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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

LICENCIATURA PLENA EM HISTÓRIA

Ananda Júlia de Araújo;


Claudio Geferson Gomes da Silva;
Emanuell Diniz dos Santos;
Jakcson Pedro da Silva;
José Jonas Santos de Lima;
Matheus Macedo do Nascimento;
Natiane de Carvalho Silva de Araújo;
Pedro Henrique Felix da Rocha;
Raylla Kaliane da Silva Marques;
Thiago Ramon Sobral.

Bíblia da Série: Resistência

GUARABIRA
2022
SUMÁRIO

1 PROPOSTA
1.2 SINOPSE DA SÉRIE
1.3 TEMPORALIDADE RETRATADA
1.4 ESPAÇOS RETRATADOS (falta fazer)
1.4.1 Locais específicos
1.5 PERSONAGENS ELENCADOS
2 SINOPSE DOS EPISÓDIOS
2.1 I
2.2 II
2.3 III
3 RELATÓRIO
3.1 REFERÊNCIAS
3.2 ANEXOS
1 PROPOSTA

A importância desse trabalho é justificada essencialmente pela baixa quantidade de


produções voltadas ao tema. Nesse sentido, vê-se que o protagonismo feminino teve sua
visibilidade minada na produção historiográfica, principalmente em meio a momentos
significativamente marcantes como as Revoluções Russas. Desse modo, faz-se necessária a
elaboração de uma série que possa atuar na desconstrução da ideia de que os processos
históricos são guiados exclusivamente por homens. Nessa perspectiva, o trabalho propõe
abordar o protagonismo de três mulheres durante o processo revolucionário russo. Apresentar
a escritora de origem camponesa Olga Chapír e sua luta por direitos femininos, também a
jornalista e ativista política Konkórdia Samóilova, além da médica Maria Pokróvskaia. Em
meio a isso, pretende-se abordar a importante atuação dessas mulheres durante as revoluções,
considerando que tiveram participações fundamentais no debate de questões como a
construção de um feminismo russo, a questão do campo e temáticas voltadas a sexualidade.
Assim, também cabe destacar que embora estivessem diretamente ligadas a revolução,
tiveram pouco destaque em produções televisivas voltadas ao tema da revolução.
Outrossim, as revoluções, dentro das perspectivas femininas irá iniciar um profundo e
complexo processo de emancipação da mulher. Há de fato uma produção intelectual e política
pouco conhecida dentro desse cenário histórico-cultural, não somente pelas circunstâncias
desfavoráveis de pesquisa em que foi produzida, mas pelas suas consequências e
prolongamento na contemporaneidade. De todo modo, as contribuições de tais personagens
além de simbólica, mostra que no início do século XX, as russas-soviéticas alcançaram
direitos que ainda nos parecem impossíveis, representando assim, uma ameaça à ordem
vigente.
Desse modo, retratar tais autoras de total relevância para os estudos feministas, cujo
legado perdura até hoje, é de extrema importância para uma nova cultura no audiovisual.
Além de estabelecer uma relação intrínseca entre cinema e história.

1.2 SINOPSE DA SÉRIE

A Rússia que sob muitos seculos ficou a mercer de uma monarquia tzarista agora via
eclodir diante de seus olhos um processo revolucionário. É sob esse contexto de convulsão
social que nossas protagonistas se inserem. A jornalista fictícia Sonya Marmeladova, a
escritora campesina, Olga Chapír, a jornalista e ativista, Konkórdia Samóilova, também Maria
Pokróvskaia, médica e teórica da sexualide. Todas têm como ponto principal a emancipação
da mulher.
Sonya Marmeladova, uma mulher ruiva de cabelos cacheados, jornalista, passou sua
trajetória académica lendo os textos das autoras e as ouvindo em assembleia, sem saber que a
posteriori ela as entrevistaria. Conhecer essas mulheres era um de seus vastos e empolgados
sonhos.
Por volta de dezembro de 1916, Marmeladova se formou e estava a procura de um
emprego como jornalista, por indicação de uma professora, foi numa entrevista num estranho
galpão de são Petersburgo, ao bater na porta ela se deparou com diversas mulheres e lá ela se
encontrou com a intelectual Konkórdia Samóilova, uma mulher de pele negra e olhar
marcante, de codinome Natasha, suposto nome de sua entrevistadora, representava tudo o que
Marmeladova admirava, os ideias de luta e resistência. A jovem ficou nervosa ao se deparar
com aquela mulher que ela tanto leu e ouviu, suas mãos tremiam e seus lábios já estavam
secos, apesar de nervosa, ela consegue a vaga. Iniciando sua trajetória na a princípio
desengonçada e curiosa coluna, carinhosamente nomeada – Mulheres nas quais encontro
força.
Posteriormente, na sua primeira entrevista, conhece a teórica da sexualidade Maria
Pokróvskaia, dedicada ao movimento das mulheres, abdicou de seu amor e se perguntava,
teria valido a pena dedicar sua vida e seu amor, tudo em prol de uma causa? Uma entrevista
labiríntica, tensa, mas arrebatodora, abrindo a o trabalho da jornalista.
Em outubro de 1917 próximo ao marco da revolução russa, Sonya encontra com Olga
Chapír, Olga que era uma brilhante escritora sobre a causa camponesa acabou por reconhecer
Sonya Marmelavoa por sua conhecida empolgação na Assembleia de Todas Mulheres da
Russia, Sonya, invariavelmente atrasada, vai ao encontro de Olga que estava a observar as
pessoas em uma cafeteria em Oranienbaum, então se iniciou a entrevista, quase que a
contragosta de Chapir.
Conhecedora como ninguém das mazelas que afligiam as mulheres camponesas, já
havia tido em sua vida o exemplo de um pai abusivo, nunca se curvaria perante um marido
abusador, ela discorreu como começou a organizar o congresso, marco do feminismo russo,
mostrou para Marmeladova a realidade do movimento, a distância do trabalho camponês para
com o trabalho urbano e toda resistência que travou em nome da sonhada emancipação
feminina.
1.3 TEMPORALIDADE RETRATADA

O recorte temporal será delimitado entre os anos de 1916 e 1917, dividindo-se em três
momentos. Nesse sentido, cada episódio vai trazer um recorte dentro dessa temporalidade,
ambos ligados ao contexto das Revoluções Russas e suas protagonistas, a narradora, a repórter
fictícia Sonya Marmeladova e as revolucionarias Olga Chapír e sua luta por direitos femininos
no campo, também a jornalista e ativista política Konkórdia Samóilova, além de Maria
Pokróvskaia, médica e teórica da sexualidade.
No primeiro episódio será trabalhado o tempo passado, no qual será abordado o mês
de dezembro em 1916. Nesse panorama, será trabalhada uma temporalidade marcada por
reflexões e questionamentos acerca do contexto russo, que serão fundamentais para o
processo revolucionário, e através disso, a narradora Sonya Marmeladova, será retratada
lendo textos de autoria das demais protagonistas durante sua formação universitária e isso será
fundamental para a consolidação de sua mentalidade revolucionária.
No segundo episódio, será trabalhado o processo revolucionário entre os meses de
janeiro a outubro de 1917. Nesse sentido, haverá o encontro das quatro protagonistas, no qual
serão realizadas importantes discussões inerentes ao processo revolucionário que estava em
curso naquele ano. Ademais, tais discussões vão abarcar diversas temáticas como gênero,
sexualidade, trabalho urbano e a questão do campo, que estavam intimamente ligadas a
revolução.
No terceiro episódio, seu final será se passará no dia 8 de outubro de 2017,
considerando o marco da Revolução Bolchevique e as demandas sociais em meio ao processo
revolucionário. Nesse âmbito, será destacado o protagonismo das personagens no tocante a
essas reinvindicações, destacando a participação feminina nesse momento marcante da
história humana.

1.4 ESPAÇOS RETRATADOS

1.4.1 Locais específicos

- Galpão 13:
Lugar onde ocorre a entrevista de Sonya Marmeladova, na cidade de São Petersburgo,
Rússia. Propriedade secreta no codinome de uma proprietária com o nome de Natasha,
utilizado pela jornalista Konkórdia Samóiolva com o intuito de servir para reuniões de
mulheres, entrevistas e também escrita de jornais, manifestos e outros textos. O galpão era um
espaço aberto, grande, coberto de cadeiras com um púlpito na frente, que servia como espaço
para palestras elaboradas por sua proprietária e outras feministas. Nos fundos haviam salas
isoladas com portas de madeiras levemente desgastadas, fechadas a chave. As salas contam
com uma mesa de madeira envelhecida e duas cadeiras somente, com chãos polidos e limpo.

- Cafeteria Karerina, popularmente conhecida apenas como “Café”


Localizado na cidade de Oranienbaum, na Rússia, a cafeteria era bastante bem
frequentada, principalmente no horário de pico russo. Era um espaço amplo e coberto por
mesas rodeadas com cadeiras estilo poltronas e contava com um balcão enorme onde era
servido e preparado cafés e outras bebidas geladas ou quentes, além de suas muitas garçonetes
passando para lá e para cá o tempo inteiro com a missão de não deixar ninguém esperando por
muito tempo, possuía uma atendente que ficava responsável pelo caixa. A cafeteria era
revestida com parte de suas portas e paredes de madeira e vidro temperado, possuía um ar
quente e delicioso advindo do café, além disso suas paredes eram marrons em diversos tons,
para lembrar as cores da bebida que era servida, o café. Na cafeteria temos o encontro entre
Olga Chapír e Sonya Marmeladova.

- Casa de Maria Pokróvskaia


Lugar onde ocorreu a entrevista entre Maria e Sonya Marmeladova, localizada na
cidade natal de Maria, Nijnilomov, na Rússia. A casa era pequena, mas aconchegante, contava
com vários utensílios domésticos e um sofá amplo de três lugares que ficava de frente para
uma mesinha de centro seguido por duas poltronas aconchegantes. Possuía uma lareira e uma
janela grande, de madeira envernizada. Apesar de pequena a casa tinha uma luz natural,
advinda das muitas janelas que possuía, ademais, da sala de estar dava para ver o quintal
enorme e coberto de verde, onde se via uma horta e muitas arvores, onde tinha um balanço
que parecia estar abandonado.

1.5 PERSONAGENS ELENCADOS

OLGA
Nome: Olga Chapír
Idade: 32 anos
Cidade de origem: Oranienbaum, Rússia
Caracterização:
- Pele caucasiana, queimada de sol;
- Olhos castanhos;
- 1,65m de altura;
- Cabelos claros, tom loiro e ondulado; porém, sempre prefere ele preso;
- Magra, porém forte (o trabalho braçal no campo favorece a isso);
- Seu rosto obtinha traços bem marcantes, olhos cansados, quase inexpressíveis.
- O que de fato chamava atenção era suas mãos, marcadas e firmes, consequência da
intelectualidade atrelado a vida no campo.
- Utilizava sempre vestido nas cores marrom, devido a alta disponibilidade de tal material.
Perfil social:
- Calma;
- Aparenta ser cuidadosa com palavras, gestos e interação social;
- Observadora e atenta aos detalhes;

Figura 1: Olga Chapir

Pokróvskaia
Nome: Maria Pokróvskaia
Idade: 45 anos
Cidade de origem: Nijnilomov, Rússia
Caracterização:
- Pele clara;
- Cabelos grisalhos;
- Rosto angelical proporcional aos olhos verdes, firmes e fixos no qual despertava
curiosidade;
- 1,70 de altura
- Forte; com busto;
- Mãos delicadas
- Roupas claras, sapatos de salto baixo;
Perfil social:
- Inovadora;
- Tem uma forte presença
- Critica e assertiva, personalidade forte;

Figura 2: Maria Pokróvskaia

Somóiolova
Nome: Konkórdia Samóiolova
Idade: 37 anos
Cidade de origem: Irkutsk, Rússia
Caracterização:
- Pele negra;
- Cabelo crespo, preto e curto;
- Traços asiáticos, extremamente marcantes ;
- 1,65m de altura
- Seus lábios firmes destacavam seu rosto como um todo;
Perfil social:
- Bem comunicativa
- Determinada em tudo que propunha fazer
- Irônica; Pode ser insolente com altos membros da sociedade;

Figura 3: Konkórdia Samóiolova

Marmeladova
Nome: Sonya Marmeladova
Idade: 25 anos
Cidade de origem: São Petersburgo
Caracterização:
- Pele clara;
- Cabelo ruivo e cacheado;
- 1,55 altura;
- Olhos atentos e escuros;
- Usa roupas de cores quentes;
Perfil social:
- Avoada e gentil;
- Bastante animada;
- Fala o que pensa, além de ser extremamente curiosa;
- Sempre está sorrindo;
Figura 4: Sonya Marmeladova

2. SINOPSE DOS EPISÓDIOS

2.1 I

São Petersburgo havia amanhecido nublado e o ar estava carregado como se


soubesse que era um dia importante, diferente dos outros dias que pareciam os
mesmos, frios e perigosos.
Estava animada, pensei. Mesmo com o dia nublado, tinha decidido que não deixaria
aquilo abalar minha esperança. Afinal, como poderia? Era simplesmente a minha
vaga dos sonhos. Quando imaginou que sairia de uma simples realidade para entrar
num mundo em que sempre desejou viver? Ser mulher já era bastante complicado,
principalmente levando em consideração que tinha que se esconder para que não
corresse risco de vida...
Enquanto divagava com o olhar perdido na rua, Sonya Marmeladova se
deparou com um galpão enorme onde possuía uma única portinha de madeira no
canto, conferiu o endereço no papel que havia levado consigo, mirou o numero 13
que havia escrito. É aqui, pensou, enquanto batia três vezes e rezava para que
alguém abrisse. Uma mulher impressionantemente alta, de cabelos loiros e sorriso
largo abriu a porta, convidando-a para entrar. Assim que pisou os pés dentro do
espaço foi abraçada pelas vozes femininas cheias de entonações diferentes,
reparou que algumas cochichavam entre si enquanto foi andando em direção a uma
salinha, guiada pela loura altíssima de sorriso bonito. Assim que entrou, demorou a
tomar consciência de quem ocupava a sala, mas seu olhar se perdeu na mulher
parada, atrás de uma mesa enorme de madeira envelhecida, era bonita, possuía
uma pele negra retinta, lábios grossos e um olhar extremamente marcante, que ao
mesmo tempo havia lhe conferido um certo tom jovial, tinha o cabelo curto, crespo e
preto o que deixava a mostra a nuca e o pescoço comprido, era muito bonita... Por
um instante Sonya se deixou impressionar por aquela mulher parada ali, que a fitava
como se a conhecesse de uma vida e pudesse despir todo e qualquer pensamento
que ela tinha... Não! É ela! Konkórdia Samóiolova! Quantas vezes havia escutado
falar dela... Me apresentei enquanto fui direcionada a sentar em sua frente, engoli
seco, nervosa, enquanto pensava no que podia significar aquilo tudo, todas aquelas
mulheres, mesmo que no fundo já soubesse, se deixou levar pelo momento, queria
escutar dela.
- Olá, Sonya. Como deve saber o meu nome não é Natasha, mas conto com sua
discrição. São tempos difíceis para escritoras e jornalistas, mas isso você também
deve saber. Ser mulher requer cautela. Acabou de se formar, pelo que entendi.
Gostei bastante do que vi, seu material é muito bom...
Escutei com atenção enquanto ela falava, coloquei as mãos que tremiam no meu
colo e me consertei na cadeira enquanto mantinha contato visual. Eu precisava me
mostrar seria, precisava daquela vaga antes, mas agora era a oportunidade perfeita.
Quantas vezes havia sonhado com aquilo? Aquela mulher representava tudo o que
ela conhecia de luta e resistência. A própria mantinha codinomes para conseguir se
manter a salvo e continuar realizando um trabalho tão impressionante quanto
admirável.
Se concentrou em falar o mais firme que podia, enquanto tentava não tremer,
demonstrou todo o respeito que sempre sentiu, mas se preocupou em não parecer
uma bajuladora, se tinha algo que havia aprendido é que ninguém gosta de
bajuladores... Enquanto falava manteve contato visual o tempo inteiro, ao
terminarem de conversar, sentiu que a vaga era sua pelo modo como o olhar de
Konkórdia havia se suavizado aos poucos durante todo o diálogo. Por fim se
assustou com ela se levantando abruptamente da cadeira e colocando as duas
mãos em cima da mesa, forçando o corpo para frente de modo que estava a menos
de um palmo do seu nariz.
- Espero que esteja pronta, não vai ser fácil e não espero que compreenda isso de
início, mas preciso que entenda, principalmente que não será fácil.
Pensou nas palavras e afirmou firmemente com a cabeça, enquanto pensava em
sua própria realidade. Fácil... A vida não foi fácil com ela, não esperava que fosse,
ela mesma já tinha deixado de acreditar que algum dia as coisas fossem mais
simples do que era, mas isso nunca a impediu de lutar à sua maneira. Estava
pronta. Levantou e apertou com força a mão estendida em sua frente. Pode vir,
estou pronta.

2.2 II

Maria Pokróvskaia se pegou pensando em todos os anos de sua vida em que dedicou a luta
por movimentos e resistências femininas. Tanta coisa que havia passado, tanta coisa que
perdera...Voltou ao presente e encarou a jornalista sentada a sua frente com curiosidade, afinal
sempre ouvira falar sobre o seu trabalho e agora poderia fazer parte desse grupo seleto de
mulheres que ela entrevistou. Respondeu à pergunta com a maior lucidez que sua mente
cansada podia fornecer naquele momento, e, voltou para a nuvem de pensamentos que insistia
em inebriar sua mente. Por que dedicara anos de sua vida a lutar e representar mulheres
quando ela mesma sentia constantemente medo do que estava por vir? Teria valido a pena
abdicar do seu amor por uma mulher que jamais poderia amar de novo, já que estavam
condenadas a viverem separadas em prol de uma causa? Enquanto se fazia perguntas
mentalmente, pegou uma xicara de chá em sua frente e cruzou as pernas assumindo uma
postura ereta de quem prestava atenção na mulher em sua frente. A verdade é que a pesquisa
de Sonya era muito boa, queria realmente contribuir dando entrevista, mas sentia o peso dos
anos em suas costas, afinal tinha 45 anos... 45 anos, uma boa idade, pensou. Uma boa idade
para morrer lutando pelo que acreditava e sempre acreditaria. Pela causa que moveu sua vida
até aqui e que provavelmente a guiaria até o fim dos seus dias. Encarou Sonya Marmeladova
com um olhar questionador e por fim disse: “O que deseja saber? Se tenho inimigos? Sim,
muitos. Por onde começamos? Pegue algo para anotar, isto vai demorar”.

2.3 III
Olga Andréievna Chapír pegou o copo fumegante com o café em sua frente, estava
estranhamente tranquila. Passou mais uma vez o olhar pela cafeteria lotada, levou o café aos
lábios e assoprou cuidadosamente enquanto olhava um casal sorrindo e tomando seus cafés.
Espero que saiba que um dia ele irá te trair, mulher tola. Todos os homens são iguais. Olga
considerou que não costumava ser tão amarga, mas dado os últimos acontecimentos, não teria
como ser diferente. Deixou a mente vagar pelas lembranças do homem baixinho de cabelos
castanhos com alguns fios grisalhos, de olhos enganosamente gentis. Sentia falta dele.
Ultimamente pensava mais nele do que queria admitir, então fechou os olhos e tentou se
concentrar no presente, por mais doloroso que fosse. Murmurou baixinho mais para si
mesma: “Onde está a Sonya? Ela deve achar que tenho o dia inteiro para desperdiçar”.
Assim que terminou de falar, uma mulher baixinha de pele clara e cabelos ruivos como fogo,
bem curtinhos e cacheados, adentrou no espaço, ela parecia cansada, mas com uma expressão
gentil nos olhos escuros. Olga viu Sonya procurar por ela no recinto com olhos atentos e
curiosos, enquanto passava pelas pessoas e se esquivava de algumas garçonetes, e na última
mesa, a mais reservada, se encontrava Olga, com o olhar atento de quem já havia visto muita
coisa na vida, apesar da aparência tranquila e do coque bem amarrado na altura da nuca, tinha
uma aparência limpa, sóbria.
Olga observou-a sentar em sua frente e tentar procurar algo que parecia um caderno
em uma bolsa marrom escura que trazia consigo. Ótimo, uma atrapalhada. Escutou a pobre
moça falar e não parar mais, enquanto balançava a cabeça afirmando e tentando soar o mais
compreensiva possível. Sentiu pena. Será que assim como eu você já foi enganada? Será que
assim como eu você já foi boba o suficiente de acreditar que um dia o homem mais gentil que
já havia conhecido poderia ser compassivo e paciente com a vida que você havia escolhido?
A desculpa para a traição que tinha sofrido teria vindo com um longo monologo de como ela
havia abdicado de cuidar da casa e dele, como insistia em não ter filhos e se recusava a fazer
as refeições todos os dias enquanto ele ia trabalhar. Ingrata? Nunca, se existia uma qualidade
em Olga, era que sempre se lembrava de quem já havia estendido a mão, suas irmãs de causa
eram uma lembrança diária disso. Que se dane! Pensou.
Enquanto falava com a mulher sentada a sua frente sobre tudo o que mais a motivava
no mundo, lhe ocorreu que estava melhor assim, por mais que sofresse jamais se dignaria a
sentir pena de si mesma por isso, já era difícil o suficiente ser mulher numa sociedade que
pouco respeitava isso, principalmente levando em consideração que a falta de respeito partia
principalmente do sexo oposto. Iria contribuir com o que pudesse, sempre, era aquilo que
havia escolhido viver e se orgulhava disso. Lembrou de sua mãe, condenada a viver sob os
preceitos do marido opressor e de como apanhava dia após dia caso não fizesse minimamente
o que lhe era imposto. Não! Não vou me curvar jamais, vou fazer por mim e por você mãe.
Olga conhecia a vida no campo e como podia ser difícil, mas principalmente entendia que se
tornava ainda mais árdua quando você era mulher e era obrigada a casar cedo para sair das
asas de um pai abusivo para cair novamente nas teias de um marido abusador, como foi o caso
de sua mãe.
- Sonya, gostaria de conhecer algo revolucionário? Perguntou, mas não deu espaço
para uma resposta, disse: - Venha! Anda, você está prestes a se deparar com a experiencia de
uma vida. Já ouviu falar no Congresso de Mulheres, né? Obvio! Eu fui a primeira a organizar.
Levantou e decidiu abandonar a postura de mulher enganada e traída, afinal, havia
uma luta para ganhar, por mais que levasse a sua vida, iria fazer por todas as mulheres que
conseguisse o que nunca pôde fazer pela mulher que mais admirou na vida. Fitou Sonya que
se levantava apressada e observou o quão longe aquela mulher havia chegado para encontrá-
la. Lhe daria a maior e melhor entrevista que pudesse. Lhe mostraria a parte crua de um
movimento de resistência! Mostraria o quão longe ainda poderiam e iriam chegar, pois nascer
mulher era sinônimo de luta, afinal.

3 RELATÓRIO

Considerações a respeito do fazer artístico se dão desde a Grécia Antiga, partindo da


platônica e aprofundando-se na proposta de sistematização da filosofia elaborada por
Aristóteles. É justamente ele, que debruçado na obra de Sófocles e de outros autores gregos,
enxerga os padrões de realização das tragédias, epopeias e também outros tipos de poemas,
atribuindo e resgatando nomenclaturas que percorriam a oralidade daqueles que enxergavam
nessas produções uma beleza transcendente ao corriqueiro (CHAUI, 1995).
Sendo assim, arranca a arte da confusa posição em que se encontrava em relação a
outros estudos formais que não raramente se confundiam com outros campos, contudo, uma
vez reunidos integralmente, compunham a filosofia (CHAUI, 1995). A distingue das outras
ciências - metafísicas, práticas e contemplativas a partir de sua finalidade – ser um objeto para
além da ação, portanto, paralelo àquele que o produz, mas ainda assim, capaz de gerar
impacto positivo naqueles que a recepcionam. (ARISTÓTELES, 2009).
Contudo, a complexificação das linguagens artísticas paulatinamente gera um
distanciamento estrutural para com a escrita grega. Elementos como o mito, aqui vivente,
reconhecimento e peripécia, combinados para gerar terror e piedade, visando a purificação das
emoções (ARISTÓTELES, 2014), são experimentados de acordo com as possibilidades do
tempo histórico de quem o produz. Observando por exemplo a interpretação de SOUSA, a
respeito da obra Shakespeariana, Hamlet, há rompimentos para com a estruturação proposta
na Poética de Aristóteles, observa-se por exemplo, mais de um reconhecimento e um deles,
inclusive, já no início da trama, distanciando-se do modelo supostamente ideal, proposto a
partir de Édipo Rei (2019).
Mesmo Shakespeare valendo-se do mesmo recurso dos poetas gregos, que era a
narrativa literária, inclusive do mesmo estilo, que era a tragédia, adaptou suas idiossincrasias.
Diante de uma outra linguagem, que é a cinematográfica, distanciamentos mostram-se
indispensáveis, especialmente na representação de um momento histórico distante, mais ainda
trabalhando com grupos não dominantes. (DELEUZE, 2018).
Essa é a proposta do presente trabalho, final da disciplina de Contemporânea II,
ministrado pelo Prof. Dr. Carlos Adriano Ferreira de Lima, na Universidade Estadual da
Paraíba, Campus III, idealizado de maneira a mobilizar a sala na elaboração de uma narrativa
cinematográfica seriada pensada coletivamente através de um documento chamado “bíblia”, o
qual reserva as peculiaridades da confecção dessa narrativa. Compilando design de
personagens fictícios ou reais, desde sua caracterização física, até mesmo psicológica, atendo-
se também aos ambientes que cerca essas figuras, através da pesquisa histórica e das
possibilidades criativas dos/das/des alunos/alunas/alunes responsáveis pela confecção do
documento. Ademais, contempla também possibilidades de desdobramentos do roteiro e da
trama como um todo, passíveis de modificações e ampliações. Visa a construção de uma
narrativa crítica e experimental.
Seu cerne é a representação de eventos, temporalidades e personagens já trabalhados
na disciplina, a fim de suscitar pesquisas e análises. O seu empreendimento relaciona-se com
a criatividade e sensibilidade daqueles que o produzem diante da construção narrativa. Diante
disso, inevitavelmente impõe desafios metodológicos e teóricos paralelos aos habituais, um
desafio inusitado e complexo, típico do trabalho inovador do professor Carlos Adriano.
A proposta da turma foi a de trabalhar a respeito do feminismo revolucionário russo,
elencando três personagens, sendo elas: Olga Andréievna Chapir, Maria Ivánova Pokróvskaia
e Konkórdiua Nikoláievna Samóilova. A escolhas delas não foi arbitrária, a proposta é que a
série atenda diferentes realidades do movimento feminista, uma vez que é impossível
enquadrar todo ele em uma só vertente teórica, ou mesmo todo ele dentro de uma única
reivindicação (SCHNEIDER, 2017). Dessa maneira, o diálogo torna-se ainda mais plural.
O trabalho percorre então, a percepção da luta feminina na área rural através dos
escritos de Olga Chapir, autora de Ideias de futuro, texto esse defendido no Congresso de
Mulheres de Toda Rússia, em 1908. Também, o trabalho da médica e autora Maria
Porkrósvkaia, que escreveu, Como as mulheres devem lutar contra a prostituição e Lei e vida,
convidando a refletir a respeito da sexualidade e a sobre o problema da prostituição na Rússia
pré-revolucionária. E finalmente, a jornalista Konkórdia Samóilova, que publicou – O que a
revolução de outubro deu aos operários e camponeses, (SCHNEIDER, 2017) ela, toma maior
destaque na série, já que conduzirá a trama, a medida que indica possíveis reportagens para
uma jornalista fictícia, protagonista da série, que terá diálogos com as teóricas citadas
anteriormente.
A série assumirá um descompromisso com a factualidade, deslocará personagens e
eventos no tempo, elencará figuras fictícias e também reais dentro de diálogos que não
tiveram, valendo-se da representação. Portanto, englobará inquietações, reflexões e
resistências que partem inevitavelmente do tempo presente de seus produtores (BARROS,
2011), dando uma nova caracterização ao ambiente revolucionário, que por inúmeras vezes
deu espaço somente a personagens que respondem a uma cisgeneridade masculina,
cruelmente imposta a esse momento de uma multiplicidade subjetiva inegável (REIS, 2017) e
doravante, se espera que incensurável.
Esse deslocamento, ocasionado pela representação, será acompanhado de pesquisa
bibliográfica. Mesmo diante de um enredo que não se firma na fidelidade histórica, ainda
assim, busca-se retratar com dignidade as personagens elencadas, levantando como fonte suas
publicações disponíveis através da tradução para o português, língua nativa dos matriculados
na disciplina. As maiores referências documentais estão presentes nos livros – Manifestos
Vermelhos, de Daniel Aarão Reis e A revolução das mulheres: emancipação feminina na
Rússia soviética: artigos, atas, panfletos e ensaios, de Graziela Schneider Urso. As presentes
obras dão voz às diferentes reivindicações que englobam o movimento, seja a partir de
manifestos, ou seja a partir de cartas, panfletos e afins, dando uma perspectiva mais íntima de
como se percebia e era percebida a resistência.
Quanto às referências audiovisuais, fora uma das decisões mais duras, pois, a medida
que a narrativa audiovisual se faz de um discurso capaz de vocalizar as palavras e pretensões
de seu realizador (FERRO, 1992), definir como estarão dispostos os elementos é
indispensável. Três nomes foram elencados como referência, a belga Agnès Varda, a
escocesa, Margaret Tait e, o polonês, Kryzstof Kiéslowski. A experimentação no trabalho de
ambos combinada, trará uma originalidade inegável à série.
Agnès Varda, é uma escolha indispensável, seu trabalho diante de questões feministas
é apaixonante, sua filmografia extensa passeia por uma série de estilos e temas, que partem de
questões desde um sofrimento metalinguístico diante do machismo, da desigualdade social e
da crescente desumanização pós-moderna, até grandes eventos históricos que a rondam. A
referência maior de suas produções na série, será a complexidade de seus planos, sempre
dinâmicos, lotados de reflexos e vidros, tendência essa amplamente referenciada no cinema
maneirista. Tal peculiaridade atribui sempre um tom de agitação aos ambientes urbanos,
perfeito para um momento revolucionário, uma vez que evoca caoticidade, além do que, seus
filmes são sempre ocupados por personagens femininas complexas, objetivo maior a ser
alcançado nessa produção.
Margaret Tait, por sua vez, é uma videopoetisa de grande apelo íntimo, também uma
das referências audiovisuais. Suas poesias carregam o expectador para sutilezas de sua rotina
e do ambiente que a cerca, aproximando-se lentamente daquele que a assiste, até que esteja
completamente enredado nos recortes temáticos da diretora, que confunde conscientemente o
tempo inteiro sua obra com o fazer literário. A experiência sinestésica de „sentir‟ as suas
gravações, sobretudo diante da sua decupagem complexa, que parece modelar o tempo diante
de suas emoções é uma das principais referências na direção da presente minissérie, a de gerar
empatia e curiosidade a respeito das personagens elencadas.
Finalmente, Kryzstof Kiéslowski, o mais famoso diretor polonês, responsável por
incontáveis obras de um charme encantador. De seu estilo, a série beberá dos roteiros seriados
que parecem se somar numa única obra, apesar de contar histórias paralelas. Uma habilidade
indispensável para o seu ofício de produtor de séries televisivas, como Dekalog, que faz o
feito extraordinário de unir uma dezena de episódios, cada um com uma temática e
personagens isolados, numa narrativa interligada e contínua. Essa conexão é visada a fim de
traduzir o empenho conjunto das feministas em diferentes reivindicações e espaços como uma
força interligada, apesar das diferenças de sua atuação.
Combinando esses elementos, planos agitados, decupagem precisa, um roteiro
harmonioso com a ideia de continuidade dos eventos e a densa pesquisa histórica, a presente
série certamente contestará as representações machistas do ambiente revolucionário soviético,
abrindo espaço para novos diálogos e representações.

3.1 REFERÊNCIAS:

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Rio de Janeiro: Editora Atlas, 2009.


ARISTÓTELES. Poética e Tópicos I, II, III e IV. 2. ed. São Paulo: Hunter Books, 2014.
BARROS, José D‟Assunção. Cinema e história – considerações sobre os usos historiográficos
das fontes fílmicas. Comunicação & sociedade; ano 32, n. 55, p. 175 – 202, jan/jun. 2011.
CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. Rio de Janeiro: Ática, 1995.
DELEUZE, Gilles. Cinema 1 – A Imagem-Movimento. 1. ed. São Paulo: Editora 34, 2020.
FERRO, Marc. Cinema e História. :Paz e terra, 1992.
SCHNEIDER, Gabriela. A revolução das mulheres: emancipação feminina na Rússia
soviética: artigos, atas, panfletos e ensaios.
REIS, Daniel Aarão. Manifestos Vermelhos. São Paulo:Penguin-Companhia, 2017.
SOUSA, William Sampaio Lima de. O príncipe ensandecido: Shakespare, Aristóteles e a
ratoeira criativa. In: MANGUEIRA, José Villian; NÓBREGA, Paulo Víncius Ávilla; LINS,
Juares Nogueira. Língua Literatura e Ensino. João Pessoa: Ideia, 2019.

3.2 ANEXOS
Figura 1, 2, 3, 4. Matheus Macedo do Nascimento.

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