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Abstract: The recent policies of governmental purchases that emerged in the years 2000,
such as the National Program of Food in Schools (PNAE) and the Food Acquisition
Program (PAA), have brought significant opportunities for family agriculture cooperatives
in Brazil to access markets. In spite of the possibilities that the PNAE and the PAA offer to
family agriculture and its organizations, these programs also present a series of challenges,
which involve different agents in the food acquisition process. This article intends to
delineate the profile of family agriculture cooperatives in Minas Gerais and analyze their
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1234-56781806-9479005301006
RESR, Piracicaba-SP, Vol. 53, Nº 01, p. 109-126, Jan/Mar 2015 – Impressa em Abril de 2015
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112 As Cooperativas de Agricultura Familiar e o Mercado de Compras Governamentais em Minas Gerais
produtos adulterados eram comuns na Inglaterra; lizar os serviços econômicos por ela propor-
g) a educação cooperativista seria uma bandeira e cionados Para este efeito vamos denominá-la
h) a cooperativa procuraria manter-se neutra em empresa cooperativa, e os indivíduos, que
questões políticas e religiosas (SINGER, 2002). são ao mesmo tempo donos e usuários da
empresa cooperativa, associados, sócios ou
Não é tarefa fácil encontrar uma definição
membros cooperadores” (p. 82).
que contemple a complexidade contida na socie-
dade cooperativa. Essa dificuldade pode ser
A dinâmica de os donos, quando integralizam
observada na multiplicidade de ramos em que as
seu capital, e usuários, quando utilizam os servi-
cooperativas atuam e na falta de consenso entre
ços oferecidos pela cooperativa, foi denominada
os estudiosos que se propõem a compreendê-la.
por Benecke (1980) de critério de identidade. Na
Em relação aos ramos de atuação, pode-se desta-
empresa convencional, o interesse do sócio é indi-
car que as cooperativas, de certa forma, derivam
reto, ele não necessariamente utiliza os serviços
de quatro principais tipos: consumo, produção,
oferecidos pela empresa; seu interesse é restrito
crédito e trabalho. Segundo o Serviço Nacional
ao lucro que a atividade irá lhe fornecer. Já nas
de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop),
cooperativas, o capital integralizado pelos coope-
são aproximadamente 13 ramos de cooperati-
rados cria a expectativa que a cooperativa presta-
vas atuantes no Brasil: agropecuário, transporte,
-lhes alguns serviços (compra, venda, trabalho,
crédito, trabalho, saúde, educacional, produção,
acesso a crédito, entre outros). Espera-se que a
habitacional, infraestrutura, consumo, minera-
cooperativa lhes ofereça algum tipo de serviço
ção, turismo e lazer e especial (SESCOOP, 2012).
que apoie suas atividades que, individualmente,
Com relação aos estudos dedicados a com-
teriam dificuldades em realizar. Esse critério de
preender a sociedade cooperativa, pode-se desta-
identidade significa também que os cooperados
car a convergência deste debate sobre a sua dupla
têm poder (pelo menos teoricamente) de mani-
orientação, ou seja, ela pode ser compreendida
festar seus interesses na realização de um deter-
do ponto de vista econômico e também socio-
minado serviço e nos rumos da cooperativa.
político. Alguns trabalhos apontam que, nos paí-
É importante ressaltar que as cooperativas,
ses desenvolvidos, a preocupação dos estudiosos
na condição de sociedade de pessoas, se distin-
está mais voltada para compreensão da coope-
guem das empresas (sociedade de capital). Neste
rativa do ponto de vista econômico; já nos paí-
sentido, para as sociedades de capital não inte-
ses considerados de terceiro mundo, a literatura
ressa muito as pessoas que vão integrá-la (desde
enfatiza questões sociais e políticas (BENECKE,
que disponibilizem o capital). Nas sociedades
1980). Polonio (2004) destaca a dificuldade na
de pessoas, o relacionamento entre a sociedade
definição de cooperativa. Ressalta que diversos
e seus sócios é de extrema importância: as capa-
estudos evidenciam seu papel de intermediária
cidades administrativas e operacionais, além do
entre o sócio e o mercado, além de seu aspecto
interesse de participar dos sócios, são levados em
não lucrativo.
consideração.
Benecke (1980) definiu as cooperativas de
Ambas podem realizar atividades econô-
forma bem parecida com ACI; entretanto, ele se
micas organizadas; entretanto, as empresas são
atém ao duplo papel que os cooperados ocupam
organizadas tão somente com objetivo de produ-
em relação à sociedade cooperativa, o papel de
zir bens e serviços, distribuindo-os no mercado
donos e usuários. Benecke (1980) afirma que:
almejando lucro. No entanto, as cooperativas
“Falamos aqui de cooperação cooperativa, orientam-se para a prestação de serviços aos seus
quando um grupo de indivíduos legalmente cooperados (BENECKE, 1980). Os excedentes de
independentes toma seu cargo conjunta- suas atividades econômicas são denominados
mente, uma empresa com a intenção de uti- sobras, que devem ser almejadas para garantir
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que a cooperativa consiga prestar serviços a seus compreendido como possibilidade de amenizar
membros ao longo do tempo. Ela assume papel alguns problemas gerados pela crise, o café deixa
de facilitadora das atividades dos cooperados, de ser o principal produto que sustenta a econo-
representando-os, ou seja, podem ser compreen- mia e surge a necessidade de diversificar a produ-
didas como uma extensão da propriedade de seus ção nacional. O governo incentiva a constituição
cooperados. As atividades mercantis desenvolvi- de cooperativas agropecuárias, sobretudo as coo-
das por elas são em nome de seus cooperados, perativas que conseguissem escoar a produção da
por isso que não são entendidas como sociedades pequena propriedade (PINHO, 1965). Chiarello
empresariais (POLONIO, 2004). (2006) afirma que:
As operações que as cooperativas estabele-
“O governo passou a incluir o cooperativismo
cem com seus cooperados são compreendidas
na pauta da política agrícola nacional, como
como transferência de mercadorias/recursos e
forma de defender a produção em pequena
não como atividades mercantis. O objetivo des-
propriedade, estimulando a policultura e o
tas operações não é trazer benefícios para as desenvolvimento do mercado interno” (p. 23).
cooperativas em detrimento ao trabalho dos coo-
perados e, sim, buscar atender aos interesses e Além disso, este incentivo à constituição de
necessidades de seus cooperados transferindo- cooperativas agropecuárias estava atrelado à ten-
-lhes as sobras obtidas (ou dando-lhes a oportu- tativa do Estado de resolver os problemas rela-
nidade de decidir em assembleia o que será feito cionados ao abastecimento dos centros urbanos.
das mesmas). Estas operações são denominadas Neste sentido, a constituição de cooperativas
de atos cooperativos, previstas na Lei nº 5.764/71. nesta época tinha como objetivo a eliminação dos
A abordagem sobre a sociedade coopera- intermediários. Machado (2006) relata que:
tiva realizada neste trabalho também irá enfati-
zar mais seu aspecto econômico (intermediária “[...] a primazia foi das cooperativas agrícolas
de laticínios, que criaram canais alternativos
entre o cooperado e o mercado), se dedicando
para a comercialização dos produtos de abas-
a refletir sobre o cooperativismo agropecuário
tecimento. Nelas, diversos pequenos pro-
e procurando construir o entendimento sobre o
dutores uniam esforços na tentativa de criar
cooperativismo da agricultura familiar. alternativas aos sistemas de comercialização
existentes e que eram controlados por ‘inter-
2.1. Trajetória do cooperativismo mediários’” (p. 44-45).
agropecuário no Brasil
Neste período de 1935 a 1960, houve aumento
O início da história do cooperativismo agro- significativo do número total de cooperativas no
pecuário no Brasil é marcado por uma estrutura Brasil, passando de 105 para 4.627 cooperativas.
autoritária, na qual os interesses dos agricultores Entretanto, a partir de 1966, o Estado intensifica
familiares não eram considerados. As iniciativas sua intervenção na vida das cooperativas, deter-
eram para a produção exportadora. Esse modelo minando que as mesmas apenas pudessem fun-
beneficiou os produtores que detinham grandes cionar sob sua autorização. A partir da criação da
extensões de terra e privilegiavam a monocul- OCB em 1969, da Lei nº 5.764/71 e da constitui-
tura. Já os pequenos produtores, camponeses e ção do Banco Nacional de Crédito Cooperativo
demais agricultores cujas atividades produtivas (BNCC), o governo direciona as atividades das
eram realizadas pela família, se viam cada vez cooperativas para a produção de commodities,
mais marginalizados (PIRES, 2009). visando atender às demandas do mercado exte-
A partir da crise econômica mundial no final rior. Estes foram fatores importantes para que o
dos anos 1920, o governo brasileiro redefine suas número de cooperativas caísse significativamente
estratégias de produção. O cooperativismo é e prevalecessem as cooperativas que atendiam
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Contudo, a agricultura familiar continua não nas escolas públicas, como a Seleta Caritativa
sendo o modelo central do desenvolvimento Humanitária, uma organização de caráter filan-
rural brasileiro e, sim, o das grandes proprie- trópico ligada à maçonaria. Entre 1920 e 1930,
dades, que contam com trabalho assalariado. alguns estados também criaram suas próprias
Apesar de contarem com a menor proporção de políticas de fornecimento de alimentação em
terras, as unidades familiares são mais expres- algumas escolas públicas de São Paulo, Pará,
sivas em quantidade, ocupam menos parte das Amazonas, Ceará, Minas Gerais e Rio de Janeiro
terras, geram mais trabalho e renda, além de con- (COSTA, 2004).
tribuir com produção maior por área cultivada Por volta da década 1930, começa a movimen-
(ABRAMOVAY, 1997). tação do Estado para adotar a alimentação esco-
Os processos de globalização deixaram as dis- lar como política pública. Já havia uma discussão
putas pelos mercados mais acirradas entre os ato- sobre o uso de alimentos regionais nos cardápios,
res que nele atuam, ocasionando a exclusão de como afirma Turpin (2009):
parte da população do sistema de produção. No
que se refere à agricultura familiar, a constitui- “[...] estudiosos e profissionais envolvidos com
o assunto já definiam cardápios adequados
ção de associações e cooperativas se mostra como
às diversas regiões do país, preconizando o
uma importante ferramenta de organização
emprego de alimentos regionais, o que visava
social, política e econômica. Nesta perspectiva,
enriquecer a base nutritiva da alimentação dos
o cooperativismo apresenta-se como uma alter-
escolares, mas também viria a se constituir no
nativa interessante aos agricultores familiares, embrião do apoio à pequena produção local”
organizando, agregando valor, comercializando (p. 21).
e de alguma forma tentando inserir a produção
em mercados locais, regionais e globais, consti- Porém, não foram esses rumos tomados
tuindo-se como instrumento de enfrentamento à pela alimentação escolar no Brasil. Influenciada
concorrência empresarial (RIBEIRO, 2012). pela política norte-americana do Alimento Pela
Para que uma cooperativa ou associação seja Paz, que consistia em doar alimentos estocados
considerada um empreendimento da agricultura durante a guerra entre os Estados Unidos e a
familiar, ela precisa obter a Declaração de Aptidão Coreia às crianças vítimas de guerras ou que se
ao Pronaf para pessoas jurídicas (DAP – Jurídica). encontravam desnutridas (COSTA, 2004), os pro-
Entre as exigências para a obtenção deste docu- dutos doados em sua maioria eram leite em pó e
mento, estão a necessidade de no mínimo 70% de derivados de trigo. Essa “ajuda” criou novas for-
seus sócios/cooperados terem a DAP física e pelo mas de organização da produção agrícola e do
menos 55% de sua produção beneficiada, proces- consumo dos países beneficiários, além da difu-
sada ou comercializada ser oriunda de seus sócios são destes produtos pelo mundo, ampliando o
com DAP física7. mercado para os mesmos (MALUF, 2009). Em 31
de março de 1955, o decreto nº 37.106/558 insti-
tuía a Campanha de Merenda Escolar (CME) que,
3. Alimentação escolar: coincidentemente, em seu 2º artigo, previa provi-
trajetória histórica e estratégias dências para a melhoria do valor nutritivo dos ali-
atuais de abastecimento mentos, medidas para aquisição de alimentos nas
fontes produtoras, além de convênios com enti-
Em 1908, há os primeiros registros de inicia- dades internacionais para fornecimento, entre
tivas que forneceram alimentos gratuitamente outros direcionamentos.
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esta demanda, o FNDE repassou R$ 3.118.473.000 dores para acompanhar o andamento das possí-
para aquisição da alimentação escolar, sendo veis negociações e esclarecimentos das dúvidas.
R$ 936.304.100,00 destinados à compra direta da Minas Gerais é o segundo maior estado
agricultura familiar. Não se trata de um mercado do Brasil quando se refere ao volume de recur-
pequeno; provavelmente existem interesses dis- sos repassados pelo FNDE para a alimentação
tintos em relação ao PNAE, seja com vistas a sua escolar (PNAE). Em 2011, o valor deste repasse
implementação e também para que a mesma não foi de R$ 289.286.280,00 (rede estadual e muni-
aconteça. Cerca de um R$ 1 bilhão que fariam cipal), sendo aproximadamente R$ 87 milhões
parte exclusivamente das receitas das empresas para compra direta da agricultura familiar12. O
distribuidoras de alimentos passam a poder ser estado contava com 305.899 agricultores e agri-
incorporados à renda de agricultores e agricul- cultoras com DAP e 397 empreendimentos aptos
toras familiares de todo o Brasil. Ainda segundo a comercializar seus produtos, atendendo à esta
o MDA, existia no Brasil, em 2011, 3.541.501 agri- demanda. Entretanto, a fatia deste mercado ocu-
cultores e agricultoras familiares com DAP e 2.245 pada pelos 80 empreendimentos (cooperativas
empreendimentos da agricultura familiar em e associações) diagnosticados (20% do total de
todo o País. empreendimentos no estado) pelo Nutre Minas
Em 2010, o MDA, a partir de dois departa- é de R$ 5.582.259,7913 (rede municipal e esta-
mentos – Departamento de Assistência Técnica dual), aproximadamente 6%. Em se tratando dos
e Extensão Rural (Dater) e Departamento de sete maiores municípios mineiros, essa diferença
Geração de Renda e Agregação de Valor (DGRAV), é ainda maior: dos R$ 10.119.039,32 repassados
lança a chamada pública n. 092/2010. Seu objetivo (rede municipal), apenas R$ 324.587,68, ou seja,
era a seleção de entidade executora de assistência cerca de 3% do repasse foi executado via compra
técnica e extensão rural para a inserção de empre- direta da agricultura familiar.
endimentos coletivos da agricultura familiar e O PNAE se apresenta como oportunidade de
seus gêneros alimentícios no PNAE em grandes comercialização. Entretanto, são diversos os desa-
centros urbanos. Esta chamada pública buscou fios no dia-a-dia dos agricultores familiares e suas
atender os estados do Amazonas, Minas Gerais e organizações na busca por acesso a este mercado.
Rio de Janeiro. No estado de Minas Gerais, este Apesar de o volume de recursos destinados aos
projeto foi denominado Nutre Minas. grandes centros para aquisição de alimentos para
Em Minas Gerais, tal projeto previa criar alimentação escolar ser significativo, a logística de
alternativas para o abastecimento do mercado distribuição dos alimentos nas escolas é complexa
institucional das sete maiores cidades do estado e os padrões exigidos dos produtos impossibili-
(Belo Horizonte, Betim, Contagem, Juiz de Fora, tam ou dificultam o acesso pelos empreendimen-
Montes Claros, Ribeirão das Neves e Uberlândia), tos de agricultura familiar.
além da secretaria estadual de educação. Para
tanto, dentre as atividades previstas no pro-
jeto estavam: 80 diagnósticos participativos por 4. Metodologia
empreendimento; 40 planos de negócios, estudo
de mercado (como funciona a execução da lei nº Este trabalho tem caráter exploratório, pois
11.947/2009 em cada município) e estudo de via- se trata de um tema relativamente novo e sem
bilidade da produção; 80 visitas de orientação téc- muitos estudos precedentes. O universo foco das
nica e apoio à regularização de empreendimentos análises foram 19 cooperativas localizadas em
coletivos da agricultura familiar; elaboração de
12. Disponível em: <http://www.mda.gov.br/portal/saf/arqui-
projetos de venda para os mercados institucionais
vos/view/alimenta-o-escolar/repasse-fnde-por-estado/C
dos grandes centros e reuniões de avaliação com at%C3%A1logo_AF_E_AE_-_EstadoMG.xls>.
gestores da alimentação nos municípios compra- 13. Dados da pesquisa.
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Sobre a participação das mulheres, 17 coo- ciamentos junto ao BNDES (5%) e outras fontes
perativas forneceram informações a respeito. de financiamento (19%).
Apenas uma cooperativa apresenta número Deste conjunto de cooperativas, 15 (aproxi-
maior das cooperadas do que cooperados em seu madamente 79%) têm o mercado governamental
quadro social. De modo geral, os dados revelam como principal. Destas, seis (31,5%) acessam ape-
a baixa participação das mulheres nas coopera- nas o PNAE; quatro (21%) acessam só o PAA; cinco
tivas em questão. Do total de cooperados, 59% (21,5%) acessam os dois programas – PAA/PNAE e
são homens, 19%, mulheres e, para 22%, não se quatro cooperativas não acessam nenhum destes
obteve informação. mercados. Em relação ao mercado convencional
Essa baixa participação das mulheres no qua- (comércio por atacado e varejo), 11 cooperativas
dro social das cooperativas analisadas pode ser (58%) conseguem inserir seus produtos. Das oito
explicada com base na divisão sexual do traba- cooperativas que não acessam o mercado conven-
lho, socialmente construída. Instituiu-se que o cional, seis apenas conseguem escoar a produção
trabalho nas lavouras, bem como as atividades de seus cooperados via mercado governamen-
relacionadas ao comércio, ao relacionamento tal; as outras duas cooperativas, na data do diag-
com o banco, cooperativas, sindicatos (conside- nóstico, ainda não acessavam nenhum mercado
rado trabalho produtivo) é papel dos homens e o (tinham acabado de ser constituídas).
trabalho da mulher está vinculado à casa, à cria- A movimentação financeira levantada nos
ção de pequenos animais, à horta, ao cuidado e diagnósticos aponta que esse conjunto de coope-
educação dos filhos, além de trabalhar nas lavou- rativas movimentou, em 2011, R$ 10.940.298,25.
ras (trabalho reprodutivo). É preciso repensar o Desta movimentação, R$ 6.911.402,80 foram
papel da mulher, para que a mesma possa efe- provenientes do mercado convencional e
tivar sua participação em outras dimensões da R$ 4.028.895,45, do mercado governamental.
vida social (BONI, 2006). Uma característica presente em muitas uni-
No que diz respeito à assistência técnica, ape- dades familiares de produção é a diversidade de
nas 7% das cooperativas não são assessoradas. O produtos (ABRAMOVAY, 1997). Essa caracterís-
restante (93%) é assessorado de alguma forma. tica pode ser observada nos produtos ofertados
Dentre as organizações que prestam assessoria, pelas cooperativas em questão. Foram 85 produ-
destaca-se a Empresa de Assistência Técnica e tos distintos comercializados por elas em 2011.
Extensão Rural (Emater), presente em 39% das Dentre esses produtos, há produtos in natura, de
cooperativas, seguida pelas ONG’s em 18%, e origem animal, vegetal e produtos processados.
o restante (36%) é assistido por universidades, A diversificação, além de uma característica
Sebrae, instituições privadas e outros tipos de da produção familiar, é considerada uma estraté-
organização de apoio e fomento. No que se refere gia de redução dos riscos (climáticos, oscilações
à assistência técnica, a grande parte é feita sob de preços etc.) adotada pelos agricultores fami-
aspectos produtivos e assessoria individualizada liares; também pode ser considerada uma pos-
na propriedade do cooperado. sibilidade de inserção de todos os membros da
O acesso ao crédito é algo que ainda não é família em determinadas atividades que podem
muito presente para este conjunto de cooperati- ser de caráter agrícola e não agrícola (BUAINAIN
vas. Pouco mais de 40% (43%) não acessa nenhum et al., 2003). Por outro lado, a diversificação do
tipo de política de crédito. A principal política de portfólio aumenta a complexidade da gestão,
crédito acessada pelas cooperativas analisadas é principalmente em sistemas agroalimentares
o PAA formação de estoque (14%), em seguida, o que são complexos por si só (ZYLBERSZTAJN,
Pronaf agroindústria (9%), o Proinf (10%), finan- 1994).
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ciados. As relações de confiança, construídas a pode ser remunerado, onerando aqueles que
partir de repetidas transações entre os gestores estão à frente do empreendimento.
públicos e os agricultores em relações informais A partir do acima exposto, serão apresenta-
de mercado, constituíram uma espécie de repu- das algumas questões identificadas nos diagnós-
tação dos produtos dos agricultores e dos empre- ticos que de alguma forma podem colocar estes
endimentos (WILKINSON, 2008). Essa relação de empreendimentos em desvantagem competi-
confiança sobrepõe alguns normativos e constitui tiva. Das 19 cooperativas estudadas, apenas oito
as relações de qualidade a partir da forma como o fazem planejamento estratégico, ou seja, procu-
produto é produzido. ram refletir sobre o ambiente interno e externo da
Desta forma, são necessárias ações que bus- organização, analisar o relacionamento com seus
quem a adequação dos normativos às realida- públicos, determinar objetivos, definir valores,
des da agricultura familiar, estabelecendo novos atribuir responsabilidades para a implementa-
padrões de mercado (SILVA e SILVA, 2011). Isto ção das ações e monitorar o andamento do pla-
deve ser atrelado a programas de assistência téc- nejamento (TAVARES, 2007). Desta forma, sem
nica que levem em consideração tanto a parte se utilizar desta ferramenta, estes 11 empreendi-
agroindustrial quanto o gerenciamento dos mentos se encontram extremamente expostos às
empreendimentos. possíveis variações de mercado.
Do ponto de vista da gestão, é possível obser- Nove das cooperativas realizam a separação
var que se trata de um entrave que de certo modo entre custos fixos e variáveis, ou seja, dez coope-
é apontado por todas cooperativas diagnostica- rativas ainda não têm ciência de que, indepen-
das, seja na área contábil, financeira, fiscal, orga- dente do volume de vendas, certos custos vão
nização da produção, comercialização, entre incorrer de qualquer maneira ao longo do mês.
outras. É considerado um desafio a gestão de O registro dos custos também chama a atenção.
cooperativas de agricultura familiar que têm por- Apenas três cooperativas contam com software
tfólio de produtos diversificado, principalmente especializado, 12 fazem seus registros no Excel
quando estas começam a se aventurar em novos e quatro cooperativas não registram seus custos.
mercados. À medida que os negócios da coope- No entanto, a informação que mais chama aten-
rativa começam a ganhar maiores proporções, o ção nesse quadro relaciona-se ao tratamento dos
desafio aumenta, sobretudo, para as cooperativas custos de produção, principalmente na hora de
que trabalham com produtos processados, pois formar o preço de venda dos produtos. Apenas
seus diretores precisam gerir a cooperativa em si nove cooperativas (47%) levam em conta os cus-
e a unidade de processamento. Das cooperativas tos de produção mais margem de lucro para a
diagnosticadas, a grande maioria não possui fun- composição do preço de venda. Portanto, dez
cionários suficientes, sendo os próprios agricul- cooperativas chegam ao preço de venda basea-
tores os envolvidos com a gestão e a produção, das em outros critérios15 (preço de referência da
concomitantemente. Conab, igual e/ou abaixo da concorrência).
Desta maneira, Zylbersztajn (1994) afirma Trata-se de um risco muito grande para o
que: “cooperativas que operam nos sistemas empreendimento, pois se desconhece quais pro-
agroalimentares dificilmente são empresas pouco dutos remuneram de fato a cooperativa. Como
complexas, dadas as características de organi- pensar alternativas para a redução de custos dos
zação do agrobusiness moderno” (p. 25). Além
disso, os diretores são os próprios agricultores
15. A Companhia Nacional do Abastecimento disponibiliza
familiares que assumem um duplo papel, o que uma lista de produtos com preços de referência. Esses
pode prejudicar a condução de suas atividades valores, no entanto, são de caráter nacional, e não trazem,
por região, os preços praticados nos mercados locais em
produtivas em suas propriedades. Em cooperati- que as cooperativas estão inseridas. Esses valores são atri-
vas de menor porte, o trabalho na diretoria não buídos aos projetos de venda do PAA pelas cooperativas.
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produtos para torná-los competitivos, principal- com eficácia, erros ao longo da cadeia podem
mente para acessar o mercado dos grandes cen- acontecer; logo, a cooperativa pode ser onerada
tros, se o empreendimento desconhece quanto a partir de atraso nas entregas, dispêndio de mão
custa sua produção? de obra e perda de informações (RIBEIRO, 1999).
Muitas dessas cooperativas são parceiras de Sobre as cooperativas analisadas, algumas
organizações como sindicatos de trabalhadores apontaram como limitações questões que se
rurais, pois, em alguns casos, emergiram a partir enquadram neste tópico. Estoque, transporte e
da demanda de comercialização dos agricultores distribuição, entre outras questões, apareceram
sindicalizados. Portanto, essas parceiras (sindica- como limitações em relação à produção. Nesta
tos/cooperativas), em determinados casos, finan- dinâmica, o transporte é realizado desde a pro-
ciam as atividades das cooperativas (pagamento priedade do cooperado até a cooperativa, enfren-
de diárias, custeio de atividades, transporte, entre tando estradas de terra, às vezes, em condições
outros), até que as mesmas consigam se manter. ruins. Outra perspectiva é o transporte dos pro-
Essa relação é fundamental para a sobrevivên- dutos processados que podem exigir condições
cia dessas cooperativas; entretanto, isso contri- especiais (refrigeração, entre outras) para serem
bui para o pouco cuidado com o registro de seus transportados. Das cooperativas estudadas, ape-
custos. nas 50% possuem caminhões que auxiliam na
Desta forma, o desafio colocado para as coo- coleta e distribuição dos produtos. As outras 50%
perativas é o de se desenvolver, acessar mercados terceirizam e os cooperados assumem o trans-
para além do local (se tratando do mercado gover- porte dos produtos ou buscam alguma forma
namental), dando conta de responder a comple- para realizarem suas entregas.
xidade que é gerir um empreendimento que atua A necessidade de local para armazenagem
no segmento agroalimentar e não perder seu foco também é apontada como limitação. Os estoques
enquanto cooperativa, que é centrado no homem não se limitam apenas aos produtos acabados,
e não apenas no capital (ZYLBERSZTAJN, 1994). mas também à necessidade de local para armaze-
Portanto, a formação contínua dos cooperados nar em condições adequadas os produtos.
se faz necessária em aspectos administrativos, A ausência de registro dos custos e demais
cooperativistas e no ramo agroalimentar de sua informações também pode ser definida como um
atuação. problema de logística. A organização da produ-
No que se refere à logística, essa pode ser ção pode ser agrupada neste tópico, pois, se não
entendida como o processo de planejar, imple- há registros atualizados sobre a produção, fica
mentar e controlar de maneira eficaz o fluxo e a inviável a cooperativa assumir compromissos
armazenagem de produtos, serviços e informa- com novos clientes e conseguir manter entregas
ções. Visa garantir a disponibilidade de produtos, regulares de seus produtos. É importante ressal-
materiais e serviços no mercado e pontos consu- tar que, a partir do planejamento da produção, é
midores, em tempo hábil e ao menor custo possí- menor a chance de se gerar expectativa nos coo-
vel. São funções-chaves da logística o transporte, perados para produzirem determinados produ-
o estoque, a distribuição, a localização, os serviços tos que se sobreponham à demanda, o que pode
aos clientes e o fluxo de informações (CARDOZO gerar riscos aos cooperados em relação à produ-
et al., 2012). ção excedente. Isso pode desgastar a relação entre
Para que a logística seja eficiente, é necessário cooperado e cooperativa.
um sistema de informações que englobe desde a Algumas cooperativas de maior porte conse-
aquisição de matéria-prima até a entrega do pro- guem se organizar e formar alianças estratégicas
duto acabado ao consumidor. Isto facilita o pla- com outras cooperativas ou empresas para supe-
nejamento da organização e ajuda na tomada de rar as limitações relacionadas à logística, tanto no
decisão. Se o fluxo de informações não funciona mercado governamental em outros municípios,
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