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THEORIES OF COUNSELING AND PSYCHOTHERAPY (tradução)

C. H. Patterson - Harper & Row Publishers, USA, 1973.

CONCLUSÃO

Divergências e Convergências em Aconselhamento ou Psicoterapia

Os capítulos anteriores resumiram um certo número de abordagens em


aconselhamento ou psicoterapia. Pelo menos um igual número de outras
abordagens, entre elas a psicanálise ortodoxa e as abordagens neoanalíticas,
poderia ter sido incluído. A situação, pelo menos aparentemente, nos remete à
diversidade. Os diversos pontos de vista parecem diferir de maneira considerável
não apenas em seus métodos ou técnicas, mas também em seus objetivos,
conceitos básicos e em suas orientações filosóficas.
Esta diversidade (ou este desacordo) fez com que certos autores se
preocupassem muito seriamente com a situação do aconselhamento e da
psicoterapia. Ungersma escreve assim: “A situação atual da psicoterapia não é
diferente daquela do homem que monta seu cavalo e cavalga em todas as
direções. A orientação teórica dos terapeutas está baseada em hipóteses, teorias
e ideologias amplamente divergentes... Individualmente, é até esperado que os
praticantes de qualquer abordagem variem em seus modos particulares de
trabalho, mas não é só isso: algumas escolas bem organizadas dentro do campo
da terapia parecem trabalhar em absoluta oposição com relação a outras escolas
igualmente bem organizadas. E não obstante, todas as escolas, em condições
favoráveis, obtém resultados positivos: o paciente ou cliente consegue alívio e
usualmente liberta-se de forma satisfatória de suas dificuldades” 1. Este sucesso
assemelhado que é obtido por abordagens aparentemente tão diferentes constitui
um problema que exige alguma explicação.
Há alguns anos, Carl Rogers, que tivera a esperança de que um dia os
terapeutas pudessem chegar a um consenso acerca do que constitui a
psicoterapia, expressou seu desapontamento. Ele, que inicialmente sentia que
“nós todos estamos falando das mesmas experiências, mas estipulando palavras,
rótulos e descrições diferentes para elas”, terminou por escrever que sentia que
“nós diferimos no nível mais básico das nossas experiências pessoais”. E concluiu
que “o campo da psicoterapia está no meio de uma confusão”, apesar de ter
sentido que a confusão criava um clima saudável para o surgimento de novas
idéias, teorias, conceitos e métodos.2
Há alguma razão para acreditarmos que hoje a situação é diferente do que era
dez anos atrás? Há menos confusão, menos divergência? O campo da
psicoterapia está unido, ou mostrou evidências de convergir na direção de uma
teoria ou sistema comuns amplamente aceitos? Parece que o progresso da
concordância sobre a existência de alguns elementos comuns às diferentes
formas de psicoterapia esteve restrito principalmente àquelas abordagens que
hoje são chamadas “tradicionais”, ou seja, aqueles métodos ou abordagens que
não estão incluídos entre as terapias comportamentais. A década passada foi o
período de desenvolvimento das abordagens teóricas da aprendizagem, assim
como os anos 50 foram a década da terapia centrada na pessoa. Este
desenvolvimento introduziu nova diversidade no campo, a ponto de parecer para
alguns que duas abordagens inconsistentes e irreconciliáveis estavam surgindo.
1
Ungersma, A.J. The search of meaning. Philadelphia: Westminster, 1961. P. 55.
22
Rogers, C.R. Psychotherapy today or where do we go from here? Amer. J. Psychother., 1963, 17, 5-16
Kanfer & Phillips afirmam que não apenas os clínicos às vezes discordam das
próprias teorias que apoiam, mas “suas práticas e crenças refletem
inconsistências e contradições ainda mais profundas”. Comentando as terapias
comportamentais, Kanfer & Phillips recomendam que “ao invés de se aceitar
como meta um maior refinamento dos muitos procedimentos específicos, pode ser
mais útil o empenho na tentativa de uma eventual integração destes num sistema
comportamental mais abrangente... O primeiro passo na construção de tal
estrutura reside nos esforços para se encontrar o que há de comum e de diferente
entre a variedade de técnicas utilizadas”3.
Concluímos o último capítulo sugerindo que, mesmo ainda não sendo o
sistema eclético de Thorne a resposta final, alguma integração sistemática das
muitas abordagens aparentemente divergentes em aconselhamento ou
psicoterapia é o objetivo último. O ecletismo de Thorne, embora seja a concepção
até hoje mais abrangente, não é ainda uma integração satisfatória da teoria e do
conhecimento disponíveis. Sua maior fraqueza parece ser não refletir de forma
adequada as duas principais posições da atualidade, a terapia comportamental e
a terapia centrada na pessoa. E também não incorporar adequadamente (como
talvez não faça nenhuma das abordagens atuais) a teoria sócio-psicológica e a
pesquisa relacionada à modificação de atitudes, atração interpessoal, influência
social, teoria dos papéis, expectativas, etc.
Talvez esteja fora do alcance de uma só pessoa dominar as imensas
quantidades de teoria e pesquisa relevantes ao desenvolvimento de um sistema
eclético integrador. Um sistema desse tipo exigiria em sua base o
desenvolvimento de uma teoria ou sistema sobre o comportamento humano.
Certamente este autor não teria a pretensão de estar apto a isso. Mas este livro
ainda estaria incompleto sem uma tentativa de integração das diversas
abordagens, ao menos até o ponto de identificarmos algumas analogias (se elas
existem) e apontarmos um caminho para a reconciliação das divergências. O
empenho científico aceita a viabilidade de uma teoria (ou sistema) consistente e
que o progresso deste desenvolvimento dá-se através do método de
aproximações sucessivas. Neste capítulo não iremos apresentar um sistema
eclético, mas as fundações ou estruturas para tal sistema.
Já houve um certo número de tentativas de se descobrir ou definir elementos
comuns entre as várias abordagens em aconselhamento e psicoterapia. 4 Um
obstáculo à identificação de analogias sempre foi o fato de que os teóricos fazem
questão de ser únicos e diferentes. Esta característica acaba por conduzir à
criação de terminologia nova e distinta mesmo em muitos casos em que os
conceitos representados por esta terminologia não são novos e nem distintos. A
questão é que são enfatizadas as diferenças. Novas técnicas são apresentadas
sem que se faça referência ao processo total no qual são utilizadas ou do qual
são parte. É presumível que todas as teorias ou abordagens que conseguiram
grande aceitação ou persistiram até hoje tenham alguma veracidade. As
diferenças entre elas podem ser mais aparentes que reais, significando
percepções e descrições diferentes dos mesmos fenômenos ou enfatizando
aspectos diferentes do mesmo processo. “De fato, as várias teorias não são
logicamente incompatíveis e até mesmo muitas vezes suplementam e
indiretamente provam umas as outras” 5. Levando-se em conta que as teorias
estão baseadas em vasta experiência prática, é esperado que possuam
analogias, concordâncias e apoio mútuo.

33
Kanfer, F.H. & Phillips, Jeanne S. A survey of current behavior therapies and a proposal for classification. In
C.M. Franks (Ed.) Behavior therapy: appraisal and status. New York: Mc Graw-Hill, 1969. Pp 445-475
44
Patterson, C.H. Counseling and psychotherapy: theory and practice. Chap. 12. Common elements in
psychotherapy: essence or placebo? New York: Harper & Row, 1959.
55
Perls, F.S. Hefferline, R.F. & Goodman, P. Gestalt therapy. New York: Julian Press, 1951. P. 280
ANALOGIAS E DIFERENÇAS

Filosofia e Conceitos

Pode parecer difícil encontrar uma filosofia comum ou mesmo um único


conceito comum aos pontos de vista contemplados neste livro. As concepções a
respeito da natureza do homem e da natureza das perturbações emocionais
variam de forma considerável. Pode parecer que há bem pouco ou mesmo nada
em comum entre concepções de homem como ser determinado pelo ambiente ou
por suas necessidades e desejos internos, por um lado, e como pessoa livre,
capaz de fazer escolhas, por outro; ou entre a concepção de homem como sendo
essencialmente um organismo a ser manipulado por recompensas e punições, por
um lado, e, por outro, como ser que tem potencial para o crescimento e o
desenvolvimento através do processo de auto-atualização.
Contudo, por menores que possam parecer as semelhanças, existe
concordância quanto à visão de homem como ser capaz de se modificar (ou, no
mínimo, ser modificado). O homem não está inapelavelmente pré-determinado;
em algum nível, ele ainda permanece maleável. Uma aproximação da teoria da
aprendizagem pode de fato confirmar que o homem é infinitamente suscetível à
mudança. Skinner expressa da seguinte forma: “É perigoso afirmar que um
organismo de determinada espécie ou em dada faixa etária não pode resolver
certo problema. Como resultado de programações cuidadosas, pombos, ratos e
macacos têm feito nos últimos cinco anos coisas que membros da sua espécie
nunca haviam feito. Não que seus ancestrais fossem incapazes de tais
comportamentos; a natureza simplesmente nunca havia disposto a eles
seqüências efetivas destas programações”6. E a respeito da possibilidade de
moldar a personalidade, ele mesmo afirma: “dê-me as especificações e eu lhe
darei o homem”7.
Outras abordagens podem não ser tão otimistas com relação a mudanças
da personalidade ou do comportamento, mas certamente as admitem como
possibilidade; de outra forma não haveria razão para dedicarem-se aos campos
do aconselhamento ou da psicoterapia.
Entre as diferentes abordagens há pelo menos mais um elemento comum,
a saber, o reconhecimento de que (a) a existência de uma neurose, um distúrbio,
um mau ajustamento, um conflito, um problema não resolvido, “sintomas” ou um
comportamento desordenado é algo desagradável e doloroso para o cliente, e (b)
é indesejável que tais coisas ocorram no indivíduo e isto autoriza tentativas para
sua modificação.
Um terceiro elemento comum possível é o reconhecimento da influência do
futuro – ou de antecipações, esperanças ou expectativas relacionadas ao futuro –
no comportamento presente. Esta é uma característica que parece unir
abordagens tão diferentes quanto o condicionamento operante e o
existencialismo. Em outras palavras, o reconhecimento de que o comportamento
não é apenas “causado” pelo passado, mas é também influenciado pelas
conseqüências do futuro (ou pelas expectativas das conseqüências), parece estar
presente na maioria dos pontos de vista. Lindsley coloca a questão da seguinte
maneira ao falar sobre o condicionamento operante:” A descoberta de que este
comportamento [voluntário] é controlado por suas conseqüências torna
desnecessária a explicação do comportamento em termos de antecedentes

66
Skinner, B.F. Reinforcement today. Amer. Psychologist, 1958, 14, 94-99.
77
Skinner, B.F. Walden Two. New York: Macmillan, 1948. P. 243.
hipotéticos”8. May, apresentando a posição existencialista, escreve que “o futuro,
ao contrário do presente ou do passado, é o modo de expressão dominante dos
seres humanos”9.

Objetivos e Metas

Mahrer começa seu livro sobre as metas do aconselhamento com a seguinte


afirmação: “A literatura em psicoterapia tem pouco a oferecer à questão sobre as
metas da psicoterapia – suas identificações, significados e organização. Neste
ponto, clínicos, pesquisadores e teóricos curiosamente não se pronunciaram” 1010.
Muitos terapeutas, no entanto, têm voltado sua atenção para a questão das
metas, consideração explicitada pronunciadamente na preocupação dos
terapeutas do comportamento em especificar os objetivos do tratamento.
Quando são examinadas as metas discutidas pelos teóricos representados
neste livro e pelos colaboradores do livro de Mahrer, encontra-se imensa
variedade. Uns falam em reorganização da personalidade, outros em cura de uma
patologia, outros em ajustamento ao ambiente, sociedade ou cultura. Outros ainda
falam em coisas como desenvolvimento de um funcionamento biológico e social
efetivos, eliminação de hábitos desadaptados para aprendizagem de adaptados,
redução da ansiedade ou alívio do sofrimento. Alguns, particularmente os
terapeutas centrados na pessoa ou humanistas, falam do sentido da vida, da
facilitação do crescimento e do desenvolvimento de pessoas auto-atualizadoras.
Pode parecer mais difícil encontrar analogias entre as abordagens com
relação às metas do aconselhamento que com relação aos conceitos ou técnicas.
Muito do problema, porém, é que as metas apresentadas refletem diferentes
níveis de especificidade ou generalização. Parloff reconhece este problema
quando distingue entre metas mediatas e metas finais. 1111 As metas mediatas
são passos ou estágios no decorrer do processo de aconselhamento que
conduzem às metas finais. A nós parece ainda necessário um outro nível de
metas, além das mediatas e das finais (consideradas como meta longo-termo ou
geral). Desta forma, poderíamos apresentá-las em três níveis: (1) imediatas, ou
metas para o processo, (2) mediatas, ou objetivos em termos de efeitos e (3)
metas finais.
Se aceitarmos este conceito de níveis podemos encontrar concordância entre
as diversas abordagens. Os behavioristas salientam metas específicas como
conseqüências diretas do processo de tratamento. Outros terapeutas enfatizam as
metas longo-termo ou finais, e ainda que eles as expressem de maneiras um
tanto quanto diferentes, o conceito de auto-atualização parece representá-las. A
descrição de Maslow da pessoa auto-atualizante, que resulta de sua pesquisa,
constituiria uma definição provisória do termo. 1212 A descrição que Rogers faz da
pessoa que funciona de forma plena é similar. 1313 Muitos dos objetivos mais
específicos para os behavioristas seriam aceitos por terapeutas centrados na
pessoa ou existencialistas como aspectos da pessoa auto-atualizante, como
submetas ou passos na direção da meta final.
Os terapeutas do comportamento, embora enfatizem a remoção dos sintomas
como meta, também parecem reconhecer e aceitar um objetivo mais amplo. Eles
aparentemente esperam que o cliente sinta-se melhor, funcione melhor na vida
88
Lindsley, O. Free operant conditioning and psychotherapy. In J. Masserman and J.L. Moreno (Eds.),
Current psychiatric therapies. New York: Grune & Stratton, 1963.
99
May, R. Contributions of existential psychotherapy. In R. May, E. Angel & H.F. Ellenberger (Eds.),
Existence. New York: Basic Books, 1958, P. 69.
1010
Mahrer, A.R. (Ed.) The goals of psychotherapy. New York: Appleton-Century-Crofts, 1967. P. 1.
1111
Parloff, M.B. Goals in psychotherapy: mediating and ultimate. In A.R. Mahrer (Ed.), op. cit., pp. 5-19.
1212
Maslow, A.H. Motivation and personality. (Rev. Ed.) New York: Harper & Row, 1970. Chap. 12.
1313
Rogers, C. R. On becoming a person. Boston: Houghton Mifflin, 1961. Chap. 9.
em seus vários aspectos e alcance um nível mais alto para viver de acordo com o
seu potencial. Salter fala de libertar o indivíduo “desfreando-o” 1414. Wolpe
utilizava como critério de progresso não apenas a remoção de sintomas, mas
“aumento da produtividade, maior ajustamento e prazer pelo sexo, melhora nas
relações interpessoais e habilidade para lidar com conflito psicológico e stress não
excessivo”1515, embora estes não fossem alvos específicos do tratamento. Assim,
os terapeutas do comportamento também estão interessados em mudanças mais
amplas e gerais, que podem ser consideradas aspectos da auto-atualização.

O processo de aconselhamento

O processo terapêutico é visto de diferentes maneiras pelas várias


abordagens. A psicanálise salienta a importância da compreensão interna em
relação ao passado obtida pela interpretação habilidosa. Para Kelly, a terapia é o
processo de afrouxar velhas construções e renovar construções pessoais. Para
Ellis, a questão é convencer o cliente de que ele funciona irracionalmente e
ensiná-lo uma estrutura mais racional na qual possa viver. A abordagem centrada
na pessoa concebe o processo de aconselhamento como a experimentação,
numa relação psicologicamente segura, de sentimentos anteriormente muito
ameaçadores para que fossem vividos livre e plenamente pelo cliente. A terapia
comportamental vê o aconselhamento como o processo de eliminação de
comportamento indesejável através de dessensibilização, extinção e
recondicionamento. Existencialistas vêem o aconselhamento como o encontro
subjetivo entre dois indivíduos numa relação afetiva.
A organização deste livro está baseada em um continuum entre as várias
abordagens no processo de aconselhamento. O continuum vai das abordagens
mais fortemente racionais, de um lado, às mais afetivas, do outro. Na abordagem
racional, o processo de aconselhamento tende a ser planejado, objetivo e
impessoal. Na abordagem afetiva, ele é considerado caloroso, pessoal e
espontâneo. Uma abordagem enfatiza a razão e a resolução de problemas; a
outra, afeto e experiência. Ainda que provavelmente não existam formas puras de
cada uma destas abordagens, a distinção acima parece ser corroborada pela
análise dos vários pontos de vista. Na verdade, parece que há duas tendências
divergentes em aconselhamento – uma na direção de uma abordagem mais
cognitiva e outra na direção de uma abordagem afetiva – de modo que se
estabelece uma dicotomia.
Outra diferenciação de abordagens em termos do processo é a dicotomia
compreensão - ação de London. 1616 Ele inclui entre as terapias de compreensão
a terapia centrada na pessoa e a análise existencial, assim como as diversas
escolas de psicanálise. Embora haja diferenças entre as abordagens da
compreensão, London as vê como irrelevantes quando comparadas às suas
similaridades. Há duas analogias que aparecem notavelmente e minimizam a
importância de outras semelhanças e diferenças existentes: “1. O único
instrumento admitido na terapia é a fala, e as sessões terapêuticas são
deliberadamente conduzidas de maneira que, do começo ao fim, o paciente,
cliente, analisando ou aconselhando fale a maior parte do tempo e decida a maior
parte do que vai ser falado. 2. O terapeuta trabalha com uma cuidadosa tendência
a não comunicar para o paciente informações importantes ou detalhadas da sua
própria vida pessoal, ou seja, o terapeuta tende a esconder sua vida pessoal do
paciente”1717. Técnicas como associação livre trazem à tona o material reprimido
1414
Salter, A. Conditioned reflex therapy. New York: Capricorn, 1961. P. 24.
1515
Wolpe, J. The practice of behavior therapy. New York: Pergamon Press, 1969. P. 275.
1616
London, P. The modes and morals of psychotherapy. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1964.
1717
Ibid., p. 45.
ou inconsciente, o qual é respondido por reflexão, compreensão empática ou
interpretação por parte do terapeuta, conduzindo a um entendimento por parte do
cliente.
Terapias de ação, ou terapias de comportamento, por outro lado, são aquelas
não preocupadas com verbalizações (ou com a fala), mas com comportamento,
ações e sintomas. O terapeuta de ação atua no comportamento e “não se importa
nem um pouco com o que o paciente diz ou deixa de dizer sobre si mesmo ou
com o que ele conhece de si exceto na medida em que estes comportamentos
tenham valor concreto e demonstrável para a produção de mudanças”. [grifo do
autor] De acordo com London, são duas características do terapeuta de ação: “1.
O terapeuta assume uma influência muito maior na forma como são conduzidas
as sessões de tratamento (e provavelmente no resto da vida do paciente) que o
terapeuta da compreensão. 2. O terapeuta é muito mais responsável pelo
resultado do tratamento, ou seja, por quaisquer mudanças que ocorram no
paciente, que os terapeutas da compreensão”1818.
Ullmann & Krasner propõe essencialmente a mesma dicotomia em sua
distinção entre terapias evocativas ou expressivas e terapia do comportamento,
embora eles reconheçam que há sobreposição entre as técnicas. 1919 Enquanto os
conceitos da teoria de aprendizagem apenas estão presentes na terapia
expressiva, na do comportamento eles são aplicados de forma sistemática.
Sundland & Barker estudaram as diferenças de orientação num grupo de 139
psicoterapeutas membros da Associação Psicológica Americana, utilizando um
Questionário de Orientação do Terapeuta, contendo dezesseis sub-escalas. 2020
Estas escalas incluíam, entre outros, Freqüência da Atividade, Tipo de Atividade,
a Característica Emocional da Relação, Espontaneidade, Planejamento,
Conceitualização do Relacionamento, Metas da Terapia, Teoria do Crescimento
Pessoal, Teoria da Neurose, Teoria da Motivação e Critérios de Sucesso. Os
terapeutas estipularam para si mesmos, com relação à maioria das escalas,
avaliações que iam de “concordo plenamente” a “discordo plenamente”. Depois
disso, todos os terapeutas foram classificados em três grupos – Freudianos,
Sullivanianos e Rogerianos – e comparados pelas escalas. Os três grupos
apresentaram diferenças significantes em nove das dezesseis escalas, com os
Sullivanianos estando na posição mediana em oito destas comparações. O grupo
Freudiano, em comparação com o grupo Rogeriano, acreditava que o terapeuta
deveria ser mais impessoal, planejar a sua terapia, ter objetivos definidos, inibir
sua espontaneidade, usar interpretação, conceituar o caso e reconhecer a
importância da motivação inconsciente. Estes resultados corroboram com aqueles
obtidos por Strupp.2121 Apenas uma diferença foi encontrada nos terapeutas
agrupados por níveis de experiência: ainda que a maioria dos terapeutas
aceitassem uma teoria de auto-atualização inata para o crescimento pessoal, esta
aceitação foi maior no grupo dos menos experientes (significante em nível .05).
Uma análise fatorial das dezesseis escalas nos trouxe seis fatores. Um fator
geral percorreu a maioria das escalas, propiciando um único continuum principal
dentro do qual os terapeutas variam. Uma extremidade é chamada de “analítica”
(que não é apenas “psicanalítica”) e a outra é chamada de “experiencial”, por
Sundland & Barker. O terapeuta analítico enfatiza conceituação, planejamento,
processos inconscientes e restrição à espontaneidade. Mais terapeutas
encaixaram-se numa abordagem “analítica” do que na abordagem “experiencial”.
1818
Ibid., p. 78.
1919
Ullmann, L.P. & Krasner, L. (Eds.) Case studies in behavior modification. New York: Holt, Rinehart and
Winston, 1965. Introduction.
2020
Sundland, D.M. & Barker, E.N. The orientations of psychotherapists. J. consult. Psychol., 1962, 26, 201-
212.
2121
Strupp, H.H. An objective comparison of Rogerian and psychoanalytic techniques. J. consult. Psychol.,
1955, 19, 1-7.
Wallach & Strupp obtiveram resultados similares da análise fatorial dos dados
de dois grupos de terapeutas numa escala de Práticas Terapêuticas Usuais. 2222
O fator primordial foi chamado de manutenção da distância pessoal. Quatro
grupos de terapeutas – Freudianos ortodoxos, psicanalíticos em geral,
Sullivanianos e centrados na pessoa – foram comparados, com o primeiro grupo
ficando no nível mais alto no fator distância pessoal, seguido pelo segundo grupo,
e os outros dois grupos obtendo resultados semelhantes entre si, bem inferiores
aos primeiros.
McNair & Lorr estudaram as técnicas relatadas por psicoterapeutas, sendo 192
homens e 73 mulheres (67 psiquiatras, 103 psicólogos e 95 assistentes sociais)
em quarenta e quatro Clínicas para Higiene Mental de Veteranos, utilizando um
instrumento desenvolvido dentro dos princípios da Escala de Orientação do
Terapeuta de Sundland & Barker. 2323 Eles construíram como hipótese três
dimensões a serem medidas por uma escala chamada AID: ( A ) técnicas de
orientação psicanalítica, ( I ) abordagens pessoais versus abordagens impessoais
para o paciente e ( D ) métodos terapêuticos diretivos e ativos. Todas as três
dimensões surgiram a partir da análise fatorial das quarenta e nove escalas
incluídas no estudo. Altas pontuações no fator A representam técnicas
psicanalíticas tradicionais. Altas pontuações no fator I representam uma
abordagem sem envolvimento emocional, objetiva e impessoal, enquanto baixas
pontuações neste fator representam ênfase na personalidade do terapeuta e na
relação terapeuta-paciente. Altas pontuações no fator D indicam que o terapeuta
tem um conjunto de metas, planeja o tratamento, conduz as entrevistas e aceita o
ajustamento social como objetivo principal. Baixas pontuações, por sua vez,
indicam não direcionamento do terapeuta e crença na determinação que o
paciente faz para os objetivos da terapia. Ainda que os três fatores estejam inter-
relacionados, McNair & Lorr os consideram independentes.
Estes estudos sustentam que existem diferenças entre os terapeutas. O
estudo realizado por Sundland & Barker nos oferece evidência do continuum ou
dicotomia racional-afetivo. O estudo de McNair & Lorr também sustenta esta
classificação das abordagens e técnicas. Além disso, McNair & Lorr encontraram
um fator ( D ) que pode complementar a dicotomia de London. Nem Sundland &
Barker, nem McNair & Lorr concordariam com a classificação de London que une
as abordagens centrada na pessoa e existencial com a psicanálise num mesmo
grupo homogêneo de ‘terapias de compreensão’. Nenhum destes estudos incluiu
terapeutas do comportamento, e os resultados seriam certamente diferentes caso
o tivessem feito. Com o surgimento da terapia do comportamento, foi adicionada
uma nova dimensão à psicoterapia e ao aconselhamento, e é a diferença entre
esta abordagem e as demais que parece apresentar nosso maior problema para o
futuro.
Os estudos mais conhecidos sobre as analogias entre escolas de psicoterapia
em termos do processo são os de Fiedler. 2424 Fiedler descobriu que terapeutas
de diferentes escolas concordavam com relação ao que seria a natureza da
relação terapêutica ideal, e a análise fatorial ofereceu um fator comum de “boa
qualidade” das relações terapêuticas. Mas, como interpretar estes estudos em
face aos outros relatados acima, que assinalaram diferenças tão importantes? A
resposta parece estar na natureza dos instrumentos utilizados nestes estudos.
Sundland & Barker desenvolveram seu instrumento eliminando itens nos quais os
2222
Wallach, M.S. & Strupp, H.H. Dimensions of psychotherapists activities. J. consult. Psychol., 1964, 28,
120-125.
2323
McNair, D.M. & Lorr, M. An analysis of professed psychotherapeutic techniques. J. consult. Psychol.,
1964, 28, 265-271.
2424
Fiedler, F. The concept of an ideal therapeutic relationship. J. consult. Psychol., 1950,14, 235-245; Fiedler,
F. A comparison of therapeutic relationships in psychoanalytic, nondirective, and Adlerian therapeutic
relationships. J. consult. Psychol., 1951, 15, 32-38.
terapeutas concordavam. Fiedler, por outro lado, parece ter unido um grupo de
itens onde havia concordância dos terapeutas. Sundland & Barker apontam que
os itens que eles descartaram, porque não resultaram numa distribuição de
respostas, eram similares aos itens usados nos estudos de Fiedler. Estes itens
estavam relacionados à empatia. Parece, portanto, haver evidência de que os
terapeutas apresentam consenso quanto a importância da empatia e da
compreensão, ainda que os terapeutas do comportamento pareçam diminuir ao
máximo a importância da empatia. Não obstante, pode-se dizer que um mínimo
de compreensão empática se faz necessário para a continuação da interação
entre o conselheiro e o cliente; e é também um fator para a mudança efetiva,
como será demonstrado mais tarde. Assim, parece que uma relação caracterizada
por algum nível de interesse, aceitação e compreensão é básica para que seja
exercida alguma influência terapêutica. Outros fatores podem direcionar
mudanças juntamente com a linha tomada pelo terapeuta, mas é o
relacionamento que torna qualquer influência possível.
Nosso interesse neste livro está no aconselhamento e na psicoterapia
individuais. Nestas modalidades, todas as abordagens utilizam a entrevista
particular, na qual a interação verbal é o componente principal. As técnicas de
condicionamento, aspecto mais importante da terapia comportamental, podem ser
utilizadas fora da situação de entrevista, é claro, mas a questão aqui é que a
terapia comportamental também utiliza a entrevista. É também verdade que
outros métodos e técnicas das demais abordagens podem ser aplicados em
outras situações que não a sessão de aconselhamento.
Há alguns terapeutas comportamentais que se interessam pela aplicação das
técnicas de condicionamento fora da situação de entrevista. No entanto, o
controle da situação ambiental do cliente fora da entrevista é muito mais difícil que
o controle do ambiente da entrevista. Além disso, pode-se sustentar que a
aplicação de quaisquer métodos ou técnicas de aconselhamento ou psicoterapia
fora da situação de entrevista não constitui de fato aconselhamento ou
psicoterapia. O crescente uso do termo “modificação do comportamento” entre
aqueles que se interessam pelas alterações do comportamento provocadas pelas
técnicas de condicionamento indica a amplitude de seus interesses. Contudo,
Wolpe deseja manter em uso o termo “terapia comportamental” e continuar a
considerá-lo apenas um método de psicoterapia.
Para somar-se ao elemento comum que é a relação pessoal na entrevista,
parece que há certo número de outros aspectos do processo de aconselhamento
compartilhados pela maioria das abordagens (se não por todas). Entre eles estão
determinadas características do conselheiro ou terapeuta e do cliente ou paciente.
A primeira característica do terapeuta é o interesse verdadeiro pelo cliente, um
forte desejo de ajudá-lo, para influenciá-lo ou transformá-lo. Conselheiros e
terapeutas não apenas aceitam a possibilidade da mudança do cliente, mas estão
genuína e fortemente interessados em ser agentes desta mudança. Se não fosse
assim, não estariam engajados em aconselhamento ou psicoterapia.
Além disso, todos os conselheiros e terapeutas esperam que seus clientes
mudem. Esta expectativa pode variar em intensidade, em alguns exemplos
apresentando-se de forma altamente otimista, até mesmo entusiástica, e sendo
mínima em outros. Mas ela sempre está presente. Há sempre uma atitude de
esperança e expectativa pela mudança. Novamente, sem essa expectativa os
terapeutas não continuariam seu trabalho. Um fator que não pode estar
independente ou separado dos demais já discutidos é a aceitação e o respeito
pelo cliente como pessoa, um indivíduo que se apresenta apesar dos seus
problemas e dificuldades ou suas características desagradáveis. Em outras
palavras, a aceitação e o respeito não estão condicionados pela demonstração no
comportamento do cliente de coisas que o conselheiro entenda como desejáveis,
boas ou saudáveis. A aceitação não impede, portanto, que exista discordância
com relação às atitudes, crenças e comportamentos do cliente; e isto não significa
aprovação. A aceitação é um respeito e um apreço pelo cliente que se dá apesar
das suas características indesejáveis. Esta é a aceitação positiva incondicional da
terapia centrada na pessoa. Parece que essa postura deve sempre existir, pelo
menos em nível mínimo, caso contrário um conselheiro não poderia continuar sua
relação com o cliente. De fato, os conselheiros não continuam um trabalho
quando esta condição não existe; portanto, os clientes são escolhidos com base
na possibilidade de que exista aceitação e respeito.
Outro elemento que parece ser comum a todas as abordagens recebe
diversas designações diferentes. Na abordagem centrada na pessoa recebe o
nome de “autenticidade” ou “congruência” do terapeuta. Outros o chamam de
“sinceridade”, “honestidade” ou “abertura”. Os existencialistas também fazem uso
do termo “autenticidade”. Algumas abordagens (como a de Ellis) não se referem
especificamente a esta característica, mas está explícito nas discussões dentro
destas abordagens, e particularmente em seus protocolos, que este é um
elemento sempre presente.
Há uma última característica que une terapeutas das mais diversas
abordagens. É o fato de que cada terapeuta acredita e confia na teoria e no
método que utiliza. Se por acaso ele sentisse que aquele não era o melhor
método (ou a melhor abordagem) não o teria escolhido, adotaria outro. Podemos
criar a hipótese de que o sucesso (ou, ao menos, os relatos de sucesso) tem
grande relação com o grau de confiança que o terapeuta tem na sua abordagem.
O fracasso ou a inabilidade do terapeuta em se comprometer com uma
determinada abordagem aparentemente limitam sua efetividade e fazem dele um
mero técnico. Um aspecto comum da terapia, portanto, parece ser o compromisso
do terapeuta com um método ou abordagem particular.
A maior parte das abordagens (se não todas), desta forma, parecem
contemplar uma relação que é caracterizada, por parte do conselheiro ou
terapeuta, por: uma crença na possibilidade de mudança do cliente; a expectativa
de que o cliente mude; o interesse pelo cliente, incluindo um desejo de ajudá-lo,
influenciá-lo ou mudá-lo; sinceridade e honestidade no processo terapêutico;
confiança na abordagem utilizada para que se processe a mudança no cliente.
É necessário adicionar um outro ponto. A questão é que o aspecto crucial do
impacto ou da contribuição do terapeuta não é a sua personalidade ou seu
comportamento reais, ou mesmo sua intenção no relacionamento. É a percepção
do cliente que determina as características e contribuições do terapeuta. Portanto,
as características do cliente, bem como suas atitudes, são importantes aspectos
do relacionamento.
Alguns aspectos comuns aos indivíduos que chegam aos conselheiros ou
terapeutas são aparentes. Primeiro, como indicado acima, eles comunicam uma
“dor” – estão sofrendo ou estão infelizes por conta de conflitos, sintomas, desejos
e aspirações insatisfeitas, sentimentos de fracasso ou inadequação, ausência de
sentido em suas vidas. Eles estão, portanto, motivados a mudar. Os clientes nem
sempre estão conscientes da sua “dor” ou, se estão, podem não sentir a
necessidade de ajuda ou não querê-la de um conselheiro ou de um terapeuta. É
claro que pode ser mantido que de alguma forma todos sentimos uma “dor” e que
portanto poderíamos nos beneficiar do aconselhamento.
Em segundo lugar, os clientes também acreditam que a mudança seja
possível e esperam mudar, esperam ser ajudados. Frank já enfatizou a
universalidade deste fator nos clientes. 2525 Cartwright & Cartwright mostraram
2525
Frank, J.D. The dynamics of the psychotherapeutic relationship. Psychiatry, 1959, 22, 17-39; Frank, J.D.
Persuasion and healing. Baltimore: Johns Hopkins, 1961; Rosenthal, D. & Frank, J.D. Psychotherapy and the
placebo effect. Psychol. Bull., 1956, 53, 294-302.
que este é um fator complexo: pode ser uma crença de que a melhora irá ocorrer,
uma crença no terapeuta como principal fonte de ajuda ou uma crença em si
mesmo (cliente) como principal fonte de ajuda.2626 Estes autores sentiram que
apenas a última destas crenças conduz à melhora de forma linear e positiva. As
outras crenças, porém, em algum nível estão presentes em todos os clientes. O
cliente precisa perceber que o conselheiro está interessado por ele e quer ajudá-
lo. Esta crença parece envolver um complexo de atitudes. O cliente deve ter
alguma confiança no conselheiro e em seus métodos, ou não iniciaria o
aconselhamento.
Em terceiro lugar, o cliente deve ser ativo e participar do processo. Ele não é
um receptor passivo, como é o paciente com uma doença física sob os cuidados
de um médico. Todo aprendizado (mudança de comportamento) requer atividade
(seja ela motora, verbal ou intelectual) por parte do aprendiz. Esse tipo de
comportamento no aconselhamento e na psicoterapia inclui a auto-análise e a
auto-exploração. Truax & Carkhuff referem-se a isto como exploração intrapessoal
ou auto-descoberta.2727 Jourard2828 e Mowrer2929 também falam em auto-
descoberta. Parece que o cliente, assim como o terapeuta, deve ser genuíno,
honesto e estar aberto ao processo de terapia.
Assim, parece que todas as abordagens lidam com clientes que estão
necessitando ajuda, reconhecem esta necessidade, acreditam que podem mudar,
acreditam que o conselheiro pode ajudá-los e realizam alguma atividade no intuito
de mudar.
Com isso fica claro que todas as abordagens estão envolvidas em um
relacionamento entre um conselheiro e um cliente no qual cada um contribui com
determinadas características que conduzem à mudança do cliente.

UMA TENTATIVA DE INTEGRAÇÃO

Ainda que existam muitas similaridades, também há muitas diferenças


entre as diversas abordagens em aconselhamento ou psicoterapia. A maior
divergência talvez esteja entre as terapias comportamentais, por um lado, e as
abordagens existencialistas (incluindo a terapia centrada na pessoa), por outro. A
despeito de todas as semelhanças e concordâncias notadas acima, parece que
estes dois pontos de vista são percebidos por seus partidários e por outros como
absolutamente contraditórios. As terapias comportamentais parecem ser
objetivas, impessoais, orientadas pela técnica e mecânicas. A abordagem
existencial pode ser vista como subjetiva, pessoal e não interessada pela técnica.
Será possível reconciliar estas abordagens aparentemente tão incompatíveis?
Reconhecendo estas tendências divergentes não apenas na psicoterapia, mas em
toda psicologia, Rogers afirmou que elas “parecem irreconciliáveis porque nós
ainda não desenvolvemos um quadro de referência mais amplo que possa dar
continência às duas.”3030
Uma reconciliação possível para as visões de homem divergentes pode
derivar da consideração dos diferentes modelos de homem delineados por Allport,
que escreve: ”o problema com nossas teorias de aprendizagem atuais não é tanto

2626
Cartwright, D.S. & Cartwright, Rosalind D. Faith and improvement in psychotherapy. J. counsel. Psychol.,
1958, 5, 174-177.
2727
Truax, C.B. & Carkhuff, R.R. Client and therapist transparency in the psychotherapeutic encounter. J.
consult. Psychol., 1965, 12, 3-9.
2828
Jourard, S.M. The transparent self. New York: Van Nostrand, 1964.
2929
Mowrer, O.H. The new group therapy. New York: Random House, 1961. P. 85
3030
Rogers, C.R. Divergent trends. In R. May (Ed.), Existential psychol. New York: Random House, 1961, p.
85.
que elas estejam erradas, mas que elas sejam parciais” 3131. Assim, podemos
dizer a respeito da terapia comportamental (ou da abordagem do
condicionamento) que seu problema não é que esteja errada, mas que seja
incompleta enquanto descrição ou teoria sobre a natureza do homem, seu
comportamento e sua modificação. É uma abordagem “nada além disso”. Não se
questiona a existência do condicionamento, o fato de que o homem é um ser
reativo que pode ser condicionado e recondicionado. Mas o homem é mais do que
isso. Ele é também um ser ativo, um ser que inicia a ação. Seu comportamento
influencia o ambiente da mesma forma que é influenciado por ele.
O homem não é meramente um mecanismo ou um organismo controlado
por estímulos objetivos do ambiente e subjetivos vindos de dentro de si. O
conceito de comportamento operante reconhece que o homem também atua em
seu ambiente. Ele seleciona e define, através das suas percepções, os estímulos
a que vai responder. Ele é, portanto, um ser que vive, ou existe, que pensa e
sente, que interpreta e define seu ambiente e a si mesmo de certas maneiras. Seu
mundo é determinado em parte pelas suas percepções e não apenas pela
natureza objetiva dos estímulos. Esta é uma abordagem “algo além”.
Como indicado acima, parece haver consenso quanto à necessidade de se
estabelecer um relacionamento no aconselhamento ou na psicoterapia. Um
relacionamento complexo, com diversos aspectos. Não simplesmente uma
relação cognitiva, intelectual ou impessoal, mas uma relação afetiva, experiencial
e altamente pessoal. Não necessariamente irracional, mas que contenha
elementos não racionais. A natureza dos laços entre colegas é essencialmente
afetiva.
Acumulam-se evidências de que o elemento efetivo no aconselhamento
seja a natureza do relacionamento estabelecido pelo conselheiro. Goldstein,
revisitando a literatura sobre as expectativas terapeuta-paciente na psicoterapia,
conclui: ”Não pode mais haver dúvida quanto à importância primária da relação
terapêutica no todo da situação terapêutica” 3232. O terapeuta do comportamento
parece não estar interessado ou minimizar a importância do relacionamento. No
entanto, o relacionamento ocupa em seu método um posto mais importante do
que ele mesmo admite. Deve estar claro que as características do conselheiro ou
terapeuta e do cliente discutidas acima manifestam-se sempre em uma relação.
A relação de aconselhamento sempre envolve aspectos do
condicionamento. A atmosfera aceitadora, compreensiva e não ameaçadora da
situação terapêutica oferece oportunidade para a extinção da ansiedade e para a
dessensibilização de estímulos ameaçadores. Nesta relação, na qual a ameaça
externa é minimizada, idéias, palavras, imagens e sentimentos ansiógenos ficam
livres para aparecer. Mais ainda, aparecem numa seqüência que se assemelha ao
tipo de hierarquia estabelecida por Wolpe, ou seja, da menos para a mais
ansiógena. Portanto, em qualquer relação terapêutica não ameaçadora, a
dessensibilização pode ser alcançada como foi em Wolpe. Esta relação, por
minimizar a ansiedade evocada pelo externo, torna possível para o cliente
experienciar e trazer à tona suas ansiedades internamente induzidas na medida
em que ele for aos poucos se apropriando delas dentro da relação aceitadora.
Além disso, o condicionamento operante serve para reforçar a produção
das verbalizações, elas que, acredita o terapeuta, têm efeito terapêutico ou são ao
menos necessárias para o transcorrer da terapia. O terapeuta recompensa estas
verbalizações através do seu interesse e da sua atenção ou então por meio de
aprovação e elogio explícitos. No começo da terapia, elementos negativos podem
ser reforçados – por exemplo, a expressão de problemas, conflitos, medos e
ansiedade, bem como auto-referências negativas. Conforme a terapia progride, o
3131
Allport, G.W. Psychological models for guidance. Harvard educ. Rev., 1962, 32, 373-381.
3232
Goldstein, A.P. Therapist-patient expectancies in psychotherapy. New York: Macmillan, 1962, p. 105
terapeuta pode reforçar elementos positivos – por exemplo, esforços na resolução
de problemas, pensamentos, atitudes e sentimentos positivos, bem como auto-
referências positivas. O terapeuta tem a expectativa de que aconteçam
progressos desse tipo e se mostra sensível a esta expressão no cliente.
A questão a ser encarada, para citar Jourard, é: “Que condições favorecem
a produção do comportamento operante no terapeuta que podemos dizer ser
‘facilitador de crescimento do paciente’? Ou seja, que condições evocam no
terapeuta as atitudes que estimulam o cliente a emitir comportamentos que
contribuem para seu crescimento?”3333
Os princípios do condicionamento têm contribuído para a compreensão da
natureza do processo terapêutico e da relação terapêutica. Mas não o
condicionamento mecânico que ocorre em um rato na caixa de Skinner. Falamos
do condicionamento como aspecto da relação terapêutica que se manifesta e que
é influenciado por ela. Há diversas evidências de que o grau e a extensão do
condicionamento são influenciados pelas atitudes e personalidade do
experimentador e pela relação entre este e seu sujeito. 3434 Nesta relação estão
presentes características do cliente – seus interesses, motivações, pensamentos,
atitudes, percepções e expectativas – bem como do conselheiro. Há também a
influência da situação na qual a relação ocorre – o que num experimento de
pesquisa se chama de caraterísticas da demanda. Como disseram Ullmann &
Krasner, “as expectativas, antecipações, etc., tanto no sujeito quanto no
examinador, têm efeito importante sobre a resposta individual à situação”, e “os
melhores resultados são obtidos quando o paciente e o terapeuta estabelecem
um bom relacionamento interpessoal”3535 A relação, portanto, não pode ser
ignorada, mesmo numa terapia comportamental. Krasner lembra que Skinner
classificava a atenção como reforço genérico. 3636 As influências mais poderosas
para o comportamento – ou, em termos de condicionamento, os reforços – são o
respeito, o interesse, a consideração e a atenção do terapeuta. A demonstração
experimental dos efeitos destes reforços generalizados apóia a teoria da
importância do relacionamento no aconselhamento e na psicoterapia.
Há ainda um ponto adicional que enfatiza a importância da relação
terapêutica. Muitos, se não a maioria dos problemas e dificuldades dos clientes
envolvem relações interpessoais. Cada vez mais tem-se reconhecido que boas
relações interpessoais são caracterizadas por honestidade, sinceridade e
espontaneidade. A psicoterapia é uma relação que tem estas características e é,
portanto, uma situação na qual o cliente tem oportunidade de aprender sobre
boas relações interpessoais. De fato, a terapia seria limitada se tentasse
influenciar as relações interpessoais do cliente apenas dando a ele uma outra
forma de relação. E se tentasse influenciar relacionamentos interpessoais
evitando o estabelecimento de uma relação terapêutica, seria ineficiente. Ensinar
(ou condicionar o comportamento individual) de maneira mecânica não traria
grande esperança quanto à generalização disso para outros relacionamentos fora
da terapia. O que o terapeuta faz é prover um modelo de bom relacionamento
interpessoal para o cliente.
London acredita que Mowrer oferece uma solução às inadequações da
divisão entre terapias de compreensão, por um lado, e terapias de ação, por
outro.3737 Porém, a abordagem de Mowrer, mesmo que ainda não tenha sido
3333
Jourard, S.M. On the problem of reinforcement by the therapist of healthy behavior in the patient. In F.J.
Shaw (Ed.), Behavioristic approaches to counseling and psychotherapy. Tuscaloosa, Ala.: University of
Alabama Press, 1961, p. 14.
3434
Ullmann, L.P. & Krasner, L. op.cit.
3535
Ibid., p. 43.
3636
Krasner, L. The therapist as a social reinforcement machine. In H.H. Strupp & L. Luborsky (Eds.),
Research in psychotherapy. Vol. II. Washington: American Psychological Association, 1962. P. 67.
3737
London, P. op. cit.
apresentada ou desenvolvida de forma sistemática, é uma terapia de relação. 3838
Mowrer, reconhecendo que a personalidade é produto de relacionamentos
interpessoais, enfatiza o valor terapêutico da disponibilidade e da auto-descoberta
nestas relações. No entanto, ainda que sinta que tal abertura possa iniciar-se no
relacionamento com um terapeuta individual, ele afirma que para isso raramente
são necessárias mais que uma ou duas entrevistas. Mowrer acredita que o cliente
deve transportar-se rapidamente do grupo de dois para o grupo maior de ‘outros’
significativos em sua vida (para usar um termo de Sullivan) ou grupos primários
(em termos sociológicos).
Não há, portanto, contradição básica ou necessária entre terapia do
comportamento e terapia de relação. Uma enfatiza a modelagem ou modificação
de aspectos específicos do comportamento através de recompensas ou reforços
específicos. A outra enfatiza modificações mais genéricas do comportamento
(incluindo mudanças de atitude e sentimento), obtidas por meio de reforços
genéricos. Ambas utilizam os princípios da aprendizagem – uma de maneira mais
limitada, enfatizando o condicionamento, a outra de forma mais abrangente,
enfatizando o que poderíamos chamar de aprendizagem social. 3939 Os terapeutas
comportamentais, como apontam Ullmann & Krasner, são sistemáticos na
aplicação que fazem de conceitos de aprendizagem específicos. 4040 Mas também
pode ser dito que os terapeutas de relação são sistemáticos na aplicação de
reforços generalizados. O condicionamento e a terapia comportamental estão
apoiados em evidências empíricas, incluindo laboratório e pesquisa experimental.
A abordagem de relação também tem apoio em pesquisas, incluindo algumas
sobre condicionamento. É interessante e significativo que ambos os grupos
estejam chegando às mesmas conclusões, um a partir do trabalho de laboratório
com condicionamento, o outro da experiência e pesquisa em aconselhamento e
psicoterapia. É importante, porém, que os terapeutas comportamentais consigam
reconhecer a complexidade do processo de aprendizagem com seus aspectos
sociais ou de relacionamento, e que também os terapeutas que enfatizam o
relacionamento estejam conscientes de que o condicionamento é um aspecto do
aconselhamento ou psicoterapia. O processo total, ainda que seja um
aprendizado, é do tipo complexo. Vários tipos de aprendizagem estão envolvidos
e não simplesmente o condicionamento operante ou clássico. Fazem parte deste
processo elementos perceptivos, cognitivos e afetivos, sendo que todos eles são
importantes para o comportamento e para sua modificação. A dificuldade de se
prover uma relação terapêutica, com seus necessários aspectos afetivos, é maior
que a de se criar uma relação de condicionamento de laboratório, ou mesmo a de
se estabelecer numa entrevista uma relação racional de resolução de problemas.
A complexidade do processo e a importância do interesse, consideração e
compreensão do terapeuta têm uma implicação fundamental. O processo não
pode ser mecanizado, simplificado ou controlado em termos de planejamento ou
de objetivos, manipulação forjada de recompensas para expressar interesse,
consideração, etc. Isto porque o comportamento do terapeuta só pode ser efetivo
quando é sincero e espontâneo, não quando é uma técnica planejada. O
terapeuta é mais efetivo quando age como pessoa – quando ele é, como diz a
abordagem centrada no cliente, “autêntico” no relacionamento. Enquanto os
terapeutas do comportamento esforçam-se para ser efetivos tentando reduzir o
tratamento às bases da técnica, parece que para ser o mais efetivo possível o
terapeuta deve ser uma pessoa humana real. A influência mais efetiva é aquela
em que uma outra pessoa oferece um relacionamento humano genuíno.

3838
Mowrer, O.H. op. cit.
3939
Murray, E.J. Learning theory and psychotherapy: biotropic versus sociotropic approaches. J. counsel.
Psychol., 1963, 10, 251-255
4040
Ullmann, L. P. & Krasner, L. op. cit., p. 37.
Os comentários de Jourard são relevantes aqui:

Acredito que estamos prestes a descobrir que quando um terapeuta


experiente abre mão da técnica e é apenas ele mesmo na presença do seu
paciente: 1. Ele está, na verdade, criando condições que provoquem um
‘ser si mesmo’ verdadeiro, ou seja, uma auto-descoberta espontânea e não
forjada em seu paciente. Isto é análogo a preparar a bomba d’água ou
mostrar ao rato como funciona a alavanca. 2. Ele está oferecendo um
reforço poderoso para o ‘ser si mesmo’ verdadeiro em seu paciente. ‘Ser si
mesmo’ gera ‘ser si mesmo’. 3. Ao responder espontaneamente ao
paciente, o terapeuta não apenas evoca o ‘ser si mesmo’ verdadeiro, mas
também extingue muitas das respostas que evocam a doença emitidas pelo
paciente. 4. Ele está evitando os tão prejudiciais comportamentos forjados
e a manipulação impessoal, sua e de seu paciente. De forma mais
apropriada, ele está oferecendo ao paciente um modelo real de
comportamento honesto e saudável.4141

As evidências parecem atribuir a uma forma particular de relacionamento o


papel de elemento crucial no aconselhamento e na psicoterapia. Uma relação não
tanto caracterizada pelas técnicas que o terapeuta usa, mas por quem ele é; não
tanto por aquilo que ele faz, mas pela forma como faz. Rogers diz que “alguns dos
estudos realizados recentemente sugerem que um terapeuta autêntico e
calorosamente humano, interessado apenas em compreender a cada momento os
sentimentos desta pessoa que comparece para a relação com ele é o terapeuta
mais efetivo. Claramente, nada indica que o terapeuta friamente intelectual,
analítico e fatual seja efetivo” 4242. Muito do que fazem os terapeutas é supérfluo
ou não tem relação com a sua efetividade; na verdade, é provável que boa parte
do seu êxito não esteja ligado àquilo que eles fazem, ou mesmo ocorra apesar do
que fazem, desde que ofereçam esta relação que tantos terapeutas das mais
diversas abordagens parecem oferecer. Pelo menos em algum nível, mesmo os
behavioristas mais radicais estabelecem um relacionamento desse tipo.

DUAS QUESTÕES

A conclusão de que a essência do aconselhamento ou psicoterapia


consiste num relacionamento humano autêntico caracterizado por interesse,
consideração, compreensão empática e congruência por parte do terapeuta
conduz a duas questões.
1. O que há de único neste relacionamento? Em que ele difere dos outros
bons relacionamentos humanos? Se a resposta for, como parece óbvio, que nada
existe de único ou diferente, então o que há de especial na prática de
aconselhamento ou psicoterapia? Fiedler concluiu a partir de seus estudos que
“uma boa relação terapêutica é muito semelhante a qualquer outro bom
relacionamento interpessoal” 4343
Esta visão pode sofrer oposição daqueles que a sentem privar conselheiros
ou terapeutas de seus poderes únicos, aqueles que temem que esta situação
“deixe aquele que os pratica sem especialidade” 4444 Não deve nos causar
surpresa, porém, o fato de que as características da psicoterapia sejam iguais às
de todas as boas relações humanas. E isto também não significa, por não
4141
Jourard, S.M. op. cit., pp. 15-16.
4242
Rogers, C.R. On becoming a person. Boston: Houghton Mifflin, 1961. P. 269.
4343
Fiedler, F. The concept of an ideal therapeutic relationship. J. consult. Psychol., 1950, 14, 235-245.
4444
Mowrer, O.H. op. cit., p. 235.
estarem estas características limitadas ao aconselhamento ou à psicoterapia, que
estes não sejam relevantes ou específicos. A essência da perturbação emocional
são relações humanas perturbadas. O indivíduo foi alienado, separado da
comunidade dos homens. Suas relações com outros sofreram uma ruptura ou
foram construídas sobre uma base insegura, falsa ou por demais frágil. Ele
precisa restabelecer boas relações com outros.
No entanto, muitas vezes ele não consegue fazer isso sozinho, por
diversas razões. Ele pode não estar apto a modificar o comportamento que
contribui para a manutenção destes relacionamentos empobrecidos. Ele pode não
saber quais comportamentos estão envolvidos. Outros podem não dar a ele a
chance de mudar, ou mesmo que ele mude, podem não reconhecer, aceitar ou
acreditar na permanência da mudança. O comportamento destes ‘outros’, pelo
menos em parte estimulado pelo próprio comportamento do sujeito em questão,
contribui para o círculo vicioso de relações empobrecidas. Tal situação não
contribui em nada com a mudança; o indivíduo está ou sente-se acuado pelos
outros e reage, por sua vez, acuando-os.
Assim, é preciso alguém que possa aceitar, em todo seu comportamento
perturbado, irritante e ameaçador, o indivíduo que tem um problema, e possa
mostrar a ele um relacionamento não ameaçador no qual ele consiga responder
abertamente, também de forma não ameaçadora. A terapia oferece a
oportunidade de aprender como se relacionar com os outros de maneira diferente,
com maior efetividade. Para isso, personifica os princípios do que seja um bom
relacionamento humano, algo que pode parecer simples, mas não é tão
largamente praticado fora da situação de terapia. Se tal relação fosse vastamente
aplicada, possivelmente não existiriam pessoas emocionalmente perturbadas,
exceto aquelas cuja perturbação tem origem orgânica. A dificuldade de se
experimentar um relacionamento desta ordem dentro dos padrões em que ocorre
boa parte das inter-relações humanas talvez seja o fundamento da atitude do
terapeuta de evitar que ocorra entre ele e seu cliente qualquer relação fora da
relação terapêutica. Ainda que haja algum mérito na análise de Schofield da
psicoterapia como uma relação na qual se compra amizade 4545, a terapia, porém,
é mais que amizade, pelo menos no sentido usual da palavra. Se numa visão de
psicoterapia como algo obscuro e misterioso o terapeuta se assemelha a mágicos
e curandeiros, uma visão de compra e venda de amizade o coloca ao lado de
garotos e garotas de programa.*
2. As características de aconselhamento ou psicoterapia desenvolvidas
acima são freqüentemente consideradas elementos não específicos. Muitas vezes
é dito que elas não têm relação com a perturbação específica de cada cliente e
que, portanto, embora possam ser consideradas condições necessárias, não são
suficientes. Além disso, características como atenção, interesse, consideração, fé,
confiança e expectativa são parte daquilo que é chamado efeito placebo no
tratamento de doenças físicas. Ainda que não se costume pedir a eliminação
desse tipo de efeito no aconselhamento ou psicoterapia, é geralmente aceito que,
como fatores não específicos, eles não sejam suficientes e que outros métodos ou
técnicas devam ser incluídos para que se possa lidar com aspectos específicos da
perturbação. Argumenta-se que qualquer método ou técnica só pode ser
considerado útil se produzir efeitos maiores que os obtidos por elementos
placebo.
O efeito placebo é um efeito psicológico. Quando o interesse e a
consideração são elementos que ajudam a determinar o efeito físico ou fisiológico
de uma droga ou medicação administrada em uma doença ou perturbação
conhecida, é justificável considerar este efeito como externo e não específico.
4545
Schofield, W. Psychotherapy: the purchase of friendship. Englewood Cliffs, N.J.: Prentice-Hall, 1964.
**
places him in the same category as taxi dancers, gigolos and call girls. – N.T.
Mesmo aqui, porém, há interesse em se reconhecer e estudar os efeitos de tais
fatores psicológicos no funcionamento físico.
Mas o conceito de externo no efeito placebo pode não ser aplicável ao
aconselhamento ou psicoterapia. Aqui, a desordem ou perturbação é psicológica.
Não é lógico que o tratamento específico para uma condição psicológica seja
psicológico? Não parece razoável que o tratamento contra relações humanas
perturbadas seja o oferecimento de uma boa relação? Seria o efeito placebo,
como afirmam Rosenthal & Frank, “uma forma não específica de psicoterapia”? 46
46
Há muito sabe-se que qualquer nova forma de tratamento, do choque
elétrico aos tranqüilizantes, consegue grande êxito logo de início, quando é
introduzida, mas que este sucesso diminui com o tempo. Isto porque no começo
todos esperam que o tratamento funcione – há esperança e expectativa por parte
do paciente e do terapeuta. Os pacientes tornam-se objeto de atenção e interesse
crescentes. Com o passar do tempo, porém, conforme o procedimento se torna
rotina, conforme dúvidas e questões aparecem (já que nem sempre há êxito), a
efetividade cai. O sucesso inicial foi resultado, totalmente ou em parte, do efeito
placebo. Novamente, é razoável que, na avaliação dos resultados de tratamentos
experimentais, este efeito seja considerado não específico. Mas nós também
poderíamos olhar o aparente sucesso da terapia comportamental da mesma
forma. Quanto deste sucesso é na verdade intensificado pelo efeito placebo? Não
seria necessário que este efeito fosse eliminado para que se pudesse avaliar o
efeito real do condicionamento?
É estranho que, mesmo com tanta evidência sobre a força do efeito
placebo, ele não tenha sido reconhecido como a abordagem mais efetiva no
tratamento de problemas psicológicos. Como colocam Krasner & Ullmann, “ainda
que todo problema tenha sido entendido anteriormente como a eliminação dos
‘efeitos placebo’, parece razoável maximizar estes efeitos na situação de
tratamento com o intuito de aumentar a probabilidade do cliente modificar-se. Há
um número cada vez maior de evidências segundo as quais o tal ‘efeito placebo’ é
um eufemismo para as variáveis da influência do examinador” 4747
O efeito placebo, enquanto efeito psicológico, inclui grande variedade de
elementos – todos os elementos de um relacionamento psicológico, na verdade.
Somados às variáveis do relacionamento enfatizadas acima, também inclui
comportamentos do terapeuta que façam crescer seu prestígio, status e
autoridade, bem como sugestão direta ou indireta – elementos que aparecem de
forma proeminente na terapia comportamental. Estes fatores mostraram-se
efetivos em estudos sobre placebo envolvendo medicamentos. A relação entre a
efetividade da terapia comportamental e a presença destes fatores ainda não foi
avaliada.

UM CONTINUUM DE RELAÇÕES DE AJUDA

O reconhecimento das analogias básicas entre as diversas formas de


abordagem ao aconselhamento ou psicoterapia, enfatizando o relacionamento, é
importante. No entanto, as diferenças não podem ser ignoradas, e nos parece que
deve ser realizada alguma tentativa de se desenvolver um modelo ou estrutura
teórica que consiga acomodar estas diferenças. Tal modelo minimizaria a
tendência de dicotomizar, de afirmar uma posição do tipo ‘um ou outro’ tal como a
representada por London entre as terapias de “compreensão” e de “ação” ou entre
4646
Rosenthal, D. & Frank, J.D. op. cit.
4747
Krasner, L. & Ullmann, L.P. (Eds.) Research in behavior modification. New York: Holt, Rinehart and
Winston, 1965, p. 230.
o “modelo médico” e o “modelo de aprendizagem”. Tais distinções, como aponta
Lazarus, são supersimplificações.4848
Outros autores sugerem que, ao invés de um único modelo ou uma
dicotomia, exista uma multiplicidade de métodos e abordagens separados. A
proliferação de teorias, métodos e técnicas propiciou o ressurgimento de uma
proposição recorrente segundo a qual as técnicas devem estar adaptadas aos
problemas e aos clientes. Ford & Urban, na retrospectiva que fizeram para a
Annual Review of Psychology, notaram uma ênfase crescente neste tratamento
diferencial.4949 Krumboltz afirmou desta forma: “O que precisamos saber é que
procedimentos e técnicas são, quando usados para conseguir que tipo de
mudança de comportamento, mais efetivos com quais tipos de clientes quando
aplicados por quais tipos de conselheiro”5050.
De forma semelhante, Blocher escreve: “As velhas questões do tipo ‘O
aconselhamento é efetivo?’ ou ‘Qual teoria de aconselhamento está correta?’ são
extremamente retóricas. Elas deram lugar a perguntas como ‘Quais tratamentos
nas mãos de quais conselheiros podem oferecer quais benefícios para clientes
específicos?’”5151 Paul coloca: “Em toda sua complexidade, a questão para a qual
todos os resultados de pesquisa devem em última análise ser direcionados é a
seguinte: Qual tratamento, realizado por quem, é o mais efetivo para este
indivíduo com aquele problema específico, e sobre que conjunto de
circunstâncias?”5252 E Strupp & Bergin, depois de analisarem centenas de
referências, afirmam: “O problema da pesquisa em psicoterapia... deve sofrer uma
reformulação... Que intervenções específicas produzem mudanças específicas em
pacientes específicos sob condições específicas?”5353
Esta abordagem parece bastante empírica. Contudo, como programa de
pesquisa ela é praticamente impossível, pelo menos atualmente. Sua realização
exigiria (a) um sistema de classificação para os clientes e/ou problemas dos
clientes, (b) uma classificação dos tratamentos e abordagens em aconselhamento
e (c) um sistema de classificação para os conselheiros. Após algumas centenas
de anos de esforços, a psiquiatria ainda não conseguiu obter um sistema de
diagnósticos aceitável (e podemos até mesmo questionar se um dia conseguirá).
Uma leitura dos capítulos anteriores deste livro torna claro que não temos um
sistema para realizar a classificação dos métodos de tratamento. A pesquisa
sobre as características dos conselheiros apenas começou.
É possível, porém, esboçar um começo em termos de grandes diferenças
entre métodos de tratamento e clientes. Parte da nossa dificuldade atual é que a
palavra “aconselhamento”, particularmente, e cada vez mais a palavra
“psicoterapia” estão sendo usadas de maneira tão ampla que cobrem uma grande
variedade de atividades. Seria interessante se pudéssemos de alguma forma
delimitar estes termos ou obter consenso sobre a existência de diferentes tipos de
aconselhamento ou psicoterapia. Se isto não puder ser feito, talvez seja possível
ao menos distinguir a terapia comportamental daquilo que poderíamos chamar
terapia de relação. Além disso, poderia ser útil pensar em termos de um
continuum de relações de ajuda. Um conceito ainda mais amplo é o de métodos
de ajuda, que incluiria métodos outros que não envolvem qualquer relação entre
os participantes, tais como intervenção ambiental ou manipulação social. No

4848
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entanto, isto vai além do nosso interesse aqui, que é tentar introduzir alguma
ordem na variedade de relações de ajuda que envolvem contatos pessoais tais
como no aconselhamento ou na psicoterapia (pensados no sentido usual dos
termos).
A figura seguinte apresenta esta tentativa. Muitas variáveis subjacentes ao
continuum de relações de ajuda estão indicadas. As primeiras três são variáveis
contínuas, não dicotomizadas; a quarta e a quinta talvez sejam dicotomias.
Este modelo nos dá uma base para “diagnóstico” ou classificação dos
problemas dos clientes e das avaliações do tratamento num sentido amplo e
geral. Então, o tratamento é específico. É interessante que, neste sentido, a
relação é, como sugeriram Wolpe e outros, não específica na terapia
comportamental, mas o tratamento específico na terapia de relação. A terapia de
relação é o tratamento específico para os clientes cujo problema está na carência
de relacionamentos interpessoais facilitadores. Portanto, para este problema a
relação é necessária e suficiente. E para outros problemas ela pode ser
necessária, mas não suficiente. Um cliente que carece de informação ou
habilidades precisa de mais que uma relação; precisa de informação e instrução.
É claramente possível, e de fato provável, que muitos clientes tenham um certo
número de problemas diferentes que exigem vários métodos diferentes de
tratamento. O conselheiro ou psicoterapeuta – ou, para usar um termo genérico, o
profissional de ajuda – deve decidir em qual porção do continuum de relações de
ajuda ele deseja ou é competente para se situar. Os profissionais de ajuda
parecem ter o direito de limitar seu trabalho se assim desejarem, encaminhando
os clientes que precisam de outros tipos de ajuda para problemas particulares.

CONTINUUM DE RELAÇÕES DE AJUDA:

Entrevista Instrução Modificação de Terapia do Terapia de


informativa subjetiva comportamento comportamento relação
(educação) (educação) (reeducação)
Cognitiva Afetiva

Impessoal Pessoal

Específica Geral

Aprendizagem Performance
(resposta fora do (resposta no
repertório) repertório)

Relação como Relação como


meio essência

O conceito da multiplicidade de relações de ajuda, todas envolvendo as


variáveis de um bom relacionamento humano, ainda que em diferentes níveis,
com algumas envolvendo outras variáveis, incluindo os métodos da terapia
comportamental, parece propiciar fundação ou estrutura para o desenvolvimento
de um sistema geral, uma teoria da ajuda ou do comportamento terapêutico.

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