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RESUMO
O Conselho de Segurança das Nações Unidas tem como sua principal atribuição
a manutenção da paz e segurança internacional. No entanto, após mais de sete
décadas de funcionamento, resta uma pergunta: o órgão é eficaz no cumprimento
de sua principal responsabilidade? Por meio de uma revisão de literatura, este
artigo analisa as bases da criação do Conselho de Segurança e seus atuais desafios.
Algumas tentativas de reformas do órgão foram feitas ao longo do tempo, mas muita
energia tem sido desperdiçada em propostas de ampliação do número de assentos.
Na verdade, o foco deveria estar concentrado no poder de veto, que é a principal
causa da ineficácia do Conselho. Como emendar a Carta da ONU é politicamente
difícil, o artigo conclui que a forma mais viável de se fazer mudanças no poder de
veto e melhorar a efetividade do Conselho é reformando o seu método de trabalho.
Palavras-Chave: Segurança Internacional. Nações Unidas. Conselho de Segurança.
Efetividade. Reforma.
ABSTRACT
The principal responsibility of the United Nations Security Council is the maintenance
of international peace and security. However, after more than seven decades
of functioning, one question remains: Is this body effective in its principal goal?
Through a literature review, this paper analyses the bases of the Security Council
creation and its current challenges. Some attempts have been made to reform the
organ, but so much energy has been wasted in enlargement proposals. Instead, the
focus should be concentrated on the veto power, which is the principal cause of the
Council’s ineffectiveness. As an amendment of the UN Charter is politically tricky,
____________________
* Eduardo Pinheiro Granzotto da Silva. Consultor Legislativo na área de Segurança Pública e Defesa
Nacional, Câmara dos Deputados. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), diplomado pela Escola Superior de Guerra (ESG) no curso Superior de Política e
Estratégia (CSUPE) e mestre em Paz e Segurança Internacional pela King’s College London.
** Newton Tavares Filho, Consultor Legislativo na área de Direto Constitucional, Câmara
dos Deputados. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), LL.M pela
Universidade de Georgetown e Doutorado na Paris 1 Panthéon-Sorbonne. E-mail: HYPERLINK
“mailto:newtontavares@gmail.com” newtontavares@gmail.com
this paper concludes that the most feasible way to make changes to the veto power
and improve the Council’s effectiveness is reforming its working method.
Keywords: International Security. United Nations. Security Council. Effectiveness. Reform.
RESUMEN
La responsabilidad principal del Consejo de Seguridad de las Naciones Unidas es el
mantenimiento de la paz y seguridad internacionales. No obstante, después de más
de siete décadas de funcionamento, la pregunta sigue siendo: ¿hasta que punto
el Consejo de Seguridad es efectivo en hacer cumplir esta misión? A través de una
revisión literaria, este ensayo analisa la base de la creación del Consejo de Seguridad
y los desafíos por los que atraviesa actualmente. Aunque se han hecho intentos por
reformar este órgano, se ha desperdiciado mucha energía en las propuestas para
ampliar el número de asientos. Por esta razón, la discusión tendría que estar enfocada
en la facultad del poder del veto, que es la principal causa de la ineficiencia del Consejo.
Dado que modificar la Carta de las Naciones Unidas es complicado ya que depende de
los intereses políticos de los Estados, este ensayo concluye que el método más viable
para modificar el poder del veto, y optimizar la efectividad del Consejo, es a través de
la modificación de lo método de trabajo de este organismo.
Palabras clave: Seguridad Internacional. Naciones Unidas. Consejo de Seguridad.
Efectividad. Reforma
1 INTRODUÇÃO
1 Roosevelt, Churchill e Stalin acreditavam que o planejamento da paz antes da conclusão das
hostilidades lhes ofereceria uma posição diplomática elevada e uma vantagem para favorecer
seus próprios interesses nacionais.
2 A delegação holandesa em São Francisco disse que a ‘igualdade exagerada entre grandes e
pequenas potências’ foi uma das razões para o fracasso da Liga das Nações.
3 Washington planejava apoiar o Brasil também para o clube da grande potência, por causa de suas
contribuições na guerra. A decisão também pode amenizar as reclamações da América Latina
sobre sua marginalização. No entanto, com tantas objeções feitas pelos soviéticos e britânicos, a
proposta nunca foi feita formalmente.
4 Depois, na Conferência de São Francisco, foi decidido incluir mais dois ramos principais: um
Conselho Econômico e Social e um Conselho de Tutela.
5 Isso incluiu apenas estados que declararam guerra contra a Alemanha e o Japão e assinaram a
Declaração das Nações Unidas em 1942.
Nenhuma medida forte e significativa foi tomada pelo Conselho de Segurança para
resolver os casos. A Síria é um exemplo. Desde o início do conflito em 2011, mais
de 500.000 pessoas foram mortas ou estão desaparecidas naquele país, e armas
biológicas têm sido utilizadas em ataques contra civis (PORQUE…, 2018). No Iêmen,
a situação também é catastrófica. Por causa da Guerra Civil, que começou em 2015,
estima-se que mais de 22 milhões de pessoas precisam de assistência humanitária
e mais de 8 milhões são consideradas em risco de fome (NAÇÕES UNIDAS, 2018a).
Outro sinal da ineficácia do Conselho é o avanço dos atos de força por poderes
estaduais. De acordo com a Carta da ONU, o uso da força na área internacional só é
permitido em duas situações: ações realizadas pelo Conselho de Segurança (segurança
coletiva) (Capítulo VII) (NAÇÕES UNIDAS, 1945) ou pelos estados em legítima defesa
(individual ou coletiva) (art. 51) (NAÇÕES UNIDAS, 1945). Não obstante, os Estados
poderosos estão sempre criando teorias e doutrinas em leis internacionais para
justificar o uso unilateral da força, contornando a autoridade do Conselho e expondo
sua ineficácia. A intervenção da OTAN em Kosovo (1999 e a Guerra do Iraque (2003)
são exemplos do uso ilegal da força sem punição. Além disso, uma paralização no
Conselho viu a Rússia anexar a Crimeia (2014) e os Estados Unidos e seus aliados
(França e o Reino Unido) bombardear alvos na Síria sem qualquer autorização.
Mas qual é a raiz do problema? Não é justo apontar apenas uma causa para
a ineficácia do Conselho de Segurança. A complexidade das relações internacionais,
a dificuldade do direito internacional em se afirmar como uma opção viável e a
falta de cooperação de alguns Estados são fatores que não podem ser esquecidos
quando discutimos a questão. No entanto, há uma questão que está no cerne do
problema: o poder de veto.
5 PERSPECTIVAS DE REFORMA
8 O grupo é formado por Brasil, Índia, Japão e Alemanha para apoiarem-se mutuamente por novos
assentos permanentes
9 O Unidos para Consenso (UfC) é formado por Argentina, Canadá, Colômbia, Costa Rica,
Indonésia, Itália, Malta, México, Paquistão, Coreia do Sul, San Marino, Espanha e Turquia. Em
geral, o grupo é contra a proposta do G4 de novos membros permanentes.
10 O grupo L-69 (sobre o projeto de resolução A / 61 / L.69) é formado por 40 estados da América
Latina e da África. Defende o alargamento do Conselho a 27 lugares.
11 O Comitê de Dez Chefes de Estado para a Reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas
(C-10) busca um Conselho de Segurança ampliado com mais Estados africanos em assentos
permanentes (com veto) e não permanentes.
12 Grupo de Trabalho de Composição Aberta sobre a Questão de Representação Equitativa e
Aumento de Membros do Conselho de Segurança e Outros Assuntos Relacionados ao Conselho
de Segurança, conhecido como “o grupo de trabalho sem fim”.
13 Cinco novas permanentes (sem veto) e mais quatro não permanentes.
14 O relatório final Um Mundo Mais Seguro: Nossa Responsabilidade Compartilhada, recomendou
a expansão, mas houve uma divergência na forma de fazê-lo, pois: “[...] os membros do Painel
discordam sobre os modelos propostos para a expansão do Conselho de Segurança e a método
para determinar os critérios de adesão ao Conselho de Segurança. […] ”.
15 Kofi Annan, em seu relatório In Larger Freedom, publicado em 2005, reforçou a recomendação
feita pelo Painel de Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e Mudanças, pedindo uma reforma do
Conselho de Segurança.
16 O único progresso considerável foi a decisão A / 69 / L.92 adotada pela Assembleia Geral em
2015, que estabeleceu um quadro mais concreto para a discussão da reforma.
17 De acordo com Stephen W. Walt, “a estrutura atual [do Conselho de Segurança] é um dos
grandes anacronismos do mundo: a Alemanha agora é mais importante do que a Grã-Bretanha
ou a França e estados como Índia, Brasil, Japão ou África do Sul (e alguns outros) seriam
candidatos plausíveis para o status ‘permanente’ também. [...] A estrutura atual não faz sentido.“
ao direito de veto. Há duas opções possíveis: (a) alterar o Artigo 27 na Carta da ONU
para abolir o poder de veto, ou (b) alterar o método de trabalho do Conselho por
um código interno de conduta para limitar o uso do veto.
A primeira opção é complicada. Qualquer parte da Carta deverá ser adotada
pelo voto de dois terços da Assembleia Geral (ar. 108) (NAÇÕES UNIDAS, 1945), o
que representa 129 estados do total de membros (atualmente 193). Se aprovada,
esta mudança assume a forma de uma revolução. Então, só entra em vigor após a
ratificação por dois terços dos membros da ONU sob seus respectivos processos
constitucionais, incluindo todos os cinco permanentes do Conselho de Segurança
(art. 108) (NAÇÕES UNIDAS, 1945). Esse tipo de processo é tão rígido que aconteceu
apenas três vezes na história da organização: em 196518, 196819 e 197320.
Diante desse processo, a segunda opção é mais viável. Embora não esteja no
debate convencional sobre a reforma, mudar a forma de trabalho para restringir
o poder de veto tem mais chances de sucesso e não precisa de emenda à Carta
(NADIN, 2016, p. 95-96). O Conselho de Segurança tem a prerrogativa de criar suas
próprias regras de procedimento, de acordo com a Carta das Nações Unidas (art. 30)
(NAÇÕES UNIDAS, 1945). O trabalho do órgão é atualmente baseado nas Regras de
Procedimento Provisórias e em uma variedade de práticas ad hoc (NADIN, 2016, p.
95). Desde 1993, a revisão e atualização dos procedimentos está a cargo do Grupo
de Trabalho Informal sobre Documentação e Outras Questões Processuais, que
tem alcançado avanços consideráveis nas questões relacionadas à transparência,
interatividade e eficiência do órgão21. Portanto, regulamentar o uso do veto por
meio de um acordo interno poderia ser uma maneira mais fácil de melhorar a
eficácia do Conselho de Segurança.
Uma proposta razoável foi defendida pelo governo francês22, considerando
o impasse no caso da Síria. A ideia é implementar um compromisso mútuo entre
os ‘Cinco Grandes’ para suspender seu direito de veto em decisões que envolvam
crimes em massa (FABIUS, 2013). A natureza do crime seria decidida pelo Secretário-
Geral da ONU23 a pedido de pelo menos 50 estados membros (FABIUS, 2013).
18 Alteração dos artigos 23.º, 27.º e 61.º (alargamento de dois órgãos: o Conselho de Segurança e o
do Conselho Económico e Social).
19 Alteração do artigo 109 (revisão das conferências da Carta).
20 Nova alteração ao artigo 61º (alargamento do Conselho Económico e Social).
21 Em 2017, o Presidente do Conselho (ocupado pelo Japão) emitiu uma nota abrangente com
medidas importantes para aprimorar o método de trabalho do órgão. Veja a nota S / 2017/507.
22 A proposta francesa não era totalmente nova, mas ganhou mais autoridade porque foi proposta
por um membro permanente. Propostas semelhantes para evitar o uso do veto já foram
discutidas no Painel de Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e Mudança e por alguns grupos,
como S5 (Costa Rica, Jordânia, Liechtenstein, Cingapura e Suíça) e Responsabilidade, Coerência e
Transparência (ACT), que é composto por pequenos e médios estados.
23 No espírito do Artigo 99 da Carta da ONU, o Secretário-Geral decidirá se a decisão envolve
atrocidades em massa, que incluem genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra
em grande escala.
7 CONCLUSÃO
desde 2013. Agora, o mundo espera que a América, a China e a Rússia encontrem
seu senso de responsabilidade internacional e negociem a ideia de melhorar a efi-
cácia do Conselho.
Também gostaria de expressar minha gratidão a meus amigos Charlie McKell e Alejandra
Bahena Iturralde por sua contribuição para este artigo.
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