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TITULO: Políticas públicas e suas consequências econômicas, sociais e

ambientais na formação do Arranjo Produtivo Local da soja: o caso do município de


Sorriso em Mato Grosso1.
AUTORES: Arturo Alejandro Zavala Zavala, Eliezer Pereira da Silva; Lazaro
Camilo Recompensa Joseph, y Benedito Dias Pereira.
CENTRO: Universidade Federal de Mato Grosso
DIRECCION DE CORREO ELECTRONICO: arturoz@ufmt.br;
camilojoseph@hotmail.com y bdp@terra.com.br;.

GRUPO DE TRABAJO 15: Las políticas públicas y el desarrollo rural en


América Latina: territorios, atores e referencias analíticas

PALABRAS CLAVES: Políticas Publicas e Estratégia de Desenvolvimento,


Territórios e espaços, Sistemas Produtivos e Inovativos Locais.

Introdução
Segundo Bickel (2004), a rápida expansão da soja se deu pela infra-estrutura
construída e os subsídios outorgados pelo governo brasileiro. O regime militar instalado
a partir de 1964 promoveu decisivamente a ocupação e modernização agrícola das
regiões Centro-Oeste e Norte. Este processo de movimentação/expansão (no Estado de
Mato Grosso) significou a aplicação de um modelo de produção favorável a uma elite
rural, (tanto no início quanto na atualidade), modelo que negligenciou os aspectos
sociais e ambientais do desenvolvimento.
Este trabalho tem como objetivo descrever e analisar de forma geral os
diferentes mecanismos e elementos de política pública que “facilitaram” a
movimentação/expansão da aglomeração de produtores de soja no Estado de Mato
Grosso, em especifico no município de Sorriso e quais suas principais conseqüências
sociais e ambientais.
O trabalho está estruturado em quatro partes. Na primeira caracteriza-se e se
descreve os principais mecanismos de política pública que favoreceram a
expansão/ocupação da soja no Estado de Mato Grosso; a segunda destaca as principais
conseqüências sociais e ambientais atreladas a esse modelo de produção; terceira coloca
a necessidade de busca de “políticas de promoção” e “modelos organizacionais” tais
como a abordagem dos arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais2 que
engendrem condições de competitividade aos diferentes atores e instituições no “novo”
ambiente criado a partir do processo de abertura comercial e liberalização da economia
a partir dos anos 90 e, na quarta e última parte são colocadas as considerações finais.

1
“Ponencia presentada al VIII Congreso Latinoamericano de Sociología Rural, Porto de Galinhas, 2010.”
2
Entende-se por Sistemas Produtivos e Inovativos Locais - SPILs – como o conjuntos de agentes
econômicos, políticos e sociais, localizados em um mesmo território, desenvolvendo atividades
econômicas correlatas e que apresentam vínculos expressivos de produção, interação, cooperação e
aprendizagem. SPILs geralmente incluem empresas – produtoras de bens e serviços finais, fornecedoras
de equipamentos e outros insumos, prestadoras de serviços, comercializadoras, clientes, etc.,
cooperativas, associações e representações - e demais organizações voltadas à formação e treinamento de
recursos humanos, informação, pesquisa, desenvolvimento e engenharia, promoção e
financiamento.Arranjos Produtivos Locais - APLs - são aqueles casos que não apresentam significativa
articulação entre os agentes e que, assim, não podem se caracterizar como sistemas.

1
Metodologia da pesquisa
Para descrever e analisar de forma geral os diferentes mecanismos e elementos
de política pública que “facilitaram” a movimentação/expansão da aglomeração de
produtores de soja no Estado de Mato Grosso, em especifico no município de Sorriso,
utilizou-se a metodologia da REDESIST para a análise dos arranjos produtivos locais.
A metodologia de pesquisa prevê a aplicação de um questionário que levanta
dois conjuntos de questões: a primeira relacionada às possíveis tipologias, considerando
atividades, segmentos de concentração empresarial, mercados, desenhos institucionais,
elementos dinâmicos do arranjo e suas respectivas estratégias, reflexos sobre o sistema
local de inovação e sobre a capacidade competitiva do arranjo como um todo, e infra-
estrutura econômica.
O segundo conjunto de questões é ligado à trajetória desses arranjos nos anos 90,
considerando o impacto do processo de globalização num contexto de abertura da
economia. Isto principalmente no que se relaciona à dinâmica dos processos de
aprendizagem, às estratégias empresariais, à entrada de investimentos externos, ao papel
e às possibilidades de políticas para promoção de sistemas inovativos, bem como à
promoção do financiamento à inovação e o cuidado com o meio ambiente.
Portanto, (para aplicar-se o questionário anteriormente citado) escolhe-se uma
parte (ou amostra) de tal forma que ela seja a mais representativa possível do todo, com
a finalidade de reduzir custos e tempo, ou seja, investiga-se uma amostra dos produtores
e das empresas que conformam o arranjo produtivo local em Sorriso, utilizando a
técnica de amostragem probabilística ou aleatória.
Para a obtenção das informações sobre os processos de ―caracterização geral e
dos ―elementos de mudanças nas trajetórias das políticas publicas e do arranjo
produtivo estudados utilizaram-se tanto a fontes informativas secundárias quanto
primárias, ou seja, foi feito um levantamento da bibliografia existente, trabalhos
científicos, teses, informativos, publicações técnicas, dados da RAIS, etc; além de coleta
de dados na Internet. Ao mesmo tempo realizou-se uma pesquisa de campo no
município de Sorriso na qual realizaram-se entrevistas e aplicaram-se questionários
previamente elaborados com base em pesquisas realizadas anteriormente e relacionadas
com o tema de análise do trabalho. Estas entrevistas nos forneceram os elementos
necessários para a melhor compreensão do problema de pesquisa abordado no
município.
1) Principais mecanismos de política pública que favoreceram a
expansão/ocupação da soja no Estado de Mato Grosso.
A seguir descreveremos de forma geral os diferentes mecanismos e elementos de
política pública que “facilitaram” a movimentação/expansão da aglomeração de
produtores de soja no Estado e no município de Sorriso. Segundo Bickel (2004), a
rápida expansão da soja se deu pela infra-estrutura construída e os subsídios outorgados
pelo governo brasileiro. O regime militar instalado a partir de 1964 promoveu
decisivamente a ocupação e modernização agrícola das regiões Centro-Oeste, Norte e
Nordeste. Em Minas Gerais, por exemplo, o Programa de Crédito Integrado (PCI, 1971)
transferiu recursos aos grandes e médios proprietários para sua modernização agrícola.
Paralelamente ao PCI, foi implementado o primeiro “Programa de Assentamento
Dirigido”, em Alto Paranaíba, Minas Gerais (PADAP), onde foram colonizados 60.000
ha para exploração agrícola intensiva3. O Governo Mineiro gastou cerca de US$ 200
milhões na construção de estradas, centros rurais, armazéns e habitações, linhas de

3
Silva, L.: O papel do Estado no processo de ocupação das áreas de Cerrado entre as décadas de 60 e 80.
Em: Caminhos de geografia – Revista Online, dezembro de 2000, pp. 30-34.

2
transmissão de crédito, além de incentivos à intensificação da produção, com a
utilização de máquinas e insumos agrícolas.
O PADAP foi o modelo para dois novos programas de desenvolvimento
regional, o Programa para o Desenvolvimento do Cerrado (POLOCENTRO) e o
Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o Desenvolvimento dos Cerrados
(PRODECER). O POLOCENTRO (1975-1982) tinha por objetivo incorporar 3,7
milhões de ha de Cerrados (1,8 milhão para lavouras, 1,2 milhão para pecuária e
700.000 para reflorestamento) na atividade agropecuária. Foram destinados US$ 577
milhões aos setores de armazenamento, energia, pesquisa e assistência técnica, crédito
rural subsidiado, utilização intensiva de corretivos do solo, mecanização, transporte e
outras infra-estruturas como eletrificação rural. O POLOCENTRO beneficiou, em sua
maioria, produtores com propriedades acima de 200 ha e, ao invés do objetivo de
reservar 60 % da área para a produção de alimentos, a parte destinada a pastagens
prevaleceu, ao passo que nas lavouras, predominou a produção de soja para exportação.
(Ver Bickel, 2004).
O PRODECER promoveu, a partir de 1978, o assentamento de agricultores
experientes do Sudeste e Sul do país. Baseado num acordo entre os Governos brasileiro
e japonês, originou-se o interesse de assegurar a fonte das importações japonesas de
soja, e de estimular a agricultura moderna nos Cerrados. A Companhia de Promoção
Agrícola (CAMPO), fundada então com 51% de capital nacional e 49 % de capital
japonês, foi encarregada da execução. Com um investimento total de US$ 570 milhões,
o PRODECER foi implementado em três fases nos Estados de Minas Gerais, Mato
Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Bahia, Tocantins e Maranhão.
Foram realizados 21 projetos com 758 assentados, incorporando 353.748 ha de
Cerrados ao processo produtivo4. As políticas de crédito subsidiado implementadas
entre 1970 e o início da década 1980 beneficiaram, significativamente, aos agricultores
modernos e politicamente mais influentes. Entretanto, um problema observado foi o
endividamento de parte dos beneficiários do PRODECER II e III, devido à inflação e
aos juros elevados durante as turbulências econômicas dos anos 80. Com a recessão e o
necessário ajuste macro-econômico dos anos 80, a disponibilidade de crédito, bem
como sua parte subsidiada, foram gradativamente reduzidas.
Outro elemento a destacar é a intensificação da pesquisa agrícola pública: Em
1975, foram criadas a EMBRAPA Soja (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária),
com a função de viabilizar o cultivo da soja no Brasil inteiro, e a Embrapa Cerrados,
como centro de pesquisa ecorregional com foco no bioma Cerrado, cujo objetivo era
gerar e difundir tecnologias para a ocupação racional da região. Até então, a produção
de soja restringia-se aos Estados da região tradicional produtora de soja no país e às
cultivares utilizados na época, eram oriundos dos Estados Unidos. Os trabalhos de
pesquisa foram completados pelas empresas de pesquisa agropecuária estaduais, nos
quais prevalecia, como padrão de referência da época, o uso de tecnologias da nomeada
“revolução verde“, ou seja, a aplicação de tecnologias intensivas em uso de capitais,
baseadas na mecanização e no uso intensivo de insumos externos como calagem,
fertilizantes químicos e agrotóxicos. (Idem).
Para divulgar estas tecnologias e auxiliar os produtores, foi criada a Empresa de
Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER). Pela crescente escassez de recursos
públicos, a EMBRAPA recorre mais e mais a parcerias com a pesquisa privada das
empresas e indústrias, com interesses específicos, como por exemplo, com a
multinacional Monsanto e fundações norte-americanas.

4
Ver www.agricultura.gov.br/sarc/dfpv/prodecer.htm.

3
Nos anos 80 a estratégia de desenvolvimento dos Cerrados foi fundamentada e
articulada através duma política de suporte de preços, ou seja, para compensar a
eliminação dos subsídios ao crédito rural exigida pelo Banco Mundial e o FMI, o
Governo aumentou consideravelmente os preços mínimos, que anteriormente ficavam
abaixo do nível do mercado, passando a adquirir volumes expressivos de produtos
oriundos do PRODECER, como soja, arroz e milho. Isto beneficiou, sobretudo, os
produtores das áreas mais remotas dos Cerrados, para quem os preços do mercado
foram menores pelo elevado custo de transporte. Por outro lado, o Governo sofreu
perdas substanciais pelos diferenciais de preços, altos custos de transporte e
armazenagem, além da deterioração dos produtos. Finalmente, com as políticas
neoliberais de ajuste estrutural implementadas nos anos 90, as compras e os estoques
governamentais foram abolidos.
Estes programas foram e estão sendo acompanhados por imensos investimentos
públicos na construção de portos, rodovias, hidrovias e ferrovias, para melhorar o
escoamento da produção de grãos. Apesar do amplo consenso sobre a necessidade de
melhorar a infra-estrutura, diversos institutos de pesquisa ambiental alertam para os
grandes impactos sócio-econômicos e ambientais negativos: por exemplo, a
pavimentação de rodovias como a BR-163, de Cuiabá a Santarém, poderá provocar
grandes desmatamentos, que afetariam severamente as terras indígenas, parques
nacionais, o equilíbrio aquático, a biodiversidade, o clima regional e global5.
Até poucos anos atrás, os Bancos públicos federais e estaduais (Banco de
Desenvolvimento – BNDES, Banco da Amazônia – BASA, Banco do Nordeste, Fundos
Constitucionais, etc) ofereciam programas de crédito a juros subsidiados (8,75 a 10,75
% ao ano), para financiar as atividades da agricultura patronal. Isto colocado significa
que o crédito rural no Brasil tem apresentando crescimento até o ano-safra de 2006/07.
Contudo, a participação do BNDES vem registrando queda nos três últimos anos / safra.
Tal deve-se ao importante aumento da participação do Banco do Brasil no crédito rural,
que nos últimos cinco anos apresentou aumento de 85,57% (Tabela no. 1)
Tabela.1. Desembolsos destinados ao Credito Rural (Investimento e
Custeio) 2002 a 2007 (Ano Safras6).

Jul 02/ Jul 03/ Jul 04/ Jul 05/ Jul 06/
Bancos / Safra
Jun 03 Jun 04 Jun 05 Jun 06 Jun 07

BNDES 3,5361 5,521 5,751 3.334 2.911

BANCO DO BRASIL 29,974 39,710 48,376 51.038 55.624

Participação do BNDES 11,8% 13,9% 11,9% 6,5% 5,2%

Fonte: Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). O BNDES e a agroindústria. Informe


Setorial. Área Industrial. No. 6. 2008. Disponível In:
http://www.bndes.gov.br/conhecimento/setorial/informe-06AI.pdf. Acesso 06/03/2009.

Os programas agrícolas do Plano Safra do Governo Federal, operados com


recursos do BNDES, se constituem em um dos principais canais de financiamento do
Banco ao setor. O valor desembolsado para esses programas agrícolas no ano de 2006 e
5
Nepstad, D., Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM); Capobianco, J. P., Instituto Sócio-
Ambiental (ISA) et al.: Avança Brasil: Os custos ambientais para a Amazônia. Relatório do Projeto
“Cenários futuros para a Amazônia”. Belém, 2000, p. 4.
6
Ano-safra ou Ano agrícola – período de tempo que decorre entre a fase de semeadura e a colheita
(especialmente de grãos e cereais) não necessariamente coincidente com o período de 12 meses entre
janeiro e dezembro.

4
no período janeiro-junho de 2007 foram, respectivamente, R$ 4,5 bilhões e R$ 2,6
bilhões. A seguir destacam-se os principais programas:
 O PRODECOOP – Programa de Desenvolvimento Cooperativo para Agregação
de Valor à Produção Agropecuária, destinado a cooperativas de produção
agropecuária e a cooperados para integralização de cotas-partes vinculadas ao
projeto a ser financiado; tem como principal objetivo o incremento da
competitividade do complexo agroindustrial das cooperativas, por meio da
modernização dos sistemas produtivos e de comercialização. Através desse
programa foram liberados, aproximadamente, em 2006, R$ 166 milhões para
um total de 113 operações, evidenciando o valor médio das operações de R$ 1,5
milhão. No primeiro semestre de 2007 foram liberados, aproximadamente, R$
129 milhões para um total de 59 operações, com um valor médio de R$ 2,2
milhões;
 O MODERAGRO – Programa de Modernização da Agricultura e Conservação
de Recursos Naturais destinado a produtores rurais (pessoas físicas e jurídicas)
e suas cooperativas com o objetivo de incentivar a correção de solos, a
recuperação de áreas de pastagens cultivadas degradadas, a sistematização de
várzeas com vistas ao aumento da produção de grãos e a implantação de
projetos de adequação ambiental de propriedades rurais. Através desse
programa, foram liberados, aproximadamente, em 2006, R$ 2,2 bilhões para um
total de 12.044 operações, evidenciando o valor médio das operações de R$ 183
mil. No primeiro semestre de 2007, foram liberados, aproximadamente, R$ 527
milhões para um total de 6.072 operações, com um valor médio de operações de
R$ 88.791,00;
 O MODERFROTA – Programa de Modernização da Frota de Tratores
Agrícolas e Implementos Associados e Colheitadeiras, destinado a produtores
rurais, pessoas físicas ou jurídicas, e suas cooperativas. Através desse programa
foram liberados, aproximadamente, em 2006, R$ 1,3 bilhões para um total de
14.412 operações e no primeiro semestre de 2007 foram liberados,
aproximadamente, R$ 845 milhões para um número de operações de 8.382;
 O MODERINFRA – Programa de Incentivo à Irrigação e à Armazenagem,
destinado a produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, e suas cooperativas.
Tem o objetivo de apoiar o desenvolvimento da agricultura irrigada e
sustentável, econômica e ambientalmente, de forma a minimizar o risco na
produção e aumentar a oferta de alimentos para os mercados interno e externo; e
ampliar a capacidade de armazenamento nas propriedades rurais. Neste
programa foram desembolsados, aproximadamente, no ano de 2006, R$ 200
milhões para um total de 3.935 operações e no primeiro semestre de 2007 foram
liberados, aproximadamente, R$ 76 milhões em 425 operações.
Depois de mais de uma década de um governo que estimulou e implementou a
maior desnacionalização já vista no Brasil, o caminho ficou pavimentando para a
atuação de apenas quatro multinacionais, Cargill, Bunge, ADM e Dreyfus (através da
empresa Coimbra), que dominam cerca de 95% das exportações da soja brasileira.
As tradings que atualmente pertencem, em sua maioria, às multinacionais que
produzem agrotóxicos e insumos agrícolas, ocuparam o vácuo deixado pelo Estado
anos atrás, passando a emprestar dinheiro aos agricultores com juros exorbitantes.
A forma de financiamento usado pelas multinacionais, além da logística e de armazéns,
para dominar os produtores, é feita através de operações de soja verde (venda
antecipada do produto) e de troca de fertilizantes por grão, como é feito pela Bunge e a
Cargill, ambas fabricantes de adubos. Como colocado anteriormente, 63% da soja in
5
natura do Mato Grosso é destinada à exportação e, como determinado pela lei Kandir,
esta commodity é exonerada do pagamento de qualquer tipo de tributo quando é
destinada à exportação: sendo assim, as tradings não pagam absolutamente nada,
sendo pouca a contribuição direta das mesmas ao desenvolvimento sustentável do
Estado e do município de Sorriso.
2) Conseqüências sociais e ambientais do aglomerado produtivo da soja no
Estado de Mato Grosso e no município de Sorriso.
No item anterior descrevemos os diferentes elementos da política pública que
facilitaram a movimentação/expansão do APL dos produtores de soja no Estado de
Mato de Grosso. A seguir analisaremos as conseqüências sociais e ambientais como
resultado da mesma.
Primeiramente explicaremos de forma geral a evolução desse processo de
movimentação/expansão (no Estado de Mato Grosso), que significou a aplicação de um
modelo de produção favorável a uma elite rural, tanto de início quanto atualmente. Esta
elite acumula inúmeras vantagens recebidas dos governos federais, estaduais e
municipais, sendo uma delas a facilidade de aquisição de terras públicas a responsável
pela criação de imensos latifúndios no Estado - o que explica em grande parte a origem
da concentração de terras e da riqueza existente, hoje em dia, no município.
Isto é, com o golpe militar de 1964, instalou-se uma ditadura a serviço do capital
monopolista, subordinando a ele a agricultura. Não existia, nesse contexto, espaço para
uma reforma agrária que diminuísse a desigualdade social. Na maioria dos casos, o que
se viu foi a criação de assentamentos para fixar mão-de-obra barata perto de fazendas.
Incentivos fiscais e empréstimos foram facilitados para a ocupação das chamadas
“fronteiras agrícolas”, que beneficiaram principalmente o estabelecimento das grandes
propriedades para agricultura ou pecuária.
Segundo Reydon (2006) este é cerne do crítico problema agrário no Brasil, que
tem suas origens no padrão de ocupação e de desenvolvimento do país que, na sua
gênese, não passou pela ruptura da “sagrada aliança” entre a burguesia e os proprietários
de terra. Ou seja, o processo de modernização da economia brasileira não rompeu com
as forças mais retrógradas, mantendo o poder político concedido aos proprietários de
terra.
As evidências de que o conjunto das regulações fundiárias no Brasil foi
estabelecido para beneficiar os proprietários de terras podem ser atestadas
historicamente, entre outros, pela permanência da “posse” como figura jurídica
fundamental de apropriação da terra, sendo esta uma conquista dos proprietários de
terras, pois a mesma permite a incorporação de novas áreas com custos bastante
reduzidos. (Idem)
Além da alternativa da posse e com o pretexto de que era necessário povoar
regiões “sem habitantes”, o Estado investiu grandes somas de recursos públicos para
criar infra-estrutura, como estrada, hidrelétricas, facilidade de créditos, subsídios
estaduais e permissão de especulação com a terra. Este tipo de
ocupação/desenvolvimento no caso do estado de Mato Grosso permitiu que se
ignorassem as comunidades tradicionais, indígenas e os posseiros que já moravam
nesses locais, processo que favoreceu e possibilitou o desmatamento de grande parte da
Amazônia.
Segundo Mançano (2004), com a introdução do conceito de agronegócio e a
construção da sua imagem, visa-se renovar a agricultura capitalista sendo esta
apresentada como “moderna”. Assim, com este “novo” conceito, os proprietários de
grandes extensões rurais tentam vincular sua figura e imagem à de modernas empresas

6
agrícolas, cujos lucros e resultados impulsionam o bom desempenho da balança
comercial brasileira.
O agronegócio, enquanto conjunto de atividades que abrangem a produção
agropecuária e florestal, o beneficiamento de seus produtos e subprodutos ou a
agroindustrialização, as empresas produtoras de insumos (sementes, agrotóxicos,
fertilizantes, máquinas, tratores etc.), o comércio dessas mercadorias, o sistema bancário
relacionado com o crédito rural e o seguro agrícola, está sendo reduzido pela
propaganda dominante à esfera daqueles produtos e subprodutos diretamente
relacionados com a exportação e negociados na Bolsa Mercantil e de Futuros (BM&F)
tais como exemplos o milho (grão, óleo), a soja (grão, óleo e farelo), os suínos, as aves,
os bovinos (carne, couro, peles), os produtos florestais (madeira, papel e pasta de
celulose). Ou seja, agronegócio, na ideologia dominante, é sinônimo de agronegócio
burguês. (Carvalho, 2004)
Nesse sentido ideológico, a propaganda dá a entender subliminarmente que, por
um lado, são os grandes produtores os responsáveis pela produção dessas mercadorias e,
por outro lado, que essas mercadorias abrangem a totalidade do agronegócio. Negam,
assim, a existência de “agronegócios democráticos e populares”. (Idem)
Entre as principais conseqüências ambientais devemos destacar o desmatamento
que, nos últimos 30 anos, (isto é, de 1978 a 2008), apresentou um ritmo anual entre
20.000 e 201.799 km², o que representa em média 6.300 km² por ano, ou seja, o
equivalente à superfície de 555.555 campos de futebol por ano no Estado de Mato
Grosso (Ver Tabela 2)
Tabela 2. Superfície total desmatada em Km2 no estado de Mato Grosso.
ANO SUPERFICIE DESMATADA TAXA DE DESMATAMENTO NUMERO DE VITIMAS
(KM2) ANUAL (KM2/ANO) FATAIS NO CAMPO

1978 20000 5140 -

1988 71500 5960 1

1989 79600 4020 3

1990 83600 2840 4

1991 84220 4674 0

1992 86500 6220 2

1994 91174 6220 3

1995 103614 10391 4

1996 112150 6543 4

1997 119141 5271 2

1998 125023 6466 2

1999 136968 6963 1

2000 146431 6369 0

2001 153592 7703 4

2002 163495 7892 2

2003 174306 10405 9

2004 184655 11814 2

7
2005 193185 7145 5

2006 195773 4333 2

2007 198354 2678 1

2008 201799 3258 1

Fonte: PRODES, INPE, Disponível In: www.inpe.br e Comissão Pastoral da Terra (CPT) 2009.
Conflitos no Campo. Disponível In:
http://www.cptnac.com.br/?system=publicacoes&action=publicacoes&cid=26.

Precisamos destacar que existem diferentes tipos de desmatamento: por corte


raso7 e por degradação florestal. O primeiro, é aquele que resulta na remoção
completa da cobertura florestal em um curto intervalo de tempo, também é nomeado
como “corte e queima”, no qual toda a vegetação é derrubada e queimada8 num pequeno
intervalo de tempo. Nesse processo, a cobertura florestal é totalmente removida e
substituída por outras coberturas e usos (agrícola, pastagem, urbano, hidroelétricas,
etc.).
O processo normalmente se inicia antes ou durante o período chuvoso que
precede o corte da floresta, com o que é localmente denominado de “brocagem”. É o
corte com foice ou machado das árvores menores e, principalmente, das lianas (cipós),
para facilitar o corte das árvores de maior porte que se dará na próxima fase. Durante a
estação chuvosa essas plantas se degradam e com isso evitam-se acidentes na fase de
corte propriamente dito. As árvores de maior porte são derrubadas com motoserras no
início da estação seca. Fica a biomassa no solo, que é queimada basicamente entre julho
e setembro. No final desse processo pode-se ou não agregar a biomassa remanescente
em leiras para queimas subseqüentes. Forma-se a pastagem por semeadura de gramíneas
africanas, que se dão bem na Amazônia porque resistem ao fogo. Esse foi o processo
mais comum na região do Estado de Mato Grosso durante as décadas de 80 e 90 e início
do século XXI.
Já o chamado desmatamento por degradação florestal caracteriza-se pela
extração de árvores de maior valor econômico antes dos procedimentos de limpeza por
queimadas. Num primeiro momento, são retiradas as madeiras nobres. Na seqüência é
plantado o capim, ao mesmo tempo em que ocorre o desmatamento e, no(s) ano(s)
seguintes(s), o gado e a pecuária entram na floresta, enquanto a mesma não
desapareceu. Após a plantação do capim e a alocação do rebanho nesta área, inicia-se a
primeira queimada, com o objetivo de limpar a vegetação rasteira.
A Tabela 3 apresenta a distribuição das áreas degradadas no Estado de Mato
Grosso. Estes valores indicam que há uma quantidade considerável de áreas em
processo de degradação que, como ilustrado na Figura, podem se tornar corte raso, se
não houver interrupção do processo.

7
Corte raso é um termo técnico que, em silvicultura, significa cortar na base todas as árvores de uma
determinada área.
8
O fogo usado na abertura e manejo de pastagens e na agricultura de “corte e queima” geralmente foge ao
controle, queimando culturas perenes, sistemas agro-florestais e florestas manejadas para produção
madeireira. Estas perdas estimulam produtores a continuarem optando por sistemas de produção
extensivos, mantendo sua dependência do fogo.

8
Tabela 3. Desmatamento por corte raso e degradação em 2007 e 2008

Tabela no Mato Grosso:

Tipos de Desmatamento 2007 2008

Áreas degradadas (km2) 8.744 12.534

Áreas degradadas (km2) em 2007 convertidas a 920


corte raso em 2008

Fonte: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE

Necessitamos enfatizar que em 2004, o Instituto de Pesquisa Ambiental da


Amazônia (IPAM), publicou o livro intitulado “Desmatamento na Amazônia: indo além
da emergência crônica”, na qual classifica o desmatamento em apropriado ou
inapropriado.
O desmatamento “inapropriado”, (que deve ser alvo de programas de
redução), é aquele que: (a) visa apenas tomar a posse da terra para especulação; (b)
ocorre em terras inapropriadas para a agricultura ou a pecuária devido ao relevo
acidentado, solos inadequados, altos índices de precipitação, distância elevada dos
mercados e ausência de estradas; (c) é pouco produtivo; (d) é ilegal (atinge a reserva
legal e as áreas de proteção permanente); (e) ocorre em áreas de elevado valor para a
conservação ou utilização sustentável da biodiversidade (áreas ainda não protegidas por
unidades de conservação); (f) ocorre em áreas onde a melhor opção econômica de uso
da terra é florestal – seja para produção madeireira, não-madeireira, ou ambas.
Por sua vez, o desmatamento apropriado seria aquele que reúne os seguintes
critérios: (a) seja realizado de forma legal, cumprindo os preceitos das leis ambientais
(por exemplo, o Código Florestal); (b) seja realizado em solos aptos para agricultura e
produtivos; (c) ocorra em áreas com infra-estrutura adequada e, portanto, com baixo
risco de abandono precoce da atividade; (d) traga benefícios socioeconômicos e
ambientais às populações tradicionais da Amazônia (quilombolas, caboclos, indígenas)
e pequenos agricultores.
Sendo assim, essa classificação permite separar o desmatamento que decorre das
ações de grilagem – como aquele que tem afetado aceleradamente as regiões à beira da
abertura da estrada BR-163, no Estado do Mato Grosso, onde se concentram vários
municípios “campeões do desmatamento” – daquele desmatamento autorizado e
permitido para cada proprietário no âmbito do Código Florestal. Note-se que o
município de Sorriso é um dos mais desmatados (aproximadamente mais da metade da
sua superfície). A Figura no. 1 mostra o desmatamento acumulado em Mato Grosso até
2004 e 2005.

9
Figura.1. Desmatamento em Mato Grosso (acumulado até Agosto 2004-
2005).
Potencialmente, três agentes promovem a devastação de áreas que é
responsável pelo desmatamento da floresta e do cerrado. Ou seja, o movimento de
expansão de fronteira agrícola (processo de ocupação/desenvolvimento) obedece, num
primeiro momento, a uma ordem de derrubada das matas pelos madeireiros, com
posterior ocupação das áreas desmatadas com pasto para a criação de gado, segue-se
com o cultivo de arroz por dois ou três anos passando para a etapa que fecha o ciclo, o
plantio de soja.
Mendez del Villar et all (2005), ao observar o comportamento da lavoura de
arroz no Estado de Mato Grosso, identifica cinco tipos diferentes de dinâmicas
produtivas que a seguir se descrevem (Ver Figura no.2):
I) Regiões de soja e milho em áreas de abertura com arroz;
II) Substituição do arroz pela soja;
III) Substituição do arroz pelo milho ou algodão;
IV) À abertura de novas áreas agrícolas com arroz: formadas por aquelas regiões
em que progressivamente a cultura do arroz é substituída pela soja e milho;
V) Regiões de pastagens e gado

Figura 2. Tipologia das dinâmicas agrícolas em Mato Grosso em 2002.


Fonte: Mendez del Villar et all (2005)

Da Figura no. 8, podemos realizar diferentes observações:


a) Na realidade, a maior lucratividade da agricultura, comparada à pecuária, tem
motivado a venda ou o arrendamento de terras tradicionalmente dedicadas à

10
pecuária sendo que a região norte de Mato Grosso, a pecuária está cedendo uma
importante quantidade de áreas para produção de grãos9. Nestes casos, o preço
da terra é determinado baseado tanto na expectativa de retorno financeiro da
atividade quanto na facilidade de comercialização da produção. No primeiro
caso, a soja oferece um retorno quase 40% maior do que uma área semelhante à
atividade de pecuária. No segundo caso, o preço de mercado e a existência de
boas vias de escoamento têm um forte peso10;
b) Percebe-se a tendência de substituição da cultura do arroz pela da soja, milho e
algodão. Se compararmos as regiões produtoras de arroz, existentes no início dos
anos noventa em relação à situação de dez anos depois, observa-se um
movimento constante da cultura em direção ao norte do Estado e uma expansão
na zona central (Ver Figura 3A e 3B), ou seja, há uma grande flutuação das áreas
agrícolas. Uma das causas que contribuiu para a vulnerabilidade da rizicultura
foi a instabilidade na comercialização, que desencorajou os produtores a fazerem
investimento de longo prazo nesta atividade.

Figura. 3A e 3B Evolução das áreas de arroz em Mato Grosso no período


1990 e 2002.
c) O padrão histórico de concentração de terras produz um efeito de expulsão dos
trabalhadores rurais, em especial naquelas regiões, onde a concentração
fundiária é ainda mais acentuada. A fim de evitar conflitos nas áreas onde a
propriedade da terra já é institucionalizada, diferentes governos adotaram como
política o incentivo à abertura de novas frentes de expansão das fronteiras
agrícolas. Assim, o processo acelerado de migrações para a região mato-
grossense serviu como uma válvula de escape para aliviar o potencial de conflito
em outras regiões.
Contudo, esse processo tem um limite de longo prazo, pois o estoque de áreas de
florestas é finito. Nas regiões de fronteira, os direitos de propriedade sobre a
terra não estão bem definidos. Logo, a violência na fronteira surge, dentre outros
motivos, a partir dos conflitos pela definição dos títulos de posse entre posseiros,
de um lado, e grileiros e fazendeiros de outro. Os posseiros, mais frágeis diante
da possibilidade do uso da violência por parte dos latifundiários e, ainda, pela

9
No Leste do Mato Grosso um hectare de terra estava sendo negociado (no ano 2001-2003) por
aproximadamente 225 sacas de soja (R$ 6.750,00), um valor bem mais alto em relação ao preço quando a
região se destinava a atividade pecuarista. Neste caso, o valor do hectare era negociado por 70 sacas.
10
A modo de exemplo em 2001, nos municípios de Água Boa e Querência o hectare de terra passou de
R$750,00/hectare, para R$1.500/hectare. No ano 2003, o valor já estava em torno dos R$6.000,00. (Ver
Mendez del Villar et all , 2005).

11
força que estes têm junto à classe política, são, geralmente, expulsos e obrigados
a buscar novas terras para se estabelecer, ampliando, dessa forma, a fronteira
agrícola. Ao expandir a fronteira, o posseiro tem que, necessariamente, preparar
a terra para o cultivo; logo, é levado a desmatar para delimitar o seu espaço de
ocupação.
Com o tempo, através da implementação gradual das funções típicas de Estado
(Schneider, 1994), a fronteira vai “envelhecendo” e os direitos de propriedade
acabam sendo outorgados aos usuários da terra (ao menos, os que conseguiram
remanescer). Uma vez reduzida a incerteza sobre os direitos de propriedade,
passa a ocorrer uma demanda por terras por parte da classe média urbana local.
Trata - se, na verdade, de uma motivação cuja base especulativa define novos
padrões de apropriação e de valor da terra. Este processo aumenta o problema da
violência na fronteira agrícola no caso, medida por vítimas fatais de conflitos no
campo: em média 2,3 assassinatos por ano nos últimos 30 anos na região.
Diferentes autores têm se debruçado na busca de uma explicação para o
fenômeno do desmatamento, ou seja, procura-se saber quem é o responsável ou “vilão”
do processo: o madeireiro, o pecuarista, ou os sojicultores. A maioria dos estudos
responsabiliza os dois primeiros como os principais “vilões” porque, no processo de
ocupação e abertura de novas áreas, parece existir uma articulação entre madeireiros e
pecuaristas. Após a exploração e retirada da madeira de interesse comercial, os
pecuaristas encontram maior facilidade para penetrar e ocupar as áreas, utilizando-se
das estradas e caminhos abertos pelos madeireiros. Ocorre que, no Estado de Mato
Grosso, em função da freqüente ausência do Estado, ou por conivência do mesmo, e
devido à enorme extensão de terras devolutas, a grilagem (ou ocupação ilegal de terras)
segue à frente do madeireiro.
Douglas Morton (2006), especialista em sensoriamento remoto da Universidade
de Maryland, publicou um estudo na revista da Academia Nacional de Ciências dos
EUA (www.pnas.org), que derruba dois argumentos comuns (típico dos sojicultores)
que tentam dissociar a atividade da fama de vilã da floresta. O primeiro é que a soja só
faz ocupar áreas previamente desmatadas para pastagem e abandonadas pelos
pecuaristas -os dados mostram que isso acontece, sim, mas não é suficiente para
explicar toda a dinâmica do desflorestamento. O segundo é o de que as variações do
preço do grão só se refletirão nas taxas de desmatamento dois ou três anos adiante,
porque a conversão de floresta para lavoura leva tempo. O trabalho demonstrou que
mais de 90% das aberturas para agricultura foram plantadas no primeiro ano após o
desmatamento. (Folha de São Paulo, 05/09/ 2006)
Cruzando imagens de satélite com levantamentos em campo, Morton estimou
em 5.400 quilômetros quadrados o total de floresta convertida diretamente para grãos
em Mato Grosso, de 2001 a 2004. No ano de 2003, quando o preço da soja no mercado
internacional atingiu seu pico, a conversão direta para lavoura representou quase um
quarto de tudo o que se desmatou no Estado campeão da devastação da Amazônia. (Ver
Figura no 4).
Para quem gosta de números, é quase um Distrito Federal o espaço da floresta
substituída pela soja -sem contar o efeito conhecido do grão de "empurrar" a fronteira
agrícola indiretamente, estimulando a pecuária a ocupar novas áreas. Nesse período,
Mato Grosso desmatou 38 mil quilômetros quadrados, ou 3,5 Jamaicas, 40% de tudo o
que se perdeu de floresta na Amazônia.(Idem).

12
Figura 4 O efeito da soja no desmatamento em Mato Grosso, de 2001-2004.
Fonte: PNAS

Ou seja, através do trabalho de Morton (2006) consegue-se diferenciar


desmatamentos para pasto e para lavoura, verificando-se que as áreas dedicadas ao
plantio da soja eram duas vezes maior que as abertas para pecuária {
38097 23463
 339 hectares contra  143 hectares em média} o que demonstra
5770  5463 16370
que existe uma forte correlação do preço da soja com a taxa anual de desmatamento
(Idem).
O estudo destaca uma queda de 12% na conversão de floresta para pasto,
enquanto a de floresta para lavoura cresceu 10% no período. Durante o período de
2001-2004 Morton acompanhou as emissões de carbono após o desmate, chegando à
seguinte conclusão: o avanço do agronegócio capitalizado e mecanizado sobre a
floresta está agravando o efeito estufa. No caso da conversão da floresta para produzir
grãos, as emissões acontecem todas de uma vez -já que a lavoura mecanizada não
admite "sujeira" e o seqüestro de carbono por rebrota é zero. Trata-se, segundo o autor,
de uma redução completa da biomassa em no máximo quatro anos. (Idem)
Isto de fato desmistifica aquela idéia até então disseminada pelos cientistas em
relação às emissões de carbono, quando se acreditava que as mesmas eram emitidas
mais lentamente pela decomposição de tocos e raízes numa área desmatada e que parte
dele voltasse ao solo por rebrota de parte da floresta em áreas transformadas para pasto.
Recentemente, MELO11 (2009) analisou como as diferentes atividades
produtivas do agronegócio mato-grossense interferem diretamente sobre o
desmatamento e identificou qual atividade ou atividades foram responsáveis pela
expansão da fronteira agrícola nos municípios do estado de Mato Grosso no período de
2001 a 2007. Melo, utilizando fontes de informação secundárias (obtidas no IBGE,
SEPLAN-MT, PRODES-INPE entre outras) e as ferramentas econometrias como
Método dos coeficientes de correlação de Pearson, Método de Análise de Fator e o
Método de cointegração de Johansen, constatou que a produção de soja, milho e
bovinos são as culturas que na atualidade mais estimulam o desmatamento no Estado de
Mato Grosso no período analisado (2001 a 2007). A Figura no 5 sintetiza essas análises.
Na mesorregião Norte do Estado de Mato Grosso (onde está inserido o
município de Sorriso), a qual concentra a maior área de floresta do Estado, a soja, o

11
Ver MELO, JOSE DA SILVEIRA, Qual é o determinante da Expansão da Fronteira Agrícola
Mato-grossense no período 2001/2007: Produção Agrícola Ou Pecuária? Dissertação Mestrado.
Faculdade de Economia, Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá. 2009.

13
milho e a bovinocultura representam as atividades produtivas, que mais pressão direta
exercem sob o desmatamento na região.
Na mesorregião Nordeste do estado de Mato Grosso, onde existe uma das
maiores reservas indígenas do Brasil, (área que concentra a maior parte das florestas da
região e de cerrado), os resultados ali apresentados não apontam nenhuma ação da
atividade produtiva da soja, milho ou de bovinos sobre o desmatamento. Devemos
destacar que nesta mesorregião os desmatamentos existentes são mais do tipo de
degradação florestal derivado da atividade madeireira ilegal.
Na mesorregião Sudoeste do Estado, uma região já aberta há mais tempo, não
houve grande incidência de desmatamentos no período em estudo, portanto os
resultados apurados neste período também não apontam nenhuma ação da atividade
produtiva sobre o desmatamento nesta região.
Na região Centro-Sul do Estado de Mato Grosso, identificou-se uma forte ação
da cultura da cana de açúcar como a atividade produtiva que maior influência teve sobre
o desmatamento da região, a qual quase não possui mais florestas nativas.
Por último, a região Sudeste do Estado de Mato Grosso, os resultados apontam
que as atividades produtivas bovinocultura e soja são as responsáveis pelo
desmatamento na região.

Figura 5. Distribuição da responsabilidade do desmatamento nas principais


Mesorregiões no Estado de Mato Grosso.
Fonte: MELO, JOSE DA SILVEIRA, 2009.

Sendo assim é possível que não exista uma força principal que impulsione ou
explique sozinha os desmatamentos dentro do Estado, porque as causas são várias e
decorrem de uma combinação sofisticada de diversas variáveis e fatores.
Isto é extremamente importante para poder entender que a dinâmica do
desmatamento do Estado está diretamente associada a três elementos fundamentais: a)
às políticas públicas que permitiram a conformação e evolução de aglomerações e
arranjos produtivos locais na região; b) à(s) dinâmica(s) produtiva(s) utilizadas cuja
gênese está atrelada ao modelo de ocupação/desenvolvimento insustentável
(econômica, social e ambientalmente) implantado no Brasil na década de 60/70 e c) à
impunidade, isto é o desrespeito ao código florestal vigente desde 1965.
Ou seja, num primeiro momento há lucratividade da pecuária, bem como no
momento consecutivo, quando esta terra (dedicada à pecuária até então) é transformada
ou vendida para agricultura intensiva (soja, milho, algodão). Isto sinaliza, tanto para os
agentes iniciais quanto para os próprios pecuaristas, que o desmatamento e a conversão
das florestas em pastagens é rentável. Se não existissem esses lucros, não haveria
interesse pela apropriação ou compra das terras convertidas e os desmatamentos
certamente teriam ritmo muito menos intenso. Em todas as etapas do processo de
desmatamento, os direitos de propriedade são assegurados com a ocupação física da
14
terra, presença que é muito mais importante do que qualquer documento de posse,
incentivando a ação de grileiros ou posseiros a ocupar terras e garantir sua transferência
a novos atores com aversão ao risco relativamente maior, embora ainda baixo.
Em segundo lugar, no caso particular da região pesquisada, isto é, o município
de Sorriso, entre as principais conseqüências ambientais observadas, destacam-se:
 O desmatamento do mesmo, derivado da ação direta da produção de soja. Isto é,
até 2007 desmataram-se 3954 km2, o equivalente a 42% da área total do
município, restando de floresta 1279,8 km2, o que representa 14% da área total
do município. Ver Tabela no 4.
Tabela 4 Área total e desmatamento acumulado no município de Sorriso até 2007.
Desflorestamento Município Sorriso

Km2 (%)

Área em km2 9350,0 100

Desflorestamento* 3954,0 42

Floresta* 1279,8 14

Não floresta* 4115,5 44

*: representa o acumulado até 2007. Fonte: PRODES-INPE

 No córrego central12, resíduos sólidos não coletados, lançados indevidamente em


talvegues, encostas e nos próprios cursos da água -o que representa riscos à
saúde coletiva, riscos de poluição física, química e biológica do solo e das águas
superficiais e subterrâneas, aumentando a probabilidade de inundações em razão
dos distúrbios que provocam no funcionamento hidráulico de estruturas de
drenagem quando mobilizados e transportados pelas águas de chuva;
 Supressão da vegetação da área formadora da nascente de córrego e a cobertura
vegetal abaixo do que a Legislação Ambiental exige;
 Degradação das Áreas de Preservação Permanentes;
 Ocupação irregular da margem do córrego
 A urbanização e a implantação da infra-estrutura deslocou várias espécies do seu
habitat natural;
 Presença da erosão ao longo do córrego central, onde a cidade nasceu, sendo que
este fenômeno está associado à ocupação da cidade. Dito de outra forma, o
desmatamento do córrego desde sua nascente e a ocupação de suas margens
foram os causadores da erosão. Por exemplo, alguns trechos sofrem com a
ocupação inadequada de prédios comerciais, com o lançamento de entulho e lixo
etc.; (Ver Diagnóstico Ambiental do Córrego Central do município de Sorriso,
2007)
 Entre 1998 e 2003, o município registrou 7922 focos de calor (queimadas), uns
dos valores mais altos dentro do Estado de Mato Grosso.
Baseados nos dados da Tabela no. 5, analisaremos as principais conseqüências
sociais vinculadas ao desenvolvimento do APL da soja em Sorriso no período de 1991 a
2000:

12
O Córrego Central pertencente à Bacia Amazônica (Carta Hidrográfica A11 SEMA-MT) corta o centro
da cidade. Sua extensão é de aproximadamente 2,3 km com sua nascente localizada próxima à Praça
Marco Zero, indo desaguar no Rio Tenente Lira que, por sua vez, deságua no Rio Teles Pires.

15
a) No ano 2000 o Produto Interno Bruto (PIB) per capita equivalia
“aproximadamente” a R$ 11,189 (onze mil cento e oitenta nove reais), superior
ao registrado no Brasil e no Estado de Mato Grosso (R$ 5,300 e R$ 6,387)
respectivamente;
b) Apresenta um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) acima da média do
Estado e do Brasil, isto é, o IDH de Sorriso em 2000 foi de 0,824 enquanto o
índice do Estado de Mato Grosso e do Brasil foi 0,733 e 0,766 respectivamente;
c) Aumento da renda média per capita do 1º quinto mais pobre da população em
R$ 15,35, aproximadamente 31% (1990-2001);
d) Aumento da desigualdade na distribuição de renda refletido na ampliação do
Índice de Gini. Em Sorriso cresceu 12,17% (1990-2001), sendo bem superior ao
registrado no Estado e no Brasil cujos valores refletem acréscimo de 5,35% e
1,74% respectivamente;
e) Queda de 0,65% da renda apropriada pelos 20% mais pobres;
f) Acréscimo de 7,96% da renda apropriada pelos 20% mais rico
g) Aumento de 56,09% (1990-2001) da Razão entre a renda dos 10% mais ricos e 40%
mais pobres. O que representa uma magnitude superior à observada no Estado e
no Brasil em 2,8 e 6,8 vezes respectivamente
h) Crescimento de 42,61% (1990-2001) da Razão entre a renda dos 20% mais ricos e
40% mais pobres. Ou seja, 2,58 vezes superior ao registrado no Estado e 6,22
vezes superior ao registrado no Brasil.
Os resultados apresentados nos itens “a”, “b” e “c”, representam os argumentos
utilizados pelos defensores do agronegócio para demonstrar as vantagens sociais
produzidas pelo APL da soja e apresentar a expansão/ocupação do município como
alguns dos exemplos positivos do processo de globalização na região.
Por outro lado, os itens “d”, “e”, “f”, “g” e “h” demonstram que esse
desempenho da economia do município vem acoplado a um forte processo de
concentração de renda que garante grandes privilégios para uma pequena minoria que
conforma a elite da soja. Isto é, o primeiro quinto da população mais pobre do
município tem renda per capita média (ano de 2000) de R$ 65,00 e o décimo mais rico
de R$ 2.550,00; ou seja, a diferença de renda entre ambos extremos é de
aproximadamente 3907,60%.
Enquanto a percentagem da renda apropriada pelos 20% mais pobres diminuiu
0,65% no período de 1991 a 2000, a percentagem apropriada pelos 10% mais ricos
cresceu 10,64%, em Sorriso. Estes indicadores demonstram que a expansão da atividade
econômica do município de Sorriso, que tem na sua base as lavouras de soja, conduz a
um processo de concentração e, conseqüentemente, de exclusão daquelas famílias que
não se integram/adaptam a esse “modelo de desenvolvimento”.
Tabela 5. Brasil, Mato Grosso e Sorriso: Resumo de indicadores sociais no
período de 1991-2000.
1991 2000 Variação 1991/00 (%)

Nº. INDICADORES MT Sorriso BR MT Sorriso BR MT Sorriso BR

1 PIB per capita (R$) --- --- 0,08 5,300 11,189* 6, 387 --- --- ---

2 Índice de Gini 0,598 0,567 0,634 0,630 0,636 0,645 5,35 12,17 1,74

3 Renda per capita média do 1º quinto 27,63 49,93 21,83 30,23 65,28 22,23 109,4 130,74 101,8
mais pobre

4 Renda per capita média do décimo 1007,49 1280,75 1174,21 1525,4 2550,94 1556,24 151,40 199,18 132,53
mais rico

16
5 % da renda apropriada pelos 20% 2,70 3,48 2,83
1,90 81,32
2,10 2,43 1,50 -0,60 -0,65 -0,40
mais pobres

6 % da renda apropriada pelos 20% 64,12 60,47 67,11 67,03 68,43 68,06 2,91 7,96 0,95
mais ricos

7 % da renda apropriada pelos 10% 49,18 44,65 50,99 52,95 55,29 52,36 3,77 10,64 1,73
mais ricos

8 Razão entre a renda dos 10% mais 22,44 17,08 30,43 26,92 26,66 32,93 19,96 56,09 8,22
ricos e 40% mais pobres

9 Razão entre a renda dos 20% mais 14,63 11,57 20,03 17,04 16,50 21,40 16,47 42,61 6,84
ricos e 40% mais pobres

10 Índice de desenvolvimento Humano 0,654 0,712 0,662 0,740 0,805 0,727 13,15 13,06 9,82
(Longevidade)

11 Índice de Desenvolvimento Humano 0,741 0,797 0,745 0,860 0,869 0,849 16,06 9,03 13,96
(Educação)

12 Índice de Desenvolvimento Humano 0,661 0,717 0,681 0,718 0,797 0,723 8,62 11,16 6,17
(Renda)

13 Índice de Desenvolvimento Humano 0,685 0,742 0,696 0,733 0,824 0,766 12,74 11,10 10,11
(IDH e IDH-M)

Fonte: Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil. Disponível em: < http://www.pnud.org.br >.
Acesso em: nov. 2009. Elaborada pelo autor.
 Valor aproximado
Esse simples exercício analítico nos leva a refletir sobre a “sustentabilidade”
desse tipo de desenvolvimento comandado pelo fator econômico e que negligencia a
racionalidade ambiental e social. Nesse sentido devemos convir com Schlesinger &
Noronha (200613) quando destacam a necessidade urgente de uma agenda de políticas
públicas que beneficiasse outras atividades econômicas menos intensivas em recursos
naturais, com maior valor agregado e menor concentração de renda. No entanto, é
decisivo, em uma democracia, maiores espaços de participação para que as pessoas
possam escolher, inclusive, o tipo de desenvolvimento que desejam.
3) Necessidade de busca e aplicação de “novas” políticas publicas de promoção
e “novos” modelos organizacionais: A importância da abordagem dos
arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais.
Na realidade, com o processo de abertura comercial e liberalização da economia
a partir dos anos 90, acelera-se os procedimentos de busca de “políticas de promoção” e
“modelos organizacionais” que engendrem condições de competitividade aos diferentes
atores e instituições num “novo” ambiente, o qual exige: crescente capacidade própria
de captação de recursos, agilidade e flexibilidade para responder às demandas e forte
capacidade de monitoramento de seu entorno (científico, econômico, social etc.).
Sendo assim, o enfoque e a ênfase na abordagem dos arranjos e sistemas
produtivos e inovativos locais torna-se peça importante na análise do papel das
aglomerações de empresas que apresentam processos de aprendizado interativos,
qualificações técnicas e organizacionais, conhecimentos tácitos acumulados, confiança
nas relações e as proximidades geográfica, social e cultural como fontes importantes de
diversidade e vantagens comparativas, bem como formas específicas de promovê-las.
(Lemos, 2003).
Segundo Cassiolato (2003) tal abordagem mostra-se ainda mais importante por
ser apropriada para promover e orientar políticas que incitem o desenvolvimento das

13
Ver Schlesinger & Noronha 2006. O Brasil está nu!. O avanço da monocultura da soja o grão que
cresceu demais. Nov. 2006

17
aglomerações produtivas locais, estimulando relações de interação, promoção de
aprendizado e absorção de conhecimento entre os diferentes atores com proximidade
geográfica.
Assim, cada vez mais se identifica uma tendência de mudança nas formas de se
formular políticas e a crescente necessidade de consideração das mesmas de uma
maneira holística, onde se reconhece a importância (i) dos processos interativos de
inovação e aprendizado, e seu caráter localizado, bem como (ii) da abordagem de
sistemas nacionais de inovação, o que faz com que estes sejam objeto de preocupações
por parte dos formuladores de políticas em muitos países. (Lemos, 2003).
Deste modo, as políticas de “promoção” da inovação se tornam atualmente mais
importantes do que no passado, tendo em vista o reconhecimento de seu papel crucial
para intensificar a competitividade, através do fortalecimento da capacidade de
indivíduos e empresas de aprender e adquirir conhecimentos.
Segundo Lemos (2003), é necessário conceber e implementar as novas políticas
e estratégias de desenvolvimento adotando a abordagem sistêmica, conforme o conceito
de sistemas nacionais de inovação14, que em uma perspectiva ampla, pode ser visto
como uma ferramenta de análise e de promoção do desenvolvimento e do crescimento
econômico.
Os objetivos das recomendações de política nesta vertente, em geral, vão em
direção à necessidade de que os formuladores de política tenham uma perspectiva ampla
do conceito de inovação e das oportunidades de aprendizado e inovação em
pequenas e médias empresas, em atividades tradicionais e regiões menos desenvolvidas.
Isto é, não se deve considerar a promoção da inovação e do desenvolvimento regional e
social como objetivos excludentes. Para a incorporação desses objetivos de forma
convergente nos diferentes municípios do Estado de Mato Grosso é necessário ampliar a
noção de inovação não restringido-a a algo que seja totalmente novo no mundo,
originada a pena de processos de P&D e voltada para ambientes tecnologicamente mais
avançados ou de grande complexidade tecnológica; qualquer aglomeração, APL, bem
como os diversos atores que nele atuam podem ser lócus de inovação e objetos de
políticas, de iniciativas de promoção da inovação e desenvolvimento sejam eles mais ou
menos articulados, rudimentares ou mais complexos (Idem)
A noção de sistemas de inovação implica em uma nova perspectiva para um
amplo conjunto de políticas incluindo aquelas sociais, de mercado de trabalho,
educação, industriais, ambientais, de C&T, entre outras. Ou seja, o conceito impõe
fundamentalmente o desenvolvimento de novas estratégias nacionais com coordenação
clara de todas as áreas de política, que afetam o processo de aprendizado e a construção
de competências. As políticas necessitam, portanto, ser desenhadas a partir de tais
considerações para terem incorporados objetivos comuns.
Sendo assim resulta apropriada a adoção do conceito de sistemas de inovação, e
em particular de sua dimensão regional ou local, para a promoção de inovações em
aglomerações de produtores, porque reforça a importância da difusão do conhecimento
e aprendizado interativo nos sistemas. Ou seja, a partir desse enfoque seria possível

14
Parte-se do suposto que a noção de SNI constitui uma forma mais bem estruturada para capturar e
enfrentar a nova fase baseada no conhecimento e no aprendizado, para a integração de estratégias que
combinem inovações técnicas, organizacionais e institucionais (Johnsons e Lundvall (2000) apud Lemos
(2003). Acrescentam-se, ainda, as vantagens deste conceito em permitir realizar uma ponte entre as
condições gerais macroeconômicas de um determinado país e as necessidades microeconômicas
específicas de arranjos locais particulares. Como decorrência, pode-se estabelecer uma maior coerência e
articulação entre políticas implícitas e explícitas, além de evidentemente evitar que as primeiras anulem
por completo as possibilidades de implementação das segundas (Cassiolato, Lastres, Szapiro, 2000 apud
Lemos (2003)).

18
identificar as necessidades específicas de um APLs e as carências no que se refere à
inovação, proximidade regional e interação, necessários para descobrir os aspectos
tácitos e latentes no mesmo.
No caso especifico do APL da soja no município de Sorriso, a pesquisa de
campo constatou a presença de escassos vínculos significativos de interação,
cooperação e aprendizado para que possa ser considerado um sistema de produção e
inovação local.
Por outro lado, quando questionados (os sojicultores) em relação com a
importância das Políticas Públicas que contribuem para o aumento da eficiência
competitiva do APL, destacaram por ordem decrescente de importância (Ver Figura 6):
a) Os programas de capacitação profissional e treinamento técnico: isto deve ser
entendido como a necessidade de combinar o conhecimento tácito local existente e as
formas de transferência dos mesmos com a capacitação da mão de obra contratada; b)
Melhora na educação básica; c) Necessidade de linhas de crédito e outras formas de
financiamento, que lhes permitam contornar o “vai e vem” das oscilações cambiais e
dos juros altos dos empréstimos, como condição de solvência financeira e sobrevivência
no mercado; d) Programas de acesso à informação, que lhes permitam dominar melhor
as técnicas de produção, marketing e comercialização do seu produto; e) Programas de
estímulo ao investimento, o qual está muito relacionado ao item “c”; e f) Necessidade
de incentivos fiscais: todos reclamaram da alta carga tributária que deve ser paga desde
o plantio até a entrega da soja para sua comercialização, o que diminui
consideravelmente a renda dos mesmos.

Figura 6. Políticas públicas que contribuem para o aumento da eficiência


competitiva das MPEs
Isto posto, destaca-se a importância e implicação que representa trabalhar com a
noção de APL e SPIL dentro de município no sentido que o desafio fundamental radica
em lidar com os diversos agentes locais de forma coletiva e com uma perspectiva
sistêmica. Sendo assim, o sucesso das políticas de promoção do desenvolvimento do
mesmo dependerá de quanto maior for o foco no conjunto de agentes.
Segundo Lemos (2003) as dificuldades de programar e/ou promover esses
formatos serão cada vez maiores, pois é mais complicado desenhar e implementar
políticas voltadas para conjunto de atores que para empresas pontualmente. Esse
exercício demanda esforços adicionais e inéditos de operacionalização assim como
requer uma política com visão sistêmica para construir novos referenciais que envolvam

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os vários aspectos correlatos, incluído aqueles relacionados à tributação, regulação e
legislação dentro do município.
Deve ficar claro que estabelecer e desenvolver ações em APLs e SPILs significa
muito mais do que dar acesso a serviços tecnológicos, comerciais, financeiros, legais,
etc., ou ampliar os recursos disponíveis, para as empresas localizadas no município.
Implica esforço de redesenhar instrumentos e de reconhecer a diversidade e a
especificidade dentro do APL e ou SPILs. Ou seja, requer, por parte dos organismos que
pretendem formular e implementar ações em APL e SPILs, um aprendizado
institucional voltado para uma nova forma de pensar e de fazer política que dê conta de
lidar com todos estes aspectos, os quais, deve-se dizer, não estão presentes no município
objeto de pesquisa.

Considerações finais
Apreciamos que as políticas de promoção devem enfatizar a importância do
desenvolvimento dos recursos humanos e a integração das diferentes partes dos sistemas
de inovação em redes, além da interação. No caso do município de Sorriso, o grande
desafio é a mensuração e análise daquilo que está acontecendo em termos de poluição e
de degradação ambiental. O desenvolvimento e/ou adoção de tecnologias e práticas
ecológicas que preservem os ecossistemas ali existentes e o estímulo a inovações que
alterem incentivos à agricultura e à silvicultura bem como técnicas favoráveis ao meio
ambiente são também indispensáveis. Inovações sociais que diminuam a desigualdade
no modo de vida das populações no seu dia-a-dia, constituindo-se em elementos
valiosos na estratégia do crescimento sustentado.

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