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O PROCESSO DE ENSINO NO CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADO NA

POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS ATRELADO A REALIDADE DA PRESTAÇÃO


DOS SERVIÇOS À COMUNIDADE
Roberto Santos Junior1
José Humberto Silva Filho2
Sidcley da Silva Santos3
Cecilio Argolo Junior4

1 INTRODUÇÃO

A Polícia Militar tem como função constitucional a atuação no policiamento


ostensivo e preventivo, baseado no art. 144 da Constituição da República de 1988,
estando seu atendimento em situações das mais simples às mais complexas, com o
único objetivo de manter a ordem pública, razão pela qual é importante uma
formação adequada.
A formação profissional e a capacitação contínua são dimensões
fundamentais do policiamento ostensivo, atividade constitucional da Polícia Militar. O
profissional de segurança pública precisa estar habilitado para desenvolver com
excelência as suas atribuições, levando em consideração que o mesmo lida com
problemas sociais de alta complexidade, precisando estar preparado para manejar
de maneira adequada os meios técnicos de maior eficácia, seja em nível operacional
e tático ou mesmo estratégico.
Tal Corporação tem sofrido transformações ao longo do tempo para
acompanhar a evolução da sociedade e fazer face aos desafios de proporcionar
segurança diante de um quadro constante de mudanças de hábitos, costumes de
leis que criam, extinguem, dilatam ou restringem seus direitos e deveres.

1
Curso Superior de Polícia, turma 2019. Especialista em Direitos Humanos. Bacharel em Segurança
Pública. Oficial Superior da Polícia Militar de Alagoas ocupando o Posto de Tenente-Coronel.
Professor da Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Mello, em Maceió, Alagoas.
E-mail: cap.roberto12@hotmail.com.
2
Mestre em Sociologia. Bacharel em Ciências Econômicas. Pesquisador. Professor da Academia de
Polícia Militar Senador Arnon de Mello, em Maceió, Alagoas.
3
Doutorando em Sociologia; Mestre em Sociologia; Graduação em História. Bacharel em Segurança
Pública. Oficial da Polícia Militar de Alagoas. Professor da Academia de Polícia Militar Senador Arnon
de Mello, em Maceió, Alagoas.
4
Doutorando em Psicologia Clínica. Mestre em Direitos Fundamentais. Mestre em Pesquisa em
Saúde. Bacharel em Psicologia e Psicólogo Clínico. Bacharel em Direito. Psicólogo-Pesquisador.
Professor da Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Mello, em Maceió, Alagoas.
Diante desse panorama, verifica-se que a construção do perfil de policial
militar necessário para o atendimento das novas exigências sociais por segurança
pública passa, obrigatoriamente, pelo processo de formação profissional.
A PMAL em sua estrutura de ensino, possui o Centro de Formação de
Praças, cujo objetivo é a formação e aperfeiçoamento dos Praças da Corporação
que, tomando por base essa demanda, que vêm através, do Curso de Formação de
Praças, proporcionar à PMAL sólida formação profissional, em consonância com o
ordenamento jurídico vigente.
Para tanto, temos como principal objetivo buscar compreender se o processo
de formação inicial dos soldados da Polícia Militar do Estado de Alagoas está
“equalizado” com a realidade enfrentada pelos agentes de segurança no momento
da prestação dos serviços à comunidade. Ver-se, desta forma, a grande importância
do direcionamento técnico no processo de desenvolvimento do perfil dos militares,
que serão entregues a sociedade.
A presente pesquisa valeu-se do relatório desenvolvido pelo Grupo de
Estudos Estratégico da Policia Militar de Alagoas denominado “Análise das
ocorrências atendidas pela polícia militar no primeiro semestre de 2018: um estudo
exploratório” onde foi efetuado o cruzamento dos dados das principais ocorrências
atendidas e as matérias lecionadas no curso de formação dando-se ênfase ao nível
operacional de atuação do agente de segurança pública, verificando se os
conhecimentos adquiridos estão condizentes com as realidades enfrentadas no seu
cotidiano, momento em que iremos fazer uma relação com as principais ocorrências
atendidas pelo Centro Integrado de Operações em Segurança Pública (CIOSP),
através dos chamados advindos pelo telefone 190.
O presente estudo foi desenvolvido a partir de uma pesquisa bibliográfica,
construído através de uma literatura atualizada além de leis, decretos, normas e
regulamentos necessários para a compreensão do objeto apresentado. O método
utilizado foi o indutivo, haja vista tal raciocínio ter como objetivo explicar o conteúdo
das premissas e, ainda, pela caracterização das conclusões que devem,
necessariamente, ser verdadeiras, partindo de uma lógica formal. Houve uma
abordagem mista, quanti-qualitativa, em decorrência de considerar o uso de
métodos e técnicas estatísticas, e quanto aos fins, explicativa, pois o principal
objetivo foi a construção de insights para a tomada de decisão estratégica no âmbito
da PMAL.
Nesse cenário, a complexidade do fenômeno da criminalidade violenta -
problema social que a atividade policial se debruça de maneira mais direta e
imediata - exige do operador e do gestor a capacidade de compreender a dinâmica
criminal e as inúmeras possibilidades de intervenção e controle que possam ser
operacionalizadas nos marcos do Estado de Direito, o que não é uma tarefa trivial
como bem salientou a pesquisadora Jacqueline Muniz, em um artigo publicado no
ano de 2001 na Security and Defense Studies Review, ao afirmar que ser a
representação mais visível do Estado no cotidiano das pessoas não é uma posição
confortável e que em cada ocorrência atendida, os requisitos da legalidade e da
legitimidade não são uma simples atribuição que pode ser equacionada tão somente
com as técnicas tradicionais de adestramento militar, sendo indispensável o
desenvolvimento de capacidades individuais de tomada de decisão em situações
voláteis e com um elevado grau de aleatoriedade.
Dessa forma, um dos mecanismos mais eficientes para o aperfeiçoamento
profissional, frente às demandas, são cursos de pequena e média duração. A Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e o Decreto nº 5.154 de 23 de julho de 2004,
que enfatiza as diretrizes e bases da educação nacional, estabelecem parâmetros
sobre os cursos de formação profissional continuada ou qualificação profissional,
bem como a Matriz Curricular Nacional que é um referencial teórico-metodológico
para as ações formativas dos profissionais da área de segurança pública. Nessa
perspectiva, os cursos precisam estar alinhados com uma política de Estado que
coopte as necessidades imediatas dos gestores e operadores da segurança pública.
A criação e a oferta de um curso de capacitação profissional precisam
necessariamente corrigir falhas que comprometam a eficácia da ação policial. Para
isso, é de vital importância a elaboração de diagnósticos da presente situação do
ensino ofertado pela Corporação que inclua desde as práticas de atuação até os
saberes formais e informais produzidos, as propostas de reformulação já tentadas,
as expectativas dos profissionais segundo suas graduações, as estruturas atuais,
modelos pedagógicos vigentes, bem como as disciplinas e conteúdos ofertados.
Sendo assim, formar-se-ia um conjunto de evidências que orientaria a tomada de
decisão frente às formatações das ementas e currículos, métodos e técnicas de
ensino e avaliação.
Por fim, as instituições precisam estar sempre melhorando o processo de
formação de seus agentes, pois, para o enfrentamento das ocorrências, é preciso
que os militares ajam com clareza dentro do melhor procedimento a ser tomado.

2 DESIGNÍOS DA FORMAÇÃO POLICIAL

O processo de formação deve disponibilizar ao policial os conhecimentos


necessários para o desempenho de sua atividade cotidiana. Contudo, a natureza do
trabalho policial é complexa. Em uma sociedade democrática, o policial deve ser
proativo e buscar atuar na resolução de problemas. Sendo assim, as possibilidades
de emprego do policial se ampliam, emergindo nesse contexto sua complexidade.
Dessa forma, o processo de formação deve abranger conhecimentos de ordem
jurídica, social, psicológica, e de expertises inerentes à atividade policial (BASÍLIO,
2008).
Para Basílio (2008), compreender o que o policial realiza diariamente é o
primeiro passo para a análise da eficiência de um programa de formação policial. O
treinamento deve estar intimamente relacionado com o serviço a ser desempenhado
na sociedade. Diante dessa realidade, procurou-se contextualizar o trabalho policial
em uma sociedade democrática. A autonomia da ação policial, no contexto social,
está intrinsecamente relacionada com a instrumentalização conceitual que o
operador de segurança pública possui.
Atualmente, a Polícia Militar do Estado de Alagoas possui uma lei específica
que trata sobre o ensino na Corporação, e a Lei nº 6.568, de 6 de janeiro de 2005, a
saber: Institui na polícia militar e no corpo de bombeiros militar do Estado de
Alagoas o sistema de ensino militar e dá outras providências. Podemos também
observar que essa lei, em seu art. 1º, Parágrafo Único, determina que:

[...] O Sistema de Ensino ora instituído tem por finalidade formar,


aperfeiçoar, especializar e treinar o efetivo das Corporações Militares, bem
como oferecer ensino básico aos dependentes de seus integrantes, com
abrangência a outras crianças e adolescentes do Estado de Alagoas.
Para tanto, dentro desse sistema de ensino, evidencia-se a oportuna
presença do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP), cujo
regulamento foi aprovado através do Decreto nº 1.818, de 2 de abril de 2004,
descrevendo em seu art. 1º, o seguinte:

O Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP) é o


estabelecimento de ensino da Polícia Militar do Estado de Alagoas que tem
por missão formar, aperfeiçoar, habilitar e especializar graduados e
soldados da Corporação através de cursos e estágios.

E um ponto muito pertinente em nossa pesquisa é o que cita o Art. 2º do


dispositivo acima, relatando que o ensino no CFAP objetiva desenvolver e aprimorar
no policial militar atributos morais e profissionais indispensáveis ao perfeito
desempenho das atividades da Corporação, ficando clara a infinita importância do
processo de formação, frente ao resultado que será visto durante o serviço policial
militar.
Uma das frentes de combate dos problemas relacionados à segurança
pública diz respeito à formação policial. Por tais razões, “[...] é comum, quando se
questiona o desempenho das polícias, relacionar o mau desempenho com
despreparo, e atribuir [...] à má formação” (KANT DE LIMA, 2007, p. 73).
Essa tripla associação, mau desempenho versus despreparo profissional
versus má formação técnica, contribuiu significativamente para dar destaque nos
planos e projetos governamentais à formação policial. Onde era evidente a
debilidade e o atraso técnico-científico do ensino nas academias de polícia,
estruturado seguindo a formação hierarquizada do Exército, indo em contraposição
ao Programa Nacional de Educação em Direitos Humanos (2004, p. 36), que visa
uma concepção de polícia vista como instrumento de cidadania e protagonista “[...]
na construção de uma cultura de paz e defesa dos direitos humanos”.

3 ANÁLISE DAS OCORRÊNCIAS ATENDIDAS PELA POLÍCIA MILITAR DE


ALAGOAS

Para a construção da análise foram utilizados os registros das ocorrências


atendidas pela Polícia Militar de Alagoas entre os meses de janeiro e julho de 2018
(1º semestre). Nesse período, foram atendidas 24.912 ocorrências distribuídas em
15 legislações diferentes, e mais um conjunto de ocorrências sem ilicitude, como é
possível verificar no quadro que segue:

QUADRO 1 – Grupo Crimes de Ocorrências atendidas pela PMAL no primeiro semestre de


2018 em Alagoas.

GRUPO NOMINAIS LEGISLAÇÃO CPC CPI GERAL %


Ocorrência sem ilicitude - 5.143 2.819 7.962 31,961%
Código penal Decreto-lei no 2.848 4.892 3.014 7.906 31,736%
Contravenções penais Decreto-lei nº 3.688 2.100 721 2.821 11,324%
Lei Maria da Penha Lei nº 11.340 1.565 456 2.021 8,113%
Lei de tóxicos ou drogas Lei nº 11.343 825 248 1.073 4,307%
Ocorrência de trânsito Lei nº 9.503 208 864 1.072 4,303%
Estatuto do desarmamento Lei no 10.826 807 257 1.064 4,271%
Crimes ambientais Lei nº 9.605 10 591 601 2,412%
Crime de trânsito Lei nº 9.503 182 150 332 1,333%
Infrações de trânsito Lei nº 9.503 3 31 34 0,136%
ECA Lei nº 8.069 5 4 9 0,036%
Estatuto do torcedor Lei no 10.671 7 0 7 0,028%
Lei das loterias Decreto-lei nº 204 5 0 5 0,020%
Racismo Lei nº 7.716 3 0 3 0,012%
Defesa do consumidor Lei 8.078 1 0 1 0,004%
Tortura Lei nº 9.455 1 0 1 0,004%
TOTAL - 15.757 9.155 24.912 100%
Fonte: NEAC/SEDS. Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública
da Policia Militar de Alagaos (GEESP)

O Comando do Policiamento da Capital (CPC) foi responsável por 63,3% dos


atendimentos, enquanto o Comando do Policiamento do Interior (CPI) assumiu
36,7%.
É possível apontar pelo menos duas hipóteses para esse fenômeno: (1)
Grandes Concentrações urbanas amplificam os conflitos sociais e os fatores de risco
que causam criminalidade; ou (2) A baixa notificação de ocorrência pode estar
associada à carência de Centros de Atendimento e Despacho nas unidades
operacionais do interior (190). Uma constatação interessante é a de que grande
parte do trabalho do policial militar está relacionada ao atendimento de ocorrência de
menor potencial ofensivo e de naturezas não criminais.
Dito isto, fazemos considerações importantes, nas quais para facilitar a
análise, foi dada ênfase apenas a 15.757 registros das ocorrências atendidas pelo
Comando de Policiamento da Capital. Tratando-se de uma pesquisa exploratória,
não serão analisadas variáveis como tempo de atendimento, local do atendimento,
unidades operacionais, e outras.
4 OCORRÊNCIA SEM ILICITUDE

As ocorrências sem ilicitude formam um conjunto de procedimentos


operacionais ou administrativos que não está vinculado a um tipo penal específico.
Foi possível identificar 71 tipos diferentes de ocorrência, no entanto 20 deles
representaram 98,3% do total.
Um caso interessante é constatar que 35,9% do total das ocorrências sem
ilicitude são formadas por abordagens a indivíduos suspeitos. Abordar é uma ação
de policiamento ostensivo por excelência. Através das abordagens é que armas,
drogas e veículos roubados podem ser recuperados.
Outro ponto a ser observado é as ocorrências de apoio a instituições públicas,
sendo esta o segundo tipo, com mais de 21% do total das ocorrências sem ilicitude
atendidas pelos policiais militares. O mais recorrente é o apoio dado ao Serviço de
Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

QUADRO 2 – Ocorrências sem ilicitude atendidas pelo CPC no Primeiro Semestre de 2018.
NATUREZA DA OCORRÊNCIA QUANT. %. % ACUM.
Abordagem de suspeito 1847 35,9% 35,9%
Apoio a instituições públicas 1101 21,4% 57,3%
Outras ocorrências 762 14,8% 72,1%
Veículo encontrado / recuperado / entregue 497 9,7% 81,8%
Cumprimento de mandado judicial 282 5,5% 87,3%
Outros 112 2,2% 89,5%
Apoio à policial militar 89 1,7% 91,2%
Achado de cadáver 59 1,1% 92,3%
Acidente de trânsito com vítima 42 0,8% 93,2%
Morte a esclarecer 41 0,8% 94,0%
Manifestação pública 40 0,8% 94,7%
Tentativa de suicídio 33 0,6% 95,4%
Acidente de trânsito sem vítima 32 0,6% 96,0%
Apoio a instituições privadas 32 0,6% 96,6%
Atendimento a paciente psiquiátrico 22 0,4% 97,0%
Apoio a outros órgãos policiais 18 0,3% 97,4%
Apreensão de arma de fogo sem autoria 14 0,3% 97,7%
(desova)
Disparo de alarme 13 0,3% 97,9%
Pessoa desaparecida 10 0,2% 98,1%
Suicídio 9 0,2% 98,3%
Fonte: NEAC/SEDS. Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública
da Policia Militar de Alagoas (GEESP)

Neste trabalho não se analisou a proporção entre as abordagens que


decorreram de solicitações pelo 190 e das que foram feitas por iniciativa do policial
militar. Comprovamos que a abordagem policial é uma ação extremamente
complexa, pois envolve o contato direto do policial militar e a população de uma
forma geral.

5 PRINCIPAIS OCORRÊNCIAS ATENDIDAS PELOS POLICIAIS MILITARES EM


SERVIÇO NAS UNIDADES QUE COMPÕEM O COMANDO DE POLICIAMENTO
DA CAPITAL

O quadro abaixo traz as principais ocorrências atendidas pela Polícia Militar


no primeiro semestre de 2018, nas unidades que compõem o Comando de
Policiamento da Capital (CPC). Foram 259 tipos de ocorrência diferentes, sendo que
22 tipos de ocorrência respondem por 86,8%. Um típico caso do Princípio de Pareto
(também conhecido como regra do 80/20), onde para muitos eventos,
aproximadamente 80% dos efeitos vêm de 20% das causas.

QUADRO 3 – Ocorrências atendidas pela PMAL no Primeiro Semestre de 2018 pelo CPC.

GRUPO CRIME NATUREZA DA OCORRÊNCIA QUANT. % %∑


Ocorrência sem ilicitude Abordagem de suspeito 1847 11,7% 11,7%
Lei Maria da Penha Violência contra a mulher 1565 9,9% 21,7%
Código Penal Ameaça 1283 8,1% 29,8%
Contravenções penais Perturbação do sossego ou trabalho alheio 1219 7,7% 37,5%
Ocorrência sem ilicitude Apoio a instituições públicas 1101 7,0% 44,5%
Código Penal Roubo 787 5,0% 49,5%
Ocorrência sem ilicitude Outras ocorrências 762 4,8% 54,4%
Lei de tóxicos ou drogas Tráfico 605 3,8% 58,2%
Código Penal Lesão corporal 546 3,5% 61,7%
Código Penal Violação de domicilio 522 3,3% 65,0%
Ocorrência sem ilicitude Veículo encontrado / recuperado / entregue 497 3,2% 68,1%
Contravenções penais Vias de fato 442 2,8% 70,9%
Estatuto do Desarmamento Disparo de arma de fogo 355 2,3% 73,2%
Contravenções penais Perturbação da tranquilidade 336 2,1% 75,3%
Código Penal Furto 322 2,0% 77,4%
Ocorrência sem ilicitude Cumprimento de mandado judicial 282 1,8% 79,1%
Código Penal Homicídio 273 1,7% 80,9%
Estatuto do Desarmamento Porte de arma 208 1,3% 82,2%
Código Penal Tentativa de homicídio 198 1,3% 83,5%
Código Penal Dano 188 1,2% 84,6%
Estatuto do Desarmamento Porte ilegal de arma de fogo 181 1,1% 85,8%
Contravenções penais Embriaguez ao volante 160 1,0% 86,8%
Fonte: NEAC/SEDS. Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública
da Policia Militar de Alagoas (GEESP)
No quadro 3 é possível verificar os 22 tipos de ocorrência mais recorrentes
nos atendimentos feitos pelo CPC, como também os 5 tipos de legislação que mais
ocupam o trabalho da polícia militar: Código Penal, Contravenções Penais, Estatuto
do desarmamento, Lei de tóxico ou drogas, Maria da Penha e mais um conjunto de
ocorrências sem ilicitude.

6 ANÁLISE DA NATUREZA OCUPACIONAL DA POLÍCIA MILITAR

O desafio agora é propor uma modelagem de habilidades que o policial militar


precisa adquirir no processo de formação inicial e continuada a partir das principais
ocorrências registradas na Central de Atendimento e Despachos (CAD).
A Matriz Curricular Nacional estabelece três competências que o profissional
de segurança pública precisa desenvolver para a realização do seu trabalho:

QUADRO 4 – Resumo das Competências Básicas inerentes ao Policial Militar.

Cognitiva Operativas Atitudinais

• Domínio de legislação • Conhecer técnicas de • Capacidade de trabalhar


pertinente; abordagem, contenção e sob pressão;
• Capacidade de condução de suspeitos; • Inteligencia emocional;
compreender os • Ter habilidades no uso • Habilidade de
aspectos gerais da de tecnologias de comunicação
dinâmica criminal. informação e interpessoal.
comunicação.

Fonte: Matriz Curricular Nacional/SENASP. Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos


em Segurança Pública da Policia Militar de Alagoas (GEESP).

Uma boa formação precisa atentar para o desenvolvimento das três


competências. As disciplinas precisam ser pensadas de forma que possam produzir
no policial militar a capacidade de adquirir ou potencializar essas habilidades.
Trabalhar sob pressão é uma habilidade fundamental do policial militar, realidade
essa que precisa ficar muito clara.
O conhecimento das principais legislações também é outro aspecto
importante. Concomitantemente, o aspecto processual e administrativo também
necessita de atenção especial. O policial precisa saber quais procedimentos devem
ser adotados para cada tipo de situação e, para que isso seja possível, é
imprescindível capacidade para pensar de forma rápida a partir de protocolos pré-
estabelecidos (Procedimentos Operacionais Padrão).
O critério utilizado para a classificação foi o da ênfase da competência a ser
utilizada no contato inicial, assim que se depara com a ocorrência. A pergunta a
ser feita seria: qual competência o policial irá utilizar dentro da legalidade e da
razoabilidade para fazer o contato inicial com a vítima, autor ou solicitante? 1.
Utilizar técnicas de abordagem a suspeito, contenção, condução; 2. Verbalizar e
compreender o motivo do conflito; 3. Utilizar do seu conhecimento da legislação. Daí
a importância em saber qual procedimento (legal ou administrativo) será utilizado.

QUADRO 5 – Relação entre ocorrências e competências.

COMPETÊNCIAS NATUREZA DA OCORRÊNCIA QUANT. % SOMATÓRIO


Atitudinais Violência contra a mulher 1565 11,44%
Atitudinais Ameaça 1283 9,38%
Atitudinais Perturbação do sossego ou trabalho alheio 1219 8,91% 36,18%
Atitudinais Lesão corporal 546 3,99%
Atitudinais Perturbação da tranquilidade 336 2,46%
Cognitivas Apoio a instituições públicas 1101 8,05%
Cognitivas Outras ocorrências 762 5,57%
Cognitivas Veículo encontrado / recuperado / entregue 497 3,63%
Cognitivas Furto 322 2,35%
25,59%
Cognitivas Homicídio 273 2,00%
Cognitivas Tentativa de homicídio 198 1,45%
Cognitivas Dano 188 1,37%
Cognitivas Embriaguez ao volante 160 1,17%
Operativas Abordagem de suspeito 1847 13,50%
Operativas Roubo 787 5,75%
Operativas Tráfico 605 4,42%
Operativas Violação de domicílio 522 3,82%
Operativas Vias de fato 442 3,23% 38,23%
Operativas Disparo de arma de fogo 355 2,60%
Operativas Cumprimento de mandado judicial 282 2,06%
Operativas Porte de arma 208 1,52%
Operativas Porte ilegal de arma de fogo 181 1,32%
Fonte: Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública da Policia
Militar de Alagoas (GEESP).

A partir dessa proposta de modelagem, é possível verificar que as


competências operativas seriam as mais necessárias para o trabalho policial com
38,23%, em seguida viriam as competências atitudinais com 36,18%, e por fim as
cognitivas com 25,59%. De uma forma geral, as três competências são necessárias
e fundamentais para esse trabalho. As disciplinas de um curso de formação
precisam potencializar as três atitudes no policial militar. Trata-se de competências
básicas, essenciais ao trabalho de policiamento ostensivo, ou seja, o trabalho
operacional.

7 DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DA MATRIZ CURRICULAR DO CURSO DE


FORMAÇÃO DE PRAÇAS (CFP) POR COMPETÊNCIAS

Uma segunda tentativa foi a de relacionar as disciplinas do Curso de


Formação de Praças com os três tipos de competências. A pergunta seria: em qual
competência esta disciplina enfatiza seus conteúdos? Respondendo essa pergunta,
foram construídos os modelos do quadro abaixo.

QUADRO 6 – Relação entre disciplinas do CFP e competências.

%
COMPETÊNCIAS DISCIPLINAS C/H
Gerenciamento de crises 60
11%
Atitudinais Agente de trânsito 24
Relações humanas e interpessoais 20
Policiamento ostensivo geral 100
Cidadania e direitos humanos 60
Fundamentos jurídicos da atividade policial 60
Ordem unida 60
Polícia comunitária 60
Normas e regulamentos institucionais 45 54%
Cognitivas
Documentação técnica 30
Fundamentos do direito Militar 30
Preservação do local de crime 30
Abordagem sociopsicológica da violência e do crime 20
História da PMAL 20
Libras 20
Condutor de viaturas policiais 66
Treinamento físico militar 60
Uso diferenciado da força 60
32%
Operativas Bastão perseguidor (BP-60) 40
Defesa pessoal 40
Técnicas em baixa luminosidade 30
Telecomunicações PM. 20
Fonte: Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública da Policia
Militar de Alagoas (GEESP).

Dessa forma, fica evidente que a competência cognitiva é a que se faz mais
presente dentro do conteúdo proposto para o Curso de Formação de Praças, com
56%, em 12 disciplinas no total de 22. Por sua vez, a competência atitudinal é a
que menos se apresenta, com apenas 11%, em 3 disciplinas, como se vê no gráfico
abaixo:

GRÁFICO 1 – Proporção das disciplinas atuais do CFP por habilidades .

11%
33%

56% Atitudinais
Cognitivas
Operativas

Fonte: Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública da Policia


Militar de Alagoas (GEESP).

Assim, propomos, de acordo com o gráfico abaixo, a divisão das habilidades


necessárias aos agentes de segurança, para atender às principais ocorrências
registradas/atendidas pelo CAD, havendo em uma proporção de 38% para as
competências operativas, 36% para as competências atitudinais e 26% para as
competências cognitivas.

GRÁFICO 2 – Proporção das habilidades necessárias para atender às ocorrências


registradas no CAD.

38% 36% Atitudinais


Cognitivas
Operativas
26%

Fonte: Elaborado pelo Grupo de Estudos Estratégicos em Segurança Pública da Policia


Militar de Alagoas (GEESP).
Desta forma, fica evidente a real necessidade de uma (re)formulação das
ementas, baseadas em aspectos positivados através da análise feita entre o
cruzamento das competências existentes na Matriz Curricular Nacional, das
competências ensinadas no Curso de Formação de Praças e as competências
necessárias para o atendimento das principais ocorrências atendidas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Trata-se de um estudo pioneiro, dentro do ambiente militar, de caráter


exploratório e que abre grandes possibilidades de análise e novos objetos de
investigação, no entanto é possível concluir, a partir dos dados evidenciados e dos
parâmetros utilizados neste estudo, bem como da experiência diária, que existe uma
relevante dissonância entre as competências exigidas pelo serviço operacional,
diariamente desempenhado pelos Policiais da corporação, e o padrão de
competências transmitidas durante o Curso de Formação de Praças.
Vemos que a formação profissional e a capacitação contínua são dimensões
fundamentais do policiamento ostensivo, atividade constitucional da Policial Militar.
Nesse sentido, o agente de segurança pública precisa estar habilitado para
desenvolver com excelência as suas atribuições, levando em consideração que o
mesmo lida com problemas sociais de alta complexidade, precisando estar
preparado para manejar de maneira adequada os meios técnicos de maior eficácia,
seja em nível operacional e tático ou mesmo estratégico.
Assim, neste trabalho, construímos a proposta de um perfil de policial militar
necessário para o atendimento das novas exigências sociais, tendo como base as
competências existentes na Matriz Curricular Nacional, instituída pela SENASP,
devendo esse perfil ser trabalhado obrigatoriamente no processo de formação
profissional, e em um segundo plano, com a capacitação continuada.
Para o andamento da pesquisa, demos ênfase ao nível operacional de
atuação do agente de segurança pública, fazendo um comparativo dos
conhecimentos adquiridos no processo de formação e se estes estão condizentes
com as principais ocorrências atendidas pelo CIOSP (Centro Integrado de
Operações em Segurança Pública).
Foi observado que o maior número de ocorrências atendidas é voltado para
as competências operativas, no entanto, no processo de formação, as disciplinas
aplicadas dão ênfase às habilidades cognitivas. Desta forma, fica evidente a
necessidade de uma (re)adequação do processo de ensino, distribuindo as
disciplinas por competência, visando tornar o operador de segurança pública capaz
de atender com mais eficiência as ocorrências demandadas pela sociedade.
Por fim, vê-se que a dinâmica das atividades desempenhadas pela Polícia se
altera constantemente e que, para corrigir gradualmente essa dissonância, se faz
necessária uma adequação das ementas que inclua conteúdos e disciplinas,
aproximando a formação inicial dos Praças do “real fazer” da Policia Militar, bem
como é preciso a criação de uma cultura organizacional que seja capaz de avaliar
constantemente as suas atividades com a perspectiva de aprimorar, dentre outros
fatores, a formação de seus quadros.

REFERÊNCIA

ALAGOAS. Gabinete do Governador. Decreto Nº 1.818, de 02 de Abril de 2004.


Institui o Regulamento do Centro de Formação De Praça – CFAP, na Polícia Militar e
do estado de Alagoas. Disponível em: https://sistemas.pm.al.gov.br › publico ›
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Institui na polícia militar e no corpo de bombeiros militar do estado de alagoas o
sistema de ensino militar e dá outras providências. Disponível em:
http://www.conselhodeseguranca.al.gov.br/legislacao/corpo-de-bombeiros-militar-de-
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Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 e 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras
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________. Ministério da Educação. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Artigo 80. O Poder Público
incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância,
em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada. Disponível
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