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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO


DEPARTAMENTO DE PÓS-GRADUAÇÃO

OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS


DOS PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NO AMAPÁ.

Macapá-AP
2018
_____________________________________________________________________________________
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE PÓS-GRADUAÇÃO

OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS


PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NO AMAPÁ.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Pro-


grama de Mestrado Profissional em Ensino de
História (ProfHistória) da Universidade Fede-
ral do Amapá (Unifap), como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre em Ensino
de História.
Orientador:
Prof. Dr. Alexandre Guilherme da Cruz Alves
Junior
Área de concentração: Ensino de História
Linha de pesquisa: Saberes Históricos no Es-
paço Escolar

Macapá-AP
2018
_____________________________________________________________________________________
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde de que citada a fonte

Catalogação na publicação

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Biblioteca Central da Universidade Federal do Amapá
Elaborado por Mara Patrícia Corrêa Garcia CRB-2/1248

398.098116

P149l Paixão, Joaciany do Carmo Nascimento da

Os Ladrões de Marabaixo: o legado das cantigas para o ensino


de história no Amapá / Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão
; orientador, Alexandre Guilherme da Cruz Alves Junior. - Macapá,
2018.

235 f.

Dissertação (Mestrado) – Fundação Universidade Federal do


Amapá, Programa de Pós-Graduação em Ensino de História.

_____________________________________________________________________________________
Nome: PAIXÃO, Joaciany do Carmo Nascimento
Título: Os Ladrões de Marabaixo: O legado das Cantigas para o Ensino de História no
Amapá.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Pro-


grama de Mestrado Profissional em Ensino de
História (ProfHistória) da Universidade Fede-
ral do Amapá (Unifap), como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre em Ensino
de História.
Orientador:
Prof. Dr. Alexandre Guilherme da Cruz Alves
Junior
Área de concentração: Ensino de História
Linha de pesquisa: Saberes Históricos no Es-
paço Escolar

Aprovado em:____/____/ 2018

Banca Examinadora

__________________________________
Prof. Dr. Alexandre Guilherme da Cruz Alves Júnior
(Presidente/ Orientador)

__________________________________
Prof. Dr. Sidney da Silva Lobato
(Membro/ProfHistória)

__________________________________
Prof.º Dra. Piedade Lino Videira
(Membro externo)

_____________________________________________________________________________________
DEDICATÓRIA

Dedico aos meus três amores: Jocimar, Bernardo e Heloísa


_____________________________________________________________________________________
AGRADECIMENTOS

O transcurso de construção deste trabalho de pesquisa não foi apenas intenso,


mas sofrido em momentos diferenciados. Por isso preciso agradecer a muitas pessoas
nominalmente.

A Deus sempre, meu refúgio, fortaleza, refrigério.

Os agradecimentos institucionais são devidos a Secretaria de Estado da Edu-


cação do Amapá por meio da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, especial-
mente a diretora Rosemary Barbosa Teles, pela compreensão e confiança em mim depo-
sitada nas atividades de Pesquisa de Campo especialmente nos períodos em que precisei
me deslocar com os estudantes ao Curiaú, distrito de Mazagão Velho, aos bairros Lagui-
nho, Santa Rita, Central e a Fortaleza de São José de Macapá.

Aos professores da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, em es-


pecial a professora Patrícia Oliveira por toda ajuda dispensada no decorrer das aplicações
das oficinas.

Aos pais dos alunos, da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, pela
compreensão quanto as atividades de Pesquisa de Campo, fora do espaço escolar.

Aos meus alunos do 2º ano do Ensino Médio da Escola Estadual Professora


Raimunda Virgolino Vitória, Márcia, Hernandes, Júlio, Wemmily, Iranilce, Rayla, Neize,
Anderson, Camila Sazalar, Camila Ferreira, Raquel, pelo carinho com a Pesquisa, dedi-
cação, interesse, pelas risadas e conversas agradáveis.

À comunidade do Curiaú, e em especial a Pedro Rosário dos Santos, pela


hospitalidade e generosidade em compartilhar saberes conosco.

À comunidade do distrito de Mazagão Velho, e em específico a Jozué da Con-


ceição Videira, pelo imenso carinho e receptividade comigo e com meus alunos.

A família de “Do Sacaca”, que de muitas formas, e em vários momentos dessa


pesquisa, generosamente me receberam em sua residência no bairro do Laguinho. A Fábio
José do Espírito Santo Souza, filho de “Do Sacaca”, não tenho palavras para mensurar
minha gratidão a você pelo tempo, paciência, e informações preciosas sobre a comuni-
dade do Marabaixo.

_____________________________________________________________________________________
Aos meus colegas de curso do Mestrado Profissional em Ensino de História
– ProfHistória pelo compartilhamento das experiências profissionais, aprendizado, análi-
ses e reflexões quanto ao objeto da pesquisa. A Jaqueline Samara, Ângela Maria e Danilo
Pacheco pelas generosas contribuições.

Aos professores do ProfHistória pelo aprendizado.

A professora Dra. Júlia Monnerat Barbosa, pelas valiosas contribuições na


banca de qualificação e pela atenção dispensada a este trabalho de Pesquisa. Agradeço
pelos comentários pertinentes.

Destaco a parceria com o Prof. Dr. Alexandre Guilherme da Cruz Alves


Júnior que aceitou, após a banca de qualificação, o desafio de orientar a temática proposta.
As suas contribuições foram riquíssimas ao longo da pesquisa e foram elas que possibili-
taram enxergar outros vieses quanto ao objeto pesquisado.

As pessoas que deram imprescindível contribuição e apoio: a minha família,


meu pai Joacino dos Santos Nascimento (in memoriam), a minha mãe Maria Jacineide
Bacelar do Carmo Nascimento; meus sogros Julimar Cardoso da Paixão e Raimunda
Celma; e as minhas seis irmãs, pelo apoio e ajuda em cuidar dos meus filhos nos momen-
tos em que precisei estudar e fazer as Pesquisas de Campo.

Ao meu esposo Jocimar Melo da Paixão, pelo apoio emocional e financeiro


imprescindíveis; pela paciência, dedicação em cuidar de forma solitária, nos momentos
em que precisei ficar reclusa, de nossos dois amores e herança de Deus: Bernardo e He-
loisa. Seu apoio nas digitalizações, transcrições, material fotográfico, pela organização e
diagramação foram fundamentais. Obrigada por ouvir minhas angústias, pela solidarie-
dade diária. Enfim, por tudo que representa na minha vida, pelo nosso amor durante esses
quatorze anos juntos. Amo-te imensamente. Sem você nada disso seria possível.

_____________________________________________________________________________________
RESUMO

O Marabaixo conta a sua história e a história do seu povo através da dança e


das letras das Cantigas que narram por meio de saga poética, a História da presença afri-
cana no Amapá. Aquilo que as letras das músicas contam e o modo como cantam e como
dançam, arrastando os pés simulando os grilhões que acorrentavam seus ancestrais na
época da escravidão, constituem-se em ricos repositórios de história de vida e de genea-
logias locais. As letras das Cantigas se compõe de um acervo oral importantíssimo não
apenas por ser uma tradição deixada pelos antepassados da festividade, mas porque como
bem salienta seus participantes, o legado das Cantigas, fazem parte da mais autentica
expressão cultural do Amapá. Nosso objetivo neste trabalho consiste no diálogo proposi-
tivo da música no Ensino de História utilizando como aporte teórico a tipologia das Can-
ções afrodescendentes e a teoria ontogenética da Consciência Histórica trazendo, através
das Cantigas de Marabaixo, a constituição de sentido histórico acerca da escravidão afri-
cana no Amapá, no século XVIII. Como metodologia aplicamos 4 oficinas visando de-
senvolver a prática da Pesquisa Histórica e a Produção de Saberes no Espaço Escolar com
12 estudantes, do 2ª ano do Ensino Médio, da Escola Estadual Professora Raimunda Vir-
golino, nos sítios de incidência da manifestação do Marabaixo de Macapá (AP) e Maza-
gão Velho. Essa proposta apoia-se numa concepção de Ensino Aprendizagem da história
que tem como objetivo central a formação da Consciência histórica do estudante, a partir
do entrelaçamento com diferentes saberes que dialogam no interior do processo educa-
tivo. Como produto final da pesquisa apresentamos o DICIONÁRIO ILUSTRADO DOS
LADRÕES DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO –
VOL. 1. O mesmo foi produzido a partir do significado de palavras e expressões contidas
nas Cantigas de Marabaixo pesquisadas.

Palavras-chaves: Ladrões de Marabaixo, Ensino, Aprendizagem Histórica.

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ABSTRACT

The Marabaixo tells its story and the history of its people through the dance
and the letters of the Thieves that narrate through a poetic saga, the History of the African
presence in Amapá. What the lyrics of the songs tell and how they sing and how they
dance, shuffling their feet simulating the fetters that chained their ancestors at the time of
slavery, are rich repositories of life history and local genealogies. The Thieves lyrics are
composed of an important oral collection not only because it is a tradition left by the
ancestors of the festival, but because, as its participants, the legacy of the songs empha-
sizes, they are part of the most authentic cultural expression of Amapá. Our objective in
this work is the propositional dialogue of music in History Teaching, using as a theoretical
contribution the typology of African descendants songs and the ontogenetic theory of
Historical consciousness, bringing through the songs of Marabaixo the constitution of
historical sense about African slavery in Amapá, in the XVIII century. As a methodology,
we applied 4 workshops aiming to develop the practice of Historical Research and the
Production of Knowledge in the School Space with 12 students, of the 2nd year of High
School, of the State School Professor Raimunda Virgolino, at the incidence places of the
Marabaixo of Macapá (AP) and Old Mazagao. This proposal is based on a Teaching
Learning concept of history whose central objective is the formation of the student's his-
torical awareness, from the intertwining with different knowledge that dialogue within
the educational process. As the final product of the research, we present the ILLUS-
TRATED DICTIONARY OF MARABAIXO SONGS, TEACHER’S MATERIAL.
HIGH SCHOOL - VOL. 1. The same was produced from the meaning of words and ex-
pressions contained in the songs of Marabaixo researched.

Keywords: Marabaixo Songs, Teaching, Historical Learning.

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 – Gengibirra - Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro Central, Macapá


(AP). Em 18/06/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da
pesquisadora. ............................................................................................... 30
Imagem 2 – Marabaixeiras tomando a Gengibirra na Associação Folclórica Raízes da
Favela, bairro Central, Macapá (AP). Em 18/06/2017. Foto: Aydano Fonseca.
Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora. ...................................................... 31
Imagem 3 – Caldo (cozidão) servido nas festividades do Marabaixo. Associação
Folclórica Raízes da Favela, bairro Central, Macapá (AP). Em 18/06/2017.
Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora. ................ 32
Imagem 4 – Associação Folclórica Raízes da Favela - bairro Central, Macapá (AP) ... 33
Imagem 5 – Dançadeira de Marabaixo. Associação Folclórica Marabaixo do Pavão onde
a festividade é em louvor ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade.
..................................................................................................................... 35
Imagem 6 – Dançadeira de Marabaixo. Associação Folclórica Raízes da Favela, no bairro
Central. Macapá (AP), onde a festividade é em louvor a Santíssima Trindade
..................................................................................................................... 36
Imagem 7 – Na festividade, as Matriarcas possuem um papel de destaque sendo
reverenciadas pela comunidade do Marabaixo. Em destaque a segunda da
direita para a esquerda, Maria José Libório, logo depois, Natalina Costa
(falecida em 2018) e a quarta da direita para esquerda, Josefa Lina da Silva,
a “tia Zefa”, 102 anos. Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses.
Bairro Central, Macapá/AP. Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte:
Acervo pessoal da pesquisadora. ................................................................. 37
Imagem 8 – Bênção da matriarca Benedita Guilherma Ramos a “tia Biló”, 91 anos. Ato
de respeito perante a posição que ela exerce dentro festividade. Associação
Folclórica Raimundo Ladislau, no bairro do Laguinho. Macapá/AP. Em
16/4/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.
..................................................................................................................... 37
Imagem 9 – Sede da Associação Cultural Raízes da Favela. Data: 18/05/2017. Foto:
Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora. ......................... 38
Imagem 10 – Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses. Bairro Central,
Macapá/AP ao centro da roda de Marabaixo a Caixa com a imagem de Tia
Gertrudes...................................................................................................... 39
Imagem 11 – Membros da Associação Folclórica Marabaixo do Pavão entrando nas matas
do Curiaú (AP) para executar o ritual da Cortação do Mastro. Ciclo do
Marabaixo de Macapá, 2017. Foto: Aydano Fonseca. Acervo pessoal da
pesquisadora ................................................................................................ 40
Imagem 12 – Mestre Julião Ramos tocando a Caixa de Marabaixo. Fonte: Nunes Pereira,
1953, p. 41. Acervo pessoal da pesquisadora .............................................. 41
Imagem 13 – Pedro Bolão em sua oficina no Curiaú – Macapá/AP. Data: 06/05/2013.
Foto: Pedro Gontijo. IPHAN, 2013, p. 3-14. ............................................... 42

_____________________________________________________________________________________
Imagem 14 – Marcelo Cláudio de Jesus Coimbra (Marcelo Favela), apresentando um
pedaço de couro para ser usado na Confecção das Caixas – Macapá/AP. Data:
20/05/2013. Foto: Eduardo Costa. ............................................................... 43
Imagem 15 – Caixas de Marabaixo da sede da Associação Cultural Raízes da Favela.
Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/05/2017 Fonte: Acervo pessoal da
pesquisadora. ............................................................................................... 44
Imagem 16 – Dançadeira de Marabaixo na Associação Folclórica Marabaixo do Pavão –
Macapá/AP .................................................................................................. 45
Imagem 17 – Cortação do Mastro. Curiaú, Macapá (AP). Marabaixeiras da Associação
Folclórica Marabaixo do Pavão dando a primeira machadada simbólica no
tronco de árvore que servirá de Mastro. Em 16/06/2017. Foto: Aydano
Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora. ....................................... 47
Imagem 18 – Cortejo do Mastro. .................................................................................... 49
Imagem 19 – Corte da Murta para revestimento do Mastro. Distrito do Coração. Macapá
(AP).............................................................................................................. 50
Imagem 20 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão- Cortejo da Murta bairro do
Laguinho, Macapá (AP). Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo
pessoal da pesquisadora ............................................................................... 50
Imagem 21 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão . Cortejo da Murta. Bairro Jesus
de Nazaré, Macapá (AP). Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo
pessoal da pesquisadora ............................................................................... 52
Imagem 22 – A caminho para a Consagração da Murta. Igreja Jesus de Nazaré, bairro
Jesus de Nazaré, Macapá (AP). Parte religiosa do ciclo de celebrações em
louvor a Santíssima Trindade e ao Divino Espírito Santo. Em 4/6/2017. Foto:
Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora. .......................... 52
Imagem 23 – Encontro das Encontro das Bandeiras da Santíssima Trindade e do Divino
Espírito Santo. As Bandeiras marcam a identidade e devoção dos grupos de
Marabaixo. Igreja Jesus de Nazaré, bairro Jesus de Nazaré, Macapá (AP). Em
4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora.. 53
Imagem 24 – Coroas são artefatos permanentes da festividade. Representa os ramos
familiares que sustentam o Marabaixo, e são colocadas em altares nas casas
dos festeiros juntamente com seus Santos de devoção pessoal. Casa da
Família Congó, local onde funciona também a Associação Folclórica Raízes
da Favela, bairro Central. Macapá (AP). Em 18/6/2017.Foto: Aydano
Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora. ........................................ 55
Imagem 25 – Pessoas ajoelhadas diante da imagem da Santíssima Trindade no período
das novenas. Foto: Alysson Antero, 2014. .................................................. 55
Imagem 26 – Levantação do Mastro em devoção a Santíssima Trindade...................... 58
Imagem 27 – Derrubada do Mastro da Santíssima Trindade, ritual que simboliza o
encerramento do Ciclo de celebrações do Marabaixo de Macapá(AP).
Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro Central. Foto: Aydano
Fonseca. Acervo pessoal da pesquisadora ................................................... 59
Imagem 28 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017. Fonte: Acervo pessoal da
pesquisa........................................................................................................ 61
Imagem 29 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017 Fonte: Acervo pessoal da
pesquisadora ................................................................................................ 62
_____________________________________________________________________________________
Imagem 30 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017. Fonte: Acervo pessoal da
pesquisadora. ............................................................................................... 63
Imagem 31 – Dançadeiras da Associação Cultural Raízes da Favela. Foto: Aydano
Fonseca. Data: 25/05/2017. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora. ......... 65
Imagem 32 – Lago do Curiaú. Foto: Alan Kardec. Disponível em http://mapio.net/pic/p-
122835443/ .................................................................................................. 67
Imagem 33 – Casal de dançadores – Macapá/AP. ......................................................... 78
Imagem 34 – Torneio de Fut-lama. Ao fundo, a prática do kitesurf. Fonte:
https://www.alcinea.com/macapa/o-que-vi-hoje-na-orla-de macapá. Foto:
Alcinéia Cavalcante. Acessado em 29/12/2017........................................... 90
Imagem 35 – Vista aérea Parque do Forte e do seu complexo de lazer. Macapá/AP. ... 90
Imagem 36 – Umbanda, dança da vida. Foto: Templo Escola Filhos do Mar. Disponível
em http://tefilhosdomar.org/index.php/2015/09/29/umbanda-a-danca-da-
vida/. Acessado em 23/04/2018 ................................................................... 98
Imagem 37 – Ciclo do Marabaixo, 2017. Dança do Marabaixo. Barracão da Tia Gertrudes.
..................................................................................................................... 99
Imagem 38 – Auditório da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino no dia das
apresentações das temáticas das Disciplinas Eletivas. Data: 25/04/2018. Foto:
Acervo pessoal da pesquisadora ................................................................ 122
Imagem 39 – Aula audição das Cantigas de Marabaixo. Para audição utilizamos dois
módulos aula de 50 minutos cada. Biblioteca da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora.
Macapá (AP). Data: 04/04/2018 ................................................................ 124
Imagem 40 – Palestra sobre a origem histórica do Marabaixo. Colaborador: Fábio José
do Espírito Santo Souza. Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
Foto: Jocimar Paixão. Arquivo pessoal da pesquisadora. Data: 07/04/2018
................................................................................................................... 130
Imagem 41 – Fábio José do Espírito Santo Souza ouvindo as perguntas dos estudantes
sobre a origem das Cantigas de dor do Marabaixo. Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Arquivo pessoal da pesquisadora.
Data: 07/04/2018 ....................................................................................... 131
Imagem 42 – Fábio José do Espírito Santo Souza falando sobre a origem do Marabaixo.
Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora. 07/04/2018 ............................................ 131
Imagem 43 – Fábio José do Espírito Santo Souza mostrando para os estudantes o toque
tradicional das Caixas de Marabaixo. Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
07/04/2018 ................................................................................................. 133
Imagem 44 – Fábio José do Espírito Santo Souza ensinado as alunas, com auxílio da
pesquisadora, a simbologia da dança do Marabaixo. Escola Estadual
Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da
pesquisadora. Data: 07/04/2018................................................................. 133
Imagem 45 – Registro da atividade com Fábio José do Espírito Santo Souza, a
pesquisadora e com as professoras Patrícia e Rita, docentes que também
estavam responsáveis pela Eletiva. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da
pesquisadora. Data: 07/04/2018................................................................. 134
_____________________________________________________________________________________
Imagem 46 – Ainda na Estadual Professora Raimunda Virgolino, a pesquisadora
entregando o formulários de coleta de dados e dando orientações gerais para
a visita ao Curiaú. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora.
Data: 14/04/2017 ....................................................................................... 135
Imagem 47 – Registro da saída da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino para
a pesquisa de campo no Curiaú. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da
pesquisadora. Data: 14/04/2018................................................................. 135
Imagem 48 – A pesquisadora e os estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino, ouvindo o relato de Pedro do Rosário dos Santos sobre a origem
de palavras e expressões das Cantigas de trabalho e dor do Marabaixo. Local:
oficina de produção de Caixas de Marabaixo. Curiaú. Data: 14/04/2018. Foto:
Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora...................................... 136
Imagem 49 – Estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino e a
pesquisadora do projeto, ouvindo atentamente os relatos de Pedro Rosário dos
Santos sobre a relação das Cantigas de trabalho e dor do Marabaixo, com a
origem histórica do local. Curiaú. Data: 14/04/2018. Foto Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora ................................................................ 137
Imagem 50 – A Carioca “Em frente à matriz de Macapá, antes das competições de luta-
livre e capoeira (carioca)”. Legenda adapatada. In: PEREIRA, Nunes. O
sahiré e o Marabaixo: Tradições da Amazônia. Contribuição ao Primeiro
Encontro Brasileiro de Folclore. Rio de Janeiro: Gráfica Ouvidor, 1951. p.
43. .............................................................................................................. 138
Imagem 51 – Oficina de produção de Caixas de Marabaixo de Pedro do Rosário dos
Santos. Curiaú. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
14/04/2018 ................................................................................................. 140
Imagem 52 – Cotidiano no Curiaú. Fonte: Pesquisa de campo, 2013 (Unifap). Disponível
em http://comunidades.lides.unifap.br/condicoes_vida/curiau.html. ........ 144
Imagem 53 – Estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino juntamente
coma pesquisadora, ouvindo Pedro do Rosário dos Santo cantar alguns
trechos das Cantigas de trabalho, Cantigas de dor do Marabaixo. Local:
Curiaú. Oficina de produção de Caixas de Marabaixo. Data: 14/04/2018.
Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora ............................ 147
Imagem 54 – Fragmento 1: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018
.................................................................................................................. .148
Imagem 55 – Fragmento 2: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018
.................................................................................................................. .148
Imagem 56 – Fragmento 3: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Dia 14/04/2018
............................................................................................................... ....150
Imagem 57 – Fragmento 4: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018
.................................................................................................................. .150

_____________________________________________________________________________________
Imagem 58 – Fragmento 5: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018
.................................................................................................................. .151
Imagem 59 – Fragmento 6: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018.
................................................................................................................... 152
Imagem 60 – Associação Cultural berço das Tradições Amapaenses, mais conhecida
como barracão da Tia Gertrudes, bairro Central, Macapá (AP). Na foto
pesquisadora explicando sobre a história de vida de Gertrudes Saturnino, uma
das primeiras moradoras na década de1940, do atual bairro Central. Foto:
Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora. ....... 155
Imagem 61 – Na sequência visita a Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro
Central, Macapá (AP). O Barracão onde se dança o Marabaixo é montado
todos os anos apenas uma semana antes da Páscoa, período em que antecede
a festividade do Marabaixo. São adaptações na residência onde as edificações
recebem uma estrutura aberta na frente e atrás. Foto Jocimar Paixão. Data
18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora. ........................................... 156
Imagem 62 – Registro mostrando como fica a Associação Cultural Raízes da Favela
durante as festividades do Ciclo do Marabaixo. Macapá/AP. Foto: Aydano
Ferreira. Data: 05/05/2017. Acervo pessoal da pesquisadora.................... 157
Imagem 63 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão. Situado na avenida José
Tupinambá de Almeida, nº1160, bairro Laguinho, Macapá (AP). Na ocasião
explicação da pesquisadora sobre a trajetória de vida de Raimundo Lino
Ramos, o mestre Pavão, considerado um dos mais importantes precursores do
Marabaixo do Amapá. Foto: Jocimar Paixão. Data: 18/04/2017. Acervo
pessoal da pesquisadora. ............................................................................ 159
Imagem 64 – Acima, registro da visita a Associação Cultural Raimundo Ladislau, Rua
Eliezer Levy, nº 632, bairro do Laguinho, Macapá (AP). Foto: Jocimar
Paixão. Data 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora. ..................... 160
Imagem 65 – Registro que mostra a Associação Cultural Raimundo Ladislau durante as
festividades do Marabaixo. Neste período o festeiro responsável pela
coordenação do evento, juntamente com sua equipe de trabalho, prepara a
parte externa da residência enfeites de papel colorido nas cores azul, vermelho
e branco, cores quer representam o Divino Espírito Santo e a Santíssima
Trindade. Associação Cultural Raimundo Ladislau, Macapá/AP. Foto:
Aydano Ferreira. Data 05/05/2017. Acervo pessoal da pesquisadora ....... 160
Imagem 66 – Poço do Mato, bairro do Laguinho. Macapá (AP). Este Local era utilizado
pelos primeiros moradores na década de 1940, para coletar água potável. Ente
os primeiros habitantes temos famílias negras que viviam na Vila de Santa
Engrácia, próximo a Igreja da Matriz, no centro da cidade que foram
deslocadas para o bairro do Laguinho que na época, não possuía infraestrutura
para recebê-los. Foto: Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da
pesquisadora. ............................................................................................. 161
Imagem 67 – Registro fotográfico dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino na avenida Padre Manoel da Nobrega, em frente ao Poço
do Mato. Acima desenho retratando a da antiga igreja da Matriz. Abaixo
_____________________________________________________________________________________
pintura da Fortaleza de São José de Macapá. Av. Padre Manoel da Nóbrega,
bairro do Laguinho Macapá (AP). Entre as Ruas General Rondon e São José,
atrás do terreno da CAESA (Companhia de Água e Esgoto do Amapá). Foto:
Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora. ....... 162
Imagem 68 – Av. Padre Manoel da Nóbrega, bairro do Laguinho, Macapá (AP) entre as
Ruas General Rondon e São José, atrás do terreno da CAESA (Companhia de
Água e Esgoto do Amapá). Foto: Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo
pessoal da pesquisadora. ............................................................................ 163
Imagem 69 – Fragmento 7: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o bairro Santa Rita e Central (antiga Favela).
Visita de campo. Dia 18/04/2018 .............................................................. 163
Imagem 70 – Fragmento 8: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre os bairros Santa Rita e Central (antiga Favela).
Visita de campo. Dia 18/04/2018 .............................................................. 164
Imagem 71 – Fragmento 9: Registros dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino, sobre o bairros do Laguinho, Santa Rita e Central
(antiga Favela). Visita de campo. Dia 18/04/2018 .................................... 164
Imagem 72 – Acesso principal para a visitação - Fortaleza de São José de Macapá. Foto:
Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018. ....... 165
Imagem 73 – Registro da entrada dos alunos com a pesquisadora na Fortaleza de São José
de Macapá. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
18/04/2018 ................................................................................................. 166
Imagem 74 – Pesquisadora utilizando a maquete da Fortaleza de São José de Macapá,
localizada na entrada principal do monumento, para contextualizar
historicamente a diáspora africana para o Amapá no século XVIII e a chegada
do negro para trabalhar como mão de obra cativa na construção do Forte.
Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018
................................................................................................................... 166
Imagem 75 – Segunda maquete da Fortaleza de São José de Macapá localizada na entrada
principal do monumento. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da
pesquisadora. Data: 18/04/2018................................................................. 167
Imagem 76 – Fosso (esgotadouro) de águas pluviais localizada no centro da praça
rebaixada da Fortaleza de São José de Macapá. Foto: Jocimar Paixão. Acervo
pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018 ............................................... 167
Imagem 77 – Registro fotográfico no terrapleno de acesso aos baluartes Fortaleza de São
José de Macapá. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
18/04/2018. ................................................................................................ 168
Imagem 78 – Fragmento 10: Atividade sobre a importância da Fortaleza e a relação da
mesma com o Marabaixo. Estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino. Visita de campo. Data: 18/04/2018 ........................ 168
Imagem 79 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo em Mazagão Velho. Alunos
da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino aguardando o momento
de coletar o relato de Jozué da Conceição Videira. Data 18/04/2018 ....... 171
Imagem 80 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão
Velho. Alunos da E.E. Raimundo Virgolino ouvindo atentamente Jozué da

_____________________________________________________________________________________
Conceição Videira, falando sobre o significado das Cantigas religiosas do
Marabaixo. Data: 18/04/2018 .................................................................... 171
Imagem 81 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão
Velho. Na imagem à esquerda, CDs com Cantigas religiosas do Marabaixo.
Nos encartes identificamos um panteão de Santos católicos com destaque para
Nossa Senhora da Piedade. À direita, banner em homenagem a Nossa Senhora
da Piedade. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
18/04/2011 ................................................................................................. 172
Imagem 82 – Jozué da Conceição Videira, e seus filhos, na sede do Grupo Folclórico
Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão. Foto: Jocimar Paixão. Acervo
pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018 ............................................... 173
Imagem 83 – Artefatos e indumentárias utilizadas nas festas do Divino e de São Thiago.
Grande parte das Canções religiosas do Marabaixo em Mazagão Velho ser
reportam a ocupação histórica do lugar e a devoção a São Thiago, padroeiro
do Município. Foto Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data
18/04/2018 ................................................................................................. 173
Imagem 84 – Alunos da Estadual Professora Raimunda Virgolino, Macapá (AP)
escolhendo indumentárias do Marabaixo de rua, em Mazagão Velho. Sede
do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Foto: Jocimar Paixão. Data:
18/04/2018 ................................................................................................. 176
Imagem 85 – Alunos da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, Macapá (AP)
aprendendo como se dança o Marabaixo de rua, em Mazagão Velho. Sede do
Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Foto: Jocimar Paixão. Data:
18/04/2018 ................................................................................................. 176
Imagem 86 – Captura do vídeo “Rancho Folclórico Portugal Canta e Danca-Tirana”.
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=tVOZ0R8ca_s. Acessado
em 04/06/2018. .......................................................................................... 177
Imagem 87 – Alunos da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino na parte externa
da Igreja de Nossa Senhora da Assunção em Mazagão Velho. A igreja de
Nossa Senhora da assunção possui Forte representatividade nos rituais
litúrgicos e nas Cantigas de resistência religiosa do Marabaixo. Durante as
festas do Divino são rezadas missas e ladainhas no local, este também é um
dos principais trajetos por onde passa o Marabaixo de rua. Foto: Jocimar
Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 18/04/2018 ...................... 178
Imagem 88 – Parada para registro fotográfico na igreja de Nossa Senhora de Assunção
em Mazagão Velho ................................................................................... 179
Imagem 89 – Pesquisadora explicando a importância histórica das ruínas da antiga Igreja
da Matriz. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data:
18/04/2018 ................................................................................................. 179
Imagem 90 – Dia 1. Alunos pesquisando verbetes e expressões das Canções de
Marabaixo, em fontes secundárias. Laboratório de Informática da Escola
Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Joaciany do Carmo
Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 23/04/2018
................................................................................................................... 181
Imagem 91 – Dia 2. Alunos pesquisando verbetes e expressões das Canções do
Marabaixo, em fontes secundárias. Laboratório de informática da Escola
_____________________________________________________________________________________
Estadual Professora Raimunda Virgolino.. Foto: Joaciany do Carmo
Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 24/04/2018
................................................................................................................... 181
Imagem 92 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino. Alunos fazendo aprofundamento da pesquisa dos verbetes e
expressões das Cantigas de Marabaixo. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento
da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 24/04/201 .................... 183
Imagem 93 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino. Alunos sendo orientados a fazer reflexões e analises da pesquisa
dos verbetes e expressões das Canções do Marabaixo. Foto: Joaciany do
Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data
23/04/2018 ................................................................................................. 184
Imagem 94 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino. Alunos sendo orientados a fazer reflexões e analises da pesquisa
dos verbetes e expressões das Canções do Marabaixo. Foto: Joaciany do
Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data
24/04/2018 ................................................................................................. 185
Imagem 95 – Biblioteca da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Alunos
preenchendo a atividade de avaliação das competências cognitivas da teoria
ontogenética da consciência histórica. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento
da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 26/04/2018................. 186
Imagem 96 – Fragmento 11: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino sobre o legado e importância das Cantigas de
Marabaixo. Data: 24/04/2018 .................................................................... 187
Imagem 97 – Fragmento 12: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino sobre a relevância das Cantigas de Marabaixo para a
História local. Data: 24/04/2018 ............................................................... 187
Imagem 98 – Fragmento 13: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora
Raimunda Virgolino sobre a relevância das Cantigas de Marabaixo para a
História local. Data 24/04/2018 ................................................................. 188
Imagem 99 – Registro das ilustrações produzidas pelos estudantes. Biblioteca da Escola
Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Joaciany do Carmo
Nascimento da Paixão. Data: 26/04/2018 .................................................. 188
Imagem 100 – Oficina para a produção das ilustrações de palavras e expressões das
Canções do Marabaixo Biblioteca da Escola Estadual Professora Raimunda
Virgolino. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal
da pesquisadora. Data: 27/04/2018 ............................................................ 189
Imagem 101 – Palestra das alunas Iranilce e Vitória Taynara (Turmas 211 e 213)
apresentando os resultados da pesquisa realizada nos locais de incidência da
manifestação do Marabaixo de Macapá e de Mazagão Velho. Culminância
das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data 7/06/2018. Local: Escola Estadual
professora Raimunda Virgolino. Macapá (AP) ......................................... 190
Imagem 102 – Estudantes da Escola Estadual Raimunda ouvindo a palestra das
estudantes. Culminância das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data:
27/06/2018 ................................................................................................. 190

_____________________________________________________________________________________
Imagem 103 – Exposição de mural com algumas fotografias tiradas pelos estudantes
durante a realização das oficinas nos redutos de incidência da manifestação
do Marabaixo de Macapá e de Mazagão Velho. Exposição Cultural das
Eletivas. Culminância das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018
................................................................................................................... 191
Imagem 104 – Exposição de desenhos e de frases de repúdio contra todas as formas de
preconceito veladas ao negro e ao Marabaixo. A atividade retrata bem qual o
posicionamento dos jovens estudantes da Educação Básica e o que eles
pensam a respeito do tema. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018 ..... 191
Imagem 105 – Caricatura da aluna Laura (212) desenhada por Kamila Ferreira (213).
Afirmação da identidade e a beleza da cultura negra revelam a consciência
história da jovem estudante que ilustrou o desenho. Foto: Patrícia Oliveira.
Data: 27/06/2018 ....................................................................................... 191

_____________________________________________________________________________________
LISTA DE MAPAS

Mapa 1 – Localização das Associações de Marabaixo de Macapá ................................ 60


Mapa 2 – Delimitação do núcleo urbano da cidade de Macapá na década de 1940,
conforme relatos coletados em pesquisa e mapa georretificado da Planta da
Vila de São José de Macapá (1761) ............................................................. 158

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Temática sugeridas pelos estudantes. ........................................................ 121

_____________________________________________________________________________________
LISTA DE SIGLAS

APA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL


IBGE INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
IPHAN INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIO-
NAL
LDBEN LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL
PCNs PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS
PIME PONTIFÍCIO INSTITUTO DAS MISSÕES ESTRANGEIRAS
SEAFRO SECRETARIA EXTRAORDINÁRIA DE POLÍTICAS PARA OS PO-
VOS AFRODESCENDENTES

_____________________________________________________________________________________
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 23
SEÇÃO 1 – OS MARABAIXOS EM MACAPÁ (AP) .............................................. 28
1.1. BEBIDAS E COMIDAS TRADICIONAIS DO MARABAIXO .................... 29
1.1.1. GENGIBIRRA ................................................................................................. 29
1.1.2. COZIDÃO ........................................................................................................ 31
1.1.3. A DANÇA DO MARABAIXO: SIMBOLOGIA ............................................ 32
1.1.4. AS DANÇADEIRAS DE MARABAIXO ....................................................... 33
1.1.5. MATRIARCAS ................................................................................................ 36
1.1.6. CANTADEIRA(S)/CANTADORE(S) DE MARABAIXO ............................ 38
1.1.7. TOCADORES .................................................................................................. 39
1.1.8. CAIXA DE MARABAIXO ............................................................................. 44
1.2. MARABAIXO: ARTEFATOS E RITUAIS .................................................... 46
1.2.1. CORTAÇÃO DO MASTRO............................................................................ 47
1.2.2. DOMINGO DO MASTRO .............................................................................. 48
1.2.3. A QUEBRA DA MURTA ............................................................................... 49
1.2.4. CORTEJO DA MURTA .................................................................................. 50
1.2.5. CONSAGRAÇÃO DA MURTA ..................................................................... 51
1.2.6. BANDEIRAS ................................................................................................... 53
1.2.7. COROAS .......................................................................................................... 54
1.2.8. NOVENAS E LADAINHAS ........................................................................... 55
1.2.9. LEVANTAÇÃO DO MASTRO ...................................................................... 57
1.2.10. DOMINGO DO SENHOR ............................................................................... 58
1.3. MARABAIXO EM MACAPÁ: LOCAIS DE INCIDÊNCIA ......................... 60
1.3.1. ASSOCIAÇÃO CULTURAL RAIMUNDO LADISLAU .............................. 61
1.3.2. ASSOCIAÇÃO FOLCLÓRICA MARABAIXO DO PAVÃO ....................... 62
1.3.3. ASSOCIAÇÃO CULTURAL BERÇO DAS TRADIÇÕES AMAPAENSES
........................................................................................................................ ..63
1.3.4. ASSOCIAÇÃO ZECA E BIBI COSTA .......................................................... 64
1.3.5. ASSOCIAÇÃO CULTURAL RAÍZES DA FAVELA.................................... 65
1.4. 1.4 BREVE HISTÓRICO DO MARABAIXO ................................................ 66
1.4.1. A CHEGADA DO AFRICANO AO AMAPÁ COMO MÃO DE OBRA
ESCRAVA ....................................................................................................... 66
_____________________________________________________________________________________
1.4.2. A CHEGADA DO AFRICANO AO CURIAÚ ............................................... 67
1.4.3. A CHEGADA DO AFRICANO EM MAZAGÃO VELHO ........................... 70
1.5. OS LADRÕES DE MARABAIXO ................................................................. 75
SEÇÃO 2 – OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS DOS
AFRODESCENDENTES NO AMAPÁ ...................................................................... 79
2.1. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE LIBERTAÇÃO .......... 81
2.2. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE TRABALHO E
CANTIGAS DE DOR ...................................................................................... 83
2.3. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE AMOR ....................... 87
2.4. A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ: SANGUE, SUOR E
MUSICALIDADE NEGRA NA SUA CONSTRUÇÃO ................................. 89
2.5. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE RESISTÊNCIA
RELIGIOSA ..................................................................................................... 92
2.6. OS LADRÕES DE MARABAIXO: A RELIGIOSIDADE DE MACAPÁ E
MAZAGÃO VELHO NA FESTA DO DIVINO ............................................. 99
2.7. AS CANTIGAS DE MARABAIXO CONTAM E CANTAM A SAGA
HISTÓRICA DE MAZAGÃO VELHO ........................................................ 101
2.8. OS LADRÕES DE AFIRMAÇÃO DA IDENTIDADE ................................ 107
2.9. OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS DOS
AFRODESCENDENTES NO AMAPÁ PARA O ENSINO DE HISTÓRIA
.........................................................................................................................114
2.9.1. MÚSICA, ENSINO E APRENDIZAGEM HISTÓRICA ............................. 114
SEÇÃO 3 – ELABORAÇÃO DO DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE
MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1...... 119
3.1. A ESCOLA ESTADUAL PROFESSORA RAIMUNDA VIRGOLINO:
LOCAL DA PESQUISA DE INTERVENÇÃO ............................................ 119
3.2. OS COMPONENTES CURRICULARES DA ESCOLA DE TEMPO
INTEGRAL: A DISCIPLINA ELETIVA ...................................................... 120
3.3. AULAS AUDIÇÕES DAS CANTIGAS DE MARABAIXO ....................... 124
3.4. O CONCEITO DE ENSINO DE HISTÓRIA INSTRUMENTALIZADO E O
RECORTE TEMPORAL E ESPACIAL........................................................ 126
3.5. A APLICAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA E COLETA DE DADOS
128
3.5.1. 1ª OFICINA: CURIAÚ UMA INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS HISTÓRICOS
DOS LADRÕES DE MARABAIXO............................................................. 128
3.5.1.1. 1ª ETAPA – PALESTRA SOBRE A ORIGEM HISTÓRICA DO
MARABAIXO. COLABORADOR: FÁBIO JOSÉ DO ESPÍRITO SANTO
SOUZA ........................................................................................................... 129
_______________________________________________
Página 22 de 235
3.5.1.2. 2ª ETAPA – VISITA AO CURIAÚ: A OFICINA DE CAIXAS DE
MARABAIXO DO MESTRE PEDRO DO ROSÁRIO DOS SANTOS ....... 135
3.5.1.3. A OFICINA .................................................................................................... 136
3.5.2. 2ª OFICINA: VISITA AOS LOCAIS DE INCIDÊNCIA DO MARABAIXO DE
MACAPÁ (AP): A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ, OS
BAIRROS DO LAGUINHO E CENTRAL ................................................... 153
3.5.2.1. VISITA AO SÍTIO TRADICIONAL DO MARABAIXO DA FAVELA:
BAIRRO CENTRAL ..................................................................................... 155
3.5.2.2. VISITA AO SÍTIO TRADICIONAL DO MARABAIXO DO LAGUINHO 157
3.5.2.3. VISITA A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ (AP) .................... 164
3.5.3. 3ª OFICINA: MAZAGÃO VELHO – VISITANDO NOSSAS RAÍZES ..... 168
3.6. 4ª OFICINA: ELABORAÇÃO DO DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES
DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL.
1 ...................................................................................................................... 179
3.6.1. 1ª ETAPA: LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA EDUCACIONAL (LIED)
........................................................................................................................ 181
3.6.2. 2ª ETAPA: ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS LABORATÓRIO DE
INFORMÁTICA EDUCACIONAL (LIED).................................................. 183
3.6.3. 3ª ETAPA: BIBLIOTECA DA ESCOLA ESTADUAL PROFESSORA
RAIMUNDA VIRGOLINO ........................................................................... 185
3.6.4. 4ª ETAPA: CULMINÂNCIA DAS ELETIVAS DA ESCOLA ESTADUAL
PROFESSORA RAIMUNDA VIRGOLINO (27/06/2018)........................... 190
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 192
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 194
ANEXO A: PARECER CONSUBSTANCIADO – CEP ........................................ 201
ANEXO B: LISTA DE VERBETES E EXPRESSÕES DO MARABAIXO
PESQUISADAS .......................................................................................................... 206
ANEXO C: ATIVIDADE DE AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIAS COGNITIVAS
DA TEORIA ONTOGENÉTICA DA CONSCIÊNCIA HISTÓRICA ................. 207
ANEXO D: TRANSCRIÇÃO DE LADRÕES DE MARABAIXO ........................ 211
ANEXO E: ILUSTRAÇÕES – RAQUEL SOARES E CAMILA FERREIRA
(TURMA 213) ............................................................................................................. 222
ANEXO F: ILUSTRAÇÕES – RAILA RAYKA (TURMA 211) ........................... 233

_______________________________________________
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INTRODUÇÃO

Como amazônida e afrodescendente, sinto-me no dever de dar minha contri-


buição educacional no que tange ao legado das Cantigas de Marabaixo as quais são inti-
tuladas de Ladrões . As Cantigas de Marabaixo, são Cantigas compostas em formas de
versos, formadas por quadras poéticas e seguidas de refrãos que acompanham toda a fes-
tividade. São Cantigas que possuem grande relevância no âmbito da Pesquisa Histórica
uma vez que integram belos relatos que contribuem para a constituição da História do
Marabaixo e do Povo do Amapá.

Em Macapá (AP), essas cantigas são executadas durante a dança do Mara-


baixo e são cantadas durante as festividades em devoção ao Divino Espírito Santo e a
Santíssima Trindade. Essa festividade está vinculada ao calendário oficial de datas reli-
giosas de cunho cristão, e tem início no sábado de aleluia e término no primeiro domingo
após Corpus Christi e recebe o nome de Ciclo do Marabaixo. O Ciclo do Marabaixo
acontece na capital nos sítios tradicionais de incidência da festividade, especialmente nos
bairros Central e Laguinho. Fora da capital Macapá, a festividade segue um calendário
mais flexível em louvor a diversos Santos católicos comemorado em diferentes datas no
decorrer do ano. Em 2013, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –
IPHAN, realizou no Estado do Amapá, a catalogação das comunidades praticantes do
Marabaixo sendo que os Municípios de Macapá e Mazagão receberam maior destaque na
pesquisa devido ser o local que os primeiros praticantes do Marabaixo chegaram ao
Amapá, no século XVIII.

Em Mazagão Velho, a genealogia da festa do Divino, segundo Katy Motinha,


remonta às origens históricas de povoamento da Vila nos setecentos quanto ela foi habi-
tada por colonos oriundos de uma cidade evacuada no Marrocos, na África, então subor-
dinada ao império português. As constantes resistências dos povos africanos que circun-
cidavam Mazagão marroquina, bem como, as investidas do sultão Mohamed Bem Adbal-
lah, forçaram a retirada de famílias portuguesas do Marrocos. Com a ocupação de Maza-
gão Velho, vieram também colonos portugueses provenientes das ilhas de Açores na

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África. Foram eles, que segundo Katy Montinha1 trouxeram para Mazagão Velho as prá-
ticas dos festejos ao Divino. Práticas religiosas que os negros absorveram do cristia-
nismo, mas que se constituíram em uma forma singular dos negros se expressarem através
do afrocatolicismo. Juntamente com as danças vieram também as Cantigas que hoje são
conhecidas pelo nome de Ladrões de Marabaixo.

As Cantigas de Marabaixo vem atravessando gerações e servem como um


grande catalizador de memórias e de símbolo de afirmação da identidade negra. A orali-
dade das Cantigas descreve, além de acontecimentos históricos, a história do negro na
própria manifestação, metamorfoseando em formas de versos, a vida cotidiana e também,
pondo em cena a constituição de sentido histórico, sobre o processo de ocupação negra
no Amapá, no século XVIII. Assim, as histórias que muitas vezes não são contadas pelo
Currículo Oficial e em grande parte dos casos, não estão nos livros didáticos, ganham
nessas Cantigas um modo de registro próprio. É um legado que ainda possui escassa pro-
dução voltada ao Ensino de História, e por isso precisam ser incorporados enquanto ma-
terial didático.

Na história ensinada e que se faz presente no “currículo manifesto”2, as Can-


tigas africanas são invisíveis antes, durante e depois da abolição da escravatura no Brasil.
Após a abolição da escravatura, se havia qualquer possibilidade dessas Cantigas se torna-
rem visíveis, isso foi eliminado com a invisibilidade dos quilombos dentro da historio-
grafia didática. Ficando assim, uma grande lacuna sobre a contribuição cultural do negro,
sobretudo dessas Cantigas para a formação histórica do país. Passados 130 anos do tér-
mino da escravidão3, os afrodescendentes ainda reivindicam medidas compensatórias na
área educacional, sobretudo no que tange a contribuição dessas Cantigas para o currículo.

Embora o Marabaixo tenha se tornado uma política pública cultural de pro-


moção da identidade social do Estado do Amapá, através da Lei Estadual nº 0845/20044,

1 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na Vila
Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo, São Paulo,
p.7
2 CUNHA Jr., Henrique. Africanidade, Afrodescendência e Educação. Educação em Debate, Fortaleza,
Ano 23, v. 2, n° 42, 2001.
3 PAIVA, Eduardo França. Trabalho compulsório e escravidão: usos e definições nas diferentes épocas.
São Paulo: Loyola, 2011.
4 Lei que cria e insere no calendário cultural o Ciclo do Marabaixo e Batuque no âmbito do Estado do
Amapá. Disponível em http://www.al.ap.gov.br/ver_texto_lei.php?iddocumento=19732. Veja tam-
bém: Lei Nº 0845, de 13 de julho de 2004, que considera bem histórico e cultural do Estado do Amapá,
para fins de tombamento de natureza imaterial, a manifestação folclórica do Marabaixo. Disponível
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dentro do currículo escolar, as Cantigas ainda são pouco conhecidas. Assim, a proposta
deste estudo é a de dar voz a sujeitos históricos ainda invisíveis no currículo, apresentando
como estratégia viável a revisão da predominância da narrativa europeia, no que tange ao
processo de ocupação e povoamento do Amapá, pelos povos africanos no século XVIII.

Neste sentido, o estudo das Cantigas de Marabaixo potencializa um diálogo


propositivo da música no Ensino de História já que esses registros corroboram não apenas
como forma de ampliar e diversificar o repertório musical dos estudantes da Educação
Básica, mas sobretudo para a produção de material didático. Isso porque a inserção dessas
Cantigas provenientes de uma manifestação da cultura oral, atestam a herança musical
negra, que participa como matriz formadora do Estado do Amapá, daí a importância de
seu legado.

Acredita-se que o estudo da tipologia da oralidade dessas Cantigas, contribui


no âmbito do Ensino de História, para o desenvolvimento da prática da pesquisa5 histó-
rica. Essa proposta apoia-se numa concepção de Ensino Aprendizagem da história que
tem como objetivo central a formação da Consciência Histórica do aluno, a partir do en-
trelaçamento com diferentes saberes que dialogam no interior do processo educativo (ci-
entíficos, históricos, escolares e sociais). Desta forma, todos esses saberes em ação pro-
duzirão o Saber histórico Escolar acerca da escravidão africana6 no Amapá no século
XVIII, a partir do significado de palavras e expressões contidas nas Cantigas de Mara-
baixo.

O interesse pelo estudo das Cantigas de Marabaixo partiu de minha experiên-


cia docente na Educação Básica, e surgiu de uma necessidade já observada e vivenciada
no âmbito do Ensino de História a qual diz respeito a essa escassez de produções didáticas
relacionando essas Cantigas com a escravidão africana no Amapá no século XVIII bem
como, da fragmentação de informações em livros físicos e online sobre o tema proposto.
São inquietudes que surgiram entre os anos de 2008 a 2013, época que me senti desafiada

em http://www.al.ap.gov.br/ver_texto_lei.php?iddocumento=24821. Lei n. 1.521, de 29 de novembro


de 2010, que declara o dia 16 de junho, Dia Estadual do Marabaixo Amapaense, como data comemo-
rativa no âmbito do Estado do Amapá. Disponível em http://www.al.ap.gov.br/ver_texto_lei.php?id-
documento=27969.
5 FONSECA, Selva Guimarães. Didática e Prática de Ensino de História: Experiências, Reflexões e
Aprendizados. (Coleção magistério: formação e trabalho pedagógico). Campinas, São Paulo: Ed. Pa-
piros, 2003. p. 171-174.
6 GOMES, Flavio dos Santos. Quilombos e Mocambos no Brasil (Sécs. XVII-XIX). 1997 (Tese de
Doutorado). Campinas: Universidade de Campinas, 1997.
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em inserir o estudo das Cantigas de Marabaixo nas séries finais do Ensino Fundamental,
na Escola Estadual Professora Aracy Miranda de Mont’Alverne.

A escola em questão passou a ser uma referência dentro desta temática e veio
ao longo dos anos acumulando know-how, o que lhe rendeu no ano 2013, o 1º lugar Na-
cional no Prêmio de Gestão escolar e 2º e 1ª Lugar nos anos de 2012 e 2013, respectiva-
mente, no prêmio “SEAFRO DE IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA É COISA SÉ-
RIA”, promovido pela Secretaria de Estado e Políticas públicas para afrodescendentes
(AP), premiações em que representei a escola, com ações educacionais afirmativas de
minha autoria. Premiações estas recebidas através do incentivo da inserção do Marabaixo
no âmbito do Espaço Escolar.

Neste sentido, esta pesquisa representa a continuidade dos estudos que venho
desenvolvendo no exercício da docência, ao longo desses anos. Isto posto, o objetivo
central foi uma interlocução da música no Ensino de História utilizando como aporte teó-
rico a tipologia das Cantigas afrodescendentes7 (neste caso, as Cantigas de Marabaixo
conhecidas como músicas tradicionais) e a teoria ontogenética da Consciência Histórica8.
A intenção foi desenvolver mudanças estruturais nos níveis de Consciência Histórica com
proposito de orientação temporal e para a vida prática9 de jovens estudantes do Ensino
Médio da cidade de Macapá (AP) trazendo, através das Cantigas de Marabaixo, a consti-
tuição de sentido histórico acerca da escravidão africana no Amapá, no século XVIII.

Feita as devidas ressalvas acerca do percurso de construção de nosso objeto


de pesquisa, passamos a apresentar a estrutura da dissertação.

Considerando que as Cantigas de Marabaixo estão intimamente conectadas à


resistência a escravidão africana no Amapá, no século XVIII, e também ao cotidiano do
povo negro local, perscrutamos a trajetória histórica da Manifestação dedicando o Seção
1 ao estudo detalhado, analítico e descritivo da festividade, seus rituais, suportes materi-
ais, os locais de incidência do Marabaixo de Macapá e as singularidades do Marabaixo
de Mazagão Velho.

7 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, p. 181. 2015)
8 RÜSEN, J. A razão histórica: teoria da história; fundamentos da ciência histórica. Brasília, DF: UNB,
2001. p. 57.
9 Ibid., p. 57.
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No Seção 2, apresentamos o percurso teórico da pesquisa a partir da análise
das Cantigas de Marabaixo que afirmam a identidade negra e da classificação tipológica
das Canções afrodescendentes, os quais foram devidamente contextualizados com o ca-
tiveiro africano para Macapá e Mazagão Velho, no século XVIII. Na segunda parte do
capítulo, nos dedicamos em situar teoricamente os aspectos metodológicos e conceituais
da música no Ensino de História, trazendo através das Cantigas de Marabaixo, a consti-
tuição de sentido histórico, através de palavras e expressões presentes nas Cantigas, ori-
entação temporal e para a vida prática dos estudantes.

A construção metodológica desta dissertação é apresentada na Seção 3: Ela-


boração do DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MARABAIXO. MATERIAL
DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1, apresentamos um diálogo propositivo da
música no Ensino de História a partir da aplicação de quatro oficinas sendo que três delas,
foram realizadas com estudantes da Educação Básica, nos sítios tradicionais de incidência
da manifestação do Marabaixo de Macapá e de Mazagão Velho. As informações levan-
tadas nos locais pesquisados durante o processo de construção da dissertação, bem como
o entrelaçamento de diálogos possíveis entre a tipologia dessas Cantigas, as aprendiza-
gens Históricas neles contidas através da interlocução com diferentes saberes, resultaram
na construção do material didático: DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MA-
RABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1.

Por fim, apresentamos nossas conclusões e a bibliografia das obras consulta-


das e citadas ao longo desta dissertação. Constam ainda, no anexo deste trabalho: parecer
consubstanciado do Conselho de Ética em Pesquisa/UNIFAP, autorização TCLE/TALE
assinadas pelos colaboradores da pesquisa, as transcrições das Cantigas de Marabaixo
pesquisadas, os formulários de verbetes, o formulário de avaliação realizado com os es-
tudantes acerca das competências cognitivas da teoria ontogenéticas da Consciência His-
tórica, e as ilustrações produzidas pelos estudantes nos sítios tradicionais de incidência
da manifestação do Marabaixo de Macapá e em Mazagão Velho e uma cópia em CD onde
consta em E-book o produto final, intitulado: DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES
DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1

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SEÇÃO 1 – OS MARABAIXOS EM MACAPÁ (AP)

O Marabaixo10 é uma manifestação cultural do Estado do Amapá que con-


grega dança, música e canto e está vinculada ao calendário oficial de datas religiosas de
cunho cristão, mas que envolve em sua ritualística elemento da cultura africana. Em
Macapá (AP), a festa é em honra ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade, e tem
início no Sábado de Aleluia e término no primeiro domingo após Corpus Christi. É co-
memorado todos os anos por grupos de famílias tradicionais dos bairros do Laguinho,
Central e Santa Rita. Por muito tempo a festividade foi realizada apenas pelas famílias
tradicionais da ancestralidade do Marabaixo, mas hoje, ela se tornou, uma política pública
cultural de promoção da identidade social do Estado do Amapá através da Lei Estadual
nº 0845/2004 que instituiu, o Ciclo do Marabaixo, nome dado ao evento em que os diver-
sos grupos da cidade de Macapá (AP), de diversas Associações, durante dois meses,
realizam simultaneamente a festividade, conforme calendário litúrgico da Páscoa a Cor-
pus Christi.

No Ciclo do Marabaixo de Macapá (AP) a festividade é realizada em diferen-


tes Associações ou na casa do festeiro11 e inclui na programação rodas de Marabaixo
missas, novenas, ladainhas, “cortejo afrodescendente”, preparação e degustação da tradi-
cional gengibirra12 e do caldo13 (cozidão de carne e legumes).

10 Cf. em PEREIRA, Nunes. O sahiré e o Marabaixo: Tradições da Amazônia. Contribuição ao Primeiro


Encontro Brasileiro de Folclore. Rio de Janeiro: Gráfica Ouvidor, 1951.
11 Festeiro é membro pertencente da comunidade do Marabaixo eleito anualmente pelos seus pares. O
mesmo tem a obrigação de prover toda a matéria-prima e ferramentas necessárias para a execução da
festa. Na capital Macapá (AP), o festeiro conta também com doações da comunidade e verbas públi-
cas.
12 Bebida caseira feita à base de gengibre, água, açúcar industrializado e cachaça. Ela é produzida geral-
mente nas sedes das Associações onde se dança o Marabaixo, na casa do festeiro ou por moradores
que detém a prática do fabrico. IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá.
(Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013, p. 52. Disponível apenas em meio digital no
formato pdf (463 p.).
13 O caldo de carne de boi, legumes e verduras é servido na festividade do Marabaixo durante os almoços
fartos e também, nas noites em que se sucedem a festividade. Ibid., p.18.
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1.1. BEBIDAS E COMIDAS TRADICIONAIS DO MARABAIXO

1.1.1. GENGIBIRRA

Bebida alcoólica de produção caseira à base da raiz do gengibre, água, açúcar


e cachaça servida durante a festividade do Marabaixo. De acordo com a velha guarda do
Marabaixo, a forma de produção da gengibirra atual convive com outras variações da
gengibirra, sem cachaça e outras vezes um fermentado do próprio gengibre. Existem di-
versos modos de fazer a gengibirra, que variam de pessoa para pessoa, e de comunidade
para comunidade, seja por mudanças na proporção e até mesmo no incremento de espe-
ciarias e outras frutas. Ela é produzida geralmente de forma doméstica, seja na sede das
Associações que promovem o Marabaixo ou na casa do festeiro ou de moradores que
detêm a prática deste fabrico. Primeiramente, é cortado o gengibre, que depois é batido
com água no liquidificador; em seguida, essa mistura é passada em uma peneira; acres-
centa-se ao líquido, açúcar e cachaça, e então a bebida é colocada para gelar.

Há relatos de pessoas que fervem o gengibre antes de utilizá-lo e outros que


acrescentam outros ingredientes, como leite condensado, especiarias, ou casca de abacaxi.
Na maioria das vezes a bebida é servida gelada e à vontade para os marabaixeiros e seus
convidados. O gengibre é uma espécie originária da China, que foi trazida pelos Portu-
gueses ao ocidente por ocasião das cruzadas e, mais tarde, para o Brasil pouco após o
“descobrimento”. Acredita-se que a raiz do gengibre protege a garganta e as cordas vo-
cais, permitindo maior longevidade à voz. A mistura do gengibre com a cachaça gera
uma bebida bastante tradicional no Marabaixo. Essa bebida (ver imagem 1) é fabricada e
consumida em larga escala, e os grupos não abrem mão de sua presença durante toda a
festividade do Marabaixo (ver imagem 2).

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Imagem 1 – Gengibirra - Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro Central, Macapá
(AP). Em 18/06/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

Imagem 2 – Marabaixeiras tomando a Gengibirra na Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro


Central, Macapá (AP). Em 18/06/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisa-
dora.

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1.1.2. COZIDÃO

Caldo de carne de boi, legumes e verduras é servido na festividade do Mara-


baixo durante os almoços fartos e também, nas noites em que acontecem o evento (ver
imagem 3). Seu preparo consiste em temperar bem a carne com vários tipos de ingredi-
entes, logo depois se adiciona legumes para que o mesmo seja derretido em fogo baixo.
Os ingredientes são colocados em um panelão. Serve-se quente acompanhado de farinha
d’água (farinha regional) e algumas vezes com arroz. Existe um grupo específico de mu-
lheres voluntárias que fazem seu preparo, elas são responsáveis por produzir o caldo nos
dias em que o Marabaixo é dançado. O cozidão de carnes e legumes tem uma importante
simbologia no Marabaixo pois, representa a hospitalidade de quem está o oferecendo.
Também é considerado um tonificante natural que serve para dar disposição para dançar
a noite toda e cortar o efeito do álcool, consumido livremente nestas ocasiões.

Imagem 3 – Caldo (cozidão) servido nas festividades do Marabaixo. Associação Folclórica Raízes da Fa-
vela, bairro Central, Macapá (AP). Em 18/06/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pes-
quisadora.

1.1.3. A DANÇA DO MARABAIXO: SIMBOLOGIA

Para quem contempla pela primeira vez a festividade tradicional do Mara-


baixo, a primeira coisa que chama muita atenção é a dança (ver imagem 4) realizada em
círculo em sentido anti- horário e que traz em sua simbologia o arrastar dos pés, o qual
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segundo relatos dos participantes mais antigos da festividade, remetem-se aos grilhões
que aprisionavam os pés dos africanos escravizados na época da escravidão. Embora,
alguns praticantes da manifestação questionem a referida afirmação.

Imagem 4 – Associação Folclórica Raízes da Favela - bairro Central, Macapá (AP)


Em 18/06/2017.Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

Em decorrência da simbologia do Marabaixo estar associada aos ecos de re-


sistência negra à escravidão e, por ser portadora de uma herança legítima africana que
participa da matriz formadora do Amapá, é que a festividade se enquadra, dentro das
categorias definidas pelo IPHAN14 para registro de bens de natureza imaterial, uma forma
de expressão sendo que constitui-se de uma dança, associada à música e ao toque das
Caixas. Contudo, tal definição proposta pelo IPHAN, é terminantemente questionada por
praticantes da manifestação, pois consideram que além da dança, existem elementos im-
bricados da cultura e da religiosidade católica. O Marabaixo é uma manifestação do Es-
tado do Amapá que acontece durante as festas em devoção aos Santos Católicos. Em
Macapá, a festa é em honra do Divino Espírito Santo e da Santíssima Trindade, e no

14 No Brasil, dentre os muitos bens de natureza imaterial categorizados pelo IPHAN podemos citar: O
Círio de Nossa Senhora de Nazaré, Samba de roda do Recôncavo Baiano, Modo de fazer viola-de-
cocho, Ofício das baianas de acarajé, Jongo no Sudeste, Feira de Caruaru, Frevo, Tambor de Crioula,
Matrizes do Samba no Rio de Janeiro como o Samba Enredo, Modo artesanal de fazer o queijo minas
e o Toque dos sinos em Minas Gerais. IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do
Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013, p. 2. Disponível apenas em meio
digital no formato pdf (463 p.).
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interior do Estado, além das mesmas devoções de Macapá, cultua-se também São José,
Sagrada Família, Santa Maria, São Sebastião, São Tomé.

1.1.4. AS DANÇADEIRAS DE MARABAIXO

São as mulheres que dançam o Marabaixo, elas estão presentes nos rituais
religiosos e na parte lúdica da festividade. Na parte lúdica que acontece nos barracões das
Associações, onde se dança o Marabaixo, a primeira coisa que chama muita atenção nas
dançadeiras15 é a sua indumentária. Grandes saias rodadas e floridas até os pés, anágua
aparecendo durante os giros, flor artificial no cabelo e blusa do mesmo tecido e/ou da
estampa da saia e/ou branca de babados ou e/da Associação a qual pertence. Usam sapato
baixo sem salto ou sapatilha e toalha pendurada no ombro entoando Ladrões e bailando
em sentido anti-horário, ao redor dos tocadores de Caixa. Em Macapá (AP), no bairro
Central (nos perímetros da antiga Favela)16, onde a manifestação é em honra a Santíssima
Trindade dos Inocentes, as dançadeiras e cantadeiras mais antigas ainda mantém o cos-
tume, nos rituais tradicionais, de usar como predominância o azul e branco em suas ves-
timentas, cor que simboliza o Santo homenageado (ver imagem 6). Já no bairro do La-
guinho, onde as comemorações são alusivas a Santíssima Trindade e ao Divino Espírito
Santo, a predominância nos rituais religiosos são das cores vermelha, azul e branca nas

15 Cf. em Formas de expressão. p. 16-21. In: IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo
do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio di-
gital no formato pdf (463 p.).
Fontes para Consulta:
 SILVA, Anna Ruth; RODRIGUES, Edileuza; NASCIMENTO, Maria Jucely. Marabaixo: a
expressão musical como processo de transformação cultural na década de 1990 na cidade de
Macapá. Trabalho de Conclusão de Curso. Especialização em Arte Educação em Instituições
Culturais. Universidade Federal do Amapá. Macapá. Acervo Unifap.
 PINHEIRO, Áurea (direção). MOURA, Cássia (direção). As Escravas da Mãe de Deus. Festa
religiosa – Folias; Nossa Senhora da Piedade; Igarapé do Lago; Mazagão; Amapá. Acervo:
Associação Amapaense de Folclore e Cultura Popular. 1 dvd vídeo (26'): formato 4:3, son.,
color, NTSC.
16 Segundo o historiador Sidney da Silva Lobato, a Favela era uma baixa alagadiça (área de ressaca). De
acordo com relatos coletados com moradores da antiga região da Favela, o local era composto de um
grande Lago que iniciava na Rua Odilardo Silva e se alongava até a Avenida Mendonça Júnior. Na
década de 1940, a Favela não possuía limites definidos sendo que se estendia para além dos atuais
limites do bairro Central. Durante a década de 1960, com a expansão urbana de Macapá e a criação de
novos bairros, alguns trechos da antiga Favela passam a pertencer ao bairro Central e outros, ao bairro
Santa Rita. Contudo, os marabaixeiros da Favela identificam hoje duas, das três Associações de Ma-
rabaixo localizadas no bairro Central, como partes integrantes dos perímetros do bairro Santa Rita.
Fonte: Josias Ferreira da Silva Filho, morador a 58 anos, do bairro Central. Maria Germina de Almeida
76 anos, moradora do bairro Central há 30 anos e praticante do Marabaixo da Favela, foi moradora
transferida da área central da cidade de Macapá para a antiga Favela. Seu Padrasto Hipólito da Silva
Gaia morava onde é hoje a residência oficial do Governador. Relatos concedidos dia 30/06/2018
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vestimentas das dançadeiras e cantadeiras mais antigas (ver imagem 5). No que diz res-
peito aos movimentos executados nas rodas de Marabaixo, as dançadeiras mais antigas
da manifestação explicam que a dança se concentram nos pés e no tronco arrastando os
pés, simulando os grilhões que acorrentavam os pés dos africanos escravizados. Hoje, o
movimento das saias rodadas, floridas traz beleza e alegria para a dança. O deslocamento
das dançadeiras nos barracões onde se dança o Marabaixo é feito para frente, para trás e
para os lados, não existem passos marcados, a liberdade desses passos e dos rodopios
predomina em cada participante. A dança é realizada no sentido anti-horário, mas não
existem regras pré-determinadas.

Imagem 5 – Dançadeira de Marabaixo. Associação Folclórica Marabaixo do Pavão onde a festividade


é em louvor ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade.
Em 16/04/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

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Imagem 6 – Dançadeira de Marabaixo. Associação Folclórica Raízes da Favela, no bairro Central. Macapá
(AP), onde a festividade é em louvor a Santíssima Trindade
Em 16/04/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

1.1.5. MATRIARCAS

As dançadeiras mais antigas da festividade são chamadas pelos marabaixeiros


de Matriarcas (ver imagem 7). As Matriarcas, conhecidas como “tias do Marabaixo”,
possuem posição de destaque dentro da festividade. Nas Associações onde se dança o
Marabaixo, elas recebem assentos exclusivos e de honra. Conforme foi observado em
pesquisa feita in loco, na abertura do Ciclo do Marabaixo em 16/04/2017, na Associação
Folclórica Raimundo Ladislau no bairro do Laguinho, existe uma grande movimentação
de pessoas que não são parentes consanguíneos das Matriarcas, mas que fazem questão
de adentrar na festividade, logo pedindo a bênção delas (ver imagem 8). Simbologia que
remete ao ato de respeito perante a posição que elas exercem no Marabaixo.

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Imagem 7 – Na festividade, as Matriarcas possuem um papel de destaque sendo reverenciadas pela comu-
nidade do Marabaixo. Em destaque a segunda da direita para a esquerda, Maria José Libório, logo depois,
Natalina Costa (falecida em 2018) e a quarta da direita para esquerda, Josefa Lina da Silva, a “tia Zefa”,
102 anos. Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses. Bairro Central, Macapá/AP. Em
4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

Imagem 8 – Bênção da matriarca Benedita Guilherma Ramos a “tia Biló”, 91 anos. Ato de respeito pe-
rante a posição que ela exerce dentro festividade. Associação Folclórica Raimundo Ladislau, no bairro do
Laguinho. Macapá/AP. Em 16/4/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

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1.1.6. CANTADEIRA(S)/CANTADORE(S) DE MARABAIXO

Os cantadores/cantadeiras são essenciais dentro da festividade do Marabaixo.


São eles que jogam os versos das músicas chamadas de Ladrões17 e aguardam resposta
dos demais (ver imagem 9). Alguns (mas) cantadores (eiras) nas rodas de Marabaixo têm
funções específicas, como por exemplo, a função de cantar o Ladrão, enquanto outros (as)
respondem repetindo o refrão, que normalmente, é a primeira ou a última estrofe de cada
verso.

Imagem 9 – Sede da Associação Cultural Raízes da Favela. Data: 18/05/2017. Foto: Aydano Fonseca.
Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

Segundo Piedade Lino Videira18, geralmente os cantadores e cantadeiras se


movimentam pelo salão em forma circular (da direita para esquerda) e em sentido anti-
horário acompanhado pelas Caixas de Marabaixo. Cada cantadeira/cantador tem uma ma-
neira única de cantar, assim o timbre e a entonação da música pode sofrer alterações con-
forme a performance musical. Os cantadores (as) têm um papel fundamental na liderança

17 Cf. em ANEXO: Bens Culturais inventariados Ladrões de Marabaixo. p. 37 de 54. In: IPHAN. Inven-
tário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.).
Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
Consultar também:
 I Festival de Ladrão de Marabaixo – DVD – Confraria Tucuju.
 CANTO, Fernando. O Marabaixo de 1898. Canto da Amazônia. 14 de julho de 2009. Dispo-
nível em: <http://fernando-Canto.blogspot.com.br/2009/07/o-Marabaixo-de-1898.html >.
Acesso: 05 de maio de 2018.
18 VIDEIRA, Piedade Lino. Marabaixo: dança afrodescendente: significando a identidade étnica do ne-
gro amapaense. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2009. 285 p.
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dos rituais que sustentam tanto a parte religiosa quanto a parte lúdica do Marabaixo já
que em ambos, o acompanhamento das Cantigas é obrigatório. Por isso eles recebem
grande destaque dentro dos grupos, em certos casos até mais do que os próprios compo-
sitores, que nem sempre cantam.

1.1.7. TOCADORES

Pessoa que toca o instrumento de percussão que acompanha as Cantigas de


Marabaixo: a Caixa de Marabaixo. No Marabaixo do Laguinho e da Favela, a exemplo
de algumas comunidades negras locais, utiliza-se no mínimo duas Caixas. Em algumas
comunidades se vê a presença de outros instrumentos de percussão sendo tocados nas
festas de Marabaixo, como a Cabaça, que é tocada na Comunidade de Campina Grande
(Curiaú).

Os tocadores utilizam duas baquetas para tocar o instrumento que fica preso
a um suporte transversal passando do ombro esquerdo, até a altura da cintura, conforme
podemos ver na imagem a seguir:

Imagem 10 – Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses. Bairro Central, Macapá/AP ao cen-
tro da roda de Marabaixo a Caixa com a imagem de Tia Gertrudes.
Em4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

A posição em que se toca o instrumento é sempre no centro da roda, ao lado


dos cantadores (as) e das dançadeiras. Estas, giram em sentido anti-horário arrastando os
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pés, simulando a partir do toque das Caixas, os pés acorrentados. Como o toque da Caixa
possui um significado ancestral no Marabaixo o tocador se faz presente em todos rituais
religiosos da manifestação. No primeiro ritual que é a Cortação do Mastro, eles:

Adentram na mata durante o corte do Mastro, circundando a árvore a


ser cortada; pelas ruas, tanto no dia do Cortejo do Mastro como no dia
do Cortejo da Murta, os tocadores acompanham o grupo; também na
igreja, durante as celebrações ao Divino Espírito Santo e a Santíssima
Trindade, o som das Caixas é ecoado, acompanhado de respeitosos La-
drões que louvam aos Santos, dão graças a Nossa Senhora, a Jesus
Cristo e a Deus.19

Nessas celebrações religiosas do Marabaixo, onde os rituais são realizados


em espaços públicos (ver imagem 11), os tocadores fazem o uso do toque dos dobrados20.

Imagem 11 – Membros da Associação Folclórica Marabaixo do Pavão entrando nas matas do Curiaú (AP)
para executar o ritual da Cortação do Mastro. Ciclo do Marabaixo de Macapá, 2017. Foto: Aydano Fon-
seca. Acervo pessoal da pesquisadora

Já nas Associações, a predominância do som emitido pela Caixa é de um to-


que mais lento e cadenciado. A maneira de tocar a Caixa também sofre variações sendo

19 Tocador de Caixa. p. 53-54. In: IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá.
(Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no for-
mato pdf (463 p.).
20 O dobrado é um ritmo de toque diferente do tradicional das Caixas de Marabaixo geralmente é execu-
tado por dois tocadores sendo que um, marca o ritmo e o segundo faz o contraponto, sincronizando a
cadência, introduzindo uma batida de improviso. Portanto, dobrar a Caixa significa introduzir uma
batida diferente, mas dentro do mesmo ritmo. Existem dois tipos de dobrados, o primeiro é executado
nos barracões das Associações onde se dança o Marabaixo, o segundo é realizado durante o Marabaixo
de rua onde neste caso, existe um toque de dobrado específico que é feito durante os rituais religiosos
da Cortação do Mastro, retirada da Murta e Levantação do Mastro.
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ditada conforme o grupo ou comunidade que o tocador se insere. No Marabaixo alguns
tocadores detêm o domínio da técnica de confeccionar as Caixas de Marabaixo. A arte de
confeccionar Caixas é um importante oficio que envolve mestres do saber com conheci-
mentos tradicionais adquiridos que vão desde a infância e são repassados geração a gera-
ção pelos seus familiares. Ensinamentos que iniciam com o aprendizado da confecção do
instrumento e vão até os conhecimentos mais aprofundados sobre seus toques e suas nu-
ances. Na história do Marabaixo de Macapá importantes tocadores e tocadoras influenci-
aram gerações como mestre Julião Ramos21 (ver imagem 12), mestre Pavão22, e as gran-
des Matriarcas do Marabaixo: Gertrudes Saturnino e Natalina Costa23, dentre outros.

Imagem 12 – Mestre Julião Ramos tocando a Caixa de Marabaixo. Fonte: Nunes Pereira, 1953, p. 41.
Acervo pessoal da pesquisadora

21 PEREIRA, Nunes. O sahiré e o Marabaixo: Tradições da Amazônia. Contribuição ao Primeiro Encon-


tro Brasileiro de Folclore. Rio de Janeiro: Gráfica Ouvidor, 1951. p. 40 e 46. Registros fotográficos
feitos por Pereira mostram mestre Julião Ramos tocando Caixas de Marabaixo.
22 Mônica do Socorro Ramos – Entrevistada em 20 de maio de 2013. Formas de expressão. p. 7 de 26.
In: IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Ma-
rabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
23 ANTERO, Alysson Brabo. Tambores no meio do mundo: expressão de um catolicismo negro no
Amapá. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Universidade do Estado do Pará. Belém,
2015. p. 60-64.
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Em 2013, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, através do
Inventário de Referências Culturais do Marabaixo do Amapá destacou a importância de
alguns tocadores mais contemporâneos , entre eles temos, Raimundo Hildemar Maia dos
Santos (H. Maia)24, Tiago da Assunção Belo dos Reis, Pedro Rosário dos Santos (Pedro
Bolão), Marcelo Cláudio de Jesus Coimbra (Marcelo Favela) e em Mazagão Velho, Jozué
da Conceição Videira, os três últimos destacam-se pela confecção do instrumento.

Imagem 13 – Pedro Bolão em sua oficina no Curiaú – Macapá/AP. Data: 06/05/2013. Foto: Pedro Gon-
tijo. IPHAN, 2013, p. 3-14.

Pedro Rosário dos Santo (ver imagem 13), é uma referência na arte de fazer
Caixas é conhecido como Pedro Bolão. Pedro mora na comunidade do Curiaú e faz parte
do Grupo Raízes do Bolão, trabalha confeccionando Caixas de Marabaixo e Batuque25, e

24 ANEXO: Bens culturais inventariados. Tocadores de Caixa. p. 51 de 54. In: IPHAN. Inventário das
referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá,
2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
25 A palavra “Batuque” se originou da expressão “Batukajé”, termo Bantu, uma referência ao bater dos
tambores em cerimoniais africanos. No Estado do Amapá, o Batuque é considerado uma das mais
importantes manifestações culturais da população afrodescendente sendo que está ligado a devoção a
Santos e Santas da religiosidade católica. O Batuque envolve rezas, cantorias e louvações como forma
de agradecimentos aos Santos padroeiros, pelas graças alcançadas. São rituais que se sucedem, por
meio de elementos religiosos cristãos e afro-indígenas. O Batuque, tal como o Marabaixo, é dançado
arrastando os pés em sentido circular, ao redor ou em frente aos músicos. É realizado em algumas
comunidades tradicionais do Estado do Amapá porém se diferencia do Marabaixo devido os versos
que são cantados, serem chamados de “Bandaias”. Outra diferença é o ritmo do Batuque ser bem mais
acelerado e os instrumentos também não são os mesmos pois, recebem, o nome de macacos. Os ma-
cacos e Caixas respectivamente, distinguem-se em tamanhos, formas e sonoridade de toque que os
identifica como amassador e dobrador (repinicador). O Batuque também conta em sua constituição
musical, com um raspador e um pau de chuva. LOBATO, Decleoma. Marabaixo, p. 20- 26. In: Tam-
bores e Batuques: Circuito 2013-2014.Projeto Sonora Brasil. Rio de Janeiro: SESC, Departamento
Nacional, 2013.
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participa de diversos projetos como oficinas de Caixas para as crianças da comunidade e
escolas da região. Além disso, é percussionista já se apresentou no Sonora Brasil projeto
desenvolvimento pelo SESC, atualmente atua nas principais festividades de Macapá,
como o Encontro dos Tambores, e das festas religiosas do Curiaú. Também podemos citar
Marcelo Cláudio de Jesus Coimbra, residente no bairro Central, que confecciona Caixas,
e é um exímio tocador e conhecedor do Marabaixo (ver imagem 14).

Imagem 14 – Marcelo Cláudio de Jesus Coimbra (Marcelo Favela), apresentando um pedaço de couro
para ser usado na Confecção das Caixas – Macapá/AP. Data: 20/05/2013. Foto: Eduardo Costa.

Em Macapá temos tocadoras como Laura Cristina da Silva (Laura do Mara-


baixo) neta de Benedita Guilherma Ramos a tia Biló e bisneta de Julião Ramos. Da nova
geração destacamos Heloisa Souza, (neta do mestre Sacaca). Porém, o Marabaixo é dan-
çado em pelos menos 75 comunidades, incluindo perímetros urbanos de Macapá e em
várias comunidades rurais fora da capital26. Por isso, acreditamos que somente um estudo
apurado e especifico em cada uma dessas localidades, tiraria do anonimato e imortalizaria
nos livros didáticos, a contribuição desses grandes mestres da arte de fazer e tocar Caixas
de Marabaixo.

26 Baseados no mapeamento das comunidades por meio do cartaz de Divulgação do Calendário Afro-
amapaense, organizado pela SEAFRO em 2015. Cf. em ANTERO, Alysson Brabo. Tambores no meio
do mundo: expressão de um catolicismo negro no Amapá. Dissertação (Mestrado em Ciências da Re-
ligião) – Universidade do Estado do Pará. Belém, 2015, p.34.
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1.1.8. CAIXA DE MARABAIXO

Imagem 15 – Caixas de Marabaixo da sede da Associação Cultural Raízes da Favela. Foto: Aydano Fon-
seca. Data: 18/05/2017 Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

A Caixa usada no Marabaixo27 (ver imagem 15) é um instrumento musical


de percussão, de formato cilíndrico, geralmente feito de madeira e couro. As Caixas são
produzidas nas próprias comunidades fora da capital e nos redutos do Marabaixo em Ma-
capá- AP (bairros Laguinho, Central e Santa Rita) e no Curiaú.

Antes das leis de proteção ambiental, a madeira usada para confeccionar as


Caixas era retirada diretamente da mata e toda a Caixa era construída com essa madeira,
geralmente a macacaúba. Atualmente, os fazedores de Caixa usam paletes de madeira que
conseguem em lojas de móveis e eletrodomésticos. Além disso, elas podem ser feitas de
zinco e de PVC. Contudo, quando são encontrados troncos caídos eles também são usa-
dos. O uso do couro, que é colocado nas extremidades, também passou por mudanças,
geralmente usa-se o couro de carneiro que é beneficiado, ou material sintético, mas ainda
podem ser encontradas Caixas com couro de cobras, como a sucuriju, e outros animais
como os bovinos.

Do lado de fora das Caixas são colocados barbantes que servem para a afina-
ção do instrumento. E na parte inferior da Caixa é colocada uma linha com miçangas. As
Caixas são penduradas nos ombros e tocadas com baquetas. Durante as festas observamos

27 ANEXO: Bens culturais inventariados. Tocadores de Caixa. p. 49 de 54. In: IPHAN. Inventário das
referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá,
2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
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dois, três e até quatro tocadores, mas esse número pode aumentar se houver amplificação
do canto com aparelhagem sonora. Entre os fazedores de Caixa, destacou-se Joaquim
Sussuarana (já falecido), que durante muitos anos foi o principal fazedor de Caixas de
Macapá e residia no bairro Laguinho.

Sem dúvida, o toque das Caixas hipnotiza o espectador que assiste pela pri-
meira, as festas tradicionais do Marabaixo. O toque das Caixas, único instrumento de
percussão que acompanha na roda de Marabaixo, as dançadeiras e cantadeiras entoando
os Ladrões, possui uma característica singular. O embalo das batidas das Caixas de Ma-
rabaixo, distingue-se do toque das marchas militares tradicionais já que segue um com-
passo harmonioso através do uso do toque de contraponto ou seja, enquanto dois tambores
seguem com batidas unívocas um terceiro entra ditando uma batida mais acelerada defi-
nindo assim, o aumento da intensidade do canto e da aceleração da roda. O toque das
Caixas remete a toda uma simbologia para a ancestralidade do Marabaixo uma vez que
segundo relatos dos tocadores mais tradicionais da festividade, suas batidas fazem refe-
rência ao som das grossas correntes que aprisionavam os pés dos africanos escravizados.

Imagem 16 – Dançadeira de Marabaixo na Associação Folclórica Marabaixo do Pavão – Macapá/AP


Em 05/05/2013. Foto: Pedro Gontijo. Fonte: IPHAN, Dossiê do Marabaixo.

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1.2. MARABAIXO: ARTEFATOS E RITUAIS

O Marabaixo também é composto de um ritual religioso complexo envol-


vendo orações, missas, ladainhas, novenas e louvações onde se faz uso de artefatos con-
siderados sagrados para os participantes da festividade. Dentre os rituais religiosos que
se sucedem na festividade do Marabaixo durante o transcorrer da Páscoa a Corpus Christi,
destacamos como vértice central, a reverencia sagrada que se dá ao Mastro. A represen-
tatividade do sagrado contida no Mastro28 está nas crenças de que este objeto é o canal de
contato com o mundo espiritual sendo que todas as etapas que envolvem seu preparado
desde a retirada da mata, seu corte, sua pintura e sua Levantação é seguido de orações e
cânticos, servindo como uma espécie29 de convite aos Santos para que venham receber a
louvação passando a ser um canal de acesso na terra ao mais alto grau da espiritualidade
cristã.

De forma esquemática os rituais sagrados que fazem parte da celebrações re-


ligiosas do Marabaixo são constituídos pelo:

Sábado do Mastro, dia em que o grupo se dirige para uma mata a fim
de cortar uma árvore de tronco fino e comprido que servirá como Mas-
tro; segue-se então o Domingo do Mastro, no qual o Mastro percorre
em cortejo as ruas dos bairros em que as festas ocorrem; a próxima data
é a Quarta-feira da Murta, quando acontece um cortejo pelas ruas dos
bairros com os ramos de Murta na mão; a seguir é o dia da Quinta-feira
da Hora, em que o Mastro é enfeitado com a Murta e levantado na frente
da casa do festeiro ou nas respectivas associações. Segundo sua devo-
ção, serão celebrados o Domingo do Divino Espírito Santo e o Domingo
da Santíssima Trindade, que ocorrem em datas diferentes e em diferen-
tes associações, distinguindo o ciclo entre as celebrações do Laguinho
e da Favela, sítios tradicionais da prática marabaixeira. Entre a levanta-
ção dos Mastros e esses domingos dedicados às invocações, em nome
das quais o Marabaixo sai, ocorrem missas, novenas, ladainhas, as duas
últimas nas associações encarregadas da celebração. Por fim, para fe-
char o ciclo ocorre a Derrubada do Mastro, que acontece no último dia
de festa, quando também é escolhido o festeiro para o próximo ano.30

28 O Mastro, conforme dados coletados para esta dissertação no Ciclo do Marabaixo em 2017, é um dos
mais importantes rituais presentes na festividade do Marabaixo. As celebrações envolvendo este
objeto são as seguintes: O Corte dos Mastros nas matas do Curiaú, o cortejo dos mastros pelas ruas do
Bairro do Laguinho, levantamento e derrubada dos mastros da Santíssima Trindade e do Divino Espí-
rito Santo.
29 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p.48
30 Ibid., 108.
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1.2.1. CORTAÇÃO DO MASTRO

A Cortação do Mastro acontece em Macapá e nas demais localidades onde se


dança o Marabaixo. O Santo homenageado, o local e o período de realização da progra-
mação são as distinções entre tais eventos de Marabaixo realizados no perímetro rural e
urbano. Em Macapá a Cortação do Mastro acontece durante o Ciclo do Marabaixo em um
sábado, 5 semanas após a Páscoa. Neste dia, os grupos de Marabaixo se dirigem em co-
mitiva separada até as matas do Curiaú. O objetivo é de cortar uma árvore de tronco fino
de aproximadamente 6cm de diâmetro de comprimento que servirá como Mastro de lou-
vação ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade (ver imagem 17). Assim, os to-
cadores entram na mata cantando Ladrões, tocando a Caixa de Marabaixo, andam em
volta da árvore escolhida até que seja cortada. São retirados dois Mastros para cada Santo,
um que será pintado com cor do Santo e outro que será ornamentado de Murta. A Cortação
do Mastro é um importante ritual anunciador do início da festa. É considerado um dos
eixos centrais devido a representatividade do sagrado contida neste objeto31. Todo o pro-
cesso que envolve o seu preparado desde a retirada da mata, sua Cortação, sua pintura e
sua Levantação são seguidos de orações e cânticos.

Imagem 17 – Cortação do Mastro. Curiaú, Macapá (AP). Marabaixeiras da Associação Folclórica Mara-
baixo do Pavão dando a primeira machadada simbólica no tronco de árvore que servirá de Mastro. Em
16/06/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

31 A Cortação do Mastro é um termo utilizado pelos marabaxeiros para designar o corte do Mastro. O
Mastro, conforme dados coletados para esta dissertação no Ciclo do Marabaixo de Macapá, no ano de
2018, é um dos artefatos sagrados mais importantes que compõe os rituais de celebração da festivi-
dade do Marabaixo. As celebrações envolvendo este objeto são quatro: A Cortação propriamente dita,
o Cortejo, sua Levantação e Derrubada.
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1.2.2. DOMINGO DO MASTRO

Em Macapá o Cortejo do Mastro acontece durante o Ciclo do Marabaixo no


dia denominado pelos marabaixeiros de Domingo do Mastro32. Um dia após o corte dos
Mastros nas matas do Curiaú, é realizado um cortejo nas ruas dos bairros onde as festas
acontecem. Esse ritual se sucede da seguinte forma: os Mastros, são retirados da casa em
que foi depositado no dia anterior pois, precisam em cortejo sair publicamente do local
onde foi guardado, até a casa do festeiro (ver imagem 18). Os marabaixeiros dos diferen-
tes grupos e das diversas Associações de Marabaixo de Macapá se organizam em comi-
tiva carregando a Bandeira da Santíssima Trindade e/ou do Divino Espírito Santo e vão
pelas ruas dos seus respectivos bairros, tocando Caixas e soltando foguetes para buscá-
los. Chegam à casa onde os Mastros foram guardados após o corte, pedem licença, tocam,
cantam e levam os Mastros nos ombros até a casa do festeiro, todos tentam tocar ou sus-
tentar os Mastros. Cada grupo de Marabaixo de Macapá realiza o seu próprio cortejo,
geralmente no mesmo dia e horário. Durante todo o trajeto do cortejo são cantadas Can-
tigas de Marabaixo que falam de fé, da presença de Deus, de Maria e de Jesus. São mo-
mentos de grande religiosidade e de louvação que ficam expressos por meio das músicas
dos Ladrões:

“Tenho fé em Deus
Na Sagrada Maria
Ora, a quem Deus promete não falta
Serei feliz algum dia”

(Trecho do Ladrão “Eu tenho fé em Deus”, autor Manoel Paciência)

32 Ibid., 56 e 72.
Consultar também:
 SANTOS, Esmeraldina. Histórias do meu povo. Macapá: Confraria Tucuju, 2002. Onde en-
contrar Secretária do Meio Ambiente do Estado do Amapá; Agência Amapá. Ciclo do Mara-
baixo: Seafro e órgãos parceiros planejam o segundo Cortejo da Murta. Disponível em:
<http://www.agencia amapa.com.br/noticia/33004/>. Acesso em: 28 março. 2018; Agência
Amapá.
 Seafro, igreja Católica e grupos de Marabaixo organizam o Cortejo da Murta no domingo. –
Cortejo da Murta. Disponível em: <http://www.agencia amapa.com.br/noticia/34006/ >.
Acesso:30 jun. 2018.

Cortejo da Murta. Disponível em: <http://fernando- canto.blogspot.com.br/2009/07/o-Mara-
baixo-de-1898.html >. Acesso: 28 jun. 2018.
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Imagem 18 – Cortejo do Mastro.
Em 5/5/2013. Foto: Pedro Gontijo. Fonte: IPHAN, Dossiê Marabaixo, 2013

1.2.3. A QUEBRA DA MURTA

A quebra da Murta é um termo utilizado pelos marabaxeiros para designar o


Corte da Murta33 (ver imagem 19). O Corte da Murta é um ritual que integra o calendário
religioso da programação do Marabaixo de Macapá (AP) e das demais localidades fora
da capital. Em Macapá a planta é retirada nas matas próximas da cidade, cada grupo de
Marabaixo faz o corte em separado, e em perímetros diferentes. Alguns grupos retiram a
planta no Curiaú, outros na comunidade do Coração ou em áreas próximas ao bairro Bra-
sil Novo. No dia do ritual os grupos de Marabaixo saem pela manhã para cortar a planta.
É um momento de grande empolgação para os marabaixeiros que entram nas matas para
realizar o corte. Enquanto isso, os tocadores de Caixa e as cantadeiras aguardam na beira
da estrada, louvando e cantando Cantigas de Marabaixo.

33 A Murta é uma planta típica das Américas. É da família das melastomáceas (Mouriri guiannensis). Cf.
em MARTINS, Rostan. Aonde tu vai, rapaz, por esses caminhos sozinho? Comunicação e Semiótica
do Marabaixo, São Paulo, Scortecci, 2016. p. 53.
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Imagem 19 – Corte da Murta para revestimento do Mastro. Distrito do Coração. Macapá (AP)
Em 18/5/2013. Foto: Eduardo Costa. Fonte: IPHAN, Dossiê do Marabaixo.

1.2.4. CORTEJO DA MURTA

O Cortejo da Murta é outro ritual que integra a programação religiosa do Ma-


rabaixo do Amapá. Na capital, no mesmo dia da quebra da Murta (Corte da Murta), acon-
tece pela parte da tarde, um cortejo. O cortejo consiste na saída pelas ruas dos bairros com
os ramos de Murta na mão, dançando o Marabaixo de rua, ao som dos dobrados das Cai-
xas e das músicas dos Ladrões. Conforme podemos ver na imagem 20, as dançadeiras e
cantadeiras de Marabaixo dançam com feixes de Murta como se os usassem na mão para
varrer o caminho que seguem, mais uma indicação do efeito de limpeza mágica.

Imagem 20 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão- Cortejo da Murta bairro do Laguinho, Macapá
(AP). Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora

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É bom frisar cada grupo de Marabaixo faz seu trajeto de cortejo separada-
mente. As Associações de Marabaixo do Laguinho34, incluem no percurso trechos do dos
bairros do Laguinho e Jesus de Nazaré e da Igreja Jesus de Nazaré, outras apenas perí-
metros do bairro do Laguinho com paradas rápidas e estratégicas na igreja São Benedito35
com intuito de pedir a bênção e louvar os Santos homenageados. Já as Associações de
Marabaixo da Favela em cortejo, percorrem perímetros dos bairros Santa Rita e Central,
ou apenas do bairro Santa Rita. Em todo trajeto a devoção ao Divino Espírito Santo e/ou
a Santíssima Trindade ficam expressos por meio das Cantigas de Marabaixo:

Divino Espírito Santo


Divino consolador
Santíssima Trindade
Me cubra com seu amor

1.2.5. CONSAGRAÇÃO DA MURTA

A Consagração da Murta integra a sequência de rituais que envolvem a pro-


gramação religiosa do Marabaixo do Amapá e faz parte do ciclo de celebrações em louvor
a Santíssima Trindade e ao Divino Espírito Santo. Na capital, até a década de 1950, a
Consagração da Murta era realizada em frente à Igreja da Matriz de São José de Macapá.
Hoje devido a Igreja Jesus de Nazaré possuir maior proximidade com os barracões do
Laguinho e da Favela os diversos grupos, das diferentes Associações de Marabaixo de
Macapá se encontram no local, para a consagração dos ramos de Murta. Durante o ritual,
os grupos de Marabaixo levam os galhos até o altar, fazem reverências, cantam e dançam
Marabaixo (ver imagem 21). Depois, seguem da igreja Jesus de Nazaré para as sedes das
suas respectivas Associações (ver imagem 22). É importante aqui fazer uma distinção:
existem dois eventos com o mesmo nome, um é este que é parte sagrada do ciclo de
celebrações da Santíssima Trindade e do Divino Espírito Santo. O outro, é uma ação afir-
mativa promovida pela SEAFRO, que reúne marabaixeiros de Macapá e do interior do
Estado numa procissão que vai da orla do Rio Amazonas até a Igreja de São José, na qual

34 No Laguinho, o Cortejo da Murta acontece em dois momentos. O primeiro durante a quarta –feira da
hora, e o segundo, no domingo de pentecoste. A Associação Folclórica Marabaixo do Pavão realiza
seu cortejo em perímetros dos bairros do Laguinho e do Jesus de Nazaré, já a Associação Cultural
Raimundo Ladislau no próprio bairro do Laguinho.
35 A Igreja São Benedito fica localizada na Rua General Rondon, 429bairro do Laguinho. Fonte: mapa
de setorização do Plano Diretor Ambiental e Urbano da Cidade de Macapá, 2004, com revisão em
2017.
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os marabaixeiros fazem um ofertório e o padre, num palco colocado na porta da igreja,
abençoa as Bandeiras e as pessoas, aspergindo água benta com um ramo de Murta ao som
das Cantigas de Marabaixo.

Imagem 21 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão . Cortejo da Murta. Bairro Jesus de Nazaré, Ma-
capá (AP). Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora

Imagem 22 – A caminho para a Consagração da Murta. Igreja Jesus de Nazaré, bairro Jesus de Nazaré,
Macapá (AP). Parte religiosa do ciclo de celebrações em louvor a Santíssima Trindade e ao Divino Espí-
rito Santo. Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisadora.

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1.2.6. BANDEIRAS

As Bandeiras são consideradas símbolos sagrados para os praticantes do Ma-


rabaixo algumas conservadas por gerações pelos ramos familiares que sustentam a festi-
vidade. A Bandeira da Santíssima Trindade é branca, com o desenho no centro de uma
Coroa com uma pomba branca de asas abertas na parte de cima da Coroa. A Bandeira do
Divino Espírito Santo é vermelha com a figura de uma Coroa e uma pomba na cor branca.
Em Macapá (AP) os grupos de Marabaixo possuem duas Bandeiras: a primeira é utilizada
nos cortejos36. A segunda, usa-se durante a Levantação dos Mastros. Em cortejo, utilizam-
se as Bandeiras de tecido de cetim, elas vão sempre a frente como forma de identificação
do grupo e da devoção. As Bandeiras são considerados artefatos de grande devoção, pro-
teção e bênção, daí o costume de que seja beijada e agitada de forma fervorosa (ver ima-
gem 23). As duas outras Bandeiras utilizadas na programação religiosa do Marabaixo de
Macapá são feitas de lona. Elas são colocadas em uma armação de madeira, sendo fixada
na extremidade superior do Mastro, ficando exposta após sua Levantação, durante todo o
tempo de permanência da festividade.

Imagem 23 – Encontro das Encontro das Bandeiras da Santíssima Trindade e do Divino Espírito Santo.
As Bandeiras marcam a identidade e devoção dos grupos de Marabaixo. Igreja Jesus de Nazaré, bairro
Jesus de Nazaré, Macapá (AP). Em 4/6/2017. Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pesquisa-
dora

36 Nas principais celebrações religiosas do Marabaixo, usa-se a Bandeira de tecido fino da Santíssima
Trindade ou do Divino Espírito Santo, conforme a devoção de cada grupo. As Bandeiras tanto em
cortejo, quanto nos rituais religiosos, têm a função de representar as Coroas, já que as mesmas só saem
da casa do festeiro, em datas pré-determinadas, para receber a bênção do padre na igreja. Assim, nos
rituais religiosos como o Domingo do Mastro, dia em que é realizado um cortejo com o Mastro; a
Quarta-feira da Hora, dia da realização do cortejo com a Murta; a Quinta-feira da Hora, dia em que os
Mastros são enfeitados com a mesma Murta do cortejo e, no outro dia, levantados na frente da casa do
festeiro, as Bandeiras estão presentes. Cf. em MARTINS, Rostan. Aonde tu vai, rapaz, por esses ca-
minhos sozinho? Comunicação e Semiótica do Marabaixo, São Paulo, Scortecci, 2016. p. 55.
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1.2.7. COROAS

São artefatos de prata ou que representam metais preciosos, ficam expostos


nos altares domésticos37 cobertos por fitas durante o período de realização do Marabaixo.
O local é preparado e enfeitado com flores artificiais e fitas que têm as cores das Bandei-
ras dos Santos homenageados: branco e vermelho para o Divino Espírito Santo, e branco
e azul para a Santíssima Trindade. Nos altares domésticos além da Coroa também ficam
expostos Santos de devoção pessoal, fotografias de personalidades do Marabaixo já fale-
cidas38 e velas acessas sobre pires. As Coroas da Santíssima Trindade e do Divino Espírito
são artefatos permanentes na festividade do Marabaixo porém, não saem em cortejo mas,
são levadas para receber a bênção nas missas39. Sua presença nos rituais religiosos (Cor-
tação do Mastro, Cortejo do Mastro, Corte da Murta, Cortejo da Murta, Consagração da
Murta, Levantação do Mastro e derrubada do Mastro) é representada pelas Bandeiras (do
Divino Espírito Santo e/ou da Santíssima Trindade). Na Bandeira, o Espírito Santo é
representado pela imagem de uma pomba, símbolo que evidencia o batismo de Jesus
Cristo. A Coroa é a representação material do que paira sobre o Mastro com a Bandeira,
tanto é que a Coroa está ilustrada na Bandeira. Essas relíquias são transmitidas entre ge-
rações pelos ramos familiares que sustentam o Marabaixo. São consideradas artefatos de
contemplação e de devoção, e sobre elas se reza e se faz promessa. As Coroas são o
símbolo material da realeza do Espírito Santo. Por isso, a família que as tem sob a sua

37 As Coroas ficam expostas na sala principal da casa do festeiro em altares domésticos chamados de
oratórios
38 Podemos encontrar também nos oratórios a bíblia que cada dia fica aberta em uma página para a re-
flexão dos devotos, copo com água benta, ramos de Murta da missa do Domingo de Ramos, fotos de
santinhos, cartazes com divulgação das festas religiosas e profanas. Cf. em MARTINS, Rostan. Aonde
tu vai, rapaz, por esses caminhos sozinho? Comunicação e Semiótica do Marabaixo, São Paulo, Scor-
tecci, 2016. p. 43.
Consultar também:
 Objetos e Instrumentos Rituais. p. 15 de 26. In: IPHAN. Inventário das referências culturais
do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponí-
vel apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
 BARRIGA, Ivaneide; SOUZA, Jane Selma; BORRALHO, Nilvânia da Conceição. Estudo
poético da linguagem do Marabaixo. Trabalho de Conclusão de Curso. Licenciatura Plena em
Letras. Universidade Federal do Amapá. Macapá, 1999.
39 No Ciclo do Marabaixo em Macapá (AP) as Coroas são retiradas dos altares domésticos em ocasiões
especiais como, por exemplo, no domingo do Divino Espírito Santo e domingo da Santíssima Trindade
onde são expostas no altar da igreja para receber a bênção do padre, logo em seguida retornam para a
casa do festeiro (organizador da festividade). Dados coletados com base na pesquisa do Ciclo do Ma-
rabaixo de Macapá, 2018.
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posse (ver imagem 24), indica que aquele grupo ocupa um lugar diferenciado na festivi-
dade por estar mais próximo da autoridade real que emana da santidade.

Imagem 24 – Coroas são artefatos permanentes da festividade. Representa os ramos familiares que sus-
tentam o Marabaixo, e são colocadas em altares nas casas dos festeiros juntamente com seus Santos de
devoção pessoal. Casa da Família Congó, local onde funciona também a Associação Folclórica Raízes da
Favela, bairro Central. Macapá (AP). Em 18/6/2017.Foto: Aydano Fonseca. Fonte: acervo pessoal da pes-
quisadora.

1.2.8. NOVENAS E LADAINHAS

Imagem 25 – Pessoas ajoelhadas diante da imagem da Santíssima Trindade no período das novenas. Foto:
Alysson Antero, 2014.

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As novenas fazem parte da programação religiosa do Marabaixo (ver imagem
25). São realizadas sempre no final da tarde ou início da noite e se constituem de uma
sequência de 9 (nove) dias consecutivos de oração dedicadas a devoção a Santos e Santas
da religiosidade católica. Durante o ciclo do Marabaixo de Macapá são realizadas nove-
nas em louvor a Santíssima Trindade e ao Divino Espírito Santo. São cerimônias reser-
vadas que acontecem na casa do festeiro e contam com parentes, amigos e lideranças
negras dos ramos familiares que sustentam o Marabaixo.

Fora da capital, durante as festas de Santos católicos, com ocorrência do Ma-


rabaixo, as novenas são realizadas nos ambientes domésticos e nas igrejas. É o caso da
Festa do Divino Espírito Santo em Mazagão Velho. Algumas novenas são feitas na Igreja
de nossa Senhora da Assunção, outras na casa do festeiro, e em alguns casos, nas residên-
cias de devotos conforme solicitação previa40. Já as ladainhas São rezas cantadas que
misturam trechos ora em português, ora em latim e que integram a programação religiosa
do Marabaixo do Amapá.

No Marabaixo do Laguinho as ladainhas são rezadas em três períodos da pro-


gramação: Após a Quinta-feira da Hora (dia em que acontece a Levantação do Mastro do
Divino Espírito Santo e se constituem de uma sequência de 18 (dezoito) dias consecutivos
de oração; no Domingo do Espírito Santo, data em que acontece o Cortejo da Murta onde
na ocasião, é realizada a reza de uma ladainha; no Domingo da Trindade data em que se
sucede a Levantação do Mastro da Santíssima Trindade, sendo que as ladainhas conti-
nuam por uma semana. No Marabaixo da Favela, as ladainhas são em louvor a Santíssima
Trindade. Elas são rezadas em uma sequência que envolve nove dias consecutivos de
oração transcorrendo após 06 (seis) dias da programação do Marabaixo do Dia das Mães.

Em Macapá, as ladainhas são rezadas durante as novenas. São cerimônias


domésticas e privadas, que acontecem no horário das 18h e/ou 19h entre um evento e
outro, do Marabaixo. Entre os rezadores de Ladainha oficiais do Ciclo do Marabaixo de
Macapá temos, João da Cruz41, que participa das festas de Santos na capital e em algumas

40 OLIVEIRA, Edna dos Santos. Devoção, tambor e canto: Um estudo etnolinguístico da tradição oral
de Mazagão Velho. (Doutorado em linguística). Universidade de São Paulo: 2015. p. 84 a 118.
41 João da Cruz é morador do Curiaú, comunidade negra que fica localizada no perímetro urbano da
cidade de Macapá (AP) a mais ou menos 12 km do centro comercial
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comunidades rurais do Estado do Amapá e, Francisco Ferreira Ramos - “Chico da La-
goa”42. Fora da capital, nos municípios onde existe ocorrência do Marabaixo, as ladainhas
além de serem rezadas na casa de fiéis43 acontecem nas igrejas ou nas pequenas capelas
das comunidades.

1.2.9. LEVANTAÇÃO DO MASTRO

A Levantação do Mastro é um dos rituais que integram a programação religi-


osa do Marabaixo do Amapá. Na capital, o ritual de Levantação do Mastro do Divino
Espírito Santo acontece apenas nas Associações de Marabaixo do Laguinho, 31 dias após
o Domingo de Páscoa, no dia denominado de Quinta-feira da Hora. Já a Levantação do
Mastro da Santíssima Trindade acontece tanto nas Associações de Marabaixo do Lagui-
nho, quanto da Favela, no dia denominado pelos marabaxeiros de Segunda-Feira do Mas-
tro. A Segunda-Feira do Mastro acontece na primeira segunda feira, após o Domingo de
Pentecostes. O ritual é realizado nas primeiras horas da manhã, porém, os seus preparati-
vos se iniciam um dia antes da levantação propriamente dita. Ainda no dia anterior, acon-
tece pela parte da tarde um cortejo para Consagração da Murta que encapará o Mastro.
Cada Associação de Marabaixo, tanto do Laguinho quanto da Favela, faz o seu cortejo e
a levantação de seu Mastro separadamente. Em cada ritual são levantados dois Mastros,
um que é pintado com as cores referentes ao Santo homenageado e o outro, que é enco-
berto de Murta. Porém, antes de iniciar o ritual é dançado um Marabaixo que se prolonga
pela noite toda, e logo de manhã, exatamente às 6h, ouvem-se fogos de artifício anunci-
ando o momento. Enquanto as mulheres cantam Ladrões falando “de fé, religiosidade e
da presença de Deus”, os homens escavam dois buracos um para cada Mastro, e na ponta
deles, fixam-se a Bandeira do Santo louvado. Já levantado, o Mastro passa a ser a ligação
física com o mundo espiritual, e através deste objeto fluem rezas, louvações e agradeci-
mentos aos Santos, pelas promessas alcançadas (ver imagem 26). Por isso, é possível
presenciar neste ritual um grande número de pessoas dançando em círculo ao redor do
Mastro e se aglomerando para tentar tocá-lo.

42 Francisco Ferreira Ramos, seu “Chico da Lagoa” é morador da Lagoa dos índios, comunidade negra
que fica localizada no perímetro urbano da cidade de Macapá (AP).
43 OLIVEIRA, Edna dos Santos. Op. cit. p.125
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Imagem 26 – Levantação do Mastro em devoção a Santíssima Trindade
Na sede da Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses. Bairro Central, Macapá (AP)
Em 9/5/2013. Foto: Pedro Gontijo. Fonte: IPHAN, Dossiê do Marabaixo, 2013.

1.2.10. DOMINGO DO SENHOR

Este é o último dia do ciclo anual do Marabaixo data em que acontece a


derrubada dos Mastros44. Sua simbologia traz como prenuncio o fim da festividade e a
escolha de um novo festeiro. Este ritual é antecedido por uma série de programações que
inclui missas, novenas com ladainhas45, bailes dançantes e noites com muito Marabaixo
para só então, os Mastros fincados, serem derrubados. No que diz respeito à execução do
ritual em Macapá, os grupos de Marabaixo do Laguinho e da Favela, derrubam seus Mas-
tros, na frente das suas respectivas Associações, conforme o Santo que está sendo home-
nageado (ver imagem 27).

44 IPHAN. Op. cit., p.06.


ANEXO: Bens Culturais Inventariados. p. 34 de 54. In: IPHAN. Inventário das referências culturais
do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas
em meio digital no formato pdf (463 p.)
Consultar também:
SANTOS, Pe. Aldemar Benjamim dos. Modernidade e Marabaixo. Luzes e sombras na perspectiva do
projeto rumo ao novo milênio. Acervo: Secretária do Meio Ambiente do Estado do Amapá.
45 No Marabaixo de Macapá, as novenas que ocorrem no bairro do Laguinho são em devoção ao
Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade, já na Favela são em devoção a Santíssima Trindade
dos Inocentes.
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Imagem 27 – Derrubada do Mastro da Santíssima Trindade, ritual que simboliza o encerramento do Ciclo
de celebrações do Marabaixo de Macapá(AP). Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro Central.
Foto: Aydano Fonseca. Acervo pessoal da pesquisadora

No Laguinho, onde a devoção é ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trin-


dade acontece uma distinção: são feitas duas derrubadas de Mastros para cada devoção.
Nas comunidades localizadas fora do perímetro urbano de Macapá, as Festas dos Santos
locais que são precedidas de Marabaixo, também realizam este mesmo ritual distin-
guindo-se apenas, o Santo que está sendo homenageado. Entre as localidades podemos
citar: A festa do Divino Espírito Santo em Mazagão Velho, São Sebastião em Mazagão,
São Tomé no Carvão, Nossa Senhora da Assunção em Torrão do Matapi, Sagrada Família
em Campina Grande, São Sebastião em Ilha Redonda, São José no Abacate da Pedreira,
Divino Espírito Santo em Ressaca da Pedreira, Santíssima Trindade em Casa Grande e
Santa Maria no Curiaú, dentre outras.

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1.3. MARABAIXO EM MACAPÁ: LOCAIS DE INCIDÊNCIA

Mapa 1 – Localização das Associações de Marabaixo de Macapá

Mapa: Jocimar Paixão, 2018. Mapa base: OpenStreet Map


(Disponível em https://www.openstreetmap.org)

Conforme podemos ver no mapa acima, esses rituais que estamos descre-
vendo acontecem nos sítios tradicionais de incidência da festividade dentro da cidade de
Macapá (AP). São realizados especialmente nos bairros Central e Laguinho, durante os
dois meses em que é celebrado o evento. Fora da capital Macapá, a festividade segue um
calendário mais flexível em louvor a diversos Santos católicos comemorado em diferentes
datas no decorrer do ano, conforme aponta pesquisa etnográfica realizada pelo IPHAN
em 2013. A catalogação feita pelo IPHAN dos diversos grupos que dançam o Marabaixo
em Macapá e das comunidades praticantes fora da capital, deu origem ao Inventário das
Referências Culturais do Marabaixo do Amapá. O IPHAN identificou diversos locais de
ocorrência do Marabaixo em várias comunidades rurais46 do Estado do Amapá, sendo que

46 As comunidades rurais praticantes do Marabaixo no Estado do Amapá foram catalogadas pelo IPHAN
em 2013 e se constituem a saber: Mazagão Velho, distrito do município de Mazagão distante 72 km
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os Municípios de Macapá e Mazagão receberam maior destaque na pesquisa devido ser o
local que os primeiros praticantes do Marabaixo chegaram ao Amapá, no século XVIII.

1.3.1. ASSOCIAÇÃO CULTURAL RAIMUNDO LADISLAU

Situada na Rua Eliezer Levi, nº 632, bairro do Laguinho (ver imagem 28). A
Associação tem como matriarca Benedita Guilherma Ramos, a “tia Biló”, única filha viva
de Julião Ramos, grande liderança do Marabaixo do Amapá. A Associação fundada em
07.08.1988, presta homenagem em seu nome a Raimundo Ladislau, exímio tocador de
Caixas e grande compositor de Ladrões, suas composições que foram feitas ainda na pri-
meira metade do século passado, são inclusive hoje adotadas, por diversos grupos, de
diferentes comunidades, durante as programações do Marabaixo.

Imagem 28 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017. Fonte: Acervo pessoal da pesquisa

A Associação promove festejos em louvor ao Divino Espírito Santo e a San-


tíssima Trindade por meio de um ciclo festivo, intitulado de Ciclo do Marabaixo. A pro-
gramação inclui 63 dias de festejos que se iniciam no Domingo de Páscoa e estendem-se
até o primeiro domingo após Corpus Christi. Neste período, ocorrem 5 noites com muito

de Macapá. Carvão e Campina Grande as quais fazem parte também, respectivamente do município
de Mazagão. Da área rural da cidade de Macapá temos: Torrão do Matapi, Ilha Redonda, Abacate da
Pedreira, Ressaca da Pedreira, Curiaú. Cf. IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo
do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio di-
gital no formato pdf (463 p.). p. 13.
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Marabaixo, bailes dos sócios, e uma sequência de rituais como: a Cortação do Mastro nas
matas do Curiaú, o cortejo dos Mastros pelas ruas do bairro do Laguinho, levantação e
derrubada dos Mastros da Santíssima Trindade e do Divino Espírito Santo. São realizados
também entre uma programação e outra, novenas com ocorrência de ladainhas e missas.
As missas são realizadas na igreja São Benedito, localizada no mesmo bairro.

A parte lúdica acontece, na sede da Associação. Durante a programação do


Marabaixo o local é cuidadosamente preparado com as cores azul, vermelho e branco,
cores que simbolizam a devoção ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade. Na
parte interna da residência é colocado um altar com diversas imagens de Santos, deixando
em destaque o Santo homenageado. Nessas noites serve-se a tradicional gengibirra e o
caldo de carnes e legumes.

1.3.2. ASSOCIAÇÃO FOLCLÓRICA MARABAIXO DO PAVÃO

Situada na avenida Nações Unidas, nº 1160, bairro do Laguinho. A Associa-


ção fundada em 06.10.1988, tem como homenageado Raimundo Lino Ramos, o “Mestre
Pavão”, patriarca da família e uma das maiores lideranças do Marabaixo de Macapá.

Imagem 29 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017 Fonte: Acervo pessoal da


pesquisadora

A Associação promove os mesmos festejos incluindo rituais similares aos re-


alizados pela Associação Cultural Raimundo Ladislau. As louvações ao Divino Espírito
Santo e a Santíssima Trindade acontecem durante o Ciclo do Marabaixo (ver imagem 29).
A programação integra o calendário de festejos que iniciam no Domingo de Páscoa e se
estendem até Corpus Christi. A programação da parte religiosa é composta também de
missas e de novenas onde nesta última, rezam-se ladainhas. As missas acontecem na
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igreja Jesus de Nazaré, localizada na rua Leopoldo Machado, nº 744, bairro Jesus de Na-
zaré. Já as novenas acontecem nesta Associação.

1.3.3. ASSOCIAÇÃO CULTURAL BERÇO DAS TRADIÇÕES AMAPAENSES

Situada na avenida Duque de Caxias, nº 1203, bairro Central (ver imagem


30). A Associação fundada em 19.07.1987, presta homenagem a Gertrudes Saturnino
Gaia, a “tia Gertrudes”. Tia Gertrudes foi uma grande liderança do Marabaixo, tocadora
de Caixas, cantadeira e compositora de Ladrões, foi também pioneira moradora do bairro
Central, que no contexto do Marabaixo é conhecido como Favela.

Imagem 30 – Foto: Aydano Fonseca. Data: 18/04/2017. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

A Associação promove festejos em louvor a Santíssima Trindade dos inocen-


tes por meio de um ciclo festivo, intitulado de Ciclo do Marabaixo. A programação inclui
63 dias de festejos que se iniciam no sábado de páscoa e estendem-se até o primeiro do-
mingo após Corpus Christi. Os dias e noites de Marabaixo recebem nomes específicos
como: Marabaixo da Aleluia, Marabaixo do Mastro, Marabaixo das mães, Marabaixo da
Murta, Marabaixo de Corpus Christi, Marabaixo de derrubada do Mastro. Neste período,
ocorrem seis noites com muito Marabaixo, bailes dos sócios, e uma sequência de rituais
como: a Cortação do Mastro nas matas do Curiaú, o cortejo dos Mastros pelas ruas do
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bairro do Central e a levantação e a derrubada dos Mastros da Santíssima Trindade. São
realizados também entre uma programação e outra, novenas com ocorrência de ladainhas
e missas. As missas são realizadas na igreja Santíssima Trindade, localizada no bairro
Nova Esperança.

A parte lúdica acontece, na sede da Associação. O local é cuidadosamente


preparado com as cores azul, e branco, cores que simbolizam a devoção a Santíssima
Trindade. Na parte externa da residência é colocado um altar com diversas imagens de
Santos, deixando em destaque o Santo homenageado. Nessas noites serve-se a tradicional
gengibirra e o caldo de carnes e legumes. Uma particularidade deste grupo é promover
no Domingo da Trindade o almoço dos inocentes, este almoço tem sua origem associada
ao pagamento de uma promessa feita por dona Gertrudes Saturnino47 para que a sua filha
Natalina Costa, conseguisse engravidar. Com a graça alcançada, a promessa foi cumprida,
e um almoço para 12 crianças representando os 12 apóstolos de Jesus, vem sendo ofere-
cido há quase sete décadas. Manoel Costa, fruto da promessa, é o primeiro de uma linha-
gem de 13 irmãos que dão continuidade, junto com filhos e netos, à festividade para a
Santíssima Trindade, à qual foi agregado a palavra Inocente, para lembrar da bênção pelo
nascimento de uma criança48.

1.3.4. ASSOCIAÇÃO ZECA E BIBI COSTA

Situada na avenida Mendonça Furtado, nº 1882, bairro Central. A Associação


fundada em 29/06/2000, presta homenagem a Zeca Costa (já falecido) e a sua esposa Irene
Pereira da Costa, grandes lideranças do Marabaixo da Favela. Esta Associação promove
os mesmos festejos realizados pelas demais Associações de Marabaixo da Favela. As
datas que integram a programação seguem também o calendário de datas religiosas de
cunho cristão (da Páscoa a Corpus Christi). A parte lúdica e a sequência de rituais que
integram a parte religiosa do Marabaixo, são realizadas de forma semelhante as demais
Associações de Marabaixo da Favela.

47 Gertrudes Saturnino é uma das fundadoras ainda em meados do século XX, do Marabaixo na Favela.
48 CAVALCANTE, Alcinéa. Domingo tem Marabaixo na Favela e Laguinho. Disponível em
https://www.alcinea.com/cultura/domingo-tem-Marabaixo-na-favela-e-laguinho. Acessado em
20/04/2018.
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1.3.5. ASSOCIAÇÃO CULTURAL RAÍZES DA FAVELA

Situada na Rua Mendonça Júnior, nº 1275, bairro Central, a Associação presta


homenagem a Raimunda Rodrigues do Carmo, conhecida como “Dica Congó” (já fale-
cida). A família Congó é uma grande liderança do Marabaixo da Favela, a história desta
família em Macapá vem desde a chegada dos negros da África para trabalharem na cons-
trução da Fortaleza. Com o término da escravidão a família Congó passou a habitar até
a década de 1940, a área central da cidade de Macapá, contudo, as reformas urbanas pro-
movidas pelo, então Governador do Território Federal do Amapá, Janary Gentil Nunes,
deslocaram os Congó para a região da Favela. Na atualidade o nome Favela tem uma
importância muito grande para o Marabaixo, e mesmo o bairro sendo oficialmente cha-
mado de Central, todas as referências relativas ao Marabaixo do local estão associadas ao
nome Favela.

Imagem 31 – Dançadeiras da Associação Cultural Raízes da Favela. Foto: Aydano Fonseca. Data:
25/05/2017. Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora.

A Associação Cultural Raízes da Favela, tal como as demais localizadas no


Bairro central, promove festejos em louvor a Santíssima Trindade dos inocentes (ver ima-
gem 31). A programação inicia no sábado de Páscoa e se estende até o primeiro domingo
após Corpus Christi. Durante os dois meses de programação os dias e as noites de Mara-
baixo são integrados através de uma sequência de rituais (Cortação dos Mastros, Cortejo
dos Mastros, Levantação e Derrubada dos Mastros). Entre um evento e outro da progra-
mação, são realizadas missas, novenas e ladainhas.
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Esta Associação, assim como as demais pertencentes as Associações de Ma-
rabaixo da Favela, também realiza durante a programação do Domingo da Trindade o
almoço dos inocentes. O almoço dos inocentes é uma das programações mais tradicionais
realizadas pelas Associações de Marabaixo da Favela e tem sua origem ligada ao paga-
mento de uma promessa feita a Santíssima Trindade dos Inocentes por uma das mais
importantes lideranças do Marabaixo: Dona Gertrudes Saturnino. O pagamento da pro-
messa consiste em servir um almoço no Domingo da Trindade, para 12 crianças, as quais
representam os 12 apóstolos de Jesus Cristo.

1.4. BREVE HISTÓRICO DO MARABAIXO

1.4.1. A CHEGADA DO AFRICANO AO AMAPÁ COMO MÃO DE OBRA ES-


CRAVA

De acordo com Pedro Rosário dos Santos grande liderança do Marabaixo do


Curiaú, a origem do Marabaixo está associada a chegada dos negros ao Amapá no século
XVIII alguns como mão de obra escrava para a construção da Fortaleza de São José de
Macapá (1764 - 1782) outros, como força de trabalho cativa de famílias vindas da região
de Marrocos, na África, para ocupar estrategicamente, o atual distrito de Mazagão Velho.
De acordo com o Inventário de Referências Culturais do Marabaixo do Amapá produzido
pelo IPHAN em 2013, a História do Estado do Amapá se funde com a própria História
do Marabaixo uma vez que a origem da festividade remonta o período da ocupação estra-
tégica da Coroa portuguesa nas terras do Cabo Norte (1637), território que posteriormente
seria de litígio com a França pela posse da margem norte do Rio Amazonas (1841-1900).
Com a formação da província Tucuju (1748) e do vilarejo de São José de Macapá (1738)
o capitão geral do Grão-Pará, Fernando Costa Ataíde Teive, inicia a construção da Forta-
leza de São José de Macapá conforme a política Pombalina.

Segundo Camilo49, como forma de fortalecimento das defesas territoriais da


Coroa portuguesa, o Capitão-Geral do Estado do Grão-Pará e Maranhão Francisco Xavier
de Mendonça Furtado é orientado conforme Instruções Régias, Públicas e secretas a im-
portar de africanos escravizados como mão de obra (1751) para o vilarejo de Macapá. No

49 CAMILO. Janaina Valéria Pinto. Homens e pedras no desenho das fronteiras: a construção da Forta-
leza de São Jose de Macapá (1764/1782). Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campi-
nas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, 2003.
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que diz respeito a chegada de africanos escravizados em Mazagão Velho, segundo Katy
Motinha, os primeiros chegaram por volta de (1775)50. Juntamente com os negros vieram
seus costumes, crenças e formas de expressão do canto e da dança. Os africanos trouxe-
ram vários elementos culturais de seus locais de origem, a música e a dança por exemplo,
foram fundamentais para a manutenção de uma memória da terra nativa servindo para
anemizar o banzo e, ao mesmo tempo, para o estabelecimento de uma identidade histó-
rica. Para que os senhores permitissem as manifestações musicais e danças, os negros
escravizados incorporaram aspectos da cultura portuguesa, sobretudo da religião. Assim
nasceu o Marabaixo, misturando tradições africanas e crenças de base católica.

1.4.2. A CHEGADA DO AFRICANO AO CURIAÚ

O Curiaú é uma área de proteção ambiental (APA do Curiaú)51 situada cerca


de 12km do centro comercial da cidade de Macapá(AP). Possui um ecossistema local
diversificado com um ambiente natural riquíssimo que inclui áreas de cerrado e de cam-
pos inundáveis, floresta de várzea, floresta densa e de alto porte composta por matas vir-
gens. É constituída por uma hidrografia com lagos margeados por bosques de buritis e
de lagos com peixes e mamíferos das as mais variadas espécies.

Imagem 32 – Lago do Curiaú. Foto: Alan Kardec. Disponível em http://mapio.net/pic/p-122835443/

50 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na Vila
Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo, São Paulo,
p.7.
51 APA do Curiaú é uma área de proteção ambiental instituída pelo decreto Lei 1.417/1992 abrange uma
área de 23.000 hectares. Ficha de identificação: Lugares. p. 3 de 9. In: IPHAN. Inventário das referên-
cias culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Dis-
ponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
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Destacamos a beleza do lugar especialmente do lago do Curiaú que durante
os primeiros seis meses do ano fica cheio e serve de habitat natural para peixes, pássaros
e búfalos. Dentro desse santuário natural vivem, aproximadamente 285 famílias52. A
maior parte, são afrodescendentes que praticam o extrativismo, a pesca, a caça e a agri-
cultura familiar. Os principais produtos cultivados são a mandioca, milho, abacaxi, ba-
nana. As árvores frutíferas muito comuns nos quintais amplos das casas, servem tanto
para o abastecimento da comunidade quanto, para o abastecimento local.

A comunidade do Curiáu, reconhecida em 1988 pela Fundação Palmares


como área remanescente de quilombos, tem uma relação estreita com o Batuque, com o
Marabaixo e com o próprio Ciclo do Marabaixo de Macapá (AP). É nas matas do Curiaú
que acontece a Cortação do Mastro da Santíssima Trindade e do Divino Espírito Santo
durante o Ciclo do Marabaixo. O Curiaú também é um dos principais locais onde mestres
da arte de fazer e tocar Caixas de Marabaixo residem53, além de ser lugar onde moram
dois, dos três rezadores oficiais de ladainhas do Ciclo do Marabaixo54. A comunidade
possui um extenso calendário de festividades religiosas que inicia sempre em janeiro e
tem seu término em dezembro sendo as principais a festa de São Joaquim55, padroeiro da
comunidade e a festa de Santa Maria, em ambas acontecem rodas de Batuque e de Mara-
baixo.

De acordo com Sebastião Menezes da Silva56 ocupação do Curiaú tem uma


estreita relação com a ocupação portuguesa no Amapá, já que o local serviu de reduto
militar após a construção da Fortaleza de São José (1789). Embora algumas versões dos

52 Consultar Mapeamento e Publicação do Patrimônio Cultural das 28 Comunidades Quilombolas


no Estado do Amapá, certificadas e/ou tituladas pela Fundação Cultural Palmares. Disponível em
http://comunidades.lides.unifap.br/condicoes_vida/curiau.html.
53 No Curiaú reside Pedro Rosário dos Santos, o “Pedro Bolão” uma das maiores fazedores e tocadores
de Caixa de Marabaixo do Estado do Amapá. Ele possui desde 2013, o reconhecimento nacional pelo
Instituto do Patrimônio histórico e Artístico Nacional (IPHAN), como mestre do Oficio de saber fazer
e tocar Caixas de Marabaixo.
54 Joaquim Araújo da Paixão e João da Cruz são moradores do Curiaú. Além deles temos outro rezador
oficial de Ladainhas no Ciclo do Marabaixo – Macapá (AP), Francisco Ferreira Ramos “Chico da
Lagoa” morador da comunidade da Lagoa dos índios.
55 Ver: VIDEIRA, Piedade Lino. Batuques, folias e ladainhas: a cultura do Quilombo do Cria-ú em Ma-
capá e sua Educação. Fortaleza: UFC, 2013.
56 SILVA, Sebastião Menezes da. Curiaú, sua vida, sua história. Macapá: Valcan. p. 9.
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moradores da comunidade quanto a origem do local sejam diferentes, em todas elas apa-
rece a figura de africanos escravizados durante os primórdios da ocupação57. Uma das
versões relaciona-se a Inácio da Bacaba, africano escravizado que chegou até a região do
Curuçá, atual Curiaú de Dentro, margeando o rio em uma canoa, com três cachorros e
uma Caixa de Marabaixo58. Já a outra, bastante difundida, atesta a presença de um senhor
por nome Miranda59 que trouxe consigo sete africanos escravizados do nordeste e que ao
morrer, sem possuir herdeiros, suas terras passaram a pertencer a esses negros . Nas falas
dos mais antigos da comunidade também encontramos histórias que se relacionam aos
primeiros africanos escravizados que quando ali chegaram colocaram o nome Cria-ú60,
sendo “ú” uma referência ao mugido do gado, também, por terem observado que as terras
eram boas para pastagens de gado.

A comunidade possui os seguintes marcos históricos: Curiáu de Fora, Curiaú


de Dentro, Mocambo, Francisco da Casa Grande, Pescada, Pirativa, Fugitivo e Currali-
nho. A parte mais visitada por moradores da malha urbana de Macapá é o Curiaú de baixo,
especialmente por causa das domingueiras do balneário do Curiaú e do complexo de lazer.
Na parte que compreende o Curiaú de cima temos casas que ficam na beira da estrada, a
Associação de moradores do Curiaú, a igreja de São Joaquim e uma igreja evangélica.
Chega-se ao Curiaú de Dentro através de uma estrada que tem uma extensão mais ou
menos de1km da entrada, especialmente esta parte tem uma ligação muito forte com as
primeiras histórias de ocupação que dão conta de seu surgimento a partir de uma casa na
beira do rio (Teso da Malhada) considerada um referencial porque foi ali que se estabe-
leceram as gerações que povoaram o Curiaú. Outra parte bastante referendada nos relatos
de moradores é o mocambo considerado um espaço onde negros libertos e fugitivos se
encontravam.

A ligação do Curiaú com a parte urbana de Macapá aconteceu na década


de1980 quando foi construído a estrada de acesso através da alteração do curso d’água do
lago, situação que na época, causou enormes conflitos com os moradores, devido aos

57 Esmeraldina dos Santos. Entrevistada em 06 de maio de 2013. Entrevista concedida ao IPHAN. In:
IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p.27
58 Pedro Rosário dos Santos. Relato concedido para esta pesquisa dia 30 de maio de 2018
59 SILVA, Sebastião Menezes da. Curiaú, sua vida, sua história. Macapá: Valcan. p. 9 APUD IPHAN.
Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo.
108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p.21.
60 VIDEIRA, Piedade Lino. Op. cit., p. 83 e 217.
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problemas ecológicos trazidos. Os moradores mais antigos guardam na memória a dis-
tância que a localidade ficava do restante da capital Macapá e do sossego que era morar
em um espaço que tinha uma relativa autonomia. Atualmente, o Curiaú se constitui de
famílias afrodescendentes que guardam na memória a história de resistência a escravidão
de seus antepassados por meio das festas religiosas do ritmo do Batuque e do Marabaixo.
Seus laços sanguíneos e tradições culturais são muito fortes e isso fica claro na forma
como são construídas suas residências algumas sem cercas nos quintais, outras com cer-
cas mas, com várias edificações e assim como bem dizem, “conservam a tarefa de dar
continuidade a cultura de seus ancestrais”61.

1.4.3. A CHEGADA DO AFRICANO EM MAZAGÃO VELHO

A criação da Vila de Mazagão no século XVIII, segundo Eliana Ramos62 e


Renata Malcher63, possuía uma motivação estratégico-defensiva e fazia parte de um plano
orquestrado para resguardar as fronteiras territoriais. A sua localização e seu acesso pri-
vilegiado a foz do rio Amazonas levou a escolha do então Governador da Capitania do
Grão-Pará, Francisco Xavier de Mendonça Furtado pela criação de um povoado na extre-
midade sul das Terras do Cabo Norte denominado de Vila de Mazagão. De acordo com
Camilo64, as cartas régias de Francisco Xavier de Mendonça Furtado em 1751, a Marques
de Pombal, atestam a existência de uma grande preocupação frente as defesas territoriais
na Amazônia. Sobretudo porque, as descobertas de importantes jazidas de ouro no Oeste
do Brasil ameaçavam os acordos fronteiriços estabelecidas pelo Tratado de Madri em
1750, acordo este que marcava as fronteiras da colônia, com as terras pertencentes a Es-
panha.

Como parte desse processo, a Vila de Mazagão no século XVIII, além de


prioritariamente corroborar com a manutenção das defesas territoriais, passou a assumir
um caráter explorativo para a o Estado e administração colonial. Segundo João Palma

61 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido no Curiaú, para estudantes da Escola Estadual Profes-
sora Raimunda Virgolino, no dia 14/04/2018.
62 RAMOS, Eliana. Estado e administração colonial: a vila de Mazagão. In: ROSA ACEVEDO, Marin
(org.). A Escrita da História Paraense. Belém do Pará: NAEA/UFPA, 1998, p. 95.
63 ARAÚJO, Renata Malcher de. As Cidades da Amazônia no século XVIII. Belém, Macapá e Mazagão,
Porto, Faup Publicação, 2ª ed., 1998, p. 267-268.
64 CAMILO. Janaina Valéria Pinto. Homens e pedras no desenho das fronteiras: a construção da Forta-
leza de São Jose de Macapá (1764/1782). Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campi-
nas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, 2003
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Muniz65 a Vila de Mazagão fez parte de um circuito produtivo de abastecimento de arroz.
Mais recentemente, as pesquisadoras Eliana Ramos e Rosa Elisabeth Acevedo Marin66,
também destacam que nos anos setecentistas a Vila de Mazagão possuía um importante
papel explorativo na atividade agrícola “baseado na mão de obra escrava e indígena”.

Porém, Rosa Elizabeth Acevedo Marin67 destaca que essa prosperidade foi
momentânea. Os colonos mazaganistas foram direcionados para desenvolverem ativida-
des de exportação, tendo como principais itens a já citada rizicultura, e também a produ-
ção de algodão. Até a década de 80 do século XVIII a Vila de Mazagão se tornou um
importante polo agrícola. Todavia, a partir de 1830 a decadência da Vila de Mazagão era
evidente com a situação de pobreza extrema. Entre os fatores, segundo Rosa Acevedo
68
Marin , há indícios de que os laços de dependência, as dívidas, a fiscalização e,
sobretudo, os baixos preços pagos pela produção dos mazaganistas, os conduziram
a um estado de “miséria”. Tais fatores foram agravados com as epidemias, má alimenta-
ção, desgastes físicos e insalubridade do local, causando fugas e a morte de muitos habi-
tantes. Isso levou os moradores a incessantes pedidos alegando motivações variadas à
Coroa portuguesa, para a saída da região.

De acordo com Maria Cardeira da Silva e José Alberto R. da Silva Tavim é


possível identificar uma outra razão atribuída ao fracasso da vila de Mazagão enquanto
polo agrícola:

Na Mazagão marroquina, estes colonos viviam dos soldos régios nas


suas atividades militares ou de funcionários, ou eram pessoas que gra-
vitavam em torno deste e do abastecimento a partir do reino: comerci-
antes e artífices. Repentinamente, o Marques de Pombal e seu irmão
pretenderam que se transformassem em colonos desenvolvimentistas,
avançando-lhes verbas, “fazendas” e escravos, que deviam pagar mais
tarde ou seja, empurraram-nos para um processo rápido e continuo de
endividamento, não só por não terem feito da agricultura seu modo de

65 MUNIZ, João Palma. Limites Municipais do Estado do Pará. Município de Mazagão. In: Anais da
Biblioteca e Arquivo Público do Pará, t. IX, 1916, p. 395-396 e 425.
66 RAMOS, Eliana. Estado e administração colonial: a vila de Mazagão. In: ROSA ACEVEDO, Marin
(org.). A Escrita da História Paraense. Belém do Pará: NAEA/UFPA, 1998, p. 98.
67 Cf. ROSA ACEVEDO, Marin. Prosperidade e Estagnação de Macapá Colonial: as experiências dos
colonos. In: Nas Terras do Cabo Norte. Fronteira, colonização e escravidão na Guiana Brasileira -
séculos XVIII/XIX, org. de Flávio dos Santos GOMES, Belém, Editora Universitária/UFPA, 1995, p.
419.
68 Cf. ROSA ACEVEDO, Marin. Prosperidade e Estagnação de Macapá Colonial: as experiências dos
colonos. In: Nas Terras do Cabo Norte. Fronteira, colonização e escravidão na Guiana Brasileira -
séculos XVIII/XIX, org. de Flávio dos Santos GOMES, Belém, Editora Universitária/UFPA, 1995, p.
419.
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vida em Marrocos, mas também porque deviam vender seus artigos ex-
clusivamente a companhia.69

É possível comprovar tal hipótese descrita acima a partir das pesquisas de


João Manuel Azevedo e Silva70, através da minuciosa análise do códice de 1784 do Ar-
quivo Público Ultramarino. Devido a detalhamento e da riqueza de descrições dos ofícios
desempenhados pelos mazaganistas em Marrocos é completamente plausível que a inex-
periência dos colonos com plantações tenha contribuído para o insucesso da atividade
agrícola. Neste contexto onde os colonos mazaganistas não tinha prática com a agricultura
e diante da situação de miserabilidade enfrentada, as confrarias e irmandades “apareceram
como um vínculo solidário para essa população”71. No Brasil colonial, as organizações
dos festejos ao Divino estavam sobre encargos de Ordens Religiosas e Irmandades que
reuniam os membros associados para cumprir atividades de cunho religioso e com víncu-
los solidários.

Documentos abrigados no Arcebispado do Pará revelam a existência, no pe-


ríodo de 1773 a 1884, de irmandades e confrarias de cumpriam vínculos solidários com
seus sócios como, por exemplo, as de Santa Rosa de Lima, Sant’Ana, São Benedito,
Nossa Senhora do Rosário, São Francisco, Nossa Senhora do Monte, Bom Jesus dos Pas-
sos, Santíssimo Sacramento e Irmandade do Espírito Santo dos Cativos. De acordo com
Katy Motinha72 a farta documentação existente no Arquivo da Arquidiocese do Pará,
aponta claramente à existência de confrarias e irmandades nas áreas circunscritas ao bis-
pado do Grão-Pará, no século XVIII, da qual a recém-criada Vila Nova de Mazagão fazia
parte.

Em 1778, Dom Frei Caetano da Anunciação Brandão, bispo do Grão-Pará,


em ofício encaminhado ao Secretário de Estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo

69 DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa– a festa de São Thiago, 2004, p. 12
70 Cf. SILVA, José Manuel Azevedo e. Mazagão: Retrato de uma cidade luso-marroquina deportada para
o Brasil. In: Camões: Revista de Letras e Cultura Lusófonas. Vol. 17-18. 2004. p. 171-172.
71 MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico. Revista
Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. janeiro-junho de 2014. p. 39.
72 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na Vila
Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo, São Paulo,
2003

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e Castro, ao reprovar a conduta dos membros da Confraria do Espírito Santo, não deixa
dúvidas quanto aos vínculos solidários cumpridos por elas:

(...) Ha aqui huã Confraria denominada o Imperio do Espírito


Santo, de natureza totalmte alheia das mais q a Igra e os Principes
costumão aprovar. Compoem-se de hum Imperador, e alguns Mor-
domos, porem so aquelle he figura considerável, e por isso mesmo a
que todos, sem excepção, dezejão fazer, nesta Comedia ao Divino. Não
me refiro as irreverências; e profanações que se comettem nos Templos
com o pretexto de render obsequio a 3a Pessoa da Sma Trindade, porque
as considero notórias a V. Exa. Digo somte q he preciso q os Prelados
tenhão confundidas todas as ideas do Culto Ecclesiastico pa deixa-
rem de combater semelhante extravagância (...). Mas sobretudo o
que mais escandaliza he o abuzo q s faz das esmolas, com q o Povo
contribue (...) se servem dellas pa se vestirem amgnificamte, e fa-
zerem esplendidos banquetes, seguidos ordinariamte de mil excessos
de bebida, e outros não menos prejudiciais a Religião e a Sociedade
(...). Isto, Exmo Snr, he quazi geral nas Freguesias de brancos, onde
se acha estabelecida a mencionada Confraria: e he tam grande a ce-
gueira do Povo, q sabendo mto bem o estranho e injusto consumo
que tem os effeitos da sua beneficencia, continuão sempre a dar (...)
persuadidos (...) q obrando o contrario serão logo vitimas da cólera da
Divinde: Sobe a tal excesso o fanatismo q já chegarão a dizer q eu não
admitia senão duas Pessoas na Trindade, isto so por dar huas pequenas
providencias, com q se evitassem alguas profanações (...) peço q
prohiba debaixo de rigorosissimas penas tiraremse esmolas pa seme-
lhante fim, e querendo os Imperadores festejar o Divino Espírito Santo
o fação a sua custa (...)73

A citação acima expõe claramente que a Confraria do Espírito Santo possui


práticas festivas que envolvem “esmolas dadas pelo povo” e de que seus membros faziam
isso devido ao “temor e cólera da divindade e também, por causa do contrato sobrenatu-
ralmente estabelecido e arraigado”. Diante do pagamento festivo da promessa as autori-
dades eclesiásticas escandalizavam-se com a “irreverência” do folguedo entendido pela
igreja católica como verdadeiras “comédias” por causa talvez, das “danças e tambores”
que não se enquadravam no “culto eclesiástico” 74 . O banquete comunal servido nessas
ocasiões eram considerados verdadeiras “profanações” já que nesses períodos permitiam
“a todos, ao menos uma vez por ano, saciar a fome causada pelas más colheitas”. Choca-
vam-se os clérigos com a quantidade de vinho servido nesses momentos, vinho este, que
permitia aos participantes esquecer, pelo menos nessas ocasiões, a miserabilidade e o
abandono tanto por parte da Igreja, quanto pelo Estado e administração colonial.

73 AHU_ ACL_CU 013, Cx. 97, D. 7749. In: MOTINHA, Katy E. F. Vila Nova de Mazagão: espelho de
cultura e de sociabilidade portuguesas no vale amazônico. p. 15. Disponível em: http://cvc.instituto-
camoes.pt/eaar/coloquio/comunicacoes/katy_motinha.pdf
74 Ibid., p. 15 e 16.
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Nesse sentido é completamente pertinente dizer que em Mazagão a situação
de extrema pobreza enfrentada no século XVIII a partir do declínio da vila como polo
agrícola exportador tenham contribuído para que as confrarias de leigos assumissem fun-
ções que dispensavam a autoridade eclesiástica para cumprir com seus participantes vín-
culos religiosos, mas também solidários. Martha Abreu75 destaca a importância dessas
irmandades durante o período da escravidão colonial no Brasil, enfatizando que os vín-
culos de solidariedade aconteciam através de ajuda mútua em troca de assistência quando
seus membros encontravam-se enfermos, presos ou passando necessidades. As confrarias
de leigos foram também grandes agentes do catolicismo barroco que com seu politeísmo
disfarçado acabaram atraindo um número significativo de negros.

De acordo com Martha Abreu76 é isso que explica a presença de negros na


festa do Divino uma vez que essas confrarias representavam um espaço de autonomia
dentro de uma sociedade escravocrata. João José Reis77 ao descrever as irmandades no
Brasil colonial ressalta que a presença de africanos nas festas de Santos católicos era
bastante expressiva incluindo, Associações constituídas somente por negros que tinham
por objetivo vínculos de solidariedades. Nessas Associações as festas dos Santos padro-
eiros, incorporavam “eleições de reis, rainhas, imperadores e imperatrizes que fundavam
no novo mundo encantações de reinos africanos”78 rituais que sempre eram acompanha-
dos de toques de batuques e atabaques. Semelhantemente podemos identificar tais ele-
mentos na festa do divino na Mazagão dos tempos coloniais, mas que persistem até hoje.

Práticas culturais/religiosas que os negros absorveram do cristianismo, mas


que se constituíram em uma forma singular dos negros, expressarem-se através do afro-
catolicismo com suas divindades sendo as louvações, a músicas e a dança

[...] elementos indispensáveis nos festejos dos Santos católicos desde o


período colonial. A participação negra nas irmandades e na folia do Es-
pírito Santo contribuiu diretamente nesses elementos. Os “barbeiros”,
os lundus, eram destaques nas folias do Divino. Para a população estes

75 ABREU, Martha. O império do Divino: festas religiosas e cultura popular (1830-1900). 1996. 507p.
(Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. 1996. p. 09.
76 Ibid., p. 08.
77 REIS, João José, Identidade e diversidade étnicas nas irmandades negras no tempo da Escravidão. In:
Tempo, vol. 2, n. 3, 1997, p. 7-33. p. 4.
78 MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico. Revista
Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. Janeiro-junho de 2014. p. 15
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eram um atrativo para a participação nas comemorações, o que signifi-
cava aumento na arrecadação de donativos para a realização das festas79

Juntamente com as danças vieram também as Cantigas, que hoje são conhe-
cidos, no Estado do Amapá, incluindo a capital e algumas localidades rurais pelo nome
de Ladrões de Marabaixo. A origem das Cantigas pode ser explicada na própria origem
da realização da festividade do Divino. No século XVIII os açorianos das ilhas de São
Miguel, Terceira e Faial realizavam a festa em dois períodos o primeiro era conforme o
calendário litúrgico envolvendo o ciclo da páscoa e o segundo era feito nas duas últimas
semanas de agosto até o final de outubro com o império dos negros ou Espírito Santo dos
pardos. Entretanto por causa das insistentes perseguições da igreja frente a festejos de
Santos envolvendo rituais católicos os membros da elite branca abandonaram tais práticas
“persistindo apenas os costumes do império dos pardos, como o Marabaixo feito com as
Caixas, e os Ladrões”80.

1.5. OS LADRÕES DE MARABAIXO

Os Ladrões são Cantigas compostas em versos formadas por quadras81 segui-


das por refrãos, cantadas durante a dança performática do Marabaixo. As letras das Can-
tigas são compostas pelos próprios integrantes da festividade e a sua inspiração vem de
experiências coletivas da comunidade Marabaixeira. Muitas dessas Cantigas são consi-
deradas pelos integrantes da festividade uma verdadeira herança musical. Isso porque al-
gumas composições contam em versos não apenas a história do Marabaixo mas, a própria
história da ocupação africana no Amapá. Nas letras, é possível identificar temporalidades
históricas implícitas acerca da chegada do africano ao Amapá como mão de obra escrava,
tanto para a construção da Fortaleza de São José de Macapá, quanto, para a ocupação
estratégica do atual distrito de Mazagão Velho, no século XVIII.

Parte das letras das Cantigas que hoje são cantadas por vários grupos prati-
cantes do Marabaixo foram compostas ainda no início do século XX, por membros tradi-

79 Id., p. 40
80 Ibid., p. 44.
81 Quadras ou quartetos são estrofes compostas por quatro versos. Cf. em https://www.norma-
culta.com.br/estrutura-externa-de-um-poema/. Acessado em 23 de abril de 2018.
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cionais da festividade como Raimundo Ladislau, Bernardino Senna, Antônio Barca, Ma-
nuel da Paciência, João Clímaco82. Os referidos compositores tiveram músicas adotadas
por diversos grupos em várias comunidades e são hoje reconhecidos pelo legado musical
que deixaram para a manifestação. No que diz respeito ao conteúdo das letras das Canti-
gas podemos encontrar uma variabilidade de temáticas que vão desde a resistência ao
cativeiro africano em Macapá e em Mazagão, no século XVIII, até chegar em temáticas
mais atuais, como por exemplo, a afirmação da identidade negra. As letras das Cantigas
mais contemporâneas abordam a história dos redutos de incidência da manifestação do
Marabaixo de Macapá (AP), assim como, a relação dessa história com os antepassados
da festividade, que são afrodescendentes. Outras Cantigas abordam a luta pelo direito de
manter viva as suas raízes, o orgulho pela sua ancestralidade, a beleza da cultura negra,
bem como, seus atributos físicos que marcam a sua singularidade.

Daniela Patrícia da Silva Monteiro, “Danniela Ramos”, compositora do La-


drão “Que Negra Tão Linda”, ao descrever o que significa a letra da composição, afirma
que a letra: “reflete a beleza do negro, em especial da negra quando adentra ao salão do
Marabaixo [...] o rufar dos tambores, aquilo mexe com o coração de cada uma de nós, e
a gente se empolga, a gente se orgulha de estar ali, de dançar, e de amar essa tradição que
é o Marabaixo”83. Podemos perceber, a partir desse relato, que as Cantigas de Marabaixo
possuem um grande no papel na afirmação da identidade negra sendo que as mesmas se
fazem presentes por meio de expressões orais84 através de seus sistemas de significações.
A identidade como “significado cultural socialmente atribuído”85 está diretamente ligada
aos sistemas de representação linguística. A representação neste sentido é sempre uma
marca, um traço visível externo que se apropria por meio de sistemas de signos86, ou seja
de palavras contidas nas letras das Cantigas.

82 Considerados personalidades do Marabaixo do Amapá. Raimundo Ladislau, por exemplo, autor de


“Aonde tu vai, rapaz”, Ladrão que conta a história da reforma urbana promovida pelo governador
Janary Gentil Nunes, e da criação do bairro do Laguinho, que posteriormente foi adaptado por Luiz
Gonzaga, e gravado com membros do Marabaixo. Cf. em IPHAN. Inventário das referências culturais
do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas
em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 8.
83 IPHAN. Op. cit. p. 56
84 SILVA, Tomaz Tadeu; HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn (orgs.). Identidade e diferença: A
perspectiva dos Estudos Culturais. 13ª ed. – Petrópolis: Vozes, 2013.
85 SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos da identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2ª ed. 10ª
reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. p. 89.
86 Ibid., p. 90
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Diante de todas as questões já expostas acima, o que mais dizer sobre a ine-
gável importância das Cantigas de Marabaixo no Ensino de História? As letras das Can-
tigas vêm atravessando gerações, são ricos catalizadores de histórias de vida e de genea-
logias locais. Assim, um estudo mais acurado das tipologias dessas Cantigas e das
aprendizagens históricas nelas contidas87, possibilita sistematizar conhecimento histórico
e permite pensar historicamente, o processo de ocupação negra no Amapá, no século
XVIII. Um debate urgente que deve ser feito na comunidade acadêmica e escolar e nos
cursos de formação de professores já que o Brasil é um país de forte herança africana. Por
causa disso, ainda se mantém uma grave distorção histórica quanto a contribuição afri-
cana no processo de formação cultural do país.

Segundo Mônica do Socorro Ramos, filha do mestre Pavão, um dos princi-


pais fundadores do bairro do Laguinho e do Grupo Raimundo Ladislau, seu pai lutou pela
introdução do Marabaixo dentro das escolas, e lhe preparou para sua sucessão conforme,
pode ser evidenciado no relato abaixo:

Eu não gostava muito de Marabaixo, queria era dançar o brega mesmo,


e ele me sentou do lado dele e disse: para com isso, brevemente estou
indo embora e preciso deixar alguma pessoa para me substituir no Ma-
rabaixo. Somos seis filhos: Ana, Paulo Sérgio, Raimundo Lino Filho,
Gerson, Felícia e eu que sou a caçula. Ele falava: hoje você é quem vai
fazer a gengibirra [...] e eu ali desconfiada e ele me levava para as apre-
sentações do lado dele, me ensinava a cantar, a bater Caixa... aí ele me
colocou para estudar, para fazer História, fiquei três semestres e eu não
gostava e saí e fiz pedagogia e me tornei professora. Ensinou-me a cor-
tar o Mastro, a tirar a Murta. Aprendi com ele a lutar, ele me ensinou
que quando a gente mais trata uma pessoa bem, mais ela volta. E agora
estou passando para os meus filhos, todos estão batendo Caixa, três es-
tão cantando, e assim estamos levando para frente. (Mônica do Socorro
Ramos)88

Passados quase meio século que Mestre Pavão, pai de Monica do Socorro
Ramos defendeu que o Marabaixo possui imensas potencialidades a serem exploradas no
Ensino, estamos aqui, para ratificar tais potencialidades no âmbito do Ensino de História.
Propomos através do estudo das tipologias das Cantigas de Marabaixo e das aprendiza-
gens Históricas nelas contidas, a mobilização de saberes e práticas que desenvolvam nos

87 Música no Ensino de História, a tipologia das Canções dos afrodescendentes: Ladrões de Marabaixo
e as aprendizagens históricas nelas contidas se constituem a vértice central deste trabalho de pesquisa.
88 Ficha de Identificação: Formas De Expressão. p. 9 de 26. In: IPHAN. Inventário das referências cul-
turais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível
apenas em meio digital no formato pdf (463 p.)
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estudantes a prática da pesquisa histórica89. Essa proposta apoia-se numa concepção de
Ensino Aprendizagem da história que tem como objetivo central a formação da Consci-
ência Histórica do aluno, a partir do entrelaçamento da música no Ensino de História,
com diferentes saberes que dialogam no interior do processo educativo (científicos, his-
tóricos escolares e sociais).

Nuances que são perceptíveis em matérias didáticos baseados naquilo que


somente a memória viva ainda testemunha e que envolve e marca todo o dia a dia da
comunidade do Marabaixo de Macapá desde a sua preparação, expectativas e execução.
Esperamos que este trabalho de pesquisa possa fornecer uma estrutura minuciosa a res-
peito das letras das Cantigas de Marabaixo e da importância que elas possuem para o
Ensino de História, mas que acima de tudo, contribua com um material didático que cor-
robore com a luta da comunidade negra em manter o Marabaixo, no rol das principais
manifestações culturais do Brasil.

Imagem 33 – Casal de dançadores – Macapá/AP.


Em 19/05/2013. Foto: Eduardo Costa

89 FONSECA, Selva Guimarães. Didática e Prática de Ensino de História: Experiências, Reflexões e


Aprendizados. Ed. Papiros: Campinas, São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e trabalho
pedagógico).
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SEÇÃO 2 – OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS DOS
AFRODESCENDENTES NO AMAPÁ

O Marabaixo conta a sua história e história do seu povo através da dança e


das letras dos Ladrões90 que narram por meio de saga poética, a História do Amapá. O
processo criativo das Cantigas de Marabaixo é realizado pelos praticantes da manifesta-
ção de forma livre e com forte marca de rima nas rodas de Marabaixo. “Aquilo que as
letras das músicas contam e o modo como cantam”91 e como dançam, arrastando os pés
simulando os grilhões que acorrentavam seus ancestrais na época da escravidão, são ele-
mentos emblemáticos presentes em toda festividade do Marabaixo. As letras das Cantigas
compõem de um acervo oral importantíssimo não apenas por ser uma tradição deixada
pelos antepassados da festividade, mas porque como bem salienta seus participantes, o
legado das Cantigas faz parte da mais autentica expressão cultural do Amapá.

Transcrevendo as letras de dois CDs do Marabaixo lançados em 2016 e


201792 respectivamente, observou-se que a temática principal de algumas Cantigas gira
em torno do cativeiro africano em Macapá e em Mazagão Velho, no século XVIII. Estes
CDs trazem um dado interessante: os mesmos se constituem apenas de áudios, e não vem
com encartes das letras. Em princípio, parece ser algo estranho, pois na atualidade, a ma-
neira que o mercado fonográfico tem de dar publicidade a um CD de música é se utili-
zando de todos os meios possíveis para a divulgação das letras para o conhecimento do
público. Mas o Marabaixo mantém as suas peculiaridades, quando os praticantes da ma-
nifestação são indagados sobre os motivos dos CDs não possuírem encarte a resposta
mais próxima obtida é sempre quanto a diminuição dos custos de produção. À medida
que os colaboradores passam a ter empatia com a pesquisa, percebe-se que a explicação

90 Piedade Lino Videira define os Ladrões de Marabaixo como “versos tirados de improviso com objetivo
de criticar, exaltar, agradecer, lamentar ou satirizar todos os fatos ocorridos no cotidiano da comuni-
dade e nas relações sociais, no conjunto maior da comunidade. Os Ladrões são versos roubados da
memória por pessoas que tem habilidades com a rima”. Cf. VIDEIRA, Piedade Lino. Marabaixo:
dança afrodescendente: significando a identidade étnica do negro amapaense. Fortaleza: Universidade
Federal do Ceará, 2009. p. 138.
91 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 27.
92 As Cantigas fazem parte respectivamente dos CDs: Festival cantando o Marabaixo Macapá, Amapá-
Amazônia-Brasil, dez. de 2016. Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, set. 2017. Os interpre-
tes dessas cantigas são considerados grandes lideranças do Marabaixo, porém, a maior parte das letras
pesquisadas não são deles.
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para tal motivo está na lógica da origem das Cantigas que é de, justamente, manter vivo
esse acervo oral deixado pelos seus ancestrais93.

As Cantigas de Marabaixo são constituídos por belas cantigas orais que po-
dem contribuir tanto para a constituição da história do Marabaixo, quanto para a história
do Povo do Amapá94 .E no que diz respeito ao Ensino de História, tais registros corrobo-
ram não apenas como forma de ampliar e diversificar o repertório musical dos estudantes
da Educação Básica mas, sobretudo, porque a inserção dessas Cantigas provenientes de
uma manifestação oral, atestam a herança musical negra que participa como matriz for-
madora do Estado do Amapá. Daí a importância de seu legado. Incontestavelmente, a
historiografia do Amapá se funde com a própria História da manifestação do Marabaixo
uma vez que a origem da festividade está atrelada a chegada de colonos ao Amapá no
século XVIII, para o atual distrito de Mazagão Velho após a desativação da cidade de
Mazagão no Marrocos, e também, de africanos escravizados para a construção da Forta-
leza de São José de Macapá.

A construção da Fortaleza de São José de Macapá (1764-1782) e a criação da


Vila de Mazagão Velho em (1770), fazem parte de um projeto estratégico da Coroa por-
tuguesa em resguardar suas possessões territoriais frente as constantes disputas envol-
vendo Portugal e Inglaterra, Holanda e França e Brasil e França pela região que compre-
ende a Amazônia setentrional. Para a consolidação deste projeto audacioso, segundo o
historiador Edinaldo Pereira Nunes Filho95, foram construídos fortins, fortalezas, aldea-
mentos, povoados e vilas em vários pontos do que é o Amapá. Além disso, foi estabele-
cido “um conjunto de normas que decretavam a liberdade completa e a integração da

93 No transcurso do trabalho de pesquisa foram entrevistados vários praticantes da manifestação, entre


eles Pedro Rosário dos Santos - o “Pedro Bolão”, tocador e fazedor de Caixas de Marabaixo. Na
entrevista concedida para esta pesquisa em 20 de abril de 2018, foi bastante enfatizado sobre a impor-
tância oral do acervo das Canções dos afrodescendentes. É com base neste relato que nos baseamos
para tal afirmação.
94 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.), p. 99.
95 FILHO, Edinaldo Pereira Nunes. Formação Histórica, econômica, social, política e cultural do Amapá:
Descrição e análise do processo de formação histórica do Amapá. In: Amazônia e Amapá Escrituais
de História, editora Paka-tatu, 2008, p. 218.
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população indígena, retirando a tutela religiosa e secular dos Jesuítas, concedida pela re-
gulamentação de 1680”96.

Tal regulamentação, transferia a exploração da mão de obra indígena da mão


de particulares para o Estado e a administração colonial97 . Além de prever, conforme
consta nas Instruções Régias, Públicas e secretas enviadas para o capitão- Geral do Es-
tado do Grão- Pará e Maranhão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado98, a importação
de africanos escravizados. Essa epopeia negra narrando a saga africana ao Amapá em
águas transatlânticas, segundo relatos dos praticantes mais antigos da manifestação, deu
origem as Cantigas em tom de lamento do Marabaixo, as quais são formadas por versos,
denominadas de Ladrões.

2.1. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE LIBERTAÇÃO

Nas letras das Cantigas de Marabaixo a resistência negra a escravidão


constitui-se uma das temáticas centrais, sendo que através delas, outras interligam-se. As-
sim, podemos encontrar Cantigas que retratam além da resistência a escravidão, a resis-
tência religiosa e a resistência cultural, por meio das Cantigas de afirmação da identidade
negra. As Cantigas mais contemporâneas abordam a afirmação da identidade a partir dos
redutos de incidência da manifestação do Marabaixo de Macapá, e a relação dessa histó-
ria, com os antepassados afrodescendentes. No que diz respeito as Cantigas que tratam
sobre a escravidão, elas giram em torno da resistência negra. Está sem dúvida, é um im-
portante tema uma vez que o mesmo, está atrelado ao fato histórico da travessia transa-
tlântica e ao cativeiro negro nos navios negreiros, e que por vez, está interligada ao mito
de origem da dança e do canto da manifestação. É o caso da letra do Ladrão “Mar Abaixo”
dos compositores Manoel Duarte e Rosângela Gungá:

A maré vazou
tô indo de Marabaixo (2x)

Antes de partir canto


e danço Marabaixo (2x)

96
CAMILO. Janaina Valéria Pinto. Homens e pedras no desenho das fronteiras: a construção da Fortaleza
de São Jose de Macapá (1764/1782). Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Insti-
tuto de Filosofia e Ciências Humanas, 2003. p, 185.

98 Cf. Instruções Régias, Públicas e secretas para Francisco Xavier de Mendonça Furtado, capitão-Geral
do Estado do Grão-Pará e Maranhão.in: Mendonça, 1963,1º tomo, p. 27 e 35
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Ah eu vou cantar
O Marabaixo
Ah eu vou dançar
O Marabaixo
(refrão) (2x)

(CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 02, set. 2017)

Logo na primeira quadra poética desta Cantiga temos uma das possíveis ver-
sões romanceadas quanto ao mito de origem do canto e da dança do Marabaixo: “A maré
vazou to indo de mar abaixo”. Apesar da falta de comprovações históricas da manifesta-
ção ter surgido dentro dos navios negreiros, durante as viagens transatlânticas, a comuni-
dade do Marabaixo a tem como justificativa ancestral que dispara a festividade. A relação
do Mar com a origem do Marabaixo é muito forte, não apenas pelo fato histórico estar
ligado ao cativeiro negro durante o período da escravidão no Brasil colonial, mas basica-
mente, porque dentro da cultura africana, algumas etnias como é o caso da Banto, tinham
o mar como sagrado seguindo as crenças Kalunga99. Na letra do Ladrão “Guadariô”, as
crenças Kalunga reverenciando o mar ficam bastante evidenciadas

Se a água do mar é sagrada, guardariô


Água de muita valia, guardariô
Me afoga-me dessas águas, guardariô
O rosário de Maria, guardariô

(interpretado por de Alan Congó, CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº


16, set. 2017)

No trecho acima do Ladrão, podemos ver que essa relação basicamente vem
acompanhada de proteção religiosa, e que neste caso, essa proteção é feita por Nossa
Senhora do Rosário na qual fica explicitada no trecho da estrofe: “o rosário de Maria,
guardariô”. Nossa Senhora do Rosário na cultura afrobrasileira tem uma estreita relação
com uma outra festividade: a Congada. Assim como no Marabaixo, a Congada também
faz a associação de seu mito de origem ao fato histórico da travessia transatlântica dos
africanos escravizados nos navios negreiros. No caso da Congada, a aparição no mar de
Nossa Senhora do Rosário, simboliza para os africanos escravizados proteção religiosa.

99 SOUZA, M. M. Reis negros no Brasil escravista: história da Festa de Coroação de Rei Congo. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2002.
Sobre o uso de barcos em cerimônias fúnebres, consultar:
MALINOWSKI, Bronislaw; FRAZER, James George. Argonauts of the western Pacific: an account
of native enterprise and adventure in the Archipelagoes of Melanesian New Guinea. [Illinois]: Wave-
land, 1984. Sobretudo os capítulos IV, V e VI.
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Já no Marabaixo, acreditamos que a conexão do nome da Santa aos versos das cantigas
se dá porque Nossa Senhora do Rosário é considerada para os marabaixeiros, a Santa
protetora dos negros. Deste modo, o Marabaixo compartilha com algumas festas tradici-
onais provenientes da cultura afrobrasileira, mitos que relacionam o mar com o próprio
surgimento da festividade

Dentre as manifestações africanas aportadas no Brasil o Marabaixo64,


guarda uma especificidade que é a de incorporar ao seu mito de origem
e à sua performance ritual, o translado do Oceano Atlântico. Assim, ele
compartilha com o Congado na região central do Brasil (MG, GO, SP,
RJ) e com o Maracatu em Pernambuco, a centralidade da história dessa
travessia para o complexo ritual, mas com conteúdo menos messiânicos
que nas outras expressões acima citadas. Por que se no congado é Nossa
Senhora do Rosário quem atravessa o mar, mas também o Rei Congo
Galanga, e enquanto no Maracatu é a Rainha Njinga, no Marabaixo são
os próprios homens.100

O Marabaixo, a Congada e o Maracatu, são manifestações que guardam uma


especificidade: o fato histórico de sua origem está relacionada ao tráfico transatlântico de
escravizados da África para a América portuguesa. Fato histórico este que se mesclou
com as crenças trazidas durante a diáspora africana pelos bantos. Os bandos possuem
crenças de que a travessia do mar, sem autorização prévia das entidades que o governam,
era transpor um portal para o mundo dos mortos. Os bantos foram uma das principais
etnias que vieram escravizadas para o Amapá durante o século XVIII101 por isso, consi-
deramos como hipótese possível, de que o mito da origem da dança ter surgido nos
porões dos navios negreiros tenha sido incorporado nas Cantigas sobretudo, naquelas que
abordam como temática, a resistência a escravidão.

2.2. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE TRABALHO E CANTI-


GAS DE DOR

Baseados nos estudos de Du Bois102 a respeito do legado das Canções afro-


descendentes nos Estados unidos, podemos dizer que as Cantigas de Marabaixo certa

100 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 38.
101 CANTO, Fernando. Água benta e o Diabo. Fundecap: Governo do Estado do Amapá, 1998, p.18. O
autor faz referência a: BUARQUE, Aurélio Távora, In: História do Amapá, Jornal novo Amapá, nª
1574. Imprensa oficial, Macapá, 1972.
102 W. E. B. Du Bois, é uma das mais importantes personalidades políticas e intelectuais norte-americanas
no século XIX. Du Bois, tornar-se-ia uma das maiores lideranças do pensamento político negro norte-
americano e do pan-africanismo. In: ABREU. Martha. Op. cit. p. 179.
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similaridade com aquilo que o pesquisador categorizou como Canções de trabalho e
Canções de dor. As Canções de trabalho e Canções refletem a dor da escravidão, do duro
trabalho compulsório sendo que nesta categoria enquadram-se letras que abordam a re-
sistência africana a escravidão. Esta resistência está associada ao trabalho rítmico dos
africanos escravizados tanto na Construção da Fortaleza de São José de Macapá, quanto
no povoado que foi fundado em 1770 as margens do rio Mutuacá: Mazagão Velho. As
Cantigas de trabalho e Cantigas de dor, tem como signo central elementos como valor,
retidão, moral, integridade e resistência e erguem-se, para os afrodescendentes praticantes
da manifestação, como a mais autentica expressão de Cantigas que se reportam a sua
ancestralidade, durante o período da escravidão no Amapá.

Eu vim de longe
fui forçado a trabalhar (2x)
Preso e humilhado
mas não deixei de cantar (2x)
(refrão) (2x)

Perdi amigos
Minha história é conhecida
Perdi amigos
Minha história é conhecida

E mesmo assim
Vou cantando pela vida
E mesmo assim
Vou cantando pela vida

(Trecho da letra do Ladrão Mar – Abaixo. CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº
02, set. 2017)

De fato, como assinala Du Bois, as Canções de trabalho e Canções de dor,


trazem como expressão maior o julgo do trabalho forçado durante a escravidão, tônica
que fica atestada na letra do Ladrão Mar Abaixo: “Eu vim de longe e fui forçado a traba-
lhar”. Mas também, exalta valores morais em meio as atrocidades sofridas, valores liga-
dos a honra dos escravizados em se manter firmes e não se sentirem diminuídos pela
escravidão como mostra o verso “preso e humilhado, não deixei de cantar”. Assim, as
cantorias dos negros nas senzalas, segundo seus descendentes que hoje são responsáveis
pelas composições dessas Cantigas, foi a forma encontrada pelos seus ancestrais para se
manterem em conduta honrosa, e por mais que seja contraditório se pensar que em meio
ao sofrimento nas senzalas se cantava e dançava, a música foi a maneira que os africanos

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escravizados encontraram para manter-se em integridade e retidão com seus lugares de
origem.

A esse respeito Martha Abreu, partindo dos estudos de W. E. B. Du Bois,


apresenta uma classificação tipológica das Canções entoadas pelos afrodescendentes de-
finindo, segundo Du Bois, o “som do cativeiro” – as Canções de trabalho e Canções de
dor como:

‘a expressão mais bela e original da vida e da nostalgia humanas jamais


nascida em solo americano’: ‘Originária das florestas africanas, onde
sua contraparte ainda pode ser ouvida, ela foi adaptada, alterada e in-
tensificada pela trágica vida interior (soul-life) do escravo até que, sob
pressão da lei e da chibata, tornou-se a expressão única e verdadeira da
dor, do desespero e da esperança de um povo’. Em outro capítulo, The
Sorrow Songs, Du Bois ampliou a perspectiva da Canção escrava e in-
cluiu, ao lado da ‘música da religião negra’, as Canções de amor e as
Canções de trabalho na categoria ‘Canções de dor’ (Sorrow Songs). Da
mesma forma lhes deu um papel especial. Em suas palavras ‘as Canções
do povo negro – o grito rítmico do escravo – erguem-se hoje, não só
como a única música americana, mas como a mais bela expressão de
experiência humana nascida deste lado dos mares’103

O “som do Cativeiro” e da resistência a escravidão, é uma marca identitária104


bem presente nas Cantigas de Marabaixo. Essas letras que hoje são compostas alimentam
a própria sobrevivência e identidade cultural da manifestação. O sabbats africano105, a dor
do exilio, “lembrança de uma pátria distante já que para lá não retornariam, ao mesmo
tempo próxima, pois não queriam esquecê-la” 106, são bem emblemáticas, durante a festi-
vidade do Marabaixo. Para os afrodescendentes expor nos versos dessas Cantigas a resis-
tência de seus ancestrais a escravidão significa mostrar a honradez de sua descendência.
Significa mostrar que mesmo subjugados, os africanos resistiram veementemente a es-
cravidão, e que nos poucos momentos contados que recebiam “liberdade” para cantar e

103 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, p.177-204, 2015. p. 181
104 A identidade é relacional, e assim é marcada pela diferença é a vertente teórica na qual nos reportamos
a partir dos estudos de: HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 11. Ed. Rio de Ja-
neiro: DP&A, 200, p. 13 e WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: uma introdução teórica e
conceitual. In: SILVA, Tomaz T. (org.) identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. 4.
ed. Petrópolis: Vozes, 2000.
105 ABREU. Martha, Op. cit. p. 185.
“Sabbats africano”, Expressão utilizada para designar Canções de dor. Utilizadas para amenizar o
banzo (tristeza ou saudade da terra natal), as quais eram entoadas pelos africanos escravizados no
período do cativeiro.
106 Ibid., p. 185.
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dançar nas senzalas, não deixavam de entoar em suas Cantigas a dor e o sofrimento du-
rante as árduas tarefas diárias, como bem atesta a letra do Ladrão de Marabaixo a seguir:

O negro que foi pro tronco


Passou pela crueldade
O tal capitão do mato
Que não dava liberdade

Hoje tem a sua honra


Sentimento e emoção
Com a força do trabalho
Construiu nossa nação
(refrão)

A vida de sofrimento
guardou em sua memória
Na senzala ou no tronco
Escreveu sua história

(Trecho do Ladrão “Meu Tambor Rolou”, interprete José Hozana. CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-
Amazônia-Brasil, faixa nº 15, set. 2017)

Assim, a resistência ao cativeiro entoado nas Cantigas de trabalho e Cantigas


de dor, cantadas pelos afrodescendentes durante a festividade do Marabaixo, narram por
meio dos versos de Ladrões e da dança, a história da resistência à escravidão no Amapá.
Para os praticantes da manifestação hoje, as composições dessas Cantigas possibilitam
mostrar através da festividade, a resistência de seus ancestrais à escravidão. Porém agora
com um outro propósito: de marcar por meio da oralidade dessas Cantigas, tais como as
entoadas pelos seus antepassados, que foi graças a música que seus ancestrais mantiveram
a África viva dentro de si107. A África de seus ancestrais só foi possível se manter perpe-
tuada durante o período da escravidão no Amapá porque os negros trouxeram em seus
músculos a sua experiência e sua identidade musical de seus lugares de origem e foi atra-
vés de tais Cantigas, que os locais de onde foram arrancados puderam ser acessados, como
bem atesta o trecho do Ladrão seguinte:

De Marabaixo eu vim
Trazendo tudo de lá
A mãe África está em mim

107 As religiões de matrizes africanas resistiram durante o cativeiro negro porque vieram alojadas nos
corpos dos cantadores sob formas de matrizes culturais in: CANDAU, Joël. O jogo social da memória
e da identidade: transmitir, receber. In. Memória e Identidade. São Paulo: Contexto, 2012. p. 120.
Consultar também:
ANTONACCI, Mari Antonieta. Memórias ancoradas em corpos negros. São Paulo: EDUC, 2013.
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É negro o meu cantar

(Trecho do Ladrão “Divino Rei”, interpretado por Laura do Marabaixo. CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-
Amazônia-Brasil, faixa nº 08, set. 2017)

2.3. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE AMOR

É dessa junção das Canções de trabalho e Canções de dor que provavelmente


surgem uma subcategoria: as Canções de amor108. As Cantigas de amor do Marabaixo
refletem toda saudade de um amor que fora deixado contra à vontade em um lugar distante
como mostram os versos a seguir:

Eu vou me embora, vou me embora


Por onde vai a baleia

(refrão)

Eu tenha pena de deixar


O meu amor em terra alheia

(refrão)

Eu subi pelo tronco, desci pelo galho


Senhora me aguenta, senão eu caio
Eu caio, eu caio, eu caio
Senhora me aguenta, senão eu caio
(2x)

(Trecho do Ladrão “Eu caio, eu caio”, interpretado por Danny Pancadão) -CD: Marabaixo. Macapá,
Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 09, set. 2017)

Ou da procura incessante da mulher amada na qual o destino quis que se se-


parassem:

O meu balão de ouro, Açucena(2x)


Minha cabocla roxa é morena (2x)
(refrão – 2x)

Eu pra ti levar, eu não posso (2x)


Eu pra ti deixar, tenho pena (2x)

(refrão – 2x)

Quando eu aqui cheguei, oh Açucena (2x)


Por ti logo perguntei, oh morena (2x)
(refrão – 2x)

108 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, 2015, p. 181.
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Não me deram novas tuas, oh Açucena (2x)
Que ver como eu chorei, oh morena (2x)

(refrão – 2x)

Se és vivente no mundo, oh Açucena (2x)


Eu também quero viver, oh morena (2x)
(refrão – 2x)

Se eu fosse e não mandasse, oh Açucena (2x)


Não perdi o que eu perdi, oh morena (2x)
(refrão – 2x)

Isso tudo acontece, oh Açucena (2x)


Quem manda podendo ir, oh morena (2x)

(refrão – 4x)

(Trecho do Ladrão “Balão de ouro”, interpretado por Aureliano Nek) -CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-
Amazônia-Brasil, faixa nº 14, set. 2017)

Embora as Cantigas de amor sejam temáticas mais romanceadas, segundo


Abreu, elas se enquadram na categoria de Canções de trabalho e Canções de dor porque
seguem uma mesma linha: mostram todo sofrimento que a escravidão causou. Seja por
mostrar todo o sofrimento dos maus tratos físicos do trabalho forçado, da dor da separação
da família, da saudade da terra de origem e até mesmo de um grande amor que ficou para
trás. As Cantigas de amor podem ser compreendidas como grandes Cantigas de resistên-
cia e lamento. São Cantigas que seguem todo um protocolo para ser cantado, dançado e
tocado nas rodas de Marabaixo e basicamente acontecem da seguinte forma: as Cantigas
são mais lentas, os passos mais compassados simulando na dança os pés acorrentados e o
toque da Caixa com cadência mais vagarosa para mostrar a saga de seus ancestrais109.
Saga que se inicia no Amapá em 1765, com a Construção da Fortaleza de São José de
Macapá.

109 No transcorrer do trabalho de pesquisa os aportes teóricos sinalizaram para a classificação das fontes
pesquisadas com base no cruzamento dos dados coletados. Em pesquisa etnográfica realizada durante
o Ciclo do Marabaixo em 2017 e 2018, constatou-se por meio de observação e de entrevistas com
praticantes da festividade, a importância da simbologia das expressões corpóreas nas Canções de dor,
os quais são tipificados dentro da manifestação do Marabaixo como “Canções de lamento”. Dados
coletados com Fabio Oliveira, membro de família tradicional do Marabaixo, neto de Raimundo dos
Santos Souza- “Mestre Sacaca”. Entrevista concedida em 15 de abril de 2018.
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2.4. A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ: SANGUE, SUOR E MUSI-
CALIDADE NEGRA NA SUA CONSTRUÇÃO

De acordo com o Inventário de Referências Culturais do Marabaixo do


Amapá produzido pelo IPHAN em 2013, a “[...] Fortaleza de São José de Macapá foi
construída com o objetivo de defender o território português das invasões estrangeiras”110.
A ligação da Fortaleza com o Marabaixo se dá em virtude da utilização da mão de obra
escrava trazida da África para o Amapá no século XVIII para a sua construção. Assim,
os praticantes mais antigos se reportam a Fortaleza como um lugar onde os africanos
escravizados “nos tempos setecentistas da colonização se reuniam para cantar, tocar e
reviver as suas lembranças”111. O certo é que os negros que trabalharam na construção da
Fortaleza trouxeram da África para o Amapá suas Cantigas e suas danças sendo que os
antepassados de maior respeito dentro do Marabaixo são sempre reportados pelos prati-
cantes da manifestação como os descendentes diretos dos escravizados que trabalharam
na construção do Forte.

No período da construção da Fortaleza de São José de Macapá uma grande


quantidade de mão de obra cativa foi trazida da África para o Amapá. Inaugurada em 19
de março de 1782, a Fortaleza de São José de Macapá é sem dúvida, uma das mais im-
portantes edificações da arquitetura portuguesa, construída durante o período do Brasil
colonial. Localizada na cidade de Macapá na margem esquerda da foz rio Amazonas,
“esse gigante” de pedra é um testemunho vivo da rijeza da ocupação portuguesa no
Amapá. Salvaguardada as devidas proporções, a edificação da Fortaleza é tão grande
quando o maior rio de água do doce do mundo que o cerceia: o rio Amazonas. Na foz do
rio Amazonas é possível contemplar o imponente Forte e as belezas naturais que deixam
a construção mais encantadora ainda e convidativa para se apreciar. O entorno do Forte é
um espaço bastante procurado nos período da mare baixa para os apreciadores do fut-
lama112, e na maré alta para a prática do kitesurf e também, por causa do seu complexo
de lazer (ver imagem 34).

110 Ficha de Identificação: Sítio. Marcos edificados. p. 6 de 27. In: IPHAN. Inventário das referências
culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponí-
vel apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
111 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 67.
112 O Fut-lama é uma prática esportiva realizada as margens do rio Amazonas. O Fut-lama é uma adapta-
ção do futebol tradicional. A única diferença é que ao invés de campos e arenas os jogadores utilizam
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Imagem 34 – Torneio de Fut-lama. Ao fundo, a prática do kitesurf. Fonte: https://www.alcinea.com/ma-
capa/o-que-vi-hoje-na-orla-de macapá. Foto: Alcinéia Cavalcante. Acessado em 29/12/2017

Imagem 35 – Vista aérea Parque do Forte e do seu complexo de lazer. Macapá/AP.


Fonte: https://josealbertostes.blogspot.com.br/2011/03/apresentacao-sobre-fortaleza-de-sao.html
Foto: Acervo do Governo do Estado do Amapá, 2008

Para os apreciadores desse belo cartão postal da cidade de Macapá (AP), o


marco edificado da Fortaleza, hoje apenas representa, um dos raríssimos vestígios da ocu-
pação original lusitana em terras amapaenses integrado ao restante do bairro Central.
Bairro esse onde está localizado a fortificação (ver imagem 35). O que pouco ainda se

a lama (solo arenoso com alta concentração de sedimentos) do Rio Amazonas quando a maré está em
baixa. Já o kitesurf é uma prática desportiva que utiliza um paraquedas de pequeno porte e uma prancha
madeira ou fibra de carbono para efetuar manobras sobre a superfície da água. É considerada pelos
praticantes esporte de aventura.
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lembra, até mesmo pelos próprios frequentadores do complexo, é que essa edificação foi
construída a custo de muito suor e sangue de indígenas e negros. Sangue, suor e musica-
lidade ditavam os ritmos de trabalho escravo na construção da Fortaleza de São José de
Macapá, uma vez que os africanos escravizados tinham seus ritmos de trabalho ditados
por marchas militares, sendo que está marcação rítmica realizada por instrumentos musi-
cais, como por exemplo, o tambor europeu, acabou por influenciar um dos principais ins-
trumentos utilizados na festividade: A Caixa de Marabaixo113.

De acordo com o IPHAN, foi pela mesma cadência rítmica ditada pelos ins-
trumentos musicais que proferiam as ordens do trabalho na construção da Fortaleza de
São José de Macapá que os africanos escravizados subvertiam a ordem, a estrutura lógica
de trabalho, recriando em suas Cantigas a árdua rotina diária. No que diz respeito à in-
fluência de instrumentos europeus de marcação do trabalho escravo na construção da For-
taleza de São José de Macapá e a sua relação com o Marabaixo atual, o IPHAN em pes-
quisa etnográfica em 2013 constatou:

[...] enquanto o domínio senhorial oferecia a marcha, a cadência, os es-


cravos em seus momentos contados para si investiam contra a ordem da
marcha monótona que os tambores nos quais eram subjugados tocavam.
E como podiam fazer isso? Apresentavam seus ritmos típicos como do-
braduras que quebravam a linearidade do toque militar. Essa especula-
ção acha indícios de sua possibilidade histórica nos elementos musicais
do Marabaixo atual. O Marabaixo atual apresenta duas variações o Ma-
rabaixo tradicional do toque aparentando o candomblé reafirma a ma-
triz africana de prática. Neste segundo caso, durante o acompanhamento
da Murta e do Mastro, o toque mais afeito a religiosidade africana, na
prática neste segundo caso durante o acompanhamento da Murta e do
Mastro, o toque tem uma conotação de proteção contra as forças exter-
nas, fato este confirmado pelo ato das mulheres com os feixes de Murta
nas mãos, dançarem na rua como se tivessem varrendo caminho, exis-
tem também os depoimentos dos entrevistados que confirmam o valor
de proteção e limpeza ligado a Murta.114

113 Ficha de Identificação: Formas De Expressão. p. 20 de 26. In: IPHAN. Inventário das referências
culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponí-
vel apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
114 Ficha de Identificação: Ofícios e Modos de Fazer. p. 9 de 20. In: IPHAN. Inventário das referências
culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponí-
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2.5. OS LADRÕES DE MARABAIXO: CANTIGAS DE RESISTÊNCIA RELI-
GIOSA

Além das Canções de trabalho e Canções de dor, os negros entoam nas sen-
zalas Canções que tinham por objetivo exorcizar o banzo. Para isso, se apegavam aos seus
deuses e as suas crenças como forma de se manter conectados com a África que estava
viva em seus músculos. É sabido que as religiões de matriz africana no Brasil, bem como
as próprias manifestações culturais trazidas entre os séculos XV e XIX durante a diáspora
negra, sofreram influência da religiosidade lusa, mas mantiveram em sua essência ele-
mentos da cultura africana. Tolhidos de cultuar seus deuses negros, os africanos escravi-
zados buscaram formas de reinventar suas matrizes de origem transplantando aos Santos
católicos a sua religiosidade por meio das Cantigas:

[...] certas religiões conseguiram permanecer vivas é porque os inicia-


dos vindos da África trouxeram sob formas de matrizes físicas alojadas
na intimidade de seus músculos, os deuses e os ancestrais étnicos- de
tal forma que era suficiente, na nova terra, escutar de novo os leitmotiv
musicais das divindades que se haviam encarnados entre seus corpos,
para que a África despertasse e se expressasse novamente [...]115

As heranças das Cantigas orais africanas trazidas nos corpos de cantadores


durante a diáspora transatlântica, contém narrativas de corpos e danças que se tentou si-
lenciar durante o processo de escravidão116. Mesmo sendo apartados de suas cosmologias,
a musicalidade e a sensibilidade musical dos negros resistiu em seus corpos através de
suas danças e das lembranças sonoras de seus instrumentos musicais. Segundo os prati-
cantes da manifestação a Caixa de Marabaixo possui reminiscências sonoras que repor-
tam às narrativas de fuga, a melancolia do banzo e a conexão cósmica com suas matrizes
de ascendência africana. Antonacci enfatiza que nos corpos negros, nas reminiscências
sonoras de seus instrumentos musicais e em suas Cantigas entoadas podemos encontrar:

[...] a sensibilidade musical dos pretos, a destreza e habilidades de seus


instrumentos de corda e percussão. Todavia, avaliando essa herança em
termos de tendência musical, em que o escravo nosso cantava pelo pra-
zer de cantar, refez silêncios em torno de suas culturas acústicas. Sem

115 CANDAU, Joël. O jogo social da memória e da identidade: transmitir, receber. In. Memória e Identi-
dade. São Paulo: Contexto, 2012. p. 120
116 ANTONACCI, Mari Antonieta. Memórias ancoradas em corpos negros. São Paulo: EDUC, 2016. p.
157.
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propor sentidos a sua bagagem musical armazenada de saudades do ou-
tro mundo - de onde trouxeram os escravos seus tambores, flautas, ago-
gôs, afofiês, tabaques, marimbas.117

Assim, as Cantigas de Marabaixo que evocam a resistência religiosa, na qual


tem o tambor como elemento fundamental, ora neste caso, sagrado, incorporou nas festas
tradicionais elementos da religiosidade colonial118, como bem pode ser atestada no trecho
do Ladrão “Vem pra cá ioiô”, interpretado por Arthur Mendes.

Amanhã é dia Santo


Dia de corpo de Deus odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Divino Espírito Santo


A nossa capela cheira odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Cheira cravo e a rosa


E a flor de laranjeira odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Valei-me nossa senhora


Valei-me nosso senhor odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Nossa Senhora me ajude


Nosso Senhor me ajudou odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Quando é na sexta-feira Santa


A Santa sai de preto odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Chorando pela morte


Pela morte do destino odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá
E Jesus sai no esquife
Porto vale-me Deus odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Coberto com pano branco


Com as flores pedaço eu odiá

117 Ibid., p. 157.


118 REIS, João José. Identidade e diversidade étnicas nas irmandades negras no tempo da escravidão.
Tempo, vol. 2, n. 3, 1997, p. 04.
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Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá
Nossa senhora da glória
Glorifique meu senhor odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Quando ele desce da cruz


Resplandece no.... odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Minha mãe chora Maria


O meu pai chora José odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Segundo domingo de outubro


Dia de Nazaré odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá (4x)

(CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 17, set. 2017)

Por outro lado, observa-se em alguns fragmentos da letra do Ladrão “Vem


pra cá ioiô”, a africanização119 da religião católica, como é o caso desta quadra poética:
“Quando é na sexta-feira a Santa sai de preto, odiá, Vem pra cá ioiô, Vem pra cá iaiá”.
Trazemos a seguinte hipótese: de que a Santa em questão é Nossa Senhora, conforme
aponta o seguinte fragmento “Valei-me Nossa Senhora, valei-me nosso senhor odiá (..)”
. Outra possibilidade é de que a Santa possa estar associada a uma expressão proveniente
da cultura afro-brasileira - “odiá”. É possível que a expressão “odiá” seja uma variação
de (Odô Iyá)120 saudação que na cultura afro-brasileira significa salve Iemanjá, a senhora
das águas. Contudo, ao longo desta pesquisa, observamos na comunidade do Marabaixo
uma possível associação entre elementos de matriz africana com a festividade não é
aceita. O certo é que as Cantigas de Marabaixo são oriundas de tradição oral sendo que
alguns versos passaram por variações semânticas e léxicas. Assim, uma mesma cantiga,
dependendo de quem canta, pode ser ouvida de forma diferente com variantes tanto na

119 ABREU, Martha. O império do Divino: festas religiosas e cultura popular (1830-1900). 1996. 507p.
(Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. 1996. p. 8.
120 CRIS. Umbanda sem mistérios e complicações: Glossário da Umbanda saudações e expressões. Dis-
ponível em http://umbandawiki.blogspot.com.br/2015/12/glossario-de-umbanda-saudacoes-e.html.
Acessado em 01/11/2017.
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pronuncia quanto no significado das palavras e expressões. Este por exemplo, pode ser
o caso da expressão - “odiá”.

Outras expressões nos trechos do Ladrão “Vem pra cá ioiô” também comple-
mentam a ideia de que a Cantiga pode estar associada a elementos provenientes da cultura
afrobrasileira, como por exemplo, o cheiro das flores. Na cultura afro-brasileira o cheiro
das flores tem todo um significado simbólico. Nas regiões de matriz africana por exem-
plo, o ponto focal é o Congá121, altar profusamente enfeitado com flores inclusive com
folhas de laranjeira, que simbolizam a energia dos diferentes Santos e Orixás, expressão
que claramente fica evidenciada no trecho a seguir:

Divino Espírito Santo


A nossa capela cheira odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Cheira cravo e a rosa


E a flor de laranjeira odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá
(....)
Nossa senhora da glória
Glorifique meu senhor odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá
(....)
Minha mãe chora Maria
O meu pai chora José odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

Segundo domingo de outubro


Dia de Nazaré odiá
Vem cá ioiô
Vem pra cá iaiá

(Trecho do Ladrão: Vem prá cá ioiô -CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 17, set.
2017)

Uma outra características das Cantigas de Marabaixo que tem por temática a
resistência religiosa, está no culto de adoração ao Divino Espírito Santo e a Santíssima
Trindade. Podemos dizer que na capital do Estado do Amapá este é o alicerce central das
Cantigas já que a própria festividade do Marabaixo de Macapá presta honra, tanto a um,

121 Id. Nota 110.


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quando ao outro122. Além da reverencia ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trin-
dade, temos um panteão de Santos católicos presentes nas letras das Cantigas entre eles:
São José, Nossa Senhora de Nazaré, São Cosme e Damião, São Benedito e São Jorge123.
Nos trechos por exemplo, da letra “Vem pra cá ioiô”, de Arthur Mendes, encontramos
citações também ao Divino Espírito Santo conforme atesta o verso acima mencionado,
mas também, a Nossa Senhora da Glória124 e a São José. São José por sinal, é um Santo
que comumente aparece em trechos de outros Ladrões. É o caso do Ladrão “Resgate a
festa de São José”, interpretado por Naira, o qual presta reverência ao Santo padroeiro da
cidade de Macapá.

[...]
“Oh meu Padroeiro São José abençoe a nossa cidade e todas as famílias da nossa comunidade
(narração)

Na porta da minha casa eu sentei-me a rezar


Pedindo a São José
Que abençoe o meu cantar
Que abençoe o meu cantar” (2x)
(CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 1, set. 2017)

E também na quadra poética do Ladrão “Mistura de raças”, interpretado pela


Del Marabaixo.

Valei-me meu São José


Padroeiro de Macapá
Rosa branca serenata
Eu te quero namorar

(CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 11, set. 2017)

A São Thiago e a Nossa Senhora de Assunção125, presente na letra do Ladrão


“Mar Abaixo”, de autoria de Manoel Duarte e Rosângela Gungá, o qual já foi analisado

122 A santíssima Trindade é representada no catolicismo pela onipresença una do Pai, filho e Espírito
Santo. Já Divino Espírito Santo, é a manifestação espiritual na terra, do Espírito de Deus.
http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/estudos-patristicos/574-a-doutrina-da-
santissima-trindade-nos-padres-pre-nicenos Acessado em 02/06/2017.
123 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 13.
124 O título Nossa Senhora da Glória refere-se à passagem da Virgem Maria da vida terrena para a vida
celestial. Santos e ícones católicos. O significado de Nossa Senhora da Glória. http://cruzterra-
Santa.com.br/significado-e-simbolismo-de-nossa-senhora-da-gloria. Acessado em 12 de novembro de
2017.
125 São Thiago e Nossa Senhora da Assunção possuem todo um simbolismo na história de Mazagão Velho
(AP). Esta representação está relacionada ao fato histórico da transmigração portuguesa da Mazagão
Marroquina e a ocupação estratégica da Mazagão Amazônica (AP) pelos portugueses no século
XVIII. Somado ao episódio das batalhas entre portugueses e muçulmanos temos a devoção religiosa
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anteriormente e devidamente classificado, dentro da categoria Canções de trabalho e Can-
ções de dor. Aqui, podemos encontrar mais de uma classificação para a letra uma vez que
as Canções de trabalho e Canções de dor, tem como abordagem a resistência ao trabalho
escravo referendando também, a fé e o apego a Santos como forma de refrigério para o
sofrimento da escravidão. Fé que neste caso, estão nos Santos católicos que o negro afri-
canizou126 devido o contato, com o catolicismo português.

Meu Santo é forte


Tenho minha devoção (2x)

Sou bem guardada


por Thiago e Assunção (2x)

(Trecho do Ladrão Mar Abaixo CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 2, set.
2017)

Logo, em diferentes Cantigas que trazem enquanto temática a resistência re-


ligiosa existem versos em que aparecem um agrupamento de Santos católicos que as ve-
zes convergem com elementos da cultura afrobrasileira. Em alguns casos, isso fica per-
ceptível nas Cantigas porque as mesmas são acompanhadas de algumas palavras e ex-
pressões. Já em outros casos, os versos das Cantigas fazem apenas referência ao panteão
de Santos católicos. Mas, como essas Cantigas possuem todo um procedimento de ex-
pressões corporais a serem seguidas é na dança que se percebe esses elementos. Em pes-
quisa de campo durante o Ciclo do Marabaixo de Macapá (março a junho de 2018), em
certo momento da observação da dança do Marabaixo, constatou-se que algumas Cantigas
não eram dançadas de forma tradicional – arrastando os pés simulando os pés acorrenta-
dos dos africanos escravizados. A esse respeito um dos colaboradores da pesquisa que
pediu para não se identificar disse:

A dança tradicional nas rodas de Marabaixo se compõe de movimentos


circulares em sentido anti-horário arrastando os pés como forma de
lembrar dos grilhões que prendiam os pés de nossos antepassados, mas
como vocês mesmos estão verificando, existem Ladrões em que as dan-
çadeiras apenas levantam as mãos para o alto e não fazem rodopios com

lusa. Cf. em DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão
(Velho) do Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004. p. 15.
126 ABREU, Martha. O império do Divino: festas religiosas e cultura popular (1830-1900). 1996. 507p.
(Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. 1996. p. 08.
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a saia porque esses cânticos que estão sendo dançados são Ladrões re-
ligiosos.127

O gesto que o colaborador chama de “levantar as mãos para o alto” e que


aparentemente serve apenas para singularizar uma expressão corpórea característica deste
tipo de Cantiga, ao ser analisado mais aprofundada mente, observa-se que tem similari-
dades com o protocolo de algumas expressões corporais de danças de matriz africana.
Em algumas religiões de matriz africana por exemplo, o dançar característico é justamente
com mãos espalmadas para cima fazendo movimentos circulares ou apenas braços abertos
com mãos para o alto. Diante disso, levantamos a seguinte hipótese: de que as cantigas
de resistência religiosa possuem na dança algumas expressões corpóreas similares com
as danças de matriz africana, conforme podemos constatar logo baixo, nas imagens 36 e
37. Porém, enfatizamos que isso são hipóteses levantadas pela pesquisadora, mas que para
serem comprovadas carecerem de um estudo aprofundado na área de etnodança. O certo
é que para a comunidade do Marabaixo, tal similaridade é completamente rechaçada.

Imagem 36 – Umbanda, dança da vida. Foto: Templo Escola Filhos do Mar. Disponível em http://tefi-
lhosdomar.org/index.php/2015/09/29/umbanda-a-danca-da-vida/. Acessado em 23/04/2018

127 Relato concedido dia 06/05/2018 por um marabaixeiro pertencente a organização do Festival Estu-
dantil Cantando o Marabaixo.
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Imagem 37 – Ciclo do Marabaixo, 2017. Dança do Marabaixo. Barracão da Tia Gertrudes.
Foto Aydano Ferreira. Arquivo pessoal da pesquisadora

2.6. OS LADRÕES DE MARABAIXO: A RELIGIOSIDADE DE MACAPÁ E


MAZAGÃO VELHO NA FESTA DO DIVINO

Com base nas Cantigas de Marabaixo pesquisadas observamos que do pan-


teão de Santos presentes nas letras dessas Cantigas, sem dúvida, a reverência máxima de
louvação que se presta na festividade do Marabaixo de Macapá (AP) , é ao Divino Espírito
Santo e a Santíssima Trindade. Eles integram também a parte central dos rituais católicos
presentes na manifestação do Marabaixo no distrito de Mazagão Velho (AP) sendo bas-
tante rica em devoção, comidas, bailados, rezas de folia, ladainhas e louvações. As letras
das Cantigas de Marabaixo que são entoadas nas festas tradicionais são cheios de sim-
bolismos, representações e práticas contidas na prossecução que envolvem os cortejos, a
derrubada e a Levantação do Mastro128. Em Macapá (AP), os festejos são seguidos de
rezas, cantorias e danças de Marabaixo com o propósito de rogar e agradecer a proteção
tanto ao Divino Espírito Santo, quanto a Santíssima Trindade. Já no distrito de Mazagão

128 O Cortejo, a Derrubada e a Levantação do Mastro são rituais contidos na parte sacra da festividade do
Marabaixo. Essa liturgia envolve a louvação ao mais alto grau da espiritualidade cristã neste caso, a
Santíssima Trindade e ao Divino Espírito Santo. Ambos não possuem representação em forma hu-
mana, mas são simbolizados nos rituais através das Coroas que ficam em altares nas casas dos organi-
zadores da festa, juntos com os Santos de devoção pessoal da preferência de cada família. Todos vão
compondo um panteão que vai além dos Santos e adota muitas vezes, o preto velho e Yemanjá, de
forma discreta. São comuns: São Jorge, São Cosme e Damião, várias invocações de Nossa Senhora e
São Benedito. Cf. em IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto
5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf
(463 p.), p. 48.
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Velho (AP), a festa é em louvor ao Divino Espírito Santo sendo que além dos mesmos
elementos já citados nos rituais, cabe destacar nos cortejos a coroação do imperador

O imperador – exerce a função de representar o Espírito Santo após a


coroação, sendo eleito pela comunidade para organizar durante todo
ano a festa do Divino. Eduardo Etzel afirma “que o imperador do divino
(o festeiro) age como um soberano, é generoso e extravagante, reina
durante um ano e termina seu reinado com festas de luxo e prodigali-
dade”. Ou seja, a figura do imperador era extravagante e ostentava um
poder simbolicamente externado na Coroa e no cedro. Esses símbolos,
por sua vez, são elementos em prata que a priori tinham uma cruz com
a encimá-lo. Entretanto a cruz foi substituída pela esfera.129

No caso da festa do Divino no distrito de Mazagão Velho (AP) a coroação é


representada pela figura da imperatriz, uma menina de até 13 anos de idade que representa
o Santo da festa. Conhecidas como empregadas do Divino, “as meninas que desempe-
nham os cargos na festividade são selecionadas através de sorteio no ano anterior”130,
sendo que um dos “momentos marcantes é o cortejo que traz esses personagens”131. Ape-
sar das distinções no que diz respeito a simbologia da coroação da imperatriz na festa do
Divino em Mazagão Velho (AP), e da representatividade das Coroas na festa do Divino
que acontecesse no Ciclo do Marabaixo de Macapá (AP), podemos dizer que em ambas,
os Ladrões que são entoados personificam atributos ora espirituais, ora humanos, à ter-
ceira pessoa da Trindade.

Assim, a representação do Divino nas folias de Marabaixo simbolizam a re-


aleza da divindade do Espírito Santo132 e, tal como a de um monarca, como bem pode ser
evidenciado na letra do Ladrão abaixo.

Salve o Divino Rei


E o raiar de um novo dia
Divino Espírito Santo
Minha fé em harmonia
Caixa rufou, anunciou
Chegou a hora
Vou cumprir minha missão
Até o romper da aurora
(refrão)

129 ABREU, Martha. O império do Divino: festas religiosas e cultura popular (1830-1900). 1996. 507p.
(Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. 1996. p. 37.
130 MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico. Revista
Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. Janeiro-junho de 2014. p. 43 e 44.
131 MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico. Revista
Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. janeiro-junho de 2014. p. 43.
132 Fábio José do Espírito Santo - Relato concedido dia 05/05/2018
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[...]
Minhas raízes
Devotas rezam com fé
Do divino Espírito Santo
Padroeiro São José

(Trecho do Ladrão Divino Rei. CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 8, set. 2017)

Apesar das distinções entre a festa do Divino, que ocorre em Mazagão Velho,
e a que ocorre em Macapá, em ambas temos rituais envolvendo a dança do Marabaixo e
as Cantigas de Marabaixo representando a majestade da divindade do Espírito Santo. Em
Macapá (AP), a devoção ao Divino Espírito Santo é realizada também durante o Ciclo do
Marabaixo conforme calendário cristão, iniciando seus festejos durante o sábado de Pás-
coa, estendendo-se por 62 dias até o primeiro domingo, após Corpus Christi. É realizado
no bairro do Laguinho, um dos mais importantes sítios de incidência da festividade133,
pelos descendentes de Julião Ramos os quais são precursores do Marabaixo de Macapá,
e antepassados diretos dos africanos que vieram escravizados tanto para a construção da
Fortaleza de São José de Macapá, quanto daqueles serviram como força de trabalho cativa
para famílias de colonos que ocuparam nos setecentos, a região de Mazagão Velho (AP).

2.7. AS CANTIGAS DE MARABAIXO CONTAM E CANTAM A SAGA HISTÓ-


RICA DE MAZAGÃO VELHO

Em Mazagão Velho, a festa do Divino é realizada entre os dias 16 a 24 de


agosto sendo que as louvações a terceira pessoa da Trindade estão relacionadas as in-
fluências dos festejos populares pagãos realizados em comunidades agrícolas rurais desde
a antiguidade clássica práticas que podemos conjecturar , com base nos estudos de Katy
Montinha134 que foram trazidas pelos colonos transmigrados da África para a homônima

133 A história dos bairros de origem negra no Amapá: Laguinho, Central e Santa Rita. Os dois últimos
ainda denominados pelos praticantes do Marabaixo pelo nome de “Favela”, remonta a história mais
contemporânea da festividade. Na década de 1940 famílias negras que viviam na vila Engrácia, no
centro de Macapá (AP), foram deslocadas para regiões afastadas do centro urbano e administrativo da
cidade. Hoje estes bairros são sítios tradicionais da manifestação e redutos de resistência da cultura
negra na cidade de Macapá. LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos Trabalhadores: insegurança
estrutural e táticas de sobrevivência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado, USP, 2013. p. 78.
134 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na Vila
Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo, São Paulo,
2003.
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matriz de Mazagão marroquina instalada nas terras do cabo norte, atual distrito de Maza-
gão Velho (AP). Segundo a Historiadora Sândala Cristina da Soledade Machado, basea-
das em estudos de Fernando Canto135, “a ligação das origens da festividade do Ciclo do
Marabaixo de Macapá com a comunidade de Mazagão Velho é muito forte”136 e logo
pode ser explicada pela presença de rituais provenientes da cultura portuguesa a folia, as
oferendas, as Bandeiras, Coroa, o Mastro enfeitado e da composição de elementos de
matriz africana, como por exemplo, a quebra da Murta137 e o toque das Caixas de Mara-
baixo.

Segundo Katy Motinha138, a genealogia da Festa do Divino em Mazagão Ve-


lho, remonta às origens históricas de povoamento da Vila nos setecentos quando ela foi
construída para abrigar colonos oriundos de uma cidade evacuada no Marrocos, na África,
então subordinada ao império português. As constantes resistências dos povos africanos
que circuncidavam Mazagão marroquina, bem como, as investidas do sultão Mohamed
Bem Adballah, forçaram a retirada de famílias portuguesas do Marrocos. Com a ocupação
de Mazagão Velho, vieram também colonos portugueses provenientes das ilhas de Açores
na África. Foram eles que, segundo Katy Montinha139, trouxeram para Mazagão Velho as
práticas dos festejos ao Divino. No que diz respeito às famílias mazaganistas, elas tiveram
como destino Lisboa e algumas delas, mais tarde, foram enviadas a Belém no Grão-Pará,
e posteriormente até ao povoado às margens do rio Mutuacá, atual distrito de Mazagão
Velho (AP), região em que havia a necessidade de se marcar urgentemente a presença
portuguesa.

Toda essa ocupação do atual distrito de Mazagão Velho também é retratada


nas Cantigas de Marabaixo durante a Festa do Divino. Este elo que liga a festa do Divino,
com Cantigas que se reportam a ocupação histórica do distrito de Mazagão Velho, pode
ser explicada pela transplantação dos colonos mazaganistas e das narrativas de combates

135 CANTO, Fernando. A água benta e o diabo. 2. ed. Macapá: FUNDECAP, 1998, p, 19. Apud MA-
CHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico. Revista
Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. janeiro-junho de 2014. p. 44.
136 CANTO, Fernando. A água benta e o diabo. 2. ed. Macapá: FUNDECAP, 1998, p. 18.
137 Expressão utilizada pelos praticantes da manifestação para designar o Cortejo da Murta
138 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na Vila
Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo, São Paulo,
2003.
139 Ibid., 2003.
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entre mouros e cristãos. Textos particulares oriundos da biblioteca de Lisboa140 atestam
que ainda nos períodos setecentistas da ocupação de Mazagão Velho aconteciam narrati-
vas de combates heroicos em frente do que seria hoje as ruínas da antiga Igreja da Matriz.
A documentação se reporta a narrativos de combates exaltando a resistência dos aguerri-
dos mazaganistas na praça de Mazagão, no Marrocos. Essa evocação de uma memória
muito forte da África pode ser atestada também pela presença “de vários elementos ma-
teriais transportados do Marrocos e que em tempos remotos encontravam-se na antiga
igreja da Matriz, hoje em ruínas”141.

Atualmente essas narrativas são encenadas na festa de São Thiago que acon-
tece em Mazagão Velho durante a segunda quinzena de julho, “com ladainhas, presentes,
procissão, baile das máscaras, cavalhada, e rememoração da luta entre mouros e cristãos
sobretudo acerca dos combates vitoriosos entre os muçulmanos e cristãos”142. É neste
contexto que surge a ideia de pertença à África. “Mas uma África enquadrada num mo-
delo visionário, clássico e cristão”143. Os grandes combates e a peleja dos soldados e
cavaleiros mazaganistas da praça de Mazagão na costa Atlântica do Marrocos contra os
mouros, e a alusão a São Tiago como Santo Cavaleiro que auxilia os cristãos em pequeno

140 14 textos, alguns com dois exemplares disponíveis. Estão depositados na Biblioteca Nacional de Lis-
boa (Secções de Reservados e de Leitura Geral). Tal documentação é analisada por:
DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004. p. 14.
Para efeitos de aprofundamento a documentação apresenta pelos autores na qual nos baseamos para
fazer as interpretações acima são as seguintes:
Vide Biblioteca Nacional, Reservados (doravante BNR), 1352P e 432/1 P, Relaçam do Combate, que
tiveram, e vitória, que conseguirão as armas portuguezas Dos nobres Cavaleiros de Mazagão, coman-
dadas pelo Ilustríssimo, e Excelentíssimo Senhor D. Antonio Alves da Cunha, Governador e Capitão
General da dita Praça, Contra os Mouros da Aduquela; chamados os Alarves, os mais guerreiros da
Barbaria, em o dia 7 de Dezembro do anno próximo passado de 2751 [sic], escritual por um dos seus
cavaleiros, Lisboa, na Oficina de Pedro Ferreira, 1752, p. 3. Vide figura nº 4.
BNLR, 903/4 P, Relação da batalha que o presido de Marzagam teve com os Mouros em o dia primeiro
de Mayo do anno de 1753, perigo em que se viu, e a gloriosa Victoria que delle alcançou, Lisboa,
s.ed., s.d. [1754], p. 3.
BNLR, 1352P e 432/1 P, p. 2.
BNLR, 903/8 P e Fundo Geral (doravante FG) HG 9787/17 P, Notícia da Grande Batalha que houve
em a Praça de Mazagão no dia 6 de fevereiro do presente ano de 1757, Lisboa, s.ed., 1757, pp. 1-3.
141 PICANÇO, Estácio Vidal. Informações sobre a História do Amapá cit., p. 5. Em Perfil do Amapá,
1999/2000, p. 30, o referido autor em sua obra apresenta uma fotografia da antiga matriz de Mazagão
Velho, ainda de pé, da década de 1940. Segundo Vidal na antiga igreja, hoje em ruínas, havia imagens
enfeitadas de ouro e de pedras preciosas, bem como uma mesa de prata trazida pelos mazaganistas de
Marrocos.
142 Nota de rodapé nº 31. In: MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois
Lados do Atlântico. Revista Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. Janeiro-junho de 2014. p.41.
143 DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004. p. 14
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número, dando vitória aos portugueses, também são retratados nas letras das Cantigas de
Marabaixo, como é o caso da letra do Ladrão intitulado “Da Nossa História”

Orai por nós, orai (4x)


Da nossa vila histórica
Temos muito o que contar
Dia 16 de julho
A festa vai começar

Com a transladação do Santo


Nas ruas ele vai estar
Depois que chegar da igreja
Todos os fiéis vão rezar

Orai por nós, orai (4x)

O arauto vai passando


Sua função é avisar
Personagem fique alerta
Logo pode começar

Orai por nós, orai (4x)

A maior festa de julho


Para São Thiago vou rezar
A vila fica animada
Povo começa a chegar

Na novena e ladainha
Eu encontro meus irmãos
E na maior alegria
Dando aperto de mão

Orai por nós, orai (4x)

Como anônimo soldado


Santiago apareceu
Contando essa história
Foi assim que aconteceu

Com a entrega dos presentes


Dava para desconfiar
Teve o baile das máscaras
Era só para disfarçar

Orai por nós, orai (4x)

Quando findou meio dia


Bobo velho apareceu
Espionando os cristãos
Logo desapareceu

Teve o roubo das crianças


Que doeu no coração
O dinheiro arrecadado
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Pra comprar mais munição

Orai por nós, orai (4x)

Com início da batalha


Com heroísmo e fé
O corpo do Atalaia
No acampamento pode ver

Com menino caldeirinha


Houve a preocupação
Com a cilada contra seu pai
Entre mouros e cristãos

Orai por nós, orai (4x)

Os cristãos pediam a Deus


Que pudesse ajudar
Prolongando este dia
Para a batalha acabar

A noite teve um baile


Organizado para crer
A vitória dos cristãos
Com a dança do [inaudível]
Orai por nós, orai (12x)

(Ladrão Da nossa História, interpretado por Verinha. CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil,
Faixa, nº 10, set. 2017)

É possível identificar nesta Cantiga de Marabaixo alguns elementos que se


reportam a Festa de São Thiago, como por exemplo: o arauto, o baile de máscaras, as
novenas, as ladainhas, o atalaia, os mouros, cristãos e São Thiago, o Santo guerreiro visto
como “Santo Guerreiro”. Não cabe aqui fazermos um relato da festividade. Concentremo-
nos na importância das performances de encenação das batalhas entre mouros e cristão
pois elas “conjugam elementos de cavalhadas (lutas equestres encenando batalhas)”144
remetendo-se ao formato carolíngio (relativo à dinastia carolíngia, da qual o rei Carlos
Magno, é o seu maior representante), as quais englobam elementos históricos que se re-
portam a triangularidade étnica145 de sua migração, Portugal Marrocos/ Portugal Brasil.
A recriação na festa de São Thiago da luta entre mouros e cristãos atestam o alicerce
histórico de Mazagão Velho. E no que diz respeito as Cantigas de Marabaixo, esses versos
são também legitimadores de alteridade.

144 DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004. p.18
145 Idem, p.18.
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Com base nos estudos sobre a ocupação portuguesa em Mazagão Velho (AP)
e da construção de uma memória enquanto vila negra feitos por Véronique Boyer, é que
podemos conjecturar que as letras das Cantigas de Marabaixo, também corroboram na
atualidade, para que negros tomem para si a legitimidade tanto da origem de ocupação
histórica da vila, quando da própria Festa de São Thiago:

Hoje em dia, boa parte da população que se declara descendentes dos


africanos que chegaram junto com os portugueses. Os habitantes ligam
portanto a sua história, antes de mais nada, aquela dos negros, escravos
ou não[...] com essa narrativa, fortalecida com a crença de que Marro-
cos é povoado de gente de pele escura, pois está na África, o Mazagão
Velho firma-se como vila negra146

Podemos concluir com esse estudo, sem pretensões de esgotar a temática, que
as letras das Cantigas de Marabaixo tem profunda relevância não apenas para se entender
a sua força legitimadora de uma identidade negra para Mazagão Velho, mas também para
a própria história do negro no Amapá. As Cantigas de Marabaixo então, entram em cena
como símbolo de alteridade para a construção de uma interpretação de que “foram os
negros que se estabeleceram em Mazagão Velho, e que implantaram a festa de São Ti-
ago”147. Entretanto, ao longo deste entre curso da pesquisa, autores como Sândala Cristina
da Soledade Machado, Maria Cardeira da Silva e José Alberto R. da Silva Tavim e a
própria Véronique Boyer convergem no entendimento de que a principal matriz forma-
dora do atual distrito de Mazagão Velho foi a portuguesa.

Através dessas questões levantadas podemos concluir que o estudo das Can-
tigas de Marabaixo possibilitam entender como essas memórias sobre Mazagão Velho e
sobre a própria história do negro, que participa da matriz formadora do povo do Amapá
vem sendo construídas. As letras das Cantigas de Marabaixo possuem grande relevância
para o Ensino de História, uma vez que elas vêm interligando gerações e servem como
um grande catalizador de história de vida e de genealogias locais. As letras das Cantigas
possuem uma inegável importância para efeitos de pesquisa acadêmica no âmbito do En-
sino de História. Por isso, precisam ser agregadas ao currículo148 como narrativa étnico

146 BOYER, Véronique. Passado português, presente negro e indizibilidade ameríndia: o caso de Mazagão
Velho. Amapá, 2008. p. 17 e 18.
147 DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004. p. 21.
148 SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos da identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2ª ed. 10ª
reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. p. 101.
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racial possibilitando através de seu estudo, pensar historicamente o processo de ocupação
negra no Amapá, no século XVIII.

2.8. OS LADRÕES DE AFIRMAÇÃO DA IDENTIDADE

As aprendizagens históricas149 contidas nas letras das Cantigas de Marabaixo


sinalizam fontes históricas, como é o caso do “documento Canção” que por muito, em
uma sociedade de forte herança africana, que nem o Brasil, foi ignorado pelo Ensino de
História e pelo próprio currículo. As Cantigas de Marabaixo permitem mais do que his-
toricizar acerca da chegada do africano no século XVIII, como mão de obra compulsória
para construção da fortaleza de São José de Macapá e para a ocupação estratégica do atual
distrito de Mazagão Velho. As Cantigas de Marabaixo possibilitam também, através de
seus elementos implícitos e explícitos nas Cantigas, a incorporação de discussões envol-
vendo a resistência negra, alteridade, afirmação étnico racial e diversidade.

As Cantigas de afirmação da identidade negra, conferem um singular estudo


no campo do Ensino de História, acerca da realidade atual do negro e do seu passado
histórico. Especialmente nas letras dessas Cantigas são citadas, por exemplo, o nome de
locais que são sítios tradicionais da manifestação e redutos de resistência da cultura negra
na cidade de Macapá (AP), como é o caso das referências que se fazem, nas letras das
Cantigas, aos bairros do Laguinho e Favela. Na letra do Ladrão de Marabaixo “Desafio”,
Daniela Patrícia da Silva Monteiro – “Danniela Ramos”, faz referência ao bairro do La-
guinho.

As Canções dos afrodescendentes no Amapá, intituladas de Ladrões de Marabaixo, neste trabalho de


pesquisa, é apresentada através de uma propostas para o Ensino de História, que contemple a produção
de material didático. Utiliza-se neste trabalho, o conceito de Consciência Histórica tomando como
pressuposto o conceito de: RÜSEN, J. A razão histórica: teoria da história; fundamentos da ciência
histórica. Brasília, DF: UNB, 2001. p. 57. Alicerçados em análises voltadas para as aprendizagens
históricas com base em autores que trabalham a temática música, Ensino de História e Consciência
Histórica: ABUD, Kátia Maria Registro e Representação no cotidiano: A música popular na aula de
História Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 67, p. 309-317, set./dez. 2005. Disponível em
http://www.cedes.unicamp.br, NAPOLITANO, Marcos. História & Música. 2ª Ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2005; AZAMBUJA, Luciano de. Jovens alunos e aprendizagem histórica: perspectivas a
partir da Canção popular. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educa-
ção, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2013 e AZAMBUJA, Luciano de. Canção, Ensino e
Aprendizagem histórica, Revista História Hoje, v. 6, nº 11, p. 31-56 – 2017; SCHMIDT, Maria A.;
BARCA, Isabel (Org.). Aprender história: perspectivas da Educação histórica. Ijuí, RS: Ed. Unijuí, 2009.
149 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt.
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O Laguinho é tradição
Agora que eu quero ver
Cantando desafio botou gente pra correr

(Trecho do Ladrão Divino Rei CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 3, set. 2017)

Ou na letra do Ladrão “Divino Rei” ( interpretado por Laura do Marabaixo)


o qual já foi analisado anteriormente. Apesar da resistência religiosa ser a temática pre-
dominante nesta Cantiga, aqui, podemos encontrar mais de uma classificação pois, a letra
possui elementos que afirmam por meio do Marabaixo, a identidade negra do bairro La-
guinho

Salve o bairro do Laguinho


Bairro negro, sim senhor!
Reduto do Marabaixo
Do samba e de muito amor

(Trecho do Ladrão Divino Rei, CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 8, set.
2017)

Ou na letra Negra Formosa interpretado pela Valdi Costa, a qual se reporta a


antiga Favela:

Favela querida venho recordar


A história esquecida de alguns ancestrais
Que enriqueceram os bens culturais
Marabaixo e samba, um elo de amor
Capoeira, Umbanda, [inaudível] só vingou
E a cultura do negro assim prosperou

(Trecho Negra formosa, CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 7, set. 2017)

Bairros como Laguinho, Central e Santa Rita, estes dois últimos mais conhe-
cido pelos praticantes da festividade como “Favela”, são constantemente citados nas Can-
tigas de Marabaixo não apenas por serem hoje locais que são de incidência da manifesta-
ção na cidade de Macapá (AP), mas porque possuem estreita relação com a história dos
afrodescendentes no Amapá. Essa história remonta em Macapá (AP), à reforma urbana
durante o período de constituição do Território Federal do Amapá, com o remanejamento

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dos negros do centro da cidade para áreas periféricas150 e com a formação de redutos na
década de 1940, afastados do eixo administrativo e comercial. A história do bairro do
Laguinho e da Favela atualmente também estabelece relação com a geração de marabai-
xeiros contemporâneos a essas mudanças “uma vez que o deslocamento da famílias ne-
gras desapropriadas do entorno do Largo de São João (atual Praça Barão do Rio Branco),
na disputada área central da cidade de Macapá, representou um processo de segrega-
ção”151 o qual ficou imortalizado nos versos do Ladrão de Marabaixo “Aonde tu vai, ra-
paz”, de Raimundo Ladislau

“Aonde tu vai, rapaz”, um dos mais importantes Ladrões da história do Ma-


rabaixo, conta um importante momento histórico da cidade de Macapá. A letra do Ladrão
“Aborda o deslocamento das famílias de afrodescendentes que moravam nas proximida-
des da Igreja de São José de Macapá na década de 1940, para locais mais afastados, em
virtude da reforma urbana feita no centro da cidade de Macapá”152. O período histórico
retratado no Ladrão cita o nome das primeiras ruas que foram abertas em Macapá153 ,
como a avenida presidente Getúlio Vargas, que na época, não passava de uma estreita
viela. Em outros trechos, apresenta-se a Avenida Presidente Getúlio Vargas já modifi-
cada com as edificações destinadas aos médicos, dentistas, agrônomos, advogados, pro-
fessores, delegado de polícia. São modificações na configuração urbana da cidade que a
população negra não usufruiu pelo contrário, ao invés disso, ela foi deslocada para as
regiões periféricas do Laguinho e da Favela, locais que não possuíam qualquer infraes-
trutura para abrigá-los. Foi motivo suficiente para que surgisse o Ladrão criticando a ação
governamental.

Aonde tu vai, rapaz


Por esses campos sozinho
Vou construir minha morada
Lá nos campos do Laguinho

Quando vim da minha casa


Me perguntou como passou

150 LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança estrutural e táticas de so-brevi-
vência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São Paulo: São Pau-lo, 2013.
239p., p. 78
151 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 25.
152 LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança estrutural e táticas de sobrevi-
vência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2013.
239p., p. 79.
153 Relato concedido Por Fábio José do Espírito Santo Souza dia 17 de Abril de 2018, na oficina: Intro-
dução aos estudos históricos dos Ladrões de Marabaixo, parte integrante deste trabalho de pesquisa.
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Rapaz eu não tenho casa
Tu me dá um armador
Destelhei a minha casa
Com a intenção de retelhar
Mas a Santa Engrácia não fica
Como a gente pode ficar?

Estava na minha casa


Conversando com a companheira
Não tenho pena da terra
Só tenho do meu coqueiro

Largo de São João


Já não tem nome de Santo
Hoje é reconhecido
Por Barão do Rio Branco

A Avenida Getúlio Vargas


Tá ficando que é um primor
Essas casas foram feitas
Pra só morar os doutor

Dia primeiro de junho


Eu não respeito o senhor
Eu saio gritando viva
Para o nosso governador
(letra do Ladrão Aonde tu vai, rapaz. Autor Raimundo Ladislau)

No que concerne a importância histórica da Cantiga acima, o historiador Sid-


ney da Silva Lobato enfatiza que:

[...]. Aonde tu vai, rapaz, foi composto no início do governo Janarista


para manifestar os sentimentos e entendimento de populares negros
acerca do momento de sua saída do entorno das praças centrais de Ma-
capá (Barão do Rio Branco e Capitão Assis de Vasconcelos), onde mo-
ravam. Eles foram obrigados a sair de lá porque não tinham condições
de cumprir as exigências governamentais de construir casas novas de
alvenarias adequadas ao perfil que se queria dar ao núcleo político e
social da cidade. O governo disponibilizou terrenos sem nenhum tipo
de beneficiamento (arruamento, água encanada, energia elétrica e etc).
Nos lugares conhecidos como Favela e Laguinho então, surgiu o refrão
deste famoso Ladrão: “Aonde tu vai, rapaz por esses caminhos sozinho
[sic]/ vou construir minha morada lá nos campos do Laguinho. Descen-
dentes de escravos, os negros que moravam no centro histórico foram
divididos: “pelo jeito que eu estou vendo nós vamos ficar sozinhos uns
vão para a Favela e outros vão para o Laguinho”154.

154 LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança estrutural e táticas de sobrevi-
vência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2013. p.
78.
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A análise da letra do Ladrão de Marabaixo “Aonde tu vai, rapaz”, feita por
Sidney da Silva Lobato155, nos dá a real dimensão da importância dos versos dessa mú-
sica. Foi justamente por causa destes versos que se tem uma outra versão além daquela
oficial acerca do deslocamento de famílias de afrodescendentes que viviam na área cen-
tral, na década de 1940, na cidade de Macapá (AP). Aqui temos um exemplo de uma
Cantiga que se enquadra na tipologia de Cantigas de afirmação da identidade negra156 e
que neste caso, pode ser considerada como tal, não pelo elementos implícitos presentes
na letra mas pelos elementos explícitos relacionados aos novos redutos negros que foram
criados, após a saída da população do perímetro central. A letra da Cantiga aborda nas
quadras poéticas, a saída do centro da cidade para o bairro do Laguinho e para a Favela.

O bairro do Laguinho e a antiga Favela são locais que representam hoje, gran-
des redutos de afirmação da identidade negra, uma vez que são lugares onde se tradicio-
nalmente dança o Marabaixo em Macapá (AP). Redutos que além de serem sítios tradici-
onais de incidência da manifestação dentro da cidade de Macapá (AP), são locais onde
vivem os descendentes dos precursores do Marabaixo, como por exemplo, os familiares
de mestre Julião Ramos, Antônio Barca, Manuel da Paciência, João Clímaco, Zeca Costa,
Raimunda Ramos dos Passos , Raimunda Rodrigues do Carmo (Dica Congó), Gertrudes
Saturnino e de Natalina Costa.

O bairro do Laguinho, Central e Santa Rita, respectivamente, são bairros que


possuem em sua composição uma significativa parcela de moradores negros. Grande
parte dos familiares das lideranças da velha guarda do Marabaixo de Macapá residem
nestes três locais como por exemplo, as famílias de Josefa Lino da Silva a “Tia Zefa do
Quinca”, Benedita Guilherma Ramos, conhecida como tia Biló, Maria Elísia Carmo Silva
(Elísia Congó), Maria José Libório e Venina Trindade dentre tantas outras personalida-
des. Personalidades ilustres que aparecem nas Cantigas de Marabaixo como grandes ba-
luartes vivos e verdadeiros símbolos de afirmação da identidade negra. Figuras que são
reverenciadas, segundo relatos dos participantes do Marabaixo, por serem descendentes

155 LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança estrutural e táticas de sobrevi-
vência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2013. p.
77 e 78.
156 Afirmação baseada na análise da tipologia das Canções entoadas pelos africanos escravizados, segundo
os conceitos de W. E. B. Du Bois, apresentado por ABREU. Martha. O legado das Canções escravas
nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São
Paulo, v. 35, nº 69, p.177-204, 2015. p.181 e 182
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diretos dos negros que resistiram a escravidão durante a construção da Fortaleza de São
José e para a ocupação estratégica de Mazagão Velho, no século XVIII.

O trecho da Cantiga “Negra Formosa”, interpretado pela Valdi Costa por


exemplo, faz uma homenagem a Gertrudes Saturnino, dançadeira de Marabaixo, compo-
sitora de Ladrões e uma das primeiras moradoras do bairro Central (que no contexto do
Marabaixo é conhecido como Favela).

Essa é uma homenagem a todas as negras lindas


E formosas do nosso querido Amapá
É a você Gertrudes
É a você Natalina Costa

(Trecho Negra Formosa, CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 4, set. 2017)

Do trecho da Cantiga Nossa Cultura, interpretado por Ronaldo Silva, que


presta reverência aos fundadores do bairro do Laguinho, personalidades ilustres e precur-
soras do Marabaixo de Macapá (AP)

Já pensou em ler uma história


Do grande mestre Julião (2x)
Ladislau e Tia Chiquinha
E do meu amigo Pavão? (2x)

(refrão) – 2x

Já andei por muitos lugares


E não consegui encontrar (2x)
Pois Marabaixo é uma cultura
Que só existe no Amapá (2x)

(Trecho do Ladrão Nossa Cultura, CD: Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, faixa nº 5, set.
2017)

Ou da letra “Nego oh odiá” interpretado por Elisia Congó, que relembra a


saga da família Congó. A história da família Congó em Macapá vem desde a chegada dos
negros da África para trabalharem na construção da Fortaleza de São José de Macapá. A
mãe de Elísia Congó, Raimunda Rodrigues do Carmo, mais conhecida como Dica Congó
(já falecida) participou sua vida toda do Marabaixo, passando a tradição para os filhos e

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especialmente para Elísia, que se encarrega de promover e levar o Marabaixo para as
novas gerações157

(narração)
Está é uma homenagem que o grupo Raízes da Favela
Dica Congó presta ao velho Congó
Compositor desse Ladrão

Nego você diz que dá na bola, odiá


Nego na bola você não dá, odiá (refrão - 2x)

(Trecho do Ladrão Negro oh diá. CD Marabaixo. Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil,


Faixa nº 6, set. 2017)

Em cada uma dessas Cantigas, diferentes personalidades da manifestação do


Marabaixo de Macapá são citadas nesses três diferentes trechos das letras das Cantigas.
Nestes trechos encontramos os principais elementos que norteiam as Cantigas de afirma-
ção da identidade negra. Entre os elementos temos: as representações positivas da estética
e da corporeidade negra, o Marabaixo como uma autêntica manifestação da cultura ama-
paense e a afirmação da herança dos antepassados através da menção aos locais que são
redutos de incidência da manifestação. Essas são as temáticas principais que são aborda-
das nas Cantigas acima, mas que de forma geral, são os temas geradores das Cantigas de
afirmação da identidade negra. Acreditamos que as Cantigas de afirmação da identidade
negra, presentes na manifestação do Marabaixo, possibilitam no âmbito do Ensino de
História, potencializar pesquisas que levem a produção de material didático baseado na-
quilo que a memória viva ainda testemunha.

Foi neste sentido que elencamos e delimitamos as fontes pesquisadas através


de uma proposta de Ensino de História, que contemple a produção de material didático, a
partir das tipologias das Cantigas que versam sobre a temáticas voltadas para a afirmação
da identidade negra. A classificação e o estudo das tipologias das Cantigas dos afrodes-
cendentes no Amapá- Cantigas de trabalho e Cantigas de dor, de amor, de resistência
religiosa e de afirmação da identidade negra, conversem para abordagens de conteúdos
que atestam a chegada do africano no século XVIII, como escravizado tanto para trabalhar
na construção da fortaleza de São José de Macapá, quanto no atual distrito de Mazagão
Velho. Foi desta forma que selecionamos as fontes documentais, as quais são oriundas de

157 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 24.
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um acervo oral passado entre as gerações pelos afrodescendentes. São Cantigas das pri-
meiras décadas do Século XX, como é o caso da Letra do Ladrão “Aonde tu vai, rapaz”,
até composições mais recentes, oriundas de um repertório musical mais contemporâneo.

2.9. OS LADRÕES DE MARABAIXO: O LEGADO DAS CANTIGAS DOS


AFRODESCENDENTES NO AMAPÁ PARA O ENSINO DE HISTÓRIA

2.9.1. MÚSICA, ENSINO E APRENDIZAGEM HISTÓRICA

As Cantigas que são entoadas nas rodas de Marabaixo descrevem além de


acontecimentos históricos, a história do negro na própria manifestação metamorfoseando
em formas de versos, não somente, a vida cotidiana, mas também as memórias sobre o
processo de ocupação negra no Amapá. Assim as histórias que muitas vezes não são con-
tadas pelo currículo oficial e que em grande parte dos casos, não estão nos livros didáti-
cos, ganham nessas Cantigas um modo de registro próprio. São Cantigas em que per-
meiam histórias de vida e genealogias locais, e vem sendo transmitidos entre as gerações
dos afrodescendentes. Mas que ainda hoje são pouco pesquisados no âmbito do Ensino
de História a partir da utilização de linguagens alternativas. O uso de linguagens alterna-
tivas, como é o caso da música, são um importante mecanismo para o desenvolvimento
de aprendizagens históricas e para transformação de conceitos espontâneos em conceitos
científicos. Eis o valor das Cantigas de Marabaixo, para o Ensino de História no Amapá.

As mudanças de paradigmas do conhecimento histórico acadêmico, a


principal referência para a construção do conhecimento histórico esco-
lar, permitem que este também reelabore os seus próprios elementos de
construção, ao relacioná-los na aula de história ao saber apreendido na
vivência cotidiana de cada um. Imagens e objetos vistos e observados;
letreiros, textos, cartazes, pichações lidas de passagem; audição de mú-
sicas; a conversa trocada com amigos; tudo isso tem se constituído em
linguagens da história, e de fontes para o conhecimento histórico aca-
dêmico passam a ser recursos didáticos para auxiliar o aluno na cons-
trução do seu conhecimento. Como a significação do conceito no co-
nhecimento escolar não corresponde à significação do mesmo conceito
no saber acadêmico, no processo de aprendizagem as fontes se trans-
formam em recursos didáticos, na medida em que são chamadas para
responder perguntas e questionamentos adequados aos objetivos da his-
tória ensinada.158

158 ABUD, Kátia Maria Registro e Representação no cotidiano: A música popular na aula de História
Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 67, p. 309-317, set./dez. 2005. p. 310.
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Neste sentido Katia Maria Abud acredita que a utilização de fontes documen-
tais, provenientes de interações imediatas, como é o caso da música, produzem conceitos
espontâneos que por sua vez podem ser transformados em situações formais de Aprendi-
zagem histórica. No caso das Cantigas de Marabaixo elas refletem a resistência a es-
cravidão dos antepassados dos afrodescendentes no Amapá, e se auferidos a métodos de
Ensino, permitem orientar a vida prática dos alunos na utilização de modelos de explica-
ção histórica acerca da escravidão durante o período do Brasil colonial. Defende-se aqui
que tais Cantigas de Marabaixo evocam a resistência negra a escravidão, e por isso, pos-
sibilitam extrair contextos históricos implícitos. São fontes que contribuem também para
a redefinição de conteúdos bem como, de novas abordagens, no que concerne as aprendi-
zagens históricas nelas contidas.

A aprendizagem histórica aqui entendida, sintetiza-se e se consolida na Cons-


ciência Histórica que, segundo Rüsen estão relacionadas a tríade experiência, interpreta-
ção e orientação. Neste caso o homem necessita ser consciente sobre o tempo, e para isso,
ele precisa experimentá-lo, e significá-lo. E cabe a ciência especializada auferir métodos
de reconstrução do passado e da apresentação de conteúdo histórico válido, que retorne
para a “vida prática em formato de funções de forma tal que possam orientar de maneira
intencional”159. Eis a razão da narrativa histórica: orientar a vida humana no curso do
tempo, sendo que a soma dessas operações mentais onde o homem interpreta a sua expe-
riência de evolução temporal de seu mundo e de si mesmos, é entendida por Rüsen de
Consciência Histórica:

Que os homens tenham consciência da história baseia-se, afinal, no fato


de que seu próprio agir é histórico. Como usam intencionalidade, os
homens inserem, pois, seu tempo interno [...] no contato com a natureza
externa, na confrontação com as condições e as circunstancias de seu
agir, nas suas relações com os demais homens e com si mesmos. Com
isso, o agir humano é, em seu cerne, histórico. E ‘histórico’ significa
aqui, simplesmente que o processo temporal do agir humano pode ser
entendido, por princípio, como não natural, ou seja: um processo que
supera sempre os limites do tempo natural.160

Seguindo a linha de raciocínio do conceito de Consciência Histórica, acredita-


se que a música se constitui uma das formas de mediar a Aprendizagem histórica uma

159 ABUD, Kátia Maria Registro e Representação no cotidiano: A música popular na aula de História
Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 67, p. 309-317, set./dez. 2005. p. 310
160 RÜSEN, J. A razão histórica: teoria da história; fundamentos da ciência histórica. Brasília, DF: UNB,
2001. p. 79.
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vez que a linguagem musical faz parte do cotidiano e das experiências práticas da vida
dos estudantes influenciando seu modo de vestir, de se comportar e de se comunicar. A
linguagem musical do jovem se desenvolve através de padrões de preferência na qual
envolve gostos pessoais com forte carga afetiva, transformando-se em modelos de refe-
rência para a apreensão e assimilação de audições equivalentes ou não, aquilo que ele já
escuta no dia a dia. Um gosto musical vai se afinando principalmente nas esferas do co-
tidiano familiar, do lazer e da escola, onde ouvir música é ouvir emotivamente, uma vez
que a mesma é utilizada para despertar ou reforçar algo bastante latente: a identidade de
grupo.

O espaço escolar por si só transpira musicalidade, os estudantes lidam cotidi-


anamente com várias tendências e estilos musicais que por sua vez influenciam em seus
comportamentos de grupo, mas que também, são trazidos dos ambientes socioculturais
de onde vivem. As relações de grupo estabelecidas pelos estudantes mediadas pela lin-
guagem musical, emerge de determinados processos da vida prática161 por isso, a música
se revela como um poderoso instrumento para atribuições de sentido histórico, conforme
os estudantes são chamados para responder às perguntas ligadas à experiências do pas-
sado e que fazem parte do seu dia a dia tais como: preconceito racial, e das representações
negativas sobre a corporeidade e a estética negra. No que diz respeito às Cantigas dos
afrodescendentes no Amapá, intituladas de Ladrões de Marabaixo, as histórias de resis-
tência ao cativeiro africano presente nas Cantigas, são um poderoso recurso Ensino para
se discutir alteridade, com vistas a levar o aluno negro a se reconhecer como tal.

O repertório musical das Cantigas dos afrodescendentes no Amapá, tem


muito a contribuir com o Ensino de História especialmente porque as letras das Cantigas
versam sobre a afirmação da identidade negra, a partir dos mecanismos de resistência a
escravidão. A escravidão, sem dúvida é um conceito imprescindível para que o aluno ao
sair da Educação Básica tenha uma formação histórica que o auxilie em sua vivencia
como cidadão e que lhes dê orientação para a vida prática, quanto ao respeito às diferenças
culturais, étnicas e religiosas. Por isso, as aprendizagens históricas contidas nas Cantigas

161 ABUD, Kátia Maria Registro e Representação no cotidiano: A música popular na aula de História
Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 67, p. 309-317, set./dez. 2005. p. 311 e 312.
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de Marabaixo convergem para o entendimento do “documento Canção”162 como uma ar-
ticulação do “texto-contexto” sendo ao mesmo tempo, uma fonte histórica, mas também,
expressão de um momento histórico que deve ser devidamente contextualizado. É neste
sentido que comungamos do mesmo entendimento de Marcos Napolitano acerca do trato
com fontes documentais relacionadas a música:

Nos últimos anos tem sido bastante comum a utilização da Canção, seja
como fonte para a pesquisa histórica, seja como recurso didático para o
ensino [...]. Por isso mesmo, o uso da Canção como documento e re-
curso didático deve dar conta de um conjunto de problemas nada sim-
ples de resolver [...]. Neste sentido, é fundamental a articulação entre
“texto” e “contexto” para que a análise não se veja reduzida, reduzindo
a própria importância do objeto analisado, o grande desafio de todo pes-
quisador em música popular é mapear as camadas de sentido embutidas
numa obra musical, bem como suas formas de inserção na sociedade e
na história, evitando, ao mesmo tempo, as simplificações e mecanicis-
mos analíticos que podem deturpar a natureza polissêmica (que possui
vários sentidos) e complexa de qualquer documento de natureza esté-
tica. Portanto, o historiador, mesmo não sendo um musicólogo, deve
enfrentar o problema da linguagem constituinte do “documento” musi-
cal e, ao mesmo tempo, “criar seus próprios critérios, balizas e limites
na manipulação da documentação163

Ainda sobre a utilização da música no Ensino de História suas abordagens


devem, segundo Miriam Hermeto, partir do princípio de que:

[...] a perspectiva, a utilização da música como fonte para a pesquisa


requer do historiador conhecimentos e sensibilidades específicos, como
o ouvido atento para as melodias e os olhos abertos para as letras, a
compreensão de que a sua audição e dos demais está intimamente rela-
cionada com seus respectivos contextos históricos, bem como o domí-
nio da gramática básica da linguagem musical e das especificidades de
cada gênero.164

Já salientamos que as Cantigas de Marabaixo são imbuídas de sentidos histó-


ricos, e são partes constituintes de um legado oral deixado pelos ancestrais negros no
Amapá e que por isso, tem muito a contribuir para o Ensino de História Local165. As
aprendizagens históricas que resultaram do projeto de intervenção desta pesquisa, direci-
onaram para a produção do DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MARA-
BAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1. O dicionário foi

162 NAPOLITANO, Marcos. História e Música. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. p. 53


163 Ibid., p. 53.
164 HERMETO, Miriam. SOARES, Olavo Pereira. Música e Ensino de História. Revista História Hoje,
vol. 6, nº 1. Junho/2017. p. 3.
165 BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. Coleção do-
cência em formação. Série Ensino Fundamental. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
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constituído com verbetes e expressões criados a partir da tipologia das Cantigas, o qual
foi nosso objeto de estudo deste segundo capítulo. Objetiva-se com esta pesquisa trazer
fontes históricas que contribuam para a construção de capacidades voltadas à Aprendiza-
gem e à construção do conhecimento histórico dos estudantes. Acreditamos que o nosso
objeto de estudo “Os Ladrões de Marabaixo” pode vir a corroborar com a divulgação de
pesquisas e para o debate entre música no Ensino de História, a tipologia das Canções
afrodescendentes e as aprendizagens históricas nelas contidas, trazendo novas abordagens
de conteúdos166 acerca da escravidão no Amapá, no século XVIII.

Nos propusermos neste capítulo fazer um percurso histórico da chegada dos


africanos escravizados ao Amapá no século XVIII, através das Cantigas de Marabaixo.
Tal percurso, teve como objetivos abordar tanto a chegada dos africanos escravizados
para a construção da Fortaleza de São José de Macapá, quanto para o atual distrito de
Mazagão Velho. A proposta de trabalho versa em apresentar sólidos procedimentos de
Ensino e uma análise acurada das Cantigas de Marabaixo como fonte de pesquisa, para a
produção de material didático já que as mesmas são verdadeiras fontes documentais, ori-
undas dos próprios afrodescendentes. O intuito é de demonstrar aqui como a pesquisa
histórica que toma a música como objeto de análise, pode fornecer elementos teóricos
para o trabalho do professor em sala de aula. O que acreditamos ser na contemporanei-

166 Pretende-se com esta pesquisa e com a produção do material didático supramencionado atender a pro-
posta curricular das legislações vigentes tomando como base, a nova reformulação do Ensino Médio
no Estado do Amapá, a partir da experiência da Estadual professora Raimunda Virgolino de implan-
tação, no 1º ano do Ensino Médio, da Escola de Tempo Integral e da incorporação da parte diversifi-
cada do currículo do artigo 26ª, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN. Como
referencias básicas para atender os pressupostos educacionais em vigor é que nos fundamentamos:
AMAPÁ. Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Amapá. Secretaria Estadual de
Educação, 2014;
BRASIL. [Lei Darcy Ribeiro (1996)]. LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei nº
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. – 13.
ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2016. – (Série legislação; n. 263 PDF);
BRASIL. Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para incluir no currículo oficial da rede de
ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.
Diário Oficial da União. Brasília, DF, 10 jan. 2003;
BRASIL. Lei nº 11.645, de 10 março de 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da Edu-
cação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “His-
tória e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.
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dade bastante pertinente, uma vez que nos tempos de intolerância, à produção deste ma-
terial didático ratifica as conquistas dos movimentos sociais negros e contempla a própria
legislação educacional vigente.

As Cantigas de Marabaixo dialogam, aqui com referências importantes da


epistemologia da Aprendizagem, como é o caso do conceito de Educação histórica de
Rüsen (2001; 2007a; 2007b; 2012); articulados a teóricos do Ensino de História como é
o caso de Marcos Napolitano (2005), Maria Auxiliadora Schimdt e Isabel Barca (2009),
Katia Maria Abud (2005) e Luciano Azambuja (2013).

Queremos fornecer indicadores de que as Cantigas de Marabaixo podem mo-


bilizar temporalidades, competências e dimensões da Consciência Histórica, configu-
rando um ponto de partida significativo do processos de Ensino e Aprendizagem histórica
de estudantes da Educação Básica. A escritura de protonarrativas167 proveniente das Can-
tigas de Marabaixo abre um leque para novas perspectivas para métodos da pesquisa his-
tórica, métodos de pesquisa e Aprendizagem histórica, mediados pelos pressupostos da
pesquisa qualitativa etnográfica168. Por isso pensamos que através deste estudo detalhado
das tipologias das Cantigas de Marabaixo, podemos fornecer um sólido material didático
para o Ensino constituído a partir das aprendizagens históricas que foram desenvolvidas,
no transcurso da aplicação da referida proposta de Ensino.

SEÇÃO 3 – ELABORAÇÃO DO DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MA-


RABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1

3.1. A ESCOLA ESTADUAL PROFESSORA RAIMUNDA VIRGOLINO: LO-


CAL DA PESQUISA DE INTERVENÇÃO

O local em questão, trata-se de uma Escola Pública de Ensino Médio, locali-


zada na zona sul da capital Macapá (AP), na rua Vila dos Oliveiras nº 837, bairro das
Pedrinhas. Atualmente, atende aos segmentos do 1º e 2º ano do Ensino Médio em período
de Tempo Integral (manhã e tarde), 3º ano do Ensino médio somente pela manhã e 2ª
etapa do Ensino médio da Educação de Jovens e Adultos (EJA), no turno da noite. No

167 AZAMBUJA, Luciano de. Jovens alunos e Aprendizagem histórica: perspectivas a partir da Canção
popular. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade
Federal do Paraná. Curitiba, 2013.
168 FLICK, Uwe. Uma introdução à pesquisa qualitativa. Trad. Sandra Netz. Porto Alegre: Bookman,
2004.
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ano de 2017 a Instituição de Ensino foi selecionada pela Secretaria de Estado da Educação
do Amapá, juntamente com mais 03 Escolas Públicas de Macapá e 03 do Município de
Santana (AP) para integrarem o rol da modalidade de Ensino de Tempo Integral, passando
assim a serem denominadas, de Escolas “Do Novo Saber”169. A modalidade de Ensino de
Tempo Integral traz especificidades no Currículo do Ensino Médio, a partir da incorpo-
ração de componentes denominados de parte diversificada do currículo. Entre esses com-
ponentes temos: Estudo Orientado, Práticas Laboratoriais, Projeto de Vida, Tutoria e
Disciplinas Eletivas170.

No entanto, em meio a uma série de discussões com o corpo docente, técnico


e gestor da Escola, sobre a falta de infraestrutura física para a sua implantação, como por
exemplo, vestiários para os estudantes, sala de descanso após horário do almoço, má qua-
lidade das refeições oferecidas e falta de materiais didáticos para a execução dos novos
componentes curriculares, o Governo do Estado do Amapá, por meio da Secretaria de
Estado da Educação, implantou na Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, o
Programa na modalidade já citada. Exerço à docência na referida Escola, nas primeiras e
segundas séries do Ensino Médio ministrando a disciplina História e também dois outros
componentes curriculares dentro da modalidade de Ensino de Tempo Integral, a saber:
Estudo Orientado (E.O) e Disciplina Eletiva sendo que foi por meio deste último compo-
nente, que optei em aplicar as oficinas desenvolvidas neste Projeto de Pesquisa.

3.2. OS COMPONENTES CURRICULARES DA ESCOLA DE TEMPO INTE-


GRAL: A DISCIPLINA ELETIVA

A Eletiva é um Componente Curricular semestral executado por todos os


professores da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino que participam da moda-
lidade de Ensino de Tempo Integral. É estabelecida conforme o calendário escolar 2018,

169 Para mais informações sobre a implantação em Macapá (AP) das escolas do “Novo Saber” através do
programa de tempo integral.
Consultar:https://www.portal.ap.gov.br/noticia/0103/escolas-do-novo-saber-;
https://g1.globo.com/ap/amapa/noticia/estudantes-de-escolas-em-tempo-integral-no-ap-relatam-difi-
culdades-e-falta-de-estrutura.ghtml
170 Sobre o modelo pedagógico da Escola de tempo integral e dos componentes que compõe a parte di-
versificada do currículo, bem como suas especificidades, carga horária e interligação com a Base Na-
cional Comum Curricular (BNCC), consultar: ZIMMERMAN, Juliana (0rg). Modelo pedagógico me-
todologias de êxito da parte diversificada do currículo componentes curriculares Ensino Médio. Insti-
tuto de Corresponsabilidade pela Educação. Recife, 2º ed., 2016.
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da Secretária de Educação do Estado do Amapá (SEED). Compõe-se de uma carga ho-
rária fixa semanal de duas horas aulas que correspondem a 100 minutos, às quartas-feiras
conforme horário determinado pelo Serviço Técnico e Pedagógico da Escola, mais sába-
dos letivos equivalentes ao dia da semana supracitado. Devido as especificidades do Pro-
grama de Tempo Integral, o Projeto de Pesquisa foi realizado dentro do prazo de duração
da Eletiva que é de um semestre.

Cada disciplina Eletiva é feita por meio de um projeto transdisciplinar171 exe-


cutado por uma equipe de no máximo 03 professores que aplicam conjuntamente, con-
forme seus conteúdos semestrais, oficinas práticas. A construção do projeto é desenvol-
vida a partir de um diagnóstico realizado com os estudantes. Por meio desse diagnóstico
individualizado, o estudante sugestiona por escrito as propostas temáticas que gostaria de
estudar em uma Eletiva. Posteriormente, essas propostas conforme podemos observar no
gráfico 1 são tabuladas. A partir daí as equipes de professores se formam com o objetivo
de escolher e de elaborar a sua proposta da Eletiva bem como, os conteúdos que serão
ministrados.

Gráfico 1 - Temática sugeridas pelos estudantes.


80 70
70
60
50
40 30
23
30
20
16 20
11
21
13 15 14
10 4
0

Fonte: Diagnóstico realizado na Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino para a elaboração das
Eletivas do 1º semestre. Data 20/03/2018

171 No 1ª semestre de 2018 os docentes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino executaram
seis projetos transdisciplinares, sendo que cada um deles englobou as três diferentes áreas do conhe-
cimento: Ciências exatas e da natureza, códigos e linguagens e Ciências humanas e suas tecnologias.
Cada projeto foi coordenado por no máximo 03 docentes. No caso especifico das oficinas envolvendo
este trabalho de pesquisa, incorporamos a proposta, dentro deste componente curricular a partir de um
trabalho em conjunto com as disciplinas inglês e matemática. Porém, no que diz respeito à sua aplica-
ção por causa das singularidades metodológicas, optamos em executar a metodologia proposta, apenas
com 12 estudantes (04) de cada turma.
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Entende-se por disciplina Eletiva, conforme as diretrizes reguladoras da Es-
cola de Tempo Integral, as diferentes necessidades dos estudantes nas diversas áreas do
Conhecimento e na vida pessoal. Essas necessidades, conforme o gráfico 1 apresentado
acima, sugestiona algumas opções temáticas. Entre as sugestões apresentadas pelos es-
tudantes podemos observar no gráfico 1, a temática relacionada ao preconceito racial foi
contemplada. Embora exista uma quantidade significativa de alunos negros que estudam
na Escola, a temática do preconceito racial ainda aparece de maneira tímida e velada,
porém, ela ocupa o seu espaço de reivindicação.

No que concerne a aplicação das oficinas especificas deste Trabalho de Pes-


quisa acadêmica escolhemos promover o estudo das Cantigas de Marabaixo neste espaço
de discussão sobre o preconceito racial. Assim a Eletiva surgiu da integração de três áreas
do conhecimento: Matemática, Inglês e História, e passou a ser intitulada pelos professo-
res que a compuseram de Tendência Black. A Eletiva Tendência Black foi devidamente
apresentada juntamente com as demais Eletivas, para todos os estudantes da Modalidade
de Ensino de Tempo Integral no dia denominado de Feirão das Eletivas, conforme a ima-
gem abaixo.

Imagem 38 – Auditório da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino no dia das apresentações das
temáticas das Disciplinas Eletivas. Data: 25/04/2018. Foto: Acervo pessoal da pesquisadora

Neste dia, todas as equipes de professores apresentaram um após o outro, no


auditório da Escola, as suas respectivas temáticas de Eletivas para os estudantes. Cada

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estudante após ouvir as propostas das Eletivas apresentadas pelos professores, teve o di-
reito de escolher uma primeira e uma segunda opção em que desejaria participar, porém,
o estudante foi preferencialmente agrupado conforme a primeira opção de escolha. Sendo
assim, a Eletiva Tendência Black foi composta de 35 estudantes de salas e de sérias dife-
rentes (1ª e 2ª ano). A Eletiva Tendência Black teve como proposta principal abrir o es-
paço de discussão sobre o preconceito racial a partir da ressignificação da beleza, e da
cultura negra por meio das Cantigas de Marabaixo. Cada professora da Eletiva optou por
vieses diferentes para alcançar tais objetivos.

No caso da disciplina Inglês, as oficinas foram de “Bijuterias”, “Maquiagem


Afro” e de “Como vender bijuterias em Inglês para um estrangeiro” sendo que as mesmas
estiveram focadas na ressignificação dos elementos corpóreos e na estética negra. Já na
Matemática, foram mobilizados saberes práticos ligados a conhecimentos tradicionais da
cultura africana que são empregados em ações cotidianas para a confecção dos instru-
mentos musicais do Marabaixo. E na disciplina História, “Os Ladrões de Marabaixo e o
legado das Cantigas dos afrodescendentes no Amapá”, focamos nas Cantigas de afirma-
ção da identidade negra.

Todos os 35 estudantes da Eletiva Tendência Black foram convidados para


participar das oficinas destinadas a aplicação deste Projeto de Pesquisa Acadêmica, po-
rém, as condições logísticas e de apoio humano, nos levou a estabelecer critérios quanto
a participação dos mesmos. Tais critérios basicamente estiveram pautados na própria di-
nâmica da Eletiva uma vez que algumas oficinas foram realizadas de forma simultânea.
Sendo assim, os estudantes fizeram suas escolhas quanto a opção de temática que gosta-
riam de desenvolver em conjunto ou em separado, com os professores da Eletiva Tendên-
cia Black. No total, 12 estudantes aceitaram o desafio de participar juntamente comigo
do trabalho de pesquisa a respeito das Cantigas de Marabaixo.

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3.3. AULAS AUDIÇÕES DAS CANTIGAS DE MARABAIXO

Para iniciar a aplicação das oficinas foram previamente selecionadas quinze


letras de Cantigas de Marabaixo172. Utilizou-se como parâmetro para a escolha das mú-
sicas as tipologias que classificam as Canções produzidas pelos afrodescendentes173 as
quais foram enquadradas em: Cantigas de trabalho, Cantigas de dor, Cantigas de amor,
Cantigas de resistência religiosa e Cantigas de afirmação da identidade negra. Realizamos
com estudantes audições das seguintes Cantigas: Mar Abaixo, Guadariô, Meu tambor ro-
lou; Divino rei; Eu caio, eu caio; Balão de ouro; Vem para cá, ioiô; Resgate da festa de
São José; Mistura de Raças; Da nossa história; Desafio; Negra formosa; Aonde tu vai,
rapaz; Nossa cultura; Nego odiá. As audições foram feitas com o devido acompanha-
mento das letras das músicas e na ocasião, foi solicitado que ouvissem as Cantigas e reti-
rassem palavras ou expressões conhecidas ou não, que se reportassem: a lugares, nome
de pessoas ou que fizessem alguma menção ao negro.

Imagem 39 – Aula audição das Cantigas de Marabaixo. Para audição utilizamos dois módulos aula de 50
minutos cada. Biblioteca da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora. Macapá (AP). Data: 04/04/2018

Após a escolha das palavras e expressões presentes nas Cantigas de Mara-


baixo foi solicitado a seguinte atividade extraclasse: procurar no dicionário de Língua

172 Festival cantando o Marabaixo Macapá, Amapá-Amazônia-Brasil, dez. de 2016 e Marabaixo. Macapá,
Amapá-Amazônia-Brasil, set. 2017. Ambos tiveram as letras das músicas devidamente transcritas por
esta pesquisadora uma vez que os CDs não vem acompanhados do encarte das mesmas.
173 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, p. 177-204, 2015. p. 185.
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Portuguesa, internet, livros físicos e online, os significados e trazer na próxima aula. A
grande maioria teve muita dificuldade em fazer a tarefa, uma vez que o significado de
muitas palavras e expressões sequer aparecem no dicionário de Língua Portuguesa. Ao
entregarmos a correção da atividade informamos que as poucas palavras retiradas da fonte
de pesquisa proposta, não condiziam com o real significado presente na manifestação.
Propusemos enquanto resolução, uma pesquisa contemplando o significado de palavras e
expressões das Cantigas de Marabaixo. Na ocasião apresentamos o Dicionário Histórico
Brasil – Colônia e Império de Ângela Viana Botelho e Liana Maria Reis174 e o Dicionário
Virtual e Ilustrado Africano175 onde tomamos como referência para o nosso trabalho, o
layout das duas obras citadas.

Informamos que filtraríamos as palavras e expressões escolhidas para então


iniciarmos o trabalho de pesquisa. A metodologia consistiu em pesquisa bibliográfica,
coleta de dados nos sítios tradicionais de incidência da manifestação do Marabaixo de
Macapá nos bairros (Central, Santa Rita e Laguinho e no Curiaú). Visitação a Fortaleza
de São José de Macapá e em Mazagão Velho, lugares de grande relevância histórica, os
quais estão associados, as palavras e expressões retiradas, das letras das Cantigas audita-
das.

Para a operacionalização metodológica aplicamos quatro oficinas fundamen-


tadas a priori, nos três conceitos elementares de competências cognitivas da tipologia
ontogenética da Consciência Histórica176. As oficinas executadas foram as seguintes: 1ª
Oficina: Curiaú – Uma introdução aos Estudos Históricos dos Ladrões de Marabaixo, 2ª
Oficina: Uma Visita pelos locais de incidência do Marabaixo de Macapá (AP). A Forta-
leza de São José de Macapá, o bairro do Laguinho e a Favela; 3ª Oficina: Mazagão Velho.
Visitando nossas raízes negras, 4ª Oficina: Elaboração do DICIONÁRIO ILUSTRADO

174 VIANNA BOTELHO, Ângela. MARIA REIS, Liana. Dicionário Histórico Brasil – Colônia e Império.
6ª ed.- SP: Autêntica, 2007.
175 DICIONÁRIO VIRTUAL E ILUSTRADO AFRICANO CULTURA E HISTÓRIA AFROBRASI-
LEIRA. Alunos do 2º ano B - Profª Elenice 2014. Disponível em http://pt.calameo.com/bo-
oks/0010585343f2aa72dc7f6.
176 O conceito operacionalizado nas três oficinas foi o de consciência história. Para cada oficina foi ins-
trumentalizado uma competência cognitivas. Orientação temporal, expectativas futuras e orientação
para a vida prática. RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico.
Una hipótesis ontogenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires,
Ano 4, n.7, p.27-36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o portu-
guês por Ana Claudia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Sch-
midt, p. 27 a 37.
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LADRÕES DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO.
VOL. 1.

3.4. O CONCEITO DE ENSINO DE HISTÓRIA INSTRUMENTALIZADO E O


RECORTE TEMPORAL E ESPACIAL

As palavras e expressões selecionadas para as oficina tiveram como critérios,


a tipologia das Canções afrodescendentes177 sendo que para cada oficina ministrada foi
instrumentalizado os conceitos elementares de competências cognitivas da teoria ontoge-
nética da Consciência Histórica178. A aplicação do trabalho de pesquisa objetivou, nas
etapas propostas, desenvolver mudanças estruturais nos níveis de Consciência Histórica
trazendo, através das Cantigas de Marabaixo, a constituição de sentido histórico da escra-
vidão africana no Amapá, no século XVIII. Assim, a execução da metodologia tomou
como pressuposto teórico os conceitos elementares da tipologia ontogenética do pensa-
mento histórico compreendido aqui, como um processo de digestão de experiências do
tempo, em formas de competências narrativas.

As competências narrativas versaram na habilidade para narrar, por meio de


palavras e expressões presentes nas Cantigas de Marabaixo, acontecimentos históricos
relacionados a escravidão no Amapá no século XVIII. Tal competência teve o intuito de
desenvolver as seguintes habilidades: interpretação das temporalidades históricas implí-
citas nas letras das Cantigas e orientação temporal que servisse para a vida prática dos
estudantes. O estudo das letras das Cantigas de Marabaixo objetivaram desenvolver atra-
vés de três etapas a construção de sentido histórico acerca da história da população negra
no Amapá, enfatizando a introdução do negro como mão de obra compulsória na cons-
trução da Fortaleza de São José de Macapá, e no atual distrito de Mazagão Velho, no
século XVIII. As oficinas foram realizadas partindo da premissa de que a Aprendizagem
histórica implica muito mais do que um simples adquirir de conhecimento do passado e

177 A tipologia das Canções do Marabaixo foi dividida em: Canções de trabalho, Canções de dor, de amor,
religiosas e de afirmação da identidade étnica. Cf. em ABREU. Martha. O legado das Canções escra-
vas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais no pós-abolição. Revista Brasileira de História.
São Paulo, v. 35, nº 69, p. 177-204, 2015, p. 181.
178 RÜSEN, Jorn. Op. cit., p. 27 a 37.
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sim, em competências que são alcançadas de forma progressiva, passando das formas
tradicionais de pensamento, aos modos genéticos179.

Desse modo, utilizamos a tipologia ontogenética da Consciência Histórica180


de maneira investigativa, para descobrir a extensão do conhecimento implícito e também,
os marcos e princípios operativos que dão sentido ao passado, através do estudo de pala-
vras e expressões presentes nas Cantigas de Marabaixo. A seleção de quais Cantigas da
festividade do Marabaixo que seriam utilizadas neste trabalho obedeceu também a crité-
rios de escolhas levando em conta que a ancestralidade de maior respeito da manifestação
do Marabaixo, é sempre referendada pela velha guarda da manifestação, como sendo des-
cendentes diretos dos africanos que foram escravizados Mazagão Velho ou que trabalha-
ram na construção da Fortaleza de São Jose de Macapá. Focamos também, em Cantigas
que evidenciam em suas letras a afirmação da identidade negra por considerar que através
delas, várias outras temáticas estão interligadas à escravidão e que as mesmas, potencia-
lizam estudos referentes ao período histórico proposto181.

Isto posto, faz-se relevante mencionar que o recorte temporal e espacial para
a utilização das Cantigas da festividade do Marabaixo foi pautada em critérios que refe-
rendam as proposições do Art. 26 A, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
– LDBEN, das competências e habilidades propostas pelos Parâmetros Nacionais Curri-
culares (PCNs) e da Lei 11.645/2008182. Assim, as proposições que foram trazidas para
integralizar a parte diversificada do currículo do 2º ano do Ensino Médio, da disciplina
História, contemplaram como escopo principal desta metodologia de pesquisa, instigar o

179 A teoria ontogenética a qual possibilita, segundo Jorn Rüsen (1992), mudanças estruturais nos níveis
de Consciência histórica, é apresentada pelo autor a partir de quatro estágios (tradicional, exemplar,
critica e genética), para cada um deles existem seis fases. Optamos em trabalhar apenas as três opera-
cionalizações básicas da Consciência Histórica proposta na teoria, a saber: orientação temporal, ex-
pectativas futuras e orientação para a vida prática, uma vez que elas são pré-requisitos para os estágios
propostos. Cf. em RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico.
Una hipótesis ontogenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires,
Ano 4, n.7, p.27-36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o portu-
guês por Ana Claudia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Sch-
midt. p. 27 a 37.
180 RÜSEN, Jorn. Op. cit., p. 31 a 35.
181 No Seção 2 desta dissertação analisamos também as Canções de afirmação da identidade negra e a
partir delas, outras, que estão interligadas como o processo de escravidão negra no Amapá no século
XVIII, como por exemplo, as Canções de resistência religiosa que abordam a origem histórica de
Mazagão Velho (AP).
182 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei nº 9.394/96; Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 que
instituem o Ensino de História e cultura africana e indígena; AMAPÁ. Diretrizes Curriculares da Edu-
cação Básica do Estado do Amapá, 2014.
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aluno a adquirir competências que o levassem a experimentar o tempo passado, a inter-
preta ló na forma histórica, e a utiliza ló com um propósito prático na vida diária. Por
fim, produzimos, ao término da pesquisa, o DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE
MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1.

3.5. A APLICAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA E COLETA DE DADOS

3.5.1. 1ª OFICINA: CURIAÚ UMA INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS HISTÓRI-


COS DOS LADRÕES DE MARABAIXO

 Tipologia das Canções afrodescendentes: Cantigas de trabalho, Cantigas


de dor
 Tipologia ontogenética da Consciência Histórica: Orientação temporal,
Expectativas futuras e Orientação para a vida prática

A primeira oficina foi dividida em duas etapas sendo que para ambas focamos
na operacionalização do conceito de orientação temporal, considerado um dos elementa-
res na teoria ontogenética da Consciência Histórica183. Utilizamos a tipologia das Canções
de trabalho e Canções de dor184 para associar palavras e expressões presentes nas Cantigas
de Marabaixo, ao processo histórico da escravidão negra no Amapá, no século XVIII. As
Cantigas de Marabaixo foram utilizados como forma de unir o passado ao presente185
com vistas a produzir, através de coletada de dados das palavras e expressões contidas
nas músicas, interpretações históricas da realidade atual186.

183 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis
ontogenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7,
p.27-36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana
Claudia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt, p. 33 a 34.
184 Na Seção 2 desta dissertação, analisamos também as Canções de afirmação da identidade negra e a
partir delas, outras, que estão interligadas como o processo de escravidão negra no Amapá no século
XVIII, como por exemplo, as Canções de resistência religiosa que abordam a origem histórica de
Mazagão Velho (AP).
185 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt, p.33 a 34.
186 Ibid., p. 38.
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3.5.1.1. 1ª ETAPA – PALESTRA SOBRE A ORIGEM HISTÓRICA DO MARA-
BAIXO. COLABORADOR: FÁBIO JOSÉ DO ESPÍRITO SANTO
SOUZA

 Local: Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Macapá (AP).


Data:07/04/2018

Na primeira etapa realizamos uma palestra na Escola Estadual Professora Ra-


imunda Virgolino com informações básicas acerca do Marabaixo. Tivemos como cola-
borador Fábio José do Espírito Santo Souza187, a razão de sua escolha foi porque quería-
mos começar apresentando a proposta de estudo das Cantigas de Marabaixo, através da
experiência prática de jovens pertencentes a própria manifestação e com idade similar à
de nossos alunos. Nas conversas preliminares sobre a temática, detectamos o desconhe-
cimento por parte dos estudantes da presença de praticantes jovens dentro da festividade
do Marabaixo. Como eu já tinha presenciado várias apresentações do colaborador, na
Associação Cultural Raimundo Ladislau, cantando e tocando eximiamente bem as Can-
tigas de Marabaixo, achei que seria muito importante a contribuição dele.

No transcurso de planejamento da palestra, apresentei a Fábio José do Espí-


rito Santo Souza a proposição do trabalho de pesquisa de Mestrado, enfatizei o legado
das Cantigas de Marabaixo e a importância que possuem para a constituição de sentido
histórico, sobre a escravidão africana no Amapá. O deixei bem à vontade (dentro da te-
mática sugerida), apenas pedi que fizesse em sua explanação um panorama geral do que
é o Marabaixo e dos elementos básicos contidos na festividade enfatizando é claro, as
Cantigas de trabalho e Cantigas dor da manifestação. A palestra aconteceu no dia 12 de
abril de 2018, onde previamente os alunos receberam um formulário contendo algumas
palavras e expressões, que não tinham conseguido achar o significado durante a aula au-
dição. Como utilizamos nesta oficina a tipologia das Cantigas de trabalho e Cantigas de

187 Fábio José do Espírito Santo Souza, 20 anos, é morador do bairro do Laguinho, sitio tradicional do
Marabaixo em Macapá (AP) é considerado uma das lideranças do grupo Juventude Marabaixeira, As-
sociação composta de jovens e crianças da nova geração de dançadeiras, tocadores e cantadores, que
vem se preparando para receber a responsabilidade da continuidade do Marabaixo. A família de Fábio
possui uma história dentro do Marabaixo, ele é neto de uma das mais importantes lideranças da mani-
festação Raimundo dos Santos Souza, profundo conhecedor das plantas medicinais, das raízes e ervas
da floresta amazônica, contador de histórias, griô, suas garrafadas ficaram famosas em todo o Estado
do Amapá, foi também folião nato e por muitos anos, rei momo do carnaval amapaense, hoje já fale-
cido, seu nome empresta a vida a um museu na cidade: Museu Sacaca. Foi por todo esse histórico
familiar e de militância jovem dentro do Marabaixo, que escolhemos o palestrante.
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dor as palavras e expressões se enquadraram nesta temática, a partir do estudo da seguinte
Cantiga: Mar Abaixo, de autoria de Manoel Duarte e Rosangela Gungá.

De antemão os estudantes foram orientados que após a palestra, deveriam en-


tregar os formulários preenchidos com as informações coletadas e à medida que tivessem
dúvidas e curiosidades, fizessem perguntas. Como a palestra fazia parte da aplicação da
primeira oficina do trabalho de pesquisa de Mestrado, mas também, compreendia a uma
ação conjunta que deveria ser executada pelas disciplinas de matemática188, e história,
decidimos então, ofertá-la para toda turma. Porém, com uma ressalva: apenas doze estu-
dantes, que já tinham sinalizado interesse em participar do trabalho de pesquisa foi que
tiveram de entregar o material coletado.

No que se refere a palestra foi destacado a origem histórica do Marabaixo e


as relações das Cantigas de trabalho e Cantigas de dor com a escravidão africana no
Amapá. Foi frisado o significado das cantadeiras, dançadeiras, e tocadores de Caixa, e o
que são as Cantigas de Marabaixo.

Imagem 40 – Palestra sobre a origem histórica do Marabaixo. Colaborador: Fábio José do Espírito Santo
Souza. Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Arquivo pessoal da pes-
quisadora. Data: 07/04/2018

188 Como já frisamos no início do capítulo, as especificidades do programa de tempo integral e do com-
ponente curricular onde nos propusemos a aplicar as oficinas do trabalho de mestrado possui especi-
ficidades. Consultar: ZIMMERMAN, Juliana (0rg). Modelo pedagógico metodologias de êxito da
parte diversificada do currículo componentes curriculares Ensino Médio. Instituto de Corresponsabi-
lidade pela Educação. Recife, 2º ed., 2016.
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Imagem 41 – Fábio José do Espírito Santo Souza ouvindo as perguntas dos estudantes sobre a origem das
Cantigas de dor do Marabaixo. Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão.
Arquivo pessoal da pesquisadora. Data: 07/04/2018

Imagem 42 – Fábio José do Espírito Santo Souza falando sobre a origem do Marabaixo. Escola Estadual
Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. 07/04/2018

De forma geral as perguntas mais frequentes giraram em torno da Caixa de


Marabaixo e de quem eram os tocadores, as dançadeiras e cantadeiras. Para ilustrar tais
elementos básicos houve um cuidado de selecionar antecipadamente algumas fotos do
Ciclo do Marabaixo 2017 e a medida que surgiam perguntas, o palestrante procurava res-
ponde-las ilustrando com imagens da manifestação. Sem dúvida, o que mais gerou curi-
osidade nos estudantes foi a Caixa de Marabaixo, e o significado ancestral do toque que
nela está contido. Várias perguntas foram feitas sobre o processo de produção original
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deste instrumento e quais eram hoje os materiais empregados para a sua confecção. Foi
explicado que “a Caixa, tal como é utilizada em sua versão contemporânea no Marabaixo,
é um instrumento de origem europeia”189. A informação deixou os estudantes bastante
intrigados porque, na visão deles, em nada o som do toque na atualidade, lembra a sono-
ridade de um instrumento musical europeu.

A temática deixou os estudantes bastantes instigados principalmente porque


nosso colaborador pertence ao segmento da juventude do Marabaixo, possui uma lingua-
gem acessível ao jovem, e se mostrou bastante solicito em responder as perguntas. No
que se refere a Caixa de Marabaixo, único instrumento que acompanha as Cantigas de
Marabaixo, houve indagações, sobre o seu processo de confecção, quais matérias primas
são empregadas e porque hoje os materiais utilizados na sua produção, se diferem daque-
les produzidos através do método tradicional. Ocorreram também perguntas sobre como
aconteceu a incorporação do instrumento na manifestação e os diferentes tipos de toque
que a Caixa de Marabaixo produz190. Um dos momentos que considerei ser de maior re-
levância na palestra foi a abordagem feita sobre os diferentes sons e toques da Caixa de
Marabaixo, sendo mostrado inclusive, algumas peculiaridades de toques, dependendo do
grupo onde o tocador está inserido.

189 Fábio José do Espírito Santo Souza, trecho do relato concedido dia 07/04/2017, para os estudantes do
2º ano do Ensino Médio, da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Macapá (AP).
190 As indagações aqui descritas sobre a Caixa de Marabaixo não faziam parte do questionário de palavras
e expressões da Canção auditada, porém, devido o instrumento possuir um conteúdo ancestral que liga
seu som, ao significado de resistência a escravidão africana no Amapá e consequentemente, contribui
para estabelecer marcos de orientação temporal, foi que escolhemos frisar este momento da oficina.
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Imagem 43 – Fábio José do Espírito Santo Souza mostrando para os estudantes o toque tradicional das
Caixas de Marabaixo. Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão. Acervo
pessoal da pesquisadora. Data: 07/04/2018

Imagem 44 – Fábio José do Espírito Santo Souza ensinado as alunas, com auxílio da pesquisadora, a sim-
bologia da dança do Marabaixo. Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 07/04/2018

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Imagem 45 – Registro da atividade com Fábio José do Espírito Santo Souza, a pesquisadora e com as pro-
fessoras Patrícia e Rita, docentes que também estavam responsáveis pela Eletiva. Foto: Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 07/04/2018

A palestra foi bastante relevante para introduzir a temática do Marabaixo e


dos elementos básicos contidos na manifestação. Consideramos que o objetivo principal
desta 1ª Etapa da oficina foi alcançado uma vez que era de mostrar a relação do Marabaixo
com a escravidão africana no Amapá, no século XVIII. Trazer um representante do Ma-
rabaixo que possui antepassados que foram escravizados acabou por reforçou ainda mais
a questão da importância do sentimento de pertencimento do negro, a manifestação.

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3.5.1.2. 2ª ETAPA – VISITA AO CURIAÚ: A OFICINA DE CAIXAS DE MARA-
BAIXO DO MESTRE PEDRO DO ROSÁRIO DOS SANTOS

Imagem 46 – Ainda na Estadual Professora Raimunda Virgolino, a pesquisadora entregando o formulá-


rios de coleta de dados e dando orientações gerais para a visita ao Curiaú. Foto: Jocimar Paixão. Acervo
pessoal da pesquisadora. Data: 14/04/2017

Imagem 47 – Registro da saída da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino para a pesquisa de
campo no Curiaú. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 14/04/2018

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3.5.1.3. A OFICINA

Imagem 48 – A pesquisadora e os estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, ouvindo


o relato de Pedro do Rosário dos Santos sobre a origem de palavras e expressões das Cantigas de trabalho
e dor do Marabaixo. Local: oficina de produção de Caixas de Marabaixo. Curiaú. Data: 14/04/2018. Foto:
Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora

Pedro Rosário dos Santos191 conhecido na comunidade do Marabaixo como


“Pedro Bolão”, é fazedor e tocador de Caixas de Marabaixo. Em sua casa no Curiaú192
(AP), possui uma pequena oficina onde fabrica instrumentos musicais e também promove
oficinas para crianças e jovens aprenderem o ofício. O músico é considerado também um
dos maiores divulgadores do Batuque e Marabaixo no Brasil e no mundo, desenvolvendo
trabalhos a mais de 20 anos no Estado do Amapá. Foi por todo esse know-how que resol-
vemos conhecer a sua oficina já que a comunidade do Curiaú possui uma relação estreita
com o nosso Objeto de Pesquisa. O Curiaú se constitui de famílias afrodescendentes que

191 Pedro Rosário dos Santos é considerado um dos maiores divulgadores do Batuque e Marabaixo no
Brasil e no mundo, desenvolvendo trabalhos a mais de 20 anos na comunidade Curiaú, através do
grupo Raízes do Bolão. Em 2002, o grupo Raízes do Bolão apresentou as Canções do Marabaixo em
alguns países europeus como a Alemanha, França e Inglaterra e em 2013, fez turnê em todos os estados
brasileiros através do projeto Sonora Brasil. O sonora Brasil é um dos mais importantes projetos
culturais do país, realizado em circuito nacional e promovido pelo Serviço Social do Comércio (Sesc).
Em 2017, nosso colaborador recebeu o prêmio de Mestre da Cultura Brasileira, pelo Ministério da
Cultura. Em março de 2018, com a criação da Academia do Marabaixo e Batuque no Amapá, recebeu
uma cadeira como imortal.
192 Devido ao Curiaú estar a aproximadamente 10 km de distância da Escola Estadual Professora Rai-
munda Virgolino, solicitamos autorização e dispensa dos estudantes do turno da manhã, para partici-
parem da oficina, sem prejuízo das demais atividades escolares.
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guardam na memória a história de resistência a escravidão de seus antepassados por meio
das festas religiosas, do ritmo do Batuque, da dança e das Cantigas de Marabaixo.

Imagem 49 – Estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino e a pesquisadora do projeto,


ouvindo atentamente os relatos de Pedro Rosário dos Santos sobre a relação das Cantigas de trabalho e
dor do Marabaixo, com a origem histórica do local. Curiaú. Data: 14/04/2018. Foto Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora

De acordo com Pedro Bolão a população do Curiaú193, é constituída de negros


que descendem de africanos que foram escravizados durante a construção da Fortaleza
de São José de Macapá no século XVIII. A população do Curiaú tem laços sanguíneos e
tradições culturais muito fortes, Pedro Bolão por exemplo, reside em uma área ampla
onde vários de seus familiares possuem casas e assim como bem disse: “conservam a
tarefa de dar continuidade a cultura de seus ancestrais”194.

Os relatos apresentados por Pedro Rosário dos Santos (Pedro Bolão) a res-
peito do significado das seguintes palavras e expressões: negro nagô, mar-abaixo, dança
do Marabaixo e escravidão, tronco, capitão do mato, senzala, África, Portugal, Marrocos,
Mazagão Velho, açucena, presentes nas seguintes letras das Cantigas de Marabaixo:
“Mar Abaixo” (Gungá), “Meu tambor rolou” (José Hosana), “Eu caio, eu caio” ( inter-
pretado por Danny Pancadão) e “Balão de ouro” ( interpretado por Nek), apontam indícios

193 O Curiaú é uma comunidade quilombola que fica localizada em Macapá (AP). Distante a 8 km do
centro comercial da capital, a região encontra-se dentro da área de proteção ambiental (APA-Curiaú),
e é considerada um importante sítio histórico e ecológico. Fonte: http://amazoniareal.com.br/vila-do-
curiau-guarda-a-memoria-da-historia-dos-quilombolas-no-amapa/
194 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido no Curiaú, para estudantes da Escola Estadual Profes-
sora Raimunda Virgolino no dia 14/04/2018.
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para a origem ética do povos africanos que vieram para o Amapá durante o período do
tráfico negreiro no Brasil. De acordo com Canto195 os negros que vieram escravizados
para o Amapá eram provenientes da África ocidental inclui o Mali, Gâmbia, Guiné e Se-
negal, fazem parte os povos Mandê ou mandingas, Fulbe ou Fula, Hausa, Songhai, Tu-
kulóor, Wolof, Serer, Mossi, Dagomba, árabes da Mauritânia e muitos outros pequenos
grupos. Mas no relato de Pedro bolão podemos identificar evidencias que atestam no
Amapá a presença também de povos do sudoeste do continente africano, conforme narra:
“[...] os primeiros Marabaixos eram bem diferentes desses atuais os homens jogavam a
carioca”196.

A carioca é uma versão local criada para o jogo da capoeira, prática comum
no início do século XX na frente da Igreja de São José de Macapá, durante as festividades
do Marabaixo. O IPHAN em 2013, fez um minucioso inventário do Marabaixo atestando
através de depoimentos e de fotos datadas197 do início do século passado, que o jogo da
carioca era realizada em tal espaço.

Imagem 50 – A Carioca “Em frente à matriz de Macapá, antes das competições de luta-livre e capoeira
(carioca)”. Legenda adapatada. In: PEREIRA, Nunes. O sahiré e o Marabaixo: Tradições da Amazônia.
Contribuição ao Primeiro Encontro Brasileiro de Folclore. Rio de Janeiro: Gráfica Ouvidor, 1951. p. 43.

O certo é que tal evidencia também colhida através do relato de Pedro Bolão
aponta a presença de africanos escravizados provenientes da região de Angola, uma vez

195 CANTO, Fernando. Água benta e o Diabo. Fundecap: 1998. p. 18.


196 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
197 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 24.
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que existe uma forte influência de africanos escravizados vindos desta região da
África198, na prática da capoeira. Já existem alguns estudos preliminares no Marabaixo,
mas ainda não aprofundados, sobre a contribuição de uma outra etnia proveniente do su-
doeste africano: os Iorubas. É o caso do Marabaixo na comunidade rural de Campina
(Curiaú) , município de Macapá, onde se faz o “o uso do afoxé e de outros instrumentos
típicos de percussão”199 específicos desta etnia.

A África aparece no relato de Pedro Bolão primeiramente como referência


de ancestralidade sempre associada à sua história familiar característica bastante recor-
rente em comunidades formadas por afrodescendentes, como é o caso do Curiaú. Embora
o Curiaú não esteja expresso em palavras nas Cantigas auditadas, e nem seja o objeto de
estudo deste trabalho de pesquisa, o cruzamento das versões historiográficas sobre a ori-
gem do Curiaú, com aquelas que permeiam o relato de nosso colaborador, tornam-se re-
levantes ao longo deste trabalho. Isso porque os praticantes do Marabaixo atual se consi-
deram descendentes diretos dos africanos que vieram escravizados para a construção da
Fortaleza de São José de Macapá, no século XVIII e que por sua vez, ocuparam a região
que compreende o Curiaú. Assim, a proposta que trouxemos para esta oficina foi de des-
pertar no estudante proposições investigativas sobre esta relação uma vez que, a produção
de saberes históricos no cotidiano escolar requer um trabalho de esforço, pesquisa, análise
e síntese que tem como objeto central a formação da Consciência Histórica do aluno200,
conforme atesta a imagem 51:

198 Banco de Dados do Tráfico Transatlântico. Disponível em: http://www.slavevoyages.org/voyage/se-


arch
199 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 9.
200 GUIMARÃES, Selva. A pesquisa e a produção do conhecimento em sala de aula. In: Didática e prática
de Ensino de História experiências, reflexões e aprendizagens, p 205 e 206. Ed. Papiros: Campinas,
São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e trabalho pedagógico)
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Imagem 51 – Oficina de produção de Caixas de Marabaixo de Pedro do Rosário dos Santos. Curiaú. Foto:
Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 14/04/2018

De acordo com a imagem acima, podemos perceber que a Consciência His-


tórica do estudante passa a ser instigada quando acontecesse uma interlocução entre as
letras das Cantigas e os saberes envoltos nos processos de produção da Caixa de Mara-
baixo. Uma outra forma que levou isso a acontecer foi por meio do relato de Pedro Bolão
já que este foi riquíssimo quanto a percepção do passado da escravidão vivido pelos seus
ancestrais, durante o tempo de Construção da Fortaleza de São José de Macapá (1777-
1785), pois, estabelece em sua fala, marcos de orientação temporal:

Quem sustentou o Amapá foi (sic) os negros o pessoal não sabe a im-
portância que esses negros tem em fazer aquela Fortaleza, foi o pessoal
meu que trabalhou naquele lugar, pessoal da minha tribo trabalhou para
ficar aquilo tudo bonito carregando pedra daqui da Pedreira para lá, não
é fácil não201

É absolutamente indispensável suscitar no estudante a Consciência Histórica


através desses marcos de referência relacionais e identitários, uma vez que isso contribui
por situar historicamente as identidades locais, as nacionais, as latino-americanas e as
mundiais202 com a sua própria identidade, enquanto sujeito histórico. Assim, através da

201 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
202 GONÇALVES, Márcia de Almeida. História local: O reconhecimento da identidade pelo caminho da
insignificância, p.182 in: Didática e Prática de Ensino de História experiências, reflexões e aprendiza-
gens, p 205 e 206. Ed. Papiros: Campinas, São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e trabalho
pedagógico)
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análise dos relatos coletados pelos estudantes, procuramos indícios que apontavam tanto
para o significado das palavras e expressões contidas nas Cantigas de Marabaixo, quanto
para os elementos constituintes do autorreconhecimento e do sentimento de se sentir per-
tencer enquanto negro. Este foi o ponto de partida para o estudante compreender como se
constitui e se desenvolve a sua historicidade em relação aos demais, entendendo quanto
há de história em sua vida que é construída por ele mesmo e quanto tem a ver com ele-
mentos externos a ele.203

A respeito desta questão, a fala de Pedro Bolão revela muito bem sua Cons-
ciência Histórica sobre a história da ocupação negra no Amapá, quando diz que a história
de seus antepassados que viveram no Curiaú está diretamente associada aos africanos
escravizados que trabalharam na construção da Fortaleza de São José de Macapá (1777-
1815): “minha avó, mãe da minha mãe, nasceu em 1888, 13 de maio, nasceu liberta aqui
nos campos do Cria-ú”204

Analisando relato acima podemos identificar que a formação do Curiaú está


envolta em histórias que relatam a presença de negros fugidos do árduo trabalho escravo
realizado na construção da Fortaleza de São José de Macapá. A relação da Fortaleza de
São José de Macapá com o Curiaú é histórica, por isso escolhemos cuidadosamente o
local objetivando suscitar no estudante a importância que o lugar possui para a formação
de sua própria identidade histórica enquanto afrodescendente. O Curiaú é uma comuni-
dade que fica localizada a 12 quilômetros do centro da cidade de Macapá (AP) onde
vivem famílias remanescentes de quilombolas que ainda guardam na memória, tal como
Pedro Bolão, a história dos seus antepassados. São ensinamentos que vem sendo repas-
sados aos mais jovens que vivem no lugar por meio das festas religiosas, pelo som do
Batuque dos tambores, dos cânticos das Bandaias e das Cantigas de Marabaixo.

203 SCHMIDT, Maria Auxiliadora. O Ensino de História Local e os seus Desafios da Formação da Cons-
ciência Histórica, p.190. In: Didática e Prática de Ensino de História experiências, reflexões e apren-
dizagens, p 205 e 206. Ed. Papiros: Campinas, São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e
trabalho pedagógico)
204 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
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Tivemos a oportunidade de presenciar a transmissão dessa herança cultural
africana através dos relatos colhidos pelos estudantes na oficina, mas sem dúvida, a prin-
cipal maneira de identificar o real significado de palavras e expressões presentes nas Can-
tigas de Marabaixo, foi por meio de observações da vivência cotidiana do Curiaú.

A comunidade do Curiaú é uma família extensa formada pelos parentes con-


sanguíneos e também, pela parentela de consideração, nesta lista estão inclusos padrinhos,
madrinhas, comadres, compadres, afilhados que vez por outra, são citados, a partir da
história de seus antepassados, em palavras e expressões das Cantigas de trabalho e Can-
tigas de dor do Marabaixo. São históricas fixadas por meio da música através de formas
de transmissão complexas onde se une o passado ao presente205 por meio do cruzamento
entre as “versões oficiais” com aquelas que permanecem vivas nas lembranças sobre a
origem histórica do local, conforme atesta o relato a seguir:

Olha o Curiaú foi essa vila que lhe eu falei, chegou essas três pessoas
aqui que vieram fugidos e se abancaram aqui no lago de Cria-ú. Eles
conseguiram esse campo e colocaram dois negros que vieram daí que
dessa descendência eu faço dessa parte dessa família que eram meus
antepassados e daí se criou essa gíria Cria-ú, campo do Cria-ú. Criar
boi, búfalo, boi selvagem, com o tempo vieram outras pessoas e modi-
ficaram para ser mais fácil de ser chamado. Mas a nossa linguagem, a
nossa origem é Cria-ú, eu moro no Cria-ú, é o maior orgulho que eu
tenho de falar assim, minha mãe dizia, tá entendendo? Essa é nossa his-
tória206

Essa sentimento de pertencimento ao território foi construído e teve seus


vínculos fortalecidos ao longo da história do Curiaú a partir de seu patriarca, símbolo de
construção identitário da comunidade, e por mais que as Cantigas que pesquisamos não
se reportassem ao seu nome, achamos pertinente aqui citar o porquê do significado da
expressão “Mar-Abaixo” no contexto de formação histórica do Curiaú, que inevitavel-
mente aparece nos relatos a partir de uma das possíveis versões ligadas ao seu patriarca
escravizado:

[...] o cara que trouxe o Marabaixo para cá, para o Curuçá (grifo meu)
foi Inácio da Bacaba. Ele chegou aqui numa jangada atravessando o rio
Mocambo, abaixo do rio Amazonas, com uma Caixa de Marabaixo. Ele

205 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt, p. 37.
206 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
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chegou aqui numa jangada e se abancou aqui no Curuçá, ele trabalhava
muito na roça, a noite ele...Para dar uma refrescada, ele amarrava os
quatro cachorros na cintura e tocava Caixa a noite todinha para os ca-
chorros dele207

As memórias deixadas pelos antepassados de Pedro Bolão sobre a história do


povoamento do Curiaú guarda lembranças de histórias contadas sobre chegada do pri-
meiro morador “Inácio da Bacaba”208, cativo que veio fugido da árdua rotina de trabalho
dos africanos escravizados durante a construção da Fortaleza de São José de Macapá. Os
relatos de seus ancestrais sobre os primeiros moradores do Curiaú, dão conta de que Iná-
cio da Bacaba chegou margeando, numa canoa e com uma Caixa de Marabaixo, o “rio
Mocambo” (região que compreende hoje o Curiaú de Fora). A região do Curuçá, hoje
Curiaú de Dentro, foi o local escolhido pelos primeiros moradores se estabelecerem, Iná-
cio da Bacaba, Manoel Paciência, Raimundo Ladislau, João Clímaco considerados pre-
cursores das composições das Cantigas de Marabaixo209.

São versões riquíssimas como essa, sobre a origem histórica do Curiaú, que
atestam a presença africana no Amapá, que participa como matriz formadora. Procuramos
desenvolver a sensibilidade histórica do estudante, através da capacidade de olhar o pas-
sado e resgatar, sua qualidade temporal210. Assim, propomos antes mesmo que chegás-
semos ao Curiaú, que eles ficassem atentos a tudo, em seus mínimos detalhes, durante o
trajeto. A mudança na paisagem, a disposição de como as casas são construídas, os uten-
sílios domésticos, as mobílias, a maneira de falar dos moradores, cada especificidade,
cada gesto foi pedido que descrevessem por escrito minuciosamente. Eles mais tarde se-
riam valiosos para nos ajudar a refletir e descortinar nas oficinas seguintes, novos signi-
ficados de palavras e expressões presentes nas Cantigas de Marabaixo mas que, não foram
contemplados nesta oficina.

207 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
208 Fazendo o cruzamento de fontes, Inácio da Bacaba aparece em vários relatos da velha guarda do Ma-
rabaixo, como um dos moradores mais antigos da comunidade quilombola do Curiaú. Cf. Ficha de
Identificação: Ofícios e Modos de Fazer. p. 10 de 20. In: IPHAN. Inventário das referências culturais
do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas
em meio digital no formato pdf (463 p.).
209 Ficha de Identificação: Formas de Expressão. p. 7 de 21. In: IPHAN. Inventário das referências cultu-
rais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível
apenas em meio digital no formato pdf (463 p.).
210 RÜSEN, J. A razão histórica: teoria da história; fundamentos da ciência histórica. Brasília, DF: UNB,
2001. p. 40.
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Todos esses elementos serviriam posteriormente para a busca de outros ver-
betes e aprofundamento e ampliação da pesquisa. O intuito foi de levar o estudante a
perceber que os atos de pesquisar continuam a se questionar permanentemente em busca
de novos horizontes na produção de saberes

[...] Ensinar história requer um diálogo permanentemente com diferen-


tes saberes, produzidos em diferentes níveis e espaços. Requer do pro-
fessor interrogações sobre a natureza, a origem do lugar e o tempo ocu-
pado sobre a produção dos diferentes saberes, que norteiam e assegu-
ram a sua prática em sala de aula. Os saberes que dialogam no interior
do processo educativo, em sala de aula, são provenientes de diversas
fontes orais: os saberes científicos, oriundos de pesquisa historiográ-
fica, educacionais e áreas afins; os saberes docentes, decorrentes das
disciplinas, dos currículos, dos profissionais, da experiência; os saberes
históricos escolares; os saberes que se constroem com base na vivencia
dos alunos; e os diferentes saberes sociais, provenientes dos espaços
de trabalho e lazer, das manifestações culturais, dos espaços de religio-
sidade , entre outros. Enfim, todos esses saberes em ação na sala de
aula, mediados pela ação dialógica dos sujeitos (alunos e professores)
são reconstruídos no processo de ensino/aprendizagem da história.211

Foi justamente traçando um diálogo constante com diferentes saberes, produ-


zidos em diferentes níveis e espaços que propusemos uma interlocução permanente com
o Ensino. No caso desta interlocução com o Curiaú, tivemos a oportunidade observar
durante nossa estada que a presença da africanidade é sentida em todo o cotidiano do
Curiaú.

Imagem 52 – Cotidiano no Curiaú. Fonte: Pesquisa de campo, 2013 (Unifap). Disponível em http://comu-
nidades.lides.unifap.br/condicoes_vida/curiau.html.

211 GUIMARÃES, Selva. A pesquisa e produção de conhecimento em sala de aula. p. 207. In: Didática e
prática de Ensino de História, experiência reflexões e Aprendizagem, 13ª ed. São Paulo: Papiros, 2014.
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Conforme podemos ver na imagem acima, esta africanidade fica claramente
expressa no modo como se constrói as casas; a relação com a natureza; como estão dis-
postos os utensílios e a mobília doméstica, ou seja, cada detalhe no interior do Curiaú
demonstra a ancestralidade da cultura africana. Ancestralidade esta que é traduzida com
sutileza nas Cantigas de trabalho e Cantigas de dor, veículo responsável em perpetuar
ensinamentos que em alguns momentos foram contados nos relatos, em outros apenas
cantados e em algumas vezes justapostos – cantados e contados de como foi a saga da
resistência africana a escravidão no Amapá, no século XVIII.

Uma saga, escrita com sangue, suor e trabalho escravo durante a diáspora
africana, mas que hoje se traduz em versos nas Cantigas de Marabaixo através do senti-
mento de pertencimento, enquanto afrodescendente. Um sentimento que se traduz tam-
bém nas letras das Cantigas e nas batidas rítmicas das Caixas de Marabaixo. Assim, as
músicas servem como forma de reforçar ensinamentos vividos no dia a dia do Curiaú. No
que diz respeito as Cantigas de trabalho e Cantigas de dor, as músicas são um importante
veículo que denota a resistência da ancestralidade africana a escravidão e neste caso, esses
momentos de reforço por meio da música são tipicamente na cultura africana, uma tarefa
da mãe:

Francisca Ramos dos Santos – Tia Chiquinha, foi um grande Baluarte,


tudo que eu sei agradeço a ela e a Deus, minha mãe era uma grande
batalhadora212

Grande parte desses ensinamentos passados pela mãe de Pedro bolão foi por
meio da música. Francisca Ramos dos Santos a “Tia Chiquinha”, sua mãe, é considerada
uma das maiores sumidades dentro do Marabaixo devido ao legado deixado como dança-
deira e tocadora de Caixas, por ser uma grande divulgadora do Batuque e das Bandaias,
mas principalmente, por causa do legado musical de suas composições sendo a mesma,
uma grande referência de ancestralidade. Isso atesta que as Cantigas dos afrodescenden-
tes no Amapá, que falam da resistência ao cativeiro, estão sempre associadas aos ensina-
mentos passados entre gerações.

[...] a memória da África e dos africanos, aparece associada à um


avô/avó “escravos” e ao “estrangeiro”, contrapondo-se ao país “brasi-
leiro”, quase sempre lembrados como “Ventres-livres”. Essa memória

212 Pedro do Rosário dos Santos. Relato concedido 14/04/2018. Retirado da transcrição realizada pelos
estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
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genealógica periodiza, com base na história familiar, a experiência dos
últimos escravos [...], em geral descendentes de escravos chegados ao
Brasil na primeira metade do século XIX, e que viveram o impacto213

Muitos desses ensinamentos passados de geração a geração são perpetuados


por meio de Cantigas. São justamente através deles, que quisemos nesta oficina, extrair
interpretações históricas a respeito da realidade atual do negro. São lições de vida que são
transmitidas oralmente e preservadas por meio das músicas que validam todo um passado
de resistência a escravidão, mas também, manifestam na contemporaneidade, o senti-
mento de pertencimento enquanto afrodescendente. Neste sentido, o relato coletado foi
fundamental para levar o estudante a refletir a respeito de sua própria identidade histórica,
a repensar no marco de suas origens já que o estudo dessas Cantigas, proveniente de uma
manifestação oral, certificam a contribuição africana na matriz formadora do Estado do
Amapá.

Foi demostrando por meio da música os atributos que validam essas tradições
orais que nos propusemos, nesta oficina, unir passado/presente214 estabelecendo marcos
de orientação temporal. A Associação de palavras e expressões das Cantigas de Mara-
baixo ao relato coletado, conectou o passado da escravidão africana no Amapá, com in-
terpretações históricas sobre a realidade atual do negro. Neste caso, as Cantigas de Mara-
baixo serviram em parte, para mostrar como se mantém viva através da música, tanto a
resistência a escravidão, quanto as tradições da cultura africana. As tradições são um im-
portante elo de orientação temporal logo, as músicas que outrora expressavam lamento
dos antepassados que foram escravizados hoje, passam a proferir orgulho.

213 RIOS, Ana Maria Lugão e MATTOS, Hebe Maria. Memórias do cativeiro: família, trabalho e cidada-
nia no pós-abolição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, 2005, p. 63.
214 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt. p. 37.
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Imagem 53 – Estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino juntamente coma pesquisa-
dora, ouvindo Pedro do Rosário dos Santo cantar alguns trechos das Cantigas de trabalho, Cantigas de dor
do Marabaixo. Local: Curiaú. Oficina de produção de Caixas de Marabaixo. Data: 14/04/2018. Foto: Joci-
mar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora

É possível observar a partir da foto acima, que o ato de contar a história dos
antepassados que foram escravizados por meio das Cantigas de Marabaixo além de ser
motivo de orgulho tende a reforçar ensinamentos e tradições e, para aproximarmos de
uma maneira mais concreta com os estudantes, partimos de uma situação real dentro do
próprio Curiaú. Suscitamos nesta oficina reflexões sobre o uso e legitimação das músicas
já que isso requer a necessidade da Consciência Histórica para construir argumentos em-
basados historicamente. Já dissemos em vários momentos deste capítulo que a inserção
dessas Cantigas provenientes de uma manifestação da cultural oral, são de suma impor-
tância para o Ensino de História pois, afirmam a herança musical negra, que participa
como matriz formadora do Estado do Amapá, daí a importância de seu legado. Por isso,
para fomentar tal compreensão, pedimos além da coletada de dados, uma descrição deta-
lhada de todos os elementos considerados interessante desde a mudança de paisagem du-
rante o trajeto, até os principais elementos característicos do Curiaú.

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Imagem 54 – Fragmento 1: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018

Imagem 55 – Fragmento 2: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018

O objetivo desta atividade foi de levar o estudante a perceber que muitas das
histórias contadas sobre os antepassados que foram escravizados também são cantadas
nas Cantigas de Marabaixo. Elas são expressas nas músicas através da maneira de fazer
as coisas, a lida com a roça, o tempo de plantar, de colher, de agradecer por meio das
ladainhas, das louvações e das festividades. São valores que vem se perpetuando por ge-
rações e que nem mesmo com chibatadas e açoites, e com a destruição de grande parte
dos arquivos do tráfico e da tentativa de apagar da história oficial, uma parte da história
da escravidão, não foram capazes de calar as tradições da cultura africana. São tradições,
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que por intermédio das músicas se tornam princípios, guias de comportamento que ex-
pressam orientações valorativas e temporais. Imprimem códigos de condutas dirigindo-
nos até a essência de nossa subjetividade, a nosso sentido de corresponsabilidade, quanto
a importância do legado dessas Cantigas de Marabaixo para o Ensino de História.

Por fim, reconhecer tudo isso requer como pré-requisito necessário a Consci-
ência Histórica, sem tal consciência não é possível entender o que legitima a perpetuação
das Cantigas e muito menos compreender a importância de seu legado. Como a Consci-
ência Histórica funciona como um modo específico de orientação em situações reais da
vida prática: tem como função ajudar-nos a compreender dentro de uma matriz temporal
o passado, a partir de uma interpretação histórica do presente, foi que enfatizamos nesta
oficina o estudo das tradições africanas. Entender que algumas palavras e expressões que
aparecem nas Cantigas de trabalho e dor moldam valores morais a um corpo temporal
(por exemplo, o corpo de validade contínua de tradições transmitidas pelos afrodescen-
dentes no Amapá) permite estabelecer conexões de temporalidade histórica com a escra-
vidão africana. Porém, esses marcos de orientação temporal só recebem validade quando
são confrontados com valores e códigos de condutas morais, com base na experiência da
vida prática dos estudantes.

Por isso, pedimos que durante o relato de Pedro Bolão eles ficassem atentos
a tudo que diz respeito aos significados de palavras e expressões que viessem porventura
a se reportar às tradições da cultura africana, a ensinamentos perpetuados entre gerações
e, comparecem aos seus próprios códigos de valores morais, condutas e ensinamentos
familiares.

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Imagem 56 – Fragmento 3: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Dia 14/04/2018

Imagem 57 – Fragmento 4: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018

Como podemos observar nos trechos apresentados, os estudantes pouco reconhe-


cem o valor que deveria ser atribuído aos ensinamentos passados pelos mais velhos e isso
é reflexo da experiência das suas vidas práticas. Ao longo da pesquisa algumas situações
peculiares nos levam a confirmar tal hipótese, como por exemplo, separação dos pais e/

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ou pouco contato diário e criação delegada a amigos de “confiança” da família bioló-
gica215. Essas são algumas das problemáticas detectadas que atestam a dificuldade de o
estudante estabelecer marcos de orientação temporal, com a temática apresentada. Par-
tindo do viés que a Aprendizagem história deve estar correlacionada a competências cog-
nitivas procedimentais e atitudinais, acreditamos que a coleta do relato, contribuiu no
sentido de levar a uma reflexão de valores que muitas das vezes não fazem parte do dia a
dia do estudante e, sobre isso achamos interessante dar voz ao que foi dito:

Imagem 58 – Fragmento 5: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018

Mediante o que está sendo relato percebe-se também, que existe uma grande
dificuldade de se reconhecer a importância de outros tipos de saberes, fora do espaço
escolar. Foi por isso que achamos oportuno nesta oficina problematizar sobre as tradições
africanas, mas, utilizando como ponto de referência, a experiência da vida prática dos
estudantes. Consideramos que a oficina foi um grande desafio porque a prática da pes-
quisa216 envolvendo interlocução com outros agentes que produzem saberes baseados em
suas experiências de vida e a própria prática da coleta e análise de dados, ainda são desa-
fiadores na Educação Básica. Desafios que envolvem desde condições logísticas para a
sua execução, até a própria proposta do trabalho de fazer das músicas do Marabaixo, não

215 Tais informações sobre os responsáveis legais dos estudantes foram obtidas durante a assinatura dos
familiares, da documentação autorizando a participação dos mesmos, neste projeto de pesquisa.
216 FONSECA, Selva Guimarães. Didática e Prática de Ensino de História: Experiências, Reflexões e
Aprendizados. Ed. Papiros: Campinas, São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e trabalho
pedagógico)
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apenas um mero espelho do passado da escravidão, mas, trazendo para o presente a im-
portância e o seu legado.

As Cantigas de Marabaixo são grandes marcos de orientação temporal, as


músicas testificam ensinamentos deixados pelos antepassados escravizados que vão além
daqueles trazidos do passado sobre a história de resistência da escravidão. No presente,
as Cantigas de trabalho e Cantigas dor substituíram o lamento do banzo produzido pela
escravidão, pelo orgulho de manter tradições africanas perpetuadas oralmente, entre ge-
rações. Valores que são passados pelos mais velhos para que os mais jovens deem con-
tinuidade, ensinamentos que corroboram tanto para a perpetuação das Cantigas quanto,
para o pertencimento, enquanto afrodescendente. Valores como “pedir a bênção”, ouvir
com atenção as narrativas dos mais velhos às suas experiências de vida e saberes, são
muito presentes e são passados nas Cantigas, através das histórias das Matriarcas e dos
Patriarcas que foram escravizados. Ensinamentos que também foram observados pelos
estudantes:

Imagem 59 – Fragmento 6: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o Curiaú. Visita de campo. Data: 14/04/2018

Porém, são valores que externos a festividade necessita serem revistos tanto
fora, mas principalmente dentro da Educação Básica pois, cada vez mais estão se per-
dendo, e se refletem, no processo de Ensino na perda da figura de valor atribuído ao papel
do docente. Acreditamos que a oficina foi pertinente porque o contato com diferentes
tipos de saberes (científicos, históricos escolares e sociais) fomentou tal despertar, mas

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principalmente possibilitou a prática da pesquisa217 histórica. Estabeleceu marcos e uma
matriz temporal situando historicamente a escravidão africana no Amapá, por meio das
Cantigas de trabalho e Cantigas de dor do Marabaixo. E contribuiu no espaço escolar
para a divulgação de um legado musical tão rico, mas ainda, pouco abordado devido à
escassez de produções didáticas e a fragmentação de informações em livros físicos e on-
line sobre o tema proposto.

3.5.2. 2ª OFICINA: VISITA AOS LOCAIS DE INCIDÊNCIA DO MARABAIXO


DE MACAPÁ (AP): A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ, OS
BAIRROS DO LAGUINHO E CENTRAL

 Tipologia das Canções afrodescendentes: Cantigas de afirmação da iden-


tidade negra
 Tipologia ontogenética da Consciência Histórica: Orientação temporal,
Expectativas futuras e Orientação para a vida prática
 Data: 18/04/2018

Na segunda oficina focamos na operacionalização do conceito de expectati-


vas futuras considerado também elementar, na teoria ontogenética da Consciência Histó-
rica218. Utilizamos a tipologia das Cantigas de afirmação da identidade negra219 presentes
na festividade do Marabaixo, para identificar palavras e expressões que se reportam a
Fortaleza de São José de Macapá e aos sítios tradicionais de incidência da manifestação
do Marabaixo de Macapá. As Cantigas de Marabaixo foram usados com vistas a produzir
um nexo entre passado, presente e futuro e não meramente uma expectativa em conhecer
fatos históricos que ficaram no passado220 sobre a escravidão negra no Amapá, mas acima
de tudo, fazer inteligível o presente e conferir expectativas futuras, a locais e pessoas

217 FONSECA, Selva Guimarães. Didática e Prática de Ensino de História: Experiências, Reflexões e
Aprendizados. Ed. Papiros: Campinas, São Paulo, 2003. (Coleção magistério: formação e trabalho
pedagógico).
218 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt.
219 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, p. 177-204, 2015.
220 RÜSEN, Jorn. Op. cit. p. 27-36.
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citadas nessas Cantigas, uma vez que eles possuem grande relevância para o Marabaixo
e para a própria História do Amapá.

A segunda oficina não teve como propósito fazer coleta de dados com prati-
cantes da manifestação, mas apenas de apresentar os sítios tradicionais do Marabaixo de
Macapá os quais estão localizados nos bairros Laguinho e Central (este último, por com-
preender perímetros da antiga Favela). O objetivo de se fazer uma visita aos locais de
incidência da manifestação e de também, estabelecer a relação dos mesmos com a Forta-
leza de São José de Macapá, deveu-se ao fato de que para a velha guarda do Marabaixo,
os africanos escravizados que trabalharam na construção do Forte, são considerados seus
descendentes diretos. Na visita que fizemos aos sítios tradicionais da festividade, procu-
ramos enfatizar a relação mais contemporânea que a nova geração do Marabaixo possui,
com os redutos negros que se formaram dentro da cidade de Macapá, a partir da década
de 1940.

Embora o propósito de ida aos sítios tradicionais do Marabaixo não tivesse


como foco um estudo apurado sobre a história da origem desses bairros, consideramos
que a visita foi extremamente necessária porque são redutos de origem negra que mantém
através do Marabaixo, a afirmação de sua identidade étnica. Por sua vez, essa identidade
étnica se faz presente nas letras das Cantigas da manifestação, através de palavras e ex-
pressões que identificam o grupo de Marabaixo no qual os cantadores e cantadeiras de
Ladrões fazem parte, o bairro onde residem, e o nome de quem são os seus antepassados
negros. Eis a importância da visita aos bairros que são sítios tradicionais da manifestação:
identificar os locais onde se dança o Marabaixo em Macapá e saber reconhecer, ao anali-
sar a letra de um Ladrão, quem são as personagens desses bairros na qual as Cantigas se
reportam.

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3.5.2.1. VISITA AO SÍTIO TRADICIONAL DO MARABAIXO DA FAVELA:
BAIRRO CENTRAL

Imagem 60 – Associação Cultural berço das Tradições Amapaenses, mais conhecida como barracão da
Tia Gertrudes, bairro Central, Macapá (AP). Na foto pesquisadora explicando sobre a história de vida de
Gertrudes Saturnino, uma das primeiras moradoras na década de1940, do atual bairro Central. Foto: Joci-
mar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora.

Nosso percurso221 inicia em perímetros da antiga região da Favela, conhecida


na década de 1940, por estar afastada do bairro Alto da cidade222. Os alunos identificaram
in loco, os redutos tradicionais onde se dança o Marabaixo como a Associação Cultural
Berço das Tradições Amapaenses223, Associação que tem como patrona Gertrudes Satur-
nino e a Associação Folclórica Raízes da Favela224, representada por Maria Elísia Carmo

221 Devido a natureza pesquisa requerer a necessidade de tempo hábil para visitação foi que solicitamos
autorização e dispensa dos estudantes no turno da manhã, para participarem da oficina sem prejuízo
das demais atividades escolares.
222 “Compreendia a área urbana o chamado ‘bairro Alto’ margeado pelas ruas Siqueira campos (atual
Mário Cruz), Barão do Rio Branco (atual Cândido Mendes) e Floriano Peixoto (Atual Avenida Presi-
dente Vargas), com todo o centro político-social incluso e mais a Vila Presidente Vargas. A área su-
burbana compreendia os bairros: (Doca da) Fortaleza, Trem, Igarapé das Mulheres, Favela, Beirol e
Laguinho (mais o Campo Agrícola). A área suburbana, que inicialmente abrigava parte não majoritária
da população de Macapá”. In: LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança
estrutural e táticas de sobrevivência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São
Paulo: São Paulo, p. 84(em PDF). Embora o historiador designe a Favela como um bairro, conforme
consta nos planos urbanísticos da cidade de Macapá tal designação nunca foi reconhecida pelo poder
público. Amapá, Governo do Território Federal. Planejamento Urbano, Turismo e Arquitetura. Con-
sultória de H.J.Cole+Associados S.A. 1976/1979
223 Localizada na Av. Duque de Caxias, nº 1203, bairro Central, Macapá (AP)
224 Sito Av. Mendonça Júnior, nº 12 75 bairro Central, Macapá (AP)
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Silva, mais conhecida como Elísia Congó225, filha de Dica Congó. A visitação teve como
proposta apresentar um pouco da história de vida da família desses duas baluartes do
Marabaixo da Favela: Gertrudes Saturnino e Dica Congó. Em muitas Cantigas elas são
citadas porque as suas histórias de vida estão interligadas a chegada dos seus antepassados
negros que foram escravizados durante a construção da Fortaleza de São José de Macapá
no século XVIII por isso, falar das percussoras do Marabaixo da Favela, é falar das Can-
tigas que seus antepassados entoavam.

Imagem 61 – Na sequência visita a Associação Folclórica Raízes da Favela, bairro Central, Macapá (AP).
O Barracão onde se dança o Marabaixo é montado todos os anos apenas uma semana antes da Páscoa, pe-
ríodo em que antecede a festividade do Marabaixo. São adaptações na residência onde as edificações re-
cebem uma estrutura aberta na frente e atrás. Foto Jocimar Paixão. Data 18/04/2018. Acervo pessoal da
pesquisadora.

225 Maria Elísia Carmo Silva (Elísia Congó) é presidente da Associação Folclórica Raízes da Favela,
membro da família Congó, considerada dentro do Marabaixo da Favela uma das mais importantes e
tradicionais. Em março de 2018, representou sua mãe, Dica Congó, recebendo na recém criada Aca-
demia de Batuque e Marabaixo, uma cadeira como imortal.
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Imagem 62 – Registro mostrando como fica a Associação Cultural Raízes da Favela durante as festivida-
des do Ciclo do Marabaixo. Macapá/AP. Foto: Aydano Ferreira. Data: 05/05/2017. Acervo pessoal da
pesquisadora.

3.5.2.2. VISITA AO SÍTIO TRADICIONAL DO MARABAIXO DO LAGUINHO

Continuamos nosso itinerário fazendo o percurso para o bairro do Laguinho226


que assim como a antiga Favela, compartilha a história da transferência da população
negra da vila de Santa Engrácia227. De acordo com historiadores locais e também por
meio de relatos colhidos durante esta pesquisa, identificamos que a Vila de Santa Engrá-
cia ficava situada no perímetro central da cidade, no entorno de onde hoje está localizada
a atual Praça Barão do Rio Branco228, prédio dos Correios e Fórum de Macapá (hoje,
Ordem dos Advogados do Brasil Seção –AP) , conforme mostra mapa abaixo:

226 O bairro do Laguinho fica localizado próximo a região central da cidade de Macapá (AP). É conside-
rado um dos bairros mais antigos da capital, sua fundação ocorreu na década de 1940, período em que
o governador do Território Federal do Amapá, Janary Gentil Nunes, implementou várias reformas
urbanas na região central da cidade de Macapá (AP) inviabilizando “a permanência dos moradores
mais pobres, por meio do estabelecimento de padrões ocupacionais que eles não podiam alcançar”. In:
LOBATO, Sidney da Silva. A cidade dos trabalhadores: insegurança estrutural e táticas de sobrevi-
vência em Macapá (1944-1964). Tese de doutorado. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2013.
239p. 84 (em PDF)
227 IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Mara-
baixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.), p. 27 e 67
228 Ficha identificação de lugares, p. 3 de 10. In: IPHAN. Inventário das referências culturais do Mara-
baixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio
digital no formato pdf (463 p.).
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Mapa 2 – Delimitação do núcleo urbano da cidade de Macapá na década de 1940,
conforme relatos coletados em pesquisa e mapa georretificado da Planta da Vila de
São José de Macapá (1761)

Mapa: Jocimar Paixão, 2018. Fonte: Planta da Vila de São José de Macapá, 1761 (GRONFELDE, Gaspar
João de (eng.). Planta da vila de São de José Macapá. Cartografia e iconografia relativa ao Pará, 1761. In:
Biblioteca Digital, Fórum Landi (UFPA). Disponível em http://forumlandi.ufpa.br/biblioteca-digital/dese-
nho/planta-da-vila-de-s-jose-macapa. Acessado em 30 de maio de 2018.)

Conforme mostra o mapa acima, uma parcela da população negra vivia na


Vila de Santa Engrácia foi transferida para o Laguinho por isso, a visitação ao local se
deu por motivos similares ao do bairro anterior: Muitas Cantigas de Marabaixo fazem
referências aos primeiros moradores que participaram, na década de 1940, deste momento
histórico, como por exemplo, Julião Ramos, Bruno Ramos, Benedita Guilherma Ramos
(tia Biló) e Raimundo Lino Ramos (mestre Pavão)229 . Diante disso, se fazia necessário
muito mais do que uma simples identificação das Cantigas e dos locais onde viveram os
principais Patriarcas e Matriarcas do Marabaixo de Macapá. Através da figura desses
grandes ícones, ainda pouco lembrados e reconhecidos em nossos livros didáticos, que é

229 Consideradas as personalidades negras mais importantes do bairro do Laguinho sendo que a contri-
buição e legado seja como ladronistas (compositores das Canções do Marabaixo), ou através dos en-
sinamentos perpetuados através da oralidade, os tornaram referências dentro da manifestação do Ma-
rabaixo do Amapá.
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possível entender e compreender, a trajetória do negro, que participa como matriz forma-
dora da História do Amapá.

Imagem 63 – Associação Folclórica Marabaixo do Pavão. Situado na avenida José Tupinambá de Al-
meida, nº1160, bairro Laguinho, Macapá (AP). Na ocasião explicação da pesquisadora sobre a trajetória
de vida de Raimundo Lino Ramos, o mestre Pavão, considerado um dos mais importantes precursores do
Marabaixo do Amapá. Foto: Jocimar Paixão. Data: 18/04/2017. Acervo pessoal da pesquisadora.

Seguimos com o trajeto para a Associação Cultural Raimundo Ladislau230


formada pelos descendentes de Mestre Julião Ramos231. Explicitamos que a Associação
presta homenagem em seu nome a um dos mais exímios poetas e compositores das Can-
tigas de Marabaixo: Raimundo Ladislau232. Durante o transcurso da visitação enfatizamos
a importância das composições do ladronista, autor de várias Cantigas de Marabaixo,
tendo inclusive, muitas de suas músicas adotadas por diversos grupos de várias comuni-
dades praticantes da manifestação. Na ida ao bairro do Laguinho procuramos explicar o
legado musical dessas Cantigas, uma vez que as mesmas corroboram por perpetuar os
registros orais deixados pelos antepassados dos compositores. Herança que conserva atra-
vés da música, a história de resistência de seus ancestrais que foram escravizados, mas

230 Localizada na rua Eliezer Levy, nº 632, bairro do Laguinho, Macapá (AP)
231 Julião Ramos participou do momento histórico na década de1940 da transferência das famílias negras
da parte central da cidade de Macapá (AP) para o bairro do Laguinho. A história dessa transferência
ficou imortalizada nos versos da Canção de Marabaixo “Aonde tu vai, rapaz”, de autoria de Raimundo
Ladislau.
232 Raimundo Ladislau é considerado um dos mais importantes ladronistas (compositores das Canções do
Marabaixo). Seus Ladrões são reconhecidos, através da penetração de suas músicas nos Marabaixos
de todo o Amapá. Cf. Ficha de identificação: Ofícios e modos de fazer. p. 4 de 20. In: IPHAN. Inven-
tário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.).
Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.)
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que acima de tudo contribui hoje, para a alteridade do local como bairro genuinamente
negro.

Imagem 64 – Acima, registro da visita a Associação Cultural Raimundo Ladislau, Rua Eliezer Levy, nº
632, bairro do Laguinho, Macapá (AP). Foto: Jocimar Paixão. Data 18/04/2018. Acervo pessoal da pes-
quisadora.

Imagem 65 – Registro que mostra a Associação Cultural Raimundo Ladislau durante as festividades do
Marabaixo. Neste período o festeiro responsável pela coordenação do evento, juntamente com sua equipe
de trabalho, prepara a parte externa da residência enfeites de papel colorido nas cores azul, vermelho e
branco, cores quer representam o Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade. Associação Cultural Ra-
imundo Ladislau, Macapá/AP. Foto: Aydano Ferreira. Data 05/05/2017. Acervo pessoal da pesquisadora

Diante disso, não poderíamos deixar de visitar no bairro do Laguinho, o Poço


do Mato, local construído para fornecer, aos antigos moradores, água potável. Situado na

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avenida Padre Manoel da Nóbrega233, o local é bastante citado nas Cantigas de Marabaixo
devido a ligação da geração mais contemporânea da manifestação e o povoamento da
área, na década de 1940. Procuramos estabelecer a relação do Poço do Mato com as Can-
tigas de Marabaixo, pois as mesmas reportam-se ao lugar envolto em histórias que dão
conta de encantamentos e lendas narrados pelos moradores locais. Surgiram muitas cu-
riosidades sobre essas lendas e da real importância histórica que o Poço do Mato possui.
Explicamos então, que através do projeto de Lei nº 037/93, da Câmara Municipal de Ve-
readores de Macapá, ele é considerado Monumento de Interesse Cultural do Município
de Macapá devido ao legado dos registros orais deixados pelos antigos moradores afro-
descendentes.

Imagem 66 – Poço do Mato, bairro do Laguinho. Macapá (AP). Este Local era utilizado pelos primeiros
moradores na década de 1940, para coletar água potável. Ente os primeiros habitantes temos famílias ne-
gras que viviam na Vila de Santa Engrácia, próximo a Igreja da Matriz, no centro da cidade que foram
deslocadas para o bairro do Laguinho que na época, não possuía infraestrutura para recebê-los. Foto: Joci-
mar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora.

Ainda na rua padre Manoel da Nóbrega, bem em frente ao Poço do Mato, dois
desenhos no muro que fica aos fundos da Companhia de Água e Esgoto de Macapá (CA-
ESA), chamaram muita atenção dos estudantes: o desenho da antiga Igreja da Matriz e o
da Fortaleza de São José de Macapá. Estabeleceu-se então a relação de tais desenhos com

233 O Poço do mato fica localizado no meio da avenida Padre Manoel da Nobrega, bairro do Laguinho,
entre as ruas General Rondon e São José, atrás do terreno da CAESA (Companhia de Água e Esgoto
do Amapá)
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o local e consequentemente, com as Cantigas de Marabaixo ao ser explicado que a refe-
rência a imagem da antiga igreja da Matriz associa-se ao Marabaixo em virtude de a ma-
nifestação ter seu lado religioso na qual envolve rituais católicos, com elementos da cul-
tura africana. Já no caso da Imagem da Fortaleza de São José de Macapá, sua associação
se dá porque segundo relatos que coletamos com a velha guarda do Marabaixo, os pri-
meiros praticantes da festividade foram os africanos escravizados que vieram para a cons-
trução do Forte no século XVIII e como os antigos moradores do Laguinho são seus des-
cendentes, reportar-se a este fato histórico é afirmar a identidade da manifestação e de
seus ancestrais.

Imagem 67 – Registro fotográfico dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino na
avenida Padre Manoel da Nobrega, em frente ao Poço do Mato. Acima desenho retratando a da antiga
igreja da Matriz. Abaixo pintura da Fortaleza de São José de Macapá. Av. Padre Manoel da Nóbrega,
bairro do Laguinho Macapá (AP). Entre as Ruas General Rondon e São José, atrás do terreno da CAESA
(Companhia de Água e Esgoto do Amapá). Foto: Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da
pesquisadora.

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Imagem 68 – Av. Padre Manoel da Nóbrega, bairro do Laguinho, Macapá (AP) entre as Ruas General
Rondon e São José, atrás do terreno da CAESA (Companhia de Água e Esgoto do Amapá). Foto: Jocimar
Paixão. Data: 18/04/2018. Acervo pessoal da pesquisadora.

No transcorrer da visitação, entregamos um trecho do Ladrão de Marabaixo


“Negra Formosa”, autoria de Valdi Costa, e pedimos uma descrição das impressões que
estavam tendo desses bairros, que são redutos tradicionais do Marabaixo de Macapá. So-
licitamos também, que estabelecessem em seus relatos, a relação entre a velha guarda
do Marabaixo, citada na letra do Ladrão apresentado, com os locais que estavam sendo
visitados. Os relatos foram os seguintes:

Imagem 69 – Fragmento 7: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o bairro Santa Rita e Central (antiga Favela). Visita de campo. Dia 18/04/2018

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Imagem 70 – Fragmento 8: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre os bairros Santa Rita e Central (antiga Favela). Visita de campo. Dia 18/04/2018

Imagem 71 – Fragmento 9: Registros dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino,
sobre o bairros do Laguinho, Santa Rita e Central (antiga Favela). Visita de campo. Dia 18/04/2018

3.5.2.3. VISITA A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ (AP)

Por fim, o último local visitação foi a Fortaleza de São José de Macapá234, a
ida ao local se deu por causa de seu caráter histórico e sua relação com a presença dos

234 A Fortaleza de São José de Macapá fica localizada na área central da capital de Macapá (AP) entre as
avenidas Beira Rio e Candido Mendes. Segundo relatos dos praticantes do Marabaixo, nos tempos
setecentistas da colonização portuguesa no Amapá, os africanos escravizados se reuniam neste local
para amenizar o banzo, tocando, cantando e revivendo suas lembranças. Cf. em IPHAN. Inventário
das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5: Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá,
2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf (463 p.). p. 40. Para mais informações con-
sultar:
Marabaixo: do lúdico ao moderno. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=wE-
veF0jO4mU; Ladrões de Marabaixo - Sala de Notícias (Canal Futura). Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=xxhu6RIwmcw&t=267s
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Página 164 de 235
africanos e de seus descendentes no Amapá e por sua vez, devido aos Cantigas de Mara-
baixo que se reportam a Fortificação como o lugar em que os seus antepassados foram
escravizados. Procuramos durante a visitação contextualizar historicamente a diáspora
africana para o Amapá no século XVIII, já que o fato histórico da travessia transatlântica
é bastante referendado nas músicas, pelos principais compositores de referência do Ma-
rabaixo. Como um dos vértices centrais da pesquisa foi levar os alunos a coletarem dados
que dessem conta da relação entre as Cantigas de Marabaixo e o fato histórico da resis-
tência ao cativeiro negro no Amapá, foi explicado que ainda nos tempos dos setecentos
da colonização portuguesa, o lugar, segundo registros orais que aparecem nas Cantigas,
e no relato dos praticantes mais antigos da manifestação, era local onde os africanos es-
cravizados se reuniam para dançar, tocar e reviver suas lembranças da África.

Imagem 72 – Acesso principal para a visitação - Fortaleza de São José de Macapá. Foto: Jocimar Paixão.
Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018.

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Imagem 73 – Registro da entrada dos alunos com a pesquisadora na Fortaleza de São José de Macapá.
Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

Imagem 74 – Pesquisadora utilizando a maquete da Fortaleza de São José de Macapá, localizada na en-
trada principal do monumento, para contextualizar historicamente a diáspora africana para o Amapá no
século XVIII e a chegada do negro para trabalhar como mão de obra cativa na construção do Forte. Foto:
Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

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Imagem 75 – Segunda maquete da Fortaleza de São José de Macapá localizada na entrada principal do
monumento. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

Imagem 76 – Fosso (esgotadouro) de águas pluviais localizada no centro da praça rebaixada da Fortaleza
de São José de Macapá. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

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Imagem 77 – Registro fotográfico no terrapleno de acesso aos baluartes Fortaleza de São José de Macapá.
Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018.

Ao término da visita, pedimos que um estudante sintetizasse através de um


registro coletivo, as impressões e as opiniões que o grupo teve sobre a Fortaleza de São
José de Macapá bem como, da relação histórica que a mesma possui com o Marabaixo.
O relato (Imagem 78) foi o seguinte:

Imagem 78 – Fragmento 10: Atividade sobre a importância da Fortaleza e a relação da mesma com o Ma-
rabaixo. Estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Visita de campo. Data:
18/04/2018

3.5.3. 3ª OFICINA: MAZAGÃO VELHO – VISITANDO NOSSAS RAÍZES

 Tipologia das Canções afrodescendentes: Resistência Religiosa


 Tipologia ontogenética da Consciência Histórica: Orientação temporal,
Expectativas futuras e Orientação para a vida prática
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 Data :23/04/2018

Já na terceira oficina focamos na operacionalização do conceito de orientação


para a vida prática, apontado como primordial na teoria ontogenética da Consciência His-
tórica235. Utilizamos a tipologia das Cantigas de resistência religiosa236 presentes na fes-
tividade do Marabaixo para interpretar historicamente e/ou geograficamente, a chegada
do africano em Mazagão Velho no século XVIII. Como a Orientação para a vida prática:
funciona como um modo específico de orientação em situações reais da vida presente237,
nesta oficina, desenvolvemos a competência de compreender os elementos culturais que
constituem as identidades238, um dos eixos propostos pela matriz de referência do Enem.
Trabalhamos está competência a partir da habilidade de interpretar fontes documentais
utilizando neste caso, como documento, palavras e expressões contidas nas Cantigas de
resistência religiosa do Marabaixo.

Tal competência descrita acima é considerada dentro dos Parâmetros Curri-


culares Nacionais PCNs239 - indispensável para o nível médio de Ensino e foram fixadas
pela Resolução nº 3/98, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educa-
ção. A ausência desta competência limita a compreensão do indivíduo, ao direito de exer-
cer plenamente a cidadania, na sua perspectiva cultural, impedindo-o de se preparar ade-
quadamente para a vida em sociedade. Impossibilita o reconhecimento das diferenças e
imediatamente a aceitação delas, frustra a relação de respeito e convivência, que rejeita
toda forma de preconceito, descriminação e exclusão. Aprender a posicionar-se social-
mente, guiar o indivíduo para a indignação e o repúdio às formas veladas ou explícitas de

235 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.
27-36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana
Claudia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt.
236 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, p. 177-204, 2015. p. 181.
237 RÜSEN, Jorn Op. cit., 27-36.
238 ENEM. Matriz de Referência. Ciências humanas e suas Tecnologias. Competência de área 1 - Com-
preender os elementos culturais que constituem as identidades, H1 - Interpretar historicamente e/ou
geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura. Disponível em http://por-
tal.inep.gov.br/educacao-basica/encceja/matrizes-de-referencia
239 BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curricu-
lares Nacionais (Ensino Médio). Brasília: MEC, 2000. p. 04-06
_______________________________________________
Página 169 de 235
injustiça, desrespeito e preconceito, incluindo o preconceito religioso às matrizes africa-
nas, foi o objeto central desta oficina, como proposta de orientação para a vida prática
dos estudantes.

Assim, nossa coleta de dados sobre as Cantigas de resistência religiosa do


Marabaixo aconteceu no distrito de Mazagão Velho240. Como a relação do Marabaixo
com Mazagão Velho é bastante reportada nessas Cantigas, uma vez que os registros orais
deixados nas músicas pelos antepassados da festividade, dão conta de histórias sobre a
chegada do africano ao Amapá no século XVIII, e de seu deslocamento para o local como
mão de obra cativa, foi que escolhemos cuidadosamente o lugar. A forte simbologia e
importância de Mazagão Velho para a História do Amapá e também, para a história do
próprio Marabaixo nos levou a fazer uma visitação que não teve um caráter meramente
exploratório. Estivemos em Mazagão Velho com o objetivo de coletar dados que permi-
tissem posteriormente, a identificação nas Cantigas de resistência religiosa do Marabaixo
palavras e expressões que referendassem o fato histórico da ocupação portuguesa no lo-
cal. Visitamos em Mazagão Velho, Jozué da Conceição Videira241, uma das principais
referências da geração mais contemporânea do Marabaixo, grande educador cultural, par-
ticipante ativo das organizações das festas do Divino Espírito Santo e de demais ações
culturais na localidade.

240 Mazagão é um município ao sul do Estado do Amapá distante a 72 km da capita Macapá cujos limites
são: Pedra Branca do Amapari e Porto Grande ao norte; Santana a nordeste; a foz do rio Amazonas a
sudeste; Vitória do Jari ao sul e Laranjal do Jari a oeste. Devido justamente a esta distância da Escola
Estadual Professora Raimunda Virgolino foi que solicitamos autorização e dispensa para participar da
oficina no turno da tarde, sem prejuízo das demais atividades escolares.
241 Jozué da Conceição Videira é pedreiro e carpinteiro de profissão, bastante comprometido com ativi-
dades culturais segue no município ministrando oficinas, para crianças e jovens aprendem o legado
musical do Marabaixo. Em suas oficinas esse exímio mestre no oficio da arte de fazer e tocar Caixas,
segue os ensinamentos tradicionais do toque e da confecção do instrumento.
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Imagem 79 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo em Mazagão Velho. Alunos da Escola Esta-
dual Professora Raimunda Virgolino aguardando o momento de coletar o relato de Jozué da Conceição
Videira. Data 18/04/2018

Imagem 80 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão Velho. Alunos da
E.E. Raimundo Virgolino ouvindo atentamente Jozué da Conceição Videira, falando sobre o significado
das Cantigas religiosas do Marabaixo. Data: 18/04/2018

Os estudantes conheceram a sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo


em Mazagão Velho, onde nosso colaborador ministra palestras e dá oficinas de música,
ensinado jovens e crianças o legado das Cantigas deixadas pelos seus ancestrais. Coleta-
mos dados especificamente sobre os rituais religiosos e demais simbologias contidas na

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festa do Divino em Mazagão Velho242 sendo explicitado as diferenças e semelhanças,
com os rituais da festividade que acontecem em Macapá (AP). Entre as similaridades
temos as missas, alvoradas, queima de fogos, novenas, ladainhas, levantação e derrubada
do Mastro, quebra da Murta, cortejos e Marabaixo243. Entre as singularidades destacam-
se a procissão fluvial a remo no rio Mutuacá, a cerimônia de coroação da imperatriz mo-
mento, que são apresentadas as empregadas do Divino e a data do próprio período da
festividade que em Mazagão Velho, acontece no mês de agosto, e está relacionado aos
períodos de colheitas agrícolas244.

No que diz respeito às Cantigas de resistência religiosa, foco da oficina em


Mazagão Velho, podemos constatar através da série de materiais expostos na Sede do
Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo, que além das louvações ao Divino Espírito Santo,
um panteão de Santos também aparece nas letras das músicas. Santos como: São Gonçalo;
Nossa Senhora da Piedade; Nossa Senhora da Assunção; Nossa Senhora da Luz; Nossa
Senhora do Rosário, Nossa Senhora da Conceição; Santa Luzia; São Tomé e São Thiago.

Imagem 81 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão Velho. Na imagem
à esquerda, CDs com Cantigas religiosas do Marabaixo. Nos encartes identificamos um panteão de Santos
católicos com destaque para Nossa Senhora da Piedade. À direita, banner em homenagem a Nossa Se-
nhora da Piedade. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2011

242 Em Mazagão Velho tal como na cidade de Macapá (AP), a festividade do Marabaixo inclui rituais
religiosos onde a vértice central é a louvação ao Divino Espírito Santo. Porém, na Capital do Estado,
cultua-se a Santíssima Trindade e demais Santos de devoção pessoal das famílias organizadoras do
Marabaixo do Laguinho e Favela.
243 Sobre os rituais religiosos que fazem parte da festividade do Marabaixo, ver Seção 1, desta dissertação.
244 Sobre os rituais religiosos que fazem parte da festividade do Marabaixo em Mazagão Velho, consultar
Seção 2 desta dissertação.
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Imagem 82 – Jozué da Conceição Videira, e seus filhos, na sede do Grupo Folclórico Raízes do Mara-
baixo. Município de Mazagão. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

Imagem 83 – Artefatos e indumentárias utilizadas nas festas do Divino e de São Thiago. Grande parte das
Canções religiosas do Marabaixo em Mazagão Velho ser reportam a ocupação histórica do lugar e a devo-
ção a São Thiago, padroeiro do Município. Foto Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data
18/04/2018

Este último Santo (São Thiago), por exemplo, recebeu grande destaque du-
rante o relato do colaborador, uma vez as Cantigas de resistência religiosa comumente se
reportam ao fato histórico da batalha entre mouros e cristãos na África e a transmigração

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de colonos portugueses de Mazagão marroquina para o Amapá. A saga histórica de Ma-
zagão Velho cantada e contada nos versos do Marabaixo e a alusão a São Thiago como
“Santo guerreiro” foi bastante enfatizada já que ambas, atestam o alicerce histórico, tra-
zendo a ideia de pertença a África.

Visando entender justamente como essa tônica se expressa nas Cantigas de


Marabaixo, e de que forma a ideia de pertença a África está alicerçada nas Cantigas de
resistência religiosa foi o objeto de nossa visitação. Observamos na fala de nosso colabo-
rador que as músicas denotam uma intima relação com o processo de ocupação histórica
da vila. Isso se dá por exemplo, através da personificação de atributos humanos a São
Thiago, visto como “Santo guerreiro”. A figura de São Thiago como um aguerrido sol-
dado cristão que venceu batalhas em “Mazagan” na África Marroquina e que ficou na
linha de frente comandando o exército cristão na luta contra os mouros245 é apenas uma,
das inúmeras exemplificações que representam a continuidade da prática católica barroca
e colonial246 no município de Mazagão Velho. Tal simbologia não fica restrita às letras
das Cantigas de resistência religiosa. Como bem podemos observar (ver imagem 84), ex-
por na comunidade artefatos e indumentárias das duas maiores expressões da religiosi-
dade em Mazagão Velho, se constituem símbolo de alteridade:

245 Em vários trechos do relato coletado pelos estudantes, Jozué da Conceição Videira enfatiza a devoção
a São Thiago e a importância que o Santo teve na batalha contra os mouros na África.
246 O catolicismo barroco tem como características principais práticas pomposas acompanhadas de dan-
ças, músicas e fogos de artifícios. REIS, João José, Identidade e diversidade étnicas nas irmandades
negras no tempo da Escravidão. In: Tempo, vol. 2, n. 3, 1997, p. 04. Ver também: ABREU, Martha.
O império do Divino: festas religiosas e cultura popular (1830-1900). 1996. 507p. (Tese de doutorado).
Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. 1996.
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Imagem 84 – Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Município de Mazagão Velho. 1 Foto in-
dumentária utilizada nos rituais religiosos da Festa do Divino. 2 Foto vestimenta usada na Festa de São
Thiago. As vestimentas das duas maiores expressões culturais de Mazagão Velho, retratadas nas Cantigas
religiosas do Marabaixo, ficam agrupadas de maneira equivalente. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal
da pesquisadora. Data: 18/04/2017

Acima podemos ver alguns dos artefatos que já foram utilizados tanto nos
rituais da Festa do Divino quanto, quanto na Festa de São Thiago estão justapostos, isso
contribui para a construção de uma memória enquanto vila para que os negros tomem
posse e tomem para si a legitimidade tanto da ocupação histórica do local, quando da
própria Festa de São Thiago. Porém, as Cantigas de resistência religiosa não podem ser
estudadas a parte sem levar em conta os elementos do catolicismo barroco e a influência
da ocupação portuguesa em Mazagão Velho. São elementos que ficam expressos em vá-
rios rituais da parte religiosa do Marabaixo e vão desde frases em latim, rezadas por meio
das ladainhas247 das missas nas igrejas, e dos ofertórios248 os quais ficam externados tam-
bém na maneira de rezar, de louvar e de dançar o Marabaixo. Em se tratando da dança do

247 As ladainhas são rezas cantadas com entonação em latim.


248 Na liturgia eucarística ofertório faz parte dos rituais sacramentais onde o pão, o vinho e a água simbo-
lizam atributos espirituais de Cristo, sendo que os dois primeiros equivalem ao corpo e ao sangue de
Cristo, e o ultimo corresponde pureza e humildade. Em missas especificas destinadas ao Marabaixo
os rituais do ofertório são seguidos das benções sacerdotais onde o padre aspergindo água benta, aben-
çoa artefatos considerados sagrados nos rituais religiosos do Marabaixo, como por exemplo, as Ban-
deiras e os galhos de Murta.
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Marabaixo, cabe aqui frisar que a forma peculiar de dançar em Mazagão Velho é uma
prova irrefutável que atesta a herança portuguesa no local.

Imagem 84 – Alunos da Estadual Professora Raimunda Virgolino, Macapá (AP) escolhendo indumentá-
rias do Marabaixo de rua, em Mazagão Velho. Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Foto: Jo-
cimar Paixão. Data: 18/04/2018

Imagem 85 – Alunos da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino, Macapá (AP) aprendendo como
se dança o Marabaixo de rua, em Mazagão Velho. Sede do Grupo Folclórico Raízes do Marabaixo. Foto:
Jocimar Paixão. Data: 18/04/2018

Abaixo a Chula, dança tradicional da cultura portuguesa. Tal como o Mara-


baixo de rua em Mazagão Velho, a Chula portuguesa é dançada em pares.

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Imagem 86 – Captura do vídeo “Rancho Folclórico Portugal Canta e Danca- Tirana”. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=tVOZ0R8ca_s. Acessado em 04/06/2018.

Para encerrar nossa visita, estivemos na parte externa da igreja de Nossa Se-
nhora de Assunção e no Sítio Arqueológico de Mazagão Velho, onde este último, fica
localizada as ruínas da antiga igreja da Matriz, construída em 1772. Na ocasião, explica-
mos a simbologia para a História do Amapá e do próprio Marabaixo, uma vez que ambos
estão relacionados a ocupação portuguesa e a presença africana no local, e por sua vez,
comumente aparecem nas Cantigas de resistência religiosa. No caso da Igreja de Nossa
Senhora da Assunção, a sua associação com as Cantigas de Marabaixo se dá porque é o
lugar onde acontecem missas e uma novena durante a festa do Divino. Além Disso, “nessa
igreja ficam guardados, nos dias de festa do Marabaixo, o cetro e a Coroa, artefatos sim-
bólicos usados pela imperatriz durante os principais ritos religiosos da festividade”249. No
tempo em que durou nossa passagem pela Igreja, enfatizamos250 que Nossa Senhora da
Assunção, padroeira do município de Mazagão Velho, é bastante retratada nas Cantigas

249 Consultar:
 ANEXO: Bens culturais inventariados. Festa do Divino Espírito Santo de Mazagão Velho. p.4
de 54. In: IPHAN. Inventário das referências culturais do Marabaixo do Amapá. (Produto 5:
Dossiê do Marabaixo. 108p.). Macapá, 2013. Disponível apenas em meio digital no formato pdf
(463 p.)
 MOTINHA, Katy E. F. A festa do Divino Espírito Santo: Espelho de Cultura e Sociabilidade na
Vila Nova de Mazagão. 2003. 346 f. Tese (Doutorado em História). Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2003. p. 279-280
 MACHADO, Sândala Cristina da soledade. A Festa do Divino, nos dois Lados do Atlântico.
Revista Tempo Amazônico. Vol. 1. Nº 2. Janeiro-junho de 2014. p.43
250 As explicações dadas para os estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino Sobre a
Igreja de Nossa Senhora da Assunção, primeiramente foram com base nos trechos do relato de Jozué
da Conceição Videira.
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de Marabaixo, especialmente naqueles que tem como temáticas a resistência ao cativeiro
negro, a fé e o apego aos Santos católicos africanizados e a batalha entre mouros e cristãos
na África.

Imagem 87 – Alunos da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino na parte externa da Igreja de
Nossa Senhora da Assunção em Mazagão Velho. A igreja de Nossa Senhora da assunção possui Forte re-
presentatividade nos rituais litúrgicos e nas Cantigas de resistência religiosa do Marabaixo. Durante as
festas do Divino são rezadas missas e ladainhas no local, este também é um dos principais trajetos por
onde passa o Marabaixo de rua. Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 18/04/2018

Já no caso da visita ao sítio arqueológico de Mazagão Velho, onde estão lo-


calizadas as ruínas da antiga Igreja de Nossa Senhora da Assunção, nossa ida se deu pelo
caráter histórico que marca a presença portuguesa no local. Existem Cantigas de resistên-
cia religiosa que fazem referências a tal fato histórico, e basicamente nessas Cantigas
aparecem como temática principal a luta entre mouros e cristãos na África e a transferên-
cia de colonos portugueses no século XVIII da Mazagão no Marrocos, para o Amapá. A
associação das ruínas da antiga igreja de Mazagão Velho, com as Cantigas de resistência
religiosa foi feita porque, nos tempos setecentistas da colonização portuguesa, existem
registros de encenações de batalhas equestres e cavalheiresca em frente ao local aludindo
às vitorias portuguesas na África a ajuda de São Thiago, considerado como Santo guer-
reiro251.

251 DA SILVA, Maria Cardeira. TAVIM, José Alberto R. Marrocos no Brasil: Mazagão (Velho) do
Amapá em Festa – a festa de São Thiago, 2004, p. 18.
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Página 178 de 235
s
Imagem 88 – Parada para registro fotográfico na igreja de Nossa Senhora de Assunção em Mazagão
Velho

Imagem 89 – Pesquisadora explicando a importância histórica das ruínas da antiga Igreja da Matriz.
Foto: Jocimar Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 18/04/2018

3.6. 4ª OFICINA: ELABORAÇÃO DO DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES


DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL.
1

 Local: Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino


 Data: 23 a 27 de abril de 2018

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Esta oficina foi para discutir, produzir reflexões e apresentar os resultados da
pesquisa realizada com os estudantes nos sítios tradicionais de incidência da manifestação
de Macapá (AP), e em Mazagão Velho. Utilizamos o material coletado nas três oficinas
anteriores para identificar, a partir do estudo das Cantigas de Marabaixo, as aprendizagens
históricas concernentes a escravidão africana no Amapá. Sendo assim, estimulamos in-
vestigações e análises sobre os relatos coletados em áudio e/ou vídeo e transcrições bem
como, do material fotográfico e ilustrações. As reflexões estiveram relacionadas aos sig-
nificados de palavras e expressões contidas nas Cantigas de Marabaixo e aprofundadas
por meio de fontes secundárias.

Sistematizamos métodos de Ensino focados para a prática da pesquisa histó-


ria. Logo, estimulamos o diálogo entre saberes científicos, escolares e sociais através de
proposições investigativas a respeito dos dados coletados. O diálogo entre os diferentes
saberes visou estimular a produção do conhecimento histórico escolar, a quebra de para-
digmas de que a pratica da pesquisa está dissociada do Ensino e de que a mesma se cons-
titui em mero reprodutivismo na Educação Básica. Assim, levamos como proposta para
esta oficina uma interlocução permanente com fontes secundárias (biografias, livros pa-
radidáticos, didáticos, reportagens escritas e/ou vídeos no YouTube) visando instigar nos
estudantes, a necessidade de cruzar informações e de examinar de forma mais apurada, o
material coletado.

Para tal procedimento dividimos a oficina em quatro etapas. As duas primei-


ras aconteceram no Laboratório de informática educacional (LIED) da Escola Estadual
Professora Raimunda Virgolino. A terceira etapa ocorreu no recinto da biblioteca, e na
quarta etapa, foi realizada a culminância do projeto com a apresentação das atividades.

Na primeira, estimulamos a pesquisa através da utilização de fontes secundá-


rias. Na segunda apresentação da tipologia das Canções (Cantigas de trabalho e Cantigas
de dor, Cantigas de amor, de resistência religiosa e de afirmação da identidade). A ter-
ceira, com a finalização e entrega propriamente dita, do material coletado (transcrições,
ilustrações, listagem com o preenchimento adicional de informações) para pesquisadora
desenvolver o produto final – DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MARA-
BAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1.

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3.6.1. 1ª ETAPA: LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA EDUCACIONAL
(LIED)

Imagem 90 – Dia 1. Alunos pesquisando verbetes e expressões das Canções de Marabaixo, em fon-
tes secundárias. Laboratório de Informática da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino.
Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 23/04/2018

Imagem 91 – Dia 2. Alunos pesquisando verbetes e expressões das Canções do Marabaixo, em


fontes secundárias. Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda Virgo-
lino.. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data
24/04/2018

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Nesta primeira etapa aprofundamos o significado de 67 verbetes (incluindo
palavras e também expressões) pesquisadas nos sítios tradicionais de incidência da mani-
festação do Marabaixo de Macapá – Bairros do Laguinho, Central e Santa Rita, no Curiaú
e em Mazagão Velho (AP). Dos 12 estudantes que participaram da atividade cada um
ficou com 05 verbetes para fazer o detalhamento das informações sendo que a proposta
principal foi de ensinar o aluno a pesquisar em fontes secundárias, pesquisamos com eles,
nos seguintes endereços eletrônicos:

a) Marabaixo: do lúdico ao moderno


https://www.youtube.com/watch?v=wEveF0jO4mU
b) Ladrões de Marabaixo- Sala de Notícias –Canal futura
https://www.youtube.com/watch?v=xxhu6RIwmcw&t=267s
c) Venha conhecer o Marabaixo, Em Macapá
https://www.youtube.com/watch?v=NmsQVPRALyo&t=416s
d) Como tocar Caixa de Marabaixo - Paulo Bastos
https://www.youtube.com/watch?v=GJNaCJYMOUc
e) APTV: Cortejo da Murta Marabaixo em Macapá
https://www.youtube.com/watch?v=fdBtIT_c5qs&t=3s
f) Repórter da Amazônia/Mazagão
https://www.youtube.com/watch?v=6y4s95i4EIc
g) Marabaixo - DOC
https://www.youtube.com/watch?v=Ya03BWzx78o

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3.6.2. 2ª ETAPA: ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS LABORATÓRIO DE
INFORMÁTICA EDUCACIONAL (LIED)

Imagem 92 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Alunos fa-
zendo aprofundamento da pesquisa dos verbetes e expressões das Cantigas de Marabaixo. Foto: Joaciany
do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data 24/04/201

Propusemos o cruzamento de informações (entre os relatos e as fontes secun-


dárias explicitadas acima. O objetivo foi instigar reflexões sobre as informações contidas
levantando outros pontos de vista ainda não discutidos, acerca dos verbetes pesquisados.
Mostramos como é possível, a partir do verbete Marabaixo, identificar nos trechos do
relato de Pedro Rosário dos Santos, a procedência étnica de africanos escravizados. In-
tercruzamos o relato de Fábio José do Espírito Santo Souza sobre o significado do verbete
dança do Marabaixo, com a gravura Negros no Porão e o desenho esquemático do navio
negreiro Veloz (1828), para enfatizar que a falsa coberta, contrapõe a ideia explicitada de
que a dança, tenha se originado nos porões dos navios negreiros. Comparamos fotos dos
alunos dançando Marabaixo em Mazagão Velho, com imagens de danças tradicionais da
cultura portuguesa para identificar, na simbologia corpórea e na forma singular de se dan-
çar o Marabaixo, elementos que atestam a ocupação portuguesa no local.

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Apresentamos e classificamos também a tipologia das Canções afrodescen-
dentes : Canções de trabalho e Canções de dor; Canções de amor; de afirmação da iden-
tidade e de resistência religiosa252. Ao término, propusemos uma atividade para a avali-
ação das competências cognitivas da Teoria Ontogenética da Consciência Histórica.
Através desta atividade o estudante fez a associação entre trechos das Cantigas de Mara-
baixo que foram auditados, com a tipologia das Canções afrodescendentes. Utilizamos
fragmentos das Cantigas e dos relatos colhidos, para identificar quais foram as aprendi-
zagens históricas obtidas acerca da escravidão africana no Amapá, no século XVIII. Para
tal selecionamos (01) fragmento de cada tipologia das Cantigas afrodescendentes basea-
dos em perguntas que contemplaram as competências cognitivas da teoria ontogenética
da Consciência Histórica (Rüsen, 1992. p. 5, 6, 7)253. As perguntas desenvolverão a se-
guinte linha epistemológica:

 Canções de trabalho e Canções de dor (ABREU, 1992. p. 181 e 182) e


orientação temporal (RÜSEN, 1992, p.6)
 Canções de amor e de afirmação da identidade (ABREU,2009. P 181 e
182) expectativas futuras (RÜSEN, 1992. p.7)
 Canções de resistência religiosa (ABREU,2009. p. 181 e 182) e orienta-
ção para a vida prática (RÜSEN 1992, p.5).

Imagem 93 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Alu-


nos sendo orientados a fazer reflexões e analises da pesquisa dos verbetes e expressões das Canções
do Marabaixo. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora.
Data 23/04/2018

252 ABREU. Martha. O legado das Canções escravas nos Estados unidos e no Brasil: diálogos musicais
no pós-abolição. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 35, nº 69, 2015. p. 181 e 182.
253 RÜSEN, Jorn. El desarrollo de la competência narrativa en el aprendiaje histórico. Una hipótesis on-
togenética relativa a la conciencia moral. Revista Propuesta Educativa, Buenos Aires, Ano 4, n.7, p.27-
36. oct. 1992.Tradução para o espanhol de Silvia Finocchio. Tradução para o português por Ana Clau-
dia Urban e Flávia Vanessa Starcke. Revisão da tradução: Maria Auxiliadora Schmidt. p. 19.
_______________________________________________
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Imagem 94 – Laboratório de informática da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Alu-
nos sendo orientados a fazer reflexões e analises da pesquisa dos verbetes e expressões das Canções
do Marabaixo. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora.
Data 24/04/2018

3.6.3. 3ª ETAPA: BIBLIOTECA DA ESCOLA ESTADUAL PROFESSORA RA-


IMUNDA VIRGOLINO

Assim, as análises feitas pelos estudantes é fruto da coleta e interpretação de


dados a partir dos procedimentos apresentados, bem como, das ações de trabalho de
campo. Com o avanço das oficinas, observamos que as intersecções entre saberes escola-
res e Consciência Histórica ficavam mais claro para os estudantes. Isso deveu-se a cone-
xão entre Consciência Histórica, a tipologia das Cantigas de Marabaixo e o Saber Histó-
rico Escolar que esteve voltado para a uma interlocução direta, através do uso corrente na
vida prática e cotidiana do estudante. Para traçar tais resultados perscrutamos nas oficinas,
diferentes aspectos envolvendo as Cantigas de Marabaixo. Pedimos em todo o transcorrer
das oficinas que os estudantes deixassem que os próprios detentores do Marabaixo des-
crevessem a manifestação cultural, para que somente depois, fizessem suas próprias in-
terpretações, a respeito das Cantigas da festividade. Descrição que foi, posteriormente,
sistematizada e confrontada com a variedade de fontes e diferença nos relatos. Relatos
que aqui nesta última oficina foram apresentados, mas, sempre levando em consideração,
a singularidade dos grupos e de sua história, na contribuição individual e na construção
coletiva.

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Imagem 95 – Biblioteca da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Alunos preenchendo a ati-
vidade de avaliação das competências cognitivas da teoria ontogenética da consciência histórica. Foto:
Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 26/04/2018

Diante dessas ponderações trouxemos como resultados para esta dissertação,


aquilo que considero um dos mais importantes dados de aplicação do trabalho de pes-
quisa: as reflexões dos estudantes proposto a partir da atividade de avaliação das compe-
tências cognitivas da teoria ontogenética da Consciência Histórica. São respostas que re-
fletem orientação temporal envolvendo a relação das Cantigas de Marabaixo com a es-
cravidão africana no Amapá, no século XVIII e a importância de seu legado. Por isso
precisamos dar voz aquilo que foi dito:

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Imagem 96 – Fragmento 11: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino
sobre o legado e importância das Cantigas de Marabaixo. Data: 24/04/2018

Também observamos que as respostas apresentadas conectam as Cantigas de


Marabaixo fazendo inteligível o presente e conferindo expectativas futuras, a locais e
pessoas citadas nessas Cantigas, uma vez que eles possuem grande relevância tanto para
o Marabaixo, quanto para a própria História do Amapá:

Imagem 97 – Fragmento 12: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino
sobre a relevância das Cantigas de Marabaixo para a História local. Data: 24/04/2018

No que diz respeito a orientação para a vida prática, levar o aluno a aprender
a posicionar-se sociamente, estimular o respeito e entender a importancia dessas
Cantigas de Marabaixo para a história local, repudiar qualquer tipo de descriminação as
matrizes africanas dentro e principalmente, fora do espaço escolar deu voz a seguinte
reflexão:

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Imagem 98 – Fragmento 13: Registro dos estudantes da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino
sobre a relevância das Cantigas de Marabaixo para a História local. Data 24/04/2018

Para finalizar, pedimos que tudo aquilo que foi relato nas oficinas, a singula-
ridade dos locais visitados, a importância dos tocadores, das dançadeiras e dos principais
rituais que são retratados nas Cantigas pelos praticantes do Marabaixo, fossem feitos em
forma de ilustrações.

Imagem 99 – Registro das ilustrações produzidas pelos estudantes. Biblioteca da Escola Estadual Profes-
sora Raimunda Virgolino. Foto: Joaciany do Carmo Nascimento da Paixão. Data: 26/04/2018

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Imagem 100 – Oficina para a produção das ilustrações de palavras e expressões das Canções do Mara-
baixo Biblioteca da Escola Estadual Professora Raimunda Virgolino. Foto: Joaciany do Carmo Nasci-
mento da Paixão. Acervo pessoal da pesquisadora. Data: 27/04/2018

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3.6.4. 4ª ETAPA: CULMINÂNCIA DAS ELETIVAS DA ESCOLA ESTADUAL
PROFESSORA RAIMUNDA VIRGOLINO (27/06/2018)

Imagem 101 – Palestra das alunas Iranilce e Vitória Taynara (Turmas 211 e 213 ) apresentando os resulta-
dos da pesquisa realizada nos locais de incidência da manifestação do Marabaixo de Macapá e de Maza-
gão Velho. Culminância das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data 7/06/2018. Local: Escola Estadual pro-
fessora Raimunda Virgolino. Macapá (AP)

Imagem 102 – Estudantes da Escola Estadual Raimunda ouvindo a palestra das estudantes. Culminância
das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018

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Imagem 103 – Exposição de mural com algumas fotografias tiradas pelos estudantes durante a realização das
oficinas nos redutos de incidência da manifestação do Marabaixo de Macapá e de Mazagão Velho. Exposição
Cultural das Eletivas. Culminância das Eletivas. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018

Imagem 104 – Exposição de desenhos e de frases de repúdio contra todas as formas de preconceito vela-
das ao negro e ao Marabaixo. A atividade retrata bem qual o posicionamento dos jovens estudantes da
Educação Básica e o que eles pensam a respeito do tema. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018

Imagem 105 – Caricatura da aluna Laura (212) desenhada por Kamila Ferreira (213). Afirmação da iden-
tidade e a beleza da cultura negra revelam a consciência história da jovem estudante que ilustrou o dese-
nho. Foto: Patrícia Oliveira. Data: 27/06/2018

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante as aplicações das oficinas com os estudantes da Escola Estadual Pro-


fessora Raimunda Virgolino, nos redutos de incidência da manifestação do Marabaixo de
Macapá e de Mazagão Velho, observamos na fala de nossos colaboradores, uma reivin-
dicação: de ter as Cantigas de Marabaixo integradas ao Currículo das Escolas Públicas,
como parte de um acervo oral tocado, dançado e cantado que testifica a presença africana
no Amapá. Neste sentido, a Dissertação apresentada traz um debate de suma relevância
que carece de discussão urgente dentro da comunidade Acadêmica e Escolar e no Curso
de História sendo que o Material Didático, como parte integrante do Produto Final desta
Dissertação, beneficiara a Comunidade Escolar, os Cursos de Formação de Professores
em História além de dar voz a própria Comunidade do Marabaixo.

Assim, o DICIONÁRIO ILUSTRADO LADRÕES DE MARABAIXO.


MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO. VOL. 1 contribui para a publicidade
e registro por escrito, de parte de um acervo oral que conta a saga africana para o Amapá
no século XVIII assim como, a sua história de resistência a escravidão. Resistência que
fica expressa nos rituais, na dança do Marabaixo e especialmente, na oralidade das Can-
tigas. São aspectos tão relevamentos, porém, devido a fragmentação de informações em
livros paradidáticos físicos e online, necessitava de material didático que dessa publici-
dade ao maior número de informações possíveis, acerca do significado de palavras e ex-
pressões contidas nessas Cantigas.

Através de pesquisa bibliográfica especializada e da coleta de relatos nos lo-


cais de forte expressividade e relevância histórica do Marabaixo de Macapá (Laguinho,
Santa Rita, Central), no Curiaú e em Mazagão Velho, produzimos um grande número de
informações em áudio, vídeo. Informações que compõe o Dicionário por meio de registro,
catalogação e transcrição dos relatos de colaboradores, da utilização de fontes secundá-
rias, de registros audiovisuais e fotográficos. Ressaltamos que na coleta de relatos procu-
ramos deixar que os próprios praticantes do Marabaixo descrevessem a importância e o
legado das suas Cantigas. Informações que foram devidamente colhidas pelos estudantes
e transcritas conforme seus pontos de vista e da visão que tiveram da manifestação. Coleta
de relatos que posteriormente na última oficina: Elaboração do DICIONÁRIO ILUS-

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TRADO LADRÕES DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉ-
DIO. VOL. 1, foi devidamente, alvo de indagações, questionamentos, reflexões visando
a produção do conhecimento histórico escolar.

Objetivo que esteve pautado em desenvolver a prática da pesquisa histórica,


através do diálogo propositivo com saberes fora do espaço escolar. Foi oportunizada aos
estudantes a interlocução com outros agentes que produzem conhecimento, baseados em
seus saberes e em suas próprias experiências de vida. Por outro lado, a própria prática da
pesquisa em História, a coleta e análise de dados, foram bastante desafiadoras para eles,
já que na Educação Básica, existe um grande mito de que o ato de pesquisar se constitui
um mero reprodutivíssimo da leitura livresca. Como as Cantigas de Marabaixo são gran-
des marcos de orientação temporal que testificam ensinamentos deixados pelos antepas-
sados escravizados e que envolve todo o cotidiano da manifestação, nas suas expectativas,
em sua preparação, em seu dia a dia, foi um imenso desafio produzir Conhecimento His-
tórico Escolar, pois, são dados que não estão nos Livros Didáticos e muito menos inte-
gram o Currículo Oficial de História.

Assim, aliamos a música no Ensino de História, por meio das Cantigas, pre-
sentes na manifestação do Marabaixo, para a produção do DICIONÁRIO ILUSTRADO
LADRÕES DE MARABAIXO. MATERIAL DO PROFESSOR. ENSINO MÉDIO.
VOL. 1 com o intuito, de tirar da invisibilidade a contribuição africana no que tange ao
processo da constituição histórica e cultural do Amapá. Dentro desta Configuração este
Trabalho Acadêmico se enquadrou na Linha de Pesquisa Saberes Históricos Fora do Es-
paço Escolar. Linha que se configura a partir dos processos de Ensino e Aprendizagem
da História, considerando as especificidades dos Saberes e das Práticas mobilizadoras no
ambiente Escolar. Configuração que correspondeu ao anseio de produzir, além do debate
e de reflexões da música no Ensino de História, Material didático voltado para a Educação
Básica.

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Quadras ou quartetos são estrofes compostas por quatro versos. Cf. em https://www.nor-
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mundo dos Santos Souza – “Mestre Sacaca”. Entrevista concedida em 15 de Abril de
2018.
Josias Ferreira da Silva Filho, morador a 58 do bairro Central (antiga Favela). Relato concedido
dia 30/06/2018.
Maria Germina de Almeida 76 anos moradora do bairro Central há 30 anos, foi moradora trans-
ferida da área central para a antiga Favela. Seu Padrasto Hipólito da Silva Gaia morava onde é
hoje a residência oficial do Governador.

Relato concedido por Jozué da Conceição Videira, morador do Município de Mazagão


Velho. Relato concedida em 15 de Abril de 2018.
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SANTOS, Pe. Aldemar Benjamim dos. Modernidade e Marabaixo. Luzes e sombras na
perspectiva do projeto rumo ao novo milênio. Acervo: Secretária do Meio Ambiente do
Estado do Amapá.
SILVA, Anna Ruth; RODRIGUES, Edileuza; NASCIMENTO, Maria Jucely. Mara-
baixo: a expressão musical como processo de transformação cultural na década de 1990
na cidade de Macapá. Trabalho de Conclusão de Curso. Especialização em Arte Educação
em Instituições Culturais. Universidade Federal do Amapá. Macapá. Acervo Unifap.
Sobre os dobrados do Marabaixo. Relato concedido Carlos Augusto Gomes, “Carlitão”,
músico da Banda Placa. Dia 20 de Abril de 2018.
SOUZA, Jane Selma; BORRALHO, Nilvânia da Conceição. Estudo poético da lingua-
gem do Marabaixo. Trabalho de Conclusão de Curso. Licenciatura Plena.
VIANNA BOTELHO, Ângela. MARIA REIS, Liana. Dicionário Histórico Brasil Colô-
nia e Império. 6ª ed.- SP: Autêntica, 2007.

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ANEXO A: PARECER CONSUBSTANCIADO – CEP

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ANEXO B: LISTA DE VERBETES E EXPRESSÕES DO MARABAIXO PESQUI-
SADAS

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ANEXO C: ATIVIDADE DE AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIAS COGNITIVAS
DA TEORIA ONTOGENÉTICA DA CONSCIÊNCIA HISTÓRICA

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ANEXO D: TRANSCRIÇÃO DE LADRÕES DE MARABAIXO

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ANEXO E: ILUSTRAÇÕES – RAQUEL SOARES E CAMILA FERREIRA
(TURMA 213)

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ANEXO F: ILUSTRAÇÕES – RAILA RAYKA (TURMA 211)

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