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Resumo: Neste artigo analisam-se alguns dados do Abstract: This article analyzes some data from Census
Censo Agropecuário 2017 do IBGE, referentes à agri- of Agricultural IBGE 2017, referring to family farming
cultura familiar no Estado da Bahia. Fazem-se compa- in the State of Bahia. Comparisons are made in relation
rações com o Brasil e a Região Nordeste. Como apoio, to Brazil and the Northeast region. As support, comple-
utilizam-se dados qualitativos complementares, inclu- mentary and primary information are used. It is inten-
sive primários. Pretende-se verificar a atual situação da ded to verify the nowadays situation of Bahia’s family
agricultura familiar baiana, destacando-se: um resumo farming, highlighting: a historical summary land tenu-
histórico e aspectos da sua estrutura fundiária, pesso- re, population, employed persons, farming numbers,
al ocupado, número de estabelecimentos, principais main crops, animal production, financing and technical
lavouras, produção animal, acesso a financiamento e guidance. In these aspects, it is observed that remains
orientação técnica. Em todos esses aspectos observa-se historical inequality of family farming in relation to the
que permanece a desigualdade histórica da agricultura national average values. The results for Bahia and the
familiar baiana em relação aos valores médios nacio- Northeast, where the most precarious Pronafians (Group
nais. Os resultados para Bahia e Nordeste, espaços onde B Pronaf) are concentrated, are similar. In counterpart
se concentram os agricultores familiares mais precários results are different in relation to Brazil. The unequal
(Grupo B do Pronaf), são similares. Em contrapartida, distribution of financing access shows the same beha-
diferenciam-se os resultados em relação ao Brasil. A vior as the indicators of value of production. Facing
distribuição desigual do acesso a financiamentos apre- that challenge, it proposes to strengthen the politics of
senta o mesmo comportamento dos indicadores referen- ATER in order to attempt Pronaf program’s main target,
tes ao valor da produção. Diante desse desafio, propõe- improving family farming.
-se valorizar mais a política de ATER como meio para Keywords: Family Farming; Non-Family Farming;
atingir o principal objetivo do Pronaf, que é fortalecer a Inequalities; Pronaf.
agricultura familiar.
Palavras-chave: Agricultura Familiar; Agricultura Não
Familiar; Desigualdades; Pronaf.
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
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zada em 2019 (SILVA, 2020), observa-se também É nesse contexto assimétrico de uma es-
um processo de fusões e aquisições de empresas e trutura agrária e ocupacional que se pretende
de propriedades rurais. Em contraposição, a área analisar a agricultura familiar baiana, em suas
média dos menores estabelecimentos (onde se múltiplas manifestações. Na seção dedicada à
concentra a agricultura familiar baiana) continua Metodologia, logo a seguir, começa-se por defi-
experimentando um processo inverso, de fracio- nir o conceito de agricultura familiar e os seus
namento das propriedades. diferentes segmentos classificados segundo a
Nas entrevistas com técnicos que executam tipologia do Pronaf.
serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural
(ATER), tanto pública quanto privada (chamada
de editais), são muito frequentes os relatos de 3 METODOLOGIA
ocorrência de fracionamentos das pequenas pro-
O conceito de agricultura familiar, definido
priedades rurais. Isso se deve a casamentos dos
pela Lei n. 11.326, de 24/07/2006, e regula-
filhos, além dos casos de terras cedidas (comoda-
mentado pelo Decreto n. 9.064, de 31/05/2017,
to), e inventários não concluídos. Nesses casos,
serve de referência para o Censo Agropecuário
muitas ocupações são autodeclaradas como “ter-
2017 do IBGE. Daí decorre a quase totalidade
ras cedidas” (geralmente por alguém da família),
dos dados utilizados neste artigo. Além do Cen-
“posses” ou “propriedades”, a depender do enten-
so Agropecuário, outros dados têm referência
dimento do agricultor (SILVA, 2020).
específica, anotada em cada caso – Censo De-
A condição precária de posse e uso de terras, mográfico IBGE 2010, e informações obtidas
sem geolocalização nem documentação conclusa, em pesquisa de campo (SILVA, 2020).
dificulta a execução dos serviços de ATER, a for-
Para fins legais considera-se agricultor fa-
mulação do planejamento e a definição da tipolo-
miliar e empreendedor familiar rural aquele
gia dos agricultores. No limite, dificulta também
que pratica atividades no meio rural e atende
a negociação de contratos de financiamento, com-
simultaneamente a quatro requisitos (BRASIL,
pra e venda da produção, sobretudo nos mercados
2006): a) não possuir área superior a quatro mó-
institucionais, a exemplo de vendas ao Programa
dulos fiscais; b) fazer uso predominantemente
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
da mão de obra da família; c) o rendimento fa-
No Gráfico 3, observa-se que o número de miliar deve ser originado predominantemente
pessoas ocupadas na agropecuária do Estado da na unidade de produção familiar; d) a gestão da
Bahia cresceu de 50,64% entre os anos 1970 e unidade produtiva deve ser desenvolvida pela
1985, e decresceu 34,23% no período compre- família. O Decreto n. 9.064/2017, que regula-
endido entre 1985 e 2017. Em 2017 (IBGE/SI- menta a referida lei, determina que deve ser uti-
DRA, 2019), 2.106.127 pessoas encontravam-se lizada, no mínimo, metade da força de trabalho
ocupadas nos estabelecimentos rurais. Quando familiar no processo de produção e geração de
se comparam os dados de 1970 com 2017, ob- rendimentos; e também que, no mínimo, meta-
serva-se uma taxa de decrescimento de 0,92%. de do rendimento familiar deve ser auferido das
atividades desenvolvidas no estabelecimento
Gráfico 3 – Evolução do pessoal ocupado: Bahia, (BRASIL, 2017).
Nordeste e Brasil, 1970-2017
Como observado por Aquino et al. (2018),
25.000.000
aqueles que não se enquadram nos referidos
20.000.000
critérios foram denominados de agricultores
15.000.000 não familiares. Esses critérios, que expressam
10.000.000 relações sociais de produção, associados às
5.000.000 2.662.835 2.508.590
normas operacionais do crédito rural definidas
2.125.809 2.106.127
0
2.518.925 3.202.485 2.326.437 para o público beneficiário do Pronaf, são ado-
1970 1975 1980 1985 1995 2006 2017 tados pelo IBGE e possibilitam a construção de
Brasil Nordeste Bahia
uma tipologia específica para os agricultores
Fonte: IBGE Censo Agropecuário 1970 a 2017 (IBGE/SIDRA, familiares.
2019).
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
Aqui se adota a tipologia do IBGE: Agricul- meio da tabulação dos dados do Censo Agrope-
tura familiar e Agricultura não familiar ou pa- cuário 2017.
tronal. A agricultura familiar, que se enquadra
em alguma categoria do Pronaf, pode ser subdi-
vida em agricultura familiar Grupo B (Pronaf B, 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
com renda bruta anual até R$ 20 mil), agricultu-
ra familiar Grupo V (Pronaf V, com renda bruta 4.1 Número de estabelecimentos, área e
anual de R$ 20 mil até R$ 360 mil) e agricul- pessoal ocupado
tura familiar não Pronaf (com renda bruta anu-
No Brasil, a agricultura familiar abrange
al acima de R$ 360 mil). Entretanto, cabe uma
3.897.408 estabelecimentos, que representam
observação. Ao se excluírem os agricultores fa-
76,82% do total dos estabelecimentos. Essa su-
miliares de um conjunto-universo, não implica,
perioridade de mais de ¾ do número de estabe-
por exclusão, serem patronais os restantes. A
lecimentos da agricultura familiar verifica-se
rigor, o conceito de patronal supõe propriedade
em todas as macrorregiões brasileiras. Confor-
individual e privada. Todavia, existem coletivi-
me a Tabela 1, o Nordeste concentra a maior
dades representadas por territórios (indígenas,
parte dos estabelecimentos não familiares e fa-
quilombolas, outras comunidades tradicionais),
miliares, dentre as macrorregiões. A agricultu-
faxinais, fundos de pasto etc. Muitos desses ter-
ra familiar no Nordeste representa 79,17% do
ritórios, onde sobrevivem agricultores familia-
total dos estabelecimentos da Região e 34,65%
res, são também beneficiários do Pronaf. Para
do total dos estabelecimentos brasileiros.
simplificar, apresenta-se a análise conforme a
tipologia disponibilizada pelo IBGE.
Tabela 1 – Número de estabelecimentos agrícolas:
Os agricultores que se enquadram no grupo Brasil e regiões (2017)
familiar não Pronaf (pouco numerosos em rela-
ção aos totais), embora tenham os pré-requisi- Tipologia
tos para serem considerados agricultores fami- Brasil
grande Região Agricultura Agricultura
liares, ainda não são beneficiários do Programa. Total
não familiar familiar
Os agricultores do tipo não familiar ou patronal
são aqueles que não se enquadram nos critérios Brasil 5.073.324 1.175.916 3.897.408
definidos por lei em nenhuma categoria de agri-
Norte 580.613 100.038 480.575
cultor familiar do Pronaf.1
Com referência à agricultura familiar, não Nordeste 2.322.719 483.873 1.838.846
se podem fazer comparações entre os dados dos
Sudeste 969.415 280.470 688.945
Censos Agropecuários de 2006 e 2017, devido
a alterações na metodologia do IBGE, inclusive Sul 853.314 187.547 665.767
conceituais. Diante disso, analisam-se os dados
de 2017 de maneira estática, ou seja, faz-se um Centro-Oeste 347.263 123.988 223.275
“retrato” da realidade (situação) com indicado- Fonte: Censo Agropecuário 2017 (IBGE/SIDRA, 2019).
res agrupados em três escalas territoriais (Bra-
sil, Nordeste e Bahia). Essa análise encontra- Assim, como em relação ao Brasil, a Bahia
-se no próximo item, onde são apresentados e é o estado com o maior número de estabeleci-
analisados os principais resultados obtidos por mentos não familiares e também familiares na
1 De acordo com Del Grossi (2019), para a realização do Censo Região Nordeste. Em 2017, foram recenseados
Agropecuário 2017 adotaram-se os critérios do Manual de 593.411 estabelecimentos familiares no estado.
Crédito Rural definidos pelo Conselho Monetário Nacional
Eles representam 77,80% dos 762.848 estabe-
(CMN), vigentes em 30 de setembro de 2017, que estabelecem
os requisitos para ser considerado beneficiário do Pronaf. Dentre lecimentos baianos e 25,55% dos nordestinos,
os requisitos do Pronaf para acessar as linhas de crédito exige- que totalizam 2.322.719 estabelecimentos (Ta-
se que os agricultores comprovem seu enquadramento através bela 2).
da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) ativa. A renda bruta
familiar não pode exceder R$ 360.000,00. Especificamente para
os beneficiários do Grupo B do Pronaf a renda bruta familiar anual
não pode ser superior a R$ 20.000,00.
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Gráfico 4 – Número de estabelecimentos rurais por área, agricultura familiar e não familiar: Bahia (2017)
100.000
90.000
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
Mais de 0 a menos de 0,1 ha
De 0,5 a menos de 1 ha
De 1 a menos de 2 ha
De 2 a menos de 3 ha
De 3 a menos de 4 ha
De 4 a menos de 5 ha
De 5 a menos de 10 ha
De 10 a menos de 20 ha
De 20 a menos de 50 ha
De 50 a menos de 100 ha
De 10.000 ha e mais
Ainda em relação à distribuição dos ativos fun- de 28.020.859 ha. A agricultura não familiar, por
diários, vale destacar que 593.411 estabelecimen- sua vez, ocupa 19.011.716 ha, que representam
tos familiares baianos ocupam 9.009.143 ha ou 67,80% da área total, com apenas 169.437 esta-
32,20% da área total dos estabelecimentos, que é belecimentos (IBGE/SIDRA, 2019). O elevado
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
Tabela 3 – Estabelecimentos agropecuários segmentados pela tipologia (un): Brasil, Nordeste e Bahia (2017)
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Essa diferença é compensada por uma maior A Tabela 4 apresenta o valor da produção
participação nacional dos agricultores familiares (milhões R$) para os tipos agricultor não fa-
do Grupo V, que é de 22,45%, contra 8,46% e miliar, agricultor familiar Grupo B, agricultor
8,40% para a Região Nordeste e Bahia, respecti- familiar Grupo V e agricultor familiar não Pro-
vamente. Observe-se que os valores para o Estado naf, nas escalas Brasil, Nordeste e Bahia. No
da Bahia são próximos da média nordestina. Isso que se refere ao valor da produção por catego-
é devido ao que se pode chamar de nivelamento rias, observa-se que a agricultura não familiar
pela pobreza, como também pela elevada repre- ou patronal concentra elevada participação na
sentatividade dos agricultores baianos do Grupo Bahia (75,43%), no Nordeste (70,34%) e no
B em relação à Região Nordeste, que é de 1/3 Brasil (77,10%).
aproximadamente, ou 32,23%. Chama a atenção Essa mesma tabela demonstra os seguin-
o fato de os agricultores familiares não Pronaf tes resultados para a Bahia: 1) Embora possua
terem uma participação residual em relação ao o maior número de agricultores familiares no
total, nas três escalas de análise, ou seja, 0,51%, Grupo B (69,31%), a sua participação no valor
para o Brasil, e 0,07% para Nordeste e Bahia. da produção estadual é de apenas 9,15%. 2) A
Comparando-se as categorias B e V, obser- agricultura não familiar detém 22,21% dos es-
va-se, na Bahia, que os agricultores familiares tabelecimentos e contribui com ¾ ou 75,40% do
do Grupo B representam 32,23% dos estabele- valor da produção. Os dados (estabelecimentos
cimentos nordestinos, e 19,30% dos nacionais. e valor) apresentados para os agricultores do
Os agricultores familiares do Grupo V repre- Grupo B aproximam-se da média dos estados
sentam 32,60% em relação ao Nordeste, e ape- nordestinos, mas se distanciam significativa-
nas 5,60% em relação ao Brasil. Eis aqui mais mente dos indicadores médios nacionais, como
um importante indicador da desigualdade. é de se esperar.
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
das famílias. O fato de não serem famílias assa- feijão, milho, algodão e soja) e permanentes
lariadas sugere uma espécie de acumulação pri- (manga), nos estabelecimentos agropecuá-
mitiva em pleno capitalismo contemporâneo. A rios que possuem a partir de 50 pés, os dados
grande concentração de agricultores familiares da Tabela 5 mostram a relevante contribuição
do Grupo B, tanto na Bahia, quanto em toda a da agricultura familiar nas plantações que são
região Nordeste, revela a permanência de uma destinadas ao consumo humano no mercado
divisão inter-regional do trabalho no Brasil, interno. Pode-se destacar a produção de arroz
ainda que parcial. Não sendo o desenvolvimen- em casca, que representa 69,71%, e a produção
to desigual objeto deste artigo, analisa-se agora de feijão, que representa 40,24% da produção
a participação dos segmentos na produção agro- baiana. A produção de manga apresenta um total
pecuária estadual. de 250.706 toneladas, sendo que a agricultura
familiar representa 30,88% e a agricultura não
4.3 Participação da agricultura familiar na familiar representa 60,11%. Para as culturas co-
merciais de milho, algodão e soja, identifica-se
produção agropecuária baiana
significativa participação dos estabelecimentos
No que se refere à quantidade produzida em patronais, que representam 93,47%, 99,89% e
toneladas para as lavouras temporárias (arroz, 99,94% da produção, respectivamente.
Tabela 5 – Quantidade produzida das principais lavouras alimentares e comerciais (toneladas): Bahia
(2017)
Nos estabelecimentos com pecuária, os prin- Na Tabela 6, percebe-se que os bovinos es-
cipais rebanhos são bovinos, equinos, suínos, tão distribuídos em um total de 297.894 estabe-
ovinos, caprinos, asininos e muares. Esses re- lecimentos. Mais de 4/5 desses estabelecimen-
banhos concentram-se em mais de 75% do total tos (235.599 ou 79,10%) são representados pela
de estabelecimentos da agricultura familiar. Ex- agricultura familiar, sendo que 1/5 (62.295 ou
ceção se faz aos bubalinos, que ocupam menos 20,90%) são do tipo não familiar. Todavia, se
de 30% dos estabelecimentos familiares, por for observado o efetivo do rebanho por estabe-
serem animais exigentes em mananciais abun- lecimento, a agricultura familiar detém um nú-
dantes de água – o que requer maiores áreas, e, mero médio de cabeças que representa 42,50%
com raras exceções, fora do semiárido baiano. dos animais, ou seja, tem participação menor
No grupo aves, os galináceos da agricultura fa- do que a agricultura não familiar. Os equinos
miliar são muito representativos, encontrando- foram identificados em 148.599 estabelecimen-
-se presentes em mais de 4/5 do total de estabe- tos, sendo que 111.802 ou 75,24% são repre-
lecimentos (IBGE/SIDRA, 2019). sentados pela agricultura familiar e 36.797 ou
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24,76% são representados pela agricultura não Os suínos encontram-se em 148.342 esta-
familiar. belecimentos, sendo 120.849, que representam
Os caprinos encontram-se em 71.473 esta- 81,47%, do tipo familiar. Os demais estabeleci-
belecimentos, sendo que 57.337 (80,22%) são mentos, 27.493 (18,53%), são do tipo não fami-
do tipo familiar e apenas 14.136 (19,78%) são liar. Calculando-se o número médio de cabeças
estabelecimentos do tipo não familiar. Ao se por estabelecimento, verifica-se que a agricul-
analisar o número de cabeças por estabeleci- tura familiar também participa com um quanti-
mento, a agricultura familiar também apresenta tativo elevado em relação à agricultura não fa-
um quantitativo elevado em relação à agricul- miliar. Na Bahia, 71,11% dos animais estão na
tura não familiar. Na Bahia, 73,78% dos capri- categoria agricultura familiar. Embora 120.849
nos estão concentrados em estabelecimentos da estabelecimentos familiares baianos criem suí-
agricultura familiar. Embora se produzam ca- nos, 58.374 (quase metade) venderam animais.
prinos em 57.337 estabelecimentos da agricul- Isso representa 81,44% do total de 71.677 esta-
tura familiar, em apenas 29.399 estabelecimen- belecimentos baianos que venderam suínos. A
tos (51,27%) foram registradas vendas. Isso se venda de suínos da agricultura familiar repre-
deve, em parte, ao autoconsumo das famílias. senta 57,62% das vendas totais na Bahia.
Observa-se também uma expressiva partici-
Tabela 6 – Número de estabelecimentos com pe- pação dos rebanhos caprinos, ovinos e suínos
cuária: Bahia (2017) em termos de faturamento. Nos estabelecimen-
tos da agricultura familiar, os principais reba-
Não Familiar Familiar
Estabeleci- nhos são caprinos, com 71,8% do valor das ven-
mentos com Total
pecuária Qtde % Qtde %
das; ovinos, com 70,3%; e suínos, com 53,3%
do faturamento (IBGE/SIDRA, 2019).
Bovinos 62.295 20,91 235.599 79,09 297.894 Os galináceos (galinhas, galos, frangos e
Equinos 36.797 24,76 111.802 75,24 148.599
pintos) encontram-se distribuídos em um total
de 411.263 estabelecimentos. Cerca de 4/5 des-
Caprinos 14.136 19,79 57.337 80,21 71.473 ses estabelecimentos (331.400 ou 80,58%) são
do tipo familiar, enquanto apenas 1/5 (79.863
Ovinos 26.421 21,76 95.007 78,24 121.428
ou 19,42%) são do tipo não familiar (Tabela
Suínos 27.493 18,53 120.849 81,47 148.342 6). Quanto ao número de estabelecimentos da
agricultura familiar que realizam vendas, em
Galináceos* 79.863 19,42 331.400 80,58 411.263 relação ao total de estabelecimentos, a Bahia, a
Fonte: Censo Agropecuário 2017 (IBGE/SIDRA, 2019). Região Nordeste e o Brasil apresentam partici-
Nota: *Galinhas, galos, frangas, frangos e pintos. pações semelhantes, em torno de 80%. Todavia,
ao se analisar a quantidade média de unidades
Os ovinos são produzidos em 121.428 es- vendidas, por estabelecimento, o percentual de
tabelecimentos, sendo que 95.007 (78,24%) estabelecimentos que realizam vendas na agri-
são da agricultura familiar e apenas 26.421 ou cultura familiar é inferior ao da agricultura não
21,76% são do tipo não familiar (Tabela 6). Ao familiar. Na Bahia, embora 331.400 estabeleci-
se analisar o número de cabeças por estabele- mentos da agricultura familiar criem galináce-
cimento, a agricultura familiar também reve- os, apenas 81.129 (24,48%) realizam vendas.
la um quantitativo elevado em relação à agri-
Os dados aqui analisados mostram a rele-
cultura não familiar, com 71,96% dos animais
vância da agricultura familiar, tanto na produ-
concentrados em estabelecimentos da categoria
ção de lavouras quanto na criação de animais
agricultura familiar. Embora se pratiquem sis-
que, mesmo em uma conjuntura adversa, res-
temas de criação de ovinos em 95.007 estabele-
ponde por significativa parcela da produção,
cimentos da agricultura familiar, apenas 51.906
sobretudo para o mercado interno. A depender
(54,63%) estabelecimentos realizaram vendas.
do nível de integração dos agricultores ao mer-
Entre as famílias produtoras de ovinos, o auto-
cado, importa também conhecer qual é a par-
consumo também é significativo, por se tratar
ticipação dos estabelecimentos que obtiveram
de rebanhos deslanados, tipo carne.
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
Tabela 7 – Número de estabelecimentos que obtiveram financiamento: Brasil, Nordeste e Bahia (2017)
Como se pode observar na Tabela 8, os va- em relação ao total de cada tipo, constata-se que
lores percentuais representam a participação de os agricultores melhor estruturados (não fami-
cada tipo de agricultor, nas três escalas, consi- liar, familiar Grupo V, e não Pronaf) concentram
derando se obteve ou não financiamento. Os va- maior percentual de estabelecimentos com fi-
lores agregados são semelhantes para as escalas nanciamento. Essa constatação sugere que exis-
Bahia e Nordeste, enquanto se diferenciam dos te uma relação direta entre os estabelecimentos
resultados em relação ao Brasil. Analisando-se a mais estruturados, portanto, com maiores ní-
participação dos estabelecimentos classificados veis de rendimento anual, e o acesso ao crédito
por tipo de agricultor, com e sem financiamento (AQUINO; GAZOLLA; SCHNEIDER, 2018).
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Tabela 8 – Percentual de estabelecimentos com e sem financiamento em relação ao total de cada tipo: Bra-
sil, Nordeste e Bahia (2017)
Como foi visto, o limite máximo dos valores termos de política agrária-agrícola à representa-
financiados para o grupo Pronaf V é significati- ção numérica desses agricultores. “[...] os últimos
vamente superior ao limite máximo dos financia- dez anos mostraram um aumento da desigualda-
mentos de apoio ao grupo Pronaf B. Portanto, se o de inter-regional” (COUTO; DUFUMIER; REIS,
grupo Pronaf V se encontra mais concentrado no 2013, p. 25; COUTO, 2014). Pode-se concluir que
Centro-Sul, esta macrorregião acaba atraindo va- o Programa, que deveria ser de equidade e apoio
lores médios de financiamento bem maiores. As- a toda a agricultura familiar nacional, acaba con-
sim, a forte concentração da agricultura familiar tribuindo, pela via do crédito, para o aumento das
no Nordeste e Bahia não tem correspondência em desigualdades sociais e regionais no Brasil.
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
Essa desigualdade remete para outra ques- po V possui a maior participação entre os bene-
tão: como corrigir os impactos decorrentes de ficiários, com 43,11%. Nessa categoria, a Região
uma política de crédito, sem impor as tradicio- Nordeste e a Bahia apresentam uma participação
nais restrições das políticas de quotas regio- bem inferior, de 16,22% e 16,98%, respectiva-
nais? Uma das hipóteses considera que a via da mente. A categoria familiar Grupo B possui a me-
orientação técnica recebida pelos agricultores, nor representação em escala nacional (24,17%)
desde que bem formulada e executada, pode e para o Nordeste e Bahia apresenta 54,20% e
estimular os agricultores a reestruturar os seus 50,15%, respectivamente. Os agricultores não
respectivos sistemas de produção, com base em familiares possuem representação relativamente
inovações de base sustentável. próxima nas escalas nacional, regional e estadual,
30,93%; 29,34% e 32,59%, respectivamente.
4.5 Orientação Técnica Recebida Analisando-se, nas três escalas, o número
total de estabelecimentos que obtiveram orien-
Para avançar na discussão mencionada ao fi- tação técnica em relação ao total geral de esta-
nal do tópico anterior, na Tabela 10 encontra-se belecimentos, observa-se que são 20,21% para
o número de estabelecimentos beneficiados com o Brasil contra 8,21% para o Nordeste e 7,68%
o serviço de orientação técnica, por categoria de para a Bahia (IBGE/SIDRA, 2019). Em síntese,
agricultor, e em relação ao total de estabelecimen- tanto no Nordeste quanto na Bahia o acesso à
tos que foram objeto desse serviço. Observa-se orientação/assistência técnica é expressivamen-
que, na escala nacional, a categoria familiar Gru- te menor que na escala nacional.
Tabela 10 – Número de estabelecimentos com orientação técnica: Brasil, Nordeste e Bahia (2017)
Conforme a Tabela 11, quando se considera bem orientação técnica, 38,80% foram orienta-
a participação dos estabelecimentos com e sem dos, no Brasil, 15,75% no Nordeste, e 15,50%
orientação técnica em relação ao total de cada na Bahia.
tipo, os estabelecimentos beneficiados, na esca- Quanto aos grupos que constituem a catego-
la nacional, têm uma participação bem maior do ria familiar (Grupo B, Grupo V e familiar não
que os estabelecimentos nordestinos e baianos. Pronaf), de forma agregada, verifica-se que os
Em relação ao número total de estabeleci- estabelecimentos beneficiados, em escala na-
mentos não familiares, 27% foram orientados, cional (708.318), representam 18,17% dos es-
no Brasil, 11,57% no Nordeste, e 11,26% na tabelecimentos familiares (3.897.408). No Nor-
Bahia. No que se refere ao número total de es- deste e Bahia, a participação é bem menor, de
tabelecimentos familiares no Grupo V que rece- 7,33% e 6,61%, respectivamente.
Rev. Econ. NE, Fortaleza, v. 51, suplemento especial, p. 211-226, agosto, 2020
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Edna Maria da Silva, Livia Liberato de Matos Reis e Vitor de Athayde Couto
Tabela 11 – Participação (%) dos estabelecimentos com e sem orientação técnica em relação ao total de
cada tipo: Brasil, Nordeste e Bahia (2017)
Rev. Econ. NE, Fortaleza, v. 51, suplemento especial, p. 211-226, agosto, 2020
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Agricultura familiar na Bahia: uma análise dos dados do Censo Agropecuário 2017
tegoria mais frágil da agricultura familiar Talvez essa questão encerre o maior desa-
(Grupo B do Pronaf); fio para qualquer política de fortalecimento da
4) Permanece significativa a desigualdade agricultura familiar. Por quê? Sabe-se, e a histó-
na estrutura de posse e uso da terra; ria, com suas incontáveis avaliações, já deixou
bem claro que não adianta induzir o agricultor
5) É importante a contribuição da agricul-
familiar ao financiamento (e consequente en-
tura familiar na produção, no autoconsu-
dividamento) sem a indispensável orientação
mo das famílias, e no abastecimento do
técnica. Em decorrência do desmantelamento
mercado. Os agricultores familiares do
das políticas nacional e estaduais de ATER, as
Grupo B (69,20% dos estabelecimentos)
perspectivas não parecem otimistas, a menos
participam com 9,10% do valor da produ-
que se fortaleçam as suas instituições. Esse for-
ção, enquanto os não familiares (21,60%
talecimento deve ser tanto da infraestrutura pú-
dos estabelecimentos) participam com
blica direta, quanto indireta, ou seja, gestão de
75,40%;
convênios e também contratos junto a empresas
6) As vendas de produtos animais apresen-
privadas e organizações sociais.2
tam a mesma desigualdade constatada
para o valor da produção agrícola em ge-
ral; REFERÊNCIAS
7) Nos estabelecimentos dos agricultores fa-
miliares baianos, os principais rebanhos AQUINO, J. R.; GAZOLLA, M.; SCHNEIDER,
são: caprinos, com 73,78% do número S. Dualismo no campo e desigualdades internas
de cabeças sobre o total; ovinos, com na agricultura familiar brasileira. Revista de
71,96%; suínos, com 71,11%; e represen- Economia e Sociologia Rural [online]. v. 56, n.
tam, respectivamente, 71,80%; 70,30%; e 1, p.123-142, 2018.
53,30% do valor das vendas;
BARROS, G. S. C. Agricultura familiar.
8) A participação nos financiamentos segue Piracicaba: Cepea/ Esalq/USP, 2006. Disponível
aproximadamente a mesma distribuição em: http://www.cepea.esalq.usp.br/especialagro/
dos indicadores da tipologia e valor da EspecialAgroCepea_9.doc. Acesso em: 06 fev.
produção; 2020.
9) Na escala nacional, os estabelecimen-
tos que receberam orientação técnica BRASIL. Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006.
têm uma participação bem maior do que Estabelece as diretrizes para a formulação da
os baianos: 20,21% para o Brasil contra Política Nacional da Agricultura Familiar e
7,68% para a Bahia; Empreendimentos Familiares Rurais. Disponível
10) Tanto no Brasil quanto na Bahia, os agri- em: http://www.planalto.gov.br/ccivil. Acesso em:
cultores não familiares receberam mais 05 jan. 2020.
orientação técnica do que os agricultores
BRASIL. Decreto no 9.064, de 31 de maio
familiares. Foram 26,97% de estabeleci-
de 2017. Dispõe sobre a Unidade Familiar de
mentos orientados, no Brasil, e 11,26%,
Produção Agrária, institui o Cadastro Nacional
na Bahia.
da Agricultura Familiar e regulamenta a Lei n.
As três últimas constatações remetem para a 11.326, de 24 de julho de 2006, que estabelece as
seguinte questão: o que explica essa maior parti- diretrizes para a formulação da Política Nacional
cipação da agricultura não familiar, se a política da Agricultura Familiar e empreendimentos
de ATER pública, em tese, definiu como prio- familiares rurais. Disponível em: http://www.
ridade a agricultura familiar? Seria a presença planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/
(e a consequente orientação técnica direta) de Decreto/D9064.htm. Acesso em: 05 jan. 2020.
oligopólios nas principais cadeias produtivas do
chamado agronegócio? Essas e outras questões
requerem novas pesquisas para que se adequem
melhor as políticas públicas. 2 Mais detalhes podem ser encontrados em Couto (2013; 2014) e
Silva (2020).
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Edna Maria da Silva, Livia Liberato de Matos Reis e Vitor de Athayde Couto
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