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Resenhas

Resenhas

Memória e Memória e (res)sentimento: indagações


(res)sentimento: sobre uma questão sensível.
indagações sobre Stella Bresciani e Márcia Naxara (org.).
uma questão Campinas. Editora da Unicamp, 2001.
sensível
Stella Bresciani e Por Alexandre Zarias
Márcia Naxara

Narradores de Memória. Conceito tão ligado à história, que


Javé se confunde com ela e, ao mesmo tempo,
Dir. Eliane Café cria-se a partir dela; para alguns, a
antecede. As relações entre memória e
Memória & história, e o conjunto de atos individuais e
sociedade: coletivos que lhes dão materialidade e
lembrança de espessura política, delimitam um amplo
velhos espectro de abordagens historiográficas. Contudo, tais abordagens
Ecléa Bosi dependem de um refinamento teórico e metodológico dos significados
que esses dois conceitos podem assumir. O desafio que essa tarefa
Outras resenhas representa liga o conjunto de textos presentes na coletânea Memória
e (res)sentimento: indagações sobre uma questão sensível. Nessa
obra, historiadores, filósofos, literatos e cientistas sociais discutem os
usos da memória e tratam dos ressentimentos que a acompanham.

Pensadas como ferramentas analíticas, as noções de memória e


história são articuladas para dar conta dos processos sociais relativos
à interpretação do passado, à construção de biografias, à reflexão
sobre o lugar da disciplina a que chamamos de História nas ciências
humanas, à construção de identidades e à compreensão dos
movimentos nacionalistas e fundamentalistas que marcaram o início
do século XX, com toda sua força e violência expressas nas guerras,
na exclusão social, no genocídio,e hoje, mais comumente, nos atos
de terrorismo.

A todo esse universo de objetos de pesquisa se junta a idéia de


ressentimento, peça fundamental que alicerça toda a linha
argumentativa da coletânea. O significado de ressentimento adotado
é aquele referente ao sentido negativo que esta palavra assume, ou
seja, tem a ver com mágoa, pesar e dor. Uma dor do passado que
dá sentido político à construção voluntária de memórias, ou de seu
próprio esquecimento, para a efetivação de demandas sociais e
constituição de subjetividades.

Memória e (res)sentimento surgiu do colóquio internacional realizado


nos meses de maio e junho de 2000, no Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas da Unicamp, reunindo, em sua maioria,
pesquisadores desta universidade e da Universidade de Paris I.
Naquela época, o país acabava de viver o que Jacy Alves de Seixas,
uma das articuladoras do livro, chamou de obsessão comemorativa,
com a festas dos 500 anos do "Descobrimento". Para ela, tais tipos
de comemoração são um fenômeno que tomou conta das sociedades
contemporâneas nas últimas décadas do século XX. No Brasil, no
entanto, houve um aparente paradoxo. País carente de
comemorações, e tido como "sem memória", colocou à margem das
comemorações de uma história oficial a memória dos excluídos, dos
índios, negros, trabalhadores e estudantes.

Trazendo ao público vinte e cinco textos divididos em duas partes,

http://www.comciencia.br/resenhas/memoria/memoria.htm[8/3/2009 01:49:30]
Resenhas

uma tratando basicamente das relações entre memória e história e


outra sobre os ressentimentos, o livro oferece ao leitor uma vasta
gama de assuntos, passando pelos clássicos da literatura, da filosofia
e das ciências humanas. De Tucídides a Foucault, passando também
por Nietzsche, Bergson, Proust, Benjamin e Wittgenstein, entre
outros, tem-se à disposição um mapa sobre as questões que rodam
a problemática da memória na historiografia contemporânea. De um
lado, há a preocupação com os processos históricos vistos a partir de
uma perspectiva ampla, de outro, procura-se compreender o que há
de subjacente nas transformações sociais, ou seja, quais são as
afetividades, o foro íntimo daqueles que as produzem ou são
submetidos aos seus efeitos.

Tais questões são logo apontadas nos textos de apresentação de


Memória e (res)sentimento, que dão impulso para o desenvolvimento
das partes seguintes da obra. Em "Percursos de memórias em terras
de história: problemáticas atuais", Jacy Alves de Seixas, da
Universidade Federal de Uberlândia (UFU), analisa a crescente
revalorização da memória e o seu direito e dever reivindicados por
diferentes grupos sociais e políticos. Para a autora, na historiografia,
esse movimento tem convivido com uma ordem inversa, que é a
falta de reflexão sobre o fenômeno.

Em seu texto, Seixas concebe a memória como ferramenta analítica


e, dentre os vários usos que se pode fazer dela e de suas relações
com a história, a questiona como um instrumento político e como
elemento amalgamador de identidades e de relações sociais. É algo
que, unindo passado e presente, move as ações sociais
positivamente em busca de um fim, de sua realização no futuro
(nesse sentido, leia na ComCiência: "Dia da Consciência Negra"
retrata disputa pela memória histórica).

Em outro texto de apresentação, "História e Memória dos


Ressentimentos", de Pierre Ansart, da Universidade de Paris VII, a
problematização da historiografia contemporânea é feita a partir da
perspectiva do ressentimento. Para o autor francês , os rancores, as
invejas, os desejos de vingança e os fantasmas da morte são os
sentimentos que melhor definem a palavra ressentimento. Em seu
texto, o conceito é esmiuçado a partir das definições que assume nas
obras de Nietzsche, Max Scheler, Robert Merton e Freud, segundo
suas relações com as noções de história e memória.

Mas, como adverte Ansart, o ressentimento não é só um conjunto de


valores, é algo mais do que isso. Pensado como ferramenta analítica,
o ressentimento faz parte de um sistema teórico que procura
compreender as forças de oposição presentes nos diversos tipos de
relações interiorizados nos indivíduos e em seus grupos: a
dominação, a subordinação e a insubordinação que acompanham as
revoltas políticas e sociais, aquelas que fazem história e memória. O
ressentimento, desse modo, é tratado como um impulso à
transformação das realidades. Toca uma questão sensível para a
compreensão das relações entre os afetos e o político, entre a
sociedade e o Estado.

Atualizado em 10/03/04

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