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Números Perfeitos e Números Amigos

O matemático Carl Pomerance1 defende que os números perfeitos, números


amigos e outros conceitos do mesmo tipo foram fundamentais no desenvolvimento da
aritmética, tendo sido decisivos na visão moderna da Teoria de Números [1].

Sejam o conjunto dos números naturais e x, n  . Dizemos que um número


x divide n, quando existe um número q  tal que n = x q . O conjunto dos divisores

próprios de um número natural é definido por: D(n) =  x  : x divide n . Por

exemplo, D(6) = 1, 2,3, 6 , D(14) = 1, 2, 7,14 , D (17) = 1,17 ,

D(28) = 1, 2, 4, 7,14, 28 .

Os divisores próprios de um número natural n são todos os divisores inteiros


positivos de n, exceto o próprio n.

Um número perfeito é um número natural que é igual à soma dos seus divisores
próprios (exceto ele próprio). Por exemplo, 6 é um número perfeito, pois 6 = 1 + 2 + 3 ;
28 é um número perfeito, pois 28 = 1 + 2 + 4 + 7 + 14 ; 14 não é número perfeito, pois
1 + 2 + 7 = 10  14 .

Dois números são amigos se cada um deles é igual à soma dos divisores próprios
do outro. A descoberta dos números amigos é atribuída à Pitágoras [2]. Por exemplo,
284 e 220 são amigos, pois:

• D(220) = 1, 2, 4, 5, 10, 11, 20, 22, 44, 55 , 110 e

1 + 2 + 4 + 5 + 10 + 11 + 20 + 22 + 44 + 55 + 110 = 284 ,
• D(284) = 1, 2, 4, 71,142 e 1 + 2 + 4 + 71 + 142 = 220 .

Os pitagóricos, cuja escola surgiu no século V a.C., em Crotona, acreditavam


que os números estavam na origem de todas as coisas. Talvez por isso considerassem

1
Carl Bernard Pomerance é um matemático nascido em Joplin, Missouri, EUA. Obteve o doutorado na
Universidade de Harvard em 1972, na qual prova que qualquer número perfeito ímpar tem ao menos 7
fatores primos distintos.
interessante o fato dos números 6 e 28 coincidirem com a soma dos seus divisores
próprios, eles eram considerados perfeitos [1].

Vejamos quais eram os números perfeitos conhecidos até ao fim do século XVIII:

Tabela 1. Os oito primeiros números perfeitos


1º número perfeito 6
2º número perfeito 28
3º número perfeito 496
4º número perfeito 8.128
5º número perfeito 33.550.336
6º número perfeito 8.589.869.046
7º número perfeito 137.438.691.328
8º número perfeito 2.305.843.008.139.952.128

Após os pitagóricos, o próximo matemático a fazer parte da história dos números


perfeitos foi Euclides (~300 a. C.), cujo seu IX livro dos Elementos contém, além da
definição de números perfeitos, uma proposição muito particular a respeito desses
números:
“Se tantos números quantos se queira começando a partir da unidade forem dispostos
continuamente numa proporção duplicada até que a soma de todos resulte num número
primo, e se a soma multiplicada pelo último origina algum número, então o produto
será um número perfeito”.

O enunciado acima quer dizer, na linguagem matemática atual, que se um


número da forma 2n − 1 é primo, então o número 2n −1 (2n − 1) é um número perfeito.
Isso fez com que fosse mais fácil encontrar números perfeitos e foi, de fato, a primeira
fórmula para se encontrar tais números. Um exemplo de um número perfeito encontrado
usando a fórmula é colocando o número 5 no lugar de n, ou seja,
25−1 (25 − 1) = 24 (25 − 1) = 16 (32 − 1) = 16.31 = 496 .

A perfeição dos números foi constatada posteriormente quando foi observado


que a Lua demora 28 dias para dar uma volta completa sobre a Terra; e também quando
Santo Agostinho (354 – 430) em seu livro: A Cidade de Deus, disse:
“O número é perfeito em si mesmo e não porque Deus criou todas as coisas em seis
dias. O inverso é “mais” verdadeiro, Deus criou todas as coisas em seis dias porque
este número é perfeito. E continuaria perfeito mesmo que o trabalho de seis dias não
existisse” [3].

Os números perfeitos e os mistérios que reservam

Poucas pessoas imaginam, mas o número 6 ocupa um lugar que não é para
qualquer algarismo. Ele faz parte do seleto grupo de números perfeitos, que se destacam
por serem iguais à soma de seus divisores: 6 pode ser dividido por 1, 2 e 3 que, quando
somados, têm como resultado 6. A descoberta não é nova. Para ser mais preciso, datada
de 2,3 mil anos atrás e faz parte de um dos ramos mais antigos e encantadores da
matemática, a teoria dos números.

O matemático grego Euclides foi o primeiro a se referir aos números perfeitos,


em sua obra “Os Elementos”. Na publicação, ele conta a descoberta de quatro números
perfeitos – 6, 28, 496 e 8.128 – e revela uma maneira eficaz, mas bastante demorada, de
se encontrar outros. Para se ter ideia, levaria mais de 1.750 anos até outro número
perfeito ser identificado.

Antes disso, Nicômaco de Gerasa (60 – 120), outro matemático grego, deu ares
místicos à estrutura matemática perfeita. Na publicação “Introdução à Aritmética”,
Nicômaco estipulava que se a soma dos divisores de um determinado número fosse
maior que o mesmo, ele deveria ser classificado como “abundante”. Caso contrário, se
fosse um número menor, ele seria “deficiente”. Por algum tempo, suas observações
deixaram marcas no campo de pesquisa e elevaram os números perfeitos a algo divino.

Com o passar dos anos, matemáticos como Pietro Antonio Cataldi (1548-1626),
Leonhard Euler (1707- 1783) e Peter Barlow (1776-1862), também avançaram em
descobertas de outras combinações de algarismos até chegarmos ao total de 51 números
perfeitos conhecidos atualmente. Uma das curiosidades desse grupo é que todos eles são
pares, mas ainda não é possível garantir que não existem números perfeitos ímpares. Por
enquanto, a única coisa que sabemos é que, se existirem, devem ser maiores que 10³⁰⁰,
já que a conjectura foi verificada computacionalmente até esse valor. Contudo existe o
trabalho do matemático Carl Bernard Pomerance, que provou que qualquer número
perfeito ímpar tem ao menos 7 fatores primos distintos.

Inúmeras mentes no mundo da matemática seguem na tarefa desafiadora de fazer


novas descobertas no campo dos números perfeitos. Para David E. Joyce, professor de
Matemática e Computação da Universidade Clark, EUA, “os critérios tradicionais de
importância na teoria dos números são estéticos e históricos”.

Ainda que não exista um consenso acadêmico sobre o campo, uma das coisas
mais fascinantes na Matemática é que ela revela maravilhas que são compreensíveis
com o passar do tempo. Quem sabe os encantos que os números perfeitos poderão
revelar no futuro? Só o tempo e os avanços matemáticos poderão responder [4]!

Antonio Luís Venezuela

REFERÊNCIAS

[1] Perguntas simples, respostas surpreendentes. Problemas antigos com números


perfeitos. Disponível em: https://gazeta.spm.pt/getArtigo?gid=531. Acessado em:
08/outubro/2022.

[2] IMÁTICA: Números Amigos. Disponível em:


https://www.matematica.br/historia/namigos.html. Acessado em: 08/outubro/2022.

[3] Universidade Federal do Ceará - Seara da Ciência. Números Perfeitos. Disponível


em: https://seara.ufc.br/pt/secoes-especiais-de-ciencia-e-tecnologia/secoes-especiais-
matematica/numeros-perfeitos/. Acessado em: 08/outubro/2022.

[4] Impa-Notícias. Os números perfeitos e os mistérios que reservam. Disponível em:


https://impa.br/noticias/os-numeros-perfeitos-e-os-misterios-que-reservam/. Acessado
em: 08/outubro/2022.

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