulfite.
A pergunta norteadora foi: O que vocês aprenderam com as atividades realizadas até este momento?
(e algumas outras variações explicativas, mas conservando o sentido e intencionalidade daprimeira).
Algumas das respostas encontradas foram: “paciência, respeito aos colegas”, “parceria”, “aprendo a
perder e ganhar”, “aprendo a trabalhar em equipe, diálogo, respeito”, “respeito e fazer amigos”, “a
socializar”, “a enturmar mais com o pessoal, e etc.”, “brincadeiras em equipe, enturmar”, “fazer
amigos”, “trabalhar em equipe”, “trabalho em equipe, perseverança, comunicação, agilidade,
amizade”, entre outras. Partindo destes dados, pode-se considerar que o contexto no qual acontecem
as atividades propicia a aproximação das relações de amizade e a socialização.
Ciente da importância do papel dos pais no incentivo à iniciação esportiva e para a manutenção
dessa, as trocas e diálogos também foram constantes com os familiares, que permaneciam na
instituição durante o período em que as crianças/adolescentes sob sua responsabilidade, participavam
dos treinos e das atividades de extensão. A partir da comunicação estabelecida com os familiares foi
possível conhecer previamente a realidade das crianças envolvidas com as ações de extensão, suas
dificuldades e desafios, identificar motivações, preconceitos e expectativas dos familiares em relação
à prática esportiva, assim como alinhar perspectivas e entendimentos em relação à como o esporte é
concebido nas práticas de extensão, permitindo a construção de estratégias adequadas e,
consequentemente, uma maior adesão tanto da família quanto da criança/adolescente. Assim, pode-
se afirmar que a escuta dos familiares enriqueceu o trabalho desenvolvido.
Além de ampliar a compreensão do comportamento das crianças/adolescentes, o contato
frequente com os familiares teve por objetivo: acolher as demandas, prestar suporte informativo,
esclarecer, fornecer orientações, promover aproximação e participação dos mesmos na vida esportiva
dos filhos, influenciando positivamente a experiência esportiva das crianças/adolescentes.
Durante o percurso de desenvolvimento do projeto, algumas dificuldades foram sentidas,
sendo elas: heterogeneidade de faixa etária - visto que em uma mesma turma congregava desde
crianças de 5/6 anos até adolescentes de 15/17 anos. A diversidade etária dificultou a programação
de ações que conseguissem levar em conta, simultaneamente, as particularidades relativas à todas as
etapas desenvolvimentais e seus processos cognitivos e comportamentais próprios. Outro desafio
encontrado foi a realização solo das atividades de extensão, uma vez que é unanimidade o fato de que
o trabalho discursivo, projetado e exercido em equipe fornece inúmeras vantagens em relação ao
individual, tanto para o desenvolvimento e aprendizagem de habilidades e competências por parte
de seus membros quanto para a qualidade do trabalho construído. No entanto, apesar das adversidades
percebidas, a oportunidade de exercer e realizar esse trabalho, exercitou aspectos essenciais e
igualmente necessários ao crescimento pessoal e acadêmico da extensionista, não possíveis caso as
circunstâncias fossem outras.
No que concerne à formação acadêmica e partindo do pressuposto de que a extensão é prática
essencial para a formação, caracterizada pela realização de atividades que estimulam o
desenvolvimento e aprimoramento de competências e habilidades necessárias para atuação
profissional, o projeto contribuiu para a qualidade da formação da estudante bolsista.
A participação em um projeto de extensão na perspectiva social tem permitido a construção
ativa de processos, autonomia prática, inserção em realidades antes desconhecidas, impacto positivo
no microambiente social onde as atividades se concretizam, aplicação de conhecimentos adquiridos
durante a jornada acadêmica, atendendo, ao mesmo tempo, a interesses e demandas da comunidade.
Foi possível o contato com profissionais de outras áreas do conhecimento, construção e
ampliação do networking, aprendizagem de habilidades comportamentais (espontaneidade,
improvisação, resolução de problemas, assertividade, criatividade e inventividade, por exemplo) e
competências técnicas e teóricas específicas do campo da prática profissional da Psicologia do
Esporte. Além da enriquecedora experiência prática, o projeto de extensão viabilizou o
enriquecimento do currículo acadêmico e a participação/apresentação em eventos científicos.

Figura 1 – Participantes do Projeto de Extensão Figura 2 – Participantes do Projeto de Extensão

Fonte: Acervo pessoal.


CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste Projeto de Extensão é utilizar o potencial educativo do esporte para favorecer
o desenvolvimento global de crianças e adolescentes praticantes de lutas, ampliando seus horizontes
e perspectivas de vida, e isso tem acontecido de forma genuína e legítima. As estratégias utilizadas
foram verificadas como eficientes neste contexto. Deste modo, compreende-se que a atuação da
psicologia do esporte não se confunde com a prática da psicologia clínica, tendo um arcabouço teórico
próprio que reúne temas específicos do mundo do esporte para basear sua intervenção.
Vale ressaltar a necessidade de se considerar as particularidades da modalidade, da instituição
e dos participantes para que se analise qual estratégia deverá ser adotada naquela situação, já que
inexiste uma “receita pronta” ou protocolo de como se atuar. Pode-se constatar, também, que é
esperado e até mesmo imprescindível, que o psicólogo atuante no contexto esportivo seja capaz de
identificar e compreender fenômenos próprios do universo do esporte que estão para além dos
conhecimentos aprendidos específicos da ciência psicológica, ou seja, é preciso um diálogo constante
com outras disciplinas e atores, uma vez que o trabalho se torna mais eficiente quando é planejado e
executado de forma interdisciplinar.
Logo, diante dos resultados inferidos e observados, considera-se que os objetivos iniciais
foram atingidos e que houveram mudanças positivas na dinâmica comportamental, pessoal e
emocional dos karatecas, algo reconhecido pelos próprios e por seus familiares, por meio dos
feedbacks dados à estudante de psicologia.
Mediante estes apontamentos, verifica-se que esse projeto de extensão na área da PE, propicia
melhorias nas relações humanas e processos de subjetivação por meio da atividade esportiva. Além
disso, viabiliza à extensionista experiências que promovem uma formação pessoal e profissional
técnica e eticamente qualificada, além da oportunidade de poder contribuir com a construção de
conhecimento nessa área de atuação.

REFERÊNCIAS
DO VALLE, Márcia Pilla. Dinâmica de grupo aplicada à psicologia do esporte. Casa do
psicólogo, 2008.

NETO, Ewerton Dantas Cortes; DANTAS, Maihana Maira Cruz; MAIA, Eulália Maria Chaves.
Benefícios dos projetos sociais esportivos em crianças e adolescentes. Saúde & Transformação
Social/Health & Social Change, v. 6, n. 3, p. 109-117, 2015.
NAKASONE, G. Os vinte princípios fundamentais do Karatê: o legado espiritual do mestre.
Tradução: Henrique A. Rêgo Monteiro. São Paulo, Editora Cultrix, 2005. RUBIO, Katia;
CAMILO, JA de O. Por quê uma Psicologia Social do Esporte. Psicologia Social do Esporte. São
Paulo: Képos, p. 9-18, 2019.

SILVA, Fábio Silvestre da. Proyectos sociales sobre discusion en la psicologia del esporte.
Revista brasileira de psicologia do esporte, v. 1, n. 1, p. 01-12, 2007. SILVA, F. S. Projetos
Sociais na Psicologia do Esporte: possibilidades e desafios na atuação profissional. Revista
Diálogos, Brasília, n 9, 16-20, Dezembro, 2018.

VIEIRA, Lenamar Fiorese et al. Psicologia do esporte: uma área emergente da psicologia.
Psicologia em estudo, v. 15, p. 391-399, 2010.
UEMG COMO UMA UNIVERSIDADE PROMOTORA DE SAÚDE

Eduarda Katyene Oliveira Santos1


Ana Carolina do Nascimento e Azevedo Ferreira2
Carlos Rodrigo Muniz Franco3
Marcela Martins Vilela4
Poliana Silva da Cruz5
Ana Cláudia Almeida Machado 6

RESUMO
Trata-se de um relato de experiência de estágio supervisionado em psicologia, desenvolvido sob a
ênfase de processos psicossociais, durante os dois semestres letivos do ano 2021. O trabalho apresenta
o modo como a preparação para a parte prática do estágio foi conduzida, por meio de supervisões
semanais realizadas entre a professora e os estagiários. A fase de campo propriamente dita refere-se
à realização de levantamento junto aos estudantes de diferentes cursos da universidade para identificar
possíveis impactos que a pandemia da Covid-19 trouxe para seu bem-estar psicológico e
acompanhamento das aulas on-line. O intuito do levantamento foi coletar informações que permitam
a oferta de ações na modalidade on-line para os estudantes que contemple suas reais necessidades, e
que serelacionem à prevenção e promoção da saúde mental. Outra finalidade do estágio foi realizar
os procedimentos que marcarão o ingresso da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) na
Rede Brasileira de Universidades Promotoras da Saúde – ReBraUPS, cujos passos pretéritos e futuros
igualmente encontram-se demonstrados no texto. A experiência de estágio foi importante para nossa
formação profissional no que se refere ao planejamento de projetos de gestão em saúde.
Adicionalmente podem ser mencionados como aspectos positivos: o reconhecimento sobre a
importância do trabalho em rede para uma efetiva promoção da saúde que atenda às demandas sociais;
a segurança e experiência adquiridas em prol de competências necessárias para o desenvolvimento e
planejamento de projetos dessa natureza; as trocas intelectuais e afetivas ocorridas no coletivo de
trabalho desse estágio; e a perenidade dos benefícios que o ingresso da UEMG na ReBraUPS supõe
proporcionar.

Palavras-chave: Promoção de saúde, saúde mental, Rede Brasileira de Universidades Promotoras da


Saúde.

INTRODUÇÃO
A promoção da saúde busca melhorar a qualidade de vida da população e seu objetivo é
promover uma gestão compartilhada entre usuários, trabalhadores do setor sanitário, trabalhadores

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
5
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
6
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
de outros setores e movimentos sociais (INCA, 2021). Para a criação e realização de ações de
promoção da saúde, é preciso considerar os determinantes sociais de saúde e como eles impactam a
qualidade de vida da população. Por determinantes sociais de saúde entendem-se os fatores sociais,
econômicos, culturais, étnico-raciais, psicológicos, comportamentais e ambientais que influenciam o
processo saúde-doença (INCA, 2021).
A Carta de Ottawa foi um marco importantíssimo para alavancar discussões em torno da pauta
da promoção da saúde. Elaborado em 1986, o documento reafirmou a importância do processo de
promoção à saúde para as populações por meio da defesa do quanto os determinantes sociais
influenciam a saúde da população (ALMEIDA et. al. 2006). A Carta de Ottawa tornou possível o
desenvolvimento de diferentes ações que tornaram viáveis as iniciativas voltadas à promoção da
saúde.
As Universidades Promotoras de Saúde (UPS) são Instituições de Ensino Superior (IES) que
possuem como cultura organizacional a orientação para a promoção de saúde. Criada em 2003, teve
a missão original de impulsionar as ações estabelecidas na Carta de Ottawa (HARTMANN et. al.
2019). As políticas universitárias das UPS buscavam o desenvolvimento de uma cultura
compartilhada baseada no tripé universidade-sociedade-comunidade, nos determinantes sociais e no
desenvolvimento sustentável. Pretendia-se realizar atividades de promoção de saúde nessas IES por
meio da participação dos discentes e demais membros da comunidade acadêmica.
Além das UPS, desde a Carta de Ottawa, diversas redes e movimentos foram criados para que
inciativas em torno da promoção de saúde fossem passíveis de desenvolvimento no contexto
educacional. Em 1996, foram criadas as Escolas Promotoras de Saúde, as quais serviram de inspiração
para o estabelecimento dos objetivos das UPS, sete anos após. Em que pese a existência das UPS,
percebeu-se a necessidade de que os trabalhos realizados em cada IES fossem compartilhados, de
forma a atingir um contingente maior de beneficiados.
Em 2007, consolidou-se a Rede Ibero-Americana de Universidades Promotoras de Saúde
(RIUPS), marco importante para o fortalecimento de promoção de saúde no âmbito acadêmico.
Como o Brasil é um país de dimensões continentais e conta com a presença deIES em todo seu
território, dadas as singularidades presentes na cultura nacional, também havia espaço para o
estabelecimento de outra rede, formada por IES brasileiras, sem descartar a possibilidade de seguir
com as trocas entre essas e as demais universidades da Iberoamérica que participam na RIUPS.
Assim, em 2018 oficializou-se a criação da Rede Brasileira de Universidades Promotoras de Saúde
(ReBraUPS), que contou com a iniciativa de diversas IES brasileiras, em evento realizado na
Universidade de Brasília, que é uma das instituições pioneiras nessa iniciativa (HARTMANN et. al.
2019).
Por meio do conhecimento teórico e prático gerado sobre temáticas ligadas à promoção de
saúde, sobretudo, considerando as vicissitudes do cenário imposto pela pandemia do novo
coronavírus (Covid-19), intensificou-se a necessidade de se utilizar conjuntamente com os
conhecimentos, aprendizados e técnicas nas universidades que fazem parte da ReBraUPS.
Promover a saúde é um compromisso comumente compartilhado por cursos da área da saúde,
independentemente de serem ou não parte de redes nacionais criadas com essa finalidade em
específico. Assim, a psicologia, pelo fato de ser uma ciência que abrange diversas áreas do
conhecimento, muitas das quais voltadas à promoção da saúde em diferentescontextos (sem contar
com a abrangência da psicologia da saúde per se), pode não apenas beneficiar-se da participação em
redes dessa natureza, mas também contribuir, por meio da disseminação de conhecimentos úteis em
diferentes contextos, para uma maior promoção do bem-estar psicológico da sociedade atendida pelas
ações dos membros participantes da rede. O estágio profissional a que faz menção este trabalho foi
denominado UEMG na ReBraUPS. Sua principal ação foi realizar um levantamento junto aos
estudantes da UEMG – Unidade Ituiutaba sobre a experiência de migração do ensino presencial ao
ensino remoto por imposição das medidas sanitárias ocasionadas pela pandemia da Covid – 19.
Os objetivos do referido levantamento (que não são os mesmos objetivos deste trabalho)
foram: (a) conhecer os impactos que a pandemia da Covid-19 trouxe aos estudantes matriculados em
diversos cursos da UEMG – Unidade Ituiutaba; (b) investigar se a necessidade de migração do
ambiente de ensino presencial para o remoto ocasionou impactos sobre sua saúde mental; e (c)
levantar que tipo de ações voltadas à prevenção e promoção em saúde mental têm potencial de
contribuir para seu bem-estar psicológico. Além desses, compõem os objetivos do estágio: (a)
acompanhar o ingresso da UEMG na Rede Brasileira de Universidades promotoras da Saúde –
ReBraUPS; e (b) capacitar os estagiários em temasligados à área de gestão de projetos.

OBJETIVOS
Geral
Apresentar um relato de experiência de estágio, que inclui a forma como foi apresentada a
proposta de estágio UEMG na ReBraUPS.
Específicos
Informar como se deu a preparação inicial dos estudantes no estágio, por meio das seguintes
etapas: (a) disseminação de informações sobre o modo de funcionamento da ReBraUPS; e (b)
capacitação teórica dos estudantes sobre temáticas relacionadas às áreas de gestão de projetos,
psicologia da saúde, e funcionamento de redes voltadas à promoção da saúde;
Apresentar os resultados parciais de levantamento conduzido pelos estagiários com o objetivo
de conhecer se a pandemia trouxe impacto para os estudantes da UEMG – Unidade Ituiutaba em
termos de sua saúde mental; e
Apresentar o processo de ingresso da UEMG na ReBraUPS.

MÉTODO
Todas as ações desenvolvidas no âmbito do estágio têm a dupla intenção de capacitar os
estudantes na área de planejamento/gestão de projetos voltados à promoção da saúde, de modo que o
segundo objetivo possa ser alcançado, que é justamente tornar possível o ingresso da UEMG na
ReBraUPS. Para que isso ocorra, a professora responsável pelo estágio vem acompanhando
informalmente as reuniões ocorridas no âmbito da ReBraUPS, assim como as redes sociais onde
constantemente ocorrem trocas entre os participantes representantes de cada universidade que
compõem a rede. Há previsão de que a entrada da UEMG na Rede de Universidades Promotoras de
Saúde seja oficializada no próximo Encontro Nacional da rede, previsto para ocorrer ainda em 2021.
Em termos da formação, primeiramente, foi necessário discutir informações sobre a própria
ReBraUPS, o que foi feito por meio de exibição de vídeos sobre os primeiros encontros da Rede,
leitura de textos acerca do assunto e discussões sobre seu funcionamento. Em seguida, passou-se à
decisão sobre o público da comunidade universitária que seria priorizado nas ações do estágio, que
poderia ser discentes, docentes ou técnicos administrativos.
Em que pese os demais grupos da comunidade acadêmica (docentes e técnicos) não terem sido
contemplados pelas tarefas relacionadas a esse estágio especificamente, faz-se importante ressaltar
que as ações que nasceram sob essa iniciativa inspiraram a elaboração de outras propostas similares,
também sob os auspícios do curso de psicologia. Tais iniciativas, que incluem uma disciplina de
pesquisa e um projeto de extensão, vêm sendo desenvolvidas de forma paralela, porém
concomitantemente ao estágio em tela.
Essa iniciativa pioneira de estágio, marcada pela participação dos estudantes Ana Carolina do
Nascimento e Azevedo Ferreira, Carlos Rodrigo Muniz Franco, Eduarda Katyene Oliveira Santos,
Marcela Martins Vilela e Poliana Silva da Cruz torna-se, assim, um marco importante para que a
UEMG ingresse em uma rede em que se privilegie a troca de conhecimentos, ampliando, assim, o
universo e força de sua atuação, visando ao desenvolvimento de projetos que promovam saúde para
um espectro cada vez maior de beneficiários.
O levantamento que vem sendo realizado no âmbito do estágio junto aos estudantes da
universidade é de cunho exploratório, baseado em um modelo de pesquisa que busca maior
familiaridade com o problema, afim de deixá-lo mais evidente ou de auxiliar na construção de
hipóteses (GIL, 1991). Ainda de acordo com GIL (2002, p. 41), essas pesquisas envolvem
levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o
problema pesquisado e análise de exemplos que estimulem a compreensão.
Trata-se de uma pesquisa de natureza mista, uma vez que ora será feito uso da abordagem
qualitativa, ora quantitativa. A opção por essa mescla justifica-se pelo fato de que informações
coletadas por ambos os métodos são complementares e permitem um maior conhecimento acerca do
objeto de investigação. Em um primeiro momento, na etapa de levantamento de dados, se está
buscando conhecer um panorama que fale pelo todo, o coletivo discente da instituição, de modo a
representar um retrato real de toda a população pesquisada (GERHARDT; SILVEIRA, 2009), mesmo
que não seja possível coletar as respostas de todos os alunos da unidade, poderemos utilizar as
respostas que obtivemos para pensar nas melhores ações para a universidade como um todo. Em
seguida, passar-se-á a uma abordagem qualitativa, por meio da realização de entrevistas individuais
com tópicos que saltaram aos olhos do grupo de estagiários quando do levantamento quantitativo.
A pesquisa quantitativa vem sendo desenvolvida no momento atual, sendo assim, os dados
aqui apresentados são parciais. Para essa etapa, foi disponibilizado um questionário eletrônico
hospedado na Plataforma Google Forms, cuja divulgação ocorreu por meio das redes sociais dos
discentes da UEMG, além de compartilhamento por meio de aplicativos de mensagens on-line
administrados pelos representantes dos centros acadêmicos de diversos cursos da unidade, e
divulgação por parte dos próprios docentes de psicologia.
A pesquisa qualitativa será realizada após análise dos resultados do levantamento realizado
por meio da aplicação do questionário, com o objetivo de esclarecer os principais pontos apontados
pela pesquisa quantitativa. Pretende-se, para tal, utilizar de convites à participação pelos mesmos
meios utilizados anteriormente. Um roteiro de entrevistas semiestruturado será desenvolvido para fins
de levantar detalhes sobre aqueles pontos críticos desvelados pelo questionário.
Dentre os objetivos da pesquisa qualitativa, destacam-se:

Objetivação do fenômeno; hierarquização das ações de descrever, compreender,


explicar, precisão das relações entre o global e o local em determinado fenômeno;
observância das diferenças entre o mundo social e o mundo natural; respeito ao
caráter interativo entre os objetivos buscados pelos investigadores, suas orientações
teóricas e seus dados empíricos; busca de resultados os mais fidedignos possíveis;
oposição aopressuposto que defende um modelo único de pesquisa para todas as
ciências (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, 32).

Para fins da experiência que será desenvolvida nesse estágio, será utilizada a técnica bola de
neve, cujo objetivo é

A execução da amostragem em bola de neve se constrói da seguinte maneira: para o


pontapé inicial, lança-se mão de documentos e/ou informantes-chaves, nomeados
como sementes, a fim de localizar algumas pessoas com o perfil necessário para a
pesquisa, dentro da população geral. Isso acontece porque uma amostra
probabilística inicial é impossível ou impraticável, e assim as sementes ajudam o
pesquisador a iniciar seus contatos e a tatear o grupo a ser pesquisado. Em seguida,
solicita-se que as pessoas indicadas pelas sementes indiquem novos contatos com as
características desejadas, a partir de sua própria rede pessoal, e assim sucessivamente
e, dessa forma, o quadro de amostragem pode crescer a cada entrevista, caso seja
do interesse do pesquisador (VINUTO, 2014, 203).

Acredita-se que a utilização de metodologia mista é um dos pontos de destaque dessa


participação no estágio, uma vez que, juntas, ambas as abordagens propiciarão melhores tomadas de
decisão por parte dos estagiários em relação à priorização de ações que virão a ser desenvolvidas
futuramente.
Conforme anteriormente exposto, os resultados a serem apresentados referem-se a dados
parciais coletados por meio do questionário eletrônico. O questionário foi composto por 16 questões
que investigaram aspectos sociodemográficos, presença de estresse e sobrecarga de trabalho devido
à pandemia, satisfação com o suporte recebido para cumprir com as exigências do ensino remoto,
possíveis dificuldades encontradas para acompanhamento das aulas fora da universidade, e hábitos
de vida durante o isolamento social. Além destas, foram inseridas perguntas para que os estudantes
manifestassem ou não seu interesse em participar de 15 tipos de ações em grupo destinadas à
prevenção e/ou promoção da saúde mental.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Até o momento foram obtidas, 52 respostas. O formulário
respeitou a confidencialidade dos participantes, uma vez que não solicitou identificação dos
respondentes. Em relação às principais características sociodemográficas, a maior parte dos
respondentes possui entre 18 e 23 anos de idade, representando 47,1% das respostas. Quanto ao
gênero, 65,4% assinalaram feminino, 5,8% masculino e 28,8% optaram por não informar. Sobre os
cursos nos quais estão matriculados, a maioria cursa psicologia (65,4%), seguida dedireito (30,8%)
e ciências biológicas (3,8%). Até o momento do fechamento do resultado parcial, não houve
respostas de estudantes de outros cursos. Por se tratar de resultadosparciais, espera-se que em
um futuro próximo os demais grupos de estudantes participem desse levantamento.
Sobre o período do curso em que os estudantes se encontram atualmente, 30,8% estão
cursando o primeiro período, 28,8% o oitavo período, 13,5% o quarto período, 11,6% o sexto período,
7,7% o segundo período, 3,8% estão acima do décimo período (essa opção foi inserida, pois, com a
pandemia, algumas turmas se atrasaram para formar), 1,9% cursam o sétimo período e 1,9% dos
estudantes que responderam estão no nono período.
Quando perguntados se os mesmos se sentiram estressados desde o início da pandemia,
84,6% responderam que se sentiram estressados muitas vezes, 11,6% sentiram-se estressados
algumas vezes e 3,8% responderam que poucas vezes se sentiram estressados. Em relação à
sobrecarga com tarefas da universidade desde que a pandemia começou, 71,2% dos alunos
responderam que muitas vezes se sentiram sobrecarregados, 25% responderam que algumas vezes
sentiram a sobrecarga e 3,8% responderam que poucas vezes se sentiram sobrecarregados.
Em relação ao suporte oferecido pela UEMG para garantir condições satisfatórias de ensino
no período pandêmico quando necessitaram de informações, 46,2% o avaliou como razoável, 25%
como ruim, 13,5% como bom, 11,5% como péssimo e 3,8% responderam queo suporte foi ótimo.
Em relação ao suporte com relação a informações por parte da UEMG, 48,1% classificaram como
razoável, 30,8% como ruim, 15,4% como bom, 3,8% como ótimo e 1,9% como péssimo.
Sobre o suporte oferecido pelos professores para a realização das atividades nesse
momento de ensino remoto, incluindo quantidade de tarefas, qualidade dos materiais, empatiaem
relação as dificuldades ocasionadas pela pandemia, dentre outros, as alternativas “bom” e “razoável”
obtiveram a maior parte das respostas, representando 32,7% cada, 23,1% dosalunos responderam que
o suporte foi ruim, 7,7% avaliaram como péssimo e 3,8% avaliaramcomo ótimo.
Com relação a dificuldades financeiras, para verificar se houve problemas nessa área que
atrapalharam o desempenho acadêmico do discente, 26,9% responderam que não houve dificuldades
financeiras, 25% relataram que houve dificuldades que atrapalharam um pouco, 25% responderam
que houve dificuldades, mas que as mesmas não atrapalharam, 17,3% dos alunos tiveram dificuldades
que atrapalharam muito e 5,8% responderam que houve dificuldades financeiras que atrapalharam
razoavelmente seu desempenho acadêmico.
Sobre condições de trabalho para trabalharem na modalidade de ensino remoto, quando
perguntados sobre a qualidade do acesso à internet para acompanhar as aulas on-line, 46,2% dos
estudantes o avaliaram como bom, 26,9% como razoável, 19,2% como ótimo e 7,7% avaliaram como
ruim.
Sobre a qualidade do ambiente físico para acompanhar as aulas remotas, 61,5% dos alunos
afirmam possuir um local para estudar parcialmente adequado, enquanto 36,5% possuem um
ambiente adequado e 1,9% possuem um ambiente inadequado. Foi deixado um campo para que os
estudantes, caso quisessem, justificassem o motivo de terem avaliado o ambiente físico como
parcialmente adequado ou inadequado. Algumas respostas foram: “Apesar de conseguir acessar as
aulas, muitas vezes elas coincidem com o horário que minha família está em casa, então geralmente
há barulhos como som de rádio, tv, entre outros que me distraem. Além disso, muitas vezes temos
queda de energia aqui em casa e não consigo ver a aula no horário, o que acaba prejudicando o
decorrer da aprendizagem das matérias”; “Porque não estou sozinha em casa e cuidando de uma
pessoa idosa de 92 anos”; “É muito complicado visto que tem vários tipos de problemas com energia
e internet devido eu me localizar na fazenda e acaba sendo problemas locais que atrapalham muito,
além disso, tem a questão do barulho em excesso que querendo ou não os pais acabando esquecendo
que aula on-line continua sendo aula e o silêncio e a compreensão é essencial” “Tenho criança em
casa”; “Nao tenho um momento/tempo em que posso ficar sozinha pra estudar. Consegui organizar o
espaço somente na metade de 2021”; “Minha internet não funciona direito. Não tenho mesa nem
cadeira, preciso assistir as aulas no sofá da sala. Divido a casa com 5 pessoas e as vezes alguém quer
assistir TV e eu preciso estar na sala para estudar.”; “Acredito que seja um ambiente que apesar de
remeter ao meu conforto me desestabilizou diversas vezes no sentido de barulhos, situações advindas
de familiares, vizinhos etc.”.
Sobre descanso e lazer durante a pandemia, 51,9% responderam que às vezes tiveram essa
oportunidade, 25% responderam que raramente tiveram esse tempo de descanso e lazer, 21,2%
responderam que frequentemente tiveram essa oportunidade e 1,9% responderam que sempre tiveram
momentos de lazer e descanso nesse período. Com relação à qualidade das noites de sono durante a
pandemia, 38,5% responderam que tiveram noites de sono razoáveis, 21,2% avaliaram como boas,
19,2 responderam que foram ruins, 17,3% avaliaram como péssimas e 3,8% dos estudantes avaliaram
como ótimas as noites de sono nesse período de pandemia.
Foi considerado relevante indagar sobre a prática de exercício físico e qualidade da
alimentação durante a pandemia. Sobre a prática de exercícios físicos, 42,3% responderam que às
vezes praticou exercícios, 19,2% responderam raramente, 15,4% responderam que frequentemente
realizou exercícios, 13,5% responderam nunca e 9,6% responderam que sempre praticaram exercícios
físicos na pandemia. 30,8% avaliaram sua alimentação como boa, 30,8% avaliaram como razoável,
19,2% avaliaram sua alimentação como ruim, 15,4% avaliaram como péssima e 3,8% avaliaram
sua alimentação como ótima durante o período de pandemia.
Questionados sobre o suporte social que receberam nesse período, 36,5% avaliaram como
sendo razoável, 30,8% como bom, 25% como ruim, 5,8% como ótimo e 1,9% como péssimo. Sobre
a frequência com que os discentes sofreram de solidão durante o isolamento social, 34,6%
responderam que sofreram às vezes, 15,4% responderam que sofreram sempre, 25% responderam
que sofreram frequentemente e 25% responderam que sofreram raramente de solidão.
Pensou-se ser importante saber se os estudantes que ingressaram na universidade durante a
pandemia podem demandar ações que promovam acolhimento, razão pela qual se decidiu pela
inclusão de uma pergunta em que os mesmos pudessem avaliar a atividade de acolhida organizada
pela universidade no início do ano. As respostas apontam que 23,1% participaram e 76,9% não
participaram. Aqueles que participaram poderiam relatar do que mais gostaram, em uma pergunta
aberta. Algumas respostas foram: “Foi nossa primeira ligação com a universidade, então gostei de
conhecer os projetos, como a universidade funciona e adorei conhecer um pouco de todos os
professores logo no início.”; “Gostei maisda do segundo semestre desse ano, visto que ela foi mais
leve e não deixou as coisas tão engessadas e mostrou que o isolamento é só uma fase e ajudou a
imaginar um futuro na universidade. A parte que mais gostei foi o tour virtual pela faculdade e pela
cidade.”; [Gostei mais] “Da interação e do bom humor da maioria na atividade”.
Para saber o interesse dos estudantes em relação às ações que podem ser promovidas visando
à prevenção e promoção de saúde mental, foi-lhes perguntado se teriam interesse em participar de
atividades em grupo por via remota. As respostas indicam que a maior parte, 78,8% têm, sim,
interesse (21,2% responderam que não). Quando exemplos de atividades que podem ser oferecidas
foram apresentadas, com a instrução de que aqueles que se interessam indicassem de quais ações
gostariam de participar, 73,1% dos respondentes indicaram oficinas de música e/ou que envolvessem
outras artes, 75% responderam que têm interessem em participar de bate-papo literário sobre
temáticas pré-definidas, 71,2% se interessam em participar de jogos de interação e bate-papo entre
estudantes, 71,2% demonstram interesse em participar de grupos comunitários de saúde mental,
82,7% assinalaram interesse em participar de rodas de conversa sobre temáticas voltadas à
promoção da saúde mental, 82,7% participariam de técnicas de relaxamento em grupo, 88,5% de
oficinas de manejo de estresse, 82,7% participariam de roda de conversa que incluísse dicas de
alimentação saudável (por parte de profissional da nutrição que previamente se ofereceu como
voluntária da UEMG nesse projeto), 69,2% manifestam interesse de participar de rodas de conversa
com dicas de atividades físicas especialmente voltadas à situação de isolamento social, 78,8% têm
interesse por palestras interativas com dicas de saúde e bem-estar, 63,5% gostariam de participar de
grupos de reflexão sobre a vida pós-Covid-19, 57,7% consideram a possibilidade de participar de
grupos de manejo do luto relacionado à Covid-19, 55,8% têm interesse em participar de grupos para
abordar dificuldades relacionadas ao acompanhamento escolar de crianças em idade escolar durante
a pandemia e 61,5% dos alunos responderam que participariam de rodasde conversa sobre a temática
da migração do ensino presencial para o remoto. Todos os respondentes puderam escolher entre as
opções “sim” ou por “não” em cada uma das atividades citadas.
A intenção em realizar esse levantamento, muito além de apontar possíveis erros ou lacunas
na condução dos problemas impostos pela pandemia, foi compreender quais são os principais desafios
pela frente, de modo que o melhor acompanhamento possível possa ser oferecido ainda durante a
formação dos estudantes. Os resultados apontam que, muito embora a crise sanitária tenha afetado a
todos indistintamente, incluindo docentes, corpo técnico e gestores, o suporte percebido pelos
discentes aparentemente fez diferença para parte significativa do corpo discente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A elevada demanda por participação em diversas ações voltadas à prevenção e promoção da
saúde mental indicam que os esforços envidados por meio dessa proposta de estágio não foram em
vão e, inclusive, podem servir como um pontapé inicial para promover qualidade de vida aos
estudantes da universidade de forma regular. Espera-se que ao final do estágio, após finalização da
fase de coleta de dados, mais informações sejam alcançadas, de modo que a tomada de decisão
contemple a realidade de parte significativa do corpo discente, de preferência, de todos os cursos da
instituição.
Considerando as respostas coletadas e com base no que foi extensamente discutido durante as
supervisões de estágio, foi possível compreender algumas das necessidades primárias da população
universitária no período em que a pandemia de Covid 19 se faz presente. Diante dos dados obtidos
no questionário aplicado aos estudantes da universidade, informações relevantes foram levantadas, o
que se acredita ser suficiente para dar início ao planejamento das ações mencionadas no questionário,
o que irá consagrar com que a UEMGse torne, efetivamente, uma Universidade Promotora de Saúde.
Nessas propostas, sim, acredita-se que haverá oportunidade para colocar em prática as ações
elaboradas especificamente para esse fim. Pretende-se ampliar os objetivos para atendimento de
demandas que porventura haja por parte dos técnico-administrativos e da comunidade externa, além
de também incluírem o corpo discente.
A experiência de estágio foi importante para nossa formação profissional no que se refere ao
planejamento de projetos de gestão em saúde. Adicionalmente podem ser mencionados como
aspectos positivos: o reconhecimento sobre a importância do trabalho em rede para uma efetiva
promoção da saúde que atenda às demandas sociais; a segurança e experiência adquiridas em prol de
competências necessárias para o desenvolvimento e planejamento de projetos dessa natureza; as
trocas intelectuais e afetivas ocorridas no coletivo de trabalho desse estágio; e a perenidade dos
benefícios que o ingresso da UEMG na ReBraUPS supõe proporcionar.
Por acreditar em uma sociedade marcada por redes de interação e relação, pode-se defender
que melhorias no bem-estar psicológico dos discentes, de forma direta ou indireta, também
impactarão todos os setores da comunidade acadêmica da UEMG – Unidade Ituiutaba: docentes,
servidores técnico-administrativos, trabalhadores terceirizados e gestores.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Cecília Puntel de; BOEHS, Astrid Eggert; HEIDMANN, Ivonete T.S. Buss;
MONTICELLI, Marisa; WOSNY, Antonio de Miranda Wosny. Promoção à saúde: trajetória
histórica de suas concepções, 2006. Disponível em
<https://www.scielo.br/j/tce/a/W4mZfM69hZRxdMjtSqcQpSN/?lang=pt&format=pdf>. Acesso em:
15/10/2021.

ANDRADE, Ganriel Rodrigues de; HARTMANN, Jane Biscaia; YAMAGUCHI MirianUeda.


Universidades promotoras de saúde (UPS) - breve mapeamento do cenário brasileiro atual, 2019.
Disponível em
<http://177.129.73.17/bitstream/123456789/3822/1/JANE%20BISCAIA%20HARTMANN.pdf>.
Acesso em: 09/11/2021.

GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo. Métodos de pesquisa, 2009. Disponível em
<http://www.ufrgs.br/cursopgdr/downloadsSerie/derad005.pdf>. Acesso em:11/11/2021.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa; 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1991.
INSTITUTO Nacional de Câncer. Promoção da Saúde, 2021. Disponível em
<https://www.inca.gov.br/programa-nacional-de-controle-do-tabagismo/promocao-saude>. Acesso
em: 09/11/2021.

VINUTO, Juliana. A amostragem em bola de neve na pesquisa qualitativa: um debate em aberto,


2014. Disponível em
<https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/tematicas/article/view/10977/6250Acesso em:
11/11/2021.
ALIANÇAS INCONSCIENTES NAS RELAÇÕES FAMILIARES

Camila Martins Dos Santos1


Débora Ferreira Bossa2

RESUMO
O presente artigo trata-se da apresentação e discussão de um caso clínico atendido durante o estágio
profissionalizante do curso de psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais, unidade
Ituiutaba-MG sob a perspectiva teórica da psicanálise. O estudo de caso apresentado foi decorrente
do acompanhamento psicológico do paciente, identificado por F., cujos atendimentos foram
realizados ao longo de 10 sessões. O enigma que o caso nos convoca a analisar sob a luz da
psicanálise, remete à construção da dinâmica familiar que F. mantém com a esposa e filhas, em que
foi percebido inversão de papeis de pai e esposo, de modo que F. parece ocupar na relação familiar
a função de filho de sua esposa, e irmão de suas filhas. Tendo como base o conceito de alianças
inconscientes que são importantes estruturas de formação da realidade psíquica, ao longo do trabalho
foi discutido como F. foi se constituindo dentro do grupo familiar a partir das vivências trazidas por
ele ao longo das sessões, relacionadas às características familiares específicas que foram transmitidas
de geração em geração. Cada sujeito, cada grupo tem como função construir, organizar e transformar
determinadas heranças, não elaboradas, enraizadas que exercem grande influência no presente.
Portanto, é importante ressaltar a importância dos estudos psicanalíticos acerca da influência das
alianças inconscientes na manutenção de sintomas, que são constantemente vistos na clínica, como o
caso relatado ao longo do presente estudo.

Palavras-chave: Alianças inconscientes; Psicanálise; Relação familiar.

INTRODUÇÃO
As alianças inconscientes são consideradas importantes estruturas de formação da realidade
psíquica. Por meio delas é possível organizar e caracterizar as consistências das relações, as quais
unem diversas pessoas, e formam o grupo primário, ou seja, a família, grupo é responsável pela
formação da personalidade do indivíduo, ao mesmo tempo em que transmite uma cultura (BLEGER,
2003). No entanto, as alianças inconscientes também são a base daquilo que é reprimido, rejeitado ou
negado, são assim parte da estruturação da vida psíquica de cada indivíduo.
Segundo Castanho (2015) o conceito de alianças inconscientes foi criado por René Kaes em
1986 e foi desenvolvido de maneira gradual com retorno ao trabalho de Freud e outros psicanalistas.
Nesse sentido, trata-se de um conceito amplo que se tornou chave de leitura para as relações e
formações grupais, em especial, para o entendimento dos laços familiares, pois, era visto como uma
condição para a existência dos vínculos em todas as suas configurações vinculares como grupo, casal,

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Mestra docente no Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
instituição, família e indivíduo.
Posteriormente, com o aprofundamento dos estudos, o conceito passou a ser considerado não
só como um modelo para compreender o princípio da civilização, ou seja, dos vínculos sociais de
modo geral, mas para compreender o início e a manutenção de cada vínculo específico. De acordo
com Castanho (2015) a formulação do conceito tem como característica central o negativo, uma vez
que, para o autor as alianças inconscientes existem somente fora do campo da consciência dos
indivíduos, incluindo os conteúdos inacessíveis, o que importa para o autor é que todo vínculo repousa
sobre o negativo.
Tendo o conceito de alianças inconscientes como alicerce teórico, o presente artigo tem como
objetivo discutir e apresentar um caso clínico realizado durante o estágio profissionalizante do curso
de psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais, unidade Ituiutaba-MG sob a perspectiva
teórica da psicanálise. O estudo de caso apresentado foi decorrente do acompanhamento psicológico
do paciente, aqui identificado por F., cujos atendimentos foram realizados ao longo de 10 sessões. O
enigma que o caso nos convoca a analisar sob à luz da psicanálise, remete à construção da dinâmica
familiar que F. mantém com a esposa e filhas, em que foi percebido inversão de papeis de pai e
esposo, de modo que F. parece ocupar na relação familiar a função de filho de sua esposa, e irmão de
suas filhas. Essa construção é feita a partir das alianças inconscientes familiares estabelecidas por F.
ao longo de sua vida, mas que é também partilhada com a esposa e as filhas, à medida que a esposa
também responde a F. a partir do lugar de mãe, e a filha mais nova responde a partir do lugar de irmã
mais velha do pai. A dinâmica familiar nos convoca a pensar que a construção dos laços ultrapassa a
condição biológica, de modo que cada personagem da família reconstrói sua posição frente aos
membros a partir de suas condições psíquicas e necessidadesafetivas.
O caso clínico que será apresentado ao longo do artigo trata-se de um atendimento realizado
no período de agosto e outubro de 2021, às quintas-feiras, semanalmente, com duração de 50 minutos
cada atendimento. O caso é de um homem de 53 anos, aqui chamado F., casado a pouco mais de 20
anos, com duas filhas já adultas. A princípio F. procura a psicoterapia por meio do encaminhamento
psiquiátrico, devido ao diagnóstico recente de transtorno bipolar.
Assim, para o desenvolvimento deste estudo, foi realizado o estudo do caso clínico, sustentado
pela revisão bibliográfica. Para esta etapa, foi realizada busca em artigos, livros e capítulos de livros
científicos, publicados sobre o assunto com o objetivo de enriquecer a discussão e alinhar a teoria à
prática apresentada. A pesquisa dos artigos transcorreu nas seguintes bases de dados eletrônicas:
BVS-Psi, Bireme, Scielo, Pepsic, o Banco de Teses e Dissertações da CAPES. Os descritores
utilizados para a pesquisa foram os seguintes: alianças inconscientes, psicanálise; relação familiar.

DESCRIÇÃO DO CASO CLÍNICO


Durante as primeiras sessões F. contou um pouco sobre sua trajetória de vida até o presente
momento. Relatou que sua infância foi muito restrita, uma vez que, o pai era muito autoritário e
rígido, usava sempre da agressão física como meio para educar. Até que quando ele tinha 10 anos o
pai faleceu, e isso foi segundo F., como abrir a uma gaiola e libertá-lo. Apesar da experiência de
perder o pai, F. se viu livre das agressões físicas e humilhações vivenciadas na relação paterna. No
entanto, junto a essa liberdade veio outras responsabilidades, de acordo com F, com a morte do pai,
passou a ser o “provedor da casa”, começou a trabalhar para assumir o papel da figura paterna na
família. Nesse momento, percebemos que F. ocupou o lugar de esposo de sua mãe, e pai de seus
irmãos, ao assumir a maior parte das responsabilidades econômicas da família.
Com toda essa responsabilidade precoce, F. contou que também deu muito trabalho para a
mãe, assim que começou a sair, beber, fumar, viajar, explorar um mundo que antes era restrito para
ele, queria viver tudo aquilo que não era permitido pelo pai. Com 19 anos mudou de cidade para
melhorar o emprego, apesar de, segundo ele, sempre ter tido um bom retorno financeiro nos empregos
que conquistou. Em meio a essas mudanças, conheceu sua então esposa, identificada aqui por S., com
quem teve as 02 filhas, F. relata que nunca exigiu que S. trabalhasse, porém, cuidasse das filhas em
primeiro lugar, já que ele passava pouco tempo em casa em razão do trabalho.
Com 30 anos F. perdeu a mãe, em decorrência de um câncer. Para ele, essa foi uma perda
muito difícil, apesar de ter acompanhado grande parte do tratamento dela, F. contou que sentia muita
falta do carinho materno, pelo fato de ter saído de casa cedo e pelas responsabilidades que assumiu
ainda adolescente. A partir desse momento, sua família passou a ser a esposa e as filhas, F. contou que
S. é tudo para ele, é sua segurança e referência de cuidado, tanto que acostumou a chamá-la de mãe.
Segundo ele, sem até mesmo perceber, relatou que S. não se importa com isso, apesar de nunca ter
perguntado a ela sua opinião sobreo apelido.
Durante alguns anos, F. passou por inúmeras cidades a trabalho até que quando estava
trabalhando em uma empresa de vendas, teve uma discussão com seu gerente, e em meio a isso, teve
uma crise muito forte segundo ele de ansiedade, em que chegou a vomitar sangue. Após esse episódio,
F. pediu demissão e procurou ajuda, relatou ter realizado inúmeros exames fisiológicos, porém, os
resultados não apresentaram nenhuma anormalidade. Desse modo, o médico responsável naquela
ocasião constatou que o problema era de ordem psicológica, visto que F. passou por um momento de
muito estresse. Com isso, foi diagnosticado com TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo),
permanecendo alguns anos em tratamento psicológico e psiquiátrico.
Depois de algum tempo, F. decidiu morar mais perto da família e começar um curso superior,
assim fez, frequentava a faculdade de ônibus, visto que a instituição era em outra cidade. Devido à
mudança de emprego, houve uma alteração na data de seu pagamento, o qual seria alguns dias após
do vencimento da mensalidade do ônibus. Apesar de ter conversado com os responsáveis, F. foi
cobrado pela dívida em meio aos outros colegas de transporte e impedido segundo ele, de fazer a
viagem, a partir disso não conseguiu acompanhar o curso e acabou trancando a matrícula.
Concomitante a isso, vieram outros acontecimentos, como o afastamento do emprego por conta de
crises de pânico e perda da casa própria por falta de pagamento das parcelas. Nesse momento F.
relatou que entrou em uma profunda depressão, anteriormente já havia relatado ter tido alguns
episódios depressivos sempre em que se deparava com situações de perda de controle sobre os
acontecimentos desua vida.
Em meio a todas essas circunstâncias, F. e a família foram morar em uma fazenda emprestada,
já que não tinham para onde ir, e essa mudança trouxe diversas dificuldades de adaptação a todos
eles, principalmente de F. que se sentiu impossibilitado e sem perspectivas de futuro, fechando-se
cada vez mais para o mundo a sua volta. Após muita insistência de S., ele procurou ajuda psiquiátrica,
sendo diagnosticado então, com transtorno bipolar, passou a fazer uso de medicações novamente e
se apoiar exclusivamente nisso.
Ao longo das sessões F. descreveu sua rotina e a relação com S., que sempre esteve dedicada
a atender as vontades dele. Relatou que S. faz todo o serviço da casa e da fazenda, por vontade dela,
e segundo ele, em razão da patologia não se prontifica para ajudá-la nos momentos que ela solicita, e
isso estava atrapalhando o relacionamento deles e ocasionando brigas na família. F. descreveu seu
descontentamento com S. por exigir dele atenção, diálogo e proatividade, uma vez que, F. passa a
maior parte do tempo dormindo no chão da sala. Para ele, S. necessita também da psicoterapia para
entender a patologia e as atitudes dele.

ALIANÇAS INCONSCIENTES: ANÁLISE E DISCUSSÃO


De acordo com Correa (2003) a base psíquica dos indivíduos é constituída pelo vínculo mãe-
bebê e o grupo familiar em que estão inseridos, a partir disso surge uma espécie de tecelagem psíquica
grupal que é transmitida de geração para geração. Essa transmissão exige um trabalho psíquico
considerável, que há a colaboração de mecanismos em conjunto com uma série de projeções e
introjeções, como é percebido no relato de F. quando verbaliza sobre sua relação com o pai, em que
temia a figura paterna pela rigidez e abuso da autoridade, porém, repete esse padrão na criação das
filhas e com a esposa, à medida que, mantém todas submissas a ele, e usa da autoridade de pai
provedor para puni-las. Para a psicanálise, segundo Correa (2003), a transmissão psíquica está
interligada diretamente à transferência e à repetição.
Por outro lado, quando o pai de F. faleceu, ele viu nesse acontecimento a possibilidade de
ruptura com esse pai, na medida em que, experimentou tudo aquilo que antes era proibido para ele.
Isso mostra o quanto F. abominava as atitudes do pai, contudo, de modo inconsciente, repete todas
elas. Vinciguerra (2006) compreende que a psicanálise de famílias, visa identificar os efeitos sobre
essa ruptura com a figura paterna na modernidade. O autor postulou que na contemporaneidade, com
o surgimento da família hipermoderna, o pai não exerce mais a função que produzia uma hierarquia
e uma classificação que constituía uma família com lugares distintos, mas atualmente, se transformou
em uma família horizontalizada. Nesse contexto, os filhos já não enxergam o pai ocupando um lugar
diferenciado, mas sim um lugar de “igualdade”, o que estabelece uma certa relação de
companheirismo.
Ao longo das sessões F. discorreu sobre sua relação com a filha mais nova, que é marcada
pela falta de diálogo e cobranças afetivas. Ele contou que passou a infância das filhas longe em função
do trabalho, por isso não acompanhou o desenvolvimento escolar, comemorações de aniversário,
dentre outras fases importantes. Por muitas vezes, tentou suprir essa falta com bens materiais, no
entanto, tem consciência que não foi suficiente.
F. contou que apesar da filha mais velha ter sentido sua falta nesse tempo longe, com ela
conseguiu ter mais diálogo e demonstrar afeto. Já com a filha mais nova, tem dificuldade de
comunicar até mesmo o básico do dia-a-dia, uma vez que, moram na mesma casa. Machado e
Carlesso (2019) afirmam que o desenvolvimento emocional da criança está diretamente ligado com
o estado emocional da família, principalmente da mãe ou de quem exerce a função materna, visto
que, a criança necessita de um adulto para cuidar e mostrá-la ao mundo, uma vez que, um ambiente
suficientemente bom é aquele proporcionado pela figura materna, que ensina a criança e ter novas
experiências, constituir um ego individualizado, para assim dominar seus instintos e enfrentar
conflitos que são inerentes a vida.
De acordo com F., durante discussões da família ou até mesmo conversas cotidianas, a filha
constantemente fala da sua insatisfação de tê-lo como pai, do quanto sua mãe errou na escolha da
pessoa para se casar. Frequentemente fala de eventos de sua infância dos quais F. não participou,
segundo ele, seria uma forma de puni-lo por não ter participado. Todo o ódio verbalizado pela filha,
segundo F., é questionado por S., que chegou a confrontá-lo perguntando se ele já havia violentado
sexualmente a filha. F. afirmou emocionado, que nunca faria isso com uma filha e mataria se
descobrisse que alguém o fez. O trecho exemplifica o que postula Machado e Carlesso (2019) que a
família possui papel fundamental na constituição do sujeito, quando a criança, durante sua formação
psíquica, é exposta por quem deveria fazer as funções maternas/paternas a grandes faltas, isso se torna
uma lacuna no ego que, posteriormente, será recalcada de modo a amenizar os traumas sofridos.
Os conflitos que F. relatou que tem com a filha, também implicam na divisão dos afazeres
domésticos. Apesar de S. fazer grande parte do serviço, F. contou que, por váriasvezes, a esposa
solicitou que ele lavasse a louça por exemplo, ele observou a filha no quarto,e questionou por que
ele deveria lavar e a filha não. Isso mostra a substituição que F. faz da filha por uma irmã mais
nova, como explica Mello et al. (2020) ao afirmar que processo de parentalização pode ser
compreendido como uma distorção subjetiva das relações parento filiais, a partir da qual o filho
assume uma postura parental na família. Nesse contexto familiar, as crianças desempenham funções
parentais, as quais seriam dos adultos. Em geral, a criança não tem uma percepção consciente da
ausência de cuidado e sustentação das figuras parentais, sentindo-se responsáveis por suprir as
carências do ambiente familiar.
Quando F. relatou sobre a educação das filhas, se descreveu ter sido bastante autoritário, e
procurou criá-las de acordo com os ensinamentos da religião, da qual são seguidores desde o
casamento. Ele contou que quando sua filha mais velha começou a namorar, fez um acordo com ela
e o namorado para manter o relacionamento baseado nos princípios religiosos. Contudo, a filha
precisou realizar alguns exames ginecológicos, e a família descobriu ocasionalmente que ela não
era mais virgem. Diante disso, F. contou quesua vontade era matar a filha e o namorado por terem
traído sua confiança e rompido com o acordo. Após esse episódio F. retornou para as sessões de
psicoterapia para amenizar a raiva da filha.
Esse controle que F. exerce sobre a filha é explicado por Azevedo et al. (2016) ao retratar
sobre a ambivalência dos filhos em relação ao pai autoritário, e sobre os meios pelos quais os estados
mentais são transmitidos de uma geração para outra, além de diferenciar a comunicação consciente e
inconsciente no processo de transmissão. Segundo Azevedo et al (2016) não é somente o ideal que é
transmitido, mas também os sintomas, a culpa, as defesase a organização das relações objetais. Para
Freud (1976/1913) as proibições originadas do tabu foram estabelecidas em uma situação ancestral,
e transmitidas de geração a geração como resultado da tradição transmitida por meio da autoridade
parental e social, a base do tabu é uma ação proibida que tem uma forte inclinação inconsciente.
Em meio a essa relação conturbada com a filha, S., que de acordo com F. está sempre tentado
apaziguar as situações conflituosas entre ele e filha, sendo descrita pelo marido como uma mulher
exemplar, a qual significa tudo para ele, e como forma de carinho a chama de mãe, de acordo com
ele, nunca havia perguntado para a esposa se ela gostava de ser chamada assim, uma vez que para ele
era uma demonstração de afeto. F. contou que apesar das dificuldades da rotina do casal, devido a
incompreensão de S. sobre sua patologia, os dois viviam a vida de casados de uma forma
consideravelmente boa. O trecho remete ao que postula Isolan (2005), que o indivíduo não se
recorda do que esqueceu ou reprimiu, porém, reproduz o reprimido não como uma lembrança, mas
como uma ação repetitiva e inconsciente.
Correa (2003) afirma que a aliança inconsciente envolve processos, que desorganizam o
espaço intrapsíquico e o da intersubjetividade, o que resulta em uma dificuldade do reconhecimento
a da articulação de ambos os espaços, que são heterogêneos, porém, com características próprias.
De acordo com Castanho (2015), o conceito de alianças inconscientes é dividido pela
compreensão de duas modalidades: os pactos denegativos e os contratos narcísicos. O primeiro é
caracterizado por uma aliança defensiva ampla, em que, para a manter os vínculos estabelecidos pelos
indivíduos, algo deve ser recalcado, reprimido ou rejeitado. Kaes (2009) afirma que esse pacto é visto
como uma modalidade de resolução de conflitos intrapsíquicos, e de outros que ultrapassam a
configuração vincular, desse modo, seus efeitos são manifestados nas repetições e nos sintomas
partilhados, como é observado em F. no momento em que relatou as atitudes que eram tomadas pelo
pai e que foram repetidas por ele.
Os contratos narcísicos são caracterizados pela relação entre o bebê e seu conjunto social. O
indivíduo que recebe investimento no conjunto, recebe com ele um lugar de pertencimento e a
possibilidade de se constituir como EU (CASTANHO, 2015). A função dos contratos é transmitir e
preservar os valores e ideais de um grupo social, de forma a manter sua continuidade. Segundo
Castanho (2015), o pacto narcísico pode ser dividido em originários, primários e secundários. O
originário se trata da entrada do bebê na espécie humana; o primário é o investimento que é recebido
dos pais, e o secundário é originado nos grupos e instituições, nas quais os indivíduos são inseridos
ao longo da vida. Esse conceito pode explicar as crenças religiosas impostas por F. na criação das
filhas, principalmente com relação ao casamento.
Segundo Correa (2003) o processo de transmissão psíquica geracional demanda um trabalho
psíquico inconsciente constante, de elaboração e transformação. Tal processo é definido como
obrigatório na sucessão das gerações, no entanto, a urgência não é sempre a de realizar a transmissão,
mas também a de interrompê-la.
Nesse sentido, como afirma Azevedo (2016), a transmissão psíquica é central no grupo
familiar, e remete ao pertencimento de cada indivíduo a uma cadeia geracional, da qual se torna um
elo. A transmissão proporciona ao sujeito condições de atuar como herdeiro forçado, beneficiário,
pensador e até mesmo criador daquilo que lhe foi transmitido. Cada sujeito, cada grupo tem como
função construir, organizar e transformar determinadas heranças, não elaboradas, enraizadas, que
exercem grande influência no presente. Portanto, é importante ressaltar a importância dos estudos
psicanalíticos acerca da influência das alianças inconscientes na manutenção de sintomas, que são
constantemente vistos na clínica, como o caso relatado ao longo do presente estudo.
Para o manejo do caso clínico apresentado, foi utilizada da associação livre, principal técnica
da psicanálise, que consiste em deixar que o paciente fale de modo livre, sem censuras, sobre seus
sintomas no processo de análise. De acordo com Carvalho e Honda (2017), é esperado que o paciente
fale livremente para que consiga expressar seu conteúdo psíquico em palavras e manifestar ao analista
a cadeia associativa, em que elas se encontram, uma vez que, se toda palavra está associada a outra,
então é possível prosseguir o curso dessa ligação, visto que, os processos psíquicos seguem uma
ordem determinada. Por meio dessa associação, foi possível explorar o conteúdo latente trazido por
F. durante as sessões, reforçando a presença das alianças inconscientes em sua constituição como
indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como relatado ao longo do presente artigo, as alianças inconscientes estão interligadas
diretamente ao espaço intrapsíquico, portanto, é um conceito visto como fundamento do trabalho
vincular em psicanálise. O caso clínico apresentado demonstrou como os laços afetivos ultrapassam
a noção biológica, à medida que, F. ao longo das sessões foi se construindo na família a partir da
transmissão de características, costumes e crenças familiares.
O modo como F. foi se constituindo, mostra que as mudanças ocorridas no sistema de
transmissão das alianças inconscientes de geração em geração, colocam em primeiro lugar o negativo
da transmissão, aquilo que não é dito, que se encontra oculto. No entanto, segundo Correa (2003)
quando se trata do negativo, observa-se que é transmitido aquilo que não pode ser contido, ou seja, o
conteúdo que não foi elaborado no psiquismo dos pais, é depositado no psiquismo da criança, tais
como lutos não elaborados, objetos sem traço de memória, as doenças e a falta.
A inversão que F. faz de esposo para filho de sua esposa e de pai para irmão de suas filhas,
nos convocou a pensar como o tecido vincular do grupo familiar é permeado pelas alianças, e pactos
inconscientes envolvendo a intersubjetividade. À medida que F. se comporta como o filho que
necessita de cuidados e demanda da mesma atenção que recebe as irmãs mais novas, e a esposa
corresponde a esse lugar de mãe e cuidadora, as posições que cada membro da família ocupa se
mantém.
Para a clínica psicanalítica, estudos como esse são necessários, uma vez que, se trata de um
conceito chave de investigação dos vínculos que os indivíduos estabelecem ao longo da vida, e que
são a base do emaranhado de demandas que chegam para análise.

REFERÊNCIAS
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Kaës. Pensando fam., Porto Alegre, v. 20, n. 2, p. 162-176, dez. 2016. Disponível em
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Epub 16 Set 2020. ISSN 1678-5177. https://doi.org/10.1590/0103-6564e190126.
APRENDIZAGEM DE NOVAS HABILIDADES SOCIAIS A PARTIR DO CRESCENTE
AUMENTO DE REPERTÓRIO COMPORTAMENTAL ÂMBITO CLÍNICO

Laura Jeniffer Silva de Oliveira 1


Ana Paula Silva Cantarelli Branco2

RESUMO
Este estudo teve com objetivos descrever e analisar excertos de sessões terapêuticas sobre o
Treinamento de Habilidades Sociais (THS) e o de analisar a aprendizagem de novas habilidades
sociais após as intervenções junto a uma adolescente. Utilizou-se as bases das competências sociais
e das habilidades sociais para a aplicação de Treinamento de Habilidades Sociais (THS), por meio
de 1) estratégias para a adolescente expressar os sentimentos; 2) estratégias de melhoria na
manutenção da relação; 3) estratégias de desenvolver mecanismos de proteção dos seus direitos; 4)
estratégias para o desenvolvimento de equilíbrio nas relações sociais. Os resultados evidenciaram o
despertar de nova habilidades, organização de pensamentos de modo que a paciente começou a
responder de forma mais assertiva às demandas do ambiente. Como também houve a ampliação de
repertório de respostas sociais, uma vez que foi possível notar a identificação e a viabilização para o
planejamento de novos comportamentos, bem como o aperfeiçoamento para haver generalizações em
eventos futuros. Para tanto, este estudo contribuiu significativamente com os processos de
maximização de repertórios sociais tanto no que se refere a competências sociais, como também com
habilidades sociais uma vez que estes conceitos serviram de base a compreensão e análise dos
aspectos socioemocionais da paciente. É muito importante haver outros estudos que tratem da
ampliação de repertório social em meio ao caos da pandemia da Covid-19.

Palavras-chave: Aprendizagem; Treinamento de Habilidades Sociais (THS); Competência Social;


Repertório.

INTRODUÇÃO
Dados da Organização Mundial de Saúde na qual revela que mais de 1,5 milhão de casos
foram notificados na região no ano passado; mais de 1,9 milhão já foram registrados nos primeiros
nove meses deste ano. Os efeitos indiretos da COVID-19 em crianças e adolescentes ser conjecturam
maiores que o número de mortes causadas pelo vírus de forma direta. De acordo com a Organização
Pan-Americana da Saúde (OPAS) o vírus indiretamente produziram consequências e está
interrompendo o desenvolvimento de crianças e adolescentesuma vez que coloca em risco o alcance
de um futuro promissor.
Houve, portanto, prejuízos no ensino, mas sobretudo, na socialização, o que afeta diretamente
à saúde mental de crianças e adolescentes.
Um repertório de habilidades sociais é crucial para que o adolescente desenvolva relações

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente do curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
harmoniosas com os próprios pares e com os adultos. As habilidades de comunicação, expressibidade
e competência nas habilidades de interações sociais é a chave para o desenvolvimento saudável. As
habilidades sociais são uma classe de comportamentos emitidos em determinadas situações que visam
a habilidade do indivíduo em um contato social e direto com outro indivíduo. Estão associadas a
manutenção, inserção e iniciação de relacionamentos sociais, ou seja, iniciar e manter conversações;
pedir ajuda; dar e receber elogios; expressar agrado e desagrado; expressar sentimentos; fazer e
responder perguntas; críticas; pedidos; escutar empaticamente (CABALLO, 1996; 2003).
Contudo, é necessário que se mantenha um vínculo com redes sociais de amizade pois podem
auxiliar diretamente no processo de desenvolvimento das habilidades sociais, permitindo assim um
bem estar psicológico, redução do isolamento social, aumento de satisfação de vida. Além de que
também auxilia no processo individual de auto confiança e auto estima (RESENDE, et al., 2006).
De acordo com Del Prette; Del Prette, 2001 um desempenho para ser bem sucedido:

“pode focalizar a sua dimensão comportamental (as habilidades propriamente ditas)


bem como sua dimensão cognitivo-afetiva (os pensamentos, sentimentos, crenças,
expectativas etc., em sua coerência com o desempenho publicamente observável),
que precisam ser cuidadosamente avaliadas” (p. 118).

Considera-se que as competências sociais, como também a funcionalidade do desempenho


social congrega as relações oriundas do contexto, do desempenho e suas consequências. Para tanto
Del Prette; Del Prette (2001), p. 118 considera que haja critérios em que:

a consecução de objetivos (se o indivíduo consegue expressar o que está sentindoou


obter o que pretendia da relação);
a manutenção ou melhoria da relação (sem prejudicar ou romper a relação com o
interlocutor);
a manutenção ou melhoria da autoestima (avaliando como adequado ou oportuno o
próprio desempenho);
o respeito e defesa dos direitos humanos básicos (reconhecendo o próprio direitode
fazê-lo e respeitando os direitos dos demais); e
a busca por equilíbrio nas relações interpessoais (resguardando a igualdade na
relação).

Diante dos critérios elencados acima, problematizou-se em que medida os Treinos de


Habilidades Sociais (THS) repercutiu no desenvolvimento de novas habilidades de uma adolescente
no processo clínico. Desse modo este estudo teve como objetivos: Descrever e analisar excertos de
sessões terapêuticas sobre o Treinamento de Habilidades Sociais (THS); Analisar a aprendizagem de
novas habilidades sociais após as intervenções. No tópico a seguir será apresentado o percurso
metodológico utilizado para a apresentação deste estudo de caso clínico.
MÉTODO
Os atendimentos foram realizados no Núcleo de Estudos e Aplicação em Psicologia (NEAP),
por meio de um estágio obrigatório supervisionado por orientação na Abordagem da Terapia
Cognitivo Comportamental (TCC).
Foi utilizado para a análise dos dados qualitativo, as características das competências sociais
desenvolvidas por Del Prette; Del Prette (2001) tais como: 1) estratégias para a adolescente expressar
os sentimentos; 2) estratégias de melhoria na manutenção da relação; 3) estratégias de desenvolver
mecanismos de proteção dos seus direitos; 4) estratégias para o desenvolvimento de equilíbrio nas
relações sociais.
Para o desenvolvimento da expressão das emoções foi utilizado: 1 - Cartões Simbólicos:
Modo de Execução: Esta técnica consistiu na apresentação de cartões coloridos com frases que estão
ligadas ao cotidiano da adolescente. Os cartões foram colocados virados em cima de uma mesa, e a
adolescente retirava um por um, lia em voz alta e respondia o que faria em cada situação, estimulando-
a na área de habilidades sociais de comunicação, de civilidade, de enfrentamento, de empatia, de
trabalho e de expressão de sentimentos positivos; 2- Roleta “E agora o que eu digo?”: Esta atividade
teve como objetivo estimular a manutenção e a melhoria na relação. Modo de execução: Esta
técnica consistiu na presentação de uma roleta divertida virtual, na qual a paciente clicava para ela
rodar, e quando a roleta parava de rodar a paciente tinha de elaborar estratégias para responder de
forma assertiva a situação a qual estava sendo submetida, como por exemplo, “saindo da sala no final
da aula” o que ela deveria dizer e com quais pessoas teria de se comunicar; 3- Vídeo curta metragem
“Fragmentos - para pensar habilidades socioemocionais”: Esta técnica teve como objetivo o de
apresentar um vídeo para a paciente cuja personagem era uma criança e toda vez que ela se sentia mal
emocionalmente com algum comportamento desagradável de alguém no cotidiano, para com ela,
tinha como resposta o seu corpo fragmentado, além de guardar esses sentimentos de tristeza, raiva,
ela saia do ambiente e chorava. Em uma dascenas, teve um episódio em que a personagem fez um
desenho numa lousa na frente de todos na sala de aula, e todos riram dela e do desenho dela, com isso
ela ficou muito triste, diminuída, e então se fragmentou novamente, não disse nada e saiu correndo.
Ou seja, o vídeo trouxe em seu enredo a importância da comunicação e expressão dos sentimentos,
além de enfocar sobre direito de exercer voz e se posicionar, questionar e demonstrar os seus valores
positivos, mas sobretudo, de oportunizar e questionar o que estava vivenciando, exercer o seu direito,
bem como o de refletir sobre a igualdade nas relações interpessoais.
Todas essas atividades propostas foram desenvolvidas com o intuito de treinar as habilidades
sociais colocando-as em prática, oportunizando a paciente mudanças de comportamento. A seguir
serão trazidos excertos de falas a partir da aplicação das estratégiase recursos para o desenvolvimento
das habilidades sociais supracitadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
1- Estabelecimento de Aliança Terapêutica
O primeiro contato com a paciente foi, excepcionalmente, para o desenvolvimento do rapport,
bem como a criação de vínculo, posteriormente, deixando a paciente à vontade e esclarecida de todas
as dúvidas possíveis de como seria o processo, visto que a mesma também não havia tido nenhum
tipo de acompanhamento psicológico anteriormente. A paciente compareceu na primeira sessão
acompanhada pelo pai no dia 03/08/2021 e foi desligada em 05/11/2021. Será descrito abaixo as
intervenções realizadas em algumas sessões psicoterapêuticas que retratam o desenvolvimento de
habilidades sociais. Associou-se as falas conduzidas pela estagiária, no papel de psicoterapeuta com
as respostas da paciente.
T: Ela se mostrou aberta e interessada desde o primeiro encontro.
T: Até que ao entrar em assuntos mais internos, como ter perdido quatro tios e uma avó
recentemente por aqueles dias, ela se emocionou e disse estar com saudade dos entes queridos. Logo
após mantê-la estável novamente, foi possível notar em algumas falas onde a paciente afirmava:
P: “me senti muito sozinha quando entrei na escola ano passado, não consegui fazeramizade
com ninguém. Ainda bem que minha prima estudava comigo na mesma sala que eu”. T: Depois de
algumas perguntas relacionadas aos motivos que levavam ela a permanecer sozinha e não criar
contato, foi possível notar várias crenças e afirmações que ela
tinha, assim, deixamos para intervir mais profundamente sobre o assunto na segunda sessão.
T: Na segunda sessão foi trabalhado a técnica do desenho no intuito dela desenhar ou escrever
características da forma como ela se via e da forma como ela achava que o outro a via, ou seja, foco
total na sua autoimagem. Ela se descreveu como sendo:
P: “Linda, humilde, engraçada, alegre, extrovertida, amiga, carinhosa, amorosa, tranquila,
lerda, feliz, emotiva, chorona e ciumenta”.
T: E em relação ao que ela achava que os outros pensavam dela, ela descreveu:
P: “Linda, legal, gente boa, engraçada e metida”.
T: Tentando ir mais a fundo sobre o que realmente a impede de criar qualquer vínculo com
alguém, ela afirmou:
P: “eu acho que sempre me acham muito metida, então nunca tento conversar com ninguém,
porque também tenho medo de acharem que estou sendo intrometida nos assuntos deles.”
T: Assim, definindo então, sua crença central. Por fim, foi feito intervenções profundas de
modo a deixar reflexiva sobre a forma como ela se vê, como ela sabe que é, como ela acha que eles
pensam, da probabilidade da sua hipótese estar errada e de como ela pode fazer pra tentar alterar esse
quadro.
Nas próximas sessões colocou-se o foco total no Treinamento das Habilidades Sociais (THS)
levando atividades a serem executadas como (i) resultado da aplicação dos cartões simbólicos; (ii)
resultado da aplicação da Roleta Divertida: “E agora o que eu digo?” e (iii) Resultado da exposição
de um vídeo de curta metragem “Fragmentos - para pensar habilidades socioemocionais”.

1 – Resultado da aplicação dos Cartões Simbólicos:


Foram utilizadas algumas frases de efeito do tipo:
T: Você percebeu que seu colega de sala está triste e quer saber o motivo. “O que fazer¿” Ela
respondeu:
P: “Oi, tudo bem? vi que você está meio triste, aconteceu alguma coisa? Se precisar conversar
estou aqui”.
T: No dia da divisão dos grupos do trabalho de ciências você faltou a aula. Ninguém colocou
seu nome no grupo. Como você poderá resolver essa situação? Ela respondeu:
P: “Nossa, eu iria ficar muito triste (risos). Mas eu acho que eu iria falar com a professora.
Olha dona, eu faltei da aula aquele dia e ninguém me colocou no grupo do trabalho, você pode me
ajudar a achar algum grupo? Ou talvez eu chegaria em alguém maisde boa e perguntava se podia
entrar no grupo, não sei, não sei se iam achar legal eu perguntar assim”.
T: Seu amigo/amiga ficou estranho(a) com você, mas você não sabe o motivo. O quevai fazer?
Ela respondeu:
P: “olha fulano, eu fiz alguma coisa pra você? se eu tiver feito você me fala, porquenão
lembro se fiz e tô achando você estranho comigo”.
T: Na sala de aula você não está entendendo a explicação. Como você pediráexplicação?
Ela respondeu:
P: “dona, desculpa atrapalhar, mas não entendi essa matéria, você pode me explicarde novo
por favor?”
T: “Apresente-se. Diga seu nome e sua idade.” Ela respondeu:
P: “aí que legal. (risos). Oi me chamo E**** e tenho 13 anos, quase 14. (risos).
T: “O vidro da janela da sala de aula foi quebrado e pensaram que foi você. Como agiria nessa
situação?” Ela respondeu:
P: “meu Deus do céu. (risos). Eu acho que eu ia entrar em desespero, não sei. Nossa, mas eu
iria falar que não fui eu, que não fui eu, iria falar até o fim. Como eu iria quebrar o vidro? eu sou tão
quieta gente. Mas eu iria ficar brava se falassem que fui eu sendo que não foi.
É eu ia até gritar que não fui eu até pararem de falar”.
T: No fim da dinâmica, ela disse:
“nossa achei muito legal essa brincadeira hoje, foi diferente, tive que falar algumas coisas,
algumas coisas que pode acontecer de verdade. Ah eu amei!”.
Nota-se que ao analisarmos as respostas da paciente atendida, apresenta déficits nas
habilidades sociais, verifica-se, portanto, que foi preciso promover recursos para haver desempenho
social sendo que ele se refere a emissão de comportamento ou sequência de comportamentos
decorrentes de uma situação. Diferente das habilidades sociais as quais foram sendo trabalhada a
noção de existência a várias classes de comportamentos sociais identificadas no repertório da paciente
contribuindo para que lidasse com as demandas provenientes das situações interpessoais (DEL
PRETTE; DEL PRETTE, 2001).
No que se refere as falas da paciente, foi possível identificar que ela não estava despida de
suas habilidades, contudo, não utilizou por vários motivos, dentre eles a ansiedade, crenças distorcidas
e dificuldades de leituras dos sinais do ambiente social. A seguir será apresentado excertos da
aplicação a segunda estratégia para o desenvolvimento das habilidades sociais.

2- Resultado da aplicação da Roleta Divertida: “E agora o que eu digo?”


Para atingir o objetivo desta etapa foi dito na primeira frase:
T: vendo que alguém precisa de ajuda. Ela respondeu:
P: “oi, está precisando de ajuda? se tiver ao meu alcance eu ajudo”. T: Na segunda frase: saindo
da sala no fim da aula. Ela respondeu: P: “ué. acho que falaria tchau amanhã a gente se vê.
T: Na terceira frase: pegando um livro emprestado. Ela respondeu:
P: “posso pegar um livro emprestado com você?”
T: quarta frase: recebendo um presente. Ela respondeu:
P: “nossa muito obrigada pelo presente. Ah eu amo presentes”.
T: Na quinta frase: um estranho me oferecendo doce. Ela respondeu:
P: “não quero, obrigada pelo doce. Nossa eu tenho medo, eu falo que não quero e saio”
T: Na sexta frase: chegando em casa depois de um dia inteiro fora. Ela respondeu:
P: “oi mãe, cheguei, até que enfim cheguei. Nossa estou muito cansada. Aí eu amo chegar
em casa”.
T: Na sétima frase: dei um presente a uma amiga e ela me disse obrigada. Elarespondeu:
“ah por nada, você gostou do meu presente?”
T: Na oitava frase: saindo da escola. Ela respondeu:
P: “ah não sei, eu fico na porta. Mas acho que só falaria tchau mesmo. Tchaupessoas.” T: Na
nona frase: pedindo ajuda para a professora. Ela respondeu:
P: “professora pode ajudar aqui? estou com dificuldade na matéria.”
T: Na décima frase: depois de me desentender com um amigo. Ela respondeu:
P: “ah se eu estivesse errada eu iria pedir desculpas pega briga. Se eu não tivesse errada iria
esperar ele pedir desculpas”.
Com relação a interpretação dessa segunda estratégia de intervenção foi possível notar poucas
habilidades no repertório da paciente tendo em vista que será necessário proporcionar novas
dinâmicas a fim de coloca-la em contato com novas interações, representações a fim de oportunizar
o despertar de novas habilidades, no sentido do indivíduo organizar seus pensamentos, sentimentos e
manejos de ações de modo a responder de maneira mais assertiva às demandas que surgirem imediatas
e mediatas no ambiente (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001).

3- Resultado da exposição de um vídeo de curta metragem “Fragmentos - para pensar


habilidades socioemocionais”
A cada sessão foi feito perguntas no final de cada atividade, de modo a saber qual foi a
compreensão que ela teve da atividade proposta.
T: E todas elas, ela disse:
P: “aí eu amei essa atividade, eu pensei em tanta coisa, pensei em como eu iria falar pras
pessoas, e às vezes eu nem tinha pensado isso antes. Todo dia podia ter uma atividade diferente”.
T: Além disso, durante uma sessão dentre tantas, no início do acompanhamento, também
aconteceu uma situação dela com os amigos na qual sempre foi chamada pra brincar com os amigos
na rua, e teve uma semana que ela não foi chamada por eles. E nessa semana ela disse ter ficado muito
mal, até chorou, ficou sem entender, achou que tinha feito alguma coisa, se sentiu sozinha. Foi feito
perguntas se ela tinha questionado o motivo a eles, se ela tinha dito a eles como ela ficou, se ela
demonstrou seus pensamentos e sentimentos. E só através das perguntas ela disse.
“nossa mas é verdade né, como eles iriam saber como eu estou se eu não falei nada?como vou
saber o que aconteceu se eles não me falaram e eu também não perguntei. Nossa é mesmo, eu chorei
a toa, ninguém nem sabia como eu tava. (risos). Agora vou ter que falar com eles”.
T: A partir disso, a prática do treinamento foi dada pra ser treinada nessa situação verídica,
que por final, foi de extrema importância pro rendimento do processo. Na próximasessão ela relatou
ter conversado com eles, ela disse:
P: “eu falei com eles e você acredita que nem aconteceu nada? Foi porque eles nem lembraram
mesmo, eles acharam que eu iria sem eles precisar chamar. Aí eu falei que fiquei muito triste e eles
me abraçaram e falaram que não sabia e que não precisava ficar daquele jeito. Ah achei tão bonitinho”.
Diante dos dados decorrentes das falas acima, foi possível identificar uma ampliação do
repertório de resposta social da paciente uma vez que foi possível notar a identificação e a viabilização
para o planejamento de novos comportamentos, aprendidos na psicoterapia, proporcionando o
aperfeiçoamento para generalizações em eventos futuros.
Observou-se, portanto, que a paciente, notoriamente, teve melhoria em seu repertório de
comportamentos, enquanto esteve em acompanhamento clínico, com duração de um mês, contudo,
não finalizamos o processo devido à interrupção por parte dos pais em faltar com o compromisso de
levar a filha, acarretando assim em três faltas alternadas, significando o desligamento automático da
paciente do NEAP.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das intervenções desenvolvidas, mas nitidamente o resultado do treino de habilidades
sociais previsto com as estratégias de intervenção para cada sessão tiveram como resposta o aumento
do repertório no âmbito social escolar.
A ampliação do repertório de habilidades sociais foi visível na medida em que a paciente
aumentou o seu vínculo das amizades o que repercutiu diretamente no processo individual de
autoconfiança e autoestima, autocontrole, equilíbrio nas relações interpessoais, bem como no
exercício dos direitos humanos, proporcionando a redução do seu isolamento social.
Nessa direção, o acompanhamento psicológico clínico foi útil e necessário para auxiliar no
processo de treinamento e evolução das habilidades sociais de modo a garantir um melhor
desempenho social na sua fase de adolescência, para consequentemente, estender-se pra vida adulta.
Para tanto, este estudo contribuiu significativamente com os processos de maximização de repertórios
sociais tanto no que se refere a competências sociais, como também com habilidades sociais uma vez
que estes conceitos serviram de base a compreensão e análise dos aspectos socioemocionais da
paciente. É muito importante haver outros estudos que tratem da ampliação de repertório social em
meio ao caos da pandemia da Covid-19.

REFERÊNCIAS
CABALLO, V. E. O treinamento em habilidades sociais. Em V. E. Caballo (Org.),
Manual de técnicas de terapia e modificação do comportamento, 1996, (p.361-398). São Paulo:
Santos Livraria Editora.

CABALLO, Vicente E. Manual de avaliação e treinamento das habilidades sociais.


Santos, 2003.

DEL PRETTE, Z. A. P.; DEL PRETTE, A. Habilidades Sociais e Educação: Pesquisa e atuação em
psicologia escolar/educacional In: Del Prette, Z. A. P. (Org.) (2001). Psicologia Escolar e
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(OPAS). Folha informativa – COVID-19 (doença causada pelo novo coronavírus) [Internet]. Brasília
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Relatório da Situação - 67 Genebra: OMS; 2020.

RESENDE, M. C. de., et al . Rede de relações sociais e satisfação com a vida de adultos e idosos.
Psicol. Am. Lat., México , n. 5, fev. 2006. Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1870350X2006000100015&ln
g=pt&nrm=iso>. acessos em 13 nov. 2021.
DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES SOCIAIS COM FOCO EM COMPONENTES
VERBAIS E COGNITIVO-AFETIVOS

Sergiane Nogueira de Souza1


Ana Paula Silva Cantarelli Branco2

RESUMO
Este estudo analisou a existência de déficit em habilidades sociais e nas relações interpessoais de um
jovem adulto no contexto clínico em desenvolver habilidades sociais a partir de diferentes classes de
comportamento apresentados no setting terapêutico. Os atendimentos foram realizados no Núcleo de
Estudos Aplicação em Psicologia (NEAP) por meio de estágio obrigatório supervisionado por
orientação na Abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), Psicoeducação e Treino de
Habilidades Sociais (THS). Foram analisados os componentes verbais e os componentes cognitivo-
afetivos de um paciente com déficits nas habilidades sociais. Os componentes verbais observados nos
eventos de respostas do paciente ainda se mostram em fase de construção no que se refere a lidar
com críticas, pedir ou dar feedback e responder perguntas que se referiam aos seus relacionamentos
interpessoais, bem como apresentou déficits em ser grato, tal como demonstrou resistência emmudar
comportamentos como o de recusar ajuda, mesmo em momentos que necessitava do outro. No que se
refere aos componentes cognitivos-afetivos observou-se maior autonomia de Daniel em relação a
seguir planos e metas em passar no exame. Apresentou bom autoconceito e autoconfiança durante as
sessões. Por outro lado, com relação aos estereótipos apresenta dificuldades com relação a crenças
mal-adaptativas que precisam ser trabalhadas em sessões posteriores. Concluiu-se uma melhora
considerável no desenvolvimento das habilidades sociais e também de alguns comportamentos
distorcidos em relação às pessoas. É importante que mais estudos de caso sejam realizados,
possibilitando melhor tratamento em pacientes com déficit nas relações interpessoais e nas
habilidades sociais, através de técnicas que vêm sendo indicadas como importantes aliadas no
tratamento desses pacientes.

Palavras-chave: Habilidades Sociais; componentes verbais; componentes cognitivos afetivos.

INTRODUÇÃO
Mesmo diante de todo progresso da ciência, deparamo-nos em pleno século XXI, com uma
pandemia. Em novembro de 2019, na cidade de Wuhan/ China, foi identificado um vírus que causa
doenças respiratórias. Desde o surgimento dos casos em novembro de 2019, o surto se espalhou
mundialmente de maneira letal, através da OMS, em março de 2020, foi decretadoestado de pandemia
(OPAS, 2020; BRASIL, 2020b).
Embora seja antigo foi detectado pela primeira vez em 1937 e só descrito em 1965. O SARS-
COV-2, denominado de “Coronavírus” é responsável pela Covid-19 (BRASIL, 2020). Diante do alto

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Doutora docente de Psicologia na Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
índice de contágio, as pessoas se viram diante de medidas restritivas como ouso de máscara, hábitos
de higiene e isolamento social para tentar diminuir o contágio.
O tato é a principal maneira de interação dessas pessoas com o mundo e também uma das
formas de transmissão do vírus. Seja para a leitura, através do braile, ou da locomoção, feita com o
auxílio de bengalas. Quem tem deficiência visual precisa ter cuidados extras para reduzir o risco de
contaminação durante a pandemia (REVISTA NACIONAL DEREABILITAÇÃO, 2020, p. 1).
As pessoas com deficiência embora não necessariamente estejam no grupo de risco para
Covid-19 (BERGAMIN et al, 2020) se contaminados, algumas podem intensificar os sintomas.
Pessoas com deficiência muitas vezes necessitam de auxílio presencial em suas rotinas, neste sentido
elas podem ser impactadas, então é possível afirmar que com a pandemia ficaram mais vulneráveis
nestes últimos meses.
Pode ser considerado socialmente habilidoso o indivíduo que apresenta um comportamento
apropriado, ou seja, é caracterizado por ações eficazes na especificidade de diversas situações
(CABALLO, 1996; 2003). Lazarus (1973) sugeriu quatro tipos de respostas socialmente hábeis, a
capacidade de dizer não; a saber, de expressar sentimentos positivos e negativos; de pedir favores e
fazer pedidos; e de iniciar, manter e encerrar diálogos.
Mais tarde, outras categorias de resposta foram sugeridas, como aceitar pedidos, fazer elogios
e falar em público (RATHUS, 1975). Já na década de 1980, se desenvolveu totalmenteo estudo do
Treinamento de Habilidades Sociais, mostrando resultados positivos sobre dificuldades de natureza
interpessoal, como habilidades de comunicação e resolução de problemas (WOLPE, 1976).
As habilidades sociais representam o conjunto de comportamentos que permitem o
desempenho social ajustado, sendo este expresso pelo padrão de relações interpessoais que o
indivíduo possui. As interações interpessoais podem ser caracterizadas conforme sua capacidade de
produzir os efeitos pessoais e sociais desejados, ou seja, nos termos da satisfação das necessidades
individuais (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 1999, 2001).
Tendo em vista que o conjunto de habilidades sociais que o indivíduo possui vai refletir
diretamente a qualidade das suas relações interpessoais, e consequentemente, impactar a sua vida
pessoal, profissional e social (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 1999, 2001a).
Evans (1993) define que intervenções e avaliações devem avaliar além dos comportamentos-
problema, os recursos, os suportes e as potencialidades dos clientes. O conjunto de habilidades sociais
é a maneira de somar na superação de comportamentosproblema.
Diante das necessidades de desenvolvimento de habilidades sociais, este estudo teve como
objetivos: analisar a existência de déficit em habilidades sociais e nas relações interpessoais de um
jovem adulto no contexto clínico e desenvolver habilidades sociais a partir de diferentes classes de
comportamento apresentados no setting terapêutico.

MÉTODO
Os atendimentos foram realizados no Núcleo de Estudos Aplicação em Psicologia (NEAP)
por meio de estágio obrigatório supervisionado por orientação na Abordagem da Terapia Cognitivo-
Comportamental (TCC), Psicoeducação e Treino de Habilidades Sociais (THS). Será relatado um
estudo de caso de Daniel (pseudônimo utilizado para manter o sigilo), sexo masculino, adulto jovem,
de 26 anos, filho único, graduado, apresenta deficiência visual.
Daniel é filho único de mãe solteira, classe econômica baixa. Conheceu seu pai quando ainda
era criança, com quem tem pouca relação de amizade e afeto, tem mais 3 irmãos, filhos de seu pai
com outra mulher, também não tem muito contato com os irmãos por parte de pai. Relata, ainda, que
tem afeto e carinho de pai por um tio (materno) que sempre esteve presente em sua vida.
Sua mãe sempre muito próxima e, excessivamente protetora, deixou de trabalhar para cuidar
exclusivamente do filho. A renda para o sustento da família é proveniente de um benefício que Daniel
recebe do governo, sua mãe nunca se casou e não teve outro companheiro.
A terapia está sendo realizada em sessões com supervisões em que estão sendo abordadas
questões técnicas, teóricas e práticas para melhor condução do caso. Até o presente momento foram
realizadas sete sessões com duração de 50 minutos, com início dia 05/08/2021, as sessões ainda estão
acontecendo semanalmente, e se encerram no mês de dezembro. Apresentou como queixas principais
dificuldades nas relações interpessoais, habilidades sociais e ansiedade. Para este estudo foram
levados como componentes de análise das habilidades sociais os 1) componentes verbais e 2) os
componentes cognitivo-afetivo, a saber.
Os componentes verbais de forma são os transtornos da fala, latência e duração, regulação
(bradilalia, traquilalia, volume e modulação). Os componentes não verbais são; gestos, postura
corporal, olhar e contato visual, sorriso, expressão facial, contato físico, distância/proximidade e
movimentos com a cabeça (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 1999). Grande parte da codificação das
mensagens das relações interpessoais acontece no plano verbal.
Já os componentes cognitivos-afetivos são; expectativas e crenças (planos, metas e valores
pessoais; autoconceito; autoeficácia versus desamparo; e estereótipos), conhecimentosprévios (sobre
cultura e ambiente; papéis sociais e autoconhecimento), estratégias e habilidades de processamento
(resolução de problemas; leitura do ambiente; autoinstrução; auto-observação e empatia) (DEL
PRETTE; DEL PRETTE, 1999).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Daniel se considera extrovertido, falante, possui alguns amigos e está sempre em busca de
novos conhecimentos. Desde a infância relata ter tido algumas dificuldades por conta da deficiência
visual, mas nada que pudesse impedir sua busca por conhecimento e chegar à sua formação em um
curso superior.
Quando criança Daniel sempre batia seu corpo nas paredes e nos móveis de sua casa, foi então
que sua mãe preocupada com estes acontecimentos o levou no médico. Daniel passou por diversos
profissionais até ser diagnosticado com deficiência visual aos 6 anos de idade. Teoricamente muitas
habilidades sociais das crianças videntes são aprendidas visualmente através do comportamento dos
pais e colegas, então para crianças com deficiência visual isso não ocorre. Para elas, isso ocorre
com baixa frequência, pois requerem feedback verbal, modelos físicos e instrução consistente com
seus comportamentos (SACKS, 1992).
Daniel iniciou seus estudos em uma escola regular na cidade onde morava, porém Daniel
queria buscar mais autonomia para uma melhor qualidade de vida e então juntamente com sua mãe
foram em busca de informações de uma instituição para cegos, conseguiu uma vaga num instituto
cerca de 300 km de distância de sua cidade de origem, então foi estudar emoutra cidade sozinho aos
8 anos de idade longe de sua mãe. Neste instituto ele permaneceu por aproximadamente quatro anos,
com base dos relatos de Daniel, nesta instituição a qual ofereceu inúmeras formas de como lidar com
a deficiência para ter mais autonomia nas tarefas cotidianas.
Ele relata também que no instituto teve o primeiro contato com uma psicóloga, a qual foi
muito importante nos processos de aprendizagem e também contribuiu com a forma de lidar com a
deficiência visual. Observou-se, portanto, que houve estimulação de suas habilidades sociais e outras
características psicológicas desde a infância, fase importante para explicar os padrões de
relacionamento interpessoal. Além disso, o momento de vida no qualas pessoas se encontram nas
suas escolhas educacionais e profissionais dizem muito a respeito de suas características pessoais e
comportamentais (BUENO, OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2001). Daniel retornou para casa aos 12 anos,
pois sua mãe adoeceu com a sua ausência. Relatou que sua mãe foi buscá-lo para ficar mais próxima
dele.
Daniel relata alguns episódios de sua infância que o fazem sentir saudades, descreve uma casa
onde foi muito feliz mesmo diante de todas as dificuldades que eles tinham, relata que foram
despejados do local por falta de pagamento do aluguel, colocaram na rua todos os móveis e pertences
da família. Contudo, relata que se pudesse morar neste lugar novamente seria muito bom. Daniel
conta que quando pequeno imaginava que aquela casa era muito grande, mas hoje adulto, sabe que
não era tão grande.
Em suas memórias da infância, nesta casa havia um quintal grande com uma goiabeira, tinha
um cachorro que foi um presente de funcionários de uma rádio local, o cão-guia ficou em sua
companhia durante algum tempo. Ele reafirma que ali foi o lugar em que ele foi mais feliz, inclusive
ao retornar nesta cidade ele visitou o local novamente e passou um filme de tudo que ali viveu na
companhia de sua mãe.
Sua mãe decidiu mudar de cidade para buscar uma melhor qualidade de vida para eles.
Ela sempre o acompanhou, levando-o para escola e em todos os lugares que ele quisesse ir.
Com base nos relatos de Daniel, sua mãe, às vezes, o sufoca com tanta proteção. Com relação às
Habilidades Sociais Educativas Parentais (HSE-P) que envolvem expressividade, comunicação e
limites, apontando que esses comportamentos parentais podem compor o ambiente para desenvolver
habilidades sociais de seus filhos. Esse conjunto de habilidades sociais educativas parentais pode
garantir às crianças os reforçadores de que necessitam(BOLSONI-SILVA; MARTURANO, 2007;
2008). Embora foi possível notar uma relação com dificuldades de impor limites por parte dessa
prática parental desenvolvida pela mãe de Daniel. Tendo em vista que as principais dificuldades
apontadas por pessoas com deficiência visual são: dificuldades em manter e iniciar brincadeiras,
problemas de adaptação social e maior isolamento, menor interação com seus pares e déficit na
emissão de comportamentos não-verbais (CABALLO, et al., 1997).
Daniel sempre teve bom rendimento escolar e durante a sua graduação não foi diferente
sempre muito focado nos estudos, recentemente conseguiu passar na primeira fasede um exame
muito importante para sua profissão, foi a sua segunda tentativa, na primeira ele disse que ficou muito
ansioso, relata que talvez este foi o motivo para não ter alcançado a nota necessária. Foi sugerida à
Daniel a técnica de respiração diafragmática, para que no dia do exame ele pudesse amenizar sua
queixa. Depois disso relatou fazer uso de bebidas alcoólicas, momento da sessão que ficou muito
triste, embora tenha encontrado na bebida um alívio, mas atualmente quer interromper o uso, pois
pretende focar toda sua atenção para conseguir êxito na segunda fase do exame que acontecerá no
mês de dezembro.
Daniel relata que faz uso de bebida alcóolica com frequência e sempre na companhiade sua
mãe, relata ainda que a primeira vez que bebeu, foi sua mãe que lhe ofereceu quando ainda era menor
de idade. Sempre que bebe Daniel relata ficar mais agressivo com sua mãe, com familiares e com
vizinhos. De acordo com Escribano e Alonso (2005), inúmeras investigações evidenciam que o
desenvolvimento social das pessoas com deficiência visual e cegas mostra dificuldades nos
relacionamentos interpessoais e por isso possui maior isolamento social. Além disso, a limitação da
visão pode estimular negativamente nos processos de aprendizagem nas relações interpessoais
iniciais, nas habilidades sociais e também nas diferentes fases do processo de informações nas
interações sociais adequadas (ESCRIBANO; ALONSO, 2005).
De acordo com os dados provenientes da pesquisa foi possível notar que as habilidades sociais
dos componentes comportamentais verbais ou não verbais, verbais de conteúdo, observadas em
Daniel ainda se mostram em fase de construção no que se refere a lidar com críticas, pedir ou dar
feedback e responder perguntas que se referiam aos seus relacionamentos interpessoais, bem como
apresentou déficits em ser grato, tal como demonstrou resistência em mudar comportamentos como
o de recusar ajuda, mesmo em momentos que necessitava do outro.
No que se refere aos componentes cognitivos-afetivos observou-se maior autonomia deDaniel
em relação a seguir planos e metas em passar no exame. Apresentou bom autoconceito e
autoconfiança durante as sessões. Por outro lado, com relação aos estereótipos apresenta dificuldades
com crenças mal adaptativas que precisam ser trabalhadas em sessões posteriores.
Nas últimas sessões Daniel relatou estar muito feliz, pois não fez uso de bebida alcóolica
naqueles dias e que a bebida não está fazendo falta. Ao longo das sessões de terapia, identificou
alguns motivos que dificultam o bom relacionamento interpessoal de Daniel.
Buscou-se conhecer alguns motivos que fazem com que Daniel não se sinta bem em receber
ajuda de sua mãe e até mesmo de outras pessoas: as maiores incidências recaem sobre a falta de
diálogo, preconceito e impaciência. São muitas barreiras existentes para a inclusão do deficiente
visual na sociedade: o preconceito, a falta de estrutura física das cidades impossibilitando o seu
desempenho de cidadão comum (ir à escola, ao banco, ao cinema, ao teatro, de trabalhar), etc. As
relações sociais são frequentemente carregadas de ansiedade e desconforto, estes sentimentos causam
dificuldades no estabelecimento de relações interpessoais (BRUMER., et al, 1997).
A busca por maior interação social foram demandas trabalhadas no âmbito da clínica para que
se possa diminuir as situações que comprometam o relacionamento interpessoal de Daniel com outras
pessoas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante o desenvolvimento dos encontros semanais, os trabalhos em cima das queixas
iniciais de Daniel demonstraram aumento no repertório de suas habilidades sociais, tanto em
componentes verbais como cognitivo-afetivo, pois cada pessoa possui uma classe de comportamentos
que são transmitidos no contexto familiar e cultural e são passiveis de mudanças. Foi perceptível a
troca de experiências e a melhora significativa nas relações, proporcionando a partir das técnicas
ensinadas uma maior autonomia do paciente diante das situações de conflito. O trabalho desenvolvido
proporcionou um crescente aumento da qualidade nas interações e na relação interpessoal uma vez
que demonstrou maior consciência de suas dificuldades e maior abertura para mudanças na vida
pessoal (WOLPE, 1976; CABALLO, et al., 1997; BRUMER., et al, 1997; DEL PRETTE; DEL
PRETTE, 1999, 2001; ESCRIBANO; ALONSO, 2005; BOLSONI-SILVA; MARTURANO, 2007;
2008). Durante
as vivências foram manifestados alguns conflitos com sua mãe e também com outras pessoas
o que demonstra grande necessidade de futuras intervenções abordando a comunicação interpessoal
que é essencial para o ser humano. Estudos futuros sobre essa temática são necessários para o
treinamento de habilidades sociais. Espera-se que mais estudos sejam realizados com o propósito de
investigar as características do desempenho social das pessoas com deficiência visual. Diante do
quadro pandêmico a população mundial está em alerta quanto à COVID-19 e o Brasil não está de
fora, o vírus ainda circula com velocidade. São necessárias reflexões sobre esta realidade. As pessoas
com deficiência necessitam de uma rede de proteção social, direitos básicos, políticas públicas
voltadas para garantir a sua integração. Diante de todas as barreiras socioculturais serão necessárias
mais pesquisas para planejamento sobre condições de vida sociais saudáveis voltadas para pessoas
com deficiência.

REFERÊNCIAS
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higienização de dispositivos para pessoas com deficiência. Vitória: UFES, 2020. Disponível
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problemas de comportamento: comparando pais e mães de pré-escolares. Aletheia, n. 27, p. 126-138,
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BOLSONI-SILVA, A. T.; MARTURANO, E. M. A qualidade da interação positiva e da


consistência parental na sua relação com problemas de comportamentos de préescolares.
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BRUMER, A.; PAVEI, K.; MOCELIN, D. G. Saindo da" escuridão": perspectivas da inclusão
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RATHUS, S. A. Princípios e práticas de treinamento assertivo: Uma visão geral eclética. The
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deficiência, mobilidade reduzida, familiares e profissionais do setor. Pessoas com deficiência visual
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https://revistareacao.com.br/pessoas-com-deficiencia-visual-precisam-de- orientacaoespecificapara-
se-prevenir-contra-covid-19/. Acesso em: 19 mai. 2020
WOLPE, J. S. A prática da terapia comportamental. São Paulo: Brasiliense, 1976.
DEPRESSÃO ASSOCIADA AO HIPOTIREOIDISMO

Amanda Vieira Simolini1


Rafaella Freitas Marques2
Allisson Rodrigues de Rezende 3

RESUMO
O hipotireoidismo é caracterizado pela alteração e disfunção da produção dos hormônios
triiodotironina (T3) e tiroxina (T4), e apresenta como um de seus sintomas a depressão. Pesquisas
apontam que pacientes já depressivos podem ter seus quadros clínicos agravados com o
hipotireoidismo, e outros podem desencadear a depressão a partir do hipotireoidismo, porém, poucos
estudos relatam uma relação direta entre eles. O trabalho foi elaborado como critério de aprovação
na disciplina Fundamentos em Fisiologia Humana em 2019, cujos objetivos foram pesquisar possíveis
relações diretas entre depressão e hipotireoidismo, suas manifestações biológicas e as ações
farmacológicas. O método utilizado foi uma análise bibliográfica de produções científicas que
fizessem esse levantamento sobre as semelhanças e diferenças de ambas doenças para que pudessem
ser relacionadas. Os resultados apresentaramausência de produções científicas comprovadas acerca
do assunto, possíveis relações foram feitas baseadas em produções sobre depressão e hipotireoidismo
pesquisados isoladamente cuja relação foi baseada em um único artigo de produção. Compreende-se
que a falta de materiais produzidos elucida a grande lacuna que ainda há sobre o tema, despertando o
interesse em descobrir e produzir novas fontes por meio de futuras pesquisas necessárias à área.

Palavras-chave: Depressão; hipotireoidismo; distúrbios da tireoide.

INTRODUÇÃO
De acordo com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), o
hipotireoidismo é uma disfunção da tireoide característico pela queda dos hormônios triiodotironina
(T3) e tiroxina (T4). Relatam que mesmo sendo mais comum em mulheres, pode ser manifestado
desde um recém-nascido até um idoso. Os possíveis danos são anemias; coronariopatia; desordem
gastrointestinais, neurológicas, endócrinas, metabólicas e renais; disfunção respiratória; dislipidemia
(colesterol anormalmente elevado); glaucoma (doença ocular que pode causar cegueira);
hipertensão arterial; insuficiência cardíaca; retardo mental; surdez; deficiência no crescimento em
recém-nascidos com hipotireoidismo (SBEM, 2005).
Considerando que o hipotireoidismo é caracterizado pela alteração e disfunção da produção
dos hormônios T3 e T4 é completamente necessário o tratamento adequado e o diagnóstico da
disfunção a tempo a fim de evitar alguns danos no paciente. O RegulaSUS (2016) apresenta como

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Mestre docente do Curso de Biologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
sintomas principais do hipotireoidismo: cansaço, ganho de peso, perda de libido, ressecamento da
pele, queda de cabelo, alteração de memória e raciocínio, distúrbio de sono, entre outros sintomas.
Porém, outro sintoma que também é destacado é o de depressão.
De acordo com o CID 10-F33, a depressão é uma doença psiquiátrica crônica e recorrente,
que altera o humor por uma tristeza profunda associada a sintomas de baixa autoestima, culpa,
cansaço excessivo, entre outros. Os pacientes já depressivos podem ter seus quadros clínicos
agravados com o hipotireoidismo, e outros podem desencadear a depressão a partir do
Hipotireoidismo. Segundo o artigo “Relação entre a função tireoidiana e a depressão: uma revisão”
dos autores Bahls e Carvalho (2004), os pacientes deprimidos refratários aos antidepressivos
tricíclicos (ADT) tem uma melhor resposta ao desenvolvimento de hormônios da tireoide quando
apresentam nível sérico normal baixo de T4 do que os de nível sérico normal, médio e alto.
Muito se observa sobre a relação sintomática entre as duas doenças, mas pouco se sabe sobre
o quão influente uma doença é na outra, visto que a manifestação sintomática se assemelha bastante.
Por isso, o presente trabalho pretende fazer um levantamento sobre pesquisas produzidas que
abordem possíveis semelhanças e diferenças em ambas doenças, estabelecendo possíveis relações de
diagnóstico e tratamento.

OBJETIVO
Gerais
Buscar uma possível relação direta entre a depressão e o hipotireoidismo.

Específicos
Encontrar possíveis formas de reversão do quadro melancólico da depressão e disfunção
tireoidiana.
Explorar quais as ações farmacológicas são indicadas para o tratamento de ambas.
Fazer levantamento de possíveis manifestações biológicas que comprovem suas relações.

MÉTODOS
Este artigo se trata de uma pesquisa básica de caráter qualitativo – visto que será abordado
toda a fisiologia de ambas as doenças, as formas como se manifestam e os medicamentos envolvidos
– estruturado através de uma pesquisa bibliográfica sobre o tema Depressão associada ao
hipotireoidismo. De acordo com o autor Antônio Carlos Gil:
A pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científicos. Embora em quase todos os estudos
seja exigido algum tipo de trabalho desta natureza, há pesquisas desenvolvidas
exclusivamente a partir de fontes bibliográficas (GIL, 2008, p. 50).

Fontes como Scielo, Google acadêmico, juntamente com dados e informações sobre a
depressão e hipotireoidismo, principalmente as disponibilizadas no site da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia (SBEM), compuseram as fontes de busca para a coleta de dados. As
fontes bibliográficas que deram suporte principal para apresentação das possíveis relações entre a
depressão e o hipotireoidismo foram os artigos “A relação entre a função tireoidiana e a depressão:
uma revisão” escrito por Bahls & Carvalho (2004), e “Avaliação clínica de sintomas psiquiátricos no
hipotireoidismo subclínico” de Teixeira et al. (2006).
Poucos foram os documentos que achamos em que, de início, o arquivo abordava a depressão
diretamente associada ao hipotireoidismo, somando um total de 2 artigos. Por conta disso, o trabalho
demandou uma pesquisa mais abrangente e direcionada de início a encontrar teses que relacionam
isoladamente o Hipotireoidismo e possíveis soluções medicamentosas, assim como as que
isoladamente abordam a depressão e possíveis tratamentos medicamentosos. As palavras-chave
usadas foram “hipotireoidismo”, “depressão”, “fármacos”, “tratamento com medicação”, “depressão
e tireoide”, “medicamentos”, englobando a junção de algumas delas para encontrar os dados
bibliográficos necessários, como “fármacos da depressão”, “fármacos do hipotireoidismo”
“medicamentos depressão e tireoide”.
Elaborando pesquisas sobre as doenças separadamente, as autoras fizeram uma análise
elaborada que pudesse juntar os dois materiais de forma coerente com a proposta de tentar encontrar
as relações entre a depressão e o hipotireoidismo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Hipotireoidismo
Os hormônios T3 e T4 são substâncias que a glândula tireoide produz e têm funções diferentes
como crescimento, acelerar o ritmo cardíaco, e até regular a quantidade de algumas substâncias no
organismo. Eles são jogados no sangue e atingem todas as células do corpo, porém só atuam nas
específicas (células-alvo). Os hormônios tireoidianos (HT) são importantes para o crescimento e
desenvolvimento de vários órgãos e tecidos, sendo T3 o principal pois conforme a revisão de Maria
Tereza Nunes (2003) “Dele também depende o crescimento, a diferenciação e a regulação da
atividade e metabolismo desses mesmos órgãos e tecidos na vida adulta, razões pelas quais os
hormônios tireoidianos são considerados essenciais para a manutenção da qualidade de vida”
(NUNES, 2003).
A glândula tireoide secreta o T4 e a partir de sua desiodação forma o T3, que por sua vez:

Apresenta atividade biológica no mínimo 5 vezes maior que a do T4, que depende
a atividade de, praticamente, todos os tecidos do organismo, já que todos eles
potencialmente expressam receptores de HT. Desta forma, para a manutenção da
atividade normal dos tecidos-alvo, níveis intracelulares adequados de T3 devem ser
garantidos (NUNES, 2003).

Os hormônios T3 e T4 auxiliam no funcionamento celular, crescimento e desenvolvimento


do sistema nervoso, fertilidade, memória, fome, aprendizagem e até mesmo no humor. Quando a
tireoide não funciona de maneira adequada ela pode 1) liberar muito hormônio: causando o
hipertireoidismo ou 2) produzir pouco hormônio: ocasionando o hipotireoidismo. Em ambas
situações o volume da glândula tireoide pode aumentar, o que se reconhece como bócio. (SBEM,
2021)
A hipófise controla a função da tireoide e produz o Hormônio Estimulante da Tireoide (TSH),
que o induz a produzir T3 e T4. Na medida em que a hipófise percebe que a tireoide está funcionando
mal – que seria quando os níveis de T3 e T4 diminuem e, consequentemente, há uma queda no
metabolismo - ela começa a produzir mais TSH, cuja qual é dosada no sangue periférico.
O diagnóstico de hipotireoidismo é feito através de um exame de sangue, no qual se mede os
níveis de TSH e T4; quando os níveis de TSH estão muito elevados e os de T4 estão muito baixos,
pode-se dizer que há um quadro de hipotireoidismo, mas é importante entender que, quando está no
início ou de forma leve, o nível de T4 pode estar normal, sendo então só o TSH observado para
diagnóstico.
O então chamado Hipotireoidismo pode se dar em vários níveis, desde quadros assintomáticos
(quando a doença não exibe sintomas) até quadros em que o paciente não tem disposição e apresenta
uma série de alterações no sistema digestório, entre outros. Os principais sintomas, segundo a
Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (2005), são fadiga, aumento de peso,
intolerância ao frio, ressecamento da pele, queda dos cabelos, aumento das taxas de colesterol e do
fluxo menstrual, além de infertilidade e depressão.
Devido ao fato de os sintomas citados nem sempre estarem todos presentes, se faz necessário
pesquisar a disfunção tireoidiana, feito por meio de um exame de sangue que avalia os níveis de TSH
– quando bebês, a disfunção é detectada pelo teste do pezinho. No caso do hipotireoidismo a
disfunção é considerada autoimune:
Na maioria das vezes, o hipotireoidismo é causado por uma inflamação denominada
Tireoidite de Hashimoto, uma disfunção autoimune. Por consequência, o organismo
produz anticorpos que danificam a tireoide diminuindo sua capacidade de produção
dos hormônios (SBEM, 2005).

Sobre estes anticorpos que o organismo produz, eles são chamados de antiperoxidase
tireoidiana (ATPO); produzido pelo sistema imune, ele ataca a glândula tireoide e consequentemente
altera os níveis de hormônio da glândula, sendo assim, apresentar um nível elevado de ATPO no
corpo é um indicativo de doença autoimune. A Tireoidite de Hashimotoé uma das maiores causas da
quantidade elevada de ATPO – que, por razões ainda não confirmadas, o corpo se volta contra si
mesmo – seguido da Doenças de Graves (doença que gera uma anomalia na glândula tireoide),
gravidez, hipotireoidismo subclínico (quando a diminuição da atividade da glândula tireoide é
assintomática e só é percebida através de exames de sangue), e histórico familiar.
O tratamento de hipotireoidismo, em geral, é feito pela vida toda. O mais adequado para
quadros em que o nível de TSH está mais elevado que o normal é a reposição do hormônio tiroxina
– já que a tireoide parou de fabricar – que deve ter a dosagem ideal de acordo com cada caso. Em
casos transitórios de hipotireoidismo (mulheres no período pós- parto ou quando há um efeito
colateral de medicamento) não é necessário a reposição hormonal, os níveis de TSH e os outros
hormônios tendem a se nivelar naturalmente.
Existem vários fármacos capazes de controlar o hipotireoidismo, dentre eles o Euthyrox,
Levoid e Synthroid – todos eles são à base de levotiroxina sódica. Conforme o site do Núcleo de
Telessaúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul:

O tratamento inicial do hipotireoidismo primário franco é feito com levotiroxina,


tomada em jejum, 30 minutos antes do café da manhã. Para pacientes saudáveis e
com idade inferior a 60 anos, pode-se começar com dose de 1,6 µg/kg/dia (dose
plena), sem necessidade de início gradual. Em pacientes idosos ou com doença
cardíaca, recomenda-se iniciar com 25 µg/dia, incrementando de maneira gradual
12,5 a 25 µg/dia a cada duas semanas até atingir a dose adequada de acordo com o
resultado do TSH (UFRGS, 2017).

Como indicado pela TelessaúdeRS-UFRGS (2017), a levotiroxina é um fármaco muito usual


para o controle da hipotireoide; se trata de um hormônio sintético do T4 da tireoide. Como grande
parte do hormônio T4 que é produzido se transforma em T3 quando chega nos órgãos e tecidos, ele
atua como uma reserva que gera mais T3 quando necessário. Assim, coma diminuição da tiroxina, a
conversão de T3 precisa ser recomposta pela sua reserva, e por isso a levotiroxina é um medicamento
tão indicado para o tratamento, pois serve para que o organismo continue produzindo T4 de forma
que controle quanto será convertido em T3. Até poderia haver reposição diretamente de
triiodotiranina, mas isso poderia acarretar numa dosagem excessiva do hormônio no organismo.
Uma vez que o hipotireoidismo não tem cura, não se trata a causa, e sim repondo a quantidade
de hormônios que tiveram sua produção interrompida. O tratamento, de início, pode necessitar de
várias mudanças de dosagem, isto devido ao fato de ser um tanto difícil encontrar qual a dosagem
certa para cada paciente. Se administrada em excesso, o paciente pode sofrer efeitos colaterais como
insônia, tremores, palpitação cardíaca e aumento considerável do apetite.

Depressão
Pelas características da depressão é necessário diferenciá-la de tristeza – que é pautadanas
dificuldades da vida e seus desafios. A depressão é um estado do humor que não se altera, trazendo
como sintomas principais um estado de ânimo irritado ou deprimido e diminuição do interesse – ou
perda – em atividades que antes eram prazerosas (FEIJÃO, MARQUES, ANDRADE, 2015). Ela
pode oscilar em graus de seriedade: leve, moderada e grave. É importante citar que a depressão pode
estar relacionada com fatores genéticos, gerados por disfunção da bioquímica do cérebro e estes por
sua vez podem desencadear a doença através de gatilhos como: estresse emocional, ansiedade,
acontecimentos traumáticos, e por doenças como o hipotireoidismo.
No que tange aos aspectos neuropsicológicos existem vários estudos que tentam analisar e
comparar o cérebro de pacientes normais, depressivos unipolares e bipolares de várias faixas etárias.
Conforme Ferreira (2008), existem estruturas cerebrais que estão diretamente relacionadas com as
alterações cerebrais dos quadros depressivos: área frontal é responsável pela atenção,
psicomotricidade e tomada de decisões; eixo hipotálamo-hipófise- adrenal (HHA) modula o
metabolismo, sede da memória e do sistema límbico; e a amígdala relacionada ao sistema límbico.
Na área frontal relativo à atenção, segundo Feijão, Marques & Andrade (2015):

Descrevem ainda que em pacientes deprimidos unipolares, comprometimento da


capacidade de sustentar a atividade cognitiva e motora, de alternar o foco de
atenção, além de lentificação motora e cognitiva, esses déficits teriam relação com a
gravidade do quadro, sendo mais intensos em pacientes em pacientes que necessitam
de internação hospitalar (FEIJÃO; MARQUES; ANDRADE, 2015).

Sobre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal relacionado principalmente com a memória,


Rozenthal, Laks e Engelhardt (2004) afirmam que “A alteração de memória estaria relacionada a
uma desregulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, levando a efeitos adversos de hormônios do
estresse sobre o hipocampo”. Sobre a velocidade do processo, conforme os autores, há uma lentidão
no processo, bem como a função executiva fica danificada. A flexibilidade mental e estruturação de
estratégias de planejamento são alterados também, da mesma maneira têm dificuldade na iniciação
de tarefas.
Em relação à amígdala reconhecem que a emoção é de extrema importância na tomada de
decisões e que em pacientes com quadros depressivos há uma dificuldade para decidir, são mais
lentos e possuem estratégias que envolvem menos autoconfiança (ROZENTHAL, LARKS,
ENGELHARDT, 2004). O núcleo central da Amígdala para a relação entre emoção e
comportamento, também ocorre nessa área redução global do metabolismo cerebral anterior e
aumento do metabolismo da glicose:

Na depressão, parece haver uma redução global do metabolismo cerebral anterior e


um aumento do metabolismo de glicose em várias regiões límbicas, com ênfase na
amígdala. A melhor evidência desta anormalidade vem de estudos de pacientes com
depressões relativamente graves e recorrentes e uma história familiar de transtorno
do humor. Durante os episódios de depressão, o aumento do metabolismo de glicose
estaria relacionado com ruminações intrusivas. Este hipermetabolismo amigdaliano
serviria como um amplificador emocional que ajudaria a distorcer os sinais de
estressores relativamente menores em pessoas vulneráveis. Segundo Thase, esta
alteração seria reversível com farmacoterapia eficaz (ROZENTHAL, LARKS,
ENGELHARDT, 2004).

Os antidepressivos são medicamentos efetivos no tratamento de depressões moderadas e


graves, atuando na redução e até eliminação dos sintomas. Para Fleck (et al. 2003), os antidepressivos
possuem eficácia semelhante, alterando somente em relação aos efeitos colaterais e à junção desse
medicamento com outros; demonstram em amostras a eficiência do método: “O índice de resposta em
amostras com intenção de tratamento (intention-to-treat) variam entre 50% e 65%, contra 25% e 30%
da resposta mostrada por placebo em estudos clínicos randomizados” (FLECK et al., 2003).
Atualmente os antidepressivos são classificados perante os mecanismos de ação já que não
compartilham de estruturas em comum. Eles agem produzindo o aumento na concentração de
neurotransmissores na fenda sináptica através da inibição do metabolismo, bloqueio de recaptura
neuronal ou atuação em autoreceptores pré-sinápticos (MORENO, 1999).
Até os anos 80, existiam dois principais antidepressivos, os tricíclicos (ADTs) e os inibidores
de monoaminoxidase (IMAOs) e causavam efeitos colaterais devido à falta de especificidade da ação
farmacológica e em superdoses podiam levar à óbito. Com o avanço farmacológico a partir de 1980,
os antidepressivos tornaram-se mais específicos e atenuaram os efeitos colaterais, um dos principais
e mais indicados são os Inibidores Seletivos de Recaptação da Serotonina (ISRS) (MORENO, 1999).
Os ISRS fazem parte da classe farmacológica de antidepressivos. São mais recomendáveis
por conta de apresentarem uma baixa toxicidade e por isso muito utilizados quando há um quadro
de Transtorno Depressivo Maior (TDM) – apresentando sintomas de apatia, perda de interesse e
humor depressivo, impulsos suicidas e outros sentimentos depressivos. Dentre os ISRS, pode-se
nomear a paroxetina, sertralina, fluoxetina, fluvoxamina, citalopram; a função deles é inibir a
recaptação de serotonina de forma vigorosa, mas suas estruturas são diferentes no sentido
farmacodinâmico (efeitos fisiológicos dos fármacos nos organismos vivos) e farmacocinético
(trajetória que o medicamento segue no organismo de seres vivos); a potência com que inibem a
recaptação de serotonina varia (MORENO, 1999).
Eles apresentam majoritariamente os mesmos mecanismos de ação, mas pelas diferenças de
estruturas moleculares – que alteram o sentido farmacodinâmico e farmacocinético, anteriormente
dito – há de ser feita uma escolha mais adequada para cada paciente. São eficazes tanto quanto os
ADTs, porém, com uma quantidade mais segura de substâncias que promove uma maior segurança
em relação aos efeitos adversos que estes fármacos podem acarretar (MORENO, 1999).
Sobre ligações proteicas, todos apresentam uma alta atividade, mas em destaque a fluoxetina,
pois é a que mais apresenta metabólito (composto intermediário das reações enzimáticas do
metabolismo). Seu tempo de meia-vida prolongado é o necessário para atingir um estado de equilíbrio
clínico significativo, consequentemente para o início da ação antidepressiva. (MORENO, 1999)
Em geral, são rapidamente absorvidos, sofrem menos efeitos no metabolismo e se ligam com
as proteínas plasmáticas. Metabolizados no fígado, todos afetam as enzimas metabolizadoras do
citocromo-P450 (grupo de enzimas que atua no metabolismo da maioria dos medicamentos) e
possivelmente comprometer o metabolismo de outras drogas metabolizadas neste sistema. Seus
efeitos colaterais podem apresentar sintomas psiquiátricos (agitação, ansiedade, insônia e
nervosismo), gastrointestinais (náuseas, vômitos, dorabdominal e diarreia), neurológicos (tremores e
efeitos extrapiramidais), assim como alteração de sono, fadiga, perda/ganho de peso, disfunções
sexuais e algumas reações dermatológicas (MORENO, 1999)

Relação entre Hipotireoidismo e Depressão


Embora o trabalho tente apresentar possíveis relações entre esta doença com o
hipotireoidismo, alguns estudos ainda não conseguem encontrar uma relação que seja consistente
entre elas. Porém, uma pesquisa sobre avaliação clínica e de sintomas psiquiátricos no
hipotireoidismo subclínico mostrou o seguinte dado de relação:

Os níveis mais baixos de T4 encontrados nos pacientes com HS (hipotireoidismo


subclínico) poderiam sugerir um estado de insuficiência tireoidiana inicial e
justificar os achados clínicos e psiquiátricos encontrados. Observou-se uma
associação entre HS e queixas clínicas, bem como sintomas de depressão, quando o
instrumento utilizado foi o questionário autoaplicável de Beck. Os pacientes que
apresentaram mais queixas clínicas também apresentaram maior frequência de
sintomas de depressão (TEIXEIRA et al. 2006).

A mesma pesquisa ainda aponta uma percepção significante que obtiveram nos resultados
com a relação de sintomas da depressão quando testada em pacientes com Hipotireoidismo subclínico
(HS), e possuíam uma carga anormal de ATPO no organismo:
“A presença de sintomas de depressão (pela escala de Beck) e de ansiedade foi mais frequente
nos pacientes com escore anormal, e ocorreu maior frequência desses sintomas à medida queo
paciente apresentou escore clínico mais elevado” (TEIXEIRA et al. 2006).
Os dados apresentados acima apontam que os fármacos de depressão e de hipotireoidismo não
se assemelham, mesmo tendo muitas semelhanças nos quadros sintomáticos e alterações dos mesmos
hormônios. Sobre essa semelhança, Bahls e Carvalho (2004) apontam na pesquisa:

Embora a maioria dos deprimidos tenha níveis circulantes de T3, T4 e TSH normais,
existem evidências de atividade alterada do eixo HHT em alguns casos de
depressão, que incluem; 1) aumento de T4 total e/ou livre, muitas vezes, dentro dos
limites da normalidade. É característico o achado de T4 e/ou T4L plasmático
elevado sem alterações de T3; 2) resposta exagerada do TSH ao desafio com TRH
em 10% e resposta diminuída em 25% dos pacientes; 3) níveis elevados de
anticorpos antitireoidianos presentes em 15% dos casos; e 4) concentração elevada
de TRH no líquido céfalo raquidiano de deprimidos (BAHLS &. CARVALHO.
2004, p. 47).

Devido aos casos que apresentam os sintomas tão comuns, a necessidade de descartar o
hipotireoidismo em um paciente com depressão não é uma questão resolvida. Em casos de o paciente
ser potencialmente depressivo, seria de extrema importância executar exames para diagnosticar
eficientemente a doença, se certificando que não se trata de uma necessidade de correção hormonal
advinda do hipotireoidismo.
Outra relação encontrada pelas escritoras Bahls & Carvalho é:

Sobre o emprego de T3 como coadjuvante no tratamento da depressão é proposto


que o T3 corrige uma anormalidade cerebral dos hormônios tireoidianos considerada
como um componente fisiopatológico da depressão. Mas, pelo fato de que o cérebro
autorregula a transformação de T4 em T3, os índices plasmáticos nem sempre são
representativos da atividade tireoidiana central (BAHLS & CARVALHO. 2004, p.
46).

Mesmo com o restrito material bibliográfico sobre o tema, ainda é possível encontrar fatores
que causam impacto de uma doença na outra, de forma a suscitar a curiosidade sobre arelação em que
o hipotireoidismo pode ter na depressão e vice-versa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
De forma a tentar descrever o hipotireoidismo e a depressão, seus tratamentos através de
fármacos, e tentar achar uma possível relação entre elas, foi possível encontrar tanto semelhanças
com relação de sintomas – inclusive neuropsicológicas – quanto diferenças, pensando na relação
medicamentosa usada para o controle destas doenças.
Observa-se que há um restrito número de pesquisas relacionadas ao tema, o que dificulta o
levantamento bibliográfico sobre as possíveis relações, mas ainda assim, os encontrados apresentam
dados de suma importância para compreensão tanto do hipotireoidismo e depressão isoladamente
quando as possibilidades de estarem relacionadas umas com as outras.
Concluímos também que a falta de abrangência de resultados já se trata, em partes, de um
resultado relevante. O fato de poucas literaturas abordarem relações comprovadas sobre essas doenças
mostra como ainda há um vasto campo a ser pesquisado e as possibilidades de que novos
procedimentos de tratamento sejam pensados na atuação da manifestação conjunta das duas doenças.

REFERÊNCIAS
BAHLS, Saint-clair; CARVALHO, Gisah Amaral de. A relação entre a função tireoidiana e a
depressão: uma revisão. 2004. 1 v. Tese (Doutorado) - Curso de Psicologia, Departamento de
Clínica Médica da Ufpr. Curitiba, Pr, Brasil, Universidade Federal do Paraná (ufpr), São Paulo - Sp,
2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-
44462004000100012. Acesso em: 8 set. 2019.

FEIJÃO, G. M. M; MARQUES, G. M. V.; ANDRADE, A. G. D. s. Depressão:


Características Clínicas, Alterações Neuropsicológicas e Possibilidades de Tratamento do
Transtorno na Infância e Adolescência. Cadernos de Graduação, CE. 2015 Disponível em:
<http://www.faculdade.flucianofeijao.com.br/site_novo/cadernos_graduacao/servico/cad_gra
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FERREIRA, Polyana. O que acontece no cérebro durante a depressão. 12 mai. 2018. Disponível
em:<http://mundodapsi.com/o-que-acontece-no-cerebro-durante-a-depressao/>Acesso em: 30 nov.
2019.

FLECK, Marcelo P. A. et al. Diretrizes da Associação Médica Brasileira para o tratamento de


depressão(versão integral). Revista brasileira de psiquiatria. 25 fev. 2003. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rbp/v25n2/v25n02a13.pdf> Acesso em: 30 nov. 2019.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
MORENO, Ricardo Alberto; MORENO, Doris Hupfeld; SOARES, Márcia Britto de Macedo.
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NUNES, Maria Tereza. Hormônios tireoidianos: mecanismo de ação e importância biológica. São
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<https://www.ufrgs.br/telessauders/documentos/protocolos_resumos/endocrino_resumo_hipot
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ROSENTHAL, Marcia; LAKS, Jerson; ENGELHARDT, Eliasz. Aspectos Neuropsicológicosda


Depressão. Revista Psiquiatrica., RS. Maio, 2004. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rprs/v26n2/v26n2a10.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2019.

Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. 10 coisas que você precisa saber sobre
Hipotireoidismo. Rio de Janeiro, RJ. 23 mai. 2005. Disponível em:
https://www.endocrino.org.br/10-coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-hipotireoidismo/ Acesso em:
11 set. 2019.
TEIXEIRA, Patrícia de Fátima dos Santos et al. Avaliação clínica e de sintomas psiquiátricos no
hipotireoidismo subclínico. 2006. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302006000400020>. Acesso em:
30 nov. 2019.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Faculdade de Medicina. Programa de


Pós-Graduação em Epidemiologia. TelessaúdeRS (TelessaúdeRS-UFRGS). 2017. Disponível em:
https://www.ufrgs.br/telessauders/documentos/telecondutas/tc_hipotireoidismo.pdf> Acesso em: 29
nov 2019
MASCULINIDADE E CONTEMPORANEIDADE: UM ESTUDO DE CASO DASQUEIXAS
DE UM HOMEM NOS DIAS ATUAIS

Jorge Luís Quirino dos Santos1


Débora Ferreira Bossa2

RESUMO
O presente estudo realiza investigação a respeito do fenômeno da masculinidade e seus efeitos
subjetivos na vida dos homens, utilizando como recurso de análise o estudo de caso de um paciente
acompanhado ao longo de três meses como prática de estágio clínico em psicanálise na clínica-escola
de uma instituição de ensino superior pública. Para tanto, é realizado levantamento de dados através
dos relatórios de estágio por um período de aproximadamente 11 sessões, orientação de caso clínico
e revisão bibliográfica especializada para interlocução dos elementos identificados, estes foram
divididos didaticamente através de tópicos para discussão e apresentação dos elementos relacionados
às questões do paciente: A queixa; Seus conflitos; Impasses, impressões, narrativas sobre si. No
processo identifica-se elementos relacionados à identificação de campos que se repetem em seus
relacionamentos e vida, como que é chamado no texto de masculinidade hegemônica, isto é, atitudes,
comportamentos e crenças que se manifestam e se apresentam como potenciais adoecedores, pois
mostram-se insuficientes para dar conta das várias formas de ser homem. Conclui-se brevemente com
este estudo a importância do processo psicoterapêutico e como este se faz de grande valia para o
decurso do emergir desses pontos de tensão e possíveis adoecimentos gerados pela perspectiva de
realização a partir de um modelo hegemônico e idealizado de homem linear.

Palavras-chave: Caso clínico; psicoterapia; masculinidade; psicanálise.

INTRODUÇÃO
A construção da ideia de sexualidade masculina é alvo de pesquisas antropológicas que
buscam compreender como tal conceito se estruturou nas sociedades, suas modificaçõese adaptações
em cada período histórico. Como este conceito vem sofrendo alterações, e, segundo alguns autores
como Silva (2000), vem até mesmo denotando uma crise para a constituição identitária masculina.
Como crise de uma estrutura político-social esta apresenta origens históricas de inícios-transições-
modificações.
Este trabalho investiga os processos históricos envolvidos na construção do que entendemos
como conceito de masculinidade e os aspectos históricos de herança cultural sobre a posição
social esperada para o homem contemporâneo, suas responsabilidades, deveres e papel social
associado em muitos casos como provedor. Tal tema tem se manifestado através de sintomas
relacionados à exaustão, frustração e pressão em muitos homens que se vêm questionando sobre seu

1
Graduando pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Mestre docente do Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
papel social. Essa queixa se manifestou a partir de um atendimento na prática de estágio obrigatório
em psicanálise e movimentou questionamentos sobre os impactos dessa construção histórica sobre
esse papel social que se apresenta em alguns casos como um destino quase inevitável sobre o Ser
Homem.
O trabalho se constituirá a partir do estudo de caso de um paciente da clínica escola NEAP
(Núcleo de Estudos e Aplicações em Psicologia), com o devido sigilo assegurado neste trabalho. O
paciente em questão será chamado de Lucas (nome fictício), e no decorrer de seu atendimento
questões ligadas à sua masculinidade, seu suposto lugar social dentro da sua relação serão alvos de
atenção a partir de termos expressos em suas próprias falas que denotam aspectos atribuídos a suas
metas e também relacionadas a imagem que construiu sobre si mesmo o papel social atribuído à
masculinidade, dentre eles podemos destacar: provedor, homem da casa, pressão, invisibilidade,
cansaço.
Nas investigações percebe-se como o tema da masculinidade apresenta-se em relação de
oposição ou negação do feminino, isto é, na busca do ideal de masculino tenta-se eliminar aspectos
da feminilidade numa tentativa de dividir esses sujeitos em papéis e funções distintas. Para esse
estudo nos ocuparemos da investigação e estruturação a partir da ideia da masculinidade a partir da
visão organizadora fálica biologicista, e a crise dessa estrutura de organização social e como os efeitos
dessa crise se manifestam como sintomas. Para apresentarmos essa ideia recorremos às considerações
feitas por Ceccarelli (2013, p. 9) ao citar Tort (1999):

Os modos de subjetivação são históricos e, para os compreendermos, temos que levar


em conta o discurso que organiza a posição do homem e da mulher nas relações
sociais. A partir daí, podemos pensar que a "crise" atual afeta mais abertamente o
sexo masculino que, mais uma vez sem saída diante da descentralização do falo,
apressa-se em falar em "declínio do poder paterno", ou “declínio do pai”. Mas, de
fato, o que está em declínio é o que, desde tempos imemoriais, tem sido aceito como
única possibilidade de subjetivação: a referência ao falo. A "crise" reflete uma outra
"crise" ainda mais profunda: a da atribuição fálica como organizador social
(CECCARELLI, 2013, p. 9).

Para que possamos situar melhor nosso objeto de estudo, é necessário que antes façamos
um pequeno esforço para contextualizarmos esse homem, ou melhor dizendo, o ideal de masculino.
Essa figura constitui características culturais e aqui compreendemos cultura como uma construção
complexa que abarca conhecimentos, moral, costumes, crenças, leis entre outras formas de
constituição e internalização por parte dos membros de determinada sociedade. Importante citar
também que as culturas têm suas próprias formas de organização. Para tanto precisamos nos centrar
no sistema organizativo ainda existente, delimitando os limites que diferenciam as culturas entre si e
como essa herança cultural é transmitida e sofre manutenção, seja através das instituições familiares,
elites, educacionais e de ordem do estado (VEIGA, 2003).
Mas afinal que crise seria essa? Como essa estrutura organizativa tem falhado em suprir as
necessidades de respostas às demandas contemporâneas? Araújo (2005) nos apresenta as mudanças
estruturais não só na organização social dos papéis que na bibliografia de ordem feminista confere à
palavra gênero um novo sentido de não mais tratar a organização social a partir de uma visão
biologicista, mas o de atribuir o caráter relacional entres entre os sujeitos.
Neste sentido (ARAÚJO 2005; PRATTA & SANTOS, 2007) ainda apontam que no processo
histórico do desenvolvimento da crise à masculinidade hegemônica, o capitalismo em seu
desenvolvimento enfraqueceu a estrutura patriarcal, pois em busca de atender às necessidades do
mercado de trabalho as mulheres aos poucos começaram a ocupar novos lugares no ambiente público
já que o homem não conseguia suprir em sua totalidade seu papel de provedor, além dos movimentos
sociais atribuíram uma categoria relacional baseada nas relações de gênero com a autora ainda
afirmando que:

[...] uma vez que a história das mulheres não pode ser vista separada da história dos
homens. O mundo das mulheres faz parte do mundo dos homens, não são esferas
separadas. Tomá-los como esferas separadas reforça o mito de que a experiência de
um sexo tem muito pouco ou nada a ver com
o outro sexo (ARAÚJO, 2005, p.42).

A crise a qual nos referimos neste trabalho compartilha da ideia de Silva (2005) e Costa (1989)
que entendem que o declínio da masculinidade na contemporaneidade parte de um conflito identitário
vivido pelo próprio homem ao se deparar com um mundo que não se dá mais por papéis fixos e
atividades predefinidas, descentralizando ao mesmo tempo o foco, posição dos homens como os
sujeitos dotados de virilidade, do falo, do sujeito que é detentor do poder.
Siqueira (1997) e Costa (1989) ainda defendem a ideia de masculinidade enquanto construção
de uma identidade caracterizada pela formulação de sistemas representativos na esfera sociocultural
que sofrem ou não manutenção de acordo com o que determinada cultura aprova ou reprova. O
surgimento de movimentos sociais e crises estruturais aos poucos vão questionando e modificando
essa construção, os autores também entendem que para a existência de uma suposta hegemonia essa
foi constituída a partir de construções humanas, sendo portanto suscetíveis também a mudanças e até
mesmo seu declínio.

MÉTODO
Apesar deste estudo ter sido desenvolvido tomando como base uma experiência de estágio
ainda em curso, o mesmo não se propõe a analisar o processo terapêutico em sua totalidade. A
participação do sujeito faz-se mediante aceite prévio relacionado ao uso dedados levantados a partir
do estágio em contrato e condição para participação do processo psicoterapêutico na clínica-escola
do curso de psicologia - NEAP, considerando excepcionalmente a particularidade atual do momento
vivido em decorrência da COVID-19,o paciente foi esclarecido em sessão online sobre as condições
e normas contratuais, com o devido aceite do mesmo.
Considerando o objetivo de compreender como o ideal de masculinidade pode se desenvolver
como um elemento de potencial adoecimento e como a psicoterapia pode contribuir com a
amenização do sofrimento. Através do nosso objetivo geral vimos a necessidade investigar como a
masculinidade foi constituída historicamente, identificar como a masculinidade hegemônica se
constituiu como única alternativa de subjetivação e localizar possíveis pontos de tensão e geração de
sofrimento na dinâmica psíquica masculina a partir de uma experiência de atendimento clínico com
uma posterior verificação de como o processo psicoterapêutico pode contribuir para a saúde mental
de homens frente ao ideal de masculinidade hegemônica.
Optamos por realizar um estudo de caso e selecionar relatórios do referido estágio
correspondentes ao acompanhamento, bem como desenvolvimento do processo de investigação
teórica com base na experiência clínica em psicanálise durante o período 12 de agosto a 11 de
novembro de 2021, totalizando 11 sessões. Após a seleção dos relatórios para análise e respectivas
leituras, efetuamos o agrupamento de elementos comuns que permitiram a criação de categorias para
análise, distribuídas nos seguintes termos: (1) a queixa; (2) seus conflitos; (3) impasses, impressões,
narrativas sobre si. A criação de categorias teve por objetivo agrupar os elementos verbais
relacionados à experiência de Lucas com sua masculinidade e de maneira que o suporte
psicoterapêutico apresenta-se como elemento para lidar com suas questões anteriormente levantadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Lucas apresenta outras questões que compõem seu Eu, mas para que os devidos objetivos
deste trabalho sejam cumpridos nos atentamos aos aspectos relacionados as suas queixas vinculadas
ao lugar ocupado por ele, não desconsiderando outros aspectos, mas para que nós não nos
distanciemos de nosso objeto de estudo faremos esse recorte metodológico.

A queixa
Lucas é um homem negro, cisgênero, de 29 anos, que está em um relacionamento há quatro
anos morando juntos há um, e, embora não tenha registro civil e religioso, ele identifica seu
relacionamento como um casamento, pois partilham de bens e convivem em mesma residência de
aluguel em um munícipio no interior do estado de Minas Gerais. Antes disso, morava no interior do
estado de São Paulo e mudou-se para a região para realização de seu curso em administração. Lucas
atualmente trabalha em dois empregos como vendedor, trabalhando uma média semanal de
aproximadamente 52 horas, pois em um dos empregos ele tem mais flexibilidade de horários,
ocupando a maior parte de seu tempo no emprego com escala comercial de 6x1. O paciente buscou o
atendimento inicialmente com objetivo de se conhecer melhor e entender suas questões, pois possui
planos futuros e sente que algumas questões podem atrapalhar a realização desses projetos.
Desde o primeiro encontro, Lucas apresentou relatos ligados à tensão e obrigatoriedade de
ocupar o papel de provedor da família com os seguintes relatos: "Quando fazemos um compromisso
a gente tem que cumprir"; "Eu como homem, como provedor tenho que assumir o compromisso para
cuidar dela". Podemos notar a partir dessa breve queixa características relacionadas à ideia de família
tradicional, caracterizada por papéis sociais delimitados através da divisão social dos trabalhos,
colocando o homem enquanto responsável pela provisão alimentar-financeira de casa, sendo o
sujeito de autoridade sobre sua esposa e filhos, sendo por vezes o sujeito relacionado a exterioridade,
o mundo. Com a mulher ocupando-se nesse ambiente do trabalho doméstico, alimentação e criação
dos filhos e marido (Torres 2000; Amazonas, Damasceno, Terto & Silva, 2003). Posteriormente
retornaremos à sua queixa, mas precisamos nesse momento entender com mais clareza como seus
conflitos e impressões sobre si influenciam o surgimento da manifestação desse ideal.

Seus conflitos
Lucas tem um certo nível de reconhecimento sobre si e sua relação com a bebida alcóolica
identificando como essa dependência tem se apresentado nociva em sua vida, relatando também a
gênese acontecendo com seu ingresso no ensino superior e intensificação desse uso assim que
ingressou em um trabalho na mesma cidade em que residia, ao ponto de fazer uso do álcool
cotidianamente após o trabalho para conseguir relaxar e dormir, pois sua atividade profissional gerava
grande tensão e estresse, segundo ele o álcool tornou-se presente na sua vida que: "Se está triste
bebe, se está alegre bebe". Relata também como esse vício esteve presente e trouxe efeitos negativos
ao seu relacionamento.
Em seu relacionamento Lucas se queixa de que não ser ouvido, sentir-se oprimido e ignorado,
por sentir sua companheira egoísta e controladora: "tudo que ela pede, eu cedo para evitar situações
de desconforto." ao mesmo tempo em que reconhece que acaba descontando e usando excessivamente
o álcool como um mecanismo motivador para externalização do que anteriormente foi recalcado, o
paciente relata também amnésias decorrentes do uso abusivo e em si mesmo diz:

[...] tem algo dentro de mim que me trava, é algo que já virou rotineiro mecanismo
de defesa..." [...] "as pessoas me escutam, mas eu não sou ouvido. Tá partindo de
um bêbado. Bloqueio emocional? Não sei pq tenho esse bloqueio emocional ainda"
[...] talvez seja esse o suprassumo. O uso abusivo do álcool para se falar enquanto
que em sobriedade não consigo [...]

Na discussão proposta por Galvão (2001) vemos o uso da bebida alcoólica como substância
que após uso excessivo por longos períodos passa a ser responsável pela regulação do organismo em
direção ao princípio do prazer para proteger-se da elevação de tensão, coma dependência alcoólica
ligando-se diretamente à química do corpo, fazendo com que seu dependente busque doses cada vezes
maiores para atingir o fenômeno da embriaguez:

Esse líquido mágico parece transportar-nos a uma situação de prazer, onde os


problemas, as dores e as limitações desaparecem. Aquele lugar ansiado doencontro
com o objeto perdido, situação de plenitude onde nada falta – momento de prazer
primitivo com a mãe. O alcoolista encontra no álcool a química que tamponar sua
falta, o gozo que lhe parece eterno enquanto dura o efeito da droga (GALVÃO, 2001,
p.1).

O relato referente ao uso do álcool como via de escape de seus recalques apresenta- se
fundamental para compreendermos como o paciente buscou estabelecer sua forma de comunicação
com o meio e principalmente dentro da dinâmica do relacionamento, por mais que Lucas reconhece
não ser ouvido nos seus momentos de embriaguez relata sentir-se assim fora deles também. O cliente
no processo terapêutico relata reconhecimento sobre o uso do álcool e malefícios que o mesmo tem
trazido para seus relacionamentos, dizendo que sua última recaída relacionada ao abuso aconteceu no
começo de agosto dizendo em um dos encontros: [...] "Acho que tenho conseguido controlar o álcool,
tenho tido mais consciência [...] Tenho conseguido encarar a realidade como ela é."

Impasses, impressões e narrativas sobre si


Ao aprofundar as investigações sobre Lucas como origem, relacionamentos anteriormente
estabelecidos, estrutura familiar ele traz algumas questões, já no primeiro encontro Lucas relata que
seu passado foi marcado por desamparo e traz a fala: "sempre fui eu sozinho". Nota-se ao decorrer
dos encontros que o paciente faz mais relatos sobre sua solidão e relata ter medo de ficar sozinho, e
para os mesmos posteriormente foi aprofundado essa experiência de estar sozinho, retornamos a
períodos anteriores aos do começo do uso do álcool e relacionamento.
Em um encontro posterior Lucas volta a relatar situações que lhe causam desconforto em seu
relacionamento ao relatar situações relacionadas ao aspecto financeiro familiar ao comparar sua
situação socioeconômica atual com as origens de sua companheira ao fazer uma analogia sobre si
mesmo, já que Lucas tinha potencial financeiro inferior ao de sua esposa, apresentando as seguintes
falas: "Tive que me acostumar com as vacas magras", enquanto sua companheira não teria vivido as
mesmas experiências. Ao retratar esse contraste de realidades Lucas relata sentir-se impotente, mas
não se sente culpado por não ser o responsável por essas diferenças socioeconômicas.
No aspecto familiar Lucas mantém contato e boas relações com seus familiares,
principalmente com sua mãe, mas relata que seu pai foi ausente, e dentro da família seu pai teria
assumido a postura de homem provedor da casa e por esse motivo segundo ele: [...] "sempre tive de
outros homens por exemplo [...] postura de homem que manda em casa [...] macho alfa". Vemos a
partir desse trecho uma característica ainda muito cultuada pela lógica machista a respeito desse
homem que segundo Silva (2005) é caracterizado pelo:

[...] conceito de masculinidade hegemônica está calcado nos modelos tradicionais e


dos predicativos da personalidade do homem, qual seja, “machista, viril e
heterossexual”, do mesmo modo em que este deve apresentar distanciamento
emocional, agressividade e comportamento de risco no seu dia a dia, ou seja, um
homem bem mais próximo dos modelos do cavaleiro medieval, do guerreiro
oitocentista e dos grandes soldados, ao passo que os novos modelos de
masculinidade têm colocado em evidência uma preocupação quanto à redefinição do
papel de pai, marido, amante, trabalhador e cidadão (SILVA, 2005, p. 121).

Vemos que com as mudanças relacionadas ao desenvolvimento do capitalismo, cenário


socioeconômico pós pandemia, que a responsabilidade quando centralizada somente em um sujeito
pode mostrar-se geradora de adoecimento.
Lucas ao falar sobre a ausência de seu pai conta um pouco sobre sua história e ainda diz: [...]
"Eu não posso cobrar do meu pai que ele fosse um bom pai porque ele teve 9 irmãos no interior da
Bahia e seu avô gastava o dinheiro em bordel, quem criou eles foi basicamente sua mãe", além de
relatos de agressão familiar de seu avô contra sua avó e conclui falando a respeito do relacionamento
de seu pai com sua mãe dizendo que o pai se arrepende de coisas que fez e não fez enquanto pai e
marido, e hoje se lamenta pelo casamento ter terminado". É precoce afirmar, mas no decurso das
escutas percebemos como esses campos herdados pela família vem se repetindo na vida de Lucas.
Lucas ficou sem atendimento por aproximadamente um mês, devido ao recesso acadêmico.
Após o retorno, o primeiro encontro pareceu mais significativo a nível de conteúdo para esse
trabalho, em que Lucas apresentou: "Está bom, mas continua a mesma coisa". Neste encontro o
paciente apresentava sinais faciais como olheiras e leve irritação em suas pálpebras, ao ser perguntado
como esteve nesse último período expõe mais detalhes a respeito da experiência que tem vivido nos
últimos tempos ao relatar cansaço físico sobre o excesso da carga de trabalho em decorrência dos dois
empregos e expõe: “Segurar as coisas sozinho está difícil”.
No mesmo período disse que teve uma conversa com sua companheira dizendo que ela
precisaria trabalhar para ajudar nas finanças da casa. Seu relato se faz interessante porque além de
dizer que sua esposa terá que trabalhar, ele buscará as opções para ela segundo sua fala: “Eu estou
avaliando as opções”. Apesar de vermos um certo reconhecimento quanto a busca da divisão do
trabalho e renda doméstica, ainda vemos em Lucas o campo de repetição relacionado ao controle
histórico do homem sobre a mulher denunciado por Ceccarelli (2013).
Lucas se vê como um sujeito com autoestima elevada e extrovertido, mas de alguns meses
para cá, sua autoestima tem se mostrado fragilizada afirmando que precisa melhorar e que algum
aspecto relacionado ao comodismo tem se manifestado na sua estrutura psíquica fazendo com que ele
se sinta assim. Cita ainda o processo psicoterápico como forma de remediação desses sintomas e que
segundo ele o processo tem trazido mais autonomia, trazendo as seguintes falas sobre de si e o
processo terapêutico:

[...] quando a gente tem autoestima você tem mais vontade de fazer as coisas e porque
você tem o controle dos problemas [...] quando você tá com a autoestima lá em cima
as pessoas percebem te respeitam mais [...] não tô no 100% do que era antes, mas tô
melhor [...] eu tenho ficado mais feliz e mais satisfeito comigo mesmo além de relatar
boas perspectivas em seu trabalho e melhor produtividade.

Quando Lucas é questionado a respeito da autonomia ele responde:

[...] preciso melhorar a autonomia na minha casa [...] ter uma vida confortável pra
dar pra minha mulher e pra mim [...] autonomia de ter o controle da minha casa, das
minhas coisas, da minha mulher [...] Não quero ter controle de tudo na minha mão,
mas quero ter mais controle, quero ter a maior parte das ações.

Vemos sempre presente a queixa relacionada à pressão sobre seu lugar dentro da
organização familiar através da pressão por ser o provedor de sua casa. Lucas relatou que sua esposa
tem perspectivas de ampliar a família, gerando filhos, mas Lucas, embora compartilhe da mesma
vontade, entende essa idealização como estressante devido aos esforços e desgastes trazidos pela
responsabilidade familiar de provedor, somando-se aos efeitos negativos do excesso de trabalho em
seu relacionamento que tem afetado inclusive sua vida sexual há aproximadamente três meses.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se a partir deste trabalho inicial que a crise da identidade masculina se faz presente
por apresentar-se naturalmente insuficiente para dar conta das múltiplas mudanças sociais e
econômicas que constituem o contexto contemporâneo, e as diferentes formas de subjetivação e
gênero. O trabalho mostra seu valor ao apresentar mesmo que brevemente as crises e possíveis
padecimentos por uma ideia de masculino linear, em que o papel do homem se dá pela atividade de
sustento familiar podendo em alguns casos levar ao excesso como denunciado neste estudo a respeito
das possibilidades de adoecimento vivenciadas por Lucas.
O processo de psicoterapia ainda está em curso, e muitas questões ainda poderão vir à tona. A
reflexão que fizemos nesse breve trabalho teve por objetivo levantar possíveis elementos pertinentes
a essa grande discussão e somar em torno dessa crise e como o processo psicoterapêutico pode
contribuir para a compreensão desses conflitos e adoecimentos gerados por um modelo de
masculinidade hegemônico que não consegue dar conta de todas as formas de manifestações do
gênero humano e como este gênero se relaciona numa contínua construção de identidade.
Este trabalho nos convida a ir em busca de maiores investigações de ordem prática e mostra a
importância do trabalho terapêutico no apoio ao sofrimento gerado por essa manifestação cultural
chamada de masculinidade hegemônica e como a crise advinda dessa hegemonia tem convocado os
homens a buscarem respostas em si mesmos. A psicologia mais uma vez se vê frente a necessidade de
buscar respostas no singular de cada indivíduo frente às mudanças socioculturais vividas por eles e
nós enquanto pesquisadores de tais mudanças.

REFERÊNCIAS
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24782003000200002.
O CASO MICHELLE: UMA COMPREENSÃO FENOMENOLÓGICA EXISTENCIAL

Isabella da Costa Santos1


Evaldo Batista Mariano Júnior2

RESUMO
Esse artigo aborda a compreensão de um caso clínico sob a ótica da abordagem fenomenológica
existencial de Michelle, uma mulher de 24 anos, solteira, que apresenta demanda acerca de seus
diagnósticos de depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia, além de estar passando por um
relacionamento abusivo com seu namorado Laerte. Como objetivo, essa pesquisa busca compreender
em que período a paciente é oprimida e em que momento é opressora em seu relacionamento afetivo,
a partir da ótica do referencial fenomenológico- existencial, além de descrever os reflexos das
violências sexuais sofridas pelo seu pai na infância, e também analisar como acontecem as
manipulações em seu relacionamento. Os procedimentos metodológicos se basearam em uma
pesquisa qualitativa com ajuda das transcrições das sessões clínicas, além de contar com a abordagem
fenomenológica existencial. Os resultados apontam que a paciente tem vivenciado um
relacionamento abusivo com seu namorado e tem tido experiências de violência desde a infância, com
isso foi possíveluma discussão acerca de seu mundo circundante, próprio e humano. As considerações
finais evidenciam o fato de que a paciente apesar de estar em um relacionamento abusivo e ter
diagnósticos de transtornos que podem lhe causar grande impacto, ela tem conseguido ressignificar
sua história tendo novas vivências e criando novas possibilidades de existência.

Palavras-chave: Estudo de caso clínico; relacionamento abusivo; fenomenologia.

INTRODUÇÃO
Para Gomes e Castro (2010) a prática clínica psicológica é a ciência que estuda e se
compromete com o alívio do sofrimento do indivíduo que está passando por conflitos psíquicos ou
por desordens emocionais. A prática clínica em Psicologia está pautada em um processo de
comunicação em que o profissional, a partir da sensibilidade, escuta atentamenteo paciente, acolhe
e possibilita que o próprio paciente possa se ouvir. É nesse processo de comunicação que teremos o
encontro.

A Fenomenologia e o Existencialismo, bem como o movimento Humanista,


introduziram um novo modo de se conhecer e trabalhar com o ser humano. O
contexto acadêmico atual revela o olhar fenomenológico da Psicologia ao se fazer
ciência. É possível perceber também fortes influências de tais perspectivas na
postura terapêutica e na relação terapeuta-cliente (LIMA, 2008, p. 29).

A terapia fenomenológico-existencial investiga a história de vida de um paciente como em


qualquer outra abordagem, mas ela busca compreender a história de vida além de suas patologias. O

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Mestre docente no Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
sujeito não é reduzido ao diagnóstico, mas a todos os aspectos que compõe a sua subjetividade. Essa
abordagem não nos diz onde e quando o paciente falhou, mas tenta lhe fazer experienciar a sua
totalidade humana e esse objetivo é alcançado quando o terapeuta explora as estruturas espaciais do
mundo de significação do indivíduo e não as estruturas temporais (GOMES e CASTRO, 2010).
Esse artigo apresenta um estudo de caso clínico feito com Michelle, uma mulher de 24 anos
de idade. Os atendimentos aconteceram na clínica escola de uma Universidade do Estado de Minas
Gerais. É importante ressaltar que a paciente a ser relatada encontra-se sob sigilo, portanto,
trabalharemos com um nome fictício, para sua segurança e ética, manteremos apenas sua idade, gênero
e quadro clínico.
O atendimento de Michelle é fundamentado pela perspectiva fenomenológico- existencial, no
qual requer do profissional de psicologia uma busca pela compreensão do homem no mundo e suas
implicações tentando criar possibilidades de existência para esse indivíduo de acordo com as suas
necessidades (LUCZINSKI; ANCONA-LOPEZ, 2010).
No primeiro atendimento, Michelle verbalizou sobre seus diagnósticos de esquizofrenia,
depressão e transtorno bipolar. De acordo com o DSM – V (2013) a depressão se caracteriza por uma
tristeza grave ou persistente interferindo no funcionamento e diminuindo o interesse e o prazer em
certas atividades. Já a esquizofrenia é caracterizada por uma psicose onde há perda do contato com a
realidade, podendo haver alucinações, delírios, discursos e comportamentos desorganizados,
embotamento afetivo, déficits cognitivos e disfunção ocupacional e social. O transtorno bipolar é
conhecido por episódios de mania e depressão que se alternam, alguns pacientes podem ter maior
predominância de um ou do outro.
O esforço da psicoterapia fenomenológico-existencial será devolver Michelle para ela mesma,
a fim de não reduzi-la apenas em seus diagnósticos, visto que, na perspectiva da fenomenologia,
de acordo com Vilella e Alexmovitz (2020) acredita-se que nós lidamos com as nossas heranças que
nos constituem, mas não necessariamente nos dizem respeito na nossa singularidade.
Michelle também relata que mora junto com ele, sua sogra e seus três cunhados que têm
deficiência. Michelle conta que seu namorado é obsessivo com limpeza e a faz limpar a casa todos os
dias. Um dado que nos chamou atenção diz respeito ao fato de Michelle afirmar que não gosta dele,
mas que tem medo de terminar, isso nos mostra uma dificuldade em lidar com as escolhas e
transformações da vida. Contou que tem poucos amigos e que sua autoestima é baixa. A relação com
a mãe é vivenciada a distância, devido residirem em cidades distintas. Outro fato marcante de sua
experiência foram as inúmeras violências sexuais sofridas pelo seu pai dos 6 aos 15 anos de idade.
Frente todas as demandas que Michelle trouxe, foi lhe perguntado o que ela esperava da
psicoterapia, e ela fala que “precisa tomar um rumo para sua vida”, podemos perceber a busca pelo
autoconhecimento e ampliação de consciência dos rumos existenciais a serem vividos.
Ao longo de todas as sessões Michelle fala muito sobre seu relacionamento com o namorado
que chamaremos de Laerte, como isso é um dos assuntos que mais se evidencia em todo atendimento,
nosso objetivo é compreender de que modo essa relação tem contribuído para experiências de
opressão, além de que investigaremos a respeito da troca de papeis entre oprimido e opressor.
Também falaremos a respeito da violência paterna, visto que é um assunto que Michelle também se
mostra muito sensibilizada quando fala.

OBJETIVO
Compreender em que período a paciente é oprimida e em que momento é opressoraem seu
relacionamento afetivo, a partir da ótica do referencial fenomenológico-existencial.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Descrever os impactos das experiências do relacionamento amoroso na saúde mental da
paciente;
Entender como foi a experiência de ter sofrido violência sexual, física e psicológica
pelo pai;
Examinar como acontecem as manipulações emocionais em seu
relacionamento com seu namorado.

MÉTODO
A pesquisa foi feita à luz da fenomenologia existencial de um estudo de caso. Contamos com
o desenvolvimento de pesquisa bibliográfica em artigos científicos e capítulos de livros, feita a partir
de banco de dados online tais como: Scielo, Pepsic, Banco de Teses e Dissertações da CAPES. A
pesquisa foi feita com descritores como: relacionamento abusivo, violência sexual, esquizofrenia,
clínica fenomenológica, fundamentos da fenomenologia.
Esse estudo de caso baseia-se em uma paciente escolhida pelo estágio clínico feito no Núcleo
de Ensino e Aplicação em Psicologia – NEAP na Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade
Ituiutaba que está sob sigilo, sendo contemplada por um nome fictício, mantendo apenas seu quadro
clínico, gênero e idade. Os recursos metodológicos do estágio foram baseados na disponibilidade e
demanda da clínica, da paciente e da estagiária, com horários já pré estabelecidos e atendimentos com
duração de cinquenta minutos, os consultórios variavam de acordo com disponibilidade de uso. As
supervisões de estágio ocorreram uma vez por semana, o que possibilitou a estagiária ampliar a
condução clínica no que tange a escuta terapêutica, acolhimento e compreensões a cerca dos
fenômenos vivenciados na clínica fenomenológica.
Conforme Richardson (1999) a abordagem qualitativa é uma forma adequada para
compreender a natureza de fenômenos sociais. Para o estudo de caso, utilizamos as transcrições das
sessões clínicas, desse modo, trabalhamos, portanto com a abordagem qualitativa, visto que, nosso
objetivo é coletar dados através da narrativa, buscando compreender os fenômenos subjetivos e
particulares da paciente Michelle. Foi possível apreender tais fenômenos: opressão em seu
relacionamento com Laerte; vivência de violência física, emocional e psicológica; desamparo em sua
relação com a mãe.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Aqui será relatado o caso de Michelle, uma mulher de 24 anos, solteira, residente da cidade
de Ituiutaba-MG. Michelle conta em sua primeira sessão que sua busca pela psicoterapia se deu por
conta de seus diagnósticos de depressão, esquizofrenia e transtorno bipolar. Além de estar em um
relacionamento com uma pessoa que não gosta, mas que não consegue terminar por medo de ficar
sozinha e não ter onde morar nem como se manter, visto que ela mora com ele, seus cunhados e sua
sogra. Sua mãe mora em uma cidade vizinha, no caso, ela não gostaria de voltar a morar com sua mãe
por não ter uma boa relação com a mesma, a paciente relata que sempre teve muitas brigas com a
mãe, e que seu pai também não é presente, além de ter sofrido violência sexual, física e psicológica
por ele.
Para Forghieri (1996) o ser humano é um ser-no-mundo, ou seja, existe em relação a algo ou
a alguém, com a compreensão de suas experiências lhes atribuindo significados. Dessa maneira temos
o mundo circundante, mundo próprio e mundo humano, esses dois últimos falaremos ao longo da
discussão. O mundo circundante caracteriza-se pelo determinismo, consiste no relacionamento do
indivíduo com o ambiente, não há como modificar, por isso é preciso adaptação por parte da pessoa,
como forma de melhor relacionar-se. A ação e o controle que o indivíduo pode obter do mundo
circundante é temporária e relativa, por isso, é um gerador de muita angústia pelo fato do ser humano
se ver impotente diante de algumas situações. No caso de Michelle é possível perceber sua angústia
pela impotência de controle do seu mundo circundante.
Michelle conta que foi afastada do seu trabalho por ter brigado com os funcionários e clientes
do local, seu chefe lhe pediu afastamento para se cuidar e ver o que estava acontecendo. Atualmente
entrou com um processo judicial para receber pelo tempo que está parada, porém está encontrando
muita dificuldade nisso, pois o juiz não está aceitando seus laudos onde esclarecem seus diagnósticos,
esse é um dos motivos por ela ficar dependente de seu namorado Laerte, haja vista que Michelle não
tem fonte de renda.
Aqui fica evidente a questão que Michelle tem com seus diagnósticos que apresentamos
anteriormente, de acordo com Andrade (2019) a esquizofrenia normalmente representa uma doença
grave e de deterioração em várias esferas da vida, isso faz com que a sociedade tenha uma visão
negativa das pessoas que são acometidas pelo transtorno. Michelle sempre se diz dependente de Laerte
por não poder trabalhar por causa de seu diagnóstico, pois ela afirma que um dia pode estar bem e no
outro não o que pode ocasionar em uma demissão do trabalho.
É possível perceber que Michelle está com Laerte por dependência financeira e também
emocional, visto que, apesar dela declarar não gostar dele, fica evidente que seu emocional necessita
de alguém para ampará-la e Laerte sempre faz isso, apesar de ser muito abusivo, controlador e
manipulador em diversos momentos, ele também ajuda Michelle a procurar recursos onde possa se
manter sozinha e independente, ao mesmo tempo que ele proporciona independência ele também a
torna dependente dele. Como ela relata ter começado o curso de Agronegócio por incentivo dele, e
agora ele não quer deixá-la trabalhar em uma empresa que tem esse seguimento por ter muitos homens
que trabalham lá.
Segundo Peretti (2013) da antiguidade até os dias atuais a maioria do que foi estruturado sobre
pensamentos e a vida das mulheres, foi feito por homens, os quais enxergam as mulheres como um
reflexo seu. Dessa forma, era muito comum ver mulheres sendo tratadas como objeto de dominação
masculina, e como podemos perceber no relacionamento de Michelle e Laerte, isso acontece
frequentemente, a mulher ainda é vista socialmente como inferior ao homem e como responsável do
cuidado da casa e da família.
Michelle apresentou durante as sessões as brigas vividas com Laerte, toda semana há uma
briga nova, e quase todas pelo mesmo motivo. Os motivos variam entre ele obrigá-la a limpar a casa
e cuidar de seus irmãos com deficiência, ele não deixar ela fazer nada sozinha, não poder entrar em
algum cômodo da casa sozinha com seu celular, ou reclamar que ela está comendo muito e está gorda.
Após todas as brigas Michelle arruma suas malas e fala que vai embora para casa de sua mãe, que
mora em outra cidade. Porém, seu namorado Laerte sempre lhe convence de ficar, lhe dá beijos e
abraços, e as vezes até presentes. O que fica evidente que há manipulação por parte dele, visto que
após lhe tratar muito mal, vai e lhe recompensa com algo bom, se tornando um ciclo de um
relacionamento abusivo.
De acordo com Agostini; Zanin; Moro; Czismoski; Giacometti; Oliveira; Basso e Algeri
(2021) estar em um relacionamento significa possuir laços afetivos e conexões com a pessoa amada,
se baseando em afeto, amor, carinho, respeito e acolhimento, de ambas as partes, porém na maioria
dos casos não é isso que ocorre, se tornando uma convivência marcada por brigas, discussões,
xingamentos e passando assim a se tornar um relacionamento abusivo, onde muitas vezes acontece
pelo excesso de domínio sobre o outro.
Essa questão do domínio e controle sobre o outro reflete muito no relacionamento de Michelle
e Laerte, visto que ela já relatou em sessão que não pode sair de casa sem ele, não pode fazer
academia, não tem amigos, e principalmente, não pode ficar em nenhum cômodo da casa sozinha sem
que esteja fazendo alguma atividade doméstica, pois Laerte acredita que ela irá traí-lo pelo celular.
Apesar de Michelle estar em um relacionamento abusivo com Laerte ela também se comporta
de maneira opressora, invertendo os papeis de oprimida e opressora. Nas brigas, Michelle relata que
em sua maioria ela “surta” e sai quebrando tudo que vê pela frente, as vezes tenta bater em Laerte e
desfere muitos xingamentos, tanto para ele como para seus cunhados e sua sogra.
O mundo humano para Forghieri (2002) se constitui pelo encontro e vivência com o outro,
existir é ser-com o outro. É na relação com seus semelhantes que o ser humano toma consciência de
sua maneira de existir. Algumas pessoas dominam o outro e outras se deixam dominar para não
assumir responsabilidades, essas restringem suas possibilidades de existência. É possível perceber
que o mundo humano de Michelle encontra-se fragilizado, visto que ela está restrita somente às
pessoas que moram com ela, e as pessoas que moram com ela estão em constante conflito, além de
deixar que Laerte a domine e tome suas responsabilidades para ele.
A paciente sempre carrega em suas falas a comparação de Laerte com seu pai “ele parece o
meu pai quando me fala que estou gorda” ou “pelo menos o meu pai me xingava, mas me dava um
espaço pra pensar, o Laerte não me dá espaço”. Aqui é possível ver como a relação com seu pai ainda
se faz presente em suas vivências com seu namorado. Tal como o pai, Laerte também comete
violências.
A violência intrafamiliar, de acordo com Minayo (2008) tem diversos fatores, mas o mais
comum no Brasil são as que submetem a mulher, as crianças e idosos ao pai, marido ou provedor,
colocando a criança sobre domínio e não sobre proteção desse adulto. Isso acontece por diversas
crenças, mas a mais comum e que abarca todas as outras é o machismo estrutural e patriarcal que dá
poder única e exclusivamente ao homem, fazendo com que a mulher seja submissa a ele.
Michelle falou poucas vezes sobre seu pai nas sessões, porém o pouco que contou, percebeu-
se o quanto essa relação de violência a machuca até hoje e a fez construir relações de violência ao
longo de sua vida. Seu pai sempre foi muito rígido com ela desde criança, ela conta que ele a ajudava
com as lições da escola, e que não tinha paciência de lhe explicar as coisas, por isso hoje em dia ela
tem muita dificuldade em interpretação de texto, dificuldade essa que a fez pedir por uma tutora na
faculdade, para lhe ajudar em seus trabalhos. Podemos perceber o quanto Michelle carrega traumas
do seu pai até hoje.
As autoras Penso, Costa, Almeida e Ribeiro (2009) nos apresentam como surge a violência
sexual no âmbito familiar:

A violência sexual incestuosa não ocorre de repente, ao acaso. Não é espontânea ou


imprevisível. Ao contrário, utiliza-se de enredos e cenários gerados nos próprios
processos de construção das subjetividades, nas frestas familiares presentes e
passadas. As condições e a lógica que a produzem vão sendo tramadas e produzidas
ardilosamente no interior dos sujeitos inseridos nas famílias, muitas vezes de
gerações em gerações. Assim, a prática da violência sexual não é improvisada, não
é um acidente. Ela se anuncia, vai sendo tecida de diferentes maneiras, utilizando-
se de códigos sócio-culturais, sinais de ameaças, mensagens de insegurança,
segredos, afetos e jogos psíquicos que, instalados no seio familiar, começam a atuar
orquestradamente ao menor descuido (PENSO, et. al. p. 154).

Nos últimos atendimentos, Michelle tem trazido colocações que é possível perceber sua
imposição a questões que lhe incomodam, como quando seu namorado Laerte lhe chama de gorda,
ela já está conseguindo colocar em palavras para ele e dizer que isso lhe incomoda, apesar de ainda
não conseguir ficar somente nas palavras e iniciar brigas, é importante, pois ela está conseguindo
expressar o que lhe entristece para ele, coisa que antes não conseguia fazer, sempre declarou ficar
calada nesses momentos de agressão verbal.
De acordo com Forghieri (2002) o mundo próprio consiste na relação que o indivíduo
estabelece consigo, podendo ser chamado também de ser-si-mesmo, como consciência de si ou
autoconhecimento. O indivíduo não se reduz a comportamentos que já teve, pois não é estático, está
em um constante vir-a-ser. Michelle demonstra estar conseguindo estabelecer uma maneira saudável
com seu mundo próprio. Ela trouxe nas últimas sessões que tem conseguido fazer um cronograma de
estudos, tem bebido menos para não “surtar”, pois relatou que quando bebia demais brigava com seu
namorado, e também está indo a uma igreja. Declarou um novo desejo de cursar Direito, e
demonstrou muito entusiasmo. Percebemos, portanto, que a paciente está conseguindo acessar e
elaborar conteúdos que antesa paralisavam.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi observado ao longo do relato do caso de Michele, seu relacionamento com Laerte
lhe causa grande instabilidade emocional, seja por questões de autoestima, seja por questões de
autoconfiança. Michele vem de um histórico de violência já desde pequena com seu pai, então
consequentemente é muito comum que ela se relacione com pessoas que também lhe dão o que ela
aprendeu a receber quando criança.
O caso de Michelle é muito sensível e nos conecta com nossa fragilidade. Durante todos os
atendimentos foi preciso muito cuidado e muito acolhimento para que ela pudesse se sentir em um
ambiente de amparo, visto que ela sempre relatou nunca ter tido um refúgio de ninguém durante toda
sua vida, apresentando até que o único espaço em que era ouvida com atenção era no consultório.
Esse amparo e cuidado da estagiária para com a Michelle foi baseado na perspectiva
fenomenológica existencial. Villela e Alexmovitz (2020) nos afirma que a terapia acontece por
esforço tanto do terapeuta como do paciente, em se empenharem para ver alguma coisa diferente
através do mesmo, enxergar novas possibilidades e caminhos, pois para a fenomenologia o homem
só se define com a própria morte, até o último instante há probabilidades de mudanças.
Apesar de todo relato de Michelle ser adverso, em suas últimas sessões ela tem conseguido
ressignificar suas relações com sua mãe e com Laerte, contou que sua mãe lhe visitou e que foi uma
visita prazerosa, diferente da outras vezes onde ela sempre relatava alguma discussão. Michelle
também apresentou que está frequentando uma igreja, e está começando a sentir prazer em estudar,
relatando inclusive seu desejo em começar um curso novo. Também relatou que Laerte vai alugar
uma sala em um shopping no centro da cidade para que ela comece a trabalhar e dessa forma ser mais
independente. Aqui é possível ver que Michelle está conseguindo construir uma relação mais
saudável com Laerte. A terapia fenomenológico-existencial tem ampliado horizontes na vida de
Michelle, porém, é preciso lembrar que o processo terapêutico é lento e gradual.
Dessa maneira, o objetivo da pesquisa foi atingido, visto que pudemos explanar todas nossas
questões faladas em sessões e compreender um pouco mais a respeito de seu relacionamento com
Laerte, seus pais e seus diagnósticos. O que se espera com essa pesquisae de pesquisas futuras é que
possam validar ainda mais o trabalho do profissional da Psicologia e o processo psicoterapêutico
para pessoas que estejam passando pela mesma situação de Michelle.
REFERÊNCIAS
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2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=DKZHFfH-_gw>
O IMPACTO PSICOLÓGICO DA PANDEMIA DA COVID-19 E A CLÍNICA
PSICANALÍTICA

Bárbara Heliodora Oliveira1


Camila Fernandes Araújo 2
Isabella Drummond Oliveira Laterza Alve3

RESUMO
O surgimento do COVID-19 (SARS-Cov-2), trouxe atravessamentos significativos na vida de toda a
população. Além dos sintomas físicos causados pela doença, o aspecto psicológico foi extremamente
afetado pela pandemia interferindo no bem-estar e na qualidade de vida de todaa população. Observa-
se, que, nos anos de 2020 e 2021 houve um crescimento da demanda por atendimento psicológico.
A clínica psicanalítica tem se mostrado bastante eficaz atravésda escuta oferecida pelo analista. No
processo terapêutico, o paciente, através da associação livre, encontra um espaço para ajudá-lo na
escuta e elaboração das dificuldades encontradas. Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo
geral discutir sobre o impacto psicológico causado pela pandemia da COVID -19 e a importância da
escuta psicanalítica como instrumento para o atravessamento desse período. Como objetivos
específicos: compreender como a pandemia tem afetado psicologicamente as pessoas; investigar se a
pandemia modificou de alguma forma o ‘fazer’ da clínica e entender o papel do psicólogo frente ao
impacto emocional gerado pela pandemia. Trata-se de uma revisão de literatura feita a partir de
pesquisa bibliográfica e teve como principais bancos de dados online BVS-Psi, Bireme, Google
Acadêmico, Scielo e Pepsic. Através dos achados na literatura, foi possível perceber que a pandemia
trouxe, para a maioria das pessoas, um grande sofrimento psicológico, no qual inclui sintomas como
ansiedade, depressão, sintomas obsessivo-compulsivos, estresse, dentre outros. Além disso, os
diversos atravessamentos da pandemia culminaram em um cenário diferente e desafiante também
para os psicólogos em seu exercício da profissão, exigindo que estes se adaptem à nova realidade e
façam uso dos atendimentos de maneira remota.

Palavras-chave: Clínica Psicanalítica; pandemia; coronavírus; impacto psicológico.

INTRODUÇÃO
Vivenciamos um período de constante luta a nível global desde 2019 com o surgimento de
um vírus chamado Coronavírus (SARS-Cov-2), inicialmente reportado pela primeira vez na China.
Ele trouxe atravessamentos significativos na vida de toda a população.
Confirmado pela primeira vez em dezembro de 2019 na cidade de Wuhan, o vírus que tem
como sintomas característicos febre, tosse, cansaço, perda de paladar ou olfato, dores de garganta,
dor de cabeça, diarreia, problemas respiratórios, dores no peito, dentre outros, teve um crescimento
exacerbado por todo o mundo, obrigando a população a seguir medidas restritivas bastante severas,

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Mestre docente do Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
dentre elas isolamento social, distanciamento, uso de máscaras e álcool 70% e em géis constantes
para que o contágio não crescesse mais do que já tinha ocorrido (SCHMIDT, et. al. 2020).
Além dos atravessamentos físicos significativos, segundo Schmidt, et. al. (2020) estudos têm
sugerido que o medo de ser infectado por um vírus potencialmente fatal, de rápida disseminação,
cujas origens, natureza e curso ainda são pouco conhecidos, acaba por afetar o bem-estar psicológico
de muitas pessoas. Sintomas de depressão, ansiedade e estresse diante da pandemia têm sido
identificados na população geral (Wang et al., 2020 apud SCHMIDT, et. al. 2020) e, em particular,
nos profissionais da saúde. Ademais, casos de suicídio potencialmente ligados às implicações
psicológicas da COVID-19 também já foram reportados em alguns países como Coreia do Sul (Jung
e Jun, 2020 apud SCHMIDT, et. al. 2020) e Índia (GOYAL et al., 2020 apud SCHMIDT et al, 2020).
Os impactos psicológicos e físicos da pandemia tem de fato interferido no bem-estar da
população. Pode-se notar, de acordo com Schmidt, et. al. (2020) que, a demanda psíquica tem tido
crescimento nas redes de atenção básicas de saúde e nos consultórios, criando novos desafios para os
profissionais de saúde dessa área
Os psicólogos tem enfrentado grandes desafios, segundo Faro et.al. (2020) frente a clínica
psicológica. A alta demanda de casos nos consultórios, a exigência rápida de resolução de problemas
por parte dos pacientes diante de casos intensos de ansiedade, depressão, ataque de pânico, transtornos
obsessivos compulsivos, fobias sociais, dentre outros advindos da pandemia, além dos desafios de
atender presencial com as restrições impostas pela OMS (Organização Mundial de Saúde) no ano de
2020 e o surgimento de uma modalidade pouco usada na clínica antes da pandemia, mas que hoje se
torna a ferramenta mais utilizada: o uso da ferramenta online, para o combate a este momento tão
desafiador (SCHMIDT, et. al. 2020).
Na clínica, em especial na clínica psicanalítica, uma das ferramentas ao enfrentamento aos
atravessamentos da pandemia, que tem se mostrado mais eficazes tanto no atendimento presencial
como remoto é o poder da escuta. É na escuta que todo o processo terapêutico acontece, quando o
paciente se comunica com o analista, ele diz muito mais que aquilo que está no consciente, o
inconsciente procura por meio da associação livre, atos falhos, dentre outros expressar seus desejos.

A importância da escuta na psicanálise vai se evidenciando na medida em que


percorremos os textos freudianos. As recomendações da técnica, assim como os
desenvolvimentos teóricos, apontam sempre para a preocupação de Freud de que a
psicanálise não perca o que a diferenciava das demais possibilidades terapêuticas: o
valor dado ao autoconhecimento e à liberdade pessoal. O que visa ser escutado na
psicanálise resulta em uma psicanálise da escuta. Os lapsos, os sonhos, as repetições,
os sintomas; enfim, as formas de subjetividade – livres de uma classificação ou de
rótulos – abrem espaços de singularidade (MACEDO E FALCÃO, 2005, p. 72).

Desse modo, apesar dos contratempos advindos da pandemia, a clínica tem se mostrado
eficaz, oferecendo modelos contemporâneos de intervenções adaptativos a atual situação, na qual
promove um olhar ativo as subjetividades de cada ser humano advindos da pandemia do Coronavírus.

A psicanálise assim vem a oferecer um modelo contemporâneo de intervenção


através da escuta aplicando um olhar profundo à individualidade do ser humano,
naqueles aspectos que fogem ao controle voluntário e consciente, de um fenômeno
crítico como a pandemia do covid-19. É um intérprete do espírito do tempo, da
angústia provocada pelo desamparo original e pela convivência social, cujas
linguagens driblam experiências subjetivas relacionadas ao isolamento, manifesto
em sintomas de ansiedade, irritabilidade, intolerância, apatia, angústia e surto, entre
outros tantos sintomas. Tocar incondicionalmente a origem do sofrimento, faz do
psicanalista um demiurgo ‒ um artífice que trabalha para o público ‒ em busca de
cura, salvação e sentido. Escutar sem julgar, sem dar razão nem negar. Diante do
mal-estar manifesto no sintoma, indo além na busca pela verdade inconsciente do
ser humano, devolvendo a este, sua dignidade pessoal, política e moral
(DROGUETT, 2020, p, 29).

OBJETIVOS
Objetivo Geral
Discutir sobre o impacto psicológico causado pela pandemia da COVID-19 e a importância
da escuta psicanalítica como instrumento para o atravessamento desse período.

Objetivos Específicos
Compreender como a pandemia tem afetado psicologicamente as pessoas;
Investigar se a pandemia modificou de alguma forma o ‘fazer’ da clínica psicológica;
Entender o papel do psicólogo frente ao impacto emocional gerado pela pandemia.

MÉTODO
A metodologia utilizada neste artigo foi a revisão bibliográfica e teve como principais bancos
de dados online BVS-Psi, Bireme, Google Acadêmico, Scielo e Pepsic, seguindo também as normas
e orientações propostas pela supervisão de estágio em psicologia.
A revisão bibliográfica produz conhecimento atualizado sobre determinado problema. Essa
modalidade de pesquisa é norteada por fases distintas: elaboração da questão; estabelecimento da
estratégia de busca na literatura; seleção de estudos com base nos critérios de inclusão; leitura crítica,
e análise dos textos norteadores do trabalho e interpretação dos dados colhidos através de referências
sobre o assunto discutido (GIL, 2008).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sabe-se que a principal recomendação para se tentar evitar ao máximo a propagação do
coronavírus foi o isolamento social. Este, por sua vez, é motivo de grande mudança no estilo de vida
da população de modo geral. Essa mudança radical de impossibilidade de contato físico, por si só, já
trouxe um grande sofrimento psicológico às pessoas, e quando somado com o medo da contaminação
do vírus, as incertezas das consequências a longo prazo, o sofrimento físico da doença, entre outros
aspectos, acaba trazendo para grande parte das pessoas um prejuízo muito grande na saúde mental.
Além dos aspectos acima citados, alguns outros fatores como a imprevisibilidade em relação
à duração da pandemia, as consequências da mesma na vida das pessoas, e até mesmo a gravidade da
própria doença são também fontes de risco para a saúde mental da população (SCHMIDT, et al.,
2020).

Estudos sobre implicações na saúde mental em decorrência da pandemia do novo


coronavírus ainda são escassos, por se tratar de fenômeno recente, mas apontam para
repercussões negativas importantes. Além disso, pesquisas anteriores sobre outros
surtos infecciosos revelaram desdobramentos desadaptativos, em curto, médio e
longo prazo, para a população geral e para os profissionais da saúde Por exemplo, na
epidemia de Ebola de 1995, os sobreviventes relataram principalmente medo de
morrer, de infectar outras pessoas, de se afastar ou sofrer abandono nas relações com
familiares e amigos, bem como estigmatização social (SCHMIDT, et. al. 2020, p. 4)

Outros achados sobre as repercussões negativas da pandemia, ainda de acordo com os autores
Schmidt, et al. (2020) referem-se às crianças e adolescentes terem um maior risco de sofrerem
violência em casa devido ao fechamento das escolas, principalmente no que se refere àquelas que
possuem uma maior vulnerabilidade socioeconômica, que com o fechamento inclui redução do acesso
à alimentação e programas recreacionais, e os pais e responsáveis por essas crianças e adolescentes
tendem a desenvolverem um maior estresse e medo, principalmente em relação à condição de
subsistência da família, o que pode reduzir a capacidade de tolerância levando a um aumento do risco
de violência; é possível notar também um maior risco de violência contra as mulheres no período de
isolamento social, uma vez que ficam mais suscetíveis aos agressores devido ao confinamento.
Segundo Taylor (2019), Bao et al. (2020), Li et al. (2020) citados por (Schmidt, et al., 2020),
afora a população geral, profissionais da saúde também costumam experienciar estressores no
contexto de pandemias, a saber: risco aumentado de ser infectado, adoecer e morrer; possibilidade de
inadvertidamente infectar outras pessoas; sobrecarga e fadiga; exposição a mortes em larga escala;
frustração por não conseguir salvar vidas, apesar dos esforços; ameaças e agressões propriamente
ditas, perpetradas por pessoas que buscam atendimento e não podem ser acolhidas pela limitação de
recursos; e afastamento da família e amigos. Sobre a COVID-19, em particular, os desafios
enfrentados pelos profissionais da saúde podem ser um gatilho para o desencadeamento ou a
intensificação de sintomas de ansiedade, depressão e estresse, especialmente quando se trata daqueles
que trabalham na chamada “linha de frente”, ou seja, em contato direto com pessoas que foram
infectadas pelo vírus).
Essas questões podem acabar levando as pessoas a desenvolverem sintomas, tais como
estresse, sensação de perda de controle e desvalorização, sintomas obsessivo-compulsivos (como
verificar repetidamente a temperatura corporal, entre outros), preocupação excessiva com o tempo de
duração da pandemia, ansiedade, depressão, interpretação de forma equivocada das sensações
corporais (levando às pessoas a confundirem os sintomas e sinais das doenças e consequentemente se
expondo de forma desnecessária ao ambiente hospitalar – fonte de grande propagação de doenças)
(SCHMIDIT et al., 2020).
Os autores Serafim, et.al. (2021) realizaram um estudo com o objetivo de verificar a
prevalência de sintomas de ansiedade, depressão e estresse, assim como também a utilização de
estratégias de enfrentamento e de adaptação de comportamentos frente às medidas da quarentena.
Foram aplicados 108 questionários na população de todo o Brasil, através da plataforma Google
Forms. Os resultados mostraram que 46,4% dos participantes apresentaram sintomas de depressão,
39,7% ansiedade e 42,2% estresse, e em relação às estratégias de enfrentamento, 61,3% relataram
aumento nas horas de sono, 40,8% perceberam aumento na ingestão de alimentos, álcool, tabaco,
drogas e medicamentos.
Além disso, os autores Serafim, et.al. (2021, p.10) trazem também que

De acordo com a fundação do DASS, a presença de sintomas depressivos está


associada à desesperança, baixa autoestima e baixo incentivo. Assim, já que a
ansiedade está associada à hiperestimulação fisiológica e ao estresse, que é um
estado emocional que varia de acordo com a avaliação do indivíduo de situações
vivenciadas como uma ameaça, dano ou desafio, juntamente com aumento da
irritabilidade e limitação da frustração. A presença de sintomas depressivos,
ansiosos e de estresse pode, em algum momento, causar alterações emocionais ou
fisiológicas no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA), por exemplo, conforme
destacado em estudos anteriores.

Outro dado interessante nesse mesmo estudo, é que participantes entre 18 e 30 anos
apresentaram uma frequência maior de depressão e ansiedade com níveis leves a extremamente
graves e moderados a extremamente graves quanto ao estresse. Vale ressaltar que participaram do
estudo pessoas com idade entre 18 e 82 anos, tendo sido a maioria mulheres e pessoas casadas.
As mulheres em muitas culturas assumem responsabilidades excessivamente
amplas: além de seu papel profissional, muitas vezes acabam no centro das tarefas
domésticas e do cuidado das crianças. Além disso, deve-se notar que entre as
mulheres, há uma alta prevalência de violência e abuso, que foi exibida em outras
epidemias, como os surtos de vírus Ebola e Zika em 2013–2016 e 2015–2016,
respectivamente. (SERAFIM, et. al., 2021, p. 10).

Os autores Serafim, et.al. (2021) ainda sugerem que diante da atenção básica de saúde, um
interessante meio de promoção de saúde e prevenção de doença seria intervenções breves, no que se
diz respeito ao uso direcionado de técnicas de comunicação e solução de problemas que possam ser
capazes de estimular a população a adquirir hábitos de vida mais seguros e saudáveis, além disso, em
relação ao âmbito psicológico, e a necessidade de políticas públicas de saúde que valorizem o
incentivo e promoção dos cuidados psicológicos também, sugerindo programas que incluem o
estímulo e ensino de técnicas de redução de ansiedade e estresse, já que os danos à saúde mental
frente à pandemia são bastante sugestivos.
O autor Drouguett (2020) afirma que: “Toda crise implica a possibilidade de reinvenção e
convida a explorar conceitos e princípios a partir da clínica, da literatura e da cultura nas suas diversas
manifestações e representações vindas à luz” (p. 16). Diante disso, o autor ressalta que todo o
isolamento necessário durante a pandemia não deve ser motivo para interromper um processo de
análise, e que é necessária então uma reinvenção da forma como a clínica se faz. Há tempos vem
acontecendo discussões no campo freudiano no que se diz respeito às possibilidades do tratamento
psicológico acontecer de outras formas - e não apenaspresencial na clínica - como vídeo-chamadas,
lives, entre outras formas. Esses modos alternativos dão suporte ao lado subjetivo em um momento
atípico como este, no qual o contato físico representa um risco.
Diante de todo exposto relacionado ao sofrimento psíquico causado pela pandemia, o
acompanhamento psicológico faz-se extremamente necessário e deveria ser medida básica de saúde
para todos, de modo a oferecer suporte psicológico e apoio para todos aqueles que foram
psiquicamente afetados (DANZMANN et al., 2020).
Os autores Danzmann et al. (2020) trazem que os efeitos psicológicos da pandemia podem
não se restringir somente ao momento do cenário atual, mas podendo perdurar até mesmo após,
existindo um quadro pós-traumático, no qual muitas pessoas ainda podem ter um sofrimento
psíquico/psicológico muito grande.
Todo esse momento traumático que trouxe a interrupção da realidade socialmente construída
e, em consequência, a produção de uma outra realidade que é precária e incerta, acaba por fazer com
que esse fator traumático encontre várias respostas psíquicas e obrigue o analista a ficar à altura dos
efeitos dos traumas gerados, na clínica – podendo ser na esfera privada ou no espaço social
(DROUGUETT, 2020).
Diante disso, ressalta-se aqui a importância da clínica psicanalítica nesse momento atual, que
segundo Drouguett (2020): “A questão que convoca a psicanálise no exercício nobre da sua escuta
sempre atual está relacionada com a acolhida à dor e à incerteza do indivíduo, nos seus modos de
sentir, pensar e agir perante o fenômeno que tomou conta do planeta” (p. 27). A psicanálise oferece
uma escuta e um olhar profundo à individualidade de cada um, no que se refere aos aspectos que saem
do controle voluntário e consciente, de um acontecimento crítico como a pandemia.

É um intérprete do espírito do tempo, da angústia provocada pelo desamparo


original e pela convivência social, cujas linguagens driblam experiências subjetivas
relacionadas ao isolamento, manifesto em sintomas de ansiedade, irritabilidade,
intolerância, apatia, angústia e surto, entre outros tantos sintomas. Tocar
incondicionalmente a origem do sofrimento, faz do psicanalista um demiurgo ‒um
artífice que trabalha para o público ‒em busca de cura, salvação e sentido. Escutar
sem julgar, sem dar razão nem negar. Diante do mal-estar manifesto no sintoma,
indo além na busca pela verdade inconsciente do ser humano, devolvendo a este, sua
dignidade pessoal, política e moral (DROUGUETT, 2020, p. 29).

Por fim, a clínica psicanalítica é tão importante no cenário atual pois se impõe com a proposta
da honradez e da responsabilidade, que representam amor, lealdade, compreensão, fraternidade e
também a dignidade que cada indivíduo vai em busca quando se encontra em meio à crise e ao caos,
além também de trazer à tona para o sujeito a consciência do sofrimento e o destino sustentável
comum a todos, que são justamente os aspectos que podem vencer as limitações impostas pela
pandemia. Portanto, sair de toda essa situação para o psicanalista refere-se a uma questão ética e de
responsabilidade com a condição humana que não recua para a angústia ou para sofrimentos nos quais
o indivíduo tem de se reinventar na construção social de outras novas narrativas que possam lhe trazer
bem-estar, saúde e felicidade (DROUGUETT, 2020).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização deste estudo ressalta a importância de se falar sobre a pandemia e suas
implicações tanto na vida da população como nas mudanças ocorridas no atendimento psicológico
(que também se faz necessário mediante ao intenso sofrimento causado pela atual situação em que
estamos), ou seja, permitiu que pudéssemos observar que desde o surgimento da pandemia a
população tem sofrido atravessamentos significativos como: sintomas físicos, psicológicos,
isolamento social, mudanças bruscas de rotina e cuidados pessoais, luto, instabilidades financeiras,
dentre outros. E isso culminou em um cenário diferente e desafiante para os profissionais de saúde
mental, fazendo com que os mesmos se adaptassem para que pudessem oferecer bem-estar aos
pacientes, disponibilizando um atendimento digno e acolhedor mediante todas a restrições e
problemas provocados pelo Coronavírus.
Na clínica psicanalítica em específico, considera-se, através do presente trabalho que o poder
da escuta proporciona além do acolhimento, modos de compreensão do indivíduo onde o mesmo
entra em contato com a consciência dos impactos causados pela pandemia e constróicom a ajuda do
analista modos de ressignificação de seu sofrimento psíquico, ajudando o paciente no que diz
respeito aos seus sentimentos, pensamentos e ações resultantes dos problemas citados ao decorrer do
trabalho.
Entende-se que esse estudo não cessou com toda a problemática derivada dos objetivos da
pesquisa, mas foi possível fornecer um importante panorama de como têm se construído as produções
científicas de posicionamento crítico e reflexivo sobre as realidades contemporâneas do coronavírus.
Assim, faz-se necessário que a Psicologia se dedique mais à essa complexidade trazendo mais
produções científicas acerca dos impactos psicológicos da pandemia e como a clínica psicanalítica
tem manejado essas questões.

REFERÊNCIAS
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coronavírus. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/leituraflutuante/article/view/50416.
Acesso em: Nov. de 2021.

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Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/307/30715905.pdf. Acesso em: Nov. de 2021.

SCHMIDT, B. et. al. Saúde mental e intervenções psicológicas diante da pandemia do novo
coronavírus (COVID-19). Disponível em:
https://www.scielo.br/j/estpsi/a/L6j64vKkynZH9Gc4PtNWQng/?lang=pt&format=pdf. Acesso em:
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SERAFIM, A. P. et. al. Estudo exploratório sobre o impacto psicológico do COVID-19 na


população rasileira em geral. Disponível em:
https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0245868. Acesso em: Nov. de
2021.
TÉCNICAS PARA O MANEJO DE ANSIEDADE NA CLÍNICA PSICOLÓGICA: UM
RELATO DE EXPERIÊNCIA

Carla Arielle de Oliveira Severino 1


Kellyane Sousa Resende2
Priscila Queiroz Messias3
Ana Carolina Rimoldi de Lima4

RESUMO
O presente trabalho trata-se de um relato de experiência sobre a prática de estágio supervisionado em
Psicologia Clínica que se deu sob a perspectiva da Terapia Analítico- Comportamental em associação
com outros modelos terapêuticos empiricamente sustentados para o manejo de ansiedade. Conforme
dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), questões relacionadas à ansiedade tem sido uma
constante na vida dos brasileiros, de modo que essa demanda tem sido cada vez mais levada aos
espaços de serviço em saúde mental. Consonante a isso, a mesma demanda foi frequentemente
identificada nas queixas dos clientes usuários do NEAP – Núcleo de Estudos e Aplicação em
Psicologia – local em que o presente estágio foi realizado pelas três alunas que produziram esse relato.
A proposta deste artigo é, então, a de mostrar as intervenções terapêuticas utilizadas diante das
demandas associadas à ansiedade por parte dos clientes, bem como os resultados percebidos até aqui,
tendo em vista que o estágio ainda não foi encerrado e que essas pessoas permanecem em
acompanhamento. Esclarecido isso, é possível constatar, com a prática clínica, que as intervenções
aqui mencionadas cumprem com seu propósito, verdadeiramente contribuindo para a diminuição do
sofrimento dos usuários dos serviços da clínica-escola, além de contribuírem para que o indivíduo,
com o treino, consiga lidar com o que lhe é aversivo sozinho e apenas não em dependência do
acompanhamento profissional.

Palavras-chave: Ansiedade; transtornos de ansiedade; psicoterapias empiricamente sustentadas;


terapia analítico-comportamental.

INTRODUÇÃO
A ansiedade está sendo um tema presente tanto no cotidiano quanto nos consultórios clínicos
de psicologia e, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil tem o maior
número de pessoas ansiosas no mundo: 9,3% da população, sendo considerado uma epidemia no país
(ESTADÃO, 2019). Além disso, estima-se que 30% das pessoas sofrerá de ansiedade em algum
momento ao longo da vida (LEAHY, 2011).
Segundo a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Mestre docente Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
V), os transtornos de ansiedade compartilham características de medo e ansiedade de forma excessiva
e incluem perturbações comportamentais relacionadas a isso. Enquanto o medo é a resposta
emocional dada à ameaça iminente real ou percebida, a ansiedade é a antecipação futura de uma
ameaça, sendo a ansiedade mais associada a tensão muscular e vigilância para preparação de perigo
futuro (APA, 2014).
No entanto, a ansiedade é uma resposta adaptativa e que permitiu a evolução da nossa espécie
por ter como função a preservação da vida, mas se torna um problema quando sua resposta é
exagerada e desadaptativa frente a algum estímulo. De acordo com Leahy (2011), precisamos
entender que a ansiedade é uma herança biológica e que era muito adaptativa para nossos ancestrais
que viviam em um mundo com muitos perigos que ameaçavam suas vidas, sendo que o medo tinha
função protetora nesse contexto. Porém, não vivemos mais nesse mundo primitivo, mas nosso cérebro
continua a funcionar como se ainda fosse igual e, desse modo, os medos que trouxemos com essa
herança nem sempre são adaptativos, já que os desafios encontrados nos dias atuais são bem diferentes
daqueles que os nossos ancestrais viviam. Por isso, quando falamos em transtorno de ansiedade,
estamos falando de uma condição que afeta profundamente a qualidade de vida do indivíduo, que traz
prejuízos e que causa impacto sobre a vida.
Há muitas variações sobre a definição do conceito de ansiedade no viés Analítico-
Comportamental, mas existe um consenso a respeito da importância atribuída a uma sinalização de
um estímulo aversivo por um estímulo pré-aversivo, considerando sua função que elicia respostas
fisiológicas e que constrói redes de relações mais ou menos complexas definindo a ansiedade de um
indivíduo (COÊLHO; TOURINHO, 2008).
Segundo Queiroz e Guilhardi (2001), a ansiedade pode ser definida como o estado corporal
sentido sob as condições de sinalização de um estímulo que apresenta um estímulo aversivo e que
não há comportamento de fuga ou esquiva disponível, fazendo com que a presença do estímulo pré-
aversivo produza supressão de comportamentos operantes vigentes (como não conseguir fazer algo
diante da situação).
Quando a queixa de ansiedade chega no contexto clínico, é papel do psicólogo ajudar o
cliente a compor o padrão completo da ansiedade em sua vida, descrevendo os estímulos
antecedentes (sinalizador) e os consequentes, além de identificar como esses eventos aversivos
adquiriam essa função a partir da história de contingência e por qual motivo o cliente não possui
repertório eficaz de fuga e esquiva. O terapeuta, então, irá atuar ajudando o cliente a discriminar
melhor os estímulos e modelando as respostas diante dos mesmos (QUEIROZ; GUILHARDI, 2011).
Levando em consideração a prevalência da ansiedade no país e entendendo que o contexto
pandêmico acarretou um maior número de queixas relacionadas à ansiedade no gerale chegando aos
consultórios clínicos, mostra-se relevante entender como a ansiedade atua nos indivíduos de acordo
com sua história de reforçamento e contingências atuais em vigor, como isso chega na clínica
psicológica e a importância de saber atuar com essa demanda através de técnicas e ferramentas que
possam ajudar o cliente a ampliar o seu repertório e conseguir mudar contingências para ter uma
resposta mais adaptativa à ansiedade.

OBJETIVO
O presente artigo possui o objetivo de reunir as principais ações interventivas aplicadas no
contexto da ansiedade a partir da experiência de atuação clínica no decurso da disciplina de Estágio
Supervisionado, tendo as atividades sido realizadas junto ao Núcleo de Estudos e Aplicação em
Psicologia (NEAP). Este trabalho tem por objetivo geral, portanto, realizar uma descrição sucinta das
principais intervenções comumente adotadas pelas três estagiárias (autoras deste trabalho) no manejo
da ansiedade em contexto clínico, de forma que possa servir de subsídio para o norteamento de futuras
ações psicoterapêuticas.
Nesse sentido, este trabalho trás os seguintes objetivos específicos: 1) Contribuir coma
construção de conhecimento na área da psicologia clínica, 2) fomentar reflexões sobre a realidade
clínica na condução do manejo da ansiedade, buscando amparo na teoria, e 3) promover a integração
entre teoria e prática.

MÉTODO
O presente trabalho trata-se de um Relato de Experiência que, segundo Daltro e Faria (2019),
é uma possibilidade de criação de narrativa científica em que a experiência é o objeto de análise e
que proporciona a produção em campos de pesquisas que englobam os processos subjetivos, como é
o caso da Psicologia.
O relato se deu a partir das experiências vividas por um grupo de estágio em processos clínicos
do curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba. O estágio
foi realizado no Núcleo de Estudos e Pesquisa em Psicologia (NEAP) entre junho e novembro de
2021. O grupo de estagiárias era composto por 3 alunas do último ano do curso e 1 professora
orientadora de Estágio Profissionalizante.
Os atendimentos clínicos eram realizados com os clientes 1 vez por semana e tinham duração
de 50 minutos. A partir das demandas de ansiedade trazida por esses clientes, foram utilizadas
técnicas de intervenção sob o viés das Psicologias Baseadas em Evidências, como a Terapia
Analítico-Comportamental (TAC), Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e Terapia de
Aceitação e Compromisso (ACT).
As principais intervenções utilizadas foram reunidas para compor esse relato com o intuito de
descrever e apresentar técnicas que auxiliaram o fazer clínico no percurso do estágio diante da
demanda de ansiedade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na prática clínica, os primeiros encontros com os pacientes foram dedicados à avaliação
inicial e coleta de informações por meio de entrevistas de anamnese e observação clínica. Através
disso, foi possível identificar a história passada e atual, aspectos contextuais históricos e atuais mais
relevantes, a história médica, afetiva, profissional e educacional, sintomatologia e queixa inicial, bem
como os aspectos biológicos, genéticos e recursos sociaise pessoais mais relevantes.
A partir do conhecimento inicial sobre os pacientes e suas queixas, foram avaliados os
sintomas, seus desencadeantes (eventos que levam a respostas de ansiedade), as cognições, as
respostas emocionais e estratégias de enfrentamento tipicamente empregadas. A partir deste conteúdo
investigado nas sessões iniciais e as análises funcionais moleculares e molares, foi construída a
formulação comportamental de cada cliente, a qual seguiu sendo reformulada ao longo das sessões e
forneceu subsídio para o emprego das intervenções realizadas.
Dessa forma, as entrevistas voltadas para a investigação, identificação e conhecimento de
variáveis relevantes auxiliaram na formulação de hipóteses e no direcionamento inicial de ações
interventivas, cujo intuito foi o de ensinar estratégias de apaziguamento da ansiedade excessiva por
meio da percepção, avaliação, flexibilização e aceitação (na perspectiva da Terapia de Aceitação
e Compromisso - ACT) de pensamentos que acompanham e reforçam o estado ansiogênico, assim
como através do treino de estratégias de enfrentamento e resolução de problemas, para o manejo dos
eventos ambientais relacionados à experiência de ansiedade. A psicoeducação (WRIGHT et al.,
2018) esteve presente em todo o processo terapêutico e consistiu em uma série de intervenções
didáticas que possuíram por objetivo central instruir, orientar e informar ao paciente quanto aos seus
sintomas, às emoções e suas funções e quanto às relações de dependência entre eventos ambientais-
pensamentos-emoções- comportamentos. Nesse sentido, a ênfase foi dada na definição e
clarificação da fonte dossintomas de ansiedade, na função evolutiva da mesma na nossa espécie
e seus potenciais benefícios e malefícios causados, introduzindo o papel dos pensamentos e da
evitação (comportamentos de fuga e esquiva) na manutenção dos respondentes aversivos, como
hiperventilação, tensão muscular e taquicardia. A psicoeducação foi aplicada nas sessões iniciais e
permanece sendo utilizada durante todo o processo, até o momento, sempre que se faz pertinente.
Para a abordagem psicoeducativa da ansiedade, diversos recursos foram utilizados, como
vídeos, séries, explicações verbais e outros documentos instrucionais. Foi possível constatar que os
pacientes obtiveram avanços significativos no que diz respeito à percepção e discriminação de
pensamentos, emoções e comportamentos, e ainda começaram a compreender seu funcionamento a
partir de uma perspectiva mais realista e funcional.
O registro de pensamentos disfuncionais – RPD (BECK, 2013) também foi uma das
estratégias adotadas para promover o treino de descrição de relações contexto- comportamento-
consequências e desenvolver repertório verbal detalhado a partir do contato com as contingências.
Este exercício, explorado nas sessões e posteriormente em ambiente natural, viabilizou o
automonitoramento, o relato de eventos que fossem associados à ansiedade e a identificação de
pensamentos automáticos, sentimentos e comportamentos decorrentes. Opções para o RPD foram
sugeridas, como aplicativos de celular, nos quais era possível anotar os pensamentos e sentimentos
apresentados em situações geradoras de ansiedade.
Knapp e Beck (2008) definem o RPD como sendo um aliado para rastrear os pensamentos,
percepções, sentimentos e comportamentos de enfrentamento a partir de situações estimuladoras.
Além disso, os autores afirmam ser o RPD eficaz na capacitação dos pacientes para encontrar erros
cognitivos, desmistificar e modificar avaliações disfuncionais e atingir uma compreensão mais
racional dos eventos.
Uma vez que identificar os padrões de pensamentos e comportamentos que acompanham e
mantêm a ansiedade, permite melhor entender as contingências e as modificações necessárias
(GREENBERGER; PADESKY, 2016), essas estratégias se mostraram importantes para dar início às
técnicas de solução de problemas e ativação comportamental, onde, para os problemas passíveis de
mudança, os pacientes eram sistematicamente questionados e estimulados a pensar maneiras
alternativas de resolvê-los. De acordo com Rangé (2011), o treinamento em resolução de problemas
habilita o paciente a responder eficazmente em situações problemáticas, a reconhecer respostas mais
eficientes e a escolher aquela que parece mais adaptada às variáveis de cada tipo de situação, ao
mesmo tempo em que lida com a ansiedade, ao invés de se engajar em comportamentos de esquiva.
A aplicação de treinamento em habilidades sociais – THS (DEL PRETTE e DEL PRETTE,
1999) e do treinamento em assertividade também contribuiu para o desenvolvimento de um
repertório de estratégias orientadas à resolução de problemas dentro e fora da sessão, revertendo
padrões rígidos de evitação motivadas pela vivência da ansiedade. Os pacientes foram modelados e
instruídos a expressar seus desejos e sentimentos, dizer não, fazer pedidos, delegar responsabilidades,
reconhecer e requerer seus direitos e deveres nas relações interpessoais, dentre outros
comportamentos protetivos.
No intuito de questionar e minorar preocupações excessivas e distorcidas (comuns em quadros
com sintomatologia preponderantemente ansiosa), interpretações errôneas, construir alternativas
menos tendenciosas e flexibilizar as regras e crenças centrais, a reestruturação cognitiva foi
trabalhada por meio de algumas técnicas além do RPD, tais como: questionamento socrático,
identificação de vantagens e desvantagens dos pensamentos e descatastrofização.
Enquanto ferramenta utilizada durante as sessões, o questionamento socrático
(KACZKURKIN; FOA, 2015) consistiu na exploração aprofundada e cooperativa de temas de difícil
acesso, no exame dos significados atribuídos aos eventos, e avaliação crítico-reflexiva das
consequências de pensamentos e/ou comportamentos, auxiliando na sua modificação (BECK, 2013).
Já o exame de vantagens e desvantagens consistiu na identificação de pensamentos-chave e de
evidências tanto que os apoiam quanto contrárias a esses pensamentos, permitindo a constatação
de contradições/incoerências e a descoberta de vias de pensamento mais produtivas e adaptativas
àquelas realidades (BECK, 2013).
A descatastrofização (KNAPP et al., 2007), recurso terapêutico também adotado no manejo
de pensamentos ansiogênicos, consistiu na proposição aos pacientes de uma testagem à
realidade/validade de seus pensamentos/previsões negativos e catastrofizados por meio do
questionamento das possibilidades e probabilidades dos eventos temidos de fato ocorrerem. Como
resultado, pôde-se verificar a tendência de alguns pacientes a questionarem os pensamentos
apressados, exageradamente pessimistas e conclusivos, que elaboravam em relação aos
acontecimentos e que geravam ansiedade e preocupações excessivas. A integração dessas
intervenções, acrescentadas dos treinos de relaxamento/respiração e das técnicas de aceitação da
ACT, têm produzido resultados preliminares modestos, mas significativos, visto que, até o momento,
se pode constatar a diminuição parcial e gradativa dos comportamentos de esquiva e a aquisição de
habilidades mais funcionais de enfretamento de situações aversivas. Muitas vezes, eventos aversivos
internos e externos podem nos conduzir a entrar em contato com a ansiedade, o que pode causar
grande desconforto. Como forma de lidar com isso, pode ser comum que haja uma tentativa de evitar
essa situação, fugir dela ou até mesmo controlá-la. A questão, entretanto, é que quanto mais tenta-se
evitar ou controlar, mais constante fica o contato e mais aversiva a situação se torna. Logo, a tentativa
de evitar um sentimento, controlar um pensamento, ou fugir de um lugar, pode ser eficaz a curto
prazo, mas é extremamente limitante e não contribui para que uma vida com valor a longo prazo seja
vivida (LEAHY, 2011; SABAN, 2015).
O mindfulness, também conhecido como atenção plena, é uma técnica que busca ajudar a
experimentar o mundo com foco no momento presente. Essa técnica é importante no manejo da
ansiedade pois, muitas vezes, a ansiedade aparece devido a uma dificuldade em conseguir manter a
atenção no que está sendo feito e experimentado agora, pelo fato de o indivíduo estar sempre
pensando em algo que passou ou que virá. Estar plenamente ciente significa não estar pensando,
julgando ou tentando controlar o que está acontecendo, direcionando seu foco para o que está sendo
feito no momento, para notá-lo e vivê-lo. De acordo com Leahy (2011, pg. 203)

Se você é uma pessoa que sofre de ansiedade, praticar a atenção plena pode ajudá‑lo
a enfrentar as causas primeiras de sua preocupação – seu medo, sua tensão, sua
crença equivocada de que está em perigo contínuo. Ela o ajudará a ficar no
presente, momento em que a ansiedade não existe.

A prática da atenção plena ajuda a lidar com os pensamentos que, muitas vezes, são tomados
como representações da verdade por quem é ansioso. Durante a prática, o indivíduo entra em contato
com esses pensamentos, mas aprende a percebê-los apenas como eles são: um evento mental sem
necessariamente ter conexão com o mundo externo. A partir do treino de mindfulness com os clientes
foi possível observar que, à medida que a técnica era praticada, havia uma maior abertura para o
conteúdo dos pensamentos aversivos e, consequentemente, um caminho mais claro para identificá-
los.
Outra demanda recorrentemente identificada na clínica e que tem colocado nossos clientes em
contato com a ansiedade, são questões relacionadas ao ambiente de trabalho. Hoje a sociedade exige
cada vez mais que cada indivíduo seja mais produtivo e os nossos clientes tem trazido cada vez mais
preocupações e angústias relacionadas ao cumprimento do que lhes é exigido. Seja no trabalho ou em
ambiente de ensino, sempre há o relato de que se tem muito a fazer e que não produzir causa grande
desconforto, o que os conduz a sentimentos de culpae frustração, pois existe o desconforto da tarefa
e o medo do fracasso. O problema, no entanto, é que geralmente esse é um ciclo com fim em si mesmo:
saber que precisa produzir pode gerar ansiedade e, estar ansioso pelo que é necessário produzir, pode
paralisar. Dessa forma, não produzem porque estão ansiosos e ficam ansiosos porque ainda não
produziram. A esse respeito, a ativação comportamental tem muito a acrescentar.
Com a ativação comportamental é aprendido que muitas vezes há a crença de que a vontade
de fazer algo precisa surgir, bem como a motivação para isso. Entretanto, é à medida que a tarefa é
iniciada que o engajamento na mesma ocorre; é ao desempenhá-la que o desejo de fazê-la vem
(COSTA e TALASK, 2019). De acordo com Martell (2020), é mais possível colocar os clientes em
contato com reforçadores naturais quando eles realizam atividades que tenham a ver com o que eles
valorizam. Ou seja, se é importante para o nosso cliente ter um bom desempenho profissional ou
acadêmico, mas se a ansiedade tem dificultado isso, é preciso focar em atividades que serão
reforçadas positivamente e estruturar atividades que poderão ser realizadas no estado atual de
ansiedade dele. É possível, por exemplo, estabelecer junto com ele um cronograma de atividades que
considere uma quantidade realista de atividades diárias, uma hierarquia entre elas (baseada em seus
níveis de dificuldade), a quantidade necessária de descanso com base no que é preciso para o cliente,
e prestar atenção a todos os detalhes para aumentar a possibilidade de que possam ser desempenhadas.
Com a aplicação dessa técnica na clínica foi possível observar que o estabelecimento das
tarefas diárias é, realmente, um reforçador natural, uma vez que desempenhar essas tarefas era
importante para os clientes, e eles perceberem que estavam caminhando, ainda que de pouco a pouco,
o que dava a eles mais motivação para continuar no próximo dia, além de não ficar o sentimento de
culpa por terem deixado de fazer algo.
Como forma de manejo dos respondentes aversivos que compõem o episódio emocional
nomeado de ansiedade, o treino de visualização (KNAPP, et.al., 2007) foi adotado com o objetivo de
proporcionar bem-estar físico e emocional através da imaginação e evocação de imagens positivas
significativas e, em última instância, com o intuito de resultar na aprendizagem de recursos para lidar
com possíveis situações ansiogênicas futuras, ampliando o repertório de enfrentamento dos pacientes.
As impressões sensoriais mentais intencionalmente provocadas via visualização guiada permitiram
que as reações de estresse e ansiedade sentidas diminuíssem sua intensidade. A técnica A.C.A.L.M.E-
S.E (RANGÉ, 2011), estratégia de auxílio nas crises de ansiedade do cotidiano, foi praticada nas
sessões com o propósito de gerar familiaridade com o procedimento e suas etapas, podendo ser
melhor aproveitada e gerando melhores efeitos nos possíveis momentos de ansiedade.
No que diz respeito à ansiedade, as técnicas de respiração (WILLHELM; ANDRETTA;
UNGARETTI, 2015), no caso da técnica da respiração diafragmática, foi treinada e exercitada em
sessões através de orientações sobre a postura corporal e movimento pulmonar. O relaxamento por
meio da respiração diafragmática foi empregado com o objetivo de induzir o organismo a retornar ao
seu estado anterior ao episódio ansioso, como forma de manejo desses sintomas no momento em que
surgem.
Juntamente à instrumentalização dos pacientes com habilidades de enfrentamento eficazes na
minimização de emoções aversivas e excitação autonômica (WRIGTH et al., 2018), estes foram
estimulados e orientados a enfrentar gradativamente situações temidas. Foiorientado aos pacientes
que executassem, com certa regularidade e sempre que necessário, esses exercícios em seus ambientes
naturais. Como recurso de enfrentamento e manejo emocional, também foram introduzidos como
recurso interventivo os cartões de enfrentamento, utilizados para estimular os pacientes a
enfrentarem situações ansiogênicas e
desencadeadoras de pensamentos disfuncionais (BECK, 2013). Todas essas técnicas aplicadas
em ambiente clínico tiverem como alvo permitir o enfrentamento, por parte dos clientes, de
estímulos/situações aversivas e romper padrões de evitação, promovendo a qualidade de vida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista a prevalência da ansiedade como uma demanda recorrente de saúde mental no
cenário Brasileiro e considerando o contexto pandêmico como um fator estressor que contribuiu para
que houvesse um maior número de queixas a esse respeito na clínica, buscou-se explicitar a
importância de saber atuar com essa demanda através de técnicas e ferramentas clínicas
empiricamente sustentadas que possam ajudar o cliente a ampliar seu repertório de enfrentamento de
situações aversivas e conseguir mudar contingências para ter uma resposta mais adaptativa tanto à
experiência subjetiva de ansiedade quanto aos eventos antecedentes a tal experiência. Com base nisso,
foram descritas nesse trabalho as principais técnicas de intervenção da Terapia Analítico-
Comportamental (TAC), Terapia Cognitivo- Comportamental (TCC) e Terapia de Aceitação e
Compromisso (ACT), que foram utilizadas no acompanhamento clínico.
Ao organizar e descrever cada técnica utilizada aqui, bem como o objetivo por trás da mesma
e o resultado obtido até onde foi possível aplicá-las, tendo em vista que o estágio clínico permanece
em andamento, foi possível observar que a prática sob o viés das abordagens terapêuticas empregadas
têm como foco o ensino de estratégias que possam ajudar o sujeito a apaziguar a ansiedade excessiva
e torná-lo, com o treino de repertórios de respostas mais adaptativas, alguém que possa enfrentar, de
maneira autônoma, situações aversivas diversas. Essa observação se faz relevante devido ao fato que
o psicoterapeuta é, nesse contexto, um participante instruído que guia o processo, mas que não o
constrói: um coautor; enquanto o cliente não é um dependente, mas um sujeito atuante e escritor
principal de cada etapa de seu aprimoramento, o que contribui para seu desenvolvimento global.
Considerando o acima exposto, o presente trabalho não teve o intuito de trazer uma extensa
pesquisa a respeito das contribuições clínicas das técnicas aqui mencionadas para o manejo da
ansiedade, mas sim de apresentar um relato de experiência que corrobora com o que se encontra na
literatura a respeito de tratamentos empiricamente sustentados para a ansiedade enquanto queixa
clínica. Acredita-se, assim, que este estudo possa contribuir, mesmo que de maneira modesta, ao
arcabouço já existente na literatura e como fonte de consulta para a prática de psicoterapeutas e
estudantes da área, além de deixar a oportunidade para que mais estudos sejam desenvolvidos a partir
desta temática, uma vez que as técnicas não se mostram apenas eficazes no que se propõem, mas
como ferramentas que tem proporcionado qualidade de vida e a possibilidade de conviver com o que
é aversivo sem perder de vista a manutenção, para os clientes, de uma vida baseada no que valorizam.

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transtornos mentais: DSM-5. Porto Alegre: Artmed, 2014.

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´=9-86, 2015.
PSICOLOGIA DO ESPORTE: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIADE ESTÁGIO

Andressa Aparecida de Souza1


Camila Baltazar de Freitas2
Caroline Cristine Melo Queiroz3
Cinthia Gabrielle do Vale Paiva 4
Maressa Santos de Paula5
Rebeca Freitas Queiroz6
Telma Sara Q. Matos7

RESUMO
O presente relato do experiência prática descreve os desdobramentos de um campo de estágio
profissionalizante em Psicologia do Esporte (PE), realizado na Escola Municipal Professor Ildefonso
Mascarenhas da Silva em parceria com o Departamento de Esporte eLazer, na cidade de Ituiutaba/MG.
O estágio, iniciado em Maio de 2021, é desenvolvido por seis estagiárias do curso Psicologia da
UEMG/Ituiutaba, sob a supervisão de uma professora do curso. O objetivo do estágio pauta-se na
ampliação de conhecimentos, domínios e aplicação de conhecimentos teóricos da Psicologia do
Esporte no campo vivencial de estágio, frente às diferentes demandas. O trabalho das estagiárias
abrangeu observações sistemáticas participantes e intervenções junto aos times de handebol
masculino e feminino. As intervenções ocorreram no campo vivencial de prática, duas vezes por
semana, presencialmente. De acordo com as demandas, as práticas se deram em torno dos seguintes
eixos: estabelecimento de metas, exercício físico e habilidade visuoespacial, intervenção voltada para
o aprimoramento da comunicação da equipe, especificidades do esporte de alto rendimento, exercício
físico e saúde, esporte e bem- estar, treinos e responsabilidade. Como resultados, percebeu-se que
os(as) atletas possuem o desejo de desenvolver-se considerando a tríade da performance de excelência
no esporte: os aspectos físicos, técnicos/táticos e psicológicos. Percebeu-se a importância da atuação
da Psicologia do Esporte na busca por amparar os(as) atletas em atividades que visavam aprimorar o
desempenho pessoal e em grupo. O estágio em Psicologia do Esporte consiste em intervenções
práticas em Psicologia Esportiva, considerando as demandas pré-existentes, obedecendo as questões
éticas e o compromisso social na área da Psicologia do Esporte. Essas ações obtiveram êxito até o
presente momento, atendendo de forma eficaz aos objetivos apresentados pelo estágio.

Palavras-chave: Estágio Profissionalizante; psicologia; psicologia do esporte handebol.

INTRODUÇÃO

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
5
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
6
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
7
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
As atividades de estágio de Psicologia do Esporte (PE) ofertadas pelo curso de graduação em
Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais, unidade Ituiutaba/MG acontece desde 2016,
como atividade obrigatória descrita no ProjetoPedagógico do Curso (PPC). Esse estágio consiste em
quatro horas semanais de supervisão semanal com professora do Curso de Graduação de Psicologia, e
de oito horassemanais em média de atividades práticas de campo. Os(as) alunos deverão cumprir, 152h
semestrais de atividades de intervenção. Essas atividades consitem em observações sistemáticas
participantes e intervenções junto a equipes desportivas. As atividades seguem um roteiro,
respeitando o objetivo do estágio, de acordo com o PPC do Curso dePsicologia.
Estágios Profissionalizantes no curso de Psicologia da Universidade do Estado deMinas Gerais
- Unidade Ituiutaba faz parte do Núcleo de Aprofundamento do processo de formação do aluno. Esse
núcleo, descrito no Projeto Pedagógico do Curso (PPC), se organiza por duas ênfases curriculares.
Estas ênfases definem-se como um conjunto delimitado e articulado de competências específicas que
configuram oportunidades de concentração e consolidação de estudos e estágios, em dois domínios
da Psicologia: ênfase A– Processos Clínicos e ênfase B – Processos Psicossociais e de Saúde. O
estágio profissionalizante em Psicologia do Esporte faz parte da ênfase B do PPC. E possui como
ementa o “Planejamento, execução e avaliação de intervenções em Psicologia Clínica ouProcessos
Psicossociais e da Saúde. Ênfase no exercício profissional e nos aspectos práticos e éticos envolvidos
nesta atuação”.
Nos últimos anos, é notável a presença cada vez mais frequente de psicólogos emcontextos
esportivos. A exemplo disso, pode-se citar a Olimpíada de Tóquio realizada ainda neste ano de 2021,
um dos últimos grandes eventos que contou com o auxílio dessesprofissionais tanto de forma presencial
quanto também com as intervenções acontecendo remotamente. A proposta de Estágio em PE possui
a intenção de ampliar e fomentar as discussões sobre Psicologia do Esporte na região, além de trazer
para a formação dos estudantes, a compreensão das especificidades da área como um campo de
atuação do Psicólogo.
Para contextualizar a Psicologia do Esporte (PE), é valido mencionar que são diversas as
definições que se dão para essa área de atuação da Psicologia desde seu surgimento. Uma delas a
divide a PE em disciplina acadêmico-científica e em campo de intervenção profissional, envolvendo
conceitos da Psicologia e das Ciências do Esporte. De acordo com algumas definições clássicas de
Psicologia do Esporte, essa, corresponde à disciplina que pesquisa as razões e os resultados dos
fenômenos psíquicos que o ser humano apresenta antes, durante e após a prática do exercício ou do
esporte, sejam eles de cunho recreativo, competitivo ou reabilitador (GILL, 1979). De fato, visto mais
amplamente, a Psicologia do Esporte refere-se aos aspectos psicológicos, processos e consequências
da regulação psicológica das atividades relacionadas ao esporte, de uma ou mais pessoas praticantes
da mesma modalidade.
De acordo com Vieira et al. (2010, p.392) “Percebe-se que o profissional da Psicologia do
Esporte deve adquirir uma formação de conhecimentos que garanta uma boa formação geral em
Psicologia aliada aos conhecimentos específicos do exercício físico e do esporte”. É inegável,
portanto, a importância do psicólogo do esporte desenvolver um olhar voltado não apenas para os
aspectos e técnicas psicológicas, mas ampliá-lo para o contexto em que está inserido, que é o contexto
esportivo, conhecendo as particularidades do seu esporte. Contudo, é importante salientar que a
Psicologia do Esporte vai para além do acompanhamento de atletas de alto rendimento. Sua atuação
pode contemplar intervenções em ambientes em que as atividades físicas são voltadas também à
reabilitação, lazer, iniciação esportiva ou recreação.
Nas palavras de Becker Júnior (2008, p. 27):

A Psicologia do Esporte e do Exercício é uma disciplina entre as Ciências do


Movimento Humano e as Ciências do esporte. O profissional em atuação nesta área
poderá gerar conhecimento específico através de investigação, utilizando abordagens
interdisciplinares, ou seja, usando o conhecimento de outras ciências. (BECKER ,
2008, p. 27)

Temas como comunicação, motivação, liderança, pensamentos, sentimentos e bem estar


psicológico de atletas e diversas outras referências da prática esportiva e da atividade física, tem
requerido estudos e atuação de profissionais de PE, visto que cada vez mais o nível técnico de atletas
e equipes de alto rendimento tem tido um diferencial, sendo dada ênfase especial na preparação
emocional desses indivíduos (BRACHT et al., 1995).
Esse relato de experiência traz a proposta de intervenção de estágio profissionalizante como
uma abordagem e objetos inovadores, a fim de se infiltrar nos meandros das circularidades teórico
práticas que engendram o fazer de diferentes profissionais amparados nos saberes do universo da
Psicologia do Esporte.

OBJETIVO
Objetivo geral
Pautar-se na ampliação de conhecimentos, domínios e aplicação de conhecimentos teóricos
da Psicologia do Esporte no campo vivencial de estágio, frente às diferentes demandas.
Objetivos específicos
Compreender por meio das intervenções em PE, qual a percepção dos atletas em torno dos
fatores psicológicos que podem influenciar no desempenho esportivo.
Verificar quais demandas psicológicas são elencadas pelos atletas e equipe técnica.
Analisar o círculo de convivência dos atletas junto a treinadora.
Identificar quais as variáveis individuais e coletivas que podem interferir no desempenho em
jogo.

MÉTODO
As atividades de estágio tiveram início após uma parceria firmada entre a Universidade do
Estado de Minas Gerais e o Departamento de Esporte e Lazer, da prefeitura Municipal de
Ituiutaba/MG. A supervisora do estágio em PE estabeleceu um contato inicial com a técnica das
equipes de Handebol, apresentando os objetivos do estágio. Em seguida, os Termo de Compromisso
de Estágio foram lavrados e assinados pelos envolvidos. As atividades iniciaram em Maio de 2021.
Inicialmente, o estágio aconteceu em dois dias diferentes: às terças-feiras e quintas-feiras. Os
primeiros encontros foram norteados por acompanhamento dos treinos das equipes de handebol
feminino e masculino. Os treinamentos ocorriam na escola Mascarenhas. As estagiárias se
subdividiram em dois subgrupos: três estagiárias iam às terças-feiras e as outras três às quintas-feiras,
o que equivalia a quatro horas semanais para cada. Os grupos atendidos são duas equipes da
modalidade de handebol: uma equipe feminina e uma equipe masculina.
O estágio profissionalizante em PE possui a obrigatoriedade do cumprimento das152h por
semestre. Devido a excepcionalidade atravessada pelo pais, em virtude das questões da Pandemia do
Covid198, também foram contabilizadas como atividades práticas de estágio o acompanhamento em
competições, participação em grupo de estudos sobre PE, supervisão semanal e confecção de
relatórios.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
No primeiro encontro, realizou-se as apresentações das estagiárias à técnica e a toda a equipe.

8
A epidemia de Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) disseminou-se a nível mundial em poucos meses,
conduzindo esse surto a condição de uma pandemia. Inúmeras medidas de saúde pública foram
empreendidas nos países afetados para na tentativa de contenção e mitigação à disseminação da doença. O
intuito foi retardar a ocorrência do pico da pandemia, de maneira que os serviços de saúde se
instrumentalizassem e tivessem condições de resposta ao tratamento do menor número possível de doentes
com COVID-19 ao mesmo tempo, evitando o colapso dos serviços. (MOURA, et al, 2020).
No primeiro momento, houveram explicações sobre a definição de Psicologia do Esporte, e como essa
área poderia auxiliar essas equipes no seu desempenho esportivo. Em seguida seguiu-se com as
observações sistemáticas participantes, em que havia uma inserção, sem uma intervenção direta.
Dessa forma, levantava-se às possíveisdemandas, as quais eram discutidas em reuniões de supervisão,
no intuito de traçar as possibilidades e propostas de intervenções a posteriori.
Com as primeiras observações, percebeu-se a necessidade da realização de um levantamento
sobre os objetivos do grupo. Nesse sentido, usou-se como instrumento a aplicação de um questionário
sobre o estabelecimento de metas no intuito de compreender de uma forma mais ampla, as perspectivas
dos atletas em relação à prática esportiva no que tange a periodização de seus treinamentos.
Realizou-se também outros trabalhos de intervenção ao longo da consecução do estágio.
Dentre algumas intervenções pode-se destacar: dinâmica do cordão, com o objetivo do
autoconhecimento. Intervenção à luz de alguns conceitos básicos porém importantes, e que permitiam
momentos de reflexão no grupo geral. Atividades que instigavam questionamentos e inquietações, a
fim deles explorassem o imaginário em relação a momentos marcantes no esporte. É válido mencionar
que algumas perguntas eram realizadas no sentido de que os atletas pudessem refletir em torno do
porquê eles estavam ali (no treino de handebol), por quais motivos. Assim, as rodas de conversa se
tornavam espaços para dar voz a todos ali e também para uma escuta respeitosa das necessidade do
grupo. Uma intervenção desafiadora e altamente potente desenvolvida foio treinamento mental. Uma
atividade que consiste num trabalho de controle da respiração, visualizações positivas e imagéticas,
com o objetivo de desenvolver o foco, atenção e concentração durante os treinos.
As intervenções realizadas contemplavam as seguintes temáticas: exercício físico e habilidade
visuoespacial, estabelecimento de metas, exercícios de comunicação, esporte e alto rendimento,
exercício físico e saúde, esporte e bem-estar, treinos e responsabilidade. Também houve auxílio à
técnica (a profissional do esporte) durante os acompanhamentos dos treinos, preparação dos jogadores
pré-competição no controle de ansiedade e trabalho de apoio, além do auxílio durante as competições.
Pode-se observar durante a realização do estágio profissionalizante, a importânciada atuação
do psicólogo junto ao time de handebol feminino e masculino. O reconhecimento por parte da própria
profissional de educação física e treinadora ao elogiar e parabenizar o trabalho, sugestiona que os
objetivos do estágio em PE estão sendo atingidos. Araújo (2002), descreve que profissional de
psicologia esportiva, ocupa o espaço importante no âmbito do esporte, dedicado em aperfeiçoar a
performance de excelência dos atletas, assim como também proporcionar atividades para o
aprimoramento mental desses atletas.
À medida que as observações dos treinamentos foram acontecendo, algumas análises foram
importantes para se pensar quais trabalhos poderiam ser efetivamente adequados para aqueles grupos.
Após a aplicação do instrumento sobre o estabelecimento de metas, pode-se compreender quais eram
os objetivos que os atletas possuiam tanto para sua vida esportiva, quanto para fora daquele cenário.
No momento seguinte, houvea devolutiva dos dados obtidos para o grupo. Nesse sentido eles puderam
pensar a respeito dos resultados, fazendo uma relação de significado daquilo que suscitou nas
respostas.
Por meio dos resultados obtidos na aplicação do intrumento sobre o estabelecimento de metas,
foi possível analisar o que eles gostariam de desenvolver, abrangendo os aspectos físicos e técnicos
a longo prazo. Quanto aos objetivos realistas, os aspectos psicológicos como autoconfiança, medo,
insegurança e coragem apareceram com maior frequência. Pode se inferir com esse dado que os
aspectos emocionais são indícios de uma dificuldade ou possíveis obstáculos para o desenvolvimento
da performance.
Ainda trazendo sobre o estabelecimento das metas, os objetivos para a próxima competição
descrevem a necessidade de ampliação dos aspectos técnicos. A competição é algo benéfico, mas é
importante atentar se realmente o atleta está conseguindo lidar comos fatores intervenientes presentes
nesse contexto. Segundo Machado (1997), quando o atleta se submete a competições muito intensas,
é importante se atentar às vertentes fisiológicas, emocionais e psicológicas. Percebeu-se, por meio da
aplicação do instrumento do estabelecimento de metas, vimos que os atletas de handebol tanto da
categoria feminina quanto masculina, estão dispostos a desenvolverem a tríade de excelência no
esporte: aspectos físicos, técnicos/táticos e psicológicos.
Tendo como base os aportes teóricos em Psicologia do Esporte, bem como os estudos no grupo
de estudos e as discussões em supervisão do estágio profissionalizante em PE, buscou-se amparar os
atletas das equipes de handebol feminina e masculina, com atividades que visavam aprimorar o
desempenho pessoal e em equipe no esporte. Por meio de atividades que contemplassem a confiança
e uma maior segurança no momento competitivo, ampliação e eficiência da comunicação entre a
equipe, pode-se desenvolver estratégias em que contemplasse um objetivo comum.
Essa questão da comunicação entre a equipe foi uma das demandas mais perceptíveis entre os
atletas. A ausência de um diálogo efetivo, tanto na equipe masculinaquanto na feminina, demonstrava
sinal de fragilidade entre a interação do grupo. Diante dessa demanda, organizou-se diferentes
intervenções pautadas na comunicação, interação e sintonia das equipes, haja vista esses constructos
serem elementos que possui interferência direta no desempenho dos grupos, seja em treinos ou jogos.
Neste sentido, percebeu-se que após algumas intervenções com o foco voltado ao diálogo interativo,
houve um melhor engajamento por parte das equipes. Ressalta-se que a equipe femininademonstrou
uma abertura às intervenções das estagiárias em PE, houve maior comunicação e envolvimento com
as atividades. No entanto, a equipe masculina assumiuuma postura diferente, demonstravam atenção,
porém manifestavam-se pouco.
Ao longo de todo o processo do estágio profissionalizante em PE, além das mudanças
perceptíveis para as estagiárias, principalmente na equipe feminina, houveraminúmeros feedbacks da
técnica sobre a atuação da PE ali naquele contexto. Por mais que os atletas da equipe masculina não
tivesse uma manifestação ativa, a técnica sempre relatava pequenas alterações observadas por ela.
Todo esse processo tornou-se mais evidente durante e após um torneio em que ambas equipes
disputaram.
Dando continuidade ao relato de experiências no estágio profissionalizante em PE, esse
seguiu-se levando propostas para serem realizadas com a finalidade de proporcionar um suporte
maior quanto ao aspecto psicológico dos atletas. Nas proximidades do Campeonato Mineiro de
handebol, em que inicialmente participariam somente o time masculino na categoria adulto, realizou-
se uma intervenção com o objetivo de fazê-los refletir sobre o significado das palavras desejo,
disciplina, desempenho e determinação (os 4Ds). Desvelou-se que Desejo era o início de tudo e a
partir disso os questionamos sobre os motivos que os levam a participar do projeto. Nesse ensejo
percebeu-se um melhor engajamento e participação dos atletas durante o treino, pois fora
demonstrado a eles a importância do trabalho da tríade da performance de excelência: o
desenvolvimento dos três aspectos básicos: os técnicos e táticos, os físicos e os psicológicos.
Nota-se que pelo fato de os atletas da equipe masculina terem um campeonato importante nos
dias seguintes, eles estavam afoitos para os treinamentos técnicos e táticos. No entanto, com a
explanação da tríade da performance de excelência, eles puderam perceber que deveriam equilibrar
os três aspectos, pois todos são relevantes para um bom resultado no jogo. De acordo com a
demostração da tríade, eles, os atletas, puderam visualizar e compreender a importância dos aspectos
psicológicos, em conjunto com as demais valências, pois a ausência do desenvolvimento de quaisquer
uma destas partes, a tríade ficaria incompleta, podendo assim levá-los a um resultado insatisfatório
na competição.
Momentos antes de os atletas saírem em viagem para disputar o campeonato, realizou-se uma
intervenção pautada na motivação, foco, espírito de equipe, dentre outros. Foram confeccionados
diversos chaveiros contendo dizeres diferentes. As palavras que compunham os chaveiros tinham um
cunho positivo e motivador. Foram entregues um para cada atleta. Na sequência, solicitou-se a eles a
leitura em voz alta do que estava descrito no chaveiro. Eles então juntaram todos em um só, e
definiram esse objeto com o codinome de “amuleto psíquico”. No retorno da competição, em que
conseguiram como resultado o terceiro lugar, às atividades pós campeonato foram retomadas. A
escuta sobre os elementos que suscitaram e compareceram na competição vieram a tona em uma roda
de conversa.
É relevante salientar sobre os aspectos positivos que ecoou após a intervenção de
estabelecimento do foco. Essa trouxe reflexões positivas por parte dos jogadores. Os relatos que
muitas e muitos dividiram com as estagiárias, permeavam a questão do errar durante o jogo, e, por
esse motivo, se desfocarem, concentrando-se apenas no erro e se martirizando por isso. Essa reflexão
se deu a partir da técnica extensa de treinamento mental e de se imaginar no melhor jogo possível,
criando cenários que trouxessem a experiência de jogo ou treino. Esta atividade traz diversas
elucubrações, assim como pontua Matos (2020), a reflexividade impulsiona um contante olhar para a
prática, para as atitudes tomadas, para novas formas de solucionar problemas. Refletir sobre a prática
leva à observação de elementos até então ignorados, mas que ajudam a dar sentido para aação. Assim,
os próprios jogadores conseguiram ampliar as possibilidades de resposta diante do fenômeno errar:
para eles ao invés de se prender, focar no erro quando cometido, e se desfocar do jogo, lembram-se
deste exercício em questão. Ou seja, articular estratégias de enfrentamento, diante do problema. Nesse
sentido, as técnicas de visualização e mentalização positiva, em que o atleta acesse o melhor jogo ou
melhor treino vivencial, pode ser um recurso para reatar e trazer de volta a energia necessária para o
jogo, juntamente ao foco e concentração.
Esse relato de experiência em torno do estágio profissionalizante em PE possui algumas
particularidades. Foi necessária uma base de conhecimento teórico, por parte das estagiárias para a
realização desse estágio. A ausência desse conhecimento, pelo fato de não haver a disponibilidade da
disciplina Psicologia do Esporte (PE) na estrutura curricular do curso de Psicologia, em um primeiro
momento, gerou de certa forma uma insegurança na aplicação prática. Durante as supervisões e o
acompanhamento do grupo de estudos em PE, foram inclusos dados de referenciais teóricos que
forneceram a base para a atuação na área. Esses recursos foram substanciais para o desenvolvimento
no estágio obrigatório de forma eficaz.
Como pontos positivos para a realização desse estágio em PE, pode-se elencar a abertura,
disponibilidade e confiança da instituição parceira, pois nesse sentido permitiu-se a realização das
intervenções propostas sem hesitação dos profissionais acompanhados. E com totais
responsabilidades, estabeleceu-se um papel de profissionais da psicologia, no cumprimento das
atividades, obedecendo as questões éticas e o compromisso social na área da Psicologia do Esporte.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Psicologia do Esporte vai para além do acompanhamento de atletas de alto rendimento. Ela
auxilia o atleta a desenvolver sua capacidade psicológica para adequar à rotina esportiva. O estágio
profissionalizante, até o presente momento, vem alcançando resultados positivos e satisfatórios.
Sinais favoráveis podem ser especificados no sentidode a necessidade de novas pesquisas no campo
de atuação para o crescimento, desenvolvimento e constância desse estágio obrigatório, que a partir
dos resultados e objetivos alcançados desse seja possível expandir para novas instituições.
Contudo, percebe-se os resultados objetidos diante da atuação do estágio em PE, junto a equipe
de handebol feminino e masculino, podem ter uma relação explícita com os objetivos apresentados
pelo estágio. O propósito de vivenciar a Psicologia do Esporte simultaneamente na área de atuação e
articular estratégias de intervenções mediante as demandas levantadas, somam campos para a área,
com destaque na real atuação do Psicólogo do Esporte.

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MATOS, T. S. Q. Os processos de reflexividade dos psicólogos do esporte e coaches:um estudo
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<https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/59/59142/tde-22062020-144837/pt-br.php>. Acesso
em: 12 novembro 2021.
APRENDIZAGEM PSICOEDUCATIVA E O DESENVOLVIMENTO DEHABILIDADES
SOCIAIS EM PROCESSO PSICOTERÁPICO

Silvania Silva de Souza1


Ana Paula Silva Cantarelli Branco 2

RESUMO
As habilidades sociais emitidas por um indivíduo num grupo social caracteriza um indicador
valorizado por este contexto, dentre o qual pode se avaliar o pertencimento, normas e expectativas do
grupo o qual faz parte. Este estudo está baseado na análise de um processo psicológico embasado na
Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), baseado na proposta da Psicoeducação a qual
proporcionou a um homem com deficiência visual, ser o colaborador ativo de seu processo de
aprendizagem em sessões de psicoterapia desenvolvidas numa clínica escola. Objetivou-se conhecer
e analisar a trajetória de história de vida de um estudante com deficiência visual no ensino superior
de Graduação. Os dados revelaram que por meio da estimulação bem como apoios adequados notou-
se o desenvolvimento de potencialidades, alcançando níveis satisfatórios de interação e habilidades
sociais pelo cliente atentido. Mas por outro lado, notou-se formas preconceituosas capacitistas
expressadas por colegas de turma da faculdade o que representou sentidos imbuídos de estereótipos
de “menos capacidade”, por parte da pessoa cega, construídos historicamente que ainda hoje
permeiam os discursosoriundos do senso comum. Ademais, reforçou comportamentos saudáveis e
produtivos frente a situação vivenciada por uma cultura excludente, atendendo aos princípios das
habilidades sociais. Observou-se certa autonomia e independência na relação social e familiar do
cliente, mas a maneira como se relacionava com os colegas ainda favorecia certo isolamento social
frente a pandemia da Covid-19. Por fim, notou-se que a falta de habilidades na expressão e
comunicação e interação com os colegas de turma na universidade impactava na resposta a ser dada
quando era submetido a exposição de trabalhos. É necessário reafirmar sobre a importância de haver
novos estudos que estimulem novos olhares a fim de rompermos com os preconceitos e estereótipos
construídos socialemnte para contribuir com material de pesquisa científica no manejo da
psicoeducação.

Palavras-chave: Terapia Cognitivo-Comportamental; psicoeducação; habilidades Sociais.

INTRODUÇÃO
As pessoas com deficiência 3 são consideradas as mais vulneráveis tendo em vista a sua
exposição a diversas situações de riscos de acordo com Dados da Organização Mundial de Saúde
(OMS). Sendo assim, faz-se importante lutar pela defesa dos direitos humanos, dignidade, autonomia

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – UnidadeItuiutaba
2
Doutora e Professora do curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais –Unidade
Ituiutaba
3
A pessoa com deficiência deve ser compreendida como àquela em que apresnta impedimentos de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual, ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras,
pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas
(BRASIL, 2015).
e equiparação de oportunidades junto a essa parcela da população.
As habilidades sociais emitidas por um indivíduo num grupo social caracteriza um indicador
valorizado por este contexto, dentre o qual pode se avaliar o pertencimento, normas e expectativas do
grupo o qual faz parte. O afastamento é conjecturado como déficits de [...] observação, percepção
social, discriminação e controle sobre o próprio comportamento como de atitudes, concepções e
valores divergentes do padrão predominante na cultura do próprio grupo (DEL PRETTE, et al., 2004,
p.342).
De acordo com Del Prette; Del Prette (2005) às pessoas com deficiência visual ou cegueira4
não aprendem por observação, o que acarreta nas lacunas de identificação dos sinais sociais como a
expressão facial e corporal do interlocutor, tal como na condução de respostas aos comportamentos
(verbal e não verbal) decorrentes de leitura não verbal do ambiente. Esta restrição faz com que ocorra
avaliações negativas voltadas para o repertório social desde o início do desenvolvimento da pessoa
com deficiência visual na infância e ao longo da adolescência, podendo se estender para a vida adulta.
Nessa direção é possível compreender a deficiência visual a partir da experiência vivenciada
por cada sujeito, levando em consideração a estimulação e os apoios adequados paradesenvolverem
suas potencialidades, alcançando níveis satisfatórios de interação e habilidadessociais.
Como maneira de compreender a deficiência a partir do déficit de ordem social, o modelo social5
da deficiência descrito e reinterpretado por Piccolo e Mendes (2012) é caracterizado decorrente de
uma consequência de uma estrutura social cujas políticas: “dão prioridade às mudanças no ambiente
e o tratamento da questão é tratado como uma responsabilidade pública” (p. 88).
Atreado a proposta da Psicoeducação a qual visa que o cliente seja colaborador ativo
(SHENEM, 2016, p.01) este estudo está baseado na análise de um processo psicológico embasado na
Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) de um homem com deficiência visualacompanhado na
numa clínica escola. E teve como objetivos conhecer e analisar excertos de quatro sessões que
refletem a trajetória de história de vida de um estudante com deficiência visual no ensino superior de

4
A Organização Mundial da Saúde (OMS) conceitua a cegueira ao indivíduo com acuidade visual de 3/60
(0,05), no melhor olho e melhor correção óptica possível, até a ausência de percepção de luz, ou equivalente a
perda de campo visual no melhor olho com a melhor correção possível. E a visão subnormal equivale à
acuidade visual igual ou menor do que 6/18 (0,3), porém igual ou maior do que 3/60 (0,05) no melhor olho
com a melhor correçãopossível.
5
Refere-se aos autores que defendem as múltiplas relações de deficiência coadunada ao gênero, classe social,
raça/etnia e geração cujos seus princípios visam romper com as concepções que versam o rompimento com
as classificações sobre a deficiência que reduz a compreensão do fenômeno às lesões e aos impedimentos do
corpo e abarca um conceito que incorpora a tônica nas questões sociais e políticas em sua análise (PICCOLO,
MENDES, 2012).
Graduação.

MÉTODO
O cliente foi encaminhado ao NEAP - Núcleo de Estudo e Atendimento Psicológico por meio
do NAE – Nucleo de Apoio ao Estudante da UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais -
Unidade de Ituiutaba.
Realizou-se o acompanhamento um homem com deficiência visual progressiva que
atualmente vivencia a cegueira total, cursa a sua segunda Graduaçao no curso de Direito.
Para compor uma representação de sua história, cursou a sua primeira Graduação há menos
de dez anos, no curso de Licenciatura em História, momento ímpar uma vez que foi o primeiro
estudante cego acompanhando pela Instituiçao de Ensino Superior - IES, de âmbito Federal, o qual
esteve engajado em vários projetos culturais e acadêmicos.
O cliente informou já ter sido atendido pelo setor de psicologia, o que contribuiu com o seu
foco e engajamento nas sessões propostas. Foram realizadas (12) sessões de atendimento psicológico
iniciada em Julho de 2021 e perduraram até Dezembro, de 2021, sendo escolhidas 4 recortes para ser
representada neste estudo.
Houve o desenvolvimento do Rapport o que possibilitou, posteriormente, a criação de vínculo
e conceitualização do caso.
No decorrer das sessões psicológicas foram aplicadas técnicas e ferramentas provenientes da
Terapia Cognitivo-Comportamental – TCC. Para compor o resultado, foram utilizados exertos das
falas do cliente decorrentes do contexto dos acompanhamentos clínicos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na primeira sessão foi compreendido o histórico sobre a cegueira adquirida os seus dezessete
anos que com o agravamento do seu quadro de saúde sendo solicitada a suaaposentadoria aos trinta e
três anos de idade. Mesmo tendo sido notada habilidades intelectuais, musicais, independência social e
orientação espacial, o cliente foi considerado inválido perantea sociedade.
Os acompanhamentos junto a este cliente girou em torno de sua relação familiar, bem como
sobre a sua relação afetiva-conjugal e social.
A partir de então, buscou-se trazer alguns excertos das falas que foram representativas no
decorrer das sessões psicoterapêuticas, atreladas a interpretação com base na Psicoeducação e no
planejamento colaborativo.
Os resultados foram divididos em 3 eixos, a saber: 1) relação familiar; 2) relação afetiva-
conjugal e 3) relação social.

Relação Familiar
Nas primeiras sessões surgiram demandas que se voltaram para a relação familiar, no geral.
Sendo assim, foi proporcionado espaço de escuta sem preconceito, e/ou qualquer forma de
julgamentos, ou definições de certo ou errado. Foi ressaltado que este espaço seria oportunopara ser
dialogado sobre qualquer assunto que o cliente sentisse vontade de revelar. Ao realizar a
conceitualização cognitiva, surgiu demanda voltada para um relacionamento homoafetivo porparte de
um membro intrafamiliar do cliente, considerado e percebido como de difícil aceitação por sua parte.
Como também foi notado desconforto em revelar sobre o assunto, na escolha daspalavras, bem como
divagações, resistências e uso de subterfúgios no curso da narrativa do cliente até chegar propriamente
no assunto.
Com relação ao incômodo sentido pelo cliente reverbera o esteriótipo e preconceito
vivenciado e reproduzido por nossa sociedade que exclui qualquer tipo de relacionamento que não
seja heteronormativo.

Relação afetiva-conjugal
No que se refere ao relacionamento afetivo-conjugal do cliente notou-se sentimento de
angústia com relação a sua resposta diante do comportamento de submissão da parceira. Apresentou
sentimento de piedade diante da história de vida da parceira.
Concomitantemente, demonstrou sentimento de culpa com relação ao comportamento de
superproteção que o cliente apresenta para com a sua parceira de modo a representar outros papéis
familiares.
Foi solicitado pela psicoterapeuta que ele refletisse sobre o sentimento de culpa, utilizando-se
a técnica de validação empírica pois notou-se uma mistura de sentimentos em sua fala, voltado para
ele se sentir culpado por sempre ter tomado as decisões por ela.
Ele não soube ao certo, ficou indeciso quanto a validar a formulação de algumas hipótesespela
psicoterapeuta. Mas ao final concordou, respondendo:
F: “É ... acho que é isso mesmo. Eu queria que ela fosse diferente. Tivesse mais iniciativa”.
F: “É.. Às vezes eu me irrito com ela. Parece que ela não se esforça pra ficar bem”.
Frente às hipóteses da psicoterapeuta refletiu com o cliente o significado da crença que se ele
continuar com o mesmo comportamento junto dela, será dificil ela buscar alguma mudança. E partir
da descoberta guiada6, foi refletido junto dele como oportunizar maior participação de sua parceira
nas decisões e demais opiniões em asssuntos rotineiros da casa e da família.

Relação Social
No que se refere ao contato social foi notório identificar o distanciamento do referido cliente
do contato social com os colegas, de tal maneira, agravado após a pandemia da Covid-19, representao
pela fala:
F: “Sinto muita angústia, muitos pensamentos do passado. Sinto-me muito triste, semprefui
muito alegre. Não estou tendo contato com as pessoas como antes”.
Verificou-se que essa questão de estar se sentido triste precisa ser investigada e que a faltade
contato presencial com as pessoas neste momento de pandemia que acomete a realidade atual. Mas,
sobretudo, foi ressaltado que há meios de manter contato com os amigos e familiares por meio de
mensagens e redes sociais.
Mesmo assim, notou-se que as falas trazidas pelo cliente giravam em torno de não ter tido
iniciativas em buscar pelo contato com as pessoas com as quais ele demonstrava certaafetividade.
Observou-se que o cliente apresentava crenças nucleares de desvalor, desamor, uma vez que
acreditava estar incomodando os amigos se entrasse em contato com eles.
Percebeu-se e investiu-se na valorização do self7, no sentido de ampliar e notar o valor que
deveria ser atribuído a ele e, consequentemte, a suas relações.
Como também decorrente do conteúdo trazido nesta sessão foi trabalhado com técnicas de
relaxamento, como mindfulness8 com o objetivo de ensinar o cliente a fazer em outros momentos

6
A descoberta guiada irá possibilitar ao psicoterapeuta averiguar qual cognição ou cognições são mais
perturbadoras para o cliente, depois lbe fará uma série de perguntas para ajudá-lo a olhar com distanciamento
(isto é, encarar suas cognições como ideias, não necessariamente como verdades), irá avaliar a validade e
utilidade das cognições e/ou descatastrofizar seus medos (BECK,2013, p.43).
7
O senso de self como processo é desenvolvido a partir da observação e da descrição verbal do cliente de
sua própria experiência no momento em que ela ocorre, muitas vezes favorecidas por práticas de mindfulness
(MOREIRA, et al., 2017, p.233).
8
Um exemplo dessas práticas envolve pedir que o cliente feche seus olhos e atente para seu corpo, uma
parte de cada vez, buscando observar sensações corpóreas como conforto/desconforto, relaxamento/tensão,
calor/frio, textura da roupa e da poltrona em sua pele, batimento cardíaco, respiração. Caso sua atenção se
volte para outros aspectos do ambiente (e.g., ruído externo, seus pensamentos), ele deve simplesmente
retornar o foco para o seu corpo (MOREIRA, et al., 2017, p.233).
exercícios que tivesse maior atenção plena no momento presente de modo a aliviar pensamentos que
se remeta ao passado ou ao futuro.
Consecutivamente, foi solicitado ao cliente que anotasse em seu diário ou agenda, os horários,
bem como os Registros Pensamentos (RP)9, dentre os quais deveria ser associado aoseventos para que
fosse, posteriormente, trabalhados nas sessões psicoterapêuticas.
Em sessões seguintes, foi possível notar os resultados provenientes das primeiras intervenções
tendo em vista iniciativa em estabelecer contato social com os colegas de sua turma, como também
obtiveram-se êxitos com relação as anotações no diário dentre as quais suscitaram conteúdos
significativos a serem trabalhados e retomados na presente sessão.
Observou-se que os pensamentos que mais angustiavam o cliente se voltava para o período
vespertino, espaço de tempo que permanecia sem atividade de rotina.
Como nas sessões anteriores foi verbalizado pelo próprio cliente sobre as suas habilidades
manuais, com instrumentos musicais, por exemplo, houve retomada desse conteúdo por parte da
psicoterapeuta em verificar a possibilidade dele preencher o seu tempo e voltar a tocar teclado, ou de
então a voltar as aulas para aperfeiçoamento, tendo em vista que havia aprendido a tocar o instrumento
há muito anos quando frequentou o Instituto dos Cegos.
Houve, portanto, total validação por parte do cliente que acreditou ser de extrema importância
reinserir as aulas de música (teclado) em sua rotina, atividade altamente valorizadapelo cliente.
Com relação a outra demanda trazida estava relacionada a dificuldades com o sono saudável
uma vez que apresentava interrupção no sono, talvez por ter revelado apresentar “sonhos” vívidos.
A Terapia Cognitivo-Comportamental não trabalha com “sonhos” de modo a interpretá- los
como sendo uma porta de entrada acessível aos esquemas cognitivos do cliente de modo a identificar
as possíveis distorções.
Desse modo foi solicitado pela psicoterapauta que o cliente narrasse as partes principais dos
“sonhos”, bem como foi solicitado que retratasse os seus significados, preocupou-se em identificar se
ele se reconhecia ou atribuia reconhecimento a alguém ou relacionado a alguma situação vivida. Na
ocasião, ele não se reconheceu, não sendo possível acessar as suascontingências históricas.
Sendo assim, a psicoterapeuta teve um Insight em evocar os pensamentos que expressavam
angústias no momento atual, representando as contingências atuais e históricas. Eo cliente retomou:
F: Ah... são lembranças da minha infância, da minha juventude, tanta coisa... de quandoeu

9
O Registro de Pensamentos (RP), também conhecido em uma versão anterior como Registro Diário de
Pensamentos Disfuncionais (Beck et al., 1979), é uma planilha que estimula o cliente a avaliar seus
pensamentos automáticos quando se sente angustiado (BECK, 2013, p. 214).
enxergava mais...
Respeitou-se o tempo do cliente, pois notou-se que ele não estava preparado para falar sobre
a perda visual.
Nesse sentido a psicoterapeuta questiona se existe algum sentimento de rancor ou mágoaE ele
verbaliza sobre preferências afetivas, no passado, por parte do pai, no caso na interpretação do cliente,
dele, o pai, ter dispensado maior afetividade ao seu irmão. De tal modoque mencionou:
F: Não sei se foi porque ele tava seguindo os passos dele profissionalmente. Sei lá...
Talvez para que houvesse alguma aprovação no presente, o cliente se desdobrou ao máximo
para realizar duas faculdades, de tal modo que pudesse ser reconhecido pelo pai tal como o seu irmão
foi. Como também, uma maneira de superar os limites e barreiras capacitistas impostas pela cultura e
ordem social às pessoas com deficiência.
Por mais que se tentasse atribuir novas configurações para a sua representação social, a
emissão de comportamentos ainda não era tão efetiva, mesmo tendo sido observado empiricamente,
pela ação psicoeducativa estar modelando novos efeitos de comportamento junto ao cliente (Del
Prette; Del Prette, 2005) ainda notou-se uma busca incessante pelo reconhecimento e aprovação social
(evento público).
Outra situaçao que foi trabalhada em sessões psicoterapeuticas foi um desconforto emocional
gerado na sala de aula da universidade, uma vez que revelou sentir ansiedade quando poderia ser
sorteado para realização de prova oral, com arguição.
Percebeu-se insegurança em ouvir os textos por meio da tecnologia assistiva do DosVox10,talvez
por não ter um acompanhante, para contribuir com a conferência de todo o material, bemcomo com a
sua rotina diária de estudos. Embora a Universidade tivesse oferecido o apoio de um Ledor.
Como também foi possível notar a falta de iniciativa, solicitação de apoio, como de
habilidades na expressão e comunicação no que se refere a interação com os colegas de turma o que
impactava na resposta a ser dada quando era submetido a exposição de trabalhos perantea sua sala de
aula. (DEL PRETTE, et al., 2004; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2005). Talvez a ausência de
recursos de Tecnologia Assistiva fazia com que se sentisse inseguro perante os demais.
Ademais, surgiu uma última demanda que será retratada neste estudo que está relacionadacom
sentimentos de desvalorização por parte dos colegas tendo em vista a observação de um evento em
que recebeu um antigo colega de sua primeira faculdade em sua casa. Posterior a visita deste colega

10
É um sistema para microcomputadores da linha PC que se comunica com o usuário através de síntese de
voz, viabilizando, deste modo, o uso de computadores por deficientes visuais, que adquirem assim, um alto
grau de independência no estudo e no trabalho. Extraído de (http://intervox.nce.ufrj.br/dosvox/intro.htm).
surgiram vários sentimentos que vieram a tona e que, portanto, foram trabalhados nas sessões. Uma
representação desses sentimentos foi elucidado pelo cliente, a saber:
F: Acho que me recordei da sensação de ser tratado por sua turma como um
“coitadinho”...[...].
Esta fala remeteu ao capacitismo, o qual denota preconceito contra a pessoa comdeficiência,
sendo julgado pelos demais como “menos capaz”. Tais sentimentos exercidos peloscolegas de turma
revalam um conjunto de sentidos imbuídos de preconceitos e estereótipos contruídos socialmente
dentre os quais foram difundidos históricamente e que hoje permeiam os discursos provenientes do
senso comum.
Como também observou-se a criação de estereótipos evidenciam traços presumidos comuns a
todas as pessoas que são colocadas numa mesma categoria, dentre os quais elucidam marcas que
distinguem as caracterísitcas das pessoas (OMOTE, 2004).
Além do episódio de tristeza em decorrência do tratamento recebido por sua turma da primeira
faculdade que fez, demonstrou afeto por esse colega, enfatizando que eram próximos. De tal modo que
revelou:
F: “Ele é uma pessoa tranquila, costumavamos fazer os trabalhos da faculdade juntos.
Hoje ele é professor de História em outa cidade....[...]”.
Observou-se que mesmo tendo recebido o colega em sua residência, todo sentimento quefazia
menção a sua turma provocava nele serntimentos e comportamentos aversivos de esquiva(NOBRE, et
al., 2006).
Acolheu-se o sentimento de esquiva, mas por outro lado, também reforçou-se comportamentos
saudáveis e produtivos frente a situação vivenciada por uma cultura excludente, atendendo aos
princípios das habilidades sociais (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2005).
Todo processo interventivo foi planejado de modo empático, a fim de promover o manejo e a
aprendizagem do próprio cliente em compreender e regular as suas emoções e sentimentos de modo
que conseguisse lidar com elas de modo que se tornasse o seu próprio terapeuta, denominado na TCC
de auto-terapia.
Para tanto, os resultados obtidos ao final das sessões elencadas foram satisfatórios, uma vez
que o cliente apresentou abertura junto ao processo terapêutico, característica que contribuiu com o
sucesso dos resultados voltados para ampliação de seu repertório de habilidades sociais (DEL
PRETTE; DEL PRETTE, 2005; MAIA; DEL PRETTE; FREITAS, 2008).
A aprendizagem de novas habilidades foram vistas como promissoras ao auxiliá-lo em
mudanças de hábitos e comportamentos causadores sofrimentos tais como a ansiedade mesmo sendo
vivenciada de forma reativa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer das sessões psicoterapeuticas notou-se modificações signiticativas no
comportamento do cliente, tendo em vista a eficácia decorrentes dos métodos e das técnicas utilizadas
pela terapia cognitivo- comportamental.
Observou-se certa autonomia e independência na relação social e familiar do cliente, mas a
maneira como se relacionava com os colegas ainda favorecia certo isolamento social, havendo
necessidade de se explorar e aprofundar em sessões subsequentes.
Notou-se que a falta de habilidades na expressão e comunicação e interação com oscolegas
de turma impactava na resposta a ser dada quando era submetido a exposição detrabalhos perante
a sua turma da universidade. Mas por outro lado, notou-se um histórico capacitista vivenciado
por este cliente uma vez que sentia-se desconfortável diante das falas providas de conteúdos
preconceituosos que foram reproduzidos ao longo do curso frequentado. Ao longo das sessões
reforçou-se comportamentos saudáveis e produtivos frente a situação vivenciada por uma cultura
excludente, atendendo aos princípios de atitudesprovenientes das técnicas de habilidades sociais.
Dois pontos importantíssimos para que houvesse sucesso na psicoterapia foi sobre o processo
embasado na Psicoeducação em que o cliente além de utilizar as ferramentas apresentadas para a
manutençao do seu bem estarinterior, ele as utilizava também no manejo frente as dificuldades do
convívio intrafamiliar, na relação com esposa e filhos, bem como a outros setores de sua vida, na
busca por equilíbrio em sua relaçao afetiva, familiar e social. É necessário reafirmar sobre a
importância de haver novos estudos que estimulem novos olhares a fim de rompermos com os
preconceitos e estereótipos construídos socialemnte para contribuir com material de pesquisa
científica no manejo da psicoeducação.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão das Pessoas com
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Presidência da República. Diário Oficial da
União. Brasília, DF, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13146.htm> Acesso em: 11nov. 2021.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental. Artmed Editora, 2013.

DEL PRETTE, Z. A. P., DEL PRETTE, A. Psicologia das habilidades sociais na infância: teoria e
prática. Petrópolis: Editora Vozes, 2005.

DEL PRETTE, Z. A. P., et al. Habilidades sociais de estudantes de Psicologia: um estudo


multicêntrico. Psicologia: Reflexão e crítica, v. 17, p. 341-350, 2004.

MAIA, J. M. D.; DEL PRETTE, A.; FREITAS, L. C. Habilidades sociais de pessoas com
deficiência visual. Rev. bras. ter. cogn., Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, jun. 2008.

MOREIRA, F. R. et al. Comparação entre os conceitos de self na FAP, na ACT e na obra de


Skinner. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, v. 19, n. 3, p. 220- 237, 2017.

OMOTE, S. Estigma no tempo da inclusão. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 10,
n.3, p. 287-308, 2004.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Programa para prevenção da cegueria: o atendimento


de crianças com baixa visão. Relatório Bangkok, 2002.

PICOLO, G. M; MENDES, E. G. Para além do natural: Contribuições sociológicas a um pensarsobre


a deficiência. In: MENDES, E. G; ALMEIDA, M. A. (Orgs). A pesquisa sobre inclusão escolar em
suas múltiplas dimensões – Teoria, Política, e Formação. Marília, ABPEE, 2012, p. 53-90.

SEHNEM, S. B, et al. Psicoeducação enquanto técnica da teoria comportamental cognitiva.


Seminário de Iniciação Científica e Seminário Integrado de Ensino, Pesquisa e Extensão, [S.l.],
2016. Disponível em: <https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/siepe/article/view/10677>. Acesso
em: 12 nov. 2021.
O FAZER CLÍNICO DE UM CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL AOLONGO DA
PANDEMIA: DEMANDAS E REFORMULAÇÕES

Camila Ponsoni Candido1


Marcella Ventoso Luciano Pereira 2
Ana Flávia Freitas Rodrigues Martins3
Gabriele Nunes Santos4
Sarah Miguel Rodrigues5
Gabriela Franco de Almeida6

RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir as alterações causadas no cotidiano de um CAPS
do interior de Minas Gerais em função da pandemia do coronavírus. O período previamente definido
para investigação foi de Março de 2020 a Outubro de 2021. Como metodologia, nos valemos de
entrevistas que ocorreram no período entre 03 e 04 de novembro de 2021 com profissionais do CAPS
em questão, sendo eles a coordenadora, 1 enfermeiro e 3 psicólogas. A pergunta norteadora do
trabalho foi: Como foi a experiência vivida pela pandemia aqui no CAPS? A partir das respostas dos
participantes, outras questões puderam ser feitas. A compreensão da pesquisa foi baseada na
perspectiva desenvolvida por Amedeo Giorgi (1931), psicólogo americano conhecido por suas
contribuições à fenomenologia. Com base nas entrevistas foi possível agrupar os resultados nas
seguintes categorias: Mudança das atividades realizadas; Mudança de público e demanda; Aumento
da demanda; Intensificação do trabalho; Maior envolvimento das famílias; Maior adesão no cuidado
à saúde mental; Volta ao ‘normal’. A pandemia do Covid-19 alterou o cotidiano e as atividades
básicas de todas as pessoas e locais, incluindo o CAPS. Com o avanço da vacinação, os profissionais
se veem agora diante do desafio de dar sequência aos trabalhos grupais e nos encaminhamentos que
serão necessários. Estagiárias do serviço e orientadora, todas autoras deste trabalho, enfrentaram e
enfrentam também em alguma medida as alterações discutidas, o que desafia positivamente a
experiência de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: CAPS; pandemia; COVID-19; demandas e reformulações.

INTRODUÇÃO
O isolamento social, parte essencial da realidade pandêmica do vírus Covid-19, fortaleceu
sintomas ansiogênicos na população em geral: preocupação acerca do futuro, sentimento de falta de
controle, demissões em massa, má gestão do governo para lidar com a situação... Essas situações do

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
5
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
6
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
cotidiano da pandemia contribuíram para o desenvolvimento de quadros de sofrimento mental grave,
fazendo com que a temática da saúde mental ganhasse um certo destaque nesse período e que as
pessoas também buscassem mais auxílio neste cuidado (DANZMANN et. al., 2020).
Contudo, nem todos os sinais de sofrimento devem ser patologizados, por se tratarem de
reações esperadas frente a uma pandemia que afligiu a população e o Sistema Único de Saúde sem
aviso prévio de sua proporção. Contudo, todo sofrimento deve ser considerado e devidamente
acolhido pelos profissionais de saúde mental, que devido aos riscos de contaminação, precisaram e
ainda precisam tomar os cuidados necessários e o distanciamento em seus atendimentos,
transformando a prática dos serviços de saúde (DANZMANN et. al., 2020). Outro ponto que se
destacou foi o luto (FERGUSON et al., 2020). As medidas de distanciamento impediram o contato
próximo dos hospitalizados com seus familiares, transformando então os rituais de passagem,
influenciando e muitas vezes dificultando o processo de elaboração do luto.
Segundo Lima et al. (2020), além do medo de contrair a doença, as pessoas se sentem
extremamente inseguras mediante o isolamento social, e todas as mudanças ocorridas devido ao vírus.
Todos tiveram suas vidas alteradas e a saúde física e mental foram impactadas de diversas formas,
ocasionando um aumento exponencial de procura nos serviços públicos de atendimento à saúde
mental. Em momentos de calamidade pública, os dispositivos de cuidado em saúde mental são
essenciais. Contudo, durante o pico pandêmico, os Centros de Atenção Psicossociais (CAPS) tiveram
seu funcionamento restringido e alguns serviços que funcionavam diariamente, como as oficinas e
grupos terapêuticos foram suspensos.

OBJETIVO
A fim de compreender melhor como o fazer clínico é transformado no principaldispositivo de
cuidado em saúde mental, o presente trabalho tem como objetivo apresentar alterações no cotidiano
de um CAPS do interior de Minas Gerais, a partir da pandemia do coronavírus. O período avaliado
será de Março de 2020 a Outubro de 2021.

MÉTODO
Este trabalho tem caráter descritivo: nos valemos de entrevistas, buscando alcançar o
significado das experiências vividas pelos profissionais sobre o fenômeno estudado. A pergunta
norteadora estabelecida neste trabalho é: “Como foi a experiência vivida pela pandemia aqui no
CAPS?”. A partir da resposta do entrevistado, outras perguntas puderam ser feitas de acordo com o
relato que surgia.
As entrevistas foram realizadas entre 03 de novembro de 2021 e 04 de novembro de 2021.
Estas foram realizadas com 5 funcionários do CAPS: coordenadora, 1 enfermeiro e 3 psicólogas. Os
participantes foram esclarecidos a respeito do propósito do trabalho e assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
A compreensão da pesquisa foi baseada na perspectiva desenvolvida por Amedeo Giorgi
(1931), psicólogo americano conhecido por suas contribuições à fenomenologia. Tendo elaborado
passos bem detalhados para um trabalho fenomenológico. O seu método divide-se em quatro etapas,
sendo elas: (1) estabelecer o sentido geral; (2) determinação das partes — divisão das unidades de
significados; (3) transformação das unidades de significado emexpressões de carácter psicológico;
(4) determinação da estrutura geral de significados psicológicos.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Com base nas entrevistas foi possível agrupar os resultados de maneira que fossem
organizados em temas extraídos do conteúdo geral de cada entrevista conforme foram sendo
evidenciados na totalidade do relato dos participantes, o que possibilitou a construção das seguintes
categorias: Mudança das atividades realizadas; Mudança de público e demanda; Aumento da
demanda; Intensificação do trabalho; Maior envolvimento das famílias; Maior adesão no cuidado à
saúde mental; e Volta ao ‘normal’.
A apresentação de parte dos conteúdos das entrevistas, que serão apresentados logo abaixo,
estão organizados por categoria e os entrevistados serão referidos aqui como Entrevistada 1
(coordenadora), Entrevistado 2 (enfermeiro), Entrevistada 3 (psicóloga), Mudança das atividades
realizadas
Nessa categoria observa-se um aspecto em comum na fala dos cinco entrevistados, no que diz
respeito às mudanças que foram observadas no cotidiano do serviço no CAPS, assim como nas
atividades que eram realizadas, que passaram de grupais para individuais: “O modelo do serviço
sempre foi um modelo de atendimento de grupo, de muita gente… Então, a gente tinha circulação de
pacientes a todo momento” (ENTREVISTADA 1). A entrevistada em questão, coordenadora do
serviço, destaca que essa circulação foi alterada.
De acordo com Azevedo e Miranda (2011), a proposta terapêutica do CAPS pode ser
compreendida por uma série de atividades e dinâmicas diversificadas. Dentre as atividades que são
realizadas coletivamente, podemos citar as oficinas terapêuticas, as atividades artísticas, as
festividades em datas comemorativas, os passeios externos, entre outros. Aindade acordo com os
autores, a realização das oficinas terapêuticas possibilitam a projeção de conflitos internos/ externos
por meio de atividades artísticas, que valorizam o potencialcriativo, imaginativo e expressivo do
usuário, e além disso, o fortalecimento da autoestima e da autoconfiança (AZEVEDO; MIRANDA,
2011).
O Entrevistado 2, enfermeiro, explica: “Eu vi uma mudança das atividades que é os grupos
né?! (...) não tava tendo esses grupos devido a pandemia. Porque tinha aglomeração, essa questão
mudou muito os atendimentos internos (...)”. Ele chega a explicar que a rotina ficou com um caráter
mais ambulatorial e cita o exemplo de pacientes em crises: “... Só que a gente não podia oferecer o
atendimento em grupo, que é… um movimento que traz uma eficácia bastante grande”.
A Entrevistada 3, psicóloga, ressalta que em 2018 a média de pessoas por dia era entre 20 e
30: “... Atualmente a gente teve que fazer tudo é… utilizando outros recursos comovisita, é…
utilizado mais telefone, ou fazer mais conversas individuais, o que demandou mais tempo da gente
(...)”.
As entrevistadas 4 e 5 também tiveram respostas bem semelhantes, o que favorece a percepção
da adaptação do CAPS às necessidades impostas pela pandemia. O serviço precisou se adequar às
questões sanitárias. As atividades que ali ocorriam tiveram que passar por reformulações e o seu
modelo de funcionamento passou a ser voltado, predominantemente, para os atendimentos mais
individualizados.
Os pacientes, em sua maioria, buscavam (antes da pandemia) a medicação no serviço, mas o
CAPS, em caráter protetivo, precisou ampliar a entrega da medicação em domicílio. A entrevistada
4 também ressalta que todos tiveram que se adaptar ao uso de máscaras e álcool em gel.

Mudança de público e demanda


Essa categoria se fez presente em três entrevistas, com a fala em comum de uma mudança no
perfil do público atendido no CAPS e nas demandas trazidas por estas pessoas: “A demanda mudou
muito, por exemplo, lá atrás eram pacientes muito crônicos, que demandavam muito da gente. Hoje
em dia não. São pacientes mais depressivos...” (ENTREVISTADA 3).
Segundo o Ministério da Saúde (2004), na cartilha “Saúde Mental no SUS”, o público alvo
para atendimento nos CAPS são as pessoas que encontram-se em sofrimento psíquico intenso,
impossibilitadas de realizar atividades e projetos de vida, com transtornos mentais severos e/ou
persistentes (pacientes crônicos), incluindo usuários de álcool e/ou outras drogas.
A fala da Entrevistada 1 demonstra sobre o perfil de público atendido pelo CAPS e alteração
sofrida no período pandêmico:

(...) a pandemia do COVID-19 trouxe para a gente (...) várias crises de ansiedade,
(...) atendimento de álcool e outras drogas, depressão… Às vezes, demandas que
nem são demandas do serviço, a gente abarcou pelo fato do modelo de atendimento
que a gente tá tendo(…).

A coordenadora explicou ter ampliado o cuidado para demandas de nível leve a moderado em
função da intensa procura.
A Entrevistada 4 acrescenta dizendo:

Percebo que são pessoas novas, não cronificadas, ainda, né… Não visualizo que esse
maior público que o CAPS tá atendendo seja para CAPS… Eu acredito que seja
algo apenas… provisório, até que eles consigam ter autonomia para retornar.

Dessa forma, é possível notar que a instituição também flexibilizou a eletividade de seus
pacientes, de acordo com o público que estava requisitando atendimento e acolhimento na saúde
mental.

Aumento da demanda
Nessa categoria conseguimos perceber o que pesquisas recentes têm trazido a respeito dos
efeitos causados pela pandemia. Segundo Faro et al. (2020), esse tipo de evento gera perturbações
psicológicas e sociais, afetando a capacidade de enfrentamento de toda a sociedade, em diferentes
níveis de intensidade e propagação. Os autores ainda discorrem que em situações pandêmicas é
comum que transtornos mentais possam ser desencadeados pela quarentena, tais como os transtornos
de ansiedade e depressão e indícios de aumento do comportamento suicida, além de um aumento
significativo em quadros como estresse, transtorno do pânico, insônia, medo e raiva e (FARO et al.,
2020).
Através do relato de 4 dos entrevistados, conseguimos perceber esse grande impacto na
saúde mental da população, o que por consequência gerou um aumento da demanda no CAPS, uma
vez que é principalmente por meio desse serviço que as pessoas em sofrimento outranstorno mental
são acolhidas pelo SUS (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020).
A Entrevistada 3 explica que:

(...) em 2018, quando eu era estagiária daqui eu saí com 800 pacientes, 800
prontuários. Hoje a gente tá chegando em 1300, e se a gente for, eu não tenho a
somativa exata da pandemia, mas foram… 300 prontuários mais ou menos, então é
uma quantidade absurda (…).

Nesse mesmo sentido, a entrevistada 4 também explica que tinha 40 pacientes para escutas
mensais e que atualmente tem 75, o que significou ampliar suas horas para essa atividade.
Ao reconhecer o aumento generalizado de demanda, o Ministério da Saúde (2020) emitiu uma
nota na qual diz que está liberando mais de R$14,1 milhões para municípios de Minas Gerais
ampliarem os atendimentos em saúde mental durante a pandemia da Covid-19. Esse incentivo
financeiro é instituído pela Portaria nº 3.350, e será destinado para qualificar as ações ofertadas nos
CAPS.

Intensificação do trabalho
A pandemia sobrecarregou o sistema de saúde que precisou atender os casos relacionados
diretamente com as questões físicas, mas também casos que envolvem desdobramentos emocionais
na Rede de Atenção Psicossocial (BARBOSA et al., 2020).
Nesse sentido, “Intensificação do trabalho” foi uma categoria que se fez presente de forma
marcante em quatro entrevistas, ou seja, a carga de trabalho para os funcionários também foi
crescente.
A Entrevistada 1 explica que o atraso no estágio em parceria com uma instituição de ensino
superior, que auxiliava bastante na execução do trabalho do CAPS, sobrecarregou os profissionais e
que também perderam outros parceiros da rede: “A gente perdeu parceiros quea gente tinha, como
também o CRAS, por exemplo, que era um parceiro de atividades de grupo.”
Por outro lado, a Entrevistada 3 chama a atenção para a forma como a sua responsabilidade
mudou muito, acrescentando que, quando perguntada recentemente sobre o que fazia uma psicóloga
no CAPS, respondeu: “A psicóloga faz tudo aqui (…) Eu acho que [a maior dificuldade] foi
conciliar o nosso tempo em organizar tudo e… ver o CAPS em outra configuração de trabalho (...)
Gerou muito… é… envolvimento mesmo, sabe?”.
Além disso, chamamos atenção para um outro ponto, abordado nas entrevistas, que dizrespeito
ao amparo oferecido à residência do paciente com suspeita ou confirmação da Covid 19, no qual
novas estratégias passaram a ser utilizadas, tal como a entrega das medicações na casa da pessoa, para
reduzir a circulação desta pela cidade. Por fim, o que foi possível de se perceber nessa categoria é
que no que diz respeito a intensificação do trabalho, este ocorreu de diferentes maneiras e em
diferentes etapas do serviço realizado pelo CAPS.
Maior envolvimento das famílias
A categoria "Maior envolvimento das famílias" apareceu nas falas de apenas dois
entrevistados, que retratam a necessidade do CAPS de atender também os familiares dos usuários,
dividindo responsabilidades do cuidado com os mesmos, os quais fazem parte do núcleo de
convivência do usuário.
A Entrevistada 3 relata que: "Com a pandemia a gente teve que ficar ainda mais próximo
desses familiares, eu falo, o CAPS ele fecha, ele tem limitações, então a gente precisa acionar,
responsabilizar essa família de que o cuidado é conjunto.” Ela acrescenta que muitas famílias não
aderem, mas que outras participaram mais efetivamente, sim.
Nesse sentido, a Entrevistada 5 também relata: “O trabalho do CAPS é um trabalho (...) com
alto risco de sofrimento e a gente vê esse sofrimento da família também. Então acaba que a
gente nunca atende só o paciente, é também o núcleo familiar que a pessoa está inserida."
De acordo com o Ministério da Saúde (2004), os familiares são o elo mais próximo da pessoa
com o mundo e realmente o CAPS deve incentivar a participação dos mesmos no serviço,
incentivando o usuário a se envolver no processo terapêutico, participando também das atividades
internas, reuniões, assembleias e ações de integração social, podendo até mesmo se associarem a
outros familiares e/ou usuários, promovendo saúde e cidadania aos envolvidos. Dessa forma, somos
capazes de observar a importância da adesão da família no serviço juntamente ao usuário,
contribuindo para uma melhor eficácia do projeto terapêutico.

Maior adesão à saúde mental


A categoria de “Maior adesão no cuidado à saúde mental” apareceu somente em uma
entrevista, contudo não se faz menos relevante. De acordo com Faro et al. (2020), a preocupação das
pessoas com a saúde mental cresceu muito durante a pandemia. Com todas as modificações e
impactos causados pelo Covid-19, os sofrimentos mentais aumentaram e com isso a procura por
serviços de ajuda psicológica também. Alguns países como a China instituíram serviços de atenção
psicológica para indivíduos que tiveram sua saúde mental atingida de alguma forma por conta da
pandemia (FARO et al., 2020). Em conformidade comos dados recolhidos na entrevista, nota-se uma
maior preocupação das autoridades em relação à população: “Vejo que a prefeitura mandou mais
profissionais aqui pro CAPS (...) Profissionais que chegaram devido a esse aumento da demanda.”
(ENTREVISTADA 4). Outro fator importante é que estudos têm apontado que a adesão por serviços
psicológicos não é uma preocupação só dos governantes, mas sim de grande parte da população.
Ademais, o pré-julgamento dos indivíduos em relação a profissionais de saúde mental, em específico,
diminuiu:

Com o aumento do público, procurando o CAPS, eu senti… uma diminuição no pre


conceito... Eu tenho percebido essa maior adesão, eles não estão receosos de vir
fazer tratamento aqui… Às vezes, eles não vão continuar por muito tempo, mas vir
até aqui e falar: ‘Não, não vou naquele lugar porque é de louco…’. Não tem
acontecido. Então, eu percebo que essa acessibilidade do CAPS tá maior.
(ENTREVISTADA 4).

A procura por atendimento psicológico expandiu de uma forma geral em âmbito privado
também, sendo facilitada pela liberação de atendimentos on-line. Segundo Viana (2020), a
procura por atendimentos em todas as modalidades (presencial e on-line) aumentoucom o objetivo de
garantir o autocuidado.

Volta ao ‘normal’
A categoria de “Volta ao normal” surgiu em 4 das 5 falas dos entrevistados. Isso representa
uma parcela considerável para análise, sendo essa reflexão comum a muitos indivíduos diante da
pandemia. Ainda não existem materiais científicos substanciais acerca da volta ao normal, ainda que
haja muita especulação sobre como os novos modos de vida vão se formar.
Sobre essa última etapa de enfrentamento da pandemia, Werneck & Carvalho (2020)
explicitam: “Por fim, e não menos importante, é a fase de recuperação, quando há sinal consistente
de involução da epidemia e o número de casos se torna residual. Essa última fase requer uma
organização da sociedade para a reestruturação social e econômica do país. E, certamente, intervenção
do Estado.” (p. 2).
Em associação com as falas dos entrevistados, entendemos que os serviços em saúde ainda
estão se organizando, se reestruturando para que a “volta ao normal” possa progressivamente
acontecer. Isso fica perceptível na seguinte fala: “A gente tá começando a voltar ao que a gente era
há dois anos atrás… (...) Agora a gente tá tentando refazer aquele perfil, né… Que é o perfil que tá
em portaria, que é colocado pelo Ministério da Saúde, mas é muito difícil.” (ENTREVISTADA 1).
Nesse sentido, a Entrevistada 3 explica que uma nova adaptação será feita para retornar à
rotina de grupos, por exemplo: “Essa adaptação tem sido difícil pra nós, eu percebo isso agora. São
dois públicos muito diferentes (...) agora vai ser um período em que a gente vai realmente conseguir
ver quem é paciente de CAPS e quem não é. Vamos conseguirpassar a peneira (...)”.
A Entrevistada 5 declara que estão em fase de preparação para a volta dos grupos e diz que
isso será muito bom para as pessoas, que acredita na troca de experiências. A Entrevistada também
acrescenta que novos cuidados serão tomados: garantia da vacina, menos pessoas no grupo e apenas
um profissional conduzindo. Além disso, a Entrevistada 4 também declara que a vacinação trouxe
mais segurança e menos preocupação e que o retorno está sendo positivo.
Destacamos que o retorno mencionado nessa categoria não se trata necessariamente de um
retorno ao que já era conhecido antes. O normal colocado nessa categoria, inclui novidades e
adaptações, e isso aparece na fala das quatro participantes em questão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pandemia do Covid-19 alterou o cotidiano e as atividades básicas de todas as pessoas e
locais e com o CAPS não foi diferente. Antes pautado por uma lógica grupal, encontrou-se
impossibilitado de trabalhar da maneira usual.
O CAPS precisou (re)criar maneiras de exercer suas atividades e funções e pudemos
identificar, a partir das entrevistas, que a principal mudança ocorrida se deu na forma de atendimento
ao paciente: antes os atendimentos aconteciam, prioritariamente, na modalidade grupal, passando a
ocorrer de maneira individual, o que interferiu na quantidade de trabalho para os profissionais.
Estagiárias do serviço e orientadora, todas autoras deste trabalho, enfrentaram e enfrentam
também em alguma medida as alterações discutidas, o que desafia positivamente a experiência de
ensino-aprendizagem. Antes o estágio que era oferecido em caráter psicossocial, em parceria com o
trabalho de grupo e das oficinas, tem sido desenvolvido em caráter clínico e individual. Porém,
sempre tentando favorecer lógicas relacionais e não individualizantes.

REFERÊNCIAS
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PSICOLOGIA ESCOLAR EM TEMPOS DE PANDEMIA: O GRUPO DE PAIS COMO
ESTRATÉGIA PARA ATUAÇÃO NAPERSPECTIVA CRÍTICA

Camila Silva Barbosa Sadala 1


Marília Gouveia Saad 2
Célia Regina da Silva 3

RESUMO
O presente texto visa apresentar uma análise do trabalho desenvolvido no estágio profissionalizante
em psicologia escolar junto a um grupo de pais e/ou responsáveis por crianças até 12 anos que
buscaram atendimento para seus filhos na clínica-escola da Universidade do Estado de Minas Gerais.
Foram analisados quatro encontros desenvolvidos remotamente via plataforma Google Meet com
participação de nove pessoas divididas em dois grupos, conforme disponibilidade. O método de
condução do grupo fundou-se na perspectiva do processo grupal na perspectiva do materialismo
histórico-dialético e as temáticas trabalhadas foram elaboradas com base nos postulados de Vygotsky
sobre o papel das interações sociais no desenvolvimento humano. A análisedos encontros revela que
as temáticas abordadas mobilizaram reflexões e necessárias ao papel a ser exercido pelos adultos para
o desenvolvimento das crianças, bem como possibilitaram a ampliação da compreensão dos
participantes em relação ao funcionamento psicológico das crianças. Conclui-se que o trabalho com
grupo de pais, mães e responsáveis mostra-se como espaço potente para atuação coerente com a
perspectiva crítica em psicologia escolar.

Palavras-chave: Psicologia Escolar Crítica; grupo de pais; desenvolvimento infantil

INTRODUÇÃO
Entre tantos desafios que a pandemia de covid-19 trouxe para as famílias brasileiras, destaca-
se a necessidade de conduzir a educação das crianças sem a frequênciapresencial nas escolas devido à
necessidade de manter-se em isolamento social. Essa situação produziu efeitos desastrosos no
desenvolvimento das crianças que vão desde o aumento da violência doméstica até quadros de
ansiedade e comportamentos auto lesivos3, levando pais e responsáveis a buscar os serviços de
atendimento psicológico infantil. Ao mesmo tempo, a morosidade em relação ao avanço da vacinação
aliada à faltade condições para oferecer atendimento presencial para crianças na clínica-escola trouxe
a impossibilidade de oferecer atendimento psicológico infantil para as famílias. A análise dessa
conjuntura nos levou à elaboração da proposta de realizar as atividades do estágio de psicologia
escolar desenvolvendo uma intervenção junto a um grupo de pais, mães e responsáveis que
registraram pedidos de atendimento psicológico para crianças em nossa clínica-escola, como

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
possibilidade imediata de acolher as angústias enfrentadas pelas famílias e criar um espaço de diálogo,
reflexão e orientação para os adultos com o intuitode favorecer o bem-estar das crianças.
Trata-se de uma forma de atuação que se diferencia em relação ao lugar tradicionalmente
ocupado pela psicologia escolar e educacional cujo discurso patologizante tende a culpabilizar os
sujeitos em desenvolvimento por não corresponderem às expectativas de aprendizagem e
comportamento, propondo intervenções centradas em laudos e diagnósticos.
De outro modo, vimos no trabalho com pais, mães e responsáveis a possibilidade de
compreender as demandas que eram fonte de sofrimento nas famílias em relação às crianças e
desenvolver reflexões sobre as características do desenvolvimento infantil do ponto de vista científico
e as estratégias a serem adotadas para aprimorar a qualidade das interações entre adultos e crianças,
tendo em vista a promoção do desenvolvimento infantil em contexto domiciliar, bem como da saúde
mental de toda a família.
Diante do exposto, o presente texto busca apresentar algumas reflexões sobre o trabalho com
grupo de pais e responsáveis como estratégia de atuação do psicólogo escolar por meio da análise de
quatro encontros que contaram com a participação de nove pessoas divididas em dois grupos,
estabelecendo relações entre o conteúdo dos encontrosdesenvolvidos junto aos pais e responsáveis
que participaram do grupo no primeiro semestre e os conceitos teóricos que orientaram a nossa
atuação.

Fundamentação teórica
Para situar o trabalho com grupo de pais e familiares de crianças encaminhadas para
atendimento psicológico como estratégia de atuação coerente com a perspectiva crítica em psicologia
escolar faz-se necessária uma breve exposição em relação à origeme principais pressupostos que
sustentam a psicologia escolar crítica.
De acordo com Checchia (2010) o movimento da psicologia escolar crítica no Brasil
consolida-se entre os anos 70 e 80 em que a autora Maria Helena de Souza Patto denuncia as
ideologias encontradas em concepções e práticas psicológicas no contexto escolar. Entretanto, a
autora revela que a atuação do psicólogo escolar ainda é muito malcompreendida, pois há expectativas
de que o foco do trabalho seja voltado para diagnosticar supostos problemas de aprendizagem,
priorizando avaliações e atendimento clínico individual como principal solução para superar inúmeros
problemas enfrentados no cotidiano escolar.
No senso comum predomina a visão em que as famílias são apontadas como o principal
responsável pelos problemas, denominando-as como “famílias desestruturadas”, “de baixa condição
econômica, que não incentiva os filhos em relação aos estudos”, entre outras expressões
culpabilizantes. Diante disso, concorda-se com Checchia (2010) ao afirmar que os grandes desafios
da atuação do psicólogo escolar em uma perspectiva crítica consistem em “possibilitar o
questionamento e a reflexão de hipóteses naturalizadas sobre a queixa e o fracasso escolar e, ainda,
lidar com as limitações de uma intervenção diante de uma política educacional que tem na base o
descaso pela boa qualidade da escola para o povo”. (PATTO, 2005, p.19 apud CHECCHIA, 2010,
p.380).
Para isso é preciso que, ao atuar na área da educação, os profissionais da psicologia ponderem
sobre os objetivos, o que está sendo avaliado e reflitam sobre como promover mudanças considerando
o campo de relações, de forças e de fenômenos psicológicos que afetam as relações envolvidas na
queixa. Enfim, o psicólogo escolar busca problematizar junto aos profissionais da área escolar, todos
os atravessamentos decada caso, porém, pensados a nível institucional, e não clínico. São forças que
se unem em rede, pois somente no coletivo é possível construir alternativas e caminhos para um
ambiente escolar mais satisfatório para todos. (MACHADO, 2003).
Para isso é preciso que, ao atuar na área da educação, os profissionais da psicologia ponderem
sobre os objetivos, o que está sendo avaliado e reflitam sobre como promover mudanças considerando
o campo de relações, de forças e de fenômenos psicológicos que afetam as relações envolvidas na
queixa. Enfim, o psicólogo escolar busca problematizar junto aos profissionais da área escolar, todos
os atravessamentos decada caso, porém, pensados a nível institucional, e não clínico. São forças que
se unem em rede, pois somente no coletivo é possível construir alternativas e caminhos para um
ambiente escolar mais satisfatório para todos. (MACHADO, 2003).
A autora complementa ressaltando que há de se considerar a implicação de todos inseridos no
contexto escolar, desde alunos, professores e familiares de forma a promover o protagonismo de todos,
fazendo com que cada um se sinta respeitado em sua singularidade, pois há casos em que a família
se afasta da escola por medo julgamentos que sofrem. Não se pode imputar somente ao aluno ou a
família a responsabilidade sobre a situação “problema” que emergiu, pois o caminho da construção de
alternativas e saberes se dá em conjunto, em comunidade, para que todos sintam-se parte do processo
e capazes de interferir e gerar mudanças e não se sintam apenas assujeitados ao que ocorre no
ambiente escolar. (MACHADO, 2003).
Collares e Moysés (1992) acrescentam que, geralmente, os profissionais daeducação tendem
a explicar o fracasso escolar atribuindo-o a razões extraescolares, sem levar em consideração que a
instituição tem um papel fundamental de promover a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos,
evitando criar mais obstáculos ao desenvolvimento de crianças que vivem em condições de
vulnerabilidade. Para as autoras,é preciso considerar todos os fatores que atravessam a vida da criança,
pois vemos a presença da fome, desnutrição, falta de moradia digna e saneamento básico, dentre outras
privações para a criança que estuda na rede pública. Desconsiderar esses fatores e querer medicalizar
ou patologizar o fracasso escolar é um desserviço à comunidade escolar, poiscompreender a educação
é ter um olhar mais amplo a todos os atravessamentos da vida dos alunos.
Para atuar criticamente junto a queixas escolares ou qualquer outra queixa associada ao
processo de educação da criança é necessário fazer uma ruptura, problematizando e não naturalizando
as queixas recebidas, desconstruindo os processos que estabelecem o normal e o anormal, não mais e
somente como patologia, mas a expressão da diversidade da natureza e da condição humana seja qual
for o critério.
Segundo Machado (2000, p.163): “A queixa escolar é constituída em uma história coletiva e
implica buscar o quanto é possível alterar essa produção, afetando os fenômenos nos quais ela se
viabiliza. Nosso objeto, portanto, passa a ser os fenômenos em intervenção”. Compreender a queixa
escolar dessa forma é compreender a complexidade do comportamento humano, olhando para além
das aparências, olhando para a essência, contemplando toda a realidade biológica, psicológica e
social, que se fazem segundo circunstâncias históricas do indivíduo.
Essa compreensão não se restringe apenas aquelas queixas formuladas por agentesescolares,
mas também as situações em que qualquer adulto supõe que esteja havendo problemas no
desenvolvimento da criança devido às dificuldades enfrentadas nas interações cotidianas que tem com
ela. Com base no pressuposto da formação social do psiquismo humano, fundamentamo-nos nas
contribuições de Lev SemionovitchVygotsky (1896-1924) para Psicologia da Educação para analisar
e orientar pais e responsáveis na promoção do desenvolvimento das crianças.
Segundo essa matriz epistemológica postula-se que, ao produzir o meio em que vive, o homem
produz a si mesmo, ou seja, constitui-se como sujeito em um movimento dialético entre aprendizagem
e desenvolvimento. Sendo assim, sua proposta mostra-se em contradição com as concepções vigentes
na época, dentre eles ambientalistas, que afirmavam as determinações do meio no desenvolvimento
do indivíduo; e inatistas, que consideravam a influência do meio como exercendo um papel
secundário, pois para elesà medida que ocorria a maturação, ocorria também a constituição humana.
A visão vigotskiana veio contrapor-se a tais concepções, pois entende que:

[…] o desenvolvimento ontogenético do organismo, que se realiza num processo de


inter-relações com o meio, é, afinal, a realização das suas propriedades específicas...
Razão por que... um estudo da interação do meio exterior e dos organismos que não
leve em conta a própria natureza destes organismos, é uma abstração absolutamente
ilegítima". (LEONTIEV, 1978, p. 159 apud ZANELLA, 1994, p.98)

Ao analisar a relação entre desenvolvimento e aprendizagem na perspectiva vigotskiana


recorre-se ao conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Para o autor russo a aprendizagem
arrasta o desenvolvimento, produzindo uma área em que o desenvolvimento está em potencial, porém
ainda não se efetivou que corresponde a Zonade Desenvolvimento Proximal que: “define aquelas
funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que
amadurecerão, masque estão presentemente em estado embrionário (Vygotsky 1984, p.97 citado por
ZANELLA, 1994, p. 98).
Vygotsky (1984 apud ZANELLA, 1994) apresenta o desenvolvimento humano em dois
níveis: o de desenvolvimento real e o desenvolvimento potencial, e a distância entre ambos se trata da
zona de desenvolvimento proximal. A autora esclarece que o nívelde desenvolvimento real é sobre
aquilo que o indivíduo consegue fazer sozinho, enquantoo nível de desenvolvimento potencial refere-
se às atividades que a criança só conseguirá realizar após ajuda ou orientação de outra pessoa. Nota-se
também que há outro fator quecontribui para o processo de desenvolvimento: o da imitação, pois, por
meio dela, a criança consegue realizar atos que não correspondem à sua fase da vida, e isso é um
propulsor da aprendizagem, facilitada pelas interações sociais.
Desse modo, Vygotsky (1984 apud ZANELLA, 1994) mostra que mesmo indivíduos que
apresentem níveis de desenvolvimento real semelhantes, podem diferir um dos outros em relação aos
alcances potenciais de seu desenvolvimento, de acordo comas interações sociais e com o meio em que
se encontra inseridas, pois, através de novas instruções o desenvolvimento pode ser impulsionado.
Zanella (1994) ressalta que na teoria vigotskiana a escola desempenha um papel muito importante para
desenvolvimento
humano, pois nesse espaço se desenrolam as relações interpessoais, o uso da linguageme dos
signos, bem como as interações sociais. Entretanto, o aprendizado das crianças não ocorre somente na
escola, bem antes do período escolar as crianças já estão aprendendo inúmeras coisas e se
desenvolvendo, de modo que as crianças adquirem conhecimentos escolares com base nos
conhecimentos prévios que possuem quando iniciam a atividade escolar. (VYGOTSKY, 1998).
O ambiente familiar é o espaço em que se iniciam essas interações sociais, sendo, portanto, o
contexto em que as primeiras aprendizagens ocorrem e, mesmo com a inserção da criança na atividade
escolar, continua exercendo influência nos processos de aprendizagem e desenvolvimento das
crianças. Essa compreensão somada ao pressuposto de que as questões educacionais têm origem em
processos coletivos que envolve todos que interagem com a criança em desenvolvimento cujo
entendimento é:

[...] em relação ao trabalho em grupo com os pais e responsáveis, entendemos que se


trata de uma possibilidade de inseri-los no processo de investigação da queixa
escolar. É interessante observar a forma como os pais interessam-se pela vivência do
outro e compartilham problemas e soluções. Nesse contexto de atendimento emgrupo,
os pais são mobilizados a participar ativamente do processo de dissolução da queixa
escolar. (REZENDE et al, 2010, p. 172).

Soma-se a isso os desafios contemporâneos que as famílias enfrentam visto que a


responsabilização social da mulher no que se refere à educação dos filhos, mesmo com a inserção das
mulheres no mercado de trabalho, permanece desproporcional em relação a lugar a ser ocupado pelos
homens, gerando a dupla jornada e alimentando, cada vez mais, expectativas inalcançáveis para que
sejamos “mulheres biônicas”, como mostra Souza (1997, p.184)

[...] mulher biônica consegue ser uma profissional competente, dedicada, bem-
sucedida e bem paga e, ao mesmo tempo, é responsável por uma casa em ordem,
bonita, com tudo funcionando a contento, bem organizada, com filhos e marido bem
cuidados e orientados. E, com isto tudo, ainda consegue ser bonita, tratada e boa de
cama!

Diante disso, delineiam-se possibilidades para atuação do psicólogo escolar e educacional,


tendo em vista o compromisso da psicologia em contribuir com as famílias para que os vínculos
tecidos no cotidiano, no que se refere às interações voltadas para o processo de aprendizagem da
criança, sejam desenvolventes e torne-se fonte de bem-estartanto para crianças quanto para adultos.
Portanto, busca-se subsidiar pais e responsáveis em sua tarefa de educar as crianças visando a
desconstrução das queixas patologizantes para que as crianças possam ter garantido seu direito
essencial que é desenvolver-se plenamente.

OBJETIVO
Refletir sobre o trabalho com grupo de pais e responsáveis como estratégia para atuação do
psicólogo na perspectiva crítica.

MÉTODO
O trabalho com grupos temáticos tem sido adotado nos mais diversos contextos de atuação do
psicólogo. Entre os autores que se voltam para a compreensão dos efeitos da vivência grupal
selecionamos as ideias de Silvia Lane, trazidas por Martins (2007) queevidencia o olhar histórico-
dialético trazido pela autora para explicar que um grupo não é um aglomerado de pessoas justapostas,
mas de pessoas com uma questão em comum, cuja busca de solução conduz ao estabelecimento de
objetivos comuns e identificação quese caracteriza como um processo grupal e não, apenas, como
grupo:

Ao falar em processo grupal e não em grupo ou dinâmica de grupo Lane (1981b,


1984b) se posiciona, trazendo para o centro da discussão o caráter histórico e
dialético do grupo. Não se trata apenas de diferença na denominação, mas uma
diferença profunda no fenômeno estudado. A partir dessa perspectiva, estamos
afirmando o fato de o próprio grupo ser uma experiência histórica, que se constrói
num determinado espaço e tempo, fruto das relações que vão ocorrendo no cotidiano
e, ao mesmo tempo, que traz para a experiência presente vários aspectos gerais da
sociedade, expressas nas contradições que emergem no grupo, articulando aspectos
pessoais, características grupais, vivência subjetiva e realidade objetiva. Ressaltar o
caráter histórico do grupo implica compreender que o grupo, na sua singularidade,
expressa múltiplas determinações e as contradições presentes na sociedade
contemporânea. (MARTINS, 2007, p. 77)

Com base nesses pressupostos tomamos a formação de um grupo de pais e/ou responsáveis
como método para atuar em situações de queixas relacionadas ao comportamento infantil.

Procedimentos para constituição do grupo


Inicialmente entramos em contato com os pais e/ou familiares que cadastraram crianças de 0
a 12 anos na lista de espera para atendimento psicológico por meio de informações da clínica escola
de Psicologia da UEMG, convidando-os a participar de umgrupo voltado para orientação aos pais,
com ênfase em ampliar a compreensão dos participantes com relação ao desenvolvimento infantil e
as estratégias de incentivo à atividade escolar adequadas para cada período de desenvolvimento.
Nesse momento, nove participantes apresentaram interesse e havia disponibilidade em horários
diferenciados, a equipe se dividiu para ter atendimento semanais e aos sábados, de formaa atender a
todos e que ninguém fosse excluído por causa de dificuldade de horários. Os encontros ocorrerem
semanalmente e continuam em andamento, entretanto, para a análise
a ser desenvolvida nesse trabalho, foram selecionados quatro encontros realizados no
primeiro semestre de 2021.

Procedimento para condução dos encontros


Cada encontro foi planejado coletivamente pela equipe de cinco estagiárias sob orientação da
professora que supervisiona o estágio de psicologia escolar, sendo um trio e uma dupla de estagiárias
as responsáveis por desenvolver o plano de encontro em cadagrupo. Os temas foram definidos de
acordo com demandas observadas em cada encontro e a forma de conduzir as temáticas baseou-se na
perspectiva vigotskiana, iniciando sempre com algum objeto simbólico sensibilizador para o assunto
principal do encontro,buscando desencadear as reflexões por parte dos participantes e articulando-as
com intervenções das estagiárias voltadas para qualificar cientificamente a análise das situações
vivenciadas nas interações cotidianas com as crianças.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
No primeiro encontro, o objetivo geral foi compreender que a criança tem funcionamento
psicológico diferente do adulto e que existem estratégias que facilitam a comunicação entre elas, e o
objeto simbólico utilizado para sensibilizar o grupo foi a charge abaixo:

Após leitura coletiva da charge, pediu-se que os participantes relatassem o que tinham
entendido. A participante LA. foi a que conseguiu chegar mais perto do objetivo que estávamos
almejando, disse que “o mundo das crianças, o que elas entendem, é diferente do que nós adultos
entendemos, e que nós adultos nem sempre temos as palavrascertas nem paciência para explicar. No
diálogo, buscou-se contribuir para que os participantes compreendessem que o psiquismo infantil
apresenta funcionamento diferente do psiquismo de um adulto. A diferença citada refere-se ao
processo evolutivo do desenvolvimento da criança e a necessidade de mediação entre ela e o mundo
a sua volta. Como vimos, para Vygotsky (1998) o conceito de zona de desenvolvimento
proximal representa a possibilidade de incentivar a criança para que alcance condições que
ainda não consegue sozinha.
Concluiu-se o encontro assistindo ao vídeo clip da música “Saiba”4que traz uma reflexão
relacionada a compreensão de que até mesmo as grandes personalidades já foramcrianças e pensaram
e sentiram como criança. O encontro foi finalizado com um pedido de feedback sobre a reunião e os
alguns participantes disseram que estavam se sentindo mais leves em saber que todos compartilham
de problemas semelhantes. Foi possível notar que falar sobre as diferenças entre a mente do adulto e
a da criança contribuiu para uma reflexão necessária para o processo de mudança de postura dos
adultos em relação às crianças, bem como para produzir a identificação entre os membros e o
estabelecimento de objetivos comuns, favorecendo o processo grupal tal como proposto por Silvia
Lane, como vimos em Martins (2007).
O segundo encontro teve como objetivo: identificar momentos agradáveis e desagradáveis
vivenciados com a(s) criança e refletir sobre os motivos pelos quais se sentem bem ou mal ao interagir
com a criança nos momentos mencionados. Para sensibilização, solicitou-se aos participantes que
elaborassem o seguinte curtograma:

GOSTO NÃO GOSTO


FAÇO Liste nessa coluna coisas que vocêgosta e faz Liste nessa coluna coisas que você não gosta,
com seu filho (a). mas precisa fazer com seu filho (a).
NÃO Liste nessa coluna coisas que você gosta e Liste nessa coluna coisas que você não gosta
FAÇO não faz ou faz menos do que gostaria com seu e não faz com seu filho (a).
filho (a).

No diálogo sobre o curtograma as participantes relataram atividades cotidianas como brincar,


desenhar entre outras como aquelas que gostam de fazer e atividades como bater e xingar como aquelas
que não gostam de fazer.
Em seguida, os participantes foram convidados a ouvir a música da bailarina 5. O conteúdo da
letra da música levou ao diálogo sobre defeitos e dificuldades como parte dacondição humana. A mãe
TH enfatizava ter sido mãe nova e a necessidade de provar paratodos que ela estava conseguindo
educar sua filha. Elas falaram também sobre o pouco tempo que elas têm com as crianças, e o medo
de estarem negligenciando-as. Uma mãe,
S. chegou no fim da reunião alegou que tinha pouco tempo para ficar com a criança e que nos
finais de semana ficava sobrecarregada com todas as atividades da escola que forampassadas durante
a semana e precisava ajudar o filho fazer, achava que seria um pouco difícil fazer qualquer outra coisa
com a criança. Esses relatos nos remetem às análises apresentadas por Souza (1997) com relação à
condição das mães na contemporaneidade. O encontro foi concluído com um relato de experiência
feito por uma das estagiárias que se tornou mãe aos 18 anos, compartilhando dificuldades enfrentadas
para educar seus filhos e ressaltando que se tivesse conhecimento da teoria histórico-cultural antes
teria facilitado muito sua vida para enfatizar que agora as participantes estavam podendo conhecer e
se apropriar de conhecimentos que ajudariam no desenvolvimento das crianças.
No terceiro encontro, o objetivo foi conhecer a rotina das crianças para identificar o que elas
realizam com autonomia e em que medida elas contam com a mediação do adulto nas atividades que
realizam cotidianamente, buscando fornecer subsídios para inserir novas atividades voltadas para
necessidades psicológicas do desenvolvimento infantil. O encontro teve início com a animação
chamada “Vida Maria”6que conta a história de três gerações de mulheres de uma mesma família em
que as novas gerações reproduzem com as filhas a forma como foram tratadas por suas mães. Assim
que todos assistiram, solicitou-se aos participantes que comentassem sobre o vídeo. J. iniciou
comentando que “tinha uma pegada meio de repetição das coisas” e completou que no difícil para ele
era quando as crianças iam para a casa da mãe, onde educação é completamente diferente, tendo na
família pessoas que se perderam no caminho da droga e da prostituição. Então, essa reflexão foi
concluída com a afirmação de que são as nossas atividades de formam a nossa consciência como
propõe Leontiev (2010), portanto, a forma como somos tratados também nos ensina sobre como tratar
as pessoas. Parabenizou-se os integrantes do grupo, acrescentando que era exatamente esse o trabalho
que estava sendo feito ali, procurando repensar sobre essa rotina dos filhos inserindo novas atividades
para mudar a consciência e tentar evitara repetição do ciclo.
No quarto encontro o objetivo foi compreender o caráter social das emoções humanas para
que os participantes investissem na promoção de emoções agradáveis e desafiantes como estratégia
para melhorar o estado emocional geral da criança ou adolescente. Pediu-se que os participantes
apresentassem as crianças por meio de fotos que foram solicitadas previamente. Para tratar sobre
emoções, apresentamos um vídeo chamado “Mr. Indiferente”7para ajudar a entender melhor sobre a
relação entre as repetições na rotina e as emoções.
Após a apresentação do vídeo foi feito o questionamento sobre o que os participantes
compreenderam e o que sentiram vendo o vídeo e eles apresentaram falas descritivas sobre o vídeo.
Destacou-se que o vídeo contribui para explicar o conhecimento da psicologia de que o estado
emocional das pessoas (adultos e crianças) sofre alteraçõesde acordo com os acontecimentos atuais e
que experiências desafiantes e agradáveis como essas que estamos buscando podem trazer alívio das
tensões e melhorar o estado emocional geral das crianças, além de aprofundar o vínculo que elas têm
com o adulto. Destacou-se, ainda, que a atividade escolar tem um papel fundamental para o
desenvolvimento do psiquismo infantil como propõe Vygotsky (1998) e que muitas vezes a escola
acaba cumprindo essa função, e ainda traz desafios e alegrias para a rotina das crianças. Não poder ir
à escola como antes da pandemia tem tirado delas essa oportunidade
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em que pesem todos os limites impostos pelo desenvolvimento desse trabalho fazendo o uso
de meios remotos de interação, o conteúdo dos diálogos estabelecidos nos encontros reforçam a
importância de criarmos espaços de reflexão sobre a tarefa de educarcrianças em contexto familiar As
diversas demandas suscitadas nos diálogos estabelecido com os participantes do grupo nos encontros
nos revela que o trabalho com grupo de pais, mães e responsáveis mostra-se como espaço potente
para atuação do psicólogo escolar crítico.

REFERÊNCIAS
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<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
389X1994000200011&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 14 nov. 2021.
IDENTIDADE E APEGO AO LUGAR EM CONFRONTO COM A SAÚDE MENTAL

Laila Thaíssa da Silva Menezes1


Priscila Aguiar Silva 2
Rafaela Queiroz Cunha Souto3
Bettieli Barboza da Silveira 4

RESUMO
Com o intuito de tecer interlocuções entre trajetos de vida, vinculações afetivas, suas identidades
construídas e suas relações com a saúde mental, retratam-se esforços dedicados ao encontro entre
Psicologia Ambiental e Saúde Mental. Esta pesquisa abrange um estudo de caso desenvolvido com a
pretensão de compreender de que modo ocorre a vinculação de identidade e apego ao lugar em
pacientes psiquiátricos com distintos processos de permanência, confrontando os ambientes e trajetos
realizados ao longo de suas vidas. A pesquisa casuística visa analisar intensivamente uma dada
situação, explorar um fenômeno contemporâneo em um contexto específico da realidade. Assim, dois
usuários do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) da cidade de Ituiutaba participaram do estudo,
que permeia uma entrevista semiestruturada e observação participante como técnicas de coleta de
dados, posteriormente apreciados à luz da Análise Temática. Três temas foram criados a partir da
apreciação dos dados, são eles: a) família; b) pertencimento; c) sentido da vida. Os principais achados
desta pesquisa estiveram direcionados aos modos de vinculação e relação pessoa-ambiente, processos
vivenciados de modos extremos pelos participantes deste estudo. Enquanto um participante ficou
internado em uma instituição total por um longo período de dezessete anos, enclausurado e com
precárias interações sociais, o outro não conseguiu se fixar em qualquer moradia ou cidade ao longo
da sua jornada de vida. O confronto de vinculações percorre distintas variáveis, fazendo destes casos
importantes desafios ao CAPS. Com os resultados desta pesquisa se busca fomentar base científica
relativa aos estudos que acercam a relação pessoa-ambiente à saúde mental, permeando as nuances
de suas vinculações, percepções e afetos envolvidos.

Palavras-chave: Saúde mental; Psicologia Ambiental; Identidade de lugar; Apego ao lugar.

INTRODUÇÃO
Com o intuito de tecer interlocuções entre trajetos de vida, vinculações afetivas, suas
identidades construídas e suas relações com a saúde mental, retratam-se esforços dedicados ao
encontro entre Psicologia Ambiental e Saúde Mental. Por meio de estágio profissionalizante em um
Centro de Atenção Psicossocial - CAPS II, desenvolveu-se o estudo com a pretensão de compreender
de que modo ocorre a vinculação de identidade e apego ao lugar em pacientes psiquiátricos com
distintos processos de permanência, confrontando os ambientes e trajetos realizados ao longo de suas

1
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
2
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
3
Graduanda pelo Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
4
Doutora docente do Curso de Psicologia da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ituiutaba
vidas.
Por muitos anos, a pessoa com diagnóstico de doença mental foi tratada em instituições que
tinham como princípio terapêutico fundamental o isolamento (AMARANTE, 2003). Após vários
movimentos, dentre eles a Reforma Psiquiátrica, hospitais psiquiátricos vão sendo substituídos por
serviços extra-hospitalares como os CAPS.
Os CAPS dentro da Rede de Atenção Psicossocial - RAPS surgiu como a principal estratégia
para transformação hospitalocêntrica de cuidado à saúde mental e para a garantia de direitos aos
usuários, já que tem se constituído dentro da rede como "serviço que se diferencia das estruturas
tradicionais e que se orienta pela ampliação do espaço de participação social do sujeito que sofre, pela
democratização das ações, pela não segregação do adoecimento psíquico e pela valorização da
subjetividade, com base das ações multiprofissionais" (TAVARES; SOUSA, 2009, p. 254). Sendo
assim, o CAPS é considerado um local de referência e de tratamento a pessoas que sofrem com
transtornos mentais severos e persistentes, os quais justificam a permanência do paciente em um lugar
de atendimento intensivo, comunitário, personalizado e promotor de saúde (BRASIL, 2004).
O Acompanhante Terapêutico (AT) exerce uma lógica de trabalho dentro desses serviços
pautando-se em ações de cuidado no território do usuário, construção de autonomia dentro da
singularidade do indivíduo em sofrimento psíquico e desinstitucionalização dos usuários do serviço.
Assim, o AT pode ser caracterizado como uma prática em que o espaço clínico está nas ruas, no
movimento (BEZERRA; DIMENSTEIN, 2009), sendo um dispositivo clínico que objetiva, entre
outros, aproximar o indivíduo das possibilidades de desenvolver laços sociais (HERMANN, 2010).
Carniel e Pedrão (2010) afirmam que o AT proporciona o resgate de vínculos, da cidadania e também
da circulação do sujeito em espaços que faça sentido para si.
Ao refletir a percepção da díade pessoa-ambiente, levando em consideração que está
intrinsecamente relacionado uma influência mútua, onde não é apenas o ser humano é influenciado
pelo meio, mas a sua ação também influencia o seu entorno. Torna-se necessário a compreensão entre
as relações que envolvem o homem e o ambiente, na qual, a construção da vinculação e a identidade
de lugar com o ambiente evoca relações entre os comportamentos socioespaciais e os diversos
processos psicossociais nos quais baseiam nossos comportamentos (CAVALCANTE; ELALI, 2017).
Dessa forma, permite buscar a compreensão em torno das motivações nais quais leva o indivíduo
adotar determinada conduta no que se refere às ações e a vinculação para com o meio ambiente.
A luz das ponderações trazidas, pretende esmiuçar o estudo de caso em questão no anseio de
compreender de que modo ocorre a vinculação de identidade e apego ao lugar em pacientes
psiquiátricos com distintos processos de permanência, confrontando os ambientes e trajetos realizados
ao longo de suas vidas. Assim, busca-se fomentar base científica relativa aos estudos que acercam a
relação pessoa-ambiente à saúde mental, permeando as nuances de suas vinculações, percepções e
afetos envolvidos.

METODOLOGIA
Este trabalho compreende a realização de uma pesquisa casuística, descritiva e exploratória,
de natureza qualitativa e com corte transversal. Yin (2015) ressalta que a pesquisa casuística visa
analisar intensivamente uma dada situação, explorar um fenômeno contemporâneo em um contexto
específico da realidade. Assim, a escolha metodológica foi desenhada objetivando a confrontação,
complementação e diálogo entre os dados obtidos, proporcionando maior riqueza na discussão dos
achados científicos (STAKE, 2016).
O estudo de caso contemplou a exploração de dois pacientes, doravante denominados de
Moisés e Elias (nomes fictícios). Elias é um homem de 51 anos, natural de Ituiutaba, Minas Gerais,
esteve institucionalizado no Hospital de Custódia de Barbacena por 17 anos, cumprindo medida de
segurança. Moisés, por outro lado, praticamente viveu seus 50 anos de idade sem residência fixa, se
considera um “andarilho, peregrino”, pois não permanece no mesmo lugar por muito tempo e possui
imensa dificuldade de se vincular a um lugar.
Frente aos objetivos desta pesquisa, foi desenvolvido um roteiro de entrevista semiestruturada
em alicerce a observação participante. O processo de realização da coleta de dados foi gravado em
áudio e posteriormente transcrito, sendo utilizado como recurso adicional para o processo de
tratamento e análise dos dados. Os dados foram organizados e analisados qualitativamente por meio
do método da Análise Temática (BRAUN; CLARKE, 2006). A partir deste método analítico se
buscou descrever adequadamente teoria, aplicação e avaliação a partir do pressuposto da explicitação
do “como”, as pesquisadoras chegaram a determinado resultado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados obtidos foram compilados e unificados com vistas a responder os objetivos desta
pesquisa, de modo que três temas foram suscitados a fim de responder às indagações propostas, são
eles: a) família; b) pertencimento; c) sentido da vida. Os códigos emergidos desta proposição temática
podem ser mais bem compreendidos a partir da visualização da Tabela 1.
Tabela 1. Caracterização de temas e códigos da Análise Temática.
Família Pertencimento Sentido da vida

idealização identidade de lugar projeto de vida

afetividade apego ao lugar autonomia

Família
Neste item elencamos o que os participantes nos mostram enquanto idealização e afetividade
familiar ao contexto que os mesmos estão inseridos, Moisés em suas errâncias e Elias em sua
experiência de reinserção em seu espaço familiar após 17 anos de internação em manicômio judicial.
Observa-se que o conceito de família, atualmente, vai além do tradicional, uma vez que, hoje
família é considerada por muitos como uma entidade a qual visa o desenvolvimento emocional do
indivíduo, um ambiente onde se aprende sobre amor, afeto, felicidade (DIAS, 2016). É o sentimento
de pertencer a um local idealizado, onde o indivíduo interage e integra seus sentimentos, valores,
sonhos, esperanças, no qual ele caminhe para o amor e felicidade. (Alves, 2020).
O conceito de família para os dois participantes perpassa entre o abandono da família que
pertencia e a que construiu, no caso de Moisés se viu abandonado pelos pais na infância, abandonou
filhos e esposa e iniciou a vida no "mundo", como o mesmo diz. Elias refere se a família não apenas
como forma de cuidado físico, como relata “Que significa família? Só para almoçar e jantar? Só pra
almoçar e jantar, porque não? Significa paz, união e amor. Não é isso?”
Elias em seus 17 anos de internação não recebeu nenhuma visita familiar no hospital de
custódia o qual estava recluso, sendo assim o estado responsável por proporcionar ao mesmo esse
direito, que com sua volta a família se viu novamente com o mesmo cuidado proporcionado no
hospital, família não é apenas alimentação.
Os infratores com transtorno mental são duplamente “vitimizados”, primeiro por serem
infratores e a posterior por serem doentes, sendo assim tratados não apenas pela sociedade, mas
também pelo Estado, que por meio do Judiciário segrega estes indivíduos submetendo-os ao regime
das medidas se segurança. Remetendo-os ao cuidado da saúde pública, que por sua vez, por serem
delinquentes não prestam o devido atendimento humanista, apartando ainda mais o indivíduo de seu
núcleo familiar (DANTAS; PEREIRA, 2014).
Na fala de Moisés “eu não tive infância né, eu não tive mãe pra me dar apoio, eu não tive pai
pra me dar apoio”. A família deveria ser um grupo social organizado, no qual os vínculos são
potencializados, e se constituindo então os espaços de socialização e de proteção aos seus membros
(BRUSAMARELLO, 2011), porém, é possível perceber que para Moisés essa idealização de família
foi desconfigurada, onde o abandono se instaurou, evidenciado em sua fala o espaço de “falta”,
mesmo que em relações conturbadas, paciente retoma por vezes a fala “Sem pai, sem mãe, sem avó,
sem madrasta, sem ninguém”.
A afetividade é parte integrante do papel e cuidado familiar, é incentivar, estar presente, ser
suporte seguro e confiável (ARRUDA, 2018). No caso de Elias a afetividade foi tomada pela rigidez
das regras e as excessivas medidas de segurança do manicômio judiciário, assim justificando a
necessidade de sua exclusão, por conseguinte, o afastamento do seu meio familiar, da sua comunidade
e da sua vida, como podemos identificar em sua fala. “Quero ter uma família, mas se eu não posso
fumar, pq da cadeia”. Entrevistador: Entendi, te falaram que você não pode arrumar uma família,
porque se não da cadeia? Elias: é, isso mesmo.”Nesta fala demonstra o processo alienante das regras
e imposições sofridas no manicômio, restringindo os padrões comportamentais e sociais devido à
anos de institucionalização.
Outro ponto a ser levado em conta na dinâmica familiar é a maneira como estabelecem a
afetividade, no caso da família de Moisés, que não se estabeleceu em decorrência do abandono na
infância e o afastamento, que é demonstrado em sua fala “eu nem vi minha mãe morrer, não vi meu
pai morrer, não vi minha irmã morrer, meus irmãos não sei onde que eles estão. Eu fiquei sabendo
que eles morreu depois que o fui pra lá daqueles lado entendeu”.
O relato consonante de Elias e Moisés sobre o entendimento de suas vivências familiares,
perpassando a idealização sobre família e a relevância do afeto, não estabelece vínculos, laços, onde
o sujeito muitas vezes acometido por algum transtorno mental são abandonados e negligenciados, não
somente no contexto macrossocial mas também em microssociedades como a família.

Pertencimento
Os dois participantes dessa pesquisa se constituem em contextos diferentes referentes ao
pertencimento a um lugar. Moisés se considera um “peregrino”, no qual, não consegue se manter em
um lugar por um longo período de tempo. Já Elias passou a maior parte do seu tempo em uma
internação que durou 17 anos. Por conseguinte, ao considerar os elementos intrínsecos dos dois
participantes para a compreensão ao pertencer a um lugar, relaciona-se a identidade de lugar e o apego
ao lugar. Entende-se que tais aspectos estão correlacionados ao um sentido espacial, pois o indivíduo
pode ter um apego em alguns lugares específicos, como por exemplo sua casa. Todavia, à níveis
elevados geográficos sendo as representações ou pertencimento social que são fundamentais para a
formação de identidade do lugar (BELANCHE; CASALÓ; FLAVIÁN, 2017). Dessa forma, a
identificação social é baseada em um pressuposto subjetivo, onde pode ter uma relevância
significativa ou afetiva. Assim, o reconhecimento desses elementos concebe a possibilidade de
compreensão de como a pessoa se constitui no espaço.
Ao analisar o processo de identidade de uma pessoa, envolve um conjunto de elementos, tais
como, biológicos, psicológicos, sociais, entre outros. Segundo Cavalcante e Elali (2017), a construção
da identidade é um processo complexo, além de qualificações subjetivas do indivíduo também se
constitui como identidade social (eg. identidade étnica, profissional, feminina). Tal processo é
mutável e dinâmico, que acontece no decorrer da vida dos indivíduos. A referência para a construção
identitária do indivíduo podem se constituir nos lugares que se tornaram importantes para ele, como
o lugar onde nasceu, onde vive ou onde passou a maior parte do tempo. Observa que os dois
participantes levaram em consideração os lugares onde nasceram, para Moisés “Sou de Araraquara,
interior de São Paulo… Morei uns 12 anos, 13 anos”, Elias “Sou daqui de Ituiutaba, no triângulo
mineiro. Nascido e criado na rua...”. Porém, Moisés não se reconhece como pertencente ao lugar de
nascimento, apenas tem uma identidade do lugar onde passou sua infância.
Perante esse contexto, a identidade de lugar também é composta por cognições sobre o mundo
físico referente à complexidade e variedade dos lugares que contribuem para a satisfação de suas
necessidades biológicas, sociais, psicológicas, sociais e culturais. Assim, a formação das cognições
se dá pelas idéias, memórias, sentimentos, valores, entre outros. Dessa forma, a identidade de lugar
tem como função principal a elaboração de um cenário interno que se sirva de proteção à
autoidentidade do sujeito (CAVALCANTE; ELALI, 2017). Pela fala de Moisés, nota-se uma falta de
uma cognição de sentimentos e valores nos lugares que já passou por suas caminhadas gerando
angústia e frustração por não conseguir manter essa vinculação “Fui criado no mundo. Pra cá, pra lá,
pra cá, pra lá andando pelo mundo, andando. Andando que nem peregrino”. Assim, o participante
entra em uma crise de identidade e procura um profissional que lhe possa restituir a estabilidade “Eu
quero sabê que que tá acontecendo na minha vida e isso e aquilo, entendeu? Quero um médico que
me cuida de mim”. Porém, também é observado que em sua fala há uma identidade de lugar referente
pela a satisfação de suas necessidades biológicas.
Ah, quando eu chego na cidade eu procuro um um um lugar de apoio, né? Ainda cheguei aqui
na cidade, o albergue me apoiou, então eu consigo ir no lugar de apoio. Quando não tem lugar de
apoio eu saio da cidade pra ver onde tem um posto mais próximo pra mim dormir no posto e eu sigo
pra frente.
Torna-se importante vínculos emocionais para a formação da identidade do lugar. Para Tuan
(1983), o lugar se relaciona a estabilidade e segurança, enquanto o espaço está relacionado à liberdade
e ao movimento. Dessa forma, o indivíduo ao experienciar as vivências ao longo do tempo, o espaço
se transforma em lugar, dotando um valor afetivo. No estudo de Cavalcante e Elali (2017), apresenta
que o conceito de apego ao lugar é complexo e multifacetado, na qual, demanda uma atenção para as
características físico-espaciais do local e significados simbólico/afetivos a ele associados pelos
indivíduos ou grupos. Entretanto, ao considerar o cenário em que os participantes desta pesquisa
experienciaram a vivência nos lugares, Moisés sem manter uma constância em um lugar por um
período de tempo e Elias por internação a longo período de tempo, houve um distanciamento de seus
familiares, assim, prejudicando uma vinculação emocional.

Sentido da vida
Este tema reúne elementos acerca do que os participantes da pesquisa apresentaram sobre
como entendem o seu viver, tanto seus projetos de vida como a sua autonomia de percorrer os lugares
e espaços. Esse tema evidencia os principais aspectos dessas relações para os participantes da pesquisa
e dos materiais teóricos produzidos acerca do tema.
Projetos de vida são desenvolvidos a partir de experiências pessoais, sociais e culturais que de
acordo com as vivências e interações são apresentados. Pode se manifestar através de desejos que se
pretende realizar, como etapas a cumprir para alcançar um objetivo. Marcelino, Catão e Lima (2009)
afirmam que o projeto de vida tem como propósito a transformação da realidade, avaliando a
representação desta realidade e a conexão entre passado presente e futuro. Dessa forma compreende-
se que quando o sujeito entende o seu tempo atual contribui para o desenvolvimento do seu futuro,
visto que o futuro denota a projeção dos desejos e planos.
Moisés em diversos momentos menciona sobre estar sempre viajando e quando indagado por
uma das pesquisadoras sobre se ele tinha um objetivo, se tinha planos para o seu próximo destino ele
respondeu “Não tenho. Eu vou aonde que o mundo me levar eu, aonde que o mundo me levar eu vou.
Não tenho paradeiro.”. Essa mesma narrativa apareceu em outros momentos quando diz “Ah, eu
ponho nada cabeça, eu vou, vou e vou andando, vou andando, se tiver lugar pra dormir eu durmo, se
não tiver lugar eu durmo no posto de gasolina, na rodovia, eu durmo em qualquer lugar…”. Verifica-
se que ele entende que sua vida é viajar, é andar pelas cidades. Ainda, juntamente com a despretensão
ele afirmou que é doloroso para si viver dessa forma, sem se entender e sem ter uma perspectiva futura
Que isso já tem cinquenta anos, vou fazer cinquenta e um anos. Se eu morrer hoje
faz dois dias que eu já morri. Eu não entendo... eu, não sinceridade eu não entendo e
não consigo me entender e eu pego minhas coisas eu dou pros outro compro coisa
boa... dou minhas roupa pros outro, fico sem. Aí eu saio pelo mundo.

O participante Elias não apresentou nenhuma projeção futura sobre como visualiza sua vida
em um futuro próximo. A sua falta de autonomia se relaciona muito com sua falta de projeções, pois
ele ainda se sente proibido, sente que não pode fazer nada pois será levado preso novamente. Quando
questionado sobre o que gosta de fazer ou que gostaria de fazer, ele responde que gostaria de voltar a
trabalhar na construção civil “Se pudesse voltar naquela época...”. Por essa afirmação entende-se que
seu olhar está voltado para o seu passado e não para o que pode viver hoje.
Santos (1999) discorre sobre a importância do território na constituição da identidade dos
indivíduos, pois entende-se que o território é lugar de vida e dos afetos, possibilita que os indivíduos
sejam potencializados ou despontencializados, permite a interação, a troca, além da construção da sua
história. Dessa forma, podemos observar que a passagem de Moisés pelos lugares sem a vinculação
também se relaciona com a sua ausência de projeções, visto que ele não apresentou em seu discurso
nenhum território que o marcou ou que o possibilitou afetos e novas perspectivas. Já Elias após ficar
17 anos no Hospital de Custódia de Barbacena não consegue vislumbrar os dias futuros, pois viveu
por muitos anos dias iguais e restrito a um lugar determinado.
Portanto, no discurso dos participantes foi observado que não há um projeto de vida. Nenhum
dos dois têm uma projeção futura da sua existência, isto é, não apresentam planos, desejos, sobre
como querem viver ou onde querem visitar. Nota-se que o viver está inteiramente reduzido ao dia em
si que está sendo vivenciado, o que mostra também que os conceitos de socialização, trabalho e lazer
não são fundamentais para si, pois se apresentam como conceitos distantes e por vezes inalcançáveis
devido a forma de seu desenvolvimento pessoal, social e da sua trajetória.
Leal (2001) apresenta a autonomia no que se refere a saúde mental de três formas: a ideia de
independência; a autossuficiência; o autogoverno. Desse modo, na proporção em que o indivíduo
estabelece normas e relações sociais para sua vida diária, está então estabelecendo sua autonomia que
pode ser mais ou menos ampliada. Pitta (1996) compreende a autonomia de forma parecida a
apresentando como possibilidade de realização de atividades da vida diária de forma independente.
O nível da autonomia varia de acordo com o grau de comprometimento do indivíduo. Pequenas
conquistas no cotidiano podem ser demasiadamente significativas para o paciente (LIMA; AGUIAR;
SOUSA, 2015). Dessa forma, analisamos a autonomia de cada paciente de acordo com suas
individualidades e desenvolvimento psicossocial.
Ainda que Moisés esteja sempre em movimento, permeando espaços é possível observar que
a sua caminhada é marcada por fugas, visto que em determinados momentos da entrevista ele contou
que já foi embora de diversos lugares. Foi relatado por ele o episódio em que abandonou sua casa e
móveis e que em outro momento da sua trajetória fugiu de uma chácara que estava alojado e deixou
seus documentos de identificação e outros pertences. Analisando esses dois momentos entende-se que
a sua autonomia não é aprazível para si, porque está carregada de medo e de pressa. Antagonicamente
Elias não possui nenhuma autonomia. Ficou por 17 anos no Hospital de Custódia e está há pouco
tempo no município de Ituiutaba, em que fica sob responsabilidade dos seus irmãos, instalado alguns
dias na cidade e outros na fazenda próxima a Ituiutaba. Assim, os lugares e espaços que visita não são
escolhidos por si, mas por sua família. Durante a entrevista uma das pesquisadoras perguntou as ele
“Você tem vontade de passear pela cidade?” ele respondeu “Não, só andar, quando ficar livre de tudo,
quando acabar o problema, quando voltar na rua, casa... talvez, talvez...”. Em seu entendimento de
mundo ele não é livre, apesar de não estar mais em Barbacena, ele acredita e espera que em algum
momentos as coisas mudem e que ele não precise mais seguir a ordem de alguém.
Os dois casos apresentados mostram como os sujeitos são individualizados, a dificuldade de
laços afetivos e de se desenvolver no lugar em que está que pode ser relacionado com o processo de
autonomia. Lima, Aguiar e Sousa (2015) afirmam que quando o cuidado é construído pela
coletividade e partilha, ampliam-se as probabilidades de fortalecimento dos processos de
empoderamento e de autonomia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista os dados discutidos e almejando responder aos objetivos deste estudo, discute-
se a temática da vinculação de identidade e apego ao lugar em pacientes psiquiátricos com processos
distintos de permanência. Ainda, colocando em foco os ambientes e trajetos percorridos ao longo de
suas vidas. Através das entrevistas feitas e análise dos dados foi possível compreender como ocorre
essa vinculação para os participantes que perpassa os temas família, pertencimento e sentido da vida.
Os participantes apresentaram ausência de vínculos emocionais que são fundamentais para a
formação de identidade de lugar e essa ausência se relaciona com a forma que entendem o seu viver.
Para um deles há a vinculação à fuga e para o outro ao aprisionamento, concomitantemente ambos
sem nenhuma projeção futura sobre a sua existência e sem vinculação a lugares em que o cuidado não
foi construído pelo partilhar, pelo coletivo e influenciou em seus processos de autonomia e identidade.
A pesquisa contribui para a fomentação de base científica acerca dos estudos com enfoque
pessoa-ambiente à saúde mental, permeando as nuances de suas vinculações, percepções e afetos
envolvidos. Visto que há pouca literatura específica que investiga o tema desenvolvido. O estudo feito
com dois participantes possibilitou maior profundidade de análise dos dados emergentes, contudo,
para estudos futuros sugere-se a exploração da temática com uma amostra maior de participantes para
que possa ser analisado e discutido mais processos de permanência, confrontando os ambientes e
trajetos de diversos indivíduos.

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