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GRUPOS E RELAÇÕES ENTRE GRUPOS

LICENCIATURA EM PSICOLOGIA
2.º ANO - 2.º SEMESTRE
2021/2022

RECENSÃO CRÍTICA
“ILLUSORY CORRELATION IN INTERPERSONAL PERCEPTION: A COGNITIVE
BASIS OF STEREOTYPIC JUDGMENTS”

(HAMILTON & GIFFORD, 1976)

Discentes: Carolina Sousa, nº 99949


Turma: PB2
Docente: Sven Walduz

23 de maio de 2022
Introdução

Muitas vezes, a nossa mente é vítima das suas próprias interpretações e conclusões,

levando-nos a criar suposições daquilo que observamos com base em experiências pessoais,

fazendo-nos tomar decisões erradas, o que, em troca, contribui para a formação de estereótipos e

preconceitos. A este efeito dá-se o nome de correlação ilusória. O presente ensaio procura

analisar de forma crítica o artigo da autoria de Hamilton e Gifford (1976) e refletir sobre as

repercussões da teoria, principalmente para o surgimento da revolução cognitiva na área da

Psicologia. Deste modo, o trabalho inicia-se por uma breve contextualização e definição de

conceitos. Posteriormente, será apresentado um resumo do artigo e serão discutidos a

metodologia e resultados obtidos de acordo com a experiência realizada e, finalmente, será

abordada a relevância do texto na área da Psicologia.

Contextualização

“Correlações ilusórias” foi um termo inicialmente proposto, nos anos 60, por Chapman e

Chapman (1967; 1969), que, ao conduzirem investigações sobre julgamentos de pares de

palavras, observaram associações semânticas entre diagnósticos e certas características de

indivíduos que foram desenhadas pelos participantes, de acordo com a tarefa solicitada. Este

efeito é um viés cognitivo que consiste na perceção da relação entre duas variáveis que, na

realidade, não estão correlacionadas entre si, ou estão, mas em menor grau (Chapman, 1967).

Posteriormente, Hamilton e Gifford (1976) tomam conhecimento da existência deste fenómeno e

percebem a relevância deste para explicar o raciocínio que está por trás dos estereótipos e

preconceitos dirigido a minorias, acabando por escrever um dos artigos fundamentais que

contribuiu para o progresso científico da Cognição Social na perspetiva do novo


experimentalismo, “Illusory correlations in interpersonal perception: A cognitive basis for

stereotypic judgments”.

Resumo

Na sua adaptação ao paradigma, ou seja, na perceção de categorias sociais, Hamilton e

Gifford (1976) basearam o efeito das correlações ilusórias numa “dupla infrequência”, que

consistia em julgar menos favoravelmente minorias do que maiorias, quando maior parte dos

comportamentos praticados pelos membros de ambos os grupos de igual predominância. Assim,

a associação da pertença grupal do grupo minoritário a comportamentos de valência mais rara

seja duplamente infrequente e, portanto, particularmente distintiva e saliente.

De modo a testar a hipótese, foram realizados dois estudos, em que, no primeiro, foi

possível demonstrar o efeito e, no segundo, contou-se uma replicação conceptual. No primeiro

estudo, 39 comportamentos (27 positivos e 12 negativos) de membros de dois grupos foram

apresentados sequencialmente aos participantes e cada comportamento era atribuído a um

indíviduo diferente. É possível afirmar que não existia relação entre a pertença grupal e a

probabilidade de praticar um comportamento positivo, ou negativo, uma vez que, dos 26

comportamentos atribuídos ao grupo A, 18 eram de valência positiva e 8 de valência negativa, e

ao grupo B foi atribuído exatamente a metade de cada valência de comportamentos (9 positivos e

4 negativos). Tal como era esperado, o grupo A foi avaliado como mais positivo que o grupo B.

Na segunda experiência, os comportamentos eram maioritariamente negativos, sendo que, os

membros do grupo A eram constituídos por 18 indivíduos com comportamentos negativos e 8

positivos e ao grupo B foram atribuídos metade dos do grupo anterior (9 negativos e 4 positivos).

Os resultados inverteram-se, pois o grupo B foi avaliado mais positivamente comparativamente


com o grupo A. Uma justificação para os resultados obtidos pelos autores, passava por

motivações particulares, personalidades neuróticas, motivações culturais e/ou exagero de um

fundo de verdade (Ashmore & DelBoca, 1981). Porém, os autores certificaram-se que os

participantes não tinham pressões culturais ou motivações particulares e o grupo maioritário e

minoritário tinham a mesma proporção de comportamentos com valência positiva e negativa.

Outros estudos de correlação ilusória forneceram outra base de estereótipo, sugerindo que as

pessoas podem formar um estereótipo sobre um grupo simplesmente como um subproduto da

maneira como suas mentes normalmente processam informações sobre o mundo.

O que era apontado como explicação para a emergência de esterótipos negativos,

preconceitos e discriminação, não são extremamente necessárias para ocorrerem, ou seja, não

originam nos processos de aprendizagem e motivacionais como afirma a literatura anterior.

Assim, fatores cognitivos podem ser suficientes para produzir percepções diferenciadas de

grupos sociais, sendo também possível que estes se reforcem mutuamente.

Contributo para a Psicologia

De acordo com Mayo (1996), o “novo experimentalismo” defende que o progresso da

ciência não se deve à acumulação de conhecimento, nem à aproximação da verdade, mas sim à

criação de restrições à construção teórica e, por isso mesmo, é caracterizado por se centrar na

ideia de “bons paradigmas experimentais”, sendo o modelo das correlações ilusórias considerado

parte destes, uma vez que seguiu todas as características que foram atribuidas a estes.

Primeiramente, o paradigma desenvolveu-se num contexto adequado para correção de

erros. Um exemplo que o pode justificar, foi quando Hamilton, Dugan e Trolier (1985)

mostraram os mesmos comportamentos dos dois grupos, porém, estes foram apresentados
simultaneamente numa tabela, o que fez com que o efeito de correlações ilusórias desaparecesse.

Também encontraram uma conexão entre o número de comportamentos duplamente infrequentes

e a significância das correlações ilusórias. Esta correlação comprovava a explicação inicial de

Hamilton e Gifford (1976), mas o efeito deixou de ser utilizado para caracterizar os efeitos da

dupla infrequência no julgamento de grupos humanos, uma vez que foi replicada seguida de uma

investigação muito específica (Stroessner & Plaks, 2001).

De seguida, o paradigma produz resultados que são apenas fracamente dependentes de

qualquer teoria. Enquanto Hamilotn e Gifford (1976) situam a sua explicação deste efeito na

dupla infrequência, Fiedler (1991) situa-a na aprendizagem deficiente dos itens mais vulneráveis

aos efeitos de regressão e à incerteza. No entando, os resultados obtidos por Hamilton e Gifford

(1976) é onde ambas as perspetivas convergem.

Um “bom paradigma experimental” também testa hipóteses muito particulares. Embora o

efeito das correlações ilusórias ser pouco específico por si só (Chapman, 1969), Hamilton e

Gifford (1976) anteciparam e obtiveram um tipo de correlação ilusória específico, a avaliação

desvalorizada de um grupo minoritário.

Por último, o paradigma de Hamilton e Gifford (1976) reproduz um teste rigoroso de uma

hipótese específica. Na primeira experiência, a desvalorização do grupo minoritário poderia ter

beneficiado do efeito de mera exposição, ou seja, o grupo apresentado mais frequentemente

tende a ser avaliado mais positivamente do que o que foi apresentado menos vezes (Zajonc,

1980). Assim, a dupla infrequência e a mera exposição convergem no sentido em que irá existir

uma desvalorização relativa ao grupo minoritário e uma sobre-valorização do grupo maioritário.

No entanto, no segundo estudo, Hamilton e Gifford (1976) confrontaram o efeito de dupla

infrequência ao efeito de mera exposição, fazendo com que maior parte dos comportamentos
fossem negativos, o que resultaria nos comportamentos duplamente distintivos passarem a ser

positivos, mas, mesmo assim, o efeito de correlações ilusórias manteve-se.

Assim, considera-se o paradigma experimental construído por Hamilton e Gifford (1976)

um bom paradigma experimental à luz do novo experimentalismo. Essa qualidade permitiu que o

quadro teórico contribuísse para a criação e desenvolvimento da Cognição Social e para o

progresso científico, já que, para existir, não basta apenas a mera criação de novos paradigmas,

estes têm que levar em consideração os “bons paradigmas experimentais ” de abordagens

anteriores. Deste modo, qualquer nova abordagem sobre correlações ilusórias na perceção tem de

ser capaz de oferecer uma explicação da dupla infrequência neste tema.

Conclusão

Concluindo, este fenómeno lançou uma nova proposta cognitiva relativamente à

formação de preconceitos e estereótipos, contribuindo também para a criação do campo da

Cognição Social no mundo da Psicologia, e para muitas outras pesquisas sobre este assunto.

Hamilton e Gifford (1976) mostraram que a cognição social não é necessariamente sui generis,

que resulta de motivações que refutam a razão, de perturbações de personalidade ou aculturação,

pois foi possível perceber que esta produção de discriminação através de avaliações é resultado

de processos básicos atencionais e/ou de aprendizagem conceptual. Como a dupla infrequência

ainda é vulgar nas sociedades do quotidiano e de estar relacionada com casos preconceituosos,

estereótipos nefastos e discriminação, é possível que as correlações sejam um dos fatores da

gênesis dos preconceitos e estereótipos, que podem ser transmitidas a outros membros de grupos

predominantes, bem como às próximas gerações. Contudo, algo que escapa aos estudiosos deste

efeito é que os mecanismos subjacentes a este fenómeno ainda não estão totalmente elucidados.
Referências

Ashmore, R. D., & Del Boca, F. K. (1981). Conceptual approaches to stereotypes and

stereotyping. Cognitive processes in stereotyping and intergroup behavior, 1, 35.

Chapman, L.J. (1967). Illusory correlation in observational report. Journal of Verbal

Learning and Verbal Behavior, 6, 151-155.

Chapman, L.J., & Chapman, J.P. (1969). Illusory correlation as an obstacle to the use of

valid psychodiagnostic signs. Journal of Abnormal Psychology, 74(3), 271-280.

Hamilton, D. L., & Gifford, R. K. (1976). Illusory correlation in interpersonal perception:

A cognitive basis of stereotypic judgments. Journal of Experimental Social Psychology, 12(4),

392-407.

Hamilton, D. L., Dugan, P. M., & Trolier, T. K. (1985). The formation of stereotypic

beliefs: Further evidence for distinctiveness-based illusory correlations. Journal of Personality

and Social Psychology, 48, 5-17.

Stroessner, S. J., & Plaks, J. E. (2001). Illusory correlation and stereotype formation:

Tracing the arc of research over a quarter century. In G. B. Moskowitz (Ed.), Cognitive social

psychology: The Princeton Symposium on the Legacy and Future of Social Cognition (pp. 247–

259). Mahwah, NJ: Erlbaum.

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