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HIDROLOGIA

PROF. GIULIANO TORRIERI NIGRO


FACULDADE CATÓLICA PAULISTA

Prof. Giuliano Torrieri Nigro

HIDROLOGIA

Marília/SP
2022
Diretor Geral | Valdir Carrenho Junior


A Faculdade Católica Paulista tem por missão exercer uma
ação integrada de suas atividades educacionais, visando à
geração, sistematização e disseminação do conhecimento,
para formar profissionais empreendedores que promovam
a transformação e o desenvolvimento social, econômico e
cultural da comunidade em que está inserida.

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emissão de conceitos.
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SUMÁRIO
CAPÍTULO 01 INTRODUÇÃO À HIDROGEOGRAFIA 07

CAPÍTULO 02 DISPONIBILIDADE E DEMANDA DOS 16


RECURSOS HÍDRICOS

CAPÍTULO 03 CICLO HIDROLÓGICO 30

CAPÍTULO 04 PLUVIOSIDADE 44

CAPÍTULO 05 BACIAS HIDROGRÁFICAS: CONCEITOS E 54


DEFINIÇÕES

CAPÍTULO 06 PADRÕES DE DRENAGEM E MORFOLOGIA DE 65


CANAIS FLUVIAIS

CAPÍTULO 07 GEOMORFOLOGIA FLUVIAL E AS FORMAS DE 77


RELEVO

CAPÍTULO 08 ÁGUAS SUBTERRÂNEAS 89

CAPÍTULO 09 BACIAS HIDROGRÁFICAS COMO 103


INSTRUMENTO DE PLANEJAMENTO E
GESTÃO

CAPÍTULO 10 POLÍTICA NACIONAL E A GESTÃO DOS 115


RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

CAPÍTULO 11 DRENAGEM URBANA 130

CAPÍTULO 12 VEGETAÇÃO E A PROTEÇÃO DOS RECURSOS 142


HÍDRICOS

CAPÍTULO 13 PRÁTICA DE CAMPO: ESTUDO DA 154


VEGETAÇÃO APLICADA À HIDROLOGIA

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SUMÁRIO
CAPÍTULO 14 IMPACTO HUMANO NO CICLO HIDROLÓGICO 167

CAPÍTULO 15 USO DA ÁGUA, GERAÇÃO DE ENERGIA E 178


IMPACTOS AMBIENTAIS

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CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO À
HIDROGEOGRAFIA

1.1 Água: A fonte da vida

Prezado(a) aluno(a), a água é o elemento natural mais abundante do planeta e está


presente e disposta de diversas formas na biosfera, podendo ser encontrada no estado
sólido, líquido e gasoso. Trata-se do elemento constituidor da chamada Hidrosfera,
estando presente nos oceanos, na atmosfera, na superfície terrestre e no subsolo.
Composta por por um átomo de oxigênio e dois átomos de hidrogênio, a água
é uma substância fundamental para a vida e vital ao funcionamento de todos os
ecossistemas, ou seja, ela é essencial para a manutenção da biodiversidade no nosso
planeta. É a água que mantém a vida na superfície terrestre, por meio da fotossíntese,
responsável pela produção da biomassa, sustentando os diversos ecossistemas.
A importância da água para os organismos vivos se dá tanto pelo aspecto ecológico
quanto fisiológico. Nesse sentido, a presença da água e o ciclo hidrológico condicionam
o estabelecimento de energia em todos os níveis tróficos (cadeia alimentar), pois é por
meio da presença da água e da energia térmica que as plantas realizam processos
químicos internos que resultam na fotossíntese e dão início à cadeia alimentar, passando
a energia produzida para os demais níveis tróficos.
Trata-se também de um elemento fundamental para a composição climática das
regiões da Terra, assim como constitui-se fator importante para a modelagem do relevo
através de diversos processos, entre eles o erosivo (mecânico ou químico). Nas áreas
tropicais, por conta das condições climáticas e alta incidência de pluviosidade, essa
condição de agente modelador do relevo se amplia. Nos dizeres de Coelho Neto (1998):

A água constitui um dos elementos físicos mais importantes na


composição da paisagem terrestre, interligando fenômenos da
atmosfera inferior e da litosfera, e interferindo na vida vegetal,
animal e humana, a partir da interação com os demais elementos
do seu ambiente de drenagem. Dentre as múltiplas funções da água
destacamos seu papel como agente modelador do relevo da superfície
terrestre, controlando tanto a formação como o comportamento
mecânico dos mantos de solos e rochas, [...] (Coelho Netto 1998, p.93)

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Está relacionada a efeitos atmosféricos comuns como a formação de nuvens, chuvas,


formação de rios, mas também a eventos catastróficos como as inundações, secas,
geadas entre outros desastres com implicações atmosféricas.
Como é essencial à vida na Terra, é também essencial à manutenção da nossa vida,
enquanto espécie. A água está presente no interior de todos os organismos vivos. O
ser humano, por exemplo, é constituído de 70% de água, número muito semelhante à
proporção de água no planeta (MACHADO; TORRES, 2013). Nosso cérebro é constituído
de 75% de água, os pulmões e o fígado por 86%, o sangue 81%, conforme observamos
na Figura 1.

Figura 1 - Presença da água no corpo humano


Fonte:https://www.terrabrasilis.org.br/ecotecadigital/images/abook/pdf/Agua%20Fonte%20da%20Vida.pdf

Ela é tão fundamental para a nossa sobrevivência que conseguimos resistir vários
dias sem nos alimentarmos, no entanto, sem água não sobrevivemos mais do que
3 dias, haja vista que ela participa de todas as reações químicas que ocorrem no
nosso corpo. Por isso, a busca por água sempre foi e continua sendo essencial para
o estabelecimento humano nos territórios.

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A água teve implicação direta na organização social da humanidade, haja vista


que a passagem da fase primitiva (caça e coleta) para a chamada fase agrícola só
se tornou possível graças ao controle da água, tanto para irrigação quanto para a
dessedentação animal. Dessa forma, apenas com o controle e o uso da água passamos
a nos tornar sedentários, fato que viabilizou a implantação das primeiras cidades que
se tem registro na história humana, grande parte delas localizadas marginalmente a
extensos cursos d’água, como no caso da civilização egípcia, nas margens do rio Nilo
(Figura 2) e da Mesopotâmia, nas margens do rio Tigre e Eufrates.

Figura 2 - Imagem de satélite do rio Nilo, Egito.


Fonte: Google Earth (2022), elaborado pelo autor

Diversos autores apontam para a existência de inúmeras obras de engenharias


ligadas à irrigação e drenagem no Egito Antigo, assim como sofisticados sistemas de
irrigação na região do chamado Crescente Fértil, entre os rios Tigres e Eufrates (Figura
3). Como a água está relacionada à vida, foi somente pela abundância dos recursos
hídricos que foi possível o estabelecimento de grandes civilizações no mundo antigo.
É importante ponderar que não foi somente em razão desse fator geográfico, mas
é inegável que ele foi preponderante para o estabelecimento e prosperidade dessas
civilizações.

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Figura 3 - Mapa da região do Crescente Fértil.


Fonte: https://www.todamateria.com.br/rio-tigre/

Conforme apontam Torres e Machado (2013), podemos dizer que a água é um


elemento natural quando não está em uso pelos seres humanos. A partir do momento
em que passa a ter algum tipo de utilidade para o homem, passa a ser um recurso.
Segundo o professor da USP, Luis Antônio Bittar Venturi, Recurso natural pode ser
definido como:

(..) qualquer elemento ou aspecto da natureza que esteja em demanda,


seja passível de uso ou esteja sendo usado direta ou indiretamente
pelo Homem como forma de satisfação de suas necessidades físicas
e culturais, em determinado tempo e espaço. (...) Se, por um lado,
os recursos naturais ocorrem e distribuem-se no estrato geográfico
segundo uma combinação de processos naturais, por outro, sua
apropriação ocorre segundo valores sociais (VENTURI, 2006)

Então, podemos compreender que para se tornar um recurso, o elemento da natureza


deve ter alguma utilidade para o homem e deve estar disponível para ser utilizado,

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mesmo que ainda não haja condições técnicas e materiais para tal retirada. Ele pode
ser utilizado de forma direta ou indireta. Vejamos a água, objeto nosso aqui de análise,
ela pode ser utilizada de forma direta para bebermos, tomarmos banho ou lavarmos a
louça, mas pode ser utilizada de forma indireta para a geração de energia, por exemplo.
Mas se a água é um recurso natural, cabe a pergunta que muitos se fazem: será
que a água do planeta vai acabar? Vejamos a resposta do professor Bittar Venturi em
entrevista concedida ao Jornal USP notícias (2015):

É incorreto classificar a água como um recurso renovável, como


muitos livros didáticos de Geografia ainda fazem. Recurso renovável
é aquele que, ao ser utilizado, tem a capacidade de recuperar seus
estoques por mecanismos naturais, como no caso das florestas.
Este conceito não se adéqua à água, já que as suas quantidades são
estáveis no Planeta. A molécula de água não se destrói com o uso e
sempre acaba voltando para o sistema, ainda que em outro estado, de
modo que sempre apenas “emprestamos” água do ciclo hidrológico.
Só que ao mesmo tempo em que os livros didáticos classificam a
água como renovável, fala-se que se trata de um recurso finito, o
que é um contrassenso. Aqui mesmo na USP há uma campanha
de ótimas intenções para o uso racional da água, mas que pecou
quando afirmou que água é um “recurso finito”, quando o correto
seria dizer: “captar, tratar e distribuir água é caro: economize”, ou
então: “a capacidade da sociedade de tratar e distribuir água é finita:
economize” (USP, 2015).

De acordo com o professor, a água é o recurso natural mais abundante do planeta


e não é correto reproduzir o discurso de que a água do planeta vai acabar, pois,
segundo ele:

(...) enquanto a terra girar, o sol brilhar e a lei da gravidade estiver


“vigorando”, as recargas de água nos continentes estarão asseguradas.
Não há como interromper o ciclo hidrológico. E o que existe de água
doce disponível na superfície e nos subsolos é muito mais do que a
capacidade humana de utilizá-la. Só os cerca de 110 km³ de água que
precipitam nos continentes anualmente já seriam suficientes para
abastecer a humanidade.(...) O que é finita é a capacidade do homem
de captar, tratar e distribuir a água para assegurar o abastecimento.
(...)

Dessa forma, é incorreto classificar a água enquanto recurso renovável como é


tratado na maior parte dos livros didáticos de Geografia. Afirma então, que:

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Recurso renovável é aquele que, ao ser utilizado, tem a capacidade


de recuperar seus estoques por mecanismos naturais, como no caso
das florestas. Este conceito não se adéqua à água, já que as suas
quantidades são estáveis no Planeta. A molécula de água não se
destrói com o uso e sempre acaba voltando para o sistema, ainda
que em outro estado, de modo que sempre apenas “emprestamos”
água do ciclo hidrológico.

Portanto, na verdade, o que está em risco não é a água acabar e sim se tornar
inviável a sua extração, tratamento e disponibilidade para consumo potável. A água
não está acabando no planeta, o problema é que ela não está sempre disponível
quando e onde o ser humano necessita. Ai sim, quando se discute sobre esse prisma,
podemos tratar a água como um recurso escasso.

ISTO ESTÁ NA REDE

Acompanhe a entrevista completa do professor Dr. Luis Antônio Bittar Venturi, no


Jornal USP notícias (2015) no link abaixo:
https://www5.usp.br/noticias/entrevista/geografo-da-fflch-alerta-sobre-nocao-
equivocada-de-falta-de-agua/

Por fim, o professor coloca que na grande maioria das vezes, os problemas
relacionados à falta de água não estão ligados às ações atmosféricas, mas sim da
falta de planejamento e políticas públicas de saneamento, uso e tratamento da água.
Então, devemos refletir que, embora a água seja um recurso inesgotável, não quer dizer
que possa ser utilizada de maneira indiscriminada e não se exime a responsabilidade
das sociedades em conservá-la e utilizá-la de forma sustentável. Ao contrário, por
compreender que se trata de um recurso vital para a natureza e as sociedades, mas
que a capacidade humana de tratar e distribuir essa água geograficamente, de acordo
com a demanda, é limitado, seu uso racional deve ser estimulado.

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A sensação de inesgotabilidade evita que as ações de planejamento e a execução


de políticas públicas sejam implementadas, na mesma medida em que dificulta a
conscientização, por parte da população, por um uso mais consciente e sustentável
da água.
Infelizmente as ações antrópicas têm ido no sentido contrário da conservação dos
recursos hídricos e têm sido as principais causas da escassez desse recurso, seja
de forma direta, por meio do uso indevido do solo, seja de forma indireta, por meio
das ações que influenciam nas mudanças climáticas globais, alterando os regimes
pluviométricos em diversas regiões do globo.
O aumento do consumo da água está relacionado ao aumento da população, mas
também ao tipo de consumo. Na realidade, está mais aliado ao estilo de vida de
determinada população do que ao número absoluto de pessoas em determinada
localidade. Veremos essa questão de forma mais detalhada no capítulo 2, onde
analisaremos a disponibilidade e o consumo da água a nível global.
O aumento da urbanização e o crescimento populacional das cidades são
problemáticas marcantes na atualidade, resultando em progressiva degradação da
qualidade ambiental no meio urbano. Com o decorrente processo de urbanização
que as cidades brasileiras vêm sofrendo, sobretudo, depois da década de 1970, e
com a crise ambiental que se intensifica, os recursos hídricos têm tido sua qualidade
severamente comprometida em virtude da própria urbanização, seja pela retirada da
vegetação para o estabelecimento de cidades, soterramento de nascentes, canalização
de rios, seja pelo indiscriminado descarte de efluentes ou pelo acúmulo de resíduos
sólidos nos corpos hídricos.
Nesse sentido, o que se observa é uma relação conturbada entre o processo de
urbanização e os recursos hídricos, a falta de planejamento das cidades em lidar com a
sua rede de drenagem é um fator marcante, sobretudo nos países em desenvolvimento.

1.2 A hidrologia e a importância de estudar a água


Caro(a) aluno(a), em virtude de toda a centralidade da água para a manutenção
da vida em todos os sentidos, não é difícil imaginar que ela passou a ser elemento
central das preocupações governamentais e da sociedade civil como um todo.
Nesse contexto, não demorou muito para que ela passasse a ser vista enquanto
recurso estratégico, despertando o interesse dos mais diversos níveis da sociedade,
passando a ser protagonista no meio científico, político e administrativo. Ela tem sido

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objeto de estudo de inúmeros áreas do conhecimento, entre eles: geografia, geologia,


climatologia, engenharia e urbanismo.
Na área científica, o estudo da água vem sendo mais difundido com base no conceito
de Hidrologia. A palavra tem sua origem no grego: hydor (água) + logos (“ciência” ou
“estudo”). Em uma tradução literal significaria “a ciência que estuda a água” (SANTOS
et al. 2001, p.21).
Segundo a U.S. Federal Council of Service and Technology (1959, apud TUCCI,
2000) “Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circulação e
distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua relação com o meio ambiente,
incluindo sua relação com as formas vivas”
Uma vez que outras ciências também têm a água enquanto objeto de estudo,
a exemplo da climatologia, oceanografia e a meteorologia, então como distinguir a
hidrologia dessas referidas ciências?
Podemos dizer que é o enfoque do estudo da água nos processos continentais que
distingue a hidrologia das demais ciências que tem a água enquanto seu objeto de
estudo. Estas outras ciências se debruçam nos processos atmosféricos e oceânicos.
Em suma, a hidrologia é a ciência que estuda os aspectos do ciclo da água na
natureza, porém relacionados aos processos hidrológicos continentais, que são os
processos físicos e químicos que ocorrem durante o percurso da água, em todos os
seus estados físicos, no ciclo hidrológico. Também procura compreender o balanço
hídrico global, que diz respeito às características espaço-temporais da transferência
de água entre todos os compartimentos do sistema global, como a atmosfera, os
continentes e os oceanos. (BRUTSAERT, 2005).
Trata-se de uma ciência consideravelmente ampla que está no “guarda-chuva”
das diversas sub-áreas mais específicas, tais como: hidrogeologia, que tem como
foco de estudo as águas subterrâneas; a oceanografia, que estuda os oceanos; a
Hidrometeorologia, responsável por estudar a água na atmosfera, só para citar estes
a título de exemplo.
Entretanto, devemos salientar que os estudos em hidrologia são complexos e amplos,
envolvem diversas destas sub-áreas simultaneamente, haja vista que os fenômenos e
processos envolvendo a água na natureza estão inter-relacionados. Como compreender
o depósito das águas subterrâneas sem estudar os fenômenos do ciclo hidrológico
na natureza, por exemplo?

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No entanto, há uma confusão terminológica que envolve hidrologia, hidrografia e


hidrogeografia. Embora todas estejam relacionadas, não são sinônimos. A hidrologia
já definimos acima e trata-se de uma ciência ampla que serve de base para diversas
áreas do conhecimento, entre elas a engenharia, urbanismo e geografia, por exemplo.
Por outro lado, entende-se como hidrografia a disposição dos rios sobre a superfície.
Assim, falamos da hidrografia do Brasil ou da hidrografia da região amazônica, por
exemplo.
Já, o termo que mais condiz com a aplicação dos conceitos da hidrologia para a
ciência geográfica é a hidrogeografia. Esta apresenta uma abordagem mais ampla
que envolve o estudo do comportamento das águas e sua relação com a sociedade.
Para o geógrafo não basta apenas o conhecimento técnico dos conceitos hidrológicos,
mas sim as implicações desses fenômenos no espaço geográfico, que é o objeto de
estudo da Geografia.
Nesses moldes, é objetivo da Hidrogeografia o estudo da circulação da água no
Planeta, bem como as principais consequências causadas pelo consumo humano.
Esse estudo é feito a partir da análise em várias escalas, seja na esfera global com
oceanos e mares, regional com as bacias hidrográficas e as locais com o estudo de
fundo de vales.
Portanto, não basta que o geógrafo compreenda apenas os mecanismos formadores
das precipitações, mas é necessário que ele analise as consequências das chuvas
concentradas em regiões de fragilidade ambiental, como as encostas de morros, por
exemplo. Da mesma forma que não é suficiente o geógrafo compreender teoricamente
os conceitos de bacia hidrográfica sem que a entenda enquanto importante ferramenta
de gestão territorial e planejamento do uso do solo.
Portanto, caro(a) aluno(a), a presente disciplina implicará no aprofundamento teórico
dos processos que envolvem a hidrologia, mas sempre fazendo as devidas relações
com as sociedades humanas. Afinal, é isso que a Geografia faz, procura entender as
sociedades humanas e as implicações de suas ações no espaço geográfico.

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CAPÍTULO 2
DISPONIBILIDADE E DEMANDA
DOS RECURSOS HÍDRICOS

2.1 Distribuição da água no planeta.

Embora abundante na superfície terrestre, a água disponível para consumo humano


é relativamente escassa. Segundo a Agência Nacional de Água (ANA), as águas cobrem
cerca de 70% da totalidade da superfície terrestre, sendo que aproximadamente 97,5%
estão nos oceanos e apenas 2,5% constituem-se em água doce. Do total de água doce,
apenas 1%, aproximadamente, é acessível para o consumo humano, seja na superfície
ou no subsolo. O restante encontra-se nas geleiras e em subsolos congelados, dessa
forma, encontra-se inacessível para ser utilizada como recurso (ANA, 2009).
A figura 4, abaixo, demonstra a distribuição de água no planeta. Repare que o
primeiro gráfico, na parte inferior esquerda da figura, se refere à disponibilidade total
na hidrosfera e o gráfico na parte superior direita apresenta apenas os 2,5% de água
doce. Então, o segundo gráfico representa a totalidade apenas destes 2,5%.

Figura 4: Disponibilidade de Água no planeta Terra.


Fonte: GONZALES (2016, p.12)

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Caro(a) aluno(a), você pode observar que embora a superfície de nosso planeta
seja composta por quase 70% de água, a ponto da Terra receber o apelido de “Planeta
Água”, perceba que aquela própria para o consumo humano, denominada “água doce”,
gira em torno de 2,5%, apenas. No entanto, quase 70% desse montante (dos 2,5%)
encontra-se em estado sólido, nas geleiras e calotas polares e apenas cerca de 30%
estaria disponível e apropriada para o consumo. Ocorre que não conseguimos aproveitar
grande parte dessa água por questões de inviabilidade técnica, econômica ou financeira,
haja vista que a maior parte é subterrânea. Ou seja, da água mais acessível ao uso
humano e dos ecossistemas, tem-se um percentual muito pequeno, de quase 0,3%
do total de água doce disponível.

ANOTE ISSO

Difere-se água salgada e doce de acordo com a concentração de sais minerais


presentes na água. Assim, na água doce essa concentração está por volta de 0,5 g/L,
incluindo principalmente cloretos e sulfatos. A água salgada, por sua vez, apresenta
concentração acima de 3 g/L.

Assim, embora a Terra apresente 1.386 milhões de Km³ de água, apenas 0,007%
dessa quantidade está disponível para o uso humano, o que é muito pouco frente
à totalidade da água disponível no sistema. É exatamente por isso que devemos
considerar a água um recurso precioso e sua disponibilidade para consumo depende
também de um uso consciente e sustentável do meio.
Você pode estar se perguntando, mas e a água subterrânea? Atualmente, as reservas
subterrâneas constituem fonte acessível de água para o consumo humano, sobretudo
em áreas secas onde as chuvas e o escoamento são escassos. De acordo com a
UNESCO (2015), as águas subterrâneas são fundamentais para a subsistência e a
segurança alimentar de mais de 1 bilhão de pessoas nas regiões mais pobres da África
e Ásia, além de servir de suprimento doméstico para grande parte da população, em
diversas parte do mundo.
No entanto, embora relativamente mais abundante que a água doce superficial,
o grande problema do uso da água subterrânea para o consumo reside nos altos
custos de exploração e nas limitações técnicas, devido a necessidade de utilização
de tecnologia avançada, tanto para a extração do recurso quanto para a investigação

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hidrogeológica do local, principalmente das águas oriundas dos aquíferos profundos,


onde costumam ser mais abundantes.

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Você sabe o que é um poço artesiano?

Chamamos de poço artesiano quando as águas fluem naturalmente do solo em


um aquífero confinado, isto é, aquele totalmente preenchido de águas, cujas as
rochas acima e abaixo são impenetráveis. As águas de um poço artesiano, na
maioria das vezes, têm a pressão mais alta do que a pressão atmosférica, fazendo
com que a perfuração faça a água subir, não sendo necessária a utilização de
bombas de sucção de água.

O autor.

Figura 5: Poço artesiano.


Fonte da imagem: https://www.furodagua.com.br/

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As geleiras e as calotas polares também servem como reservatórios de água. Em


épocas mais frias a água é retida em forma de gelo, sendo liberada nos anos mais
quentes.
Mas e a dessalinização da água? Pode ser uma alternativa viável? Sim, em muitos
países em que o abastecimento de água doce é insuficiente, ou até mesmo inexistente,
esse procedimento técnico é utilizado em larga escala para abastecimento humano.
Países da Península Arábica, tais como Emirados Árabes, Omã, Arabia Saudita, Qatar,
entre outros, produzem água potável por meio do processo de dessalinização.
No entanto, a coisa não é tão simples assim, esse processo é dispendioso, envolve
grandes obras de engenharia e, sobretudo, pode ser altamente poluente, conforme
aponta o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Segundo
o órgão, a dessalinização envolve a remoção do sal da água e sua filtragem para
a produção de água potável de qualidade. No entanto, o processo consome alta
produção de energia, normalmente oriunda de combustíveis fósseis e produz um
resultante químico altamente poluente: a salmoura tóxica, responsável pela poluição
de ecossistemas costeiros.
De acordo com o PNUMA (2022), na maior parte dos processos de dessalinização,
para cada litro de água produzido são gerados cerca de 1,5 litros de líquido poluído
com cloro e cobre. Esse concentrado possui duas vezes mais salinidade do que as
águas do oceano e se não for descartado adequadamente, pode gerar uma densa
nuvem de salmoura tóxica, diminuindo o oxigênio da água, decorrente do aumento
da salinidade e da temperatura.
Ainda, de acordo o PNUMA, 80% das águas residuais desse processo acabam
em mares, rios ou lagos. Dessa forma, embora solução viável em muitos países, seu
processo pode agravar os problemas ambientais, haja vista a ineficiência e falta de
políticas públicas para o descarte adequado dos resíduos.

ISTO ESTÁ NA REDE

O artigo do PNUMA sobre dessalinização da água está no link abaixo, confira:

https://www.unep.org/pt-br/noticias-e-reportagens/reportagem/cinco-fatos-
importantes-sobre-dessalinizacao#:~:text=A%20dessaliniza%C3%A7%C3%A3o%20
envolve%20a%20remo%C3%A7%C3%A3o,produz%20polui%20os%20ecossis-
temas%20costeiros.

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2.2 Distribuição da água superficial no mundo e o acesso à água.


Caro(a) aluno(a), já vimos que a disponibilidade de água para os seres humanos
não é tão abundante como se poderia pensar, haja vista que dos 2,5% da quantidade
de água doce disponível, é possível, ao menos na atualidade, aproveitarmos apenas
uma parcela muito pequena desse quantitativo.
Para piorar um pouco esse cenário, a água não se encontra distribuída de forma
igualitária na superfície. Na realidade, nenhum recurso apresenta uma regularidade de
ocorrência, isso se dá pelas características físicas e geográficas de cada localidade.
No caso da água, por exemplo, as condições climáticas interferem diretamente na
abundância ou escassez desse elemento.
Considerando que a água se encontra distribuída geograficamente de forma irregular,
observa-se, na figura 6, que algumas regiões do globo possuem mais acesso à água
do que outras.

Figura 6: Dados da distribuição da água nos continentes.


Fonte: ANA (2009). Elaborado pelo autor.

ANOTE ISSO

A água não está distribuída igualmente em todo o globo. Menos de 10 países


concentram 60% do suprimento global de água doce disponível: Brasil, Rússia,
China, Canadá, Indonésia, EUA, Índia, Colômbia e a República Democrática do
Congo.
Fonte: ANA (2009)

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Alguns países se encontram em regiões muito secas, como é o caso dos países do
Oriente Médio e da África, outros dispõem do recurso de forma abundante, como no
caso do Brasil, que detém 12% da reserva hídrica do planeta. O continente americano
detém 39,6% das águas de superfície e a maior parte se concentra na América do
Sul (60%). A Ásia possui 31,8%, a Europa toda apresenta 15% e a África com apenas
9,7% da reserva hídrica mundial.
Nota-se, entretanto, que essa irregularidade continental não obedece à lógica da
demanda por esse recurso. É exatamente esse o grande problema da crise hídrica
mundial. Muitas vezes, ou podemos dizer que na maioria das vezes, a necessidade
por água se dá em regiões altamente povoadas, onde os recursos são escassos.

ANOTE ISSO

Crise hídrica é o termo que utilizamos quando não há uma quantidade suficiente
de água potável disponível em uma determinada região capaz de satisfazer as
necessidades humanas.
O autor

Vejamos o caso da África, por exemplo. De acordo com a UNESCO (2015), o acesso
ao fornecimento de água é o menor entre as regiões do mundo, tanto das populações
rurais quanto urbanas. Podemos observar isso confrontando os dados absolutos de
disponibilidade de água na África com os dados de densidade demográfica e demais
dados populacionais. As regiões mais problemáticas, nesse ponto, localizam-se na
África subsaariana, principalmente nas áreas rurais, onde as condições climáticas e
socioeconômicas dificultam o acesso das pessoas à água potável.
Embora a maior parte dos países da América Latina possam usufruir de satisfatória
cobertura de água potável e de saneamento, ainda existe muita diferença entre os
países, mas, sobretudo, entre as áreas urbanizadas e as áreas rurais, haja vista que
as áreas rurais geralmente são muito pobres e tanto o abastecimento de água potável
quanto às questões de saneamento são precárias.
Com o aumento da população mundial, decorrente do crescente processo de
urbanização, aumenta-se a demanda por água, não apenas para o consumo doméstico,
mas também, e em maior quantidade, para as atividades econômicas de abastecimento
alimentar e industrial. A irrigação agroindustrial, a utilização de água pelas indústrias
de bens de consumo e também de produção de energia tendem a aumentar na mesma
proporção em que aumenta a população humana e os padrões de consumo.

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Na realidade, o aumento do uso da água está mais ligado ao estilo de vida das
populações do que ao número absoluto da população. Um exemplo disso é os EUA,
que possuem o maior uso per capita de água entre os países do mundo, consumindo
cerca de 2,5 vezes a mais do que todos os países da Europa juntos. Dessa maneira,
o exacerbado consumismo difundido pela globalização econômica aponta para um
uso cada vez mais predatório da água, contribuindo negativamente para um cenário
que não é muito animador.

Figura 7 - Consumo de água per Capita por país.


Fonte: http://arte.folha.uol.com.br/ambiente/2014/09/15/crise-da-agua/

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), caso não sejam realizadas
políticas públicas necessárias à proteção dos recursos hídricos e caso as taxas de
consumo e crescimento populacional não se reduzam, metade da população mundial
não terá acesso à água limpa a partir de 2025. Esse problema já assola cerca de 20%
da população mundial, o que representa aproximadamente 1 bilhão de pessoas.
Nesse cenário, estima-se que a falta de água e a disputa pelo acesso a esse recurso
será, provavelmente, uma das causas, juntamente com a disputa territorial, em regiões
pobres do globo, principalmente na África subsariana.
Machado e Torres (2013) apontam que, de acordo com a Organização Mundial da
Saúde (OMS), a quantidade mínima de água necessária para usos domésticos é de
50 litros/habitante/dia, admitindo-se que em situações de extrema pobreza esse valor
possa cair para 25 litros/habitantes/dia.

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Segundo os autores, para que uma comunidade humana não enfrente problemas
relacionados à escassez hídrica, é necessário um uso per capita da água de 4.657 litros/
pessoa/dia. Esse cálculo inclui produção de alimentos (agricultura), atividades industriais
e energéticas, além do uso doméstico da água. A ausência da água potável, nesse
contexto, causa a morte de 12 milhões de pessoas por ano, de doenças decorrentes
da falta de acesso à água potável e/ou consumo de água contaminada.
Outra questão que dificulta o acesso da água é a poluição e a contaminação,
tanto das águas superficiais quanto das sub superficiais. Esse assunto será melhor
detalhado no capítulo 15.

ISTO ESTÁ NA REDE


Já está acontecendo…
Nessa reportagem da BBC (2019) é discutida a questão da crise hídrica no mundo,
já sentida por uma parcela significativa da população mundial. De acordo com o
relatório do World Resources Institute (WRI), um centro de pesquisa sediado em
Washington, EUA, habitantes de quase 400 regiões do planeta já estão vivendo sob
condições de “extremo estresse hídrico”. O temor é que essa situação possa gerar
novas ondas de refugiados, conflitos e instabilidade política.
Leia a entrevista na íntegra em:

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/geral-49243195

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2.2 Distribuição da água superficial no Brasil


Quando olhamos a disponibilidade hídrica do Brasil, vemos que o país é o mais rico
do mundo em ocorrência de água doce, apresentando 12% do total desse recurso.
Isso, na realidade, acaba camuflando uma realidade de escassez hídrica, muitas vezes
não imaginada por quem está começando a ter contato com a ciência geográfica de
forma mais aprofundada.
Embora aparentemente apresentar uma situação favorável frente aos demais
países do mundo, no Brasil a água é distribuída regionalmente de forma desigual.
Algumas regiões apresentam disponibilidade hídrica abundante, como é o caso da
bacia amazônica, por exemplo, no entanto, outras apresentam escassez hídrica, a
exemplo de parte da região Nordeste. Há regiões também com grande oferta de água,
porém com o consumo muito alto, como na região Sudeste.

Figura 8: Distribuição dos recursos hídricos e da população brasileira em %


Fonte: https://publica.ciar.ufg.br/ebooks/saneamento-e-saude-ambiental/modulos/5_modulo_saneamento/02-6.html

Se analisarmos apenas os números absolutos da distribuição dos recursos hídricos


pelas regiões do Brasil, disponível na figura 8, percebe-se que é na região Norte do
país que se encontra mais da metade da disponibilidade de água doce (68%), frente
aos 32% restantes das demais regiões somadas. A região Centro-oeste apresenta
cerca de 16%, enquanto o Sudeste apresenta 6% e a região Sul, aproximadamente
7%. Nota-se que a região com menos disponibilidade de recursos hídricos é a região
Nordeste, com apenas 3% do total.

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Ocorre que quando tratamos de recursos hídricos, estamos falando de consumo


para as atividades humanas, ou seja, de nada nos adianta apenas observarmos os
dados brutos da disponibilidade de água em nosso território. É aí que entra a análise
geográfica. Devemos comparar a distribuição dos recursos hídricos com os dados
populacionais das regiões. Além disso, é necessário ponderar que o consumo de água
está relacionado a diversos fatores, entre eles: culturais, classes sociais, acesso, entre
outros.
Ao compararmos os dados da distribuição dos recursos hídricos no Brasil com
a distribuição demográfica, chegamos à seguinte conclusão: a água no país é
irregularmente distribuída pelo território e apresenta um padrão inversamente
proporcional à concentração demográfica. Em outros termos, onde há água em
abundância há pouca demanda, onde há pouca água, existe grande demanda.
Repare, caro(a) aluno(a), que cerca de 70% do volume d’água encontra-se na região
Norte do país, isso se dá pelo fato da bacia amazônica se localizar alí. No entanto, em
termos demográficos, a região abriga apenas 7% da população brasileira. A questão
se inverte no Nordeste e no Sudeste, por exemplo, onde a demanda por água é muito
maior do que a sua oferta. No caso do Nordeste, o clima semiárido contribui para a
escassez de rios, enquanto que na região Sudeste se localizam as maiores regiões
metropolitanas do país, como São Paulo e Rio de Janeiro.
Ainda que consideremos a disponibilidade relativa dos recursos hídricos, temos
que considerar os problemas relacionados ao acesso da população à água tratada.
Segundo dados do IBGE, cerca de 36% das residências no Brasil (cerca de 20 milhões)
não possuem acesso à água potável. Apenas para utilizarmos o exemplo de uma
localidade com abundância de água doce, a maior parte da população da cidade de
Manaus, localizada na bacia amazônica, não têm acesso à água tratada.

2.3 Uso da água no Brasil


A água doce disponível como recurso para os seres humanos possuem inúmeras
utilidades. De acordo com a ANA (2021), o uso da água pelos seres humanos pode
ser consuntivo, isto é, que consome água de forma direta por meio da retirada dos
mananciais ou não consuntivo, que não consomem diretamente, mas dependem da
manutenção de condições naturais ou de operação de infraestrutura hídrica, como
a pesca, o turismo ou atividades de navegação, que aproveitam seu uso, mas sem
consumo.

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Conforme aponta Machado e Torres (2013), do ponto de vista do uso consuntivo da


água de forma global, a agricultura constitui a sua principal destinação, principalmente
por meio da irrigação, representando aproximadamente 70% do total consumido. As
atividades industriais também representam parcela significativa do uso da água,
consumindo cerca de 20%. Os outros 10% ficam a cargo do uso doméstico, incluindo
água para beber, cozinhar, higiene pessoal, limpeza doméstica, entre outros.

ANOTE ISSO

Embora a maior demanda de água doce se concentre nos setores agrícolas e


industriais, é nas cidades que se consome a maior quantidade de água potável
(volume). Nesse sentido, cerca de 84% do consumo de água tratada nas regiões
metropolitanas do país são de destinação doméstica. Por isso, é importante as
ações que visam a gestão e conservação da água no meio urbano.

Fonte: https://publica.ciar.ufg.br/ebooks/saneamento-e-saude-ambiental/modulos/5_modulo_saneamento/02-6.html

É claro que estes dados representam uma média do consumo mundial, porém,
conforme já tratamos anteriormente, o consumo da água é extremamente variado
nas diversas regiões do globo, principalmente por conta dos diferentes níveis
de desenvolvimento econômico, mas também por razões de acessibilidade e
comportamento de consumo.
De acordo com o PNUD (2006), são significativas as diferenças no consumo da
água quando se faz uma comparação simples entre países desenvolvidos e países em
desenvolvimento. A Tabela 1 expressa, de forma clara e simples, essa discrepância,
principalmente em relação aos usos industriais e agrícolas.
Observa-se que o fator chave para compreender essa discrepância é a questão da
industrialização. Os países mais desenvolvidos tendem a ser mais industrializados
e, em contrapartida, tendem a ter uma atividade econômica menos dependente da
agricultura.
Atividades Países desenvolvidos Países em desenvolvimento

Agricultura 42% 81%

Industrial 43% 11%

Usos domésticos 13% 08%


Tabela 1: Distribuição dos recursos hídricos no Brasil.
Fonte: PNUD (2006) elaborado pelo autor

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Repare que nos países em desenvolvimento o uso da água na atividade industrial


beira os 10%, enquanto que nos desenvolvidos representa quase a metade do consumo
(43%). Por outro lado, os dados passam a ser mais expressivos quando analisamos
o consumo de água por parte das atividades agrícolas, representando um total de
81% nos países em desenvolvimento, enquanto que nos países desenvolvidos esse
consumo é dividido pela atividade industrial.
Em ambos os casos, a atividade agrícola está consumindo uma quantidade enorme
de água, isso se dá pelas características da própria produção, que necessita, muitas
vezes e também a depender das condições climáticas, grande quantidade de água
para irrigação.

Figura 9: Uso da água no Brasil.


Fonte: https://www.gov.br/ana/pt-br/assuntos/gestao-das-aguas/usos-da-agua

A figura 9 ilustra a retirada de água para consumo, no Brasil. Observe que 30%
dessa água, o que representa 27,9 trilhões de litros/ano são “perdidos” no processo
natural de Evaporação, processo integrante do Ciclo Hidrológico (assunto que iremos
abordar de forma detalhada no capítulo 3).
Por ser um país economicamente forte, porém em desenvolvimento, observe que
o Brasil tem um consumo de água muito similar aos países dessa categoria, com a
diferença no destaque à produção agropecuária. Nesse ponto, cerca de metade da
água é destinada à irrigação, enquanto aproximadamente 9% serve para abastecimento
animal. Por outro lado, o uso da água para a atividade industrial é de cerca de 10%.
Esses dados, apresentados de forma mais detalhada na figura 9, demonstram a
concentração econômica em torno do agronegócio.

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Do ponto de vista do uso doméstico, este representa aproximadamente 11%


(incluindo o uso urbano e rural). Nota-se, por meio da figura 10, que a maior parte
da água utilizada está relacionada à higiene pessoal, destacando-se, em termos de
volume, a sua utilização para banho (39%) e descarga (20%).

Figura 10: Uso doméstico da água no Brasil


Fonte:

O problema é que grande parte dessa água potável retirada das reservas hídricas
para o nosso consumo não são, de fato, aproveitadas para realizar as tarefas do dia
a dia. Estima-se que de cada 100 litros de água tratada no Brasil, apenas 63% são
consumidos, ou seja, 37% são perdidos em vazamentos e ligações irregulares.
Além disso, outra grande parte dessa água é utilizada de forma indiscriminada
pela sociedade, seja para varrer a calçada da residência, lavar louça ou tomar banho,
tudo isso de forma demorada. Estima-se que uma torneira gotejando consuma 46
litros de água por dia. A limpeza de calçadas e garagens por 30 minutos, utilizando
mangueira com água corrente gasta um total de 280 litros e o banho com duração
de 15 minutos, consuma em torno de 144 litros de água.
Segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, em 2019 o Brasil
desperdiçou um volume de água que seria suficiente para abastecer 63 milhões de
pessoas. Esse número representa quase 40% do total de captação de água potável
no país.

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Portanto, caro(a) aluno(a), são inúmeras as questões relacionadas à indisponibilidade


ou difícil acesso à água em muitas partes do globo. São questões que envolvem sempre
uma análise integrada da Geografia, haja vista que as razões dessa problemática
envolve questões físicas ligadas ao clima e aos regimes pluviométricos, distribuídos
de forma desigual pela superfície terrestre; mas também envolve questões ligadas
à falta de acesso a recursos tecnológicos; falta de políticas públicas para garantir o
abastecimento das populações, sobretudo nos países mais pobres; poluição causadas
pelo intenso processo de urbanização e industrialização; entre outros fatores que
fazem com que a água seja um dos fatores mais complexos da atualidade.

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CAPÍTULO 3
CICLO HIDROLÓGICO

Caro(a) aluno(a), conforme vimos nos capítulos anteriores, a água pode ser encontrada
no estado sólido, líquido e gasoso. Ela está presente nos oceanos, na atmosfera, na
superfície terrestre e no subsolo.
Embora possamos estimar a quantidade de água em cada um desses ambientes
mencionados, é importante frisar que a água está em constante movimento,
constituindo o que didaticamente denominamos ciclo hidrológico (Figura 11). Esse
ciclo tem na energia solar seu motor propulsor, haja vista ser ela a energia responsável
pelo aquecimento da água e sua consequente evaporação, tanto das águas oceânicas
quanto das continentais. Não podemos esquecer também que a energia solar é a
responsável pela evapotranspiração da massa vegetal.

Figura 11 – Ciclo hidrológico


Fonte: https://www.epal.pt/

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Conforme apontam Machado e Torres (2013, p. 74):

O movimento contínuo e dinâmico que transporta água de um lugar


para outro é mantido pela energia solar e pela gravidade por meio da
evaporação, transpiração, sublimação, condensação, precipitação,
infiltração, escoamento superficial, de acordo com as leis físicas
que dirigem essa ciclicidade. Os fenômenos que permitem o ciclo
hidrológico é a coexistência dos três estados (sólido, líquido,
gasoso), os quais implicam em transferências contínuas de um
estado para outro. Por ser dessa forma, o princípio dos processos
que desencadeiam esse movimento da água, tem início a partir da
energia solar que incide sobre a Terra.

Dessa forma, em sua constante movimentação, a água muda de estado físico e


posição ao percorrer esse ciclo, promovendo, assim, sua renovação no planeta. As
águas se movimentam, circulam e se transformam nas três esferas que compõem o
planeta: a atmosfera, a hidrosfera e a litosfera, formando um ciclo contínuo (COSTA;
TEUBER, 2001).
Conforme visto anteriormente, a movimentação da água ocorre por meio de duas
forças: a energia térmica do sol, que propicia a evaporação e a evapotranspiração das
águas oceânicas e continentais, e a ação gravitacional, responsável pela precipitação
na forma de chuva, neve, orvalho ou granizo, assim como do movimento da água que
já atingiu a superfície do continente.
Assim, podemos dizer, de maneira didática, que a água segue um ciclo natural que
será descrito nos parágrafos a seguir. Antes de tudo, não podemos perder de vista que
essa explicação é simplória diante de um fenômeno complexo que ocorre na biosfera.
Pela ação da energia térmica do sol, tanto a água oceânica quanto a água continental
são evaporadas. A evaporação é a passagem do estado físico da água líquida contida
na superfície terrestre (mares, rios, lagos, etc.), para o estado gasoso (vapor).
Na superfície, a planta absorve parte da água que está no solo para suas atividades
metabólicas e pode passar parte dela para os demais níveis tróficos da cadeia alimentar
(outros animais se alimentam da planta e da água contida em seus tecidos). Entretanto,
a maior parte da água absorvida pela planta será perdida novamente para a atmosfera
por meio da transpiração. Assim, a água contida na biomassa (plantas e demais seres
vivos) e transpirada também é evaporada, recebendo o nome de evapotranspiração
(Figura 12).

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Figura 12 – Importância da vegetação no ciclo hidrológico.


Fonte:https://pt.khanacademy.org/science/5-ano/matria-e-energia-a-gua-na-terra/a-agua-na-terra/a/ciclo-da-agua-local-e-global

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Influência da evapotranspiração na agricultura


Você sabia que o conhecimento sobre a evapotranspiração na agricultura é
fundamental? O solo e a planta são os elementos-chave de produção e, desse
modo, não ocorreria produção sem a quantidade de água mínima exigida pelas
culturas. É pela evapotranspiração que se estima a demanda hídrica das culturas
e, por meio desse conhecimento, é possível definir com maior precisão sua
necessidade de irrigação. Nesse sentido, saber a demanda hídrica de cada cultura
é importante para conseguir explorar o potencial máximo de produção, evitando a
queda da produtividade por falta de água.

Figura 13 – Demanda hídrica aproximada de algumas culturas


Fonte: https://blog.aegro.com.br/evapotranspiracao/

Conhecendo os dados de evapotranspiração, juntamente com as demais variáveis


que influenciam no ciclo hidrológico, (precipitação, umidade relativa do ar,
temperatura), a irrigação se torna mais eficiente e contribui para o uso sustentável
da água, além de aumentar a produtividade agrícola.
Fonte: https://blog.aegro.com.br/evapotranspiracao/

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Ao ser evaporada, essa água se condensa. A condensação é o processo pelo qual o


vapor de água contido na atmosfera é novamente transformado em água líquida. Esse
processo ocorre quando o vapor de água sobe e entra em contato com as camadas
mais frias da atmosfera. Ao entrar em contato com o ar mais frio, a água em estado
de vapor se condensa, formando nuvens.
Anteriormente suspensa pela ação da atmosfera, ela agora se avoluma e passa a
não ser mais sustentada pela atmosfera. Por gravidade, a água cai, então, na superfície,
em forma de chuva, neve ou granizo. A esse fenômeno dá-se o nome de precipitação.
Dessa maneira, a chuva pode ser definida como o conjunto de águas originárias
do vapor de água atmosférico que se precipitam, em estado líquido, na superfície
terrestre. Sua formação está relacionada à ascensão das massas de ar quente e
úmida e à formação de nuvens.
A chuva consiste na principal forma de precipitação em países tropicais, como o
Brasil. É o principal fator de entrada de água nos sistemas hidrológicos superficiais
e subterrâneos e, por isso, é um fenômeno amplamente estudado pela hidrologia e
pela hidrogeografia. Os processos que envolvem sua formação serão detalhados no
próximo capítulo.
Por hora, o que precisamos compreender é que, ao precipitar sobre os continentes,
essa água pode tomar alguns caminhos diferentes, conforme observamos na Figura
14, entre eles:
• infiltra e percola no solo e nas rochas, formando aquíferos subterrâneos;
• escoa superficialmente, alimentando o sistema hídrico superficial (rios, lagos e
demais corpos d’água);
• ressurge na superfície terrestre, por meio dos afloramentos e nascentes;
• é interceptada pela vegetação, sofrendo novamente processo de evaporação;
• acumula-se nas rochas e em determinados solos, evaporando e retornando
para a atmosfera;
• congela no cume das montanhas e nas geleiras, em forma de neve.

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Figura 14 – Caminhos da água ao precipitar no solo.


Fonte: https://canal.cecierj.edu.br/recurso/7678

Em regiões florestadas, principalmente, uma parte da precipitação pode passar por


interceptação, processo na qual a água fica retida sobre folhas e caules, resultando na
evaporação, posteriormente. Com a movimentação da folha pelo vento, parte da água
retida se dirige ao solo. A interceptação, nesse caso, é um importante processo capaz
de diminuir os impactos das gotas de chuva sobre o solo, reduzindo o escoamento
superficial, e, portanto, seus efeitos erosivos. Essa é uma das inúmeras funções
benéficas que a manutenção da cobertura vegetal propicia e ilustra a importância
dela no ciclo hidrológico.
Perceba, caro(a) aluno(a), a importância da fitomassa no ciclo hidrológico, haja vista
que as plantas liberam água para a atmosfera por dois processos: pela evaporação,
que ocorre em sua estrutura foliar, e pela transpiração, no processo conhecido como
evapotranspiração, conforme já vimos anteriormente.
Outra parte da água que cai em forma de precipitação se infiltra no solo lentamente
e percola. Esse processo é denominado infiltração e é importantíssimo para a reposição
da água na superfície e para a formação das águas subterrâneas. Parte dessa água
vai se concentrar na subsuperfície, constituindo-se os lençóis freáticos e outra parte
consegue penetrar lentamente a profundidades maiores (centenas de metros abaixo
da superfície), formando os aquíferos.

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ANOTE ISSO

Entende-se como percolação o movimento lento de penetração da água no solo e


subsolo, que dá origem ao lençol freático e aos aquíferos profundos. Também pode
ser entendida como o ato de um fluido passar através de um meio poroso.
Fonte: https://www.iat.pr.gov.br/Pagina/Glossario-Geologico

A água que infiltra é absorvida pelo solo e pelas rochas por meio de seus poros,
fissuras ou fraturas. O limite inferior da percolação da água se dá quando esta atinge
rochas impermeáveis, não apresentando mais porosidade devido à pressão das rochas
sobrejacentes (que estão acima). A profundidade máxima que isso ocorre é cerca de dez
mil metros, a depender do tipo de rocha e da situação topográfica.
Dessa maneira, por ação da gravidade, toda a água tende a atingir esse limite inferior,
onde sofre represamento, ocupando todos os espaços em direção à superfície. Essa zona
cujo espaço é completamente preenchido por água denominamos zona saturada ou zona
freática. A água que vai se infiltrando acaba por atingir a zona saturada e vai compondo
as reservas de águas subterrâneas. Essa composição é chamada recarga dos aquíferos.
Acima desse nível, os espaços vazios estão preenchidos parcialmente por água, mas
também por ar. Assim, a água não consegue ocupar todos os espaços. Essa parte do
solo é denominada zona não saturada ou zona aerada.
Conforme observamos na Figura 15, o solo é composto por uma zona não saturada
e por uma zona saturada. Na zona saturada (aquíferos), os poros ou fraturas das rochas
estão completamente preenchidos pela água, apresentando saturação. O nível freático
representa o limite entre a zona saturada e a não saturada. Isso é facilmente observado
com a abertura de um poço raso no local, assim, o nível d’água que se encontra representa
a profundidade do lençol existente naquele ponto.

Figura 15 – Distribuição da água no subsolo.


Fonte: TEIXEIRA et al. (2003).

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ANOTE ISSO

O lençol freático se caracteriza como um reservatório de água subterrânea


decorrente da infiltração da água da chuva no solo, nos chamados locais
de recarga. Nele, não há confinamento, a água flui livremente e, geralmente,
encontram-se próximos à superfície. Como os lençóis freáticos acompanham a
topografia do relevo, em alguns pontos pode ocorrer o afloramento dessa água,
formando uma nascente.

O nível freático acompanha as irregularidades topográficas e a sua profundidade se


dá em função da quantidade de recarga (quantidade de água que entra no sistema)
e dos materiais do subsolo (rochas e solo). De maneira geral, é mais raso em fundos
de vale e mais profundos nos interflúvios, conforme observamos na Figura 16.

Figura 16 – Nível freático e a topografia do terreno.


Fonte:TEIXEIRA et al. (2003).

Justamente por acompanhar os níveis topográficos, em determinado momento,


o nível freático aflora, ou seja, emerge na superfície. Esse processo dá origem às
chamadas nascentes, fontes de água responsáveis pelo ponto inicial de formação de
rios e demais cursos d’água.
O nível freático pode sofrer alternâncias de profundidade ao longo do ano, devido à
variabilidade climática. Então, os maiores índices de infiltração de água no lençol freático
vão ocorrer em períodos em que a pluviosidade é alta, consequentemente, elevando

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o nível freático. Da mesma forma, em períodos de seca, haverá pouca infiltração e o


nível freático vai ser mais profundo.
Em áreas em que a pluviosidade é alta, o nível freático tende a ser mais raso, enquanto
em ambientes áridos, tende a ser mais profundo. Geralmente, onde há bastante umidade
e a pluviosidade é alta, a vazão do rio aumenta à jusante (no sentido nascente para o
exutório), pois são alimentados pela água do lençol freático. Esses rios são chamados
efluentes. Os rios influentes fazem o movimento contrário, a vazão diminui à jusante
como consequência de recarga da água subterrânea pelo escoamento superficial. Dessa
forma, a água do rio se infiltra para o nível freático e poderá secar, caso esse nível
se rebaixe devido à falta de pluviosidade, fato comum em áreas semiáridas e áridas.

ANOTE ISSO

Os lençóis freáticos geralmente têm uma água bastante limpa devido à filtração
natural que ela sofre ao escorrer pelo solo poroso. Tanto é que as águas minerais
podem ser consumidas sem necessidade de tratamento. Mas, nas grandes cidades,
ou mesmo no campo, devido ao uso de agrotóxicos, a qualidade da água presente
nos lençóis freáticos é bastante prejudicada, principalmente junto aos lixões.

O escoamento superficial se dá quando a intensidade da precipitação excede a


capacidade de infiltração do solo. Essa água que flui pelo solo e por gravidade vai
buscar as partes mais baixas do relevo, estabelecendo-se em rios, córregos, lagos e
oceanos. É importante lembrar que essa separação se dá para fins didáticos apenas,
pois parte dessa água também é evaporada e parte é, por exemplo, infiltrada no solo
no decorrer de seu trajeto.
Para que o ciclo hidrológico se complete de forma satisfatória, é necessário que
parte da água precipitada seja depositada nos chamados reservatórios subterrâneos,
que servirão de reabastecimento da água no sistema. Por isso, é importante entender a
relação que se estabelece entre infiltração e escoamento superficial. É sempre desejado
que haja a maximização da infiltração e redução do escoamento superficial, pois o
último, além de “jogar” a água para fora do sistema de forma rápida e não permitir a
recarga nos aquíferos, também gera uma série de problemas relacionados à erosão,
assoreamento de corpos hídricos e movimentos de massas em encostas.
Nesse contexto, a infiltração é o processo mais importante de recarga da água no
subsolo e o volume e a velocidade da infiltração vão depender de diversos fatores,
dentre eles, os principais são: características do substrato; presença, densidade e

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condições da vegetação; topografia do terreno; regime de precipitação; e ocupação


humano do solo.
A pluviosidade tem uma relação direta com a infiltração do solo, na medida em
que, se ela aparecer de forma concentrada, vai favorecer o escoamento superficial
direto, pois a taxa de infiltração é inferior ao grande volume de água precipitada em
curto período de tempo. Por outro lado, as chuvas mais bem distribuídas ao longo do
tempo favorecem a infiltração da água, pois há tempo para que ela penetre no solo
e não sature. Assim, quanto maior a intensidade de chuva, mais o solo atingirá sua
capacidade de infiltração, fazendo com que essa água escoe superficialmente.
Em outras palavras, quanto maior a duração da chuva, maior a quantidade de
água que infiltrará no solo e menor será a capacidade deste solo em reter mais água,
resultando no aumento do escoamento superficial. É importante ressaltar, também,
que, se o solo estiver úmido devido às chuvas anteriores, menor será a capacidade
de absorção de água, resultando em um maior escoamento superficial.

ANOTE ISSO

No ciclo hidrológico, a chuva pode se caracterizar pelo volume total de água,


medindo-se em milímetros; pela duração, observando-se o tempo de ocorrência
e pela intensidade, que se dá pelo tempo de precipitação e pela quantidade de
milímetros de água.

Como já vimos, a infiltração é favorecida pela porosidade e permeabilidade dos solos,


mas também pela presença de rochas porosas e fraturadas, permitindo a penetração
da água no subsolo. Por outro lado, rochas cristalinas têm poucas fraturas e não
permitem que a água infiltre, assim como nos solos argilosos.
A declividade também interfere na infiltração, pois tem relação direta com o
escoamento superficial. As vertentes menos declives facilitam a infiltração da água,
por uma questão ligada à gravidade.
Além desses fatores, o uso e a ocupação do solo pelas atividades econômicas
humanas contribui diretamente com a infiltração da água. Em áreas urbanizadas, as
edificações e a pavimentação tornam os solos impermeáveis, causando uma série de
danos sociais e ambientais devido ao aumento do escoamento superficial e à redução
da recarga subterrânea, o que também remete ao problema de recarga hídrica.
No entanto, não é apenas a urbanização que contribui negativamente para a infiltração
da água no solo, mas também o uso indiscriminado da terra para as culturas agrícolas,
principalmente aquelas ligadas à produção intensiva e agroindustrial. Nessas áreas,

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a infiltração sofre redução pelo desmatamento, principalmente de encostas, e pelo


pisoteamento do solo, em áreas de extensiva criação de gado.
No processo de infiltração da água, a vegetação também desempenha importante
papel, no sentido de aumentar a porosidade do solo e permitir que a água infiltre com
mais facilidade, evitando o escoamento superficial e protegendo o solo de processos
erosivos causados por esse escoamento. A importância da vegetação para a estabilidade
hidrogeológica será vista com maior detalhe no capítulo 12.

ISTO ESTÁ NA REDE

Trabalhos desenvolvidos pelo Instituto Florestal (IF) comprovam, de forma


inequívoca, que a presença de cobertura florestal em bacias hidrográficas promove
a regularização do regime de rios e a melhora na qualidade da água. Pesquisadores
da Seção de Engenharia Florestal, do IF, Valdir de Cicco, Francisco Arcova e Maurício
Ranzini, embasaram suas teses de doutorado em pesquisas sobre a relação entre a
floresta e a água.
Segundo eles, “as bacias hidrográficas recobertas por vegetação florestal são as que
oferecem água com boa distribuição ao longo do ano, e de melhor qualidade”. Parte
da água precipitada cai e é retida pela copa das árvores (interceptação), evaporando
em seguida. A taxa de evaporação varia de acordo com a densidade da vegetação,
idade, espécies, além das condições climáticas da região.

Figura 17 – Mata ciliar protegendo os recursos hídricos


Fonte: https://www.ecodebate.com.br/2017/01/25/estudo-indica-que-matas-ciliares-ajudam-manter-fertilizantes-fora-dos-rios/

Os pesquisadores afirmam que, em florestas tropicais, a interceptação varia de


4,5% a 24% da precipitação, o restante da água alcança o solo florestal por meio do
gotejamento de folhas e ramos ou por escoamento pelos troncos e caules. No solo,
a água se infiltra ou é armazenada em depressões, não escoando superficialmente,
conforme ocorre em áreas onde o solo é exposto.

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Acompanhe a reportagem completa no link a seguir:


https://cetesb.sp.gov.br/blog/2018/02/21/pesquisas-comprovam-a-importancia-da-
vegetacao-na-producao-de-agua-com-qualidade/

Perceba, caro(a) aluno(a), que o ciclo da água é dinâmico, haja vista que ela está
sempre alterando de estado físico e mudando de posição no espaço. Dessa forma,
a água que hoje está no oceano pode ter sido subterrânea, ou, ainda, a própria água
subterrânea já passou pela atmosfera, pelos rios, lagos e oceanos, por exemplo.
O ciclo hidrológico é responsável pela movimentação de uma enorme massa de
água pelo globo. A maior parte da água na Terra não passa pelo ciclo hidrológico
rapidamente, ou seja, não muda de um lugar para o outro de forma frequente. A maior
parte da água, então, tende a se depositar em reservatórios e o tempo em que ela
reside nesse local varia muito (tempo de residência). Quando a água penetra no solo,
por exemplo, ela pode levar milhares de anos até atingir os aquíferos mais profundos.
Outra parte da água da Terra passa por esse ciclo de forma mais rápida.
Reservatórios Período médio de renovação (tempo de residência)
Oceanos 2.500 anos
Água subterrânea 1.400 anos
Umidade do solo 1 ano
Áreas permanentemente congeladas 9.700 anos
Geleiras em montanhas 1.600 anos
Solos congelados 10.000 anos
Lagos 17 anos
Pântanos 5 anos
Rios 16 dias
Biomassa algumas horas
vapor d’água na atmosfera 8 dias
Tabela 2 – Período de renovação da água em diferentes reservatórios da Terra
Fonte: SETTI et al. (2001, p. 65).

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O ciclo hidrológico em uma superfície pode ser expresso por uma fórmula simples.
Nesse caso, utilizaremos como exemplo o trabalho de Setti et al. (2001) sobre o ciclo
hidrológico nos continentes:
Pc = Evtc + ESs + ESb
Onde:
Pc = a quantidade de precipitação que cai sobre sobre os continentes;
EVTc = evapotranspiração nos continentes;
ESs = escoamento superficial
ESb = escoamento subterrâneo (infiltração)

Portanto, observa-se, na Figura 18, que, anualmente, cerca de 119 mil km³ de
água são precipitados sobre os continentes, dos quais, aproximadamente, 74.200
km³ evapotranspiram e retornam para a atmosfera (vapor), 42.600 km³ escoam
superficialmente em direção aos corpos hídricos (rios, lagos e oceanos) e 2.200 km³
infiltram no solo, formando o chamado escoamento subterrâneo.

Figura 18 – Ciclo hidrológico médio anual da Terra.


Fonte: https://docplayer.com.br/74317438-A-gestao-de-recursos-hidricos-de-barragens-utilizando-a-tecnica-de-dinamica-de-sistemas.html

Se formos analisar a fundo essa questão, verificamos então que, do total da


precipitação nos continentes, 62% retornam à atmosfera e 38% escoam até os oceanos.
Por outro lado, nos oceanos, o volume precipitado é de 458 mil km³ enquanto a
evaporação é de 502.800 km³, gerando um excedente de vapor na atmosfera de 44.800
Km³. Como se pode perceber, o volume de água que escoa dos continentes para o
oceano, representados por ESs (42.600 km³) + ESb (2.200 km³), totalizam os 44.800

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Km³, ou seja, podemos concluir que o volume de água que escoa dos continentes
para o oceano é igual ao valor que retorna dos oceanos para os continentes sob a
forma de vapor d’água, fechando o ciclo (SETTI et al., 2001).
É importante ressaltar que a quantidade de água do oceano que sofre evaporação
é superior à quantidade de água que retorna a ele através da chuva no continente. Ou
seja, a maior parte da chuva (cerca de 90%) que precipita nos continentes é proveniente
da água evaporada do mar.
Baseando-se nesse cálculo expresso anteriormente, também é possível estimar o
ciclo hidrológico de uma bacia hidrográfica, por meio de uma equação simplificada:
P = Etp + R + I
Onde:
P = quantidade de precipitação que cai sobre a bacia;
Etp = quantidade de água que volta à atmosfera em formato de vapor;
R = quantidade de água que escorre superficialmente;
I = água que infiltra no solo.

ANOTE ISSO

O ciclo hidrológico é ensinado desde o Ensino Fundamental nas escolas,


seus conceitos são relativamente simples, porém, não é fácil para as crianças
compreenderem o ambiente de forma sistêmica. Nesse sentido, cabe ao professor
de Geografia utilizar diversos recursos didáticos para melhorar a compreensão
dos alunos, sobretudo das séries iniciais. Dentre os diversos recursos didáticos
disponíveis, os livros infantis podem ser uma opção interessante.

Fonte: https://www.estantevirtual.com.br/livros/samuel-murgel-branco/aventuras-de-uma-gota-dagua/2521375294

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Caro(a) aluno(a), a essa altura, você já percebeu que, embora possamos expressar
didaticamente o ciclo hidrológico iniciando na precipitação e finalizando na evaporação
ou infiltração da água no subsolo, é correto advertir que o movimento é cíclico e
sistêmico, a água está em movimento contínuo, tanto em localização quanto em
estado físico. Dessa forma, não há um início e nem um fim.
A água é o bem da vida, elemento essencial à manutenção de todos os ecossistemas
da biosfera, além de ser vital à manutenção das atividades econômicas dos seres
humanos. Por isso, o estudo do ciclo hidrológico, seus conceitos e funcionamento
são de vital importância para a Geografia.
Além da importância em si mesmo, o ciclo ainda contribui para a ocorrência de outros
ciclos naturais, principalmente devido à precipitação atmosférica e ao escoamento
superficial, que contribuem para a ciclagem de diversos elementos, entre eles o carbono,
o nitrogênio, o fósforo e o enxofre.

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CAPÍTULO 4
PLUVIOSIDADE

4.1 O que é precipitação?

Caro(a) aluno(a), conforme vimos no capítulo anterior, a precipitação é um dos


componentes mais importantes do ciclo hidrológico, pois é ela que vai garantir o
retorno da água evaporada à superfície terrestre e ao oceano, permitindo a distribuição
da água nos ecossistemas e nos reservatórios utilizados pelos seres humanos.
Por isso, optamos por estudar o fenômeno da precipitação de forma separada,
pois é fundamental que tenhamos uma base de conhecimento sobre os aspectos
elementares da ocorrência, distribuição, processo de formação e dos diferentes tipos
de precipitação que ocorrem na superfície terrestre (TAVEIRA, 2018).
De acordo com Machado e Torres (2013), a precipitação é o processo pelo qual
a água condensada na atmosfera atinge a superfície terrestre. Ela pode ocorrer sob
a forma líquida ou pluvial (chuva ou garoa) ou sob a forma sólida (granizo e neve).
Alguns autores também consideram o orvalho e a geada como formas de precipitação.
Segundo Brutsaert (2005), a precipitação na superfície pode ocorre nas seguintes
formas:
• Chuva: trata-se da precipitação na qual as gotículas de água são maiores que
0,5 mm de diâmetro, podendo se diferenciar de acordo com a sua intensidade.
• Garoa: consiste na precipitação leve e uniforme, apresentando grande quantidade
de gotículas que não vão ultrapassar 0,5 mm de diâmetro.
• Neve: refere-se à precipitação em forma de cristais de gelo e sua formação está
ligada à passagem do vapor diretamente para o estado sólido, em função das
baixas temperaturas.
• Granizo: geralmente, ocorre durante tempestades onde as baixas temperaturas
congelam o vapor de água, podendo gerar blocos que variam de 5 a 50 mm.
• Orvalho: é formado pela pela condensação do vapor d’água próximo à superfície,
ocorrendo no período noturno devido à perda de calor da superfície. Alguns
autores não consideram o orvalho como precipitação por entenderem que não há

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“queda” de água por gravidade. No entanto, sua ocorrência, embora minoritária,


também é importante ao ciclo hidrológico.
• Geada: forma-se da mesma maneira que o orvalho, mas, devido às baixas
temperaturas, o vapor d’água se condensa diretamente em gelo.

Embora todos os tipos de precipitação sejam importantes ao ciclo hidrológico,


entendemos que a chuva é a que mais está relacionada ao retorno da água à superfície
terrestre. Devido à capacidade de gerar escoamento superficial, ela constitui a forma
de precipitação de maior interesse para a hidrologia, afinal, é a chuva que garante a
maior quantidade de entrada da água nas bacias hidrográficas, proporcionando seu
reabastecimento.
No entanto, a chuva também pode gerar uma série de problemas socioambientais
(Figura 19), ainda mais em países de clima predominantemente tropical, como é o
caso do Brasil, cujo regime pluviométrico é consideravelmente alto e é um importante
agente modelador do relevo.

Figura 19 – Deslizamento de encosta potencializado pela chuva.


Fonte: https://www.ecoambientale.com.br/blog/curiosidades/o-que-causa-o-deslizamento-de-encostas-em-areas-urbanas

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Além disso, o geógrafo tem que compreender os processos, as formas de ocorrência


e as consequências das chuvas para as sociedades humanas. As enchentes e os
escorregamentos de encostas (Figura 19) são exemplos de fenômenos físicos
que ocorrem em detrimento de uma série de fatores físicos, juntamente com as
características climáticas de cada região, mas as ocupações humanas e o uso do solo
influenciam diretamente na ocorrência desses fenômenos. É por isso que é objetivo
da ciência geografia compreender, também, o fenômeno da precipitação.

4.2 Como ocorre a precipitação?

Para compreendermos o processo de precipitação de forma detalhada, temos


que resgatar alguns conceitos vistos no capítulo 3 acerca do ciclo hidrológico. Você
se lembra como se dá o processo de precipitação? Vale a pena relembrarmos para
aprofundar!
Pela ação da energia térmica do sol, tanto a água oceânica quanto a água continental
são evaporadas. Ao ser evaporada, essa água se torna menos densa que a atmosfera,
e sobe. É importante compreendermos que a maior presença de vapor de água na
atmosfera diminui a densidade do ar, pelo fato do peso molecular da água ser menor
do que o peso molecular médio do ar. Portanto, em iguais temperaturas e volumes,
uma massa de ar mais úmida exerce menor pressão que uma massa de ar mais seca.

ANOTE ISSO

O peso molecular da água é de 18,016 kg/mol, enquanto o peso molecular médio


do ar é de 28,97 kg/mol. Dessa forma, quando o ar se encontra carregado de
umidade, ele tende a ser menos denso e subir na atmosfera. Entender esse
fenômeno auxilia no entendimento de como ocorre a precipitação.

Na medida em que o vapor d’água vai ganhando altitude, ele se resfria e se condensa,
até atingir seu ponto de saturação, ou seja, sua capacidade de conter umidade. A
condensação é o processo pelo qual o vapor d’água contido no ar atmosférico é novamente
transformado em água líquida. É assim que as nuvens são formadas. A condensação
desse vapor no interior de uma massa de ar se dá quando atinge a saturação, isto
é, quando há diminuição da capacidade de retenção de vapor de água (MACHADO;

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TORRES, 2013). Dizemos, então, que o ar está saturado quando ele apresenta a
concentração máxima de vapor d’água que pode conter.

ANOTE ISSO

A relação estabelecida entre a concentração de vapor de água existente no ar e


a concentração máxima é definida como umidade relativa do ar e é expressa em
porcentagem.

Dessa forma, a condensação resulta do resfriamento do ar úmido, que se dá pela


ascensão do ar quente, que, ao ganhar altitude, se resfria. Assim, quanto menor
a temperatura, menor será a quantidade de água necessária para saturar o ar.
Em outros termos, o ar contendo grande quantidade de vapor de água (ar úmido)
tem menor densidade em relação ao ar atmosférico de baixa umidade e sobe.
Na medida em que ganha altitude, ele se resfria, haja vista que, na troposfera,
quanto maior é a altitude menor é a temperatura. Ao se resfriar, o vapor d’água
se condensa, transformando-se novamente em água líquida.
Até um determinado momento, as gotículas de água ainda permanecem em
suspensão na atmosfera por apresentarem pequenas dimensões. Podemos dizer
que, nesse momento, as forças ascendentes da atmosfera estão segurando essas
gotículas. No entanto, começa a ocorrer agregação e junção das gotículas que
acabam se colidindo ou se juntando e atingindo um tamanho suficiente para que
sejam vencidas pela força da gravidade.
A precipitação vai ocorrer pelas próprias características físicas do fenômeno
descrito anteriormente, porém, há de se observar que o ar está cheio de
micropartículas em suspensão, sendo elas de sulfato de sódio, cloreto de sódio,
hidrocarbonetos, grãos de pólen, argila, sais marinhos, entre muitas outras de
origem orgânica e inorgânica, denominadas aerossóis (MACHADO; TORRES, 2013;
TAVEIRA, 2018). Essas partículas auxiliam no processo de condensação e estimulam
a formação de gotas, funcionando como núcleos de condensação, facilitando a
precipitação.

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ANOTE ISSO

Os aerossóis consistem na dispersão de partículas de pequenas dimensões, sólidas


ou líquidas, em um meio gasoso. A química dos aerossóis abrange, além da sua
produção, suas aplicações em diversos produtos e os seus impactos no meio
ambiente. Eles podem ter origem natural (como o aerossol marinho) ou industrial.
Os aerossóis atmosféricos pode causar diversos impactos negativos como:
diminuição da visibilidade, problemas respiratórios, deposição de sujeira em
superfícies, além de potencializar a corrosão atmosférica e favorecer a formação de
novas espécies de poluentes, a partir de outros poluentes presentes na atmosfera.
Porém, também são importantes em diversos processos presentes em nossa
atmosfera, entre eles a precipitação meteórica.

ISTO ESTÁ NA REDE

Um estudo divulgado pela revista Science e reproduzido pelo Jornal da USP (2018)
revelou como a presença atmosférica de partículas ultrafinas de aerossol pode
intensificar o processo de formação de nuvens e também as chuvas que caem
sobre a região amazônica.
“As partículas de aerossol são essenciais no processo de formação de nuvens
porque são elas que oferecem uma superfície para o vapor d’água se condensar. As
gotículas formadas pela condensação são pequenas, mas elas acabam colidindo
umas com as outras e, assim, crescendo. As gotas aumentam de tamanho e,
quando ficam pesadas o suficiente, precipitam”

Confira a reportagem inteira neste link:


https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-ambientais/particulas-ultrafinas-aerossol-
intensificam-as-chuvas-na-amazonia/

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4.3 Tipos de chuva

Conforme vimos no tópico anterior, a chuva pode ser definida como o conjunto de
águas originárias do vapor de água atmosférico que se precipitam, em estado líquido,
sobre a superfície terrestre. Sua formação sempre está relacionada à ascensão das
massas de ar quente e úmida e à formação de nuvens.
Elas podem ser classificadas em três tipos principais, relacionadas à sua gênese:
chuvas convectivas; chuvas chuvas frontais; chuvas orográficas ou de relevo, conforme
demonstrado na Figura 20.

Figura 20 – Tipos mais comuns de chuvas.


Fonte: CRUZ (2016).

As chuvas convectivas (Figura 20-1) são formadas pelo aquecimento das massas de
ar concentradas, que se encontram em contato com a superfície aquecida (terra ou
oceano). Ao aquecer, essas massas de ar quente e úmida ganham altitude e condensam,
em função da temperatura. Esse tipo de chuva é bem comum em regiões equatoriais
onde a evaporação é mais intensa. Ocorrem também com maior frequência no verão,
em clima tropical. As chuvas se caracterizam por serem intensas, mas de curta duração.

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As chuvas frontais, também chamadas de chuvas normais (Figura 20-2), são as mais
comuns e resultam da instabilidade causada pelo encontro de duas massas de ar,
normalmente uma massa de ar quente que se choca com uma massa de ar frio. No
encontro das duas massas, a frente de contato da massa de ar mais quente e úmida
é empurrada violentamente para cima, causando o resfriamento dessa massa e, como
consequência, a precipitação.
Diferentemente das chuvas convectivas, que são de curta duração, as chuvas frontais
costumam ser intensas, contínuas e afetam grandes áreas. São mais comuns em
áreas de médias latitudes. Essas chuvas, associadas a frentes frias, são geralmente
bem severas e geram tempestades e ventos fortes.
As chuvas orográficas ou de relevo (Figura 20-3) ocorrem devido à ascensão forçada
de ventos úmidos causados por um obstáculo do relevo, geralmente montanhas
ou serras. Essa massa de ar que se eleva, gradativamente se esfria, provocando a
condensação e a posterior precipitação. As vertentes do obstáculo voltadas para o
vento se denominam barlavento e são nelas que as chuvas vão cair. Do outro lado do
obstáculo, denominado sotavento, o ar descendente é seco e mais frio.

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

O professor de Geografia encontra muitas dificuldades em passar alguns


conceitos para os alunos de uma forma que evite a estes decorar as terminologias
sem entender os processos. No entanto, em alguns momentos, os alunos,
principalmente aqueles das séries mais iniciais, vão se deparar com situações em
que é necessário fixar algumas terminologias. Assim, podemos utilizar algumas
técnicas para auxiliar o aluno nesse processo. Ao explicar sobre as chuvas
orográficas, temos que explicar sobre os conceitos de barlavento e sotavento. Como
você faria?
Coloco aqui para você, futuro(a) professor(a), uma dica divertida e didática para
passar a seus alunos(as), de modo que eles compreendam, mas também fixem os
conceitos. Barlavento é a vertente onde o vento vai ser “barrado”, portanto, compare
o termo barlavento com “barra-vento”. No caso do sotavento, podemos comparar
com “só tá o vento”, porque a chuva ficou toda do outro lado e aqui “só ficou o
vento”.

No Brasil, nós temos um caso significativo da ocorrência de chuvas orográficas


na Região Nordeste, em decorrência do planalto da Borborema, que serve como

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barreira orográfica. Esse planalto, localizado nos Estados de Alagoas, Pernambuco,


Paraíba e Rio Grande do Norte, pode apresentar picos de até 1.200 m de altitude.
Em decorrência dessa elevação, constitui-se uma barreira que impede, ou dificulta,
a passagem da umidade vinda do Atlântico em direção ao Sertão Nordestino. Dessa
forma, a precipitação vai ocorrer na zona da mata nordestina (barlavento), enquanto
do outro lado (sotavento) vai prevalecer a massa de ar seca, contribuindo para o clima
semiárido daquela região.
Outro exemplo clássico desse fenômeno é também encontrado aqui na América do
Sul, na região do deserto do Atacama, no Chile, considerado o mais árido do mundo.
A cordilheira dos Andes serve como uma enorme barreira que impede a passagem
da umidade do oceano Pacífico ao continente. Outros fatores geográficos também
contribuem para a aridez desta região, no entanto, esse é o fator primordial.

4.4 Precipitações e medições: prática de campo

Agora que compreendemos o processo de formação das chuvas e os tipos de


precipitação, vamos ver de maneira mais prática de que forma o geógrafo coleta os
dados para a realização de suas pesquisas?
A precipitação é caracterizada pela quantidade, duração e intensidade. A quantidade
é expressa pela altura da água caída e acumulada sobre uma superfície plana e
impermeável, medida em milímetros (mm). Geralmente, essa medida se refere a um
período de tempo de 24 horas. A duração da precipitação é o tempo decorrido entre
o seu início e o seu término. A intensidade, por outro lado, se dá pela quantidade de
água precipitada por unidade de tempo, usualmente definida por milímetros por hora
(mm/h) (MACHADO; TORRES, 2013).
Para a coleta desses dados, são utilizados instrumentos dos mais variados tipos,
entretanto, os dois mais comuns são o pluviômetro (Figura 21) e o pluviógrafo (Figura
22).
O pluviômetro é constituído por um recipiente metálico dotado de funil com anel
receptor, geralmente com uma proveta graduada para leitura direta da lâmina de água
precipitada. Esse instrumento armazena a água da chuva e, fazendo-se a leitura da
proveta, tem-se a lâmina precipitada. Dessa maneira, o pluviômetro indica a precipitação
ocorrida nas últimas 24 horas, desde a última leitura.

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Figura 21 – Pluviômetro instalado em diversos locais para a coleta de dados.


Fonte: https://www.researchgate.net/publication/321152810_CARACTERISTICAS_DAS_CHUVAS_E_INTERCEPTACAO_VEGETAL_NO_BIOMA_CAATINGA/
figures?lo=1

Observa-se, na Figura 21, que o pluviômetro pode ser utilizado em diversas situações
em campo. Por exemplo, imagine que faremos um estudo em que precisamos coletar
dados pluviométricos de uma determinada área e estabelecer a relação da cobertura
vegetal com a quantidade de água que cai no solo. Dessa forma, posicionamos
nossas amostras em lugares heterogêneos. A exemplo da figura citada anteriormente,
primeiramente, posicionamos o instrumento em uma área aberta (a); em seguida,
colocamos outro instrumento em uma área com vegetação arbórea (b); e, depois,
colocamos outro no tronco da árvore para medir o escoamento da água nesse ambiente.
Como resultado, teremos índices diferentes em cada uma das amostras, haja vista
que, na área aberta, por exemplo, não haverá interceptação da água por parte da
vegetação. Na área (b), a vegetação vai interceptar a água da chuva e essa água vai
cair no instrumento de maneira mais lenta, comprovando a importância da vegetação
para evitar o escoamento superficial.
Outro instrumento muito utilizado é o pluviógrafo (Figura 21). Trata-se de um
instrumento um pouco mais sofisticado e se difere do pluviômetro basicamente por
ter um mecanismo de registro automático da precipitação, gerando informações mais

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precisas quanto ao tempo de duração e à intensidade da pluviosidade, haja vista que o


aparelho registra o momento exato do aumento da quantidade de chuva e sua duração.

Figura 22 – Pluviógrafo analógico.


Fonte: O autor

Os pluviógrafos analógicos e menos sofisticados utilizam um braço mecânico


para traçar um gráfico em papel graduado, apresentando os valores precipitados. Os
aparelhos mais modernos são digitais e o registro é feito da mesma maneira, porém,
marcam a informação de forma magnética e transmitem esses dados de forma remota,
possibilitando a manipulação dos dados em tempo real.
Os dois aparelhos são os mais utilizados, principalmente no meio científico e também
como recurso didático ao ensino de Geografia. Os dois têm a mesma finalidade, a
diferença que o pluviógrafo vai trazer dados mais precisos, relacionado ao tempo e à
duração da ocorrência da precipitação, além de ser mais prático, pois não necessita
da visita diária do operador e isso é uma vantagem, a depender do local onde os
dados são coletados.

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CAPÍTULO 5
BACIAS HIDROGRÁFICAS:
CONCEITOS E DEFINIÇÕES

5.1 O que são as bacias hidrográficas?


As bacias hidrográficas ganham relevância atual, principalmente nos estudos
ambientais, por terem sido adotadas em diversos países como unidades físico-
territoriais para diversas intervenções relacionadas à gestão dos recursos hídricos.
Também têm sido objeto de estudo de diversas áreas do conhecimento, entre elas a
ecologia, geologia, engenharia ambiental, entre outras. Porém, é a ciência geográfica,
especialmente a Geografia Física, que a utiliza de forma mais aprofundada como
objeto de estudo da paisagem.
Tanto quanto pode ser diferenciada a aplicação dos estudos em uma bacia
hidrográfica, diversas também são as definições do que se entende por esse importante
recorte espacial. Então, caro(a) aluno(a), o que podemos entender por bacia hidrográfica?
Barrella et al. (2001) conceituam bacia hidrográfica como um conjunto de terras
drenadas por um rio e seus afluentes. Ela é geralmente formada nas regiões mais altas
do relevo, delimitada pelos divisores de água, onde as águas das chuvas ou escoam
superficialmente para as partes mais baixas do terreno, formando os riachos e rios,
ou infiltram no solo para a formação das nascentes e do lençol freático. À medida que
as águas descem das vertentes, juntam-se a outros riachos, aumentando o volume e
formando os primeiros rios. Esses pequenos rios continuam seus trajetos recebendo
água de outros tributários, formando rios maiores até desembocarem no oceano.
De acordo com a Agência Nacional de Água (ANA, 2011, p. 11), denomina-se Bacia
Hidrográfica:

[...] a região compreendida por um território e por diversos cursos


d’água. Da chuva que cai no interior da bacia, parte escoa pela
superfície e parte infiltra no solo. A água superficial escoa até um
curso d’água (rio principal) ou um sistema conectado de cursos
d’água afluentes; essas águas, normalmente, são descarregadas por
meio de uma única foz (ou exutório) localizada no ponto mais baixo da
região. Da parte infiltrada, uma parcela escoa para os leitos dos rios,
outra parcela é evaporada por meio da transpiração da vegetação e
outra é armazenada no subsolo compondo os aquíferos subterrâneos.

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De forma complementar, Venturi (2011, p. 57) define bacia hidrográfica como:

[...] um sistema que compreende um volume de materiais,


predominantemente sólidos e líquidos, próximo à superfície terrestre,
delimitado interna e externamente por todos os processos que, a
partir dos fornecimentos de água pela atmosfera, interferem no fluxo
de matéria e de energia de um rio ou de uma rede de canais fluviais.
Inclui, portanto, todos os espaços de circulação, armazenamento, e
de saídas da água e do material por ela transportado, que mantêm
relações com esses canais.

Podemos ver que, entre os autores discutidos nos parágrafos anteriores, há algumas
relações de ideias que podem nos ajudar em uma definição mais simplificada do termo.
Dessa maneira, podemos definir bacia hidrográfica como a área delimitada por um
divisor de águas, denominado interflúvio, que drena as águas da chuva para um curso
principal (rio ou córrego), convergindo para uma única saída (exutório), desaguando
diretamente para um rio maior, um lago ou para o oceano. Ou seja, a bacia é constituída
por um conjunto de vertentes, sobre o qual a água precipitada escoa para compor uma
rede de drenagem formada por cursos d’água que confluem até o exutório, também
denominado foz.
Dessa forma, as bacias são drenadas por um rio principal e por todos os seus
afluentes (rios e córregos), também denominados tributários. Geralmente, as bacias
recebem o nome de seu rio principal. Por exemplo, o município de Marília se localiza
na bacia hidrográfica do rio do Peixe, no qual esse rio é o principal e a bacia recebe
esse nome. Um dos rios que banha o município é o ribeirão Barbosa, que é tributário
do rio do Peixe, que, por sua vez, é tributário do rio Paraná.
A rede fluvial, ou rede de drenagem, que compõe uma bacia, é constituída por
rios, córregos e riachos e é a responsável pela coleta e distribuição das águas e
dos sedimentos de uma área para a outra. Além da própria composição da rede de
drenagem, outros elementos também são importantes e interferem diretamente na
captação de água e sedimentos em uma bacia hidrográfica, entre eles a rocha, o solo,
a vegetação e o próprio uso humano do solo.
Nesse sentido, todas as mudanças ocorridas em uma bacia interferem nos rios que a
compõem. A água dos rios é alimentada diretamente pela precipitação e indiretamente
pela água infiltrada que abastece o sistema de forma mais lenta. Por isso, qualquer
modificação nos elementos apontados anteriormente podem alterar drasticamente
a rede fluvial, em diferentes porções da bacia.

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A Figura 23 ilustra os principais elementos componentes de uma bacia hidrográfica:

Figura 23 – Elementos de uma bacia hidrográfica


Fonte: https://geoverdade.com/2018/05/10/o-que-e-uma-bacia-hidrografica/

O rio é uma corrente contínua de água que deságua no mar, em um lago ou em


outro rio. Quando deságua em outro rio, chamamos afluente. O ponto de encontro
entre dois cursos d’água diferentes denomina-se confluência.

ANOTE ISSO

Os rios são responsáveis pela drenagem de uma bacia, isto é, por transportar
sedimentos de um ponto para outro e, por isso, são capazes de alterar as formas
do relevo ao longo do tempo.

A bacia hidrográfica pode ser considerada um sistema, cuja entrada é o volume


de água precipitado na área da bacia e a saída é o volume de água escoado pelo
exutório. Entretanto, é um sistema aberto (Figura 24), haja vista que apenas parte da
precipitação é escoada para a saída do sistema ou fica armazenada na própria bacia.

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Lembrando o que já vimos, uma parcela dessa água precipitada sofre infiltração ou é
interceptada pela vegetação, sendo posteriormente evaporada.

Figura 24 – Representação da bacia hidrográfica como sistema aberto


Fonte: https://geoverdade.com/2018/05/10/o-que-e-uma-bacia-hidrografica/

Desse modo, parte da água é “perdida” para a atmosfera, no caso da evaporação, ou


para camadas mais profundas do subsolo, onde não retornará ao sistema. Além disso,
outra parte dessa água que entra na bacia acaba sendo utilizada para abastecimento
doméstico, atividades industriais e agrícolas, entre outras atividades humanas da
população residente.
Assim, no meio tempo de entrada da água na bacia (precipitação) e da vazão de
saída, decorrem todos os processos. A precipitação que cai sobre a bacia hidrográfica
atinge as vertentes e se infiltra no solo até que ele atinja sua saturação, gerando, dessa
forma, o escoamento superficial das vertentes para as redes de drenagem (cursos
d’água), que transporta a água até o exutório.
Parte da água precipitada se infiltra no solo e na rocha, alimentando o lençol freático,
que, de acordo com as características do terreno, podem aparecer na superfície,
processo denominado afloramento do lençol freático, que constituem as nascentes
dos rios, conforme vimos de forma mais detalhada no capítulo 3.
No entanto, a formação de rios também pode estar vinculada ao degelo das
montanhas durante períodos em que as temperaturas estão mais elevadas, como é
o caso do rio Amazonas, por exemplo, que nasce por meio do degelo da água contida
na cordilheira dos Andes.
De acordo com a forma que a água escoa para fora do sistema, as bacias hidrográficas
podem ser classificadas em quatro tipos:

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• Exorreica: quando a bacia drena suas águas direta ou indiretamente para o mar.
A maior parte dos rios têm essa dinâmica.
• Endorreica: quando a bacia hidrográfica drena suas águas para um lago ou um
mar fechado, como, por exemplo, nos rios que deságuam nos Grandes Lagos,
entre os Estados Unidos e o Canadá. Não temos esse tipo de drenagem em
nosso país.
• Arreica: quando há escoamento das águas para o lençol freático, alimentando
as águas subterrâneas ou evaporam pela ação do forte calor. Esse tipo de bacia
é muito comum em regiões desérticas.
• Criptorreica: quando a água dos rios que formam a bacia hidrográfica se infiltra
no subsolo, formando os chamados rios subterrâneos. Esse tipo de bacia é
comum em áreas de formação calcária.

As bacias hidrográficas são referências e/ou recortes espaciais importantíssimos


para o estudo do meio físico, haja vista que subsidia grande parte da legislação e do
planejamento territorial no Brasil e em diversos outros países do mundo. Porém, esse
assunto será melhor tratado nos capítulos posteriores.

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Recursos didáticos para trabalhar bacias hidrográficas em sala de aula


Quando trabalhamos Geografia com alunos do Ensino Fundamental, é necessário
que possamos desenvolver o conteúdo das aulas de maneira lúdica e criativa.
Devemos despertar o interesse e a curiosidade dos alunos para o processo de
aprendizagem. Procure sempre trabalhar com jogos, brincadeiras, confecção de
maquetes e desenhos, rompendo, dessa forma, a formalidade do livro didático. É
fazendo que os alunos aprendem com mais facilidade, portanto, procure sempre
utilizar metodologias ativas.
Uma ideia simples e divertida de trabalhar o conteúdo de bacias hidrográficas em
sala de aula é utilizar uma folha de couve como forma de representar uma bacia
hidrográfica. Olha só as semelhanças entre a bacia e a couve!

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Figura 25 – Representação lúdica de uma bacia hidrográfica


Fonte: https://media-exp1.licdn.com/dms/image/C4D22AQEC4aRMVRWnoQ/feedshare-shrink_2048_1536/0/1591624787099?e=2147483647&v=beta&t
=BcU9yG_4Rm1axEnw7cajQB0vqa-YceMLR7VzFrG5qL8

A forma como vai ser desenvolvida a atividade fica a critério de cada professor. No
entanto, podemos sugerir a seguinte ideia:
• Leve a folha de couve para a sala de aula e explique que ela, neste momento,
pode ser compreendida como um modelo mais simples de representação da
bacia hidrográfica.
• Explore a imagem e pergunte aos alunos que, se a folha de couve fosse a nossa
representação de bacia hidrográfica, onde seria o rio principal, seus afluentes e o
curso d’água.
• Pergunte aos alunos qual parte da couve podemos considerar a foz do rio e qual
seria a sua nascente. Explique que faz parte da bacia hidrográfica toda a água
superficial e subterrânea em direção ao leito de um curso d’água. Aproveite esse
momento para relembrar o ciclo da água com os alunos e também a formação
das águas subterrâneas responsável por manter o equilíbrio hídrico dos rios e
lagos.
• Lembre-se que isso é apenas um recurso didático e, de forma alguma, deve
substituir o conteúdo explicado em sala. O professor deve procurar relembrar os
conceitos antes, durante e depois da atividade proposta.

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5.2 Delimitação de bacias hidrográficas

Uma vez definido o que se entende por bacia hidrográfica, como podemos definir,
então, seu limite? Como estabelecemos que um determinado tributário faz parte de
uma determinada bacia e não da outra ao seu lado, por exemplo?
Não importa a técnica utilizada, a bacia é sempre delimitada identificando os
interflúvios, que são seus divisores topográficos. Entendendo-se que uma bacia
hidrográfica é definida como um conjunto de vertentes que direcionam a água para
o ponto mais baixo, e o escoamento superficial se dá pela ação da gravidade, vindo
das cotas mais altas, fica simples compreender que a região das áreas mais altas
estabelecem uma divisão de terreno, onde, a depender da localização da água, ela irá
escoar para uma bacia ou para outra.
Observe que, na Figura 26, o divisor de águas (Interflúvio) são as áreas mais altas
da bacia e representa o limite entre as bacias do rio A e a do rio B. Dessa forma, as
águas que escoam superficialmente no lado esquerdo da vertente vão compor a bacia
do rio A, ocorrendo o mesmo para a bacia do rio B.

Figura 26 – Divisor de águas de duas bacias hidrográficas


Fonte: GROTZINGER; JORDAN (2013, p. 510) (adaptado)

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É importante salientar que o divisor de águas, também denominado divisor


topográfico, espigão, linha cumeada ou interflúvio, segue uma linha rígida em torno
da bacia, atravessando o curso d’água somente no exutório.
Saber delimitar uma bacia hidrográfica é um fator essencial para o geógrafo ou qualquer
outro profissional que aborde a temática ambiental, haja vista que a bacia hidrográfica
é uma unidade de paisagem de enorme importância à gestão dos recursos hídricos, à
gestão do uso do solo e também para inúmeros estudos científicos ligados à hidrologia.
Antes de qualquer coisa, é importante pontuar que a delimitação da bacia hidrográfica
é arbitrária e segue os interesses e objetivos de cada estudo, obedecendo aos critérios
geográficos de escala e recorte espacial. Nesse sentido, por exemplo, ao realizar um
estudo de análise do uso do solo da bacia hidrográfica do rio Paranapanema, ter-se-ia
que delimitar toda a bacia desse grande rio. Ocorre que, em determinados estudos,
há a necessidade de trabalhar em escalas maiores, ou seja, em áreas menores, sendo
necessária a subdivisão de uma bacia hidrográfica, tendo, então, como recorte espacial,
uma sub-bacia ou uma microbacia.
Geralmente, os limites da bacia são estabelecidos analisando a topografia do terreno, de
forma analógica, por meio de cartas topográficas ou de maneira digital, utilizando imagens
de satélite, como por exemplo as imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission).
A carta topográfica é uma representação cartográfica em escala de um terreno
mostrando a localização altimétrica e planimétrica de determinada feição do relevo. A
posição altimétrica é mostrada por curvas de nível, que, segundo Taveira (2018, p. 27):

[...] são linhas imaginárias de igual distância que representam o relevo


em determinada área. Os pontos cotados são pontos localizados em
determinada coordenada geográfica que tem também uma informação
de altitude. Os pontos são informações adicionais às curvas, para
representar áreas específicas – por exemplo, topos de morros.

O exutório será o ponto escolhido para a delimitação da bacia, geralmente localizado


em uma confluência de dois rios, mas também pode estar em qualquer parte do
percurso do rio, de acordo com o objetivo e a necessidade do estudo. Após a definição
do exutório, inicia-se o traçado de delimitação da bacia em direção à nascente.
Para ilustrar, tomemos como exemplo a Figura 27, que representa a delimitação de
uma bacia hidrográfica, no caso, a bacia do córrego B. Repare que foi necessário utilizar
a carta topográfica para analisar os limites entre a rede de drenagem pertencentes
ao córrego A e as pertencentes ao córrego B.

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Perceba que as duas bacias estão separadas por um interflúvio cuja cota altimétrica é de
113 metros de altitude, provavelmente representando um topo de morro. O que podemos
compreender com isso? Toda a água que vai escoar à direita dessa vertente pertencerá à
bacia do córrego B, conforme facilmente observado no perfil traçado da referida Figura.
Repare que as curvas de nível representam cotas de 5 em 5 metros. Dessa forma,
na bacia do córrego B, os pontos mais baixos estão a 100 metros de altitude, enquanto
o córrego A está a 95 metros de altitude.

Figura 27 – Delimitação de uma bacia hidrográfica e perfil transversal topográfico


Fonte: DAEE (2008)

Assim, os limites da bacia serão os pontos mais representados pelas curvas de


nível. Então, ao determinar o exutório, deverá ser traçada uma linha em direção à
nascente do rio principal, delimitando os pontos mais altos do relevo.
É importante notar, caro(a) aluno(a), que, nesse exemplo, foi necessário traçar uma
bacia que separasse os dois córregos, porém, muito provavelmente, eles pertencem
à mesma bacia de maior grandeza, mostrando que a delimitação de uma bacia se dá
pela necessidade e escala dos objetos a serem observados pelo pesquisador ou tem
que estar de acordo com o objetivo de determinado projeto.
Ainda que haja ferramentas atuais na área de geoprocessamento que facilitam ou
até mesmo delimitam automaticamente os limites de uma bacia, é de fundamental
importância o conhecimento dos elementos necessários e dos critérios utilizados
para sua delimitação, ainda mais para quem vai ensinar geografia.

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ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Atualmente, os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) são amplamente


utilizados para a delimitação de bacias hidrográficas. Os softwares de
geoprocessamento possibilitam um conjunto de técnicas capazes de automatizar o
que anteriormente era efetuado manualmente pelo geógrafo ou cartógrafo.
A Missão Topográfica Radar Shuttle (Shuttle Radar Topography Mission – SRTM)
foi uma missão espacial da National Aeronautics and Space Administration (NASA)
que teve como objetivo obter um Modelo Digital do Terreno (MDT) da Terra para
gerar uma base de cartas topográficas digitais terrestres de alta resolução. Para
o levantamento de dados topográficos (elevação), a SRTM utilizou a técnica
de interferometria, na qual duas imagens obtidas de pontos de vista diferentes
(distantes 60 m) permitem a determinação da altitude da superfície (NASA, 2013).
As imagens SRTM podem ser manipuladas com uso de softwares de
geoprocessamento como o QGIS, ArGIS pro, SPRING, entre outros. Elas substituem
as cartas topográficas, pois seu uso possibilita, além de outras coisas, gerar
curvas de nível de determinada área, permitindo a elaboração de modelos digitais
tridimensionais do terreno, informações de declividade, valores isométricos e
informações de gradientes altimétricos, etc.

Figura 28 – Delimitação de uma bacia hidrográfica utilizando imagem SRTM.


Fonte: http://www.dsr.inpe.br/sbsr2015/files/p0791.pdf

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A resolução espacial dessas imagens, que estão disponíveis para acesso livre e uso
irrestrito, é de 90 metros. As imagens SRTM podem ser obtidas nos seguintes sites:

NASA – http://www2.jpl.nasa.gov/srtm/
EMBRAPA - http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br
EMBRAPA - http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br/download/index.htm
INPE - Projeto TOPODATA:
http://www.dsr.inpe.br/topodata/
http://www.dsr.inpe.br/topodata/data/geotiff/
http://www.dsr.inpe.br/topodata/data/geotiff/

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CAPÍTULO 6
PADRÕES DE DRENAGEM
E MORFOLOGIA DE
CANAIS FLUVIAIS

6.1 Classificação física das bacias hidrográficas


O estudo detalhado de uma bacia hidrográfica é fundamental à sua utilização e ao
manejo mais adequado de seus recursos, especialmente os hídricos. Assim, é importante
observar suas características físicas, mas também o parcelamento e o uso do solo, fatores
que vão influenciar diretamente na dinâmica hídrica de uma bacia hidrográfica.
Neste capítulo, no entanto, vamos nos ater de forma mais aprofundada às
características físicas das bacias hidrográficas e da morfologia fluvial, deixando os
aspectos de uso e ocupação do solo para outro momento.
Em hidrologia, uma bacia hidrográfica pode ser analisada de acordo com seus
diversos aspectos fisiográficos. Consideramos dados fisiográficos todos aqueles que
podem ser extraídos de mapas, cartas topográficas, fotografias aéreas e imagens de
satélite e, nesse caso, são os fatores físicos de uma bacia hidrográfica, no qual terão
influência direta na sua dinâmica interna. A análise conjunta e integrada dos fatores
fisiográficos de uma bacia é denominada análise morfométrica.
Nos itens a seguir, abordaremos os principais aspectos fisiográficos que influenciam
na dinâmica hídrica em uma bacia, dando ênfase a alguns indicadores que julgamos
serem os mais utilizados e determinantes nessa dinâmica, entre eles a forma da bacia;
declividade média das vertentes; densidade da drenagem e padrões de drenagem;
comprimento e formato dos corpos d’água.

ANOTE ISSO

“Aspectos fisiográficos” estão relacionados à Fisiografia, que consiste em uma


ciência autônoma que estuda as características e as modificações do relevo, porém,
ela é utilizada de forma integrada pela Geografia Física, servindo de aporte para
disciplinas como Geomorfologia e Hidrologia, por exemplo.

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6.1.1 Área, perímetro e forma da bacia

A área da bacia é também chamada área de drenagem ou área de contribuição (A)


e corresponde a toda a área drenada pelo conjunto do sistema fluvial. É extremamente
importante, pois serve como elemento base para o cálculo de outras características
físicas da bacia. É expressa em m², hectares (ha) ou em km². O perímetro (P), por sua
vez, corresponde ao comprimento dos limites estabelecidos pelos divisores de água,
podendo ser expresso em metros (m), quilômetros (km).
A forma da bacia é um dos dados mais importantes, pois tem efeito sobre o
comportamento hidrológico. Ela vai influenciar diretamente no escoamento superficial
e no padrão de comportamento da rede de drenagem, como, por exemplo, no tempo
de contribuição (Tc).

ANOTE ISSO

O tempo de contribuição (Tc) é definido como o tempo necessário para que toda a
bacia contribua com a vazão até o exutório. Esse tempo se inicia na precipitação, ou
seja, no momento em que a água cai na bacia hidrográfica.

Geralmente, as grandes bacias hidrográficas têm formato de uma pêra ou um leque,


porém, as pequenas bacias variam de formato e isso depende de uma série de fatores
como a estrutura geológica do terreno, relevo e do solo (MACHADO; TORRES, 2013).
A Figura 29 ilustra três formatos diversos de bacias, demonstrando que o formato
influencia no tempo (T) de vazão (Q) da água. Repare que, quanto mais circular é o
formato, maior é o tempo que essa água vai demorar para sair do sistema. Isso ocorre
porque, no formato circular, toda a água da bacia converge para um trecho pequeno do
rio principal em curto espaço de tempo. O formato circular tem mais possibilidades de
acumular águas de chuvas intensas que ocorrem em toda a sua extensão, concentrando
grande volume de água no rio principal, enquanto nos formatos mais alongados, o
escoamento é mais bem distribuído temporalmente no canal principal, diminuindo a
possibilidade de enchentes.

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Figura 29 – Formas das bacias hidrográficas.


Fonte: https://www.researchgate.net/publication/277862978_HIDROGEOMORFOLOGIA_PRINCIPIOS_CONCEITOS_PROCESSOS_E_APLICACOES/figures?lo=1

É bom que se esclareça que a Figura 29 apresenta bacias hidrográficas com formatos
diferentes, mas com a mesma área de drenagem e com as mesmas características
físicas. Em outras palavras, em igualdade de fatores geológicos, pedológicos, de uso e
ocupação do solo, entre outros fatores, quanto mais arredondada for uma bacia, maior
será a sua tendência à ocorrência de cheias e possibilidade de enchentes. É claro que,
quando fazemos esse tipo de análise, outros fatores, descritos anteriormente, devem
ser considerados, pois também influenciam na vazão da água.
As bacias de formatos retangulares, trapezoidais ou triangulares, também são menos
suscetíveis a enchentes do que as circulares, ovais ou quadradas (ROCHA; KURTZ,
2001).
Há diversas métricas para a análise da forma da bacia, entre os principais estão os
índice de compacidade (kc), que relaciona o perímetro da bacia e um círculo de área
igual; e o índice de circularidade (Ic), que expressa a relação existente entre a área da
bacia e a área do círculo de mesmo perímetro.

6.1.2 Declividade média (Dm ou H)


A declividade média das vertentes em uma bacia hidrográfica é um dos fatores mais
importantes para o entendimento da sua dinâmica hídrica. Ela tem relação importante

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com vários processos hidrológicos, tais como a infiltração, o escoamento superficial


e a umidade do solo.
Sabendo da declividade, sempre em conjunto com outros fatores fisiográficos, é
possível inferir a fragilidade ambiental de uma bacia e sua suscetibilidade a processos
erosivos. É a declividade que controla o tempo de escoamento superficial, que vai ter
relação direta com a magnitude da enchente ou processos erosivos. Quanto maior
a declividade, maior serão os processos erosivos e a possibilidade de acúmulo de
águas na rede de drenagem.
Ao compararmos bacias hidrográficas de uma mesma região, observamos que os
valores mais altos de declividade média identificam bacias com maior vulnerabilidade
de sofrerem erosão por escoamento hídrico superficial (MACHADO; TORRES, 2013).
Ou seja, quanto mais íngreme for o terreno, mais rápido será o escoamento superficial,
fato que contribuirá diretamente ao aumento das enchentes e dos processos erosivos.
Calculando-se a diferença entre a elevação máxima e a elevação mínima de uma
bacia, é possível obter sua “amplitude altimétrica”. Dividindo-se a amplitude altimétrica
pelo comprimento da bacia, obtém-se a média da declividade, expressa na fórmula
a seguir:
.
S = (D L/A) 100 .
Onde:
S é a declividade média (%)
D é a distância entre as curvas de nível (m)
L é o comprimento total das curvas de nível (m)
A é a área da bacia hidrográfica (m²)

Ao realizar esse cálculo, é necessário atenção às particularidades de cada ponto,


pois se trata de um valor médio de declividade. Para isso, é desejável traçar um
perfil longitudinal da bacia hidrográfica, observando os pontos de maior cuidado (mais
declives).
Outra questão que facilita a análise da declividade em bacias hidrográficas é a
confecção de um mapa de declividade, utilizando uma carta topográfica ou imagens
de satélite, por exemplo as imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission).
A Figura 30 ilustra um exemplo de como um mapa de declividade pode facilitar um
estudo de fragilidade ambiental em bacias hidrográficas na área urbana:

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Figura 30 – Mapa de declividade da bacia do córrego Cleópatra/Moscados, Maringá-PR.


Fonte: NIGRO (2020)

Neste estudo, Nigro (2020) optou por utilizar os intervalos de classificação de


declividade propostos pela EMBRAPA (2006), que considera as classes de 0 a 3%
Plano; 3 a 8% Suave ondulado; 8 a 20% Ondulado; 20 a 45% Forte ondulado; 45 a 75%
Montanhoso, e valores maiores que 75% Escarpados.
Baseando-se nos estudos de classes de suscetibilidade à erosão (Tabela 3)
apresentadas por Silva, Schulz e Camargo (2003 apud MACHADO; TORRES, 2013), é
possível estabelecer uma relação existente entre os valores de declividade, as formas
de relevo e sua respectiva suscetibilidade a processos erosivos.

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Declividades Relevo Suscetibilidade à erosão


Até 8% Plano e suave ondulado Ligeira
>8 ≤ 20 Ondulado Moderada
>20 ≤ 45 Forte ondulado Forte
> 45 Montanhoso e escarpado Muito Forte
Tabela 3 – Classes de relevo e suscetibilidade à erosão.
Fonte: SILVA; SCHULZ; CAMARGO (2003 apud MACHADO; TORRES, 2013)

Observa-se, pelo mapa da Figura 30, que a bacia apresenta baixos valores de
declividade. As regiões Norte e Oeste apresentam os menores valores, variando de 0
a 3% e no máximo 8%, nas vertentes de maior comprimento. Nesses pontos, o relevo
varia de plano para suavemente ondulado e o escoamento superficial é de lento a
médio, apresentando ligeira suscetibilidade à erosão.
As declividades maiores que 8% se encontram nas baixas vertentes, onde o
relevo já começa a ter características de ondulação, com superfícies mais inclinadas.
Nesses pontos, a declividade já começa a ser um fator mais incisivo ao aparecimento
de processos erosivos e a suscetibilidade à erosão é considerada moderada.
As áreas que indicam valores entre 20% e 23% se localizam nos fundos de vales, bem
próximos às áreas de drenagem. Nesses pontos, o relevo já apresenta forte ondulação
e o escoamento superficial passa a ser mais rápido. São esses os pontos onde deve
haver maior atenção ao uso e ocupação do solo, haja vista que a suscetibilidade a
processos erosivos é considerada forte.
Esse exemplo foi utilizado apenas para ilustrar a importância da declividade nos
processos hídricos e no monitoramento das fragilidades ambientais em uma bacia
hidrográfica. No entanto, uma análise de fragilidade deve levar em conta uma quantidade
muito maior de fatores fisiográficos e de ocupação do solo, não apenas a declividade.

6.2 Classificação dos cursos d’água e padrões de drenagem

6.2.1 Elementos de um rio


Recorda-se, caro(a) aluno(a), quando falávamos, no capítulo 3, que o nível freático
acompanha as irregularidades topográficas e que em um certo momento ele emerge
na superfície, constituindo as nascentes? É por ela que iniciamos a nossa jornada,
passando pelos principais elementos de um rio, conforme observado na figura 31.

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Figura 31 – Perfil longitudinal contendo os principais elementos constituintes de um rio.


Fonte: https://oexilio.wordpress.com/tag/aguas/

Lembrando que o tipo de nascente de um rio ou ribeirão depende da paisagem


em que ele está inserido. No Brasil (contexto em que estamos inseridos e por isso
a ênfase vai ser nesse processo), as nascentes são frutos da infiltração da água no
lençol freático que acaba aflorando por conta da topografia. Porém, existem também
as nascentes que são oriundas do degelo das águas que se acumulam nas partes
mais altas de uma montanha, geralmente no pico, por conta da baixa temperatura.
É a partir da nascente que a água descerá das áreas mais altas da vertente em direção
às áreas mais baixas, recebendo mais água de outros rios (afluentes), enxurradas ou
escoamentos superficiais que ocorrem regularmente no relevo. No sentido da nascente
para a foz, ou seja, no sentido do fluxo do rio, dizemos à Jusante do rio. No sentido
em direção à parte mais alta, ou seja, no sentido contrário ao fluxo do rio, dizemos
à Montante.
Com finalidade de facilitar a localização para fins de planejamento e de estudo, o
curso (trajeto por onde a água passa) de um rio pode ser dividido em três partes: o
curso alto ou superior; médio; e baixo ou inferior.
O alto curso é a parte mais alta da vertente, onde se localiza a nascente do rio.
Por conta da grande velocidade da água há um escavamento vertical do terreno,
gerando um relevo de alta declividade, de modo que a água escorre para as partes
mais baixas do relevo. Nesse processo, a água carrega sedimentos decorrentes da
erosão. O médio curso se refere à porção intermediária do curso d’água, com menor

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declividade, caracterizando-se por ser uma área de transporte de sedimentos e pela


modelagem de encostas, onde a velocidade da água é menor. O baixo curso, por sua
vez, representa a porção final do rio, onde ocorre a deposição de sedimentos trazidos ao
longo do curso. Trata-se de uma área um pouco mais aplainada, com baixa declividade.
O baixo curso finaliza com a foz do rio que deságua no mar ou em outro corpo d’água.
A foz é a região onde o rio deságua no mar ou em outro corpo d’água. Ela pode ser
dos tipos: estuário, delta ou mista. A foz do tipo estuário é a que possui um único canal
de saída da água e ocorre quando o rio carrega pouco sedimento ou quando o fluxo
do rio é grande. A do tipo delta (Figura 31) ocorre quando o rio arrasta uma grande
quantidade de sedimentos que se depositam na saída do fluxo da água, formando
pequenas ilhas que interrompem a linearidade do curso, resultando em uma fisionomia
que lembra a letra “D”. O tipo de foz mista é aquele em que, durante a época de chuva
e aumento do fluxo de água, a foz se torna estuário, quando em época de seca, se
torna delta, a exemplo do rio Amazonas.

6.2.2 Tipos e padrões de drenagem


De grande importância para o estudo das bacias hidrográficas é o conhecimento
do sistema de drenagem. Segundo Machado e Torres (2013), os cursos d’água podem
ser classificados em três tipos principais:
• Perenes: contém água o tempo todo, sendo alimentado constantemente pelo
lençol freático e não desce nunca abaixo do leito do curso, mesmo durante as
estações mais secas.
• Intermitentes: geralmente, escoam durante as estações chuvosas e secam na
estiagem. Durante as estações chuvosas, o lençol freático se conserva acima do
leito fluvial, alimentando o curso d’água. Esse processo não ocorre nos períodos
mais secos.
• Efêmeros (temporários): aparecem apenas durante o período de precipitação e
só transportam o escoamento superficial.

Essencial para o funcionamento de uma bacia hidrográfica, a rede de drenagem,


também chamada de rede hidrográfica, apresenta padrões de configuração ou
arranjo espacial que reflete a estrutura geológica e geomorfológica da região. Essas
configurações acabam definindo padrões ou modelos de drenagem (CHRISTOFOLETTI,
1980). De acordo com o autor, existem diversos padrões de drenagens, porém, os
mais comuns são:

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A. drenagem dendrítica: também chamada de “arborescente”, se assemelha à


configuração de uma árvore. Nota-se que os rios tributários se unem formando
ângulos agudos de graus variados, porém menores do que os ângulos retos. É
tipicamente de áreas cobertas por rochas horizontais não fraturadas e sedimentares,
mas podem ocorrer em rochas de origem vulcânica e em derramamentos de lavas.
É o tipo mais comum encontrado na paisagem (CHRISTOFOLETTI, 1980).
B. drenagem paralela: Caracterizam-se por ser uma rede de drenagem em que os rios
correm quase paralelamente entre si, em uma extensão relativamente grande.
Geralmente, ocorre onde há uma declividade pronunciada, com grande desnível de
terreno. A diferença de nível faz com que o ângulo da confluência entre os canais
seja mínimo (TAVEIRA, 2018).

Figura 32 – Padrões de Drenagem mais comuns na paisagem.


Fonte: CHRISTOFOLETTI, 1980 (adaptado).

A. drenagem radial: Esse padrão de drenagem ocorre quando a drenagem flui a


partir de um ponto (centrífuga) que se encontra em altitude elevada, como no
caso de cones vulcânicos, por exemplo (CHRISTOFOLETTI, 1980).
B. drenagem treliça: as confluências conformam ângulos retos. Os padrões de treliça
se desenvolvem em rochas dobradas ou inclinadas, onde há uma série de falhas
paralelas, geralmente, é encontrado em estruturas geológicas com diferentes
resistências ou em áreas de glaciação (TAVEIRA, 2018).

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C. drenagem retangular: é caracterizada por curvas abruptas em ângulo reto, tanto


na corrente principal quanto em seus tributários, mas difere do padrão de
treliças por ser mais irregular, além de não haver o paralelismo de correntes
laterais. Essa configuração se dá pela influência exercida por falhas nas rochas
(CHRISTOFOLETTI, 1980).
D. drenagem anelar: formada por uma série de cursos d’água de forma circular ou
semicircular, são típicas de áreas dômicas de vulcões ou depressões. Ocorre
em áreas de afloramento de rochas com menor resistência, onde o fluxo d’água
é controlado pela estrutura da rocha (TAVEIRA, 2018).
E. drenagem centrípeta: as correntes fluviais se dispõem radialmente sentido centro,
sendo comumente encontradas em declives, onde as drenagens seguem para
um ponto central em que a água se acumula, dando origem aos lagos e lagoas
(CHRISTOFOLETTI, 1980).

Outra característica importante para a compreensão da rede de drenagem de uma


bacia hidrográfica é o padrão do canal de um corpo hídrico. Segundo Christofoletti
(1980), um padrão de canal é o arranjo espacial que o leito apresenta ao longo do rio.
É bem verdade que essa classificação morfológica deve ser adotada para descrever
um determinado trecho de um rio, apenas, pois um único rio pode apresentar dois ou
mais padrões, a depender das características morfogenéticas em que esses canais
estão dispostos na paisagem. Dessa forma, de acordo com o autor, podemos classificar
os canais em quatro tipos, conforme mostrado na figura 33.

Figura 33 – Padrões de Canais Fluviais mais comuns na paisagem.


Fonte: https://www.agbbauru.org.br/publicacoes/revista/anoXXV_4/agb_xxv_4_web/agb_xxv_4-23.pdf

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• Retilíneo: caracterizados pela presença de canais únicos, bem definidos e com


baixa sinuosidade. Estes canais estão associados a alguma condição específica
como a ocorrência de falhas ou fraturas que impedem o rio de fazer meandros.
• Meandrante: Os meandros são as curvas acentuadas de um rio. Os rios
meandrantes possuem alta sinuosidade, formadas a partir da erosão progressiva
das margens côncavas e sua posterior deposição nos leitos convexos. São
muito comuns em regiões de climas úmidos. Com a crescente deposição de
sedimentos, a curva do meandro vai se acentuando até que se feche, separando-o
do restante do canal fluvial, gerando os chamados (meandros abandonados.

Figura 34 – Meandro de um rio e seus afluentes.


Fonte: https://www.agbbauru.org.br/publicacoes/revista/anoXXV_4/agb_xxv_4_web/agb_xxv_4-23.pdf

• Entrelaçado: Apresentam canais entrelaçados e separados por ilhas e barras


arenosas, devido a alta carga sedimentar recorrente de processos erosivos
avançados em suas margens e a alta declividade nos vales.
• Anastomosado: são caracterizados pela presença de dois ou mais canais estáveis
que se subdividem pela presença de obstáculos no relevo (ilhas assimétricas)
e se reencontram posteriormente. Sua formação está associada à alta carga
sedimentar do leito.

6.2.3 Hierarquia dos canais fluviais

A hierarquia fluvial é o processo de estabelecer a classificação de cada canal de


drenagem e sua respectiva área no conjunto total da bacia hidrográfica. Podemos

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dizer que esse tipo de separação e caracterização é feita para facilitar os estudos
morfométricos. Nesse sentido, pode ser considerado o primeiro passo para a análise
das bacias hidrográficas (TAVEIRA, 2018).
Existem diversos sistemas de classificação para hierarquização dos canais fluviais,
no entanto, vamos nos concentrar na classificação de Strahler (1957), amplamente
utilizada na hidrogeografia. Nesse sistema, todos os canais que não têm afluentes são
considerados de primeira ordem, incluindo as nascentes. Assim, os canais de segunda
ordem são formados pela união de canais de primeira ordem e os canais de terceira
ordem originam-se da confluência dos de segunda ordem, e assim sucessivamente,
conforme descrito na figura 35.

Figura 35 – Sistema de hierarquização de canais fluviais proposto por Strahler (1957).


Fonte: STRAHLER, 1957 (adaptado).

Na medida em que a ordem dos canais aumenta, para jusante, há uma tendência
de diminuição das declividades, diminuindo a velocidade do fluxo da água, onde ocorre
a deposição de sedimentos trazidos do trecho superior. Dessa maneira, as vazões
tendem a ser mais uniformes e as águas mais turvas, em virtude dos sedimentos
transportados (MACHADO; TORRES, 2003).
Perceba, caro(a) aluno(a) que são muitas as variáveis que definem as características
e os padrões de drenagem em uma bacia hidrográfica. Conhecer os conceitos de
grande parte delas, entendê-los e aplicá-los, sempre de forma integrada, é importante
ao geógrafo e contribui para o manejo e gestão do território.

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CAPÍTULO 7
GEOMORFOLOGIA FLUVIAL
E AS FORMAS DE RELEVO

7.1 Estrutura e composição das camadas da Terra

Prezado(a) aluno(a), os estudos das formas de relevo são fundamentais para


compreender os distintos padrões de drenagem que se formam de acordo com as
características do relevo. Para isso, é necessário resgatarmos alguns conceitos e
compreendermos os processos de formação do relevo, ao menos de maneira breve,
de forma alinhada aos objetivos da nossa disciplina.
Após a sua formação, a Terra teria sofrido um processo conhecido como diferenciação,
no qual o material mais denso “mergulhou” para o interior, compondo o núcleo, enquanto
o material menos denso “flutuou” para a superfície e formou a crosta terrestre ou litosfera.
A emersão do material menos denso carregou consigo o calor interno, fazendo com
que a Terra se resfriasse e se solidificasse, ao longo do tempo. Dessa maneira, a Terra
se configurou como um planeta diferenciado, ou seja, constituído por três camadas:
Núcleo, Manto e Crosta (Figura 36).
O ferro e o níquel são elementos altamente densos e com isso mergulharam para o
interior da Terra, formando o seu núcleo interno (5.200 km até 6.400 km). Estima-se que
núcleo tem composição líquida na parte externa (inicia a 2.900 km), com temperaturas
próximas a 3.000 ºC, porém é sólido na parte interna, apresentando temperaturas de
até 6.000 ºC. Isso ocorre pela alta pressão no centro da Terra, impedindo a fusão dos
seus materiais constituintes (PRESS et al., 2006). Devemos lembrar que a temperatura
de fusão de qualquer material varia com a pressão, quanto mais alta é a pressão, mais
alta tem que ser a temperatura para aquele material se fundir.
A litosfera, também chamada de crosta terrestre, corresponde à camada externa da
Terra. Ela é rígida e sustentada por diversos tipos de rochas de formações e idades
diferentes. Nela, contém materiais de menor densidade e com temperatura de fusão
baixa. A maior parte desses materiais são compostos por elementos de silício, alumínio,
ferro, cálcio, magnésio, sódio e potássio (PRESS et al., 2006).

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Figura 36 – Camadas internas da Terra.


Fonte: https://www.minasjr.com.br/as-camadas-internas-da-terra/

A crosta apresenta valores médios de 40 km, com 70 km nas partes mais espessas
e 5 km nas menos espessas. Podemos ver, então, que sua espessura é bem fina, haja
vista que a espessura média do manto é de aproximadamente 2.870 km e o raio médio
do núcleo teria cerca de 3.480 km (ROSS, 2019).
Entre o núcleo e a crosta encontra-se o manto, que é composto por rochas de
densidade intermediária, em sua maior parte constituída por oxigênio com magnésio,
ferro e silício. Trata-se da região que forma a maior parte da Terra sólida e abrange
profundidades que vão desde 40 até 2.900 km (PRESS, et al., 2006). O manto ainda
pode ser dividido em superior e inferior. O manto superior é formado por rochas em
estado pastoso, em virtude do calor emanado pelo núcleo. O manto inferior, por sua
vez, tem formação basicamente líquida, haja vista que as rochas se fundem por conta
da alta temperatura do núcleo.

ANOTE ISSO

Cerca de 90% da Terra é constituída de apenas quatro elementos: ferro, oxigênio,


silício e magnésio. Devido ao processo de diferenciação, há pouca quantidade de
ferro na litosfera, por conta desse elemento ser mais denso que os demais.

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ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

As informações atuais que temos das camadas profundas da Terra, seus materiais
componentes, espessura e densidade foram adquiridas de forma indireta, por meio
das observações de dados sísmicos, haja vista que as maiores profundidades
atingidas até hoje pelas perfurações humanas na crosta não ultrapassam os 6.000
metros.
O comportamento das ondas sísmicas altera-se de acordo com a sua passagem
nos diferentes elementos que constituem cada camada da Terra. As liberações
de ondas sísmicas são constantes em regiões de cadeias orogênicas, fossas
submarinas e nas cadeias oceânicas. A maior parte é de baixa intensidade e pode
ser captada apenas pelo uso de sismógrafos. Apenas sentimos esses tremores na
superfície quando sua intensidade é maior.
Somente por meio dos métodos indiretos de análise que os cientistas passaram
a conhecer de forma mais complexa o interior da Terra. Os estudos realizados no
assoalho oceânico, por meio de equipamentos de sondagem e radar, a partir da
década de 1960, possibilitaram compreender diversas características das rochas
e do relevo submarino, características que nos auxiliaram no entendimento da
dinâmica atual e pretérita da crosta terrestre.

Em 1620, o filósofo inglês Francis Bacon (1561-1626), levantou a hipótese de uma


possível união continental pretérita ao observar o encaixe do contorno da África e da
América do Sul. Porém, somente no início do século XX, o pesquisador alemão Alfred
Lothar Wegener (1880-1930), em seus estudos acerca das características climáticas do
oceano Atlântico, percebeu a similaridade de fósseis de animais e plantas presentes na
África e na América do Sul, além de descobrir fósseis de plantas tropicais em regiões
de clima frio no hemisfério norte.
Esse conjunto de evidências fez com que a comunidade científica se questionasse
sobre como essas espécies teriam se distribuídos em continentes distintos e
geograficamente isolados uns dos outros. Dessa forma, Wegener se debruçou sob as
antigas análises de encaixes pretéritos entre os continentes africano e sulamericano,
alimentando a teoria de que em algum momento esses continentes estiveram unidos
geograficamente. Formulou, então, a hipótese do supercontinente denominado Pangeia
(pan=todos e gea =terra) que durante o tempo geológico teria se separado (Figura
37). Essa teoria ficou conhecida como a Teoria da Deriva Continental e durante grande
parte do século XX foi suficiente para explicar a junção e separação dos continentes.

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Figura 38 – Separação dos Continentes (Teoria da Deriva Continental).


Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/deriva-continental.htm

Wegner afirmava que as massas continentais “flutuavam” sobre uma camada rica
em silício e magnésio, denominada sima e, reunindo dados geológicos, paleontológicos,
biogeográficos e climáticos, comprovou a hipótese da fragmentação do supercontinente
Pangeia nos continentes Gondwana e Laurásia, dos quais os continentes atuais teriam
se originado, a partir de uma nova fragmentação.
Durante as décadas de 1940 e 1960, um grande volume de pesquisas e dados
científicos, potencializados pelos novos avanços tecnológicos do período pós-guerra
permitiram reunir uma série de evidências cruciais à elaboração da hipótese de
expansão do fundo oceânico, apresentada pelo norte americano Harry Hess, em 1959.
A descoberta da dorsal meso-oceânica (Figura 39), cadeia de montanhas localizada no
fundo oceanico, entre os continentes sulamericano e africano, de aproximadamente
84.000 km de comprimento por 1.000 km de largura, contribuiu para consolidar a
hipótese levantada pela teoria da deriva continental. Boas e Marçal (2014, p. 86)
explicam que:

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De acordo com essa hipótese, a ação das correntes de convecção no


manto possibilitaria a formação da dorsal oceânica, o rifteamento, o
afastamento de blocos e a acreção vertical de materiais provenientes
do manto, levando à formação e à expansão dos fundos oceânicos.
Para manter a superfície e o volume da Terra, haveria afundamento
nas fossas e consumo de porções oceânicas no manto (processo de
subducção), de tal modo que os oceanos atuais não teriam rochas
mais velhas que 100 Ma.

Figura 39 – Destaque das cadeias meso-oceânicas


Fonte: https://geopoliticadopetroleo.files.wordpress.com/2010/05/atlantico-sul-2.jpg?w=640

Ao longo dessa formação foi identificada uma importante atividade magmática e


a formação de rochas mais recentes do que as encontradas próximas ao continente
africano e sulamericano, indicando movimento de afastamento de placas e acréscimo
de material próximo da falha. As evidências peleomagnéticas também foram cruciais
para a diferenciação e estimativa da idade das rochas acrescidas, uma vez que o
campo magnético da Terra varia e, com isso, é possível estimar com precisão a idade
das rochas.

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A descoberta da dorsal meso-oceânica, assim como a ocorrência de diversos outros


estudos importantes da mesma época que delinearam as placas litosféricas e seus
limites, velocidades de deslocamento, entre outras características, deram corpo ao
nascimento de uma teoria unificadora, a tectônica de placas, que se tornou o principal
paradigma das geociências, no século XX.
Portanto, caro(a) aluno (a), embora aparenta ser estática, a litosfera possui certo
dinamismo, que é fruto das forças endógenas (internas) da Terra, alimentada pelo núcleo
e pelo manto. Em decorrência de sua estrutura físico-química, todo esse material líquido
e pastoso se movimenta internamente, por meio de um fenômeno físico denominado
convecção, e acabam por movimentar a crosta terrestre.
Conforme vimos, a litosfera não é uma superfície rígida e constante, ela é altamente
fragmentada, formando as chamadas placas tectônicas (Figura 37). Hoje sabemos
que a crosta é constituída por cerca de 20 placas que se movimentam: afastando-se
uma das outras, provocando falhamentos entre elas, onde o magma posteriormente
se solidifica e acresce material na crosta; convergindo, de forma que a mais densa
mergulha sob a menos densa (subducção), responsável pela formação de cadeias
de montanhas orogênicas (cordilheira dos Andes); ou movimento convergente de
obducção, no qual duas placas cisalham em direção oposta, mas não há subducção.

ANOTE ISSO

Você sabia que o motivo do Brasil não sofrer com abalos sísmicos de maneira
intensa está ligado ao fato de se situar no centro da placa tectônica Sul-americana?
A movimentação dessa placa não gera movimentos convergentes, fazendo
com que não tenhamos terremotos em grande escala, embora possamos sentir
tremores irradiados, principalmente da região de convergência entre as placas de
Nazca e a Sul-americana, responsável pelo soerguimento da cordilheira dos Andes.

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Figura 37 – Placas Tectônicas.


Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/tectonica-placas.htm

Mas a litosfera é formada por placas do mesmo tipo e com a mesma composição
de rochas? Na verdade não, ela se constitui de duas famílias de rochas com formações
e idades diversas. Essa diferença estrutural culminou em uma divisão da litosfera
em duas partes distintas: uma crosta continental ou ciática e uma crosta oceânica
(ROSS, 2019).
Há inúmeras diferenças entre as duas crostas, sobretudo no que tange à espessura,
na tipologia das rochas e nas formas do relevo. Enquanto a crosta terrestre apresenta
espessura média de 40 km, podendo atingir até 70 km, a crosta oceânica tem espessura
média de 7 km. Além disso, a quase totalidade das rochas oceânicas são ricas em
silicatos de magnésio e ferro (SIMA), pertencentes ao grupo de rochas magmáticas,
como o basalto ou diabásio. Pela sua composição, apresentam densidade um pouco
mais elevada do que as rochas da crosta continental, ricas em silicato de alumínio
(SIAL), compostas por rochas metamórficas, ígneas ou sedimentares. Outro fator que
as diferencia é a idade, enquanto as rochas do assoalho oceânico possam chegar aos
250 milhões de anos, as da crosta terrestre são datadas do pré-cambriano, podendo
ter 4,5 bilhões de anos (ROSS, 2019).

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7.2 As macroformas do relevo da crosta continental

A teoria da tectônica de placas também foi fundamental para uma melhor análise e
compreensão dos mecanismos de formação e modelagem do relevo. Primeiramente,
devemos compreender que o relevo é o resultado de duas forças atuantes:

Toda a dinâmica que rege os fenômenos da natureza contidos no


estrato geográfico é produto do antagonismo entre as forças geradas
pela energia solar que atua na superfície terrestre, com o auxílio da
atmosfera, e a energia do interior da Terra, que age na superfície da
crosta terrestre ou litosfera (ROSS, 2019, p.15)

Dessa maneira, o dinamismo da superfície terrestre é resultante dessa duas forças


antagônicas, as forças endógenas ou internas e as forças exógenas ou externas. Destas
duas forças opostas resulta toda a dinâmica da crosta terrestre e da litosfera. As
pressões exercidas pelo núcleo e pelo manto modificam as estruturas que compõem a
crosta terrestre. Por outro lado, as forças exógenas, regidas pela energia térmica solar
exercem um papel de esculturação das formas produzidas pelas forças endógenas.
As forças endógenas, também conhecidas como agentes internos, são responsáveis
pela gênese de grandes formas de relevos terrestres, como por exemplo as cadeias
orogênicas criadas pelos movimentos e choques entre placas tectônicas.
Por outro lado, as forças exógenas, também chamadas de agentes externos trabalham
na modelagem do relevo, seja por degradação ou por agradação, as duas ocorrendo
de forma simultânea na paisagem. A degradação se dá por meio do intemperismo físico
e químico que atuam na destruição do material construído pelos agentes internos. A
agradação é o processo de carregamento e transporte de sedimentos (areia, seixo,
silte e argila) para outras áreas, seja pela ação dos ventos, seja pela ação dos rios ou
do gelo. Esse processo de transporte é chamado de erosão. Quando esse transporte
perde força e energia, ocorre o processo de sedimentação ou deposição.
Com isso, podemos inferir que a diversidade de fisionomias de paisagens que existem
no globo é fruto das ações e reações estabelecidas entre a superfície terrestre, a
hidrosfera e a atmosfera. A atuação conjunta dessas duas forças é responsável pela
criação da diversidade de formas de relevo presentes em nosso planeta, seja na crosta
continental quanto na crosta oceânica. As principais formas de relevo continental são
as montanhas, os planaltos, as planícies e as depressões (Figura 38)

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Figura 38 – Principais formas de Relevo da crosta continental


Fonte:http://marcosbau.com.br/geobrasil-2/relevo-brasileiro/

As montanhas, também conhecidas como dobramentos modernos, por terem sido


originadas recentemente no tempo geológico, são as porções mais elevadas do relevo
e podem aparecer agrupadas em cadeias de montanhas ou cordilheiras e maciços.
Comumente vão aparecer de forma agrupada, pois sua gênese está associada a
processos tectônicos de soerguimento de placas e derramamento de material vulcânico.
Esse elemento do relevo apresenta vertentes com altas declividades (mais íngremes)
e maior dissecação dos vales fluviais. As montanhas mais recentes surgiram no período
terciário há cerca de 65 milhões de anos e costumam ser mais altas, haja vista que
as forças exógenas ainda não tiveram tempo de atuar de maneira que o desgaste da
rocha ainda não seja acentuado. Questão que difere no caso dos dobramentos mais
antigos, geralmente do pré-cambriano, que apresentam altimetria menor e menores
declividades das vertentes, em função do intemperismo ao longo do tempo geológico. É
importante lembrar também que além do tempo, outra variável importante relacionada
ao intemperismo é a constante climática. As nossas serras do Mar e da Mantiqueira
são exemplos de atuação das forças exógenas ou dos agentes externos em nosso

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território, desgastando o relevo. Esse é o motivo de não termos montanhas altas no


Brasil.
De acordo com Ross (2019), os Planaltos são superfícies mais ou menos aplainadas,
situadas em diferentes altitudes e delimitadas por escarpas íngremes. São áreas que
fornecem sedimentos a outras áreas e sua origem pode estar associada a processos
de erosão, vulcânicos ou tectônicos.
As planícies são caracterizadas como áreas mais planas e pouco inclinadas, no
qual predominam os processos de deposição de sedimentos advindos de outras áreas
mais altas, como dos planaltos, por exemplo. Elas podem ser do tipo costeiras ou
continentais (ROSS, 2019).
As depressões, segundo o mesmo autor, são regiões geográficas mais baixas que
as áreas ao seu redor, nesse caso denominadas depressões relativas. Quando as áreas
são mais baixas em relação ao nível do mar, denominamos de depressão absoluta.
Sua gênese pode estar associada à questões de afundamento da rocha por questões
de gravidade e pressão, mas também por agentes externos ligados ao intemperismo
das rochas com resistência baixa.
Entenda, caro(a) aluno(a), que essa breve análise da composição da Terra e das
formas de relevo na crosta continental são importantíssimos para compreendermos
os processos hídricos sobre o substrato rochoso. Nessa próxima etapa do capítulo
iremos nos concentrar mais nas macroformas do relevo submarino e a importância
desses estudos para a disciplina de hidrologia.

7.2 As macroformas do Relevo Submarino

Conforme observamos no tópico anterior, grande parte das pesquisas no período


posterior à Segunda Guerra permitiram diversos avanços técnicos e científicos que
possibilitaram compreendermos melhor os processos internos da Terra, mas também
as macroformas do relevo no fundo oceânico.
Assim como as formas do relevo estão presentes na superfície terrestre, também
estão presentes no fundo dos oceanos, porém com divergências na sua morfogênese,
devido, principalmente, aos processos erosivos atuantes de forma mais acentuada
na água.

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De acordo com Ross (2019), podemos dividir o relevo do fundo oceanico em três
grandes unidades: a margem continental; as bacias oceânicas; e os sistemas de
cordilheiras mesoceânicas, conforme ilustrado na figura 39.

Figura 39 – Macroformas do Relevo Submarino


Fonte:Ross (2019, p.29)

A margem continental é a continuação da margem dos continentes submersa pela


água do mar, portanto, faz parte da crosta continental. As rochas aqui encontradas
são as mesmas das áreas continentais, ou seja, rochas ígneas, metamórficas muito
antigas cobertas por rochas sedimentares em diferentes idades (ROSS, 2019).
Dessa forma, considera-se que a plataforma continental é uma área da margem
continental que se caracteriza por ser a continuidade do continente que se encontra
submerso. Sua profundidade varia entre 0 e 500 m e sua faixa de largura pode atingir
até duas ou mais centenas de km. Já o talude continental, por sua vez, é a parte da
margem continental possui uma menor extensão e representa a área de término da
crosta continental, caracterizando-se como uma faixa de transição entre a plataforma
continental e as grandes profundidades do fundo oceanico. É relevo geralmente
escarpado, que pode chegar a 3.000 m de profundidade, com elevadas declividades
e presença de cânions e vales submersos (TEIXEIRA, 2000).
As bacias oceânicas correspondem a terrenos profundos entre 2.000 e 5.000 metros
e se localizam entre a margem continental e as cordilheiras meso-oceânicas. O relevo
constitui-se de superfícies planas e também de baixas colinas associadas às atividades
vulcânicas (ROSS, 2019).
Entre a margem continental e a bacia oceânica encontra-se a fossa abissal (Figura
40), que é uma profunda depressão formada abaixo da plataforma continental em
zonas de subducção, na convergência entre placas tectônicas oceânicas e continentais.

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Trata-se de uma região onde o relevo apresenta depressões alongadas e estreitas,


com laterais de altas declividades (TEIXEIRA, 2000).

Figura 40 – Relevo oceanico simplificado.


Fonte: https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/218121/001122775.pdf

A planície abissal (Figura 40) é considerada a área de maior extensão no fundo


oceanico, que localmente é interrompida pela presença de montanhas submarinas
ou outras formações de relevo. Trata-se de uma área plana, com profundidade média
de 5.000 metros, que se estende da base das elevações continentais até os relevos
irregulares das cordilheiras oceânicas (TEIXEIRA, 2000).
Por fim, as cordilheiras dorsais meso-oceânicas, também chamadas apenas de
dorsais oceânicas, são encontradas nas áreas centrais dos oceanos, formando longas
e contínuas cadeias de montanhas submersas, cujas partes mais elevadas geralmente
se encontram entre 1.000 e 2.000 metros abaixo do nível do mar, mas que podem
ter uma parte emersa, formando ilhas e arquipélagos na superfície (ROSS, 2019). São
áreas formadas pelas zonas divergentes de placas tectônicas e por isso há intensa
atividade tectônica e vulcânica (TEIXEIRA, 2000).

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CAPÍTULO 8
ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

8.1 Infiltração da Água no Subsolo

Caro(a) aluno(a), se recorda do capítulo 3 em que falávamos do ciclo hidrológico e


mais especificamente da parte da água que sofre infiltração no solo e/ou nas rochas?
Pois bem, teremos que lembrar de alguns conceitos, pois iremos tratar agora sobre
a água subterrânea.
Parte da água que cai em forma de precipitação se infiltra e percola no solo por
meio de seus poros, fissuras ou fraturas (Figura 41). Dessa forma, podemos dizer que
a infiltração é favorecida pela presença de materiais porosos e permeáveis, como os
solos e sedimentos arenosos. As rochas expostas fraturadas ou porosas também
permitem a infiltração da água. Por outro lado, materiais argilosos, rochas cristalinas
pouco fraturadas e rochas metamórficas (granitos ou gnaisses) dificultam a sua
infiltração para o subsolo.

Figura 41 – Formas de infiltração da água para o subsolo.


Fonte: https://www.abas.org/aguas-subterraneas-o-que-sao/

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Devemos saber que todo tipo de rocha e solo possuem poros, mesmo que esses sejam
poucos em quantidade e pequenos em tamanho. Porém, existem solos, sedimentos
e rochas que possuem maior quantidade de espaços porosos, como é o caso do
arenito e do calcário, por exemplo. A quantidade de espaços porosos é denominada
porosidade e ela se refere à porcentagem do volume total que é ocupada pelos poros.
Nesse sentido, a porosidade vai depender do tamanho e da forma do grão e como
eles estão dispostos. A porosidade é mais alta em sedimentos e rochas sedimentares,
podendo chegar a 40%, enquanto que em rochas ígneas e metamórficas pode chegar
a 2%, apenas (PRESS et al., 2006).
Existem dois tipos fundamentais de porosidade nos materiais terrestres, a porosidade
primária e a porosidade secundária. Segundo Teixeira (2000, p. 121):

A porosidade primária é gerada juntamente com o sedimento ou rocha,


sendo caracterizada nas rochas sedimentares pelos espaços entre os
clastos ou grãos (porosidade intergranular) ou planos de estratificação.
Nos materiais sedimentares o tamanho e forma das partículas, o seu
grau de seleção e a presença de cimentação influenciam a porosidade.
A porosidade secundária, por sua vez, se desenvolve após a formação
das rochas ígneas, metamórficas ou sedimentares, por fraturamento
ou falhamentos durante sua deformação (porosidade de fraturas).
Um tipo especial de porosidade secundária se desenvolve em rochas
solúveis, como calcários e mármores, através da criação de vazios
por dissolução, caracterizando a porosidade cárstica.

Saber a porosidade do solo ou da rocha é fundamental para compreender a capacidade


de absorção de água no solo, mas não traz informações sobre a velocidade em que a
água pode fluir pelos poros. Ao passar pelos poros, fissuras ou fraturas, a água não
percorre um caminho regular, ela vai passando de forma sinuosa. Assim, quanto menor
forem os espaços e mais sinuosos forem esse caminho, mais lentamente a água vai
se infiltrar. Então, a permeabilidade também é um fator importante, pois trata-se da
capacidade que um sólido tem de deixar um fluido atravessar os seus espaços (PRESS
et al., 2006). Podemos dizer que um reservatório considerável de água subterrânea
vai existir onde a porosidade e a permeabilidade forem altas.
Teixeira (2000) nos traz alguns exemplos interessantes para distinguir os conceitos
de porosidade e permeabilidade. Um sedimento argiloso, por exemplo, possui alta
porosidade, mas é praticamente impermeável, haja vista que seus poros são muito
pequenos e a água acaba ficando presa. Outro exemplo diz respeito aos derrames

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basálticos, onde não há porosidade alguma da rocha, no entanto, são abundantes as


fraturas abertas, podendo deixar a rocha altamente permeável.
Espessas coberturas de solo ou regolitos exercem um importante papel no controle
de infiltração, retendo temporariamente parte da água que será liberada aos poucos.
A quantidade de água transmitida pelo solo depende da capacidade de campo, que
corresponde ao volume de água absorvido pelo solo, antes dele atingir a saturação. A
capacidade de campo influencia diretamente a infiltração porque representa um volume
de água que participa do solo mas não contribui com a recarga de água subterrânea,
sendo aproveitada somente pela vegetação (TEIXEIRA, 2000).

ANOTE ISSO

Entende-se por regolito o capeamento natural da rocha, inconsolidado, composto


por material heterogêneo (fragmentos de solo e rocha) e superficial. É residual
quando originário da rocha subjacente, ou transportado, quando advindo de outros
locais. Todo esse material é chamado vulgarmente de solo, o que está errado, pois
entendemos como solo apenas a fina camada superior do regolito, que possui
algum tipo de matéria orgânica e é capaz de suportar vida. Nesse sentido, é correto
falarmos que há regolito na Lua ou em Marte, mas não há solo nestes dois corpos
celestes.

8.2 Aquíferos Profundos

Entendemos como água subterrânea aquela que se encontra dentro da litosfera e


é estudada pela hidrogeologia, ramo da hidrologia que estuda as águas subterrâneas
desde sua origem, movimento e distribuição abaixo da superfície (TAVEIRA, 2018).
Chamamos de aquíferos as unidades rochosas ou sedimentares, sendo elas porosas
e permeáveis, que armazenam e transmitem volumes significativos de água subterrânea
passível de ser explorada pela sociedade. Da mesma forma, as unidades geológicas que
são incapazes de transmitir volumes d’água significativo e com velocidade suficiente
para abastecimento de poços ou nascentes, por serem rochas impermeáveis, são
denominadas de aquicludes (TEIXEIRA, 2000).
A maneira como as rochas se constituem e se organizam no ambiente natural
influencia diretamente no armazenamento e qualidade das águas subterrâneas. Assim,
existem três formas básicas de classificação dos aquíferos de acordo com o tipo de

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porosidade da rocha: aquífero granular (poroso); aquífero fissural; e aquífero de fratura


ou cárstico (Figura 42).

Figura 42 – Tipos de aquíferos em relação à porosidade.


Fonte: http://arquivo.ambiente.sp.gov.br/cea/2014/11/01-aguas-subterraneas-estado-sao-paulo.pdf

Os aquíferos granulares ocorrem no regolito e em rochas sedimentares com porosidade


primária, destacando-se os arenitos, pela sua alta porosidade e permeabilidade.
Os aquíferos fissurais ou de fratura formam-se em consequência de falhamentos
ocasionados por dobramentos e deformações tectônicas, assim como falhamentos
ligados ao resfriamento e constituição das próprias rochas vulcânicas. Esse tipo de
aquífero só vai se instaurar quando o falhamento for interconectado, pois haverá fluxo
d’água entre as falhas. Os aquíferos cársticos, por sua vez, se constituem em redes
de condutos geradas pela dissolução de rochas carbonáticas, como o calcário, por
exemplo. São aquíferos com grande quantidade de água, mas altamente vulneráveis
à contaminação, devido a sua alta porosidade e permeabilidade (a água não passa
pelo processo natural de filtragem).
Os aquíferos também podem ser classificados de acordo com as suas características
hidráulicas, sendo eles do tipo livre, suspenso e confinado (Figura 43). O aquífero livre
ou freático é aquele mais próximo à superfície, onde o topo é demarcado pelo nível
freático, estando em contato com a atmosfera. Ocorre em profundidades de algumas
dezenas de metros da superfície. Esse tipo de aquífero é comumente denominado
lençol freático.

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Figura 43 – Tipos de aquíferos em relação às características hidráulicas.


Fonte:http://www.daebauru.sp.gov.br/2021/ambiente.php?item=RH4

Quando a água infiltrada, encontra uma barreira com dimensão restrita na zona
não saturada, tal como uma lente argilosa, por exemplo, podendo se acumular e ficar
armazenada temporariamente e formando o que chamamos de aquífero suspenso.
Em épocas sem chuva, quando não há recarga, estes aquíferos tendem a se esgotar
(IRITANI; EZAKI, 2008).
O aquífero confinado (Figura 44) é carregado de água, cujos extremos inferiores e
superiores são limitados por rochas praticamente impermeáveis, entre elas as rochas
vulcânicas maciças e argila. A água desse aquífero denomina-se artesiana e, geralmente,
sua pressão é mais elevada que a pressão atmosférica. Dessa forma, ao se perfurar
o aquífero a água poderá jorrar por causa da diferença de pressão existente.

Figura 44 – Tipos de aquíferos em relação às características hidráulicas.


Fonte: PRESS et al., 2006, p. 324.

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Nos dizeres de Teixeira (2000, p. 126):

Quando um poço perfura esse aqüífero, a água sobe, pressionada por


esta pressão hidrostática, jorrando naturalmente. A formação deste
tipo de aquífero requer as seguintes condições: uma sequência de
estratos inclinados, onde pelo menos um estrato permeável encontra-
se entre estratos impermeáveis e uma situação geométrica em que
o estrato permeável intercepte a superfície, permitindo a recarga
de água nesta camada. O poço, ao perfurar o aqüífero, permite a
ascensão da água pelo princípio dos vasos comunicantes, e a água
jorra na tentativa de atingir a altura da zona de recarga. A altura do
nível da água no poço corresponde ao nível potenciométrico da água;
em três dimensões, o conjunto de vários níveis potenciométricos
define a superfície potenciométrica da água. Devido à perda de carga
hidráulica ao longo do fluxo há um rebaixamento no nível d’água no
poço em relação ao nível d’água da zona de recarga. Este desnível
cresce conforme aumenta a distância da área de recarga.

Geralmente, nos aquíferos confinados, as camadas sobrepostas impermeáveis


impedem que a água infiltre diretamente até o aquífero, sendo, então, recarregados
apenas pela precipitação ocorrida nas áreas de recarga. A água, por conta da gravidade,
percola pelos poros e fissuras das rochas e sua velocidade depende da permeabilidade
dessa rocha ou substrato, conforme vimos anteriormente. Essa velocidade é altamente
variável e esse processo, a depender do tipo de aquífero e das condições geológicas,
pode demorar de semanas até séculos para que a água transite da área de recarga
para a descarga (IRITANI; EZAKI, 2008).
Somente nos aquíferos cársticos, por apresentarem fraturas em grande quantidade,
o processo de recarga pode ser acelerado. Nesses sistemas, os locais de descarga
são áreas onde a água sai do aquífero, retornando à superfície em forma de nascente,
ou podem, de forma subterrânea, abastecer rios e lagos.
De acordo com esses autores:

A recarga também pode ocorrer pelo aporte de água vindo de outra


unidade hidrogeológica, seja granular ou fraturada, em contato
com o aquífero em questão. Por exemplo, um aquitarde, apesar da
baixa permeabilidade, pode permitir a transmissão de água para
um aquífero confinado subjacente. (...) Pode ocorrer que o aquífero
tenha recarga não natural, por exemplo, pela água que infiltra no solo
devido ao vazamento das tubulações do sistema de abastecimento
e saneamento, ou pelos excessos na irrigação de diferentes culturas
(IRITANI; EZAKI, 2008, p. 21)

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A velocidade no qual a água se move no solo afeta de forma intensa o balanço


entre carga e descarga dos aquíferos. Conforme vimos acima, a maior parte das águas
subterrâneas se move lentamente. Na maioria dos aqüíferos, a água subterrânea
move-se a uma taxa de poucos centímetros por dia. Em camadas de cascalho muito
permeáveis próximas à superfície, a água subterrânea pode percorrer até 15 cm/dia,
velocidade muito baixa quando comparada com a dos rios, por exemplo, cujo fluxo
tem uma velocidade típica de 20 a 50 cm/s (PRESS et al., 2006)
No entanto, se a água subterrânea se movesse tão rapidamente quanto nos rios,
os aquíferos secariam após um período de tempo sem chuva. Isso ocorreria pelo
fato da velocidade de descarga ser superior à velocidade de recarga. Assim, o lento
movimento do fluxo d’água subterrânea também torna impossível que a água recarregue
o aquífero de forma rápida, se caso houvesse uma descarga excessiva dessa água
por bombeamento, por exemplo. Por isso, é importante estudos de hidráulica para
a exploração desses recursos em larga escala, de forma sustentável, de maneira a
garantir que sempre a velocidade de descarga seja inferior à recarga.

ISTO ESTÁ NA REDE

De acordo com estudos realizados na Universidade da Califórnia, divulgados no


site da Agência Espacial Americana (Nasa), a população mundial utiliza as águas
subterrâneas de forma indiscriminada. Este é o primeiro estudo que analisou as
perdas dos aquíferos, a partir de dados coletados no espaço, pela Nasa. As leituras
dos satélites Grace, especializados em analisar a gravidade do planeta, mostraram
que 13 dos 37 maiores aquíferos estudados entre 2003 e 2013 estão sendo
esvaziados em velocidade superior à da reposição de água nos sistemas.

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Dos 13 aquíferos ameaçados, oito foram classificados como “superestressados”,


por terem muito pouca ou nenhuma reposição natural, e cinco foram classificados
como “extremamente” ou “altamente” sobrecarregados, o que varia de acordo com
o tempo da reposição. Os mais sobrecarregados estão nas regiões mais secas do
planeta, onde as populações usam intensamente águas subterrâneas. O Sistema
Aquífero Árabe, que atende a 60 milhões de pessoas, é o mais sobrecarregado do
mundo. O segundo é a Bacia Aquífera Indu, no Noroeste da Índia e no Paquistão, e o
terceiro é a Bacia Murzuq-Djado, no Norte da África.

A reportagem original pode ser vista no link abaixo:

https://www.nasa.gov/jpl/grace/study-third-of-big-groundwater-basins-in-distress

8.2 Distribuição das águas subterrâneas no Brasil e no Mundo

Caro(a) aluno(a), agora que entendemos os processos de infiltração da água para


abastecimento dos diferentes tipos de aquíferos existentes, devemos discorrer sobre
a disponibilidade e distribuição deles no Brasil e no mundo. É necessário compreender
que os aquíferos possuem inúmeras funções relacionadas à recarga dos sistemas
hídricos em diversos locais do globo, mas também, possuem a importante função
de armazenar água doce para o abastecimento humano, principalmente nas regiões
mais áridas, onde a falta de pluviosidade leva, muitas vezes, à larga exploração desses
recursos para o abastecimento das populações humanas.
Diversos estudos indicam que, nas últimas décadas, aumentou consideravelmente
o interesse de alguns países na captação das águas subterrâneas para abastecimento
humano e demais necessidades, por isso, a urgência em compreender a dinâmica
destes importantes sistemas subterrâneos. No entanto, nessa seção iremos nos ater
mais às características gerais dos aquíferos, assim como suas localizações e tipologias.
Não iremos tratar, ainda, acerca do consumo humano desse recurso, assunto que
será melhor explorado no capítulo 15.
O sistema de águas subterrâneas no mundo é bem diversificado com quantidades
e distribuição distintas, assim podemos reconhecer alguns deles espalhados pelo

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planeta, ao menos os que possuem maior relevância e que são mais comumente
estudados. Entre eles destaca-se o Arenito Núbia, que se localiza no Egito, Chade, Líbia
e Sudão, apresentando dimensões de 2 milhões de km² e capacidade de 150.000 km³
de água; o aquífero Kalahari Karoo, localizado na Namíbia, Botswana e África do Sul,
cuja extensão é de 135 mil km²; o Digitalwaterway vechte, localizado na Holanda e
Alemanha, que apresenta aproximadamente 7,5 mil km²; o Aquífero Praded, localizado
na Polônia e República Checa, com dimensões de 3,3 mil km²; o Bacia Artesiana, que
está localizado na Austrália, apresentando extensão de 1,7 milhões km²; e o Bacia
Murray também localizado na Austrália, com extensão de 297 mil km².
A combinação das estruturas geológicas com fatores geomorfológicos e climáticos
do Brasil resultou na configuração de 10 províncias hidrogeológicas, que são regiões
com sistemas aqüíferos com condições semelhantes de armazenamento, circulação
e qualidade de água (REBOUÇAS et al., 2002).

Figura 45 – Províncias hidrogeológicas do Brasil.


Fonte: https://www.cgee.org.br/documents/10195/734063/a2b_doc_final_agua_subterr_1184.pdf/49642517-e831-4ef7-bccd-5c6d3834a3a0?version=1.0

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No Brasil, as águas subterrâneas ocupam diferentes tipos de reservatórios,


desde as zonas fraturadas do embasamento cristalino (escudo) até os depósitos
sedimentares cenozóicos (bacias sedimentares), reunindo-se nos três sistemas
aqüíferos, anteriormente vistos: porosos, fissurados e cársticos.
Os escudos são formados por rochas magmáticas e metamórficas e correspondem
aos primeiros núcleos de rochas emersas que afloraram desde o início da formação
da crosta terrestre. As bacias sedimentares são depressões preenchidas, ao longo do
tempo, por detritos ou sedimentos provenientes de áreas próximas ou distantes que
normalmente estão dispostas de forma horizontal (ROSS, 2019).
Os sistemas porosos, formados por rochas sedimentares, ocupam 42% da área
total do país e compreendem cinco províncias hidrogeológicas (bacias sedimentares):
Amazonas, Paraná, Parnaíba-Maranhão, Centro-Oeste e Costeira. A estrutura geológica
dessas áreas lhes garante uma condição de artesianismo, haja vista que a água fica
confinada entre camadas permeáveis e impermeáveis, que se intercalam (REBOUÇAS
et al., 2002).
Os sistemas fissurados, por sua vez, ocupam uma área total de 53,8% do território
brasileiro, compreendendo as Províncias Hidrogeológicas dos Escudos Setentrional,
Central, Oriental e Meridional. A província Oriental se divide em duas sub-províncias
(Nordeste e Sudeste) (REBOUÇAS et al., 2002).
Quanto aos sistemas cársticos, destacam-se o sistema cárstico-fissural da Província
Hidrogeológica do São Francisco e da Formação Jandaíra (subprovíncia Potiguar).
Inclui os domínios do calcário do Grupo Bambuí com mais de 350.000 km² nos
Estados da Bahia, Goiás e Minas Gerais e a Formação Caatinga. As profundidades
do desenvolvimento cárstico são muito variáveis, com média em torno de 150 m.
No tocante à utilização das águas subterrâneas nas províncias hidrogeológicas do
Brasil, Tucci e Cabral (2003), comentam que:

(...) a Província Hidrogeológica Escudo Oriental do Nordeste, onde


está localizada a Região Semi-Árida – tem pequena disponibilidade
hídrica, devido à formação de rochas cristalinas. Nesta região é
frequente se observar o teor elevado de sais nas águas, o que
restringe ou impossibilita seu uso. Na Província Hidrogeológica
Costeira, os sistemas aqüíferos Dunas e Barreiras são utilizados
para abastecimento humano nos Estados do Ceará, Piauí e Rio
Grande do Norte. O aqüífero Açu é intensamente explotado para
atender ao abastecimento público, industrial e em projetos de

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irrigação (fruticultura) na região de Mossoró (RN). O aqüífero


Beberibe é explotado na Região Metropolitana de Recife por 2 mil
poços que atendem condomínios residenciais, hospitais e escolas.
O crescimento desordenado do número de poços tem provocado
significativos rebaixamentos do nível de água e problemas de
salinização do aqüífero costeiro em Boa Viagem, no Recife (TUCCI;
CABRAL, 2003, p.15)

Na figura 46 são apresentados dados contendo os sistemas de aquíferos classificados


quanto ao tipo de reservatório, apresentado por Tucci e Cabral (2003).

Figura 46– Tipos de aquíferos em relação às características hidráulicas


Fonte: https://www.cgee.org.br/documents/10195/734063/a2b_doc_final_agua_subterr_1184.pdf/49642517-e831-4ef7-bccd-5c6d3834a3a0?version=1.0

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Os sistemas aquíferos brasileiros (Figura 47) armazenam os importantes excedentes


hídricos que alimentam uma das mais extensas redes de rios perenes do mundo e
desempenham, ainda, importante papel socioeconômico, devido à sua potencialidade
hídrica (REBOUÇAS et al., 2002). São inúmeros os aquíferos presentes em nosso
território, porém, merecem destaque: o Guarani, Alter do Chão, Cabeças, Urucuia-
Areado e Furnas, sendo os dois primeiros os maiores do mundo.

Figura 47 – Principais Aquíferos do Brasil


https://ichef.bbci.co.uk/news/800/cpsprodpb/AF26/production/_123983844_mapaaquiferos_servico_geologico_br.png.webp

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O Alter do Chão localiza-se na região que compreende os estados do Amazonas, Pará


e Amapá. Trata-se do maior aquífero do mundo em extensão de água. Com o grande
volume que apresenta, calcula-se que ele seria suficiente para abastecer toda a população
mundial por 100 vezes. O sistema aquífero Cabeças é considerado o de melhor potencial
hidrogeológico na Bacia Sedimentar do Parnaíba, com água de boa qualidade. O sistema é
utilizado para uso doméstico e irrigação. O de Urucuia-Areado, localizado entre os estados
da Bahia, Minas Gerais, Goiás, Piauí e Maranhão, é conhecido pelo predomínio de suas
águas bicarbonatadas de cálcica, pouco mineralizadas. Já o sistema aquífero de Furnas,
correspondente a parte dos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná
e São Paulo é caracterizado por água bicarbonatada sódica, potássica e mistas.
No entanto, nenhum outro aquífero é tão importante no contexto brasileiro e também
da América do Sul quanto o Sistema Aquífero Guarani, presente em quatro países e oito
estados brasileiros (Figura 48)

Figura 48 – Localização do Sistema Aquífero Guarani


Fonte: https://hidrogeron.com/a-qualidade-das-aguas-do-aquifero-guarani%EF%BF%BC/ (adaptado pelo autor)

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Tendo seu nome sugerido como forma de homenagear a memória da nação Guarani,
O referido aquífero é considerado uma das maiores reservas de água subterrânea
do mundo e se estende desde a Bacia Sedimentar do Paraná até a Bacia do Chaco-
Paraná. Possui dimensão aproximada de 1,2 milhão de quilômetros quadrados; tem
dois terços (840 mil km²) distribuídos em oito estados brasileiros (SILVA, 2011).
A porção aflorante deste aquífero, isto é, aquela que se pode observar na superfície
do terreno e que tem comportamento de aquífero livre, é pequena ao compararmos
com sua área total.
Formado há cerca de 130 milhões de anos, é constituído, predominantemente, por
arenitos de granulação média a fina, depositados pela ação eólica, em um ambiente
desértico. Como este arenito é bastante homogêneo, possui grande quantidade de
poros interconectados, que imprime uma elevada capacidade de armazenar e fornecer
água, conforme apontam Filho et al:

Apresenta uma porosidade média de 16% e condutividade hidráulica


inferior a 0,01 até 4,6 m/dia. O volume total de água no aquífero
foi estimado como sendo igual a 46.280 km³. Para este cálculo foi
considerado 228 m como espessura média do sistema aquífero.
(FILHO et al. 2003, p. 92).

Uma característica importante dos aquíferos confinados é o seu potencial geotermal,


pois a temperatura da água se eleva com o aumento da profundidade. O Aquífero
Guarani, por alcançar profundidades maiores que 1.000 metros em algumas regiões,
chega a atingir temperaturas de 60 ° C. Existem estâncias turísticas que captam estas
águas termais para uso recreativo em parques e clubes (REBOUÇAS et al., 2002)
Dessa forma, caro(a) aluno(a), o Sistema Guarani é considerado um dos maiores
reservatórios de água subterrânea do mundo, a sua exportação de água através de
poços profundos, permite o consumo humano em várias regiões do Sul e do sudeste
do Brasil, bem como na Argentina e Uruguai. Trata-se de um aquífero amplamente
estudado por conta de seu potencial de abastecimento, motivo este por termos dado
maior ênfase a ele, em detrimento dos demais importantes aquíferos no nosso território.

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CAPÍTULO 9
BACIAS HIDROGRÁFICAS
COMO INSTRUMENTO DE
PLANEJAMENTO E GESTÃO

Caro(a) aluno(a), agora que já estabelecemos os principais conceitos e processos


acerca do sistema hidrológico em diversos níveis, neste capítulo iremos começar a
tratar, de forma mais direta, a gestão da água em nosso país. Daremos, aqui, maior
ênfase à utilização das bacias hidrográficas enquanto ferramentas para o planejamento
e gestão do território, apresentando, ao longo do capítulo, estudos de caso com
finalidade de ilustrar a aplicação dessas importantes unidades territoriais, sobretudo,
nos estudos geográficos.

9.1 As Bacias Hidrográficas como instrumentos de Planejamento e Gestão

As bacias hidrográficas vêm sendo utilizadas enquanto áreas preferenciais para o


planejamento e gestão dos recursos hídricos como uma tentativa de integração desses
recursos com a gestão ambiental do território. Ao longo do tempo, a necessidade de
compreender o ambiente de forma integrada e sistêmica modificou o foco apenas no
recurso hídrico em si, ampliando para uma visão de planejamento ambiental integrado.
A bacia representa um meio natural espacialmente definido, no qual seus
elementos mantêm relações dinâmicas entre os componentes físicos, biológicos e
socioeconômicos. Por ser considerado um sistema integrado entre os elementos que
a compõem, a bacia hidrográfica pode ser utilizada como unidade de planejamento.
Dessa forma, considerando os seus aspectos naturais e antrópicos como um todo, o
planejamento da ocupação do território se torna mais abrangente, ultrapassando os
limites administrativos, como o municipal e o estadual.
Todas as mudanças ocorridas em uma bacia hidrográfica interferem nos rios que a
compõem. A água dos rios é alimentada diretamente pela pluviosidade e indiretamente
pela água que se infiltra nos solos e nas rochas, alcançando os rios de modo mais

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lento. Por isso, qualquer interferência nas áreas próximas aos rios poderá causar
modificações na rede fluvial, em diferentes porções da bacia hidrográfica.
Pela sua distribuição espacial, apresentam, na maioria dos casos, diferentes
paisagens que, em geral, representam diferentes estágios de sua evolução. Nesse
termos, Nascimento e Carvalho (2021) advertem sobre a adoção de metodologias de
análise integrada da paisagem quando é utilizada a bacia hidrográfica como recorte
espacial de análise geográfica:

Enquanto unidade espacial de gestão, calcada na questão dos recursos


hídricos em um contexto amplo de planejamento ambiental, uma bacia
hidrográfica deve ser estudada através de uma metodologia sistêmica
e holística, baseada na interdisciplinaridade, e que permita a investigação
de suas paisagens, identificando os impactos ambientais resultantes das
ações sócio-espaciais. Na caracterização de um sistema, é necessário
que sejam explicitados os objetivos, propósitos ou finalidades do mesmo,
assim como sua função (RODRIGUES; CARVALHO, 2021, p.3).

Conforme vimos no capítulo 5, as bacias hidrográficas devem ser consideradas


sistemas complexos que incluem diversas variáveis que estão interconectadas, que vão
desde as características físicas do ambiente até às características socioeconômicas,
que refletem no uso do solo.
Então, quando se utiliza a bacia como recorte espacial de análise, além de estudar o
corpo d’água em si, é necessário considerar os intervenientes que modificam a qualidade
ambiental, incluindo os aspectos socioeconômicos, o consequente uso e ocupação
do solo, tanto a montante quanto a jusante da bacia (RODRIGUES; CARVALHO, 2005).
Devemos compreender que as atividades socioeconômicas são o cerne da modificação
das paisagens, haja vista que, de acordo com as suas necessidades, as sociedades
retiram a cobertura vegetal para o estabelecimento de cidades e implementação de
atividades agrossilvopastoris e com isso, modificam as características físicas das
bacias. Assim, o uso do solo vai interferir nas taxas de escoamento superficial, infiltração
da água no solo e demais componentes que irão influenciar negativamente o balanço
hídrico e a qualidade da água nesses sistemas.
Além disso, com a realização de grandes obras de engenharia, as sociedades
humanas são capazes de alterar fluxos de rios, represar grandes áreas para a confecção
de hidrelétricas, modificando, inclusive, as características do relevo. Imagine, então,
caro(a) aluno(a) como cada uma dessas ações vão interferir em um sistema complexo
como as bacias hidrográficas.

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É exatamente por isso que a análise geográfica deve levar sempre em conta as
interações do ser humano com a natureza e as implicações disso para as sociedades,
tanto do ponto de vista da interferência negativa na qualidade de vida humana quanto
das consequências negativas que esse uso causa nos ecossistemas e na paisagem.
Na área da bacia é que desenvolve todas as atividades de exploração econômica
(urbanas, industriais, agrícolas), que geram consequências diretas e indiretas sobre
o meio físico natural da bacia hidrográfica. Nesse contexto, qual escala de análise é
a ideal para compreensão desses processos?
De acordo com Porto e Porto (2008), a questão da escala de análise a ser utilizada
vai depender do problema a ser solucionado. Citando alguns exemplos, os autores
explicam:

Pode ser delimitada a totalidade da bacia do Rio Amazonas, desde


suas cabeceiras mais distantes na cordilheira andina até seu exutório
do Oceano Atlântico, assim como podem ser delimitadas suas sub-
bacias, maiores ou menores, dependendo da necessidade do problema
a ser abordado. Diz-se que o tamanho ideal de bacia hidrográfica é
aquele que incorpora toda a problemática de interesse. Pode-se ter
interesse em uma pequena bacia de 0,5 km² numa área urbana, como
na bacia do Rio São Francisco, com mais de seus 600.000 km² de
área. Esse conceito sistêmico adapta-se muito bem aos sistemas de
gestão de recursos hídricos. (PORTO; PORTO, 2008, p. 45).

O uso de bacias hidrográficas como unidade de gestão natural teve sua consolidação
na década de 1970 em consequência da necessidade de promover a recuperação
ambiental e a manutenção de recursos naturais escassos como a água.
No entanto, a gestão dos recursos hídricos baseadas nesse conceito só ganhou
força a partir de 1992, com a criação e difusão dos Princípios de Dublin, quando
passou a adotar a bacia hidrográfica como uma unidade de integração físico-territorial
de planejamento, determinando que a prioridade para o uso dos recursos hídricos é,
primeiramente, para o consumo humano e posteriormente para fins múltiplos. Esse
documento também prezava a gestão descentralizada e participativa da água, assim
como o seu efetivo reconhecimento como item econômico.

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ANOTE ISSO

Os Problemas urgentes em relação aos recursos hídricos mundiais conduziram ao


desenvolvimento dos Princípios de Dublin, na Conferência Internacional sobre Água
e Meio Ambiente, realizada em Dublin, Irlanda, em Janeiro de 1992. Os Princípios de
Dublin são os embriões da noção de gestão integrada dos recursos hídricos, que
passou a ser adotada em larga escala, a nível mundial.
Os quatro princípios orientadores para a gestão dos recursos de água doce contidos
nos Princípios de Dublin são:
Princípio n° 1 - A água doce é um recurso finito e vulnerável, essencial para
sustentar a vida, o desenvolvimento e o meio ambiente.
Princípio n° 2 - Gerenciamento e desenvolvimento da água deverá ser baseado
numa abordagem participativa, envolvendo usuários, planejadores e legisladores
em todos os níveis.
Princípio n° 3 - As mulheres têm papel principal na provisão, gerenciamento e
proteção da água.
Princípio n° 4 - A água tem valor econômico em todos os usos competitivos e
deve ser reconhecida como um bem econômico

Os Princípios de Dublin foram posteriormente apresentados aos líderes mundiais na


Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992,
no Rio de Janeiro (ECO 92).
A importância da gestão de águas transfronteiriças também foi reconhecida em
1992, na Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro. No capítulo 18 da Agenda 21 foi
estabelecido um plano de ação não vinculativo, adotado pelos participantes da
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento.
Fonte: DOMINGUES (2012)

No Brasil, a Lei 9.433/97, denominada Lei das Águas, instituiu a bacia hidrográfica
como unidade territorial básica de análise para fins de planejamento e gestão do uso
e ocupação do solo, em função de suas características naturais, principalmente, onde
há grande pressão antrópica em função do crescimento populacional (SANTOS, 2004).
Dessa forma, embora no Brasil seja papel da União prezar pela gestão dos recursos
hídricos (BRASIL, 1988), a bacia hidrográfica é vista mais como unidade territorial do
que como recurso hídrico, propriamente dito. Sendo assim, a gestão desses territórios
deve ser integrada e pulverizada entre as três esferas administrativas: União, Estados
e Municípios, em que a bacia esteja contida.

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Por meio do Comitê da Bacia Hidrográfica, previsto na Lei 9.433/97, a decisão


e gestão das bacias podem ser trazidas ao nível local, possibilitando uma gestão
individualizada, dando a possibilidade de conformá-las de acordo com a escala e as
características da problemática local (PORTO; PORTO, 2008).
No campo da Geografia, as bacias são consideradas unidades territoriais de
investigação a mais tempo do que está proposto pela legislação e constitui-se um
campo de estudo amplamente consolidado. As pesquisas estão sempre relacionadas à
realização de diagnósticos do meio físico e antrópico, com finalidade de subsidiar planos
de gestão dos recursos hídricos, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico
em harmonia com a natureza, visando o mínimo de degradação possível.
Dessa forma, a utilização da bacia hidrográfica como unidade de estudo permite o
planejamento dos recursos hídricos, pois se podem levantar nela dados ambientais
relevantes, como aspectos climáticos, relevo, características geológicas, hidrologia,
uso e ocupação das terras, qualidade da água, possibilitando assim a caracterização,
classificação, os diagnósticos, prognósticos e o zoneamento ambiental do sistema
(MORAES, 2001).
Embora consolidada, o principal problema de estabelecer uma bacia hidrográfica
enquanto unidade territorial para planejamento ambiental é que seus limites, em
grande parte dos casos, não coincidem com limites municipais ou estaduais, e, por
consequência, a gestão destas áreas fica comprometida, principalmente quando esses
limites dizem respeito a áreas interestaduais. Essa questão não inviabiliza a proposta
da bacia como unidade, porém, dificulta por conta dos trâmites burocráticos e das
diferenças legais de uma área para a outra.
Atualmente, as bacias cada vez mais estão sendo utilizadas em estudos do
planejamento urbano. Quando se pensa o planejamento pelo viés do planejamento
ambiental, além da lei de zoneamento municipal, por exemplo, se faz necessária,
também, a implantação de um zoneamento ambiental de alcance regional e, nesse
sentido, a bacia hidrográfica se mostram uma unidade adequada para esse propósito,
haja vista que a topografia é um elemento determinante no controle dos processos
de superfície, pois interfere diretamente na distribuição dos sistemas biológicos e no
comportamento da rede de drenagem. A bacia é uma unidade sistêmica fundamental
para o estudo de potencialidade e fragilidades paisagísticas, pois é nela que ocorrem
as interações (SANTOS, 2004).

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9.1.1 Estudo de Caso: fragilidade ambiental de bacias hidrográficas

Conforme vimos no tópico anterior, as bacias hidrográficas têm sido apresentadas


enquanto unidades territoriais para o estudo e planejamento dos recursos naturais, e
cada vez mais estão sendo utilizadas em estudos ligados ao planejamento ambiental.
Caro(a) aluno(a), agora iremos trabalhar esses conceitos de forma mais prática,
apresentando um estudo de caso relacionado à fragilidade ambiental em bacias
hidrográficas. Mas, o que podemos entender sobre fragilidade ambiental e qual a importância
de estabelecer índices de fragilidade ambiental ao longo de uma bacia hidrográfica?,
Por meio dos modelos de fragilidade torna-se possível apontar as áreas onde há maior
fragilidade em uma bacia, orientando o poder público a ter maior atenção a essas áreas,
do ponto de vista do manejo e da implementação de atividades humanas degradantes.
São diversos os modelos de fragilidade ambiental que podem ser adotados para
estudo de uma bacia hidrográfica, entretanto, iremos abordar a metodologia proposta
por Crepani et al. (2001), que foi desenvolvida a partir do conceito de Ecodinâmica,
elaborado por Tricart (1977), no qual, quando predomina a morfogênese, prevalecem
os processos erosivos modificadores das formas de relevo, mas quando predomina
a pedogênese, prevalecem os processos formadores do solo.
Os autores estabelecem que o modelo deve ser aplicado individualmente a cada
uma das variáveis físicas que compõem cada unidade de paisagem a ser analisada,
essas variáveis são: Geologia; Geomorfologia; Solos; Vegetação e Clima. Posteriormente,
será atribuído um valor final, resultante da média aritmética dos valores individuais
de cada uma das variáveis físicas, buscando representar a posição de cada unidade
dentro da escala de vulnerabilidade natural à perda de solo. A equação que representa
a descrita metodologia é:
V = (G + R + S + V + C)
___________________
5

Onde:
V= vulnerabilidade
G = vulnerabilidade para a variável Geologia
R = vulnerabilidade para a variável Geomorfologia
S = vulnerabilidade para a variável Solos
Vg = vulnerabilidade para a variável Vegetação
C = vulnerabilidade para a variável Clima

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Dessa forma, foi proposta uma escala de vulnerabilidade que estabelece 21 classes
de vulnerabilidade à perda do solo (Figura 49). Esses valores representam o estágio de
evolução morfodinâmica das unidades territoriais analisadas. Assim, a unidade será
estável quando prevalece a pedogênese, apresentando valores mais próximos a 1.0;
intermediária, quando houver equilíbrio entre pedogênese e morfogênese, apresentando
valores próximos a 2.0; e instável quando prevalecer a morfogênese em detrimento
da pedogênese, atribuindo-se valores próximos a 3.0 (CREPANI et al, 2001).
Em relação à escolha das cores, procurou-se obedecer aos critérios cartográficos que
buscam associar às cores “quentes” e seus matizes (vermelho, amarelo e laranja) situações
de emergência, e às cores “frias” e seus matizes (azul, verde) situações de tranquilidade.
Assim, aos valores que resultam entre 1,1 e 1,9 são atribuídas as variáveis das cores
azul e verde, ficando mais verde quando se aproxima de 2,0. As cores resultantes da
combinação do verde com vermelho correspondem aos valores que se situam entre
2,1 e 2,9, aumentando o vermelho quando se aproxima do valor 3,0.

Figura 49 – Escala de Vulnerabilidade das Unidades Territoriais Básicas.


Fonte:https://www.researchgate.net/publication/350370750_Fluxo_de_CO2_e_os_Indices_de_Vegetacao_do_Parque_Nacional_das_Nascentes_do_Rio_Parnaiba_
Piaui_Brasil/figures?lo=1

Esse modelo pode ser adotado por qualquer estudo em qualquer bacia hidrográfica.
No entanto, os modelos sempre devem, quando necessários, sofrerem alterações em
função dos objetivos e escalas de cada estudo.

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Com finalidade de exemplificar a adoção desse tipo de estudo, de maneira mais


didática, analisaremos o estudo de caso apresentado por Carvalho (2013) para análise
da fragilidade ambiental de bacias hidrográficas urbanas localizadas na cidade de
Ilha Solteira, no estado de São Paulo. A autora utilizou uma adaptação do modelo
proposto por Crepani et al. (2001), com finalidade de determinar as potencialidades
e fragilidades para o uso do solo na região estudada.
Na metodologia proposta pela autora, são atribuídas classes de vulnerabilidade
para cada uma das variáveis, indicando sempre os valores de 1,0 a 3,0 de acordo com
a escala de 21 cores, apresentada acima. Cada uma das variáveis foram analisadas
de acordo com critérios que influenciam diretamente nos processos morfodinâmicos
da paisagem.
Em relação à Geologia, foi estabelecido parâmetro em função da resistência das
rochas aos processos de erosão e intemperismo com relação ao grau de coesão das
rochas ígneas, metamórficas e sedimentares, de acordo com a tabela 4:
Escala de vulnerabilidade à denudação das rochas

Quartzitos ou Hornblenda, Tremolita,


1,0 1,7 Folhelhos 2,4
Metaquartzitos Actinolita xisto
Milonitos, Quartzo
Andesito, Diorito,
muscovita, Biotita, 1,1 Grauvacas, Arcózios 1,8 2,5
Basalto
Clorita xisto
Arenitos quartzosos ou Ardósia,
1,2 Migmatitos, Gnaisses 1,9 2,6
ortoquartzitos Metargilito
Calcários,
Estaurolita xisto, Xistos Dolomitos,
Riólito, Granito, Dacito 1,3 2,0 2,7
granatíferos Margas,
Evaporitos
Piroxenito, Anfibolito Anortosito,
1,4 Siltitos, Argilitos 2,1 2,8
Kimberlito, Dunito Gabro, Peridotito
Fonólito, Nefelina
Conglomerados,
1,5 Sienito, Traquito, 2,2 Mármores 2,9
Subgrauvacas
Sienito
Sedimentos
Granodiorito, Quartzo Inconsolidados:
1,6 Filito, Metassiltito 2,3 3,0
Diorito, Granulitos Aluviões,
Colúvios etc.
Tabela 4 - Escala de vulnerabilidade à denudação das rochas
Fonte:Carvalho (2013, p. 66).

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No tocante à Geomorfologia, os valores da escala de vulnerabilidade foram adotados


os dados que correspondem à declividade, por ser ela o fator mais incisivo do relevo que
interfere na morfodinâmica da paisagem. Assim, Os valores mais próximos de 1,0 estão
associados a pequenos ângulos de inclinação das encostas, situação em que prevalecem
os processos formadores de solo da pedogênese e os valores mais próximos de 3,0 estão
associados a situações de maior declividade, onde prevalecem os processos erosivos da
morfogênese (CREPANI et al, 2001), conforme demonstrado na tabela 5:
CLASSES MORFOMÉTRICAS DECLIVIDADE (%) VALORES DE VULNERABILIDADE
Muito Baixa <2 1,0
Baixa 2–6 1,5
Média 6 –20 2,0
Alta 20 - 50 2,5
Muito Alta > 50 3,0
Tabela 5 - Classes de declividade com escalas de vulnerabilidade
Fonte:Carvalho (2013, p. 67).

Com relação à Pedologia, foram adotados parâmetros determinados pela estabilidade


do solo em relação à erodibilidade. A causa fundamental da erosão hídrica é a ação
da chuva sobre o solo, sendo ela o agente ativo da erosão e o solo, o agente passivo
(Crepani et al. 2001).
Nas unidades estáveis, o valor atribuído é 1,0 e representa os solos do tipo Latossolos,
haja vista que são bem desenvolvidos, velhos ou maduros, com grande profundidade e
porosidade (facilita a infiltração). Nas unidades intermediárias, no qual o valor atribuído
é 2,0, representa a classe dos solos do tipo Podzólicos, com profundidade menor,
menos estáveis e intemperizados, em comparação com os Latossolos. O valor 3,0,
unidades vulneráveis, ocorrem em solos jovens e poucos desenvolvidos, como os
Neossolos, por exemplo (CARVALHO, 2013).
Em relação à vegetação, Crepani et al. (2001) considera que a densidade da cobertura
vegetal é um parâmetro importante, já que quanto maior a cobertura do solo, menor
é a suscetibilidade a processos erosivos. Dessa forma, os dados de cobertura de
uso do solo podem ser importantes ferramentas para determinar a cobertura vegetal
de determinada área. Nesse caso, para as altas densidades de cobertura os valores
atribuídos na escala de vulnerabilidade se aproximam da estabilidade (1,0), para as
densidades intermediárias atribuem-se valores intermediários (próximos de 2,0) e para
baixas densidades de cobertura vegetal valores próximos da vulnerabilidade (3,0),
conforme demonstrado na tabela 6.

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Uso do Solo Características da Vegetação Peso


Mata Cobertura vegetal estável 1,0
Pastagens Cobertura vegetal vulnerável 2,5
Cultura Permanente Cobertura vegetal vulnerável 2,7
Cultura Temporária Cobertura vegetal vulnerável 2,8
Solo Exposto Cobertura vegetal extremamente vulnerável 3,0
Área urbanizada Cobertura vegetal extremamente vulnerável 3,0
Tabela 6 - valores de vulnerabilidade da Vegetação encontrada na área de estudo.
Fonte:Carvalho (2013, p. 70).

Quanto à variável clima, o parâmetro é determinado pela intensidade pluviométrica


e seu poder erosivo. A causa fundamental da denudação é a ação da chuva agindo
inicialmente sobre as rochas provocando o intemperismo, e mais tarde sobre o solo
removendo-o pela erosão hídrica. Com isso, o processo erosivo é resultante do poder da
chuva em causar erosão e da capacidade do solo em resistir a essa erosão (CREPANI
et al, 2001).
Com isso, é adotada uma escala de erosividade (capacidade da chuva em alavancar
processos de erosão) que leva em consideração a distribuição linear dos valores
contidos entre os intervalos possíveis de intensidade pluviométrica para as diversas
regiões do país, demonstrada na tabela 7.
Intensidade Intensidade Intensidade
Pluviométrica Vulnerabilidade Pluviométrica Vulnerabilidade Pluviométrica Vulnerabilidade
(mm/mês) (mm/mês) (mm/mês)
< 50 1,0 200 - 225 1,7 375 - 400 2,4
50 - 75 1,1 225 - 250 1,8 400 - 425 2,5
75 - 100 1,2 250 - 275 1,9 425 - 450 2,6
100 -125 1,3 275 - 300 2,0 450 - 475 2,7
125 - 150 1,4 300 - 325 2,1 475 - 500 2,8
150 - 175 1,5 325 - 350 2,2 500 - 525 2,9
175 - 200 1,6 350 - 375 2,3 > 525 3,0
Tabela 7 - valores de vulnerabilidade da Vegetação encontrada na área de estudo.
Fonte:Carvalho (2013, p. 70).

Com as bases de dados e parâmetros quantitativos estabelecidos, foi possível


elaborar um mapa síntese (Figura 50), para a identificação das potencialidades e
restrições para o uso da terra na área de estudo. Utilizou-se quatro dos cinco dados
indicados por Crepani et al. (2001), sendo descartado o indicador Clima, haja vista que

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a bacia comporta um único regime climático. Nota-se que a autora utilizou também
um recorte temporal em seu estudo, fato que não iremos nos ater neste exemplo.

Figura 50 – Fragilidade Ambiental da área de estudo.


Fonte: Carvalho (2013, p. 106).

Os resultados obtidos foram diretamente influenciados pelas variáveis Pedologia e


Geologia. Nesse caso, portanto, a declividade pouco influenciou na fragilidade, haja vista
que o relevo da área varia de plano a ondulado, apenas, com até 20% de declividade
(CARVALHO, 2013)
As áreas de maior vulnerabilidade localizam-se entre oeste-noroeste-norte, no
setor 1 das bacias, apresentando geologia Serra Geral, argissolo e relevo plano a
suavemente ondulado. São áreas ocupadas por várzea e pastagem. A autora discute
que se a litologia fosse basalto, esta área traria resultados ainda mais preocupantes,
por conta da cobertura vegetal. Nas regiões nordeste-centro-leste, setor 2 das bacias,
a fragilidade é de nível médio, com algumas áreas de baixa fragilidade, ligadas à
presença de urbanização. São áreas planas a moderadamente onduladas, em Serra
Geral (basalto) e latossolos. No setor 3 da bacia, localizado na região sul-sudoeste,
apesar das modificações no uso da terra e, a fragilidade para esta área resultou em
muito baixa, em consequência dos atributos da área, com geologia de Serra Geral
e Santo Anastácio, latossolo e principalmente relevo plano a suavemente ondulado.

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Neste último caso, embora o relevo favorece a estabilidade, em comparação com as


outras áreas, a litologia e a pedologia favorecem uma maior fragilidade.
Ainda sobre o setor 3, a comparação entre dois períodos (1978 e 2009) permitiu
que autora traçasse uma relação entre uso do solo e fragilidade ambiental, haja vista
que em 1978 a fragilidade era baixa e o uso do solo se caracterizava apenas pela
pastagem, e em 2009 e a fragilidade variou de média para baixa, com a introdução
da cultura de cana-de-açúcar.
Dessa forma, caro(a) aluno(a), por meio desse exemplo prático de aplicação, podemos
dizer que esse tipo de trabalho contribui para o desenvolvimento de estudos integrados
à paisagem como ferramenta de políticas de ordenamentos territoriais e zoneamentos
geográficos para bacias hidrográficas.

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CAPÍTULO 10
POLÍTICA NACIONAL E A
GESTÃO DOS RECURSOS
HÍDRICOS NO BRASIL

10.1 Lei Nacional das Águas e as gestão dos recursos hídricos no Brasil

As preocupações com os recursos hídricos no Brasil não se iniciaram recentemente.


O marco legal da gestão pública da água em nosso país se deu por meio da instituição
do Decreto 24.643, de 10 de julho de 1934, denominado Código das Águas. Este código
é considerado o “pontapé inicial” técnico e jurídico nas apropriações e conservação
dos recursos hídricos do Brasil, assim como estabeleceu uma ordem jurídica para o
uso das águas e o aproveitamento dos cursos d’água, em especial para geração de
energia elétrica.
A partir disso, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, o uso da
água se destinava à geração de energia elétrica, controle de inundações, irrigação
e abastecimento, dando ênfase ao potencial hídrico de geração de energia elétrica
(MACHADO; TORRES, 2013).
A Constituição Federal de 1988 (CFB 1988) representou um marco importante para
a questão ambiental em nosso país e trouxe inúmeros avanços legais e institucionais
para os recursos hídricos, estabelecendo uma série de leis. Estabeleceu novos conceitos
relacionados à gestão dos recursos hídricos, determinando dois domínios: o Federal
e o Estadual, além de assegurar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos.
Porém, sem dúvida alguma, o grande marco norteador das ações referentes ao uso,
gestão, planejamento e gerenciamento de recursos hídricos no Brasil foi promulgação
da Lei Federal n.º 9.433/97 (Lei das Águas), que instituiu a Política Nacional de Recursos
Hídricos (PNRH), regulamentando o inciso XIX do Artigo 21 da Constituição Federal. A
referida Lei criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SNGRH).

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A mudança principal preconizada por essa Lei tem relação com os mecanismos
de gerenciamento, deixando de adotar um modelo centralizador e adotando medidas
de participação conjunta entre setores governamentais e da sociedade civil. A Lei da
água adere, então, os princípios de Dublin, sendo eles: adoção das bacias hidrográficas
enquanto unidades territoriais para gestão, planejamento e organização do território; a
prioridade de uso dos recursos hídricos devem estar voltados às necessidades básicas
dos seres humanos; a gestão deve ser integrada e participativa; e reconhecimento da
água como item econômico.
A PNRH tem por objetivo assegurar à atual e futuras gerações a necessária
disponibilidade de água em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos,
visando sua utilização de maneira racional e integrada, além da prevenção e defesa
contra eventos hidrológicos críticos, de origem natural ou antrópica, decorrente do
uso inapropriado dos recursos naturais (TAVEIRA, 2018).
Braga et. al (2008) resumem bem os princípios sobre os quais se baseia a política
nacional e gestão dos recursos hídricos em nosso país:

• reconhecimento da água como um bem público dotado de valor


econômico;
• garantia do uso múltiplo das águas;
• prioridade do uso dos recursos hídricos em situações de escassez
para o consumo humano e dessedentação de animais;
• adoção da bacia hidrográfica como unidade territorial de
planejamento e gestão das águas: gestão descentralizada;
• participação dos diferentes níveis do poder público, dos usuários
e da sociedade civil no processo de tomada de decisão: gestão
participativa (BRAGA et. al, 2008, p.24)

Com finalidade de implementação dessa política e atingir os seus objetivos de forma


mais eficiente, a PNRH instituiu o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos (SINGREH). A implementação desse sistema, que está previsto na CFB de
1988, traz inovações no sentido de atribuir mecanismo econômico na gestão da água,
no qual passa a ter valor econômico e a sua utilização fica sujeita a cobrança, por
meio do conceito de poluidor-pagador e usuário-pagador (BRAGA et al, 2008).
O SINGREH foi criado com o objetivo de coordenar a gestão integrada das águas;
arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos;
implementar a PNRH; planejar, controlar e regular o uso da água e preservar os recursos
hídricos; e promover a cobranças pelo uso dos recursos hídricos.

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Para a implementação de um sistema tão complexo, a Lei n.9.984, de 17 de julho


de 2.000 cria a Agência Nacional de Água (ANA), autarquia vinculada ao Ministério
do Meio Ambiente, sob regime especial, com autonomia administrativa e financeira,
cuja finalidade é implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrando o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Em seu Artigo 1º, a Lei estabelece a ANA como entidade federal responsável pela
implementação da PNRH, estabelecendo regras para a sua atuação, sua estrutura
administrativa e suas fontes de recursos.
Assim, a ANA está encarregada de regular o uso da água em rios de domínio da
União, por intermédio da outorga de direito de uso e de sua fiscalização. Sua atuação
obedece a fundamentos, objetivos, diretrizes e instrumentos da Política Nacional de
Recursos Hídricos, em particular a adoção da Bacia Hidrográfica como unidade territorial
de planejamento e gestão dos recursos hídricos, e é desenvolvida em articulação com
órgãos e entidades públicos e privados, integrantes do SINGREH.
Em relação à sua atribuição, Braga et. al (2008, p. 26) afirmam que a ANA atua
como:

Reguladora do uso de recursos hídricos em rios de domínio da União


e coordenadora da implementação do Singreh em todo território
nacional, a ANA tem como missão implementar e coordenar a gestão
compartilhada e integrada dos recursos hídricos e regular o acesso
à água, promovendo o seu uso sustentável em benefício da atual e
das futuras gerações.

Dessa forma, o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos é integrado


pelas seguintes instituições: Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH); ANA;
Conselho de Recursos Hídricos Estaduais e do Distrito Federal (CERH), Comitês das
Bacias Hidrográficas; Ministério do Meio Ambiente (MMA); Secretaria de Recursos
Hídricos e Ambiente Urbano (SRHU); entidades e secretarias estaduais; e agências
de água.
Assim, o sistema funciona por meio da integração das esferas Federal e Estadual,
dividindo-se em funções de formulação e implementação de políticas públicas para
o gerenciamento da água. Para fins de melhorar o entendimento, a figura 51 ilustra
como está estruturado o SINGREH.

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Figura 51 – Estrutura institucional de gestão de recursos hídricos no Brasil.


Fonte: BRAGA et. al ( 2008).

Nesse contexto, o CNRH subsidia a formulação da PNRH e promove a articulação


entre as esferas nacional e estadual; o MMA/SRH é responsável pela formulação das
políticas de orçamento da União; a ANA implementa o SINGREH, outorga e fiscaliza
o uso dos recursos hídricos de domínio da União; os órgãos estaduais de recursos
hídricos são responsáveis pela outorga e fiscalização do uso de recursos hídricos de
domínio estadual; os Comitês de bacia decidem sobre o Plano de Recursos Hídricos,
no que diz respeito aos aspectos de qualidade, quantidade e cobrança do uso da
água; e a Agência de água atuam como escritórios técnicos dos comitês de bacias.
Outra instituição central na garantia da gestão participativa dos recursos hídricos
são os comitês de bacias hidrográficas. O Comitê de Bacia Hidrográfica é um órgão de
gestão de recursos hídricos, com função de caráter normativo, deliberativo e faz parte
do Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Possuem o papel de
integrar as ações governamentais em todas as suas esferas. O comitê também possui
a função de promover o respeito aos ecossistemas, contribuir para a conservação e
preservação dos corpos hídricos e garantir o uso racional e sustentável dos recursos
hídricos (ANA, 2011).
Os comitês de bacia se diferem de outras instâncias de participação pública na
gestão da água, pois têm como atribuição legal deliberar sobre a sua gestão, porém

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de forma compartilhada com o poder público, dando a eles (comitês) o poder de tomar
decisões sobre um bem público comum. Então, antes de se tornarem leis e normas
para o uso da água, elas passam primeiramente pelo comitê (TAVEIRA, 2018).
Segundo a ANA (2011), cabe aos comitês a competência de promover o debate
acerca das questões de interesse da bacia hidrográfica, relacionadas aos recursos
hídricos e articular a atuação das entidades intervenientes. Complementa que cabe
aos comitês:

Promover o debate, articulando e integrando a atuação da sociedade


civil, dos usuários, do poder público e dos comitês de bacias afluentes,
e, na forma da legislação e deste Regimento Interno, a definição das
seguintes questões: a) O marco regulatório da bacia. b) A alocação
quantitativa e qualitativa das águas entre as diversas instâncias
deliberativas do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
c) os usos que proporcionem impactos regionais significativos. d) as
transposições e derivações internas e externas à bacia. e) os critérios
gerais para a cobrança pelo uso das águas. (ANA, 2011, p. 58)

Os Comitês de Bacias Hidrográficas são compostos por representantes da União;


dos Estados e do Distrito Federal, cujos territórios se situem, ainda que parcialmente,
em suas respectivas áreas de atuação; dos Municípios situados, em sua totalidade ou
apenas em parte da bacia; dos usuários das águas pertencentes à área de atuação da
bacia e das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia
(ANA, 2011).
A área de atuação dos Comitês é a totalidade de uma bacia hidrográfica, como sub-
bacia, tributário do curso de água principal, bacias ou sub-bacias hidrográficas, assim
como todo o sistema de drenagem em sua área de atuação. A ANA complementa que
somente em bacias de rios até a 3ª ordem, em território nacional, podem ser criados
comitês de bacia.
Como exemplo, podemos pegar a bacia do rio Paraná, caracterizada como bacia
de 1ª ordem. Componente da bacia do Paraná, está a bacia do rio Paranapanema
(2ª ordem). A bacia do rio Tibagi é uma bacia de 3ª ordem, localizada na bacia do rio
Paranapanema. Ou seja, a bacia do Paraná é a maior bacia em termos administrativos
dentro do território brasileiro para este exemplo. Ela é componente da bacia do rio da
Prata, porém, por se tratar de um rio transfronteiriço, não é considerada em termos
de gestão do território. A figura 52 ilustra essa questão.

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Figura 52 – Ordem de grandeza das Bacias Hidrográficas


Fonte: Elaborado pelo autor.

ISTO ESTÁ NA REDE

Dando prosseguimento à sua desafiadora missão de implementar a Política


Nacional de Recursos Hídricos, a ANA apresentou, em comemoração aos seus dez
anos de fundação, uma série de cadernos com o objetivo de discorrer, de forma
sucinta, sobre os instrumentos previstos na Lei das Águas, bem como sobre o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh).
Esse caderno, em específico, visa explicar, de forma detalhada, os comitês de bacias
hidrográficas, demonstrando objetivos e diretrizes desta importante ferramenta de
gerenciamento territorial.
Não deixe de acessar e ler esse completo material, disponível no link abaixo:

https://arquivos.ana.gov.br/institucional/sge/CEDOC/Catalogo/2012/CadernosDeCapacitacao1.pdf

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10.2 As Regiões Hidrográficas do Brasil

Prezado(a) aluno(a), conforme vimos anteriormente, a gestão dos recursos hídricos


no Brasil é realizada por bacias hidrográficas, com finalidade de ser uma gestão
descentralizada, que considere as particularidades ambientais de cada ecossistema,
assim como as especificidades sociais e econômicas, em um país megadiverso e
com dimensões continentais.
Com isso, para facilitar o projeto e o gerenciamento dos recursos hídricos, o Conselho
Nacional de Recursos Hídricos dividiu, em 2003, o conjunto das bacias hidrográficas
brasileiras em 12 regiões hidrográficas, sendo elas: Paraná; Amazonas; São Francisco;
Tocantins-Araguaia; Atlântico Nordeste Ocidental; Parnaíba; Atlântico Nordeste Oriental;
Atlântico Leste; Atlântico Sudeste; Paraguai; Uruguai e Atlântico Sul (Figura 53).

Figura 53 – Regiões hidrográficas brasileiras


Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_regi%C3%B5es_hidrogr%C3%A1ficas_do_Brasil#/media/Ficheiro:Brasil_Bacias_hidrograficas.svg

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ANOTE ISSO

Uma Região Hidrográfica é considerada “o espaço territorial brasileiro compreendido


por uma bacia, grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas com
características naturais, sociais e econômicas homogêneas ou similares, com vistas a
orientar o planejamento e o gerenciamento dos recursos hídricos” (ANA, 2005, p. 14)

Todas as regiões hidrográficas possuem o seu grau de importância dentro do contexto


dos territórios que elas englobam, entretanto, por uma questão de demanda hídrica
e potencialidade econômica, será dado ênfase às regiões hidrográficas amazônica,
do Rio Paraná, do São Francisco e do Tocantins-Araguaia, retratadas de forma mais
detalhada nos tópicos a seguir,

10.2.1 Região Hidrográfica Amazônica

A região hidrográfica amazônica abrange a rede hidrográfica mais extensa do mundo,


drenando praticamente metade de todo o território brasileiro. A Bacia Continental
Amazônica se estende muito além do território brasileiro, ocupa uma área de 6,1
milhões de km², atravessando sete países da América do Sul: Brasil, Peru, Bolívia,
Colômbia, Equador, Venezuela e Guiana (Figura 54).

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Figura 54 – Localização da Região Hidrográfica Amazônica.


Fonte: https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2008/04/bacia-amazonica.jpg

Porém, a maior parte (63%) está situada no Brasil, com uma área de aproximadamente
3,8 milhões de km², e 7 mil km de extensão. Abrange os estados do Acre, Amazonas,
Rondônia, Roraima, Amapá, Pará e Mato Grosso. A região hidrográfica drena grandes
cidades, cuja população total é de aproximadamente 9,6 milhões de habitantes (IBGE,
2010). Embora detenha 72% de toda a água do território brasileiro, a região é habitada
por menos de 8% da população brasileira, fato que nos remete ao assunto tratado
no capítulo 2 acerca da distribuição desigual dos recursos hídricos em nosso país.
Seu tributário principal nasce na região dps Andes peruanos com o nome de Ucaiali,
atravessa a selva equatorial do Peru e penetra em território brasileiro, no estado do
Amazonas, com o nome de Solimões, que encontram as águas escuras do rio Negro,
passando nesse ponto a ser chamado de rio Amazonas, constituindo-se o maior rio
do mundo em volume d’água e o segundo maior em extensão, perdendo apenas para
o rio Nilo, na África.

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ISTO ESTÁ NA REDE

Caro(a) aluno(a), embora saibamos muito sobre o rio Amazonas, sua nascente
ainda é controversa. Somente recentemente, por meio do avanço das
Geotecnologias, foi possível detectar as origens do rio Ucayali, rio Peruano que dá
origem ao rio Amazonas.
Confira a reportagem na íntegra:

https://www.cartacapital.com.br/educacao/onde-nasce-o-rio-amazonas/

Por ser um rio predominantemente de planície, seu potencial de navegação se


destaca, constituindo mais de 20 mil km de vias fluviais, contando com seus afluentes.
No entanto, muitos dos seus tributários se localizam em planaltos como o Planalto
Brasileiro e o Planalto das Guianas, caracteŕistica que os conferem grande potencial
hidrelétrico.

10.2.2 Região Hidrográfica do Rio Paraná

A região hidrográfica do Paraná (Figura 55) é uma das mais importantes regiões
hidrográficas do país, pois abriga aproximadamente 32% da população nacional:
cerca de 56 milhões de habitantes, concentrados em grandes e médias cidades.
Ou seja, trata-se da região hidrográfica mais densamente ocupada, cuja área é de
aproximadamente 880 mil quilômetros quadrados, abrangendo parte dos estados de
São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Goiás, Santa Catarina e Distrito
Federal, representando cerca de 10% do território nacional (IBGE, 2010).
O rio Paraná possui extensão de 2570 km (até sua foz no rio do Prata); somando-
se aos 1170 km do rio Paranaíba, seu afluente principal, totaliza 3.740 km, sendo o
terceiro rio mais extenso das Américas.

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Figura 55 – Região hidrográfica do Rio Paraná.


Fonte: https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2008/04/bacia-amazonica.jpg

Por ser uma área com alta densidade populacional, os recursos hídricos sofrem
sobrecargas constantes para atender ao uso urbano e rural. A densa ocupação
urbana em bacias de cabeceira na região configura um fator complicador quanto à
contaminação dos mananciais pelo lançamento de efluentes sem tratamento. Esse
problema é recorrente em grandes conglomerados urbanos, como a região Metropolitana
de São Paulo e Curitiba, apenas para ficar nos exemplos mais problemáticos.
Por ser uma região altamente urbanizada, a supressão histórica da vegetação
nativa é um fator importante para a degradação dos corpos d’água e soterramento
de nascentes, fenômeno que contribui para as constantes crises hídricas ocorrentes
na região.
Embora existam esses problemas característicos das áreas altamente urbanizadas,
essa região hidrográfica é a que apresenta as melhores condições de saneamento,
no qual cerca de 98% da população é abastecida e 70% possui coleta de esgoto
(TAVEIRA, 2018).

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A crescente demanda de água para irrigação, em virtude do aumento das


monoculturas de grãos, principalmente nos estados de São Paulo e Paraná, afetam
a demanda hídrica da região e em alguns casos, a demanda para irrigação é maior
do que a disponibilidade hídrica.

10.2.3 Região Hidrográfica do São Francisco

A Região hidrográfica do São Francisco drena uma longa depressão encravada


entre o Planalto Atlântico e as chapadas do Brasil Central. Ocupa 7,5% do território
nacional e abrange parte dos Estados da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Alagoas,
Sergipe, Goiás e o Distrito Federal (Figura 56).
O rio principal nasce na Serra da Canastra, em Minas Gerais, no sentido sul-norte
até a cidade de Barra (BA). Nesse ponto, volta-se para o nordeste até a cidade de
Cabrobó (PE), quando se dirige para o sudeste até desembocar na divisa de Alagoas
e Sergipe, no oceano Atlântico.
A população total da região é de 14,3 milhões de pessoas, sendo que 77% se
localizam em áreas urbanas (IBGE, 2010). Desse total, mais da metade encontra-
se na região do Alto São Francisco, onde localiza-se a região Metropolitana de Belo
Horizonte (MG), Petrolina (PE), Juazeiro (PE) e Penedo (AL).

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Figura 56 – Região hidrográfica do São Francisco.


Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/21/Bacia_S%C3%A3o_Francisco.png

O rio São Francisco é de extrema importância para a Região Nordeste, pelo volume
de água que transporta em plena região semiárida, inclusive durante os períodos de
estiagem. Com águas perenes, o São Francisco tem suas cabeceiras na Serra da
Canastra, em Minas Gerais, onde há precipitação relativamente abundante. Porém, a
região sofre com uma baixa oferta hídrica, especialmente nas porções onde o clima
é mais seco.
A maior demanda de retirada de água nessa região é a irrigação, representando
cerca de 77% do total do uso desse recurso (TAVEIRA, 2018). Com isso, há um conflito
pelo uso da água por parte da agricultura e do abastecimento humano.
O aproveitamento hidroelétrico é relevante, equivalente a 15% do total nacional, com
destaque às hidrelétricas de Xingó e Sobradinho. Inúmeras obras de engenharia têm
contribuindo com a diminuição de sua vazão, como é o caso da construção da Usina

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Hidrelétrica de Sobradinho. À jusante da barragem, o nível das águas do rio diminui


dramaticamente nos meses da seca, comprometendo, inclusive, o abastecimento de
água dos moradores da região.

10.2.4 Região Hidrográfica Tocantins-Araguaia

A Região Hidrográfica do Tocantins–Araguaia ocupa aproximadamente 10% do


território nacional, abrangendo parte dos estados de Goiás, Tocantins, Pará, Maranhão,
Mato Grosso e uma pequena parte do Distrito Federal (Figura 57).

Figura 57 – Região hidrográfica Tocantins-Araguaia


Fonte: https://meioambiente.culturamix.com/ecologia/bacia-do-tocantins-araguaia

A região é composta pelo rio Araguaia, que é o principal afluente do rio Tocantins.
Juntos, formam uma região hidrográfica que drena uma faixa de transição entre o
Cerrado e a Floresta Amazônica. A vazão média das águas do Tocantins-Araguaia
corresponde a 9,6% do total do país.

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O rio Tocantins nasce em pleno Planalto Central, no estado de Goiás, a cerca de


1.000 metros de altitude. Possui 1.900 km de extensão e deságua no estuário do rio
Amazonas. Seu principal afluente, o Araguaia, tem 2.600 km de extensão e envolve
a Ilha do Bananal, a maior ilha fluvial do mundo, com 350 km de comprimento e 80
km de largura.
Ocupa uma área de 967.000 km², onde vivem 8 milhões de pessoas IBGE (2010).
Desse total, 72% residem em áreas urbanas, portanto, a região é muito exposta à
poluição produzida pelas cidades.
Quanto à demanda hídrica, a região tem grandes trechos de rios navegáveis e
potencial hidrelétrico, com algumas das principais hidrelétricas como a Tucuruí, Serra
da Mesa, Lajeado e Canabrava. Além disso, a região abriga o maior complexo de
exploração mineral do Brasil, sendo responsável por cerca de 50% de todo o ouro
produzido no país.

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CAPÍTULO 11
DRENAGEM URBANA

Certamente, a urbanização é um dos mais importantes processos socioambientais


da atualidade. A massiva migração de pessoas para as cidades é o mais significativo
evento ecológico do século XX e o que mais ocasionou impactos, principalmente nos
trópicos, onde a instabilidade política e a falta de planejamento para o uso e ocupação
dos solos são realidades agravantes (REES, 1997).
É a partir do Colonialismo e da Revolução Industrial que o modelo ocidental de
cidades foi disseminado para todo o planeta, resultando em um modelo homogêneo
e globalizado, com consequências ambientais muito parecidas em diversas partes
do globo.
Em meados do século XIX, a população urbana mundial representava cerca de 1,7%,
atingindo 25% em 1960. Em 1980, esse número passou a representar 41,1%, saltando
para 46% no ano de 1995 (2,7 bilhões de pessoas). O ano de 2007 registrou a mais
importante alteração demográfica da história da humanidade, quando a população
urbana ultrapassou a rural (PUGLIELLI NETO, 2008).
No Brasil, a população urbana superou a rural ainda no final da década de 1960.
Os dados dos Censos Demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE, 2010) mostram que em 1950 a taxa de urbanização era de 36,1%; em 1970
era de 55,9%; em 2000 era de 81,2% e de 84,3% em 2010. O crescimento vegetativo
da população e o êxodo rural foram os principais fatores (GIRARDI, 2008).
Com isso, caro(a) aluno(a), neste capítulo vamos discutir como o acelerado
crescimento urbano das últimas décadas vem comprometendo a sustentabilidade hídrica
das cidades. Na medida em que retiramos a cobertura vegetal para a implementação
da infraestrutura urbana, estamos diminuindo a propriedade de infiltração da água
no solo, aumentando o escoamento superficial. Esse processo vai gerar uma série de
problemas de erosão e assoreamentos de córregos e rios, haja vista que os impactos da
urbanização nos recursos hídricos não se limitam ao perímetro urbano e se estendem
ao longo das bacias hidrográficas.

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11.1 Impactos da urbanização no ciclo hidrológico

O adensamento populacional permite a implementação de diversas melhorias nas


condições de vida das populações humanas, tais como: oferta de empregos, facilitação
da prática de serviços, oferta de serviços públicos de saúde, locomoção, opções de lazer,
entre outras. No entanto, tais “comodidades” se materializam em ações de degradação
ambiental, refletindo na saúde das populações urbanas e comprometendo a qualidade
de vida.
O desenvolvimento dos grandes centros urbanos se dá com a modificação e retirada
sistemática da cobertura vegetal nativa. O uso do solo, na maioria das vezes, sem
nenhum planejamento e estudo prévio de impacto ambiental, impacta diretamente no
ciclo hidrológico natural das bacias adjacentes às áreas urbanas. A substituição da
cobertura vegetal e a implementação de infraestrutura urbana acarreta os seguintes
efeitos no ciclo hidrológico:
• diminuição da infiltração no solo;
• aumento do escoamento superficial;
• redução do nível do lençol freático;
• diminuição da evapotranspiração;
• diminuição da reposição dos aquíferos subterrâneos.

Conforme vimos no capítulo 3, parte da água da chuva infiltra e percola no solo


e nas rochas, formando aquíferos subterrâneos. Com a retirada da vegetação, esse
solo se torna menos permeável, diminuindo drasticamente a quantidade de água
que vai infiltrar, principalmente com a pavimentação do solo. O asfalto é altamente
impermeável. A quantidade de água que deixa de sofrer infiltração permanece na
superfície, aumentando o escoamento superficial. A menor infiltração vai resultar
diretamente na diminuição do nível do lençol freático, que deixará de ser alimentado.
Além disso, em áreas urbanas o papel retentor de água da vegetação é extremamente
reduzido. A estrutura urbana não retém água da mesma maneira que a vegetação e
como consequência haverá redução da evapotranspiração.
A figura 58 ilustra as alterações antrópicas no ciclo hidrológico, causadas pela
urbanização e retirada da vegetação, relatado por Barbosa (2008), em seu estudo
sobre controle de inundações urbanas.

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Figura 58 – Efeitos da Urbanização no ciclo hidrológico


Fonte: GONZALES, 2016 (adaptado)

A figura 58-A ilustra uma situação de pré-urbanização, na qual há uma condição


mais próxima da natural, enquanto a (B) representa a mesma área, porém altamente
urbanizada. Repare que em (A), a evapotranspiração é de cerca de 40% por conta da
quantidade de vegetação presente, enquanto que na (B), esse valor cai para 25% e o
escoamento superficial aumenta de 10%, na figura (A) para 33% na (B). Outro fator
marcante é que em na situação de pré-urbanização a água subterrânea, utilizada
para o abastecimento do lençol freático e dos aquíferos subterrâneos, está em 50%,
enquanto na condição de pós-urbanização, essa água que deveria infiltrar, está sendo
levada para o esgoto pluvial, ou seja, será direcionada aos corpos d’água da bacia.
Além dos impactos acima mencionados, a urbanização também vai impactar nas
mudanças de alguns padrões ambientais, principalmente relacionados à temperatura
nas áreas urbanas. A maior parte das superfícies impermeáveis utilizadas nas cidades,

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como o concreto e o asfalto, têm elevada capacidade de absorção de radiação solar,


fazendo com que ocorra o aumento da emissão de radiação térmica de volta para o
ambiente, que se dá na forma de calor. Conforme vimos no capítulo 4, o aumento da
temperatura na superfície pode elevar o aumento da evaporação da água e também
ocasionar o movimento ascendente da massa de ar quente na atmosfera, resultando
em um aumento da precipitação. Esse fenômeno tende a agravar os problemas de
inundações e enchentes nas grandes cidades brasileiras.
A figura 59 ilustra a diferença de temperatura entre uma área mais vegetada em
relação a uma área urbana:

Figura 59 – diferença térmica entre cidade e área rural.


Fonte: https://www.revistaea.org/pf.php?idartigo=2330

Germano (2018) aponta que a supressão da vegetação na área urbana permite


que as superfícies fiquem expostas à radiação solar, promovendo o aquecimento
intenso das superfícies urbanas. Esse aquecimento vai possibilitar uma evaporação
acelerada, bem como a formação de nuvens mais carregadas e que podem gerar
chuvas torrenciais e impactar negativamente a infraestrutura urbana por meio das
enchentes.
Essa situação proporciona o desenvolvimento da formação do fenômeno denominado
ilhas de calor, no qual as temperaturas da área urbana se tornam mais elevadas do
que as rurais no entorno (GERMANO, 2018). Dessa forma, as ilhas de calor apontam
para temperaturas mais elevadas onde a urbanização é maior (cidades) e geralmente
mais amenas em áreas menos urbanizadas.

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ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Geralmente, as áreas centrais das cidades são mais quentes, devido à intensa
urbanização, enquanto as áreas periféricas apresentam temperaturas mais amenas.
Porém, na cidade de Maringá, no estado do Paraná, ocorre o oposto.
Segundo o pesquisador da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Paulo
Germano, as áreas centrais da cidade apresentam temperaturas menos elevadas,
contrariando grande parte das pesquisas direcionadas às ilhas de calor urbanas
(Figura 60).

Figura 60 – Sensoriamento remoto aplicado à ocorrência de hot spots em ilhas de calor de superfície na cidade de Maringá-PR.
Fonte: https://www.cbnmaringa.com.br/noticia/quais-sao-os-bairros-mais-quentes-de-maringa

“Este resultado diferente observado na cidade de Maringá pode ser explicado pela
arborização viária do município. Nós observamos que, na área central de Maringá,
nós temos espécies de árvores de grande porte que promovem o sombreamento
de ruas, casas e calçadas, atenuando o efeito de ilhas de calor. Já nos bairros mais
novos, essa arborização viária geralmente é de pequeno porte ou ainda não está
desenvolvida, gerando mais eventos de ilhas de calor”

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ISTO ESTÁ NA REDE

Acompanhe a entrevista de Paulo Germano na íntegra por meio do link abaixo:

https://www.cbnmaringa.com.br/noticia/quais-sao-os-bairros-mais-quentes-de-maringa

11.1.1 Inundações e Enchentes urbanas

As enchentes urbanas constituem-se num dos principais impactos atuais nas


sociedades e, segundo TUCCI (2005), são consequência de dois processos, que podem
ocorrer isoladamente ou de forma conjunta. Esses processos são os seguinte:
• Enchentes em áreas ribeirinhas - são enchentes naturais que atingem a população
que ocupa os leitos de rios por falta de planejamento do uso do solo. Geralmente,
os rios possuem dois leitos, o maior e o menor. O leito menor é aquele por
onde a água escoa na maior parte do tempo, enquanto que o leito maior sofre
inundação em média a cada dois anos. O impacto devido à inundação ocorre
quando a população ocupa o leito maior do rio, ficando sujeita às enchentes;
• Enchentes decorrentes da urbanização - Em uma bacia hidrográfica não
urbanizada, ou com pouca urbanização, o fluxo de água é retido pela vegetação,

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infiltra-se no subsolo e, o restante, escoa sobre a superfície de forma gradual,


apresentando picos de enchentes moderados em momentos onde há bastante
precipitação elevada. Em áreas urbanizadas, a ocupação do solo propicia
impermeabilização das superfícies, e a implementação de rede de drenagem faz
com que aumentem a magnitude das inundações, bem como a sua frequência.

A tendência da urbanização é ela ocorrer do sentido jusante à montante, devido


às características de relevo, haja vista que as áreas mais planas (a jusante) acabam
sendo ocupadas primeiramente, pois tendem a ser mais planas. À medida que as áreas
vão sendo loteadas, o sistema de drenagem vai aumentando, aumentando também a
vazão sobre o restante da bacia. A combinação do impacto dos diferentes loteamentos
produz aumento da ocorrência de enchentes a jusante. Esse processo ocorre por
meio da sobrecarga dos condutos sobre os rios e canais que atravessam as cidades.
O processo de urbanização, principalmente nas grandes cidades, tem causado
impactos expressivos para a população e para o meio ambiente. O desenvolvimento
desordenado desencadeou em um considerável aumento na frequência e nos
níveis das inundações, reduzindo a qualidade de vida da população e elevando os
prejuízos associados a estes eventos. Nesse contexto, as modificações hidrológicas
correspondentes observadas são: aumento considerável nos volumes escoados e
alterações nos hidrogramas de cheias, principalmente devido ao crescimento de áreas
impermeáveis (GONZALES, 2016).
De acordo com Barbosa (2006), o volume que escoava lentamente através da
superfície do solo e que era retido pela vegetação ou tinha sua velocidade reduzida
pela própria rugosidade do solo, com a urbanização passa a escoar no canais de
escoamento, gerando um maior custo de manutenção para redução dos picos de vazão.
São inúmeros os fatores e impactos ligados à urbanização que desencadeiam as
enchentes. Segundo TUCCI (2005), os fatores e os impactos mais presentes encontram-
se no quadro x, abaixo:
FATORES IMPACTOS
Impermeabilização Maiores picos de cheia e vazões
Redes de drenagem Maiores picos de cheia a jusante
Lixo Entupimento de bueiros e galerias pluviais
Maiores picos de cheia e volumes escoados /
Desmatamento
Maior erosão e Assoreamento em canais e galerias
Maiores picos de cheias
Ocupação de várzeas
Maiores custos de utilidades públicas
Quadro x - Fatores e impactos ligados à urbanização nas bacias hidrográficas.
Fonte: TUCCI (2005) adaptado pelo autor.

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A Figura 61 ilustra o impacto causado pela urbanização, representado por um


hidrograma. Os principais efeitos da urbanização são o aumento da vazão máxima e
o aumento do volume do escoamento superficial.

Figura 61 – Hidrograma apresentando os impactos da urbanização em uma bacia hidrográfica.


Fonte: GONZALES (2016, p. 41).

ANOTE ISSO

Hidrograma é a definição dada ao gráfico que relaciona a vazão (Q, m3/s ou L/s)
de uma dada bacia hidrográfica e o tempo (minutos, horas, dias). A relação entre a
precipitação (quanto, como e onde choveu) e a vazão é uma interação de todos os
componentes do Ciclo Hidrológico que existem entre a ocorrência da precipitação
e a vazão produzida na bacia hidrográfica. Costuma-se representar um hidrograma
em escala gráfica, colocando no eixo das abscissas o tempo, e no eixo das
ordenadas o valor correspondente à vazão.

11.2 Sistema de Drenagem Urbana

Para alterar esse quadro crítico relacionado às cheias, a adoção das medidas de controle
de inundações se faz necessária. Tais medidas são comumente classificadas em estruturais
e em não estruturais. As medidas estruturais incluem a modificação estrutural do rio,
mediante a realização de obras hidráulicas como barragens, diques e canalização, entre
outros. Já as medidas não estruturais são aquelas realizadas sem a transformação do
rio através de ações preventivas, como zoneamento de áreas de inundação e sistema
de alerta ligado à Defesa Civil. Para o controle da inundação de forma eficaz torna-se
necessária a combinação de medidas estruturais e não estruturais, para garantir o mínimo
de prejuízo possível para a população (BARBOSA, 2006).

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O sistema de drenagem urbana é essencial para a manutenção do equilíbrio hídrico


em uma bacia hidrográfica. As medidas de controle para as redes de drenagem urbana
devem possuir duas metas que são o controle do aumento da vazão máxima e a
melhoria das condições ambientais.
As medidas de controle de escoamento em um sistema de drenagem são
classificadas como “na fonte”, que está relacionado ao escoamento em estruturas
urbanas individuais (parques, estacionamentos, loteamentos, edifícios, praças, entre
outros); microdrenagem, que consiste no sistema de condutos pluviais em rede
primária; e macrodrenagem, que abrange os sistemas coletores de vários sistemas
de microdrenagem (GONZALES, 2016).

Figura 62 – Os sistemas de micro e macrodrenagem em áreas urbanas


Fonte: https://wp.ufpel.edu.br/hugoguedes/files/2019/10/Microdrenagem.pdf

Nesse sentido, as principais medidas de controle em um sistema de drenagem


pluvial são: o aumento da infiltração, que pode ser por meio da implementação de
áreas permeáveis; armazenamento de água mediante a criação de reservatórios
que amortecem o escoamento de água reduzindo a vazão de pico; e alterações da
capacidade de escoamento, que envolve alterações estruturais que visam aumentar
a vazão do rio e redução de seu nível para evitar as enchentes em picos de chuvas.
Essa última medida não resolve o problema, só o empurra à jusante.
A microdrenagem urbana é composta pelo sistema de condutos pluviais no loteamento
ou na rede primária urbana, formando por bueiros e tubulações secundárias de menor
diâmetro. Os elementos principais da microdrenagem são os meio-fios, as sarjetas,

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as bocas de lobo, os poços de visita, as galerias (Túnel Linear), os condutos forçados,


as estações de bombeamento e os sarjetões.
O meio fio é construído de blocos de concreto ou de pedra, localizados entre a via
pública e a calçada, com sua face superior nivelada com a calçada, formando uma
faixa paralela ao eixo da via pública; as sarjetas são faixas constituídas pelo limite
da via pública com os meio-fios, formando uma calha coletora das águas da chuva
provenientes da rua; as bocas de lobo são dispositivos de captação das águas das
sarjetas; os poços de visita são estruturas feitas para permitir a limpeza e inspeção
dos condutos subterrâneos; as galerias são canalizações públicas que visam escoar
as águas pluviais advindas das ligações privadas e das bocas de lobo; os condutos
forçados e estações de são utilizados no caso de o escoamento por gravidade não ser
possível para realização da retirada da água de um canal de drenagem para outro; e
os sarjetões que são formados pela própria pavimentação nos cruzamentos das vias
públicas, através de calhas destinadas a orientar o volume das águas que escoam
pelas sarjetas;
A macrodrenagem, por sua vez, inclui o sistema de córregos urbanos, naturais ou
canalizados (a céu aberto ou em galerias), capazes de drenar grandes áreas nas quais o
escoamento é originado em regiões urbanizadas e não urbanizadas. A macrodrenagem
é responsável pelo escoamento da água até os fundos de vale, onde serão despejadas
nos canais fluviais.
A figura 63 ilustra uma paisagem urbana composta por duas vertentes cortadas
por um fundo de vale.

Figura 63 – Paisagem urbana


Fonte: Google Earth (2022).

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Podemos imaginar que haverá situações diferenciadas quanto à drenagem da água


da chuva em direção ao fundo de vale nas duas vertentes. Na vertente esquerda,
podemos perceber que há uma menor impermeabilidade do solo, ou seja, a água vai
infiltrar melhor no solo, enquanto ocorre o processo inverso na vertente direita. Como na
área urbanizada o escoamento superficial vai ser maior, é provável que os impactos às
áreas de fundo de vale vão ser maiores, por razão da velocidade e quantidade da água
escoada. No entanto, a presença de áreas verdes e maior quantidade de arborização
urbana vão atenuar esse processo, pois a vegetação tende a interceptar a água da
chuva por um determinado período de tempo e também aumentam a capacidade de
infiltração da água no subsolo, diminuindo o escoamento superficial.

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Diversos estudos de impacto da ação pluvial em áreas urbanas são realizados, com
diferentes abordagens e propósitos. Trazemos aqui os estudos de Bocato (2017) e
Nigro (2020), relacionados à drenagem urbana que impacta diretamente uma região
de fundo de vale, onde se localiza o Parque do Ingá, na cidade de Maringá, Paraná.
Os dois autores, com abordagens diferentes, concluíram haver grande impacto
no interior do fundo de vale, relacionado à captação da água pluvial na bacia do
córrego Cleópatra (Figura 64).

Figura 64 – Sistema de escoamento de águas pluviais do Parque do Ingá


Fonte: NIGRO (2020).

Segundo Bocato (2017), além do escoamento superficial, que já afetava o parque, o


plano de desenvolvimento urbano do município direcionou para o interior do parque
o escoamento das águas pluviais, por meio de um Túnel Liner (A), captadas na área

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do Novo Centro. As águas são inicialmente armazenadas em cisternas localizadas


no Novo Centro, e posteriormente liberadas ao sistema de escoamento. Embora
possua dissipador de energia no escoamento das águas superficiais representados
nos pontos B e C, em desníveis topográficos, isso não ocorre na saída do Túnel
Liner, tornando o escoamento ineficiente.
Esse sistema de escoamento que se encontra no parque foi uma forma da
administração tentar mitigar um grande processo erosivo causado pelas pressões
da urbanização, na área. Porém, a voçoroca no interior do parque continua existindo,
mesmo com as iniciativas de tentar conter a velocidade da água no fundo de vale.

Figura 65 – Detalhes do escoamento de águas pluviais no interior do Parque do Ingá


Fonte: NIGRO (2020).

A figura 65 demonstra a saída do túnel, onde é possível observar processos erosivos


avançados, caracterizados por uma voçoroca na área da nascente do Córrego
Moscados. Esse processo ocasiona solapamento do terreno, comprometendo a
estabilidade do solo e suprimindo parte da vegetação da área mais conservada do
parque

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CAPÍTULO 12
VEGETAÇÃO E A PROTEÇÃO
DOS RECURSOS HÍDRICOS

Caro(a) aluno(a), neste capítulo vamos olhar mais de perto o papel da vegetação
para a manutenção, proteção e estabilidade dos recursos hídricos em nosso país.
Primeiramente, iremos abordar, dentro de uma perspectiva histórica, alguns pontos
importantes acerca da legislação brasileira, no que diz respeito à conservação da
natureza. Porém, com finalidade de atendermos aos objetivos da disciplina, iremos
fazer isso com o foco no estabelecimento das Áreas de Preservação Permanente
(APP) e dos processos legais que levaram à legislação atual. Após essa breve análise,
discorreremos sobre a importância da manutenção da vegetação e as consequências
quando de sua supressão.

12.1 Leis e dispositivos legais para a proteção dos recursos hídricos

Os mecanismos legais de estabelecimento das APP são frutos de uma sucessão


histórica de medidas e leis ligadas ao contexto de cada época em que foram
implementadas. A preocupação com a manutenção dos recursos naturais no nosso
país não é de hoje e se inicia na década de 1930, no então governo do presidente
Getúlio Vargas.
O Código Florestal Brasileiro de 1935 (Lei Federal nº 23.793) foi a primeira legislação
federal que versava sobre proteção de áreas naturais de relevante interesse ambiental
para o país. Um dos pontos mais positivos do código era a proibição do corte de árvores
ao longo dos cursos d’água, principalmente em áreas que abrigassem espécies raras
ou em áreas de proteção de mananciais.
Segundo Sampaio (2013):

O Código Florestal de 1935 não foi muito respeitado, até porque


tinha muitas falhas que permitiam o desmate de forma exagerada.
O governo não tinha infra-estrutura suficiente para o controle do
respeito ao código, assim como, não tinha prioridade no sentido
de proteção da floresta. O jurista Osny Pereira comparou o direito
florestal brasileiro da época com os de outros países e concluiu que
a legislação brasileira era uma das mais suaves e leves do mundo
em relação à proteção das florestas (SAMPAIO, 2012, p. 69)

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Somente em 1965 com a efetivação do novo Código Florestal Brasileiro (Lei Federal
nº 4.771) é que algumas questões foram revistas e aperfeiçoadas. Embora tenha
possibilitado a substituição de florestas nativas por florestas alteradas, o código
avançou no sentido de regulamentar a proteção mais efetiva dos regimes hídricos,
estabilidade geológica e para a manutenção da biodiversidade e da paisagem, com
vistas ao bem-estar humano. Esse código determinou a exigência do estabelecimento
de APP em áreas previamente delimitadas.
Anteriormente ao estabelecimento do Código Florestal de 1965, não existia legislação
específica de proteção aos fundos de vale e florestas marginais, ficando a proteção destes
recursos sujeita ao interesse de cada local. Somente mais tarde, com a efetivação do novo
Código algumas questões foram revistas e aperfeiçoadas. Foi a primeira regulamentação
em relação ao tratamento das APP, determinando uma faixa mínima de proteção de 5
metros em cada margem dos cursos d’água com até 10 metros de largura.
Após o estabelecimento do código de 1965, diversas outras resoluções federais,
estaduais e municipais foram aperfeiçoando e alterando as regulamentações previstas.
Em 18 de setembro de 1985, por meio da resolução CONAMA nº 04, ficaram definidas
como reservas ecológicas as florestas e as demais formações vegetais que se situam ao
longo dos corpos d’água, tais como rios, córregos, lagos, lagoas, represas e nascentes.
Somente em 1989, por meio da Lei nº 7.80310, foi alterada para 30 metros de
proteção, em cada margem, dos cursos d’água com até 10 metros de largura. Além
de proibir a substituição de florestas heterogêneas por homogêneas, a referida lei
também foi importante para afirmar sua aplicabilidade em solo urbano e reafirmar a
obediência dos princípios e limites estabelecidos por ela, obedecendo o disposto nos
planos diretores municipais.
No final da década de 1990, outros decretos, leis e resoluções foram promulgadas
em favor da proteção ambiental. Como destaque, há a Resolução SEMA (Secretaria
de Estado e Meio Ambiente) 031/1998 que estabelece critérios e procedimentos
administrativos referentes ao licenciamento e autorizações ambientais, assim como
anuência prévia para desmatamento. Também podemos destacar a Lei Federal nº
9.065/98 (lei de crimes ambientais), que, em seu artigo 38, considera crime destruir
florestas de preservação permanente, mesmo que em estado inicial de formação.
Em meio a uma série de discussões duradouras e polêmicas de flexibilização
ambiental, foi aprovado o novo Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651, de 25 de maio
de 2012), que consiste em uma readequação do antigo Código de 1965. Para a maior
parte da comunidade acadêmica e dos ambientalistas, a implementação deste novo
código é considerada uma anistia ambiental para com aqueles que desmataram antes
de 2008. As maiores implicações legais das mudanças da legislação são refletidas
nas áreas rurais (NIGRO, 2020).

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A aprovação do texto referente à Lei Federal 12.561/2012, de revisão ao Código


Florestal, implicou em uma série de retrocessos legais relacionados à proteção da
vegetação, que puderam ser sentidos com maior intensidade nas áreas rurais, mas
que trouxeram problemas, inclusive, para as áreas urbanas (NIGRO, 2020).
Dentre todas as alterações e flexibilizações em relação à supressão da vegetação
nativa da APP, a mais grave é a possibilidade para sua utilização pública e de interesse
social, bastando que administração pública julgue que aquela área é propícia a
determinado empreendimento visando o bem-estar comum, que a camada vegetal
poderá ser parcialmente substituída por tal empreendimento. São consideradas
utilidades públicas a instalação para competições esportivas de pequena ou grande
abrangência, além da gestão de resíduos.

ISTO ESTÁ NA REDE

No ano de 2013, após a aprovação do Novo Código Florestal, em 2012, a Produtora


Cinderela e O2 Play, juntamente com André D`Elia e Fernando Meirelles, produziram
o documentário “A Lei das Águas – novo Código Florestal” que é uma compilação
de dados e opiniões sobre a temática legal, social e ambiental com enfoque
direcionado à conservação da natureza.
Nesse documentário, diversos profissionais qualificados, pesquisadores nacionais
e internacionais, ligados a diversas áreas do conhecimento, manifestaram suas
opiniões e teses sobre a questão preservacionista e legal do código florestal. Além
desses, diversos deputados e senadores, envolvidos no cenário de aprovação do
documento oficial, também foram convidados a apresentarem seus argumentos.
Deixando evidente os pontos de vista ambientalistas e econômicos, além de
interesses pessoais e financeiros.
O documentário denuncia os interesses privados sobressaindo-se aos interesses
públicos de preservação da natureza e dos recursos hídricos. Vale a pena conferir.
Está disponível na íntegra, no link abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=jgq_SXU1qzc

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Segundo o Novo Código Florestal Brasileiro (2012), Áreas de Preservação Permanentes


(APP) são espaços territoriais especialmente protegidos, independentemente da cobertura
vegetal, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade
geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o
bem-estar das populações humanas.
A APP possui, ainda, a função de promoção da preservação das florestas e demais
formações vegetais no território nacional. São formadas por vegetação nativa ou alterada.
A Lei determina que as referidas áreas devem ser mantidas integralmente, não ocupadas
por habitação humana e livres de qualquer exploração econômica (BRASIL, 2012).
Uma das funções da APP é preservar os recursos hídricos através da manutenção
da cobertura vegetal que reduz a drenagem, o carreamento de substâncias e elementos
para os corpos d’água. Por sua vez, a vegetação ciliar oferece o sombreamento da água
controlando a temperatura, e funciona como fonte de fornecimento adequado de nutrientes
para os organismos aquáticos e silvestres. Também age como filtro de sedimentos que
podem afetar o ecossistema aquático.
São consideradas APP os topos de morros, morrotes, montanhas ou serras, cuja altura
é superior a 100 metros e a inclinação média é de 25º; as encostas de morros, serras e
montanhas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;
as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; as nascentes e
as margens dos rios; as áreas em altitude superior a 1.800 metros, qualquer que seja
a vegetação; os manguezais, em toda a sua extensão; e as bordas dos tabuleiros ou
chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 metros, em
projeções horizontais (BRASIL, 2012).
A figura 66 ilustra alguns tipos mais comuns de APP:

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Figura 66 – Principais tipos de APP existentes, segundo o Código Florestal Brasileiro (2012).
Fonte: https://www.florestativa.com.br/areas-preservacao-permanente-app
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O Código Florestal vigente (2012) prevê faixas e parâmetros diferenciados para as


distintas tipologias de APP, de acordo com a característica de cada área protegida. No
caso das faixas mínimas a serem mantidas nas margens dos cursos d’água, a norma
considera a conservação da vegetação e também as características e a largura do
curso d’água, seja em área rural ou urbana.
De forma geral, todas as faixas marginais de cursos d’ água perenes ou não, assim
como lago, lagoas e lagunas, desde que naturais, devem ser cobertos por vegetação e
consideradas APP. A área de vegetação deve seguir o tamanho mínimo estabelecido
de acordo com a largura do eixo d`água: (Figura 67)

I. as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e


intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do
leito regular, em largura mínima de:
a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10
(dez) metros de largura;
b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de
10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50
(cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de
200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham
largura superior a 600 (seiscentos) metros;
II. as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com
largura mínima de:
a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo
d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa
marginal será de 50 (cinquenta) metros;
b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas.
(BRASIL, 2012).

Figura 67 – Largura da faixa marginal da APP de acordo com a largura do rio.


Fonte: https://trilhante.com.br/curso/espacos-territoriais-especialmente-protegidos/aula/areas-de-preservacao-permanente-app-parte-4-2

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As APPs cumprem inúmeras funções ecológicas, todavia a APP de nascente exerce


ainda uma importante atividade: a filtragem de sedimentos que possam vir por erosão
dos ambientes de montante, especialmente se estes contiverem sistemas produtivos
como a agricultura e a pecuária. A presença da floresta em APP de nascente também
realiza a sustentação mecânica de taludes por meio de raízes, diminuindo fortemente o
processo de desbarrancamento e, consequentemente, o remonte erosivo em nascentes.
Nesse sentido, de acordo com a lei, as nascentes e os olhos d’água perenes,
independente do tipo e tamanho, devem ser cercados por vegetação em um raio de
50 metros em todas as direções.

Figura 68 – Estrutura institucional de gestão de recursos hídricos no Brasil.


Fonte: https://www.ufsm.br/pro-reitorias/proinfra/uma/o-que-sao-areas-de-preservacao-permanente/

12.2 Mata ciliar e a vegetação da bacia como fator de conservação do solo e dos
recursos hídricos

Caro(a) aluno(a), sabemos que a preservação da vegetação e das áreas florestadas


é essencial para um adequado e equilibrado funcionamento dos ecossistemas e para a
manutenção da biodiversidade. Além disso, as florestas exercem funções significativas
no controle da erosão e assoreamento dos corpos d’água, controle da desertificação e
da qualidade da água. A vegetação em uma bacia hidrográfica é eficaz para estabilizar
e manter as vazões dos rios.
As bacias hidrográficas são vulneráveis a alterações da vegetação, pois elas interferem
nas propriedades do solo e refletem nas propriedades da água. A presença ou não de

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vegetação pode influenciar nas características da água e no ciclo hidrológico em um


manancial, o que é de fundamental importância para a sustentabilidade do ambiente.
Os ecossistemas florestais desempenham inúmeras funções, entre elas estão a
mitigação do clima (temperatura e umidade); redução de enchentes e recarga para os
rios; controle de erosão; melhoramento da qualidade da água no solo e no rio; atenuação
da poluição atmosférica; fornecimento do oxigênio e absorção do gás carbônico;
prevenção contra ação do vento e ruídos; produção de biomassa e fornecimento
de energia. Todas as funções atuam simultaneamente, sendo a maioria baseada na
atividade biológica da própria floresta (NUCCI, 2001; MASCARÓ; MASCARÓ, 2010).
As raízes das plantas evitam que o solo se torne demasiadamente compacto a ponto
de dificultar a infiltração da água. A presença da vegetação permite a absorção da água
das chuvas e permite sua condução até o lençol freático e ao aquífero subterrâneo. Além
de possibilitar uma maior infiltração da água, também permite que parte considerável
dessa água infiltrada retorne à atmosfera por meio da evapotranspiração.
Nesse sentido, os fluxos de chuva e os picos de cheias tendem a aumentar com
o desmatamento, pois esse compacta o solo e dificulta o processo de infiltração da
água. A manutenção da permeabilidade do solo e a absorção da umidade diminuem
a intensidade e a duração das inundações.
Dessa maneira, uma das funções mais relevantes da vegetação é a manutenção da
estabilidade geológica do solo. A sua retirada, sobretudo das de porte arbóreo, ou até
mesmo a sua substituição para uma vegetação menos robusta, leva ao aumento do
escoamento superficial, principalmente em áreas onde a declividade é mais acentuada.
Esse fato desencadeia processos de erosão dos solos e contribui para o transporte
de materiais para os recursos hídricos, causa de constante assoreamento dos rios
(SAUNDERS et al., 1991).
Assim, a presença da vegetação, sobretudo a florestal, em áreas de maior declividade,
ajuda a aumentar a absorção da água e impede que o solo seja levado pela erosão.
As folhas das árvores, a vegetação rasteira e a serrapilheira diminuem o impacto
da água da chuva e aumentam a sua infiltração. As raÌzes das árvores, por sua vez,
formam um emaranhado que ajuda na sustentação da camada superficial do solo.
A figura 69 ilustra o comportamento da água em áreas de grande declividade. A
primeira situação (área com floresta) apresenta maior cobertura florestal na vertente,
enquanto que na segunda (área sem floresta), essa cobertura é esparsa ou inexistente.
Observe que na segunda situação, o escoamento superficial vai ser muito maior,
provocando processos de erosão ao longo da vertente e o material advindo desse
processo irá parar no rio, causando assoreamento deste.

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Figura 69 – Processo de assoreamento do rio pela retirada da mata ciliar.


Fonte: https://docplayer.com.br/81714632-Livro-eletronico-aula-00-geografia-p-colegio-naval-2018-com-videoaulas.html

A vegetação atua no amortecimento do impacto das chuvas e na diminuição do


escoamento superficial, contribuindo para a melhoria da qualidade da água, pois reduz
o volume de sedimentos trazidos pela erosão, reduzindo o assoreamento dos rios e
corpos d’água.
Podemos entender como assoreamento (Figura 70), o acúmulo de sedimentos
(terra, areia, rocha, argila) e outros materiais como lixo e matérias orgânicas, que vão
sendo levados até o leito dos cursos d’água pela ação da chuva, vento ou do próprio
ser humano e se acumulam nos corpos d’água. Embora seja um processo natural, as
ações antrópicas de retirada da cobertura vegetal, principalmente das matas ciliares,
potencializam os processos de assoreamento, trazendo uma série de danos ambientais
e comprometendo a qualidade da água.

Figura 70 – Processo de assoreamento do rio pela retirada da mata ciliar.


Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-1-Assoreamento-de-um-corrego-devido-a-retirada-da-mata-ciliar-para-entao-o-usar_fig1_272506965

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Além disso, ao perder profundidade devido ao acúmulo de sedimentos, a largura do


rio cresce e, devido à maior irradiação do sol por área, a temperatura da água aumenta,
comprometendo a biodiversidade, que é sensível a essas mudanças ambientais. Desse
modo, a fauna e flora subaquáticas são afetadas, podendo até mesmo desaparecer.
Nas encostas dos rios, a retirada da vegetação (mata ciliar) ocasiona o aumento
da erosão (Figura 71), comprometendo a estabilidade geológica da área, haja vista
que se não forem realizadas medidas de manejo da vegetação ou até medidas mais
drásticas de estabilização de encostas, a erosão vai crescendo e pode comprometer
boa parte do terreno onde se localiza o corpo d’água.

Figura 71 – Erosão em córrego por conta da retirada da mata ciliar, em Campo Grande (MS).
Fonte: https://www.questoesdevestibular.com.br/questao/http-mundoeducacaoboluolcombr-o-processo-ilustrado

Quando a erosão nas encostas de rios ocorrem em áreas onde a declividade é


mais acentuada, pode comprometer a estabilidade do solo, causando solapamento
de terreno e voçorocas (Figura 72).

ANOTE ISSO

Voçoroca ou Boçoroca é o nome que se dá a um tipo de erosão em estágio


avançado. O que difere a voçoroca dos outros tipos de erosão é a sua dimensão,
mas também a profundidade. Alguns autores consideram que para ser chamada de
voçoroca, a erosão deve ser tão grave a ponto de atingir o lençol freático.
Em alguns lugares, as voçorocas chegam a atingir dezenas de metros de largura
e profundidade e centenas de metros de comprimento, comprometendo e
impossibilitando o uso do solo tanto para atividades agrícolas como urbanas.

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Figura 72 – Voçoroca e solapamento de terreno na beira do córrego Cleópatra, Maringá, PR.


Fonte: NIGRO, 2020.

Solapamento de solo ou de terreno é a ação erosiva, geralmente associada às


voçorocas, que cria um vazio na parte inferior da vertente. Ocorrem em vertentes
íngremes, sendo comuns nas margens fluviais e em muitos cortes de rodovias e
ferrovias (Figura 73).

Figura 73 – Processo de solapamento em vertentes.


Fonte: http://www.cprm.gov.br/publique/media/gestao_territorial/curso_processos_erosivos.pdf

Outro impacto decorrente da retirada da vegetação em uma bacia hidrográfica é


o movimento de massa (Figura 74). De acordo com a velocidade e composição do
material deslocado vertente abaixo, recebe diferentes denominações (escorregamento

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de encosta, desmoronamento, queda de blocos, entre outros). São processos


desencadeados por uma série de fatores naturais, porém, geralmente são potencializados
pela ação antrópica, principalmente àquela relacionada a retirada da vegetação. No
Brasil, os movimentos de massa de grande magnitude, quando ocorridos em áreas
ocupadas, geram inúmeros desastres naturais, provocando consideráveis prejuízos
socioeconômicos e perda de vidas humanas (PINTO et al., 2012).

Figura 74 – Movimento de massa em encosta potencializado pela retirada da vegetação.


Fonte: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-provoca-os-deslizamentos-de-terra/amp/

A figura 74 ilustra uma situação onde a fragilidade da vertente foi potencializada


pela retirada da vegetação para fins de habitação humana em uma área que deveria
ser destinada à preservação, por conta da sua alta declividade. A situação 1 demonstra
a estabilidade no solo pela permanência da vegetação arbórea apropriada. Repare que
no local onde o solo cedeu, a vegetação era composta por bananeiras, cujas raízes
são fracas e os troncos pesados.

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A situação 2 mostra uma parte da vertente sem cobertura vegetal, onde vai ocorrer
o agravamento. Na situação 3, a água da chuva vai formando canais de drenagem,
auxiliando a agravar o deslizamento. A terra e os detritos caem na rede e podem se
dividir por meio dela, multiplicando a área de devastação e arrastando materiais para
regiões relativamente distantes. A situação 4 mostra como as ocupações irregulares em
encostas de morros podem piorar mais a situação, pois as construções vão eliminando
a cobertura vegetal da área. Além disso, as habitações nas encostas criam lacunas,
que podem canalizar e intensificar os deslizamentos.
Portanto, caro(a) aluno(a), veja a importância que a cobertura vegetal desencadeia
para a estabilidade dos processos geológicos das vertentes, proteção dos recursos
hídricos para manter a qualidade da água que vai ser consumida pelos seres humanos
e para a manutenção dos ecossistemas, tão importantes para a qualidade de vida
das populações. Por todos esses fatores, ações de manejo e reflorestamento são
recomendadas para recuperação de áreas degradadas nas bacias hidrográficas,
principalmente onde a fragilidade ambiental é mais evidente.

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CAPÍTULO 13
PRÁTICA DE CAMPO:
ESTUDO DA VEGETAÇÃO
APLICADA À HIDROLOGIA

Prezado(a) aluno(a) e futuro professor(a), agora que já entendemos a principal


função da vegetação para a proteção dos recursos hídricos em bacias hidrográficas,
devemos refletir um pouco sobre as práticas pedagógicas. Quando falamos em erosão
do solo e assoreamento de rios, muitas vezes esses conceitos se tornam abstratos
para o aluno, principalmente para aqueles que ainda estão nas séries iniciais. É função
do professor de geografia pensar formas alternativas de passar o conteúdo de uma
maneira lúdica e eficaz, fazendo com que o aluno consiga assimilar os principais
processos e conceitos.
Nesse sentido, na primeira parte do capítulo, iremos trazer algumas ideias de
atividades práticas para trabalhar com os alunos em sala de aula. São atividades
simples e que podem ser feitas sem a necessidade de muito recurso empregado. Após
essa etapa, trataremos de um estudo de caso relacionado à pesquisa acadêmica,
mostrando a atuação prática do geógrafo na temática abordada.

13.1 Aula prática: atividades pedagógicas para simular os efeitos da mata ciliar
e a erosão do solo

13.1.1 Garrafas pet

Embora simples e de fácil confecção, o experimento que iremos abordar neste item
é extremamente eficaz e seus resultados são de fácil visualização. Ele visa demonstrar
a relação entre a precipitação, a erosão do solo, a proteção dos cursos de água e a
vegetação.
Antes de apresentá-lo aqui, é bom que se saiba que não há uma única maneira
de fazê-lo e existem diversas variações que podem apresentar alguns resultados

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diferenciados, porém, o objetivo é sempre o mesmo, demonstrar a relação dos fatores


acima já mencionados.
Para a confecção da maquete, iremos precisar dos seguintes itens:
• 3 garrafas pets de tamanhos iguais (preferência 2L);
• 3 recipientes transparentes para escorrer o líquido;
• terra;
• plantas (mato ou grama);
• pedras e/ou cascalhos e/ou folhas secas;
• estilete e tesoura;
• garrafa pet com tampa furada (diversos furos) ou regador de jardim.

As três garrafas devem ser cortadas longitudinalmente e preenchidas com terra


(Figura 75). Na garrafa (A), a terra não recebeu nenhum tipo de cobertura, enquanto
sobre a terra da garrafa (B) deverá ser depositada uma grossa camada de folhas secas,
cascalho e algumas pedras. Essa camada de folhas secas simulou a serrapilheira
encontrada no solo das florestas. O objetivo dessa garrafa é demonstrar que além
das plantas, todo o material vegetal (folhas, caules, ramos, frutos, flores) que recobre
o solo das florestas, a chamada serrapilheira, é importante para a preservação do
solo, evitando a erosão e o assoreamento.

Figura 75 – maquete para simulação de processos de erosão do solo.


Fonte: https://profalexandregangorra.blogspot.com/2013/05/experimento-sobre-erosao-do-solo.html (adaptado pelo autor, 2022).

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Na garrafa (C) podem ser inseridas a vegetação juntamente com a terra. A vegetação
pode ser mato ou grama, pois é mais fácil encontrar. Ao retirar do local, é necessário
que a terra acompanhe, pois nela ficarão as raízes das plantas já estabelecidas.
Também há a opção, e daí o resultado certamente será melhor, de plantar sementes
de crescimento rápido, como é o caso do alpiste, por exemplo. Nesse caso, o resultado
do experimento será melhor, pois a vegetação estará melhor enraizada no solo e a
quantidade de sedimentos que irá cair no recipiente será menor.
Conforme se observa na figura 75, após despejar água sobre a superfície da terra
nas três garrafas houve diferença na quantidade de água e de material particulado
dissolvido na água retida nos três recipientes coletores. Na garrafa cuja terra não tenha
qualquer tipo de cobertura, houve maior quantidade de água e com aspecto barrento,
demonstrando que a água despejada funcionou analogamente a chuva, favorecendo o
escoamento superficial e possibilitando o carreamento de sedimentos e os acumulando
no recipiente coletor.
Na garrafa com cobertura de folhas observou-se uma redução da quantidade de água
retida Esta água possui aspecto menos barrento, quando comparada com a garrafa
anterior. Dessa maneira, é possível observar que as folhas reduziram o impacto da água
diretamente no solo, mas não impediram que a mesma escorresse superficialmente
e carregasse partículas de solo, acumulando-as no recipiente coletor, demonstrando
a importância que a serapilheira tem na estabilidade do solo, mas que não é maior
do que a própria vegetação.
Na garrafa com cobertura vegetal, foi observada menor quantidade de água retida
no recipiente coletor, demonstrando o poder de infiltração da vegetação, pois a água
irá demorar para sair. Observa-se que a água apresentou a coloração mais clara e com
menos sedimento, em comparação com a água dos demais recipientes coletores. O
fato de ter ido menos água para o coletor, demonstra a capacidade de infiltração da
vegetação, mas também o papel de interceptador de parte da água que cai no solo.
Existem outras variações desse mesmo experimento. Na aula prática da disciplina,
fizemos um experimento parecido, mas ao invés de colocar serapilheira na garrafa
(B), colocamos grande quantidade de pedras. As garrafas (A) e (C) demonstraram o
mesmo comportamento relatado acima, no entanto, o escoamento superficial foi muito
superior na garrafa (B). Ou seja, a água não penetrou no solo e escorreu rapidamente
para o coletor. Essa situação é similar a do asfalto, mostrando alta impermeabilidade.

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13.1.2 Caixa de papelão

A maquete da caixa de papelão tem a mesma proposta didática da maquete com


as garrafas pet. Para a confecção da maquete, iremos precisar dos seguintes itens:
• 1 caixa de papelão;
• terra;
• plantas (mato ou grama);
• pedras e/ou cascalhos e/ou folhas secas;
• estilete e tesoura;
• garrafa pet com tampa furada (diversos furos) ou regador de jardim.

Inicialmente, coloca-se a garrafa pet no fundo da caixa de papelão, em seguida


é necessário preencher os dois lados com terra, de modo que ficasse uma ligeira
inclinação a partir da borda da caixa de papelão até o nível da borda da garrafa pet,
simulando certa declividade para que a água possa escorrer em direção à garrafa.
No lado denominado de (I) da garrafa pet coloca-se a terra contendo a vegetação,
simulando a mata ciliar, enquanto que no lado (III) apenas a terra sem cobertura. A
garrafa pet (II) teve a função de simular o rio. (Figura 76).

Figura 76 – maquete para simulação de processos de erosão do solo.


Fonte: https://revistapos.cruzeirodosul.edu.br/index.php/rencima/article/view/1564/1290 (adaptado pelo autor, 2022).

Antes da utilização da maquete, garrafa pet (II) deve ser preenchida com água
e em seguida, com o auxílio de uma garrafa com diversos furos em sua tampa ou
com um regador de jardim, a água deve ser despejada nos dois lados da maquete,
simulando a chuva. É importante que a água seja pulverizada e não concentrada, pois

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deve simular, de maneira mais fiel possível, a precipitação que ocorre naturalmente.
De maneira similar à maquete anterior, a água que apresentou maior sedimentação
é fruto da falta de cobertura vegetal.
Dentro de uma mesma ideia de atividade, é possível realizar uma variação. No
entanto, nesse exemplo haverá um maior empenho dos alunos na construção da
maquete, pois ela é um pouco mais complexa. Devemos sempre lembrar que há
diversas formas de fazer, aqui segue apenas um exemplo.

Figura 77 – maquete para simulação de processos de erosão do solo.


Fonte: https://revistapos.cruzeirodosul.edu.br/index.php/rencima/article/view/1564/1290 (adaptado pelo autor, 2022).

Os materiais utilizados são:


• Caixa de papelão ou madeira;
• Corte em “V”;
• Calço de 1 cm de altura, para deixar a parte fechada, atrás, mais alta;
• Forrar toda a caixa com plástico;
• Terra;
• Grama e folhas secas (cobrir toda a área);
• Plantas pequenas (“árvores”);
• garrafa pet com tampa furada (diversos furos) ou regador de jardim.

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13.1.2 Maquete plantada

Sem dúvida alguma, a maquete mais interessante de se trabalhar essa temática


é a maquete plantada, pois ela simula uma situação mais próxima do que realmente
ocorre na natureza. Entretanto, sua confecção é bem mais demorada e requer um
planejamento adequado. Trata-se de um recipiente de madeira dividido em duas partes,
sendo que em uma delas haverá vegetação plantada e a outra apenas solo exposto.
Talvez seja interessante o professor envolver os alunos no processo de plantio das
mudas para a utilização futura da maquete.

Figura 77 – maquete para simulação de processos de erosão do solo.


Fonte: https://revistapos.cruzeirodosul.edu.br/index.php/rencima/article/view/1564/1290 (adaptado pelo autor, 2022).

13.2 Estudo de caso: análise da recomposição da vegetação em áreas de fundo


de vale em uma bacia hidrográfica urbana

Agora, caro(a) aluno(a), traremos um estudo de caso da aplicação da utilização de


uma bacia hidrográfica como recorte espacial para fins de planejamento da paisagem
em área urbana. Nesse caso, iremos trazer os estudos de Nigro (2020) acerca da
análise da bacia hidrográfica do córrego Cleópatra/Moscados, dentro da área urbana
do município de Maringá, no estado do Paraná.
A figura x apresenta a área de estudo. Os fragmentos de vegetação foram separados
em fragmentos de fundo de vale (localizados em áreas de APP) e demais fragmentos
de outras tipologias, representando outros tipos de áreas protegidas como parques
ou reservas naturais. Os números correspondem às áreas de coleta de dados, que
serão explicadas posteriormente.

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Figura 78 – Localização da área de estudo contendo os pontos de análise.


Fonte: NIGRO (2021)

Essas áreas foram separadas em “unidades de vegetação” por serem áreas mais ou
menos homogêneas, com características próprias que as diferenciam umas das outras, no
conjunto da paisagem. Dentre as unidades de paisagem presentes na bacia, selecionou-
se oito pontos para a análise, na tentativa de ter a maior representatividade possível das
áreas de fundo de vale que fazem parte do recorte espacial da pesquisa.
O município de Maringá é drenado por 20 córregos, sendo que 19 deles possuem suas
nascentes dentro da área urbana. Os cursos d’água apresentam leitos “encaixados” nos
vales (SALA 2005), assim chamados de fundos de vale, os quais drenam a malha urbana
do município, percorrendo cerca de 70 km. A bacia hidrográfica do córrego Cleópatra/
Moscados pode ser considerada de terceira ordem, pois os córregos principais que a
compõem (Moscados e Cleópatra) são considerados rios pequenos, de terceira ordem,
originando-se da confluência de dois canais de segunda ordem.

12.3.1 Procedimentos metodológicos

Com base nos trabalhos de Bedê et al. (1997), Puglielli Neto (2008), Sampaio (2013)
e Cardoso (2016), atribuiu-se valores aos parâmetros previamente estabelecidos, com
finalidade de quantificar a realidade estudada e, por meio de uma análise multicritérios,

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qualificar os fragmentos florestais quanto ao seu grau de conservação e/ou degradação,


a fim de alcançar os objetivos propostos.
Dessa forma, os valores são relativos e comparativos entre os parâmetros de cada
critério, variando em escalas de 1 a 3 e 1 a 5, a depender do critério em questão. Os menores
valores indicam situação menos favorável, e os maiores valores indicam situação mais
favorável do ponto de vista das condições físico-ecológicas das unidades de vegetação.
Entende-se que alguns dos critérios adotados possuem peso maior do que outros, por
conta dos objetivos do trabalho e também pela percepção e conhecimento dos autores.
Por esse motivo, foram estabelecidos pesos (1 a 3) a fim de diferenciar esses critérios,
sem desprezar a importância que cada um deles tem para a dinâmica da paisagem.
O Quadro x expressa os critérios e os parâmetros utilizados para medir o grau de
degradação das unidades de vegetação localizadas nas áreas de fundo de vale.

Figura 79 – critérios para análise da degradação dos fragmentos em fundos de vale na área de estudo.
Fonte: NIGRO (2021)

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Por meio da compilação dos dados diagnósticos obtidos, cada fragmento florestal
foi classificado de acordo com grau de degradação, separados em alto, médio e baixo,
conforme a pontuação estabelecida para cada unidade de vegetação. Desse modo,
entende-se que os valores mais altos sugerem áreas menos degradadas, necessitando
de poucas ações de manejo. Em contrapartida, os índices mais baixos sugerem
intervenções quanto à conservação dessas áreas.

12.3.1 Resultados e Discussões

Com base na análise dos mapas de uso da terra (Figura 80) no recorte temporal entre
2003, 2013 e 2018, foi possível observar aumento significativo das áreas florestadas
na bacia do córrego Cleópatra/Moscados, principalmente nas áreas de fundo de vale,
objeto de estudo deste trabalho.
É possível notar o aumento considerável da vegetação entre os anos de 2003 e
2013, ao mesmo tempo que aumenta o tamanho das áreas urbanizadas e diminui as
áreas de vazios urbanos. Em 2003, havia uma cobertura florestal de aproximadamente
6,7% em relação à área da bacia, que no ano de 2013 subiu para 9,6%, aumentando
novamente em 2018 para 9,92%. Em termos de áreas, em 2003 os fragmentos florestais
analisados ocupavam 1,75 km2. Dez anos mais tarde, em 2013, passaram a ocupar
2,51 km2, praticamente dobrando de tamanho. Entre 2013 e 2018 observou-se pouca
diferença, porém, houve pequeno aumento para 2,57 km2, permanecendo na casa
dos 9%.

Figura 80 – Localização da área de estudo contendo os pontos de análise.


Fonte: NIGRO (2021)

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Observa-se que entre os anos de 2003 e 2013, na maior parte desses fragmentos,
houve recomposição parcial da vegetação. No ano de 2003, não havia vegetação
florestal com espécies lenhosas na área, e, no ano de 2013, é possível observar que
parte dela já se encontrava recomposta, com presença de espécies lenhosas em grande
parte do perímetro. No ano de 2018, a área se apresentava quase completamente
recomposta com vegetação florestal.
Nesse sentido, fragmentos que se mantiveram conservados ou já estavam
parcialmente recompostos tendem a apresentar estágios sucessionais mais avançados,
e os que se recompuseram integralmente ou de maneira quase completa tendem a
apresentar estágios menos avançados de sucessão. É claro que se deve ponderar
que essa tendência pode se confirmar ou não, a depender de outras variáveis que
influenciam na dinâmica vegetacional dos fragmentos, como o tamanho e o formato
destes, declividade do terreno, entre outras.
Dentre os pontos analisados, o que apresentou maior suscetibilidade a processos
erosivos foi o ponto 2. A área apresenta formato côncavo e está associada a duas
vertentes retilíneas e côncavo-retilíneas. A vertente (A) apresenta declividade média
de 7,3%, com valor máximo de 10,8%. A vertente (B) apresenta declividade média de
9,4%, com inclinação máxima em 15,4%, considerada média, de acordo com a literatura.
A característica topográfica da área, aliada ao alto adensamento urbano e
impermeabilidade da matriz, favorece o carreamento de materiais para o interior do
fragmento, desencadeando processos erosivos nas margens do córrego Cleópatra.
Apesar da baixa declividade e drenagem pobre, o córrego Cleópatra pode apresentar
elevados picos de enchente e elevada ocorrência de processos erosivos dada a taxa
de impermeabilização dos terrenos, o que faz aumentar o escoamento superficial,
contribuindo com o aumento da velocidade de escoamento da água pluvial. Isso ocorre
pelo fato de toda a bacia se localizar em área urbanizada e a parte norte ter alto grau
de adensamento urbano. Dessa forma, as águas pluviais coletadas na drenagem
urbana são lançadas no interior dos fundos de vale (ZAMUNER; NOBREGA; MARTONI,
2002; BORSATO; MARTONI, 2004). Essa condição foi observada, também, ao longo
do córrego Moscados, principalmente na porção NE.
Também foram observados processos erosivos nos pontos 6 e 7. Mesmo
localizados em áreas de baixa densidade urbana, é possível notar que os interflúvios
são impermeabilizados e a declividade é alta em algumas áreas dentro da unidade
de vegetação, nas partes mais baixas da vertente. Além disso, a ausência de uma

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vegetação florestal contribui para caracterizar a área como de alta suscetibilidade


para a ocorrência de processos erosivos. As águas pluviais do entorno convergem
para esses dois pontos, inclusive aquelas oriundas da área do Cemitério Municipal,
que atingem o fundo de vale, possibilitadas pelas características físicas da área.
Embora os demais pontos tenham apresentado situação topográfica semelhante,
não foram encontrados processos erosivos nas análises de campo. Porém, pelas
características do relevo e pela condição da vegetação marginal do município, os
processos erosivos são latentes nas áreas de fundo de vale da bacia hidrográfica,
evidenciando a necessidade de manutenção e proteção integral dos fragmentos florestais
que compõem a APP, sobretudo aqueles situados em áreas de maior declividade.
Como resultado da análise multicritério proposta, as unidades de vegetação foram
classificadas quanto ao grau de degradação em que se encontram, conforme mapa
da figura 81.
Pertencentes a uma classe mais alta de degradação estão as unidades de vegetação
que contêm os pontos de análise 4, 6, 7 e 8. O fator determinante para isso é a
ausência de vegetação nativa e a abundante ocorrência de espécies exóticas/invasoras.
Além disso, são locais onde não havia vegetação florestal em 2003, sendo quase
completamente recompostas em um período de 20 anos.
No entanto, essa recomposição não se deu acompanhada de um manejo adequado,
com medidas de reflorestamento e/ou retirada de vegetação invasora, por exemplo,
mas sim por um abandono relativo por parte da administração pública. O fato de essas
áreas não estarem cercadas e permitirem o livre acesso da população também é um
fator que auxilia na regressão da cobertura vegetal nativa. De forma não coincidente,
foram os pontos com maior ocorrência de perturbações antrópicas, associadas,
principalmente, ao descarte de resíduos sólidos e abertura de trilhas na parte interna
dos fragmentos. Essa é a classe mais emergencial, e necessita de urgente medida
de manejo e recuperação da vegetação nativa. Recomenda-se a adoção de algumas
medidas: recuperação da floresta nativa; controle e eliminação de herbáceas exóticas/
invasoras; controle e eliminação de espécies arbóreas exóticas/invasoras; manejo de
bambus; manejo de lianas e trepadeiras; e cercamento da área.

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Figura 81 – Localização da área de estudo contendo os pontos de análise.


Fonte: NIGRO (2021)

Em uma classe intermediária, estão os fragmentos de média degradação,


representados pelos pontos 2, 3 e 5. Essas áreas também se encontram em estágio
inicial de sucessão vegetal, mas apresentam condições ecológicas mais estabelecidas
e número reduzido de espécies exóticas/invasoras. Porém, apresentaram pouca
diversidade de espécies arbóreas e poucos estratos de vegetação. Mesmo a área do
ponto 2 se mostrando frágil quanto à ocorrência de processos erosivos, acredita-se
que, pelo fato de ser uma área central e parcialmente cercada, a vegetação apresentou
indícios de recomposição. Recomenda-se a adoção de medidas de manejo, tais como:
recuperação da floresta nativa; controle e eliminação de herbáceas e lenhosas exóticas/
invasoras; manejo de trepadeiras; e eliminação de bambus na baixa vertente.

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O ponto 1 foi o único representante da classe de baixa fragilidade, apresentando


condições ecológicas satisfatórias e com poucos indicativos de degradação.
Recomenda-se medidas de controle de lianas e trepadeiras e controle de herbáceas
exóticas/invasoras, principalmente na alta vertente.

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CAPÍTULO 14
IMPACTO HUMANO NO
CICLO HIDROLÓGICO

Caro(a) aluno(a), sabemos que a retirada da cobertura vegetal e o uso do solo


sem o devido planejamento pode levar a bacia hidrográfica e o conjunto da paisagem
a inúmeros impactos ambientais, muitas vezes irreversíveis aos ecossistemas. A
urbanização tem sido o principal fator das mudanças ambientais, tais como: aumento
da temperatura da superfície; diminuição da infiltração do solo; aumento do escoamento
superficial; diminuição da quantidade de água (recarga) dos aquíferos subterrâneos;
redução da evapotranspiração; aumento da erosão e sedimentação de cursos d’água;
entre outros associados à retirada da cobertura vegetal, conforme vimos de forma
detalhada no capítulo 12.
Porém, neste capítulo, iremos dar maior ênfase aos processos ligados à poluição
e mal uso do solo nas bacias hidrográficas. Trataremos, de forma mais detalhada,
os impactos associados ao ciclo de contaminação da água superficial e subterrânea.

14.1 Poluição e contaminação da água


Apesar de parecerem sinônimos, os termos “contaminação” e “poluição” remetem a
coisas diferentes, embora estejam interligados. A poluição remete à alteração de alguma
característica ambiental (sedimento, químico e biológico) seja no ambiente aquático,
terrestre ou atmosférico. A contaminação, por sua vez, pressupõe a existência de
agentes biológicos patogênicos ou presença de substâncias nocivas à saúde (veneno).
Devemos entender por poluição ambiental qualquer tipo de ação ou obra humana
capaz de provocar deterioração ou degradação do meio ambiente. A poluição pode
se dar de diversas formas e em diversos ambientes. Na água, geralmente, está
associada ao descarte irregular de efluentes e resíduos sólidos. Porém, também pode
ser ocasionada pela presença em excesso de uma ou mais substâncias não poluentes.
Por exemplo, o fosfato e outros nutrientes são essenciais às plantas ou à vida aquática,
contudo, se utilizados em quantidades excessivas, passam a ser prejudiciais, inclusive
causando desastres ecológicos. Nos ambientes aquáticos, pode causar o processo
de eutrofização da água (ANA, 2012).

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ANOTE ISSO

Eutrofização é o processo de mudança ambiental que ocorre na água, fruto do


acúmulo de nutrientes, especialmente fósforo e nitrogênio, provocando surgimento
excessivo de organismos como algas e cianobactérias. Esse processo ocorre de
forma natural, mas é potencializado pela poluição de origem humana, geralmente
advinda de esgotos domésticos. O ser humano pode desencadear a eutrofização
quando, por exemplo, lança no ambiente aquático resíduos, como o esgoto
doméstico e industrial, ou faz a utilização inadequada de adubos orgânicos, que
podem ser transportados para o ambiente aquático (Figura 82)

Figura 82 – Eutrofização em um corpo hídrico.


Fonte: https://fsm2009amazonia.org.br/tag/eutrofizacao/

A eutrofização pode acarretar diversos problemas, como: forte odor em razão da


decomposição anaeróbica; diminuição na penetração de luz; alterações na cor e
turbidez da água; florescimento excessivo de algumas espécies invasoras, que
provoca a deterioração no ecossistema aquático; diminuição na concentração de
oxigênio, alterando drasticamente as condições ambientais e levando a perda da
biodiversidade. Além de impactar os ecossistemas, também compromete diversos
usos humanos da água, como: turismo, abastecimento público, navegação e
funcionamento das hidrelétricas, por exemplo.

De acordo com Tucci (1998), a poluição das águas decorre da adição de substâncias
ou de formas de energia que, diretamente ou indiretamente, alteram as características
físicas e químicas do corpo d’água de uma maneira que prejudique a utilização das suas
águas para usos benéficos. Torna-se importante ressaltar a existência dos seguintes
tipos de fontes de poluição: atmosféricas, pontuais, difusas e mistas.

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As fontes pontuais são facilmente identificáveis e seu tratamento é relativamente


eficaz e rápido, pois trata-se de lançamentos individualizados, como o lançamento
de esgotos sanitários, efluentes industriais, derramamentos acidentais de alguma
substância química, atividade de mineração, entre outras. As fontes difusas, por
sua vez, não possuem um ponto identificado de lançamento e, por isso, são mais
difíceis de serem identificadas e tratadas. São exemplos: as práticas agrícolas, as
deposições atmosféricas, os trabalhos de construção, as enxurradas em solo, entre
outras (GONZALES, 2016). As fontes mistas são aquelas que englobam características
de cada uma das fontes anteriormente descritas.
Quanto ao aumento da poluição na água, a autora complementa que:

Por mais estranho que se possa parecer, a deterioração dos rios


foi agravada com a construção de redes de esgoto doméstico, que
desembocam nos corpos receptores grandes quantidades de matéria
orgânica. Em quantidades adequadas, o esgoto sanitário, bem como
alguns efluentes industriais tratados, podem ser dispostos em rios,
os quais através do processo de autodepuração têm a qualidade de
suas águas recuperadas. No entanto, o grande excesso de efluentes
que são ilegalmente lançados nos mananciais causa uma demanda
de consumo de oxigênio dissolvido na água, que resulta da ação
das bactérias atuando na degradação da matéria orgânica presente
nos esgotos. O consumo do oxigênio pelas bactérias tem como
consequência a deterioração da qualidade da água, levando muitas
vezes à mortandade de peixes (GONZALES, 2016, p. 38).

ANOTE ISSO

Efluente é o termo usado para as águas que perderam suas características naturais,
ou seja, aquelas que foram alteradas. São compostas por água doméstica, excretas
dos seres humanos, água dos comércios e também das indústrias. Os efluentes
são formados pelo esgoto doméstico ou industrial.

Cada uma das fontes de poluição citadas determinam um certo grau de poluição
no corpo hídrico atingido, que é mensurado através de características físicas, químicas
e biológicas das impurezas existentes. Por isso, com fins didáticos, podemos separar
os tipos de poluição nos corpos d’água em três: Poluição química, física e biológica
(PEREIRA, 2004). A figura 83 resume os tipos de poluição existentes e o ciclo de
poluição da água.

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Figura 83 – Ciclo de contaminação da água.


Fonte: https://ambientesaudavelbiologia.wordpress.com/contaminacao-das-aguas/

Os poluentes químicos (Figura 84) são responsáveis por grande parte da


contaminação dos corpos hídricos. Podem ser biodegradáveis ou persistentes. O
primeiro sofre decomposição pela ação de bactérias, ao longo do tempo, e acabam
sumindo do meio, como é o caso dos detergentes, inseticidas e fertilizantes. Os
persistentes se mantêm por longo tempo no meio ambiente e nos organismos vivos.
Estes poluentes podem causar graves problemas como a contaminação de peixes
e demais animais que servem de alimento aos seres humanos, além de causarem
impactos irreversíveis nos ecossistemas aquáticos. Como exemplo, temos o mercúrio
e o chumbo, sendo o primeiro muito utilizado em atividades mineradoras.

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Figura 84 – Efluentes químicos despejados em corpo d’água.


Fonte: https://www.estudopratico.com.br/poluicao-quimica-dos-rios/

A poluição física é aquela que altera as características físicas da água, sendo a


térmica e a sólida os principais tipos encontrados. A poluição térmica decorre do
lançamento nos rios da água aquecida usada no processo de refrigeração de refinarias,
siderúrgicas e usinas termelétricas. Esse tipo de poluição altera as características
ambientais da água, levando muitos seres vivos à morte.
A poluição por resíduos sólidos (Figura 85), por sua vez, é originada pelo acúmulo
de lixo em áreas adjacentes aos rios e córregos, ou despejados diretamente neles. O
escoamento da água ao longo da bacia acaba levando esse material sólido ao interior
dos corpos d’água. Também podem ser fruto de material particulado e sedimentos
provenientes da erosão dos solos, levados ao interior dos rios, riachos, ribeirões e lagos.
A água também pode ser contaminada por organismos patogênicos, existentes
nos esgotos, podendo conter bactérias, vírus, protozoários e vermes, responsáveis
por diversas doenças graves aos seres humanos.

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Figura 85 – Efluentes químicos despejados em corpo d’água.


Fonte: https://www.ferrovelhocoradin.com.br/os-problemas-da-destinacao-incorreta-de-residuos/

Os Oceanos, rios e lagos, sobretudo os que se encontram nas proximidades de


regiões urbanizadas e industrializadas, estão, em sua maioria, seriamente poluídos.
Esses ambientes quase não possuem mais nenhum tipo de vida. Embora tendemos a
pensar que a poluição se concentra em áreas de mananciais, não podemos esquecer
que, de um jeito ou de outro, as águas sempre vão parar nos oceanos. Um exemplo de
poluição que compromete a integridade dos ecossistemas, mas também afeta a vida
das pessoas é a Baia da Guanabara, no Rio de Janeiro, tão poluída que não permite
nem banho. Já imaginou os prejuízos para o turismo da região?
No caso dos oceanos, a quantidade de óleo despejada pelos petroleiros em suas
operações regulares ou em caso de vazamento de óleo em navios, oleodutos, plataformas
marítimas, entre outros, compromete fortemente a biodiversidade marinha, mas também
as regiões adjacentes e litorâneas, haja vista que, em grandes derramamentos de óleo,
a mancha tende a avançar sentido litoral. Os derramamentos de óleos acidentais
figuram os impactos mais catastróficos à biodiversidade marinha, além de causar
uma série de consequências socioambientais às populações humanas.

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ISTO ESTÁ NA REDE

No ano de 2019, tivemos um desastre ambiental muito grande ligado ao


derramamento de óleo que atingiu boa parte da costa do Nordeste. Segundo a
reportagem do UOL, publicada no ano de 2022, o óleo chegou pela primeira vez no
final de agosto de 2019, em praias nos municípios de Pitimbu e Conde, no litoral da
Paraíba. Dali em diante, o óleo foi se alastrando, e somente até março de 2020 o
Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis) contabilizou
1.009 localidades afetadas em 130 municípios do Maranhão ao litoral norte do Rio
de Janeiro.
Segundo dados da reportagem, mais de 80% da biodiversidade de invertebrados foi
perdida na área que as equipes de pesquisa fizeram o levantamento. Houve redução
de 85% de animais por m² de praia. Este é um prejuízo muito significativo para a
natureza, especialmente para os invertebrados sésseis, aquelas espécies que, diante
do perigo, não têm como ‘correr’. E como serve de alimentos para animais maiores,
as consequências são sentidas em todo o ecossistema marinho afetado.
Veja a reportagem na íntegra, através do link abaixo:

https://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2021/08/30/oleo-nordeste-dois-anos.htm

Embora os sistemas hídricos de água subterrânea apresentam maior resistência à


poluição do que os superficiais, eles também são passíveis de contaminação. Ocorrem
em menor frequência e quantidade, pois a camada de solo atua como filtro físico,
químico e biológico. Contudo, quando contaminada, tem um custo mais elevado de
recuperação, além de existir também um tempo longo neste processo. (CENTRO DE
GESTÃO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS, 2003).
Nesse contexto, os defensivos agrícolas não são apenas fontes difusas de poluição
dos rios e córregos, mas também são responsáveis pela contaminação das águas
subterrâneas. Com as chuvas, os produtos químicos usados na composição dos
pesticidas se infiltram no solo ou acabam escorrendo para os rios. A infiltração em

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direção aos lençóis freáticos contamina a água subterrânea. Fertilizantes sintéticos


e agrotóxicos (inseticidas, fungicidas e herbicidas), usados em quantidades abusivas
nas lavouras, poluem o solo e as águas dos rios, onde intoxicam e matam diversos
seres vivos.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente (2006):

O uso intensivo de fertilizantes e agrotóxicos também tem contribuído


para a contaminação das águas. Além disso, os garimpos, a irrigação
e as barragens hidrelétricas são responsáveis pelo desvio do leito
dos rios, redução da vazão, alteração da intensidade e época das
enchentes, transformação de rios em lagos etc., com impactos diretos
sobre os recursos pesqueiros. (MMA, 2006, p. 59)

A mineração é outra atividade causadora de impactos nas águas superficiais e


subterrâneas. Embora não seja a principal fonte de poluição desses sistemas, ela acarreta
um grave quadro ao meio ambiente, pois a recuperação dessas áreas degradadas é
lenta e gera grandes custos. Parte da poluição e contaminação advindos da atividade
mineradora se dá pelo uso do mercúrio para o beneficiamento do ouro, enquanto
a mineração do carvão tem como impacto a contaminação das águas superficiais
e subterrâneas pela drenagem de águas ácidas proveniente de antigos depósitos
de rejeitos. Além desses fatores que são específicos para cada mineral beneficiado,
ainda existem impactos comuns, como: construção de barragens, desmatamento e
desencadeamento de processos erosivos. (PEREIRA, 2004).
A falta de saneamento básico, fruto da desigualdade social brasileira, potencializa
o impacto superficial e subterrâneo por vazamento de redes de esgoto, proliferando
doenças, sobretudo para as comunidades mais próximas das áreas afetadas.
Outro elemento contaminante das águas subterrâneas são os lixões (Figura 86) e
os aterros controlados. Os lixões são áreas a céu aberto, destinadas ao acúmulo de
lixo e não fornecem nenhum tratamento adequado para ele. Tendo em vista que essa
destinação não possui nenhum critério sanitário de proteção ao meio ambiente, o
resultado é que todo esse lixo contamina a água, o ar, o solo, o lençol freático, atraindo
inúmeros vetores de doenças (insetos, ratos, vermes, baratas, entre outros),
A decomposição do lixo, produz um líquido altamente poluído e contaminado
denominado chorume. Em caso de má disposição dos rejeitos, como ocorre no lixão,
o chorume atinge os mananciais subterrâneos e superficiais. Este líquido contém

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concentração de material orgânico equivalente a uma escala de 30 a 100 vezes o esgoto


sanitário, além de microorganismos patogênicos e metais pesados (PEREIRA, 2004)

Figura 86 – Lixão a céu aberto.


Fonte: https://www.estudopratico.com.br/poluicao-quimica-dos-rios/

As medidas para conter esse tipo de contaminação são simples, porém requerem
grandes investimentos. As soluções passam pelo adequado manejo e descarte final
dos resíduos, que devem ser realizados em aterros sanitários adequados.

ISTO ACONTECE NA PRÁTICA

Aterro Sanitário é um local de depósito de lixo coberto, que recebeu adequações


para evitar a poluição e contaminação do ar, solo e água. No aterro, o lixo é
depositado em solo impermeabilizado com argila e mantas de PVC. Os aterros
sanitários também possuem sistema de drenagem para o chorume, que é
levado para tratamento, sendo depois devolvido ao meio ambiente sem risco de
contaminação, além de captação dos gases liberados, como metano, seguida da
sua queima. A figura 87 explica detalhadamente o funcionamento de um aterro
sanitário adequado.

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https://www.ferrovelhocoradin.com.br/os-problemas-da-destinacao-incorreta-de-residuos/
Figura 87 – Funcionamento de um aterro sanitário.
Fonte: https://movimentolixocidadao.com.br/como-funciona-um-aterro-sanitario/

Embora separamos a poluição em: atmosférica, do solo e da água, devemos


compreender que é uma separação arbitrária, haja vista que todos esses ambientes
funcionam de forma integrada. Um exemplo disso é a ocorrência da chuva ácida. Ela
não está ligada diretamente à poluição da água, mas representa uma perturbação

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no ciclo hidrológico, por conta da poluição atmosférica, e acaba, por consequência,


poluindo a água, mesmo que indiretamente.
A fumaça que sai do escapamento dos veículos automotores, das usinas termelétricas,
refinarias e diversos tipos de indústrias é extremamente tóxica, pois nela há o óxido de
enxofre (SO2 e SO3) e de nitrogênio (N2O, NO e NO2). Esses compostos reagem com
as gotículas de água na atmosfera, formando o ácido sulfúrico (H2SO4) e ácido nítrico
(HNO3). Embora qualquer precipitação seja considerada ácida, somente haverá dano
à natureza com alterações no pH do solo e da água. É o que acontece em regiões
onde a precipitação contém esses compostos originários das atividades humanas
poluidoras. Esse tipo de chuva altera o pH do solo e da água e com isso destrói a
cobertura vegetal e mata os micro-organismos. A figura 88 mostra o esquema de
contaminação e a formação das chuvas ácidas

Figura 88 – Formação e ocorrência das chuvas ácidas no ambiente.


Fonte: https://conhecimentocientifico.com/o-que-e-a-chuva-acida/

Quando cai a chuva ácida, os metais tóxicos chegam à água, que por sua vez é
ingerida pelo homem. Isso pode causar sérios problemas de saúde no decorrer do
tempo, como problemas renais, cardíacos e de hipertensão. Há também associação
desse tipo de intoxicação com outras doenças graves.
Perceba, caro(a) aluno(a), que são inúmeros os problemas decorrentes das atividades
econômicas humanas. Cabe a nós, educadores, transmitir esse conhecimento aos
nossos alunos, buscando a conscientização e sensibilização na perspectiva de um
futuro melhor, onde o uso da água respeite os preceitos da sustentabilidade.

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CAPÍTULO 15
USO DA ÁGUA, GERAÇÃO
DE ENERGIA E IMPACTOS
AMBIENTAIS

15.1 A água e o potencial Energético no Brasil

Uma das alternativas para a geração de energia elétrica se dá pela transformação


da energia hidráulica disponível. Ao contrário das demais fontes renováveis, já
representa uma parcela significativa da matriz energética mundial e possui tecnologias
devidamente consolidadas. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL,
2012), atualmente, a energia hidráulica é a principal fonte geradora de energia elétrica
para mais de 30 países e representa cerca de 20% de toda a eletricidade gerada no
mundo.
Esse tipo de aproveitamento é bastante favorável no Brasil, representando 42% da
matriz energética do país. Isso se dá devido à enorme disponibilidade de recursos
hídricos existentes. A ANEEL complementa, afirmando que:

O potencial hidrelétrico brasileiro é estimado em cerca de 260 GW, dos


quais 40,5% estão localizados na Bacia Hidrográfica do Amazonas.
Entre as demais bacias, destacam-se a do Paraná, com 23% desse
potencial, a do Tocantins (10,6%) e a do São Francisco (10%). As
bacias do Uruguai e do Atlântico Leste representam cerca de 5%
cada uma e as demais (Atlântico Sudeste e Atlântico Norte/Nordeste)
somam juntas apenas 5% do referido potencial. Contudo, apenas
63% desse potencial foi inventariado, de modo que essas proporções
mudam significativamente em termos de potencial conhecido. Como
indica a Tabela 3.1, a Bacia do Amazonas representa apenas 19,4% do
potencial inventariado, subindo substancialmente os índices relativos
às bacias do Paraná, São Francisco e Tocantins (ANEEL, 2012, p.19).

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A figura 89 ilustra o potencial energético do país por bacia hidrográfica:

Figura 89 – Potencial energético do Brasil representado em Bacias Hidrográficas


Fonte: ANEEL, 2012, p. 19

De acordo com a agência, o potencial hidrelétrico brasileiro está em aproximadamente


245 GW. Desses, 91 GW encontram-se em operação, 14 GW em construção, 22 GW
estão em fase inicial dos projetos, 70 GW inventariados e, por fim, existe potencial
estimado de 48 GW.
Para se ter uma ideia mais clara da totalidade da potencialidade hidrelétrica no país,
o mapa da figura 90 apresenta esses dados separados por sub-bacias hidrográficas.

Figura 90 – Potencial energético do Brasil representado em sub-bacias.


Fonte: ANEEL, 2012, p. 20.

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Segundo o Ministério de Minas e Energia (2007), o aproveitamento do potencial


hidrelétrico do Brasil vem aumentando, principalmente através da construção de
empreendimentos de grande porte, com o objetivo de tornar o país autossuficiente
em energia elétrica, utilizando tecnologia nacional.
Nos últimos anos, o setor energético brasileiro tem se expandido com a mescla de
investimentos estatais e privados. A maior parte dos investimentos estão centrados
nas usinas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, nas proximidades de Porto
Velho (RO). Estas usinas adicionam mais de 7 gigawatts (GW) ao Sistema Interligado
Nacional. Ao mesmo tempo, está sendo construída a Usina de Belo Monte, no Rio
Xingu, nas proximidades da cidade de Altamira do Pará, com mais de 11 GW.
Segundo a ANEEL (2012, p.17)

A participação da energia hidráulica na matriz energética nacional


é da ordem de 42%, gerando cerca de 90% de toda a eletricidade
produzida no país. Apesar da tendência de aumento de outras fontes,
devido a restrições socioeconômicas e ambientais de projetos
hidrelétricos e os avanços tecnológicos no aproveitamento de fontes
não-convencionais, tudo indica que a energia hidráulica continuará
sendo, por muitos anos, a principal fonte geradora de energia elétrica
do Brasil. Embora os maiores potenciais remanescentes estejam
localizados em regiões com fortes restrições ambientais e distantes
dos principais centros consumidores, estima-se que, nos próximos
anos, pelo menos 50% da necessidade de expansão da capacidade
de geração seja de origem hídrica.

Caro(a) aluno(a), com base nesses dados, conseguimos enxergar que o Brasil possui
um enorme potencial hidrelétrico a ser explorado nos próximos 20 e 30 anos. A maior
parte desse potencial encontra-se na bacia amazônica, devido a maioria dos seus
tributários serem rios de planalto, pois boa parte de seu curso atravessa terras mais
elevadas. Essa característica confere à bacia grande potencial hidroelétrico. Tamanho
potencial explica a existência de um ambicioso projeto que prevê a construção de 76
novas usinas hidrelétricas ANEEL (2012).
Porém, cerca de 60% deste potencial apresenta algum tipo de restrição, haja
vista que as grandes hidrelétricas tendem a causar inúmeros impactos ambientais,
principalmente relacionados à inundações de Unidades de Conservação e de Terras
Indígenas.
Embora as hidrelétricas são fonte de energia renovável e sua produção é menos
custosa (não levando em conta o investimento para a construção) que as demais

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energias consideradas limpas, tais como a solar e eólica, por exemplo, são inúmeros
os impactos socioambientais proveniente de grandes obras para a instauração de
hidrelétricas. Entre esses impactos, destacam-se: o desmatamento e a perda da
biodiversidade; assoreamento do leito dos rios; alterações na água do reservatório
relativas à temperatura e oxigenação; o deslocamento de milhares de pessoas de suas
moradias; retirada de povos originários de seus territórios; e prejuízos econômicos
causados às regiões; entre muitos outros. Com a instauração de grandes barragens,
por exemplo, o rio perde uma grande quantidade de espécies de peixes importantes
para a população ribeirinha, levando essas comunidades a prejuízos econômicos e
sociais.
Durante muito tempo, acreditou-se que as hidrelétricas eram fontes de energia
limpa, porém, hoje sabe-se que elas causam grandes impactos ambientais como,
por exemplo, a decomposição da vegetação submersa que dá origem a gases como
o metano, o gás carbônico e o óxido nitroso, componentes que contribuem com as
mudanças climáticas globais.
Além disso, a construção de usinas hidrelétricas levam à diminuição da vazão da
bacia hidrográfica em alguns pontos. Esse fato ficou bastante latente na construção
da Usina Hidrelétrica de Sobradinho (BA). A jusante da barragem, o nível das águas
do rio diminui dramaticamente nos meses de seca, comprometendo, inclusive, o
abastecimento de água dos moradores da região. Esse grande empreendimento formou
um lago de 3.970 km², caracterizando-se como o maior represamento de água do
Brasil. Estima-se que, pelo menos, 70 mil pessoas foram removidas de suas áreas
para locais mais distantes, em consequência da construção da represa, cujas águas
inundaram dezenas de povoados e deixaram submersas quatro cidades: Pilão Arcado,
Santo Sé, Casa Nova e Remanso.

15.1 Impactos ambientais e recursos hídricos

Caro(a) aluno(a), além de ser um recurso finito, a água é cada vez mais consumida no
mundo todo, seja para abastecimento das populações, seja pelas atividades econômicas
dependentes de grande quantidade de água, conforme vimos no capítulo 2. Ainda que
o Brasil detenha cerca de 12% de toda a reserva mundial de água potável, nos últimos
anos temos passado por inúmeras crises hídricas em grande parte do nosso território.

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Dentre essas crises, damos destaque à crise energética de 2001, que obrigou o
governo a adotar o racionamento de energia para conter as suas consequências.
Assim como em outros momentos, essa crise teve múltiplas motivações que passaram
tanto pela escassez das chuvas quanto pela falta de planejamento e investimentos
no sistema de produção e geração de energia.
Já em 2021, ano em que o país presenciou a pior falta de chuva em 90 anos, a
crise hídrica se repetiu, preocupando especialistas e governantes quanto aos impactos
socioambientais relacionados à falta de acesso de água por parte das populações,
assim como das atividades econômicas.
Primeiramente, devemos entender que uma crise hídrica sempre é consequência
direta da escassez pluviométrica. Os volumes de chuva nos últimos anos têm diminuído
muito por conta de variações climáticas. Atualmente, estamos passando por um ciclo
de chuvas de baixo volume e irregulares, com concentrações em períodos curtos,
dificultando a recarga de aquíferos subterrâneos (aquíferos profundos e lençóis
freáticos), de mananciais e reservatórios.
A exemplo do sistema Cantareira, no estado de São Paulo que sofreu seguidamente,
durante vários anos, diversas crises hídricas. Nesse ponto, o Senado Federal (2014,
p.2) argumenta que:

(...) a média de chuvas no sistema Cantareira (desde 2003) entre


janeiro e julho é de 933 mm. Em 2013, o volume foi de 762 mm e, em
2014, de apenas 533 mm. Desse modo, em dois anos, a pluviosidade
total nesses períodos foi de 1.295 mm, quando o esperado seriam
1.866 mm. Déficit em relação à média foi de 30,7% em um período
relativamente longo de dois anos. Os meses de dezembro são aqueles
em que há menor nível de água nas represas do sistema, em razão da
sazonalidade do regime de chuvas. Os volumes de dezembro para os
anos de 2009 a 2013 foram os seguintes: 92,5%; 72,5%; 69,0%; 47,6%;
30,3% e, finalmente, 18%. O índice de dezembro de 2012, de 47,6%
não parece baixo à vista de ser exatamente o menor valor esperado
sazonalmente. Apenas em 2013 e 2014 os níveis ficaram em 30% ou
abaixo, o que é consistente com os dois anos extremamente secos.
De fato, considera-se que a situação em São Paulo corresponde à
pior seca dos últimos 84 anos.

Diversos cientistas e pesquisadores da área têm atribuído esse fenômeno às


mudanças climáticas, que já estão ocorrendo em escala global, potencializadas pelas
ações humanas. Existem hipóteses de que o desmatamento da Amazônia reduz a
produção da umidade que se espalha por toda a América do Sul e provoca as chuvas

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no fenômeno que chamamos de Rios Voadores. Por outro lado, o aquecimento global
provoca secas mais prolongadas e o fim dos períodos de invernada (longo período
de chuvisco lento que auxilia na recarga dos lençóis subterrâneos, responsáveis pelo
reabastecimento dos corpos hídricos superficiais).
No entanto, muito além da questão climática e da falta de planejamento por parte
do poder público, muito das escassez hídricas sentidas, sobretudo no Centro-Oeste,
Sul e Sudeste do Brasil, têm como parte da explicação o assoreamento dos rios; a
destruição; o soterramento das nascentes; e o desmatamento das áreas de recarga do
lençol freático subterrâneo. Todos esses impactos causam a diminuição das vazões
de água no conjunto das bacias hidrográficas.
Grande parte das reduções de corpos d’água superficiais encontram-se próximos
às fronteiras agrícolas, o que sugere que o aumento do consumo, construção de
pequenas represas em fazendas, que provocam assoreamento e fragmentação da
rede de drenagem e que vem junto com o desmatamento e aumento de temperatura,
são fatores que podem ajudar a explicar a diminuição da superfície da água no Brasil.
Segundo a ANEEL (2002), entre 1950 e os dias atuais, o número de grandes barragens
no mundo passou de 5.750 para mais de 43 mil, fato que alterou radicalmente a
dinâmica da vida aquática e modificou completamente a paisagem global. Uma vez que
a água é barrada como parte do funcionamento das hidrelétricas, o rio passa a ter sua
vazão controlada, alterando suas oscilações naturais. A dinâmica morfológica própria
dos rios é alterada, assim como sua biodiversidade, pois o local, então, apresentará
características de lagos (água parada).

ISTO ESTÁ NA REDE

A reportagem do Portal G1 apresenta inúmeros dados relevantes ligados às causas


das atuais crises hídricas que temos passado no Brasil. Segundo a reportagem,
os recursos hídricos de todos os biomas foram afetados por construções de
barragens e hidrelétricas. “A perda da superfície de água natural por causa da
água armazenada em estruturas construídas pelo homem tem consequências
preocupantes na alteração do regime hídrico, afetando a biodiversidade e a
dinâmica dos rios”, alerta a reportagem.
Vale a penas conferir na íntegra, disponível no link abaixo:

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https://g1.globo.com/natureza/noticia/2021/08/23/brasil-perdeu-15percent-dos-seus-recursos-hidricos-nos-ultimos-30-anos-uma-perda-quase-o-dobro-
da-superficie-de-agua-de-todo-o-nordeste.ghtml

Aliado a todos esses fatores, devemos levar em conta que, a partir da segunda
metade do século XX, por conta da urbanização e melhoria das condições de vida das
pessoas, a população mundial cresceu exponencialmente. O aumento do consumo
mundial também acompanhou esse processo. Já desenvolvemos esse assunto de
forma detalhada no capítulo 2.
Outros fatores que explicam a escassez hídrica estão relacionados à urbanização,
entre eles: soterramento das nascentes e mananciais; a impermeabilização do solo;
e canalização de rios e córregos.
Das inúmeras interferências antrópicas em meio fluvial, uma das mais comuns é a
retificação do canal fluvial, que consiste na alteração do trajeto de um rio, tornando-o
reto. Isso implica em diversas modificações, como impermeabilização da calha do rio,

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causando a diminuição da infiltração da água; alteração de seu caminho natural (curvo


para o reto), mudando a velocidade do fluxo de água. Além disso, essas mudanças
promovem alterações na sua vazão, gerando nas nascentes ou nas áreas mais altas,
maior velocidade de fluxo, o que consequentemente aumenta a erosão e assoreamento.
Conforme já vimos, essas ações vão contribuir diretamente para a escassez hídrica,
pois ocorrem não somente de forma isolada em um ou outro rio, mas se caracteriza
como um padrão de urbanização que foi adotado, ocorrendo na maior parte das
médias e grandes cidades brasileiras.

Figura 91 – Retificação do canal fluvial e as suas consequências no meio urbano.


Fonte: https://journals.openedition.org/confins/26012 (adaptado).

Sob o pretexto de diminuir as enchentes em grandes cidades, a canalização de


rios e córregos foi amplamente utilizada em cidades brasileiras. A título de exemplo,
na cidade de São Paulo, o rio Tietê foi canalizado como forma de mitigar os efeitos
causados pelas enchentes nas regiões adjacentes à marginal do rio. Toda vez que
há uma chuva muito forte, as regiões adjacentes ao rio inundam, causando severas
enchentes que se prolongam por grande parte das chamadas marginais do rio Tietê.
Porém, caro(a) aluno(a), para que servem as várzeas dos rios? Não seria uma área
que deveria ser destinada ao alagamento natural do rio em épocas de cheias? De
acordo com Peixoto (2008), elas têm a função de atuar como terrenos inundáveis,
que funcionam como mecanismos de contenção e drenagem, na medida em que
possibilitam a retenção de água e controlam a velocidade de escoamento do rio em
épocas de cheia. As várzeas, com isso, funcionam como uma espécie de “esponja”
ao absorver a água excedente.
Pois bem, por uma questão de planejamento urbanístico que não levou em
consideração essa mecânica da natureza, essas áreas foram impermeabilizadas pelo

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asfalto. Como as várzeas, em seu formato natural, funcionam como “esponjas” para
facilitar a infiltração da água, uma vez que impermeabilizadas, deixam de cumprir sua
função e as águas ficam empoçadas.

Figura 92 – Função das várzeas dos rios.


Fonte: https://journals.openedition.org/confins/26012 (adaptado).

A solução mitigadora para conter as enchentes decorrentes desse processo foi a


canalização (Figura 93) do rio e o afundamento do seu leito. Com isso, o rio (agora
se comportando somente como um canal) consegue dar vazão às águas pluviais, no
sentido a jusante.

Figura 92 – Lixão a céu aberto.


Fonte: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/obras-de-canalizacao-de-rios-em-nova-constituinte-estao-90-prontas/

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Como boa parte das cidades brasileiras foram e são ocupadas sem nenhum
planejamento prévio, são poucos os cuidados tomados que visam a diminuição dos
impactos. Esse fato se reproduz ao longo de todas as vertentes da bacia e nas áreas de
topo do relevo. Não se considera a inclinação e morfologia das vertentes; a morfologia
do canal fluvial; bem como outros parâmetros morfométricos e a própria morfodinâmica
das bacias hidrográficas (MALVEZZI; MIYAZAKI, 2018).
Segundo os autores, essas falhas relacionadas ao planejamento errôneo ou própria
falta de planejamento, podem:

(...) causar danos na dinâmica natural de um rio, como a vazão, o fluxo de


água, as erosões nas encostas e a vida que existe no ambiente aquático.
Isso deveria ser considerado no planejamento urbano e ambiental de
todo município. Por exemplo, o fundo de vale recebe água proveniente
de todo seu entorno, ou seja, a água escoa pelas vertentes, parte penetra
no solo e parte escoa superficialmente até chegar ao rio que se encontra
no ponto mais baixo do relevo. Com a ocupação urbana, essas vertentes
são impermeabilizadas pelo asfalto e construções, inibindo a infiltração
da água no solo e aumentando não só a velocidade do escoamento, mas
também a quantidade de água pluviais que chegam na parte baixa do
relevo, o domínio dos fundos de vales. Além disso, quando o rio presente
no fundo de vale é canalizado e retificado, o fluxo de água é levado para
dentro da canalização aberta, o que resulta em levada de lixo da rua,
aumento de sedimentos, assoreamento e solapamento das encostas. A
retificação também implica na mudança do seu percurso natural, às vezes
meandrante e tornando-se retilíneo. Essa mudança resulta no aumento
da velocidade do fluxo de água, que por consequência aumenta o poder
erosivo nas margens dos canais fluviais sem mata ciliar, provocando
erosões, visto que a água está mais rápida e agressiva (MALVEZZI;
MIYAZAKI, 2018, p. 1)

Portanto, caro(a) aluno(a), percebam que os impactos que levam à escassez hídrica
constituem uma série de fatores complexos que se inter-relacionam. Fatores esses
que fazem parte de um conturbado processo histórico de ocupação do território
brasileiro. Não conseguimos explicar a falta de água ou escassez apenas pelo ponto
de vista climático, e nem tão pouco somente pelo ponto de vista da falta de gestão
e planejamento do uso do solo. Trata-se de um compilado das duas situações, que
devem ser compreendidas de acordo com as especificidades de cada local.

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CONCLUSÃO

Caro(a) aluno(a) vimos que são inúmeros os problemas e desafios que temos pela
frente ao pensarmos na necessidade de gestão da água em nosso país de forma
sustentável e inclusiva. Reitero que é necessário pensarmos em um desenvolvimento
sustentável, que leve em consideração a capacidade de regeneração dos ecossistemas
e que alinhe crescimento econômico, meio ambiente e desenvolvimento socioambiental
das comunidades humanas, sobretudo àquelas mais carentes de políticas públicas
que visam a proteção dos recursos hídricos.
Devemos sempre refletir e tentar abrir novos caminhos no sentido de propor soluções
a esses problemas, sempre realizando a necessária crítica ao atual modelo de vida,
no qual o consumo predatório da água pode levar à sua poluição, contaminação, ou,
até mesmo, à escassez.
Nosso dever enquanto geógrafo e/ou professor de Geografia é sempre buscar pensar
formas de desenvolvimento que agridam menos o meio ambiente e não prejudiquem
as comunidades humanas. Nesse sentido, a gestão da água deve ser realizada de
forma sustentável, a fim de garantir a perpetuidade do acesso à água para as futuras
gerações.
É papel da Geografia compreender as relações dos seres humanos com a natureza
e as dificuldades impostas por essa conturbada relação que aqui, se materializa na
falta de cuidados com os recursos hídricos. Mas também é seu papel pensar em
como superá-las.
Cabe ao professor de geografia promover o conhecimento de forma integradora
e emancipadora. Devemos procurar provocar, em nossos alunos, a assimilação do
conteúdo, de uma maneira que ele reflita sobre esses inúmeros problemas e que, por
meio da geografia, possa buscar possíveis soluções.

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REFERÊNCIAS

ANA. Agência Nacional De Águas, Ministério do Meio Ambiente. Disponibilidade e


Demandas de Recursos Hídricos no Brasil. Brasília: 2005. 134 p.

ANA. Agência Nacional de Águas. O Comitê de Bacia Hidrográfica: o que é e o que


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ANA Agência Nacional De Águas. Panorama da qualidade das águas superficiais


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ANEEL. Agência Nacional de Energia Elétrica. Atlas de energia elétrica do Brasil.


Agência Nacional de Energia Elétrica. Brasília: 2012

BARBOSA, F. A. R. Medidas de proteção e controle de inundações urbanas na


Bacia do Rio Mamanguape/ PB. João Pessoa/PB: 2006

BARRELLA, W. et al. As relações entre as matas ciliares, os rios e os peixes. In:


RODRIGUES, R. R.; LEITÃO FILHO; H. F. (Ed.) Matas ciliares: conservação e recuperação.
2. ed. São Paulo: Edusp, 2001.

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