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BOLETIM TÉCNICO-CIENTÍFICO DO CEPNOR

A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Márcia Cristina da Silva Tavares1


Ivan Furtado Júnior2
Raimundo Aderson Lobão de Souza3
Carla Suzy Freire de Brito4

RESUMO
A região do litoral norte do Brasil é caracterizada por apresentar uma linha de
costa bastante diversa onde se localizam inúmeros sistemas estuarinos. Possui
uma topografia baixa e aporte de grandes volumes de água doce, principalmente
do Rio Amazonas, produzindo processos oceanográficos interdependentes e
complexos, que exercem uma forte influência na distribuição dos recursos vivos
da região. Um estudo sobre a produção, o esforço de pesca e a captura por
unidade de esforço (CPUE) das principais espécies de peixes capturadas em
currais-de-pesca no litoral amazônico do estado do Pará, durante o período de
1995 a 2002, foi realizado visando a fornecer subsídios para o gerenciamento
adequado desta pescaria. Para tal foram analisados dados coletados pelo projeto
ESTATPESCA, e através de entrevistas realizadas com pescadores e pessoas
relacionadas com a atividade pesqueira em 15 municípios. A produção de pescado
nos currais-de-pesca seguiu a mesma tendência da produção total desembarcada,
com a captura máxima em 1998; a partir de 1999 apresentou uma tendência de
produção decrescente com pequena recuperação em 2002. As espécies com maior
participação relativa, em ordem decrescente, foram a pescada-gó (Macrodon
ancylodon) 38 %, o bagre (Arius herzbergii) 10 %, o bandeirado (Bagre bagre) 6
%, a corvina (Micropogonias furnieri) 4 % e o peixe-pedra (Genyatremus luteus) 2
%. Os municípios com maior produção desembarcada foram Quatipuru (19,07
%), Curuçá (17,11 %), Bragança (12,12 %) e Marapanim (8,14 %). O esforço de
pesca seguiu uma tendência de crescimento durante todo o período (1995 a 2002),
com uma pequena redução em 2001 logo compensada em 2002. A produção
anual e as CPUE’s do bagre, bandeirado, peixe-pedra e pescada-gó apresentaram
uma tendência de queda enquanto que a corvina manteve seus valores com
pequenas variações ao longo do período. Os resultados da análise de variância
da CPUE anual pelo teste H de Kruskal-Wallis para cada uma das cinco espécies
foram significantes nível de α = 0,05. Foram utilizados os modelos logísticos linear
de Schaefer e exponencial de Fox para se estimar os parâmetros da produção
das principais espécies. O esforço aplicado sobre o bandeirado atingiu 166,6 %
do ótimo estimado e a captura e a CPUE são, respectivamente, de apenas 58,6 %
e
1
Bióloga, M. Sc., Pesquisadora Cepnor/Ibama
2
Engenheiro de Pesca, M. Sc., Professor Ufra, Pesquisador Cepnor/Ibama
3
Biólogo, D. Sc., Professor Ufra
4
Engenheira de Pesca, Pesquisadora Cepnor/Ibama

Bol. Téc. Cient. Cepnor, Belém, v. 5, n. 1, p. 115-139, 2005


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35,2 % dos ótimos estimados. Para as demais espécies esses valores variaram
como a seguir: corvina = 143,3 %, 74,2 % e 51,9 %; peixe-pedra = 165,6 %, 72,8
% e 44,3 %; bagre = 172,0 %, 43,6 % e 25,3 %; pescada-gó = 173,1 %, 45,4 % e
26,2 %. A queda na produção das espécies capturadas pelos currais-de-pesca
mostra que níveis do esforço acima do valor ótimo podem levar a uma situação de
sobrepesca, resultando em drásticas conseqüências sobre a produtividade e
rendimento econômico dos currais-de-pesca.
Palavras–chave: curral-de-pesca, principais espécies, modelos de produção,
esforço de pesca, CPUE, Estado do Pará.

ABSTRACT
The fish-weir fishery in Pará State
The Northern region of Brazil presents a varied coastline where countless estuarine
systems are located. It displays low topography and high volumes of freshwater,
mainly from Amazonas River, producing complex oceanographic processes
depending on one another, which exercise a strong influence on the distribution of
its live resources. A study of the production, fishing effort and the capture for unit
of effort (CPUE) of the main species of fish captured by fish-weirs in the Amazonian
coast of Pará State during the period from 1995 to 2002, was carried out with the
aim at supplying subsidies for the adequate management of this kind of fishery.
For such a purpose the data on catch statistics collected by the ESTATPESCA
Project in 15 counties, and by means of interviews with fishers and middlemen
were analyzed. The fish production by fish-weirs followed the same decreasing
trend as that of total production in years 1995-2002, but with a slight recovery in
2002. The species that stood out as to fish production, in a decreasing order of
their take in the catch, were: king weakfish (Macrodon ancylodon), 38 %, thomas
sea catfish (Arius herzbergii), 10 %, coco sea catfish (Bagre bagre), 6 %,
whitemouth croaker (Micropogonias furnieri), 4 % and torroto grunt (Genyatremus
luteus), 2 %. The most productive counties were: Quatipuru (19.07 %), Curuçá
(17.11 %), Bragança (12.12 %) and Marapanim (8.14 %). The fishing effort followed
a growth tendency during the whole period (1995 to 2002), with a small reduction in
2001 and ready compensated in 2002. Annual yield and CPUE of thomas sea
catfish, coco sea catfish, torroto grunt and king weakfish showed a downward
trend while that of whitemouth croaker kept stable along the period. The results of
the variance analysis through Kruskal-Wallis’ H test and discrimination among mean
annual CPUEs for each of the main five species proved to be statistically significant.
Linear and exponential surplus production models were used to estimate optimum
values of sustainable yield, fishing effort and productivity. The annual applied effort
on coco sea catfish was 66.6 % above its optimum and hence their correspondent
figures for sustainable yield and catch per unit effort amounted only to 58.6 and
35.2 % of their optimum values. The other main species likewise figures were:
whitemouth croaker = 143.3 %, 74.2 % and 51.9 %; torroto grunt = 165.6 %, 72.8
% and 44.3 %; thomas sea catfish = 172.0 %, 43.6 % and 25.3 %; king weakfish =

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173.1 %, 45.4 % and 26.2 %. The decrease in fish production by fish-weirs implies
that fishing effort above acceptable levels may lead to an overfishing situation
whereby recovery is difficult and harmful effects are brought to bear upon
productivity and economic revenues from the fish-weir fisheries.
Key words: fish-weir, main species, production models, fishing effort, CPUE, Pará
State.

INTRODUÇÃO
A pesca artesanal na região Norte do Brasil é responsável por quase metade
da produção pesqueira, seja em águas costeiras, litorâneas ou interiores (Paiva,
1997). No Brasil, os pescadores artesanais são responsáveis por grande parcela
da captura do pescado, destinada tanto a exportação quanto ao consumo interno
(Diegues, 1995). No estado do Pará, no ano de 2002 a produção artesanal chegou
a 60,91 % do total desembarcado (IBAMA/CEPENE, 2004).
No contexto da atividade pesqueira artesanal do litoral amazônico do estado
do Pará, os currais-de-pesca assumem posição de destaque na produção de
pescado, principalmente nos municípios de Quatipuru (1.046,7 t), Curuçá (939,2
t), Bragança (665,1 t) e Marapanim (446,7 t), em frente aos quais a plataforma é
propícia à instalação desses aparelhos de pesca (Furtado-Júnior, 2003).
As armadilhas fixas para peixes podem ser feitas de cercas, redes, telas,
etc; e são usadas especialmente nas áreas de marés. As cercas podem ser
construídas como espirais (forma de caracol) em seu final, que não impedem
completamente o escape dos peixes, apenas dificultam sua saída. Arranjos de
cercas com passagens intricadas e sinuosas, considerados como labirintos, têm
sido usados em muitas pescarias em várias partes do mundo (von Brandt, 1984).
Considerando-se que os currais-de-pesca não oferecem nenhuma atração
artificial (iscas, por exemplo) e a captura depende do peixe movimentar-se
ativamente para seu interior, os principais fatores determinantes de sua eficiência
são: localização, e disposição de seus compartimentos e estruturas com relação
às correntes de maré. Durante as fases de lua cheia e com ventos brandos, a
pesca é mais proveitosa devido ao silêncio e à força da correnteza da maré
(Fonteles-Filho & Espínola, 2001).
Como o plano de evolução da Lua em torno da Terra não está no mesmo
plano de evolução da Terra em torno do Sol, existem efeitos diversos gerados pela
ação destas duas forças nos ciclos das marés, sobretudo no que se refere à sua
amplitude. Desta forma, pode-se encontrar ciclos de marés de diferentes
amplitudes em diferentes pontos geográficos, tendo como exemplo mais marcante
a região Norte do Brasil, onde se observa que as amplitudes máximas de marés
podem atingir aproximadamente 7 m (El-Robrini, 1992), característica que possibilita
a construção dos currais-de-pesca em áreas localizadas bem próximas da costa.
Dois tipos de correntes de maré, classificadas como periódicas, podem ser
identificadas: (1) as alternativas, que mantêm uma direção fixa durante a metade
de seu período, e uma direção oposta na outra metade; (2) as giratórias, como o

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A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

próprio nome leva a entender, são aquelas que giram em todas as direções
possíveis em torno de um ponto fixo. Na realidade, levando-se em conta a
localização geográfica e o período, ocorre quase sempre uma combinação dos
dois sistemas: Se for considerada a disposição da corrente para um ciclo completo
de maré, ela terá a forma de uma elipse, que será mais ou menos abaulada em
função das correntes existentes naquele período, diferenciando assim as correntes
alternativas das giratórias (Turekian, 1968).
Ao longo do litoral do Pará os tipos básicos dos currais-de-pesca atualmente
em uso são: (a) Curral de duas espias, que geralmente é cercado com panagem
de polietileno, com exceção das asas (laterais do primeiro compartimento), que
são feitas de varas colocadas juntas e amarradas entre si, com cipó. Alguns currais
podem ter também panagens colocadas nas asas; em geral, a malha do cercado
neste tipo de curral tem 90 mm (entre nós opostos), com exceção do chiqueiro
onde a malha usual é de 40 mm (entre nós opostos); (b) Curral de uma espia, que
é construído com os mesmos materiais que os de duas espias e, em alguns
locais mais expostos, usando-se cercas de arame feitas a mão. O comprimento
de um lado das malhas quadradas de arame é de 40-50 mm no chiqueiro e na
salinha.
A disposição da linha central longitudinal nos currais-de-pesca de uma espia
deve preferencialmente ficar numa posição oblíqua, enquanto nos currais de duas
espias devem ter essa linha paralela em relação às correntes de maré alternativas.
Na década de 80, os currais-de-pesca sofreram uma série de modificações
com relação aos materiais utilizados na sua construção, quando passaram a
incorporar pedaços de redes de pesca de material sintético e telas de arame e,
hoje, poucos dos currais feitos inteiramente de materiais naturais podem ser
encontrados (Furtado-Júnior, 2003).
A produtividade desta arte varia consideravelmente entre as diversas áreas
de pesca, épocas do ano, marés, fases da lua e principalmente do regime de
chuvas. Uma estimativa precisa dos rendimentos médios dos currais-de-pesca
só é possível mediante um rígido controle de captura, esforço correspondente e
regime de pesca durante uma série de anos e em diferentes áreas de pesca
(Dias-Neto et al., 1985).
O controle da captura e esforço de pesca gera séries históricas da pescaria
que podem ser testadas pelos modelos de produção proporcionando indicações
do nível de exploração dos recursos pesqueiros, tendo como pressuposto biológico
o equilíbrio entre a captura e o esforço de pesca (Sparre & Venema, 1997).
Em vista da importância dos currais-de-pesca na produção de pescado pelo
sistema de pesca artesanal bem como a falta de maiores informações sobre a
produção e produtividade desta arte de pesca na região Norte, espera-se que os
resultados decorrentes deste trabalho contribuam para uma avaliação preliminar
da atual situação desta modalidade de pesca que é imprescindível para seu
adequado gerenciamento.

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A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

O objetivo deste trabalho é estudar a produção, esforço de pesca e a captura


por unidade de esforço (CPUE) da espécie-alvo, pescada-gó, e da sua fauna
acompanhante capturadas em currais-de-pesca no litoral amazônico do estado
do Pará durante o período de 1995 a 2002.

MATERIAL E MÉTODOS
Os dados que fundamentaram esta pesquisa fazem parte do sistema de
controle estatístico do projeto Estatpesca realizado pelo Cepnor/Ibama, no período
de 1995 a 2002. Para este estudo foram controlados, o esforço de pesca e a
captura dos currais-de-pesca nos 12 municípios da região do salgado, além dos
municípios de Belém, Soure e Salvaterra, sendo estes divididos nas seguintes
áreas: Área I - Belém, Curuçá, Marapanim, Maracanã e Salinópolis; Área II -
Salvaterra, Soure, Vigia, Colares e São Caetano de Odivelas; Área III - Bragança,
São João de Pirabas, Quatipuru, Augusto Correia e Viseu.
O cálculo das estimativas da produção de pescado para o curral-de-pesca
foi gerado pelo programa ESTATPESCA através do relatório Produção por Município
por Arte de Pesca. Este relatório mostra a produção estimada total anual (todas
as espécies) capturada pelos currais para cada município controlado. A participação
de cada espécie no total capturado pelos currais-de-pesca foi obtida do relatório
Parâmetros das Pescarias, que mostra a participação relativa anual da produção
de cada espécie por frota ou arte de pesca para o Estado, conforme Tavares
(2005) adaptado de Aragão (1997).
Nas localidades onde se realizou a pesquisa os dados foram coletados por
pessoas contratadas e residentes nas próprias comunidades pesqueiras o que
facilitou o trabalho e conferiu fidelidade aos dados coletados. Após a contratação
dos coletores, foi feito um treinamento para este tipo de pesquisa que consistiu,
basicamente, no preenchimento dos formulários de cadastro de embarcações e
artes de pesca, controle de desembarque, controle mensal do esforço de pesca e
controle diário do esforço de pesca.
O esforço de pesca, f foi calculado como sendo o número de currais ativos
num determinado mês (operando com e sem auxílio de embarcações) multiplicado
pelos dias do respectivo mês (curral-dia). O índice de captura por unidade de
esforço – CPUE (Y f ) adotado foi calculado como a biomassa de peixes
capturados por cada curral ativo pelo período de um dia, representado por kg/
curral-dia.
As tendências de variação no esforço de pesca, para se avaliar o
comportamento da atividade pesqueira dos currais-de-pesca, foram analisadas
considerando-se uma periodicidade anual.
Foram selecionadas as cinco espécies com valores de produção mais
expressivos, capturadas pelos currais-de-pesca, para análise de seus respectivos
parâmetros na pescaria, com base em uma ou mais das seguintes premissas:
(a) estar entre as espécies mais importantes da pesca com curral; (b) fazer parte,

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ao mesmo tempo, da lista de espécies mais importantes da captura total e


da captura com curral-de-pesca; (c) estar entre as espécies de maior importância
comercial.
Os dados sobre a CPUE para as cinco principais espécies foram
comparados entre os oitos anos do período estimado, considerando-se seus
postos médios e respectivas variâncias. Foi testada a hipótese de nulidade (H0),
pela qual se considerou não existir diferença significativa entre os postos médios
das CPUE’s anuais para cada espécie, nos oito anos, procedendo-se a uma
análise de variância por postos através do teste H de Kruskal-Wallis (Zar, 1984),
 12 k
2
pela equação: H =  ∑ n j R j  − 3 ( N + 1) onde: k = número de amostras
 N ( N + 1 ) j =1 
ou grupos; N = número total de escores; n j = número de escores da amostra j ;

= somatório dos postos da amostra j .


Comprovando-se a existência da diferença, procedeu-se então ao teste do
comparador D de Dunn para determinar quais os postos médios das CPUE’s
significativamente diferentes nível de significância, α = 0,05, utilizando-se o
programa BioEstat 3.0 (Ayres et al., 2003).
Nas estimativas das tendências da captura para as cinco principais espécies
i(Rff=
Y
foram considerados apenas aspectos relativos 1f ,2=),3−à,....,
iMSY
jMSY 2nb
acapacidade de produção de
biomassa, definidas através dos modelos de produção. Os dados básicos para o
ajuste dos modelos consistiram da série histórica dos dados anuais de produção
e esforço de pesca no período de 1995 a 2002 obtidos através do projeto
Estatpesca. Esses dados foram utilizados no cálculo do nível ótimo de esforço
que leva à captura máxima sustentável (MSY ) pelos currais-de-pesca e à
CPUE máxima sustentável (Y f MSY ) , testando-se dois modelos:

(a) Modelo linear de Schaefer (1954), que pressupõe uma relação linear
entre a CPUE (Y f ) e o esforço de pesca ( f ), segundo a equação:
Yi f i = q × B = a + b × f i se f i ≤ − a b onde: B = biomassa, q = coeficiente de
capturabilidade (constante),= esforço no ano i , e = captura
em massa por unidade de esforço no ano i.
Calculou-se Y f a partir da captura, Yi , do ano i , para a pescaria como
um todo, e do correspondente esforço, , por Y f = Yi f i , i = 1,2,3,...., n . Pelo
que se estima:
; MSY = − a 2 4b e Y f MSY = a 2

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A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

(b) Modelo exponencial de Fox (1970), que pressupõe uma relação curvilínea entre
a CPUE (Y f ) e o esforço de pesca (f ), segundo a equação:
Yi f i = q × B = exp(c + d × f i ) ou ln (Yi f i ) = q × B = c + d × f i . Pelo que se estima:
f MSY = − 1 d , MSY = −(1 d ) × exp(c − 1) e Y f MSY = exp(c − 1)
As equações de Schaefer e Fox foram ajustadas por regressão e seus
coeficientes de determinação testados em nível de α = 0,05, para verificação de
sua significância estatística, sendo parâmetros da regressão a e b (no modelo
linear), e c e d (no modelo exponencial).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados das estimativas da produção total de pescado marinho e
estuarino do Pará para os anos de 1995 e 1996 são mostrados na Tabela 1. Estas
estimativas complementam a série histórica de dados que foi analisada, uma vez
que as estimativas anteriormente existentes foram feitas usando diferentes
metodologias.
No Estado do Pará, onde praticamente cada rancho na costa ou nas margens
dos rios e igarapés torna-se um ponto de desembarque do sistema de pesca
artesanal, é praticamente impossível obter-se a produção total pelo somatório dos
desembarques. O que se faz é estimar a captura por unidade de esforço e fazer o
controle do esforço de pesca para cada estrato da pescaria, ou seja, para cada
combinação de embarcação e arte de pesca, ou arte de pesca que opera
independentemente de embarcação. Para o sistema de pesca industrial, as
estimativas da produção coincidem com a totalização dos desembarques
controlados.
Paiva (1997) ao comentar as estatísticas de pesca do Brasil, destaca que já
se tornou corriqueira a menção à sua baixa qualidade, o que não impede que
sejam utilizadas, com as devidas precauções. Pondera, ainda, que a grande
dificuldade para se obter dados confiáveis se deve à coexistência de dois sistemas
de produção, o artesanal e o industrial, e ao fato de que o primeiro atua sobre um
elevado número de espécies, com pequenas quantidades capturadas de cada
uma, e ampla dispersão dos locais de desembarque.
A produção total de pescado desembarcada no Estado do Pará apresentou
tendência crescente no período de 1995 a 1998, com queda no ano de 1999, mas
recuperando-se nos anos seguintes, com máximo da produção total desembarcada
de 105.630,3 t, em 1998 (Tabela 1; Figura 1a). O bagre, a uritinga e a corvina
apresentaram tendência crescente de produção desembarca ao longo de todo
período analisado, mas as demais espécies tidas como mais importantes nos
desembarques (bandeirado, gurijuba, pescada-gó, serra e tubarão) apresentaram
a mesma tendência de redução na produção total anual, com variação no início da
tendência decrescente da série histórica (Tabela 1; Figura 1b).

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A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

A Tabela 2 mostra os nomes vulgares, científicos, autores e áreas de


ocorrência das principais espécies ou grupos de espécies controladas pelo projeto
ESTATPESCA no Estado do Pará.

Tabela 1 – Produção total (t) de pescado marítimo e estuarino estimada para o


Estado do Pará, por espécie, no período de 1995 a 2002.

Ano
Espécies Média
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Arraia 873,40 1087,58 1768,93 806,83 642,00 595,12 974,42 2335,00 1135,41
Atum 1,00 0,00 0,00 0,00 0,00 22,57 130,71 110,00 33,04
Bagre 1282,97 2768,91 3303,83 3698,06 2984,50 4585,22 5847,52 5731,00 3775,25
Bandeirado 2175,65 3301,50 4487,21 3055,72 3761,00 2687,85 5255,35 2945,50 3458,72
Bijupirá 302,41 472,60 751,70 2024,47 1542,00 1275,90 744,29 1054,50 1020,98
Bonito 357,46 493,07 875,63 2420,64 1398,50 1367,03 205,75 1010,50 1016,07
Camarão 8641,28 5426,19 4950,67 5333,38 4110,00 2335,81 3038,54 3897,50 4716,67
Cambéua 431,32 616,35 862,20 290,80 193,50 178,12 495,47 3318,50 798,28
Camurim 464,96 543,70 871,69 1441,65 1477,50 1825,24 1660,82 1392,00 1209,69
Cangatá 836,84 1137,95 1547,39 3618,95 522,00 234,73 809,56 786,50 1186,74
Canguira 161,27 156,32 186,46 933,85 731,00 561,25 319,19 528,50 447,23
Caranguejo 8152,00 4211,02 5909,35 4083,10 3563,42 3573,16 5213,62 5230,00 4991,96
Cavala 154,17 296,67 240,25 374,38 823,00 452,27 507,58 971,50 477,48
Cioba 144,30 237,88 277,76 257,43 439,00 373,78 1100,37 758,00 448,56
Corvina 1985,50 684,67 1021,43 1519,31 1845,50 3353,48 3962,79 4968,50 2417,65
Enchova 76,00 33,09 26,71 157,28 87,00 18,35 192,68 77,00 83,51
Espadarte 61,82 71,60 77,56 113,15 161,00 206,52 71,67 61,50 103,10
Garoupa 104,08 131,39 262,25 14,33 344,50 877,27 541,89 891,50 395,90
Guaiuba 71,59 106,79 141,09 195,97 279,00 187,83 255,11 203,50 180,11
Gurijuba 2342,00 6566,85 8941,11 9039,05 9939,00 12211,58 12274,24 7988,50 8662,79
Jurupiranga 27,26 41,00 33,29 217,07 84,00 20,27 91,29 82,00 74,52
Lagosta 2,00 2,00 70,68 726,01 247,00 289,05 1121,28 911,50 421,19
Meka 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 40,50 5,06
Mero 724,50 431,71 507,52 1791,81 622,00 1490,06 1175,00 1149,50 986,51
Mexilhão 485,20 0,04 0,08 0,00 0,00 0,00 0,88 57,00 67,90
Ostra 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 2,06 1,58 0,50 0,52
Pacamão 66,74 74,67 88,46 1307,45 86,00 5,09 37,90 104,50 221,35
Pargo 3535,15 4936,23 7125,84 5221,90 6430,50 4711,70 4925,74 5664,00 5318,88
Peixe-galo 12,26 55,00 6,55 3,12 21,00 9,55 42,59 16,00 20,76
Peixe-pedra 248,00 232,86 348,08 687,45 454,00 93,55 867,79 666,00 449,72
Pescada amarela 6140,26 7920,74 12227,49 16612,10 14254,00 22028,09 17180,75 21630,50 14749,24
Pescada cambuçu 505,00 216,52 108,10 104,46 439,00 292,84 134,17 382,50 272,82
Pescada gó 3694,54 4440,05 5300,69 5697,33 6731,50 3435,07 3451,57 3858,00 4576,10
Pirapema 508,33 645,62 1041,88 648,93 914,00 1607,39 947,77 823,00 892,12
Serra 2843,00 6634,99 9274,54 12254,99 10999,00 8393,98 6079,94 6857,50 7917,24
Siri 133,00 130,00 0,23 3,95 9,00 0,00 32,86 22,50 41,44
Tainha 1716,00 826,34 960,09 918,40 2933,00 652,90 1618,76 1130,00 1344,44
Timbira 422,81 555,84 855,15 1101,35 1010,00 1009,35 355,30 1095,50 800,66
Tubarão 2264,50 4398,92 6754,47 7372,93 6719,50 7570,38 5611,08 5284,50 5747,03
Uricica 67,33 69,80 66,66 550,86 75,00 218,40 242,35 312,50 200,36
Uritinga 1045,07 1900,41 2509,79 3319,32 3228,00 4095,42 4174,55 3690,00 2995,32
Xaréu 919,44 1140,76 1555,88 1116,15 786,00 1250,29 706,82 603,00 1009,79
Outros 2949,96 2391,57 5240,86 9596,33 4991,00 7420,19 6151,71 6065,00 5600,83
Total 56930,37 65389,19 90579,55 108630,26 95876,92 101518,72 98553,23 104705,50 90272,97

122
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 1 - Produção de pescado: (a) total desembarcado e (b) das espécies com
maior volume desembarcado. Valores estimados para o Estado do Pará, no período
de 1995 a 2002.

Tabela 2 – Espécies capturadas, com dados sobre a família, nomes vulgar e


científico, e distribuição geográfica.

123
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Os maiores valores médios da produção desembarcada dos currais no


período de 1995 a 2002 aconteceram nos municípios de Quatipuru (1.046,69 t),
Curuçá (939,19 t), Bragança (665,13 t), Marapanim (446,74 t). Nos municípios de
Maracanã, S.C. Odivelas, S.J. Pirabas, Salinópolis e Viseu, as capturas variaram
de 373,03 t a 305,17 t e, nos demais, a produção desembarcada esteve abaixo de
300,00 t (Tabela 3; Figura 2).

Tabela 3 – Produção de pescado (t), marítimo e estuarino capturado por curral-de-


pesca no Estado do Pará, por município no período de 1995 a 2002.
Ano
Localidade Média
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
A. Corrêa 300,30 324,85 600,54 223,43 168,57 130,26 132,41 110,05 248,80
Bragança 414,88 807,44 695,82 1300,51 1261,55 320,16 202,82 317,82 665,13
Curuçá 857,08 813,62 1159,24 1377,45 790,12 961,99 440,56 1113,49 939,19
Maracanã 187,43 267,48 193,09 397,58 458,94 274,68 342,98 358,59 310,10
Marapanim 381,80 396,23 551,34 757,80 399,98 392,82 257,73 436,20 446,74
Quatipuru 1057,51 989,69 1374,90 1313,21 992,13 1239,38 859,15 547,53 1046,69
S. C. Odivelas 243,52 120,49 167,96 532,11 120,00 443,02 413,20 401,04 305,17
S. J Pirabas 363,72 475,61 582,64 250,16 561,00 311,07 200,40 239,64 373,03
Salinópolis 300,01 344,62 429,07 739,98 400,63 312,58 119,84 66,63 339,17
Salvaterra 118,25 102,35 166,44 380,17 77,97 126,23 150,00 58,00 147,43
Soure 25,90 24,55 39,90 37,45 18,46 23,76 26,58 15,60 26,53
Vigia 263,06 244,10 225,74 369,32 364,79 431,49 247,14 179,64 290,66
Viseu 235,56 348,56 425,73 721,31 412,48 150,24 237,65 269,67 350,15
Total 4749,02 5259,59 6612,41 8400,48 6026,62 5117,68 3630,46 4113,90 5488,77

Figura 2 - Produção média de pescado marítimo e estuarino capturado por curral-


de-pesca no Estado do Pará, por município, no período de 1995 a 2002.

124
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

A partir de 1999, diferentemente do que ocorreu com a produção total, a


produção obtida dos currais-de-pesca apresentou tendência decrescente (Tabela
4; Figura 3a). No que concerne às espécies com maior produção desembarcada
dos currais-de-pesca, todas apresentaram tendência decrescente de produção
ao longo do período 1995 a 2002 (Tabela 4; Figura 3b).

Tabela 4 – Produção estimada (t) de pescado marítimo e estuarino capturada por


curral-de-pesca no Estado do Pará, por espécie, no período de 1995 a 2002.
Ano
Espécies Total Média
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Arraia 93,98 87,55 333,27 235,48 35,62 271,06 206,00 506,15 1769,11 221,14
Atum 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Bagre 697,74 807,15 737,93 628,26 592,30 248,71 470,80 403,44 4586,33 573,29
Bandeirado 444,08 403,70 517,97 410,73 259,46 219,79 281,19 307,66 2844,58 355,57
Bijupira 5,09 2,82 0,00 0,00 0,00 0,00 1,66 0,00 9,57 1,20
Bonito 6,65 24,02 0,00 0,00 0,00 5,41 10,17 6,72 52,97 6,62
Camarão 0,00 0,00 6,42 0,00 0,00 3,91 1,66 1,57 13,56 1,69
Cambéua 18,80 55,17 31,90 13,81 6,66 36,22 81,91 46,95 291,42 36,43
Camurim 12,25 70,04 15,63 0,00 13,55 20,68 47,47 12,40 192,02 24,00
Cangatá 12,53 56,32 71,60 61,72 265,63 66,31 48,58 104,22 686,91 85,86
Canguira 7,84 50,65 4,81 0,00 0,00 105,34 10,69 3,55 182,88 22,86
Caranguejo 0,00 0,00 6,02 10,04 0,00 0,00 4,99 0,00 21,05 2,63
Cavala 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 1,25 2,58 0,40 4,23 0,53
Cioba 0,99 8,46 0,00 0,00 0,00 0,00 3,27 0,00 12,72 1,59
Corvina 202,95 229,36 224,14 212,50 192,09 172,92 169,37 166,77 1570,10 196,26
Enchova 3,26 1,81 0,00 0,00 0,00 5,49 20,08 10,19 40,83 5,10
Espadarte 1,05 4,42 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 5,47 0,68
Garoupa 0,00 0,00 4,01 5,41 0,00 0,00 0,00 1,58 11,00 1,38
Guaiuba 0,00 2,26 7,03 0,00 0,00 0,00 2,08 0,00 11,37 1,42
Gurijuba 11,05 6,12 33,97 35,98 2,13 20,70 27,93 56,83 194,71 24,34
Jurupiranga 15,81 8,75 10,90 5,41 11,85 6,30 6,54 6,61 72,17 9,02
Lagosta 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Meka 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Mero 28,55 15,81 6,42 0,00 0,00 17,33 17,62 10,62 96,35 12,04
Mexilhão 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Ostra 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Pacamão 4,67 4,84 9,83 0,00 0,00 3,75 5,05 88,32 116,46 14,56
Pargo 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,47 1,11 0,00 1,58 0,20
Peixe galo 1,57 1,75 0,00 0,00 0,00 2,09 28,49 2,41 36,31 4,54
Peixe pedra 177,93 149,85 168,94 136,81 122,70 63,80 123,31 143,86 1087,20 135,90
Pescada amarela 36,06 19,97 136,57 25,73 30,23 11,38 26,65 27,64 314,23 39,28
Pescada cambuçu 1,05 0,58 2,01 30,65 2,13 146,05 55,35 46,62 284,44 35,56
Pescada gó 2688,74 2835,62 2722,21 2054,24 1959,88 1103,58 1594,61 1542,31 16501,19 2062,65
Pirapema 0,00 40,66 10,00 0,00 7,93 9,30 1,11 0,00 69,00 8,63
Serra 2,05 1,13 14,14 7,72 1,93 20,49 0,00 0,00 47,46 5,93
Siri 0,00 0,00 0,00 0,00 0,25 0,00 3,05 3,30 6,60 0,83
Tainha 33,51 67,87 28,05 47,81 146,64 28,19 51,47 15,85 419,39 52,42
Timbira 12,65 77,46 14,44 5,41 2,13 0,51 9,47 1,19 123,26 15,41
Tubarão 3,10 1,72 9,41 50,40 0,00 54,08 4,13 5,87 128,71 16,09
Uricica 13,83 31,27 24,41 324,26 40,51 51,09 48,30 64,49 598,16 74,77
Uritinga 58,98 66,23 157,13 467,94 85,69 370,75 82,26 154,36 1443,34 180,42
Xaréu 26,56 32,78 66,11 0,00 8,12 49,16 68,34 87,27 338,34 42,29
Outros 125,68 93,49 1237,13 3630,16 2239,18 2001,60 113,17 284,77 9725,18 1215,65
Total 4749,03 5259,59 6612,41 8400,47 6026,62 5117,68 3630,46 4113,90 43910,20 5488,77

125
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 3 - Produção de currais-de-pesca: (a) total desembarcado e (b) das espécies


com maior volume desembarcado. Valores estimados para o Estado do Pará no
período de 1995 a 2002.

A se considerar apenas as espécies com maiores produções, têm-se que:


(a) a pescada-gó apresentou uma tendência de queda bastante acentuada,
passando de 2.688,74 t em 1995 para 1.542.31 t em 2002; (b) o bagre também
apresentou forte tendência de queda, passando de 697,74 t em 1995 para 403,44
toneladas em 2002; (c) o bandeirado apresentou pequena tendência de queda na
produção, passando de 444,05 t em 1995 para 307,66 t em 2002; (d) corvina e
peixe-pedra mostraram ligeiras reduções nas suas capturas pelos currais-de-
pesca, sendo que a produção total da corvina apresentou-se crescente enquanto
a do peixe-pedra mostrou-se irregular (Tabela 4).
A redução na produção de pescado obtida dos currais-de-pesca é
preocupante e depende de um ou mais dos seguintes fatores inerentes a arte de
pesca e que interferem diretamente na relação estoque reprodutor/recrutamento:
(a) elevado número dessas armadilhas ao longo da costa, (b) alto poder de pesca
e (c) ausência de seletividade.
Tendo em vista oferecer alternativas ao controle da pesca em curral na região
do salgado do Estado do Pará selecionamos as cinco espécies mais importantes
para estudo, cuja produção apresentou as seguintes participações relativas:
pescada-gó = 38 %; bagre = 10 %; bandeirado = 6 %; corvina = 4 %; peixe-pedra
= 3 %. O uritinga não foi selecionado por ser de baixo valor comercial, e as arraias,
por representarem um grupo de indivíduos não identificados em nível de espécie
nas amostragens.

126
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 4 - Participação relativa das cinco espécies selecionadas para estudo em


relação à produção total estimada dos currais-de-pesca, no período de 1995 a
2002.

A quantidade de esforço de pesca, na unidade curral-dia, varia


consideravelmente: valores mínimos e máximos são observados, respectivamente
nos meses de fevereiro e julho, com médias de 26.826 currais-dia e 36.345 currais-
dia. O máximo de esforço de pesca aplicado no mês de julho está relacionado,
provavelmente, com o fim da estação chuvosa e início do chamado verão
amazônico, ocasião em que as águas salobras ensejam a aproximação das
espécies marinhas da região e sua captura pelos currais-de-pesca. Os currais
“de fora”, construídos nos bancos de areia ou de pedra mais afastados da costa
e, conseqüentemente menos afetados pelas variações de salinidade, podem atuar
durante todo o ano (com manutenções periódicas) capturando espécies marinhas
A partir de outubro, com a redução das capturas, os currais-de-pesca vão sendo
paulatinamente desativados ou abandonados, até que, em fevereiro do ano seguinte
recomece um novo ciclo desta atividade pesqueira (Tabela 5; Figura 5a). O esforço
de pesca mostrou-se crescente no período de 1995 a 2000, com leve redução em
2001, retomando a tendência de crescimento em 2002 (Tabela 5; Figura 5b).

Tabela 5 – Distribuição mensal do esforço de pesca, em curral-dia, no Estado do


Pará durante o período de 1995 a 2002.
Meses
Ano Total
jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
1995 24417 25204 29249 28471 29735 29108 31107 28848 28499 22930 23934 23273 324774
1996 26825 26701 33724 32720 35786 34077 30260 29974 30143 25909 23549 23733 353401
1997 26888 25060 30730 30253 34275 34742 35369 33241 31311 31764 29710 28188 371531
1998 27231 24355 30698 32948 36268 35328 37453 38046 36618 36772 32202 27438 395356
1999 30812 28110 33325 33116 34667 37447 38971 38041 32849 32980 30684 28918 399920
2000 29963 27937 33189 35337 37180 40068 41104 42201 40389 38510 36077 29830 431785
2001 31435 29046 33879 32587 35670 36352 37873 38562 34453 32123 30754 30402 403135
2002 30609 28174 34176 35081 36867 37341 38650 39007 36839 35635 33387 29766 415531
Média 28522 26823 32371 32564 35056 35558 36348 35990 33888 32078 30037 27694 386929

127
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 5 - Distribuição do esforço de pesca, em curral-dia, para o Estado do Pará:


(a) média mensal e (b) anual para o período de 1995 a 2002.

No Estado do Maranhão há uma sazonalidade na produção da pesca


artesanal que está associada a mudanças de salinidade nas águas costeiras; as
capturas da pescada amarela e pescada-gó caem conforme as chuvas fortes vão
reduzindo a salinidade nas reentrâncias e águas costeiras, quando o peixe se
afasta da costa (Stride, 1992). Com a diminuição da pluviosidade no final de maio
ou em junho, o aumento da salinidade é acompanhado da imigração dessas
espécies até as reentrâncias maranhenses, determinando o aumento da produção,
mas esta decresce a partir de agosto e mantém-se baixa para todas as espécies
em outubro.
No litoral paraense importante redução da salinidade das águas costeiras
ocorre entre o inverno e o verão amazônico, quando o Rio Amazonas despeja no
oceano o maior volume d’água e a força da correnteza leva a massa d’água fluvial
a se misturar com as águas marinhas. Essa época corresponde ao tempo da
água doce, começando, então, na zona costeira a freqüência de espécies habituais
desse ambiente natural. Quando a vazão diminui, também diminui a correnteza e
em conseqüência, a salinidade tende a aumentar, o que naquela região ocorre
entre os meses de maio a agosto, ensejando a invasão do estuário amazônico
por espécies de água salgada. Esse período é regionalmente conhecido como o
tempo da água salgada na região nordeste do Pará (Furtado, 1987).
Para que o esforço de pesca seja um índice de mortalidade por pesca e a
captura por unidade de esforço (CPUE) seja um índice de abundância do estoque,
é preciso que todas as operações de pesca sejam expressas em unidade padrão,
isto é, que o coeficiente de capturabilidade (q ) seja o mesmo para todas as
operações. Esse coeficiente representa a probabilidade de um indivíduo ser
capturado por uma unidade de esforço de pesca, e o seu cálculo pode apresentar
distorções causadas por quatro fatores: vulnerabilidade, tempo efetivo de pesca,
poder de pesca e distribuição espacial do esforço (Fonteles-Filho, 1989). Tendo

128
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

em vista as dificuldades para sua estimação, mesmo para grandes intervalos de


tempo, deve-se procurar eliminar as distorções na computação da captura (Y ) e
do esforço de pesca ( f ) , para que as CPUE’s calculadas para diferentes períodos
sejam comparáveis e reflitam realmente a abundância do estoque (Gulland, 1971).
Segundo Furtado-Júnior (2003), os dois tipos de currais-de-pesca, no estado
do Pará, são construídos paralelamente nas mesmas áreas, atuam da mesma
maneira e apresentam o mesmo poder de pesca. Portanto, como as espécies
disponíveis na área estão igualmente vulneráveis aos dois tipos de curral e por
terem o mesmo tempo efetivo de pesca, ou seja, o tempo de duração das marés,
os respectivos coeficientes de capturabilidade podem ser considerados iguais.
A CPUE estimada para o conjunto das espécies selecionadas para estudo
apresentou tendência de crescimento entre os anos de 1995 e 1998, após o que
se segue um período de decréscimo até o ano de 2000, com um período
subseqüente de leve crescimento. No geral, tem-se que a CPUE apresenta
tendência decrescente (Tabela 6; Figura 6a). Ao se observar a CPUE para cada
uma das espécies em separado, têm-se que bagre, bandeirado, peixe-pedra e
pescada-gó apresentaram a mesma tendência de decréscimo que o conjunto
das espécies, enquanto que a corvina manteve seus valores com pequenas
variações ao longo do período (Tabela 6; Figura 6a).

Tabela 6 – CPUE (kg/curral-dia) das principais espécies e para o total das espécies
de pescado marítimo e estuarino capturadas por currais-de-pesca no Estado do
Pará, no período de 1995 a 2002
Ano
Espécies
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Bagre 2,15 2,28 1,99 1,59 1,48 0,58 1,17 0,97
Bandeirado 1,37 1,14 1,39 1,04 0,65 0,51 0,7 0,74
Corvina 0,62 0,65 0,6 0,54 0,48 0,4 0,42 0,4
Peixe-pedra 0,55 0,42 0,45 0,35 0,31 0,15 0,31 0,35
Pescada gó 8,28 8,02 7,33 5,2 4,9 2,56 3,96 3,71
Total das espécies 14,62 14,88 17,8 21,25 15,07 11,85 9,01 9,9

Os currais-de-pesca chegaram a produzir, por ocasião da safra, até três


toneladas de peixes por maré (Dias-Neto et al., 1985), o que dificilmente é
conseguido na atualidade. Passada a safra, seu rendimento diminui
consideravelmente, e durante as chamadas “marés-mortas” (de baixa amplitude)
as capturas, em algumas localidades, mal chegam para o sustento do proprietário
e sua família.

129
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 6 - Evolução da CPUE, em kg/curral-dia, para o período 1995 a 2002: (a)


para o conjunto das espécies selecionadas para estudo; (b) para cada uma das
espécies selecionadas para estudo.

Os resultados da análise pelo teste H de Kruskal-Wallis encontram-se


sumariados na Tabela 7. Como demonstrado, obtiveram-se valores de H
significativos em nível de α = 0,05, para pescada-gó, corvina, peixe-pedra,
bandeirado e bagre. Com base nesse resultado, rejeitou-se a hipótese de nulidade
e, com base nos postos médios das CPUE’s, pode-se considerar que existe uma
real diferença na produção dessas espécies entre os anos do período estudado.

Tabela 7 – Análise de variância pelo teste H de Kruskal-Wallis dos postos médios


das CPUEs anuais para a pescada-gó, corvina, peixe-pedra, bandeirado e bagre,
no período de 1995 a 2002.
Estimativas Pescada gó Corvina Peixe pedra Bandeirado Bagre
H calculado 254,754* 159,491* 113,516* 149,833* 52,961*
Graus de liberdade 7
H crítico 14,067
Ano Posto médio da CPUE
1995 761,800 533,855 533,373 593,164 448,918
1996 749,997 484,380 646,136 648,435 522,198
1997 786,228 485,685 642,714 767,452 654,139
1998 629,873 522,354 352,842 470,076 719,886
1999 389,564 555,022 454,099 390,859 577,151
2000 407,449 701,872 553,696 532,916 524,831
2001 562,659 842,183 749,610 647,244 699,764
2002 477,325 735,669 684,172 556,140 595,987
* - significativo em nível de erro de 0,05

Os resultados obtidos do teste do comparador D de Dunn possibilitaram a


identificação das diferenças significativas entre os postos médios das CPUE’s,
em nível de α = 0,05. Estes resultados comprovam que houve uma variação
estatisticamente significante entre as CPUE’s anuais, para cada uma das cinco

130
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

espécies estudadas, sendo que os anos com as maiores diferenças foram: para
a pescada-gó (1997 e 1999, 1997 e 2000, 1997 e 2002), corvina (1997 e 2001,
1996 e 2001, 1997 e 2002), peixe-pedra (1998 e 2001, 1998 e 2002, 1999 e 2001),
bandeirado (1997 e 1999, 1997 e 2000, 1997 e 2002) e bagre (1995 e 2001, 1995
e 1998, 1996 e 2001).

Tabela 8 – Teste do comparador de Dunn (D) das diferenças (∆) dos postos médios
de CPUE anuais para pescada-gó, corvina, peixe-pedra, bandeirado e bagre, no
período de 1995 a 2002.
Pontos Pescada gó Corvina Peixe-pedra Bandeirado Bagre
médios de ∆ D (p) ∆ D (p) ∆ D (p) ∆ D (p) ∆ D (p)
1995 e 1996 11,8 0,218 ns 49,47 0,914 ns 112,76 2,083 ns 55,27 1,021 ns 73,28 1,354 ns
1995 e 1997 24,43 0,479 ns 48,17 0,945 ns 109,34 2,145 ns 174,29 3,419 * 205,22 4,025 *
1995 e 1998 131,93 2,166 ns 11,5 0,189 ns 180,53 2,964 ns 123,09 2,021 ns 270,97 4,449 *
1995 e 1999 372,24 6,844 * 21,17 0,389 ns 79,27 1,458 ns 202,3 3,719 * 128,23 2,358 ns
1995 e 2000 354,35 6,469 * 168,02 3,068 ns 20,32 0,371 ns 60,25 1,1 ns 75,91 1,386 ns
1995 e 2001 199,14 3,54 * 308,33 5,48 * 216,24 3,843 * 54,08 0,961 ns 250,85 4,459 *
1995 e 2002 284,47 5,344 * 201,81 3,791 * 150,8 2,833 ns 37,02 0,696 ns 147,07 2,763 ns
1996 e 1997 36,23 1,066 ns 1,31 0,038 ns 3,42 0,101 ns 119,02 3,503 * 131,94 3,883 *
1996 e 1998 120,12 2,524 ns 37,97 0,798 ns 293,29 6,162 * 178,36 3,747 * 197,69 4,154 *
1996 e 1999 360,43 9,264 * 70,64 1,816 ns 192,04 4,936 * 257,58 6,62 * 54,95 1,412 ns
1996 e 2000 342,55 8,686 * 217,49 5,515 * 92,44 2,344 ns 115,52 2,929 ns 2,63 0,067 ns
1996 e 2001 187,34 4,516 * 357,8 8,626 * 103,47 2,495 ns 1,19 0,029 ns 177,57 4,281 *
1996 e 2002 272,67 7,315 * 251,29 6,742 * 38,04 1,02 ns 92,3 2,476 ns 73,79 1,98 ns
1997 e 1998 156,35 3,555 * 36,67 0,834 ns 289,87 6,59 * 297,38 6,761 * 65,75 1,495 ns
1997 e 1999 396,66 11,532 * 69,34 2,016 ns 188,61 5,484 * 376,59 10,949 * 76,99 2,238 ns
1997 e 2000 378,78 10,823 * 216,19 6,177 * 89,02 2,544 ns 234,54 6,702 * 129,31 3,695 *
1997 e 2001 223,57 5,997 * 356,5 9,562 * 106,9 2,867 ns 120,21 3,224 * 45,63 1,224 ns
1997 e 2002 308,9 9,493 * 249,98 7,683 * 41,46 1,274 ns 211,31 6,494 * 58,15 1,787 ns
1998 e 1999 240,31 5,017 * 32,67 0,682 ns 101,26 2,114 ns 79,22 1,654 ns 142,74 2,98 ns
1998 e 2000 222,42 4,602 * 179,52 3,715 * 200,85 4,156 * 62,84 1,3 ns 195,06 4,036 *
1998 e 2001 67,21 1,344 ns 319,83 6,396 * 396,77 7,934 * 177,17 3,543 * 20,12 0,402 ns
1998 e 2002 152,55 3,275 * 213,31 4,58 * 331,33 7,113 * 86,06 1,848 ns 123,9 2,66 ns
1999 e 2000 17,89 0,449 ns 146,85 3,69 * 99,6 2,503 ns 142,06 3,569 * 52,32 1,315 ns
1999 e 2001 173,09 4,139 * 287,16 6,866 * 295,51 7,066 * 256,38 6,13 * 122,61 2,932 ns
1999 e 2002 87,76 2,331 ns 180,65 4,797 * 230,07 6,11 * 165,28 4,389 * 18,84 0,5 ns
2000 e 2001 155,21 3,668 * 140,31 3,316 * 195,91 4,63 * 114,33 2,702 ns 174,93 4,134 *
2000 e 2002 69,88 1,829 ns 33,8 0,885 ns 130,48 3,415 * 23,22 0,608 ns 71,16 1,863 ns
2001 e 2002 85,33 2,117 ns 106,51 2,642 ns 65,44 1,623 ns 91,1 2,26 ns 103,78 2,575 ns
D crítico = 3,125
* = diferenças estatisticamente significativas em nível de erro de 0,05
ns = diferenças estatisticamente não significativas em nível de erro de 0,05

As espécies marinhas e estuarinas desembarcadas no Estado do Pará são


exploradas pelos sistemas de pesca artesanal e industrial, utilizando vários tipos
de barcos e artes de pesca. Cada uma destas pescarias é diferente tanto do
ponto de vista tecnológico como sócio-econômico, de modo que é possível haver
uma interferência mútua nas respectivas produções de pescado. Em face do
exposto, a meta de avaliação dos estoques deveria ter como objetivo a definição
de um nível de exploração ótimo para cada tipo de pescaria. Neste sentido, todas
as análises realizadas para as tendências da pescaria no presente trabalho foram

131
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

feitas somente para os currais-de-pesca, podendo os resultados ser melhorados


e complementados com a análise dos outros tipos de pescaria.
As CPUE’s anuais para o conjunto das espécies capturadas não mostraram
correlações significativas com os respectivos esforços de pesca para o período
estudado (α = 0,05). Os coeficientes de determinação, R² dos ajustes das
regressões para os modelos de Schaefer e Fox não foram estatisticamente
significativos; apenas 0,122 % e 0,163 % das CPUE’s dependem dos esforços de
pesca, respectivamente, tendo a CPUE total anual apresentado um valor mínimo
em 2001 (Tabela 6; Figura 6a) enquanto o esforço de pesca apresentou seu valor
máximo em 2000 (Tabela 5; Figura 5b).
Os resultados obtidos após a aplicação dos modelos de produção aos dados
para as cinco principais espécies capturadas pelos currais-de-pesca, assim como
os parâmetros das regressões e limites de confiança dos declives e interseções,
estão apresentados na Tabela 9. No ajuste das retas de regressão entre CPUE e
esforço de pesca para cada uma das cinco principais espécies capturadas pelos
currais-de-pesca se constatou a existência de correlação estatisticamente
significativa indicando que os modelos logísticos podem ser usados para descrever
situações biológicas em que a produtividade diminui em decorrência de sua
capacidade limitada de produção.
O conceito de equilíbrio, que fundamenta a maioria dos modelos de produção,
sugere que o esforço deve-se manter relativamente constante, com o rendimento
tendendo a se estabilizar em torno do nível sustentável, tendo como premissa
uma correlação significativa entre as variáveis CPUE e esforço de pesca. Isto se
observou principalmente para o modelo linear para as cinco espécies, cujos
coeficientes de determinação nos anos de 1995 a 2002 foram superiores aos
determinados pelo modelo exponencial para o mesmo período. Desta forma, as
estimativas da produção máxima sustentável (MSY ) , esforço de pesca ótimo
( f MSY ) e CPUE ótima (Y f MSY ) para as cinco espécies foram consideradas mais
próximas da realidade quando obtidas através do modelo linear de Schaefer (Tabela 9).
Os modelos de produção constituem uma simplificação dos modelos de
predador-presa, em que as artes de pesca são consideradas como um elemento
predador e estudam os efeitos da variação no esforço de pesca sobre a produção.
Estes modelos não fazem distinção quanto a influencia do recrutamento,
crescimento e mortalidade na produção resultante da atividade pesqueira, de modo
que esses fatores são expressos em conjunto como uma função simples da
biomassa e podem ser aplicados quando se dispõe de estimativas razoáveis da
captura total (por espécie) e/ou da captura por unidade de esforço (CPUE) por
espécie e/ou a CPUE por espécie e o esforço correspondente para um certo número
de anos. O esforço deve ter sofrido substanciais alterações ao longo do período
estudado.

132
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Tabela 9 – Dados de produção (Y ) em toneladas, esforço de pesca ( f ) em curral-


dia e CPUE (Y f ) em kg/curral-dia e cálculos para estimar a captura máxima
sustentável (MSY ) , esforço ótimo ( f MSY ) e CPUE ótima (Y f MSY ) , através dos
modelos de Schaefer e de Fox, para as cinco principais espécies capturadas
pelos currais-de-pesca no período de 1995 a 2002. Sc = Y f Schaefer;
Fo = Ln(Y f ) Fox.

A simplicidade dos modelos de produção e a facilidade de obtenção dos


dados necessários para sua aplicação têm feito deles instrumentos muito usados
na biologia pesqueira. Porém, o uso de suas formulações implica em alguns
problemas conceituais e na adoção de hipóteses de difícil aceitação.
Os modelos são do tipo determinístico, ou seja, todas as variações anuais
da captura são atribuídas exclusivamente a variações no esforço de pesca. Sabe-
se, porém, que entre outros, os fatores ambientais, como, por exemplo, as variações
da salinidade provocadas pela pluviosidade e descarga dos rios, também afetam
a abundância dos recursos. Estas considerações fazem com que os resultados
da aplicação dos modelos não possam ser usados para prever com confiabilidade
as capturas dos próximos anos, e muito menos, para fixar cotas de captura.
O esforço de pesca variável não é na prática totalmente independente, pois
sabe-se que a pesca de curral é direcionada para a pescada-gó, de maneira tal
que as unidades são construídas ou reconstruídas nas épocas e áreas de sua
maior abundância, assim como existe uma concentração sazonal do esforço no
meio do ano. Desta forma percebe-se que em alguns casos não é o esforço que
controla a abundância e sim esta última que determina a intensidade do esforço,
confrontando uma auto-correlação entre as variáveis.

133
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Apesar da argumentação referida, deve-se reafirmar que os modelos de


produção têm sido utilizados com boa aceitação em todo o mundo, e os resultados
com eles obtidos, especialmente quando comparados com aqueles gerados com
base na biologia das espécies, vêm representando subsídios fundamentais para
administração das principais pescarias. Por esse motivo, considera-se que suas
aplicações são válidas se os resultados puderem ser avaliados dentro de um
contexto holístico dos conhecimentos sobre os estoques em questão e,
fundamentalmente, se estes forem validados com subsídios obtidos por outras
metodologias alternativas (Isaac et al., 1992).
Por espécie considerada, têm-se os seguintes valores sustentáveis de
produção, esforço de pesca e CPUE, conforme estimado pelo modela de Schaefer
(Tabela 9; Figuras 7-11): bandeirado – captura máxima sustentável de 524,93 t a
ser obtida com um esforço ótimo de 249.390 currais-dia para uma CPUE ótima de
2,10 kg/curral-dia; corvina – captura máxima sustentável de 224,61 t a ser obtida
com um esforço ótimo de 290.037 currais-dia para uma CPUE ótima de 0,77 kg/
curral-dia; peixe-pedra – captura máxima sustentável de 197,60 t a ser obtida com
um esforço ótimo de 250.860 currais-dia para uma CPUE ótima de 0,79 kg/curral-
dia; bagre – captura máxima sustentável de 924,57 t a ser obtida com um esforço
ótimo de 241.597 currais-dia para uma CPUE ótima de 3,83 kg/curral-dia; pescada-
gó – captura máxima sustentável de 3.395,42 t a ser obtida com um esforço ótimo
de 240.078 currais-dia para uma CPUE ótima de 14,14 kg/curral-dia.
O esforço de pesca conforme aplicado no ano de 2002 (415.531 currais-
dia) supera o esforço ótimo estimado para cada uma das espécies em separado.
Inversamente, as produções e as CPUEs, estão abaixo dos valores ótimos
estimados para cada espécie. O esforço aplicado sobre o bandeirado atingiu 166,6
% do ótimo estimado e a captura e a CPUE são, respectivamente, de apenas 58,6
% e 35,2 % dos ótimos estimados. Para as demais espécies esses valores
variaram como a seguir: corvina = 143,3 %, 74,2 % e 51,9 %; peixe-pedra = 165,6
%, 72,8 % e 44,3 %; bagre = 172,0 %, 43,6 % e 25,3 %; pescada-gó = 173,1 %,
45,4 % e 26,2 %.
Estas quedas na produção e CPUE servem de alerta, no sentido de que
qualquer pescaria que se encontre em níveis acima do esforço máximo, fica numa
situação muito sensível e qualquer alteração ambiental ou biológica provocará,
mesmo que temporariamente, uma situação de sobre-capacidade, que pode
redundar em drásticas conseqüências sobre a produtividade e, portanto, no
rendimento econômico dos currais-de-pesca. Portanto é necessário que o esforço
de pesca seja reduzido e mantido em níveis iguais ou menores que aqueles
estimados pelo modelo linear de produção de Schaefer.

134
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 7 - Ajuste das equações de regressão para o bandeirado: (a) reta de


regressão entre a CPUE – Y/f e esforço de pesca – f e (b) ajuste do modelo de
produção de Schaefer.

Figura 8 - Ajuste das retas de regressão para a corvina: (a) reta de regressão
entre a CPUE – Y/f e esforço de pesca – f e (b) ajuste do modelo de produção de
Schaefer.

Figura 9 - Ajuste das retas de regressão para o peixe-pedra: (a) reta de regressão
entre a CPUE – Y/f e esforço de pesca – f e (b) ajuste do modelo de produção de
Schaefer.

135
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

Figura 10 - Ajuste das retas de regressão para o bagre: (a) reta de regressão entre
a CPUE – Y/f e esforço de pesca – f e (b) ajuste do modelo de produção de
Schaefer.

Figura 11 - Ajuste das retas de regressão para a pescada-gó: (a) reta de regressão
entre a CPUE – Y/f e esforço de pesca – f e (b) ajuste do modelo de produção de
Schaefer.

CONCLUSÕES
1. A produção total estimada de pescado marítimo e estuarino do Estado do
Pará para os anos de 1995 a 2002 mostraram uma tendência crescente, sendo o
ano de maior captura 1998 e no período de 1999 a 2002 apresentou uma pequena
redução mantendo-se em torno de 100.000 t;
2. A produção estimada do curral-de-pesca mostrou uma tendência crescente
até 1998, e decrescente a partir de 1999 com uma pequena recuperação em
2002.
3. As cinco principais espécies capturadas pelos currais-de-pesca foram:
pescada-gó (Macrodon ancylodon), bagre (Arius herzbergii), bandeirado (Bagre
bagre), corvina (Micropogonias furnieri) e peixe-pedra (Genyatremus luteus).
4. Das cinco principais espécies estudadas, a pescada-gó apresentou a
maior participação relativa, com 38 % da produção total estimada.

136
A PESCA DE CURRAL NO ESTADO DO PARÁ

5. Os municípios com maior produção de pescado por curral-de-pesca, em


ordem descrescente, foram: Quatipuru, Curuçá, Bragança e Marapanim.
6. A evolução do esforço de pesca ao longo do período estudado mostrou
uma tendência crescente, com um pequeno decréscimo de 2001 sendo
compensado em 2002, cujos valores mensais mínimo e máximo ocorreram em
fevereiro e julho, respectivamente.
7. A evolução da CPUE total mostrou uma tendência crescente durante o
período de 1995 a 1998, a partir de 1999 apresentou um decréscimo acentuado
até 2001 com uma pequena recuperação em 2002.
8. Os resultados da análise de variância comprovam que houve uma variação
estatisticamente significante entre as CPUEs anuais, para cada uma das cinco
espécies estudadas.
9. O modelo de produção de Schaefer parece ser o mais adequado para se
estimar as tendências de produção para as cinco principais espécies capturadas
pelos currais-de-pesca.
10. O esforço de pesca, conforme aplicado no ano de 2002 (415.531 currais-
dia) supera o esforço ótimo estimado para cada uma das espécies em separado.
Inversamente, as produções e CPUEs, estão abaixo dos valores ótimos estimados
para cada espécie. O esforço aplicado sobre o bandeirado atingiu 166,6 % do
ótimo estimado e a captura e a CPUE são, respectivamente, de apenas 58,6 % e
35,2 % dos ótimos estimados. Para as demais espécies esses valores variaram
como a seguir: corvina = 143,3 %, 74,2 % e 51,9 %; peixe-pedra = 165,6 %, 72,8
% e 44,3 %; bagre = 172,0 %, 43,6 % e 25,3 %; pescada-gó = 173,1 %, 45,4 % e
26,2 %.

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