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Abstract: This paperwork examines the organizational changes that have occurred in the
family farming enterprises from the county of Espera Feliz (Minas Gerais State) through
the operationalization of actions of the Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
The case of the Cooperativa da Agricultura Familiar e Solidária de Espera Feliz (Coofeliz),
of Espera Feliz (Coofeliz), was analyzed from the economical sociology approach to identify
http://dx.doi.org/10.1590/1234-56781806-9479005302006
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âmbito do PNAE: 82,5 milhões de reais (9,3%)5. que contrariam as capacidades de oferta da pro-
A dimensão da agricultura familiar mineira tam- dução daquele segmento.
bém é expressiva. Segundo o Censo Agropecuário Estas contradições foram analisadas em um
de 2006, Minas Gerais possuía 437.415 estabeleci- caso específico: a atuação da Cooperativa da
mentos da agricultura familiar (79% do total dos Agricultura Familiar Solidária de Espera Feliz
estabelecimentos agropecuários), ocupando mais (Coofeliz), localizada no Município de Espera
de 1,1 milhão de trabalhadores. Feliz (MG). Neste município, de acordo com o
Apesar das oportunidades que o PNAE ofe- IBGE (2011), há 761 estabelecimentos familiares,
rece à agricultura familiar e às suas organizações, representando 73% do total dos estabelecimentos
ele também apresenta uma série de desafios, na rurais. Nestes estabelecimentos foram contabili-
medida em que envolve diferentes atores no pro- zadas 3.500 famílias, que residem e trabalham em
cesso de operacionalização da aquisição de ali- propriedades cujo tamanho médio é de apenas
mentos. Estes atores aderem à política com suas nove hectares8. Em Espera Feliz cultiva-se histo-
particularidades, demandas e expectativas pró- ricamente o café. Em 2006, os cafezais ocupavam
prias. Os empreendimentos coletivos da agri- 28% da extensão territorial do município, corres-
cultura familiar, por exemplo, para atender ao pondendo a 98,75% da área dedicada a lavouras
mercado da alimentação escolar, precisam incor- permanentes.
porar múltiplas capacidades gerenciais, que habi- A pesquisa que deu origem a este artigo9
tualmente compõem o “mundo dos negócios”, buscou analisar as mudanças organizacionais
tais como o planejamento e a organização da pro- que ocorreram na Coofeliz à medida que se deu
dução; padronização e homogeneização dos pro- o acesso de seus cooperados ao PNAE. O tema
dutos; gestão eficiente; visão estratégica; dentre de pesquisa está relacionado ao envolvimento
outras. Estas capacidades compõem, de modo profissional de um dos autores deste artigo com
geral, o que denominamos “padrão de mercado”. o trabalho de assessoria realizado pelo Centro
Enquanto se adaptam aos padrões domi- de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata
nantes do mercado de alimentos, os empreen- (CTA-ZM) junto à Coofeliz. Esta assessoria teve
dimentos da agricultura familiar se mobilizam, por objetivo o suporte técnico a processos de
concomitantemente, para colocar em cena novos organização econômica e acesso a mercados (pla-
critérios que contribuam para afirmar padrões nejamento da produção, assessoria à gestão e
mais compatíveis com as suas condições técnicas procedimentos de habilitação sanitária), princi-
e socioeconômicas. Já as Entidades Executoras6, palmente aquele instituído pelo PNAE.
especialmente aquelas localizadas nos grandes O processo de assessoria tem gerado apren-
centros urbanos, apresentam demanda constante dizado e revelado desafios à rede de organiza-
e em larga escala, que geralmente não é suprida ções que se mobilizam em torno do Sindicato
pela oferta atual da agricultura familiar7. Esta de Trabalhadores Rurais de Espera Feliz, prin-
demanda tende a legitimar padrões de consumo cipalmente em relação à inserção de produtos
agroecológicos em mercados. Este processo foi
recentemente descrito e analisado por Silva et al.
5. Fonte: FNDE (2012).
6. De acordo com as normativas do PNAE, são as entidades 8. Essas famílias estão distribuídas em uma estrutura fundiá-
que demandam produtos e organizam a compra local: ria em que 42% possuem menos de 10 hectares, 45%, entre
Secretarias de Educação, Secretarias de Abastecimento, 10 e 50 hectares, 8%, entre 50 e 100 hectares, 4%, entre 100
Municipalidades. e 200 hectares e apenas 1% das propriedades têm acima de
7. De acordo com os dados do FNDE (2012), o repasse 200 hectares (IBGE, 2011).
para os sete maiores municípios de Minas Gerais foi de 9. Pesquisa realizada com o apoio do Programa de Bolsas de
R$ 10.119.039,32 (rede municipal), desse valor total, ape- Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa
nas R$ 324.587,68, ou seja, cerca de 3%, foi executado via do Estado de Minas Gerais (Probic/Fapemig), entre 2013 e
compra direta de estabelecimentos da agricultura familiar. 2014.
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Alimentação Escolar
(2014). Estes autores apresentam a constituição da Considera-se que o limitado acesso a mer-
ampla rede de atores e entidades que, desde mea- cados institucionais pelos agricultores familiares
dos dos anos 1990, empreendem estratégias de não está relacionado apenas a questões de ordem
desenvolvimento rural para a agricultura familiar técnica-gerencial. Acredita-se que, ao adentrar
do município e região. Alguns momentos pontu- em mercados e promover o prolongamento dos
ais desta trajetória serão resgatados neste artigo. mesmos para além das relações de vizinhança e
Acompanhar o processo de assessoramento proximidade (características fundamentais dos
permitiu evidenciar os conflitos existentes entre mercados da agricultura familiar de pequena
os modos de organização da produção – e do pró- escala), depara-se com novas regras e ações puni-
prio estilo de vida dos agricultores familiares – e tivas, muitas vezes restritivas à entrada nestes.
as exigências que lhes foram apresentadas para o Nesse sentido, tem-se uma pressão à adaptação a
acesso e a operacionalização dos contratos firma- padrões de qualidade e a regras de higiene e sani-
dos por meio do PNAE. O principal desafio aos dade, por exemplo, com implicações sobre escala
agricultores familiares, a partir do acesso ao pro- de produção, a matriz tecnológica e tipo de pro-
grama, foi lidar com as mudanças nos processos duto, dentre outras (WILKINSON, 2008).
e produtos locais, que se fundamentam, tradicio- Frente a esses elementos, buscou-se investigar
nalmente, em relações de proximidade, circuitos quais mudanças organizacionais teriam ocorrido
curtos de circulação e comercialização de merca- nos empreendimentos dos agricultores familia-
dorias, como feiras locais. Estes modos de orga- res que, associados à Coofeliz, operacionalizaram
nização socioeconômica são valorizados como contratos do PNAE em Espera Feliz. Para respon-
extensão e desdobramento das redes sociais que der a esta questão também foi feita a descrição
estruturam seu cotidiano. Para os mediadores das relações estabelecidas pela cooperativa com
mais próximos e para os agricultores, no acesso os diferentes agentes envolvidos no processo de
e operacionalização do PNAE, estava em jogo aquisição de alimentos, por meio do PNAE.
a manutenção das características da produção Em estudos realizados sobre o Programa de
familiar historicamente enraizadas, frente a uma Aquisição de Alimentos (PAA), tem-se a constata-
demanda por “padronização da qualidade”, exi- ção da contribuição desse programa nas mudan-
gida pelos operadores do programa, fundada em ças geradas na matriz produtiva dos agricultores,
valores (nem sempre explicitados) cuja principal principalmente no que se refere à diversifica-
referência (e instrumento de legitimação) eram as ção produtiva, além de provocar a produção e
normas técnicas que regulamentam o programa. o consumo de alimentos regionais e fortalecer
Neste cenário, a pesquisa buscou compreen- ou gerar novos mercados (GRISA et al., 2011).
der, como pressuposto analítico, as normas téc- Compreendendo que a estrutura do PNAE (seus
nicas (padrões desejados e normatizados) como normativos, atores envolvidos, formas de acesso
valores passíveis de serem negociados e a “quali- etc.) se difere consideravelmente do PAA10, fez-se
dade dos produtos” como um processo que pode- necessária uma investigação que pudesse desven-
ria envolver a consideração dos modos de vida dar em que medida o acesso à política promove o
e de produção sobre os quais se assenta a agri- “fortalecimento da agricultura familiar”, ou seja,
cultura praticada pelos cooperados da Coofeliz.
Neste sentido, buscou-se investigar até que ponto 10. Uma diferença fundamental é que, no PNAE, a demanda
os mercados se instituem como “construções é estabelecida pelo cardápio escolar, enquanto no PAA são
sociais”, definidos e estruturados de acordo com elaborados projetos a partir da oferta de produtos que
os agricultores têm disponível. Mesmo a Conab estabe-
as racionalidades, disputas e conflitos por recursos lecendo uma lista dos produtos que podem ser adquiri-
que os atores e grupos sociais mobilizam em seus dos, tem-se uma diversidade de itens que abrange grande
parte dos produtos cultivados pelos agricultores familia-
processos de interação social (ABRAMOVAY, 2004; res. Isso permite, inclusive, a entrega de produtos que são
GAZOLLA et al., 2010; DUARTE e DIAS, 2012). menos “normatizados” ou in natura.
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2014, a cooperativa tinha 110 sócios e integrava-se Nesta rede sociopolítica eram firmados acordos
ao conjunto de organizações locais, quase todas e negociações diretas entre os atores visando
vinculadas a sindicatos de trabalhadores rurais, acesso ao mercado institucional criado pelo PAA
que possibilitavam ou operacionalizam local- e, principalmente, pelo PNAE. Também por meio
mente o acesso a programas e políticas públicas. da rede constituída, e em sua dinâmica de inte-
A parceria com outras organizações, dentre elas ração, foram engendradas estratégias de supe-
instituições de ensino, entidades de pesquisa, ração das ações restritivas (WILKINSON, 2008)
extensão rural e agências de crédito rural propor- instituídas nas normas e regulamentos dos pro-
cionou, dentre vários outros benefícios aos coo- gramas, nos padrões de consumo vigentes, e
perados, a consolidação de algumas experiências mais amplamente nos determinantes de mer-
agroecológicas e a comercialização da diversi- cado. Descreve-se e analisa-se a seguir, detalha-
dade de produtos da agricultura familiar (SILVA damente, o rol de mudanças que ocorreram na
et al., 2014). Coofeliz a partir do acesso ao PNAE e a interação
A organização econômica e social da coope- com suas normas.
rativa ocorreu a partir da orientação ao manejo
agroecológico da produção agrícola. Esta orienta-
ção se deu em ambientes de interação agroecoló- 4. Agricultura familiar e a
gica11 e reuniões técnicas nos Núcleos Produtivos construção social de mercados
da cooperativa nas comunidades, nas quais eram
discutidos os “padrões de qualidade” necessários Para o entendimento do funcionamento dos
aos produtos comercializados. Além do manejo mercados é necessária uma abordagem em que
da produção, discutia-se a organização e plane- a economia é vista enquanto parte constituinte
jamento produtivo, definindo cronogramas de das relações sociais, ou seja, a ação econômica é
entrega, quantidades demandadas, processa- compreendida como imersa nas estruturas de
mento, questões relacionadas a armazenamento, relações sociais. Nesta concepção, atores sociais e
embalagens e transporte dos produtos. individuais assumem maior relevância na deter-
Os Núcleos Produtivos da cooperativa esta- minação social dos mercados, relativizando-se o
vam presentes em diversas comunidades, envol- papel das instituições econômicas, que passam a
vendo a totalidade dos cooperados, constituindo, ser compreendidas como “construções sociais”
assim, uma extensa rede de contatos na qual inte- (LÉVESQUE, 2007). É deste modo que Granovetter
ragiam agentes das diversas instituições e orga- (2000) fundamenta seu argumento sobre a ação
nizações. O acesso a novos mercados ocorreu a econômica ser essencialmente localizada.
partir das ações da cooperativa e dos parceiros
(entidades de assistência técnica e extensão rural, E é exatamente nesse sentido que se pode
entidades de pesquisa, entidades de representa- falar de uma nova sociologia econômica. Não
se trata de encarar o mercado como uma enti-
ção dos agricultores e instituições financeiras).
dade “auto-regulável”, para usar a expressão
de Polanyi, que outras instituições sociais vão
11. Os “ambientes de interação agroecológica” são baseados
limitar: o objetivo é mostrar que, nos merca-
na metodologia campesino a campesino (MACHÍN SOSA
et al., 2011). Estes ambientes podem ser definidos como dos, os vínculos sociais concretos, localizados,
momentos de troca de experiências e reúnem as famílias são determinantes de suas dinâmicas e que,
(homens, mulheres e jovens) dos agricultores, técnicos, portanto, sua auto-regulação depende da pró-
professores e estudantes, para discussão e desenvolvi-
mento de práticas e tecnologias sociais relacionadas ao pria maneira como a interação social ocorre
manejo, cuidado com o solo, técnicas de cultivo de cultu- (ABRAMOVAY, 2004, p. 55).
ras específicas, controle de pragas, produção de insumos,
dentre outras questões que auxiliam a ampliação da escala
produtiva e na qualidade da produção a partir do manejo
Ao se falar em estruturas de relações sociais
agroecológico. na agricultura familiar, especificamente no que se
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refere à produção agrícola e ao acesso a mercados, camponeses abrangidos naquilo que, no Brasil,
tem-se, marcadamente, um conjunto de relações denomina-se “agricultura familiar”. Nesta lei-
que envolvem desde manejo coletivo de recur- tura, os agricultores familiares são herdeiros das
sos comuns à redistribuição de fatores produti- características peculiares aos modos de vida cam-
vos (sementes, trabalho, conhecimentos etc.), ou poneses e seu enraizamento nas culturas locais.
seja, um esforço coletivo de coordenação de ativi- Já para Ploeg (2008), os agricultores, a depender
dades econômicas que conduzem à configuração de seu grau de integração aos mercados, podem
das especificidades locais da mesma. Além disso, transitar entre “camponeses” e “empresariais”, a
outro elemento que permite caracterizar essas depender das necessidades de reprodução socio-
relações são os diferentes “tipos” de mercados ins- econômica, sem perder, em nenhuma das duas
tituídos, que imprimem destinações diversas aos situações, suas características familiares. Redin e
produtos, envolvendo feiras, autoconsumo, tro- Silveira (2010, p. 17), ao analisarem as concepções
cas intrafamiliares etc. (SABOURIN, 2009). de campesinato em diversos autores, e conside-
Essas relações, porém, não se restringem ao rando a inserção mercantil dos agricultores fami-
nível comunitário, mantendo interação estreita liares brasileiros, argumentam que:
com processos globais, sem perder, em alguns
casos, a autonomia frente às relações com os mer- [...] a alocação do trabalho em função de uma
cados mais distantes, que extrapolam as redes ou mais atividade voltada ao mercado, viabi-
locais de relações sociais. Para Ploeg (2008), a “con- lizando renda capaz de garantir os meios de
subsistência para a família, não retira os agri-
dição camponesa” é definida por um conjunto
cultores da condição camponesa, mas pode
de características que seriam relevantes para a
ser manifestação desta condição. Pois, precisa-
determinação social dos mercados dos quais par-
-se considerar que tal decisão pode ser uma
ticipam e interagem os agricultores familiares: forma de a família, a partir de seus recursos
coprodução com a natureza; base relativamente escassos, almejar sua manutenção na agricul-
autônoma de recursos (escassos); diversificação tura e, mais, exercendo sua autonomia diante
da produção; autonomia parcial em relação aos das possibilidades oferecidas pelas relações
mercados e predomínio de relações de reciproci- com o mercado.
dade e cooperação, em que a monetarização não
é o modo exclusivo de remuneração do trabalho. Compreendendo que um empreendimento,
Para este autor, estas características definem a especificamente uma cooperativa de agricultura
“agricultura familiar camponesa”. familiar (como a objeto deste estudo), envolve
Sabourin (2009, p. 32), corroborando as for- processos econômicos e sociais – ou seja, a ati-
mulações de Ploeg (2008), ao estudar agriculto- vidade econômica organizada de forma coope-
res do Nordeste brasileiro, enfatiza as relações de rativa se edifica nas relações estabelecidas pelo
reciprocidade e argumenta que as características corpo de associados que a compõe – entende-
da “agricultura familiar camponesa” revelam: -se que é fundamental compreender também as
características do modo de “fazer agricultura”
[...] uma relação íntima com recursos naturais
estabelecido por seus associados.
vivos, mas limitados à intensificação do traba-
As características da agricultura familiar,
lho e à valorização da ajuda mútua, um dis-
anteriormente enumeradas, permitem estabele-
tanciamento institucionalizado das regras do
cer categorias analíticas capazes de descrever os
mercado capitalista associado à capacidade de
autonomia com relação ao mundo capitalista. sistemas produtivos dos agricultores familiares
associados aos empreendimentos de agricultura
A caracterização da agricultura familiar como familiar, permitindo também a identificação de
“camponesa” também está presente na argumen- mudanças que ocorrem a partir de sua interação
tação de Wanderley (2003), que afirma serem os com os mercados, no caso em questão, sua intera-
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afirmando-se, em crítica à especialização produ- Para mudar esta percepção negativa sobre os
tiva, uma opção de organização socioprodutiva produtos da agricultura familiar, a Coofeliz orga-
fundada na diversificação de produtos14. nizou visitas das merendeiras a propriedades
Com a inserção dos produtos da agricul- de alguns cooperados, para que elas compreen-
tura familiar, foram necessárias adequações nos dessem o processo de produção agroecológica,
cardápios das escolas, que ao longo do tempo demonstrando que o padrão estético dos produ-
privilegiavam produtos enlatados, massas, pré- tos comercializados em supermercados nem sem-
-processados, entre outros (COSTA, 2004). Desta pre está associado a qualidades positivas, como
maneira, para além do trabalho de organização à produção livre de agrotóxicos, por exemplo.
social com os cooperados, a Coofeliz procurou Desta forma, completava-se um ciclo de intera-
desenvolver um trabalho para informar e sensibi- ção que relacionava os produtores com os des-
lizar demais atores sociais envolvidos na execução tinatários finais do produto, buscando interferir
do PNAE na região. Foram realizadas reuniões nos padrões estabelecidos relativos à demanda
com gestores públicos (diretores de escolas, secre- de alimentos.
tários de educação, nutricionistas etc.), responsá-
veis pela aquisição da alimentação escolar, a fim
5.2. Estrutura organizacional e
de negociar a elaboração de Chamadas Públicas,
prática de gestão
de modo que as mesmas previssem a compra de
produtos por item e não por lote, como vinha À medida que a Coofeliz foi aumentando
sendo feito. Também houve iniciativas para que volume de vendas para o PAA e PNAE, a estru-
fossem demandados produtos de acordo com a tura organizacional15 da cooperativa, bem como
disponibilidade sazonal dos produtos na região sua gestão16, foram sofrendo mudanças para ten-
de atuação da Coofeliz. Esta foi uma importante tar atender às demandas apresentadas. Para com-
inovação institucional nas relações de mercado preendermos a importância destes programas
estabelecidas pelo PNAE, qual seja, a introdução na movimentação da cooperativa, é importante
de um padrão estabelecido, quanto ao tipo de observar as variações nas Demonstrações de
produto e à forma de oferta dos mesmos, a partir Resultado do Exercício (DRE) a partir das receitas
das negociações estabelecidas nas redes de rela- de vendas: em 31 de dezembro de 2010, a DRE
ções sociais locais. fechou em R$ 118.101,88; em 2011, R$ 193.670,00
Com as merendeiras das escolas foram rea- e, em 2012, foi de R$ 335.000,00.
lizadas oficinas sobre aproveitamento dos pro- Até 2009, a Coofeliz não contava com fun-
dutos, difundindo receitas que utilizassem a cionário ou profissional que se dedicasse exclu-
produção local. As entrevistas realizadas e os sivamente às atividades da cooperativa. Este fato
depoimentos expressos em várias reuniões é recorrente em cooperativas agropecuárias de
demonstraram a resistência inicial das merendei- menor porte, pois os agricultores, além de geri-
ras aos produtos adquiridos da agricultura fami- rem a cooperativa, necessitam desenvolver suas
liar por meio do PNAE. Os produtos entregues atividades produtivas em suas propriedades
pela cooperativa não apresentavam o padrão
15. “Estrutura organizacional é o instrumento administra-
estético daqueles adquiridos em supermercados
tivo resultante da identificação, análise, ordenação e
(tamanho uniforme, pré-processamento etc.), tor- agrupamento das atividades e dos recursos das empre-
nando o preparo dos alimentos, de acordo com os sas, incluindo o estabelecimento dos níveis de alçada e
dos processos decisórios, visando ao alcance dos obje-
depoimentos citados, mais trabalhoso. tivos estabelecidos pelos planejamentos das empresas”
(OLIVEIRA apud GABRICH, 2008, p. 31-32).
14. A cooperativa comercializou 42 itens em 2013. Apesar de 16. Como gestão se subentende que é o que leva a organizar,
ter alguns produtos com maior escala, a perspectiva é dispor, dirigir, ou seja, é usada para referir-se à direção
abranger ao máximo a diversidade produzida pelos agri- e à administração que se realizam em uma organização,
cultores a ela vinculados (CTA-ZM, 2014). empresa ou negócio.
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(ZYLBERSZTAJN, 1994). A partir de 2010, devido (GRANOVETTER, 1985). Portanto, para além
ao crescimento das operações financeiras, foi con- de mudanças nos aparatos técnico-gerenciais,
tratada uma funcionária para exercer atividades a mudança na relação com os agentes econômi-
relacionadas ao atendimento aos cooperados, cos que compõem a rede de relações do PNAE
recebimento de produtos, emissão de notas, con- foi fundamental para garantia de entrega dos
tato com as escolas e outros públicos etc. produtos.
Em relação à logística17 adotada para ope- Para cobrir os custos de operacionalização dos
racionalizar o PNAE, a Coofeliz recebia em sua programas (PAA e PNAE), a Coofeliz cobrava uma
sede, todas as segundas-feiras, os produtos trazi- taxa administrativa percentual sobre os produtos
dos pelos cooperados, que assumiam os custos do comercializados via cooperativa. A taxa adminis-
transporte entre a propriedade e a cooperativa. Na trativa foi fixada em 20% do valor do produto. O
cooperativa os produtos eram pesados, seleciona- montante arrecadado foi utilizado para custear
dos/fiscalizados, embalados e posteriormente dis- a operacionalização das atividades (manutenção
tribuídos nas escolas. Para que esta logística fosse de veículo, salário, diárias, despesas contábeis e
eficiente era necessário dispor de um sistema que de escritório, entre outras) e trabalhos de forma-
disponibilizasse as informações desde a aquisi- ção e capacitação com os cooperados.
ção de matéria-prima até a entrega do produto Tanto o PAA quanto o PNAE representam
ao consumidor. Isto facilitava o planejamento da oportunidades econômicas para os empreendi-
organização e ajuda na tomada de decisão. Se o mentos da agricultura familiar, e para a Coofeliz
fluxo de informações não funcionasse com eficá- não foi diferente. Entretanto, a partir da ope-
cia, erros ao longo da cadeia poderiam acontecer. racionalização destes programas, alguns desa-
Logo, a cooperativa poderia ser onerada a partir fios foram surgindo, ao passo que inovações
de atraso nas entregas, dispêndio de trabalho e foram necessárias para contorná-los. Por exem-
perda de informações (RIBEIRO, 1999). Assim, plo, ambos os programas não efetuam o paga-
para que esse arranjo proposto funcionasse, era mento pelos produtos à vista, isto atrelado a um
necessário um fluxo de informação entre as esco- complexo arranjo burocrático para prestação de
las, a cooperativa e os cooperados, no qual as contas. Estas características burocráticas se des-
escolas apresentassem suas demandas no prazo dobraram em atrasos nos pagamentos, fato que
que a cooperativa conseguisse articular com seus em determinadas situações contribuiu para fragi-
cooperados a produção para atender às deman- lizar a relação da cooperativa com seus coopera-
das; ou seja, era necessário que a rede social for- dos. Houve vários casos em que os cooperados
mada para a distribuição tivesse um fluxo de realizavam as entregas na cooperativa e ficavam
informações dinâmico e preciso. dois meses sem receber, em função de atrasos nos
Nesse sentido, não se trata apenas de capa- trâmites para o pagamento. Como a Coofeliz não
cidade gerencial ou de um aparato técnico que tinha capital de giro para realizar os pagamentos
consiga monitorar os procedimentos administra- aos cooperados, a solução encontrada foi a cria-
tivos e financeiros, mas uma relação de proximi- ção do que ficou conhecido como Vale Solidário.
dade e confiança, na qual as relações econômicas Este vale era uma nota, no valor dos produtos
estejam enraizadas (embedded) em redes sociais entregues, que podia ser utilizada como moeda
em estabelecimentos comerciais conveniados
17. Pode ser entendida como o processo de planejar, imple- com a cooperativa ou sacada na cooperativa de
mentar e controlar de maneira eficaz o fluxo e a armazena- crédito (SILVA e AMORIM JUNIOR, 2013).
gem de produtos, serviços e informações. Visa garantir a
disponibilidade de produtos, materiais e serviços no mer- Desta forma, o Vale Solidário funcionou
cado e pontos consumidores, a tempo hábil e ao menor como uma moeda social que, segundo Singer
custo possível. São funções-chaves da logística o trans-
porte, o estoque, a distribuição, a localização, os serviços
(2009, p. 72), é “um instrumento de troca e meio
aos clientes e o fluxo de informações (CARDOZO, 2012). de pagamento criado e operado por associações
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300 Mudanças Organizacionais em Empreendimentos de Agricultura Familiar a partir do Acesso ao Programa Nacional de
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autogestionárias.” Atualmente, o vale é aceito interna da família, e como ela reage ao jogo das
em supermercados, postos de combustíveis, far- instituições e dos condicionantes do mercado no
mácias, lojas de produtos agrícolas, papelarias e sistema local”.
padarias. O relacionamento entre a Coofeliz, seus Em 2013, a Coofeliz comercializou 44 itens
cooperados e demais comércios que aceitam o diferentes produzidos pelos agricultores familia-
vale solidário não se limita apenas às transações res cooperados, isto em uma região em que pre-
econômicas; é pautado em relações sociais esta- domina o monocultivo do café, o que pode ser
belecidas no dia-a-dia entre estes atores, o que explicado como uma ressignificação da produção
gera confiança e reputação, possibilitando que no entorno da matriz principal (café). Aquilo que
mais estabelecimentos comerciais adotem o vale, se cultivava apenas para autoconsumo passou, a
ampliando esta rede. partir do processo de interação com as regras do
programa, a ter um valor de mercado e se inserir
em redes de interação para além da rede de rela-
5.3. Matriz produtiva e qualidade de produção
ções locais.
O processo de modernização da agricultura A estratégia de diversificação da produção
vivenciado causou impactos na forma de produ- adotada pela cooperativa, que atende de forma
zir dos agricultores na região. De um modo geral, mais ampla ao PNAE no município e região, tam-
houve fomento à implementação de um modelo bém possibilitou o aumento da renda das famí-
de agricultura que privilegiasse a especialização lias. Com base na renda de uma propriedade
em determinados produtos (commodities)18. Com analisada19, onde residiam três famílias, pode-se
isso, intensificou-se a competitividade na agricul- observar essa alteração. A renda anual na pro-
tura e pecuária, além da busca por homogeneizar priedade entre 2007/2008 era de R$ 16.222,00; já
a produção, ou seja, estabelecer um padrão para a em 2013, a renda passou para R$ 57.098,00. Nesta
produção. Atrelado a isto, a abertura do mercado propriedade, 41 produtos diferentes eram produ-
interno possibilitou a entrada de produtos impor- zidos, nem todos comercializados pela coopera-
tados a preços mais baixos, o que propiciou signifi- tiva por meio do PNAE, mas parte significativa
cativa queda nos preços e exclusão de agricultores desta produção é escoada para o programa. Outro
familiares do mercado (BORILLI et al., 2008). dado que chama a atenção é em relação à pro-
Em Espera Feliz, a influência do processo de dução de café. Nesta propriedade, em 2009/2010,
modernização da agricultura não foi diferente do a renda da venda do café era de 47% da receita
acima exposto. O principal produto no município total da propriedade. Em 2013, este número caiu
é o café, com produção aproximada de 200 mil para 29% da composição anual da renda da pro-
sacas/ano (SILVA, 2010). Entretanto, o trabalho priedade. É evidente o aumento da mudança na
iniciado pelo sindicato dos trabalhadores rurais, renda a partir do acesso ao programa, principal-
posteriormente assumido pela Coofeliz e poten- mente como resultado do aumento da receita
cializado pelo PNAE, vem contribuindo para a proveniente de outros produtos, apesar de o café
mudança da matriz produtiva das famílias coo- ser a principal cadeia produtiva do município.
peradas, em prol da diversificação da produção. Outra mudança relevante percebida a partir
Segundo Borilli et al. (2008, p. 14), “[...] deve-se do acesso ao PNAE foi a adequação sanitária e de
entender a matriz produtiva a partir da dinâmica higiene com os produtos. A principal dificuldade
ocorria em relação aos padrões necessários para
“gerar qualidade aos produtos”, diretamente
18. Crepaldi (apud BORILLI et al., 2008, p. 13) comentam que
“[...] o agricultor vem diminuindo o número de atividades relacionada à precariedade de infraestrutura
em seu estabelecimento rural, dedicando-se em apenas
uma ou duas espécies, especializando-se para melhorar 19. Dados do monitoramento econômico realizado em uma
a qualidade de seus produtos, visando um mercado pelo propriedade de um sócio da Coofeliz entre 2007 e 2013
qual recebe um melhor preço”. pelo CTA-ZM (CTA-ZM, 2014).
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Marcio Gomes Silva, Marcelo Miná Dias e Paulo Cesar Gomes Amorim Junior 301
mínima adequada para o processamento, arma- dade de produção foram as negociações entre a
zenamento e transporte das mercadorias. Essas Coofeliz e os gestores públicos responsáveis pelo
limitações geravam dificuldades na obtenção dos PNAE no município/região acerca das demandas
registros sanitários para produtos específicos, (elaboração de Chamadas Públicas), do padrão
que exigiam adequação tanto de infraestrutura de qualidade dos produtos e das necessidades
quanto de manuseio de produtos. para superar as limitações estruturais de comer-
Além destas limitações estruturais, a legis- cialização da agricultura familiar. Como afirma
lação sanitária se mostrava incompatível com a Wilkinson (2008, p. 16):
realidade dos empreendimentos da agricultura
familiar. Sua aplicação propiciava concentração Os novos patamares de qualidade implicam
novas relações de poder econômico. Assim,
de mercado, favorecendo as grandes empresas
as associações dos agricultores e as suas repre-
agroalimentares, sobretudo as de produtos com
sentantes devem negociar os padrões de qua-
maior valor agregado, ou seja, criava oligopólios,
lidade com base no princípio que objetivos
impedindo a entrada de novos empreendimen-
comuns podem ser alcançados com instrumen-
tos. Como afirma Wilkinson (2008, p. 205), “a legis- tos diferentes. Devem-se identificar as práticas
lação federal sobre agroindústrias efetivamente agrícolas que, ao mesmo tempo, garantem
tem excluído o setor artesanal de produtos pere- níveis adequados de qualidade e viabilizem a
cíveis do mercado nacional”. Mesmo se tratando agricultura familiar na atividade em questão.
de um mercado diferenciado (PNAE), os padrões
estabelecidos para os produtos eram os mesmos Devido às relações de confiança instituídas,
aplicados aos de mercados de commodities. Logo, a partir de repetidas transações entre os gestores
padrões que interessam aos grupos dominantes públicos e os agricultores, inicialmente em rela-
eram corriqueiramente institucionalizados como ções informais de mercado e posteriormente na
referência à normatização dos processos produti- operacionalização do PAA e PNAE, se constituiu
vos diversificados que caracterizam parte da agri- uma espécie de reputação dos produtos, dos agri-
cultura familiar (WILKINSON, 2008). cultores e da própria cooperativa entre os gestores
Diante da necessidade de enfrentar este cená- públicos e demais envolvidos com os programas
rio adverso, a Coofeliz buscou realizar as ade- (WILKINSON, 2008). Em relação à qualidade da
quações e estabelecer parcerias que viabilizem o produção, a experiência demonstrou que o reco-
acesso de seus cooperados ao PNAE. Quando a nhecimento da mesma não depende apenas de
cooperativa começou a acessar o PNAE, alguns um selo que certifica a qualidade do produto,
cooperados, por terem experiência em produzir e pois a confiança, o conhecer o processo de pro-
comercializar apenas o café, sendo os outros pro- dução, a reputação que o produto adquire cum-
dutos apenas para o autoconsumo, não tinham pre esse papel em determinadas situações.
o hábito de produzir para comercializar banana,
alface, taioba, laranja etc. Estas lavouras não eram
consideradas comercializáveis. No início das entre- 6. Conclusões
gas, respondendo a demanda por estes produtos,
os cooperados realizaram entregas na coopera- Com base na pesquisa realizada, identifi-
tiva com produtos em sacos de adubos, ou outros cou-se que o acesso ao mercado institucional
tipos de embalagem, o que poderia comprometer pela Coofeliz promoveu uma série de mudan-
a qualidade do produto e a segurança de quem ças envolvendo diferentes aspectos de sua rede
iria consumi-lo. A orientação técnica e as ações de de relações sociais. Um desses aspectos refere-se
capacitação visaram a mudança deste cenário. à dimensão de ordem técnico-gerencial, envol-
Outro aspecto relevante na compreensão das vendo mudanças significativas nos processos de
mudanças relativas à matriz produtiva e à quali- organização produtiva – e nos mecanismos de
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302 Mudanças Organizacionais em Empreendimentos de Agricultura Familiar a partir do Acesso ao Programa Nacional de
Alimentação Escolar
controle necessários – à medida que se amplia- BABBIE, E. The practice of social research. 6. ed. Belmont,
ram as operações financeiras. CA: Wadsworth, 1992.
Foi possível identificar inovações organiza- BECKER, H. S. Métodos de pesquisa em ciências sociais.
cionais estabelecidas a partir das relações sociais 2. ed. São Paulo: Editora HUCITEC, 1994.
em que a cooperativa passou a se inserir. O exem- BORILLI, S. P., FERRAZOLI, A. C. M., CICHOSKI,
plo do Vale Solidário utilizado como moeda E. P. e FERREIRA F. C. Análise da evolução da matriz
social, criado para suprir a dificuldade de paga- produtiva do setor agropecuário do município
mento aos agricultores devido à ausência de de Toledo/PR. Ciências Empresariais da UNIPAR,
capital de giro, é um exemplo evidente dessa ino- Umuarama, v. 9, n. 1 e 2, p. 11-33, jan./dez. 2008.
vação, lastreada pela confiança e pela relação de BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário.
proximidade. Projeto Nutre Minas. Brasília, 2011.
As relações estabelecidas pela cooperativa CARDOZO, K. T. et al. A tecnologia da informação
com outros agentes envolvidos no processo de na logística da Cooperativa Mista Agropecuária de
aquisição de alimentos para alimentação esco- Juscimeira/MT. Revista Científica Eletrônica de Ciências
lar no município têm criado padrões de mercado Sociais Aplicada da Eduvale, v. 5, n. 7, nov. 2012.
mais próximo da realidade dos agricultores fami- COSTA, L. M. C. O programa nacional de alimentação
liares. A inserção de produtos específicos, respei- escolar (PNAE) na perspectiva dos usuários: um estudo
tando a sazonalidade e as vocações produtivas de caso. 2004. 186 f. Dissertação (Mestrado em
locais nos cardápios escolares, é uma evidência Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Universidade
Federal do Ceará, Fortaleza, 2004.
deste achado da pesquisa. A análise desta experi-
ência torna evidente o fato de que as normas téc- CTA-ZM. Transição agroecológica e políticas públicas na
nicas são valores passíveis de serem negociados Zona da Mata de MG. Viçosa: CTA-MZ, 2011.
e que os mercados, especificamente os criados a CTA-ZM. Relatório planejamento COOFELIZ 2014.
partir do PNAE, são construções sociais. Viçosa: CTA-ZM, 2014.
O acesso ao PNAE também provocou mudan- DUARTE, D. N. e DIAS, M. M. Rede de comercialização,
ças na renda dos agricultores e na diversidade pro- políticas públicas e mudanças na ação extensionista:
dutiva. A pesquisa demonstrou que, apesar de o o caso de Iconha-ES. Extensão Rural, v. 19, p. 105-136,
município de Espera Feliz ter predominantemente 2012.
o cultivo do café, foram vários os itens comerciali- FREITAS, A. F., FREITAS, A. F. e DIAS, M. M. Mudanças
zados e, em alguns casos, a renda adquirida com a conceituais do desenvolvimento rural e suas influências
comercialização da diversidade produtiva é maior nas políticas públicas. Revista de Administração Pública,
do que a renda gerada com a venda do café, até v. 46, p. 1575-1597, 2012.
então praticamente a única cultura direcionada a GABRICH, G. T. Análise das alterações na estrutura
mercados. Isso nos permite inferir que o PNAE em organizacional e sua influência na longevidade do Jornal
Espera Feliz também provoca mudanças na matriz Estado de Minas. 2008. 116 f. Dissertação (Mestrado em
Ciências Econômicas) – Universidade Fumec, Belo
produtiva dos agricultores vinculados à coopera-
Horizonte, 2008.
tiva, no sentido de uma maior diversificação da
produção, ao invés de uma especialização produ- GAZOLLA, M. e PELEGRINI, G. A construção
social dos mercados pelos agricultores: o caso
tiva voltada para uma commodity.
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