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MARABÁ/PA
2021
JACLENE ALVES RIBEIRO
MARABÁ/PA
2021
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca
Setorial Campus do Tauarizinho da Unifesspa
Banca Examinadora:
______________________________________
Prof.ª Dr.ª Karla Leandro Rascke
Orientadora
_______________________________________
Prof.º Dr.º Geovanni Gomes Cabral
Examinador Interno
_______________________________________
Prof.ª Me. Cristiane Mare da Silva
Examinadora Externa
Fonte: https://anchor.fm/nat341lia-franciele-pomi351/episodes/Reinos-Africanos-e-Americano-eik5il
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, quero externar minha eterna gratidão а Deus, pela minha vida, e
por me permitir ultrapassar todos os obstáculos encontrados ao longo da realização deste
trabalho. Permitiu que meus objetivos fossem alcançados durante todos os meus anos de
estudos. Restaurando minha saúde e determinação para não desanimar durante a realização
deste trabalho.
Fui acometida pelo coronavírus no período da escrita do último capítulo desse
trabalho. Passei dias e noites intermináveis, eu só chorava. No auge da minha dor nada me
consolava. Mas eu sobrevivi como a águia solitária e a sorte de novo sorriu para mim. Deus
me escondeu debaixo de suas asas e o poder de Deus na minha fraqueza se aperfeiçoou.
Sou grata aos amigos/familiares, por todo o apoio e pela ajuda, que muito contribuiu
para a realização deste trabalho e que sempre estiveram ao meu lado, pela amizade
incondicional e pelo apoio demonstrado ao longo de todo o período de tempo em que me
dediquei a este trabalho. Principalmente a minha mãe (Maria Djanira Alves) e esposo
(Rahfelson de Oliveira Barbosa), que me incentivaram nos momentos difíceis e
compreenderam a minha ausência enquanto eu me dedicava à realização deste trabalho.
Agradeço a professora Drª Karla Leandro Rascke, por ter sido minha orientadora e ter
desempenhado tal função com dedicação e amizade. Aos professores do curso de graduação
em História em História, pelas correções e ensinamentos que me permitiram apresentar um
melhor desempenho no meu processo de formação profissional ao longo do curso, obrigada
por todos os conselhos, pela ajuda e pela paciência com a qual guiaram o meu aprendizado.
Meus sinceros agradecimentos aos colegas de curso, com quem convivi intensamente
durante os últimos anos, pelo companheirismo e pela troca de experiências que me permitiram
crescer não só como pessoa, mas também como formada e por compartilharem comigo tantos
momentos de descobertas e aprendizado. Sou extremamente grata pelo ambiente amistoso no
qual convivemos e solidificamos os nossos conhecimentos, o que foi fundamental na
elaboração deste trabalho de conclusão de curso.
Por fim, agradeço aqueles que contribuíram, de alguma forma, para a realização deste
trabalho. A todos que participaram, direta ou indiretamente do desenvolvimento deste
trabalho de pesquisa, enriquecendo o meu processo de aprendizado. Obrigada UNIFESSPA
(Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará), por tudo o que aprendi ao longo dos anos do
curso e pela oportunidade de fazer parte do seu quadro de discente. Foi uma honra fazer parte
da sua história.
Por fim, não poderia deixar de agradecer a Escola Estadual de Ensino Fundamental e
Médio Profº Acy de Jesus Neves de Barros Pereira. Bem como aos professores – Ewerton
Correia e Alex, professores de História da escola, pelos livros didáticos cedidos, que foram
utilizados como fonte de pesquisa para esse trabalho de conclusão de curso.
RESUMO
The present work aims to analyze the way the History of Africa is portrayed in texts
and images of history textbooks aimed at Elementary School II, in the public school system in
Marabá/PA. We took as analysis space the State School of Elementary and High School
Teacher Acy de Jesus Neves de Barros Pereira. We focused on the narrative on textbooks,
destined to the 6th and 9th year published between the years 2015 and 2018, approved by the
PNLD 2017 and 2020, our sources of research. The analysis points to some advances, but also
to the permanence of misconceptions and stereotypes, characteristic of a negative
representation historically constructed on the African continent. We try to reflect, in this
sense, on the challenges and possibilities currently encountered to address the African theme
in the classroom.
Keywords: History Teaching. Textbook. African History. Representations.
SUMÁRIO
1 - INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 11
2 - MARABÁ, ENSINO DE HISTÓRIA, LIVRO DIDÁTICO E HISTÓRIA DA
ÁFRICA ................................................................................................................................... 16
2.1 - Todos os olhares para Marabá na atualidade .......................................................... 16
2.2 - Ensino de História e livro didático ............................................................................ 22
2.3 - O ensino da História da África .................................................................................. 27
3 - ANÁLISE DO CONTINENTE AFRICANO EM LIVROS DIDÁTICOS DE
HISTÓRIA .............................................................................................................................. 33
3.1 - O Continente africano entre representações nos livros didáticos de História ...... 37
3.2 - Análise de livros didáticos produzidos no século XXI............................................. 40
4 - CONSTRUÇÃO DE UMA ABORDAGEM DE ENSINO PARA A HISTÓRIA DA
ÁFRICA ................................................................................................................................... 60
4.1 - A Construção da abordagem ..................................................................................... 63
4.2 - Elaboração dos materiais e metodologia de ensino de história .............................. 65
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 70
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 72
ANEXO I – Questionário aplicado na turma pesquisa – 8º ano “a” ................................. 74
ANEXO II – Plano de aula..................................................................................................... 76
ANEXO III – Texto produzido .............................................................................................. 78
ANEXO IV – Jogo Mancala .................................................................................................. 80
11
1 - INTRODUÇÃO
conhecer sua história. Assim como suas especificidades, que nos leva a imaginar a
imensurável importância do continente africano e seus povos para todo as demais sociedades.
Aprendemos de tudo um pouco com os povos africanos: costumes, crenças, línguas, gestos,
saberes, fazeres, línguas, gestos, tantas outras coisas.
Com ajuda da minha orientadora Prof.ª Dr.ª Karla Leandro Rascke, que sempre esteve
acessível para ajudar e direcionar o caminho a ser percorrido, indicando leituras e
compartilhando as que têm na sua biblioteca, foi possível a abertura a abertura de um leque de
conhecimentos no que tange a história do continente africano e seus povos. Partindo de tais
conhecimentos, passei a olhar a história da África com sentimento de pertencimento dessa
história, ou seja, eu faço parte dessa história. Pois, a história do continente africano e seus
povos fazem parte da minha história.
No Estágio Supervisionado, a partir do período da regência, meu primeiro contato com
alunos em sala de aula e tive a oportunidade de observar o livro didático, o Ensino de História
e Ensino da África na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Profº Acy de Jesus
Neves de Barros Pereira. Mediante atividades supracitadas pelo Estágio Supervisionado,
resolvemos elaborar e aplicar um questionário-diagnóstico na turma do 8º ano “A” (ver anexo
I). Partindo de uma prática que objetivou mapear o conhecimento dos alunos sobre o “A
História da África”, constituiu uma problematização a respeito da importância do “Ensino da
História da África na sala de aula”. O objetivo era identificar de que forma o Ensino da
História da África estava sendo apresentado e contemplado na sala de aula.
No resultado do questionário ficou visível o não conhecimento dos alunos sobre a
História da África. Resposta que norteou a escolha do tema desse trabalho. Visto que, detive o
cuidado de não abordar a história africana em termos de conscientização ou supervalorização,
mas, mas a fim de atuar na construção de relações étnico-raciais em prol da diversidade e da
promoção da igualdade racial que rendeu experiências muito valiosas para a prática docente
em História.
O ensino de História da África vem somar-se a valorização da diversidade étnica e
cultural de nosso país, trazendo para o estudo e para o debate o papel das populações negras
nos processos históricos. Aliado ao estudo da África insere-se em grande medida o papel da
instituição escolar no que se refere ao combate do preconceito e das diferentes formas de
discriminação, já que participa na construção de atitudes de cidadania e de valores
fundamentais para a vida em sociedade.
Este trabalho, intitulado “Quais áfricas? O ensino da história da África na sala de aula
(Marabá, 2015-2020)”, tem como objetivo analisar a maneira como a História da África é
13
Dessa maneira, pensarmos como está sendo abordado os conteúdos no livro didático
de História no que tange à História da África e problematizar como acontecem tais
abordagens, e quais suas contribuições para a crítica a estereótipos e preconceitos. Visto que:
O presente trabalho está estruturado em três capítulos, sendo que no primeiro capítulo
– Marabá Ensino de História, Livro Didático e História da África, abordamos aspectos da
cidade de Marabá, o ensino de história, o livro didático e a história da África. No primeiro
tópico apresentamos Marabá/PA, com suas diversidades e particularidades; ao passo que no
segundo tópico desenvolvemos algumas reflexões sobre ensino de história e livro didático,
bem como, dialogamos com os textos de autoria de Circe Bittencourt (2018). Circe
Bittencourt fala da importância de se apropriar de uma certa concepção de história. Traçamos
diálogo com Anderson Ribeiro Oliva (2003), que retrata as representações e imprecisões na
literatura didática. No terceiro e último tópico, refletimos sobre a História da África e seu
ensino, dialogando com pesquisadores da área, incluindo os citados no tópico anterior.
No segundo capítulo – Análise do Continente Africano em Livros Didáticos de
História, analisamos o continente africano no livro didático. No primeiro tópico desse
capítulo visamos diagnosticar de que maneira o continente africano está sendo representado
nos livros didáticos de História. No segundo tópico analisamos os livros didáticos produzidos
no século XXI (publicados entre os anos de 2015 e 2018, aprovados pelo PNLD de 2017 e
2020). Em síntese, nesse capítulo, buscamos contextualizar como o livro didático utilizado
pelos docentes e discentes retratam o continente africano. Se somente de forma tradicional, ou
seja, a partir de textos e imagens que demonstrem mitos e preconceitos, que durante muito
tempo ocultaram a real história deste continente; ou se hoje, com o ensino da História e
15
1
Almanaque100anosanosdemarabá/2013:umanoquevalepor100/banzeirocomunicação
17
Marabá não é uma única cidade. Marabá são muitas. É um perder as contas, no que
tange ao seu crescimento demográfico. Tantas ou mais quantas forem as pessoas que chegam
aos milhares a cada ano vindas das mais variadas e Estados do Brasil. Marabá, lugar de
disputas políticas, sociais e territoriais, de gente que ousou/ ousa estabelecer aqui seus
negócios e famílias e que fez da vila fundada oficialmente por “Francisco Coelho” 2, uma das
cidades que mais crescem nesse País. Marabá é uma experiência plural.
A história de Marabá é narrada em almanaques, jornais, principalmente, por relatos,
encontrados na Fundação Casa da Cultura de Marabá. Em uma visita ao Museu Municipal de
Marabá, no período da pesquisa, instalado nas dependências da Fundação Casa da Cultura, há
feiras, há bairros, há praças da cidade de Marabá, que permitem perceber diferentes aspectos
da cidade: do lambedor3 de ervas medicinais indicado pela vendedora da feira do Bairro
Laranjeiras ao mais tecnológicos dos consultórios médicos; do canoeiro do Bairro Amapá ao
maquinista de trem que transporta minério em mais de 200 vagões; do tacacá vendido na
praça do Hamburg das redes de Fast-Food; dos ciclos econômicos tão marcantes na sua
história, a política emblemática das oligarquias e coronelismo, a explosão demográfica, da
instalação do Grande Projeto Carajás e da descoberta do garimpo de Serra Pelada.
Marabá, aos 108 anos, onde o novo e o velho se contradizem, os tempos se misturam e
permitem o convívio num cotidiano de aprimoramento social e econômico, onde a feira livre e
o shopping Center não se apartam. O envelhecimento nem sempre é dado pelo tempo,
principalmente quando se trata de lugares. Marabá, impulsionada pelo movimento de
embarcações em frente à Praia do Tucunaré, de onde saíam os carregamentos de Caucho, na
década de 1898, anos depois com carregamentos de Castanha - por volta da década de 1920,
cresce sem detença números de casas e bairros.
Marabá terra indígena, com suas densas matas, nasceu na ponta do Cabelo Seco4 se
expandiu para formar a aglomeração chamada de Pioneira. Segundo almanaques e jornais,
existentes na Fundação Casa da Cultura, logo, surge a planejada Nova Marabá, no formato de
uma folha, acima da linha da enchente dos rios Itacaiúnas e Tocantins, ao mesmo tempo em
que se constituíram os bairros do Novo Horizonte, Amapá e Cidade Nova e se ramificou pelo
município, tornando-se conhecido mundo a fora pelas disputas e conflitos que, se dão sobre o
seu território de colonização do espaço rural.
2
De acordo com o livro “Viagem ao Tocantins” (autor desconhecido), escrito por ocasião da visita à região do
então secretário geral do Estado, Deodoro Mendonça, logo após a grande enchente de 1926, 7 de junho de 1898
foi o dia em que Francisco Coelho, após também deixar o burgo, instalou-se no pontal, atualmente, denominada
Marabá.
3
Lambedor – Preparados caseiros de xarope (São úteis no cuidado da tosse).
4
Cabelo Seco – Nome do bairro da Cidade de Marabá.
18
Fonte: https://www.google.com/search/mapa/Marabá-PA.
19
Fonte: https://www.google.com/search/mapa/Marabá-PA.
Fonte: https://www.google.com/search/maraba/PA.
20
Fonte: https://www.google.com/search/bandeirademaraba/PA.
não são verdades absolutas, pois são dados gerados sobre a perspectiva projetista para as
escolas, onde elas podem alcançar avanços educacionais futuros, ou não.
Ao analisar a Prova Brasil, criada pelo Governo Federal para avaliar os alunos nas
disciplinas de Matemática e Português percebe-se que o município se encontra em um nível
abaixo da média se comparada com outros municípios. Isso pode ser percebido nos dados do
ano de 2017 que contém 8 etapas de avalição para os alunos. Na primeira etapa, temos o item
de avalição da disciplina de Português com: 0 45.56%, 1, 18.43% 2, 17.32% 3, 10.45% 4,
4.74% 5, 3.61% 6, 0.0% 7, 0.0% e 8 0.00% todos esses índices pressupõem uma avaliação em
específico sendo que as inicias representam o menor peso da prova e, assim o nível de
eficiência dos alunos.
Quando comparado esses dados da escola do município com outras escolas, o
município está bem abaixo do nível de eficiência, pois na mesma avaliação dos municípios
paralelos têm no mesmo item: 0, 27.67% 1, 22.27% 2, 25.05% 3, 14.83% 4, 5.35% 5, 4.27%
6, 0.39% 7, 0.19% 8, 0.00%. (PROVA BRASIL, Avaliação do Rendimento Escolar, 2017).
No item 0 temos uma diferença no percentual de 9% a mais que os outros municípios e no 1%
a mais, no 2 +1%, no 3 +2, 4 -1%, 5 2,50%, 6 +4, 7 0,40% e 8 00. (PROVA BRASIL,
Avaliação do Rendimento Escolar, 2017).
Nos dados apresentados pela Prova Brasil, as escolas do município apresentam um
desenvolvimento baixo se comparada com as outras, entretanto, vale acrescentar que durante
a realização desses exames algumas escolas escolhem seus melhores alunos para realizar
avalições e, assim aumentar seus índices.
Vale ressaltar, sobre as avaliações da Prova Brasil que, as escolas estão cada vez mais
direcionadas para os exames das disciplinas Português e Matemática. Isso retoma as ideias
tradicionais de ensino. O que nos direciona para as avaliações do ENEM, que tem conteúdos
bem direcionados. Quando esses dados partem para o IDEB os desníveis são ainda maiores,
tendo em vista que a escola se encontra bem abaixo da média nacional com o IDEB 4,3.
Claramente esses paradoxos mostram as incoerências dos dados para com a realidade
das escolas do município. Tendo em vista que os dados do IDEB e da Prova Brasil são apenas
mecanismos de tentar monitorar os “avanços educacionais” das escolas, mas, não
compreendem a realidade o aprendizado como um todo.
É importante pontuar que a fórmula que quantifica este resultado é obtida a partir de
indicadores como o desempenho na Prova Brasil (aprendizagem), taxas de evasão e repetência
da unidade escolar. Cada escola possui suas metas diferenciadas, que são apresentadas
bienalmente por meio da Prova Brasil, ou seja, a cada dois anos, as escolas deverão melhorar
22
seus índices. Assim, com base nos dados apresentados, é perceptível que, a educação em
Marabá precisa de incentivos para melhoria de sua qualidade. Há muito para se mudar. Visto
que, qualidade em educação é algo a ser buscado com persistência perene e é muito mais
complexo do que os indicadores eleitos pelo IDEB.
5
Leopold Von Ranque (1795-1886) – Historiador alemão do séc. XIX, considerado o pai da “História
cientifica”.
24
6
Neste século, várias mudanças historiográficas repensaram a escrita da história e seus métodos. Como a história
marxista, história dos Annalles, Nova história cultural.
25
Uma concepção mais ampla e atual parte do princípio de que os materiais didáticos
são mediadores do processo de aquisição de conhecimento, bem como facilitadores
da apreensão de conceitos, do domínio de informações e de uma linguagem
específica da área de cada disciplina. (BITTENCOURT, 2004, p. 296).
Os livros didáticos fazem parte do cotidiano escolar há séculos. Por esta razão, a
familiaridade com seu uso faz com que seja fácil identificá-los e estabelecer distinções entre
eles e os demais livros (BITTENCOURT, 2004).
Lajolo (1996, p. 03) afirma que os livros didáticos no Brasil “são centrais na
produção, circulação e apropriação de conhecimentos, sobretudo dos conhecimentos por cuja
difusão a escola é responsável”. Choppin (2004) “alerta que o livro didático é bastante
complexo, podendo assumir diferentes funções, dependendo das condições em que é
produzido e utilizado, além de ter um papel de instrumento de controle do ensino pelos
agentes do poder”.
Circe Bittencourt (2004) também nos fala das diversas interferências na elaboração e
nos usos do livro didático. Para a autora, o livro didático caracteriza-se por ser um suporte de
conhecimentos escolares, suporte de métodos pedagógicos, veículo de sistema de valores e,
também, uma mercadoria. Ou seja, sintetizando:
De acordo com Saab (1999), a indústria dos livros didáticos representa, em média,
54% da indústria nacional; em 1998, dos 369 milhões de livros produzidos, 244 milhões
referiram-se a livros didáticos, cujo segmento é o mais concentrado, ou seja, com o menor
número de editoras: Ática, Scipione, FTD, Saraiva e Moderna.
As editoras quando compradas com grandes multinacionais ocorre uma
internacionalização do mercado do livro didático como consequência do faturamento em cima
da área da educação, surgindo um maior embate de interesses comerciais e educacionais no
que diz respeito ao seu conteúdo e formato. A produção desses materiais envolve-se, então,
26
como uma parte do sistema, perdendo muitas vezes apenas a sua função educadora por ser tão
importante para o mercado editorial nacional.
Em consequência disso, o livro didático se torna uma “cartilha” das propostas
curriculares do Estado, face ao suporte de conhecimento escolares.
Essa característica faz que o Estado esteja sempre presente na existência do livro
didático: interfere indiretamente na elaboração dos conteúdos escolares veiculados
por ele e posteriormente estabelecem critérios para avaliá-los, seguindo, na maior
parte das vezes, os pressupostos dos currículos escolares institucionais. Como os
conteúdos propostos pelos currículos são expressos pelos textos didáticos, o livro
torna-se um instrumento fundamental na própria constituição dos saberes escolares
(BITTENCOURT, 2004, p. 301-2).
Alain Choppin (2004), no seu trabalho, que tem o livro didático como objeto de
pesquisa, descreve além da função privilegiada de dar suporte educativo como portador de
conhecimentos, técnicas e habilidades, o livro didático tem também sua função ideológica.
Visto que, possuem visões de mundo, pois, devem ser entendidos enquanto portadores de
valores.
Função ideológica e cultural: é a função mais antiga. A partir do século XIX, com a
constituição dos estados nacionais e com o desenvolvimento, nesse contexto, dos
principais sistemas educativos, o livro didático se afirmou como um dos vetores
essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Instrumento
privilegiado de construção de identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como
a moeda e a bandeira, como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido,
assume um importante papel político (CHOPPIN, 2004, p. 553).
27
O livro didático não é uma coletânea de aulas prontas e acabadas, ele não substitui o
trabalho dinâmico de professores e alunos em sala de aula. Este deve ser estimulado por
relações de trocas entre o que é estudado e o que é vivido, pela articulação com informações
interdisciplinares e pela construção de novos conhecimentos. Pois a preparação de uma aula e
sua efetivação são tarefas complexas. Afinal, é na sala de aula que surgem as questões, as
formas mais adequadas de lidar com o material de estudo, iniciativas de debates e trabalhos.
Assim, o livro didático não pode dar conta dessa dinâmica tão ampla e complexa.
No entanto, visto a história do continente africano e sua importância na construção de
sentidos e expressões dos alunos acerca das vivências no cotidiano e das variadas práticas que
os envolvem. Dessa maneira, nos livros didáticos pesquisados, busquei analisar como as
abordagens sobre a História da África estava sendo representada, nos respectivos capítulos,
direcionados a temática.
[...] exótica, terra selvagem, como selvagem são os animais e pessoas que nela
habitam: miseráveis, desumanos, que se destroem em sucessivas guerras fratricidas,
seres irracionais em meio aos quais assolam doenças devastadoras. Enfim,
desumana. (ZAMPARONI, 2004, p. 40).
em reservas de petróleo, gás natural e urânio. Fato proporcionado em razão de sua formação
geológica, da idade pré-cambriana7.
No passado, Mama África foi explorada, recortada, colonizada. Hoje é lembrada nos
noticiários da tevê por suas tristezas. O coração das riquezas dos europeus no século
XIX transformou-se no coração da pobreza dos dias de hoje. O espetáculo de
horrores, que começou a ser encenado a partir do século XV, teve seu apogeu do
século XIX. E deixou sua herança. (CAMPOS; et al, 2002, p. 181).
7
Pré-cambriana – Tempo geológico (cerca de 4,6 bilhões de anos atrás), período em que o planeta terra passou por um
conjunto de modificações que proporcionou diversas características, como a formação do oceano, da lua, de muitos minerais,
de sua oxigenação, da formação de algumas vidas multicelulares e das placas tectônicas.
29
atuais. Não somente nos livros didáticos como também fortes imagens que circulam no
imaginário coletivo brasileiro sobre a África. Imagens que desvalorizam e desqualificam tanto
o continente quanto os povos africanos, partindo de uma visão etnocêntrica, que impõem
padrões culturais, sociais e econômicos de forma substancial.
É neste contexto que no início de 2003, foi sancionada pelo Presidente da República
a Lei Federal nº 10.639 de 09 de janeiro de 2003, que altera a Lei Federal no 9.394,
de 20 de dezembro de 1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) -, determinando a inclusão no currículo oficial da rede de ensino a
obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras
providências. (PAULA e PERÓN, 2006).
31
Segundo Paula e Perón (2006), a Lei ganhou o reforço de dois documentos, a saber:
Embora a Lei Federal 10.639/03 traga benefícios no que diz respeito ao tratamento
dado às relações étnico-raciais, até que ponto a criação dessa lei e sua implementação nas
escolas têm o respaldo e o apoio das políticas educacionais que regem a educação no Brasil?
Visto que a quantidade de matérias didáticos produzidos sobre o assunto são abundantes e,
revisões nos conteúdos a serem realizadas a fim de desenvolver a prática pedagógica sem as
deturpações que fizeram parte do estudo da África nas escolas durante anos?
Não há como negar a importância da Lei Federal 10639/03, assim como, o aumento de
especialistas e pesquisas voltadas para a temática, pois o conhecimento sobre o tema está em
construção, crescendo gradativamente. Apesar das dificuldades no que tangue ao processo de
ensino-aprendizagem em relação à temática, sem sombra de dúvida, a Lei é uma conquista e
impacta na construção de novas relações sociais, podendo assim quem sabe no futuro mudar
essa ordem cronológica linear tradicional de ensino.
Conforme Paula e Perón (2006), ganham também destaque, os inúmeros projetos de
implementação das políticas de ações afirmativas para a população negra a afrodescendentes,
entre elas: a implementação de cotas nas Instituições de Ensino Superior e nos concursos
públicos; políticas específicas de inserção do negro no mercado de trabalho; programas
especiais voltados a saúde da população negra; programas específicos para ingresso na
carreira diplomática, e; ações específicas na área da cultura e da educação.
Desta feita, ao analisar os manuais escolares da editora Saraiva e FTD do 6º ao 9º -
publicados entre os anos de 2015 e 2018, utilizados na EEEFM. Profº Acy de Jesus Neves de
32
Barros Pereira – Marabá/PA, escola onde realizamos o Estágio Supervisionado I, II, III e IV,
onde estou estagiando desde 2018.4, é perceptível que, mesmo com os ricos e grandes debates
envolvendo o ensino da história da África, gerados a partir da promulgação da Lei, a
linearidade europeia no conteúdo dos livros didáticos continua sendo ministrada na sala de
aula. Os conteúdos abordados sobre a História da África, por ano, são:
• 6º ano - é abordado a África Antiga: O Egito, os Cuxitas (O Reino de Cuxe / Reis e
rainhas cuxitas).
• 7º ano – Reinos e impérios africanos (O Continente Africano/ O Islamismo na África/
O reino de Gana/ O Império Mali/ O Império Songai/ Os Reinos Iorubás/ Máscaras Africanas/
O Reino do Congo).
• 8º ano – Imperialismo na África (Imperialismo/ Impérios coloniais).
• 9º ano – as Independências na África (O contexto das Independências/ As
independências na África/ Os países africanos independentes).
Desse modo, é visível nos livros didáticos analisados, a mesma linha cronológica
eurocêntrica (Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea), estática
até os dias atuais. Pois, tem muita questão em jogo, principalmente, como a editora seleciona
e pensa o seu livro didático. Por sua vez, não podemos deixar de mencionar a formação de
professores que de certa forma mantém essa linha de percepção. Contribuindo para essa
permanência.
33
Quantos de nós estudamos a África quando transitávamos pelos bancos das escolas?
Quantos tiveram a disciplina História da África nos cursos de História? Quantos
livros, ou textos, lemos sobre a questão? Tirando as breves incursões pelos
programas do National Geographic ou Discovery Channel, ou ainda pelas imagens
chocantes de um mundo africano em agonia, da AIDS que se alastra, da fome que
esmaga, das etnias que se enfrentam com grande violência ou dos safáris e animais
exóticos, o que sabemos sobre a África? (OLIVA, 2003, p. 423).
Complexa e diversa, a África, sua história e seus povos precisam ser mais bem
compreendidos, e seus papéis, na história do mundo, redimensionados. Com um reflexo, de
décadas de idas e vindas, superações e convencimentos a história da África não deve se
limitar ao estudo da tradição, do exótico ou das influências colonialistas das potências
europeias.
34
Nesse sentido, Anderson Ribeiro de Oliva (2003, p. 421), observa que: “[...] devemos
voltar nossos olhares para a África, pela sua relevância incontestável como palco das ações
humanas e pelas profundas relações que guardamos com aquele Continente [...]”.
[...] Uma das questões a serem resolvidas se refere às fontes utilizadas na produção
da história e, consequentemente, à análise feita sobre elas. ‘Povos sem história’,
‘sem escrita’ e ‘sem cultura’, entre outras representações, foram expressões
atribuídas aos povos que se encontravam fora do círculo restrito da história.8 Isso
tem sido reavaliado de forma crítica em relação ao modo pelo qual se construiu a
história que valeria a pena ser contada, no qual a produção europeia – e mais
recentemente a dos Estados
Unidos – se localiza em um centro difusor e orientador dos saberes. (SANTOS;
CRUZ, 2012, p. 195).
8
Não esqueçamos o contexto e o impacto da análise de Hegel sobre a ausência da história dos povos negros
africanos à época, “A África não é uma parte histórica do mundo” (HEGEL, G. W. F. Filosofia da História.
Brasília: Ed. UnB, 1995, apud OLIVA, Anderson Ribeiro. A história da África nos bancos escolares:
representações e imprecisões na literatura didática. Est. Afro-Asiáticos, v.25, n.3 p.421-461, 2003; p.438) e o
fato de que textos como esses continuam ainda hoje a ser lidos nos cursos de formação de historiadores.
35
Com base no que está disposto nas leis supracitadas no parágrafo que antecede a
citação, de maneira especial na Lei 10.639/03, com olhar voltado com que a legislação
preconiza, neste capítulo nos atentamos se, com a lei em vigor, ocorreram mudanças
significativas em relação ao tratamento da temática africana nos livros didáticos pesquisados,
ou se continua sendo retratada de forma eurocêntrica e preconceituosa.
Consideramos os manuais didáticos como propagadores do conhecimento histórico e
responsáveis, de certa forma, pela percepção que os alunos constroem a partir das aulas, visto
que, segundo Circe Bittencourt (2002, p. 72), muitas vezes, esses manuais didáticos são
propagadores de “um sistema de valores, de uma ideologia” e “de uma cultura” que
inferiorizam determinados grupos sociais e enaltecendo os valores de outros, através da
exclusão, generalização e valorização da cultura de “grupos dominantes”.
Ao optar por analisar o livro didático, Izabel Gobbi enfatiza que:
[...] no Brasil, o contato de grande parte das crianças com o primeiro livro,
geralmente, se dá por meio da escola. Muitas vezes, o livro didático é o único livro
que as crianças terão em casa. Portanto, a preocupação com o conteúdo que
apresentam torna-se bastante relevante (GOBBI, 2006, p. 15).
9
Consciência histórica é quando os alunos conseguem perceber o significado da história na sociedade e no meio
em que está inserido.
37
editoras, vieram sendo introduzidos recursos de informação ao texto base: boxes, infográficos,
mapas, documentos de diversas naturezas. Outro item adicionado ao texto base são textos de
maior extensão, entremeados ou posteriores à narrativa principal, habitualmente denominados
como seções que aparecem ao longo dos capítulos.
Rocha (2013) afirma que a composição da narrativa principal do livro, ou texto base, é
o resultado de escolhas referentes a diversos aspectos. Assim, para Oliva (2009, p. 18), as
“abordagens acerca dos estudos africanos, presentes ou ausentes nas coleções de livros
didáticos de História, aparecem como ingredientes chaves na composição, transformação e
manutenção das referências e imagens que o público escolar constrói sobre aquele continente
e suas sociedades”.
Nos livros didáticos de História, como também na sociedade em geral, a presença de
equívocos e preconceitos construídos sobre o continente africano no Brasil é uma questão
histórica e que está presente até os dias atuais. Objetivando enriquecer a reflexão sobre o
assunto em questão, recorremos aos livros didáticos que foram analisados no contexto da
presente pesquisa, como também às reflexões de Anderson Ribeiro de Oliva que trabalhou
com a mesma temática analisando livros de outros períodos, também com recorte sobre a
história da África.
A obra “Olhares sobre a África: abordagens da história contemporânea da África nos
livros didáticos brasileiros” de Anderson Ribeiro Oliva (2009), por exemplo, constitui
trabalho de referência. Nele, o autor analisa livros didáticos produzidos entre 1999 e 2002, e
destinados ao Ensino Fundamental II. Assim, permite pensar criticamente de que forma a
História da África está representada nos livros didáticos de história. Dessa forma, a partir das
reflexões, busca-se estabelecer um contraponto entre livros didáticos de outros períodos com
aqueles analisados especialmente para esta pesquisa.
Oliva, ao analisar os livros didáticos, tem como enfoque as resistências africanas face
à ocupação colonial. Enfatiza que as narrativas começaram a serem contadas a partir do ponto
de vista europeu. No livro intitulado “Nova História Crítica, 7ª série”, de Mário Schmidt, o
autor diagnosticou problemas na classificação das ações históricas; no livro “Uma História em
Construção, volume 4”, foi diagnosticado que “a dominação só foi possível devido à
superioridade militar europeia”; no livro de Joelza Ester Rodrigue, “História em Documento:
texto e imagem, 8”, percebeu que “a perspectiva de denúncia ou crítica à ação europeia, foi
marcada, de acordo com a autora, pela “opressão”.
39
No livro “O jogo da História”, Anderson Ribeiro Oliva observou que “os autores
destacam o papel dos missionários e exploradores europeus na ação de reconhecimento e
ocupação do continente africano”. (CAMPOS et al, 2002, p. 173-175).
Grande parte das populações dos países ricos compartilhava ainda o preconceito da
superioridade sobre os outros povos. Era opinião comum entre a população dos
países industrializados que os povos dominados constituíam-se em raças inferiores,
por natureza incapazes de utilizar seus próprios recursos naturais; e que eles, povos
superiores, tinham o direito e o dever de explorá-los em benefício de toda a
humanidade. (BONIFAZI; DELLAMONICA, 2002, p. 213).
Passados dezoito anos após a promulgação da Lei Federal 10.639/2003, uma das
questões que surgiram era a de como essa lei teria influenciado nas abordagens e na inclusão
da temática africana nos livros didáticos atuais. Para pensarmos como essa lei tem interferido
nos livros didáticos mais atuais, para além do conteúdo escrito, também as imagens
constantes nos livros emergem aqui como objeto de reflexão.
Para essa pesquisa foram selecionados 03 livros didáticos de duas editoras com
edições publicadas entre os anos de 2015 e 2018, para os anos finais do Ensino Fundamental
II. Todos esses livros passaram na seleção do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)
e, portanto, foram considerados adequados a demandas e exigências da legislação educacional
vigente, pautando as abordagens e os conteúdos destinados a faixa etária de 6º ao 9º ano. A
escolha dos livros didáticos é feita por cada escola a partir do momento que o Ministério da
Educação (MEC) publica uma lista de livros aprovadas pelo PNLD em seu site.
De conformidade com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) que possuem
objetivos sobre o que o aluno deve aprender durante o Ensino Fundamental com base em
conceitos sobre relações sociais, da cultura e do trabalho relacionados às realidades da
História da América, da Europa, África e outros locais do mundo a partir de processos e que
consigam relacionar semelhanças e diferenças com sua própria vida.
Os livros analisados são produzidos por duas editoras: FTD, aprovado pelo PNLD de
2017 e Moderna, aprovado pelo PNLD de 2020. As duas editoras possuem focos no ramo de
educação e estão há muito tempo no mercado editorial de livros didáticos. Embora seja
possível identificar alguns avanços, o pouco espaço concedido à História da África ainda é
também característica de manuais publicados após a lei. A seguir busco fazer uma análise
específica de cada um dos livros selecionados para minha pesquisa.
O Livro intitulado “Vontade de Saber”, voltado para o 6º ano do ensino fundamental
II, publicado pela editora FTD, aprovado pelo PNLD 2017, tem como autores Marco César
Pellegrini, Adriana Machado Dias e Keila Grinberg. No que tange aos autores é importante
41
salientar que Marco César Pellegrini, Adriana Machado Dias e Keila Grinberg possuem
formação em História.
Marco César Pellegrini atuou como professor de História em escolas da rede particular
de ensino, é autor e editor de livros didáticos de História para Ensino Fundamental e Médio.
Adriana Machado Dias é especialista em História Social e Ensino de História pela
Universidade Estadual de Londrina (UEL-PR). Keila Grinberg é doutora em História Social
pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ) e professora do departamento de História da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO-RJ).
A obra observada conta com dez capítulos direcionados ao estudo da Europa. Uma vez
que disponibiliza dois capítulos da obra para a África Antiga: os Egípcios e Cuxitas.
Temáticas que dizem respeito a origens da humanidade, aos primeiros povos americanos, à
antiguidade no Oriente e na África, à construção da Antiguidade Clássica e suas
contraposições com outras sociedades, à Europa Medieval, ao mundo Islâmico e ao Império
Bizantino, dando seguimento a linha cronológica eurocêntrica.
Os autores trazem em sua apresentação, uma reflexão, sobre o que é História e sua
importância:
Para você, o que é História? Algumas pessoas pensam que História é o estudo do
passado. Outras, porém, afirmam que ela serve para entender melhor o presente. Nós
acreditamos que História é tudo isso e muito mais!
O estudo da História nos ajuda a perceber as ligações existentes entre o passado e o
presente. A escrita, a música, o cinema, as construções magnificas, os aviões, os
foguetes. Tudo aquilo que dispormos hoje [...]. A História nos permite conhecer o
cotidiano dessas pessoas e perceber como a ação delas foi importante para construir
o mundo como ele é hoje.
A história nos auxilia a conhecer os grupos que formam as sociedades, os conflitos
que ocorrem entre eles e os motivos de tais conflitos. Ela nos ajuda a tomar
consciência da importância de nossa atuação política e a desenvolver um olhar mais
crítico sobre o mundo. Assim, nos tornamos mais capazes de analisar desde uma
afirmação feita por um colega até uma notícia veiculada pela televisão.
“Ao estudarmos História, percebemos a importância do respeito à diversidade
cultural e ao direito de cada um ser o que é, e entendemos como esse respeito é
indispensável para o exercício da cidadania e para construirmos um mundo melhor”.
(PELLEGRINI; DIAS; GRINBERG, 2015, p. 2).
Marco César Pellegrini, Adriana Machado Dias e Keila Grinberg objetivam sondar os
conhecimentos prévios dos alunos, estimulando-os a comentar em que situações ouviram falar
dessas civilizações. Pois, segundo os autores é provável que muitos alunos já tenham entrado
em contato com a história do Egito antigo, por meio de filmes, histórias em quadrinhos,
livros, sites na internet, etc.
42
Outro fato observado na obra analisada é que os autores não fazem menção às
atividades exercidas pelos cuxitas, tais como agricultura, artesanato e universo de mercadores.
Tendo em vista que vendiam ouro, incenso, marfim, ébano, óleos, penas de avestruz e pele de
leopardo. Assim, centralizam a história somente na figura de reis e rainhas cuxitas, conquistas
(como a ampliação do seu domínio sobre a região da Núbia) e construção de pirâmides. (Ver
Figura 9).
46
1
Fonte: PELLEGRINI; DIAS; GRINBERG, 2015, p. 102-103.
10
Alcorão – Livro sagrado do Islã.
48
bem como nas línguas, é tão amplo que não pode ser considerado como um aporte do
islamismo ou do cristianismo, apesar de certo desprezo das mesmas em relação às religiões
tradicionais africana”. Pois, segundo Sylla (1994), “[...] a moral, o respeito à vida em
conjunto, a proposta de harmonia entre os homens e a natureza é a base do comportamento de
muitos dos povos do continente africano e de suas religiões”.
No entanto, Visentini, Ribeiro e Pereira (2014, p. 25) enfatizam que, apesar da grande
presença do islamismo na África Subsaariana nos séculos que antecederam à chegada do
cristianismo e da colonização europeia, importa sublinhar que as religiões ancestrais ou
tradicionais dominavam os principais Estados ou impérios como Songhai, Mali e Benin.
Nessa perspectiva de crença aos ancestrais, as quais acreditavam em ser supremo, do qual
procedem todas as pessoas.
A rápida expansão do islamismo na África, ocorrida por conta da expansão árabe
desde o século VIII dado, em grande parte, ao comércio, implicou também no âmbito cultural,
ou seja, no sentido religioso, ao respeito e à tolerância inerente à cultura tradicional. Além
disso, vale ressaltar que a religião é um dos elementos cruciais para compreender a sociedade
africana desde do período pré-colonial até a atualidade. Pois, na importância de justificar a
presença estrangeira no continente africano, as sociedades africanas continuam sendo pouco
conhecidas e, encarada, a partir do etnocentrismo ocidental.
O livro “Aribabá Mais História”, da editora Moderna, foi escrito por Ana Claudia
Fernandes (2020-2023), bacharela em História e mestre em Ciências no programa de História
Social, pela Universidade de São Paulo. Trata-se de material voltado para o sétimo ano do
Ensino Fundamental, sendo possível verificar uma abordagem totalmente diferenciada
daquela presente no livro didático citado anteriormente.
A obra analisada inicia-se com os dois primeiros capítulos direcionados aos Reinos e
povos da África. Esse capítulo chama atenção para a diversidade cultural e as diferentes
formas de organização social que caracteriza esses povos, o que contribui para que suas
culturas e hábitos sejam reconhecidos e valorizados.
Ana Claudia Fernandes (2020-2023) faz um apanhado sobre os Reinos do Sahel, nome
de origem árabe, que significa “margem” ou “borda”; o contato e o comércio desses povos
africanos com os árabes; assim como o desenvolvimento na região de diversos reinos e
cidades mercantis, como o Reino de Gana - terra do ouro e a presença do Islã em Gana. (Ver
Figura 11)
49
Figura 11 – Árabes
11
Movimento almoravida – Monges-soldados saídos de grupos nômades provenientes do Saara.
12
Berberes –povos nômades do Deserto do Saara.
50
No box reservado para “Lugar e Cultura”, nota-se a intenção da autora em mostrar que
atualmente a palavra falada, tanto quanto a palavra escrita, pode ser considerada uma fonte
histórica. Na figura, podemos observar mestres da tradição oral, na África Ocidental.
Os autores deixam claro a relação que os agudás estabelecem com o Brasil, e a cultura
afro-brasileira e, a importância dessa relação a construção de suas memórias e identidades.
Ressaltando que as influencias dos agudás, contribuem para o conhecimento de história da
África e nos leva a compreender como as culturas africanas influenciaram o mundo ocidental.
(Ver Figura 13).
africanos com outros povos, como também o “Projeto Pedra da Memória”, são utilizados para
enriquecer as informações.
O livro intitulado “Araribá Mais História”, da mesma coleção supracitada acima,
voltada para o oitavo ano, apresenta no décimo quarto capítulo, “O capital financeiro e a
expansão imperialista na África, na Índia e na China”. “Para refletir – quais são as relações
entre o imperialismo e o empobrecimento da África atual?”. A figura que segue, mostra uma
passividade no contato dos europeus com a África, sem violência (física e psicológica) por
parte dos europeus, e resistência por parte dos povos africanos. Conforme vejamos a figura
abaixo:
Na página seguinte, a autora apresenta uma outra charge, alusiva à dominação colonial
alemã em áreas da África. Bem como, evidencia uma narrativa sobre características da
colonização da África, em assunto extenso, e de suma importância para a compreensão do
imperialismo colonial, resumido em dois parágrafos. A imagem aponta o aspecto negativo da
expansão imperialista para os africanos. (Ver Figura 16).
Dado o exposto, observa –se na obra analisada que o extenso conteúdo sobre o
capitalismo financeiro e a expansão imperialista na África, se resumiu em onze páginas.
Ademais, vale ressaltar, um ponto importante e inovador, abordado na obra, que está no
tópico “ler os mapas - A partilha da África”. A partir do mapa exposto, Fernandes (2018),
procura retratar “a visão dos europeus sobre a ocupação do continente africano em 1880. Ela
se limita a pequenas áreas, geralmente nas regiões costeiras”. Nesse mesmo mapa a autora
instiga o leitor a “observar que o restante do território no mapa, não está ocupado, como se
fosse um imenso vazio. A visão europeia do período, portanto, ignorou a presença humana já
existente na África, bem como as formas internas de organização política no continente”
(FERNANDES, 2018, p. 180).
No outro mapa – África (1914), Ana Claudia Fernandes elenca observações que
chamam atenção do leitor para o mapa, deixando visível que “os países europeus, não só
preservaram suas possessões litorâneas na África como expandiram esses domínios em
relação ao cenário de 1880”. O mapa chama atenção para o modo como todo o território do
continente foi demarcado. As fronteiras que separam cada domínio colonial foram
estabelecidas pelos europeus na Conferência de Berlim (1885), com base na presença que
cada país já tinha naquela área ou de acordo com sua força política e econômica.
De tal forma, Visentini, Ribeiro e Pereira (2014) ajudam a pensar a esse respeito
quando explicam:
Não obstante o livro analisado anteriormente, a obra “Araribá mais História”, ao levar
o leitor à reflexão sobre o que foi abordado em todo o capítulo, é bem atual e possui imagens
e sugestões de trabalho que prendem a atenção do aluno. Há também a preocupação em trazer
o assunto para a realidade de quem está lendo. Assim como busca aprofundar o assunto, ao
falar da crise do colonialismo; A relação entre a Guerra Fria e os movimentos nas colônias
africanas; os diferentes projetos relacionados às independências na África; o apartheid na
África do Sul.
Para além disso, Ana Claudia Fernandes, autora da obra analisada, no tópico “O Pan–
Africanismo: uma conquista ideológica, enfatiza que os movimentos de resistência contra o
colonizador atuaram durante todo o período de dominação europeia na África. No tópico
“migrações africanas na atualidade” a autora chama atenção na imagem recente de um mapa,
para o intenso fluxo migratório na África, ajudando a identificar os problemas políticos e as
disputas pelo poder no interior do continente africano, assim como as economias mais
prósperas e as que enfrentam mais dificuldades.
58
pesquisa e também as exigências da lei em relação a essa temática nas escolas, é inadmissível
que os alunos ainda se deparem com conteúdo escasso, genérico e preconceituoso.
Com exceção do livro didático denominado “Vontade de Saber”, da editora FTD, que
aborda a História da África de forma passiva e tradicional, sem mostrar a sua presença no
cenário atual, os outros três livros didáticos Araribá Mais História, da editora Moderna
analisados nesse capítulo já trazem uma abordagem diferente em relação a História da África.
Evidenciando a diversidade sócio-política do continente africano. Aborda as reivindicações
políticas, bem como a relação do povo africano com outros povos. As abordagens enfatizam o
caráter dinâmico das culturas africanas.
Em síntese, neste capítulo, analisamos como os livros didáticos utilizados pelos
alunos, retratam a imagem do continente africano. Se somente de forma tradicional, ou seja, a
partir de textos e imagens que demonstrem mitos e preconceitos, que durante muito tempo
ocultaram a história deste continente; ou se hoje, com o ensino da História e Cultura Afro-
Brasileira tornado obrigatório através da lei 10.639/2003, a História da África é mostrada de
uma forma mais ampla.
No capítulo posterior traremos uma proposta didática para o ensino da história da
África. A intenção é justamente pensar como trabalhar a história do continente africano em
sala de aula, tendo em vista que, como mostrado aqui, alguns livros ainda reproduzem
preconceitos e estereótipos em relação ao continente.
60
O ensino da História da África nas escolas ainda é escasso e conta com poucas
ferramentas que possibilitem ao professor ampliar o conhecimento da cultura e da diversidade
do continente africano. Diante da realidade presenciada no período das observações do
Estágio Supervisionado I, II e III e IV, realizado na Escola de Ensino Fundamental e Médio
Profº Acy de Jesus Neves de Barros Pereira, localizada na Rua Américo Castanheira, nº 175,
bairro Amapá, na cidade de Marabá/PA. Partindo do primeiro contato que obtive em sala de
aula na regência do Estágio Supervisionado III, mediante aplicação do questionário e seus
resultados sobre o ensino da história da África na turma do 8º ano “A” (ver anexo II), na
escola pesquisa, percebeu-se a necessidade de elaborar uma proposta para construção de uma
abordagem de ensino para a história da África. Segue fotografia da frente da escola.
A escola como objeto de estudo é uma instituição que se dedica ao processo de ensino
e aprendizagem entre alunos e docentes. Um espaço de saberes com trocas de experiências,
lugar de reflexão, ancorado na esperança e buscando mudanças. A escola tem uma função
específica, que é ensinar. E hoje, ensinar é contribuir com o desenvolvimento das capacidades
intelectuais e reflexivas dos estudantes, em face da capacidade do mundo moderno, em face
das influências fortes das mídias e em face de todo um conjunto de problemas sociais que
61
estão afetando a juventude. A escola precisa manter sua característica de ensinar, pois a escola
hoje não detém o monopólio do saber.
A experiência docente/discente estagiário traz consigo inúmeros desafios e
possibilidades, com problemáticas que são encontradas em relação ao papel e lugar do
Estágio. Procuramos respostas em teóricos como Pimenta e Lima (2004), que compreendem o
Estágio Supervisionado como “campo de conhecimento que se produz na interação entre
cursos de formação e o campo social no qual se desenvolvem as práticas educativas”.
desconstruir as imagens socialmente construídas que muitos alunos carregam, de que a África
é um continente marcado, sobretudo, pela pobreza, pela fome, por doenças e por conflitos
políticos.
É nesse sentido que o ensino de História da África vem somar-se a valorização da
diversidade étnica e cultural de nosso país trazendo para o estudo e para o debate o papel das
comunidades negras nos processos históricos. Aliado ao estudo da África insere-se em grande
medida o papel da instituição escolar no que se refere ao combate do preconceito e das
diferentes formas de discriminação, já que participa na construção de atitudes de cidadania e
de valores fundamentais para a vida em sociedade.
Estão no cerne desta proposta de ensino levar a sala de aula diferentes temas acerca da
História da África privilegiando os aspectos que, conforme as leituras feitas para o
planejamento e também atendendo a especificidade da história escolar, julgamos relevantes
para o estudo da temática como: relações de comércio, família, mitos, crenças, religiosidades,
mulheres e organização social, escravidão na África, África contemporânea, desenvolvimento
econômico e relações internacionais. Visto que, o ponto central dessa proposta é construir
caminhos com outros professores no fortalecimento dessa construção.
Diversas temáticas veem sendo discutidas pelos estudiosos do ensino de História,
analisando inclusive os Parâmetros Curriculares Nacionais. Destaco aqui o trabalho de Hebe
Maria Mattos, que traz um debate acerca do combate à discriminação racial e do ensino de
História em seu artigo “O ensino de História e a luta contra a discriminação racial no Brasil”.
Nele, a autora traz para discussão um assunto pouco abordado, que é justamente o ensino de
História da África. A autora chama a atenção para a necessidade de perceber a África e os
africanos, como também a identidade negra no Brasil, dentro de um contexto mais
abrangente, que é o mundo atlântico.
Muitos trabalhos sobre a história da África temática estão sendo produzidos, no
entanto o efetivo uso destas produções para o ensino de História da África ainda é bastante
pequeno. Outro importante conteúdo que buscamos enfatizar são as fontes históricas
existentes para o estudo da História da África. Portanto, as fontes, sua constituição, seus usos
como ferramenta de ensino de História da África figuram como ponto importante da proposta
de ensino.
Somado a isso, a valorização da tradição oral dos povos africanos, em nosso
entendimento, proporciona uma desconstrução da ideia de que somente as fontes escritas
trazem ou podem suscitar informações verdadeiras sobre a história de um povo ou de uma
cultura. Assim, está em nosso horizonte que os educandos reconheçam as tradições orais da
63
África como elemento que permeia as diferentes culturas existente se que possibilita
exatamente perceber a grande diversidade cultural existente no continente ainda hoje.
A África não é uma parte histórica do mundo. Não têm movimentos progressos a
mostrar, movimentos históricos próprios dela. Quer isto dizer que sua parte
setentrional pertence ao mundo europeu ou asiático. Aquilo que entendemos
precisamente pela África é o espírito a-histórico, o espírito não desenvolvido, ainda
envolto em condições de natural e que deve ser aqui apresentado apenas como no
limiar da história do mundo (HEGEL, 1995, p. 174).
Embora essas ideias não tenham exercido grande influência nos estudiosos do século
XIX, continuaram repercutindo nas concepções elaboradas posteriormente, que só foram
rompidas com o avanço dos estudos das sociedades africanas, que contaram com a
contribuição de outras disciplinas como a geografia, as ciências políticas, a sociologia e mais
marcadamente da antropologia, disciplina esta que contribuiu com “as primeiras análises que
romperam com o universo de pensamento eurocêntrico e com os enunciados colonialistas”
(SERRANO & WALDMAN, 2008, p. 16). Mas essa é outra discussão que extrapola os
limites desse texto, aqui cabendo apenas ressaltar as contribuições que alguns autores
propiciaram para a construção da abordagem de ensino utilizada nos materiais didáticos.
Uma obra importante é a do historiador e político Joseph Ki-Zerbo (1972), “História
da África Negra”, que enfatiza a importância dos estudos acerca da África para todos, em
especial para os africanos, pois se trata da busca da identidade através da reunião de
elementos da memória coletiva. Neste sentido, Ki-Zerbo ressalta o valor da tradição oral e das
inúmeras mudanças sucedidas no continente ao longo de sua história, o que seguramente
delega aos africanos uma extraordinária contribuição para a história universal. Com esta
leitura foi possível elencar fatores que favoreceram a desmistificação da África como um
continente atrasado e sem história.
Alberto da Costa e Silva e Marina de Melo e Souza, ambos influenciaram
categoricamente a estrutura que adotei para o texto didático. Em seus relativos trabalhos,
esses autores, além de seguirem uma linguagem muito compreensível e agradável, também
usam exemplos que favorecem a compreensão de elementos das culturas africanas que à
primeira vista apresentam certa complexidade. Exemplificando algumas obras de Alberto da
Costa e Silva que fizeram parte das leituras preparatórias, destacamos “A enxada e a lança: a
África antes dos portugueses” de 2006, que apresenta uma análise da África, dos seus
primórdios até o século XVI, descrevendo como viviam os diversos povos e privilegiando os
variados aspectos culturais. No livro “A África explicada aos meus filhos”, de 2008, Costa e
65
A proposta de ensino é elaborar texto didático, selecionar fontes históricas e, por fim,
apresentar o jogo de tabuleiro – Mancala13. Para que possamos estudar a diversidade cultural
africana, para podermos proporcionar aos professores de história, uma atividade leve e lúdica
em sala de aula, para turma do 7º ano (ver plano de aula – anexo II). Com o objetivo não
apenas de abordar conteúdos, mas de discutir e enfatizar a construção do conhecimento
histórico. De forma semelhante, as atividades que visam perceber não apenas como os alunos
estão compreendendo os conteúdos abordados, mas principalmente como estão dialogando
com a proposta de desconstrução da visão da África como um lugar atrasado e sem cultura.
Para a aproximação dos educandos com as características das culturas africanas,
apresentaremos sucintamente os temas trabalhados, destacando apenas um texto didático que
produzimos para abordar alguns temas relacionados a história da África.
No texto “Para que estudar a História da África? ”, (ver anexo III), enfatizamos a
importância desse estudo e discutimos quais são as fontes históricas que viabilizam a
construção da história das sociedades africanas, destacando as fontes orais. Complementando
o texto, introduziremos a atividade “Trabalhando com documento histórico”, onde será
13
Mancala – Jogo de origem africana, tem seus registros no fragmento de um tabuleiro de cerâmica e diversos
cortes de rochas encontrados na Etiópia [...]. (GUERRA, 2009, p.1).
66
“(...) Sou griot. Meu nome é Djeli Mamadu Kuyatê, filho de Bintu Kuyatê e de
Djeli Kedian Kuyatê, Mestre na arte de falar. Desde tempos imemoriais estão os
Kuyatês a serviço dos príncipes Keita do Mandinga (o mesmo que Império do Máli);
somos os sacos de palavras, somos o repositório que conserva segredos
multiseculares. A Arte da palavra não apresenta qualquer segredo para nós; sem nós,
os nomes dos reis cairiam no esquecimento; nós somos a memória dos homens;
através da palavra, damos vida aos fatos e ás façanhas dos reis perante as novas
gerações.
Recebi minha ciência de meu pai Djeli Kedian, que a recebeu igualmente de
seu pai; a História não tem mistério algum para nós; ensinamos ao vulgo tudo que
aceitamos transmitir-lhes; somos nós que detemos as chaves das doze portas do
Mandinga.
(...) Os griots conhecem a história dos reis e dos reinos, motivo por que são os
melhores conselheiros dos reis. Todo grande rei quer ter um chantre para perpetuar
sua memória, visto que é o griot quem salva a glória dos reis, pois os homens têm a
memória muito curta.
Os reinos têm seu destino traçado, tal como os homens; só o conhecem os adivinhos,
que investigam o futuro, cuja ciência dominam. Nós outros, griots reais, somos os
depositários da ciência do passado; mas quem conhece a história de um país poderá
ler seu futuro. Há povos que se servem da linguagem escrita para fixar o passado;
mas
acontece que essa invenção matou a memória dos homens: eles já não sentem mais o
passado, visto que a língua escrita não pode ter o calor da voz humana. Todo mundo
acredita conhecer, ao passo que o saber deve ser algo secreto (os griots tradicionais
são muito criteriosos ao transmitir seu saber por considerá-lo um segredo). Os
profetas não escreveram, e sua palavra nem por isso é menos viva. Pobre
conhecimento, esse que se encontra imutavelmente fixado nos livros mudos...
Eu, Djeli Mamadu Kuyatê, sou o elo final de uma longa tradição: desde muitas
gerações nós transmitimos de pai para filho as histórias dos reis. A palavra me foi
transmitida sem alteração e eu passarei sem qualquer mudança, visto que a recebi
isenta de qualquer mentira. Ouvi, pois, a história de Sundjata, o Na’Kamma, o
homem que tinha uma missão a cumprir (...)”. (NIANE, 1982. p. 11 e 66).
Esse trabalho de análise de fontes possibilita o contato dos educandos com a fonte
oral. Durante muito tempo, as sociedades africanas foram vistas pelos europeus como
sociedades sem história. No entanto, tal interpretação e rotulação do continente condiz com o
colonialismo, mas não com a África e seus povos. Sabemos que as poucas referências do
passado referente a história do continente eram dadas a partir dos marcos da história Europeia.
Todavia, desde o processo de independência dos países africanos, nos primórdios da década
67
de 1950, historiadores africanos vêm buscando restabelecer o passado da África a partir das
perspectivas das sociedades que ali vivem.
De acordo com Hampaté Ba (2010), na região ao Sul do deserto do Saara – África
Sulsaariana, o saber era tradicionalmente transmitido pela palavra falada, ou seja, transmitido
oralmente. Razão essa que, basicamente até a década de 1950, grande parte dos historiadores
desprezou a história desta parte do continente que, não dispunha de fontes documentais
escritas. Contudo precisamos compreender que a habilidade não está atrelada a ausência da
escrita, porém, se relaciona ao valor atribuído à palavra nas sociedades da África Ocidental,
por ser depositária da sabedoria dos ancestrais.
Segundo Hampaté Ba (2010), é através da fala e da memória que a história da África é
contada e transmitida entre os povos africanos. Sendo assim, a tradição oral apresenta dois
tipos de portadores ou “guardiões da palavra falada”, que são os tradicionalistas e os griots.
Os tradicionalistas são conhecedores de um oficio, que tem como função guardar a palavra,
possuem o conhecimento da palavra falada, pois tem uma ligação com o divino e suas
revelações são sempre verdadeiras, sem a verdade perderiam o seu dom de colocar a ordem e
manter os povos unidos e em harmonia. Estes tradicionalistas possuem um grande
conhecimento da tradição, são portadores do conhecimento sobre a criação e de todas as
coisas.
14
Aprenda a jogar Mancala disponível em: http://www.youtube.com/whatch? Acessado em 06/04/2021 às 20h.
15
Tabuleiros de jogos desse tipo foram encontrados desenhados nas pedras dos telhados de um templo egípcio
construído há 3.300 anos e em muitas outras construções antigas.
70
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise de livros didáticos de história utilizados, nos permitiu observar que, embora
haja permanências de percepção negativas sobre a História da África, congelada no tempo e
no espaço, alguns livros avançaram no sentido de procurar abordar a diversidade e aspectos da
questão africana no presente. Ressalta-se, entretanto, que mesmo que a história da África e
dos povos africanos estejam representados nos livros, o espaço reservado para o estudo da
temática africana ainda é ínfimo. Existem espaços maiores voltados para a Europa. O que faz
alusão a importância atribuída à história e padrões culturais europeus em detrimento daquele
de outros povos.
A pesquisa foi bastante desafiadora, mas acredita-se que ela tenha conseguido alcançar
o seu objetivo inicial. Ela tornou possível perceber que gradualmente mudanças importantes
vêm acontecendo no que diz respeito ao ensino da história da África. Permanece, entretanto, a
certeza que ainda há muito o que ser feito. Muitos são os desafios que precisam ser vencidos
para que haja um ensino da história da África que retire a invisibilidade a que ela foi relegada.
Portanto, é de suma importância desvincular a história da África da história
eurocêntrica, ou seja, devemos avançar nossa compreensão sobre o continente africano para
além do contexto do mercantilismo e do tráfico negreiro ou, séculos depois, do imperialismo
colonial. Frente às problemáticas levantadas nesse trabalho, torna-se imprescindível saber
quais áfricas estão sendo abordadas no livro didático e comtempladas no processo de ensino-
aprendizagem. Por essa razão, o desenvolvimento de uma nova proposta curricular pode se
apresentar como um importante instrumento que possibilite a compreensão da História da
África em toda as suas dimensões.
72
REFERÊNCIAS
BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. 9.ed. São Paulo: Contexto, 2004.
BRASIL. Lei 10.639, de 9 jan. 2003. Altera a Lei 9.394, de 20 dez. 1996, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a
obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.
Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 9 jan. 2003. Disponível em:
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.639.html; Acesso em: 20 out. 2010. p.1.
CHOPPIN, Alain. Pasado y presente de los manuals escolares. Traduzido por Miriam Soto
Lucas. In Errio, Julio Ruiz (Ed.). La cultura escolar de Europa. Tendências históricas
emergentes. Madrid: Editorial Biblioteca Nueva: 2000.
HAMPATÉ BÂ, Amadou. “A tradição viva”. História Geral da África. Vol. 1. Brasília:
MEC/UNESCO, 2010, pp. 167-210.
LAJOLO, Marisa. Livro didático: um (quase) manual didático. In: Em aberto. Brasília, DF,
v. 00, n. 69, 1996. pp. 40-49.
LEILA, Leite Hernandes. A África na sala de aula – visita à história contemporânea. SP:
Selo Negro Ed., 2005 (1ª. Ed.).
73
LOPES, Carlos. A Pirâmide Invertida – historiografia africana feita por africanos. IN: Actas
do Colóquio Construção e Ensino da História da África. Lisboa: Linopazas, 1995. p. 21-
29.
NIANE, Djibril. Sundjata ou a epopéia mandinga. São Paulo: Ática, 1982, p. 11 e 66.
SILVA FILHO, José Barbosa da. História da África e História do Negro no Brasil. 2007.
(Curso de curta duração ministrado/Extensão).
SILVA, Alberto da Costa e. A África ensinada para meus filhos. Rio de Janeiro: Agir,
2008.
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil Africano. São Paulo: Ática, 2007.
Pesquisa – Aluno
4. Referente aos conteúdos estudados na disciplina de História, qual deles você mais
gosta?
➢ 22 alunos - História Europeia; Independência do Brasil; Iluminismo.
➢ 07 alunos - História da Africana.
16 GOSTA DA DISCIPLINA
11
NÃO GOSTA DA DISCIPLINA
PARTE INFORMATIVA
1.1 Disciplina: História
1.2 Tema: Para que estudar História da África?
1.3 Docente: Jaclene Alves Ribeiro
1.4 Duração: 150 minutos.
1.5 Público alvo: 7º ano do Ensino Fundamental
OBJETIVOS
Geral:
- Conhecer e refletir sobre as diferentes fontes acerca da história da África antes do século
XV. Como se organizam as atividades africanas e que atividades econômicas desenvolviam.
Específicos:
1. - Apresentar as diferentes fontes existentes para se estudar História da África;
- Utilizar um documento histórico como fonte de informação para o estudo da África;
2. - Explicar a importância da oralidade como característica da cultura dos povos da África;
3. - Perceber a importância da tradição oral e dos gritos;
4. - Explicar a atividade jogo de tabuleiro – Mankala, para ensinar a diversidade cultural
africana.
CONTEÚDOS
- A importância de se estudar a história da África e suas fontes históricas;
- Aspectos da organização social dos povos africanos e as principais atividades econômicas
desenvolvidas no continente antes do séc. XV;
- Origem e regras do jogo africano Mankala;
PROCEDIMENTOS DIDÁTICOS
- Técnicas: Aula expositiva-dialogada;
- Recursos: quadro branco pincel e data show (se houver);
- Texto impresso, material para registro, caixas vazias de ovos, tinta guache, sementes ou
botões, tesouras, garrafas pets, copos descartáveis, fita adesiva e demais matérias para
decorar o tabuleiro.
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- Ações: Os alunos deverão expor seu conhecimento prévio sobre a história da África.
SILVA, Alberto da Costa e. A Enxada e a Lança – a África antes dos portugueses. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2006.
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil Africano. São Paulo: Ática, 2007.
SILVA, Alberto da Costa e. A África ensinada para meus filhos. Rio de Janeiro: Agir,
2008.
Quando pensamos no continente africano e sua trajetória histórica, muitas vezes nos
deparamos com algumas imagens construídas com base naquilo que as mídias e redes sociais
em geral nos mostram fome, pobreza, atraso econômico, animais selvagens, entre outras
coisas. Atualmente a África tem tido destaque na TV e jornais por conta da Copa do Mundo
de futebol. Mas será que a imagem que temos da África ou mesmo aquelas imagens e
informações que recebemos por meio da mídia dão conta de nos informar sobre a África, sua
cultura, sua diversidade e principalmente sua história?
Torna-se importante saber que o continente africano é imenso, com inúmeros grupos
étnicos e sociedades. E, ao contrário do que se possa pensar, a África possui uma longa e
complexa história, com características próprias. E são justamente algumas dessas
características, próprias do continente africano, que iremos conhecer. A História da África
durante muito tempo foi escrita pelos seus colonizadores, europeus que chegaram ao
continente pelo oceano Atlântico a partir do século XV. Esses homens chegaram ao
continente e viram sociedades com organização, costumes, línguas, crenças, relações de
parentesco muito diferentes das suas, e passaram a interpretar essas características a partir da
comparação com a cultura europeia.
Desta maneira a imagem que difundiram do continente africano foi a de um
continente
primitivo, mergulhado no atraso. Assim, os europeus retrataram a África desconsiderando as
suas diferenças culturais, materiais e espirituais. O que foi relatado pelos europeus era
baseado na sua visão eurocêntrica – a Europa era o centro do mundo – e etnocêntrica – os
brancos eram
considerados superiores.
Por isso, a História da África, não pode ser compreendida tomando-se como referência
a organização social, econômica, política e cultural dos povos europeus. Geralmente devido a
ocupação e colonização praticada pelos europeus após o século XV, fica no esquecimento que
existe uma África anterior, que se convencionou chamar de África tradicional, rica em
diversidade, independente e com suas particularidades sociais, econômicas e culturais. Assim,
a degeneração da imagem das sociedades africanas, de seus saberes, de seus produtos foi por
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muito tempo resultado desta visão eurocêntrica e etnocêntrica, que difundiu a ideia de que o
continente africano é quente e cheio de tribos perdidas.
É necessário, abandonar antes da chegada dos europeus pelo Atlântico, muitas das
sociedades africanas possuíam uma divisão de obrigações e de direitos, técnicas próprias
baseadas em sua economia, fosse ela de subsistência ou de comércio. Algumas das sociedades
tradicionais baseavam-se na agricultura, outras na caça e na pesca e em muitas delas essas
atividades aconteciam simultaneamente. Desta maneira não podemos dizer que existiam
sociedades ou grupos africanos que não tivessem uma organização, pois essas sociedades
eram organizadas em aldeias ou grandes e prósperos reinos.
Para se escrever a História do continente africano, ou ainda, para compreendermos as
culturas e as sociedades africanas é preciso antes de tudo romper com a imagem que existe até
hoje da África, como se até a sua “descoberta” pelos europeus houvesse ali um continente
perdido e sem civilização. Muitos dos aspectos culturais dos diferentes povos africanos foram
sofrendo modificações ao longo dos séculos. Mas existem certos traços que são comuns a
todas as culturas de modo que podemos falar em uma cultura africana, mesmo que os modos
de vida
possam ser diferentes de uma região ou de um povo para outro.
Bibliografia:
SILVA, Alberto da Costa e. A Enxada e a Lança – a África antes dos portugueses. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2006.
SILVA, Alberto da Costa e. A África ensinada para meus filhos. Rio de Janeiro: Agir,
2008.
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil Africano. São Paulo: Ática, 2007.
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Fonte: https//www.google.com/search?q=imagem+dojogo+mancala&cliente=firefox