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Scripta Uniandrade, v. 19, n.

3 (2021)
Revista da Pós-Graduação em Letras – UNIANDRADE
Curitiba, Paraná, Brasil

PAISAGEM SONORA: ESTUDO PROVENIENTE DA ACÚSTICA


TRANSPOSTO À ANÁLISE LITERÁRIA

Dr. GERSON LUÍS WERLANG


Universidade Federal de Santa Maria (UFMS)
Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil
(gerwer@rocketmail.com)

VIVIANE APARECIDA PANDOLFO DEBORTOLLI (DOUTORANDA)


Universidade Federal de Santa Maria (UFMS)
Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil
(viviane.debortolli@hotmail.com)

Resumo: A paisagem sonora está concatenada aos sons presentes ou ausentes em um


determinado espaço; de modo geral, o processo evolutivo da humanidade trouxe consigo
uma gama vasta de alterações na paisagem sonora mundial, haja vista a inserção de
sons produzidos pela ação humana, também por meio de representações artísticas
sonoras, como a música. Considerando que na literatura a diegese narrativa
compreende normalmente o espaço e o ambiente psicológico decorrente dele ou que o
compõe, torna-se necessário atentar para a presença da paisagem sonora na literatura,
já que ela também compõe o espaço e o ambiente narrativos e pode ser por si só um
elemento da narrativa, sobre o qual esse artigo discorre.

Palavras-chave: Paisagem Sonora. Literatura. Diegese.

Artigo recebido em: 30 set. 2021.


Aceito em: 29 out. 2021.

WERLANG, Gerson Luís; DEBORTOLLI, Viviane Aparecida Pandolfo. Paisagem sonora: estudo
proveniente da acústica transposto à análise literária. Scripta Uniandrade, v. 19, n. 3 (2021), p.
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SOUNDSCAPE: AN ACOUSTIC STUDY


TRANSPOSED TO LITERARY ANALYSIS

ABSTRACT: Soundscape relates to all the sounds present or absent in a given space; in
general, the process of human evolution has brought with it a wide range of changes in
the world’s soundscape, given the insertion of sounds produced by human action,
whether through work, life in society, industries, technologies, as well as through sonic
artistic representations, such as music. Considering that in literature, narrative diegesis
normally comprises the space and the psychological environment arising from it or
integrating it, to pay attention to the presence of soundscape in literature is necessary,
since it also composes the narrative space and environment and may be by itself an
element of the narrative, an aspect that is discussed in this article.

Keywords: Soundscape. Literature. Diegesis.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Para todas as pessoas que possuem um sistema auditivo padrão, o


primeiro contato sonoro se dá ainda no ventre materno, por meio da sonoridade
do líquido placentário. Essa é a premissa principal que denota o fato de que os
seres humanos são seres sonoros, já que “o oceano dos nossos ancestrais
encontra-se reproduzido no útero aquoso da mãe e está quimicamente
relacionado com ele” (SCHAFER, 2011, p. 33). Sonora também é uma das
percepções da vida, observada quando as gestantes ouvem o coração de seu
filho, por vezes antes até de ter uma manifestação visual de sua existência. Do
mesmo modo, ao nascerem as crianças choram, como se a inauguração da vida
também se desse por via sonora.
Questões como essas fazem perceber o quanto os seres humanos são
impregnados por sons. Por que seria diferente para os personagens literários?

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Isso leva a pensar na estruturação narrativa da diegese, que pressupõe a


elaboração de um detalhado mundo ficcional, em que personagens, espaço,
ambiente e narradores são os elementos em torno dos quais gira um enredo em
que, por extensão, o som também está presente.
Ocorre que o estudo dos sons nos textos literários é algo relativamente
recente e carece ainda de bastante empenho cognitivo para que sejam
delineados os aspectos que envolvem as diversas questões relacionadas à
paisagem sonora ficcional, que vão desde os diferentes tipos de sons
característicos de um ambiente (como os sons tradicionais da fazenda, dos
centros urbanos, os naturais, os produzidos pelo homem) até a forma como a
sonoridade influencia no desenvolvimento do enredo, já que por vezes está
concatenada ao estado anímico dos personagens, ou então interfere diretamente
nas ações, tornando-se, portanto, um elemento desencadeador de fatos e
efeitos. Paralelo a isso, tem-se também a necessidade de observar a questão da
memória sonora, talvez não como algo binário em relação à paisagem sonora
presente, mas em função da capacidade de recordações de sons, de identificação
de sons pela memória, ou mesmo quando cenas se desenvolvem a partir do que
é ouvido pelos personagens em outros cômodos ou quando não há luz. Em casos
assim (com privação de visão, por exemplo), a percepção sonora é o recurso
primordial que permite aos personagens compreender o que se passa ao seu
redor.
Debortolli e Werlang (2020) trabalham com um conceito associado ao da
paisagem sonora, aos quais os personagens literários também estão expostos,
que é o da memória auditiva. A memória auditiva aparece quando os
personagens ativam recordações sônicas de tempos pretéritos, notadamente
quando tais lembranças desencadeiam emoções. Dessa forma, o registro sonoro
se dá na memória,

ou seja, a memória auditiva, que proporciona a recordação de sons específicos e


situações que envolvam diferentes sonoridades, mesmo que estejam distantes
no tempo e no espaço. A carga semântica da memória auditiva permite o
desencadeamento de emoções ligadas à sonoridade (...) de onde se verifica a
capacidade de influência atemporal que a paisagem sonora tem em relação aos
personagens. (DEBORTOLLI e WERLANG, 2020, p. 365)

Não menos importante é a exposição sonora estabelecida por meio do


narrador, ou seja, o mundo diegético é sonoro e a percepção de sons que o
narrador tem é reveladora, inclusive, de sua capacidade subjetiva de apontar
ou esconder traços sônicos aos quais os personagens estão submetidos;

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levando-se em conta que é o narrador, prioritariamente, quem apresenta, revela


ou oculta as informações no enredo, a configuração sonora que ele faz é
indicativo também de suas próprias características, e das características do
autor, ao considerar que o próprio autor se revela no texto. Em outros termos,
autores e narradores conhecedores de música, por exemplo, têm condições de
construir a diegese de suas narrativas e das narrativas das quais fazem parte,
a partir de um complexo mundo sonoro, por vezes até transfigurando estruturas
musicais aos textos literários ficcionais, o que pode ser observado a partir da
análise estrutural dos enredos em que isso acontece.
As questões sonoras nos textos literários ficcionais, embora existam
provavelmente desde o surgimento da literatura, passaram apenas
recentemente a ser estudadas. Historicamente, tanto os gêneros textuais quanto
a forma de abordá-los passou por alterações, de modo que o que é vanguarda
em determinada época passa a ser algo comum em outra. Mudanças desse tipo
são normais e por vezes ocorrem em paralelo a alterações de outras ordens na
sociedade, visto que alguns fatos históricos como a Revolução Industrial não
mudaram apenas a vida das pessoas e a relação de trabalho delas, mas
refletiram em alterações de classes sociais, cujas transformações reverberaram
notadamente na cultura. Mais recentemente, os reflexos da aceleração da vida
e da pós-modernidade são evidenciados também na estruturação de textos
literários contemporâneos, que apresentam a fragmentação presente na
sociedade atual. Diante disso, os estudos literários cada vez mais demandam
um aporte teórico que dê conta de analisar e compreender tais manifestações,
fato que pode justificar a gama de teorias interdisciplinares sobre as quais a
academia se debruça. Nesse sentido, estudos provenientes de áreas que não são
propriamente os estudos literários passam a ser importantes na tentativa de
elucidar questões de ordem literária. É desse caldo que brotou o conceito de
paisagem sonora na literatura, termo proveniente da acústica, que foi
transposto aos estudos literários e que faz referências aos sons presentes na
realidade da narrativa.
O termo paisagem sonora foi desenvolvido por Murray Schafer quando
elaborou um detalhado estudo dos sons presentes no universo. Sua ampla
pesquisa, enfeixada na obra A afinação do mundo (2011), é reveladora do
processo de modificação da paisagem sonora mundial ao longo da história da
humanidade, bem como da variedade de sons existentes em espaços diferentes,
o que passa também pela música, já que ela é uma das mais elaboradas criações
sonoras produzidas pelo homem. Além desses elementos, Schafer (2011) analisa
as mudanças na percepção dos sons advindas dessas alterações.

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O território básico da paisagem sonora está situado a meio caminho entre a


ciência, a sociedade e as artes. Com a acústica e a psicoacústica aprenderemos
a respeito das propriedades físicas do som e do modo pelo qual este é
interpretado pelo cérebro humano. Com a sociedade aprendemos como o homem
se comporta com os sons e de que maneira estes afetam e modificam o seu
comportamento. Como as artes, e particularmente com a música, aprenderemos
de que modo o homem cria paisagens sonoras ideias para aquela outra vida que
é a da imaginação e da reflexão psíquica. (SCHAFER, 2011, p. 18)

Com base nesse excerto é possível partir de duas premissas-vórtices; ao


assentir que o homem se relaciona com o som e que este modifica e interfere em
seu comportamento, pode-se presumir que algo semelhante possa acontecer
com os personagens, já que é possível associar as ações humanas às de figuras
literárias. O universo diegético do qual o personagem faz parte permite
compreender que ele é passível de emoções semelhantes às humanas.
Paralelamente, a segunda premissa que pode ser evidenciada é aquela de que o
homem cria paisagem sonoras ideais por meio das artes. Ora, a literatura é um
campo privilegiado quanto à possibilidade de criar tais paisagens, já que é
relativamente comum na literatura universal concatenar elementos como a
chuva e o sol ao estado anímico do personagem, ou de acordo com o que é
narrado, associando a chuva a eventos tristes e o sol a episódios alegres, ou
então, ocorrências negativas que se passam à noite, enquanto que as ações
agradáveis se passam durante o dia, de modo que o clima também é organizado
de acordo com o que favorece o texto. Lodge (2011) afirma que “todos nós
sabemos como o clima afeta nosso humor. Os romancistas são muito
privilegiados nesse sentido, pois têm a liberdade de inventar o clima apropriado
à atmosfera que desejam evocar” (LODGE, 2011, p. 94). Ainda segundo o mesmo
autor, escritores como Jane Austen e Charles Dickens utilizaram o clima como
um elemento para desencadear determinados efeitos nas narrativas, já que “nos
romances de Jane Austen o clima, em geral, mantém relações importantes com
a vida pessoal dos personagens, como uma espécie de índice metafórico de suas
vivências íntimas” (LODGE, 2011, p. 94).
Nesse âmbito, a malha sonora presente nos textos literários permite
acessar um grau mais profundo na criação diegética, já que a sonoridade
também pode ser ajustada de acordo com as intenções do narrador ou do autor.
É evidente, então, que a paisagem sonora, enquanto elemento da narrativa, tem
funções específicas e apresenta efeitos particulares, os quais viabilizam a
construção da composição literária. Nessa perspectiva, Rosenfeld (2014)
assegura que:

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A criação de um vigoroso mundo imaginário, de personagens “vivas” e situações


“verdadeiras”, já em si de alto valor estético, exige em geral a mobilização de
todos os recursos da língua, assim como de muitos outros elementos da
composição literária (...). (ROSENFELD, 2014, p. 37)

Pode-se considerar, então, que a presença da paisagem sonora nos textos


literários ficcionais contribui para que seja atingido o valor estético necessário
para a composição diegética ideal, já que ela é, em princípio, um recurso literário
que se equipara ao clima, ambiente e outros elementos da narrativa. Talvez uma
percepção sonora mais específica, apurada e subjetiva tenha desencadeado o
interesse pelos estudos sônicos e em especial os estudos da paisagem sonora
ficcional. A ambientação, para Lodge (2017), está relacionada ao surgimento do
romantismo, pois, segundo ele, “os efeitos do ambiente sobre o homem, abriu
(sic.) os olhos das pessoas para a beleza sublime das paisagens naturais e, mais
tarde, também ao simbolismo tétrico dos panoramas urbanos na Era Industrial”
(LODGE, 2017, p. 66). Dessa forma, depreende-se que, por extensão, os efeitos
da paisagem sonora sobre o homem podem aguçar os ouvidos das pessoas para
uma expansão no modo de produzir sentidos, pois, ao adentrar o portal da
percepção sonora na literatura, é possível alargar e transmutar a maneira
comum de criar sentidos, compreendendo elementos e significações que passam
despercebidas quando não se atenta à questão sônica. Ao alargarem as
possibilidades de verossimilhança, as paisagens sonoras permitem ouvir
contextos e subjetividades permeadas pela sonoridade.

As paisagens sonoras concedem identidades aos lugares, e agem direta e


constantemente em seus moradores na contribuição à perpetuação das falas e
sotaques, dos gostos musicais, e na evocação de paisagens do passado, o que
reforça valores existentes em cada indivíduo, que pode contribuir para sua
fixação em lugares distintos, e à criação do sentimento de pertencimento a eles,
pelo fato de apresentarem sonoridades que concedem familiaridade na paisagem.
(TORRES; KOZEL, 2010, p. 125)

Torres e Kozel (2010) adentram um ponto significativo da temática


sonora, que é o que ela imprime historicamente nos indivíduos. Dessa forma,
subentende-se que questões identitárias perpassam, por vezes, questões
sonoras, especialmente ao considerar a malha cultural que une grupos por
meio, inclusive, de representações artísticas que envolvem sonoridades, sejam
estilos musicais, sejam as culturas regionais dentro de um país tão diverso

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como o Brasil, sejam as próprias características culturais que aproximam ou


distanciam os países entre si.

O CONCEITO DE PAISAGEM SONORA

A expressão paisagem sonora provém dos estudos da acústica e foi


definida pelo musicólogo e compositor Murray Schafer (2011), após vasta
pesquisa em que analisa a sonoridade mundial em diferentes tempos e locais.
“Podemos referir-nos a uma composição musical, a um programa de rádio ou
mesmo a um ambiente acústico como paisagens sonoras” (p. 23). Mas mais do
que definir o conceito, ele explanou as particularidades das diversas paisagens
sonoras, orquestrou as diferentes sonoridades do mundo, bem como as
alterações sônicas desde os primeiros sons da vida até a Revolução Industrial e
elétrica, passando pela música e pela mudança na percepção sonora advinda
das alterações sônicas mundiais. A expressão foi apresentada por Gérson
Werlang (2011), como termo “relacionado aos sons existentes no mundo,
incluindo aí tanto o ruído como a música, assim como os sons da natureza, o
ambiente sonoro de grandes cidades, assim como de vilas e outras pequenas
comunidades” (2011, p. 29), ao analisar a obra do escritor Érico Verissimo,
quando transpôs o estudo da acústica à análise literária:

Utilizaram-se ainda alguns conceitos tomados de empréstimos de outras áreas


para analisar a dicotomia música-literatura. Foi introduzido aqui um conceito
que cremos inovador, o da paisagem sonora dentro de uma obra literária. O
termo paisagem sonora foi definido por Schafer (2001), relacionado aos sons
existentes no mundo, incluindo aí tanto o ruído como a música, assim como os
sons da natureza, o ambiente sonoro de grandes cidades, assim como de vilas e
outras pequenas comunidades. Os conceitos deste autor foram aplicados na
análise da paisagem musical das obras de Érico. Portanto, transpomos para o
campo literário ideias concebidas no campo da acústica, que contêm
observações preciosas sobre os sons circundantes de vários ambientes como os
do meio rural e do urbano, e aplicamos esses conceitos como ferramenta
analítico-literária. (WERLANG, 2011, p. 29)

No estudo em questão Werlang (2011) observou que a

paisagem sonora é de suma importância, e esses sons não são apenas os sons
musicais tradicionais, mas também o ruído das ruas, do trânsito, do canto dos

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pássaros, a festividade transmitida pelos ruídos caseiros, e muitos outros


recursos provenientes de um âmbito estritamente sonoro”. (WERLANG, 2011,
38)

Para ele, então, a paisagem sonora desempenha, naquela obra, uma


valiosa função na construção da malha textual e viabiliza, em função disso, a
produção de sentidos ímpares, singulares, que acontecem por vias sonoras.
Depois desse estudo provavelmente inovador em que houve a aplicação à
literatura de análises provenientes de outra área, o interesse pelos estudos da
paisagem sonora ficcional foram ampliados, assim como o próprio conceito de
paisagem sonora. Em recentes artigos publicados sobre o tema há uma
atualização do conceito:

Para Werlang (2011, p. 37), a paisagem sonora é o conjunto de sons presentes


no dia-a-dia dos seres humanos desde tempos imemoriais. Esses sons terminam
por caracterizar e mesmo condicionar a existência das sociedades. Dentro desse
conjunto de sons estão presentes também os sons musicais, ou seja, a música
de determinadas sociedades. (DEBORTOLLI e WERLANG, 2020a, p. 263)

Ou ainda:

o conjunto de sonoridades presentes em um determinado local, seja ele um


espaço pequeno (um cômodo de casa, uma sala, etc.) ou um espaço amplo (uma
cidade, uma floresta, os oceanos). Cada um desses ambientes possui um
conjunto de sons que lhes são próprios, partes integrantes de sua constituição.
(DEBORTOLLI e WERLANG, 2020a, p. 257)

Esses estudos recentes sustentam o argumento de que “Na ficção


literária, esse termo estaria relacionado, portanto, aos elementos sônicos que
compõe (sic.) o espaço narrativo, que é percebido por personagens e narradores
e que acaba por influenciar na narrativa (DEBORTOLLI e WERLANG, 2020b, p.
27)”; No entanto, há de se considerar que nos textos em que a paisagem sonora
se apresenta num grau mais profundo, ela acaba por ser fundamental na
produção de determinados sentidos, embora nem sempre a sua influência seja
percebida por leitores que não atentem à sua existência.
De qualquer modo, a paisagem sonora do mundo real possui algumas
particularidades que se repetem no mundo ficcional e nele funcionam e
desencadeiam aspectos semelhantes ao da realidade. Dentre os sons que

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compõem a paisagem sonora de um espaço há os sons fundamentais, que para


Schafer (2011) são

os sons criados por sua geografia e clima: água, vento, planícies, pássaros,
insetos e animais. Muitos desses sons podem encerrar um significado
arquetípico, isto é, podem ter-se imprimido tão profundamente nas pessoas que
os ouvem que a vida sem eles seria sentida como um claro empobrecimento.
(SCHAFER, 2011, p. 26)

Som fundamental também pode ser entendido como

um som regular que sustenta outros eventos sonoros, mais fugidios ou recentes.
Os sons fundamentais da fazenda eram numerosos, pois no campo a vida tem
poucas variações. Os sons fundamentais podem influenciar o comportamento
das pessoas ou criar ritmos que são transportados para outros aspectos da vida.
(SCHAFER, 2011, p. 79)

Nas narrativas, a presença de sons fundamentais é relativamente


comum, especialmente quando os espaços ficcionais são os do campo ou afins;
assim como ocorre com os seres humanos, que passam a ter essas sonoridades
impregnadas em si, provavelmente pode-se dizer o mesmo em relação aos
personagens, quando estão expostos a essas sonoridades. Dessa forma, ao
aceitar que os sons fundamentais fazem parte da vida das pessoas, mesmo que
elas não se deem conta disso, é possível aceitar que isso acontece com
personagens, numa relação de verossimilhança. O mesmo pode ser dito em
relação ao que Schafer (2011) conceitua como evento sonoro. Para o
pesquisador:

Um evento sonoro é simbólico quando desperta em nós emoções ou


pensamentos, além de suas sensações mecânicas ou funções sinalizadoras,
quando possui uma numinosidade ou reverberação que ressoa nos mais
profundos recessos da psique. (SCHAFER, 2011, p. 239)

Assim, se for aceito que os sons podem despertar nos seres humanos
emoções, é possível estender isso a sua capacidade emotiva no campo ficcional,
pelo menos quando se entende a construção de personagens e enredos
verossímeis, cuja realidade tomada como base permite reconhecer as figuras
ficcionais como seres passíveis de emoções.

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Há de se considerar ainda que a construção da paisagem sonora na


literatura pode não ser tão simples como tende a parecer, já que “dar uma
imagem totalmente convincente de uma paisagem sonora requer habilidade e
paciência extraordinárias” (SCHAFER, 2011, p. 23) e por se consistir “em
eventos ouvidos e não em objetos vistos” (SCHAFER, 2011, p. 24, grifos do
autor). Em verdade, não é apenas fazer a descrição de um som, mas
principalmente a construção de todas as subjetividades que o compõem, e
muitas vezes da percepção que os personagens têm dos elementos sônicos.
Ademais, a paisagem sonora na literatura é tão rica que o próprio autor do texto
se releva na sua construção, haja vista que é necessário o próprio autor ter
ouvidos atentos ao mundo que o cerca para transfigurar os elementos sonoros
circundantes ao campo diegético. Assim, é possível levantar alguns
questionamentos acerca do campo de visão (ou de audição) do autor, porque,
quando aspectos sônicos não despertam seu interesse, talvez a sonoridade
ficcional criada por ele seja mais silente, enquanto que escritores cuja vida é
concatenada com questões sonoras podem ter esse aspecto refletido em seus
enredos. As matizes sonoras criadas por eles talvez estejam relacionadas à
intimidade que têm com os sons, como fica evidente em Érico Verissimo, cuja
obra é repleta de elementos musicais:

(...) a paisagem sonora é demasiado complexa para ser reproduzida pela fala
humana. Assim, somente na música é que o homem encontra verdadeira
harmonia dos mundos interior e exterior. Será também na música que ele criará
os seus mais perfeitos modelos da paisagem sonora ideal da imaginação.
(SCHAFER, 2011, p. 70)

Em Érico, a relação com a música tende a ser intrínseca, e reverbera,


inclusive, no conteúdo semântico de alguns títulos dos romances, quando
elementos musicais são evidenciados.

O escritor Érico Verissimo nunca escondeu seu apreço pela música. Diversas
passagens de sua obra atestam a influência ela exercia em sua vida, levando-o
mesmo a afirmar que, não fosse escritor, gostaria de ter sido músico.
Desde sua estreia como escritor com o livro de contos Fantoches, passando pelos
primeiros romances, pelo O tempo e o vento até o seu derradeiro livro, Solo de
clarineta, em toda sua obra sente-se a presença da música. Às vezes essa
presença está marcada de forma explícita, identificável nos títulos de diversas
obras (no romance Música ao longe, no livro infantil O urso com música na
barriga, no conto Sonata). Outras vezes aparece de forma velada, inserida no

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enredo ou na estrutura. Como no conto As mãos de meu filho, onde a vida de um


pianista é relembrada pela sua mãe enquanto ele toca um recital. Em Caminhos
cruzados, o escritor usa o mesmo recurso técnico utilizado por Aldous Huxley
em seu romance Contraponto, proveniente de uma técnica de composição
musical. (WERLANG, 2011, p. 21. Grifos do autor)

Em verdade, o próprio estudo de Murray Schafer (2011) colabora com a


tese de que a criação diegética sonora perpassa pela relação que os escritores
têm com os sons, já que ele próprio, inclusive por ser músico, desenvolveu a
pesquisa sobre a paisagem sonora mundial. Para ele, a música tem influência
na formação e na caracterização das sociedades, pois ela seria

um indicador da época, revelando, para os que sabem como ler suas mensagens
sintomáticas, um modo de reordenar acontecimentos sociais e mesmo políticos.
Desde algum tempo, eu também acredito que o ambiente acústico geral de uma
sociedade pode ser lido como um indicador das condições sociais que o
produzem e nos contar muita coisa a respeito das tendências e da evolução dessa
sociedade. (SCHAFER, 2011, p. 23)

A presença da música nos enredos literários ficcionais faz surgir “o


conceito de paisagem musical, derivada do conceito de paisagem sonora”
(WERLANG, 2011, p. 37). Dentro do conjunto de sons da paisagem sonora
estariam também “os sons musicais, ou seja, a música de determinada
sociedade” (WERLANG, 2011, p. 38).
Ao pensar o mundo histórica e sonoramente, há de se levar em conta que
“antes da era da escrita, na época dos profetas e épicos, o sentido da audição
era mais vital que o da visão. A palavra de Deus, a história das tribos e todas
as outras informações importantes eram ouvidas, e não vistas” (SCHAFER,
2011, p. 28). Diante disso, é possível considerar que para os personagens
literários o universo sonoro também é importante, já que “a audição é um modo
de tocar a distância, e a intimidade do primeiro sentido funde-se à sociabilidade
cada vez que as pessoas se reúnem para ouvir algo especial” (SCHAFER, 2011,
p. 29). Para pessoas (e personagens) que ouvem, o mundo (seja real ou ficcional)
é sonoro e é impossível pensar que a paisagem sonora não tenha alguma
influência sobre eles. O corpo humano é preparado para ouvir e para sentir o
que ouve, para produzir sentidos e emoções a partir do que escuta.

A única proteção para os ouvidos é um elaborado mecanismo psicológico que


filtra os sons indesejáveis, para se concentrar no que é desejável. Os olhos

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apontam para fora; os ouvidos, para dentro. Eles absorvem informação. [...]
Assim, por sua própria natureza, o ouvido requer que os sons dispersos e
confusos sejam interrompidos para que ele possa concentrar-se naquilo que
realmente importa. (SCHAFER, 2011, p. 29)

Com esse apontamento de Schafer (2011) chega-se a um ponto


interessante, que é a percepção sonora propriamente dita, porque os
personagens também fazem uso desse mecanismo de filtragem de som,
provavelmente por meio do narrador, que dá ênfase a determinada sonoridade,
que o conduz a prestar atenção a um som em detrimento do outro. Assim, como
o personagem é levado a ouvir algo, o leitor também é levado a ouvir a mesma
coisa, ainda que imaginariamente. Ao reproduzir uma paisagem sonora, o
escritor conduz o narrador a abrir os caminhos que levam o personagem a ouvir,
e com isso o leitor também ouve. Em última análise, é o leitor quem ouve
diegeticamente a paisagem sonora do texto literário ficcional.
A imaginação ligada ao senso de audição não é algo recente, já que “na
imaginação dos profetas, o fim do mundo seria assinalado, por forte estrondo,
um estrondo mais violento do que o som mais forte que se possa imaginar, mais
terrível que qualquer tempestade conhecida, mais feroz que qualquer trovão”
(SCHAFER, 2011, p. 50). O imaginário humano é permeado pela sonoridade
desde muito tempo. E em muitas narrativas, o imaginário dos personagens
também.
Talvez uma das mais antigas e simples representações sonoras seja a
onomatopeia, que para Schafer (2011)

reflete a paisagem sonora. Mesmo com a nossa linguagem avançada, ainda hoje
continuamos, no vocabulário descritivo, a resgatar sons ouvidos no ambiente
acústico; e bem pode ser que as mais complexas extensões acústicas do homem –
suas ferramentas e seus recursos de sinalização – também continuem, até certo
ponto, a ampliar os mesmos modelos arquetípicos. (SCHAFER, 2011, p. 68)

De modo geral, as particularidades de cada som tendem a representar


aspectos específicos nos contextos em que se inserem, já que, notadamente,
levam em sua essência algumas simbologias intrínsecas à sua existência,
exemplo disso são as canções dos pássaros, que, de acordo com Schafer (2011),
“sempre hão de sugerir esta delicadeza de sentimentos, e eu gostaria de ir mais
além e afirmar que elas aparecem na música em deliberada contradição com a
brutalidade e os acidentes da vida exterior” (SCHAFER, 2011, p. 155). Relativo

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a isso, o pesquisador afirma que o canto dos pássaros está associado à


afetividade. Segundo ele:

Nenhum som da natureza tem estado ligado tão afetivamente à imaginação


humana quanto as vocalizações dos pássaros. Em testes feitos em vários países,
temos pedido aos ouvintes que identifiquem os sons mais agradáveis de seu
ambiente; o canto dos pássaros aparece repetidamente no topo da lista, ou
próximo dele. (SCHAFER, 2011, p. 53)

Para além disso, o pesquisador explica antigas definições de espaços a


partir de configurações sonoras:

Nos cantos territoriais dos pássaros, encontramos a gênese da ideia do espaço


acústico. (...) a definição do espaço por significados acústicos é muito mais
antiga do que o estabelecimento de cercas e limites de propriedade; e, à medida
que a propriedade privada se torna cada vez mais ameaçadora no mundo
moderno, é de crer que os princípios reguladores da complexa rede de espaços
acústicos que se sobrepõe (sic.) e interpenetram, como ocorre entre os pássaros
e animais, terão de novo uma grande significação também para a comunidade
humana. (SCHAFER, 2011, p. 58)

Em analogia, a significação do espaço acústico para as comunidades


humanas pode ser atribuída às comunidades ficcionais, já que o que vale para
a realidade tomada como base aos textos ficcionais tende também a valer na
ficção. Isso fica mais evidente nas análises literárias quando se observa a
relação dos personagens com o espaço em que estão inseridos, especialmente
em enredos cujas demarcações de comunidades se dão por vias sonoras, como
o caso do uso do sino de igreja que demarca as comunidades cristãs. De acordo
com Schafer (2011), “para onde quer que os missionários conduzissem a
cristandade, os sinos logo os seguiam, demarcando acusticamente a civilização
paroquial da selvagem, situada além do alcance dos ouvidos” (p. 87). Ademais:

Para toda a cristandade, o divino era sinalizado pelo sino da igreja. É um


desenvolvimento tardio da mesma necessidade de clamor que antes havia sido
expressa pelo canto e pelo estrondo. O interior da igreja também reverberava
com os mais espetaculares eventos acústicos, pois o homem trouxe para esse
lugar não somente as vozes que se ouviam nos cânticos, mas também a mais
ruidosa máquina que até então ele havia produzido – o órgão. E ele foi todo
planejado para fazer a divindade ouvir. (SCHAFER, 2011, p. 83)

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A demarcação sonora advinda dos sinos deu um passo a mais na


significação que passou a ter para a humidade quando começou a demarcar a
passagem do tempo por meio de relógios sonoros. Na literatura, é relativamente
comum encontrar enredos em que a presença da paisagem sonora advinda do
tiquetaquear dos relógios tem profunda importância na construção geral da
trama e no desenvolvimento do enredo.

Foi durante o século XIV que o sino se uniu a uma invenção técnica de grande
significado para a civilização europeia: o relógio mecânico. Juntos, eles se
tornaram os sinais mais inevitáveis da paisagem sonora porque, como o sino da
igreja, e mesmo com mais implacável pontualidade, o relógio mede a passagem
do tempo de forma audível. Por isso, ele difere de todos os instrumentos de
contagem de tempo usados anteriormente – clepsidras, ampulhetas e
quadrantes solares – que eram silenciosos (...).
O relógio sonoro tinha uma grande vantagem sobre o de mostrador, porque para
se ver o mostrador é preciso estar à sua frente, enquanto a pancada do relógio
envia os sons do tempo para todas as direções, uniformemente. (SCHAFER,
2011, p. 88)

A paisagem sonora advinda do relógio tem uma relação intrínseca com o


tempo; sonoramente, é o relógio que demarca a passagem temporal. Não é à toa
que se veem relógios pararem, na literatura, quando personagens morrem e seu
tempo acaba, o que pode ser entendido como uma metáfora do fim do tempo,
que se dá, nesses casos, estritamente por vias sônicas e silentes. Além dele,
outros sons produzem efeitos recorrentes, em virtude da significação que trazem
em sua essência.

O uivo é um som que o imaginário constrói desde a infância e que está impresso
na imaginação humana. Além do mais, “no grito do lobo, encontramos um ritual
vocal que define a demarcação territorial da alcateia pelo espaço acústico –
exatamente do mesmo modo que a trompa de caça demarca a floresta e o sino
da igreja, a paróquia”. (SCHAFER, 2011, p. 66)

O som da coruja, por sua vez, profetiza a languidez e com frequência está
relacionado ao mau agouro. Tal associação foi estabelecida ao longo da história
e pode estar relacionada aos hábitos noturnos da ave, os quais teriam se
juntado a crenças em outros elementos noturnos, como espíritos, e daí sua
associação com a morte. Lendas e mitos que envolvem a coruja e seus maus
presságios podem ser facilmente encontrados em diferentes sociedades e

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tempos, e “no folclore brasileiro as corujas possuem a fama da civilização


romana e da oriental, onde são tidas como agourentas (DANTAS e FREIRE,
2017, p. 13)”. Isso continua na contemporaneidade, pois

a coruja é símbolo de morte, considerada a guardiã dos cemitérios. O seu voo


noturno, seus olhos grandes, sua vocalização lúgubre, sintetizando dessa forma
seu comportamento, configuram sua imagem negativa para uma parcela da
sociedade. Na literatura brasileira o animal é muito abordado, principalmente em
obras de cunho regionalista. (DANTAS; FREIRE, 2017, p. 13)

Além de obras regionalistas, as corujas e seus sons são recorrentes em


enredos de horror, mas de modo geral, vêm acompanhadas de algo negativo que
está por acontecer, como ocorre às vezes com as tempestades, seus raios e
trovões, que com frequência pressagiam tragédias e que estão concatenadas a
crenças antigas de poder. Linearmente, a evolução da associação entre poder e
ruído iniciou quando “os ruídos fortes evocavam o temor e o respeito nos
primeiros tempos, e (...) pareciam ser a expressão do poder divino” (SCHAFER,
2011, p. 113) e depois “esse poder foi transferido dos sons naturais (trovão,
vulcões, tempestades) para os dos sinos da igreja e do órgão de tubo”
(SCHAFER, 2011, p. 113), diferente do que ocorre com a chuva (apenas chuva,
não tempestade), que, para Schafer (2011), assim como o “riacho, uma fonte,
um rio, uma cachoeira, o mar, cada qual produz seu som único, mas todos
compartilham um rico simbolismo. Eles falam de limpeza, de purificação,
refúgio e renovação” (SCHAFER, 2011, p. 240). De qualquer modo, “todos os
caminhos do homem levam à água. Ela é fundamento da paisagem sonora
original e o som que, acima de todos os outros, nos dá o maior prazer, em suas
incontáveis transformações (SCHAFER, 2011, p. 34)”.
A água compõe uma das primeiras paisagens sonoras naturais, mas
assim como ela, outro som natural está permanentemente presente na mente
humana, já que é relativamente constante e se apresenta com frequência no
mundo ficcional. A malha textual faz uso dele em suas diferentes variações, já
que ele, o vento, “é um elemento que se apodera dos ouvidos vigorosamente. A
sensação é táctil, além de auditiva. Que curioso e quase supernatural é ouvir o
vento à distância, sem senti-lo (...)” (SCHAFER, 2011, p. 43). Interessa destacar
a configuração sonora de espaços interioranos, em que o vento, por estar em
espaço aberto, produz um tipo específico de som, diferente de em outros
momentos. Na literatura, o som do vento se apresenta nas mais variadas
configurações, e em alguns casos ele dá aquele passo a mais na significação,
quando a malha textual em que está inserido faz com que ele não seja apenas o

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pano de fundo das ações, mas que componha o enredo no sentido mais profundo
do termo. Bastante presente em espaços de fazenda, nesses casos ele se mistura
a outros sons tradicionais desse tipo de lugar e passa a produzir efeitos sonoros
específicos.

A paisagem sonora da fazenda fornece todo um turbilhão de atividades. Cada


animal tem seus próprios ritmos de som e silêncio, de despertar e repousar. O
galo é o eterno despertador e o latido dos cachorros, o telégrafo original, pois a
invasão de uma propriedade por um estranho logo é denunciada pelo latido dos
cachorros, passado de um sítio a outro. (SCHAFER, 2011, p. 77)

Assim como a sonoridade das fazendas tem suas matizes sonoras


específicas em virtudes dos animais que normalmente estão presentes nela, isso
também ocorre em locais como a selva.

O urro do leão, o uivo do lobo ou a risada da hiena, têm qualidades de tão grande
impacto que se imprimem imediatamente na imaginação humana, provocando
intensas imagens acústicas. Uma vez ouvidos, nunca mais serão confundidos
ou esquecidos. Estão entre os sons que fazem história. Os homens que apenas
ouviram falar deles pelos lábios de um bardo estremecerão só de pensar.
(SCHAFER, 2011, p. 66)

Semelhante ao que ocorre com os sons das corujas, os dos lobos também
estão impregnados no imaginário coletivo social, desde a literatura infantil até
a de terror, já que, ao estarem miticamente associado a trocas de lua, fazem
parte inclusive de crenças e lendas que circulam há gerações em diferentes
locais do mundo, não apenas no campo ou fazendas, mas também em regiões
urbanas, que apresentam também características importantes no processo
evolutivo (ou linear) de sua configuração sonora. Nesse sentido, Schafer (2011)
afirma que “um dos sons fundamentais mais influentes das primeiras paisagens
sonoras urbanas deve ter sido o tropel dos cavalos, audível em toda parte, nas
ruas pavimentadas de pedra, e diferente do cavo ruído dos cascos em campo
aberto” (SCHAFER, 2011, p. 98). Essa é uma questão interessante de se pensar,
tendo em vista que os sons dos cavalos podem estar associados a diversas
situações, desde tranquilos passeios no campo até a guerra, já que seu tropel
era audível quando as tropas passavam dizimando povoados, ou em lutas em
campo aberto. Inclusive, de modo geral, as guerras são sonoras, até porque o
barulho está associado ao poder e ao medo. Schafer (2011) chega a afirmar que

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“se os canhões fossem silenciosos, nunca teriam sido utilizados na guerra” (p.
115), já que

os exércitos condecorados para a batalha ofereciam um espetáculo visual, mas


a batalha em si era acústica. Ao barulho dos metais que se entrechocavam cada
exército acrescentava seus gritos de guerra e toques de tambor no intuito de
amedrontar o inimigo. O barulho era um estratagema militar deliberado
defendido pelos antigos generais (...). (SCHAFER, 2011, p. 80)

A literatura é um campo fértil para criar paisagens sonoras de guerra,


especialmente em romances históricos associados a elas. Fica difícil imaginar,
portanto, a elaboração de uma cena ficcional de guerra silente, a menos que a
batalha em si não seja narrada, o que, de fato, pode acontecer. No entanto, em
situações em que há guerra, em que há batalhas, há de se considerar que o
processo auditivo nesses casos também é peculiar, já que o medo pode agir na
percepção sonora, porque, de acordo com Schafer (2011), “quando o homem
estava com medo de um ambiente inexplorado, todo seu corpo se convertia em
ouvido (p. 45)”.
Dentre os sons existentes, nem todos podem ser ouvidos e alguns são
únicos, não repetidos. Schafer (2011) levanta essa questão quando diz que
“talvez o universo tenha sido criado silenciosamente. Não o sabemos. Não havia
ouvidos humanos para escutar a dinâmica do milagre que fez nascer nosso
planeta” (SCHAFER, 2011, p. 49); na literatura, porém, pode haver essa escolha,
já que é possível colocar os personagens sonoramente diante da paisagem
sonora que se quer criar. Ademais, a transcrição do som nunca será o som, ou
seja, na ficção narrativa é possível criar um espaço e contextualizar a cena em
que determinadas ações ocorrem, sob determinadas circunstâncias sônicas,
mas o som em si não é reproduzido pela linguagem. No entanto, na realidade
há essa tentativa de reprodução de sons. Schafer (2011) chega a afirmar que:

O homem sempre tentou destruir seus inimigos com ruídos terríveis.


Encontramos tentativas deliberadas para reproduzir o ruído apocalíptico na
história das guerras, desde o entrechocar-se dos escudos e o rufar dos tambores
dos tempos primevos até a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki, na Segunda
Guerra Mundial. A partir de então, a ampla destruição do mundo talvez tenha
sido reduzida, mas a destruição sônica não, e é desconcertante percebermos que
o inóspito ambiente acústico produzido pela moderna vida civil deriva do mesmo
anseio escatológico. (SHAFER, 2011, p. 51)

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Embora não seja possível reproduzir com exatidão os sons (o mais perto que se
chega disso é a onomatopeia), deve-se pensar no surgimento da linguagem, da
fala e da música.
Estamos naquele tempo da Pré-história em que ocorre o duplo milagre da fala e
da música. Como essas atividades começaram? Seria precipitado insistir que a
fala originou-se exclusivamente da imitação onomatopaica da paisagem sonora
natural. Mas não pode haver dúvida de que a língua dançou e ainda continua a
dançar com a paisagem sonora. Os poetas e os músicos têm mantido viva a
memória, ainda que o homem moderno se tenha convertido em um “espectador
de óculos”. (SCHAFER, 2011, p. 68)

O argumento defendido por Schafer (2011) leva a alguns pontos de


reflexão, dentre os quais as alterações sonoras pelas quais passaram os espaços
ao longo da história, e isso pode ser percebido também na literatura. Os textos
narrativos ficcionais cujo tempo histórico datam de época distante apresentam
sonoramente elementos distintos dos que se passam na contemporaneidade.
Narrativas ou trilogias que abrangem um período de tempo mais longo, ou que
ocorrem em mais do que uma época geralmente apresentam elementos ricos
para esse tipo de análise, já que a tendência é que apresentarem as alterações
sonoras típicas dos contextos tomados como base para transfiguração ficcional.

Os pastores tocavam flauta e cantavam uns para os outros a fim de fazer passar
as horas solitárias (...); e a música delicada de suas canções constituem talvez
os primeiros e decerto os mais persistentes arquétipos sonoros produzidos pelo
homem. Séculos de flauta produziram um som referencial que ainda sugere
claramente a serenidade da paisagem pastoril, embora muitas imagens e
recursos literários tradicionais estejam começando a desaparecer. (SCHAFER,
2011, p. 73)

É fácil perceber em narrativas ficcionais as alterações sonoras quando as


histórias se desenvolvem ao longo de décadas ou séculos. Inclusive, os mais
atentos são capazes de perceber dissonâncias entre as paisagens sonoras reais
e ficcionais, em enredos que tomam por base épocas e lugares existentes,
especialmente no que concerne aos ritmos musicais que, por vezes, são usados
em épocas e regiões em que ainda não existiam, ou então com sonoridades de
determinados animais em regiões que eles nunca habitaram.

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CONSIDERAÇÕES SONORAS FINAIS

Algumas questões surgem quando se passa a pensar na paisagem sonora


da literatura, nas diferentes manifestações em que ela ocorre. Há de se
considerar questões relativas ao autor especialmente, porque, se a percepção
sonora que ele tem na vida real interfere na criação do enredo, é de se aceitar
também que seu lugar de fala vai refletir as questões sonoras. A perspicácia
auditiva de alguém que tenha velado o sono de um recém-nascido talvez não
seja a mesma de alguém acostumado à balbúrdia de uma indústria. Mais do
que um lugar de fala (ou de audição), o que importa nesse caso seria o que é
evidenciado em função disso e o que é calado. Ao representar sonoramente um
espaço geográfico específico que apresenta classes sociais ou gêneros distintos,
há de se observar se alguns deles são silenciados, as vozes que estão em
destaque, as representações musicais dessas classes, ou seja, tão importante
quanto observar a preponderância da paisagem sonora em um enredo é analisar
o contexto em que ela se insere, o contexto que ela insere e qual silencia, para
que assim seja possível compreender profundamente as matizes sônicas
diegéticas.
A partir da associação entre estudos literários e sonoros, tornou-se
possível adentrar um campo de significação subjetiva, cujo potencial aponta
para compreensões não apenas ficcionais, mas que, em última análise, são
compreensões da dinâmica social, compreensões da vida.

REFERÊNCIAS

DANTAS, Adelannia Chaves; FREIRE, Manoel. A coruja como símbolo de morte


em “As corujas” de Moreira Campos. In: Revista Digital dos Programas de Pós-
Graduação do Departamento de Letras e Artes da UEFS Feira de Santana, v. 18,
n. 1, 2017.

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paisagem sonora como elemento constitutivo no conto O poncho, de Charles
Kiefer. In: O Eixo e a roda, Belo Horizonte, v. 29, n. 1, 2020a.

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paisagem sonora em O Pêndulo do Relógio, de Charles Kiefer. In: Revista
Investigações, Pernambuco, v. 33, n. 1, 2020b.

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LODGE, David. A arte da ficção. Porto Alegre: L&PM, 2011.

ROSENFELD, Anatol. Literatura e personagem. In: CANDIDO, Antonio. A


personagem de ficção. 13. ed. São Paulo: Perspectiva, 2014.

SCHAFER, R. Murray. A afinação do mundo. 2. ed. São Paulo: UNESP, 2011.

TORRES, Marcos Alberto; KOZEL, Salete. Paisagens sonoras: possíveis


caminhos aos estudos culturais em geografia. Curitiba: UFPR, 2010.

WERLANG, Gérson Luís. A música na obra de Érico Verissimo: polifonia,


humanismo e crítica social. Passo Fundo: Méritos, 2011.

GÉRSON LUÍS WERLANG possui graduação em Música pela Universidade


Federal de Santa Maria (1995), Especialização [pós-graduação lato sensu] em
Educação Musical (Universidade de Passo Fundo - 1998) e mestrado em Música
- Guitar Performance - University of Miami (1999). É doutor em Letras - Estudos
Literários - Universidade Federal de Santa Maria, na área de Literatura
Comparada, mantém pesquisas nas áreas de criação da canção, composição e
em interfaces entre a música erudita e popular, história do rock, contracultura,
música e literatura e produção musical. Estuda as possibilidades educacionais
da música popular, particularmente o rock, nas escolas. É Pós-Doutor em
Letras-Literatura Comparada pela Universidade Federal de Santa Maria, com
projeto que envolve as áreas de Música e Letras. Na área de Letras, pesquisa o
dialogismo de Mikhail Bakhtin e as conexões polifônicas com a música.
Atualmente é professor do Departamento de Música da Universidade Federal de
Santa Maria, do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFSM, assim como
da Pós-Graduação/ Especialização em Música da mesma instituição. Como
músico tem diversos álbuns lançados, tanto solo como com sua banda, a Poços
e Nuvens.

VIVIANE APARECIDA PANDOLFO DEBORTOLLI possui graduação em Letras


pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul,
Mestrado em Letras pela Universidade Federal de Santa Maria, e cursa
Doutorado em Letras – Estudos Literários, na Universidade Federal de Santa
Maria. É docente efetiva da rede pública do Estado do Rio Grande do Sul. Sua
pesquisa é voltada ao estudo da paisagem sonora na literatura.

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