Você está na página 1de 31

POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE À FOME: O CASO DO PROGRAMA DE

AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS DA AGRICULTURA FAMILIAR NO ESTADO DE


SANTA CATARINA1

Lauro Mattei2

1. INTRODUÇÃO

O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), instituído pela Lei nº 10.696, de 02


de julho de 2003, foi concebido no bojo de um grupo de políticas estruturantes do Programa
Fome Zero (PFZ), visando implementar ações no âmbito das políticas agrícola e de
segurança alimentar com o objetivo de fortalecer a política global de combate à fome. Para
tanto, buscou-se incentivar a agricultura familiar através de ações vinculadas à distribuição
de alimentos de origem agropecuária aos grupos sociais em situação de insegurança
alimentar, além de facilitar o processo de comercialização no âmbito local e promover a
formação de estoques estratégicos de alimentos.
De maneira geral, o programa destina-se à aquisição de produtos agropecuários
fornecidos pelos agricultores familiares, os quais são utilizados para formação de estoques
reguladores de alimentos. Esses produtos podem também fazer parte dos programas sociais
de combate à insegurança alimentar desenvolvidos pelo Governo Federal em parcerias com
os governos estaduais e municipais.
Em termos operacionais, o programa é composto pelas modalidades Compra Direta
da Agricultura Familiar (CDAF); Compra Antecipada Especial da Agricultura Familiar
(CAEAF); Compra Antecipada da Agricultura Familiar (CAAF) e Compra Direta Local da
Agricultura Familiar (CDLAF). A gestão nacional está ao encargo de um Comitê Gestor,
enquanto que a operacionalização das ações é de responsabilidade do Ministério do
Desenvolvimento Social (MDS) e da CONAB.
No estado de Santa Catarina, a modalidade CAEAF, operacionalizada pela
CONAB, atingiu 16 municípios no exercício de 2003, movimentando aproximadamente R$
1
Artigo escrito a partir do relatório de pesquisa sobre o PAA em SC (Mattei, 2006).
2
Professor do Departamento de Ciências Econômicas da UFSC. E-mail: mattei@cse.ufsc.br

1
1.8 milhões e atendendo 1046 agricultores familiares. Neste caso, os principais produtos
comercializados foram o feijão, milho e arroz. Já nos anos seguintes esta modalidade foi
sendo implementada em praticamente todas as regiões do estado, atingindo
aproximadamente 100 municípios no ano de 2005.
A modalidade CDLAF está sendo operacionalizada pelo governo estadual e pelas
administrações municipais através de convênios diretos celebrados entre o MDS, o
Governo Catarinense e as referidas administrações locais. Informações obtidas no momento
da realização da pesquisa de campo (meses de novembro e dezembro de 2005) revelaram
atrasos na implementação das ações decorrentes desses convênios. O cenário de
implementação desta modalidade pelas administrações municipais é bastante diverso,
embora se observe um envolvimento bem expressivo de administrações municipais com o
programa desde 2003, especialmente nos municípios da região Oeste, onde predomina a
agricultura familiar.
Decorridos mais de três anos do início da implantação do programa no estado de
SC, justifica-se a realização de um estudo que procure analisar possíveis impactos do
mesmo sobre as economias locais e, especialmente, sobre as condições socioeconômicas
dos agricultores familiares, considerando-se que o PAA é uma política pública que também
foi concebida para apoiar este segmento de produtores.
Para tanto, o texto está organizado em cinco seções, além desta introdução. Na
primeira delas, discutem-se brevemente as principais características demográficas e
socioeconômicas da microrregião Extremo-Oeste Catarinense, bem como os objetivos e os
procedimentos metodológicos da pesquisa realizada em alguns municípios localizados na
região acima mencionada. A segunda seção apresenta alguns indicadores de impactos do
programa, tomando-se como referência a percepção dos diferentes atores sociais envolvidos
com o PAA. Na terceira seção são discutidos os aspectos relativos à gestão e à
institucionalidade do programa, a partir das opiniões dos gestores locais e estaduais. A
quarta seção trata dos indicadores de impactos do programa sobre as sociedades locais,
destacando-se o papel do mesmo na esfera produtiva e seus reflexos na área social, ao
disponibilizar alimentos para instituições que trabalham com populações carentes.
Finalmente, na quinta seção são elaboradas as considerações relativas ao programa, no que
diz respeito às semelhanças e diferenças entre as modalidades do PAA, bem como as razões

2
que levam as administrações municipais a se envolver com o programa. Posteriormente, são
organizadas algumas recomendações gerais em relação às esferas da produção, da gestão e
institucional.

I – OBJETIVOS DA PESQUISA, PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.


E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS MICRORREGIÃO PESQUISADA

1.1 - A pesquisa em Santa Catarina: objetivos e procedimentos

A pesquisa procurou identificar e analisar elementos de impactos do PAA em


municípios do Extremo-Oeste catarinense (São Miguel do Oeste, Guaraciaba e Dionísio
Cerqueira), procurando delimitar os efeitos gerados pelo PAA sobre os atores envolvidos
na comercialização de produtos da agricultura familiar; avaliar o desenho institucional do
programa; e debater o potencial de mercado gerado pelas compras públicas do PAA.
A metodologia da pesquisa, de caráter nacional, procurou combinar o uso de
informações quantitativas e qualitativas, tanto as de caráter primário como secundário.
Estas últimas foram obtidas através de levantamentos junto aos órgãos executores do
programa e também junto às organizações sociais locais envolvidas com o PAA. Já as
informações primárias foram obtidas nos municípios selecionados através da aplicação de
questionário junto aos atores sociais envolvidos com o programa.
Do ponto de vista dos atores entrevistados foram priorizados os órgãos públicos
relativos às três esferas de governo, visando obter informações qualificadas desde as
coordenações centrais até as instâncias operacionais do programa no âmbito local; os
beneficiários diretos da política pública, especialmente os agricultores familiares e suas
formas de representação social; agricultores não beneficiários do programa; entidades
sociais e assistenciais beneficiadas pelo programa; associações de agricultores e
administradores locais.
A escolha dos municípios obedeceu ao critério nacional da pesquisa, bem como a
noção de proximidade geográfica, ou seja, buscou-se avaliar os impactos do programa em
um conjunto de municípios de uma microrregião geográfica com características
econômicas, sociais e culturais semelhantes. Para tanto, os municípios do Extremo-Oeste

3
Catarinense revelaram-se bastante eficazes para responder aos objetivos da pesquisa, tanto
pelo domínio da agricultura familiar enquanto atividade econômica preponderante como
pela maior inserção do PAA na região.
No universo amostral foram considerados agricultores familiares beneficiados pelo
programa; agricultores familiares não beneficiados; associações de agricultores
beneficiadas; entidades sociais locais beneficiadas pelo programa; gestores locais e
estaduais do programa, além de outros atores sociais relevantes no âmbito local.
No caso do estado de Santa Catarina, o universo amostral para cada município ficou
definido da maneira como segue:
a) Agricultores beneficiados pelo programa: 20 entrevistas
b) Agricultores não beneficiados: 5 entrevistas
c) Associações beneficiadas: até 3 entrevistas
d) Entidades beneficiadas pelo programa: até 3 entrevistas
e) Gestores locais do programa: até 3 entrevistas
f) Gestor estadual: 2 entrevistas (CONAB e Governo Estadual)
O quadro 1 apresenta a amostra total da pesquisa, totalizando 95 questionários
aplicados entre os diversos atores sociais envolvidos com o PAA. Desta forma, percebe-se
que a metodologia nacional para as amostras estaduais foi cumprida, exceto apenas na
categoria dos gestores municipais, uma vez que a gestão do programa nos municípios
pesquisados normalmente é feita por uma única pessoa.

Quadro 1: Atores sociais entrevistados por municípios selecionados em SC.


Atores Sociais São Miguel do Oeste Guaraciaba Dionísio Cerqueira
Beneficiário 20 20 21
Não beneficiário 5 5 5
Associação de Agricultores 2 3 2
Entidade beneficiada 3 3 3
Gestor Municipal 1 1 1
TOTAL 31 32 32
Fonte: pesquisa de campo.

Também fazem parte da amostra entrevistas qualificadas (aplicação de questionário


mais uma entrevista semi-estruturada) com gestores estaduais do PAA. Por um lado,
buscaram-se informações mais precisas na coordenação estadual da CONAB sobre o
conjunto das ações do PAA em SC e, por outro, procurou-se junto à secretaria de estado da

4
Agricultura e do Desenvolvimento Rural de Santa Catarina conhecer as iniciativas previstas
para a execução do PAA sob responsabilidade do governo estadual.

1.2 – Principais características da região da pesquisa

A microrregião Extremo-Oeste Catarinense faz parte da Mesorregião Oeste de SC,


também conhecida como a grande região colonial Oeste, e se localiza no extremo oposto à
administração pública estadual, fazendo fronteira com os estados do RS e PR e com a
Argentina. O acesso rodoviário ligando a microrregião às demais regiões do estado ocorre
através da BR 282, que inicia em Florianópolis e termina em São Miguel do Oeste,
enquanto que o acesso ao Paraná e à Argentina se dá pela BR 163, que liga os dois estados
vizinhos a SC e o país vizinho.
O mapa abaixo mostra a dimensão geográfica da região e a localização em seu
interior dos municípios pesquisados.

Mapa 1: Microrregião Extremo-Oeste de SC.

Fonte: <http://www.citybrazil.com.br/sc>

No caso específico da região Oeste, onde se localiza a microrregião Extremo-Oeste,


nota-se que a ocupação das terras ocorre mais fortemente após a construção da estrada de
ferro São Paulo - Rio Grande, nas duas primeiras décadas do século XX. No entanto, a
colonização efetiva da região só vai ocorrer após a década de 1920, por colonos gaúchos

5
vindos da região Noroeste do rio Grande do Sul, em sua maioria descendentes de
imigrantes italianos e alemães.
Nesta última área de ocupação do estado catarinense desenvolveu-se um sistema
produtivo baseado nas pequenas unidades familiares de produção, cuja economia era de
subsistência, sendo baixo o volume de excedentes comercializados. Mas aos poucos esse
regime de produção agrícola familiar permitiu acumulação de capital que levou a
emergência de outras atividades econômicas, especialmente das agroindústrias de carnes,
que se transformariam na locomotiva econômica do período pós-guerra, através do sistema
de integração produtiva.
Nas últimas décadas do século XX, ocorreram grandes mudanças neste sistema de
integração entre proprietários rurais e empresas de beneficiamento de carne de suínos e
aves. Em grande medida, essas alterações têm a forma de diminuição na quantidade de
produtores rurais integrados a cada empresa, simultaneamente ao aumento de capacidade
dos contingentes que permanecem vinculados às agroindústrias. Assim, por exemplo, o
tamanho médio dos aviários cresceu consideravelmente, o que significa avanços em termos
de escala e benefícios logísticos para as empresas. A contrapartida reside no deslocamento
de numerosos produtores, que se viram desligados do sistema tradicional e passaram a
enfrentar graves problemas. Esse quadro não é estranho, certamente, à intensificação – ou
pelo menos à manutenção da magnitude – dos fluxos migratórios desde áreas do Oeste e
Extremo-Oeste catarinense para os municípios litorâneos, em particular rumo às áreas de
Florianópolis, Joinville e Blumenau.
Além desse problema estrutural, verifica-se que na década de 1990 ocorreu um
reordenamento institucional na região Oeste como um todo e, mais particularmente, no
Extremo-Oeste. Assim, novos municípios foram criados a partir de municípios maiores. Na
área de estudo este aspecto é mais relevante para o caso de São Miguel do Oeste que, entre
1989 a 1998, deu origem a mais dois municípios (Paraíso e Bandeirantes), além de
contribuir, juntamente com Guaraciaba, com parte da área de um novo município chamado
Barra Bonita.

6
1.2.1 - Aspectos da dinâmica demográfica recente da região

Na análise comparativa do início da década de 1990 ao seu final, nota-se que apenas
4 municípios (Dionísio Cerqueira, Itapiranga, Mondai e Princesa), do total de 21
municípios que formam a microrregião, elevaram sua população, porém a baixos índices
percentuais. Nos demais municípios, observa-se uma forte queda, indicando a existência de
êxodo em direção a outras regiões do próprio estado ou para estados vizinhos.
Uma segunda informação importante é que são municípios pequenos e com um
estoque populacional baixo no contexto regional e estadual. Assim, verifica-se que nada
menos que oito municípios apresentam uma população inferior a 5.000 mil habitantes. Se
considerarmos o parâmetro de 10 mil habitantes, apenas 4 municípios o ultrapassam. Uma
explicação plausível neste caso é que nas duas últimas décadas ocorreu um movimento
emancipatório, com desagregação de pequenas localidades e formação de novos
municípios.
Em síntese, a microrregião Extremo-Oeste Catarinense tem se revelado,
principalmente na década de 1990, como um local de esvaziamento populacional. Mesmo
em municípios mais estruturados, como é o caso de São Miguel do Oeste, nota-se uma
redução da população total, implicando que as pessoas estão migrando para outros locais
para garantir sua reprodução social.

1.2.2 - Comportamento de alguns indicadores sociais na região

Em termos da renda per capita observa-se que todos os municípios da região


tiveram uma evolução positiva ao longo da década de 1990, sendo que alguns deles
praticamente dobraram o patamar deste indicador. No entanto, são poucos os municípios
que se aproximam do indicador estadual, significando que este quesito não é muito
favorável à microrregião.
O quesito mortalidade infantil apresenta um quadro bastante diversificado na região,
considerando-se que muitos municípios apresentam taxas elevadas e bem superiores à

7
média estadual, enquanto outros se situam em patamares bem inferiores ao parâmetro
estadual. Mas o fato mais relevante a ser observado é que em todos os municípios ocorreu
uma redução expressiva deste indicador, o que pode estar relevando melhorias nas
condições de acesso a saúde.
Este aspecto se expressa na esperança de vida ao nascer, que sofreu uma evolução
positiva em todos os municípios da região, fato que os situa bem próximos à média
estadual. Registre-se, inclusive, que em alguns lugares esse indicador supera, tanto a média
estadual como a nacional.
Também a freqüência escolar sofreu uma evolução bastante expressiva em todos os
municípios, especialmente no caso das crianças na faixa etária entre 7 a 14 anos. Com isso,
nota-se que em toda a região o percentual deste quesito supera a 95%, percentual bem
superior ao conjunto do estado de SC. Além disso, deve-se registrar, ainda, a expansão do
percentual de alunos com freqüência no ensino médio, pois em todos os municípios esse
percentual ultrapassa a 60%, o que pode ser considerado um bom indicador,
comparativamente ao desempenho estadual.
Em termos da taxa de analfabetismo também se observa uma evolução positiva em
todos os municípios, levando o conjunto da região a se posicionar adequadamente no
âmbito estadual. No entanto, em alguns municípios este quesito ainda permanece em
patamares elevados, como é o caso de Dionísio Cerqueira, que se situa no grupo dos
municípios que detém as maiores taxas de analfabetismo da região.
De alguma forma, as informações anteriores não se refletem sobre o comportamento
do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), uma vez que apenas 7 dos 21 municípios da
região superaram o patamar de 0,800, o que é muito significativo, considerando-se que o
IDH médio de SC estava ao redor de 0,887. No entanto, verifica-se que a grande maioria
dos municípios da região Extremo-Oeste permanece no patamar inferior a 0,800, o que
indica um nível médio de desenvolvimento.

1.2.3 - Comportamento de alguns indicadores econômicos municipais

O Extremo-Oeste Catarinense é conhecido pelo processo histórico de


desconcentração da propriedade da terra, o que caracteriza a região com predomínio de
minifúndios e pequenas unidades de produção. Em linhas gerais, nota-se uma concentração

8
dos estabelecimentos agropecuários em todos os municípios na faixa de até 20 hectares,
sendo que a área total também se concentração nestes estratos. Isto significa que a região
apresenta uma das melhores distribuições da propriedade da terra no estado de Santa
Catarina.
A estrutura da produção primária é fortemente condicionada pela produção agrícola.
Em grande medida, os municípios produzem produtos tradicionais da agricultura familiar
(milho, mandioca e trigo) e, em menor proporção, feijão e arroz. Estes produtos
normalmente são vendidos in natura ou então são utilizados para o tratamento dos animais.
Além disso, deve-se registrar a forte presença da cultura do fumo em praticamente todos os
municípios da região e, também, a presença da soja na maior parte deles. Naquelas
localidades onde as culturas de subsistência predominam, é muito comum a presença de
hortifrutigranjeiros e de algumas frutas, especialmente as de clima temperado.
Todavia, é necessário mencionar que nesta região está em curso um processo de
desarticulação da forma tradicional de organização da produção familiar com as
agroindústrias, levando muitos agricultores a reestruturar suas unidades de produção.
Porém, quando isto não é possível muitos deles são obrigados a abandonar a atividade
agropecuária.
O setor secundário da economia regional está ancorado nas indústrias de
transformação e, em menor escala, na indústria da construção civil, enquanto o setor
terciário está fortemente atrelado ao comércio local e, em menor escala, as prestações de
serviços. As indústrias de transformações se concentram em um pequeno número de
municípios, destacando-se São Miguel do Oeste, São José do Cedro, Dionísio Cerqueira e
Itapiranga. Neste ramo industrial prevalecem os setores diretamente ligados à produção
primária, como é o caso das indústrias de lacticínios e das indústrias frigoríficas de carnes
de aves e suínos. Já a indústria da construção civil apresenta uma grande concentração na
cidade de São Miguel do Oeste, município pólo que comanda o desenvolvimento regional.

1.2.4 - Principais tendências da microrregião

A microrregião Extremo-Oeste Catarinense, de colonização recente, vem


enfrentando um novo tipo de problema decorrente, em grande medida, da estruturação
econômica inicial. Durante a ocupação da região nos anos de 1950 e 1960 a madeira foi

9
uma importante atividade econômica, tanto pela sua abundância como pela sua diversidade.
Como este processo foi acelerado, o ciclo madeireiro teve vida curta e já nos anos de 1960
a região começa a se inserir no modelo da agricultura moderna, o qual atinge seu auge na
década de 1980.
A partir daí a região vem passando por sucessivas crises com reflexos sobre as
esferas demográfica e social. Por um lado, já começam a ser visíveis os vazios
demográficos, além de um processo de envelhecimento acentuado da população residente
nas áreas rurais. Por outro, a migração de contingentes populacionais, especialmente dos
jovens, tem provocado reduções demográficas expressivas em vários municípios, com
efeitos negativos sobre a própria arrecadação financeira das administrações municipais e
sobre as transferências governamentais.
Esta situação tende a piorar caso não sejam encontradas alternativas viáveis na
própria região. A principal delas está relacionada à solução dos impasses atuais que afetam
o sistema de produção agropecuária, que se desenvolveu a partir de uma premissa produtiva
que tende a elevar seqüencialmente a escala de produção. Neste percurso, muitos vão
ficando para trás, restando-lhes apenas a alternativa de migrar para outras partes do estado e
do país.

II – INDICADORES DE IMPACTOS DO PAA SEGUNDO A VISÃO DOS


ATORES ENVOLVIDOS COM O PROGRAMA

Esta seção sistematiza alguns elementos dos três aspectos centrais do trabalho,
tomando-se como referência analítica as opiniões dos atores sociais entrevistados nos
municípios visitados.

2.1 – A percepção dos agricultores familiares beneficiados pelo PAA

A maior parte dos agricultores beneficiados foi classificada na modalidade CAEAF,


doação simultânea. De alguma forma, isso se explica pelos problemas ocorridos com a
modalidade CDLAF em alguns municípios, que no momento da pesquisa não tinham

10
implementado qualquer tipo de ação, apesar do convênio ter sido celebrado há tempos com
o MDS.
Outra informação relevante é sobre a dinâmica do trabalho rural. Dentre os
beneficiários da modalidade CAEAF é bastante expressivo o percentual de agricultores que
já trabalhou fora do meio rural. Este aspecto também é importante dentre os não
beneficiários, cujo recurso ao trabalho fora do meio rural é bem representativo nos
municípios pesquisados.
Do ponto de vista do tamanho dos estabelecimentos agropecuários dos beneficiários
do programa, verifica-se que em todos os municípios e em todas as modalidades
praticamente não foram registrados estabelecimentos com área superior a 50 hectares,
sendo que a grande maioria se situa na faixa de até 20 hectares, o que é muito compatível
com a estrutura agrária da microrregião geográfica pesquisada.
Este fato explica, em parte, porque a grande maioria dos entrevistados (82%)
também tem participação no Pronaf. Isto significa dizer que há uma forte
complementaridade entre as duas políticas públicas, considerando-se que grande parte dos
instrumentos do Pronaf está direcionada ao estímulo produtivo, através do acesso ao crédito
em condições favoráveis.
Do ponto de vista da renda, verificou-se que em todos os municípios pesquisados é
importante o impacto do programa sobre o nível de renda dos agricultores, sendo que
muitos foram categóricos em afirmar que a renda agropecuária aumentou após a
implementação do PAA.
Quanto à produção, nota-se que a maior parte dos entrevistados afirmou que o
programa os estimulou a produzirem novos produtos agropecuários, isto porque a grande
maioria dos participantes na modalidade CAEAF afirmou ter ampliada a cesta de produtos
que vinha sendo produzida nos estabelecimentos agropecuários.
Em relação à tecnologia utilizada pelos agricultores, verifica-se que a maioria dos
entrevistados afirmou que fez melhorias tecnológicas no sistema produtivo. No entanto,
este item deve ser relativizado, considerando-se que mudanças tecnológicas são mais
difíceis de serem internalizadas nas unidades de produção, especialmente naquelas em
condições mais debilitadas, devido aos elevados custos financeiros.

11
Diante da hipótese de ocorrer interrupção do programa, observaram-se dois tipos
distintos de reações dos beneficiários. Para aqueles segmentos que o programa foi decisivo
para a inserção nos mercados locais, a descontinuidade do mesmo causaria impactos mais
visíveis e imediatos sobre a estrutura de produção. Já para aqueles segmentos que
participam do programa, mas que podem ter outros mecanismos de comercialização (feiras
locais, atacadistas, supermercados, etc.), talvez a interrupção do mesmo signifique apenas
uma readequação aos espaços dos mercados locais.
A avaliação geral realizada pelos agricultores beneficiados sobre o PAA foi muito
positiva, embora se torne necessário registrar que vários entrevistados manifestaram
descontentamentos com alguns aspectos do programa, principalmente na parte relativa aos
mecanismos de implementação desta nova política pública.
No entanto, cabe destacar que as críticas foram feitas no sentido de aprimorar e
melhorar as ações do programa, visando a sua continuidade nos próximos períodos, uma
vez que se criou uma expectativa muito favorável em relação ao enfrentamento de um
gargalo muito significativo para os agricultores familiares, que é o processo posterior à
produção no interior das unidades de produção.

2.2 - A percepção das associações de agricultores beneficiadas pelo PAA

As entidades entrevistadas, em sua grande maioria, são ligadas aos movimentos


sociais presentes nos municípios da microrregião da pesquisa, sendo que todas elas têm
menos de 10 anos de existência, fato que revela um processo recente de busca do
associativismo entre esse segmento de agricultores. O corpo de associados é composto,
majoritariamente, por agricultores familiares, com área média da terra não superior a 20
hectares.
Os sócios dessas organizações são agricultores familiares classificados nos grupos
A, C e D do Pronaf. Estão inseridas no programa desde 2004, sendo que ficaram sabendo
do mesmo através das administrações municipais, dos meios de comunicação locais, do
Consad e dos sindicatos. O ingresso ocorreu porque é mais fácil vender os produtos
alimentares através do programa (pois há a garantia da venda), além do que os preços pagos
pelo mesmo se revelaram mais atrativos.

12
No entanto, destacaram que as principais dificuldades para participar do programa
dizem respeito à documentação exigida, ao excesso de mecanismos burocráticos e ao
atendimento das propostas, via manutenção da regularidade das quantidades produzidas.
Em termos de mudanças na produção a partir da implementação do programa,
constatou-se que passaram a produzir novos produtos (hortifrutigranjeiros e frutas), além de
terem ampliado a área de produção, especialmente de produtos olerícolas, bem como a
criação de frangos. Chama a atenção que, caso o programa seja desativado, a produção
deverá diminuir e a comercialização direta com as entidades sociais poderá ser suspensa.
Por outro lado, se observou que houve pequenas mudanças nas relações com os
comerciantes locais, uma vez que parte dos produtos que antes eram comercializados com
estes passou a ser destinada às entidades sociais beneficiárias do programa.
Os entrevistados foram unânimes em afirmar que os preços praticados pelo PAA
cobrem os custos de produção para todos os produtos comercializados e que durante o
processo de comercialização usam embalagens próprias, algumas inclusive com rótulos,
sendo que o transporte dos produtos é feito de forma coletiva e individual entre os
associados.
Finalmente, em termos de sugestões de melhorias do programa, foram destacados os
seguintes pontos: ampliar o valor específico por agricultor; antecipar mais os recursos para
manter a regularidade da oferta dos produtos; reduzir os mecanismos burocráticos; ampliar
o volume de vendas; melhorar a distribuição dos recursos entre as associações visando
ampliar as vendas; aumentar a fiscalização sobre os produtos, tanto no momento da
aquisição como na distribuição; e estimular parcerias entre as agroindústrias familiares
existentes nos municípios.

2.3 - A percepção das entidades sociais locais beneficiadas pelo PAA

Foram entrevistadas pessoas responsáveis por escolas municipais; hospitais locais;


centros de bem-estar do menor; programas locais para famílias carentes, entre outras. Todas
são entidades sociais que foram beneficiadas pela doação simultânea de produtos
alimentares. Independentemente do público que cada uma dessas entidades assiste, o fato é

13
que elas fornecem alimentação à população e que parte dessa alimentação passou a ser
composta pelos produtos oriundos do PAA.
O fornecimento de alimentos a essas organizações sociais tinha origem nos
supermercados locais e em atacadistas. Mais recentemente passaram a obter parte dos
alimentos direto dos agricultores, sendo que muitos desses alimentos são preparados nas
cozinhas das próprias entidades.
Todos os respondentes informaram conhecer as ações do PAA, tendo acesso às
condições do mesmo através da prefeitura local, de órgãos governamentais e de meios de
comunicação, sendo que todas as entidades passaram a fazer parte do programa via convite
da administração municipal.
Os respondentes afirmaram, ainda, que no momento do recebimento dos produtos
fazem controle, tanto da quantidade como da qualidade dos alimentos, e que após o final
das doações pretendem continuar comprando produtos oriundos da agricultura familiar.
A freqüência do recebimento dos alimentos varia de semanal a quinzenal e até
mesmo mensal, sendo que em alguns casos (Hospitais) chega a ser de duas vezes por
semana. Com isso, avaliou-se que houve alterações qualitativas no cardápio, com
ampliação da diversidade de produtos aos necessitados.
Isto significa que os principais benefícios do programa estão relacionados à
aquisição de alimentos diretos dos agricultores; a melhoria na diversidade e qualidade dos
produtos; a economia na aquisição de remédios no caso específico dos hospitais; e a própria
economia de recursos financeiros por parte das entidades.
A título de sugestão de melhorias no programa, apontou-se a necessidade de ampliar
o programa para todas as comunidades, visando incentivar a produção local, como forma de
ampliar a quantidade de produtos destinados às entidades sociais.

2.4 - Outros aspectos relevantes destacados pelos atores

Em primeiro lugar, observou-se que o programa não sofreu interrupção diante da


troca do comando político nas administrações locais. Ao contrário, as administrações
desencadearam diversas ações de divulgação, no sentido de incentivar a ampliação deste
tipo de política pública. De alguma forma, isso se consubstanciou na criação de

14
coordenações locais que ficaram responsáveis pela implementação das atividades do PAA
nos municípios.
Outro aspecto relevante do programa é a possibilidade concreta da receita financeira
advinda do programa permanecer nos municípios. Isto induz as autoridades municipais a
apoiar o programa e gera efeitos diretos e indiretos sobre a economia, ao mesmo tempo em
que propicia a oportunidade de valorização dos produtos localmente.
Também foi considerada muito relevante a articulação local entre os diferentes
atores sociais, culminando com a formação de coordenações políticas locais, para além das
administrações públicas. Registre-se, neste caso, a presença de diversas organizações
sociais, bem como o importante papel desempenhado pelos CONSEA municipais.
O processo de definição dos preços, por sua vez, também funciona como um
instrumento de adesão ao programa, pois em todos os casos pesquisados observou-se que o
patamar fixado supera os custos de produção e compete com os preços praticados pelos
comerciantes locais, fato avaliado positivamente pelos agricultores familiares.
Os gargalos do programa estão mais localizados no âmbito da produção, uma vez
que muitos agricultores cadastrados não têm condições e capital suficiente para atender a
demanda, além do que a oferta de produtos continua sendo muito irregular. Já no âmbito
das administrações municipais, a principal dificuldade diz respeito à falta de pessoal
qualificado nos municípios para coordenar as ações deste tipo de política pública.

III – Indicadores de gestão e de institucionalidade do PAA

3.1 - A percepção dos gestores locais do programa

Os gestores locais ressaltam a importância da continuidade do programa, ao mesmo


tempo em que identificaram os motivos pelos quais os municípios aderiram ao mesmo,
ressaltando-se a possibilidade da receita permanecer no próprio local; a possibilidade de
elevação da renda dos agricultores familiares; e a valorização do produto local, a partir de
um processo de venda garantida.
Durante a execução do programa nos municípios as autoridades criaram uma
coordenação local e se envolveram diretamente com diversas entidades e órgãos públicos.

15
Neste processo, a administração local avaliou que o arranjo institucional do programa foi
bom, apenas devendo ser melhorado os aspectos de comunicação junto aos agricultores
familiares.
Em termos da distribuição espacial do programa, avaliou-se que o mesmo ficou
preso à capacidade de produção de cada agricultor e/ou entidade (quando a compra era
realizada coletivamente), o que atingiu um número pequeno de agricultores. Mas há
possibilidades concretas de atingir um número bem maior de agricultores, o que
beneficiaria um número ainda maior de entidades sociais locais, especialmente as escolas e
também grupos de idosos.
Do ponto de vista dos critérios adotados para selecionar os agricultores que
participam do programa, considerou-se a capacidade de produção individual, a organização
em grupos e o enquadramento na categoria de agricultor familiar, de acordo com as normas
do PRONAF. Duas características, porém, aproximam este público alvo: o baixo nível de
renda e as unidades familiares de produção com área bastante reduzida.
Quanto aos produtos adquiridos pelo programa, destacam-se o leite, mandioca,
batata-doce, feijão, fubá, doces, mel, etc. Além destes, poderiam ser fornecidos também
queijos, embutidos de carnes, frutas, mel e peixes. O controle de qualidade dos produtos
era feito visualmente pela coordenação local, não sendo realizado nenhum tipo de análises
laboratoriais. Apenas as entidades cadastradas faziam anotações em fichas próprias sobre
quantidade e qualidade dos produtos.
Os critérios para definição dos preços dos produtos obedeciam a um levantamento
dos mesmos nos supermercados locais, a partir do qual se elaborava uma média para cada
produto. De um modo geral, avaliou-se que os preços superavam os custos de produção,
sendo avaliados positivamente pelos agricultores, comparativamente aos preços praticados
pelos comerciantes locais. Além disso, o pagamento era feito logo após a entrega dos
produtos, possibilitando ao agricultor um fluxo financeiro contínuo.
Os critérios adotados para identificar as entidades recebedoras dos produtos
seguiram os parâmetros da relevância do trabalho social executado pelas mesmas junto às
famílias de baixa renda, sendo excluídas as entidades sociais independentes e as famílias de
alta renda.

16
3.2 - A percepção dos gestores estaduais

Em termos da distribuição territorial do programa, os gestores estaduais reconhecem


que a maior parte das ações do PAA está concentrada na região Oeste, tendo em vista que
ele iniciou naquele local em 2003. Atualmente estão sendo implementadas ações também
nas regiões Sul e Norte, destacando-se que a região do Planalto Serrano é a única onde o
programa praticamente não tem nenhuma inserção. Em parte, isso se justifica pela menor
presença da agricultura familiar e pelo fato de que a dinâmica produtiva regional ainda ser
fortemente condicionada pela pecuária em regime extensivo. De qualquer forma, deve-se
registrar que o PAA, modalidade CAEAF, foi implantado em apenas 5 municípios no ano
de 2003 e no ano de 2005 atingiu 80 municípios em todo o estado. Já a modalidade CAAF
foi implementada apenas no ano de 2003, mas devido aos problemas decorrentes da
estiagem não teve continuidade nos anos seguintes.
Quanto ao fluxo operacional e execução geral do programa nota-se, em primeiro
lugar, que após reuniões com municípios interessados e seminários regionais, a equipe
técnica do órgão estabelece as metas para cada exercício, as quais são discutidas e definidas
juntamente com a direção da empresa em Brasília. Após essa definição é feito o convênio
com o MDS, o que significa dizer que as metas no caso de SC dependem sempre das metas
nacionais definidas entre o MDS e a diretoria da empresa executora. Este procedimento tem
implicações diretas sobre o volume de recursos destinados ao estado que, no limite, define
o número de agricultores a serem atendidos.
Do ponto de vista do arranjo e das relações institucionais, nota-se o envolvimento
de um conjunto de órgãos públicos federais e locais (MDS, CONAB, INCRA e
administrações municipais), de movimentos sociais (sindicatos, federações, conselhos,
associações) e de ONGs de apoio a esses movimentos. Este é um trabalho de consertação
social que não é fácil de ser executado, mas que na avaliação da equipe técnica da CONAB
foi bastante favorável, especialmente porque conseguiu unir os interesses dos dois setores,
ou seja, os ofertantes e os demandantes de produtos alimentares.
Em termos dos agricultores beneficiados pelo PAA, se adotou como critério de
seleção os grupos do PRONAF. Na prática, porém, nota-se que houve uma concentração

17
maior do programa no grupo D, que normalmente é composto pelos agricultores familiares
mais bem posicionados no cenário da agricultura familiar regional.
Quanto aos aspectos relativos à produção, vários pontos precisam ser mencionados.
O primeiro deles é que a cesta de produtos adquiridos pelo programa obedeceu a dois
critérios básicos: a facilidade de distribuição e os hábitos alimentares regionais. Com isso,
verifica-se que arroz, milho, feijão, leite, mel, biscoitos e hortifrutigranjeiros prevaleceram
nas aquisições e doações simultâneas. O segundo aspecto está relacionado aos produtos
com potencial, mas que não foram incluídos no programa. Neste caso, não foram incluídos
os produtos processados e derivados da produção animal, devido aos problemas relativos à
questão sanitária. Finalmente, registre-se que o controle de qualidade dos produtos é feito
pelas entidades sociais receptoras, as quais têm o direito de rejeitar determinados produtos.
Do ponto de vista do monitoramento e controle das ações, verifica-se que, no
âmbito estadual, toda gestão do programa está centralizada na superintendência da
CONAB, sendo que o acompanhamento de desempenho do PAA é feito através de
relatórios mensais que permitem identificar os estágios de execução de cada projeto. Além
disso, são realizadas visitas de supervisão em municípios que têm dificuldades para
executar as ações previstas. Neste caso, a empresa conta com a participação dos
articuladores do programa no âmbito local, que normalmente são os comitês gestores e os
conselhos de segurança alimentar e nutricional.
No entanto, cabe aqui uma pequena qualificação sobre a participação desses atores
locais no processo de gestão do programa. Embora este aspecto tenha sido avaliado
positivamente pelos gestores estaduais, sabe-se que o envolvimento de atores sociais em
programas públicos desta natureza é muito diferenciado, fazendo com que algumas
localidades se destaquem mais que outras. Neste caso, dois pontos são determinantes: o
grau de organização social dos atores e a estrutura e organização pública municipal. Assim,
naqueles locais onde esses dois aspectos estão articulados e melhor desenvolvidos, tende a
ocorrer um funcionamento mais adequado do programa.
Em termos dos impactos do programa no âmbito local verifica-se que há um
envolvimento muito expressivo com o programa, tanto por parte dos agricultores familiares
como das entidades sociais beneficiadas. Os primeiros porque, além de não perderem sua
produção, têm mais um espaço de comercialização, que poderá resultar em aumento de

18
renda. Já as entidades sociais, em sua maioria com dificuldades financeiras, podem
economizar recursos próprios e melhorar a qualidade e a quantidade dos alimentos
utilizados em seus programas junto às populações carentes e às crianças, doentes, etc.
Além disso, observa-se um maior envolvimento das administrações locais,
especialmente na modalidade CAEAF, porque o PAA desempenha um papel social
relevante, ou seja, se ele não existisse outro tipo de ação pública teria que ser implementada
para atender as famílias em estado de insegurança alimentar. Porém, deve-se registrar que a
continuidade e a expansão de um programa desta natureza dependem do aporte de recursos
por parte das autoridades federais. Sem dúvida, este ponto já pode ser considerado um fator
limitante no cenário atual.

3.3 - Gestão e arranjo institucional do programa

De um modo geral, notou-se que o relacionamento entre os órgãos públicos,


especialmente entre as esferas federais e locais, foi bastante harmonioso, contribuindo para
elevar o potencial do programa em diversos municípios. Assim, o envolvimento das
administrações públicas municipais com o programa é um ponto importante porque
auxiliou nas articulações entre os atores locais e órgãos governamentais responsáveis pela
implementação e controle das ações.
No entanto, é sintomática a falta de envolvimento dos órgãos públicos estaduais,
especialmente das equipes técnicas da Epagri, empresa responsável pela pesquisa e
assistência técnica aos agricultores familiares, a qual conta com escritórios em todos os
municípios do estado. A presença desta empresa nas discussões locais poderia ter
contribuído para melhorar aspectos relativos à oferta de produtos, bem como coordenar o
planejamento do programa a médio prazo.
Além disso, verifica-se que o próprio governo estadual, ágil em firmar convênio
com o MDS, não foi tão eficaz no processo de implementação das ações do programa sob
sua responsabilidade. Assim, percebeu-se que ao final de 2005 quase nenhuma atividade
específica dos órgãos públicos estaduais havia sido implementada, a não ser o repasse de
recursos para o CONSAD Extremo-Oeste, para que este viabilizasse o PAA nos municípios
sob sua jurisdição.

19
No âmbito das administrações municipais, observam-se avanços e limitações no
processo de implementação desta nova política pública. Em termos de avanços, deve-se
registrar que, mesmo diante da alternância do poder político local em 2004, ocorreu a
continuidade das ações. Já as limitações dessas administrações se localizam na estrutura
administrativa, pois se observou a falta de técnicos qualificados e com capacidade gerencial
para planejar e coordenar as ações do programa, e na esfera financeira, considerando-se as
dificuldades orçamentárias pelas quais passam essas administrações públicas locais.
No entanto, é necessário fazer uma distinção entre as duas modalidades estudadas.
No caso da modalidade CAEAF, todo o arranjo institucional foi se formando a partir das
ações desencadeadas pela CONAB, órgão público responsável execução do programa no
âmbito estadual. Já na modalidade CDLAF, executada a partir de convênio direto entre as
administrações municipais e o MDS, prevaleceu a dinâmica de cada localidade.
Quanto à participação social, nota-se que nos municípios onde existem movimentos
sociais organizados e também uma tradição de diálogo democrático entre as administrações
e órgãos públicos e esses movimentos, o processo transcorreu de forma mais harmoniosa,
estimulando, inclusive, a participação de organizações da sociedade local, especialmente
dos sindicatos e das associações dos agricultores familiares.
Finalmente, deve-se registrar o importante papel desempenhado pelo CONSAD
Extremo-Oeste e pelos CONSEAs municipais na articulação e implementação do programa
em toda a região. Essas instituições foram muito eficazes no processo de articulação e de
mediação de interesses entre os atores envolvidos, especialmente entre as representações da
sociedade civil e as administrações públicas locais.

IV – Indicadores de impactos sobre a esfera local

O processo de comercialização da produção tem recebido muito espaço nos debates


das organizações dos agricultores familiares, tendo em vista as dificuldades que este setor
encontra quando procura realizar sua produção nos mercados. Para tanto, ao longo da
década de 1990 estas organizações estudaram e sistematizaram diversas experiências que
surgiram em vários locais do país, como forma de enfrentar o problema.

20
Deste modo, as diferentes modalidades do PAA vieram suprir uma necessidade
premente deste segmento de produtores rurais, na medida em que estabelecem novas
formas de comercialização nos próprios locais da produção.
Neste sentido, um dos aspectos mais citados pelos agricultores e suas organizações
foi a possibilidade de organizar e planejar parte da produção a partir de uma lógica local, ou
seja, a demanda dos mercados locais foi considerada um importante fator de estímulo à
produção de vários tipos de alimentos que não estavam sendo priorizados no plano de
atividades das unidades de produção. Paralelamente a isto, os agricultores passaram a ter
um compromisso relativo à periodicidade de fornecimento dos alimentos às entidades
credenciadas pelas coordenações locais, fato que os obriga a adotar uma estratégia clara em
relação ao processo produtivo.
Outro ponto relevante diz respeito ao processo de definição dos preços dos produtos
agropecuários, que possibilitou o estabelecimento de um preço “mais justo”, segundo a
interpretação da maioria dos entrevistados. Este aspecto é essencial, especialmente para
aqueles segmentos de agricultores mais vulneráveis e que geralmente têm pouco poder de
barganha para defender melhores preços aos seus produtos quando conseguem se inserir
nos mercados locais e regionais.
Este critério de definição de preços e a certeza de que os produtos seriam
comercializados estimularam o aumento da produção de vários produtos, especialmente de
hortifrutigranjeiros, devido ao seu ciclo curto, além da diversificação da oferta, causando
pequenas mudanças nas relações comerciais locais que tradicionalmente eram comandadas
pelo pequeno comércio varejista local.
No entanto, deve-se registrar que esses aspectos são bem mais visíveis entre os
agricultores com dificuldades, tanto de meios de produção como de acesso aos mercados.
Com isso, o programa transforma-se em uma importante oportunidade para esses
segmentos, especialmente para melhorar seus níveis de renda. Já para os segmentos de
agricultores melhor posicionados no sistema familiar, torna-se mais difícil creditar ao PAA
efeitos diretos sobre o processo produtivo e o nível de renda familiar.
De outro lado, as próprias entidades sociais beneficiadas acabaram percebendo a
importância do programa. Neste caso, ressaltou-se a maior variedade de produtos, o
aumento da qualidade dos alimentos, a economia de recursos financeiros por parte das

21
instituições beneficiadas, a ampliação dos atendimentos e a integração com as organizações
de produtores, viabilizando a compra direta do produtor.
Deste modo, percebe-se que o programa tem um componente social importante,
uma vez que, além de estimular o fornecimento de alimentos direto aos consumidores, cria-
se a possibilidade de se estabelecer laços de solidariedade entre pessoas e entidades sociais,
enaltecendo o papel destas nas sociedades locais.

4.1 - Potencial de mercado gerado pelas compras públicas

O trabalho de campo mostrou que as duas modalidades do PAA implementadas na


região geraram uma expectativa muito favorável em relação ao mercado local,
considerando-se que muitos produtos típicos das unidades familiares de produção agora
também têm a oportunidade de serem comercializados localmente, o que pode contribuir
para elevar a renda familiar.
No entanto, percebe-se que o volume de produtos comercializados ainda é pequeno
nestes primeiros anos do programa. Isso decorre, em parte, de estrangulamentos na esfera
produtiva, ocasionando uma oferta irregular de produtos e gerando incertezas,
especialmente na outra ponta do processo, uma vez que as entidades assistenciais ficam em
dúvida se terão ou não os produtos prometidos.
Mesmo assim, nota-se que há espaço para expansão das compras diretas dos
agricultores. Porém, para que isso aconteça é necessário fazer alguns ajustes importantes,
principalmente na área técnica, com um maior acompanhamento por parte dos órgãos
públicos responsáveis pela assistência aos agricultores e uma melhor organização por parte
dos produtores. Esses dois pontos ajudariam a reduzir a frustração de expectativas em
relação ao programa.
Assim, uma expansão do programa tenderia a dinamizar ainda mais a economia
local, tendo em vista que os agricultores familiares, com um poder de compra maior,
poderiam consumir mais na esfera local, fortalecendo tanto o comércio local como as
próprias administrações municipais, que aumentariam suas arrecadações financeiras.
Essas externalidades positivas, no entanto, deveriam estar ancoradas em uma
estratégia política que ataque, por um lado, o fomento à produção familiar e, por outro, o
atendimento às demandas alimentares das populações em situação de insegurança

22
alimentar. Neste caso, o PAA precisa combinar um conjunto de ações imediatas com outras
de cunho estrutural. Isso significa manter e ampliar a disponibilidade de recursos
financeiros para atender adequadamente essas duas ordens de questões, estabelecendo
cronogramas orçamentários que não venham a frustrar as expectativas, especialmente dos
agricultores familiares, que precisam planejar com boa antecedência o processo produtivo.

V – CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES

O PAA se insere no âmbito do conjunto de políticas que fazem parte do Programa


Fome Zero, que articula políticas emergenciais com políticas estruturais. Neste caso,
buscou-se construir uma proposta de segurança alimentar para o país, levando-se em
consideração o papel decisivo a ser desempenhado pela agricultura familiar. Daí a
necessidade de uma integração entre as políticas de fomento à produção e as políticas de
abastecimento alimentar, processo este que se expressa através de três eixos básicos:
articulação local de demandas dirigidas especificamente à agricultura familiar; subvenção
ao consumo de alimentos às populações em insegurança alimentar; e articulação entre
políticas estruturais e políticas emergenciais.
O estudo procurou observar possíveis impactos deste novo arcabouço de políticas
sobre atores e sistemas econômicos locais em uma microrregião homogênea, cuja dinâmica
é pautada por valores sociais e culturais muito próximos e por uma lógica econômica muito
particular, ou seja, em todos os municípios visitados e também nos municípios próximos a
estes a agricultura familiar comanda a organização socioeconômica. Daí a relevância da
necessária articulação entre os eixos mencionados no parágrafo anterior, que sugere
algumas hipóteses que serão discutidas na seqüência.

Semelhanças e diferenças entre as modalidades do PAA

No momento da pesquisa de campo, apenas duas modalidades do PAA estavam


sendo executadas no estado de SC (CAEAF e CDLAF), com processos de implementação
muito distintos, o que certamente afetará o desempenho das mesmas.

23
Dentre todas as modalidades do PAA, a modalidade CAEAF – doação simultânea -,
sob a gestão da CONAB, é a que vem apresentando melhor desempenho, não somente pelo
fato de ter expandido suas ações de cinco municípios, em 2003, para oitenta, em 2005 e de
ter triplicado o volume de recursos orçamentários disponíveis, mas também pela forma
como as ações vêm sendo implementadas junto aos atores sociais envolvidos.
O órgão executor desta modalidade conseguiu implementar uma articulação local ao
redor do programa, envolvendo produtores rurais, administrações municipais e entidades
sociais, cujos resultados favoráveis já foram percebidos nas visitas às localidades
selecionadas. No entanto, esse processo precisa avançar mais, especialmente na esfera da
produção, onde se localizam diversos gargalos que podem vir a comprometer a
continuidade da modalidade.
Além disso, como o critério de seleção dos agricultores familiares segue as regras
do PRONAF, notou-se uma concentração de beneficiários enquadrados como grupo D, o
que poderia estar levando a uma focalização excessiva dessa modalidade no segmento de
agricultores familiares mais bem posicionados no âmbito da agricultura familiar local.
Já a modalidade CDLAF, realizada através de convênios entre as administrações
municipais e o MDS, apresentou situações um pouco distintas nos municípios visitados.
Estas diferentes formas de implementar o programa estão relacionadas, fundamentalmente,
ao clima político reinante no município, o qual espelha a própria amplitude das ações que
foram desenvolvidas e a forma com que as administrações públicas municipais se
relacionam com as comunidades e demais organizações sociais.
Assim, naquelas localidades onde anteriormente ao programa já existia uma tradição
“mais democrática” de gestão de políticas públicas, verificou-se que a participação e o
envolvimento dos beneficiários (agricultores e entidade sociais locais) ocorreram de forma
mais tranqüila e menos conflitiva. Já nos casos onde as administrações municipais não
implementaram nenhuma das atividades previstas nos convênios, observou-se uma
descrença generalizada entre os atores sociais entrevistados. Este aspecto pode ser resumido
através de um sentimento expressado por um grupo de atores: “algumas administrações
municipais atuam contra os interesses do PFZ porque esse programa está sendo implantado
pelo Governo Lula”. De certa forma, esta afirmação traduz a forma como interesses

24
políticos antagônicos se expressam localmente no âmbito das políticas públicas e a própria
motivação e mobilização das administrações municipais, conforme veremos na seqüência.

Diferentes razões das administrações locais para aderir ao programa

A crise econômica do país das duas últimas décadas do século XX também


provocou efeitos sobre as esferas fiscal e financeira das administrações municipais,
especialmente sobre aquelas localidades com baixo dinamismo econômico e com pequena
capacidade de resposta a uma situação adversa.
Desta forma, nota-se que a adesão a uma nova política pública, como é o caso do
PAA, é motivada, primeiramente, pela possibilidade de expansão do orçamento municipal,
especialmente quando isto ocorre via convênios. Talvez este aspecto ajude a explicar
porque determinadas administrações, mesmo estando inadimplentes e cientes que não
poderão utilizar os recursos federais, acabam celebrando convênios e assumindo
compromissos que, na maioria das vezes, deixam de ser cumpridos.
Além disso, uma nova política pública com a natureza desta que estamos estudando
dá ao administrador local a possibilidade concreta de fazer a interlocução com os atores
locais, especialmente com os agricultores familiares, e mostrar que, mesmo diante de um
cenário de crise, a administração local está fazendo algo em prol dos munícipes. Ou seja, o
programa transforma-se em um espaço de prestação de contas do político local aos seus
apoiadores.
Articulado a este ponto aparece um elemento subjacente ao processo, mas que é
fundamental para todo político local: a necessidade de dar respostas às demandas das
comunidades rurais que enfrentam problemas, tanto na esfera da produção como na área de
comercialização da produção. Para tanto, acenar a este público com a possibilidade de
ingresso de novos recursos atenua momentaneamente as possíveis cobranças e pressões
sobre a administração pública local.
Por outro lado, não deve ser descartado que o programa também se transforma em
uma possibilidade concreta para a administração desenvolver ações assistencialistas, seja
diretamente através da distribuição de cestas básicas de alimentos, seja através de
organizações sociais beneficiadas pela iniciativa da administração pública local.

25
Finalmente, deve-se registrar que ainda são poucas as administrações municipais
que incorporam às suas atividades programas desta natureza como espaços efetivos de
democratização da política pública e de construção da cidadania, através do estímulo à
participação dos atores sociais locais e à construção de instrumentos de gestão social que
poderiam potencializar os resultados da política pública.

A importância da participação de organizações sociais na gestão do programa

Atualmente está em curso um processo de valorização do local como espaço de


realização de novos pactos entre atores sociais, que podem gerar novas institucionalidades
capazes de promover a ampliação da representação social e intervir na definição e
implementação de políticas públicas.
No entanto, o processo de descentralização e de democratização das políticas
públicas ainda encontra, em diversas regiões e estados do país, obstáculos para a sua
efetivação. Parte desses limites decorre de pressões das oligarquias, dos vínculos familiares
tradicionais e da própria forma de exercício do poder político local.
Neste sentido, a gestão social é um instrumento que deve ser estimulado como
forma de garantir transparência, participação e sustentabilidade de uma determinada
política pública. Para tanto, ela deve ser vista como um processo em construção que visa
democratizar o espaço relativo dos assuntos públicos. Nesta lógica, a gestão social poderá
definir novas relações políticas que levem ao empoderamento da sociedade local.
Para que este processo tenha êxito, dois fatores são essenciais. Por um lado, é
necessário desenvolver a capacidade de articulação e de complementaridade entre as
iniciativas dos órgãos governamentais e as organizações sociais, enfatizando a importância
da participação dos atores em todas as fases do processo de implantação de uma nova
política pública. Por outro lado, é necessário garantir o espaço de legitimação social e
política dos atores através da criação e/ou do fortalecimento de instituições já existentes
para que as mesmas se transformem no fio condutor do processo de democratização das
políticas públicas.
No caso do PAA em SC, estes dois fatores ainda são muito incipientes, quando não
ausentes. Por mais que gestores estaduais e locais tenham afirmado que está havendo um

26
bom envolvimento dos atores sociais com o programa, deve-se ter cautela com este tipo de
análise. Na verdade, o que se observou foi uma forte centralização das ações do programa,
tanto no âmbito estadual (CONAB) como na esfera das administrações municipais, além de
um baixo envolvimento das representações sociais, especialmente dos sindicatos e
federações de agricultores familiares.
Do ponto de vista institucional, diversos gestores entrevistados fizeram menção a
uma coordenação local para implementar o programa nos municípios. No entanto, não ficou
clara a forma de funcionamento desta coordenação, bem como o grau de institucionalidade
a ela conferido. Nas visitas de campo notamos que esta coordenação local, na verdade, está
fortemente atrelada à autoridade municipal responsável pela condução do programa.
Em termos de inovações institucionais, verificamos que as mudanças foram poucas.
Houve casos que, em função de requisitos do próprio PAA, as administrações municipais
estavam formando Conselhos Municipais de Segurança Alimentar (Consea), cujas
atribuições ficavam restritas à parte meramente operacional (burocrática) do programa.
Com isso, perdem-se oportunidades para construir instituições locais com representação
social e com legitimidade para democratizar as políticas públicas.

Principais Recomendações

A título de sugestão aos responsáveis pela condução do programa nas esferas


governamentais, elencamos algumas proposições a partir das informações coletadas a
campo. Tais sugestões pretendem atacar alguns pontos cruciais que têm implicações sobre a
continuidade e expansão do programa, pois dizem respeito a três esferas distintas de
intervenção.

a) Esfera da produção

Um dos pontos de unanimidade durante todos os contatos com os atores locais


envolvidos com o programa diz respeito ao estrangulamento existente no processo
produtivo, que se traduz na irregularidade da oferta de produtos após as propostas terem
sido aceitas pelas coordenações locais.

27
Neste caso, torna-se necessário uma melhor articulação entre as políticas de apoio à
produção e os processos de comercialização, de tal forma que expectativas não sejam
frustradas e o programa não seja desativado. Para tanto, é essencial envolver a Epagri neste
processo, enquanto empresa responsável pela assistência técnica aos agricultores no estado
de SC, visando organizar e planejar melhor as atividades produtivas, como forma de atacar
a sazonalidade, bem como promover e ampliar a diversidade de oferta de produtos
alimentares.
Além disso, é fundamental a continuidade de uma política de crédito que estimule a
diversificação produtiva, de tal forma que os agricultores familiares possam manter uma
regularidade da produção no mercado, fato que certamente contribuirá para elevar o nível
de capitalização das unidades familiares, capacitando-as a dar respostas adequadas às
demandas existentes.
Também se sugere uma política de agroindustrialização mais ativa, no sentido de
agregar valor aos produtos oriundos da agricultura familiar. Neste caso, devem-se buscar
parcerias entre agroindústrias locais, como forma de potencializar o espaço criado pelo
PAA.
Resumidamente, significa dizer que é necessário uma política de fomento à
produção mais robusta e articulada aos novos canais de comercialização que se abrem nos
espaços locais, como elementos essenciais para a sobrevivência e ampliação do programa.

b) Esfera da gestão do programa

O processo de gestão social das políticas públicas deve ser sempre buscado e
aprimorado, como meio de democratizar essas políticas. O PAA, por ser uma política nova,
tem a possibilidade concreta de avançar neste campo, inovando tanto nas formas como nos
mecanismos de representação social.
Ao longo de todo o trabalho vimos diversas manifestações relacionadas a uma
determinada coordenação local. No entanto, não foi possível investigar em profundidade a
composição da mesma, bem como sua forma de atuação. Porém, nas entrevistas com os
gestores locais ficou a impressão que esta articulação está centralizada nas administrações

28
municipais, particularmente nos secretários municipais das pastas mais próximas ao
programa.
Para tanto, propõem-se a criação de comitês gestores locais nos moldes iniciais do
PFZ, com autonomia em relação às administrações municipais, como forma de envolver
tanto as organizações dos agricultores familiares, bem como as demais representações
sociais locais.
Além disso, propõem-se também a criação de um sistema de monitoramento e
acompanhamento de execução das atividades dos projetos, de tal forma que a sociedade
local tenha conhecimento da dimensão das ações desenvolvidas pelo programa no
município.

c) Esfera institucional do programa

No âmbito geral do programa, ampliar a dotação orçamentária para todas as


modalidades, como forma de dar maior capilaridade ao mesmo, transformando-o
efetivamente em uma política pública de alcance nacional.
Especificamente em relação à modalidade CDLAF, não celebrar convênios com
administrações municipais que estão inadimplentes porque, nesta situação, dificilmente elas
conseguirão implementar qualquer ação relativa ao programa num curto espaço de tempo.
Além disso, deve-se exigir das administrações municipais a elaboração de um
cadastro específico dos agricultores beneficiados pela modalidade CDLAF. Esta sugestão
se justifica, em parte, pelo fato de que houve dificuldades em todos os municípios visitados
para saber quem eram efetivamente os agricultores beneficiados e o local de residência dos
mesmos.
Da mesma forma, estabelecer mecanismos mais consistentes de fiscalização e
controle desta modalidade para evitar que aquilo que é colocado como novidade (PAA) não
siga pelo caminho tradicional de servir apenas aos interesses de grupos políticos locais.

29
VI - BIBLIOGRAFIA

CASTRO, Josué. Geografia da fome: o dilema brasileiro, pão ou aço. São Paulo:
Braziliense, 10ª edição, 1985.

FUBRA/UNB. Notas técnicas sobre metodologia de pesquisa e definição do universo


amostra. Brasília, 2005, notas 1, 2 e 3.

FUBRA/UNB. Estudo de impactos do Programa de aquisição de Alimentos (PAA) –


Sul e Nordeste – Informes Metodológicos. Brasília, 2005, 52 pg.

FUBRA/UNB. Projeto de pesquisa sobre o Programa de Aquisição de Alimentos –


PAA – região Sul e Nordeste. Brasília, 2005, 29p.

FUBRA/UNB. Relatório consolidado sobre o Programa de aquisição de Alimentos


(PAA). Brasília, 2005, 236 pg.

GOULARTI FILHO, A. Formação econômica de Santa Catarina.Florianópolis (SC):


Cidade Futura, 2002.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa


Pecuária Municipal, vários anos.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa


Agrícola Municipal, vários anos.

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA (IPEA). Avaliação do


Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar – PAA. Brasília, IPEA,
2005 (texto para Discussão nº1145).

MATTEI, L. & LINS, H. (2003). A socioeconomia catarinense no limiar do século XXI.


Florianópolis (SC): UFSC (Texto para Discussão n.5).

MATTEI, LAURO. Estudos de impactos do PAA em municípios selecionados de Santa


Catarina. Relatório de pesquisa para convênio FAO-FUBRA/UNB. Florianópolis (SC),
abril de 2006, 87 p.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME.


Publicações temáticas: revista cisternas, 2004, 26 p.

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Brasil, um país de todos, ano 1, nº 2, dezembro de


2003.

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Brasil, um país de todos, ano 2, nº 4, dezembro de


2004.

30
PROGRAMA FOME ZERO: uma proposta política de combate à fome no Brasil. São
Paulo: Instituto Cidadania, 2001, 128p.

RELATÓRIO PROGRAMA FOME ZERO. Principais ações desenvolvidas em 2003.


Brasília (DF): PFZ, Janeiro de 2004, 6 p.

SEN, Amartya. Poverty and Famine. Oxford: Clarendon Press, 1981.

31

Você também pode gostar