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O PLANEJAMENTO DA OPERAÇÃO

ENERGÉTICA NO SISTEMA
INTERLIGADO NACIONAL

CONCEITOS, MODELAGEM MATEMÁTICA,


PREVISÃO DE GERAÇÃO E CARGA
Copyright© 2020 by Artliber Editora Ltda.

Revisão:
Alexadra Resenda

Capa e editoração:
Editorando Birô

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro)

Francisco José Arteiro de Oliveira (org.)


O planejamento da operação energética no sistema : conceitos, modelagem
matemática, previsão de geração e carga / Francisco José Arteiro de Oliveira
. –- São Paulo : Artliber, 2020.
402 p. : il., color.

ISBN: 978-65-86443-02-8

1. Energia elétrica - Sistemas – Brasil 2. Gestão energética - Brasil I. Título


20-1942 CDD 621.310981

Índices para catálogo sistemático:


1. Operações energéticas - Brasil

2020
Todos os direitos desta edição são reservados à
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APRESENTAÇÃO

Francisco José Arteiro de Oliveira


Diretor Coordenador
Diretor de Planejamento e Programação da Operação (2012 – 2017)
Diretor de Planejamento (desde 2017)
Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS)

A evolução do Setor Elétrico Brasileiro e a necessidade de ampliar as competências técni-


cas para lidar com as transformações tecnológicas e a crescente complexidade da operação do
Sistema Interligado Nacional-SIN, impõem que a valorização do conhecimento e o estímulo
contínuo ao desenvolvimento dos seus profissionais sejam ações prioritárias da Diretoria do
Operador Nacional do Sistema Elétrico -ONS.
Com um olhar no futuro, ancorado na crença da sustentabilidade organizacional por meio
da expertise e do conhecimento técnico do seu corpo funcional, o Modelo de Aprendizagem
Corporativo e a Gestão do Conhecimento têm assumido importância fundamental para o en-
frentamento dos desafios futuros.
Atentos a esses fatos, foram concebidos em 2016 pela Diretoria de Assuntos Corporativos
do Operador, conduzida pelo engenheiro István Gárdos, Programas de Treinamento e Desen-
volvimento com o propósito de facilitar e promover a conversão do conhecimento tácito em
explícito. Esses programas contaram com o apoio do Diretor Geral do ONS, engenheiro Luiz
Eduardo Barata Ferreira e a participação direta das três Diretorias Técnicas, a Diretoria de
Administração da Transmissão e a Diretoria de Operação, lideradas pelos engenheiros Álvaro
Fleury Veloso da Silveira e Ronaldo Schuck, e a Diretoria de Planejamento e Programação da
Operação, sob a minha liderança.
Nesse contexto, graças ao comprometimento e esforço das equipes em alcançar os objeti-
vos para a disseminação do conhecimento, foi possível realizar o “Curso de Nivelamento para
Engenheiros”, ministrado por profissionais que compõem o quadro técnico do Operador que
detêm conhecimentos especializados, tendo como público alvo os engenheiros do ONS.
O curso focou conhecimentos técnicos, complementares aos do nível da graduação para
os engenheiros recém-admitidos no ONS, permitindo a compreensão das atividades ligadas
a missão do Operador, além de proporcionar uma visão transversal e detalhada da cadeia de
macroprocessos.
Implementado em 2016, coube a mim, como titular da Diretoria de Planejamento e Pro-
gramação da Operação, a Coordenação Temática, apoiado pela Diretoria de Assuntos Corpo-
rativos. A Coordenação Técnica ficou a cargo do engenheiro Paulo Gomes e a Coordenação
da área de Recursos Humanos foi conduzida pelo gestor Marco Antônio de Almeida Costa
Carvalho.
O Programa contou com 40 instrutores, todos profissionais do ONS, que se dedicaram
ao processo de ensino-aprendizagem e ao compartilhamento do conhecimento, com vistas a
atender com êxito o propósito do Programa. A 1ª turma teve a participação de 26 engenheiros,
com carga horária total de 172 horas e grade temática composta por 10 módulos técnicos.
Dentre os diversos temas destacamos, pela sua abrangência, o de Proteção de Sistemas
Elétricos de Potência, Análise Dinâmica e Segurança de Sistema Elétricos de Potência, Trans-
missão em Corrente Contínua, Controle Automático de Geração e Planejamento Energético.
Com base nos resultados alcançados, entendemos que o conteúdo dos módulos técnicos
deveria ser consolidado em livros, possibilitando a extensão do compartilhamento do conhe-
cimento e da experiência acumulada na operação do SIN para além das equipes do Operador.
Essa proposta foi levada, em setembro de 2018, à apreciação da Diretoria do ONS, composta
pelos novos titulares das Diretorias de Operação e de Assuntos Corporativos, engenheiros
Sinval Zaidan Gama e Jaconias de Aguiar, respectivamente, tendo sido prontamente aprova-
da. Tal iniciativa demonstra o valor que a Diretoria e os profissionais do Operador têm com
relação à formação, o conhecimento e o desenvolvimento dos seus profissionais, pilares fun-
damentais para o cumprimento da visão e missão do ONS.
O presente livro, elaborado por Mário Daher, gerente executivo de Planejamento Energé-
tico, pela gerente de Estudos Energéticos Maria Aparecida Martinez, Alex Nunes de Almeida
(In Memoriam), Luiz Guilherme Barbosa Marzano, Nestor Bragagnolo Filho e Paulo Gerson
Cayres Loureiro; pelo gerente de Previsão de Carga Fausto Pinheiro Menezes, Marcia Perei-
ra dos Santos e Evandro Luiz Mendes; pelo gerente de Metodologias e Modelos Energéticos
Vitor Silva Duarte, Alberto Sérgio Kligerman, Alessandra Mattos Ramos de Oliveira, Débo-
ra Dias Jardim Penna, Filipe Goulart Cabral, Joari Paulo da Costa, Paulo Sérgio de Castro
Nascimento, Rodrigo José Coelho Pereira e Rogério Saturnino Braga; e por Paulo Eduardo
Martins Quintão, da gerência executiva de Estudos Especiais, e Maria Alzira Noli Silveira,
da gerência de Planejamento Elétrico de Médio Prazo, é o terceiro a ser lançado e refere-se
ao Planejamento da Operação Energética no Sistema Interligado Nacional, Conceitos, Mo-
delagem Matemática, Previsão de Geração e Carga. Estamos certos que será de grande valia
na formação e desenvolvimento dos profissionais do ONS e do Setor Elétrico Brasileiro, bem
como dos estudantes de engenharia elétrica.
PREFÁCIO

O Sistema Interligado Nacional – SIN é, sob qualquer aspecto que se considere, um dos
mais complexos e abrangentes sistemas produzidas pela engenharia. Ele se estende por mais
de 3.500 km de norte a sul e mais de 3.500 km de leste a oeste, ligando regiões de caracterís-
ticas físicas, econômicas e sociais diversas.
Sem dúvidas, trata-se de um sistema complexo, vasto e dinâmico. Sua evolução ao longo
dos mais de 22 anos de atuação do ONS tem sido notável. De fato, o SIN nasceu em março de
1999, quase que simultâneo com o ONS, com a entrada em operação do 1º circuito da inter-
ligação Norte- Sudeste/Centro-Oeste, ligando dois sistemas que até então operavam isolada-
mente, dando origem ao SIN.
Desde então o Sistema Interligado Nacional tem se expandido continuamente, incorpo-
rando novas áreas, usinas, instalações de transmissão e, sobretudo, novos consumidores.
A expansão do SIN tem sido marcada também pela evolução tecnológica, que tem se
acelerado em anos recentes, verificando-se o crescimento na participação de novas formas de
geração, com destaque para as fontes eólica e fotovoltaica, e de transmissão, especialmente a
utilização mais intensa da transmissão em corrente contínua.
Todos esses movimentos aumentam a complexidade do SIN e o desafio do ONS de garan-
tir que a operação do SIN se dê da forma mais segura e econômica, requisito cada vez mais
essencial à medida que avança na sociedade brasileira a sua dependência da energia elétrica.
Considerando as características do SIN, com forte presença de usinas hidroelétricas, dis-
tribuídas em diversas bacias hidrográficas em todo o território nacional, fazendo com que as
decisões de despacho sejam acopladas espacial e temporalmente, além de longas distâncias
entre as fontes e os centros de carga e do recente crescimento de fontes não despacháveis, a
obtenção da melhor utilização dos recursos energéticos no Brasil constitui um problema único,
que tem sido enfrentado e solucionado por gerações de técnicos e pesquisadores brasileiros.
No cumprimento das suas atribuições, onde se destaca a interação permanente com o
corpo técnico dos agentes e com especialistas das mais diversas instituições, o ONS tem tido
a oportunidade, pela sua posição no setor elétrico brasileiro, de acumular um conhecimen-
to único sobre o problema do planejamento da operação energética do Sistema Interligado
Nacional.
Por sua vez, um princípio que tem pautado a atuação do Operador tem sido o de compar-
tilhar conhecimento, ação essencial, no nosso entender, para que o ONS possa cumprir a sua
missão.
É nesse contexto que este livro foi elaborado. Ele foi conduzido com muito esmero e
apresenta de forma didática conceitos, modelos e procedimentos que têm sido largamente
utilizados no trabalho incessante de buscar a utilização ótima dos recursos energéticos dispo-
níveis no SIN.
Inicialmente é apresentado como evoluiu o planejamento da operação energética no Brasil,
seguindo-se de modelos matemáticos, procedimentos e produtos, incluindo capítulos específi-
cos para a previsão de carga, previsão de vazões e a previsão de geração eólica e fotovoltaica.
Trata-se, portanto, de conteúdo fundamental para a formação dos novos engenheiros e
de todos os envolvidos na permanente tarefa de garantir a continuidade do fornecimento de
energia elétrica aos consumidores brasileiros.

Francisco José Arteiro de Oliveira


Diretor de Planejamento e Programação da Operação (2012 – 2017)
Diretor de Planejamento (desde 2017)
Operador Nacional do Sistema Elétrico
SUMÁRIO

1. PLANEJAMENTO NO SETOR ELÉTRICO..........................................................................13


1.1 – Histórico ......................................................................................................................................................... 14
1.2 – Interação com o planejamento da expansão da geração................................................................................. 17

2. GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA .................................................................................19


2.1 – Introdução....................................................................................................................................................... 19
2.2 – Fontes primárias de energia para produção de energia elétrica...................................................................... 19
2.2.1 – Fontes renováveis de energia....................................................................................................................... 19
2.2.1.1 – Energia solar............................................................................................................................................. 21
2.2.1.2 – Energia eólica............................................................................................................................................ 29
2.2.1.3 – Energia hidroelétrica................................................................................................................................. 40
2.2.2 – Fontes não renováveis de energia................................................................................................................ 41
2.3 – Tipos de usinas para geração de energia elétrica............................................................................................ 42
2.3.1 – Usinas hidroelétricas.................................................................................................................................... 42
2.3.2 – Centrais geradoras eólicas............................................................................................................................ 50
2.3.2.1 – Centrais geradoras eólicas offshore.......................................................................................................... 55
2.3.3 – Centrais geradoras fotovoltaicas.................................................................................................................. 57
2.3.4 – Centrais termosolares de concentração........................................................................................................ 61
2.3.4.1 – Central termosolar de receptor de torre central......................................................................................... 61
2.3.4.2 – Central termosolar de calhas cilindro-parabólicas.................................................................................... 67
2.3.4.3 – Central termosolar híbrida........................................................................................................................ 72
2.3.5 – Usinas termoelétricas................................................................................................................................... 73
2.3.5.1 – Usinas termoelétricas a vapor................................................................................................................... 75
2.3.5.2 – Usinas termoelétricas a gás natural .......................................................................................................... 77
2.3.5.3 – Usinas termoelétricas a gás natural operando em Ciclo Combinado (CCGT)......................................... 78
2.3.5.4 – Usinas termoelétricas no sistema interligado nacional............................................................................. 80
Glossário do capítulo............................................................................................................................................... 81
Referências do capítulo............................................................................................................................................ 82

3. O SISTEMA INTERLIGADO NACIONAL E O PLANEJAMENTO DA OPERAÇÃO ENERGÉTICA......85


3.1 – Características do Sistema Interligado Nacional............................................................................................ 85
3.2 – O problema de planejamento da operação energética..................................................................................... 96
3.3 – Estratégia de solução..................................................................................................................................... 100
3.4 – Breve histórico do planejamento da operação no Brasil............................................................................... 102
3.5 – Métodos de solução do problema ................................................................................................................ 104
3.5.1 – Programação dinâmica............................................................................................................................... 106
3.5.2 – Programação dinâmica estocástica............................................................................................................ 111
3.5.3 – Programação dinâmica dual....................................................................................................................... 115
3.5.3.1 – Método de decomposição de Benders..................................................................................................... 116
3.5.3.2 – Programação Dinâmica Dual Determinística.......................................................................................... 121
3.5.3.3 – Método L-Shaped.................................................................................................................................... 125
3.5.3.4 – Decomposição Aninhada ou Programação Dinâmica Dual (PDD)........................................................ 129
3.5.4 – Programação dinâmica dual estocástica (PDDE)...................................................................................... 133
3.5.5 – Reamostragem de cenários........................................................................................................................ 138
3.6 – Reservatórios equivalentes de energia.......................................................................................................... 139
3.6.1 – Energia armazenável máxima.................................................................................................................... 141
3.6.2 – Energia natural afluente............................................................................................................................. 142
3.3.3 – Energia de vazão mínima, energia de desvio e energia evaporada............................................................ 144
3.6.4 – Geração hidráulica máxima....................................................................................................................... 146
3.7 – Formulação matemática do problema de despacho...................................................................................... 148
3.7.1 – Formulação geral do problema de planejamento da operação energética de curto prazo.......................... 149
3.7.1.1 – Função objetivo ...................................................................................................................................... 149
3.7.1.2 – Restrição de balanço de energia.............................................................................................................. 150
3.7.1.3 – Função de produção de energia hidráulica.............................................................................................. 152
3.7.1.4 – Restrição de atendimento a demanda...................................................................................................... 153
3.7.1.5 – Função de custo futuro............................................................................................................................ 155
3.7.1.6 – Limitação de variáveis............................................................................................................................ 157
3.7.2 – Formulação geral do problema de planejamento da operação energética de médio prazo........................ 158
3.7.2.1 – Função objetivo....................................................................................................................................... 159
3.7.2.2 – Restrição de balanço de energia controlável........................................................................................... 159
3.7.2.3 – Vertimento fio d´água (perda fio d´água)................................................................................................ 160
3.7.2.4 – Restrição de balanço de energia fio d´água............................................................................................. 160
3.7.2.5 – Restrição de geração hidráulica máxima................................................................................................ 160
3.7.2.6 – Restrição de atendimento a demanda...................................................................................................... 160
3.7.2.7 – Função de custo futuro............................................................................................................................ 161
3.7.2.8 – Limitação das variáveis........................................................................................................................... 161
3.8 – Acoplamento entre as etapas de médio e curto prazo .................................................................................. 162
3.9 – Representação das usinas não simuladas...................................................................................................... 163
3.10 – Função custo de déficit................................................................................................................................ 164
3.11 – Representação da taxa de desconto............................................................................................................. 165
3.12 – O custo marginal de operação..................................................................................................................... 165
3.13 – Condições de contorno para horizonte de estudo....................................................................................... 166
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 168
4. SEGURANÇA ENERGÉTICA........................................................................................... 171
4.1 – Curva bianual de Aversão a Risco – CAR.................................................................................................... 171
4.1.1 - Conceitos básicos para a Curva de Aversão a Risco................................................................................. 173
4.1.2 – Premissas para a construção da Curva de Aversão a Risco....................................................................... 174
4.1.3 – Formulação matemática adotada na CAR.................................................................................................. 175
4.2 – Procedimentos Operativos de Curto Prazo – POCP..................................................................................... 178
4.2.1 – Estabelecimento do Nível Meta................................................................................................................. 179
4.2.2 – Obtenção da Série de Referência............................................................................................................... 180
4.2.3 – Obtenção dos Níveis de Segurança Mensais............................................................................................. 181
4.2.4 – Determinação da necessidade de aplicação dos procedimentos operativos............................................... 183
4.2.5 – Processo decisório para atender o nível de segurança............................................................................... 184
4.3 – Conditional Value at Risk – CVaR ............................................................................................................... 185
4.3.1 – CVaR e o controle de eventos extremos.................................................................................................... 188
4.3.2 – CVaR em Programação Estocástica........................................................................................................... 191
4.3.3 – Abordagem direta para consideração do CVaR no problema de planejamento da operação hidrotérmica.192
4.4 – Superfície de Aversão ao Risco – SAR......................................................................................................... 194
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 195

5. PREVISÃO DE CARGA................................................................................................... 197


5.1 – Carga global.................................................................................................................................................. 198
5.1.1 – Comparativos com os dados do setor – CCEE.......................................................................................... 199
5.1.2 – Comparativos com os dados do setor – EPE............................................................................................. 200
5.2 – Perdas e diferenças........................................................................................................................................ 201
5.3 – Previsão de carga mensal e semanal para o Programa Mensal de Operação – PMO................................... 202
5.3.1 – Principais variáveis de influência nas previsões mensais de carga de energia e demanda........................ 203
5.3.2 – Carga de energia e demanda semanal........................................................................................................ 203
5.3.3 – Metodologia............................................................................................................................................... 205
5.3.3.1 – Modelos de previsão mensal................................................................................................................... 205
5.3.3.2 – Modelagem da previsão de carga no PrevCargaPMO............................................................................ 206
5.3.3.3 – Método de repartição semanal................................................................................................................ 206
5.4 – Carga ajustada............................................................................................................................................... 210
5.5 – Cálculo dos patamares de carga.................................................................................................................... 213
5.6 – Previsão de carga anual para o Planejamento da Operação Energética........................................................ 221
5.6.1 – Principais variáveis de influência no consumo e na carga......................................................................... 223
5.6.2 – Método de previsão do consumo............................................................................................................... 224
5.6.2.1 – Classe residencial.................................................................................................................................... 224
5.6.2.2 – Classe comercial..................................................................................................................................... 225
5.6.2.3 – Classe industrial ..................................................................................................................................... 225
5.6.2.4 – Classe Outras classes.............................................................................................................................. 227
5.6.3 – Metodologia de projeção de consumo de eletricidade no âmbito das projeções
para o Planejamento Anual da Operação energética.............................................................................................. 227
5.7 – Previsão de carga de curto prazo.................................................................................................................. 230
5.8 – Previsão de carga para o planejamento diário da operação.......................................................................... 231
5.9 – Curvas de carga diária – exemplos............................................................................................................... 232
5.10 – Séries temporais de carga diária – aspectos teóricos.................................................................................. 237
5.11 – Séries temporais de carga diária – aplicação de modelos........................................................................... 240
5.11.1 – Modelos de amortecimento exponencial.................................................................................................. 241
5.11.2 – Modelos autorregressivos, integrados e de médias móveis..................................................................... 244
5.11.3 – Modelos Autorregressivos (AR).............................................................................................................. 244
5.11.4 – Modelos de Médias Móveis (MA)........................................................................................................... 245
5.11.5 – Modelos autorregressivos e de médias móveis (ARMA)........................................................................ 245
5.11.6 – Modelos autor regressivos e de médias móveis sazonal (SARIMA)....................................................... 246
5.11.7 – Modelos com variáveis exógenas (regressão dinâmica).......................................................................... 247
5.12 – O processo da consolidação da carga diária............................................................................................... 254
5.11.8 – Modelos não-lineares de redes neurais.................................................................................................... 250
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 259

6. PREVISÃO E GERAÇÃO DE CENÁRIOS DE VAZÕES.................................................... 261


6.1 – Dados hidrológicos....................................................................................................................................... 261
6.1.1 – Vazão natural.............................................................................................................................................. 261
6.1.2 – Vazão de usos consuntivos......................................................................................................................... 266
6.1.3 – Vazão de evaporação líquida dos reservatórios......................................................................................... 268
6.2 – Modelos de previsão de vazões..................................................................................................................... 273
6.2.1 – O processo de previsão de vazões naturais do ONS.................................................................................. 276
6.2.2 – Modelo PREVIVAZH................................................................................................................................ 277
6.2.3 – Modelo PREVIVAZ................................................................................................................................... 277
6.2.4 – Modelo SMAP/ONS.................................................................................................................................. 278
6.2.5 – Modelo CPINS........................................................................................................................................... 284
6.2.6 – Outros modelos utilizados.......................................................................................................................... 284
6.3 – Modelo de geração de cenários de vazões e de ENAs.................................................................................. 286
6.3.1 – Conceitos básicos....................................................................................................................................... 286
6.3.2 – Modelo periódico autorregressivo PAR(p)................................................................................................ 288
6.3.2.1 – Formulação............................................................................................................................................. 288
6.3.2.2 – Estimação dos parâmetros do modelo..................................................................................................... 289
6.3.2.3 – Determinação dos resíduos..................................................................................................................... 291
6.3.2.4 – Estimação da distribuição dos ruídos...................................................................................................... 291
6.3.2.5 – Identificação do modelo.......................................................................................................................... 292
6.3.2.6 – Geração de cenários................................................................................................................................ 297
6.3.2.7 – Geração de cenários multivariados......................................................................................................... 297
6.4 – Perspectivas de aprimoramento da previsão e geração de cenários de vazões............................................. 298
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 300

7. PREVISÃO DE GERAÇÃO EÓLICA E FOTOVOLTAICA.................................................. 303


7.1 – Dados disponíveis para previsão de fonte eólica e solar............................................................................... 303
7.1.1 – Dados observados das usinas eólicas e solares.......................................................................................... 303
7.1.2 – Modelos de previsão numérica do tempo ................................................................................................. 304
7.2 – Modelo de previsão de geração eólica.......................................................................................................... 305
7.2.1 – Tratamento de dados.................................................................................................................................. 307
7.2.1.1 – Tipos de dados e triagem......................................................................................................................... 307
7.2.1.2 – Resultados dos processos de tratamento................................................................................................. 311
7.2.2 – Processo de ajuste da previsão de vento.................................................................................................... 312
7.2.2.1 – Metodologia para ajuste das previsões de vento .................................................................................... 313
7.2.2.2 – Resultados do ajuste da previsão de vento.............................................................................................. 315
7.2.3 – Modelo de previsão de geração de fonte eólica......................................................................................... 317
7.2.3.1 – Criação dinâmica das curvas Vento x Potência....................................................................................... 317
7.2.3.2 – Características dos algoritmos................................................................................................................ 323
7.2.4 – Modelo de combinação.............................................................................................................................. 324
7.2.5 – Metodologia de separação das previsões por usinas.................................................................................. 326
7.2.6 – Resultados.................................................................................................................................................. 327
7.2.6.1 – Métricas utilizadas para avaliação dos desvios da previsão .................................................................. 327
7.2.6.2 – Análise de desempenho das previsões eólicas........................................................................................ 330
7.3 – Modelo de previsão de geração solar fotovoltaica........................................................................................ 344
7.3.1 – Informações disponíveis para os modelos de previsão de geração fotovoltaica........................................ 344
7.3.2 – Dificuldades para o uso dos dados observados e previstos........................................................................ 345
7.3.3 – Dados previstos do modelo GFS............................................................................................................... 347
7.3.4 – Modelos baseados em métodos estatísticos............................................................................................... 351
7.3.4.1 – Modelos de séries temporais................................................................................................................... 351
7.3.4.2 – Modelos de inteligência artificial............................................................................................................ 353
7.3.5 – Modelos de regressão multivariada........................................................................................................... 353
7.3.6 – Resultados ................................................................................................................................................. 354
7.4 – Sumário do capítulo...................................................................................................................................... 357
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 360

8. PRODUTOS E PROCESSOS PARA O PLANEJAMENTO E PROGRAMAÇÃO ENERGÉTICA.. 361


8.1 – Plano da Operação Energética – PEN........................................................................................................... 361
8.1.1 – Visão geral do PEN.................................................................................................................................... 361
8.1.2 – Características da oferta do SIN................................................................................................................ 364
8.1.2.1 – A sazonalidade........................................................................................................................................ 367
8.1.2.2 – Complementaridade da oferta................................................................................................................. 367
8.1.2.3 - Redução do grau de regularização........................................................................................................... 369
8.1.2.4 – Custo e relevância da oferta térmica....................................................................................................... 369
8.1.3 – Representação a subsistemas e das interligações....................................................................................... 371
8.1.4 – Principais resultados.................................................................................................................................. 372
8.1.4.1 – Avaliações energéticas ........................................................................................................................... 372
8.1.4.1.1 – Análise conjuntural.............................................................................................................................. 372
8.1.4.1.2 – Análise estrutural................................................................................................................................. 373
8.1.4.2 – Balanço estático de energia .................................................................................................................... 374
8.1.4.3 – Atendimento à ponta............................................................................................................................... 375
8.1.4.3.1 – Requisitos de demanda........................................................................................................................ 377
8.1.4.3.2 – Disponibilidade de potência das usinas hidroelétricas......................................................................... 380
8.1.4.3.3 – Disponibilidade de potência das usinas termoelétricas........................................................................ 381
8.1.4.3.4 – Disponibilidade de potência das usinas eólicas e fotovoltaicas........................................................... 381
8.1.4.3.5 – Disponibilidade de potência das PCHs e PCTs.................................................................................... 382
8.1.4.3.6 – Reserva de potência operativa............................................................................................................. 382
8.1.4.3.7 – Premissas gerais................................................................................................................................... 382
8.1.4.3.8 – Principais resultados do balanço de demanda ..................................................................................... 384
8.1.4.4 – Indicadores de segurança energética – ISEN.......................................................................................... 388
Referências do capítulo.......................................................................................................................................... 394

9. PROGRAMA MENSAL DA OPERAÇÃO ENERGÉTICA .................................................395


9.1 – Visão geral.................................................................................................................................................... 395
9.2 – Cálculo da política de operação hidrotérmica............................................................................................... 396
9.3 – Descrição do processo................................................................................................................................... 397
9.4 – Insumos para formação do PLD................................................................................................................... 400
1
PLANEJAMENTO NO SETOR ELÉTRICO

A partir de meados da década de 1960 o crescimento do consumo de energia elétrica e,


como consequência a necessidade do aumento da capacidade instalada em usinas geradoras e
da malha de transmissão, exigiu que os sistemas elétricos brasileiros funcionassem de forma
integrada, tendo em vista o aproveitamento mais racional das fontes energéticas então dispo-
níveis para exploração de forma econômica. Evidentemente que o sucesso desta integração
foi muito facilitado pela construção de grandes empreendimentos de geração e transmissão,
realizados por empresas públicas federais e estaduais.
Dessa forma, a operação de forma integrada de sistemas elétricos, especialmente predo-
minantemente hidroelétricos, como o brasileiro, com características hidrográficas peculiares,
tem um enorme efeito sinérgico quando realizada de forma coordenada, integrada e centra-
lizada, o que proporciona um amplo potencial de benefícios econômicos e de melhoria da
qualidade do serviço, destacando a socialização do uso da água para geração hidroelétrica, o
aumento da disponibilidade de energia, a redução dos custos operativos, com consequência
na modicidade tarifária, e maior confiabilidade do atendimento aos consumidores finais de
energia elétrica.
No Brasil, a origem da operação coordenada e integrada dos sistemas elétricos teve início
há quase 60 anos e o contínuo crescimento dos grande troncos de transmissão, permitindo a
interligação das regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul, conduziu a formação
de um grande sistema interligado, denominado Sistema Interligado Nacional – SIN e atenden-
do a aproximadamente 99 % do mercado de energia elétrica brasileira. Atualmente não fazem
parte do SIN o estado de Roraima, bem como assim como 297 localidades no interior do Ama-
zonas, Acre, Rondônia, Pará, Macapá e Fernando de Noronha, que constituem os chamados
Sistema Isolados – SISOL.
Por outro lado, a valorização do potencial hidrelétrico brasileiro, o uso da geração térmica
complementar, a interligação das diversas regiões geoelétricas do País e mais recentemente,
o advento das fontes intermitentes, modificaram profundamente a estrutura técnico-produtiva
do setor, aumentando, sobremodo, a complexidade operacional, em face da necessidade de
transferências de grandes blocos de energia a longas distâncias.
Ao longo desse período acumularam-se informações e conhecimentos, empregaram-se
novas técnicas e desenvolveram-se novos métodos, aprimorando-se cada vez mais a atividade
de coordenação da operação interligada. Nos dias de hoje, as questões relacionadas à opera-
ção do SIN interessam cada vez mais ao grande público, além dos técnicos especializados no
assunto.
14    Planejamento no setor elétrico

Nesse contexto, o Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS é parte integrante dessa
história em que se constituiu a concepção, a implementação e exploração deste complexo
sistema interligado, qualquer que seja a base de comparação em escala mundial. O ONS tem
como missão garantir o suprimento de energia elétrica no país, com qualidade e equilíbrio
entre segurança e custo global da operação, sendo responsável por coordenar a operação do
SIN e administrar a rede básica de transmissão de energia elétrica do País, assegurando aos
usuários do sistema a continuidade, a qualidade e a economicidade do suprimento de energia
elétrica.
Este livro apresenta os principais conceitos, metodologias e estudos relacionados à ati-
vidade de planejamento da operação energética efetuada pelos profissionais do ONS, com o
objetivo de disseminar o conhecimento e a experiência a todos aqueles que tenham interesse
em aprender sobre as etapas do planejamento energético.

1.1 – Histórico

Até a década de 1960, os estudos da expansão eram feitos principalmente pelo capital
privado, tendo como objetivo o aproveitamento de potenciais hidrelétricos locais, dado que o
atendimento da demanda era realizado predominantemente por geração térmicas e com siste-
mas de transmissão radiais e/ou isolados. Planejamento da Expansão, coordenados pelo Mi-
nistério de Minas e Energia (MME), através do Comitê Coordenador dos Estudos Energéticos
da Região Centro-Sul contratou um consórcio de consultores canadenses, americanos e bra-
sileiros, denominado consórcio Canambra. O principal marco desse trabalho foi a realização
do primeiro levantamento integrado do potencial hidroelétrico brasileiro nas regiões Sudeste
e Sul. Como resultado, foram inventariados 264 locais com estudos para aproveitamento do
potencial hidroelétrico em 28.000 km de rios.
A década de 1970 foi marcada pela estruturação do planejamento setorial centralizado,
com considerados investimentos estatais, a instalação de grandes reservatórios de regulari-
zação plurianual e a criação de subsistemas regionais interligados. Nessa década, teve início
a coordenação da operação dos 46 subsistemas elétricos pela Eletrobrás, através dos órgãos
colegiados como Grupo Coordenador para a Operação Interligada – GCOI e o Comitê Coor-
denador de Operação do Nordeste – CCON.
O grande marco da década de 1970, em termos de planejamento da expansão, foi o Plano
90, de longo prazo, elaborado pela Eletrobrás e que definiu o programa nuclear brasileiro,
orientando todo o início de uma geração e absorção de conhecimentos com relação à produ-
ção de energia elétrica de origem nuclear no Brasil. Outros planos setoriais de longo prazo
sucederam-se, como o Plano 92, o Plano 95 e o Plano 2000, cujos objetivos eram de indicar
as estratégias de longo prazo para o Setor Elétrico Brasileiro – SEB.
Foi na década de 1980 que o processo de planejamento da expansão se consolidou, de
forma estruturada e participativa, através da criação do Grupo Coordenador do Planejamento
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   15 

dos Sistemas Elétricos – GCPS, coordenado pela Eletrobrás e com a participação de todos os
agentes setoriais.
O crescimento do consumo, a interligação dos subsistemas – Sul/Sudeste/Centro-Oeste
e Norte/Nordeste, e posteriormente a interligação Norte-Sudeste, em 1999, a predominância
do capital estatal e a introdução da dimensão ambiental no planejamento, foram os grandes
marcos do período de existência do GCPS.
Alguns outros marcos merecem destaque, como a elaboração do Manual de Inventário
e de Viabilidade de Usinas Hidroelétricas, o 1º Plano Diretor de Meio Ambiente (1986) e a
aplicação de novas metodologias de planejamento, considerando cenários de mercado, pla-
nejamento estocástico e planejamento sob incertezas. Ao todo foram publicados, pelo GCPS,
quinze planos decenais entre 1984 e 1999 e dois planos de longo prazo – Plano 2010, em
1987, e o Plano 2015, em 1994.
A partir de 1995 teve início o processo privatização de reforma do setor, tendo com base
a Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, conhecida como Lei das Concessões, que permitir
a competição na construção de novos projetos o que até então era exclusivo das empresas
estatais.
Já em 1996 foi iniciado o Projeto de Reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro Reseb, que
recomendou as seguintes ações: a criação da agência reguladora independente Agência Nacional
de Energia Elétrica – ANEEL (1997), do Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS (1998),
a criação do mercado de livre contratação no suprimento – o Mercado Atacadista de Energia –
MAE (1998), a instituição do planejamento indicativo na geração e determinativo na transmissão
(três anos), sob responsabilidade direta do MME, através Comitê Coordenador do Planejamento
Elétrico – CCPE (1999), sucedâneo do GCPS, a criação do Conselho Nacional de Política Ener-
gética – CNPE (2000).
Além disso, também foi recomendado iniciar o programa de desverticalização das empre-
sas de energia elétrica, separando os segmentos de geração, transmissão e distribuição, incen-
tivar a competição nos setores de geração e comercialização e manter sob regulação os setores
de distribuição e transmissão, considerados monopólios naturais, sob a regulação do Estado.
Um marco importante desse modelo institucional, no que diz respeito diretamente ao
ONS, foi o livre acesso e a competição na transmissão, o que exigiu uma atribuição nova no
SEB, que foi a administração da transmissão, função delegada então ao ONS, além das res-
ponsabilidades de planejar e coordenar a operação do SIN.
Nesse ambiente de grandes mudanças, em 2001, o setor elétrico foi submetido à uma
grave crise de abastecimento, culminando com o racionamento de energia que afetou todos
os consumidores (residencial, industrial e comercial), sendo necessário a implementação de
diversas medidas para o controle do consumo.
Com o racionamento de 2001, e consequentemente, a crise financeira do Setor em 2002
e as expressivas sobras de energia em 2003, foram adotadas medidas emergenciais de curto
prazo e elaborado um novo modelo institucional para o setor, Lei n° 10.848, de 15 de março
16    Planejamento no setor elétrico

de 2004 e Decreto n° 5.163, de 30 de julho de 2004, cujos os principais mecanismos de res-


truturação institucional eram a modicidade tarifária, a universalização do acesso e a segurança
no suprimento de energia elétrica.
Nesse contexto, foi criada a Empresa de Pesquisa Energética – EPE, responsável pelo
planejamento de longo prazo, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico – CMSE, com o
objetivo de avaliar continuamente a segurança do suprimento de energia elétrica e a Câmara
de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE para dar continuidade aos trabalhos do MAE,
sendo responsável por toda a comercialização de energia no SIN. Na Figura 1.1 é apresentada
a estrutura institucional do setor elétrico brasileiro.

igura 1.1
CNPE
Conselho Nacional de
Política Energética

Política Energética / Matriz

EPE MME CMSE


Ministério de Minas e Comitê de
Empresa de Pesquisa
Energia Monitoramento do Setor
Energética
Elétrico
Planejamento da Expansão Implementação Política Energética Segurança de Suprimento

CCEE ANEEL ONS


Câmara de Agência Nacional de Operador Nacional do
Comercialização de Energia Elétrica Sistema Elétrico
Energia Elétrica
Comercialização Regulação e Fiscalização Operação

AGENTES
Transmissão, Distribuição, Comercialização e Geração de
Energia, Consumidores Livres, Importador/Exportador de
Energia

Figura 1.1 – Estrutura institucional SEB

Conforme apresentado, a estrutura institucional do setor elétrico Brasileiro sofreu várias


mudanças ao longo do tempo, passando de um modelo privado e descentralizado, até mea-
dos da década de 60, para um modelo com forte participação estatal e gestão centralizada
até 1995 e a partir de 1995, para um modelo com grande participação privada e com gestão
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   17 

descentralizada. Um resumo das mudanças que o setor elétrico brasileiro foi submetido ao
longa das últimas décadas é apresentada na tabela 1.1.

Tabela 1.1 – Características do Setor Elétrico Brasileiro


Característica Até 1995 Entre 1995 e 2003 A partir de 2004
Majoritariamente públi-
Empresas Públicas e privadas desverticalizadas
cas e verticalizadas
Planejamento e coor- Coordenado pela Eletro-
Coordenado pelo ONS
denação da operação bras por meio GCOI
Coordenado pelo CNPE Coordenado pela EPE
Coordenado pela Eletro-
Planejamento da brás por meio do GCPS
Indicativo na geração Indicativo na geração
expansão Indicativo na geração e
e Determinativo Trans- e Determinativo Trans-
Transmissão
missão missão
Regulação e Coordenado pela Ele-
Coordenando de forma independente pela ANEEL
fiscalização trobrás
Comercialização de
Rateio entre as empresas Coordenado pelo MAE Coordenado pela CCEE
energia
Administração da
Não existia Coordenado pelo ONS
transmissão

1.2 – Interação com o planejamento da expansão da geração

A capacidade efetiva de geração e transmissão de energia elétrica do País, antes da sua


efetiva entrada em operação, é precedida por estudos de planejamento que abrangem diferen-
tes horizontes temporais, tendo como objetivo definir quando, como e onde expandir a oferta
de energia elétrica de forma a atender o mercado consumidor dentro de critérios preconizados
pelo Órgão Planejador.
Os resultados do planejamento da expansão são de vital importância para o ONS, pois são
eles que condicionam toda a configuração eletroenergética do SIN – linhas e usinas e, como
consequência, boa parte dos desafios operacionais a serem enfrentadas pelo ONS no cumpri-
mento de sua missão. Antever como será o SIN, quais os recursos eletroenergéticos no futuro
é, sem dúvida, um objetivo estratégico importante para o ONS, de forma a dimensionar, com
adequada antecedência, seus recursos tecnológicos, humanos e de conhecimentos, bem como as
recomendações/sugestões ao Órgão Planejador de eventuais estudos/antecipações/novos proje-
tos a serem implementados para o adequado atendimento aos critérios de suprimento em vigor.
Os estudos de longo prazo, que se caracterizam por uma visão estratégica da expansão,
identificam, para um horizonte de até 30 anos à frente, as principais linhas de desenvolvimen-
to dos sistemas elétricos de geração e transmissão em face dos diferentes cenários de cres-
cimento econômico, do mundo em geral e do Brasil, em particular, permitindo antever e até
preparar a indústria de energia elétrica para a matriz energética brasileira – MEB.
18    Planejamento no setor elétrico

Os estudos de médio prazo orientam, com as diretrizes e recomendações mais detalhadas,


em relação aos estudos de longo prazo, os estudos de mais curto prazo, numa visão de pro-
gramação no tempo das obras necessárias ao atendimento do mercado, como o Plano Decenal
de Energia Elétrica – PDEE, que tem periodicidade anual, no qual são atualizados, sistema-
ticamente, os primeiros 10 anos dos estudos de longo e médio prazos e analisados, com mais
detalhe, a expansão da geração do SIN e dos sistemas isolados, assim como as futuras inter-
conexões destes ao SIN.
Essas atualizações anuais consideram, entre outras, as mudanças nas previsões de cresci-
mento do consumo de energia elétrica e as eventuais reavaliações da economicidade e viabili-
dade dos projetos de geração em função de um maior detalhamento dos seus estudos técnicos
de engenharia e de meio ambiente, além da incorporação de novos projetos cujos estudos
tenham sido finalizados.
O objetivo do planejamento decenal da expansão do SIN, no atual modelo institucional,
consiste na definição de cenários para implementação de novas instalações de geração e trans-
missão, necessárias para o atendimento ao crescimento dos requisitos do mercado, segundo
critérios de garantia de suprimento pré-estabelecidos, de forma ambientalmente sustentável
e minimizando os custos totais esperados de investimento, inclusive socioambientais e de
operação.
O planejamento decenal – PDEE subsidia a realização dos futuros leilões de compra de
energia de novos empreendimentos de geração e de novas instalações de transmissão. Além
disso, a definição de quais estudos de expansão da transmissão deve ser priorizada, bem como
de quais estudos de viabilidade técnica, econômica e socioambiental de novas usinas gera-
doras deve realizar e, eventualmente, quais estudos de inventários de bacias hidrográficas
deverão ser atualizados.
Para expandir o SIN é indispensável a existência de um processo de planejamento que
possa orientar futuras ações governamentais e fornecer uma correta sinalização a todos os
agentes do SEB, para induzir a alocação eficiente dos investimentos, base para a modicidade
tarifária futura.
Enquanto o planejamento da expansão fornece sinais para minimizar os custos totais futu-
ros da energia elétrica para a sociedade, o objetivo principal de cada um dos agentes é a maxi-
mização de seus resultados. Cada agente privado desenvolve seu plano de expansão empresa-
rial, com objetivos que podem ser bastante distintos daqueles do planejamento governamental.
Ao governo cabe buscar as utilizações adequadas, racionais e otimizadas dos recursos
naturais nacionais, em especial o hídrico, como previsto na Constituição Brasileira. Isto exige
um cuidadoso planejamento da expansão do parque gerador de energia elétrica, o qual deve
considerar não apenas as diversas opções de fontes geradoras disponíveis, mas também as
interligações elétricas existentes e potenciais entre as diferentes bacias hidrográficas sul-ame-
ricanas, visando o aproveitamento da diversidade hidrológica existente.
2
GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA

2.1 – Introdução

O presente capítulo é dividido em duas partes. Na primeira parte, é feita uma revisão bi-
bliográfica dos diversos tipos de fontes renováveis e não renováveis de energia, sua origem
na natureza, suas formas de aproveitamento e aspectos técnicos específicos de sua utilização
no Brasil como fonte primária para geração de energia elétrica. Na segunda parte do capítulo,
é feita uma análise detalhada de cada um dos tipos de usinas para geração de energia elétrica
presentes no Sistema Interligado Nacional (SIN), que utilizam as formas de energia primária
tratadas na primeira parte.

2.2 – Fontes primárias de energia para produção de energia elétrica

A energia elétrica pode ser produzida através da conversão de diversas fontes primárias
de energia. Essas fontes primárias se dividem em dois grandes grupos: energias renováveis e
energias não-renováveis, cujos principais aspectos serão tratados em detalhe nesse item.

2.2.1 – Fontes renováveis de energia


As fontes renováveis de energia se caracterizam pelo fato de estarem relacionadas a pro-
cessos e ciclos naturais renováveis da Terra. A energia solar é o motor principal de todos esses
processos e ciclos que, por sua vez, irão fornecer a matéria-prima da maior parte das demais
fontes renováveis de energia. A tabela a seguir apresenta um resumo das fontes de energia
renováveis com maior participação na matriz energética brasileira.

Fonte renovável Descrição e processo natural associado


de energia
Diretamente relacionada à irradiação solar incidente na superfície da Terra. A energia solar
Energia solar é a fonte principal de energia de vários processos e ciclos naturais do planeta que, por sua
vez, irão fornecer a matéria-prima da maior parte das demais fontes renováveis de energia.
Diretamente relacionada ao deslocamento das massas de ar da atmosfera terrestre que, de
forma simplificada, ocorre em razão do aquecimento da superfície terrestre e dos oceanos,
Energia eólica
provocados pela irradiação solar. A rotação da Terra também influencia a circulação das
massas de ar da atmosfera devido ao Efeito de Coriolis.
20    Geração de energia elétrica

Fonte renovável Descrição e processo natural associado


de energia
Diretamente relacionada ao Ciclo das Águas, que é um ciclo natural fechado alimentado
Energia hi-
diretamente pela irradiação solar, que provoca a evaporação da água nos oceanos, rios e
droelétrica
lagos, e dos ventos, responsáveis pela circulação das nuvens na atmosfera terrestre.
Subproduto do processamento de uma matéria-prima renovável, como o bagaço de cana-
-de-açúcar, obtido como resíduo do processo de extração de açúcar e álcool. A produção
de cana está intimamente relacionada ao Ciclo do Carbono. A planta produz açúcares para
seu crescimento através da fotossíntese, utilizando o CO2 da atmosfera, água e energia
Biomassa
solar (fonte de energia). Portanto, o carbono produzido com a queima do bagaço de cana
será reutilizado no próximo ano para o crescimento da nova safra de cana, em um ciclo
fechado. Na verdade, a energia obtida da biomassa é, de alguma forma, a própria energia
solar armazenada em matéria-prima.

Nos últimos anos tem crescido a demanda da sociedade a nível mundial pela utilização de
fontes renováveis de energia. A principal fonte de energia renovável no mundo são as usinas
hidroelétricas, que geram energia elétrica a partir dos seus geradores síncronos, inicialmente
pela transformação da energia potencial da água em potência mecânica em suas turbinas hi-
dráulicas e, a seguir, potência elétrica em seus geradores que são conectados mecanicamente
às turbinas por um eixo.
Existem muitas pesquisas para a utilização de fontes renováveis de energia na matriz ener-
gética, dentre essas linhas de pesquisa, destacam-se:

• Energia geotérmica. Utiliza o calor existente no interior do planeta Terra. Essa ener-
gia térmica teve origem com a formação da Terra, devido a colisões cósmicas, e do
decaimento de materiais radioativos que ainda ocorre nos dias de hoje. O calor é uti-
lizado para obtenção de vapor de água aquecido, através da extração direta ou da
injeção de água no subsolo através de poços artificiais. O vapor de água obtido é utili-
zado como fonte de energia primária para mover uma turbina a vapor, que se conecta
através de um eixo a um gerador síncrono convencional, produzindo energia elétrica; e
• Energia das ondas e marés. Utiliza a energia das ondas e marés como fonte de ener-
gia cinética para geração de energia elétrica. O Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-
-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE), da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), [1] desenvolveu um protótipo de usina para aproveitamento da energia
das ondas do mar, próximo ao Porto do Pecém (CE), no Ceará, capaz de gerar 50 kW.
Nesse protótipo, um conjunto de flutuadores e braços mecânicos acionam bombas
hidráulicas, que comprimem um fluido para abastecer e manter elevada a pressão de
uma câmara hiperbárica. A câmara hiperbárica é previamente pressurizada com água e
gás nitrogênio em volume fixo. A vazão da água, que abastece a câmara hiperbárica, é
então liberada na forma de um jato, que aciona uma turbina do tipo Pelton, conectada
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   21 

a um gerador síncrono, produzindo energia elétrica. Estimativas recentes indicam que


a energia contida nas ondas do mar é de cerca de 10 TW [1].
Nos capítulos a seguir, serão detalhadas as características de cada uma dessas fontes re-
nováveis de energia no Brasil, assim como seus aspectos mais relevantes para conexão das
centrais que utilizam cada uma dessas fontes no Sistema Interligado Nacional.

2.2.1.1 – Energia solar


A fonte de energia primária de todas as formas de aproveitamento da energia solar é a ra-
diação ou irradiação solar. O Sol gera sua energia através de um processo denominado fusão
nuclear. Esse processo consiste, basicamente, em uma estrela com a massa do Sol, na fusão de
4 átomos de hidrogênio 1H em 1 átomo de Hélio 4He. Como subproduto desse processo, uma
pequena parte da massa é transformada em energia, de acordo com a equação de Einstein:

E = m $ c! (2.1)

Uma vez que a velocidade da luz, c, é de aproximadamente 3 x 108 m/s, essa constante
elevada ao quadrado, faz com que uma pequena quantidade de matéria, m, gere uma enorme
quantidade de energia, E.
Parte da energia gerada como radiação solar é transmitida como uma onda eletromagnéti-
ca em todas as frequências do espectro, incluindo a luz visível, através do espaço até chegar na
Terra. Para avaliar a energia recebida na Terra pelo Sol é definida uma grandeza denominada
Constante Solar (I0), que é uma densidade de fluxo que mede a energia total da radiação rece-
bida na Terra pelo Sol fora da atmosfera terrestre, por unidade de área, em uma superfície te-
órica perpendicular aos raios solares e à distância média da Terra ao Sol (1 UA). Essa medida
é realizada por satélites em órbita terrestre, e seu valor é de 1.362 W/m2, no máximo solar [2].
A Terra recebe uma quantidade total de radiação determinada por sua seção transversal
(π r ) mas, à medida que a Terra gira, essa energia é distribuída por toda a área da superfície
2

esférica (4 π r2). Portanto, a radiação solar média recebida, levando em consideração o ângulo
no qual os raios solares atingem a Terra, e que a qualquer momento metade do planeta não
recebe radiação solar, é um quarto da constante solar (aproximadamente 340 W/m²). A quan-
tidade que atinge a superfície da Terra (como insolação) é ainda mais reduzida pela atenuação
atmosférica. A qualquer momento, a quantidade de radiação solar recebida em um local na
superfície da Terra depende da estação do ano, do estado da atmosfera, da latitude do local e
da hora do dia.
A Figura 2.1 apresenta um diagrama esquemático do plano da órbita da Terra em torno
do Sol, denominado eclíptica. O eixo de rotação da Terra forma um ângulo de 23,45 graus em
relação à eclíptica, como consequências desse ângulo surgem as estações do ano.
22    Geração de energia elétrica

Figura 2.1 – Órbita da Terra em torno do Sol e a inclinação do eixo de rotação da Terra

Nos equinócios, os raios solares incidem perpendicularmente ao equador terrestre e am-


bos os hemisférios recebem nesses dias exatamente a mesma irradiação solar. No solstício de
verão no Hemisfério Sul, os raios solares incidem perpendicularmente ao trópico de capri-
córnio (23,45 graus de latitude sul), portanto com menor inclinação nesse hemisfério. Nesse
mesmo dia ocorre o solstício de inverno no Hemisfério Norte, quando os raios solares incidem
com maior inclinação nesse hemisfério. Em aproximadamente 6 meses ocorre o solstício de
verão no Hemisfério Norte, e os raios solares incidem perpendicularmente ao trópico de cân-
cer (23,45 graus de latitude norte), portanto com menor inclinação nesse hemisfério. Nesse
mesmo dia ocorre o solstício de inverno no Hemisfério Sul, e os raios solares incidem com
maior inclinação nesse hemisfério.
Essa variação da radiação solar ao longo das estações do ano devido ao maior ou menor
ângulo de incidência da irradiação solar na superfície da Terra, resultam em uma variação
sazonal da energia disponível para a geração de energia solar, que deve ser levada em conta
na avaliação econômica de projetos que utilizam essa fonte de energia renovável. A menor in-
clinação dos raios solares próximos ao equador terrestre, torna essa a região da Terra que mais
recebe irradiação solar, ao longo do ano, como pode ser observado na Figura 2.4, tornando
essa região a mais atrativa para construção de plantas solares.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   23 

A Figura 2.2 apresenta um gráfico com o detalhamento das principais tecnologias hoje
existentes para obtenção de energia através da radiação solar, tanto para uso residencial, quan-
to para uso comercial em centrais solares.

Figura 2.2 – Tecnologia solar fotovoltaica e de aquecimento

Tecnologia fotovoltaica
Nessa tecnologia uma corrente elétrica contínua é gerada de forma direta nos painéis
fotovoltaicos a partir da radiação solar, utilizando o efeito fotovoltaico. Logo após gerada,
essa corrente elétrica contínua (CC) deve ser transformada em uma corrente elétrica alternada
(CA), através de inversores de corrente CC-CA.
O efeito fotovoltaico consiste na criação de tensão elétrica contínua ou de uma corren-
te elétrica contínua correspondente, num material semicondutor, após a sua exposição à luz
solar. Embora o efeito fotovoltaico esteja diretamente relacionado com o efeito fotoelétrico,
ambos são processos distintos. No efeito fotoelétrico, os elétrons são ejetados da superfície
de um material após exposição dele à radiação com energia suficiente. O efeito fotovoltaico
é diferente, pois os elétrons gerados são transferidos entre bandas diferentes (i.e., das bandas
de valência para bandas de condução), dentro do próprio material semicondutor, resultando
no desenvolvimento de tensão elétrica contínua entre dois eletrodos [3]. O efeito fotovoltaico
foi observado pela primeira vez pelo físico francês Antoine Henri Becquerel (1852-1908), em
1839. Ele explicou sua descoberta no Comptes rendus de l’Académie des Sciences, “a pro-
dução de uma corrente elétrica, quando duas placas de platina ou ouro imersas em um ácido,
neutro, ou solução alcalina são expostas de maneira desigual à radiação solar” [4].
24    Geração de energia elétrica

Essa tecnologia, para uso em escala residencial, consiste na instalação de painéis fotovol-
taicos mono ou policristalinos nos telhados, que são acoplados a inversores, com o objetivo
de conectar essa geração à rede de distribuição das cidades. Essa utilização residencial pode
ser considerada o embrião dos smart-grids, considerados uma tendência mundial irreversível.
A utilização de baterias para armazenamento de energia a nível residencial, para redução da
intermitência dessa fonte, ainda é inviável do ponto de vista econômico, no entanto, a revolu-
ção dos carros solares e suas baterias de alta capacidade de armazenamento, prevista para as
próximas décadas, pode se constituir em uma tecnologia disruptiva nesse cenário, podendo
até mesmo afetar significativamente o mercado de distribuição de energia elétrica. Nos países
desenvolvidos, muito tem sido discutido em relação a esse assunto, estando inclusive sendo
estudadas alternativas técnicas para reduzir o impacto nas empresas distribuidoras de energia
elétrica.
Para aplicações em escala comercial existem as centrais fotovoltaicas de concentração.
Nessas centrais, como o próprio nome sugere, existe a concentração da radiação solar através
de uma ótica de reflexão ou mesmo utilização de lentes, previamente a incidência da radiação
solar nos painéis ou células fotovoltaicas. Isso reflete em um melhor aproveitamento da radia-
ção solar devido à concentração, no entanto, não pode haver um grau de concentração muito
elevado, para não haver perda de rendimento, ou até mesmo danos permanentes nos painéis
fotovoltaicos por aquecimento. A tecnologia fotovoltaica de concentração não é muito utiliza-
da em razão do seu elevado custo de implantação e manutenção.
Outra prática muito comum adotada em centrais fotovoltaicas é o agrupamento de painéis
fotovoltaicos em conjuntos, de forma que eles possam “seguir” o caminho aparente do Sol na
eclíptica, mantendo, dessa forma, a incidência da radiação solar perpendicular nos conjuntos
ao longo do dia e, assim, maximizar a geração de energia elétrica. Isso é feito através da utili-
zação de uma estrutura mecânica apropriada que é movida por servomotores controlados por
computador. Existem basicamente dois tipos de acompanhamento (tracking):
Acompanhamento parcial ou acompanhamento de um eixo – acompanhamento do movi-
mento diário e aparente do Sol no sentido leste – oeste. Esse acompanhamento é o mais usado,
pois permite um aumento significativo do rendimento da central, se comparado ao seu custo
de instalação e manutenção; e
Acompanhamento total ou acompanhamento de dois eixos – acompanhamento do movi-
mento diário e aparente do Sol no sentido leste – oeste (tracking parcial), além do acompa-
nhamento do movimento do Sol ao longo das estações do ano no sentido norte (solstício de
junho) → sul (solstício de dezembro) → norte (solstício de junho) (figura 2.1). Para isso, são
necessários dois servomotores, resultando em um custo mais elevado de instalação e manu-
tenção. Nesse tipo de acompanhamento, existe a garantia de que a todo momento a radiação
solar irá incidir de forma perpendicular aos painéis fotovoltaicos, levando a um rendimento
máximo do ponto de vista de posicionamento dos painéis.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   25 

Um dos maiores problemas da tecnologia fotovoltaica é a redução da produtividade dos


painéis fotovoltaicos provocados pelo aumento da temperatura nas células semicondutoras
onde ocorre o efeito fotovoltaico. Esse fato é agravado pelas elevadas temperaturas dos climas
tropicais, e, principalmente, da forma como os painéis são instalados. Para que o efeito da
temperatura seja reduzido, uma boa circulação de ar, principalmente em painéis instalados em
telhados residenciais, é fundamental. Em casos mais severos, esse problema pode provocar
uma redução de até 9% na produção de energia elétrica prevista.
O processo de geração de energia elétrica nas Centrais Geradoras Fotovoltaicas será de-
talhado no Capítulo 2.3.3.

Tecnologias de aquecimento
Nesta tecnologia solar, a radiação pode ser absorvida através de coletores solares, prin-
cipalmente para aquecimento direto da água que será usada para a higiene pessoal, lavar
utensílios etc. Essa forma de utilização da tecnologia de aquecimento é predominantemente
residencial, mas há uma demanda significativa e aplicações em outros setores, como edifícios
públicos e comerciais, hospitais, restaurantes, hotéis e similares. Esse sistema de aproveita-
mento térmico da energia solar, também denominado aquecimento solar ativo, envolve o uso
de um coletor solar discreto [5]. Outra forma de utilização residencial da energia solar é na
preparação de alimentos por meio da utilização de fornos solares, muito utilizados na Região
Nordeste do Brasil.
Do ponto de vista de aplicações comerciais da tecnologia de aquecimento, destacam-se as
Centrais Termosolares de Concentração (Concentrated Solar Power – CSP). Nessas centrais,
a água, um fluido térmico ou outro meio, como sais fundidos, são aquecidos a elevadas tem-
peraturas (da ordem de centenas de graus Celsius), para armazenamento de energia e futura
produção de vapor. A energia elétrica é gerada através de um gerador síncrono convencional
e uma turbina a vapor como máquina primária. Essa se constitui na principal vantagem dessa
tecnologia, se comparada à tecnologia fotovoltaica, pois a geração de energia elétrica é feita
por meio de uma máquina síncrona, contribuindo para o aumento tanto do nível de curto-cir-
cuito, quanto da inércia, além de proporcionar controle de tensão da rede elétrica em que a usi-
na é conectada de forma direta. Devemos ainda ressaltar o fato de que as áreas elétricas do SIN
com maior índice de irradiação solar são aquelas com baixo nível de curto-circuito e inércia.
Na tecnologia de aquecimento (figura 2.3) destacam-se duas arquiteturas básicas de Cen-
trais Termosolares de Concentração (CSP): a de Receptores de Torre Central e de Receptores
de Calhas Cilindro-Parabólicas. As demais arquiteturas são consideradas tecnologias para fins
de pesquisa e ainda não têm aplicação comercial.
26    Geração de energia elétrica

Figura 2.3 – Centrais termosolares de concentração

Conforme mencionado anteriormente, algumas centrais termosolares utilizam o arma-


zenamento térmico para geração de vapor em períodos sem irradiação solar, a fim de manter
contínua a operação de um turbogerador. Esse armazenamento pode ser feito em fluido térmi-
co ou em sais fundidos. Os sais fundidos são compostos por uma mistura de sais de nitratos –
principalmente nitrato de sódio (NaNO3) e nitrato de potássio (KNO3) – em uma proporção de
60-40%, que se funde a uma temperatura de 230°C. Dessa forma, para garantir uma margem
de segurança, admite-se uma temperatura mínima dos sais fundidos de 290°C no processo
de gerenciamento desse meio no parque solar. Uma vez que a temperatura máxima dos sais
fundidos (565°C) é cerca de 1,4 vezes maior que a temperatura máxima do fluido térmico
(400°C), esse fato tem relação direta com a quantidade de calor armazenada nesses dois ma-
teriais (equação 2.2).
O processo de geração de energia elétrica nas Centrais Termosolares de Concentração de
Receptores de Torre Central e de Receptores de Calhas Cilindro-Parabólicas serão detalhados
no Capítulo 2.3.4.

Mapas de Irradiação Solar Horizontal Direta (DNI) da Europa e América do Sul


Os mapas de Irradiação Solar Direta Horizontal (Direct Normal Irradiance – DNI), da
Europa, América do Sul e Caribe são mostrados na Figura 2.4. Nessa Figura é possível obser-
var que o maior índice de irradiação solar na Europa fica em torno de 1.700 kWh/m2 no sul da
Espanha. Na América do Sul, o maior índice de irradiação solar está localizado no Chile, mais
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   27 

precisamente na Região Norte do país no deserto de Atacama, onde são observados valores
superiores a 2.500 kWh/m2.

Figura 2.4 – Mapas de Irradiação Solar Horizontal (DNI) da Europa e América do Sul

No Brasil, os maiores índices de irradiação solar estão no sudoeste do estado da Bahia,


com valores em torno de 2.000 a 2.300 kWh/m2. Os menores índices de irradiação solar no
Brasil se localizam, conforme esperado, na Região Sul devido à latitude, com índices em tor-
no de 1.500 a 1.700 kWh/m2. Dessa forma, podemos concluir que o menor índice de irradia-
ção solar no Brasil equivale ao maior índice de irradiação solar na Europa!
Esse fato representa um grande potencial para a utilização da energia solar, até mesmo em
nível residencial, através do aquecimento de água ou da utilização de painéis fotovoltaicos
para geração de energia elétrica.
Quanto à tecnologia de aquecimento, os elevados índices de irradiação solar do Brasil
proporcionam uma oportunidade ainda maior de utilização dessa tecnologia, se comparado
a sua utilização na Europa. Como essa tecnologia utiliza o aquecimento de um meio (fluído
térmico ou sais fundidos) para armazenamento térmico, e futuro aproveitamento na geração
de vapor para utilização em um turbogerador, quanto mais aquecido o meio, mais quantidade
de calor Q é armazenada, e mais vapor será produzido em uma mesma massa de material. O
calor armazenado pode ser calculado de acordo com a equação (2.2):
28    Geração de energia elétrica

Q = m ∙ c ∙ Δθ (2.2)

Onde:
Q quantidade de calor armazenado no meio (J).
m massa do meio (g).
c calor específico do meio (J/g°C).
Δθ variação de temperatura (°C).

Vantagens e desvantagens da tecnologia de aquecimento (CSP) em relação à tecno-


logia fotovoltaica
Como principais vantagens da tecnologia de aquecimento em relação à tecnologia foto-
voltaica, podemos destacar:
• Possibilidade da conexão da central de geração termosolar com a rede elétrica através
de um gerador síncrono, contribuindo de forma direta no aumento, tanto do nível de
curto-circuito, quanto da inércia, além de participar efetivamente do controle de ten-
são, em regime transitório e permanente, da rede elétrica em que a usina é conectada.
Esse é um ponto muito importante se levarmos em conta que os locais do país (sul
do estado da Bahia), onde são observados os maiores índices de irradiação solar, são
próximos a redes elétricas com baixos níveis de curto-circuito e inércia, tornando a
conexão de centrais solares fotovoltaicas nessas áreas um grande desafio, podendo,
inclusive, demandar reforços na rede elétrica, que seriam supridos diretamente com os
geradores síncronos utilizados na tecnologia de aquecimento.
• Parte do calor gerado na central pode ser armazenado, por exemplo, em tanques de
sais fundidos, propiciando uma operação mais estável da planta, mesmo em períodos
com pouca ou até mesmo sem radiação solar. Esse fato é muito relevante do ponto de
vista do Operador do Sistema, pois a central pode ser programada centralizadamente,
com flexibilidade, durante todo o seu ciclo diário de operação, agregando menor inter-
mitência e confiabilidade à rede elétrica onde ela é conectada.
• Não é necessária a utilização de inversores CC-CA para a conexão da central geradora
à rede elétrica. Esses inversores necessitam de requisitos específicos para o seu cor-
reto funcionamento, como o valor mínimo do nível de curto-circuito da rede elétrica
em que estão conectados. Os inversores também produzem, devido ao chaveamento
de suas válvulas, correntes harmônicas que, por sua vez, podem necessitar de filtros
CA para que sejam atendidos os critérios de desempenho harmônico do sistema. A
utilização desses filtros CA pode levar a dificuldades no controle de tensão da área,
sobretudo em regiões de baixo nível de curto-circuito.
• Não apresenta problemas de sobreaquecimento dos cristais presentes nos painéis foto-
voltaicos, sobretudo em regiões de clima tropical, que provoca decréscimo na energia
gerada, quase sempre durante o período diário de maior radiação solar. Esse problema
é tema de pesquisas na atualidade, sem, contudo, ter sido completamente resolvido.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   29 

Como desvantagem da tecnologia de aquecimento em relação à tecnologia fotovoltaica,


podemos destacar:
• Alto custo dos equipamentos, heliostatos, servomecanismos, torre central, receptor
etc. e de instalação e montagem da planta; e
• As duas tecnologias de centrais termosolares ora analisadas, empregadas em plantas
comerciais, ainda utilizam tecnologias não totalmente desenvolvidas.

Novas tecnologias para produção de energia a partir da energia solar


No Brasil, destaca-se a iniciativa da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf)
em relação à produção de energia elétrica a partir de uma usina fotovoltaica flutuante piloto,
instalada no reservatório da hidroelétrica de Sobradinho (BA). O atual projeto produz 1 MWp
(Mega Watt pico), tem 3.792 módulos de placas solares, área total de 11 mil m² e é fixado ao
fundo do lago por meio de cabos, com material próprio para suportar o peso das placas e dos
trabalhadores que atuam na sua construção e manutenção [6].
Há muitas pesquisas para aproveitamento da energia solar para produção de energia. Na
Alemanha, por exemplo, seu principal centro de pesquisas é o Centro Aeroespacial Alemão
(Deutsches Zentrum für Luft und Raumfahrt – DLR). Existem vários centros na Alemanha
e Espanha que se dedicam às pesquisas no campo de energia solar de armazenamento, tais
como receptores volumétricos de cerâmica, meios de armazenamento de calor, além da pro-
dução direta de combustíveis, entre eles o hidrogênio, a partir de um processo catalítico com
fornecimento de energia advindas da irradiação solar. Esse é um campo muito promissor, pois
permite o armazenamento do combustível de forma eficiente para ser utilizado no futuro.

2.2.1.2 – Energia eólica


A fonte primária da energia eólica é o vento. Podemos definir o vento como o deslocamen-
to de massas de ar na atmosfera terrestre em grande escala, causado por diferenças na pressão
atmosférica. Quando uma região da superfície terrestre aquece, a pressão atmosférica nessa
região diminui, e o ar se eleva. Isso cria uma diferença na pressão atmosférica, fazendo com
que o ar envolvente, mais frio, se desloque da área de maior pressão (anticiclônica) para a área
de menor pressão (ciclônica) [7].

Circulação atmosférica terrestre


Uma vez que a Terra está em rotação, o ar também se desloca pela força de Coriolis, ex-
ceto, exatamente, sobre a linha do equador (figura 2.5). Em termos globais, os dois principais
fatores dos padrões de vento em grande escala (circulação atmosférica) são a diferença de
temperatura entre a linha do equador e os polos (a diferença de absorção de energia solar que
provoca forças de impulsão) e a rotação do planeta. Fora dos trópicos e nas camadas superio-
res da atmosfera, os ventos de grande escala tendem a aproximar-se do equilíbrio geostrófico.
30    Geração de energia elétrica

Perto da superfície terrestre, o atrito faz diminuir a velocidade do vento e faz com que os ven-
tos soprem mais para o interior das áreas de baixa pressão (figura 2.5) [7] [8] [9].

Figura 2.5 – Esquema da circulação atmosférica da Terra

A Figura 2.5 apresenta o esquema da circulação atmosférica terrestre, dividida em três


grandes células em cada hemisfério.

• Células de Hadley: Compreendida entre 0 e 30° de latitude, onde ocorrem os ventos


alísios. Os ventos alísios são predominantes nos trópicos. Esses ventos deslocam-se
nas camadas inferiores da troposfera junto à superfície terrestre [10]. Sopram predo-
minantemente a partir de sudeste no Hemisfério Sul, e de nordeste no Hemisfério Nor-
te, das regiões tropicais em direção ao equador e são mais fortes durante o inverno. Os
ventos alísios são uma composição do efeito convectivo do aquecimento das regiões
mais quentes da Terra próximas ao equador e da força de Coriolis, consequência da
rotação do nosso planeta [7] [11];
• Células de Ferrel: Compreendida entre 30 e 60° de latitude, onde ocorrem os ventos
do oeste. Esses ventos sopram predominantemente a partir de noroeste no Hemisfério
Sul, e de sudoeste no Hemisfério Norte, em direção ao equador. São mais fortes duran-
te o inverno quando a pressão atmosférica dos polos é menor, e mais fracos no verão
quando a temperatura dos polos é maior, e, consequentemente, a pressão atmosférica
é menor [7] [11].
• Células polares: Acima dos 60º de latitude, onde ocorrem os ventos polares de leste.
Esses ventos são frios e secos, advindos da baixa umidade das regiões polares, e têm
origem devido ao menor ângulo de incidência solar, que faz com que surjam áreas de
elevada pressão junto à superfície que força o deslocamento do ar em direção às áreas
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   31 

de baixa pressão das regiões de menor latitude dos ventos de oeste. Os ventos polares
de leste, ao contrário dos ventos de oeste, sopram predominantemente a partir de su-
deste no Hemisfério Sul, e de nordeste no Hemisfério Norte [7] [11].

Características dos ventos no Brasil


As características dos ventos no Brasil estão intimamente relacionadas aos efeitos descri-
tos acima, conforme pode ser observado na Figura 2.6.

Figura 2.6 – Características dos ventos nas regiões Nordeste e Sul do Brasil

Na Região Nordeste, mais próxima do equador, predominam os ventos alísios, que têm
direção predominante de sudeste, e de características constantes ao longo do ano, sofrendo
uma redução no verão, e uma redução mais acentuada no outono, principalmente no litoral do
Nordeste, e que coincide com os períodos chuvosos nessa região. Na Região Sul predominam
os ventos de rajada que são consequência da entrada na região de sistemas meteorológicos
(frentes frias), que têm origem nas células polares, e se deslocam em direção ao equador. De-
vido a este fato, esses ventos podem sofrer variações significativas em poucas horas.
A Figura 2.7 apresenta um mapa com as velocidades de vento observadas nas diversas
regiões do Brasil. É possível observar que as maiores velocidades de vento estão concentradas
no litoral, principalmente no Nordeste e no Sul, com destaque para o litoral dos estados do Rio
Grande do Norte e do Ceará, com ventos atingindo velocidades de até 8,0 m/s (~30 km/h). Ou-
tra região de destaque no mapa é Região Sudoeste e noroeste da Bahia, onde são observados
32    Geração de energia elétrica

os melhores ventos do Brasil, da ordem de 7,0 m/s (~25 km/h), com elevado fator de capaci-
dade, devido, principalmente, ao clima tropical, ausência de chuvas e relevo da região.

Fator de capacidade
A velocidade do vento não é o único dado importante nos estudos de viabilidade econô-
mica de um empreendimento eólico. O Fator de Capacidade também é muito importante. Em
linhas gerais, esse fator mede, ao longo de um determinado período (em geral ao longo do
ano), o percentual de geração de um parque eólico em relação à sua potência total instalada. É
claro que quanto mais constante o vento em uma determinada região ao longo do ano, maior
será o fator de capacidade dos parques eólicos instalados nessa região.

Figura 2.7 – Panorama da energia eólica no Brasil

Na Figura 2.7 é apresentado o gráfico do fator de capacidade das centrais eólicas insta-
ladas no Brasil durante o ano de 2014. É possível observar que o Nordeste tem um fator de
capacidade superior ao Sul, em razão das características dos ventos dessa região, ventos alí-
sios, mais constantes ao longo do ano, que os ventos de rajada, característicos dos sistemas
meteorológicos (frentes frias), predominantes no Sul.
Outro ponto importante em relação ao gráfico do fator de capacidade apresentado nessa
Figura é sua característica de sazonalidade. No Nordeste pode ser observado um sensível au-
mento do fator de capacidade durante o inverno e a primavera, uma redução no verão e uma
redução ainda mais acentuada no outono, que coincide com o período de chuvas nessa região,
fazendo valer o ditado conhecido no Nordeste: “quando chove não venta, quando venta não
chove”. Em relação ao Sul, podemos observar que o fator de capacidade aumenta durante o
inverno, quando é maior a ocorrência de frentes frias, e reduz com a chegada da primavera. As
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   33 

observações em relação ao fator de capacidade dessas regiões estão intimamente relacionadas


às características dos ventos dessas regiões, comentadas anteriormente.
O fator de capacidade médio das centrais eólicas onshore comissionadas no Brasil no ano
de 2018 foi o maior do mundo, com um valor de 46%. A título de comparação, em outros pa-
íses esse número foi de 44% nos Estados Unidos da América, 40% no Reino Unido, 37% na
Austrália, e 29% na China, França e Alemanha [12].

Intermitência e previsão da velocidade do vento


Um grande desafio advindo da energia eólica é sua intermitência e a previsão, com re-
lativa precisão, da velocidade do vento de uma determinada região, valor esse diretamente
relacionado à geração eólica dessa região.
Um aspecto ainda mais complexo na previsão do vento é que a variabilidade na velocida-
de do vento pode provocar a desconexão de grandes blocos de geração em um determinado
momento, em razão das condições meteorológicas extremas, veja:
• No Nordeste podem ser observadas calmarias, típicas dos ventos alísios, que podem
fazer com que a velocidade do vento caia abaixo da velocidade mínima necessária
para a operação dos aerogeradores (velocidade típica de cut-in < 3 m/s, ~11 km/h),
causando a interrupção da geração desses parques.
• No Sul podem ser observados ventos de rajada, típicos de frentes frias, que podem
fazer com que a velocidade do vento atinja valores acima da velocidade máxima de
operação dos aerogeradores (velocidade típica de cut-off > 25 m/s, ~90 km/h), também
causando a interrupção da geração desses parques.

A intermitência e a previsão da velocidade do vento afetam diretamente a operação do


sistema em toda a sua cadeia de processos, do planejamento à programação e operação em
tempo real, trazendo grandes desafios para o Operador do Sistema, a saber:
• necessidade de elevados investimentos no desenvolvimento de modelos matemáticos
e ferramentas computacionais para uma previsão da velocidade do vento (geração eó-
lica), para o dia a dia (Programação D – 1), com certo grau de precisão. Essa previsão
não é uma tarefa simples, pois está intimamente relacionada às condições meteoroló-
gicas de uma determinada região;
• decisões de operação em tempo real: se houver um valor otimista da previsão do vento
há que se lançar mão de geração de outras fontes de energia, de forma a manter o equi-
líbrio entre a carga e a geração em um determinado momento da operação. Obviamen-
te, isso tem um impacto no custo da operação, pois é necessário utilizar uma geração
que não havia sido programada originalmente; e
34    Geração de energia elétrica

• reavaliação da metodologia e critérios para a definição da reserva de potência ope-


rativa, ou reserva girante, a ser alocada em fontes convencionais de geração, como
hidroelétrica e termoelétrica.

Cabe ressaltar que no SIN os aerogeradores não contribuem para a reserva girante. A cada
instante os aerogeradores geram toda a potência disponível para a velocidade de vento obser-
vada no parque eólico.

Nível de curto-circuito (Short Circuit Capacity – SCC)


Devido ao fato dos aerogeradores e inversores se basearem em eletrônica de potência, eles
necessitam de requisitos específicos da rede em seu ponto de conexão. Um desses requisitos
é dado pelo nível de curto-circuito (Short Circuit Capacity – SCC). O nível de curto-circuito
é uma grandeza que representa quanto um determinado ponto de uma rede elétrica é forte em
relação a afundamentos de tensão no momento, por exemplo, de um curto-circuito. O nível de
curto-circuito de uma barra é calculado pela relação entre o quadrado da tensão na barra, sobre
a impedância equivalente do sistema, vista dessa barra.

$
V!"##"
Scc!"##" = (2.3)
Zeq !"##"

Onde:
Sccbarra nível de curto-circuito da barra (MVA)
Vbarra tensão da barra (kV)
Zeqbarra impedância equivalente de Thévenin vista da barra (Ω)

As áreas do sistema identificadas com baixo nível de curto-circuito podem exigir moni-
toramento ou estudos adicionais, pois indicam condições de baixa resistência do sistema que
podem agravar perturbações e distúrbios do sistema e potencialmente impactar nos ajustes e
coordenação dos relés de proteção.
O Essential Reliability Service Working Group (ERSWG) e o North American Electric
Reliability Corporation (NERC) concluíram que a migração dos recursos de geração de fontes
convencionais baseadas em geradores síncronos, para fontes alternativas baseadas em eletrô-
nica de potência, tem um impacto profundo na confiabilidade da transmissão e exigirá con-
siderações de política energética, planejamento do sistema e operação do sistema à medida
que o percentual de utilização dessas fontes, comparado as convencionais aumenta. Algu-
mas preocupações específicas são: estabilidade e controle de tensão, controle de frequência
e a estabilidade do sistema (ou seja, atraso na recuperação da tensão devido a falhas, além
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   35 

do comprometimento da estabilidade de tensão) [13]. Portanto, esses pontos de preocupação


devem ser levados em conta também aqui no Brasil para a expansão da inserção das fontes
alternativas de forma segura em nossa matriz energética.

Relação de curto-circuito (Short Circuit Ratio – SCR)


Como as fontes alternativas, baseadas em inversores, substituem gradativamente os gera-
dores síncronos, será atingido um ponto da expansão dessas fontes, onde a rede elétrica não
será mais forte o suficiente para suportar a operação estável dos conversores eletrônicos de
potência utilizados pelos aerogeradores e inversores das centrais fotovoltaicas. A relação de
curto-circuito (Short Circuit Ratio – SCR) é um índice utilizado para identificar redes fracas
nas proximidades da instalação de conversores eletrônicos. Esse índice teve origem na iden-
tificação de condições de rede fracas perto de conversores de corrente contínua de alta tensão
(High-Voltage Direct Current – HVDC), e está sendo aplicado em plantas não síncronas [13].
A relação de curto-circuito é a razão entre o nível de curto-circuito (Short Circuit Capacity
– SCC) e potência ativa sendo transmitida pelo conversor em MW:

Scc!"##"
SCR !"##" = (2.4)
Pdc$%&'(#)%#

Onde:
SCRbarra relação de curto-circuito da barra
Sccbarra nível de curto-circuito da barra (MVA)
Pdcconversor potência ativa sendo transmitida pelo conversor (MW)

Um valor baixo da relação de curto-circuito é uma preocupação significativa, pois os


controles internos da planta não funcionarão de maneira estável (ou seja, a representação de
sequência positiva da estabilidade da planta pode não representar o verdadeiro comportamen-
to da planta), aumentando a chance de interações subsíncronas e de controle entre disposi-
tivos próximos que empregam eletrônica de potência. Nesse caso, quando as plantas estão
eletricamente próximas umas das outras, elas podem interagir umas com as outras através de
oscilações de alta frequência [13].
Ainda existem outros índices para análise da conexão de conversores em redes elétricas,
tais como a relação de curto-circuito efetiva (Effective Short Circuit Ratio – ESCR), que tam-
bém leva em conta a influência adversa da impedância dos filtros na relação de curto-circuito,
subtraindo o valor dos filtros em Mvar do nível de curto-circuito em MVA da barra. Os con-
troles dos conversores têm importância fundamental no fenômeno de interação das redes CA/
CC, e devem ser levados em conta na definição da robustez do sistema CA. Os sistemas CA
são classificados historicamente da seguinte forma [14]:
36    Geração de energia elétrica

• Forte, se o ESCR for maior que 5;


• Moderado, se o ESCR estiver entre 3 e 5; e
• Fraco, se o ESCR for menor que 3.

Com refinamentos nos controles CA e CC essas classificações mudaram. Ou seja, a evo-


lução dos controles das redes CA e CC permitem, atualmente, uma operação de elos CC com
ESCR menores que aqueles mencionados acima. A referência [15], citada por [14], recomen-
da a seguinte classificação levando-se em conta esse fator:
• Forte, se o ESCR for maior que 3;
• Fraco, se o ESCR estiver entre 2 e 3; e
• Muito fraco, se o ESCR for menor que 2.

Muito se tem discutido em relação a esses índices e sua aplicabilidade em redes elétricas
fracas com alto grau de penetração de fontes renováveis [13].

Reserva de Potência Operativa


Por definição, o termo Reserva de Potência Operativa se refere à provisão de reserva de
potência ativa efetuada pelas unidades geradoras para realizar o controle de frequência [16]. A
reserva de potência pode ser classificada, de acordo com sua finalidade em quatro tipos:
• Reserva de potência para controle primário ou R1: provisão de reserva de po-
tência ativa efetuada pelas unidades geradoras para realizar o controle primário de
frequência.
• Reserva de potência para controle secundário ou R2: provisão de reserva de potên-
cia ativa efetuada pelas unidades geradoras participantes do Controle Automático de
geração (CAG), para realizar o controle secundário de frequência e/ou de intercâmbios
líquidos programados de potência ativa entre áreas de controle.
• Reserva girante: diferença entre a potência total efetiva das unidades geradoras que
já se encontram sincronizadas no sistema e a demanda total do sistema, num dado
momento.
• Reserva de prontidão: disponibilidade de unidades geradoras para recompor as re-
servas de potência para controles primário e secundário, em caso de indisponibilidade
ou de redeclaração de geração, se atingido o limite de provisão de reserva de potência
ativa do sistema.

Em relação à reserva de potência operativa mencionada anteriormente, cabe lembrar que


ela sofre influência da intermitência, e dos erros na previsão do vento em uma determinada
região, tratados no item anterior. No caso do SIN, o cálculo da reserva de potência operativa
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   37 

sofreu modificações para levar em conta esses aspectos da geração eólica e, consequentemen-
te, dessa geração em uma região, através da inclusão de parcelas relacionadas a essas incer-
tezas. Essas modificações estão detalhadas no submódulo 23.3 dos Procedimentos de Rede
do ONS, item 15 – Diretrizes e Critérios para Estudos de Reserva de Potência Operativa e de
Controle Carga-Frequência [17].
No Sistema Interligado Brasileiro, a programação do despacho das usinas é feita a cada
30 minutos. Para enfrentar a intermitência da geração eólica nesse intervalo, foi introduzida
uma parcela adicional no cálculo da reserva de potência operativa do SIN, denominada Reol.
O dimensionamento da parcela Reol foi realizada por meio de uma extensa pesquisa estatística
do comportamento da geração eólica nas regiões Nordeste e Sul. Os resultados levaram aos
seguintes percentuais para essas parcelas:
• Reol Nordeste = 6% da geração eólica prevista; e
• Reol Sul = 15% da geração eólica prevista.

A parcela Reol deve ser adicionada à reserva de potência para controle secundário (R2)
alocada nas unidades geradoras que participam do Controle Automático de Geração (CAG),
das Áreas de Controle Nordeste e Sul.
Para enfrentar os desvios da geração eólica verificada de seus valores previstos, uma par-
cela adicional da reserva operacional foi introduzida (denominada Deol). Essa parcela é dimen-
sionada como 20% da geração eólica prevista, e é constituído de reserva de prontidão (não
girante) que deve ser sincronizada caso ocorra um desvio.
Cabe ressaltar que, dada a potência dos aerogeradores e suas taxas de falha, após um es-
tudo estatístico detalhado, foi verificado que não há necessidade de modificação no cálculo da
reserva de potência para controle primário (R1) do SIN, devido à geração eólica.

Energia eólica e sua complementariedade em relação à energia hidráulica


Sob o ponto de vista energético, uma vez que a sua produção anualizada é bastante previ-
sível, a energia eólica traz grandes benefícios para o SIN. O principal benefício, visualizado
na Figura 2.8, está relacionado ao fato de que existe uma perfeita complementariedade do
comportamento sazonal da geração eólica no Nordeste, com o regime hidrológico das bacias
hidrográficas, com consequente reflexo na Energia Natural Afluente (ENA) dessa região.
O aumento expressivo da geração eólica no Nordeste vem fazendo com que essa região
seja exportadora de energia para as demais áreas do SIN, apesar do período seco, dada a evo-
lução significativa da geração eólica na matriz energética, com crescimento acentuado a partir
de 2013. As projeções para o futuro são de manutenção do crescimento. Com isso tem sido
possível gerenciar melhor os reservatórios do SIN durante o período seco.
38    Geração de energia elétrica

Figura 2.8 – Complementariedade sazonal da energia natural afluente (ENA) e geração eólica

O principal aspecto adverso da utilização em larga escala de geração eólica, assim como
da geração fotovoltaica, é que essas formas de geração, apesar de serem energias renováveis,
requerem outras fontes de geração convencionais, como os geradores síncronos das usinas
hidroelétricas de forma a prover o desempenho dinâmico adequado ao SIN, quando da ocor-
rência de distúrbios.

Energia eólica onshore e offshore no Brasil


O Atlas do Potencial Eólico Brasileiro [18] estima que o potencial eólico brasileiro onsho-
re é de 143 GW, considerando torres de 50 metros de altura e aerogeradores com tecnologia
que remontam à época de sua edição (2001). Números atuais, segundo a Associação Brasileira
de Energia Eólica (ABEEólica) [19], indicam que esse valor é da ordem de 500 GW, conside-
rando torres de 150 metros e turbinas com novas tecnologias, com potência da ordem de 2 a
3 MW. Esse valor pode aumentar ainda mais, se consideramos a tendência dos fabricantes em
aumentarem a potência dos aerogeradores para valores da ordem de 5 MW e a incorporação de
novas áreas de exploração da energia eólica, que se tornaram economicamente viáveis, como
consequência do aumento da altura das torres [19] [20].
Apesar de ser uma fonte de energia renovável, há muitas discussões, principalmente em
fóruns internacionais, sobre o impacto na paisagem decorrente da instalação de aerogerado-
res em solo continental. Na Europa, o uso múltiplo do solo pode provocar restrições, ou até
mesmo delimitar, a instalação de novos parques eólicos. Estima-se que o Brasil dispõe de um
significativo potencial eólico offshore em sua Zona Econômica Exclusiva de cerca de 1,78
TW. Entretanto, um dos fatores que limita o desenvolvimento da energia eólica offshore no
Brasil é a inexistência de um marco regulatório [21].
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   39 

Acrescenta-se a isso uma tendência dos fabricantes em produzir e comercializar aeroge-


radores com potência nominal cada vez maior. Existem indicações do mercado mundial de
comercialização de turbinas com potência unitária superiores a 10 MW [22]. Evidentemente,
esses equipamentos necessitam de pás cada vez mais longas, de forma a aumentar a área de
varredura, causando um impacto cada vez maior na paisagem.
O detalhamento das características técnicas dos equipamentos necessários e da conexão
com a rede de transmissão de uma central eólica offshore são apresentados no Capítulo 2.3.2.

Desafios da utilização da energia eólica e energia solar – presente e futuro


Apesar do Brasil pertencer ao ranking dos países com maior quantidade de recursos natu-
rais necessários para a geração de energia eólica e solar, a utilização dessas fontes de energia,
dadas as características dos equipamentos utilizados, pode trazer dificuldades para a operação
dos sistemas, tanto em regime permanente, quanto no momento da ocorrência distúrbios. No
Brasil esse problema é agravado e exige soluções específicas, pelos seguintes motivos:
• As regiões do Brasil onde há incidência dos melhores ventos estão localizados nas
regiões Nordeste e Sul. No caso dos maiores índices de irradiação solar horizontal
(DNI), os sites estão localizados na região Nordeste.
• Estas regiões são caracterizadas pelo baixo nível de curto-circuito e inércia reduzida,
muitas vezes necessitando de reforços na rede para o correto desempenho dos aeroge-
radores ou inversores, no caso das centrais fotovoltaicas.
• A intermitência das fontes renováveis, devido ao seu alto grau de penetração, também
provoca variações dos fluxos de potência maiores no sistema de transmissão. Dessa
forma, ele deve ser planejado de forma a atender esse novo paradigma, dispondo de
equipamentos adequados para controle de tensão, para todos os cenários de geração
dessas centrais.
• Geradores eólicos ou inversores das centrais fotovoltaicas devem ser capazes de par-
ticipar do controle de tensão em redes fracas (baixo nível de curto-circuito), de forma
eficiente, mesmo quando produzem pouca ou nenhuma potência ativa (wind-free e
sun-free).
• A rede elétrica deve estar preparada para lidar com uma quantidade maior de perda de
geração, por exemplo, quando o vento em uma determinada área reduz de forma muito
rápida, ou até mesmo a geração eólica é interrompida devido ao valor da velocidade do
vento estar abaixo ou acima das velocidades de cut-in e cut-off, respectivamente. Essa
redução também é observada quando da passagem de uma nuvem sobre uma central
solar fotovoltaica.
• Os Procedimentos de Rede devem refletir e evoluir concomitantemente com as no-
vas tecnologias disponíveis nos equipamentos de geração. Requisitos como inércia
sintética para controle de frequência, bem como wind-free e sun-free para controle de
40    Geração de energia elétrica

tensão, devem ser disponibilizados de forma a prover recursos que permitam maior
contribuição desses equipamentos no desempenho do SIN [17].

Até o presente momento, as medidas necessárias em termos de requisitos técnicos, que


permitam a conexão segura de fontes alternativas eólica e solares fotovoltaicas, no grau atu-
al de penetração dessas fontes, foram tomadas pelo Operador com os Agentes de geração e
entidades do setor. Melhorias como a manutenção do submódulo 3.6 dos Procedimentos de
Rede do ONS, par e passo com as novas tecnologias disponíveis nos equipamentos, melhorias
nos modelos matemáticos de previsão de ventos e de irradiação solar, leilões, levando-se em
consideração a capacidade de conexão em uma subestação do sistema, são exemplos de tais
medidas.
De forma que o Brasil possa dar o próximo passo no sentido de aumentar o grau de pe-
netração das fontes renováveis de energia, principalmente das centrais solares fotovoltaicas
nos próximos anos, medidas adicionais devem ser tomadas, a exemplo do que foi realizado no
passado para que o nível atual pudesse ser atingido.
O planejamento do setor elétrico deve considerar as características diferenciadas das fon-
tes renováveis, avaliando os reforços na rede elétrica que permitam a conexão segura dessas
fontes, sem que o desempenho do SIN, tanto em regime permanente, quanto durante contin-
gências (análises de estabilidade eletromecânica), seja comprometido. Caso seja necessário,
reforços no sistema para conexão dessas fontes, eles devem ser incluídos em leilões, permi-
tindo que elas possam concorrer, de forma mais justa, com as fontes convencionais de geração
que, muitas vezes, já agregam recursos que exigiriam reforços no sistema para conexão das
fontes renováveis.

2.2.1.3 – Energia hidroelétrica


A fonte primária de energia em uma usina hidroelétrica é a energia potencial da água,
armazenada em um reservatório.
Os rios e reservatórios de uma determinada bacia hidrográfica recebem água das chuvas,
derretimento de gelo e neve. Esse processo, representado na Figura 2.9, é denominado Ciclo
da Água. O motor principal desse ciclo, como toda forma de energia renovável, é a irradiação
solar.
O Ciclo da Água pode ser descrito, em linhas gerais, da seguinte forma: o Sol aquece os
oceanos e espelhos-d’água da superfície terrestre, transformando a água em estado líquido
para o estado gasoso, através da evaporação. Esse vapor de água, menos denso que o ar, sobe
na atmosfera formando as nuvens que, por sua vez, são deslocadas pelos ventos, que também
são consequência do aquecimento das massas de ar pela irradiação solar (ver item 2.2.1.2).
Quando as gotas de água presentes nas nuvens atingem uma região com baixas temperaturas,
o vapor de água condensa, transformando a água em estado líquido, provocando a precipitação
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   41 

das gotas de água na forma de chuva, neve ou gelo, que irão formar os rios e lagos, fechando
o Ciclo da Água.

Figura 2.9 – Ciclo da Água ou ciclo hidrológico

A energia potencial da água é transformada em energia mecânica quando esta entra no


conduto forçado, passa pelo distribuidor e movimenta as pás das turbinas que, por sua vez,
estão conectadas por meio de um eixo a um gerador síncrono, responsável pela transformação
da energia mecânica em energia elétrica.

2.2.2 – Fontes não renováveis de energia


As fontes não renováveis de energia se caracterizam pelo fato de que, uma vez que suas
matérias-primas são utilizadas no processo de obtenção de energia, elas não podem ser recu-
peradas, como o carvão, petróleo, gás natural, urânio etc. A produção de energia através de
fontes não renováveis está, em geral, associada a um processo que produz poluição ou resídu-
os tóxicos, como a queima dos combustíveis fósseis produzindo os gases do efeito estufa, ou
resíduos radiativos, que é o caso do urânio utilizado nos reatores de fissão nuclear.
É interessante destacar que em algum momento dos 4,5 bilhões de anos de história da
Terra, os combustíveis fósseis armazenados no subsolo foram formados a partir de matéria
orgânica que, na base da cadeia alimentar, utilizou a luz solar para realizar a fotossíntese, mas
isso é outra história...
42    Geração de energia elétrica

Assim como na energia hidroelétrica, em que um gerador síncrono, impulsionado pela


água, transforma a energia potencial da água em energia elétrica, nas usinas termoelétricas
uma fonte de calor aquece uma caldeira com água, gerando vapor de água em alta pressão, e o
vapor move as pás da turbina que aciona o gerador síncrono através de um eixo. Finalmente,
o vapor é condensado, transferindo o resíduo de sua energia térmica para um circuito inde-
pendente de refrigeração, devolvendo a água para a caldeira, completando o ciclo. Esse ciclo
térmico é denominado Ciclo Rankine e predomina nos processos de geração de calor através
do carvão, petróleo, geotérmica, incineração de resíduos, etc.
Outra forma de geração de energia elétrica em uma central termoelétrica é através da quei-
ma do gás natural. Esse ciclo térmico é denominado Ciclo Brayton. Nessas centrais, a queima
do gás natural é utilizada na produção de energia elétrica e o calor residual da turbina a gás,
na forma de gás quente de exaustão, pode ser aproveitado para gerar vapor em um Caldeira de
Recuperação de Calor e Geração de Vapor (Heat Recovery Steam Generator – HRSG) para
produzir eletricidade em um gerador síncrono acionado por uma turbina operando em Ciclo
Rankine. Uma usina que utiliza a Caldeira de Recuperação é denominada Central Termoelé-
trica de Ciclo Combinado e aumenta a eficiência geral da planta termoelétrica.

2.3 – Tipos de usinas para geração de energia elétrica

Neste item são descritos os principais tipos de usinas do SIN para a produção de energia
elétrica, que utilizam as fontes primárias de energia descritas no item anterior. Será dado enfo-
que detalhado nos equipamentos dessas usinas e do impacto da conexão desses equipamentos
no SIN. Nesse sentido, será apresentada uma forma inédita em nosso país de geração de ener-
gia elétrica a partir da radiação solar – as centrais termosolares de concentração. A principal
característica desse tipo de usina é que a produção de energia elétrica é feita por gerador sín-
crono, apesar da utilização de uma forma renovável de energia.

2.3.1 – Usinas hidroelétricas

A capacidade instalada de geração do SIN é composta, principalmente, por usinas hidro-


elétricas distribuídas nas diferentes regiões do país. Uma usina hidroelétrica é composta de
estruturas, tais como: barragem, reservatório, vertedouro, tomada-d’água, canais de adução e
restituição, conduto forçado/túnel, casa de força, chaminé de equilíbrio, eclusas, sistema de
transposição de peixes, trecho de vazão reduzida e subestação elevadora.
Para ocorrer a transformação da energia potencial da água armazenada no reservatório em
energia elétrica, é necessário primeiramente transformar essa energia potencial em energia
mecânica. Essa transformação é realizada pelas turbinas hidráulicas. As turbinas são conec-
tadas mecanicamente através de eixos aos geradores síncronos, que irão, por sua vez, gerar a
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   43 

energia elétrica que será injetada no sistema elétrico. A Figura 2.10 ilustra uma usina hidro-
elétrica e seus principais componentes.

Figura 2.10 – Componentes principais de uma usina hidroelétrica

Reservatório de armazenamento

Para que haja energia potencial na água armazenada é necessário existir uma altura de
queda suficiente para movimentar as turbinas, de forma natural ou imposta nos cursos dos
rios através de barragens. Por meio da construção de uma barragem ocorre o represamento
do curso da água e a formação do reservatório. Alguns reservatórios são denominados "a fio
d'água" pois não dispõe de alta capacidade de armazenamento e são capazes de promover uma
regularização de vazões a jusante da barragem apenas em níveis diário ou semanal.
Reservatórios de regularização dispõe de alta capacidade de armazenamento e promovem
uma regularização de vazões a jusante, no mínimo em nível mensal. De forma geral, os reser-
vatórios de regularização acumulam água em períodos chuvosos e as liberam para compensar
afluências baixas em períodos de estiagem.
É denominado volume morto, o volume de água abaixo do nível mínimo operacional que
restringe a entrada de ar nas turbinas, e, consequentemente, problemas mecânicos nelas. Em
geral, esse volume não deve ser utilizado para geração de energia. O volume útil pode ser ca-
racterizado como a diferença entre os volumes máximo e mínimo operativos. Quanto menor
o volume morto, embora maior seja o volume útil, mais escavado deve ser o local da casa de
força. Dessa formao dimensionamento do reservatório deve atender questões técnicas, econô-
micas e ambientais.
O nível da água de montante do reservatório é uma função não linear de seu volume total
armazenado, resultante das características de relevo do vale no qual o barramento foi cons-
truído e o reservatório foi formado. O nível d'água do canal de fuga também é uma função
44    Geração de energia elétrica

não linear dependente das características da calha do rio a jusante da barragem, representada,
nos modelos hidroenergéticos, por polinômios de quarta ordem. Dependem, ainda, das vazões
defluentes da usina e, eventualmente, dos níveis de montante do reservatório da usina ime-
diatamente a jusante. A Figura 2.11 ilustra o perfil de uma usina hidroelétrica apresentando a
altura de queda bruta e outros componentes básicos.

Figura 2.11 – Altura de queda bruta e outros componentes básicos de uma usina hidroelétrica

Em algumas configurações de cascata, o nível da água do canal de fuga de uma usina hi-
droelétrica pode sofrer influência do nível d'água de montante do reservatório de uma usina a
jusante. Essa influência é chamada de efeito de remanso. A Figura 2.12 a seguir ilustra o efeito
de remanso.

Figura 2.12 – Efeito de remanso

O armazenamento de um reservatório depende da topografia do vale no qual está implan-


tado, do armazenamento da água pelo solo da margem em razão de sua permeabilidade, do
transporte de sedimentos por suspensão e arraste, e das perdas por infiltração e evaporação no
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   45 

espelho-d’água. A regularização de vazões pode ser horária, diária, semanal, mensal, anual
ou plurianual. O grau de regularização depende da topografia e da disponibilidade hídrica do
local.
Quando se realiza um projeto para formação de um reservatório, a altura de seu barra-
mento é estabelecida a partir da predefinição da cota do nível da água máximo normal ou do
volume a ser armazenado. Dessa forma, nos estudos de Projeto são elaboradas relações de
cota versus área e cota versus volume.
A partir dos levantamentos topobatimétricos na escala adequada, para cada cota de inte-
resse a área de sua curva de nível é mensurada, sendo elaborada uma curva cota versus área
através desses pares de pontos. Através da integração da curva cota versus área é obtida a
curva cota versus volume ao determinar o volume a cada duas curvas de nível consecutivas. A
Figura 2.13 ilustra essas curvas.

Figura 2.13 – Curvas cota × área e cota × volume de um reservatório

Circuito hidráulico
Quando a água passa pelo circuito hidráulico, desde a adução no reservatório até a saída
do tubo de sucção, ela perde energia em acidentes localizados e por atrito contra as estruturas
46    Geração de energia elétrica

do circuito em razão do material utilizado. A queda disponível para geração de energia pela
turbina (queda líquida) é obtida pela diferença entre a queda bruta e o total das perdas de ener-
gia ao longo do circuito hidráulico.
A perda de energia associada a uma unidade geradora pode ainda depender da vazão
turbinada em outras unidades, caso essas unidades tenham uma parte do circuito em comum,
como ocorre em arranjos que envolvem adução em túnel, por onde passa a totalidade da va-
zão turbinada na usina, antes que o fluxo seja distribuído entre as diversas turbinas, através de
bifurcações, repartidores ou derivações sucessivas.
As perdas no interior da turbina referentes ao caracol, rotor e ao tubo são consideradas de
forma indireta no rendimento da turbina. O rendimento de uma turbina hidráulica é uma fun-
ção não linear entre a queda líquida e a vazão turbinada, expresso por curvas de desempenho,
denominadas curvas-colina. A Figura 2.14 ilustra uma curva-colina típica.

Figura 2.14 – Curva-colina de uma usina hidroelétrica

Turbina hidráulica
A tomada d'água, uma estrutura hidráulica responsável pela captação e condução da água
aos componentes adutores, se localiza, em geral, no corpo da barragem. Na entrada da tomada
d'água, um sistema de gradeamento impede a passagem de materiais indesejáveis.
A água captada na tomada é conduzida por um canal de adução e/ou sob pressão por tubu-
lações forçadas até a casa de força, onde estão instaladas as turbinas e os geradores. A turbina
é formada por um rotor ligado a um eixo. A força da água sobre as pás do rotor da turbina
produz um movimento giratório no eixo da turbina, transformando a energia hidráulica em um
trabalho mecânico que, por sua vez, aciona o gerador. O gerador, um equipamento composto
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   47 

por um eletroímã e por um fio bobinado, produz um campo eletromagnético em seu interior
gerando uma corrente elétrica.
Em usinas hidroelétricas, dentre os diversos tipos existentes de turbinas hidráulicas no
mercado, usualmente são instaladas turbinas de ação do tipo Pelton, ou turbinas de reação do
tipo Francis ou Kaplan. As turbinas podem ser classificadas em dois grupos: turbinas de ação
ou de reação. O critério utilizado nessa classificação leva em conta a variação de pressão es-
tática. Nas turbinas de ação, a pressão estática permanece constante entre a entrada e saída do
rotor. Nesse caso, a energia potencial hidráulica disponível é transformada em energia cinética
que ao atingir as pás do rotor transforma-se em energia mecânica. Já nas turbinas de reação o
rotor fica completamente submerso. Nesse caso, com o engolimento da água ocorre a redução
da pressão estática ao atravessar o rotor gerando uma velocidade entre a entrada e a saída.
A indicação do tipo de turbina hidráulica a ser instalada na usina leva em consideração a
altura de queda, a vazão e a potência. Porém, também devem ser ponderados fatores, como o
custo do gerador, o custo da obra de construção da casa de força, a flexibilidade de operação
hidráulica, a facilidade de manutenção, e outros. A Figura 2.15 ilustra os tipos mais usuais de
turbina citados anteriormente.

Figura 2.15 – Tipos de turbinas hidráulicas

Produção de energia elétrica


A quantificação da geração de energia hidráulica de uma unidade geradora é feita a partir
de uma função de produção hidráulica que corresponde ao produto da sua vazão turbinada
(Qtur) e sua produtividade (ro), dada pela expressão (2.5):

gh V, q !"#$ , Q !"#$ , Q %&#! = ρ V, Q !"#$ , Q %&#! × q !"#$        (2.5)


48    Geração de energia elétrica

Onde:
gh é a geração de energia hidráulica de uma unidade (MWmédio)
ρ é a produtividade de uma unidade (MW/m³/s)
V é o volume de água armazenada na usina (m³)
qturb é a vazão turbinada da unidade geradora (m³/s)
Qturb é a vazão turbinada total da usina (m³/s)
Qvert é a vazão vertida da usina (m³/s)

Observe que a produtividade da unidade gerada é função, além de variáveis relacionada à


unidade geradora, de variáveis associadas à usina como um todo. A produtividade da unidade
gerada pode ser calculada de acordo com (2.6), como o produto entre a altura de queda líquida
e a sua produtibilidade específica, dada por (2.7).

(2.6)
ρ V, Q !"#$ , Q %&#! = H'í) V, Q !"#$ , Q %&#! ×ρ&*+
(2.7)
ρ!"# = η$ ×η% ×g×ρá'() ×10*+

Onde:
Hlíq é a altura de queda líquida (m)
ρesp é a produtibilidade específica da usina (MW/ m³/s / m)
ηT é o rendimento da turbina (%)
ηG é o rendimento do gerador (%)
g é a aceleração da gravidade (m/s²)
ρágua é a massa específica da água (kgf/m³)

A altura de queda líquida é dada pela diferença entre o nível de montante, que é uma fun-
ção não linear do volume armazenado, e o nível de jusante, que é uma função não linear da
vazão total turbinada, podendo haver ainda influência da vazão vertida. No cálculo da queda
líquida é abatida, ainda, as perdas de carga hidráulica do circuito de geração.
(2.8)
H!í# = NA$%&' V − NA()* Q ')+, + Q -.+'

Onde:
NAmont é a cota do nível d’água de montante ou apenas nível de montante (m)
NAjus é a cota do nível da água de jusante do canal de fuga ou apenas nível de jusante (m)
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   49 

As cotas dos níveis de montante e jusante são obtidas através das curvas cota-volume e va-
zão-cota de jusante, que normalmente são expressas por polinômios de grau quatro de acordo
com as equações (2.9) e (2.10), respectivamente.

NA!"#$ V = PCV V = A% + A& V + A' V ' + A( V ( + A) V ) (2.9)

NA!"# Q $"%& + Q '(%$ = PVJ Q $"%& + Q '(%$ = (2.10)


= B) + B* Q $"%& + Q '(%$ + B+ Q $"%& + Q '(%$ +

+ B, Q $"%& + Q '(%$ , + B- Q $"%& + Q '(%$ -

Onde:
PCV(V) é polinômio cota-volume, em razão do volume armazenado na usina.
PVJ(Qturb+Qvert ) é o polinômio vazão-cota de jusante, em razão da vazão turbinada ou da
vazão defluente, dependendo do arranjo da usina.

No cálculo da altura de queda líquida ainda é necessário descontar as perdas de carga hi-
dráulica do circuito de geração, conforme a expressão (2.11):

(2.11)
H!í# = NA$%&' V − NA()* Q ')+, + Q -.+' − perdas

Portanto, a função de produção de uma unidade geradora é dada pela expressão (2.12):
(2.12)
gh V, q !"#$ , Q !"#$ , Q %&#!
= ρ&'( × NA)*+! V − NA,"' Q !"#$ + Q %&#! − perdas
× q !"#$

A expressão (2.12) mostra a interdependência existente entre as unidades geradoras, vis-


to que o engolimento total da usina influencia na geração individual das unidades tanto pela
elevação do nível do canal de fuga quanto pela diminuição do nível da água do reservatório.
Para se determinar a geração total da usina (gh) é utilizada uma função não linear que
considera o somatório das gerações das n unidades geradoras (gh), sendo denominada função
de produção hidroelétrica exata (FPH), dada por (2.13):
( (2.13)
GH V, Q !"#$ , Q %&#! = ( gh V, q'!"#$ , Q !"#$ , Q %&#!
')*
50    Geração de energia elétrica

A Figura 2.16 ilustra uma função de produção hidroelétrica para geração total de uma
usina.

Figura 2.16 – Função de produção hidroelétrica para geração total de uma usina (Fonte: Cepel)

2.3.2 – Centrais geradoras eólicas


As centrais geradoras eólicas ou usinas eólicas utilizam como fonte primária a energia
cinética do vento. O componente principal de uma central eólica é o aerogerador. Os aeroge-
radores são conectados, na maioria das vezes, através de cabos subterrâneos formando ramais
que, por fim, se conectam a um barramento de baixa tensão. O barramento de baixa tensão
é ligado a um transformador elevador que interligará a central eólica à rede de transmissão.
Essa interligação também é denominada Ponto de Conexão ou Ponto de Acoplamento Comum
da central eólica, sendo importante para a avaliação de vários requisitos de desempenho em
regime permanente e dinâmico.
De forma a modelar os aerogeradores (e inversores de centrais fotovoltaicas), de forma
precisa, eles devem ser agrupados e identificados de acordo com o seu tipo. Aerogeradores
comerciais podem ser divididos em cinco grandes grupos de acordo com a International Elec-
trotechnical Commission – IEC 61400-27 [23], com base no tipo de máquina, capacidade de
controle de velocidade (frequência) e características operacionais. A Figura 2.17 apresenta
uma classificação dos tipos de aerogeradores disponíveis atualmente, de acordo com essas
características.
Cabe aqui destacar que alguns tipos, tecnologicamente obsoletos, não permitem mais o
atendimento integral do submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede do ONS, Item 8 – Requi-
sitos Técnicos Mínimos Para Conexão de Centrais Geradoras Eólicas e Fotovoltaicas [17]. A
evolução dos requisitos técnicos dos aerogeradores nos Procedimentos de Rede, par e passo
com a evolução de novas tecnologias disponíveis, é uma tendência mundial, uma vez que os
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   51 

tipos mais antigos contribuem pouco, ou até mesmo não contribuem, com aspectos como con-
trole de tensão e desempenho dinâmico da rede. Esse fato também se justifica dado a crescente
evolução, a nível mundial, da penetração da geração eólica.

Tipo Descrição
Gerador de Indução de Rotor de Gaiola
Tipo 1
Squirrel-Cage Induction Generator (SCIG)
Gerador de Indução de Rotor Bobinado com resistor externo ao rotor
Tipo 2
Wound Rrotor Induction Generator (WRIG) with external rotor resistor
Gerador de Indução Duplamente Alimentado
Tipo 3
Doubly-Fed Induction Generator (DFIG)
Full-Converter
Tipo 4
Full Power Converter Generator
Gerador Síncrono Mecanicamente Conectado Através de um Conversor de Torque
Tipo 5
Synchronous Generator Mechanically Connected Through a Torque Converter

Tipo 1 – Gerador de Indução de Rotor de Gaiola (Squirrel-Cage Induction Generator


(SCIG))
Primeiro tipo de aerogerador utilizado em escala comercial. Uma vez que o gerador de
indução está conectado diretamente à rede elétrica, sua velocidade é fixa e determinada exclu-
sivamente pela frequência da rede elétrica que o aerogerador é conectado, independentemente
da velocidade o vento. Esse tipo se caracteriza pela necessidade de conexão de capacitores
em paralelo com o equipamento, de forma a compensar a absorção de potência reativa da rede
pelo gerador de indução.

Tipo 2 – Gerador de Indução de Rotor Bobinado (Wound Rotor Induction Generator


(WRIG))
Esse tipo de aerogerador é uma evolução do anterior com a conexão de resistores va-
riáveis ao rotor bobinado através de anéis coletores. O objetivo desses resistores é ajudar a
absorção dos transitórios eletromecânicos, pois, variando o valor da resistência, o valor do
escorregamento (slip) e a potência de saída do aerogerador são controlados. A faixa do con-
trole de velocidade varia de 0 a 10% da velocidade síncrona. Esse tipo também conta com a
conexão de capacitores em paralelo com o equipamento, de forma a compensar a absorção de
potência reativa da rede pelo gerador de indução.
52    Geração de energia elétrica

Figura 2.17 – Tipos de arranjos de geradores elétricos e conversores de potência de aerogeradores

Os aerogeradores que se enquadram nos tipos 3 e 4, representados na Figura 2.17, per-


mitem o atendimento integral do submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede do ONS, Item 8
– Requisitos Técnicos Mínimos Para Conexão de Centrais Geradoras Eólicas e Fotovoltaicas
[17].

Tipo 3 – Gerador de Indução Duplamente Alimentado (Doubly-Fed Induction Generator


(DFIG))
Esse tipo de aerogerador, representado esquematicamente na Figura 2.17, caracteriza-se
pela utilização de um gerador de indução duplamente alimentado (DFIG). A energia mecânica
do vento movimenta as pás do aerogerador que se conectam através de um eixo a uma caixa
de engrenagens. Esse equipamento é responsável por adequar a velocidade de rotação das
pás à velocidade ótima de rotação do eixo do gerador de indução. A caixa de engrenagens é
o dispositivo mecânico mais sensível desse tipo de aerogerador, demandando manutenções
periódicas preventivas, para seu correto funcionamento.
O enrolamento de armadura do gerador de indução é conectado ao enrolamento primário
do transformador de acoplamento do aerogerador. O enrolamento secundário é conectado ao
terminal do aerogerador. No transformador existe ainda um enrolamento terciário que é conec-
tado a um filtro passa-baixa (low-pass filter). A esse filtro se conecta um retificador CA-CC,
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   53 

conectado a um inversor CC-CA que, por sua vez, se conecta ao enrolamento do rotor do
aerogerador. Tanto o retificador, quanto o inversor são formados por semicondutores do tipo
IGBT (Insulated-Gate Bipolar Transistors), que permitem o controle do ângulo de disparo
(início da condução de corrente) e do ângulo de extinção (término da condução de corrente).
O sistema de controle do aerogerador adquire variáveis medidas e valores de referência
que são utilizados para controlar tanto o retificador quanto o inversor, que são conectados ao
enrolamento do rotor do aerogerador. Em geral, os conversores têm potência entre 25 e 30%
da potência nominal do aerogerador. Essa tecnologia também permite o controle adequado
da potência reativa terminal, além de variações de velocidade entre +/- 30% da velocidade
síncrona.

Tipo 4 – Full-Converter
Esse tipo de aerogerador, representado esquematicamente na Figura 2.17, caracteriza-se,
nas melhores variantes dessa tecnologia, pela utilização de um gerador síncrono de velocida-
de variável, além de conversores conectados de um lado diretamente à armadura do gerador
síncrono, e do outro lado diretamente à rede elétrica. Por esses conversores é transmitida toda
a potência elétrica (ativa e reativa) gerada pelo gerador síncrono. Atualmente, existem duas
variantes tecnológicas importantes em torno da tecnologia full-converter, dependendo do fa-
bricante do aerogerador:
• Gerador síncrono com rotor excitado (Synchronous generator with excited rotor
(SGER)).
• Gerador síncrono com ímãs permanentes (Permanent magnet synchronous generator
(PMSG)).

Como são utilizados geradores síncronos de velocidade variável nas duas variantes dessa
tecnologia que serão aqui tratadas, a energia mecânica do vento movimenta as pás do aeroge-
rador que são conectadas diretamente ao rotor do gerador síncrono através de um eixo, sem a
necessidade do uso de uma caixa de engrenagens. Esse é o principal atrativo dessa tecnologia,
pois, conforme já comentado anteriormente, a caixa de engrenagens é um componente mecâ-
nico que exige manutenções periódicas de forma a não comprometer sua vida útil.
Diferentemente da tecnologia DFIG, na tecnologia Full-Converter um retificador CA-CC,
que pode ser formado por diodos (tecnologia SGER) ou semicondutores do tipo IGBTs (tec-
nologia PMSG), é conectado diretamente ao enrolamento de armadura do gerador síncrono e,
em seguida, conectado a um inversor CC-CA formado por IGBTs. Os inversores são conecta-
dos a um filtro passa-baixa (low-pass filter) que, por sua vez, se conecta à rede elétrica.
O sistema de controle do aerogerador adquire variáveis medidas e valores de referência
que são utilizados para controlar tanto o retificador (tecnologia SGER), quanto o inversor, que
são conectados ao enrolamento do rotor do aerogerador.
54    Geração de energia elétrica

Devido ao fato de que esse tipo de aerogerador se conecta à rede de forma assíncrona,
exclusivamente através do seu inversor, esse equipamento não contribui com o controle de
frequência, nem com o aumento do nível de curto-circuito na rede elétrica na qual ele é conec-
tado. Para que esse equipamento possa contribuir, mesmo que de forma limitada no controle
de frequência da rede, foi definido no submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede do ONS
[17], um requisito técnico denominado Inércia Sintética, que será detalhado adiante.

Tipo 5 – Gerador síncrono mecanicamente conectado através de um conversor de torque


Synchronous generator mechanically connected through a torque converter.
Nessa tecnologia, as pás do aerogerador se conectam a um caixa de engrenagens de re-
lação fixa que, por sua vez, se conecta a uma caixa de engrenagens hidrodinâmica, a qual
permite que o eixo de alta rotação (lado do gerador) opere em uma velocidade fixa, enquanto
que o eixo de baixa rotação (lado das pás) opere a velocidades variáveis.
O ponto principal dessa tecnologia é que ela permite o uso de geradores síncronos con-
vencionais. Como o gerador síncrono é conectado diretamente à rede, não são necessários
conversores de potência, fazendo com que o equipamento se comporte como um gerador sín-
crono convencional, agregando à rede todos os requisitos técnicos, como inércia, potência de
curto-circuito e controle de tensão, que um equipamento desse tipo agrega.

Inércia sintética
Considerando o fato de que o Tipo 5 de aerogerador ainda está em fase de desenvolvi-
mento e pesquisa, atualmente somente os Tipos 3 e 4 de aerogeradores, descritos acima, são
capazes de atender os requisitos técnicos do submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede do
ONS [17].
Os aerogeradores DFIG (Tipo 3) contribuem parcialmente, em razão de sua eletrônica de
potência, no controle de frequência do sistema (entre +/- 30% da velocidade síncrona). Por sua
vez, os aerogeradores Full-Converter (Tipo 4), não contribuem com a inércia da rede devido
ao fato de eles serem conectados à rede elétrica através de seus conversores. Para que esses
aerogeradores possam contribuir, mesmo que de forma limitada, no controle de frequência da
rede elétrica, foi definido submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede do ONS um requisito
técnico denominado inércia sintética [17].
O aerogerador que tem esse recurso, seu sistema de controle mede continuamente a frequ-
ência da rede elétrica. Caso a frequência sofra uma redução em relação ao regime permanente,
o controle do aerogerador comanda um aumento de sua potência ativa terminal, de forma a
contribuir com a recuperação da frequência. Esse aumento de potência é realizado através da
utilização de parte da energia cinética armazenada no rotor e pás do aerogerador. Sua contri-
buição é por tempo limitado, evitando provocar o efeito stall do aerogerador e esforços nas
caixas de engrenagem [24]. Hoje esse requisito é obrigatório para todos os aerogeradores que
irão se conectar ao SIN [17].
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   55 

Dada sua velocidade de ação (de 2 a 3 ciclos), a inércia sintética tem condições de contri-
buir no controle de frequência do sistema no momento de uma perturbação, quando somente
a inércia das massas girantes sincronizadas podem contribuir. Por isso, a inércia sintética con-
tribui com a redução da taxa de variação de frequência do sistema (df/dt), até que a ação da
regulação de velocidade dos geradores sincronizados e com reserva primária (R1) atue. A ação
da inércia sintética pode reduzir de forma efetiva a taxa de variação de frequência do sistema,
assim com a frequência mínima atingida em uma perturbação, podendo evitar até mesmo a
atuação de estágios do Esquema Regional de Alívio de Carga (ERAC) [24].

2.3.2.1 – Centrais geradoras eólicas offshore


Existem aspectos específicos importantes em relação aos parques eólicos offshore relacio-
nadas aos equipamentos, logística de instalação e manutenção, além da forma com é realizada
a conexão desses parques ao sistema de transmissão. Devido ao fato dos equipamentos do
parque eólico offshore serem instalados em ambiente marinho, algumas variáveis devem ser
cuidadosamente estudadas.

Aerogeradores: esses equipamentos devem ser adaptados para a instalação em ambiente


marinho extremamente corrosivo devido à salinidade e umidade. Fenômenos como a corrosão
eletrolítica devem ser cuidadosamente estudados. Como o clima do Brasil é predominante-
mente tropical, há grande evaporação no mar, que provoca o aumento da salinidade, que torna
esse ambiente ainda mais agressivo para os equipamentos do parque como um todo. Por outro
lado, o ambiente offshore é uma grande oportunidade de utilização de equipamentos de maior
potência nominal, da ordem de 10 MW, que estão sendo disponibilizados pelos fabricantes.
Esses aerogeradores exigem uma altura maior de torre devido a área de varredura ser maior e,
consequentemente, o comprimento das pás.

Fundações dos aerogeradores: em uma central eólica offshore os aerogeradores devem


ser instalados em fundações no leito marinho, ou em estruturas ancoradas no fundo do oce-
ano. A seleção do tipo de fundação é realizada em razão da profundidade e do tipo do leito
marinho, assim como das características do aerogerador. Aspectos como o efeito do vento,
ondas, marés e a corrosão devido a umidade e salinidade do oceano, descrita acima, devem
ser cuidadosamente considerados no dimensionamento das estruturas. O maior custo dessas
fundações tem impacto significativo no custo da instalação do parque eólico offshore, confor-
me pode ser verificado na Figura 2.19. A construção dessas estruturas também demanda uma
logística que deve ser capaz de transportar grandes estruturas no porto até o local de instalação
no mar. Nesse sentido, a indústria petrolífera pode contribuir em muito com esse know-how.
Isso já vem ocorrendo em países no mar do Norte, como Reino Unido, Noruega, que foram
os pioneiros na tecnologia de parques eólicos offshore. A Figura 2.18 apresenta os principais
tipos de fundações de turbinas eólicas offshore. As fundações monopilares (monopile), tripés
56    Geração de energia elétrica

(tripod) e jaqueta (jacket) são atualmente tecnologias consolidadas. As estruturas flutuantes


usam três tipos principais de fundações, que são adaptados da indústria de petróleo e gás: a
Tension Leg Platform, Spar-Submersible e Spar-Buoy.

Figura 2.18 – Tipos de fundação de aerogeradores offshore

Subestações offshore: as fundações das subestações offshore seguem o mesmo conceito


de engenharia, no que se refere aos tipos de estruturas utilizadas, das fundações dos aeroge-
radores apresentadas na Figura 2.18. No entanto, o peso das subestações é muito superior ao
peso dos aerogeradores, podendo chegar próximo de 4.000 toneladas, demandando muito
concreto e aço, sendo estruturas de difícil construção em razão da logística, montagem e
manutenção.

Cabos submarinos: a conexão dos aerogeradores à subestação offshore e da subestação


offshore até a rede de transmissão no continente é feita através de cabos submarinos de corren-
te alternada (CA) ou corrente contínua (CC). Para parques distantes, cerca de 80 km da costa,
a alternativa de conexão por cabos submarinos CA é a mais atrativa economicamente. Para
distâncias superiores, a capacitância dos cabos submarinos CA passa a ser uma dificuldade
técnica determinante para viabilizar economicamente a alternativa de transmissão em corrente
contínua, que consequentemente utiliza cabos CC.

Conexão com a rede elétrica: como visto anteriormente, a conexão dos parques eólicos
offshore com a rede elétrica no continente pode ser feita por meios de cabos submarinos CA
ou CC, dependendo da tecnologia utilizada. Destaca-se que, no caso de utilização da alterna-
tiva CC, existe a necessidade de instalação de subestações retificadora (offshore) e inversora
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   57 

(onshore). Isso aumenta consideravelmente o custo da conexão do parque com a rede elétrica.
Em contrapartida, há uma redução das perdas da alternativa CC se comparada a alternativa
CA, além da operação assíncrona permitir um controle mais efetivo tanto da potência ativa
quanto da potência reativa injetada/absorvida na rede, bem como uma suportabilidade maior
aos distúrbios.
Os custos com a infraestrutura de transmissão (cabos) para conexão dos aerogeradores às
subestações offshore, e sua conexão ao continente, incluindo os custos das próprias subesta-
ções offshore, variam de 15 a 30% dos custos totais do empreendimento [12].

Figura 2.19 – Comparação da composição dos custos de projetos eólicos onshore e offshore

No Brasil ainda existe um grande potencial eólico onshore não explorado, dessa forma,
em razão da complexidade do projeto de engenharia, associado a elevados custos de ins-
talação, a exploração de empreendimentos offshore em escala comercial ainda é inviável
economicamente.

2.3.3 – Centrais geradoras fotovoltaicas


As usinas fotovoltaicas ou centrais geradoras fotovoltaicas utilizam como fonte primária
a irradiação solar. A Figura 2.20 apresenta um diagrama esquemático de uma central geradora
fotovoltaica. Nessas centrais, inicialmente, os painéis fotovoltaicos captam a irradiação solar
e produzem uma corrente contínua, através de um processo denominado efeito fotovoltaico
(ver item 2.2.1.1). Essa corrente contínua gerada é enviada aos inversores CC-CA, que con-
vertem a corrente contínua gerada em corrente alternada. A saída dos inversores está conecta-
da a um transformador elevador que é responsável pela elevação da tensão para a conexão da
central à rede elétrica em seu Ponto de Conexão.
A tecnologia fotovoltaica tem como principal característica a necessidade de utilização
de inversores. O uso desses equipamentos cria uma série de dificuldades técnicas para a co-
nexão da central fotovoltaica à rede de transmissão. É necessário que a rede tenha um valor
mínimo do nível de curto-circuito, a qual permita que o valor mínimo do índice relação de
58    Geração de energia elétrica

curto-circuito (Short-Circuit Ratio – SCR), necessário para conexão dos inversores, seja aten-
dido de forma que estes possam operar de forma estável. Além disso, eles produzem correntes
harmônicas, que podem necessitar de filtros para que sejam atendidos os critérios de desem-
penho harmônico. A presença desses filtros pode levar a dificuldades no controle de tensão da
área, sobretudo em regiões de baixo nível de curto-circuito.
A Figura 2.20 apresenta o diagrama esquemático de uma central geradora fotovoltaica.
Se comparada com as outras formas de geração de energia elétrica por fontes renováveis, as
centrais fotovoltaicas têm um processo bem mais simples, apesar do fato de que o uso de in-
versores requer aspectos específicos da rede elétrica onde eles são conectados, conforme visto
anteriormente.

Figura 2.20 – Diagrama esquemático de uma central geradora fotovoltaica

Central geradora fotovoltaica: 1. Painéis fotovoltaicos; 2. Inversores CC-CA; 3. Trans-


formador elevador

(1) Painéis fotovoltaicos


Inicialmente, a radiação solar incide nos painéis fotovoltaicos gerando corrente e tensão
contínuas através do efeito fotovoltaico [3]. Esses painéis geralmente são agrupados em con-
juntos formados por vários painéis, de forma a permitir o acompanhamento pelo conjunto, do
movimento diário do Sol na eclíptica. Esse acompanhamento é realizado por meio de motores
(drivers), acionados por um sistema de controle centralizado. O acompanhamento pode ser de
um eixo ou de dois eixos, conforme detalhado anteriormente no item 2.2.1.1.

(2) Inversores de corrente contínua (CC) para corrente alternada (CA)


A corrente e tensão contínua gerada nos painéis fotovoltaicos passa pelos inversores,
transformando essa corrente e tensão contínua em corrente e tensão alternada, porém ainda
em baixa tensão e, portanto, não é adequada a conexão à rede de transmissão. No caso do
uso de instalações residências, o inversor é conectado diretamente à rede de transmissão da
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   59 

distribuidora de energia, não sendo necessário o transformador elevador, reduzindo com isso
os custos da instalação.

(3) Transformador elevador


Esse transformador é responsável por elevar a tensão CA da energia elétrica gerada pelo
inversor para níveis compatíveis com a rede de transmissão, reduzindo as perdas.
Atualmente, a maior usina fotovoltaica em operação no Brasil e na América Latina é a
Central Fotovoltaica de São Gonçalo (figura 2.21). A UFV São Gonçalo está localizada no
município de São Gonçalo do Gurgueia, no nordeste do estado do Piauí. A primeira etapa das
obras, para a construção de 475 MW, está finalizada. Está prevista para 2020 a construção da
segunda etapa do empreendimento, que irá incluir 133 MW adicionais a central, totalizando
uma capacidade total de geração de 608 MW ao empreendimento.
Na UFV São Gonçalo foram utilizados, pela primeira vez no Brasil, módulos solares bifa-
ciais, que captam energia de ambos os lados dos painéis. Estima-se que a inovação aumente a
geração de energia em até 18%, se comparado com módulos convencionais [25]. Nessa UFV
também é utilizada a tecnologia de tracking parcial, com isso é possível fazer com que os pai-
néis fotovoltaicos acompanhem o movimento diário e aparente do Sol no sentido leste – oeste.
Esse acompanhamento também permite um aumento significativo do rendimento da central,
se comparado com o custo de instalação e manutenção desse equipamento.
Quando a central estiver em plena operação, totalizando sua capacidade instalada de
608 MW, ela será capaz de gerar mais de 1.500 GWh de energia anualmente, evitando a emis-
são de mais de 860.000 toneladas de CO2 na atmosfera a cada ano [25].

Figura 2.21 – UFV São Gonçalo – 475 MW (primeira etapa) – estado do Piauí, Brasil
60    Geração de energia elétrica

O armazenamento de energia como solução para a intermitência das centrais eólicas


e fotovoltaicas
De forma a reduzir o problema da intermitência da geração de potência das centrais eólicas e
fotovoltaicas, quando há uma redução abrupta no vento ou a redução da irradiação solar devido à
passagem de uma nuvem sobre a central fotovoltaica, tem-se pesquisado a possibilidade de utiliza-
ção do armazenamento de energia em baterias, de uma forma stand-alone em containers próprios
ou, no caso dos parques eólicos, nas próprias bases das torres dos aerogeradores. O restante deste
tópico irá tratar de aplicações em centrais eólicas, mas o mesmo conceito pode ser utilizado em cen-
trais fotovoltaicas, pois a diferença é somente a fonte primária de energia, vento ou irradiação solar.
Para o armazenamento de energia são normalmente utilizadas baterias com tecnologia
de íons de lítio (Li-Ion), que podem ser utilizadas tanto para controlar e reduzir as rampas de
potência ativa (ΔP/Δt), causadas por reduções da fonte primária de energia da central, ou para
a reserva operativa do sistema.
A primeira aplicação se constitui em uma forma de contribuição de potência ativa para o
sistema que, por sua vez, se reflete na redução da intermitência da frequência (Δf/Δt). Nessa
aplicação, as baterias operam de forma flutuante com aerogeradores e sistema, podendo ser
carregadas tanto pelos aerogeradores da central eólica (preferencialmente), quanto pelo sis-
tema. Um sistema de controle específico (Energy Management System – EMS) realiza esse
gerenciamento, verificando qual é a necessidade, no momento, de fornecer potência ativa para
o sistema, ou carregar as baterias.
A segunda aplicação está relacionada ao armazenamento de energia e não ao fornecimento
de potência ativa, de forma imediata, para o sistema. Essa aplicação tem o objetivo de prover
reserva de potência operativa para o sistema. Nesse caso, a energia armazenada nas baterias
fornece potência para o sistema, caso haja uma redução de frequência abaixo de um valor
predeterminado, que varia de sistema para sistema. Em uma situação de sobrefrequência, o
sistema de controle da bateria, dependendo da condição de carregamento dela, também pode
contribuir para a redução da sobrefrequência, armazenando essa energia excedente do sistema
na bateria. Em uma condição normal de operação, as baterias ficam operando de maneira flu-
tuante com o sistema e prontas para fornecerem potência quando solicitadas.
A utilização do armazenamento, seja como forma de reduzir a intermitência ou fornecer
reserva de potência operativa para o sistema, não deve ser confundida com o requisito de inér-
cia sintética dos aerogeradores, estabelecido no submódulo 3.6 dos Procedimentos de Rede
do ONS. A inércia sintética é um controle específico do aerogerador capaz de transformar,
praticamente de forma instantânea, por um curto intervalo de tempo, parte da energia cinética
armazenada nos rotores e nas pás dos aerogeradores, em potência ativa, de forma a fazer fren-
te a um afundamento abrupto de frequência durante grandes distúrbios [24].
Estudos recentes, realizados por diversos fabricantes, mostram que com a tecnologia de
armazenamento é possível aumentar a segurança do nível de penetração de fontes renováveis
intermitentes em uma determinada região ou sistema.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   61 

2.3.4 – Centrais termosolares de concentração


As usinas ou centrais termosolares de concentração têm como principal característica a
geração de energia elétrica através de uma máquina síncrona convencional, a partir da radia-
ção solar concentrada. Todo o processo de aquecimento se resume em uma forma de obtenção
de vapor e posterior utilização em uma turbina a vapor, conectada a um gerador síncrono
convencional.
A seguir, serão analisadas duas dessas tecnologias que podem ser aplicadas comercialmente.

2.3.4.1 – Central termosolar de receptor de torre central


A Figura 2.22 apresenta o diagrama básico de produção de energia elétrica em uma Cen-
tral Termosolar de Concentração (Concentrated Solar Power – CSP) de Receptor de Torre
Central. Os principais componentes desse tipo de usina são os heliostatos e a torre central,
onde fica localizado o receptor solar. Nesse capítulo serão descritas todas as etapas do proces-
so de geração de energia elétrica em uma central termosolar de torre central com armazena-
mento em sais fundidos. Os números nos itens abaixo se referem à numeração da Figura 2.22.

Figura 2.22 – Etapas de produção de energia elétrica em uma central termosolar de torre central com armazenamento
térmico em sais fundidos

Central termosolar de torre central: 1. Campo de heliostatos; 2. Tanque de armaze-


namento de sais frios; 3. Torre central e receptor solar; 4. Tanque de armazenamento de sais
quentes; 5. Gerador de vapor; 6. Turbina a vapor; 7.  Gerador síncrono; 8. Transformador
elevador.
62    Geração de energia elétrica

O receptor solar, situado no topo da torre central, é o principal componente dessa tecnologia.
Muitas pesquisas são realizadas no sentido da utilização de materiais cerâmicos, além da utiliza-
ção de novos arranjos geométricos nos receptores solares. Atualmente, o estado da arte em termos
de receptores solares são os receptores solares do tipo cilíndrico. Esses receptores permitem um
melhor aproveitamento da área do parque solar, pois os heliostatos podem ser dispostos em uma
área circular em torno da torre central, podendo ser apontados em diversas alturas do receptor,
evitando com isso sobreaquecimento do receptor solar. Hoje são comuns receptores que recebem
o equivalente a várias centenas de “sois” concentrados através dos heliostatos do parque solar.

(1) Heliostatos
Inicialmente, a radiação solar incide nos heliostatos que são responsáveis por redirecioná-la
para o receptor solar, localizado no topo da torre central. Os heliostatos são formados por um
conjunto de espelhos planos, podendo chegar a uma área de 100 m2. Esses conjuntos têm suas
posições, ao longo do dia, controladas por dois servomotores elétricos, de elevada precisão no
posicionamento, em uma montagem altitude-azimute, similar ao de telescópios astronômicos, e
são controlados por um sistema de controle computadorizado. Os motores posicionam cada he-
liostato ao longo do dia, de maneira que nem todos os heliostatos apontem para a mesma posição
no receptor solar. Caso isso aconteça, pode haver danos no receptor por temperatura.
Outro fato interessante em relação ao controle dos heliostatos é que, a partir de uma deter-
minada velocidade do vento no parque solar, os servomotores colocam os heliostatos em uma
posição de repouso horizontal, reduzindo o efeito do vento neles e possíveis danos físicos. Os
heliostatos devem ser lavados com frequência, pois a poeira depositada com o tempo reduz a
radiação solar refletida por eles para o receptor. Algumas usinas termosolares desenvolveram,
inclusive, processos automatizados para a limpeza dos heliostatos, reduzido assim o custo de
manutenção, além da quantidade de água para limpeza.
Dependendo do projeto, a quantidade de heliostatos pode variar de centenas até milhares,
todos eles com a posição controlada precisamente por um sistema de controle computadoriza-
do, a fim de otimizar a reflexão da radiação solar para o receptor solar ao longo do dia e do ano.

(2) Tanque 1 – Tanque de armazenamento de sais frios


Os sais são armazenados no tanque de sais frios após a retirada do seu calor no trocador de
calor, que gera o vapor necessário para a operação da turbina a vapor. Todo o cuidado deve ser
tomado na manutenção da temperatura mínima do tanque de armazenamento dos sais frios,
pois caso a temperatura caia abaixo do seu ponto de fusão, 290°C, os sais se solidificam e o
tanque de armazenamento é perdido. De forma a evitar esse risco a qualquer custo, existe a
possibilidade, em uma emergência, de aquecer os sais frios por queimadores a gás para manter
sua temperatura mínima. Os tanques de armazenamento possuem um isolamento térmico de
alto desempenho que proporciona uma perda térmica dos sais armazenados de somente 1°C
a cada 24 horas.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   63 

(3) Torre central e receptor solar


Sua principal função é elevar a posição do receptor solar em relação aos heliostatos, pos-
sibilitando um número maior de heliostatos no campo solar, sem que a posição de um interfira
com o outro (sombreamento). No centro da torre central também estão localizadas as tubulações
responsáveis pela condução dos sais armazenado no tanque de sais frios que serão aquecidos
no receptor solar em até 565°C, e depois conduzido para o tanque de sais quentes. Cabe aqui
destacar que o sentido da circulação dos sais fundidos é inverso ao da convecção, pois os sais
fundidos com temperatura mais baixa devem subir a torre, enquanto os sais fundidos com tempe-
ratura mais elevada, aquecidos pelo receptor, devem descer a torre. Esse fato provoca um gasto
de energia com bombeamento, reduzindo um pouco a eficiência da planta solar como um todo.
Durante o período noturno, os tubos que sobem a torre central são drenados, de forma que
não haja a solidificação dos sais fundidos em seu interior, e a consequente perda da tubulação.
Esse fato também gera um gasto diário de energia durante o início de operação da planta, para
que os sais frios sejam bombeados para o receptor solar, localizado no topo da torre central.

(4) Tanque 2 – Tanque de armazenamento de sais quentes


O tanque de sais quentes armazena os sais aquecidos pelo receptor solar que desce da
torre central. A temperatura máxima dos sais quentes é de 565°C, bem maior que a do fluido
térmico (400°C). A temperatura máxima dos sais fundidos (565°C) é 1,4 vezes maior que a
temperatura máxima do fluido térmico (400°C). Esse fato tem relação direta com a quantidade
de calor armazenada nesses dois materiais (equação 2.7), e, consequentemente, com a energia
total armazenas na central solar.

(5) Gerador de vapor


O gerador de vapor é, na verdade, um trocador de calor no qual o calor armazenado no
tanque de sais quentes irá gerar o vapor necessário para a turbina a vapor. Após a troca de calor
dos sais quentes com a água para geração de vapor, os sais, agora frios, retornam para o tanque
de sais frios. A central termosolar é projetada de forma que, durante o dia, haja um superávit
de calor, ou seja, é gerado mais calor, que é armazenado no tanque de sais quentes, do que é
consumido na geração de vapor, de forma que possa haver geração de vapor, mesmo durante
a noite e madrugada e, consequentemente, geração de energia elétrica.

(6) Turbina a vapor


A turbina a vapor é a máquina primária que produz a potência mecânica para o gerador
síncrono. A grande vantagem, advinda da regularização da produção de vapor devido ao arma-
zenamento de energia em sais fundidos, é que não é necessário parar a turbina a vapor durante
a noite e sim somente reduzir sua potência. Isso faz com que aumente a vida útil das palhetas
da turbina, e da turbina como um todo.
64    Geração de energia elétrica

(7) Gerador síncrono


O gerador síncrono é responsável por gerar a energia elétrica que será injetada na rede
elétrica. Essa é a principal vantagem de uma central geradora termosolar. A geração de energia
elétrica é feita por uma máquina síncrona convencional, agregando potência de curto-circuito,
inércia e controle de tensão à rede elétrica na qual ela é conectada de forma direta.

(8) Transformador elevador


O transformador é responsável por elevar a tensão CA da energia elétrica gerada pelo ge-
rador síncrono para níveis compatíveis com a rede de transmissão, reduzindo as perdas.

Ciclo de produção diário de uma central termosolar de receptor de torre central com
armazenamento térmico em tanques de sais fundidos
A principal vantagem de uma central termosolar com armazenamento é o melhor ge-
renciamento da produção de energia elétrica da planta, que permite que ela produza energia
mesmo em períodos sem irradiação solar, representando, portanto, menor intermitência se
comparada a uma central fotovoltaica.
A Figura 2.23 apresenta um gráfico com um ciclo típico de três dias de produção de ener-
gia de uma central termosolar de armazenamento. Na figura, são apresentadas as seguintes
curvas:
• Curva azul traço fino, semelhante a uma parábola, indica o nível de Irradiação Solar
Horizontal (Direct Normal Irradiance – DNI), que incide nos heliostatos do parque
solar durante três dias consecutivos. Esse é o motivo pelo qual há três ciclos, não só na
curva DNI, mas também nas demais curvas da Figura 2.23. Para os três dias observa-
dos, o nível de irradiação solar foi praticamente o mesmo.
• Curvas azuis, que se assemelham ao perfil de dente de serra, indicam a energia térmi-
ca armazenada na central em seu tanque de sais fundidos aquecido. A curva contínua é
o valor verificado, enquanto a curva tracejada é o valor calculado através de um mode-
lo matemático da central. A energia armazenada no tanque de sais fundidos aquecidos
é que é utilizada para gerar vapor para a turbina.
• Curvas vermelhas, que indicam a potência mecânica gerada pela turbina e, conse-
quentemente, a potência elétrica gerada pelo gerador da central termosolar em regime
permanente. A curva contínua é o valor verificado, enquanto a curva tracejada é o
valor calculado através de um modelo matemático da central.
• Curva azul claro, indica a potência do forno de gás natural, utilizado em uma emer-
gência para evitar que a temperatura dos sais fundidos frios atinja valores abaixo da
temperatura mínima dos sais, evitando a solidificação deles dentro do tanque de arma-
zenamento de sais frios e, consequentemente, de danos severos. Durante os três dias
de monitoramento da central, não houve a necessidade de utilização de gás natural
para aquecimento, mesmo tendo sido observada a operação contínua dela.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   65 

Esse é um fato relevante no aspecto da vida útil da turbina a vapor, conforme já mencionado.

Figura 2.23 – Ciclo de produção diário de uma central termosolar de torre central com armazenamento térmico
em tanques de sais fundidos

À 0 hora do primeiro dia, não existe irradiação solar incidindo sobre os heliostatos, de for-
ma que a potência mecânica gerada pela turbina (curva em vermelho), é obtida exclusivamen-
te pelo vapor obtido a partir da energia térmica armazenada no tanque de sais fundidos aqueci-
dos (curva azul). Podemos, inclusive, notar a linearidade dessa perda de energia térmica, fato
que é previsto segundo a equação 2.4, uma vez que existe a variação de temperatura dos sais
fundidos para geração do vapor que será utilizado na turbina. Por volta de 8 horas da manhã
do primeiro dia, começa a haver incidência de irradiação no parque solar a central, que pode
ser visualizado na Figura 2.23 pelo aumento observado na curva de DNI (curva azul fina).
Até cerca de 10h30, a energia armazenada ainda sofre uma redução, pois a central ainda conso-
me mais energia térmica do que a irradiação solar consegue fornecer. Isso ocorre por dois motivos:
• Existe um aumento da potência da turbina (curva vermelha), com o aumento do DNI
(curva azul fina), fazendo com que haja um progressivo aumento da energia térmica
consumida na central, paralelamente ao aumento do DNI.
• Devemos também destacar o gasto de energia para bombear sais aquecidos para o receptor
localizado no topo da torre central, antes do início da operação da planta. Conforme co-
mentado anteriormente, existe a necessidade diária de esvaziar a tubulação da torre durante
a noite para evitar a solidificação dos sais e, consequentemente, da perda da tubulação.

Após as 10h30 do primeiro dia, a central passa a apresentar um superávit de energia,


fazendo com que seja possível iniciar o aquecimento dos sais fundidos frios de forma a
66    Geração de energia elétrica

armazená-los no tanque de sais aquecidos, visando o armazenamento de energia térmica para


geração de vapor no próximo período sem irradiação solar. Vale destacar que a partir das
10h30 a central opera com sua turbina na potência máxima.
Esse quadro de operação/produção se mantém estável até cerca de 20 horas do primeiro
dia, quando então a irradiação solar que incide nos heliostatos, passa a não ser mais suficien-
te para permitir a operação da planta superavitária, do ponto de vista de armazenamento de
energia. A partir das 20 horas podemos observar que a central começa a utilizar sua energia
térmica armazenada nos sais fundidos aquecidos, em conjunto com a irradiação solar ainda
existente, porém em declínio, para produção de energia. A partir das 21 horas do primeiro dia
passa a não haver mais irradiação solar sobre o parque solar, e a central passa a gerar toda a
sua energia a partir da energia armazenada nos sais fundidos aquecidos.
Por volta de 0 hora do segundo dia, a geração da central ainda estava próxima do seu va-
lor máximo, no entanto, podemos observar que, caso essa potência fosse mantida, a taxa de
decaimento da energia armazenada seria tal, que a central usaria toda a energia armazenada
antes do próximo ciclo de irradiação solar. Para que esse fato não ocorra, é realizada uma
redução da potência gerada pela central provocando uma redução da taxa de utilização da
energia armazenada.
Da mesma forma que no primeiro dia, o ciclo solar no segundo dia se inicia por volta de
oito horas, terminando também por volta das 20 horas.
Na madrugada do terceiro dia fica evidente que potência gerada pela central é completa-
mente gerenciável, uma vez que são observadas duas modulações da potência gerada durante
a madrugada. Uma redução por volta da zero hora e um aumento por volta das quatro horas.
Esse fato é muito relevante do ponto de vista do Operador do Sistema, pois a central pode ser
programada centralizadamente, com flexibilidade, durante todo o seu ciclo diário de operação,
agregando menor intermitência e confiabilidade à rede elétrica onde ela é conectada.
As Figuras 2.24 e 2.25 mostram detalhes da central geradora termosolar Gemasolar, loca-
lizada em Sevilha, no Sul da Espanha. A Gemasolar foi a primeira planta a aplicar em escala
comercial a tecnologia de receptor de torre central e a armazenamento em um único fluido
térmico (sais fundidos).

Figura 2.24 – Usina termosolar Gemasolar – Sevilha, Espanha – 17 MW – 1.650 heliostatos


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   67 

Figura 2.25 – Usina termosolar Gemasolar – Sevilha, Espanha – Detalhe da torre central e heliostatos

2.3.4.2 – Central termosolar de calhas cilindro-parabólicas


A Figura 2.26 apresenta o diagrama básico de produção de energia elétrica em uma cen-
tral termosolar de concentração calhas cilindro-parabólicas. Os principais componentes desse
tipo de usina são as calhas cilindro-parabólicas, onde em seu foco estão localizados os tubos
absorvedores, responsáveis por receber a radiação solar e aquecer o fluido térmico. Neste
capítulo, serão descritas as etapas do processo de geração de energia elétrica em uma central
termosolar de calhas cilindro-parabólicas e armazenamento em sais fundidos. Os números a
seguir referem-se à numeração da Figura 2.26.

(1) Calhas cilindro-parabólicas e tubos receptores


Inicialmente, a radiação solar incide nas calhas cilindro-parabólicas. Essas “calhas” na
verdade são espelhos cilindro-parabólicos, que refletem a radiação solar para os tubos re-
ceptores localizados no foco desses espelhos. Tanto os espelhos, quanto os tubos receptores
possuem tecnologias para maximizar a absorção de calor pelo fluido térmico, também deno-
minado HTF (Heat Transfer Fluid), que circula dentro dos tubos absorvedores, por todo o
campo solar.
68    Geração de energia elétrica

Figura 2.26 – Etapas de produção de energia elétrica em uma central termosolar de calhas cilindro-parabólicas
com armazenamento térmico em sais fundidos

Central termosolar de calhas cilindro-parabólicas: 1. Campo de calhas cilindro-pa-


rabólicas; 2. Trocador de calor fluido térmico x água – gerador de vapor; 3. Turbina a vapor
e gerador síncrono; 4. Transformador elevador; 5. Condensador; 6. Torres de refrigeração;
7. Trocador de calor fluido térmico x sais fundidos; 8.1. Tanque de armazenamento de sais
frios; 8.2. Tanque de armazenamento de sais quentes; 9. Caldeira.
Os tipos disponíveis de espelhos ou calhas cilindro-parabólicos são apresentados na Figu-
ra 2.27. Para que haja maior eficiência na reflexão da radiação solar, as calhas são alinhadas
de forma paralela ao eixo de rotação da Terra (sentido norte-sul), de forma que possa haver o
acompanhamento através da movimentação das calhas por servomotores, durante todo o dia,
do movimento aparente do Sol na eclíptica. O acionamento dos motores das calhas no campo
solar é feito através de um controle computadorizado e centralizado.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   69 

Figura 2.27 – Dimensões dos espelhos ou calhas cilindro-parabólicas em metros

No foco da parábola ficam localizados os tubos receptores, cujas características técnicas e


construtivas são apresentadas na Figura 2.28. Os tipos mais utilizados de tubos receptores têm
comprimento de 4.060 mm, a temperatura de 20ºC, comprimento útil superior a 96,7%, e são
compostos de um tubo absorvedor metálico envolvido por um tubo de vidro. Entre o vidro e o
tubo absorvedor existe um ambiente de vácuo, visando reduzir as perdas do turbo absorvedor
por condução térmica.

Figura 2.28 – Características técnicas e construtivas dos tubos receptores


70    Geração de energia elétrica

(2) Trocador de calor fluido térmico x água – gerador de vapor


Durante o dia, o fluido térmico aquecido até a temperatura de 400ºC, temperatura máxima
para que haja a estabilidade dele, é bombeado por tubos até o gerador de vapor, onde seu calor
armazenado é trocado com a água para a geração de vapor que será utilizado na turbina a vapor.

(3) Turbina a vapor e gerador síncrono


A turbina a vapor é a máquina primária que produz a potência mecânica para o gerador
síncrono. A grande vantagem advinda da regularização da produção de vapor, devido ao arma-
zenamento de energia em sais fundidos, é não ser necessário parar a turbina a vapor durante
a noite e sim somente reduzir sua potência. Isso faz com que aumente a vida útil das palhetas
da turbina e da turbina como um todo.
O gerador síncrono é responsável por gerar a energia elétrica que será injetada na rede
elétrica. Essa é a principal vantagem de uma central geradora termosolar. A geração de energia
elétrica é feita por uma máquina síncrona convencional, agregando potência de curto-circuito,
inércia e controle de tensão à rede elétrica na qual ele é conectada de forma direta.

(4) Transformador elevador


O transformador é responsável por elevar a tensão CA da energia elétrica gerada pelo ge-
rador síncrono para níveis compatíveis com a rede de transmissão, reduzindo as perdas.

(5) Condensador
O vapor que sai da turbina a vapor é condensado, transformando-se em água que volta
novamente ao ciclo de produção de vapor.

(6) Torres de refrigeração


As torres de refrigeração proporcionam a refrigeração necessária à água que passa no
condensador para condensar o vapor de saída da turbina em água.

(7) Trocador de calor fluido térmico x sais fundidos


Durante o dia, sempre que há um superávit de energia térmica no fluido térmico utilizado
para a produção do vapor necessário para a geração de energia elétrica, esse excedente é armaze-
nado no tanque de sais quentes. Isso é feito através de uma derivação de parte do fluido térmico
aquecido, para um outro trocador de calor com os sais fundidos, que são aquecidos nessa troca
de calor. Aqui deve ser destacado um ponto importante em relação ao armazenamento térmico
em sais fundidos nessa central, se comparado ao armazenamento em sais fundidos na central
de receptor de torre central. Como a temperatura máxima do fluido térmico (400ºC) é inferior
à temperatura máxima dos sais fundidos (565ºC), a quantidade de calor armazenada para um
mesmo volume de sais fundidos, nessa central termosolar é inferior à do calor armazenado na
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   71 

central de receptor de torre central. Isso irá refletir em uma redução no período de geração da
planta sem Sol, considerando que ambas as centrais tenham um mesmo volume de sal fundido.

(8.1) Tanque de armazenamento de sais frios


Como comentado no item 7, durante o dia, caso haja um excedente de calor armazenado
no fluido térmico para gerar o vapor necessário para a geração de energia elétrica no gerador,
esse excedente é direcionado para um outro trocador de calor. Nessa situação, esse trocador
de calor é responsável por aquecer os sais fundidos do tanque de sais frios, através da troca de
calor com o fluido térmico, mais aquecido, proveniente do campo solar. Os sais quentes são
bombeados para o tanque de armazenamento de sais quentes. Recordando que a temperatura
mínima admissível dos tanques de sais frios é de 290°C, caso a temperatura do sal frio caia
abaixo desse valor o sal irá solidificar dentro do tanque.

(8.2) Tanque de armazenamento de sais quentes


Durante o período noturno, os sais quentes armazenados ao longo do dia pelo aquecimento
dos sais frios pelo fluido térmico, utilizando o superávit de calor necessário para a produção de
energia elétrica, é bombeado para o trocador de calor fluido térmico – sais fundidos. Os sais
quentes passam agora a aquecer o fluido térmico que tem uma temperatura inferior. Após a troca
de calor, os sais, agora frios, são bombeados para o tanque de sais frios para armazenamento, e o
fluido térmico aquecido é conduzido para o trocador de calor fluido térmico – água, para gerar o
vapor necessário na turbina a vapor para produção de energia elétrica. Ressalta-se que durante o
período noturno não há circulação de fluido térmico no parque solar por razões óbvias, ficando a
circulação do fluido térmico restrita a ambos os trocadores de calor (figuras 2.29 e 2.30).

(9) Caldeira
A caldeira é utilizada para a manutenção da temperatura do fluido térmico do campo solar
em situações extremas.

Figura 2.29 – Usina termosolar Valle 1 e Valle 2 – Cadiz, Espanha – 50 MW – Campo solar 510.000 m2 de calhas cilindro
parabólicas
72    Geração de energia elétrica

Figura 2.30 – Usina termosolar Valle 1 e Valle 2 – Sistema de armazenamento térmico em sais fundidos

2.3.4.3 – Central termosolar híbrida


Nos últimos anos, muitas pesquisas tem sido realizadas no sentido de reduzir os custos,
ainda elevados, das centrais termosolares. Uma das possibilidades de redução de custo é di-
minuir, ou até mesmo eliminar, a necessidade de armazenamento de calor para a operação da
planta em períodos sem Sol, ou para reduzir a intermitência, através da hibridização da central
termosolar (figura 2.31).
A solução mais adotada mundialmente para hibridização tem sido a operação conjunta
da central termosolar, com uma usina termoelétrica a gás natural, criando uma usina híbrida
(Integrated Solar Combined Cycle – ISCC). Com isso, durante a noite, ou em dias sem irradia-
ção solar direta, a turbina a vapor pode ser operada utilizando o vapor produzido na Caldeira
de Recuperação de Calor e Geração de Vapor (Heat Recovery Steam Generator – HRSG),
utilizando o calor dos gases de exaustão da turbina a gás. No Brasil, temos a possibilidade de
hibridização de centrais termosolares e usinas térmicas de ciclo combinado, utilizando, por
exemplo, o gás natural produzido indiretamente a partir da extração do petróleo do pré-sal.
No Brasil, outra opção mais ecologicamente correta poderia considerar a elevada dispo-
nibilidade de biomassa, como o bagaço de cana-de-açúcar, construindo de uma usina híbrida
termosolar e bagaço de cana-de-açúcar. Com isso, seria reduzida, ou até mesmo eliminada, a
necessidade de armazenamento térmico, pois esta usina poderia gerar vapor para o turboge-
rador durante o dia, utilizando a radiação solar, e à noite produzir vapor a partir da queima do
bagaço de cana (Ciclo Rankine).
Nesse sentido, vale lembrar que no Brasil o período de safra de cana-de-açúcar na região
centro-sul se concentra nos meses de maio a novembro, e de setembro a março na região nor-
te-nordeste. Esse também é um período seco nessas regiões, portanto com elevados índices de
irradiação solar direta.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   73 

Figura 2.31 – Diagrama simplificado de uma central termosolar híbrida calhas cilindro-parabólicas e termoelétrica a gás
natural

2.3.5 – Usinas termoelétricas


Uma usina termoelétrica é uma central geradora elétrica na qual a energia térmica, for-
necida por algum combustível, seja ele de origem fóssil ou biocombustível, é convertida em
energia elétrica. Na maioria das centrais termoelétricas, a turbina é movida a vapor. A água é
aquecida, transforma-se em vapor e gira uma turbina a vapor que aciona um gerador elétrico.
Depois de passar pela turbina, o vapor é condensado em um condensador e reciclado para
onde foi aquecido. Esse ciclo é conhecido como ciclo Rankine.
Existem também usinas termoelétricas que utilizam como combustível o gás natural, utili-
zado como combustível em uma turbina a gás que, por sua vez, aciona, através de um eixo, um
gerador elétrico. Esse ciclo é denominado ciclo Brayton. Nesse tipo de usina, o calor gerado
pela queima do gás pode ser reaproveitado na exaustão da turbina para geração de vapor para
geração de energia elétrica por um turbogerador.

Heat rate ou consumo específico de uma usina termoelétrica


É um termo comumente utilizado em usinas termoelétricas para indicar a eficiência da
usina. O heat rate é o inverso da eficiência: quanto menor o heat rate melhor.
74    Geração de energia elétrica

Enquanto a eficiência é uma medida adimensional (às vezes dada em porcentagem), o


heat rate é normalmente expresso em Btu/kWh [26]. Isso ocorre porque o Watt-hora é nor-
malmente utilizado quando se refere à energia elétrica e o Btu é mais normalmente utilizado
quando se refere à energia térmica. Dessa forma, o heat rate pode ser calculado pela fórmula
apresentada em (2.14).

energia térmica entrada (2.14)


ℎ𝑒𝑒𝑒𝑒𝑒𝑒 𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟 =
energia elétrica saída

Onde:
heat rate: (Btu/kWh)
energia térmica: energia térmica obtida com a utilização da fonte primária (Btu)
energia elétrica: energia elétrica obtida no processo de produção de energia (kWh)

O heat rate no contexto de usinas termoelétricas pode ser considerado como a entrada
necessária para produzir uma unidade de produção. Geralmente, indica a quantidade de com-
bustível necessária para gerar uma unidade de eletricidade. Os parâmetros de desempenho
rastreados para qualquer usina termoelétrica, como eficiência, custos de combustível, fator
de carga da planta, nível de emissões etc., são uma função do heat rate da planta e podem ser
vinculados diretamente [27].
Uma eficiência de 100% implica em energias de entrada (térmica) e saída (elétrica) iguais:
para 1 kWh de saída, a entrada deve ser de 1 kWh. Essa entrada de energia térmica de 1 kWh
= 3,6 MJ = 3.412 Btu. Portanto, o heat rate de uma planta 100% eficiente é simplesmente 3,6
MJ / kWh, ou 3.412 Btu / kWh.
A Energy Information Administration dos EUA fornece uma descrição geral de como
converter um valor de heat rate no valor de eficiência de uma usina [27]. Para expressar a
eficiência de um gerador ou usina como porcentagem, é possível dividir o valor equivalente
em Btu de 1 kWh de eletricidade (3.412 Btu) pelo heat rate. Por exemplo, se a energia de
aquecimento (entrada) for de 10.500 Btu, a eficiência será de 32,5% (3.412 Btu / 10.500 Btu
= 32,5%). Se a energia de aquecimento for de 7.500 Btu, a eficiência é de 45,5% (3.412 Btu /
7.500 Btu = 45,5%). Quanto maior o heat rate (ou seja, quanto mais energia é necessária para
produzir 1 kWh), menor a eficiência da usina.
A maioria das usinas possui um heat rate objetivo em sua fase de projeto. Se o heat rate
real da planta não corresponder ao objetivo, a diferença entre o heat rate real e o heat rate
objetivo é denominado desvio de heat rate.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   75 

2.3.5.1 – Usinas termoelétricas a vapor


O vapor em uma usina termoelétrica em ciclo Rankine pode ser gerado por diferentes
fontes de calor, como a energia de combustíveis fósseis, energia nuclear, energia térmica so-
lar, biocombustíveis (bagaço de cana, cavaco de lenha etc.), resíduos orgânicos, em síntese,
qualquer matéria-prima ou forma de energia que possa ser aproveitada como fonte de calor na
geração de vapor. Na indústria também é comum haver a utilização de parte do vapor gerado
para algum processo industrial, além de ser utilizado para geração de energia elétrica. Esse
processo é denominado cogeração (figura 2.32).

Figura 2.32 – Diagrama esquemático de uma usina termoelétrica a carvão

Ciclo de admissão de combustível/ar: 1. Transportador de carvão; 2. Tremonha de car-


vão; 3. Entrada de ar; 4. Pré-aquecedor de ar; 5. Ventilador de circulação forçada; 6. Moinho
de combustível pulverizado; 7. Tremonha de cinzas.

Ciclo de vapor e turbinas: 8. Tambor de vapor da caldeira; 9. Superaquecedor; 10. Tur-


bina de alta pressão (HP); 11. Válvula reguladora de vapor; 12. Reaquecedor da caldeira; 13.
Turbina de pressão intermediária (IP); 14. Turbina de baixa pressão (LP); 15. Condensador;
16. Bomba de extração de condensado; 17.  Desaerador; 18.  Bomba de água de alimenta-
ção; 19. Aquecedor de alimentação; 20. Economizador; 21. Torre de resfriamento; 22. Bomba
d’água de resfriamento.
76    Geração de energia elétrica

Ciclo de Eliminação de Resíduos: 26. Ventilador de tração induzido; 27. Precipitador


eletrostático; 28. Chaminé.

Ciclo de Produção de Energia Elétrica: 23. Gerador síncrono; 24. Transformador ele-
vador; 25. Rede elétrica.

A Figura 2.32 apresenta o diagrama esquemático de uma usina termoelétrica que utiliza
o carvão como combustível. No início do processo da planta, o carvão é transportado através
de esteiras (1) do seu local de armazenamento, moído e transformado um pó muito fino por
grandes esferas de metal na tremonha de carvão (2). Por outro lado, o ar necessário para a
combustão do carvão é admitido pela entrada de ar (3) é pré-aquecido no pré-aquecedor de ar
(4), e acionado pelo ventilador de circulação forçada (5). O carvão triturado (combustível) e o
ar pré-aquecido são então conduzidos para preparação da queima no moinho de combustível
pulverizado (6). A mistura combustível/ar-quente é forçada em alta pressão na caldeira, onde
se inflama rapidamente. Uma parte das cinzas resultantes da queima do combustível precipita
e é processada na tremonha de cinzas (7) para reaproveitamento no moinho de combustível.
A água de alto teor de pureza e desmineralizada, de forma a evitar problemas de incrusta-
ções e corrosões na caldeira, flui verticalmente pelas paredes revestidas com tubos da caldeira,
onde se transforma em vapor, é direcionada para o tambor de vapor da caldeira (8), onde o
vapor é separado da água não transformada em vapor. O vapor formado passa através de um
coletor no teto do tambor para o superaquecedor (9), onde sua temperatura e pressão aumen-
tam rapidamente para cerca de 200 bar e 570°C, o suficiente para fazer as paredes do tubo bri-
lharem de um vermelho opaco. O vapor é então canalizado para a turbina de alta pressão (10),
a primeira de um processo de turbina de três estágios. Uma válvula reguladora de vapor (11)
permite o controle manual da turbina e o acompanhamento automático do ponto de ajuste.
O vapor da exaustão da turbina de alta pressão em pressão e temperatura reduzidos é re-
tornado ao reaquecedor da caldeira (12). O vapor reaquecido é então passado para a turbina
de pressão intermediária (13), e a partir daí é conduzido para o conjunto da turbina de baixa
pressão (14). O vapor que sai, agora um pouco acima do seu ponto de ebulição, entra em con-
tato térmico com a água fria (bombeada da torre de resfriamento) no condensador (15), onde
ele se condensa novamente, criando condições próximas ao vácuo no interior do condensador.
A água condensada é então direcionada pela bomba de extração de condensado (16) para um
desaerador (17), e depois bombeada pela bomba de água de alimentação (18) e pré-aquecida,
primeiro em um aquecedor de alimentação (19), alimentado pelo vapor retirado do conjunto
de alta pressão e depois no economizador (20), antes de retornar ao tambor da caldeira.
A água de resfriamento do condensador é pulverizada dentro de uma torre de resfriamen-
to (21), criando uma nuvem de vapor de água visível das redondezas da central termoelétrica
antes de ser bombeada (22) de volta para o condensador no ciclo da água de resfriamento. Por
sua vez, o gás de exaustão da caldeira é aspirado pelo ventilador de tração induzido (26) através
de um precipitador eletrostático (27) e é então conduzido para a chaminé da planta (28).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   77 

Em aplicações típicas, os três conjuntos de turbinas são acoplados no mesmo eixo a um


gerador síncrono (23), que gera a potência elétrica em baixa tensão (tipicamente 13,8-18 kV).
A tensão é elevada pelo transformador elevador da unidade geradora (24) para uma tensão
mais elevada (normalmente entre 230-500 kV), de forma a reduzir as perdas na transmissão.
O transformador elevador é conectado à rede de transmissão (25).

2.3.5.2 – Usinas termoelétricas a gás natural


Uma usina termoelétrica a gás natural e uma usina na qual a energia química armazenada
nesse combustível, que é principalmente o metano, é convertida sucessivamente em energia
térmica, energia mecânica e, finalmente, energia elétrica. Embora não possam exceder o li-
mite do ciclo de Carnot para a conversão de energia térmica em trabalho útil, o excesso de
calor pode ser aproveitado em usinas de ciclo combinado a vapor ou para a produção de água
quente ou vapor para utilização em processos industriais ou em sistemas de calefação, só para
enumerar algumas de suas possíveis utilizações. Essas usinas podem ser divididas nos tipos
descritos abaixo, de acordo com o tipo de queima do gás ou arranjo físico:

• Motores de combustão interna


Essas centrais são caracterizadas por conjuntos de motores de combustão interna que
utilizam l o gás natural como fonte primária de energia mecânica. Esses motores são conec-
tados por meio de um eixo diretamente, ou através de uma caixa de engrenagens a geradores
síncronos. Essa alternativa é utilizada geralmente em emergências. Essas usinas têm como
característica principal baixa potência, em geral algumas poucas dezenas de megawatts.
No Brasil ainda são utilizadas, pontualmente, com destaque para o Sistema Manaus, como
herança do período em que ele operava isoladamente e essas usinas operavam, assim como
até os dias de hoje, com gás natural proveniente do campo petrolífero de Urucu, localizado no
município de Coari, a 650 km da capital Manaus.

• Turbina a gás de ciclo aberto (OCGT)


Em uma turbina a gás de ciclo simples que utilizam o Ciclo Brayton. É também deno-
minada turbina a gás de ciclo aberto (Open Cicle Gas Turbne – OCGT), o gás natural em
combustão aciona, através de um eixo mecânico, um gerador síncrono para gerar eletricidade.
Esse tipo de planta é de construção relativamente barata e pode até mesmo ser construída
a partir de turbinas de uso aeronáutico, nesse caso são denominadas usinas aeroderivadas.
Houve uma grande demanda no Brasil por esse tipo de usina no início dos anos 2000, devido
ao período de racionamento, principalmente das aeroderivadas, dado suas características de
baixo custo e instalação em um período curto.
Outra característica muito interessante desse tipo de usina termoelétrica é a possibilida-
de de partidas rápidas, característica essa que pode fazer dessa usina um recurso de geração
78    Geração de energia elétrica

muito importante para alocação de reserva operativa, para fazer frente à intermitência de
centrais geradoras eólicas e fotovoltaicas. Devido à sua menor eficiência energética, em razão
do ciclo aberto, essas centrais só são viáveis economicamente para geração de energia para o
atendimento da reserva operativa (reserva a frio), ou durante algumas horas do dia para aten-
dimento da carga em períodos de ponta.

2.3.5.3 – Usinas termoelétricas a gás natural operando em Ciclo Combinado (CCGT)


As usinas a gás de ciclo combinado (Combined Cicle Gas-Turbine – CCGT) consistem
em turbinas a gás natural de ciclo simples, que usam o Ciclo de Brayton, seguidas por um
gerador de vapor de recuperação de calor e uma turbina a vapor que usa o ciclo de Rankine.
A configuração mais comum (figura 2.33) são duas turbinas a gás que suportam uma turbina a
vapor. Eles são mais eficientes do que as usinas de ciclo simples e podem alcançar eficiências
um pouco acima de 60% e tempos de despacho de cerca de meia hora [28].

Figura 2.33 – Diagrama esquemático de uma usina termoelétrica a gás natural de ciclo combinado

Turbina a gás e gerador síncrono: 1. Entrada de gás natural; 2. Câmara de combustão;


3. Entrada e filtro de ar; 4. Compressor da turbina; 5. Exaustão; 6. Eixo mecânico de acopla-
mento; 7. Gerador síncrono; 8. Transformador elevador; 9. Rede elétrica.

Turbina a vapor e gerador síncrono: 10. Caldeira de recuperação de calor e geração


de vapor (Heat recovery steam generator – HRSG); 11. Tubulação de vapor aquecido; 12.
Turbina a vapor; 13. Condensador; 14. Tubulação de vapor frio; 15. Torre de resfriamento;
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   79 

16. Bomba-d’água de resfriamento; 17. Eixo mecânico de acoplamento; 18. Gerador síncro-


no; 19. Transformador elevador; 20. Rede elétrica.
A Figura 2.33 apresenta o diagrama esquemático de uma usina termoelétrica de ciclo
combinado.
No início do processo da planta, o gás natural (1) é injetado em forma de aerossol pelos
injetores na câmara de combustão (2) da turbina a gás. O ar admitido pelo compressor dessa
turbina (3) é comprimido, de forma a aumentar sua densidade, é então misturado com o gás
na câmara de combustão, quando se inicia a queima do combustível. Esse processo continua
na turbina a gás (4), sendo que a mistura é cada vez mais comprimida, de forma a aumentar
sua densidade e capacidade térmica. Após a combustão, o resíduo é eliminado pela exaustão
da turbina (5). Em centrais de ciclo aberto, o resíduo, extremamente aquecido, é eliminado na
atmosfera, já em centrais de ciclo combinado, o calor do produto da queima é aproveitado na
geração de vapor para utilização em uma turbina a vapor, conforme será visto a seguir. Tanto o
compressor, quanto a turbina a gás são conectados através de um eixo mecânico (6) ao gerador
síncrono (7) da turbina a gás, que gera a potência elétrica em baixa tensão (tipicamente 13,8-
18 kV). A tensão é elevada pelo transformador elevador da unidade geradora (8) para uma
tensão mais elevada, de forma a reduzir as perdas na transmissão (normalmente entre 230-500
kV). O transformador é conectado na rede de transmissão (9).
Em centrais de ciclo combinado, é instalada uma Caldeira de recuperação de calor e ge-
ração de vapor (10) (Heat recovery steam generator – HRSG), cuja função é retirar parte do
calor dos gases de exaustão da turbina a gás, e produzir vapor para mover uma turbina a vapor.
O vapor gerado na caldeira de recuperação é conduzido por uma tubulação de vapor aquecido
(11) até a turbina a vapor (12). Após a utilização da capacidade térmica do vapor na turbina, o
vapor frio é direcionado para o condensador (13), onde ele é transformado em água, que é no-
vamente conduzida através de uma tubulação de água fria (14) para a caldeira de recuperação
(11), fechando o ciclo da turbina a vapor.
A água de resfriamento do condensador (13) é pulverizada dentro de uma torre de resfria-
mento (15), criando uma nuvem de vapor de água visível das redondezas da central termoelé-
trica, antes de ser bombeada (16) de volta para o condensador no ciclo da água de resfriamento.
Da mesma forma que na turbina a gás, a turbina a vapor é conectada através de um eixo
mecânico (17) ao gerador síncrono (18) da turbina a gás, que gera a potência elétrica em baixa
tensão (tipicamente 13,8-18 kV). A tensão é elevada pelo transformador elevador da unidade
geradora (19) para uma tensão mais elevada, de forma a reduzir as perdas na transmissão
(normalmente entre 230-500 kV). O transformador é conectado na rede de transmissão (20).
Como já comentado acima, as usinas termoelétricas de ciclo combinado (figura 2.33) têm
um rendimento superior as de ciclo aberto, devido ao aproveitamento de parte do calor gerado
na queima do gás natural, para a geração de vapor na caldeira de recuperação, que é então uti-
lizado em uma turbina a vapor. Dessa forma, são atingidos rendimentos de até 64%, enquanto
o rendimento máximo atingido pelo ciclo aberto é de 34% [29].
80    Geração de energia elétrica

2.3.5.4 – Usinas termoelétricas no sistema interligado nacional


As usinas termoelétricas que utilizam ciclo a vapor (ciclo de Rankine), em geral, possuem
ciclos térmicos bastante complexos, que fazem com que elas tenham que ser utilizadas próxi-
mo à sua potência nominal. Esse regime, denominado base load, permite apenas modulações
de potência pequenas e muito lentas, de forma a não comprometer a integridade dos equi-
pamentos da usina, principalmente das turbinas. Aplicações de turbinas a vapor que exijam
modulação de potência, e partidas e paradas frequentes, necessitam de projetos de turbinas a
vapor específicos, em geral com multiestágios (figura 2.32) para reduzir o stress térmico nos
componentes da turbina. São também necessários controles específicos para monitorar as par-
tidas, paradas e modulações de potência, podendo levar, em casos limites, ao desligamento da
planta, caso as condições operativas possam provocar danos ao equipamento.
As usinas termoelétricas a gás natural (ciclo Brayton), principalmente as aeroderivadas,
têm uma flexibilidade maior quanto aos tempos de partida, parada e modulação da potên-
cia gerada, que permite que elas possam ser utilizadas para partidas rápidas para utilização,
por exemplo, na reserva não girante. Uma usina termoelétrica em ciclo combinado pode ser
projetada para, em situações operativas específicas, operar em ciclo aberto, porém o aspecto
econômico da queda no rendimento em razão da abertura do ciclo deve ser levado em conta.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   81 

GLOSSÁRIO DO CAPÍTULO

Constante solar (I0) – é uma densidade de fluxo que mede a energia total da radiação recebida
na Terra pelo Sol fora da atmosfera terrestre, por unidade de área, em uma superfície teórica
perpendicular aos raios solares e à distância média da Terra ao Sol (1 UA). Essa medida é re-
alizada por satélites em órbita terrestre, e seu valor é de 1.362 W/m2, no máximo solar.

Efeito fotovoltaico – consiste na criação de tensão elétrica contínua ou de uma corrente elé-
trica contínua correspondente num material semicondutor, após a sua exposição à luz solar.
Embora o efeito fotovoltaico esteja diretamente relacionado com o efeito fotoelétrico, ambos
são processos distintos. No efeito fotoelétrico, os elétrons são ejetados da superfície de um
material após exposição do mesmo à radiação com energia suficiente. O efeito fotovoltaico é
diferente, pois os elétrons gerados são transferidos entre bandas diferentes (i.e., das bandas de
valência para bandas de condução), dentro do próprio material semicondutor, resultando no
desenvolvimento de tensão elétrica contínua entre dois elétrodos [3].

Irradiância ou radiância solar – taxa na qual a energia solar atinge uma unidade de área. A
unidade de medida normalmente utilizada é o W/m2.

Radiação ou irradiação solar – integral em um determinado período da irradiância solar. A


unidade de medida normalmente utilizada é o W.h/m2.

Unidade astronômica – distância média entre a Terra e o Sol – cerca de 350 milhões de quilô-
metros, uma vez que a órbita da Terra em torno do Sol é ligeiramente elíptica. Essa distância é
definida como um padrão de medição de distância, sendo denominada 1 unidade astronômica,
ou 1 UA.
82    Geração de energia elétrica

REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

1. Coppe-UFRJ. Planeta Coppe Notícias, Coppe – UFRJ, 19 dezembro 2006. [On-line]. Available: http://
www.coppe.ufrj.br/pt-br/geracao-de-energia-eletrica-pelas-ondas-do-mar-0. Acesso em: 9 dezembro
2019.
2. Kopp G, Lean JL. A New, Lower Value of Total Solar Irradiance: Evidence and Climate Significance.
Geophysical Research Letters; 2011.
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O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   83 

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3
O SISTEMA INTERLIGADO NACIONAL E O
PLANEJAMENTO DA OPERAÇÃO ENERGÉTICA

3.1 – Características do Sistema Interligado Nacional

Em razão de suas características naturais, o Brasil tem vocação própria para desenvolver a
hidroeletricidade. A análise da potência instalada no Brasil indica, de forma inequívoca, que a
expansão do parque gerador ocorreu, principalmente, através da instalação de usinas hidroelé-
tricas. Observa-se que a hidroeletricidade continua, na matriz de energia elétrica atual, como
a principal fonte de geração de energia, embora sua participação no total da potência instalada
do SIN venha sofrendo redução ao longo dos anos, representando hoje cerca de 67,6% da po-
tência elétrica instalada no país, sendo complementada pelas usinas termoelétricas (22,4%),
usinas eólicas (8,9%) e fotovoltaicas (1,1%).
Deve-se observar que a característica de predominância das usinas hidroelétricas na capa-
cidade instalada do SIN, independentemente da oportunidade técnica, estratégica, econômica e
necessária de novas fontes de geração, complementar ou distribuída ao longo da rede, deverá
perdurar por várias décadas, pois as expectativas da escala de crescimento do mercado de energia
elétrica, aliada à vocação natural à hidroeletricidade (vale lembrar que somente 27% do poten-
cial hidroelétrico competitivo existente no país foram aproveitados), conferem ao Setor Elétrico
brasileiro o desafio de implementar, a cada ano, montantes consideráveis de oferta de geração. A
tabela 3.1 demonstra este fato para o horizonte de dezembro de 2018 a dezembro de 2023.
Tabela 3.1– Oferta do SIN
2018 2023 Crescimento 2018-2023
Tipo
MW % MW % MW %
Hidráulica 109.212 67,6 114.585 64,4 5.373 4,9
Nuclear 1.990 1,2 1.990 1,1 - -
Gás/GNL 12.821 7,9 17.861 10,0 5.040 39,3
Carvão 2.672 1,7 3.017 1,7 345 12,9
Óleo/Diesel 4.164 2,9 4.900 2,8 286 6,2
Biomassa 13.353 8,3 13.871 7,7 428 3,2
Outras(1) 779 0,5 1.000 0,6 221 28,4
Eólica 14.305 8,9 17.281 9,7 2.976 20,8
Solar 1.780 1,1 3.626 2,0 1.846 103,7
Total 161.526 100,0 178.041 100,00 16.515 10,2
(1) Usinas Biomassa com CVU
86    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

A Figura 3.1 apresenta os montantes de geração verificados em 2018, por fonte de produ-
ção, sendo a geração hidrelétrica responsável por aproximadamente 70% do atendimento da
carga do SIN (66.559 MWmed).

Figura 3.1 – Produção de energia em 2018 (em MWmed)

Outra característica singular do SIN é sua dimensão continental, o que lhe confere uma
complexidade operacional, quando comparado aos sistemas de outros países.
Para visualização desta característica, a Figura 3.2 representa, em escala, a inserção da
Rede Básica do Sistema Interligado Nacional no continente europeu. Nesta figura, podemos
observar que a interligação entre os subsistemas do SIN, tendo-se como referência o subsiste-
ma Sul, na cidade de Porto Alegre, e o subsistema Norte, na cidade de Manaus, corresponde
à inserção no continente europeu de uma malha de interligação entre as cidades de Lisboa
(Portugal) e Estocolmo (Suécia).

Figura 3.2 – Comparação Brasil – Europa


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   87 

Dada a predominância de usinas hidroelétricas (cerca de 68 % da capacidade instalada) no


SIN, estas são responsáveis por cerca de 74% da energia produzida anualmente. Cabe destacar
que esse percentual é variável ao longo dos anos, em razão das condições hidrológicas e das
políticas de otimização eletroenergética verificadas em cada ano.
Entretanto, a fim de se aproveitar, de forma ótima, os recursos energéticos existentes no
Brasil foi necessário o estabelecimento de uma extensa malha de transmissão, a fim de se
aproveitar a sazonalidade hidrológica entre as regiões do Brasil.
Sob este enfoque, a malha de transmissão funciona como se fosse uma usina virtual, pois
permite a transferência de excedentes energéticos entre as regiões do país, permitindo a otimi-
zação dos estoques armazenados nos reservatórios das usinas hidrelétricas.

Submercado/subsistema
Em sistemas elétricos com predominância hidráulica, que é o caso do sistema brasileiro,
o problema fundamental é a produção de energia para atendimento aos requisitos de merca-
do, nos períodos hidrologicamente desfavoráveis. Conforme visto anteriormente, as grandes
bacias brasileiras apresentam uma diversidade hidrológica que proporciona um acréscimo na
energia firme total do país através das interligações elétricas, tornando-as de grande importân-
cia para a otimização do sistema.
O Brasil adotou um modelo de preços por submercados que foram instituídos pelo Decre-
to No. 2.655, de 2 de julho de 1998, que regulamentou a Lei No. 9.648, de 27 de maio de 1998.
O critério determinante para a definição das áreas de mercado seria a presença e duração
de restrições relevantes de transmissão nos fluxos de energia dos sistemas interligados. No
sistema brasileiro, estão definidos quatro submercados, Sul, Sudeste/Centro Oeste, Norte e
Nordeste, havendo, portanto, um preço separado para cada submercado.

A complementariedade hidrológica e as interligações entre subsistemas


Analisando a Figura 3.3, pode-se ter uma adequada visualização da complementariedade
hidrológica entre as regiões do país. Nesta Figura estão representadas as energias naturais
afluentes, ENAs, em valores médios mensais do histórico de afluências, período de 1931 a
2018, bem como seu valor médio anual, para cada uma das regiões do país.
Observa-se, inicialmente, a complementariedade hidrológica existente entre as regiões
Sudeste/Centro-Oeste e Sul. A distribuição das energias naturais afluentes médias mensais
apresenta uma clara complementariedade hidrológica entre essas regiões, pois os períodos
secos e úmidos não são coincidentes.
Na Região Sudeste/Centro-Oeste, o período úmido ocorre de dezembro a abril, onde se
observam afluências superiores à média anual. Nesse mesmo período, na Região Sul, as aflu-
ências encontram-se abaixo do valor médio anual, ou seja, a região encontra-se em período
seco.
88    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

De forma semelhante, ao analisar-se a Região Sul, observa-se que o período úmido ocorre
de junho a novembro, período em que as ENAs mensais estão superiores à média anual. Nesse
mesmo período, as Regiões Sudeste/Centro-Oeste encontram-se em seu período seco.

Figura 3.3 – Complementariedade hidrológica

Como visto, há uma clara complementariedade hidrológica, que permite o intercâmbio


de excedentes energéticos entre essas regiões, durante os respectivos períodos úmidos, bem
como o uso dos estoques que apresentarem menor custo. Dessa forma, foi estabelecida em
1982 a interligação entre as Regiões Sudeste/Centro-Oeste e Sul.
A análise das ENAs das Regiões Norte e Nordeste permite observar a inexistência de
complementariedade hidrológica entre essas Regiões, uma vez que há coincidência entre os
períodos secos e úmidos. Entretanto, durante o período úmido, as afluências à UHEs Tucuruí e
Belo Monte são extremamente elevadas, conduzindo à ocorrência de vertimentos turbináveis
nestas usinas, passíveis de serem exportados.
Por outro lado, a Região Nordeste, embora tenha um regime hidrológico semelhante à
Região Norte, é exclusivamente dependente das afluências à Bacia do rio São Francisco, não
apresentando, portanto, diversidade hidrológica. Assim sendo, os excedentes energéticos da
Região Norte são importantes para a complementação energética da Região Nordeste. Dessa
forma, no início da década de 1980 (1981), foi estabelecida a interligação Norte/Nordeste.
Com a finalidade de permitir a otimização integradas das quatro regiões do país, que
constituem o Sistema Interligado Nacional, foi concluída, em 1999, a interligação Norte/Sul.
Atualmente, a malha de interligação do SIN tem a configuração apresentada nas Figuras
3.4 e 3.5.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   89 

Figura 3.4 – Malha de Interligação – Norte/Nordeste

Figura 3.5 – Malha de Interligação – Sul/Sudeste Centro-Oeste


A Figura 3.6 destaca a importância da malha de transmissão na interligação entre os sub-
sistemas e bacias hidrográficas do SIN.
90    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Figura 3.6 – Malha de transmissão

A Figura 3.7 mostra a Rede de Operação do SIN, representada pelas linhas de transmissão
com tensões entre 138 KV e 750 KV.

Figura 3.7 – Rede de Operação do SIN


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   91 

Limites das interligações


As interligações entre submercados são formadas por um conjunto de linhas e/ou transfor-
madores operando em paralelo e conectando as subestações de fronteira dos dois submercados.
A Figura 3.8 mostra os quatro submercados e todas as linhas de interligação existentes em
janeiro de 2020 – Norte, Nordeste, Sudeste/Centro-Oeste e Sul.

Figura 3.8 – Linhas de interligação em Janeiro de 2020

Em alguns casos, estas linhas de fronteira se estendem em série pelos dois submercados
envolvidos, formando longos troncos de transmissão, como pode ser observado na Figura
3.9. Em alguns casos, todos esses troncos podem impactar de forma significativa o limite da
interligação em questão.
Os limites de intercâmbio entre submercados se constituem em informações importantes
para os programas de otimização energética, que são responsáveis pelo cálculo do CMO/PLD.
Esses valores limites representam o máximo de energia que cada submercado pode exportar
ou importar, com a segurança e a qualidade preconizadas pelos Procedimentos de Rede, para
prover o atendimento ao mercado de acordo com os recursos de geração disponíveis.
Para a determinação dos limites entre os subsistemas que visam subsidiar as análises
energéticas realizadas pelo PEN, são considerados todos os cenários energéticos que podem
ocorrer ao longo do ano.
92    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

No cálculo dos limites são considerados cenários energéticos caracterizados a partir da di-
versidade hidrológica entre as bacias hidrográficas. Para cada cenário energético, os intercâm-
bios entre os subsistemas são aumentados até que alguma violação no sistema de transmissão
seja encontrada, podendo essa violação ser de regime permanente ou dinâmico.

Figura 3.9 – Sistema Norte-Nordeste – Janeiro de 2020

Para a interligação Sul-Sudeste/Centro-Oeste são analisados dois cenários considerando


cada submercado como exportador. Para as interligações Norte/Sul, Norte/Nordeste e Sudes-
te/Nordeste são analisados diversos cenários, considerando-se cada um dos três subsistemas
em análise como máximo exportador e máximo importador. A Figura 3.10 mostra as grande-
zas que melhor caracterizam o desempenho das interligações nos cenários Norte e Sudeste
Exportador.
Os limites são definidos buscando-se o valor da máxima transferência de potência entre
os subsistemas, por meio da elevação da geração no subsistema exportador e redução no im-
portador, verificando o desempenho do sistema quando submetido a contingências simples, ou
duplas, conforme caracterizado nos Procedimentos de Rede, de qualquer das instalações do
SIN e em qualquer ponto do sistema de transmissão.
Todos os pontos analisados são avaliados em regimes permanente e dinâmico. Na análise
em regime permanente, o foco é o atendimento aos requisitos mínimos de tensão e de capa-
cidade de carregamento dos equipamentos, tanto com a rede completa quanto em contingên-
cia. Nas avaliações do desempenho dinâmico é analisado o comportamento em situações de
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   93 

contingências simples e duplas que se enquadrarem na categoria de contingência de circuitos


que compartilhem a mesma torre ou faixa de passagem.1
Portanto, todos os limites são definidos de forma que o sistema suporte dinamicamente to-
das as contingências simples além das contingências duplas em consonância com os critérios
de segurança estabelecidos nos Procedimentos de Rede.

Figura 3.10 – Interligações nos cenários Norte e Sudeste Exportador

Outro critério de confiabilidade de operação específico de caráter definitivo, estrutural e


distinto do padrão definido nos Procedimentos de Rede do ONS poderá ser adotado pela ope-
ração e assim será considerado no cálculo dos limites.
O desempenho é avaliado pelo atendimento ou não aos critérios de segurança e qualidade
definidos nos Procedimentos de Rede (níveis de tensão, carregamento dos circuitos, perda
de estabilidade etc.). Em caso de serem observadas violações, os valores de transferência de
potência entre os submercados devem ser reduzidos até que os critérios sejam atendidos. Esse
ponto de operação caracteriza o limite de intercâmbio entre os submercados em análise.
Destaca-se que tanto as contingências limitantes como as instalações nas quais são ob-
servadas violações podem ou não estar diretamente associadas às instalações na fronteira dos
submercados.

Capacidade de armazenamento
A capacidade de armazenamento máximo do SIN, previsto para o ano de 2019 é de
291.547 MWmês, distribuídos pelas regiões, conforme indicado na Figura 3.11. Observa-se a
predominância do subsistema SE/CO, com cerca de 70% do armazenamento total, bem como,

1  Conforme Submódulo 23.3 dos Procedimentos de Rede “Diretrizes e Critérios para Estudos Elétricos.
94    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

em destaque, o quadrilátero dos principais reservatórios de regularização da região SE/CO,


localizados nos estados de Minas Gerais e Goiás.

Figura 3.11 – Percentuais de Subsistema em relação ao SIN

Acoplamentos Temporal e Espacial


O SIN é responsável pelo suprimento de energia de cerca de 99% do território nacional.
Os 1% restantes constituem-se em Sistemas Isolados, localizados principalmente na Região
Norte, compreendendo os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondô-
nia e Roraima, além da ilha de Fernando de Noronha, pertencente ao estado de Pernambuco,
sendo estes atendidos predominantemente por usinas térmicas que usam o óleo diesel como
combustível.
Finalizando, pode-se dizer que no SIN existe:
• Interdependência na Geração – a operação de uma determinada usina depende das
vazões liberadas a montante por outras usinas, que podem pertencer a outras empre-
sas, ao mesmo tempo em que a sua operação afeta as usinas a jusante, de forma análo-
ga, conforme ilustrado na Figura 3.12.
• Integração Geração-Transmissão – a utilização dos recursos de geração e transmis-
são dos sistemas interligados permite reduzir custos operativos, minimizando a produ-
ção térmica e o consumo de combustíveis sempre que houver superávits hidrelétricos
em outros pontos do sistema. Em períodos de condições hidrológicas desfavoráveis,
as térmicas contribuem para o atendimento ao mercado como um todo e não apenas
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   95 

aos consumidores do submercado que estão localizadas. Assim, a participação com-


plementar das usinas térmicas no atendimento do mercado consumidor exige interco-
nexão e integração entre os Agentes.
• Interconexão na Transmissão – a transmissão transportando grandes blocos de ener-
gia para os centros de consumo e funcionando como usinas virtuais, interligando as
bacias e as regiões geográficas, viabilizando assim a otimização pela exploração de
complementariedades hidrológicas, permitindo o aproveitamento ótimo da água, ou
seja, gerando energia elétrica ou armazenando água onde for mais conveniente.

Figura 3.12 – Usinas em cascata

Em resumo, a natureza do Sistema Interligado Nacional faz com que exista um acopla-
mento espacial e temporal das decisões tomadas na sua operação eletroenergética. O uso, no
presente, mais ou menos intensivo dos estoques de água nos diversos reservatórios, frente às
incertezas das condições hidrometeorológicas e do consumo, irá afetar a operação futura do
Sistema, em termos de garantia de atendimento e em termos de custos ao consumidor final.
Por outro lado, as decisões operativas no presente dependem de como se imagina a confi-
guração futura do Sistema – quantas usinas, quantas linhas de transmissão, qual é o mercado
a ser atendido, enfim, pode-se usar mais ou menos a “poupança energética dos reservatórios”
no presente dependendo da expansão prevista da rede de transmissão e da oferta de energia
elétrica.
Essas características, aliadas ao fato de que a expansão da geração e da transmissão de-
manda longos tempos de maturação, fazem com que a operação em tempo real do SIN seja
precedida de uma etapa de Planejamento da Operação, de forma a garantir, ao menor custo,
a confiabilidade do sistema, a qualidade e a quantidade de energia requerida pelo mercado
consumidor.
96    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

3.2 – O problema de planejamento da operação energética

O problema de planejamento da operação energética de um sistema hidrotérmico de geração


de energia elétrica consiste em determinar metas de geração para as usinas hidroelétricas e ter-
moelétricas para cada estágio ao longo do horizonte de estudo, atendendo à demanda de energia
elétrica, às restrições operativas das usinas e às restrições elétricas do sistema. A determinação
da alocação ótima dos recursos hídricos e térmicos é norteada segundo um determinado critério,
como o critério de minimização dos custos globais de produção da energia elétrica.
A princípio, pode-se imaginar que a água armazenada nos reservatórios não possui valor
associado, logo seria mais vantajoso atender a demanda utilizando primeiramente a água es-
tocada nos reservatórios evitando o acionamento de usinas termoelétricas, que possuem um
custo direto associado ao seu combustível. Porém, considerando que a capacidade de arma-
zenamento em um sistema é limitada pela capacidade de seus reservatórios, e que a afluência
futura aos aproveitamentos é desconhecida, pode-se dizer que há uma dependência entre a
decisão operativa de hoje e os custos operativos do futuro.
Esse acoplamento entre a decisão da operação tomada no presente e suas consequências
no futuro é conhecida como o dilema do decisor e está ilustrado na Figura 3.13. Suponha que
a decisão tomada tenha sido utilizar a energia hidroelétrica para atender a demanda presente e
que, no futuro, ocorra um período hidrológico ruim caracterizado por baixas afluências, então
poderá ser necessário o uso de geração térmica de custo elevado ou, até mesmo, interromper
o fornecimento de energia. Logo, o custo total de operação será elevado. Se, por outro lado, a
decisão for atender a demanda presente com geração térmica e no futuro ocorrer um período
hidrológico favorável com afluências altas, então poderá ocorrer vertimento no sistema, ca-
racterizando um desperdício de energia e, consequentemente, um aumento desnecessário do
custo total de operação. Dessa forma, pode-se perceber que o benefício da utilização da água
armazenada nos reservatórios em um determinado estágio é medido em razão da economia de
combustível das usinas termoelétricas e déficits em estágios futuros. Assim, no processo de
tomada de decisão da operação de um sistema hidrotérmico é essencial comparar o benefício
imediato do uso da água e o benefício futuro de seu armazenamento.

Figura 3.13 – Dilema do decisor


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   97 

A Função de Custo Imediato (FCI), ilustrada na Figura 3.14, é utilizada para representar o
benefício do uso imediato da água. Observando a FCI é possível verificar que o custo operati-
vo imediato de gerar energia a partir do desestoque de água dos reservatórios é nulo, já o custo
imediato obtido a partir da geração termoelétrica é dado pelo custo do combustível utilizado,
que é significativamente mais alto.

Figura 3.14 – Função de custo imediato (FCI)

Por outro lado, o custo futuro de um reservatório vazio tende a ser alto, pois espera-se gas-
tar mais combustível no futuro. O reservatório cheio, por sua vez, tende a ter um menor custo
futuro, pois há um estoque de água que dispensará geração térmica. Dessa forma, o benefício
de armazenar a água nos reservatórios no presente para o seu uso futuro pode ser representado
através de uma Função de Custo Futuro (FCF), como mostrado na Figura 3.15.

Figura 3.15 – Função de custo futuro (FCF)

Nas Figuras apresentadas, o eixo das abscissas representa o estado do sistema que, neste
exemplo ilustrativo, é dado pelo volume final armazenado nos reservatórios das usinas hi-
droelétricas do sistema, e o eixo das ordenadas representa os valores do custo futuro e custo
imediato expressos em unidades monetárias.
A Função do Custo Total de Operação (FCT), por sua vez, corresponde à soma das fun-
ções de custo imediato (FCI) e custo futuro (FCF), conforme equação (3.1). O custo total de
operação tem um valor mínimo, que corresponde ao uso ótimo da água armazenada, e pode
ser obtido calculando-se o ponto onde as derivadas da FCI e da FCF com relação ao armaze-
namento se igualam em módulo, de acordo com (3.2) e como mostrado na Figura 3.16.
98    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

FCT = FCI + FCF (3.1)

Figura 3.16 – Função de custo total (FCF)

∂ FCT ∂ FCI + FCF ∂ FCI ∂ FCF (3.2)


= = + = 0
∂V ∂V ∂V ∂V
∂ FCI ∂ FCF
=−
∂V ∂V
A derivada da função de custo futuro em relação ao volume armazenado, como ilustrado
na Figura 3.17, é usualmente conhecida como custo marginal da água ou “valor da água”,
pois traduz o custo de oportunidade da água representado pelo benefício incremental ao longo
do tempo da água estocada no reservatório, com relação à redução dos cortes de carga e da
economia nos custos de geração térmica no futuro. Notem que à medida que o reservatório
vai ficando mais cheio, o valor da água se reduz, tendendo a zero quando o reservatório se
aproxima da sua capacidade máxima de armazenamento.

Figura 3.17 – “Valor da água”


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   99 

Assim, observando a Figura 3.16 pode-se verificar que o despacho energético que conduz
ao menor custo total é obtido ao se equilibrar a geração hidráulica e térmica de forma a igua-
lar o valor da água (custo futuro) ao custo de geração da térmica mais cara que estiver sendo
acionada (custo imediato).
O custo imediato corresponde às despesas decorrentes das decisões presentes, tais como o pa-
gamento do combustível a ser utilizado para a geração em usinas termoelétricas. Logo, é possível
determiná-lo sem grande dificuldade. Mas para determinar qual é o custo futuro, por sua vez, é ne-
cessário saber o que ocorrerá nos próximos anos. Dadas as características já mencionadas do SIN, o
custo futuro depende fortemente das afluências que irão ocorrer nos rios em que estão instaladas as
usinas hidrelétricas. Como as vazões afluentes têm alto grau de incerteza, uma forma muito comum
para representar esta variável aleatória ao longo do horizonte de planejamento é através de uma ár-
vore de cenários obtida a partir da discretização da variável aleatória. Na Figura 3.18 (a) é ilustrada
uma árvore de cenários construída para um problema de quatro estágios e três realizações desta
variável aleatória por período, totalizando 27 cenários ou trajetórias possíveis. Cada realização do
conjunto de realizações da variável aleatória também é conhecida como abertura.
Uma alternativa para se obter os cenários que compõem a árvore é fazer uso de cenários
de afluência gerados sinteticamente por um modelo estatístico baseado no histórico conhecido
de vazões afluentes. Com base nos diversos cenários possíveis de afluência futura, é possível
construir uma aproximação da função de custo futuro e assim determinar uma política ótima
de operação para o sistema. A metodologia utilizada para a modelagem da incerteza hidroló-
gica será abordada no Capítulo 6 deste livro.

Figura 3.18 – Árvore de cenários: (a) árvore completa, (b) sub-árvore

Diversos métodos e estratégias têm sido propostos para a solução do problema de plane-
jamento da operação energética. Neste livro, trataremos da estratégia e do método de solução
adotados nos modelos computacionais utilizados atualmente pelo ONS. Todavia serão forne-
cidas referências bibliográficas para que o leitor possa se aprofundar nos temas abordados ao
longo do capítulo.
100    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

3.3 – Estratégia de solução

A coordenação do planejamento da operação energética é uma tarefa bastante complexa dada


as características do Sistema Interligado Nacional, tal como a capacidade de regularização dos re-
servatórios, a incerteza associada às afluências futuras dentre outras. Como visto na seção anterior,
as decisões operativas presentes têm influência nos custos operativos futuros em um horizonte
plurianual, o que caracteriza o seu acoplamento temporal. Adicionalmente, outra característica
que aumenta a complexidade do problema é a existência do acoplamento espacial decorrente da
interdependência da operação das usinas hidroelétricas pertencentes a uma mesma cascata.
Desta forma, uma estratégia muito utilizada para a solução do problema de planejamento
da operação energética é desagregá-lo em diferentes etapas temporais segundo os diferentes
graus de incerteza, representação do sistema gerador e de discretização dos dados e informa-
ções, por exemplo, conforme ilustrado na Figura 3.19.

Figura 3.19 – Etapas do planejamento da operação energética

No sistema elétrico brasileiro, a primeira etapa, chamada de médio prazo, corresponde ao


planejamento da operação energética, onde se busca estabelecer as estratégias de operação que
descrevem o comportamento probabilístico dos custos futuros do atendimento, com a aplicação
dos critérios de minimização do valor esperado dos custos operativos e, simultaneamente, de se-
gurança do atendimento energético mediante o uso de mecanismos de aversão a risco de déficit
de energia [22]. Nesta análise de médio prazo, o sistema é visto a reservatórios equivalentes de
energia, extraindo-se resultados indicativos sobre as condições de atendimento futuro do consu-
mo em um horizonte plurianual. A evolução do sistema é desagregada, neste horizonte, em etapas
mensais. As vazões, que determinam a abundância ou a carência de recursos energéticos, passam
por períodos úmidos e secos que se prolongam, ocasionalmente, por alguns anos. Baseando-se
no mais longo período seco ocorrido na Região Sudeste, o planejamento da operação energética
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   101 

é realizado para o horizonte de cinco anos à frente com discretização mensal, para a definição das
políticas de geração hidrotérmica e dos intercâmbios de energia entre os subsistemas.
A segunda etapa, referenciada como etapa de curto prazo, tem caráter tático e corresponde
à fase da programação mensal. Nesta etapa, contemplando as estratégias definidas pelo planeja-
mento da operação energética e as condições operativas atuais, como níveis de armazenamento,
vazões antecedentes verificadas e cargas previstas a serem atendida, são estabelecidas as metas
de geração individualizada do parque gerador, de níveis finais de armazenamento dos reserva-
tórios e de intercâmbios entre os subsistemas, levando em conta as características dos sistemas
e restrições de natureza hidráulica, elétrica e ambiental. Atualmente, a programação mensal é
realizada com o horizonte de dois meses, na qual são vistos em detalhes o sistema gerador das
usinas e os principais troncos de transmissão, discretizando-se o período de programação em
etapas semanais, durante o primeiro mês. Essa fase é consubstanciada no Programa Mensal de
Operação – PMO e suas revisões semanais, que será abordado no Capítulo 9.
Por último, a fase da programação diária da operação (PDO) contempla, no horizonte de
uma semana, considerando informações como as previsões de curto prazo da carga, das afluên-
cias, das gerações eólicas, os tempos de viagem da água entre aproveitamentos em cascata, as
disponibilidades de equipamentos e os desligamentos de elementos do sistema de transmissão.
São ainda atendidas restrições hidráulicas locais, ambientais e elétricas da rede, com o
detalhamento por todos os barramentos de interesse e, finalmente, estabelecida a programação
de despacho de geração, por usina, a cada meia hora para o próximo dia, a ser implantada na
operação em tempo real.
A estratégia de divisão de um problema altamente complexo em diversas etapas, que tro-
cam informação entre si, é adotada na cadeia de modelos computacionais [23] desenvolvida
pelo Cepel, ilustrada na Figura 3.20, e utilizada pelo ONS para o planejamento e operação
energética do SIN. Os modelos desta cadeia transmitem ao modelo imediatamente subsequen-
te na cadeia informação sobre a condição futura do sistema, através da Função de Custo Futu-
ro. Desta forma, ao final do último período do horizonte o modelo de curto prazo se acopla à
FCF construída pelo modelo de médio prazo, conforme ilustrado na Figura 3.21.

Figura 3.20 – Cadeia de modelos


102    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Os métodos de solução adotados em cada etapa levam em conta o nível de detalhamen-


to dos componentes do sistema e a representação da incerteza hidrológica considerados no
problema. Por exemplo, para as etapas de médio e curto prazo são utilizados os programas
NEWAVE [6] e DECOMP [7], respectivamente. Estes modelos tratam o problema de forma
estocástica, uma vez que levam em conta a incerteza das afluências futuras, e utilizam métodos
baseados na decomposição de Benders multiestágio para resolução do problema. A incerteza
hidrológica é representada por uma árvore de cenários, porém a forma como essa incerteza é
representada no primeiro mês de estudo é diferenciada. Outra diferença entre os dois mode-
los está na representação do parque hidráulico, que é feita atualmente de forma agregada no
NEWAVE e individualizada no DECOMP. Já na etapa de programação da operação é utilizado
o modelo DESSEM [8] que resolve um problema de otimização inteiro-misto, dada as restri-
ções de unit commitment das usinas termoelétricas, considerando as restrições da rede elétrica
através de um processo iterativo. Entretanto, dado seu horizonte de aplicação, não considera
a incerteza hidrológica, tratando o problema de forma determinística.

Figura 3.21 – Comunicação entre os modelos (acoplamento)

3.4 – Breve histórico do planejamento da operação no Brasil

O planejamento da operação no Brasil teve início a partir da assinatura do Tratado de Itai-


pu, em 1973, época em que passaram a ser construídos os grandes troncos de transmissão en-
tre as regiões Sul e Sudeste/Centro-Oeste e entre as regiões Norte e Nordeste, e a maior parte
das usinas hidrelétricas hoje existentes. Para implementá-lo foi criado o Grupo Coordenador
da Operação Interligada [14], coordenado pela Eletrobrás.
Nesta época o planejamento da operação energética baseava-se em um método deter-
minístico denominado “Método da Curva Limite Inferior de Armazenamento”, que se baseava
no histórico de afluências médias mensais para o sistema hidrelétrico equivalente, registrado
desde janeiro de 1931, sendo que inicialmente a estratégia era definida com base no período
crítico da região geoelétrica que compreendia o Sudeste e Centro-Oeste.
Conforme mostra a Figura 3.22, o período crítico para um reservatório representativo
de um conjunto de usinas hidrelétricas é o intervalo de tempo, ao longo do histórico de va-
zões, compreendido entre o instante em que o reservatório está repleto e o primeiro instante
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   103 

posterior em que este se esvazia completamente, supondo o atendimento sem déficit de uma
determinada carga média ao longo de todo o período histórico. Esta carga é livremente ajus-
tada para esta condição, e a geração destinada a atender esta carga é definida como a energia
firme para este conjunto de usinas [13]. Na região geoelétrica Sudeste/Centro-Oeste, o perío-
do crítico compreende os anos de 1952 a 1956.
O planejamento da operação iniciou-se então com o traçado de uma curva-limite, que de-
terminava o nível dos reservatórios acima dos quais, mesmo ocorrendo as vazões do período
crítico, seria possível garantir o atendimento da carga prevista para o sistema até o final do
quinto ano do horizonte de planejamento. O mesmo se fazia com todas as demais regiões,
cada uma com seu período crítico. Cada vez que a energia armazenada se situava em pontos
abaixo da curva-limite, todas as térmicas eram acionadas na sua capacidade máxima. O único
critério considerado era, portanto, a segurança do atendimento.

Figura 3.22 – Determinação do período crítico

Em pouco tempo, porém, a partir de 1979, este critério foi substituído pelo mínimo cus-
to total esperado. Ao invés de se considerar apenas o cenário mais crítico, de 1952 a 1956,
foi extraído do histórico de vazões um conjunto de índices estatísticos que inclui a média, o
desvio padrão e a correlação temporal das vazões medidas nos postos hidrológicos em que
atualmente estão situadas as usinas hidroelétricas. Estes índices foram introduzidos na técnica
de Programação Dinâmica Estocástica (PDE), que determinava, a cada mês, o montante de
geração térmica que deveria ser despachado para minimizar o custo total esperado ao longo
de todo o horizonte de estudo, considerando todas as possibilidades de afluência [43]. Intro-
duziu-se no algoritmo um custo para o déficit de energia, estipulado como um valor superior
ao custo de geração da usina termelétrica mais cara disponível. Cada região era representada
pela agregação de todos os reservatórios de suas usinas em um único reservatório equivalente
de energia. O algoritmo da PDE utilizado tratava um reservatório equivalente por vez, as tro-
cas de energia entre as regiões seguiam uma regra heurística que buscava a igualdade entre os
custos marginais de cada região.
A consideração de um único reservatório equivalente por vez se devia à dificuldade cau-
sada pela dimensão do problema. A solução do planejamento da operação por PDE exige a
discretização do armazenamento dos reservatórios equivalentes e da tendência hidrológica
(vazões dos meses anteriores). Para exemplificar, se cada reservatório é discretizado em cem
intervalos, e a tendência hidrológica a cada reservatório em dez intervalos, tem-se, para quatro
104    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

reservatórios, 1 trilhão de estados a serem estudados, o que, com o estado da arte da capacida-
de de processamento da década de 80, era algo que não se concebia implementar.
Entretanto, ao ser lançada a interligação das regiões Norte e Nordeste com o Sudeste/
Centro-Oeste, no final da década de 1990, conforme a Figura 3.23, passou a ser fundamental
a otimização simultânea dos quatro reservatórios equivalentes de energia.
A consideração de subsistemas interligados no cálculo da estratégia passou a ser possível
com o desenvolvimento da técnica de Programação Dinâmica Dual Estocástica (PDDE) [35],
a partir da década de 1990. O uso da PDDE permite uma redução drástica na discretização uti-
lizada para a varredura dos estados de cada reservatório equivalente, possibilitando represen-
tar explicitamente as interligações entre os diversos subsistemas. Desde 1998, a PDDE passou
a ser o algoritmo de solução empregado no modelo oficial utilizado para o planejamento da
operação energética de médio prazo do setor elétrico brasileiro.

Figura 3.23 – Interligações representadas no planejamento da operação

3.5 – Métodos de solução do problema

O planejamento da operação energética de médio e curto prazo é um problema de natureza


essencialmente estocástica, dado que não temos o conhecimento perfeito da disponibilidade
das afluências futuras, combustível da principal fonte geradora do SIN. Para solução deste
tipo de problema são empregadas metodologias de otimização estocástica [39] e [45], cujo ob-
jetivo é encontrar a melhor decisão tendo em vista vários possíveis cenários construídos a par-
tir da discretização da variável aleatória que representa a incerteza do problema estocástico.
Uma alternativa para resolver o problema estocástico é escrevê-lo na sua forma equiva-
lente determinística, onde as restrições e variáveis de todos os períodos e cenários são consi-
deradas de uma só vez em um único problema de otimização determinística. Em geral, esta
alternativa resulta em um problema de otimização de grande porte, especialmente se o núme-
ro de cenários ou períodos for muito grande, o que torna a resolução do problema inviável
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   105 

computacionalmente. Uma forma de contornar esta dificuldade é a utilização de técnicas de


decomposição, como os métodos baseados na decomposição de Benders. As técnicas de de-
composição resolvem o problema a partir de uma série de subproblemas menores associados
ao problema original.
Os métodos aplicados para resolver problemas estocásticos também podem ser classifi-
cados de acordo com a representação das variáveis aleatórias do problema: abordagem deter-
minística ou abordagem estocástica.
Na abordagem determinística, todas as possíveis realizações da variável aleatória do pro-
blema são representadas como uma árvore completa de cenários, Figura 3.18 (a), que será
considerada explicitamente no problema de otimização. Em geral, os métodos que utilizam a
representação explícita da árvore completa de cenários se restringem a problemas com hori-
zonte curto e com poucas aberturas por estágio. Para os demais casos, utiliza-se a abordagem
estocástica, onde representa-se apenas uma pequena porção da árvore completa de cenários
(sub-árvore), conforme ilustrado na Figura 3.18 (b).
Na abordagem estocástica, a representação da variável aleatória pode ser feita através
de uma amostragem explícita ou implícita. No caso da amostragem explícita, a sub-árvore é
amostrada a partir da árvore completa e então o problema de otimização é resolvido de forma
determinística como na abordagem determinística. O problema é resolvido diversas vezes
considerando em cada resolução do problema uma sub-árvore diferente. Um dos principais
métodos na literatura que utiliza a abordagem estocástica com amostragem explícita é o mé-
todo SAA (Sample Average Approximation) [19]. Por outro lado, quando se considera a amos-
tragem implícita, novas sub-árvores são amostradas à medida que o problema de otimização
vai sendo resolvido. Um método bastante conhecido que utiliza a abordagem estocástica com
amostragem implícita é a PDDE (Programação Dinâmica Dual Estocástica) [35].
Além dos métodos citados neste item, há na literatura uma grande variedade de outros
métodos e técnicas aplicados a problemas de otimização estocásticos. Em [10] é apresentada
uma revisão bibliográfica destes métodos.
O problema de planejamento da operação energética de médio prazo, assim como o pro-
blema de curto prazo, é representado por um problema de programação estocástica linear
multiestágio, onde a incerteza hidrológica é representada por uma árvore de cenários. No caso
do modelo NEWAVE [24] e [25], a técnica utilizada para encontrar a solução ótima é a PDDE,
baseada na decomposição de Benders [3] e técnicas de amostragem. A formulação da PDDE
atualmente empregada no modelo leva em conta a correlação temporal das afluências aos re-
servatórios [27]. Dessa forma, os estados que representam o sistema passam a ser o armazena-
mento no início do período e as afluências passadas (tendência hidrológica). No modelo DE-
COMP, a metodologia empregada para solução do problema é a Programação Dinâmica Dual
(PDD), também conhecido como Decomposição Aninhada, que percorre a árvore completa de
cenários. A variável de estado que representa a situação em que o sistema se encontra é o vo-
lume armazenado no início do período. O problema de planejamento da operação energética
106    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

a ser resolvido pode envolver apenas a minimização de custos ou também incorporar medidas
de aversão a risco [22], [31] e [37], que serão abordadas no Capítulo 4 deste livro.
Para facilitar o entendimento destas metodologias, inicialmente será apresentada a pro-
gramação dinâmica tradicional (PD), um método de solução para problemas que envolvem
decisões sequenciais, cujos fundamentos principais podem ser estendidos para PDD e PDDE.

3.5.1 – Programação Dinâmica


A Programação Dinâmica foi desenvolvida para trabalhar com processos de decisão se-
quenciais, que podem ser vistos como modelos de sistemas dinâmicos sob o controle de um
tomador de decisão [28]. A cada estágio do horizonte de planejamento, uma decisão é tomada
a partir de um conjunto de alternativas disponíveis, que geralmente depende do estado atual
do sistema. Essa decisão possui um custo associado e leva o sistema a um novo estado (tran-
sição de estados).
O objetivo da PD é determinar uma sequência de decisões, também chamada de política,
que otimiza o desempenho do sistema. Um aspecto importante é que as decisões não podem
ser tomadas isoladamente a cada estágio, pois é necessário equilibrar o custo presente no es-
tágio atual com o custo futuro a partir do estágio seguinte.
Para resolver esse tipo de problema, na Programação Dinâmica é utilizado um procedi-
mento de otimização recursiva, onde se busca a solução para o problema completo de múl-
tiplos estágios, resolvendo primeiro o problema de um estágio e incluindo sequencialmente
um estágio de cada vez, até que o ótimo do problema completo seja encontrado. Embora cada
problema de um estágio seja resolvido como um problema simples de otimização, sua solução
ajuda a definir as características do problema do próximo estágio na sequência. Este procedi-
mento recursivo usualmente é baseado em uma recursão reversa, onde o primeiro estágio a ser
analisado é o estágio final do problema e os problemas são resolvidos voltando um estágio por
vez até que o estágio inicial seja alcançado. A base do procedimento de otimização recursiva
é o chamado princípio da otimalidade de Bellman [2]:
“Uma política ótima possui a propriedade de que, qualquer que seja o
estado e a decisão atuais, as decisões restantes devem constituir uma
política ótima em relação ao estado resultante da decisão atual.”

Os estados do sistema refletem as informações necessárias para avaliar completamente


as consequências que a decisão atual têm sobre decisões futuras. A especificação dos estados
do sistema é talvez o ponto mais crítico na Programação Dinâmica. Não há regras definidas
para fazer isso, na maioria das vezes requer conhecimento profundo sobre o problema que
está sendo estudado. Dois pontos importantes que devem ser avaliados durante a escolha das
variáveis de estados:
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   107 

• os estados devem transmitir informações suficientes para tomar decisões futuras sem
levar em consideração sobre como o processo alcançou o estado atual;
• o número de variáveis de estado deve ser pequeno, dado que o esforço computacional
associado à abordagem de programação dinâmica é proibitivamente caro quando mui-
tas variáveis de estado são envolvidas na formulação do modelo.

Esse último ponto é conhecido como “mal da dimensionalidade” e pode limitar conside-
ravelmente a aplicabilidade da programação dinâmica na prática.
Considere um problema de planejamento da operação energética com um horizonte de
planejamento composto por T estágios, para o caso determinístico e com um único reservató-
rio, conforme formulação simplificada dada em (3.3).
"

Min % CT! ∗ gt ! + CD! ∗ def!


!#$

s.a.
vt = v(t-1) + at - ght - vertt t = 1,...,T
ght + gtt + deft = demt t = 1,..,T (3.3)
0≤ vt ≤ vmax t = 1,...,T

Onde:
T é o número de estágios do horizonte de planejamento
vt é a energia armazenada no final do estágio t
vt-1 representa a energia armazenada no final do estágio t-1, que equivale à energia arma-
zenada no início do estágio t
at é o montante de energia afluente no estágio t
ght é o montante de energia hidráulica gerada no estágio t
vertt é o montante de energia vertida no estágio t
gtt é o montante de energia térmica gerada no estágio t
deft é o montante de energia não suprida no estágio t
demt é a demanda a ser atendida no estágio t
CTt ,CDt representam o custo da geração térmica e de déficit

A função objetivo do problema (3.3) é a minimização do custo total de operação, que é


dado pelo somatório dos custos presentes ao longo de todo o horizonte de planejamento. O
custo presente é dado pelo custo da decisão no próprio estágio, isto é, custo de combustível
108    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

das usinas termoelétricas e penalidades pelo não atendimento à carga. A primeira restrição é
chamada de restrição de balanço de energia e representa a equação de transição da variável de
estado. A segunda restrição é conhecida como atendimento à demanda, e a terceira restrição
representa os limites da variável energia armazenada no final do estágio.
O problema descrito anteriormente é um problema recursivo e separável no tempo, assim,
podemos resolvê-lo recursivamente utilizando a equação de recursão de Bellman, de acordo
com (3.4), para t = 1,...,T. O estado do sistema é representado pela a energia armazenada no iní-
cio do estágio, ou de outra forma, pela a energia armazenada no final do estágio anterior (vt-1).

α! v!"# = Min CT! ∗ gt ! + CD! ∗ def! + α!$# (v! )

s.a.
vt = v(t-1)+at - ght - vertt
ght + gtt + deft = demt (3.4)
0 ≤ vt ≤ vmax

Onde:
α(t+1) (.) é a função de custo futuro construída em t+1

A função α(t+1) (vt) representa o custo futuro esperado associado ao estado de armazena-
mento ao final do estágio t. Esse custo traduz o custo total de operação esperado a partir do
próximo estágio até o final do horizonte de planejamento. Dessa forma, para cada estágio de-
seja-se minimizar o custo total de operação do estágio composto pela soma do custo presente
(CTt * gtt + CDt * deft) e do custo futuro (αt+1 (vt).
Deve-se determinar a melhor decisão a cada estágio, de acordo com a situação (estado) em
que se encontra o sistema. Essa decisão também pode ser obtida através da avaliação de di-
versas possibilidades de operação, ao invés da solução de um problema de otimização. Neste
caso, a variável geração térmica é fixa em alguns valores pré-estabelecidos (ΩtGT), para cada
estado de armazenamento são calculados o balanço de energia e o custo de operação para cada
valor de geração térmica, e então é escolhida a opção que fornece o mínimo custo. Esta forma
de calcular a FCF é simples, mas requer a discretização de mais uma variável, o que aumenta
ainda mais a complexidade computacional do problema quando o número de variáveis cresce.
A resolução do problema inicia-se pelo último estágio, e para tanto, é necessário estabele-
cer uma função de custo futuro para o final do horizonte de estudo αT. Usualmente, é conside-
rada uma função igual à zero, conforme ilustrado na Figura 3.24.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   109 

Figura 3.24 – FCF do último estágio

Para cada estado de armazenamento inicial no estágio T (vT-1) é resolvido o problema


(3.4), encontrada a solução ótima e, consequentemente, o armazenamento no final do estágio
T (vT). O custo presente é calculado de acordo com geração térmica e corte de carga oriundos
da decisão tomada uT= {gtT, defT ,ghT ,vertT}. A função de custo futuro do estágio seguinte
é acessada a partir valor de vT encontrado na solução do problema, e retorna o custo futuro
esperado, que para o último estágio, é sempre nulo. De posse do custo presente e do custo
futuro, é possível calcular o custo total de operação do estágio T até o final do estágio para o
estado em questão.
Resolvendo o problema para todos os estados que descrevem o sistema no estágio T, é
possível construir uma função de custo futuro para este estágio. A Figura 3.25 ilustra o proces-
so de solução do problema do estágio T para todos os estados visitados neste estágio.

Figura 3.25 – Resolução PD, estágio T


Para cada estado de armazenamento inicial visitado no estágio T foi calculado um custo
total de operação. A partir destes pares de valores é possível construir a função αT (.), ou mon-
tar uma tabela de custos futuros, que será consultada quando o problema do estágio T-1 for
resolvido. A construção da função de custo futuro do estágio T é ilustrada passo a passo na
110    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Figura 3.26. Observe que para cada corte adicionado à FCF é possível determinar sua incli-
nação, que como visto anteriormente, é chamada de valor da água.

Figura 3.26 – Construção da FCF, estágio T

O valor da água (VA) pode ser calculado a partir da inclinação de cada reta que compõe
a FCF, conforme Figura 3.27.

Figura 3.27 – Valor da água, estágio T

Seguindo o processo recursivo, o próximo estágio a ser resolvido é o T-1, conforme apre-
sentado na Figura 3.28. O procedimento é bastante similar ao descrito acima, porém a função
de custo futuro que será utilizada para resolver os problemas deste estágio é a função αT (.),
construída em T. Notem que a otimalidade de cada decisão é baseada no conhecimento prévio
de todas as possibilidades futuras e suas consequências.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   111 

Figura 3.28 – Resolução PD, estágio T-1

Este processo é repetido até que se chegue no estágio inicial do horizonte de estudo. Ao
final do processo estarão disponíveis funções de custo futuro para todos os estágios.
Para uma boa representação da FCF é necessário que a discretização da variável de estado
seja bem refinada. Suponha uma representação acurada do reservatório seja alcançada dividindo-
-o em 100 faixas de armazenamento, desta forma, no exemplo acima 100 estados serão visitados
para compor a função de custo futuro. Porém, para representar de forma mais realista o sistema
gerador, é necessário representar mais reservatórios. Quanto mais reservatórios, maior será o
número de combinações de estados para serem incorporadas na função de custo futuro. Por
exemplo, se são representados dois reservatórios, 10.000 estados deverão ser visitados, para três
reservatórios, o número de estados sobe para 1.000.000, para quatro reservatórios, 108 estados!
Neste ponto reside o principal problema da PD, conhecido como “mal da dimensionalidade”.
No problema (3.3) a afluência a cada estágio era conhecida, porém, ocorre que o proble-
ma de planejamento da operação é estocástico, não se conhecendo previamente as energias
afluentes futuras, mas apenas sua distribuição de probabilidades. Para estes casos, torna-se
necessário o uso da Programação Dinâmica Estocástica.

3.5.2 – Programação Dinâmica Estocástica


A Programação Dinâmica Estocástica (PDE), assim como a Programação Dinâmica, é um
método que permite calcular o custo futuro para qualquer estado, em qualquer período, e ao
mesmo tempo garantir que estes custos sejam os mínimos possíveis.
Como mencionado anteriormente, a incerteza hidrológica é representada através de um
conjunto de cenários (realizações) de afluência futura associado a cada estado de armazena-
mento. As afluências podem ser consideradas como eventos independentes temporalmente,
112    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

isto é, a afluência de um estágio não é influenciada pelos valores observados nos estágios
passados, ou como eventos correlacionados temporalmente. Neste caso, a afluência em um
estágio é uma função das afluências em estágios passados.
Na Programação Dinâmica Estocástica, o processo de cálculo das funções de custo futu-
ro, ou das tabelas contendo o custo futuro, também é iniciado no último estágio, avaliando
recursivamente todos os períodos até o início do horizonte de estudo, ou seja, do futuro para
o presente. Em geral, a função de custo futuro observada pelo último período é considerada
igual a zero.
Para o caso de afluências sem dependência temporal, a PDE é uma extensão direta da PD,
conforme ilustrado na Figura 3.29. Nesta situação, ao invés encontrar uma única decisão por
estado, são tomadas diversas decisões, uma para cada um dos cenários de afluências no está-
gio. O custo de operação associado ao estado de armazenamento inicial é dado pela média dos
custos de operação obtidos em cada cenário de afluência considerado. A partir dos custos de
operação médios é construída uma aproximação da função de custo futuro, ou de uma tabela
de custos futuros associados aos estados de armazenamento do sistema.

Figura 3.29 – Resolução PDE, estágio T-1

Para a situação onde as afluências são representadas como eventos correlacionados tem-
poralmente, a variável afluência no estágio anterior (ou estágios anteriores, se considerada
uma dependência maior) deve ser representada como uma nova variável de estado. Assim, a
cada período do horizonte de estudo são definidos estados dados pela combinação dos níveis
de armazenamento inicial do reservatório a ser analisado e das afluências observadas no está-
gio anterior. Note que o número de combinação de estados a ser visitado aumenta bastante ao
incluir novas variáveis de estado.
O problema a ser resolvido pode ser formulado de acordo com duas abordagens: supon-
do-se conhecido os cenários de afluência no início do estágio e então tomando-se as decisões
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   113 

(abordagem acaso-decisão), ou decidindo-se apenas em razão da distribuição de probabilida-


des das afluências no mês (abordagem decisão-acaso).
Na abordagem “acaso-decisão” partimos do princípio de que todas as possibilidades de
afluência no início de cada estágio são conhecidas, e então o problema estocástico a ser resol-
vido é formulado de forma recursiva de acordo com a equação recursiva dada em (3.5).
&'

α! v!"# , a!"# = Min * p$! ∗ CT! ∗ gt $! + CD! ∗ def!$ ! + α!%# (v!$ , a$! )
$(#
s.a.
v!$ = v!"# + a$! − gh$! − vert $!
gh$! + gt $! + def!$ = dem!
(3.5)
0 ≤ v!$ ≤ vmax (3.5)

Onde:
a"! = ∅ ∗ a!#$ + ε"! é modelo autorregressivo ordem 1 utilizado nesta formulação
simplificada para representar as afluências no estágio t
p"! é a probabilidade de ocorrência da afluência 𝑎𝑎!"

Esta abordagem “acaso-decisão” está ilustrada na Figura 3.30 e recebe este nome, pois
supõe que ao início de cada estágio se conhece a energia afluente que irá ocorrer nesse estágio.
O estado do sistema é dado pelo par energia armazenada no início do estágio e afluência no
estágio anterior. Cada cenário de afluência é avaliado separadamente, resultando em diferen-
tes soluções ótimas individuais. Isto poderia levar a obtenção de diferentes custos de operação
para um mesmo estado do sistema, porém, o custo a ser atribuído ao estado é o valor esperado
(média) dos custos relacionados a cada cenário de afluências.
A partir de valor médio de custo de operação obtido para cada estado do armazenamento
e afluência passada é possível obter um corte representado por um plano, no caso de um único
reservatório, assim traçar a curva de custo futuro.
114    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Vt
Vt-1
Decisões Resultados obtidos da
ut=[gh, gt, def, vert, v] equação de transição
ut1 ut2... ut1,na (balanço de energia)

Vt-1
At-1 At

Energia armazenada
Distribuição de probabilidade
no final do mês anterior
at-1 da energia afluente no mês,
condicionada a afluência
do mês anterior (at-1)
Energia afluente
no mês anterior
P (At Iat-1)

estágio t-1 estágio t


Figura 3.30 – Programação Dinâmica Estocástica (acaso-decisão). Adaptado de [21]

Na abordagem “decisão-acaso”, as decisões são tomadas sem o conhecimento da afluên-


cia que irá ocorrer no próprio estágio, mas apenas em razão da distribuição de probabilidades
dessas afluências. Nesta abordagem, mantêm-se as restrições da formulação (3.3), substituin-
do-se apenas a equação de recursão (3.5), que passa a ser dada por (3.6).

&'

α! v!"# , a!"# = Min CT! ∗ gt ! + 0 p$! ∗ CD! ∗ def!$ ! + α!%# (v!$ , a$! )
$(#

s.a.
v!$ = v!"# + a$! − gh$! − vert $!
gh$! + gt ! + def!$ = dem!
(3.6)
0 ≤ v!$ ≤ vmax
Onde:
a$! = ∅ ∗ a!"# + ε$! (3.6)

É possível notar a diferença em relação à abordagem “acaso-decisão”, em que a mini-


mização do custo de geração térmica (decisão) está diretamente relacionada à afluência 𝑎𝑎!" ,
suposta conhecida no início do estágio, ao passo que na abordagem “decisão-acaso” a decisão
depende do valor médio do custo de operação condicionado ao estado do sistema.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   115 

A Figura 3.31 ilustra o processo de resolução “decisão-acaso” utilizado na PDE. Observe


que nesse processo primeiro é tomada a decisão gtt e depois ocorre o acaso, representado pela
afluência no estágio.
Vt
Vt-1
Resultados obtidos da
equação de transição
Decisão (balanço de energia)
ut=[ght, gtt, deft, vertt, vt]

Vt-1
At-1 At
Energia armazenada
no final do mês anterior Distribuição de probabilidade
at-1
da energia afluente no mês,
condicionada a afluência
Energia afluente do mês anterior (at-1)
no mês anterior
P (At Iat-1)

estágio t-1 estágio t

Figura 3.31 – Programação Dinâmica Estocástica (decisão-acaso). Adaptado de [21]

O leitor interessado poderá consultar um exemplo didático da aplicação da programação


dinâmica estocástica em um pequeno problema de planejamento da operação em [41].
Conforme visto anteriormente, a partir da entrada da interligação Norte-Sul ao final da
década de 1990 no SIN, o que levaria à utilização de um número elevado estados, tornou-se
necessário estabelecer uma metodologia que permitisse calcular o custo futuro para um núme-
ro reduzido de estados. Assim, iniciou-se a utilização de algoritmos de programação dinâmica
dual, que não exigem a discretização do espaço de estados na solução da equação recursão da
programação dinâmica.

3.5.3 – Programação Dinâmica Dual


Uma abordagem típica para resolver problemas estocásticos multiestágios é aproximar
o processo aleatório associado à incerteza que se deseja representar usando uma árvore de
cenários. Para se representar bem a distribuição de probabilidades associada ao processo ale-
atório é necessário o uso de um número grande de cenários, o que resulta em problemas de
otimização de grande porte, que podem ser resolvidos usando algoritmos especializados que
empregam técnicas de decomposição.
Na literatura são encontrados diversos algoritmos que utilizam técnicas de decomposição,
porém os mais populares para lidar com programas estocásticos de vários estágios são a pro-
gramação dinâmica dual ou decomposição aninhada (PDD) proposta por [4] e a programação
dinâmica dual estocástica (PDDE) proposta por [35]. Ambos os métodos aproximam as fun-
ções de custo futuro usando funções lineares por partes refinadas iterativamente, definidas por
hiperplanos calculados através da resolução de problemas lineares mais simples do que o pro-
blema multiestágio original. Este método de decomposição é conhecido por método de planos
116    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

cortantes ou método de decomposição de Benders, e os hiperplanos obtidos para representar


a FCF são denominados de cortes de Benders.

3.5.3.1 – Método de decomposição de Benders


Para explicar o método de decomposição de Benders, vamos considerar o seguinte pro-
blema determinístico genérico de dois estágios, apresentado sob a forma de um problema de
programação linear, de acordo com (3.7). As ideias aqui apresentadas podem ser estendidas
para o caso com mais estágios e para o caso estocástico.
Min c1 x1 + c2 x2
Sujeito a (3.7)
A1 x1 ≥ b1
E1 x1 + A2 x2 ≥ b2

As variáveis x1 e x2 e representam as variáveis de decisão de primeiro e segundo estágios.


O custo de operação para os dois estágios é dado por c1 x1 e c2 x2. As restrições do sistema para
o primeiro estágio são representadas por A1 x1 ≥ b1 e para o segundo estágio por E1x1 + A2x2
≥ b2.Veja que a restrição do segundo estágio depende de uma variável de decisão do primeiro
estágio. Esta restrição representa o acoplamento entre os estágios.
O problema (3.7) pode ser decomposto e apresentado como um processo de decisão em 2
estágios, onde o problema de segundo estágio é dado por (3.8) e pressupõe que a decisão de
primeiro estágio x1 já seja conhecida, lado direito da restrição.

2º estágio
α2 (x1) = Min c2 x2
Sujeito a (3.8)
A2 x2 ≥ b2 - E1 x1

O problema do 1º estágio é então formulado como em (3.9). Este problema pode ser visto
como uma equação de recursão da Programação Dinâmica, onde c1x1 representa o custo ime-
diato e α2(x1) o custo a partir do estágio seguinte.

1º estágio
α1 = Min c1 x1 + α2 (x1)
Sujeito a (3.9)
A1 x1 ≥ b1
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   117 

A função α2(x1) representa o valor ótimo do problema de segundo estágio (3.8) e, como
observado anteriormente, depende diretamente da decisão x1 tomada no primeiro estágio. Se
esta função for conhecida, a solução ótima do problema (3.9) será igual à solução ótima obtida
no problema (3.7). A função α2(x1) é chamada de função recurso ou função de custo futuro.
Vimos que no processo de solução por Programação Dinâmica é necessário calcular α2(x1)
para diversos valores de x1, sendo que a discretização do vetor de estados era o ponto crítico
deste processo para a obtenção das funções de custo futuro. No entanto, quando utilizamos o
método de decomposição de Benders, podemos caracterizar analiticamente a função de custo
futuro α2 sem recorrer a discretizações.
Da teoria de otimização, sabemos que há um problema dual associado a qualquer proble-
ma de programação linear [28], desde que este seja convexo. O problema dual associado ao
problema de programação linear do 2º estágio é dado por (3.10).

α! (x" ) = Max π! (b! − E" x" )

Sujeito a (3.10)
π2 A2 ≤ c12

Onde: π é o vetor de multiplicadores de Lagrange, chamado também de variável dual.

Um conceito importante da teoria de Programação Linear é que o valor ótimo da função


objetivo dos problemas primal e dual coincidem quando o problema for viável. Desta forma, a
obtenção do valor de PI2 para a solução ótima substitui o que seria a obtenção do valor de x2 no
problema primal. Isto quer dizer, enquanto o vetor x2 determina as quantidades ideais de cada
variável envolvida no problema para que a solução seja ótima, o vetor π2 determina, para esta
mesma solução ótima, qual seria a derivada parcial ou o custo marginal da função objetivo
α2(x1) em relação ao recurso ou requisito que é representado por cada restrição do problema.
Como consequência de se adotar a formulação dual do problema é que o vetor x1, que se
refere ao estágio anterior, passa para a função objetivo, e com isso a região viável definida
pelas restrições π2A2 ≤ c2 independe de x1. Esta região corresponde a um poliedro convexo
definido pelo conjunto de seus vértices π"!, π!!, … , π#! , conforme ilustrado na Figura 3.32.

Figura 3.32 – Ilustração da região viável e dos vértices


118    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Em um problema de programação linear, a solução ótima estará associada a um dos vér-


tices da região viável do problema. Assim, o problema (3.10) pode ser resolvido por enume-
ração, conforme (3.11).

α! (x" ) = Max π! (b! − E" x" )

Sujeito a (3.11)

Π! ∈ π"! , π!! , … , π#!

A função α2(x1) do problema (3.11) é dada pelo o máximo de funções lineares, ou seja, é
uma função linear por partes, como ilustrado na Figura 3.33. Cada função linear , i = 1,..,n,
representa um hiperplano suporte da função α2(.).

Figura 3.33 – Função linear por partes

Desta forma, o problema (3.11) pode ser reescrito como o problema de programação line-
ar dado em (3.12).
α2 (x1)= Min α
Sujeito a (3.12)
α≥ π"! b! − E" x"

α ≥ π!! b! − E" x"

α ≥ π#! (b! − E" x" )


...
Onde:
α é uma variável escalar.
Como α é maior ou igual a cada π"! b! − E# x# , i = 1,...,n, e sendo o objetivo do problema
(3.12) é minimizar α, tem-se que α é igual ao maior dos π"! b! − E# x# , o que confere equi-
valência às formulações (3.11) e (3.12).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   119 

O problema de dois estágios (3.7) pode ser reescrito como em (3.13), em razão das variá-
veis e x1 e α. Como x1 é uma variável de decisão no problema (3.13), esta foi colocada no lado
esquerdo das restrições que representam a função de custo futuro.
Min c1x1 + α
Sujeito a (3.13)
A1 x1 ≥ b1

α + π12 (E1 x1 ) ≥ π12 b2

α + π22 E1 x1 ≥ π22 b2
...
α + πn2 (E1 x1 ) ≥ πn2 b2

Diferentemente do que foi visto na PD, na PDD podemos obter a função de custo futuro
α2 (x1) sem precisar discretizar a variável x1, bastando conhecer todas as soluções viáveis do
problema (3.10), que correspondem aos coeficientes π2i dos hiperplanos utilizados represen-
tação da função de custo futuro via função linear por partes.
Em geral o conjunto de restrições que representam a função de custo futuro apresenta uma
dimensão muito elevada tornando a solução do problema (3.13) intratável computacionalmente.
Uma forma eficiente para resolver o problema é aplicar a técnica de relaxação ao proble-
ma, isto é, ir inserindo de forma iterativa as restrições no problema.
Desta forma, a função de custo futuro α2 (.) passa a ser representada por uma função
aproximada α "! . , dada por (3.14). O conjunto de restrições em (3.14) é um subconjunto das
restrições de (3.12). Ao longo do processo iterativo, novas restrições irão sendo incorporadas
a (3.14) de forma a aprimorar a qualidade da aproximação da FCF. Como já mencionado an-
teriormente, na literatura as restrições que representam a FCF são conhecidas por cortes de
Benders.
α
"2 x1 = Min α "
Sujeito a (3.14)
" ≥ π"! b! − E" x"
α

" ≥ π!! b! − E" x"


α

" ≥ π#! (b! − E" x" )


α

Assim, o problema relaxado é dado por (3.15).


Min c! x! + α
)
120    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Sujeito a (3.15)

A! x! ≥ b!

' + π!" (E! x! ) ≥ π!" b"


α

' + π"" E! x! ≥ π"" b"


α

' + π#" (E! x! ) ≥ π#" b"


α

Como estamos utilizando uma aproximação da função de custo futuro real, não é possível
afirmar que a solução ótima de (3.15) será igual à solução ótima do problema original de dois
estágios dado em (3.7). Como α "! . é um limite inferior da função de custo futuro α "! . ,
uma vez que o problema (3.15) é uma relaxação do problema original, podemos calcular um
limite inferior z para o valor ótimo do problema (3.7), a partir da solução ótima x!∗ ; α$∗ obti-
da pelo problema (3.15), de acordo com (3.16).
(3.16)
(∗
z = c! x!∗ + α

O limite superior z para o valor ótimo do problema (3.7) é obtido resolvendo-se o proble-
ma (3.8), considerando a decisão x!∗ , e calculado conforme (3.17).

z = c! x!∗ + α# (x!∗ ) (3.17)

A precisão da aproximação da função de custo futuro α"! . em relação à função de custo



futuro real α2 (.), ambas calculadas no ponto x! , pode ser medida a partir da diferença entre
os limites superior e inferior.

+∗
z − z = c! x!∗ + α# (x!∗ ) − c! x!∗ + α +∗
= α# x!∗ − α (3.18)

O problema será considerado resolvido se esta diferença for menor que uma tolerância
pré-estabelecida, ε> 0. Caso contrário, a aproximação da função de custo futuro deverá ser
aprimorada adicionando novos cortes à função α "! . . O novo corte estará associado à variá-
"#$
vel dual π! e à decisão x1k+1 obtidas na solução ótima do problema (3.15).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   121 

3.5.3.2 – Programação Dinâmica Dual Determinística


O algoritmo a seguir descreve resumidamente a Programação Dinâmica Dual Determinís-
tica (PDDD), aplicado a um problema de dois estágios. A Figura 3.34 ilustra a troca de in-
formação entre os problemas de 1º e 2º estágios, que é a base dos métodos de decomposição.

Figura 3.34 – PDDD para problema 2-estágios

Algoritmo PDDD 2-estágios


Passo (1). Inicialização: definir α
"! . = 0, iniciar o contador de iterações k = 0, o conjunto
de cortes iniciais Π ={∅} e definir a tolerância ε > 0.
k

Passo (2). Etapa Forward: Resolver o problema de 1º estágio aproximado, obtendo a solu-
ção 𝑤𝑤1𝑘𝑘 , 𝑥𝑥1𝑘𝑘 , 𝛼𝛼%2𝑘𝑘 . A solução do primeiro estágio será utilizada no segundo estágio conforme
a ilustrado na Figura 3.34.
w! = Min c! x! + α
+"
Sujeito a
A! x! ≥ b!

'" + π#" (E! x! ) ≥ π#" b"


α i = 1,...,k

Passo (3). Calcular o limite inferior a partir da solução x1k , α


$k obtida para o problema do
passo anterior.
z ! = c" x"! + α
(!# = w"!

Passo (4). Passo Backward: Resolva o problema de 2º estágio condicionado ao estado


fornecido pelo problema de 1º estágio (solução x!" ), obtendo a solução x!" e a variável dual
π"#$
! , que dará origem a um novo corte a ser inserido na FCF.

w2 = Min c2 x2
Sujeito a
A! x! ≥ b! − E" x"# (π#$"
! *
122    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

O novo corte de Benders construído α ≥ π"#$ ! b! − E$ x$ é adicionado ao conjunto de


cortes já existente, e será utilizado na solução dos problemas da próxima iteração, de acordo
com a Figura 3.34.
Π k+1 = Π k ∪ α ≥ πk+1
2 b2 − E1 x1

Passo (5). Calcule o limite superior a partir das soluções de primeiro e segundo estágios.
A solução x!", x#" é uma solução viável, mas não necessariamente é a solução ótima do pro-
blema (3.7).
z = c1 x1k + c2 x2k

Passo (6). Se 𝑧𝑧 − 𝑧𝑧 ≤ ε, , então podemos considerar que o problema já atingiu a solução


ótima e o processo é encerrado. Caso contrário, faça k = k + 1, retorne ao Passo (2).

Esta versão de dois estágios do algoritmo PDDD é equivalente ao algoritmo decompo-


sição de Benders. Uma observação interessante é que entre duas iterações consecutivas é
adicionada ao problema de otimização somente uma restrição linear associada ao novo corte
calculado no Passo (4).
Podemos escrever o corte de Benders calculado no Passo (4) de outra forma a partir do
conceito de igualdade entre as soluções dos problemas primal e dual. Seja a solução do pro-
blema primal w!" e do problema dual πk2 b2 − E1 x1k . Então, ao igualarmos as duas so-

luções, podemos isolar o termo 𝜋𝜋2 𝑏𝑏2 e substituí-lo na equação do corte.
w!" = π"! b! − E# x#"

π"! b! = w!" + π∗! E# x#"


"
Substituindo 𝜋𝜋! 𝑏𝑏! em 𝛼𝛼 ≥ 𝜋𝜋2𝑘𝑘 𝑏𝑏2 − 𝐸𝐸1 𝑥𝑥1 , temos a equação do corte em razão do valor
da função objetivo w!" e do estado visitado x!" . A Figura 3.35 ilustra o corte de Benders
construído no ponto .

Figura 3.35 – Construção do corte de Benders associado ao estado


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   123 

Este algoritmo pode ser estendido o problema multiestágio ilustrado na Figura 3.36, con-
forme algoritmo abaixo.

Algoritmo PDDD multiestágios


Passo (1). Inicialização: iniciar o contador de iterações k = 1,definir
definir 𝛼𝛼"! . = 0,x! # = 0 e Π!# = ∅ para t = 1,..., T e definir a tolerância ε > 0.

Passo (2). Resolver o problema de 1º estágio aproximado, obtendo a solução ótima


w!", x!" , α
%"# .

W1 = Min c1 x1+ α
"2

Sujeito a

A1 x1 ≥b1
" "
"! + π ! (E1 x1) ≥ π ! b2
α i = 1,...,k

Passo (3). Calcular o limite inferior a partir da solução x!", α


$"# obtida para o problema
do passo anterior.
z k = c1 x1k + α
(k2 = w1k

Passo (4). Passo Forward: Repita para t = 2, ..., T

$
Dado x!"# , resolva o problema aproximado de estágio t, obtendo a solução ótima
wtk , xtk , α
%kt+1 .

wtk = Min ct xt + α
+t+1
Sujeito a
k
At xt ≥ bt − Et−1 xt−1

)t+1 + πit+1 (Et xt ) ≥ πit+1 bt+1
α i = 1,...,k


Passo (5). Calcule o limite superior a partir das soluções obtidas em todos os estágios t
= 1 a t = T. O vetor de solução é uma solução viável, mas não necessariamente é a solução
x!", … , x#" ótima do problema multiestágio.
124    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

T
k
z = $ ct xtk
t=1
! !
Passo (6). Se z − z ≤ ε , então podemos considerar que o problema já atingiu a solu-
ção ótima e o processo é encerrado. Caso contrário, faça k = k + 1, e vá para o Passo (7);

Passo (7). Passo Backward: Repita para t = T, ..., 2


k−1
Dada a solução xt−1 obtida durante o Passo Forward da iteração anterior, resolva o pro-
"
blema aproximado do t-ésimo estágio, obtendo o custo w! e a variável dual πkt que irá
permitir a construção de um novo corte a ser incluído na função de custo futuro α
"! . .
w!" = Min c!x! + α
+!#$

Sujeito a
k−1
At xt ≥ bt − Et−1 xt−1

)t+1 + πit+1 (Et xt ) ≥ πit+1 bt+1


α i = 1,...,k-1

$"#
O novo corte construído x!"# está associado ao estado e sua inclinação é dada pela vari-
ável dual πkt , de acordo com:

α ≥ π"#$
! b! − E!#$ x!#$

Ou de outra forma:
α ≥ wtk + πkt Et−1 xt−1
k −x
t−1

Passo (8). Retorne para o Passo (2).

Figura 3.36 – PDDD para problema multiestágio


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   125 

O algoritmo do método de decomposição pode ser divido em duas etapas:


• Etapa Backward: constrói cortes em torno dos pontos/estados x1k , … , xTk , a fim de
aprimorar a aproximação da função de custo futuro.
• Etapa Forward: calcula uma política viável que satisfaz as restrições dos problemas
dos estágios 1,...,T. Os pontos x1k , … , xTk selecionados nesta etapa serão os estados
visitados na Etapa Backward.

O problema resolvido na Etapa Forward já incorpora as aproximações da função de custo


futuro obtidas até o momento. Este procedimento assegura que a FCF está sendo aprimorada
numa vizinhança de interesse, ou seja, onde estão localizados pontos que são bons candidatos
para uma solução ótima.

3.5.3.3 – Método L-Shaped


Seja o problema genérico de dois estágios da formulação (3.7), porém vamos considerar
que o segundo estágio seja estocástico, e que a incerteza esteja presente apenas no vetor de
recursos (termo b2). O espaço amostral é formado por um conjunto finito que pode ser repre-
sentado por uma árvore de cenários, conforme ilustrado na Figura 3.37. O primeiro estágio é
determinístico e a incerteza do segundo estágio é representada
"
por |S2|=s cenários com proba-
bilidade associada p1,…,ps , cuja soma é igual a 1 ( ! p! = 1 ).
!#$
O problema a ser resolvido é determinar a estratégia que minimize a soma do custo do
primeiro estágio e o valor esperado do custo do segundo estágio, conforme (3.21).

Min c! x! + ( p"#c" x"#


#∈%!

Sujeito a (3.21)

A1≥
A1 x1 x1 b
1 ≥ b1


E1 x1 + A2 xE2s
1 x≥
1+ As2 x∈2sS≥
b2s 2 b2s s ∈ S2

Onde:
S2 é o espaço amostral dos cenários do segundo estágio. S2 = {a2,1, a2,2 ,..., a2,s}
|S2| é a cardinalidade de S2
x1 é vetor de decisões do primeiro estágio
x2s é o vetor de decisões do segundo estágio para o cenário s
p2s é probabilidade do cenário s
126    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

c1e c2 são os vetores de custos do primeiro e segundo estágios, respectivamente


b1 é o vetor de recursos do primeiro estágio
b2s é o vetor de recursos do segundo estágio para o cenário s
E1 é a matriz com os coeficientes das restrições que acoplam o primeiro e segundo estágios
A1 e A2 são as matrizes com os coeficientes das restrições do primeiro e segundo estágios,
respectivamente

Os cenários da árvore apresentada na Figura 3.37 foram amostrados a partir distribuição


de probabilidade da variável aleatória associada ao problema que se deseja resolver. O espaço
amostral dos cenários do primeiro estágio possui apenas um valor S1 = {a1}, dado que o pri-
meiro estágio é determinístico, e para o segundo estágio, o espaço amostral é dado por S2 =
{a2,1, a2,2 ,..., a2,s}. O segundo estágio tem |S2| nós, onde cada nó corresponde a uma realização
da variável aleatória, e todos têm o mesmo nó antecessor, que chamaremos de nó-pai e deno-
taremos por P(t,s), s ∈ St. Definiremos também o conceito de nós-filho, representado por F(t,s),
s ∈ St, como o conjunto de nós descendentes de um dado nó do estágio anterior. Por exemplo,
F(1,1) = {a2,1, a2,2 ,..., a2,s }e P(2,1) = P(2,2) =...= P(2,s) = {a1} para a árvore em questão.

Figura 3.37 – Árvore de cenários do problema (3.21)

Consideramos que a árvore de cenários representa completamente a incerteza do processo


aleatório do problema (3.21), isto é, temos o conhecimento a priori das realizações futuras
(“acaso-decisão”). Desta forma, a solução ótima do problema está fortemente associada a esta
árvore de cenários. Se outra árvore de cenários for amostrada, a solução ótima do problema
pode ser outra. Portanto, se faz necessário que a construção da árvore de cenários seja feita
de forma bastante criteriosa, tendo em vista a representação adequada do processo aleatório a
ser modelado.
O método de decomposição de Benders aplicado para resolução de problemas de otimi-
zação estocástica de dois estágios, como o problema (3.21), é conhecido por L-Shaped e foi
proposto em [40]. Neste método, o problema (3.21) é decomposto em um problema de primei-
ro estágio (3.23) e s problemas de segundo estágio (3.22), onde s = |S2| é cardinalidade de S2.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   127 

2º estágio – cenário j (j=1,..., s)


α! (x" ) = Min c! x!#

Sujeito a (3.22)
A2 x2j ≥ b2j − E1 x1

1º estágio
α! = Min c! x! + α" (x! )

Sujeito a (3.23)
A! x! ≥ b!

Assim como apresentado anteriormente para o caso determinístico, a função de custo


futuro real α2 (.) pode ser aproximada pela função α
"! (. ) , que será construída iterativamente
pelos problemas de segundo estágio.
A decisão do primeiro estágio x1 é passada para os problemas de segundo estágio que irão
calcular novos cortes para a função de custo futuro aproximada α "! (x" ), conforme ilustrado na
Figura 3.38. Notem que o corte a ser adicionado à função α"! (. ) é a média dos cortes calcula-
dos em cada cenário, conforme (3.24).

α ≥ $ p!" w!" + π!" E# x#∗ − x#


"&#

α ≥ w! + π! E" x"∗ − x" (3.24)


Onde:
x1* é o ponto (estado) para o qual o corte foi construído
s
w2 = # p2j ∗ w2j
j=1

s
π2 = # p2j ∗ π2j
j=1
Assim, o problema relaxado de primeiro estágio pode ser escrito como (3.25).
w! = Min c! x! + α
+"
128    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Sujeito a (3.25)
A! x! ≥ b!
# #
&" ≥ w" + π" E! x!∗# − x!
α i = 1, ..., k

Onde:
k é o número de cortes de Benders adicionados até a k-ésima iteração do algoritmo
x1*i é o estado para o qual o i-ésimo corte foi construído

O método L-Shaped é um processo iterativo, onde a cada iteração um novo corte é adi-
cionado ao problema de primeiro estágio. A convergência do processo é alcançada, na teoria,
quando os limites inferior e superior se igualam. Na prática, porém, o processo de convergên-
cia é concluído quando a diferença entre os limites é menor que uma tolerância (ε>0) pré-es-
tabelecida. Assim, a cada iteração do algoritmo, é realizado o seguinte teste apresentado em
(3.26).
!
z − z! ≤ ε (3.26)

Onde:
k é o contador de iterações
!
z = c" x"! + p#" c# x#" ! !
+ ⋯ +p#$ c# x#$
z ! = c" x"! + α
*# x"! = w"!,

Há duas abordagens usuais de adicionar cortes ao problema principal: single-cut ou mul-


ti-cut. Na abordagem single-cut, apresentada acima, os multiplicadores duais de todos os pro-
blemas do segundo estágio são agregados para gerar um único corte a cada iteração principal.
Na abordagem multi-cut, todas as informações no segundo estágio são utilizadas, sendo adi-
cionado um corte para cada subproblema de segundo estágio. Em [5] são discutas as vantagens
e desvantagens dessas duas abordagens. Na literatura existem outras abordagens alternativas
para inclusão de cortes nos problemas de otimização multiestágios resolvidos por métodos de
decomposição, como [15] e [46].
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   129 

Figura 3.38 – Esquema do método L-Shaped

3.5.3.4 – Decomposição Aninhada ou Programação Dinâmica Dual (PDD)


Em geral, os problemas que encontramos no dia-a-dia têm um horizonte temporal mais
extenso do que dois estágios, podendo alcançar diversos anos à frente. Um método muito
utilizado para resolver problemas estocásticos multiestágio é a Programação Dinâmica Dual
(PDD) ou Decomposição Aninhada (DA). Este método foi proposto em [4] e é uma extensão
do método L-Shaped para problemas multiestágio.
A solução numérica de problemas estocásticos multiestágio é geralmente obtida através
da discretização da distribuição de probabilidade da variável aleatória e da subsequente cons-
trução de uma árvore de cenário, conforme Figura 3.39. Desta forma, o problema de otimiza-
ção estocástica pode então ser reescrito como um único problema de programação linear na
forma aninhada (3.27).
&
Min c! x! + ( ( p"# c"x"#
"'( #∈%!

Sujeito a (3.27)
A! x! ≥ b!

A"x"# ≥ b"#-E"$! x"$!,&("#$,&) t = 2, . . , T s ∈ S"


Onde:
St é o espaço amostral dos cenários em cada estágio t
P (t-1,s) é o nó antecessor (nó pai) do cenário s no estágio t-1
130    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Observe na Figura 3.39 que, quanto maior o número de estágios, maior será a cardinalida-
de da árvore de cenários, apresentando um crescimento exponencial do número de cenários.
Desta forma, a PDD não é indicada para problemas com horizonte muito extenso. A árvore
de cenários não precisa ser necessariamente simétrica, isto é, o conjunto de nós descendentes
(nós-filho) não precisa ser igual em cada nó antecessor (nó-pai), P(2,1) ≠ P(2,2) ≠ P(2,3).

Figura 3.39 – Árvore completa a ser visitada pelo algoritmo da PDD

Na Figura 3.40 são apresentadas de forma esquemática as Etapas Forward e Backward


que fazem parte do algoritmo da PDD. O vetor de decisões obtido na Etapa Forward para cada
nó de um determinado estágio é enviado aos seus nós filhos, que por sua vez, será utilizado
durante a Etapa Backward como estado para construção de um corte médio que servirá para
aprimorar a função de custo futuro a ser consultada pelo nó-pai. Notem que os nós de um mes-
mo estágio não compartilham a mesma função de custo futuro, cada nó do estágio t consulta
sua própria função de custo futuro α"!"#,%(. % , onde s ∈ St, conforme ilustrado na Figura 3.41.

Figura 3.40 – Esquema do método PDD


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   131 

O algoritmo da PDD é descrito resumidamente pelos passos abaixo:


Passo (1). Inicialização: iniciar o contador de iterações k = 0, definir
"kt
α . = 0,xtk = 0e Πtk= ∅ para t = 1,..., T e definir a tolerância ε> 0.

Passo (2). Resolver o problema de 1º estágio aproximado, obtendo a solução ótima


w1∗k , x1∗k , α
%∗k
2 .

w!" = Min c! x!" + α


+"#

Sujeito a A! x!" ≥ b!
$ $
+"# ≥ w# + π# E! x!∗$ − x!"
α i = 1, ..., k

Passo (3). Calcular o limite inferior a partir da solução x!∗#, α


$∗#
$ obtida para o problema
do passo anterior.
z k = c1 x1∗k + α
(∗k ∗k
2 = w1

Passo (4). Passo Forward: Repita para t = 2, ..., T .


Repita para s ∈ St.

∗'
Dada a solução obtida pelo nó antecessor (nó-pai) na iteração anterior x!"#,% !,# , resolva
o problema aproximado do estágio t e do nó s, obtendo a solução ótima w!" ∗$ ∗$
%∗$
, x!" , α!%&," .
# #
w!" = Min c!x!" +#!$%,"

Sujeito a
# ≥ b − E ∗#
A!x!" !" !$% x!$%,'(",$)

)#!)%," ≥ w*!)%," + π*!)%,"E! x!"


α ∗* − x #
!" i = 1, ..., k

Passo (5). Calcular o limite superior a partir das soluções obtidas em todos os estágios t =
1 a t = T. O vetor de solução de cada estágio e nó é uma solução viável, mas não necessaria-
mente é a solução ótima do problema multiestágio.
'
! ∗!
z = $ $ p"# c"x"#
"() #∈&!
132    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Passo (6). Se z! − z ! ≤ ε , então podemos considerar que o problema já atingiu a solução


ótima e o processo é encerrado. Caso contrário, faça k = k + 1, e vá para o Passo (7).

Passo (7). Passo Backward: Repita para t = T, ..., 2.

Repita para sp ∈ St-1

Repita para s ∈ Ft-1, sp

Dada a solução obtida pelo nó antecessor (nó-pai) na iteração anterior do Passo Forward
∗(
x!"#,%& ,, resolva o problema aproximado do estágio t e do nó s, obtendo a solução ótima
∗k
w!" e a variável dual πts .
∗$

# #
w!" = Min c! x!" +#!$%,"

Sujeito a
# ≥ b − E
A!x!" ∗#
!" !$% x!$%,"'

)#!)%," ≥ w*!)%," + π*!)%,"E! x!"


α ∗* − x #
!" i = 1, ..., k
Depois que os problemas dos nós s ∈ Ft-1, sp forem resolvidos, calcula-se um novo corte
∗(
médio associado ao estado x!"#,%& , que será adicionado à função de custo futuro consultada
pelo nó antecessor sp, α
"t,sp .

α ≥ $ p!" w!#∗% + π∗% ∗%


!# E!&' x!&',") − x!&',")
"∈+!"#,%&

Ou de forma condensada:
% % ∗%
α ≥ w!,#$ + π!,#$ E!&' x!&',#$ − x!&',#$

Onde:
w%!,#$ = # p!# w!&∗%
#∈)!"#,%&

π%!,#$ = # p!# π∗%


!&
#∈)!"#,%&

Passo (8). Retorne para o Passo (2)


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   133 

Atualmente, o modelo DECOMP utilizado para o planejamento da operação de curto pra-


zo faz uso da metodologia PDD, que percorre a árvore completa de cenários, construindo uma
aproximação da função de custo futuro para cada nó da árvore de cenários. A incerteza a ser
modelada neste problema é a vazão afluente a cada usinas, e como a árvore completa de cená-
rios é percorrida na integra, a variável vazão afluente não é considerada como uma variável de
estado. Neste caso, apenas o volume armazenado nos reservatórios no início de cada estágio é
considerado como variável de estado. A formulação completa adotada pelo modelo DECOMP
pode ser consultada em [7] e aprimoramentos para tornar a PDD mais eficiente computacio-
nalmente são apresentados em [36].

Figura 3.41 – PDD: uma FCF para cada estado

3.5.4 – Programação Dinâmica Dual Estocástica (PDDE)


Para tratar do problema de árvore de cenários de grande porte, foram propostos alguns
algoritmos nos quais apenas uma amostra dos cenários da árvore é considerada no procedi-
mento de otimização. Note que a árvore de cenários é um dado de entrada destes algoritmos,
de forma que a amostragem realizada pelo algoritmo de solução do problema é independente
do modo como foi feita a amostragem do processo estocástico para gerar a árvore de cenários.
Um desses algoritmos é a Programação Dinâmica Dual Estocástica (PDDE) desenvolvida
por Pereira e Pinto [35]. Uma análise deste algoritmo pode ser encontrada em [38]. Outros
algoritmos amostrais podem ser citados, como o algoritmo de Planos Cortantes e Amostragem
Parcial (CUPPS) [9], Decomposição Aninhada Reduzida (AND) [11] e Amostragem Reduzi-
da (ReSa) [16]. Uma análise da convergência desta classe de algoritmos é dada em [32].
A PDDE é uma estratégia que viabiliza a solução de problemas estocásticos com muitos
estágios através da aplicação de técnicas de amostragem em conjunto com o método de de-
composição de Benders. Ela se baseia na estratégia de solução da PDD, porém não necessita
que a árvore de cenários seja completamente visitada. Através de um sorteio de Monte Carlo,
são sorteados alguns poucos cenários da árvore completa, constituindo assim, uma árvore
incompleta com cardinalidade bastante inferior à cardinalidade da árvore completa, conforme
134    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

ilustrado na Figura 3.42. Neste contexto, define-se cenário como o caminho que vai do nó raiz
até o nó folha T.

Figura 3.42 – (a) Árvore completa, (b) Árvore incompleta e (c) Árvore incompleta “pente”

Como a PDDE é baseada em métodos de decomposição, seu processo de solução é iterati-


va e compreende duas etapas principais descritas a seguir e ilustradas nas Figuras 3.43 e 3.44.
• Etapa Forward: realiza uma simulação direta (t = 1,...,T) considerando os NCEN ce-
nários da árvore incompleta de cenários (comumente chamados de cenários forward).
Para cada cenário e estágio é resolvido um problema de programação linear estocás-
tica e obtém-se, a partir da solução ótima, um estado de operação (xt,s) inicial viável
para o próximo estágio (nó-filho). Os estados alcançados nesta etapa serão utilizados
na Etapa Backward seguinte para aprimorar a FCF.
• Etapa backward: realiza uma simulação recursiva, cujo objetivo é calcular os cortes
de Benders que irão compor a FCF para cada estágio. Nesta etapa, para cada estado
visitado são considerados vários cenários futuros (cenários backward ou aberturas),
dado pelos nós descentes (nós-filhos).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   135 

Figura 3.43 – PDDE – Etapa Forward

Observem na ilustração da Etapa Backward que a função de custo futuro consultada no


estágio t é a mesma para todos os cenários deste estágio. A possibilidade de compartilhamento
de cortes entre os cenários de um mesmo estágio é uma propriedade importante da PDDE, e é
discutida em detalhes por [18].

Figura 3.44 – PDDE – Etapa Backward

Devido ao compartilhamento de cortes, uma única função de custo futuro é construída


para cada estágio, além de permitir que, a cada iteração do algoritmo da PDDE se adicione
NCEN cortes, o que torna mais rápido a convergência do processo. No entanto, esta proprie-
dade só é válida se a árvore completa for construída de tal forma que a incerteza vista a partir
de qualquer nó de um determinado estágio seja a mesma, isto é, o conjunto de nós descenden-
tes (nós-filho), F(t,s), deve ser o mesmo para todo s ∈ St, conforme ilustrado na Figura 3.45.
136    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Figura 3.45 – Árvore completa simétrica

Os métodos para construir uma árvore de cenários que represente adequadamente o pro-
cesso aleatório é um tema de muita relevância e bastante abrangente. Alguns métodos têm
sido propostos para melhorar a construção da árvore de cenários no contexto do planejamento
da operação energética, com, por exemplo, [17], [30] e [34]. Em [29]são apresentados apri-
moramentos para o algoritmo de decomposição de Benders aplicado a problemas estocásticos
multiestágios.
Os cenários podem ser gerados considerando dependência temporal entre os estágios, ou
de forma independente, onde a realização de um estágio não depende da realização do estágio
anterior. Apesar da derivação original da PDDE proposta em [35] não levar em conta a inter-
dependência temporal, mas esta importante característica pode ser incorporada à derivação da
PDDE, conforme mostrado em [27] e [26]. Neste caso, o vetor de variáveis de estado deve
incluir também a informação sobre as realizações passadas do cenário. A construção dos ce-
nários para tal aplicação será discutida em mais detalhes no Capítulo 6.
No modelo NEWAVE, adotado para o planejamento da operação de médio prazo, os ce-
nários utilizados para representar a incerteza hidrológica possuem correlação temporal e por-
tanto, o vetor de variáveis de estado do problema é composto pelo nível de armazenamento
no início do estágio e pelas afluências passadas. A Função de Custo Futuro passa a variar de
acordo com o armazenamento e com as afluências anteriores, conforme ilustrado na Figura
3.46, e os cortes de Benders agora são representados por um hiperplano ao invés de uma reta,
conforme (3.28).

α ≥ w"! + πv"! earmf!#$


∗" − earmf " ∗"
!#$ + πa! ena!#$ − ena!#$ (3.28)
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   137 

Onde:
k é o k-ésimo corte (hiperplano) do conjunto de cortes que representam a FCF
"
πv! é o coeficiente do k-ésimo corte associado à variável de estado energia armazenada
inicial
k
πat é o coeficiente do k-ésimo corte associado à variável de estado energia afluente
passada
∗%
earmf!"# é o estado (armazenamento) a partir do qual o k-ésimo corte foi construído
earmf!"# é a energia armazenada final do estágio t-1, ou energia armazenada inicial em t
!"# é o estado (afluência passada) a partir do qual o k-ésimo corte foi construído
ena∗%
ena!"# é a energia afluente no estágio t-1 (afluência passada)
w! é o termo constante do k-ésimo corte
"

Figura 3.46 – FCF em razão do armazenamento e afluência passada

Uma questão que se coloca é como parar o algoritmo. Para o algoritmo L-Shaped ou para
PDD, o critério adotado em geral consiste em comparar a diferença entre o limite superior e
inferior (comumente chamado de gap). Para problemas de pequeno porte, nos quais é possível
percorrer todos os cenários, o gap tende a zero após algumas iterações conforme ilustrado na
Figura 3.47. Entretanto, o comportamento para o algoritmo PDDE é diferente: não há incerte-
za no limite inferior, que tende para a solução ótima à medida em que o número de iterações
cresce, mas o limite superior é um estimador da solução do problema que pode apresentar
oscilações, embora seja não-viesado, conforme ilustrado na Figura 3.48.
Em problemas de grande porte, quando o algoritmo está próximo da convergência, em
geral observa-se (i) um crescimento lento do limite inferior, (ii) a média do limite superior
oscilando em torno do limite inferior e (iii) as soluções primais e duais do problema próximas.
Por outro lado, na prática muitas vezes não se dispõe de tempo suficiente para que todos es-
ses comportamentos sejam observados e opta-se por parar o algoritmo considerando critérios
138    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

alternativos tais como a estabilidade do limite inferior ou ao se observar o limite inferior den-
tro de um intervalo de confiança calculado para o limite superior.

Figura 3.47 – Algoritmo L-shaped – convergência

Figura 3.48 – Algoritmo PDDE – convergência

3.5.5 – Reamostragem de cenários


No método da PDDE apresentado na seção anterior apenas uma pequena porção da árvore
de cenários completa de cenários é visitada durante o cálculo da política ótima de operação.
Na Figura 3.49(a) e (b) estão ilustradas a árvore completa de cenários e a parcela desta árvore
que é visitada durante o cálculo da política ótima de operação. A árvore ilustrada no exemplo
da Figura 3.49 considera duas realizações para representar a incerteza futura (nó cheio e nó
vazio), ou seja duas aberturas, totalizando 16 cenários ao longo do horizonte de estudo.
Para possibilitar cobrir uma parcela maior da árvore de cenários, emprega-se reamostra-
gem de cenários ao longo das iterações da PDDE [33]. Isto é, a cada iteração são sorteados
novos cenários a serem visitados durante a simulação forward, como os cenários exibidos na
Figura 3.49 (c) e (d). Desta forma, ao final do processo uma porção maior da árvore completa
de cenários terá sido visitada, conforme pode ser observado na Figura 3.49 (e), aproximando-
-se ainda mais do ponto ótimo do problema de planejamento da operação energética.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   139 

Figura 3.49 – Reamostragem de cenários (Fonte: [33])

3.6 – Reservatórios equivalentes de energia

Alguns componentes são modelados de maneira diferenciada dependendo do horizonte de


planejamento considerado. Por exemplo, no horizonte de curto prazo, as usinas hidroelétricas
são modeladas de forma individualizada, já no escopo do planejamento de médio prazo, o
parque hidráulico é representado de forma equivalente.
Nos estudos de médio prazo, que consideram um horizonte de estudo de diversos anos,
torna-se conveniente tratar a configuração do sistema de geração hidrelétrica de forma sim-
plificada, através da agregação de todos os reservatórios de cada região em um único Reser-
vatório Equivalente de Energia (REE), conforme mostrado na Figura 3.50, e de e acordo com
a metodologia proposta em [1] e [44]. A simplificação da representação do parque gerador
hidráulico permite a exploração de outras características do sistema ao longo do horizonte de
planejamento, como a representação da incerteza hidrológica.
A ideia principal da formulação baseada em REEs é que a água contida em cada um dos
reservatórios é convertida em um montante de energia, cujo total forma a energia armazenada
no Reservatório Equivalente de Energia. Na Figura 3.50 são apresentadas as principais gran-
dezas de um REE, todas calculadas a partir dos dados das usinas individualizadas. A conversão
da água em energia foi abordada no Capítulo 2, mas repetiremos neste item alguns conceitos
necessários para o entendimento da construção dos Reservatórios Equivalentes de Energia.

Figura 3.50 – Principais grandezas no modelo equivalente


140    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

A conversão de água em energia dos reservatórios pertencentes a um REE supõe que toda
a água armazenada nestes reservatórios passará pelas turbinas da própria usina e em seguida
pelas turbinas de todas as demais usinas a jusante, até atingir o mar. A hipótese adotada pela
modelagem a sistema equivalente para transformação da água em energia é de que todos os
reservatórios de um mesmo REE serão esvaziados em paralelo.
A energia hidráulica produzida por uma usina é função do volume de água turbinada em
um instante de tempo, da altura de queda líquida e da sua produtibilidade específica, de acordo
com (3.29).
(3.29)
EH = ρ!"# ×H$%& × Q '()* × t

EH = ρ!"# ×H$%& × ∆V

Onde:
Hlíq é a altura de queda líquida (m)
ρesp é a produtibilidade específica da usina (MW/ m³/s / m)
Qturb é a vazão turbinada da usina (m³/s)
∆V é o volume de água turbinado em um instante de tempo (m³)

Como visto, a altura de queda líquida é obtida em função da cota de montante, obtido pelo
polinômio cota-volume, da cota de jusante ou nível do canal de fuga, calculada a partir do
polinômio vazão-nível de jusante, e das perdas no circuito hidráulico. No intervalo de tempo
mensal, como aquele utilizado no planejamento de médio prazo, o nível de canal de fuga será
mantido constante, isto é, não será considerado o polinômio vazão-nível de jusante no cálculo
da altura líquida.
(3.30)
H!í# = PCV V − PVJ Q $%&' + Q ()&$ − perdas
ou
H!í# = PCV V − canalfuga − perdas
Supondo o deplecionamento de uma usina, desde seu volume máximo até seu volume
mínimo, podemos calcular a EH resolvendo a integral dada em (3.31):

$%&'

𝐸𝐸H = ρ!"# × ' PCV V dV − canalfuga − perdas × Vmax − Vmin (3.31)


$%()
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   141 

Onde:
Vmax é o volume máximo da usina (hm3)
Vmin é o volume mínimo da usina (hm3)
PCV(V) é o polinômio cota-volume (m)

Definindo a altura equivalente (Heq) conforme (3.32), pode-se calcular a energia máxima
acumulada na usina como em (3.33).
!"#$
1
Heq = - PCV V dV − canalfuga − perdas (3.32)
Vmax − Vmin
!"%&

EH = ρ!"# ×Heq× Vmax − Vmin (3.33)

A formulação abordada neste capítulo pressupõe que a configuração do parque gerador


é estática, isto é, não se altera ao longo do horizonte de estudo. Porém, em estudos reais a
configuração é dinâmica, seja pela entrada de novas usinas, motorização de usinas existentes
e de alterações de níveis de montante e jusante das usinas. Mudanças na configuração levam
a modificações nas grandezas calculadas para o REE, e isto deve ser levado em conta durante
a construção dos reservatórios equivalentes de energia.
A seguir são descritas as principais variáveis que compõem um REE. Uma descrição mais
detalhada de todas as variáveis que compõe um REE, assim como a consideração da configu-
ração dinâmica do parque gerador, pode ser consultada em [32].

3.6.1 – Energia armazenável máxima


A energia armazenável máxima (EARMx) é a energia que pode ser gerada no sistema,
com o deplecionamento total dos reservatórios do sistema operando em paralelo, desconside-
rando afluências adicionais. A energia armazenada no REE como um todo será o somatório
da energia armazenada em todos os reservatórios que o compõem, de acordo com (3.34) e
conforme ilustrado na Figura 3.51.
(3.34)
𝐸𝐸ARMx!"#$$ = C ) Vmax" − Vmin" ) ρ$'(! Heq )
"∈&
)∈*"

Onde:
C é uma constante que depende do sistema de unidades adotado. No modelo NEWAVE
esta grandeza corresponde a 1/2.63.
R conjunto de reservatórios do sistema;
Ji conjunto de usinas a jusante do reservatório i inclusive;
142    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Vmax volume máximo do reservatório i (hm3);


Vmin volume mínimo do reservatório i (hm3);
ROesp rendimento global do conjunto turbina-gerador da usina j (MW/m3/s/m), representa
a quantidade de energia gerada por cada 1m3/s de vazão turbinada e 1 metro queda líquida;
Heq,j altura equivalente do reservatório j ou altura líquida para as usinas a fio d’água (m);
EARMx!"#$$ é a energia armazenável máxima no reservatório equivalente iree no instante
t, dado em (MWmês);

Figura 3.51 – Energia armazenada de um REE

O armazenamento inicial é calculado de forma similar à energia armazenável máxima,


bastando substituir o volume máximo (Vmax) pelo volume inicial e a altura equivalente dos
reservatórios (Heq) pela altura referente ao volume inicial, calculada a partir da integração do
polinômio cota-volume, conforme (3.35).
(3.35)
"#$#!
1
Hini! = * PCV v dv − canalfuga# − perdas#
Vini! − Vmin!
"%#$!

As usinas hidroelétricas que integram o sistema podem ser classificadas de acordo com
sua capacidade de regularização. De acordo com a discretização temporal em cada estudo
energético, algumas usinas são consideradas como usinas de regularização e outras como usi-
nas a fio d’água, isto é, sem capacidade de acumulação. Assim, existem usinas de regulariza-
ção mensal, usinas de regularização semanal e usinas de regularização diária. Para a operação
diária todas as usinas são consideradas como usinas de regularização.

3.6.2 – Energia natural afluente


A energia natural afluente (ENA) é a energia gerada a partir das afluências naturais a
todas as usinas pertencentes a um REE. Para cada REE o cálculo da energia natural afluente
é separado em duas parcelas: uma referente ao total de energia afluente a usinas de regula-
rização, chamada de energia controlável e outra relativa ao montante total afluente a usinas
a fio d’água, chamada de energia a fio d’água, conforme ilustrado na Figura 3.52. A energia
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   143 

afluente às usinas com capacidade de regularização é chamada de controlável uma vez que a
decisão de estocar ou utilizar esta água está sob o controle do operador. Já a vazão que chega
às usinas a fio d’água será turbinada ou vertida, pois não há a possibilidade de armazená-la.

Figura 3.52 – Energia controlável e fio d´água

A energia controlável de um REE, em um determinado período t, pode ser calculada de


acordo com (3.10). Notem que a vazão turbinada por uma usina com reservatório irá gerar
energia no próprio reservatório e em todas as usinas a fio d´água a jusante até o próximo reser-
vatório, exclusive. Quando a vazão turbinada chega ao próximo reservatório, esta vazão passa
ser considerada como vazão afluente a este reservatório.

EC!"#$$ = $ Q ",! ρ$&'! H" + $ ρ$&'" h(


"∈+
(∈*" (3.36)

Onde:
R é o conjunto de reservatórios do sistema
Fi é o conjunto de usinas a fio d’água entre a usina i e o próximo reservatório a jusante
Qi,t é a afluência natural ao reservatório i durante o período t (m3/s)
Hi é a altura do reservatório i, a 65% do volume útil (m)
hj é a altura de queda líquida da usina a fio d’água j (m)
Pespj é o rendimento global do conjunto turbina-gerador da usina j (MW/m3/s/m),
EC!"#$$ é a energia controlável do REE iree durante o período t (MWmês)

Observe que a altura de queda líquida considerada na equação (3.36) é uma altura média.
Assim, o montante de energia controlável está associado à energia armazenada média do REE.
Todavia, ao longo do cálculo da política o armazenamento do REE irá variar, sendo neces-
sário corrigir o valor de energia controlável associado a neste novo nível de armazenamento
do REE. Esta correção é realizada através de parábolas de correção, que são polinômios de
segundo grau ajustados a partir de níveis de armazenamento do REE. Para maiores detalhes
sobre as parábolas de correção, consulte [6] .
A soma das vazões que chegam às usinas sem capacidade de acumulação é transformada
em energia e chamada de Energia fio D´água Bruta (EFIOB) e é dada pela seguinte equa-
ção (3.37), dado um mês t. Como uma parcela da vazão afluente à usina a fio d´água já foi
144    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

contabilizada na energia controlável, deve-se considerar apenas a parcela incremental entre a


usina e o(s) reservatório(s) imediatamente a montante.

EFIOB!"#$$ = ( Q %,! − ( Q ',! ρ$+,! h%


(3.37)
%(* '()!

A Energia Fio D’água “Líquida” representa a máxima quantidade de Energia Fio D´água
que pode ser turbinada, considerando a capacidade máxima de engolimento da turbina. Para
calcular a energia à fio d’água líquida de um REE, num mês k, temos(3.38):

EFIO"#$$ = ' min + Q %&',) , Q ),! − ' Q %.! / ρ) h)


! (3.38)
)+- %+,!

Onde:

F conjunto de usinas a fio d’água


Mj conjunto de reservatórios imediatamente a montante da usina a fio d’água j
Qmax,j engolimento máximo da usina a fio d’água j (m3/s)
Qj,t afluência natural na usina a fio d’água j durante o período t (m3/s)
Qm,t afluência natural ao reservatório m, imediatamente a montante da usina a fio d’água
j, durante o período k (m3/s)
EFIOB!"#$$ é a energia fio d´água bruta do REE iree durante o período t (MWmês)
EFIO"#$$
! é a energia fio d´água líquida do REE iree durante o período t (MWmês)

A perda devido à limitação de turbinamento de um REE, denominada Energia Vertida


Não Turbinável, é dada pela diferença entre a energia fio d´água bruta e a energia fio d´água
líquida, de acordo com (3.39).
PERDA"#$$
! = EFIOB!"#$$ − EFIO"#$$
!
(3.39)

Finalmente, a soma da energia fio d´água bruta com a energia controlável de um REE é
denominada Energia Natural Afluente (ENA), dada em (3.40)

ENA"#$$
! = EC!"#$$ − EFIOB!"#$$ (3.40)

3.3.3 – Energia de vazão mínima, energia de desvio e energia evaporada


A energia de vazão mínima é a quantidade de energia gerada pela descarga mínima obri-
gatória dos reservatórios, em geral estabelecidas pela Agência Nacional de Águas. A energia
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   145 

de vazão mínima é calcula considerando que a energia é gerada pelo reservatório e todas as
usinas fio d’água a jusante até o próximo reservatório, exclusive, de acordo com (3.41).
(3.41)
EVMIN!"#$$ = ' Qmin",! ρ$&'! H" + ' ρ$&'" h(
"∈+
(∈*"
Onde:
Qmini,t é o requisito de vazão mínima obrigatória do reservatório i durante o período t
(m /s)
3

EVMIN!"#$$ é a energia de vazão mínima do REE iree durante o período t (MWmês)

A energia de outros usos d´água de um REE representa o montante de vazão desviada ou


adicionada imediatamente a montante de uma usina. O valor da energia de outros usos pode
ser positivo, representando um acréscimo de água, ou negativo, associado a um desvio de
água. Em geral, os montantes de outros usos d´água são definidos para atendimento à irriga-
ção, navegação, saneamento etc. Apesar de poder representar desvios e acréscimos de água,
em geral a energia de outros usos d´água é chamada de energia de desvio. Assim como na
energia controlável, esta variável é dividida em duas parcelas: desvio controlável e desvio fio
d´agua, de acordo com as equações (3.42) e (3.43), respectivamente:

EDESVc!"#$$ = ∑i∈R Qdesv",! ρ$&'! H" + ∑(∈*" ρ$&'" h( + ∑k∈F Qdesv+,! ∑,∈-.$ ρ$&'# h, (3.42)

EDESVf!"#$$ = ' Qdesv",! ρ$&'! h" + ' ρ$&'" h(


"∈*
(∈*"
(3.43)

Onde:
Ji é o conjunto de usinas a jusante do reservatório i
Nfk é o conjunto de usinas a jusante do primeiro reservatório, inclusive, a jusante da usina
fio d’água k
Qdesvi,t é vazão desviada a montante da usina i durante o período t (m3/s])
Qdesvk,t é vazão desviada a montante da usina fio k durante o período t (m3/s)
EDESVc!"#$$ é a energia de desvio controlável do REE iree durante o período t (MWmês)
EDESVf!"#$$ é a energia de desvio fio do REE iree durante o período t (MWmês)

Para as usinas com reservatório deve-se calcular o montante de energia armazenada que é
perdido devido à evaporação. Esta energia é calculada considerando que o montante de água
evaporada em um reservatório poderia ter sido utilizado em todas as usinas a jusante deste re-
servatório, inclusive, para gerar energia, conforme (3.44). O coeficiente de evaporação a cada
mês pode variar bastante, inclusive assumindo valores negativos.
146    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

1
EVAP!"#$$ = C +"∈+ cevap",!A",!
2630
+ ρ$&'! H(            (3.44)
(∈*"

Onde:
C uma constante que depende do sistema de unidades adotado. No modelo NEWAVE esta
grandeza corresponde a 1/2630.
Ai,t é o área do reservatório i durante o período t (km2)
cevapi,t é Coeficiente de evaporação do reservatório i durante o período t (mm/mês)
EVAP!"#$$ é a energia evaporada do REE iree durante o período t (MWmês)

A mesma observação sobre parábola de correção feita para energia controlável é válida
para energia de vazão mínima, energia de desvio e energia evaporada.

3.6.4 – Geração hidráulica máxima


A restrição de geração hidráulica máxima é uma forma simplificada de considerar a varia-
ção da produtibilidade das usinas hidrelétricas em função da altura de queda em um modelo
que considera reservatório equivalente de energia. Esta restrição é calculada para cada REE,
considerando a configuração de cada período.
A capacidade de geração hidráulica máxima de um REE é obtida a partir de um polinô-
mio de segundo grau em função do seu nível de armazenamento. Este polinômio é estimado
mensalmente a partir de três valores que correspondem à queda líquida do reservatório nos
volumes mínimo, médio (correspondente a 65% do volume útil) e máximo, conforme ilustra-
do na Figura 3.53.
Durante o processo de obtenção da política ótima de operação, a capacidade máxima de
geração de energia hidráulica de um REE em um determinado instante de tempo é dada de
acordo com o nível de armazenamento no início do período, seguindo a parábola dada em
(3.45).
GHMAX !"#$$ = a"#$$,! , "#$$,! "#$$,!
%&'() EARM"#$$.! + b%&'() EARM"#$$.! + c%&'()
(3.45)

Onde:
a&'((,* &'((,* &'((,*
!"#$% , b!"#$% , c!"#$% são os coeficientes do polinômio do REE iree no instante t;

EARM!"##.% é a energia armazenada no início do instante t do REE iree ;

GHMAX !"#$$ é a capacidade máxima de geração hidráulica REE iree no instante t;


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   147 

Figura 3.53 – Polinômio de geração hidráulica máxima

A capacidade máxima de geração de um REE em determinado período é calculada pela


equação (3.46), considerando todas as usinas pertencentes a este REE. Observe que esta gran-
deza depende da altura de queda líquida de cada usina (hi) e de um termo que depende do tipo
da turbina (kturb).
%&'()* 1!2#3!
Hliq "
GHMAX !"#$$ = ' 1 − tei-h" 1 − iph" ' nmaq " j pef" j min 1;   (3.46)
hncj" j
"∈ ./0 '+,

Onde:
R é o conjunto de usinas com reservatório do sistema
F é o conjunto de usinas a fio d’água
teifhi é a taxa média de indisponibilidade forçada da usina hidroelétrica i
iphi é a taxa média de indisponibilidade programada da usina i
nmaqi(j) é o número de máquinas do conjunto j da usina i
pefi(j) é a potência efetiva de cada máquina do conjunto j da usina i
Hliqi é a altura de queda líquida da usina i
hncji(j) é a queda nominal de cada máquina do conjunto j da usina i
kturbi é uma constante que depende do tipo de turbina (= 1,5 se o tipo da turbina é Francis
ou Pelton; = a 1,2 se o tipo da turbina é Kaplan)

Os três pontos necessários para o ajuste do polinômio de geração hidráulica máxima são
obtidos substituindo a altura de queda de todas as usinas na equação (3.46) pelas alturas de
148    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

queda correspondentes ao nível máximo, médio e mínimo do reservatório. A altura de queda


líquida é obtida de acordo com (3.47).

Hliq !,# = PCV!,# vol!,# − canalfuga!,# − perdas!,# (3.47)

As taxas médias de indisponibilidade forçada e programada são informadas pelo agente


responsável pela planta e devem representar de forma geral a razão entre o número de horas
de desligamento forçado e programado, respectivamente, e o número de horas total do período
de apuração considerado.

3.7 – Formulação matemática do problema de despacho

O planejamento da operação visa calcular estratégias de operação para as usinas hidrelé-


tricas e termelétricas de forma a minimizar o custo de operação no horizonte de planejamento.
Assim, o problema de operação ótima de um sistema hidrotérmico consiste em determinar
uma estratégia de operação que, a cada estágio do período de planejamento, conhecido o es-
tado do sistema no início do estágio, forneça as metas de geração de cada unidade geradora e
intercâmbio de energia entre os submercados.
A formulação matemática geral de um problema de minimização pode ser escrita confor-
me (3.48). Neste problema é possível representar restrições de igualdade, desigualdades e os
limites das variáveis de decisão x (restrições de caixa).

Min f(x)
s.a
g(x)=0 (3.48)
h(x)≤0
x≤x≤x

O problema de despacho ótimo resolvido que faz parte do planejamento da operação ener-
gética pode ser escrito de forma sucinta, de acordo com (3.49). Para resolver este problema,
conforme foi visto na seção anterior, utilizamos métodos de programação linear. Restrições
não lineares são representadas através de funções lineares por parte, como é o caso da função
de custo futuro e da função de produção.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   149 

Min Custo Total de Operação


s.a.
restrições de balanço de energia
restrições de atendimento a demanda
restrições da função de produção
(3.49)
restrições hidráulicas
restrições elétricas
função de custo futuro
restrições de caixa

A formulação dos problemas de médio e curto prazo se diferenciam na representação do


parque hidroelétrico, que é representado de forma agregada em reservatórios equivalentes de
energia no médio prazo, e de forma individualizada no curto prazo. Ambos consideram varia-
ção de produtibilidade com a altura queda, porém cada um com um nível de detalhamento. A
seguir será apresentado o problema de despacho ótimo de médio e curto prazo para um perío-
do t e um cenário hidrológico s.

3.7.1 – Formulação geral do problema de planejamento da operação energética


de curto prazo
No modelo DECOMP, o problema de planejamento da operação de curto prazo é mode-
lado representando as usinas de forma individualizada e utilizando o método de programação
dinâmica dual (PDD) para solução do problema. O problema percorre a árvore completa de
cenários iterativamente construindo uma aproximação da função de custo futuro para cada nó
da árvore completa de cenários, considerando como variável de estado o volume armazenando
no início do período de cada reservatório.
As variáveis de decisão do problema são a geração termelétrica, os volumes de vazão
turbinados e vertidos a cada aproveitamento, o montante de energia intercambiada entre os
submercados, o montante de energia não atendida (déficit) e o volume armazenado no final
do período. As variáveis de decisão são apresentadas na formulação em letras minúsculas. As
variáveis que são dados de entrada do problema são apresentadas em letras maiúsculas.

3.7.1.1 – Função objetivo


A função objetivo do problema de cada estágio e cenário é minimizar o custo total de ope-
ração, dado pela soma do custo imediato de operação, representado pelos custos de geração
térmica e os custos de corte de carga, e do custo futuro, dado pela função de custo futuro. A
150    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

parcela relativa ao custo futuro é multiplicada por uma taxa de desconto, que tem o propósito
de trazer este custo a valor presente.
Adicionalmente, pode-se representar na parcela de custo imediato os custos associados à
violação de restrições impostas ao problema, como restrições de defluência mínima obrigató-
ria, desvio de água para usos consultivos, etc.

(*+, (*+,

Min % % CT!"!,"$%& ∗ gt "!,"$%& + % CD"$%&


! ∗ def!"$%& + β ∗ α!/. (3.50)
!
"$%&-. "!∈()!"#$ "$%&-.

Onde:
CTtit,isbm é o custo de geração da UTE it, pertencente ao submercado isbm
gttit,isbm é o montante despachado da UTE it, pertencente ao submercado isbm
CDtisbm é o custo de déficit do REE iree, dado pela função de custo de déficit
deftisbm é o montante de energia não atendida (déficit) do submercado isbm
β é o fator de desconto, calculado a partir de uma taxa de desconto mensal txdesc (β=1/
(1+txdesc))
αt+1 é o custo futuro associado ao período t
NTisbm é o conjunto de térmicas pertencentes ao submercado isbm
NSBM é o número de submercados representados na configuração

3.7.1.2 – Restrição de balanço de energia


As restrições de balanço de energia (ou balanço hídrico) representam a variação do volu-
me do reservatório entre dois períodos consecutivos. De forma simplificada, o volume final do
reservatório é uma função do volume armazenado no início do período e as vazões afluentes
e defluentes, conforme ilustrado na Figura 3.54. Observe que o volume inicial do período é o
volume final do período anterior.
Na restrição de balanço de energia também podem ser representadas outras grandezas
como a evaporação e retirada e acréscimo de água devido aos usos consultivos.
A vazão afluente a uma usina é dada pela soma de sua vazão incremental (ou lateral) e os
montantes decididos de vazão defluente das usinas a imediatamente montante, de acordo com
(3.52). A vazão defluente é dada soma das vazões turbinada e vertida de acordo com (3.51).
Desta forma, equação que representa o balanço hídrico de uma usina pode ser escrita con-
forme (3.53). Existirão tantas restrições do tipo (3.53) quantas forem as usinas hidrelétricas
representadas na configuração do sistema. Caso a usina não possua capacidade de armazena-
mento (usina fio d´agua), as variáveis relacionadas ao volume armazenado serão iguais a zero,
e a equação (3.53) pode ser escrita como (3.54).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   151 

Figura 3.54 – Balanço de energia de uma usina

qdef!"#$% = qturb"#$%
! + qvert "#$%
! (3.51)

qa#l"#$%
! = QINC!"#$% + + qdef!& = QINC!"#$% + + qturb&! + qvert &!
&∈(!"#$ &∈(!"#$
(3.52)

v!"#$% = v!&'
"#$% + qa&l"#$% − qdef "#$%
! !

v!"#$% = v!&'
"#$% + QINC "#$% − qturb"#$% − qvert "#$% + /
! ! ! qturb(! + qvert (! (3.53)
(∈*!"#$

QINC!"#$% + & qturb&! + qvert &! = qturb"#$%


! + qvert "#$%
! (3.54)
&∈(!"#$

Onde:
vtiuhe é o volume armazenado no final do período t para UHE iuhe
v (t-1)
iuhe
é o volume armazenado no final do período t-1 para UHE iuhe, que equivale ao vo-
lume armazenado inicial do período t
QINCtiuhe é a vazão incremental durante o período t para UHE iuhe
qturbtiuhe é a vazão turbinada durante o período t para UHE iuhe
qverttiuhe é a vazão vertida durante o período t para UHE iuhe
Miuhe é o conjunto de usinas imediatamente a montante da UHE iuhe
qafltiuhe é a vazão afluente durante o período t para UHE iuhe
qdef t
iuhe
é a vazão defluente durante o período t para UHE iuhe
152    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

A vazão afluente (3.52) não considera tempo de viagem entre as usinas. Caso houvesse
tempo de viagem o volume defluente da usina de montante pode levar algum tempo até chegar
como vazão afluente à usina de jusante. Portanto, neste caso é necessário fazer uma composi-
ção entre a vazão defluente da usina de montante do período atual e do período anterior (um
ou mais períodos anteriores).

3.7.1.3 – Função de produção de energia hidráulica


A energia gerada por uma usina hidroelétrica, como visto no Capítulo 2, varia com sua
produtibilidade de acordo com uma função não linear do volume armazenado e da vazão de-
fluente no período. A esta função dá-se o nome de função de produção hidroelétrica (FPH).
Uma forma simplificada de considerar a FPH no planejamento da operação energética
seria aproximá-la como uma função linear, supondo uma produtibilidade constante, que não
leva em conta a variação na altura de queda da usina. Porém, é possível representar uma FPH
através de uma função linear por parte, uma aproximação mais acurada do que a anterior. Em
[47] é descrito de forma detalhada a função de produção hidroelétrica aproximada (FPHA)
que atualmente é representada no modelo de planejamento da operação de curto prazo. A Fi-
gura 3.55 ilustra essa aproximação da função de produção energética de um aproveitamento
hidrelétrico.

Figura 3.55 – Função de produção de uma usina

Assim, a energia hidroelétrica gerada por uma usina durante o período t é obtida consul-
tando-se os cortes da FPHA e limitada ao seu montante máximo de geração, de acordo com a
equação (3.55). Um corte, ou hiperplano, da FPHA é dado pela função em (3.56).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   153 

gh"#$%
! ≤ CorteFPHA"#$%
& v!"#$% , v!'(
"#$% , qturb"#$% , qvert "#$%
! !

k = 1,...,ncor_fpha (3.55)

gh"#$%
! ≤ GH!"#$%

CorteFPHA"#$%
! .
v+"#$% + v+,-
"#$%
= α γ"#$%,!
& + γ"#$%,!
()* + γ"#$%,! "#$% + γ"#$%,! qvert "#$%
+#./ qturb+ (%.+ + (3.56)
2

k= 1,...,ncor_fpha

Onde:
ghtiuhe é a geração hidrelétrica decidida no período t para usina iuhe
CorteFPHAkiuhe (.) é o k-ésimo corte da função de produção hidroelétrica aproximada da
usina iuhe
ncor_fpha é o número de cortes da FPHA da usina iuhe
"#$%,' "#$%,' são coeficientes do k-ésimo corte da FPHA
α, γ"#$%,'
! , γ"#$%,'
()* , γ+#,- , γ(%,+

GH!"#$% é a geração máxima no período t para usina iuhe

3.7.1.4 – Restrição de atendimento a demanda


A demanda de cada submercado é atendida pela geração termelétrica, geração hidroelé-
trica e importação de energia de outros submercados. Em situações de escassez de recursos
para atendimento à demanda, é acionada uma térmica fictícia, de capacidade ilimitada, que
representa cortes de energia (déficit). O custo do déficit é dado por uma função de custo de
déficit, cujo estabelecimento será explicado mais adiante.
Em geral, o problema de despacho hidrotérmico visa atender uma demanda líquida, isto
é, o mercado de energia do período em questão abatido o montante de geração compulsória,
como a geração das usinas eólicas, solares, PCHs, biomassa etc. Adicionalmente, conside-
ra-se uma variável para absorver o excesso de energia que porventura possa ocorrer em um
submercado.
A equação (3.57) mostra a restrição de atendimento a demanda para um submercado para
o período t. Cada submercado tem sua própria equação de atendimento a demanda.
154    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

! gt "!,"$%&
!
"!∈()!"#$

+ ! gh"*+,,"$%& + def!"$%& + ! imp"$%&,- − ! exp"$%&,- − exc!"$%& (3.57)


! ! !
"!∈(/!"#$ -∈.!"#$ -∈.!"#$
= DEM!"$%& −GPEQ"$%&
!

Onde:
NHisbm é o conjunto de hidrelétricas pertencentes ao submercado isbm
impt(isbm,j) é a energia importada do submercado j pelo submercado isbm durante o período t
expt(isbm,j) é a energia exportada do submercado isbm para o submercado isbm durante o
período t
Sisbm é o conjunto de submercados interligados ao submercado isbm
exctisbm é o excesso de energia do submercado isbm durante o período t
DEMtisbm é a demanda de energia do submercado isbm durante o período t
GPEQtisbm é o montante de geração de usinas não simuladas do submercado isbm durante
o período t

A restrição apresentada acima não considera a representação da curva de demanda em


patamares de carga. Usualmente no problema de planejamento da operação energética são
considerados três patamares de carga de forma a representar os períodos de maior e menor
consumo (carga pesada, carga média e carga leve). Cada um dos patamares é caracterizado por
uma duração e uma profundidade. A duração indica o percentual de horas dentro do estágio
analisado que a carga está no patamar em questão, e a profundidade indica a intensidade da
carga neste patamar. A representação da carga em patamares de carga está ilustrada na Figura
3.56. A soma das durações dos patamares deve ser igual a 1, e soma da área de cada patamar
(duração x profundidade) deve ser igual à área da carga original, isto é, 𝑑𝑑𝑑𝑑𝑑𝑑!"#$%

Figura 3.56 – Patamares de carga

Caso seja considerado patamares de carga, haverá tantas equações do tipo (3.57) quan-
to for o número de patamares. Neste caso, as variáveis de decisão relacionadas à geração
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   155 

termelétrica, geração hidrelétrica, importação/exportação de energia e déficit também serão


consideradas por patamar de carga.

3.7.1.5 – Função de custo futuro


A função que traduz o valor esperado do custo futuro é representada por um conjunto de
hiperplanos, conhecidos por cortes de Benders, apresentados na equação (3.58). Apesar da
omissão do índice relativo ao cenário na formulação apresentada, ressalta-se que cada nó da
árvore de cenários tem sua própria função de custo futuro.
*+,-
α!"# ≥ w$,! + % π&'() &'()
$,! ∗ v!
&'().#
(3.58)

k = 1, ..., ncorfcf
Onde:
ncorfcf é o número de cortes da FCF construída pelo DECOMP no período t+1 (e consul-
tada no período t e cenário s)
NUHE é o número total de usinas com reservatórios considerado na configuração do SIN
π$%&'
!,# é o coeficiente associado à variável volume armazenado inicial da usina iuhe no
período t + 1 do k-ésimo corte da FCF
wk,t é o termo constante do k-ésimo corte da FCF construída no período t + 1

Como visto, o acoplamento entre as etapas de planejamento de médio e curto prazo é rea-
lizado através da função de custo futuro. Diferentemente do modelo de curto prazo, a função
de custo futuro do modelo de médio prazo é válida para todos os nós (cenários) de um período,
conforme equação (3.59).
Como o modelo de médio prazo considera uma representação agregada da configuração
hidrelétrica, é necessário fazer uma transformação de variáveis, isto é, deve-se calcular a
energia armazenada e a energia afluente do reservatório equivalente de energia a partir os
montantes de armazenados e afluentes às usinas individualizadas, de acordo com (3.60). Ape-
sar do modelo de curto prazo utilizar apenas a variável armazenamento inicial como variável
de estado, é necessário calcular as variáveis relacionadas às energias afluentes passadas, dado
que para o modelo de médio prazo estas variáveis também são variáveis de estado e, portanto,
fazem parte da função de custo futuro.
156    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

*+,, *+,, 0!"##


'()) '())
α!"# ≥ ω$,!"# + % Π&$,!"# ∗ earmf!'()) + % % Π.,' $,!"# ∗ ENA'())
!"#/' (3.59)
'())-# '())-# '-#

k = 1, ..., ncor_fcf_nw

earmf!"#$$ = ' ρ"')$ "')$


%&'( ∗ v!
"')$∈ "#$$

iree = 1, ..., NREE (3.60)


ENA%&''
!"#$% = % ρ%-/' %-/'
()%+,-. ∗ QINCR !"#$%
%-/'∈ %&''

iree = 1, ..., NREE; i =1,...,


Onde:
ncor_fcf_nw é o número de cortes da FCF construída pelo NEWAVE no período T + 1
(atualmente 3º mês)
NREE o número total de REEs considerado na configuração do SIN
ωk,T+1 é o termo constante do k-ésimo corte da FCF construída no período T +1

Π!'())
",$%& é o coeficiente associado à variável energia armazenada inicial do REE iree no
período T + 1 do k-ésimo corte da FCF

Π!,# #())
$,%&' é o coeficiente associado à variável energia afluente no i-ésimo período passado
do REE iree no período T+1 do k-ésimo corte da FCF

p!"## é o número de variáveis de estado relacionadas à afluência passada necessárias


para o REE iree. Este valor provém da ordem do modelo autorregressivo utilizado para mode-
lar a energia natural afluente do REE iree
earmf!"#$$ é a energia armazenada do REE iree no final do período T (inicial período T + 1)

ENA%&''
!"#$% é a energia afluente do REE no período T + 1-i

ρ%#&'
!"#$ é a produtilibilidade acumulada da usina iuhe, considerando uma altura equivalente

!"%$%&' é a produtilibilidade acumulada da usina iuhe, considerando uma altura cor-


ρ(&)*
respondente à 65% do seu volume útil
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   157 

As produtibilidades acima são consideradas para manter equivalência aos montantes de


energia calculados para construção dos reservatórios equivalentes de energia.

3.7.1.6 – Limitação de variáveis


As variáveis de decisão do problema em geral possuem limitações, resultantes das suas
características físicas ou de restrições impostas ao problema. Por exemplo, todo reservatório
possui uma capacidade máxima de armazenamento, que deve ser representada no problema de
despacho. Adicionalmente, em algumas situações, são impostos limites máximos armazena-
mento, por exemplo, para atender aos requisitos de volume de espera para controle de cheias.
Da mesma forma, restrições de armazenamento mínimo podem ser necessárias para garantir
uma operação adequada para usina, por exemplo, evitando a cavitação nas turbinas. As limi-
tações descritas acima são apresentadas em (3.61).

V!"#$% ≤ v!"#$% ≤ V!"#$%


(3.61)
ou
V!"#$% ≤ v!"#$% ≤ VMAX !"#$%

As usinas hidrelétricas possuem restrições físicas que limitam seu turbinamento máximo,
por outro lado a imposição de um montante mínimo de vazão deplecionada em geral está re-
lacionada com o atendimento aos usos múltiplos da água. A consideração de limites mínimos
e máximos para vazão afluente e vazão defluente são decorrentes da necessidade de represen-
tação de restrições hidráulicas no problema de despacho. Na equação (3.62) são apresentadas
as restrições para as variáveis mencionadas.

QTUR"#$%
! ≤ qtur!"#$% ≤ QTUR"#$%
!

QDEF!"#$% ≤ qdef!"#$% ≤ QDEF!"#$% (3.62)

QAFL"#$%
! ≤ qa3l"#$%
! ≤ QAFL"#$%
!

Limites máximos e mínimos também podem ser declarados para geração de energia hi-
drelétrica e termelétrica, assim como para o montante de energia escoado pelos troncos de
interligação, de acordo com (3.63), (3.64) e (3.65), respectivamente.

GH!"#$% ≤ gh"#$%
! ≤ GH!"#$% (3.63)
158    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

GT!"! ≤ gt "! "!


! ≤ GT!
(3.64)
0 ≤ def!"! ≤ ∞

IMP!"#$%,' ≤ imp"#$%,'
! ≤ IMP!"#$%,'
(3.65)
EXP!"#$%,' ≤ exp"#$%,'
! ≤ EXP!"#$%,'

O limite inferior da geração térmica é chamado de parcela inflexível. Em geral, as infle-


xibilidades das usinas térmicas são decorrentes de contratos de compra de combustível e/ou
de restrições elétricas necessárias ao problema de despacho. Em geral, a parcela inflexível da
geração térmica é abatida diretamente da demanda do respectivo submercado, e o montante
de geração térmica passível de ser despachado fica limitado de acordo com (3.66). Neste caso,
para calcular o custo total de operação do período, deve-se somar ao custo obtido em (3.50) o
montante associado ao despacho obrigatório de GT!"! .

0 ≤ gt "! "! "!


! ≤ GT! − GT! (3.66)

Vale a pena ressaltar, que usinas térmicas despachadas apenas em sua inflexibilidade não
influenciam no custo marginal de operação.
Restrições elétricas envolvendo os recursos utilizados para atender a demanda podem ser de-
claradas no problema de despacho, assim como restrições hidráulicas envolvendo todas as usinas
pertencentes a um reservatório equivalente de energia ou um subconjunto destas usinas. Uma
restrição muito comum de ser representada nos problemas de planejamento da operação energé-
tica é de armazenamento mínimo nos reservatórios equivalentes de energia. Neste caso, a energia
armazenada em todas as usinas que fazem parte do REE em questão é comparada com o limite
imposto pela restrição. A formulação matemática de todas as restrições consideradas no problema
de planejamento de curto prazo, adotada pelo modelo DECOMP pode ser consultada em [7].

3.7.2 – Formulação geral do problema de planejamento da operação energética


de médio prazo
De forma geral, o problema de despacho resolvido a cada período e cenário pelo mode-
lo de planejamento da operação energética de médio prazo é bastante similar ao problema
resolvido pelo modelo de curto prazo. No problema de médio prazo, as variáveis de decisão
são a geração termelétrica, energia gerada hidráulica e energia vertida por REE, o montante
de energia intercambiada entre os submercados, o montante de energia não atendida (déficit)
e a energia armazenada no final do período. O método de solução adotado pelo modelo de
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   159 

planejamento de médio prazo é programação dinâmica dual estocástica e o estado do sistema,


composto pelas variáveis que descrevem o sistema em um dado período e portanto podem in-
fluir no resultado da operação, são o nível de armazenamento no início do estágio e as energias
afluentes aos estágios anteriores de todos os REEs.
A formulação a seguir é apresentada de forma simplificada, sem considerar, por exemplo,
acoplamento hidráulico entre os REEs e a representação os patamares de carga. Maiores deta-
lhes sobre a formulação matemática empregada no problema resolvido pelo modelo NEWA-
VE podem ser obtidos em [6].

3.7.2.1 – Função objetivo


A cada período t e cenário s deseja-se minimizar o custo presente mais o custo futuro de
operação. O primeiro é representado pelos custos dos combustíveis das usinas termelétricas
mais o custo associado à interrupção do fornecimento de energia. O segundo representa o
impacto futuro de uma decisão presente, ou seja, o custo de operação desde o estágio seguinte
até o final do horizonte de estudo.

(*+, (*+,
Min % % CT!"!,"$%& ∗ gt "!,"$%&
! + % CD"$%&
! ∗ def!"$%& + β ∗ α!/. (3.67)
"$%&-. "!∈()!"#$ "$%&-.

3.7.2.2 – Restrição de balanço de energia controlável


A energia armazenada ao final do período deve ser igual à energia armazenada no início do
período somada a parcela controlável da energia natural afluente e subtraída a energia gerada
vertida e evaporada durante o período. Existe uma restrição de balanço de energia controlável
para cada reservatório equivalente de energia.

earmf!"#$$ = earmf!%&
"#$$
+ γ"#$$
! ENA"#$$
! − gh"#$$
! − evert "#$$
! − evap"#$$
! (3.68)

Onde:
𝛾𝛾!"#$$ é um fator de separação que divide a energia natural afluente gerada pelo modelo
de geração de cenários sintéticos em energia controlável e energia fio d´água.

Como será visto no Capítulo 6, a incerteza hidrológica é representada através de uma


árvore de cenários gerada por um modelo autorregressivo periódico. A grandeza modelada é
a energia natural afluente ao REE, porém é necessário separar a ENA gerada em uma parcela
controlável e fio d´água por conta da modelagem a sistemas equivalentes utilizada no modelo
de médio prazo. O fator de separação é utilizado para este propósito, e é obtido a partir de uma
análise do histórico de energia natural afluente.
160    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

3.7.2.3 – Vertimento fio d´água (perda fio d´água)


Quando uma usina sem capacidade de armazenamento atinge sua capacidade máxima de
turbinamento, todo o excedente de vazão afluente é vertido. Porém quando se representa di-
versas usinas agregadas em uma usina equivalente, como é feito na representação a sistemas
equivalentes, a princípio não é possível calcular vertimentos que ocorrem pontualmente em
algumas usinas. O vertimento só ocorre quando a capacidade de turbinamento máximo da
usina equivalente for atingida.
Para tornar a representação do vertimento fio d´água mais próxima do que ocorre na ope-
ração individualizada, é utilizada uma função linear por partes, dada na equação (3.69), que
estima o montante de energia vertida fio d´água localizada 2]. Caso a restrição (3.69) esteja
na igualdade, o vertimento é dito não turbinável, isto é, não havia capacidade para turbinar
este montante. Caso contrário, a energia vertida será composta por uma parcela de vertimento
turbinável.

evertf!"#$$ ≥ a"#$$
%,! 1 − γ"#$$
! ENA"#$$
! − b"#$$
%,! (3.69)
k = 1, ...,nretas

3.7.2.4 – Restrição de balanço de energia fio d´água


Esta restrição representa o montante de energia efetivamente gerado pelas usinas a fio
d’água. É calculada abatendo-se o vertimento a fio d´água, também chamado de perdas a fio
d´água, da parcela de energia fio d´água bruta.

ghf!"#$$ = 1 − γ"#$$
! ENA"#$$
! − evertf!"#$$ (3.70)

3.7.2.5 – Restrição de geração hidráulica máxima


A restrição de geração hidráulica máxima é uma forma simplificada de considerar a varia-
ção da produtibilidade das usinas hidrelétricas em razão da altura de queda em um modelo que
considera reservatório equivalente de energia. A soma da geração hidráulica total (controlável
e fio d´água) não deve ultrapassar um limite máximo calculado em razão da energia armaze-
nada no início do período, de acordo com (3.71).

"#$$
gh"#$$
! + ghf!"#$$ ≤ ghmax(earmf!%&
"#$$
,! (3.71)

3.7.2.6 – Restrição de atendimento a demanda


Esta restrição representa o atendimento ao mercado de energia através das gerações das
usinas hidráulicas, térmicas e usinas não simuladas. Adicionalmente, devem ser considerados
os montantes de energia trocados entre os submercados, e um possível déficit no sistema.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   161 

Existirá tantas restrições de atendimento a demanda quantos forem os submercados e os pa-


tamares de carga. Todavia, nesta formulação simplificada, não está sendo representada a mo-
dulação da curva de carga.

it,isbm iree,isbm iree,isbm isbm,j isbm,j


! gt t ! ght + ! ghft + deftisbm + ! impt − ! expt − exctisbm
it∈NTisbm iree∈isbm iree∈isbm j∈Sisbm j∈Sisbm (3.72)
= DEMtisbm −GPEQisbm
t

3.7.2.7 – Função de custo futuro


As restrições relativas ao custo futuro representam o acoplamento temporal das decisões
presentes, pois traduzem o aumento esperado no custo de operação dos períodos subsequentes
por causa de um possível acréscimo no despacho de geração térmica devido ao uso da água
armazenada no reservatório para geração hidráulica no estágio t.
α!"#
+,--
'())
≥ ω$,!"# + % Π&$,!"# ∗ earmf*'())
'()).#
+,-- 1!"##
(3.73)
'())
+ % % Π/,' $,!"# ∗ ENA'())
!"#0'
'()).# '.#

k = 1, ..., ncor_fcf

3.7.2.8 – Limitação das variáveis


Pode-se representar no problema limites inferiores e superiores para as variáveis de deci-
são do problema. Em geral, estes limites estão associados a restrições físicas do sistema ou a
restrições hidráulicas ou elétricas impostas ao sistema.

EARM!"#$$ ≤ earmf!"%&$ ≤ EARM!"#$$ (3.74)

GT!"! ≤ gt "! "!


! ≤ GT!
(3.75)
0≤ def!"! ≤∞

IMP!"#$%,' ≤ imp"#$%,'
! ≤ IMP!"#$%,'
(3.76)
EXP!"#$%,' ≤ exp"#$%,'
! ≤ EXP!"#$%,'
162    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

3.8 – Acoplamento entre as etapas de médio e curto prazo

Conforme mostrado anteriormente, a comunicação entre os modelos NEWAVE, DECOMP


e DESSEM é feita através da Função de Custo Futuro, que indica o benefício incremental no
futuro de se manter a água estocada nos reservatórios.
Como as variáveis do DECOMP estão associadas às usinas individualizadas enquanto
às variáveis do NEWAVE, ao reservatório equivalente de energia (REE), conforme ilustrado
na Figura 3.57, então uma transformação deve ser feita no acoplamento entre os modelos. O
DECOMP acopla com a FCF do NEWAVE ao final do segundo mês, as variáveis para o aco-
plamento são a energia armazenada no final do segundo mês, a energia natural afluente dos
dois primeiros meses e dos meses anteriores ao início do estudo.

Figura 3.57 – Representação parque gerador

Para fazer este acoplamento são necessárias duas transformações. A primeira transfor-
mação tira proveito do enfoque de árvore completa do DECOMP, em que se conhece com
exatidão quais são as afluências anteriores ao acoplamento com o NEWAVE. Pode-se, então,
eliminar os eixos da FCF relacionados às afluências anteriores, considerando apenas a pro-
jeção dos cortes associada às afluências anteriores conhecidas sobre o plano Custo Futuro
versus Energia Armazenada, como mostra a Figura 3.58.
A Energia Natural Afluente passada para fins de acoplamento deve ser calculada de acordo
com a formulação apresentada (3.77a).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   163 

Figura 3.58 – Acoplamento entre os modelos NEWAVE e DECOMP

O passo seguinte é a conversão dos armazenamentos de todas as usinas de um mesmo


REE na Energia Armazenada do REE. Assim como no cálculo da energia natural afluente,
deve-se calcular energia armazenada de acordo com a formulação apresentada em (3.77a). O
acesso aos cortes da FCF do NEWAVE é feito com a variável calculada .

earmf!"#$$ = ∑"')$∈ "#$$ ρ"')$ "')$


%&'( ∗ v! iree= 1, ..., NREE (3.77a)

ENA"#$$ "')$ "')$


!,-." = ∑"')$∈ "#$$ ρ/0%%&'( ∗ QINCR !,-." iree= 1, ..., NREE; i=1,...,piree
(3.77b)

O acoplamento entre os modelos de curto prazo e programação da operação, DECOMP e


DESSEM, pode ser feito através da FCF do DECOMP ou através de metas operativas para as
usinas hidroelétricas, termoelétricas ou metas de intercâmbio entre subsistemas. Atualmente,
o problema resolvido pelo DESSEM acopla com a FCF construída pelo segundo estágio do
DECOMP. Para maiores detalhes sobre a formulação empregada no modelo DESSEM, con-
sulte [8].

3.9 – Representação das usinas não simuladas

Nos estudos de planejamento energético de médio e curto prazo, atribui-se a denominação


de usinas não simuladas àquelas usinas que não são simuladas individualmente nos modelos
matemáticos (NEWAVE/DECOMP), e que disponibilizam energia para o SIN.
O conjunto das usinas não simuladas engloba, independentemente de sua potência insta-
lada, pequenas centrais hidroelétricas (PCH), pequenas centrais térmicas (PCT), em geral à
164    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

biomassa, usinas eólicas (UEE) e usinas fotovoltaicas (UFV). Tais fontes geradoras não são
controladas pelo ONS.
As estimativas da disponibilidade das usinas não simuladas para o SIN são agregadas por
subsistema e informadas aos modelos matemáticos, sendo abatidas diretamente da carga do
subsistema correspondente.
Com o intuito de unificar todo arcabouço regulatório relacionado à elaboração do PMO,
bem como endereçar problemas observados nas resoluções vigentes, em 2 de abril de 2019, a
ANEEL emitiu a Resolução Normativa nº 843/2019, que estabelece critérios e procedimentos
para elaboração do Programa Mensal da Operação e formação do Preço de Liquidação de
Diferenças (PLD).

3.10 – Função custo de déficit

No problema de planejamento da operação energética, quando o sistema não dispõe de re-


cursos suficientes para atender à demanda, é necessário acionar o déficit de energia. Na mode-
lagem apresentada anteriormente, o corte de carga é representado como uma térmica fictícia,
de capacidade ilimitada e com um custo marginal de déficit, em geral, de valor muito elevado.
O custo marginal do déficit é uma medida que visa quantificar o valor da energia para a so-
ciedade, e tem um papel importante no cálculo da política ótima de operação para o setor elé-
trico. Se for considerado um custo marginal de déficit muito baixo pode haver uma sinalização
de uso intensivo dos reservatórios, resultando em uma elevação do risco de déficit futuro. Por
outro lado, se for considerado um custo muito alto, poderá haver um aumento desnecessário
no despacho das usinas termoelétricas, aumentando o custo total de operação do SIN.
O custo marginal do déficit normalmente está associado ao impacto da interrupção no
fornecimento de energia elétrica na produção econômica de um país. A função custo de dé-
ficit pode ser obtida por uma metodologia que calcula o custo implícito do déficit ou pode
ser calculada de forma explícita utilizando a Matriz Insumo- Produto [12]. Nesta última, o
custo marginal do déficit é calculado avaliando-se o impacto no PIB ocasionado pela falta de
energia em cada setor da economia através da matriz insumo-produto nacional. Este método
foi utilizado pelo Grupo Coordenador do Planejamento dos Sistemas Elétricos (GCPS), e pos-
teriormente, pela Comissão para Estudo do Custo de Déficit de Energia Elétrica (CDEE) para
calcular o custo de déficit global e sua representação em patamares, formando uma função
de custo de déficit. A função de custo de déficit é atualizada anualmente pelo índice IGP-DI
(índice geral de preços), conforme disposto na Resolução Normativa nº 795/2017 da ANEEL.
Na Figura 3.59 está ilustrado uma função de custo de déficit com quatro e um patamares.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   165 

Figura 3.59 – Função custo de déficit

A Resolução nº 7/2016, do Conselho Nacional de Política Energética, estabeleceu a uti-


lização da função de déficit em patamar único de preço a partir de 2017. A curva de déficit
passou a ter apenas um patamar calculado segundo procedimento descrito na Nota Técnica
EPE 21/2016. Desde então, a função de custo de déficit foi unificada para os estudos de pla-
nejamento da operação e da expansão.

3.11 – Representação da taxa de desconto

Entre gerar a mesma quantidade de energia em uma usina termoelétrica hoje ou daqui
a cinco anos, considerando que o custo do combustível não se altere, qual seria a melhor
decisão?
Certamente, o dinheiro com que se compraria o combustível hoje poderia ser aplicado,
rendendo juros durante cinco anos, e o combustível que fosse comprado daqui a cinco anos
consumiria apenas uma parte do dinheiro aplicado. Isso leva à necessidade de atualizar todos
os custos para o valor presente, de forma a tomar decisões enxergando custos comparáveis.
O mesmo conceito se aplica à Função de Custo Futuro, que a cada mês é depreciada a
uma taxa que representa exatamente a rentabilidade real à aplicação do dinheiro. Esta taxa é
denominada Taxa de Desconto. Por determinação da ANEEL, atualmente a Taxa de Desconto
está em 12% ao ano.

3.12 – O custo marginal de operação

Um dos resultados obtidos pelos modelos de otimização utilizados para o planejamento


da operação é o custo marginal de operação por submercado, que matematicamente é dada
pelo valor da variável dual associada à equação de atendimento a demanda na solução ótima
do problema.
166    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

Enquanto o valor da água é a derivada do custo futuro da operação em relação à energia


armazenada, sendo esta decrescente, o custo marginal de operação é a derivada do custo futu-
ro de operação em relação à carga, sendo esta crescente. Em outras palavras, o CMO é valor
que correspondente a resposta à seguinte pergunta: “depois de atendido todo o consumo, qual
é o custo adicional que seria causado pelo atendimento de um acréscimo marginal de carga,
em cada região”. O recurso a ser utilizado para o atendimento ao acréscimo de carga é que
define o custo marginal de operação, conforme apresentado na Figura 3.60.
Pelo fato do sistema de geração de energia no Brasil ser predominantemente hidroelétrico,
na maior parte das vezes o custo marginal de operação acaba sendo o próprio valor da água.

Figura 3.60 – Custo marginal de operação

O custo marginal de operação serve como referência para o cálculo do Preço de Liquida-
ção de Diferenças (PLD), cujo valor é utilizado para valorar energia comercializada no Mer-
cado de Curto Prazo. Neste caso, o PLD é calculado e divulgado pela CCEE a partir de um
caso sem restrições de transmissão internas aos submercado, e limitado por preços mínimo e
máximo.

3.13 – Condições de contorno para horizonte de estudo

Um aspecto que deve ser levado em consideração ao se resolver o problema de planeja-


mento de médio prazo (modelo NEWAVE) é o “efeito de fim de mundo”. Ao final do último
ano de planejamento quais serão os custos futuros esperados? Se considerarmos custo nulo
ao final do último ano, a operação dentro do período de interesse fará um uso intenso dos
recursos hidráulicos, principalmente no último ano do período de planejamento, o que pode
ocasionar problemas na segurança energética do sistema (esvaziamento dos reservatórios).
Como não há outro resultado futuro a ser acoplado ao modelo NEWAVE, isso é resolvido
com a adição de mais alguns anos de simulação ao próprio horizonte de estudo. Este período
adicional tem a mesma configuração e as mesmas condições do horizonte de planejamento e
é chamado de período pós-estudo ou estático final.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   167 

O período pós-estudo é composto por cinco anos, horizonte considerado suficiente para
que o sistema não seja afetado pelo “efeito de fim de mundo”. Vale ressaltar a configuração do
sistema durante o período pós-estudo é estática.
Já no planejamento de curto prazo (modelo DECOMP) este problema não existe, pois
ao final do seu horizonte de planejamento é acoplada a função de custo futuro do NEWAVE,
conforme visto anteriormente.
168    O sistema interligado nacional e o planejamento da operação energética

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4
SEGURANÇA ENERGÉTICA

Modelagem de aversão ao risco é um tema recorrente em processos de tomada de deci-


são sob incertezas e muitas tentativas de descrever precisamente o significado de risco foram
feitas na literatura científica. No setor elétrico brasileiro, uma das principais preocupações
que considera a noção de risco é o gerenciamento dos suprimentos energéticos de modo a
satisfazer um balanço entre a segurança do atendimento à demanda e a modicidade tarifária.
Como os recursos hídricos compõem a maior parte da reserva energética do país, o foco de
muitas das propostas de aversão ao risco do setor reside no aperfeiçoamento do uso da energia
armazenada dos reservatórios.
Desde o racionamento de 2001/2002, o setor elétrico concentra atenção especial em ações
e medidas que aumentem a segurança operacional do SIN. Profundas discussões se deram na
sociedade e no âmbito do governo sobre as salvaguardas de segurança eletroenergética que
deveriam ser consideradas no Planejamento e na Programação da Operação do SIN.
Desta forma, desde o ano de 2002 até os dias atuais, foram criados mecanismos de aversão
ao risco de racionamento a serem incorporados nos modelos de otimização energética. Esses
mecanismos serão descritos ao longo deste capítulo.

4.1 – Curva bianual de Aversão a Risco – CAR

A resolução GCE nº 109, de 24/1/2002, estabeleceu, como uma das primeiras medidas
adotadas, a criação de um mecanismo de aversão ao risco de racionamento e sua incorporação
nos modelos de otimização energética. Nesse contexto, foram estabelecidas as Curvas Bianu-
ais de Aversão ao Risco, as quais estabeleciam requisitos mínimos de energia armazenada, em
base mensal, adotados como referência de segurança para o atendimento do SIN, utilizando
os recursos energéticos de custos mais elevados, de forma a preservar a segurança do atendi-
mento à carga.
Sua incorporação nos modelos de otimização teve como objetivo a determinação de es-
tratégias operativas, representadas pelas funções de custo futuro, admitindo a possibilidade
do acionamento de geração térmica adicional mediante a violação dos requisitos de armaze-
namento indicados pela CAR.
Posteriormente, a resolução nº 10 do Conselho Nacional de Política Energética – CNPE,
de 16/12/2003 e a resolução nº 686 da ANEEL, de 24/12/2003, estabeleceram que, para fins de
atendimento aos critérios de segurança do SIN, o ONS poderia determinar, antecipadamente,
o despacho de usinas térmicas, tendo em vista a probabilidade de violação das CAR, dentro
172    Segurança energética

dos períodos de vigência dos PMO e suas revisões. Esse, portanto, é o princípio fundamental
de construção das CAR, ou seja, considerando as premissas de expansão do SIN – carga e
oferta, e o cenário hidrológico para qual se quer proteger o sistema, todos os recursos devem
ser utilizados, independente da ordem de mérito.
Logo, o método para a estimativa da CAR consistia em determinar, de forma recursiva no
tempo para cada subsistema e ao longo de um período predefinido de dois anos, os requisitos
mínimos de armazenamento de energia necessários ao atendimento pleno da carga prevista,
na hipótese de repetição das afluências críticas escolhidas em sua determinação, levando-se
em conta as características de sazonalidade e complementaridade hidrológica, capacidades de
intercâmbios inter-regionais e da geração térmica programada, de forma a garantir um nível
mínimo de armazenamento ao final do período de segurança definido.
Esquematicamente, a Figura 4.1 ilustra o processo de construção da CAR.

Figura 4.1 – Determinação e uso de uma Curva Bianual de Aversão ao Risco

Destaca-se que o uso de uma CAR no modelo de otimização de médio prazo indica que,
na simulação da operação, armazenamentos iguais ou inferiores aos estabelecidos em uma
determinada CAR implicarão em um custo adicional de operação, representado pelas penali-
dades de violação dessa curva, ou seja, no processo de otimização da operação energética de
médio prazo, que é baseado na minimização do custo total de operação, as CAR representam
restrições de armazenamento mínimo que só deveriam ser violadas para se evitar um déficit
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   173 

futuro de energia. Este processo de otimização busca manter os armazenamentos equivalentes


acima das CAR, pois reduzirá, desta forma, o custo total esperado.
As violações de armazenamento podem ocorrer, conceitualmente, quando simulados ce-
nários estocásticos de energias naturais afluentes mais pessimistas que os cenários escolhidos
para a formulação das CAR, que foram baseados nas vazões históricas afluentes, além da
influência dos níveis de partida e de políticas de intercâmbios praticadas diferentes das for-
muladas de forma recursiva e determinística nas determinações das CAR, fruto das condições
hidrológicas vigentes e previstas.
Ponto importante a destacar foi a definição do horizonte bianual de aversão ao risco. Na
época, o objetivo básico era proteger os subsistemas em racionamento (Sudeste/Centro-Oeste
e Nordeste) para o próximo biênio, tempo considerado suficiente para se implementar me-
didas emergenciais, como a aquisição das “térmicas emergenciais”, além da construção de
novas usinas termoelétricas e a entrada em operação das usinas em construção, então previstas
no planejamento do setor.
Nesse período, ficou clara a importância dada à segurança energética do SIN, tanto que
o simples acompanhamento da violação das CAR por fora dos modelos de operação, despa-
chando-se todos os recursos térmicos e/ou invertendo-se intercâmbios de forma a se retomar
os níveis de armazenamento das CAR, foi logo substituído (inclusive previsto na própria
resolução 109, Art. 8º) pela sua consideração na formulação matemática do modelo de médio
prazo – NEWAVE.

4.1.1 - Conceitos básicos para a Curva de Aversão a Risco


A Figura 4.2 ilustra os parâmetros básicos pertinentes nos cálculos da CAR.

Figura 4.2 – Parâmetros básicos da CAR


174    Segurança energética

Nível mínimo de segurança ao final do período seco – NSPS: Representa o nível de ar-
mazenamento de energia do subsistema, ao final do período seco, para o qual valores inferio-
res ao mesmo resultam na operação a fio-d’água em alguns aproveitamentos, em decorrência
da diversidade hidrológica entre as bacias, não visualizada na representação a reservatório
equivalente de energia. O NSPS poderá ser diferente para o primeiro e segundo ano do biênio
em apreço.

Nível mínimo de segurança mensal – NS: Representa o nível de armazenamento de


energia do subsistema ao início de cada mês, abaixo do qual pode resultar a operação a fio-
-d’água em alguns aproveitamentos, em decorrência da diversidade hidrológica entre as ba-
cias, não visualizada na representação a reservatório equivalente de energia. O NS deverá no
mínimo ser igual ao NSPS.

Nível mínimo de segurança ao final do período úmido – NSPU: Representa o nível


de armazenamento de energia do subsistema, ao final do período úmido. Normalmente, não
se estabelecia valores limites para o NSPU, sendo ele era decorrente da equação recursiva
do balanço de atendimento à carga, segundo cenários hidrológicos considerados, limitado,
evidentemente, ao valor de 100% ou, por exemplo, ao volume de espera, quando pertinente.

Biênio hidrológico: Considerando a característica de segurança da curva de aversão ao


risco, a afluência correspondia a uma condição hidrológica crítica para o biênio, segundo cri-
térios escolhidos, isto é, ela poderia estar associada ao n-ésimo biênio mais crítico do histórico
de afluências, ou corresponder a uma frequência de ocorrências pré-definida, para a qual se
deseja proteger o Sistema. Em outras palavras, a escolha do biênio hidrológico trazia em si
um critério de segurança que se desejava adotar, que era passível de um processo de discussão
com a sociedade via Audiências Públicas.

4.1.2 – Premissas para a construção da Curva de Aversão a Risco


Para a elaboração da CAR, era utilizado um conjunto de Premissas Básicas e um conjunto
de Premissas Específicas, que procuravam representar as diversidades de cada um dos subsis-
temas para os quais as curvas eram calculadas.
Dentre as premissas básicas, destacam-se:
• carga de energia estimada pelo ONS e pela EPE, normalmente para a 2ª Atualiza-
ção Quadrimestral do Planejamento Anual da Operação Energética, além de eventu-
ais atualizações dos valores previstos para o horizonte de curto prazo (novembro e
dezembro);
• limites de transmissão inter-regionais calculados pelo ONS e considerados no Progra-
ma Mensal de Operação;
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   175 

• cronograma de obras determinado em reunião colegiada no DMSE/CMSE/MME em


17/10/2012;
• geração das usinas não simuladas individualmente: eólicas, PCH, solar, biomassa etc.
(em acordo com as Resoluções ANEEL 440/2011 e 476/2012, vigentes à época).

Dentre as premissas específicas, destacam-se:


• nível mínimo de segurança correspondente a 10% do armazenamento máximo do Sub-
sistema Sudeste/Centro-Oeste, ao longo de todo o período de vigência da CAR (NS =
NSPS = 10% EARmáx);
• armazenamento mínimo mensal de 30% EARmáx (valor mínimo observado no his-
tórico – 2006) como limite inferior da CAR, de forma que a Região Sul não atinja
valores que conduzam a adoção de medidas operativas severas, conforme NT ONS
049/2009;
• nível mínimo de segurança de 10% do armazenamento máximo do Subsistema Nor-
deste, ao longo de todo o período de vigência da CAR, que correspondia a 14, 8 e 10%
dos volumes úteis dos reservatórios das UHE Três Marias, Sobradinho e Itaparica,
respectivamente (NS = NSPS = 10%).

4.1.3 – Formulação matemática adotada na CAR


A CAR, calculada de forma recursiva e isoladamente para cada subsistema, era determi-
nada segundo a seguinte metodologia:
1. define-se o biênio hidrológico de proteção do subsistema cujas afluências serão
simuladas;
2. define-se o nível mínimo de segurança ao final do período seco (NSPS) do 1º e do 2º
ano do biênio;
3. definem-se, para cada um dos anos, as premissas de carga, oferta e limites de intercâm-
bios entre subsistemas;
4. definem-se as Premissas Específicas de cada subsistema; e
5. determinam-se os requisitos de armazenamento, a cada mês, a partir do NSPS do 2º
ano do biênio, no sentido inverso do tempo, através de um balanço energético mensal
com os recursos e requisitos definidos através da equação (4.1).

CAR m = CAR m + 1 − FC m + 1 + ENA m + 1 + CAtend m + 1 +


! + evap m + 1 + desvio(m + 1) (4.1)
NS(m) ≤ CAR(m) ≤ EARmax(m)

Onde:
m mês em curso para o cálculo da CAR;
176    Segurança energética

CAR(m) valor da CAR no final do mês m;


CAR(m+1) valor da CAR no final do mês m+1;
EARmax(m) energia armazenável máxima no mês m;
NS(m) nível mínimo de segurança do subsistema ao início do mês m;
ENA(m+1) valor energético da vazão natural afluente no mês m+1;
FC(m+1) fator de correção de energia no mês m+1, para levar em conta a variação da
altura de queda;
CAtend(m+1) carga a ser atendida no mês m+1 (sua formulação será descrita a seguir);
evap(m+1) valor energético correspondente à água evaporada;
desvio(m+1) valor energético correspondente aos montantes de água retirados ou adicio-
nados a montante de uma usina hidroelétrica (usos consuntivos da água).

O valor de FC(m+1), desvio(m+1) e evap(m+1) são obtidos a partir de um polinômio de


segundo grau, que é função de CAR(m).
Da equação (4.1), é definido como (4.2):

CAtend m + 1 = mi n[ Req m + 1 ; GHmax m + 1 ] (4.2)

Onde:

Req (m + 1) requisito líquido para atendimento da carga ao longo do mês m+1;


GHmax (m + 1) geração hidroelétrica máxima no mês m+1.

O valor de CAR(m) tem que considerar recursos hidráulicos realmente disponíveis no sis-
tema em cada configuração, devendo, portanto, estar limitado GHmax (m + 1), que é obtido a
partir de um polinômio de segundo grau, função de próprio valor de CAR(m).
Da equação (4.2), Req(m+1), é definido como (4.3):

Req m + 1
= carga m + 1 + volmorto m + 1 + Expo m + 1
(4.3)
− Impo m + 1 − GTerm m + 1 − NSimul m + 1
− submot m + 1

Onde:
carga(m + 1) carga própria de energia do mês m+1, estimada pelo ONS e pela EPE para o
Planejamento Anual da Operação Energética e suas revisões. No caso do Sudeste/Centro-O-
este, a carga inclui a parcela do mercado da ANDE atendido por Itaipu e o consumo interno
do setor de 50 Hz da UHE Itaipu;
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   177 

volmorto (m + 1) valor energético correspondente ao volume morto dos novos reservató-


rios em enchimento;
Expo (m + 1) somatório dos suprimentos exportados para outros subsistemas no mês m+1,
limitados à capacidade do intercâmbio regional (política de intercâmbios);
Impo (m + 1) somatório dos suprimentos importados de outros subsistemas no mês m+1,
limitados à capacidade do intercâmbio regional (política de intercâmbios);
GTerm (m + 1) disponibilidade máxima das usinas termoelétricas, considerando aplicação
de FCMAX, TEIF e TEIP;
NSimul (m + 1) energia das usinas não simuladas individualmente, atendendo resoluções
específicas da ANEEL: RN 440/2011 e 476/2012, vigentes à época; e
submot (m + 1) energia das usinas submotorizadas correspondente à energia disponível
em cada uma das novas usinas, durante o período de motorização até que seja instalada sua
potência base.

A Figura 4.3 ilustra a metodologia de obtenção da CAR para cada subsistema, uma vez
definidos os parâmetros básicos e as premissas básicas e específicas.

Figura 4.3 – Metodologia de obtenção da Curva Bianual de Aversão ao Risco

A Figura 4.4 apresenta, como exemplo de uma CAR, a curva que foi adotada para o biênio
2013/2014, no subsistema Sudeste/Centro-Oeste.
178    Segurança energética

Figura 4.4 – CAR SE/CO – Curva Bianual de Aversão a Risco 2013/2014

4.2 – Procedimentos Operativos de Curto Prazo – POCP

Mesmo com a incorporação das restrições de armazenamento mínimo estabelecidas pela


CAR no modelo computacional de médio prazo NEWAVE, em 2002, não houve garantias de
antecipação das decisões necessárias de despacho de geração térmica e intercâmbios entre
regiões, de forma a evitar a violação futura da própria CAR. O mesmo pode ser dito para
qualquer outro nível meta que viesse a ser estabelecido com horizontes mais distantes que o
do PMO, como o final da estação seca.
Uma razão que explica esse fato, é que, naquela época, o modelo NEWAVE representava
as afluências através de um conjunto de cenários sintéticos equiprováveis, sendo que sua in-
fluência na função de custo futuro era refletida através valor do esperado (média) dos custos
operativos, cuja minimização constitui a formulação do problema da otimização da operação.
Consequentemente, não havia garantias de proteção para os eventos de maior arrependimento,
que correspondem à ocorrência de séries críticas e à violação de um nível de segurança pre-
viamente estabelecido.
A violação dos níveis de segurança poderia implicar na adoção medidas adicionais, tais
como o relaxamento dos critérios de segurança elétrica, de restrições ambientais e de uso
múltiplo da água e, em último caso, até mesmo o gerenciamento da demanda. Por essa ra-
zão, torna-se vantajoso antecipar, no presente, decisões operativas que possam atenuar essas
medidas adicionais futuras mais rigorosas. Com essa finalidade, foi proposta a aplicação dos
denominados Procedimentos Operativos de Curto Prazo (POCP).
O POCP foi uma metodologia desenvolvida pelo ONS para aumentar a garantia do aten-
dimento energético nos dois primeiros anos do horizonte quinquenal, considerando hipóteses
conservadoras de ocorrência de afluências e de requisitos de níveis mínimos de armazena-
mento, denominados Níveis Meta. Esses Procedimentos foram aprovados pela Resolução
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   179 

Normativa nº 351 da ANEEL, de 17/2/2009, cujo objetivo era preservar os estoques dos re-
servatórios, através da gestão dos recursos (intercâmbio entre regiões e despacho de geração
térmica) de forma antecipada ao sinal econômico dos modelos de otimização.
O POCP era realizado a cada PMO e em suas respectivas revisões, sendo composto das
seguintes etapas:
1. Estabelecimento do Nível Meta;
2. Obtenção da Série de Referência;
3. Obtenção dos Níveis de Segurança Mensais;
4. Determinação da necessidade de aplicação dos Procedimentos Operativos de Curto Prazo;
5. Decisão de despacho termoelétrico adicional para atender o Nível de Segurança.

A seguir, são descritas cada uma destas etapas.

4.2.1 – Estabelecimento do Nível Meta


Como a antecipação de decisões para atendimento do Nível Meta ao final do período seco
mitigava tanto aquelas situações de violação da CAR como as condições de segurança do
atendimento, previamente definidas para o ano subsequente, o Nível Meta, ao final do período
seco, foi o indicador de segurança perseguido pelo planejamento da operação energética.
A cada ano, o CMSE definia o Nível Meta, que correspondia ao nível de armazenamento
ao final do período seco do primeiro ano (30 de novembro), podendo, em razão da evolução
dos armazenamentos e/ou dos requisitos de geração térmica necessários, decidir pela altera-
ção deste Nível Meta. Essa decisão era associada ao risco que se admitia correr em não atingir
o Nível Meta, ou seja, dar maior chance de recuperação dos armazenamentos ao longo do
período úmido subsequente (dezembro a abril).
O Nível Meta era obtido através de um cálculo recursivo, igual ao utilizado na elaboração
da CAR, mostrado no item anterior, considerando como nível inicial aquele indicado pela
CAR vigente ao final do período úmido subsequente, isto é, ao final de abril do segundo ano.
Esse nível era denominado NSPU – Nível de Segurança ao Final do Período Úmido.
Partindo do nível de armazenamento NSPU, o Nível Meta desejado era função da hi-
drologia crítica no período úmido (dezembro a abril) observado no histórico, para o qual se
desejava garantir a continuidade do suprimento no ano seguinte.
A Figura 4.5 apresenta um diagrama representando o estabelecimento do Nível Meta, que
era determinado para condições hidrológicas crescentemente severas, da pior para a melhor,
durante o período úmido subsequente. Caso o ano histórico a ser escolhido para proteção fosse
o mesmo adotado para a estimativa da CAR, o Nível Meta seria o próprio nível de armazena-
mento da Curva de Aversão ao Risco.
180    Segurança energética

Figura 4.5 – Diagrama do estabelecimento do Nível Meta

Na prática, a adoção do Nível Meta ocorria apenas para os subsistemas Sudeste/Centro-


-Oeste e Nordeste. Para as regiões Sul e Norte, eram consideradas, de forma complementar,
a representação de um conjunto de restrições de segurança operativa, estabelecendo níveis
mínimos de energia armazenada nos subsistemas ou de bacias componentes, no horizonte
simulado do PMO pelo modelo DECOMP (dois meses).
Uma vez escolhido o nível de segurança desejado – Nível Meta – eram aplicados os
Procedimentos Operativos propriamente ditos, para identificar, a cada PMO, a possibilidade
de violação do Nível Meta de algum subsistema e, se necessário, decidir, antecipadamente
e complementarmente ao sinal econômico do modelo de otimização, as medidas operativas
pertinentes para evitar essa condição, conforme será visto a seguir.

4.2.2 – Obtenção da Série de Referência


Os Procedimentos Operativos de Curto Prazo, aplicados no escopo do PMO, visavam
proteger o SIN contra a violação do Nível Meta previamente estabelecido, para o final do pe-
ríodo seco do 1º ano. Para tanto, considerava-se para o período entre o final do mês em curso
e o final do mês de novembro do 1º ano, a ocorrência de um cenário hidrológico de referência
com base nas séries de vazões compostas pela tendência hidrológica vigente, aplicando-se os
ruídos do histórico de vazões.
O passo inicial para a obtenção da Série de Referência era calcular séries de vazões natu-
rais afluentes compostas pela aplicação dos ruídos do histórico, obtidos segundo a aplicação
das equações descritas no Capítulo 6, à tendência hidrológica vigente, considerando o período
desde o 2º mês do PMO até novembro do ano em curso.
Para cada uma destas séries resultantes, era realizada uma otimização determinística com
o modelo DECOMP, na modalidade PL – único, a partir do nível inicial de armazenamento
do PMO e considerando, para o primeiro mês, a média das previsões de afluências semanais.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   181 

Adicionalmente, considerava-se, como restrição, não se atingir níveis de armazenamento in-


feriores ao Nível Meta especificado, para os subsistemas, ao final da estação seca (novembro).
Na otimização determinística, para cada série, o modelo DECOMP dispunha, como re-
curso energético para atingir o Nível Meta de cada subsistema, dos estoques armazenados nos
reservatórios, das vazões naturais afluentes, e do parque gerador térmico. Entretanto, esses
recursos podem não ser suficientes para se atingir os Níveis Meta, principalmente nas séries
hidrológicas mais críticas. Nestas situações, o recurso adicional ao parque gerador térmico
disponível se constitui no déficit de energia indicado pelo modelo, necessário para atingir os
Níveis Meta. A esse déficit de energia, se convencionou chamar de Geração Térmica Adicio-
nal – GTA.
A partir dos valores totais de geração térmica para atingir os Níveis Meta (GT+ GTA), as
séries eram ordenadas de forma crescente desses montantes de geração.
O CMSE, a cada ano, definia o risco admitido em não atingir o Nível Meta, o que servia
de parâmetro para a definição da Série de Referência. Por exemplo, admitido o risco de 5% e
um histórico composto por 80 séries, seriam descartadas as primeiras 4 séries, sendo a série
de referência a primeira série do conjunto restante. O conjunto de séries descartadas, que eram
as mais críticas que a Série de Referência, resultaria em custos demasiadamente elevados para
se atingir o Nível Meta.

4.2.3 – Obtenção dos Níveis de Segurança Mensais


Para a determinação dos Níveis de Segurança Mensais, era realizada uma simulação de-
terminística com o modelo DECOMP, na modalidade PL-único, a partir do nível inicial de
armazenamento do PMO, considerando, no mês do PMO, as afluências correspondentes à
previsão e, a partir do final do referido mês, as afluências da série de referência e a restrição
associada ao Nível Meta ao final do período seco (novembro).
Nesta simulação direta poderiam ocorrer duas situações:

1ª situação:
Não houve necessidade de utilização de geração térmica adicional – GTA para se atingir
os Níveis Meta ao final de novembro.
Nesta situação, a própria trajetória de armazenamentos resultante da simulação definia o Ní-
vel de Segurança Mensal para o mês de elaboração do PMO, conforme mostrado na Figura 4.6.
182    Segurança energética

Figura 4.6 – 1ª situação no processo de determinação dos Níveis de Segurança Mensais

2ª situação:
Houve necessidade de utilização de geração térmica adicional – GTA para se atingir os
Níveis Meta ao final de novembro.
Nesta situação, os Níveis de Segurança Mensais obtidos diretamente pelo modelo não refle-
tiam os requisitos de armazenamento mensais para se atingir os Níveis Meta, pois seria necessária
uma geração térmica adicional, que não estava, de fato, disponível. Assim, faz-se necessário cor-
rigir os Níveis de Segurança Mensais incorporando-se, de forma linear, o valor da geração térmi-
ca adicional – GTA, que correspondia à diferença entre a geração térmica necessária para atingir
o Nível Meta e a geração térmica disponível (GTA = GT necessária – GT disponível).
Destaca-se que essa correção reflete a necessidade de antecipação de geração térmica
disponível de forma a reduzir os riscos de se ter que utilizar, no futuro, montante maior de
geração térmica e de maior custo de operação.
A Figura 4.7 ilustra como a GTA, em base mensal, era utilizada para a correção do Nível
de Segurança do mês do PMO.

Figura 4.7 – 2ª situação no processo de determinação dos Níveis de Segurança Mensais


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   183 

Como exemplo numérico da obtenção do Nível de Segurança Mensal, seja o PMO de


maio/08, cuja geração térmica disponível, no período maio-novembro, correspondeu a
8.484 MWmed/mês. Neste exemplo, a Série de Referência, resultado da aplicação do proces-
so descrito anteriormente, os Níveis de Segurança iniciais e as respectivas gerações termoelé-
tricas são apresentadas na tabela 4.1.
Região ENA Mai/Nov (% MLT) EAR em 31/mai (%EARmáx) GTA (MWmed) GTA (MWmed)
SE/CO 90% 82% 5.099 1.048
Sul 61% 55% 1.951 0
Nordeste 71% 74% 1.134
Norte 78% 93% - -
SIN - - 8.484 1.048
Tabela 4.1 – Resultados da simulação com a Série de Referência

Pelos resultados, observar-se que o volume de Geração Térmica Adicional (GTA) neces-
sária para atingir o Nível Meta foi de 1.048 MWmed/mês. Essa GTA corresponde a um valor
de armazenamento adicional ao final do mês do PMO de maio/08 de 3,3% EARmáx da região
SE/CO. Portanto, o Nível de Segurança de 82% EARmáx, obtido pela simulação para essa
região, deverá ser alterado para 85,3% EARmáx (82%+3,3%).
Os Níveis de Segurança Mensais eram determinados a cada mês, por ocasião da elabora-
ção do PMO.

4.2.4 – Determinação da necessidade de aplicação dos procedimentos operativos


Finalmente, a última etapa do processo consistia na comparação do nível do reservatório
equivalente do subsistema considerado ao final do mês do PMO, resultante da política de
operação do DECOMP – PMO, com o Nível de Segurança Mensal determinado. Caso o nível
no PMO estivesse acima do Nível de Segurança, não havia necessidade de aplicação de Pro-
cedimentos Operativos. Essa situação é ilustrada na Figura 4.8.

Figura 4.8 – Situação de nível de armazenamento do PMO acima do Nível de Segurança Mensal
184    Segurança energética

Por outro lado, caso o nível no PMO estivesse abaixo do Nível de Segurança, era neces-
sária a aplicação de Procedimentos Operativos por meio da antecipação de geração térmica
segundo o mérito econômico e da utilização de intercâmbios de energia, em valor suficiente
para possibilitar a recuperação do armazenamento para o Nível de Segurança Mensal. Esta
situação é ilustrada na Figura 4.9.

Figura 4.9 – Situação de nível de armazenamento do PMO inferior ao Nível de Segurança Mensal

As decisões operativas, envolvendo o volume de geração térmica e intercâmbio de energia


entre subsistemas, eram ajustadas, a cada Revisão Semanal do PMO, em razão das condições
energéticas efetivamente verificadas, buscando atingir o Nível de Segurança Mensal desejado.

4.2.5 – Processo decisório para atender o nível de segurança


Tendo em vista que para a utilização plena dos recursos de geração térmica, dada as ca-
racterísticas de logística de abastecimento de combustível e custos, seriam necessárias ações
diferenciadas, o parque térmico foi subdividido, conforme se segue:
• GT1: composto pela geração térmica normalmente utilizada nos Programas Mensais
de Operação e Revisões Semanais, considerando a seguinte divisão:
• GT1A: composto por geração térmica nuclear, gás e carvão;
• GT1B: composto por geração térmica a óleo, imediatamente disponível
quando comandadas para despacho pelo ONS.
• GT2: composto por geração térmica a gás, bicombustível e geração térmica de reserva, a
óleo, que para a sua operação necessitam de logística especial de suprimento de combustível.

O montante de geração que era utilizado pelo ONS para atingir os Níveis de Segurança
Mensais deveria respeitar a ordem de mérito de custo, considerando a sistemática que se
segue:
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   185 

1. Os Procedimentos Operativos eram aplicados a partir do Programa Mensal de Opera-


ção do mês de abril, que seria elaborado ao final do mês de março.
2. Se, após a elaboração dos Programas Mensais de Operação e/ou suas Revisões Sema-
nais, o armazenamento dos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e/ou Nordeste estivesse
abaixo do Nível Mensal de Segurança, era avaliado o montante de geração térmica
necessário para atingir esse nível. Se esse montante fosse igual ou inferior ao montante
disponível associado ao conjunto GT1A, o ONS realizava o despacho dessa geração
térmica.
3. Se esse montante despachado não fosse suficiente, havia a necessidade de se despa-
char a geração térmica associada ao conjunto GT1B. Nesta situação, adotava-se um
procedimento adicional para se ratificar esta decisão, conforme descrito a seguir:
• Partindo do nível de armazenamento obtido ao final do mês de elaboração do Pro-
grama Mensal de Operação ou de suas Revisões e já considerando a geração tér-
mica GT1A, adicional àquela que foi indicada no PMO, executava-se o modelo
DECOMP para o período compreendido entre o mês seguinte ao do PMO e o mês
de novembro, com o valor esperado da Previsão de Afluências para esse período.
• Caso o nível de armazenamento obtido ao final do mês de novembro para os sub-
sistemas Sudeste/Centro-Oeste e Nordeste estivessem acima dos Níveis Meta, não
havia despacho da geração GT1B, naquele PMO ou sua correspondente Revisão
Semanal.
• Caso o nível de armazenamento obtido ao final do mês de novembro para os sub-
sistemas Sudeste/Centro-Oeste estivesse abaixo dos Níveis Meta, o ONS despa-
chava o montante necessário de geração térmica GT1B para que o armazenamento
obtido fosse igual ao Nível Mensal de Segurança
• Na hipótese do volume total de geração térmica GT1B não ser suficiente para que
os subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e/ou Nordeste atingissem o Nível Mensal de
Segurança, era solicitado ao CMSE o despacho adicional de geração térmica asso-
ciada ao conjunto GT2 ou superior, caso justificada tal necessidade.

4.3 – Conditional Value at Risk – CVaR


Apesar do POCP ter sido um mecanismo de segurança relevante do ponto de vista de
operação energética do SIN, não havia sinalização econômica adequada da situação real para
o mercado de curto prazo, nem nos processos de planejamento da expansão da geração. Nes-
se contexto, em 6 de março de 2013, a resolução CNPE nº 3 determinou que: “a Comissão
Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico –
CPAMP desenvolva e implemente metodologia para internalização de mecanismos de aversão
a risco nos programas computacionais para estudos energéticos e formação de preço, realizan-
do os ajustes necessários nas disposições referentes ao atendimento energético, à formação de
preço e aos Encargos de Serviços do Sistema”.
186    Segurança energética

Transitoriamente, ficou estabelecido que fosse adotada uma CAR quinquenal – CAR5, em
substituição à curva bianual utilizada até então, desde a primeira semana operativa de abril de
2013 até a implementação da metodologia para internalização de mecanismos de aversão ao
risco nos programas computacionais.
O desenvolvimento e avaliação desses mecanismos de aversão ao risco internalizados
nos modelos de otimização energética ocorreu no âmbito da CPAMP, com a participação do
ONS, CCEE, CEPEL, EPE, ANEEL e MME, resultando no Relatório Técnico intitulado “De-
senvolvimento, implementação e testes de validação das metodologias para internalização de
mecanismos de aversão ao risco nos programas computacionais para estudos energéticos e
formação de preço”, de 17/09/2013. Das metodologias avaliadas, foi recomendado o uso do
Coditional Value at Risk - CVaR, nos modelos NEWAVE e DECOMP.
Em 27/8/2013, o despacho do Diretor Geral da ANEEL nº 2.978, aprovou o uso de novas
versões dos modelos NEWAVE e DECOMP com a adoção do CVaR, a partir do PMO de se-
tembro/2013. Adicionalmente, a Resolução Normativa ANEEL nº 576, de 27/8/2013, revogou
todas as disposições normativas atinentes à Curva de Aversão ao Risco de Racionamento e aos
Procedimentos Operativos de Curto Prazo.
Apesar da adoção do CVaR nos modelos de otimização energética de médio e curto prazo
ter por consequência reduzir as chances de operação heterodoxa para manutenção de níveis
seguros de energia armazenada nos subsistemas (uso de POCP), perde-se a referência de quais
são esses níveis de segurança, uma vez que esses mecanismos de aversão estão internos aos
programas computacionais e as CAR foram extintas, bem como os POCP. Ressalta-se que
essa metodologia não garante que algum subsistema opere a níveis de armazenamento baixos,
uma vez que restrições de armazenamento mínimo deixaram de fazer parte do problema ma-
temático. Dessa forma, é importante que o ONS, ao acompanhar a operação do SIN, monitore
o quão distante os reservatórios estão de níveis de armazenamento seguros. Esse tipo de mo-
nitoramento viabiliza a avaliação para que eventuais medidas operativas heterodoxas sejam
recomendadas ao Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), objetivando aumentar
a segurança operativa do SIN em situações hidrológicas adversas. Com a incorporação do me-
canismo CVaR, os cenários de afluências mais críticos passam a ter maior relevância para a es-
timativa da função de custo futuro. Para isso, o paradigma de minimização do valor esperado
do custo total de operação se torna a minimização de uma ponderação entre o valor esperado
do custo total de operação e o valor esperado do custo operativo dos α cenários mais críticos,
onde o valor de α corresponde ao percentual desses cenários. Tanto o valor de α quanto o va-
lor da ponderação do CVaR (denominada de λ) são estabelecidos pela CPAMP. Inicialmente,
foi-se adotado os valores de α = 50% e λ = 25%.
A Figura 4.10 compara o processo de otimização com e sem a consideração do CVaR.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   187 

Figura 4.10 – Ilustração da aplicação do CVaR no processo de otimização

O CVaR é uma metodologia em que o custo de operação médio das diversas possibilida-
des de afluência (cenários) utilizadas para a decisão de despacho hidrotérmico é calculado,
considerando uma ponderação na qual os cenários de custo mais elevados recebem maior
peso. Assim, de forma a se precaver contra esses cenários, o processo de otimização define
um maior despacho térmico, proporcionando mais segurança energética. No item 4.3.3 será
discutido como o mecanismo CVAR foi incorporado ao modelo NEWAVE.
O mecanismo de aversão a risco CVaR, introduzido em setembro de 2013, respondeu
adequadamente até meados de 2015, quando o SIN vivenciou um período de baixas afluências
nos principais subsistemas geradores, Sudeste e Nordeste. A partir de meados de 2015, quando
houve melhora nas afluências e o gradativo reenchimento dos reservatórios, os parâmetros do
CVaR não corresponderam à percepção de risco do CMSE, nem ao objetivo de atingimento
de valores de níveis meta para o final da estação seca.
Durante o ano de 2015, o CMSE indicou à CPAMP que seria necessário reavaliar a ade-
quação dos parâmetros atuais da metodologia CVaR utilizados nos modelos de simulação de
otimização energética, de forma a verificar se a solução de equilíbrio entre custos operacionais
e segurança energética ainda era adequada. Em reunião do CMSE, realizada em março de
2016, este Comitê deliberou pelo encaminhamento à CPAMP de solicitação de análise refe-
rente à avaliação de tais parâmetros.
Após análise da CPAMP, o MME determinou, por meio da Portaria MME nº 41 de 7 de
fevereiro de 2017, a atualização dos parâmetros α e λ para 50% e 40%, respectivamente, e uso
a partir do PMO de maio/2017.
188    Segurança energética

4.3.1 – CVaR e o controle de eventos extremos


Para entender o CVaR como um mecanismo de controle de eventos extremos e porque se
optou por utilizar o CVaR na função objetivo, é necessário avaliar algumas metodologias an-
teriores que, apesar de intuitivas, apresentaram certas dificuldades que levaram a descartá-las
como uma possível proposta para uso no planejamento da operação hidrotérmica. Em parale-
lo, será introduzido alguns conceitos ligados ao CVaR quando oportuno.
A primeira técnica de modelagem que visa controlar a frequência que um certo evento
extremo ocorre é a de restrições probabilísticas. Dado um nível de confiabilidade p∈[0,1],
impõe-se que em pelo menos (100⋅p)% dos cenários o valor de energia armazenada esteja
dentro de uma região segura , conforme (4.4).

ℙ E!"# ∈ $E$!%& , ∞' ≥ p (4.4)

Apesar de esta ser uma alternativa intuitiva, existem algumas dificuldades técnicas da propos-
ta de restrições probabilísticas:
• É não convexa.
• Não distingue entre as diferentes magnitudes de invasão da região insegura.
• Podem resultar inviáveis.

Este último item merece destaque, pois não é possível garantir que para qualquer escolha
de nível de confiança seja sempre viável atender a restrição probabilística. Um exemplo ex-
tremo é p = 1, onde exigimos que em todos os cenários a restrição imposta deve ser atendida,
o que em geral é inviável.
A segunda técnica de modelagem e que também possui relação com restrições probabilís-
ticas é a restrição de CVaR. O CVaR é uma função que associa uma distribuição de probabili-
dade a um valor real ao tomar a média de um percentual dos maiores valores da distribuição,
como ilustrado na Figura 4.11. Tal percentual é chamado de VaR, e o VaR de parâmetro α é
o valor acima do qual se encontra (100⋅α)% da distribuição de X, enquanto que o CVaR de
mesmo parâmetro é a média da distribuição de X condicionada aos valores acima do VaRα[X].

Figura 4.11 – Ilustração do CVaR


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   189 

Apesar do CVaR ser definido como a média dos maiores custos, também é possível cal-
cular a média de um percentual dos menores. Isso pode ser feito ao multiplicar a variável X
por −1, pois tal operação reflete a distribuição de X ao longo do eixo y, e com isso o valor
CVaRα[−X] torna-se a média dos (100⋅α)% menores custos de X mas com o sinal trocado,
conforme ilustrado na Figura 4.12. Para ter o valor correto, basta multiplicar por −1 novamen-
te, isto é, a média dos (100⋅α)% menores custos de X é igual a -CVaRα[-X].

Figura 4.12 – Cálculo da média dos 20% menores valores de X

Após a introdução dos conceitos básicos do CVaR, a utilização desta medida será exem-
plificada em um caso onde se deseja garantir um nível mínimo de armazenamento. Suponha
que é desejado garantir que o valor de energia armazenada Earm fique acima de Esafe para certa
proporção de cenários, por exemplo 80%. Para isso, deve-se dividir a distribuição de valores
de energia armazenada Earm em duas regiões, os 80% maiores e os 20% menores valores de
energia armazenada. Observe que cada um dos 80% maiores valores é maior do que cada um
dos 20% menores e, em particular, é maior do que a média dos 20% menores. Portanto, se for
exigido que a média dos 20% menores valores de energia armazenada seja maior do que Esafe,
por transitividade, é garantido que em 80% dos cenários o valor de energia armazenada Earm
fique acima de Esafe. Por meio da medida CVaR, é enunciada a restrição em (4.5) que exige que
a média dos 20% menores valores de energia armazenada seja maior do que Esafe:

−CVaR !.# −E$%& ≥ E'$() (4.5)

Em outras palavras, ao atender a restrição de CVaR em (4.2) com parâmetro α = 0,2 tam-
bém é garantido atender a restrição probabilística (4.4) com nível de confiabilidade p = 0,8 de
se manter na região segura. No caso geral, a relação entre os parâmetros do CVaR e da restri-
ção probabilística para que haja uma relação de inclusão entre as respectivas regiões viáveis
é p = 1 - α.
190    Segurança energética

Alguns comentários são relevantes para a restrição de CVaR. Em [1] é avaliada outra pro-
posta de restrição de CVaR e que é aplicada à variável déficit ao invés de à energia armazena-
da. Observa-se também que a restrição de CVaR pode ser interpretada como uma aproximação
convexa interna da região viável definida pela restrição probabilística. Por último, pode-se
destacar que a magnitude da violação da região insegura também é levada em consideração na
restrição de CVaR já que, se um dos valores em um conjunto de cenários aumenta, a respecti-
va média também aumenta. Em resumo, as seguintes características da restrição de CVaR são
enunciadas:
• É convexa.
• Distingue entre as magnitudes de invasão, porém,
• O resultado pode ser inviável.

Este último item se deve ao fato da região viável da restrição de CVaR estar incluída na
região viável da restrição probabilística. Já que ambas as propostas possibilitam a existência
de inviabilidades, evidencia-se a motivação de introduzir uma abordagem alternativa que é o
CVaR custo.
O CVaR custo é uma forma alternativa de sintetizar o custo futuro, pois, como será apre-
sentado adiante, a função objetivo de cada estágio de decisão de um problema de programação
estocástica consiste na soma do custo imediato e de uma estimativa, normalmente a média,
dos custos dos estágios seguintes em diante. A proposta do CVaR custo [2][3] consiste em
substituir a média da definição da função de custo futuro por uma média de proporção dos ce-
nários mais caros de custo. Dessa forma, as decisões ótimas obtidas tendem a ser mais conser-
vadoras em termos de custo, pois são dimensionadas para uma porção pessimista de cenários.
Como estados de baixa energia armazenada estão indiretamente associados a custos elevados
de déficit (corte de carga) ou de térmica, o CVaR como uma medida de aversão ao risco de
custo exercerá um controle indireto sobre a frequência e a magnitude de tal invasão. A vanta-
gem desta alternativa é sempre produzir uma política operativa viável e a desvantagem é que a
confiabilidade de se manter dentro da região operativa segura é um efeito indireto promovido
pelo critério. Abaixo são resumidas as características do CVaR custo:
• É convexo.
• Distingue indiretamente entre as magnitudes de invasão.
• É sempre viável.

Por se tratar de uma forma robusta de controle de baixos níveis de energia armazenada
e possuir o requisito de convexidade necessário para o emprego da Programação Dinâmica
Dual Estocástica (PDDE), o CVaR foi adotado no programa NEWAVE de planejamento de
longo prazo em sua formulação variacional que é a mais apropriada para o uso em problemas
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   191 

de otimização. Na próxima seção, apresentaremos mais detalhes sobre o uso do CVaR em


programação estocástica.

4.3.2 – CVaR em Programação Estocástica


Programação estocástica é a área da otimização que modela processos decisórios ao longo
do tempo em que decisões são tomadas enquanto informações novas sobre o fenômeno alea-
tório são adquiridas. Neste sentido, uma dada decisão exerce influência nas próximas decisões
e estas também variam conforme o tipo de informação observada. Seja a ilustração abaixo:
decisão 𝑥𝑥! ⇝ observação 𝑏𝑏" ⇝ decisão 𝑥𝑥" ⇝
⋯ ⇝ observação 𝑏𝑏! ⇝ decisão 𝑥𝑥!

Uma vantagem de um processo decisório multiestágio em comparação com a estratégia de


estabelecer todas as decisões de antemão é que informações recentes reduzem a incerteza do
correspondente fenômeno aleatório, e isso tende a reduzir o custo como um todo.
A incerteza em problemas de programação estocástica geralmente reside nos parâmetros
das restrições ou da função objetivo: no caso de problemas lineares, a incerteza pode ocorrer
no vetor c do custo cTx, ou no par matriz-vetor (A,b) da restrição Ax = b. Para a atual expo-
sição iremos nos ater ao caso linear com incerteza apenas no vetor b do lado direito. Observe
que as decisões e custos associados dependem do cenário de parâmetros e por isso não faz sen-
tido minimizar a soma do custo ao longo do horizonte de planejamento, pois este é consequen-
temente incerto. Uma opção que se justifica como a mais econômica em média é, em cada
estágio, otimizar a soma do custo do dado estágio mais o valor esperado dos custos futuros:

min c ⊺ x + 𝔼𝔼%" min c ⊺ x + 𝔼𝔼%# ⋯ + 𝔼𝔼%$ min c ⊺ x


! #! $%! ( (
" " #" $%" * *
" $ #$ $%$ + +
" (4.6)
#! &' #" &' #$ &'

A formulação em (4.6) é dita neutra ao risco (de custo), pois o índice associado ao custo
futuro pondera os cenários caros e baratos proporcionalmente às probabilidades.
A proposta do CVaR na função objetivo consiste em substituir o valor esperado de (4.6)
pela função CVaR. Essa nova formulação é dita avessa ao risco, pois como visto na seção
anterior, o CVaR responderá à distribuição de probabilidade de modo que o índice associado
ao custo futuro seja o valor esperado condicionado a um percentual dos cenários mais caros
de custo. É possível observar que a medida de risco empregada na prática é uma combinação
convexa entre o valor esperado e o CVaR, isto é, utiliza-se uma função ρλ,α [∙] dada por (4.7).

ρ!,# " = 1 − λ 𝔼𝔼 X + λCVaR # X (4.7)


192    Segurança energética

Onde λ∈[0,1] e α∈(0,1].Neste caso, a interpretação da reponderação da distribuição de


probabilidade se aplica de forma semelhante e a função ρλ,α [∙] é apelidada coloquialmente
também de CVaR.
Embora a formulação (4.7) seja interessante para apresentar a teoria de programação esto-
cástica, esta não é a mais conveniente para definir e resolver problemas multiestágio de grande
porte. Para isso, a versão de programação dinâmica é mais adequada e pode ser obtida a partir
de (4.7) ao definir a função de custo total Qt (xt-1,bt) como o valor ótimo do problema de otimi-
zação do estágio t com variável de estado xt-1 e parâmetro bt fixos, como em (4.8).

Q ! x!"# , b! = min c⊺x + 𝔼𝔼*!$# ⋯ + 𝔼𝔼*% min c⊺ x


! &!"# '(! &! )*! ! !
% % &%"# '(% &% )*% . .
% (4.8)
&! +, &% +,

A partir disso, define-se a função de custo futuro 𝒬𝒬"!"# x! do estágio t como o valor espe-
rado das funções de custo total do estágio t+1, ou seja, 𝒬𝒬"!"# x! = 𝔼𝔼$!"# Q !"# x!, b!"# , o que
permite enunciar a relação de recorrência (4.9), chamada de programação dinâmica:

Q ! x!"# , b! = min c!⊺ x! + 𝒬𝒬-!'# x! , t ∈ 1, … , T


! &!"# '(! &! )*!
%
&! +,
(4.9)
𝔼𝔼*!$# Q !'# x!, b!'# , t ∈ 1, … , T − 1
𝒬𝒬-!'# x! = 3
0, t = T
Observe que é possível recuperar a formulação (4.7) a partir da formulação por progra-
mação dinâmica (4.9) se substituirmos a definição da função de custo total e custo futuro em
sequência, desde o primeiro ao último estágio. Note também que o CVaR aparece nesta for-
mulação apenas como uma modificação da função de custo futuro 𝒬𝒬"!"# x! , ao substituir o
valor esperado pela função ρ!,# X .

4.3.3 – Abordagem direta para consideração do CVaR no problema de planeja-


mento da operação hidrotérmica
Conforme descrito em [4], no modelo NEWAVE o mecanismo CVaR é aplicado direta-
mente à metodologia PDDE através de uma pequena modificação no cálculo dos cortes de
Benders que irão representar a função de custo futuro. Para cada estado visitado durante o
passo forward (cenário forward) é calculado um corte representativo, que para o caso neutro
a risco, corresponde à média dos cortes de Benders calculados nas aberturas (cenários ba-
ckward), de acordo com a equação (4.10) e conforme ilustrado na Figura 4.13.

$
(4.10)
corte"! = ( p# corte#! j=1.,,,m
#%&
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   193 

Onde: corte"! é o corte médio do j-ésimo estado, considerando todos os cenários ba-
ckward (aberturas), n é o número de aberturas, m é o número de estados visitados (cenários
forward) no instante t, e pi é a probabilidade associada à i-ésima abertura. No caso equipro-
1
vável, p! = .
n
Na abordagem avessa ao risco, o corte representativo é calculado, conforme apresentado
na equação (4.12), como uma ponderação entre o corte médio calculado em (4.10) e corte mé-
dio dos α% cenários mais críticos, representados pelos cenários com custo de operação mais
elevado, de acordo com (4.11). Na Figura 4.14 é ilustrado o processo de cálculo de um corte
de Benders representativo para um caso avesso a risco.

"
corte_α! = ) p# corte$! (4.11)
$∈&'
j = 1.,,,m

"
Onde: nα representa o conjunto dos α% cenários mais críticos e corte_α! é o corte médio
deste conjunto de cenários.

" " "


corte_cvar! = 1 − λ corte! + λ corte_α! (4.12)
j = 1.,,,m
"
Onde: corte_cvar! é o corte representativo do j-ésimo estado para o caso avesso a risco
com parametrização α λ,λ∈[0,1] e α∈(0,1].

Figura 4.13 – Corte médio caso neutro a risco


194    Segurança energética

Figura 4.14 – Corte médio caso avesso ao risco

4.4 – Superfície de Aversão ao Risco – SAR

A superfície de Aversão ao Risco (SAR) foi proposta inicialmente pela PSR em 2008,
cuja formulação é baseada no estabelecimento de condições mínimas para o atendimento de
requisitos de armazenamento mínimo nos reservatórios equivalentes de energia ao final dos
períodos seco e úmido, denominados níveis meta, dado uma condição hidrológica crítica pré-
-estabelecida. É uma abordagem análoga à curva de aversão ao risco, sendo que os requisitos
mensais mínimos são estabelecidos iterativamente pelo próprio modelo matemático, de forma
multivariada. Assim como ocorre no caso da curva de aversão ao risco, penalidades são adi-
cionadas ao custo da função objetivo, no caso de violação dos níveis estabelecidos pela SAR.
A implementação dessa metodologia foi feita pelo Cepel em 2013, cuja avaliação foi
feita pela CPAMP e os resultados confrontados aos obtidos com a aplicação do CVaR. Mes-
mo sendo uma abordagem promissora, principalmente por tratar diretamente as restrições
físicas de segurança estabelecidas pela operação, ela foi preterida por apresentar resultados
não aderentes à operação real do SIN, como a ocorrência de cortes de carga preventivos para
a preservação dos níveis meta.
Em 2016, evoluções a essa metodologia foram apresentadas pelo Cepel, que denominou
essa funcionalidade de aversão ao risco de Nova SAR. Mais detalhes sobre a metodologia
e a formulação matemática da Superfície de Aversão a Risco, assim com sua aplicação em
estudos do planejamento da operação energética de médio prazo, podem ser consultados em
[5] e [6].
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   195 

REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

1. Costa Jr LC. Representação de restrições de aversão a risco de CVaR em Programação Dinâmica Dual
Estocástica com aplicação ao planejamento da operação de sistemas hidrotérmicos. Tese de doutorado
– Universidade Federal do Rio de Janeiro – Coppe/UFRJ; 2013.
2. Shapiro A, Tekaya W, Costa JP, et al. Risk Neutral and Risk Averse Stochastic Dual Dynamic Program-
ming Method. European Journal of Operational Research 2013;224:375-391.
3. Diniz AL, Tcheou MP, Maceira MEP, Penna DDJ. Uma abordagem direta para consideração do CVAR
no problema de planejamento da operação hidrotérmica. In: SEPOPE 2012, Rio de Janeiro. Proceedin-
gs of the XII SEPOPE, 2012.
4. Maceira MEP, Marzano LGB, Penna DDJ, Diniz AL, Justino TC. Application of CVaR Risk Aversion
Approach in the Expansion and Operation Planning and for Setting the Spot Price in the Brazilian
Hydrothermal Interconnected System. International Journal of Electrical Power & Energy Systems
2015;72:126-135.
5. Vasconcellos CLV. Aprimoramentos na metodologia de superfície de aversão ao risco (SAR) para o
problema de planejamento de médio/longo prazo da operação de sistemas hidrotérmicos. Dissertação
de mestrado – Universidade Federal do Rio de Janeiro – Coppe/UFRJ.
6. Diniz AL, Maceira MEP, Vasconcellos CLV, et al. A combined SDDP/Benders Decomposition Appro-
ach with a Risk-Averse Surface Concept for Reservoir Operation in Long Term Power Generation
Planning, Annals of Operations Research (2019).
5
PREVISÃO DE CARGA

Para execução das atribuições do ONS, é essencial que se tenha pleno conhecimento do
comportamento e da evolução da carga de energia e de demanda que será atendida nos proces-
sos de planejamento e operação do SIN.
As previsões de carga são insumos fundamentais para os estudos elétricos, energéticos e
eletroenergéticos, nos horizontes de curto, médio e longo prazos, para atendimento ao SIN.
Todos os estudos do ONS se utilizam de dados de carga previstos e verificados como dados
de entrada.
Na Figura 5.1 está ilustrado o processo de consolidação da previsão de carga, responsável
por gerar os insumos para os estudos de planejamento e programação da operação eletroener-
gética e para os estudos de ampliações e reforços.

Figura 5.1 – Processo de consolidação da previsão de carga


198    Previsão de carga

5.1 – Carga global

O ONS tem nos Procedimentos de Rede as definições e conceitos a serem seguidas no


processo de apuração da carga global. A apuração da geração de energia em sua totalidade
permite representar o total da carga atendida, ou seja, representa a totalidade da energia gerada
no âmbito do SIN injetada nos sistemas de transmissão e distribuição para suprir não apenas
o consumo de energia das unidades consumidoras, mas também as perdas internas de redes e
instalações de geração, transmissão e distribuição. A partir da adoção deste conceito, permite-
-se uniformizar a composição dos dados de carga global.
A Carga Global do SIN pode ser medida pela perspectiva da energia ofertada (geração) e
da energia demandada (consumo).
Na perspectiva da demanda (consumo) a Carga abrange:
• Os dados de consumo medidos de todas as unidades consumidoras atendidas pelas
distribuidoras e classificadas como cativo ou livre.
• Perdas totais de energia dos sistemas de distribuição (perdas comerciais e técnicas), na
transmissão (Rede Básica) e nas demais instalações de transmissão (DIT´s.).
• Consumo na rede de autoprodutores conectados aos sistemas de distribuição ou na
Rede Básica.

Na perspectiva da energia ofertada a Carga resulta na soma de:


• Energia gerada por central hidroelétrica, termelétrica, termonuclear, eólica, fotovol-
taica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas e termelétricas de propriedade de
concessionárias de geração, produtores independentes, autoprodutores, ou qualquer
outra modalidade de geração que injete energia na Rede Básica e nos sistemas e dis-
tribuição. Acrescentam-se também os fluxos líquidos de energia no SIN resultantes de
intercâmbios internacionais oriundos dos países da América do Sul.

Assim, o ONS apura os valores de carga sob a ótica da oferta com base na geração ve-
rificada de todas as usinas conectadas aos sistemas de transmissão e distribuição. Portanto,
a Carga representa toda a energia que transita nos sistemas de transmissão e distribuição no
SIN, de acordo com a Figura 5.2.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   199 

Figura 5.2 – Carga global

5.1.1 – Comparativos com os dados do setor – CCEE


Os valores verificados relativos à geração, carga e consumo de energia são fundamentais
para o acompanhamento operativo do SIN promovido pelo ONS, assim como se constituem
em informações essenciais para os agentes do mercado de energia elétrica que participam da
Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Essas informações são relevantes
também para os estudos da programação e de planejamento da operação elétrica e energética
do ONS e os estudos de mercado da CCEE, assim como servem de parâmetro aos agentes do
setor, empresas e órgãos públicos.
Em razão da relevância para o mercado de energia tanto no aspecto operativo quanto
comercial, é importante que os agentes e todos os usuários dessas informações encontrem co-
erência absoluta entre as informações divulgadas pelo ONS e CCEE. Essas informações são
compatibilizadas tanto no seu aspecto conceitual, ou seja, que os usuários das informações
conheçam o significado exato delas, bem como nos métodos e procedimentos de apuração
utilizados, para que os resultados sejam entendidos de acordo com a finalidade a que se pro-
põem, de maneira que os dados realmente possam se constituir em informações relevantes e
coerentes com as necessidades dos usuários.
Para tanto, a compatibilização dos valores de carga global, utilizados nos processos de
planejamento e programação da operação do ONS, e que são insumos para o cálculo do Custo
Marginal de Operação – CMO, faz-se necessário através de critérios definidos e coerentes
200    Previsão de carga

entre as entidades ONS/CCEE na obtenção da Carga Global composta pelos valores de gera-
ção (oferta) e intercâmbio.

5.1.2 – Comparativos com os dados do setor – EPE


As diferenças entre os dados de carga global e de consumo divulgados pelo ONS e pela
Empresa de Pesquisa Energética (EPE), constantemente são motivos de dúvidas quanto à in-
terpretação e sua aplicação, dificultando o entendimento referente ao que representa a Carga
e o Consumo.
Considerando que o ONS apura os valores de carga sob a ótica da oferta, com base na
geração verificada de todas as usinas conectadas aos sistemas de transmissão e distribuição,
observa-se que pela ótica do consumo há dificuldade de se obter os valores de energia medi-
da em todos os consumidores, inclusive no contexto da carga global, da mesma forma e ao
mesmo tempo em que são obtidos os valores de geração. Daí a necessidade de se explicitar as
diferenças entre as duas grandezas.
O Consumo, cujos valores são apurados pela EPE, utiliza a perspectiva da energia de-
mandada, e desenvolve suas atividades de previsão e a apuração dos dados de Consumo de
energia elétrica para todo o Sistema Elétrico Nacional (inclui o Sistema Elétrico Interligado
e o Isolado).
Nas previsões de consumo de energia elétrica não estão incluídas as perdas nos sistemas
de distribuição e de transmissão (Rede Básica). No entanto, os valores de carga utilizados
pela EPE nos seus estudos são os mesmos valores utilizados pelo ONS, pois os trabalhos de
previsão que são desenvolvidos para o horizonte de estudo da EPE são efetuados em conjunto
com o ONS.
Os valores de consumo previstos e verificados divulgados pela EPE mensalmente cor-
respondem ao consumo faturado de unidades consumidoras, cativos e livres, conectados aos
sistemas das empresas de distribuição de energia e conectados na Rede Básica.
O período considerado para apuração dos valores de consumo corresponde ao período
de medição que é o mesmo de faturamento dos consumidores. Nesse caso, o período com
referência a um determinado mês n, abrange leituras de consumo de parte do mês n e parte do
mês n-1. Isso ocorre porque as concessionárias de distribuição, por contarem com um grande
número de unidades consumidoras, efetuam as medições dos consumos durante o mês corres-
pondente a um período médio de 30 dias, iniciando a leitura no início do mês (primeiro dia
útil) e finalizando no final do mês (último dia útil), conforme ilustrado na Figura 5.3.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   201 

Figura 5.3 – Período de medição de consumo e carga

5.2 – Perdas e diferenças

A previsão da carga de energia, realizada a partir da previsão do consumo, contempla a


agregação de parcela de perdas. As Perdas e Diferenças englobam as chamadas perdas técni-
cas nas redes de transmissão e distribuição e as denominadas perdas não técnicas, que consi-
deram ligações irregulares e clandestinas, erros de medição, erros no processo de faturamento,
unidades consumidoras sem equipamento de medição, efeito calendário, entre outros efeitos.
Especialmente o comportamento das perdas não técnicas, vinculadas às fraudes pratica-
das nas redes de distribuição, dado o seu volume, há uma grande preocupação em estabelecer
limites e acompanhamentos, uma vez que as empresas de distribuição têm enormes dificulda-
des em dimensionar e avaliar como se comportam ao longo do ano.
Adicionalmente, as perdas totais contabilizam outras diferenças relativas aos próprios
conceitos utilizados de Carga global (ONS/CCEE) e de Consumo de Energia Elétrica na rede
(EPE), como é o caso de alguns consumidores livres conectados na rede básica que possuem
autoprodução de eletricidade, cujo consumo é integralmente considerado na Carga global
(item 6), porém, não está contabilizado no Consumo na rede. Normalmente, as perdas são
expressas como percentual da carga, compondo o que se convencionou chamar de Índice de
perdas.
202    Previsão de carga

5.3 – Previsão de carga mensal e semanal para o Programa Mensal


de Operação – PMO

O processo do Programa Mensal da Operação (PMO) do SIN do ONS necessita das previ-
sões de carga dois meses à frente (podendo se estender até doze meses à frente, conforme for
determinado pela ANEEL), com descrição semanal (semana operativa) para o primeiro mês,
concomitantes com as informações atualizadas sobre o cronograma de expansão da geração
e transmissão, o estado de armazenamento dos reservatórios, previsões de carga de energia
distribuídas por patamar, análise das condições meteorológicas verificadas e previstas nas
principais bacias do SIN e previsões de afluências aos aproveitamentos hidrelétricos. Essas
informações constituem parte do conjunto de dados necessários para que o ONS possa elabo-
rar o PMO do SIN, no qual são traçadas as políticas operativas de curto prazo que englobam
as metas de intercâmbio, as metas de armazenamento dos reservatórios, a política de operação
das usinas térmicas e os custos marginais de operação.
Os estudos de otimização e simulação da operação do SIN são realizados em base men-
sal, com discretização em etapas semanais e por patamar de carga. Estabelecem políticas de
geração térmica, intercâmbios inter-regionais para as semanas analisadas, fornecem metas
e diretrizes a serem seguidas pela Programação Diária da Operação Eletroenergética e pela
Operação em Tempo Real. São realizadas regularmente revisões semanais que incorporam in-
formações atualizadas sobre o estado do sistema, as condições meteorológicas e as previsões
de carga e afluências.
Nota-se que, em razão do critério de utilização de dados semanais de energia (MWmé-
dios), utilizando-se do critério da semana operativa, haverá, na maioria dos meses, a comple-
mentação de valores semanais que correspondem ao mês imediatamente anterior (m-1) e o
mês seguinte (m+1).
Na Figura 5.4 é ilustrado o horizonte das previsões de carga para a elaboração do PMO.

Figura 5.4 – Horizonte das previsões de carga para a elaboração do PMO


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   203 

5.3.1 – Principais variáveis de influência nas previsões mensais de carga de


energia e demanda
Nas previsões de carga mensais considera-se que existem algumas variáveis que influen-
ciam o consumo e, consequentemente, a carga de energia elétrica de forma mais relevante,
sejam ou não de imediata avaliação os seus efeitos, mas que precisam ser adequadamente
analisadas. É importante observar que a utilização dessas variáveis, principalmente de cunho
econômico, em modelagens estatísticas é de grande complexidade, tendo em vista a indispo-
nibilidade de valores verificados devido ao período de tempo decorrido para publicação, além
da falta de previsibilidade e da dispersão de valores entre aqueles que são publicados pelos
atores econômicos e de mercado. Por isso é importantíssimo a participação de profissionais
especializados para avaliação tácita através de análises comportamental da carga para a efeti-
va execução do processo de previsão de carga. Dentre essas variáveis pode-se destacar:
• Medidas macroeconômicas de curto prazo;
• Políticas de incentivos, desonerações fiscais;
• Ações de política monetária: taxa de juro interna – Selic e efeitos na taxa de câmbio;
• Expansão do crédito e nível de emprego;
• Níveis de estoques e produção industrial;
• Utilização da capacidade instalada e FBKF;
• Cenário político – outras medidas que impactam a economia no curtíssimo prazo;
• Conjuntura internacional – comportamento dos principais mercados e parceiros co-
merciais, preços de commodities e resultados obtidos na importação e exportação;
• Evolução da perdas – totais: na rede básica e na distribuição;
• Cronograma de entrada de grandes consumidores no SIN;
• Demanda de grandes consumidores livres na rede básica e na rede de distribuição;
• Comportamento do clima que pode afetar o comportamento sazonal da carga;
• Regulação econômica e política tarifária praticada pela ANEEL.

5.3.2 – Carga de energia e demanda semanal


Além das incertezas acerca do comportamento da carga mensal, semanalmente há também
alguns aspectos que causam impactos no prazo mais curto, dentre esses destacam-se, princi-
palmente, as mudanças diárias nas temperaturas e/ou nas condições climáticas em cada região.
Outros fatores de incerteza são os feriados, os chamados “semiferiados” (dias ponte), além dos
dias especiais, esses se caracterizam quando o comportamento dos consumidores é significativa-
mente atípico. Fatores econômicos, com efeitos no curtíssimo prazo e sazonais também podem
afetar o comportamento da carga semanal. A mitigação dessas incertezas dependerá, portanto, da
precisão das previsões meteorológicas para o horizonte desejado, de uma ampla base de dados
contendo os dados de carga observadas e associadas aos correspondentes dados meteorológicos
além de uma análise da conjuntura econômica atual e seus impactos sobre a carga.
204    Previsão de carga

Nas revisões semanais, as principais variáveis observadas são:


1. Clima – temperatura e incidência de chuva;
2. Desconforto térmico;
3. Feriados e dias especiais – nacionais, estaduais e efeitos regionais;
4. Comportamento de grandes cargas – consumidores livres;
5. Especificidades da geração distribuída;
6. Comportamento do consumo durante períodos de vigência do horário de verão;
7. Intercâmbios entre subsistemas – que podem impactar nas perdas da Rede Básica;

A Figura 5.5 mostra um exemplo de um procedimento de revisão semanal correspondente


a terceira semana operativa.

Figura 5.5 – Procedimento de revisão semanal

A fim de caracterizar o comportamento da carga semanal durante o ano, primeiramente obser-


ve a Figura 5.6 que ilustra algumas curvas em PU de carga semanal observadas no subsistema SE/
CO nos anos de 2015 a 2018. De antemão, percebe-se o comportamento característico ao longo
do ano. O gráfico dessa apresenta uma sazonalidade bem definida. A curva do polinômio mostra
uma tendência sazonal média da carga de energia média das 53 semanas operativas do ano.

Figura 5.6 – Curvas em PU de carga semanal


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   205 

5.3.3 – Metodologia

5.3.3.1 – Modelos de previsão mensal


A previsão de carga constitui uma área de intensa pesquisa e conta com uma vasta litera-
tura técnica contendo uma variedade de métodos. Tal fato reflete na busca dos analistas por
métodos capazes de gerar previsões mais precisas e que permitam fazer melhor uso dos re-
cursos disponíveis e, portanto, contribuam para a otimização da operação do sistema elétrico.
Diversas técnicas estatísticas de análise de séries temporais, como regressão linear, amorteci-
mento exponencial, metodologia de Box & Jenkins, técnicas de Inteligência Computacional (IC)
como Sistemas Especialistas e Redes Neurais têm sido utilizadas em previsão de carga pelo ONS.
Em 2018, o ONS desenvolveu com o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), um
modelo de previsão de carga mensal, PrevCargaPMO, utilizando-se de metodologia de Má-
quinas de Vetor de Suporte (Suport Vector Machines – SVM), em ambiente R(R Core Team,
2017), motivado pelo grande número de funções (tools boxes), gratuitamente disponibiliza-
das, nas quais podem ser encontrados diversos métodos de previsão para pronta aplicação na
previsão de carga. A contratação do desenvolvimento desse modelo com o CEPEL teve como
objetivo dar maior transparência e reprodutibilidade ao processo de previsão da carga para o
PMO e suas revisões semanais. Esse modelo ainda está em desenvolvimento e seus resultados
são referenciais no apoio à decisão das previsões adotadas pelo ONS.
Toda a metodologia utilizada no PrevCargaPMO está descrita no “Manual do modelo de pre-
visão de carga global para o PMO”, Relatório Técnico – 11627/ 2018 – CEPEL. A estrutura do
modelo PrevCargaPMO está apresentada na Figura 5.7, e é importante ressaltar que, uma vez que
os dados da série histórica se baseiam em valores de carga compostos de geração supervisionada
pelo ONS e não supervisionada (pequenas usinas não despachadas pelo ONS, normalmente co-
nectadas na rede de distribuição, essa particularidade foi considerada na formulação do modelo.

Figura 5.7 – Estrutura do modelo de previsão PrevCargaPMO


206    Previsão de carga

5.3.3.2 – Modelagem da previsão de carga no PrevCargaPMO


Dado a extensão da metodologia empregada no PrevCargaPMO, descrita detalhadamente
no relatório citado anteriormente, citaremos aqui apenas síntese de sua composição.
O programa PrevCargaPMO conta com cinco modelo SVM (Máquinas de Vetor de Supor-
te), conforme indicado na Figura 5.7, capazes de fornecer previsões de carga para diferentes
horizontes:
• Modelo 1: Previsão da carga média diária (geração supervisionada).
• Modelo 2: Modelo de previsão da geração não supervisionada média diária.
• Modelo 3: Previsão semanal da carga média global da primeira semana à frente.
• Modelo 4: Previsão semanal da carga média global da segunda até a sexta semana à
frente.
• Modelo 5: Modelo de previsão mensal da carga média global até 2 meses à frente.

Nos modelos 3, 4 e 5, a carga global por subsistema é definida pela seguinte equação:

Carga Global por Subsistema = Geração supervisionada – Intercâmbio + Geração


não supervisionada

Sendo que a parcela supervisionada da Carga Global do Subsistema é igual a:

Geração supervisionada – Intercâmbio.

Ressalta-se que o ajuste (treinamento) dos modelos é precedido pelo tratamento dos dados
de carga e temperatura.

5.3.3.3 – Método de repartição semanal


Embora o PrevCargaPMO forneça dados mensais segregados semanalmente, esse ainda é
considerado um modelo referencial e em evolução, as previsões de carga oficiais utilizadas no
PMO são fruto de ações específicas de acompanhamento dos resultados obtidos na semanas
anteriores, heurísticas e avaliação das propostas enviadas pelos agentes e resultados de mode-
los de séries temporais utilizando-se softwares estatísticos de uso geral.
O detalhamento em base semanal dos requisitos de carga, considerando que a semana
operativa é composta do período de sábado à sexta-feira seguinte, é fundamental para a pro-
gramação da operação do SIN, particularmente no caso das previsões de carga, que os desvios
acarretem o mínimo efeito dentro da própria semana, de ações operativas não consideradas
quando elaborado o PMO.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   207 

Especialmente nas previsões de carga, aspectos bastante variados como a existência de


feriados, mudanças climáticas, greves, ou a adoção do horário de verão, acarretam diferenças
em relação ao seu comportamento mensal e, consequentemente, no planejamento da operação
dentro da semana operativa.
A desagregação dos valores mensais de energia em semanas é feita através de fatores
sazonais diários obtidos em séries históricas, com o objetivo de medir sua influência no com-
portamento da carga durante aquela semana.
É importante ressaltar que, o “mês operativo” pode apresentar de quatro de até seis sema-
nas, pois a primeira semana considerada dentro do mês, é aquela que possui os primeiros dias
do mês em curso e a última semana é aquela que possui o último dia do mesmo mês.
A seguir se apresenta a metodologia utilizada para a desagregação da carga mensal de
energia em valores semanais adotada, embora esteja em andamento a evolução do método
utilizado, levando em consideração particularidades diárias/semanais das semanas operativas,
tendo em conta aspectos tendenciais ao longo do ano e anda: feriados fixos e móveis tanto no
aspecto nacional quanto mensal e regional, dias “sem feriados” (dias pontes), dias especiais
cuja carga apresenta comportamento atípicos etc.

1 – Método geral
Como ponto de partida, devem-se tratar as séries a serem utilizadas para o cálculo dos
fatores sazonais. Expurga-se das séries os valores correspondentes aos dias de feriados, em
razão da atipicidade presente nesses dias, para a obtenção de uma série chamada “isenta”.
Após análise detalhada dos fatores diários, foi identificado que o mesmo dia da semana
DS (Dom, Seg,Ter, ..., Sab) tem características diferentes de acordo com o seu decêndio.
Logo, para cada decêndio k (k = 1, 2, 3) do mês j (j = 1, 2, 3, 4, ..., 12) são estabelecidos fatores
para cada dia da semana.

Ex:
DOM12 , SEG12 , TER12 , QUA12 , QUI12 , SEX12 , SAB12
DOM22 , SEG22 , TER22 , QUA22 , QUI22 , SEX22 , SAB22
DOM32 , SEG32 , TER32 , QUA32 , QUI32 , SEX32 , SAB32

2 – Fatores brutos (Fij)


Os fatores brutos são calculados utilizando os dados pertencentes à série isenta da seguin-
te forma:
1 – Calcula-se a carga média mensal Cj:
%∗
∑ ! C" .!
C! = "&'∗
N!
208    Previsão de carga

Onde:
CI .j = carga média do dia I no mês j
Nj* = número de dias do mês j presentes na série isenta

2 – Divide-se o valor médio diário pela carga média mensal verificada:


C$ .#
F!,# =
C#

Onde:
Fi,j = fator bruto do dia i do mês j

3 – Para cada dia I, define-se o dia da semana que ele corresponde DS (DOM, SEG, TER,
QUA, ..., SAB). Calcula-se a média aritmética dos fatores referentes a cada dia da semana DS,
de acordo com decêndio Dk.

Ressalta-se que, embora possa existir repetição de dias dentro do mesmo decêndio “Dk”,
será calculado somente um fator, ou seja, se dentro de um determinado decêndio existirem
duas quartas-feiras, o fator de desagregação a ser utilizado será o mesmo.

3 – Fatores dos dias de feriados


Os dias de feriados recebem o mesmo tratamento dos dias úteis. Contudo, os fatores mé-
dios são calculados independentemente do decêndio ao qual ele pertença. Logo, os fatores são
obtidos da seguinte forma:
Divide-se o valor verificado da carga do dia de feriado, pela média mensal da série “isen-
ta” do mês que contém o referido feriado.
Calcula-se a média aritmética dos fatores dos feriados utilizando todos os anos da série
histórica.

4 – Normalização dos fatores


Com a existência de feriados em alguns meses, a soma dos fatores utilizados para a de-
sagregação da carga mensal não corresponde ao número de dias do mês. Com isso, torna-se
necessário realizar a normalização desses fatores dentro dos respectivos meses.
Assim, a normalização é realizada de acordo com a equação a seguir:

∗ F! .$
F! .$ = . N$
N$∗
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   209 

Onde:
Nj = número total de dias do mês j

5 – Cálculo das médias semanais


Após a obtenção dos fatores sazonais normalizados, pode-se realizar o cálculo das médias
diárias e semanais. As semanas operativas podem começar ou terminar contemplando dias do
mês anterior/posterior ao mês “j”, tais dias devem possuir fatores sazonais de acordo com o
mês, ou seja:
Para os dias que pertencem ao mês anterior (j-1), serão utilizados os fatores do terceiro
decêndio do mês “j-1” e a desagregação será realizada com a carga média estimada para o
mês “j-1”.
Para os dias pertencentes ao mês posterior “j+1, serão utilizados os fatores do primeiro
decêndio do mês “j+1” e a desagregação será realizada com a carga média prevista para o mês
“j+1”.

A seguir é apresentado como são obtidas as médias diárias e semanais utilizando os fato-
res sazonais:

C! .$ = C$ . F! .$

∑'!() C! .$
C& so =
7

Onde:
Ci .j = carga média do dia i do mês j
Cs(so) = carga média da semana operativa
so = número da semana operativa do mês j, 1 ≤ so ≤ 6

6 – Validação final
Após a realização das etapas anteriores, são obtidos os valores previstos de carga média
semanal para todas as semanas operativas do mês “j”. Contudo, é necessário que a carga men-
sal Cj, seja igual à média ponderada prevista das semanas, considerando o número de dias do
mês “j” presentes em cada semana operativa.
Com isso, foi desenvolvido um processo de validação final da seguinte maneira:
1. cálculo da média ponderada semanal;
210    Previsão de carga

2. comparação da carga média mensal Cj com a média ponderada das semanas operati-
vas. Se os valores forem iguais, o processo é encerrado;
3. caso contrário, é calculada a diferença entre a média ponderada das semanas operati-
vas e a carga prevista para o mês;
4. a diferença verificada no item 3 é dividida pelo número de Semana Operativa do mês
“j”, e o resultado deverá ser somado a todas as semanas operativas do mês. E retorna-
-se ao item 1.

A Figura 5.8 apresenta o fluxograma do processo obtenção dos valores de desagregação


da carga média mensal em valores semanais, para todas as semanas operativas do mês.

Figura 5.8 – Fluxograma do processo obtenção dos valores previstos mensais desagregados em valores semanais

5.4 – Carga ajustada

Para melhor entendimento sobre o comportamento da carga é necessário que as séries de


carga estejam livres de fatores fortuitos ou não econômicos, como calendário, caracterizados
como diferente número de dias úteis e não úteis e variações significativas da temperatura.
Essas séries são chamadas de “séries ajustadas de carga”. Elas apresentam duas vantagens so-
bre as séries primárias. Em primeiro lugar, elas são uma boa base para a previsão de carga no
médio e longo prazo, na medida em que representam não a carga efetivamente verificada, mas
aquela que teria sido observada se não estivessem sobre efeitos dos fatores fortuitos. Em se-
gundo lugar, as séries ajustadas de carga permitem uma análise mais refinada da relação entre
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   211 

o comportamento da economia e da carga, constituindo um indicador que reflete na carga o


efeito datividade econômica com boa qualidade.
Com o intuito de estruturar séries de carga “ajustadas”, que permitissem aumentar a ca-
pacidade analítica do ONS sobre a evolução da carga, foi realizada pelo ONS, em parceria
com o Gesel-IE-UFRJ e a PUC-Rio (Departamento de energia elétrica), uma pesquisa para o
desenvolvimento de uma metodologia adequada às especificidades do Brasil para a produção
desses dados ajustados, capaz de isolar a influência de fatores não econômicos sobre a carga.
Foram identificados quatro fatores não econômicos que influenciam no comportamento da
carga e que podem ser estimados com base em dados disponíveis:
1. Descontinuidades de dados obtidos por medição;
2. Perdas na rede de transmissão;
3. Ocorrência de temperaturas atípicas;
4. Variações no calendário.

As descontinuidades de dados obtidos por medição ocorrem, por exemplo, quando há


alteração dos limites de subsistemas, como a incorporação de um sistema isolado ao SIN.
Em outubro de 2009, o até então sistema isolado Acre-Rondônia foi conectado, em parte, ao
SIN, a partir de então a carga da maior parte desses dois estados, que somavam cerca de 400
MWmédios, passou a ser computada no SIN. Claro está que estes acréscimos de carga ao SIN
de um mês para o outro, não se deve a nenhum crescimento econômico, mas simplesmente ao
fato de que o ONS passou a medir a carga de uma parcela maior do país.
As perdas da rede de transmissão podem oscilar ao longo do ano por razões estritamente
ligadas à operação do sistema. Embora essas perdas tenham como fundamento razões técnicas
e não econômicas, são a menor parcela na composição do total das perdas no setor elétrico
brasileiro. O sistema de transmissão brasileiro é muito extenso e teve como base, em sua con-
cepção, o aproveitamento das diferenças nos regimes hidrológicos entre as diversas bacias. O
ONS se vale do sistema de transmissão para transportar energia de onde ela está disponível
e economicamente viável, em determinados períodos, para onde é necessária, na busca de
otimização dos recursos energéticos existentes. O uso mais ou menos intenso das grandes in-
terligações, consequentemente o carregamento elétrico do sistema de transmissão, acaba por
influenciar no nível das perdas técnicas. Assim, as perdas podem aumentar, por exemplo, com
o uso mais intensivo das interligações transportando energia entre os subsistemas, através de
prática de intercâmbio, e podem reduzir quando a carga a ser atendida passa a ser basicamente
por geração mais próxima aos grandes centros.
A ocorrência de temperaturas atípicas para a época do ano também é um fator de forte
influência no comportamento da carga e, na maioria dos casos, o principal. Particularmente,
o consumo industrial tende a ser pouco sensível a variações de temperatura, mas o consumo
para uso comercial e, sobretudo, o consumo residencial, tendem a ser muito sensíveis a es-
sas variações. Grande parte do efeito da temperatura sobre o montante da carga de energia
212    Previsão de carga

consumida é sazonal, pois é normal um grande aumento do consumo residencial durante os


meses de “verão”, período compreendido entre novembro e março. Mas a ocorrência de tem-
peraturas atípicas, muito acima ou abaixo das médias históricas, podem também fazer com
que a carga tenha uma variação além do padrão sazonal normal: a ocorrência de intervalos
dentro desse período considerado “verão”, com temperaturas relativamente amenas podem
resultar em valores de carga atípicos. Nesse caso, essa redução da carga tem pouco ou nenhum
significado econômico e, portanto, torna-se importante faze a correção.
Variações no calendário, caracterizados como maior ou menor número de dias úteis exis-
tentes no mês, também influenciam no montante da carga atendida. Normalmente se restringe
a influência do calendário ao número de dias úteis de um determinado mês. No entanto, para
corretamente comparar um indicador de um determinado mês com a leitura do mesmo indica-
dor para o mesmo mês do ano anterior, é preciso fazer um ajuste para refletir a diferença entre
o número de dias úteis no período de comparação.

Séries ajustadas: metodologia


A série de carga ajustada do SIN procura ser um indicador coincidente da atividade econô-
mica que possui baixa volatilidade e boa aderência à evolução do PIB e ao IBC-BR.
Para montar as séries ajustadas, foram testadas diversas metodologias de ajuste, sobretudo
para compensar o efeito da temperatura e do calendário sobre a carga. Para selecionar a me-
lhor metodologia foi preciso definir critérios para avaliar os resultados obtidos. Os critérios de
seleção utilizados foram dois:
1. Maximizar a correlação entre a Carga Ajustada do SIN e um indicador de atividade
econômica (PIB e IBC-BR).
2. Minimizar a volatilidade da própria série de carga ajustada.

Assim, frente a diversos ensaios realizados para compensar, por exemplo, o efeito da
ocorrência de temperaturas atípicas na carga, a seleção recaiu sobre o ensaio que mais au-
mentou a correlação da série ajustada com o PIB e/ou que diminuiu de forma mais acentuada
volatilidade da série ajustada produzida.
Em uma descrição resumida, a metodologia da carga ajustada consiste em ajustar as bases
de comparação, observando os seguintes passos:
1. Tratar dados diários para ajustar o efeito do calendário e da temperatura.
2. Calcular um fator de ajuste da carga mensal com base no ajuste efetivamente realizado
na carga diária de um dado mês.
3. Aplicar o fator de ajuste aos componentes da carga que estão disponíveis apenas em
frequência mensal (geração distribuída e descontinuidades de medição).
4. Retirar da carga mensal por subsistemas as perdas da rede básica estimadas.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   213 

No gráfico da Figura 5.9 foram plotadas três curvas mensais, a saber:


• Crescimento da carga verificada referente ao período de dez-17 a dez-18.
• Crescimento da carga verificada ajustada referente ao período de dez-17 a dez-18.
• Crescimento da produção industrial.

Como se pode observar na Figura 5.9, a curva da evolução representativa da carga segue o
mesmo movimento da curva que representa a produção industrial, pois como já foi pontuado
anteriormente, esse setor sofre pouca influência das variações de temperatura, o que é bastante
previsível uma vez que o consumo da classe residencial e da classe comercial sofrem bastante
influência da temperatura. Portanto, retirando-se o efeito do fator temperatura, a influência so-
bre o comportamento da carga dar-se-á, basicamente, por conta do setor produtivo industrial.

Figura 5.9 – Carga x carga ajustada x produção industrial

5.5 – Cálculo dos patamares de carga

Patamar de carga é a classificação das horas do mês, de acordo com o perfil de carga de-
finido pelo ONS.
A curva de carga diária se caracteriza por apresentar três tipos de patamares de carga:
• Patamar de carga Leve – período do dia composto pelos horários em que se observam
as menores demandas/consumo de energia elétrica.
• Patamar de carga Média – período do dia composto por horários em que se observam
comportamento semelhantes durante o dia, após o patamar de carga leve.
214    Previsão de carga

• Patamar de carga Pesada – período do dia composto por horários em que se observam
comportamento semelhantes durante o dia, após o patamar de carga média. Observa-
-se que esse patamar ocorre durante o período noturno até antes das 24 horas.

Anualmente, em razão do comportamento dos consumidores com base nos hábitos de consu-
mo e uso de equipamentos demandantes de energia elétrica, é necessário que se faça uma aferi-
ção dos períodos utilizados como patamares de carga no SIN. Em julho de 2018 foi apresentada,
pelo nos, à Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais
do Setor Elétrico (CPAMP), uma proposta de atualização do cálculo dos patamares, que resultou
em Relatório Técnico – 5566/2019 “Reavaliação dos intervalos de duração dos patamares de
carga”, Centro de Pesquisa em Energia Elétrica (Cepel), considerando as visíveis alterações na
curva de carga diária do SIN. Para esse cálculo é necessário o uso de perfis de curvas típicas de
carga (perfis de carga) horária para representar em patamares as previsões semanais e mensais,
cujas durações estão representadas no mapa coroplético da Figura 5.13 e definidas na tabela 5.3.
No referido relatório técnico está descrito toda a metodologia adotada para a reavaliação
para atualização dos patamares de carga. A reavaliação considerou o período 2014-2018 para
cada mês, quando foram calculadas as demandas médias horárias em p.u. da demanda média
mensal. Na sequência, o método K-Means foi aplicado em todas as observações horárias de
um mesmo mês. Assim, foram realizadas 12 análises de agrupamentos, uma para cada mês do
ano, nas quais as observações horárias foram classificadas em três clusters (mesmo número de
patamares). Para cada cluster obtido calculam-se o total de elementos e a média das observa-
ções pertinentes (centroides). Apesar da associação entre os três clusters e os três patamares
de carga, vale destacar que os patamares não correspondem exatamente aos clusters. Assim,
os centroides dos clusters são apenas uma primeira estimativa do valor em p.u. do patamar de
carga, enquanto a frequência relativa de observações classificadas em cada cluster fornece uma
indicação prévia da duração do patamar que representa a hora pertencente a cada patamar.
Na sequência, os perfis de carga, em cada mês, foram segregados nos tipos 1 (dia útil) e
tipo 2 (sábados, domingos e feriados), conforme figura 5.10. A definição dos intervalos das
durações dos patamares é realizada por meio da aplicação de algoritmo e, resumidamente,
descrito a seguir na análise dos loadplots, com representação visual de todas as observações
horárias para um mesmo mês, ao longo do período considerado:

• A duração do patamar pesado deve ter como referência a frequência de observações


classificadas pelo K-Means no cluster com o maior centroide.
• O patamar pesado abrange as seguintes horas:
• horas nas quais o valor mediano da carga horária supera o maior centroide;
• horas adjacentes de horas já classificadas como patamar pesado, mas seguindo a
ordem decrescente das medianas até alcançar a duração sugerida pelo K-Means.
• O patamar leve abrange as horas, cujas medianas da carga não ultrapassa o segundo
maior centroide.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   215 

• O patamar médio é composto pelas horas não classificadas como pesadas ou leves.

Figura 5.10 – Perfis de curva de carga para a identificação dos patamares

Caso exemplo para o mês de janeiro


Nas Figuras 5.11 e 5.12, cada ponto representa um registro horário da carga (em p.u. da
demanda média mensal). No total há 3720 pontos, todos referentes ao mês de janeiro no perí-
odo de 2014 até 2018. Por meio da análise de agrupamentos (K Means) os registros horários
foram classificados em três clusters. Para cada intervalo horário apresenta-se um boxplot dos
respectivos registros horários da carga (em p.u. da demanda média mensal). Adicionalmente,
as três linhas horizontais no interior da Figura 5.11 indicam os centroides dos clusters. Já na
Figura 5.12 a linha referente ao maior centroide localiza-se fora da escala da figura.
Os 3720 registros horários, referentes ao mês de janeiro no período de 2014 até 2018, fo-
ram classificados em três clusters, cujas frequências são apresentadas na tabela 5.1.

Figura 5.11 – Dia útil


216    Previsão de carga

Figura 5.12 – Sábado, domingo e feriado

Tabela 5.1 – Clusters


Clusters 1 2 3
Frequência absoluta 1285 1317 1118
Frequência relativa (%) 35% 35% 30%
Frequência relativa x 24
8,3 horas 8,5 horas 7,2 horas
horas
Centróide em p.u. da
1,1357 0,9909 0,8506
demanda média mensal

Os intervalos horários indicados dos patamares de carga identificados estão na tabela 5.2.
Tabela 5.2 – Patamares de carga – caso exemplo/janeiro
Patamar Pesado Médio Leve
Perfil de carga tipo 1 –
11 - 18 9 - 10 1-8
dias úteis
Perfil de carga tipo 2 –
21 - 23 1 – 20 e 24
demais dias

Uma vez apurado os respectivos patamares de carga diário e mensal, é necessária uma
avaliação dos resultados obtidos, considerando os distintos períodos do ano, caracterizados
pelo comportamento da carga em razão dos sinais de consumo que compõem a curva de car-
ga diária, sujeitas ao comportamento sazonal. Nesse sentido, monta-se um mapa coroplético
com os dados mensais, composto de horas apuradas que formam os patamares. A partir desse
ponto é essencial a avaliação e análise dos dados obtidos para se chegar ao agrupamento dos
períodos de duração dos patamares. Observa-se que há pelo menos três períodos distintos: um
que engloba os meses de temperatura mais elevada que podemos chamar de verão. O segundo
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   217 

predomina nos meses de inverno e um terceiro que se caracteriza por meses de transição sem
uma tipicidade de carga dominante.

Figura 5.13 – Mapas coropléticos dos perfis típicos diários de carga de energia

Tabela 5.3 – Intervalos horários de patamares de carga de energia


Maio a agosto Abril, setembro e outubro Novembro a março
Patamar de Sábado, Sábado, Sábado,
carga 2ª a 6ª feira domingo e 2ª a 6ª feira domingo e 2ª a 6ª feira domingo e
feriado feriado feriado
Leve 1ª h à 7ª h 1ª h à 18ª h 1ª h à 8ª h 1ª h à 18ª h 1ª h à 8ª h 1ª h à 20ª h
Média 8ª h à 10ª h 23ª h à 24ª h 9ª h à 10ª h 23ª h à 24ª h 9ª h à 10ª h 24ª h
Pesada 23ª h à 24ª h 19ª h à 22ª h 21ª h à 22ª h 19ª h à 22ª h 19ª h à 24ª h 21ª h à 23ª h
11ª h à 22ª h 11ª h à 22ª h 11ª h à 22ª h
Nota: o intervalo horário é composto pelo primeiro minuto após a hora anterior até a hora seguinte (inclu-
sive). Exemplo: a 1ª hora é considerada do primeiro minuto após a hora 24 do dia anterior até a hora 1 do
sedia seguinte.

Curvas típicas
A determinação de curvas típica é fundamental para os cálculos dos patamares de carga,
como também veremos a seguir, para cálculo dos fatores de profundidade e, consequentemen-
te, a energia alocada em cada patamar.
As séries temporais de carga com resolução horária apresentam múltiplos ciclos sazonais,
i.e., padrões que se repetem diariamente, semanalmente e mensalmente (Taylor e Snyder,
2012). As curvas horárias típicas são representações dos padrões sazonais presentes em uma
série temporal de carga.
As curvas horárias típicas podem ser obtidas a partir de uma série histórica de carga com
resolução temporal horária. Inicialmente, os registros horários são segmentados em perfis de
carga formados por 24 registros horários, um perfil para cada dia. Na sequência, os perfis de
carga são classificados em grupos (clusters), de tal forma que os perfis em cada grupo sejam
218    Previsão de carga

semelhantes entre si e, concomitantemente, diferentes dos perfis nos demais grupos. As curvas
horárias típicas correspondem aos perfis médios (centroides) ou medianos dos grupos.
A presença de dados discrepantes (outliers) e feriados podem afetar o cálculo do perfil
médio em cada grupo que formará uma curva típica. A solução consiste em separar os feriados
e perfis atípicos do cálculo do perfil médio. Contudo, uma estratégia mais simples e robusta
toma como curvas típicas os perfis medianos em cada grupo, i.e., a coleção dos valores media-
nos da carga ao longo do dia. A Figura 5.14 apresenta, como exemplo, as curvas típicas (me-
dianas) para um dia da semana, útil (segunda-feira), sábado e domingo, calculada no período
2012-2017 no mês de janeiro no subsistema Sudeste. Nota-se que, no período, ocorreram dois
feriados de 1º de janeiro no domingo, portanto muito discrepante do perfil de um domingo
“normal”.

Figura 5.14 – Curvas Típicas para cada dia da semana de janeiro

Fatores de profundidade e duração dos patamares de carga


Além da definição dos patamares de carga, se faz necessária a repartição da energia con-
tida em cada patamar ao longo das semanas operativas. Para esse cálculo, utiliza-se de um
argumento que procura avaliar, através dos perfis de carga típicos e a duração de cada patamar,
o total de energia a ser considerado. Para tanto, é necessário que sejam apurados segundo dois
fatores que aproximam a realidade do comportamento da carga nos respectivos patamares:
fator de duração e fator de profundidade.
O primeiro, fator de duração, corresponde ao tempo de duração de cada patamar, multi-
plicado pelos dias da semana. O segundo, fator de profundidade, modela a curva de carga em
p.u. nas horas que duram o patamar. Dessa forma, obtém-se, de forma aproximada, a parcela
de energia corresponde que contém cada patamar.
A metodologia de cálculo dos fatores de profundidade e duração dos patamares, está des-
crita em detalhes no Relatório Técnico – 13843/2018 – “Profundidades e durações dos pata-
mares de carga para a operação energética”, Cepel.
O cálculo dos fatores de profundidades dos patamares de carga inicia-se com a extração
dos perfis de carga típicos, em cada mês e dia da semana, a partir de uma série de carga com
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   219 

resolução temporal horária. O resultado desta primeira etapa é um conjunto de 96 curvas tí-
picas, isto é, oito curvas para cada mês do ano expressas em p.u. da demanda média mensal:
um para cada dia da semana (sete perfis) e um perfil adicional relativo aos feriados no mês.
Na sequência, as profundidades dos patamares em cada mês são calculadas a partir dos res-
pectivos perfis típicos previamente identificados, dos intervalos horários dos patamares e das
frequências de dias úteis, fins de semana e feriados em cada mês do horizonte de estudo. Res-
salta-se que os perfis típicos e intervalos horários dos patamares permanecem os mesmos ao
longo dos anos do horizonte de estudo, a mudança reside no calendário, i.e., nas frequências
de dias úteis, fins de semana e feriados em cada mês do horizonte de estudo. Na Figura 5.15,
tem-se um esquema do cálculo dos patamares de carga.

Figura 5.15 – Etapas do cálculo dos fatores de profundidade

Consideramos as seguintes estatísticas obtidas a partir do calendário para um mês M per-


tencente ao horizonte de estudo para apuração dos fatores de profundidade:
N1,M = número de domingos sem feriados no mês M
N2,M = número de segundas-feiras sem feriados no mês M
N3,M = número de terças-feiras sem feriados no mês M
N4,M = número de quartas-feiras sem feriados no mês M
N5,M = número de quintas-feiras sem feriados no mês M
N6,M = número de sextas-feiras sem feriados no mês M
N7,M = número de sábados sem feriados no mês M
N8,M = número de feriados no mês M
P1,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de domingo para o mês M
P2,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de segunda-feira para o mês M
P3,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de terça-feira para o mês M
P4,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de quarta-feira para o mês M
P5,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de quinta-feira para o mês M
220    Previsão de carga

P6,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de sexta-feira para o mês M


P7,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de sábado para o mês M
P8,h,M = valor em p.u. na hora h, do perfil típico de feriado para o mês M
Tp,verão = oito horas, duração do patamar pesado no verão
Tm,u,verão = oito horas, duração do patamar médio em dia útil no verão
Tm,f,verão = três horas, duração do patamar médio em fim de semana/feriado no verão
Tl,u,verão = oito horas, duração do patamar leve em dia útil no verão
Tl,f,verão = 21 horas, duração do patamar leve em fim de semana/feriado no verão
Tp,i = 10 horas, duração do patamar pesado no período intermediário
Tm,u,i = seis horas, duração do patamar médio em dia útil no período intermediário
Tm,f,i = quatro horas, duração do patamar médio em fim de semana/feriado no período
intermediário
Tl,u,i = oito horas, duração do patamar leve em dia útil no período intermediário
Tl,f,i = 20 horas, duração do patamar leve em fim de semana/feriado no período intermediário
Tp,inverno = 12 horas, duração do patamar pesado no inverno
Tm,u,inverno = cinco horas, duração do patamar médio em dia útil no inverno
Tm,f,inverno = quatro horas, duração do patamar médio em fim de semana/feriado no inverno
Tl,u,inverno = sete horas, duração do patamar leve em dia útil no inverno
Tl,f,inverno = 20 horas, duração do patamar leve em fim de semana/feriado no inverno

N1+N2+N3+N4+N5+N6+N7+N8 é igual ao total de dias do mês M.

As durações dos patamares são obtidas diretamente da tabela 5.3. Adicionalmente, neste
trabalho a hora h = 1 corresponde ao intervalo horário entre 00:00 h e 01:00 h, a hora h = 2
corresponde ao intervalo entre 1 e 2 h e assim sucessivamente até a hora h = 24, relativa ao
intervalo entre 23 e 24:00 h.
Se o mês M pertence ao período de verão, isto é, se M corresponde aos meses novembro,
dezembro, janeiro, fevereiro ou março, as profundidades dos patamares devem ser calculadas
por meio das seguintes equações:

Profundidade do patamar pesado para o período de verão (PUp, verão):

∑"!#$ N! ∑%#'(
%#'' P%,!
T),*+,ã. ∑"!#$ N!
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   221 

Profundidade do patamar médio para o período de verão (PUm, verão):

∑"!#$ N! ∑%#'( %#$* %#$-


%#) P%,! + ∑%#') P%,! + ∑%#$' N' P%,' + N+ P%,+ + N, P%,,
T.,/,012ã4 ∑"!#$ N! + T.,5,012ã4(N' + N+ + N, '

Profundidade do patamar leve para o período de verão (PUl, verão):

∑"!#$ N! ∑%#' %#$*


%#( P%,! + ∑%#( N( P%,( + N) P%,) + N' P%,' + N( P$+,( + N) P$+,) + N' P%,'
T,,-,./0ã2 ∑"!#$ N! + T,,3,./0ã2(N( + N) + N' '

Da mesma forma, pode-se obter os fatores de profundidade para os períodos de inverno e


intermediário definidos na tabela de duração de patamar.
Denotando o período do ano (verão, intermediário e inverno) por “*”, a duração total de
cada patamar no mês M é calculada pelas seguintes equações:

A soma das durações dos patamares (Dp + Dm + Di) é igual ao total de horas do mês.
Assim, a profundidade média dos patamares é dada por:
PU!,∗ D! + PU$,∗ D$ + PU%,∗ D%
"=
X
D! + D$ + D%

5.6 – Previsão de carga anual para o Planejamento da Operação Energética

Anualmente, o ONS, em conjunto com a EPE e a CCEE, elabora previsões de carga para o
planejamento anual da operação energética para os cinco anos subsequentes ao ano em curso.
Essas previsões, além de avaliar a evolução recente dos valores de carga global, conta com
a participação dos agentes, distribuidoras e consumidores livres conectados na Rede Básica,
que fornecem dados de carga previstos para o período, agregando informações importantes
para a evolução do mercado de energia elétrica no SIN.
222    Previsão de carga

Nesse processo, é relevante o comportamento da economia nos próximos anos, dado que será
o principal balizador das projeções de consumo de energia elétrica elaborado pela EPE. Agre-
ga-se a isso, variáveis de importância como população, número de domicílios, grandes projetos
industriais, e as tendências do mercado de energia como participação da geração distribuída,
avaliação da posse e hábitos de consumo, programas de racionalização energética, evolução tec-
nológica dos equipamentos que consomem energia elétrica, condições climáticas, entre outros
aspectos, alguns deles também vinculados direta ou indiretamente ao crescimento da economia.
Alguns desses fatores tem uma influência mais acentuada nas oscilações de curto prazo
da demanda de energia elétrica, como é o caso da temperatura, enquanto outros implicam em
alterações do perfil de consumo de eletricidade de mais longo prazo e de forma mais perma-
nente, como ocorre, por exemplo, com avanços tecnológicos ou novos projetos industriais.
Outro fator de incerteza no total da carga que tem chamado muito a atenção dos órgãos
setoriais e que impactam nas previsões, são o comportamento das perdas técnicas e não téc-
nicas, essa última muito significativa em razão da crescente utilização de energia por ligações
irregulares ou mesmo de prática ilegal, o que leva às empresas de distribuição a adotarem
programas de recuperação e combate a essas práticas, mas de resultados aquém do previsto.
O processo de previsão com amplos estudos é executado no final do ano. Existem ainda
duas revisões quadrimestrais desses valores durante o ano, quando os valores de carga passam
por avaliações analíticas relativas ao desempenho da economia e seus possíveis efeitos sobre
o comportamento da carga, podendo resultar em ajustes das projeções de carga em função do
comportamento da carga observadas durante o ano e até mesmo a se a chegar à atualização das
premissas adotadas no estudo anual, conforme Figura 5.16.
Com esse objetivo, o ONS, EPE e CCEE elaboram as previsões de carga global e de con-
sumo, sob a ótica das premissas macroeconômicas apresentadas pela EPE e acordadas entre
as três empresas em reuniões específicas.

Figura 5.16 – Processo de previsão de carga para o Planejamento Anual e suas revisões quadrimestrais
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   223 

Além disso, as projeções de carga, encaminhadas ao ONS pelos agentes para o período de
cinco anos, também são utilizadas para nortear as projeções (figura 5.17).

Figura 5.17 – Previsões de carga mensais enviadas pelos agentes

As previsões são avaliadas, obrigatoriamente, em períodos quadrimestrais, dando origem


às Revisões Quadrimestrais (figura 5.18). Há também a possibilidade de revisões extraordi-
nárias em períodos distintos no caso de eventos excepcionais e previamente autorizadas pela
ANEEL.

Figura 5.18 – Revisões quadrimestrais da carga

5.6.1 – Principais variáveis de influência no consumo e na carga


Dada a forte inter-relação entre o consumo e o desempenho da economia, o ponto de par-
tida para as projeções de carga de energia elétrica para o Planejamento Anual da Operação
Energética é a análise de cenários macroeconômicos e a quantificação de correspondentes tra-
jetórias de crescimento da economia, responsáveis por gerar as taxas de crescimento do PIB.
224    Previsão de carga

• Políticas Macroeconômicas – indicadores:


• PIB;
• Renda;
• Investimento.
• Cenário Nacional – econômico e político.
• Cenário Internacional – principais mercados, preços de commodities, crises globais.
• Evolução das Perdas – Totais, Rede Básica e na Distribuição.
• Grandes consumidores – Novas cargas.
• Consumidores Livres na RB;
• Livres na distribuição;
• Interligações e expansão do SIN.

5.6.2 – Método de previsão do consumo


Devido à forte relação entre a evolução da economia e o consumo de eletricidade, as pro-
jeções de energia por classe são projetadas a partir dos cenários econômicos. A dificuldade em
prever, com precisão, a estrutura e a magnitude do crescimento econômico, obrigam a que se
associem as projeções do mercado de energia elétrica a cenários ou trajetórias de crescimento
da economia.
Essas classes possuem características específicas, são elas: residencial, comercial, indus-
trial e demais classes. As principais variáveis utilizadas para a projeção do consumo de eletri-
cidade de cada classe de consumo, conforme descrito na Nota Técnica de EPE DEA 003/2019
“metodologia de projeção de demanda”, estão descritas a seguir.

5.6.2.1 – Classe residencial


O consumo residencial apresenta forte correlação com o consumo comercial e outros
consumos, como: iluminação pública, poderes públicos, serviços públicos etc. Essa classe de
consumo refere-se ao conjunto de unidades consumidoras com fim residencial, considerando-
-se as seguintes subclasses:
• Residencial;
• Residencial baixa renda;
• Residencial baixa renda indígena;
• Residencial baixa renda quilombola;
• Residencial baixa renda benefício de prestação continuada da assistência social.

A projeção do consumo residencial por subsistema é obtida através da projeção de dois


parâmetros: número de consumidores residenciais (NCR), projetado em consonância com o
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   225 

ritmo de crescimento da população e com a expectativa de habitantes por domicílio no futuro


em cada subsistema elétrico, e consumo médio por consumidor residencial (CPC), em bases
mensais, com elasticidade correlacionada ao Produto Interno Bruto (PIB) Brasil. O consumo
residencial é obtido, portanto, pela identidade.

Consumo residencial = NCR x CPC x 12

Principais variáveis utilizadas para a projeção do consumo residencial:


• Relação entre o número de unidades consumidoras residenciais e a população (NCR/
Pop).
• Consumo médio por consumidor residencial (CPC): Representa o consumo médio de
energia elétrica de uma unidade consumidora residencial.
• Elasticidade-renda do consumo médio por consumidor residencial: Representa o quan-
to varia o consumo médio de energia elétrica por consumidor residencial em relação à
variação em uma unidade do PIB nacional.
• Perspectivas de eficiência energética nas residências.

5.6.2.2 – Classe comercial


Essa classe de consumo compreende as unidades consumidoras em que seja exercida
atividade comercial ou de prestação de serviços, à exceção dos serviços públicos ou de outra
atividade não prevista nas demais classes. As principais variáveis utilizadas para a projeção
do consumo comercial:
• Relação entre o consumo comercial e a população (CC/Pop).
• Elasticidade-renda do consumo comercial per capita: Representa o quanto varia o con-
sumo comercial de energia elétrica per capita em relação à variação em uma unidade
do PIB nacional.
• Perspectivas de eficiência energética no setor de comércio e serviços.

5.6.2.3 – Classe industrial


A relação entre o consumo de energia elétrica e o PIB é tanto mais forte quanto maior o
peso do segmento industrial, tanto na economia como no consumo de eletricidade. No PIB, a
indústria representa um pouco mais de 20% das riquezas produzidas. Na energia, a indústria
responde por 43% de toda a demanda de eletricidade. A análise do comportamento do consu-
mo de energia elétrica vis-à-vis a evolução do PIB revela que existe uma componente inercial
que limita o crescimento da demanda por eletricidade no caso de taxas de expansão do PIB
elevadas e, por outro lado, sustenta aquele crescimento mesmo em período de recessão ou de
expansão econômica modesta.
226    Previsão de carga

O consumo das indústrias é projetado conforme as perspectivas de evolução do PIB e


projeção do consumo dos grandes consumidores industriais realizada com base na produção
física e nos consumos específicos de energia elétrica de cada setor (kWh por tonelada). Para
cada um deles são estabelecidas premissas relativas à demanda interna (consumo interno dos
respectivos produtos) e aos níveis de exportação e de importação, expressos em unidades físi-
cas (toneladas). Também são considerados os níveis de autoprodução de energia. O conjunto
das outras classes de consumo engloba as classes: rural, serviço público, poderes públicos,
iluminação pública e consumo próprio das concessionárias.
As projeções de consumo da classe industrial referente aos grandes consumidores indus-
triais eletrointensivos envolvem os seguintes ramos industriais eletrointensivos:
• Cadeia do alumínio (bauxita, alumina e alumínio primário);
• Metalurgia do aço (siderurgia, pelotização e ferro-ligas);
• Cobre;
• Química (petroquímica e soda-cloro);
• Papel e celulose (papel, celulose e PAR);
• Cimento.

Além disso, são envolvidos também:


• Elasticidade-renda do consumo relacionado a cada segmento da indústria: representa
o quanto varia o consumo de energia elétrica de cada ramo industrial em relação à
variação em uma unidade do PIB nacional.
• Capacidade instalada de produção: representa a evolução anual da capacidade instala-
da de cada ramo industrial. Incluem novas plantas industriais, descomissionamento de
fábricas, adição de capacidade, entre outros.
• Produção física setorial: representa a evolução anual da produção física de cada ramo
industrial.
• Consumos específicos setoriais de energia elétrica: representa o consumo específico
de cada ramo industrial relacionado as suas respectivas tecnologias.
• Relação exportação/produção: representa a relação da produção nacional com o quan-
to deste valor é direcionado para as vendas externas (exportações).
• Relação importação/demanda interna: representa a relação da demanda interna nacio-
nal com o quanto deste valor é atendido pelas compras externas (importações).
• Perspectivas de eficiência energética em cada ramo industrial.
• Perspectivas de autoprodução e cogeração: perspectivas de evolução da autoprodução
e da cogeração em cada ramo industrial.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   227 

As projeções de consumo da classe industrial referente à indústria tradicional envolvem


os demais ramos industriais não intensivos em eletricidade. As principais variáveis utilizadas
para a projeção dessa classe de consumo estão descritas a seguir:
• Elasticidade-renda do consumo industrial: Representa o quanto varia o consumo de energia
elétrica destes ramos industriais em relação à variação em uma unidade do PIB nacional.
• Perspectivas de eficiência energética nestas indústrias.
• Perspectivas de autoprodução e cogeração: perspectivas de evolução da autoprodução
e da cogeração nestas indústrias.

5.6.2.4 – Classe Outras classes


Essa classe de consumo envolve a agregação do consumo de energia elétrica das classes
Rural, Poder Público, Iluminação Pública, Setor Público e Consumo Próprio conforme NT da
EPE citada anteriormente. O consumo das demais classes é projetado através da sua elastici-
dade em relação ao PIB, utilizando-se curvas da elasticidade desse consumo. Envolve a agre-
gação do consumo de energia elétrica das classes Rural, Poder Público, Iluminação Pública,
Setor Público e Consumo Próprio.
• Elasticidade-renda do consumo Outras Classes per capita (CO/Pop): representa o
quanto varia o consumo de energia elétrica das Outras Classes per capita em relação
à variação em uma unidade do PIB nacional.
• Perspectivas de eficiência energética nas Outras Classes.

5.6.3 – Metodologia de projeção de consumo de eletricidade no âmbito das pro-


jeções para o Planejamento Anual da Operação energética
A metodologia de projeção de consumo na rede e carga de energia adotada no âmbito das
projeções para o Planejamento Anual da Operação energética, leva em consideração tanto
curvas de elasticidade-renda para cada classe de consumo quanto o acompanhamento setorial
de grandes cargas industriais.
Alguns cuidados nessa análise devem ser tomados, uma vez que, pontualmente, isto é, ano
a ano, a elasticidade-renda apresenta comportamento bastante volátil. Isso se deve à influência
de outros fatores, notadamente fatores conjunturais, de curto prazo, que afetam o comporta-
mento dessa medida. Visando diminuir a influência desses fatores conjunturais, é recomen-
dada que sua apuração por período de alguns anos (“arco”). Feito isso, historicamente obser-
va-se um comportamento decrescente da elasticidade quanto maior o dinamismo econômico.
A partir da evolução do PIB e da população, são analisadas as elasticidades-renda de
algumas variáveis essenciais na composição do consumo de energia elétrica, quais sejam:
o consumo médio residencial, o consumo industrial tradicional, o consumo comercial per
capita e o consumo per capita do agregado das outras classes. Visando captar uma tendência
228    Previsão de carga

desses parâmetros, considera-se as médias móveis das taxas de crescimento de cada uma das
variáveis e do PIB para o período histórico e as correspondentes elasticidades.
Por outro lado, há parcela de consumo, oriunda de plantas industriais grandes consumi-
doras de energia que, por vezes, está associada não apenas ao mercado interno como também
à dinâmica internacional. Dependendo do segmento, o aumento do consumo de eletricidade
associado à produção física incremental pode culminar em um pequeno aumento no valor adi-
cionado industrial. Dessa forma, alterações na dinâmica de produção destes eletrointensivos
geram impactos diretos na relação entre PIB e Carga de Energia.
A seguir estão listadas as equações básicas utilizadas para o cálculo dos parâmetros nos
quais o Modelo de Projeção da Demanda de Eletricidade (MDE), utilizado pela EPE, se baseia.

Equações básicas
ɛ = (β0 + nºdp0 x dp0) + (β1 + nºdp1 x dp1) x (1/(∆%PIB))
∆%CPC = ɛCPC x ∆%PIB
∆%IT = ɛIT x ∆%PIB
∆%CC/Pop = ɛCC/Pop x ∆%PIB
∆%CO/Pop = ɛCO/Pop x ∆%PIB

NCR:
NCR = NCR/Pop x Pop
NCR/Pop = K/(1 + exp(A));
A = β0* + nºdp0 x dp0 + (β1 + nºdp1 x dp1) x T

Onde
nºdpX: número de desvios-padrão adotados para o parâmetro X
dpX: desvio-padrão do parâmetro X
CPC: consumo médio por consumidor residencial
IT: industrial tradicional
Pop: população
CC: consumo comercial
CO: consumo outros
NCR: número de unidades consumidoras residenciais
K: nível de saturação
b0*: parâmetro β0 ajustado de acordo com o último valor verificado.
T: ano, onde 1985 = 0
ɛ: elasticidade-renda
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   229 

O comportamento do consumo e da carga de energia são importantes indicadores do nível


de atividade econômica. Conceitualmente, o consumo é medido nas unidades consumidoras,
seja através da leitura do relógio dos pequenos consumidores, seja através de tele medição,
como já é praxe em muitos dos grandes consumidores. A carga deve ser sempre maior do que
o consumo, pois há perdas entre a unidade geradora e o consumidor.

Carga = Consumo + Perdas

A projeção da carga de energia é obtida a partir da projeção do consumo de energia elé-


trica e das premissas utilizadas sobre a evolução do Índice de perdas. Sendo assim, a carga
de energia elétrica anual pode ser calculada a partir do consumo de eletricidade pela seguinte
identidade:
Carga de Energia Elétrica = Consumo de Energia Elétrica/(1-Índice de Perdas)

As projeções por classe de consumo se baseiam na evolução de alguns parâmetros carac-


terísticos conforme a Figura 5.19.

Figura 5.19 – Projeções por classe de consumo


230    Previsão de carga

5.7 – Previsão de carga de curto prazo

A previsão de carga de curto prazo tem por objetivo inferir curvas de carga diária para o
planejamento da operação. Uma curva de carga diária representa o comportamento do consu-
mo de energia elétrica numa residência, comércio ou indústria, contudo, para o ONS e demais
agentes do setor elétrico, o interesse está em avaliar tal comportamento de forma agregada,
por exemplo, nos barramentos, áreas, subsistemas e SIN, no caso do ONS, ou por unidade
consumidora, redes de distribuição, subestações e barramentos, no caso dos demais agentes.
As curvas de carga diária também expressam características próprias de cada região, haja
vista que o Brasil é um país de dimensões continentais com uma extensão territorial que
abrange inclusive diferentes fusos horários. Algumas dessas características podem ser encon-
tradas nas curvas de carga através das variações nas mesmas, como:
1. Efeitos da diversidade do clima: devido à variação das temperaturas e incidência de
chuvas.
2. Efeitos da diversidade socioeconômica e cultural:
• Posses de eletrodomésticos e de hábitos de consumo;
• Participação relativa das classes de consumo na curva de carga: residencial, co-
mercial e industrial;
• Nível de renda da região;
• Valores tarifários, impostos, perdas comerciais etc.;
• Densidade demográfica.
3. Efeitos da regulação e das medidas econômicas no setor elétrico:
• Mudanças no sinal tarifário e inclusão de novas modalidades tarifárias.
• Incentivos fiscais para aquisição de aparelhos eletrodomésticos da linha branca.
• Uso intenso de aparelhos de refrigeração.
• Uso de aparelhos de aquecimento, sobretudo na Região Sul.
• Uso de gás natural para aquecimento de água, em substituição ao chuveiro elétrico
nos novos empreendimentos imobiliários nas principais capitais e cidades.
• Aumento da micro e mini geração distribuída, com destaque para a geração foto-
voltaica residencial e comercial.

Todos esses fatores influenciam o comportamento dos consumidores e, por conseguinte, a


curva de carga diária. Por isso, a previsão de carga de curto prazo deve levar em consideração
essas particularidades de cada região, pois nenhum modelo estatístico ou método analítico de
cunho geral atenderia a todos os casos com o mesmo desempenho de qualidade.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   231 

O tópico seguinte descreve o processo da previsão de carga para o planejamento diário


da operação, cuja carga é uns dos principais insumos para a programação dos despachos de
geração hidroelétrica e térmica no país.

5.8 – Previsão de carga para o planejamento diário da operação

A Programação Diária da Operação Eletroenergética (PDE) do ONS necessita, entre ou-


tros, das previsões de carga para as áreas de concessão dos agentes distribuidores e consumi-
dores livres conectados à Rede Básica para o dia da operação. Essas previsões são elaboradas
no dia anterior ao dia da operação, em intervalos de meia hora, para um horizonte que varia
de dois a sete dias à frente. Essas previsões normalmente são para dias úteis ou finais de se-
mana, precedidos e/ou seguidos de feriados e dias pontes. Previsões para dias especiais, por
exemplo, jogos do Brasil em copas do mundo, são elaboradas com maior antecipação porque
preveem comportamentos de carga fora dos padrões normalmente observados, exigindo da
operação medidas adicionais.
As incertezas acerca do comportamento da carga diária devem-se, principalmente, às mu-
danças diárias nas temperaturas e/ou nas condições climáticas em cada região. Outros fatores
de incerteza são os feriados, dias pontes, entrada e saída do horário de verão, além dos dias
especiais. Fatores econômicos e sazonais também afetam o comportamento da carga diária,
porém em menor intensidade para fins de previsão de curto prazo – a forma da curva de carga
já revela o período sazonal. A mitigação dessas incertezas dependerá, portanto, da precisão
das previsões meteorológicas para o horizonte desejado, de uma ampla base de dados conten-
do curvas de carga diária observadas, associadas aos correspondentes dados meteorológicos
e de ferramentas analíticas computacionais capazes de processar um volume considerável de
dados que, nos próximos anos, será um modelo de Big Data. Atualmente, o ONS possui algu-
mas bases de dados relacional contendo dados de cargas relativas ao SIN, subsistemas e áreas
de operação, além de dados de temperaturas observadas e previstas em diversas localidades
do país.
No ONS, o processo responsável pelas previsões de curto prazo é chamado de Consoli-
dação da Previsão de Carga para a Programação Diária e se subdivide em: recebimento das
previsões de carga dos agentes para as suas respectivas áreas de concessão, validação dos
dados recebidos, geração de cenários de carga através de modelos de previsão de curto prazo
considerando principalmente cenários meteorológicos, análise e tomada de decisão e envio
das previsões consolidadas para o processo da Programação. A etapa mais crítica é a tomada
de decisão, pois ela consiste na determinação de um único cenário de carga para cada área e
subsistema para o dia da operação, ou seja, consiste na escolha de um cenário mais provável
baseado nos dados e informações consideradas. O objetivo desse processo é reduzir os desvios
de previsão de carga nas áreas e subsistemas monitorados pelo operador a fim de garantir a
segurança eletroenergética do sistema e a modicidade tarifária.
232    Previsão de carga

O Submódulo 5.1 dos Procedimentos de Rede do ONS define os conceitos básicos relati-
vos ao processo da previsão de carga e estabelece a sistemática do fornecimento dessas pre-
visões para os estudos realizados no operador, que abrangem desde os estudos de ampliações
e reforços na rede básica até os que tratam do planejamento da operação elétrica e energética
em seus diversos horizontes. Especificamente, o Submódulo 5.4 define as responsabilidades
e estabelece a sistemática para o processo da Consolidação da Previsão da Carga Diária para
o atendimento às necessidades e prazos do Submódulo 8.1– Programação diária da operação
eletroenergética, e do Submódulo 6.5 – Programação de intervenções em instalações da Rede
de Operação. Como observação, esses procedimentos estão sendo revisados para atender os
novos requisitos da programação com o Preço Horário.
O tópico seguinte visa caracterizar as curvas de carga diária com base nos exemplos ob-
servados. Cabe destacar que análises, deduções e/ou inferências acerca de uma determinada
variável dependem exclusivamente da amostra de dados e, por isso, é fundamental que ela
contenha um volume considerável de dados observados, a fim de capturar a maior variedade
de características dos objetos contidos na amostra.

5.9 – Curvas de carga diária – exemplos

Exemplos de curvas de carga diária podem ser vistos nas Figuras 5.20 e 5.21, referentes
ao subsistema SE/CO. No gráfico, a escala vertical está em p.u. – por unidade da carga média
diária, a fim de evidenciar somente as formas das curvas. De antemão, percebe-se o comporta-
mento característico de cada tipo de dia: dia útil, sábado, domingo e feriado, dentro e fora do
horário de verão, além de um dia considerado especial devido à ocorrência de um jogo da se-
leção brasileira em copa do mundo (curva atípica). Nota-se também que a carga varia devido
à sazonalidade, pois no verão o valor máximo de consumo nos dias úteis tem ocorrido durante
as tardes devido ao uso intensivo de aparelhos de refrigeração, enquanto que no inverno e
nos dias mais frios do outono e primavera o maior valor de consumo ocorre no final da tarde
e início da noite. Essas formas de curvas expressam características do subsistema em ques-
tão, porém elas vêm sofrendo modificações ao longo dos anos devido a uma série de fatores,
principalmente econômicos. Portanto, cabe dizer que os impactos sistêmicos da mini e micro
geração também modificarão a forma da curva de carga diária, causando o efeito conhecido
como “curva do pato”,1 aumentando de forma substancial a incerteza associada à previsão de
carga de curto prazo.
Em relação aos feriados (figura 5.20), a curva de carga pode ser caracterizada, grosso
modo, como uma curva similar à de um final de semana, isto é, uma curva que varia entre uma
de sábado e domingo de um mesmo período sazonal. Para fins de inferência, as curvas de fe-
riados e dias pontes podem ser representadas, respectivamente, por meio de uma combinação

1  http://www.gesel.ie.ufrj.br/app/webroot/files/publications/46_tdse79.pdf ou https://en.wikipedia.org/wiki/
Duck_curve
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   233 

linear convexa2 entre curvas típicas de sábado e domingo, e entre curvas típicas de dia útil e
de sábado de um mesmo período sazonal. Entretanto, feriados como natal, ano novo e Carna-
val, bem como os dias que os antecedem e sucedem, apresentam curvas com características
distintas, cujo método de combinação não se aplica. Em relação aos dias especiais (figura
5.21), nota-se também a característica distinta e peculiar da curva de carga e, por isso, vem
sendo tratados com maior antecedência para fins de previsão. Cabe destacar que nesse tipo de
curva, a parte crítica para a operação do sistema elétrico são as variações excessivas de carga
que ocorrem num curto intervalo de tempo. No exemplo ilustrado a seguir, essas variações
ocorrem no início e no final dos jogos.

Figura 5.20 – Curvas de carga diária – dentro do horário de verão (Fonte: ONS)

2  A combinação linear convexa exige a seguinte restrição aos seus coeficientes: ai ≥ 0 e Sai = 1, ai Î Â
234    Previsão de carga

Figura 5.21 – Curvas de carga diária – fora do horário de verão (Fonte: ONS)

As curvas de cargas apresentadas nas Figuras acima, isto é, relativo ao exemplo dado,
apresentam um comportamento que pode ser considerado regular, típico ou padrão, entretan-
to, mudanças nas temperaturas e/ou no clima ao longo do dia devido à entrada de uma frente
fria podem afetar o consumo de carga repentinamente, e, por conseguinte, a forma da curva
de carga diária. Esse efeito pode se agravar em áreas ou regiões onde a participação de cargas
residenciais é majoritária, já que essa categoria é mais sensível às mudanças de temperatura
e/ou clima do que as cargas comerciais e industriais. Assim, mudanças abruptas nas curvas de
carga ocorrem devido à saída ou entrada de um grande volume de aparelhos de refrigeração.
A Figura 5.22 ilustra esse efeito observado numa curva de carga de um agente distribuidor da
Região Sudeste. Nota-se a mudança brusca na curva de carga do dia seguinte, quando a frente
fria se configurou com maior intensidade a partir do final da manhã reduzindo a temperatura e
provocando chuvas e, por conseguinte, induzindo um grande número de consumidores a des-
ligarem seus aparelhos de refrigeração. Daí, previsões de carga que contemplam tais efeitos
dependem exclusivamente de previsões meteorológicas precisas sobre a ocorrência de even-
tos dessa natureza para o dia da operação bem como de uma base de dados contendo curvas
observadas em dias similares.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   235 

Figura 5.22 – Curvas de carga diária – entrada de frente fria (Fonte: ONS)

Os efeitos provocados pelo horário de verão (HV) na curva de carga também são relevan-
tes para fins de previsão, já que a medida afeta os hábitos dos consumidores devido ao maior
aproveitamento da iluminação solar ao longo do dia. Na entrada do HV o horário é adiantado
em 1 (uma) hora provocando de antemão, respectivamente, avanços e atrasos na entrada de
algumas cargas, ou seja, alguns consumos de carga são antecipados durante a manhã devido à
falta de iluminação solar e outros são postergados devido à iluminação solar perdurar por mais
algum tempo durante algumas atividades humanas. Por exemplo, no final da tarde a entrada da
iluminação pública fica postergada, o consumo de energia devido ao uso de chuveiros elétri-
cos fica reduzido bem como o da iluminação residencial, dentre outros. O principal efeito do
HV, portanto, é a redução da demanda no horário da ponta noturna. Em termos de variação no
consumo de energia, cabe destacar que os efeitos do HV tem sido nulos. A Figura 5.23 ilustra
tal efeito, exibindo curvas típicas de carga diária do subsistema SE/CO relativas a um dia útil
dentro e fora do HV. Pela figura, fica evidente a redução na demanda em alguns horários no
final da tarde e da noite.
236    Previsão de carga

Figura 5.23 – Curvas de carga diária – fora HV x dentro HV (Fonte: ONS)

Por fim, pode-se afirmar que curvas de carga diária apresentam padrões diversos e que
variam de acordo com diversos fatores, exigindo do tomador de decisão conhecimentos es-
pecíficos acerca do comportamento da carga para a elaboração das previsões para o processo
da PDE. Além disso, as curvas exemplificadas acima referem-se às séries temporais de cargas
observadas num determinado subsistema e agente distribuidor, respectivamente. Outros sub-
sistemas, agentes distribuidores e consumidores livres apresentam cargas com características
próprias, diferentes do exemplo citado acima, já que o país ocupa um território extenso, com
diversidade no clima, no relevo, na economia, na cultura, nos hábitos dos consumidores etc.,
sendo necessário, portanto, conhecer cada uma dessas características especificamente.
O tópico seguinte visa definir séries temporais com base na teoria de Análise de Séries
Temporais. Esta teoria define conceitos, estatísticas, modelos e diagnósticos para a análise dos
dados dessa natureza.
Ademais, ela fornece algoritmos computacionais que reproduzem os modelos matemáti-
cos e/ou estatísticos com a finalidade de auxiliar na identificação e estimação dos fatos estili-
zados3 das séries temporais para fins de tomada de decisão.

3  Fato estilizado é uma aproximação teórica de um fenômeno observado empiricamente e ele pode ter maior
ou menor sucesso em prever o comportamento da variável estudada. O termo fato estilizado é usado nas ciências
sociais, principalmente na Economia. Em séries temporais, os fatos estilizados são: tendência, sazonalidade, ciclo,
heterocedasticidade, outliers, quebras estruturais etc.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   237 

5.10 – Séries temporais de carga diária – aspectos teóricos

Uma série temporal é um conjunto de observações de uma dada variável, ordenadas se-
gundo o parâmetro tempo, geralmente em intervalos equidistantes (Souza e Camargo, Ref.
[1]). Se Yt representa o valor da variável aleatória Y no instante t, denota-se a série temporal
por Y1, Y2,...,Yn onde n é o tamanho da série. Séries temporais podem ser classificadas em
discretas (quando o conjunto de observações for finito ou infinito enumerável), contínuas
(quando o conjunto for infinito não enumerável), determinísticas (quando os valores futuros
da série são expressos por meio de uma equação matemática), estocásticas (quando os valores
futuros da séries são expressos em termos probabilísticos), multivariadas (se cada observação
da série é representada por um vetor de ordem r´1, e.g. para r = 3, Yt = [Y1t, Y2t, Y3t]) e mul-
tidimensionais (se o parâmetro t de Yt é um vetor de ordem p´1, e.g. para p = 3, t = [tempo,
latitude, longitude]).
Características relevantes das séries temporais são: a) dependência entre observações vi-
zinhas, isto é, valores passados da série contém informação para estimar valores futuros; b)
tendência, isto é, elementos de longo prazo relacionados com a série de tempo; c) ciclo e/
ou sazonalidade, isto é, ondas mais ou menos regulares, em torno da linha de tendência; d)
termo aleatório ou resíduo, isto é, demais efeitos que não foram incorporados pela série via
os componentes anteriormente citados. Daí o interesse em identificar, analisar e modelar tais
características.
Exemplos de séries temporais de cargas podem ser vistos nas Figuras 5.24 e 5.25, cujas
séries referem-se às cargas observadas no subsistema SE/CO nos períodos 18/2/18 a 4/3/18 e
1/1/13 a 18/2/17, em intervalos de meia hora e diário, respectivamente, cujos valores estão em
MWmédio (no ONS o menor intervalo das séries temporais de carga é minuto a minuto). De
antemão, destacam-se: na Figura 5.24, o comportamento cíclico semanal da série e a magni-
tude das cargas que varia principalmente com as temperaturas; e na Figura 5.25, o comporta-
mento sazonal da carga haja vista que no verão ela é mais alta devido às altas temperaturas e
vice-versa no inverno.
238    Previsão de carga

Figura 5.24 – Série temporal – carga diária meia hora (Fonte: ONS)

Os modelos utilizados para descrever séries temporais são processos estocásticos, isto é,
sistemas que evoluem no tempo e/ou espaço de acordo com leis probabilísticas (Morettin e
Toloi, Ref.[2]). Um processo estocástico pode ser pensado como um conjunto de trajetórias
que poderiam ter sido observadas ou como um conjunto de variáveis aleatórias, uma para
cada tempo t. Assim, dado T um conjunto arbitrário, um processo estocástico é uma família
Y = {Yt, tÎT}, tal que, para cada tÎT, Yt t é uma variável aleatória (v.a.). Se T é tomado
como o conjunto dos inteiros Z = {0,±1,±2,...} e, para cada tÎT, YtÎÂ, , então o processo é
de parâmetro discreto, porém se T º Â, então o processo é de parâmetro contínuo.

Figura 5.25 – Série temporal – carga média diária (Fonte: ONS)


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   239 

A estrutura probabilística de um processo estocástico pode ser descrita através do conjun-


to de distribuições de todas as coleções finitas dos Y´s observados, isto é, a distribuição de
probabilidade conjunta de Yt1,...,Ytk para qualquer conjunto de tempos t1,...,tk e qualquer valor
de k. Porém, como é difícil determinar explicitamente tal distribuição, na prática costuma-se
descrever um processo estocástico através das funções de média, variância e autocovariância,
cf. definidas nas equações abaixo4. Note que a função de variância é um caso especial da fun-
ção de autocovariância quando t1 = t2. Cabe destacar que, se a distribuição conjunta dos Y´s
é uma Normal Multivariada, o primeiro e o segundo momento (vetor de médias e matriz de
variâncias e covariâncias) são suficientes para determinar toda a distribuição.

µ! = 𝔼𝔼 Y! → Média (5.1)

σ"! = Var Y! = 𝔼𝔼 Y! − µ! " → Variância (5.2)

γ!! ,!" = 𝔼𝔼 Y!! − µ!! Y!" − µ!" → Autocovariância (5.3)

Uma importante classe de processos estocásticos são os chamados processos estacionários


ou processos invariantes no tempo – quando a série se desenvolve no tempo aleatoriamente
ao redor de uma média constante, refletindo alguma forma de equilíbrio estável. Na prática,
a maioria das séries que encontramos apresentam algum tipo de não estacionariedade, por
exemplo, tendência. Logo, um processo estacionário tem a propriedade de que a média, a va-
riância e a estrutura de autocorrelação (autocovariância padronizada) não mudam no decorrer
do tempo, de forma que as equações (5.1), (5.2) e (5.3) tornam-se:

𝔼𝔼 Y! = 𝔼𝔼 Y!"# = µ, ∀t (5.4)

𝔼𝔼 Y! − µ! " = σ" < ∞, ∀t (5.5)

Cov Y!, Y!"# = Cov Y!"$, Y!"#"$ , ∀m (5.6)

Uma série temporal é dita estritamente estacionária se a distribuição de probabilidade


conjunta de Yt1,...,Ytk é a mesma de Yt1+t,...,Ytk+t, ou seja, o deslocamento da origem dos tempos

4  Os símbolos , Var e Cov significam, respectivamente: Esperança Matemática (ou Valor Esperado), Variância e
Covariância.
240    Previsão de carga

por uma quantidade t não tem efeito na distribuição conjunta, dependendo apenas dos inter-
valos entre t1,...,tk.
A Figura 5.26 exibe as funções de Autocorrelação e Autocorrelação Parcial,5 respectiva-
mente para as séries temporais de carga média diária e horária do exemplo acima. Na Figura
5.26, (a) e (b) as defasagens (lags) 1 e 7 apresentam as maiores autocorrelações, indicando que
os termos da série de carga média diária têm forte dependência (relação) com o dia anterior e
com o mesmo dia da semana anterior (efeito cíclico semanal). Já em (c) e (d) os lags 1 e 24
apresentam as maiores autocorrelações, indicando que os termos da série de carga horária têm
forte dependência com a hora anterior e com a mesma hora do dia anterior (efeito cíclico di-
ário). Mais detalhes sobre os conceitos acima podem ser obtidos nas Referências de [1] a [5].

Figura 5.26 – Função Autocorrelação e Autocorrelação Parcial – carga média diária e horária (Fonte: Forecast Pro)

5.11 – Séries temporais de carga diária – aplicação de modelos

Um modelo tem por principal finalidade reproduzir o mecanismo gerador da série tem-
poral, ou seja, o processo estocástico que gerou a amostra de dados observados. Ademais,
um modelo destaca as características mais relevantes do processo através dos seus compo-
nentes, sendo por isso utilizado para explicar o efeito desses componentes na variável anali-
sada ou prever valores futuros da série temporal. Neste tópico destacaremos alguns modelos

5  A autocorrelação parcial no lag k é a autocorrelação entre Yt e Yt-k eliminando a dependência produzida pelos
lags intermediários (t-1 até t-k+1). As autocorrelações parciais são úteis na identificação da ordem de um modelo
autoregressivo.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   241 

paramétricos para séries temporais, cuja análise é feita no domínio do tempo. Alguns dos
modelos frequentemente usados são: modelos de amortecimento exponencial (decomposição
em componentes não observadas), modelos autorregressivos e de médias móveis (ARMA,
ARIMA, SARIMA), modelos de regressão dinâmica e os modelos não lineares de redes neurais.
Outros modelos normalmente utilizados em análise e previsão de séries temporais podem ser
vistos nas Referências de [6] a [10], dentre eles: modelos estruturais, bayesianos, Fuzzy e
funcionais.

5.11.1 – Modelos de amortecimento exponencial


Os modelos de amortecimento exponencial foram introduzidos originalmente por Brown
(1959, 1963), Holt (1957) e Winters (1960). Esses modelos supõe que o nível médio das ob-
servações pode ser descrito, a cada instante, por uma função conhecida do tempo, sendo que
para séries não sazonais a função normalmente adotada é do tipo polinomial e para as séries
sazonais, tal informação deve ser incluída no nível médio da série de duas formas: aditiva ou
multiplicativa (Montgomery et al, Ref.[1]). A equação 5.7 exibe uma das formulações desse
tipo de modelo, contudo, para uma visão mais geral, consulte as Referências [11] e [12].

Y! = # a"#$ t " . ρ! + e! , (5.7)


"

A função polinomial da equação acima em geral descreve componentes não observadas,


tais como: nível e tendência, além da sazonalidade que, neste caso, é multiplicativa e a com-
ponente irregular que é aditiva. Como exemplo, segue a equação 5.8 que representa o modelo
multiplicativo de Winters. Neste modelo, a série observada Yt está representada por meio de
três componentes (nível, tendência e sazonalidade), além da irregular et (que representa a parte
não explicada pelas componentes anteriores).

"! m = S! + mT! I)! m + e!


Y (5.8)

As respectivas componentes são obtidas conforme as equações 5.9, 5.10 e 5.11, sendo as
constantes a, g e d denominadas hiperparâmetros; p é o período sazonal. Os hiperparâmetros
são estimados com base nos dados e eles têm a finalidade de dar relevância (ou ponderar) à in-
formação mais recente em detrimento da componente anteriormente estimada, ou vice-versa.
O método de estimação dos hiperparâmetros é conhecido como amortecimento ou alisamento
exponencial porque os fatores de ponderação decrescem exponencialmente com os termos da
equação (se escrita na forma recursiva).
Y
S! =∝ !&I + 1 −∝ S!"$ + T!"$ (5.9)
!"#
242    Previsão de carga

T! = γ S! − S!"# + 1 − γ T!"# (5.10)

I! = δ Y!&S + 1 − δ I!"# (5.11)


!

Um exemplo desse modelo pode ser visto na Figura 5.27, cuja aplicação foi: previsão sete
dias à frente da carga média diária do Subsistema SE/CO. O modelo foi estimado através do
software Forecast Pro XE ® versão 6.0.1.3, licenciado para o ONS.

Figura 5.27 – Modelo de Winters – carga média diária Subm SE/CO (Fonte: Forecast Pro)
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   243 

O gráfico da Figura 5.27 exibe os valores observados da série, valores ajustados pelo
modelo e as previsões 7-dias à frente envolta pelo respectivo intervalo de confiança, estimado
com 95% de probabilidade. A tabela exibe os componentes estimados de nível, tendência e
sazonalidade; os hiperparâmetros (a, g e d) encontram-se sob o título “Peso da Suavização”
e os respectivos valores estimados para o último período da série encontram-se sob o título
“Valor Final”. Os índices ou fatores sazonais (no caso, o período é semanal) seguem sob o
título “Índices Sazonais”. Além disso, algumas estatísticas de ajuste do modelo são apresen-
tadas, com destaque para: MAPE in-sample (Mean Absolute Percentual Error), RMSE (Root
Mean Square Error) e o Ljung-Box (autocorrelação do erro). O objetivo dessas estatísticas é
apresentar um diagnóstico sobre a aplicação desse modelo na série temporal em questão.
Sobre os resultados, o MAPE informa que o modelo apresentou um erro médio absoluto per-
centual in-sample (dentro da amostra) de 2,23%, que pelo RMSE equivale a ±1.267 MWmédio,
isto é, o erro entre os valores ajustados pelo modelo e os valores observados da série temporal.
Cabe observar que a estatística “MAPE out-of-sample” (fora da amostra) seria mais apropriada
para um diagnóstico do modelo, pois trata de aferir o modelo num contexto real de previsão.
Quanto à estatística Ljung-Box, ela indica a existência de autocorrelação nos erros in-sample,
isto é, se existe dependência temporal na estrutura de erros do modelo. Se existe, então cabe
ao analista apurar tal estrutura e a sua magnitude para fins de aperfeiçoamento do modelo ou
substituição do mesmo. A Figura 5.28 ilustra esse resultado e, apesar da estatística Ljung-Box
apresentar um valor significante (p-value6 = 1,00), indicando a presença de autocorrelação nos
erros, a Figura mostra que essa estrutura parece ser de natureza “espúria” ou “fraca”.
Por fim, esse modelo tem seu uso limitado para horizontes de previsão de curto prazo, ou
seja, poucos passos à frente. Logo, ele acaba sendo útil na previsão da carga diária. Sobre as
demais estatísticas do diagnóstico, consulte as Referências de [1] a [5].

Figura 5.28 – Modelo de Winters – autocorrelação dos erros (Fonte: Forecast Pro)

6  Na estatística clássica, o p-valor, também chamado de nível descritivo ou probabilidade de significância, é


a probabilidade de se obter uma estatística de teste igual ou mais extrema que aquela observada em uma amostra,
sob a hipótese nula.
244    Previsão de carga

5.11.2 – Modelos autorregressivos, integrados e de médias móveis


Os modelos autorregressivos e de médias móveis, também conhecidos como ARIMA,
foram originalmente propostos por Box & Jenkins (Ref. [2]) e representam uma classe de mo-
delos. Tendo como base a teoria geral de sistemas lineares, esta metodologia supõe que uma
série temporal é o resultado da passagem de um processo aleatório ou ruído branco7 por um
filtro ou sistema linear, conforme ilustra a Figura 5.29.

Figura 5.29 – Geração de uma série temporal (Fonte: ONS)

O objetivo do analista é justamente determinar o filtro ou sistema inverso capaz de gerar


um ruído branco a partir da série temporal em estudo (figura 5.30). Se esse objetivo for alcan-
çado, ou seja, se for determinado um filtro linear que produza um ruído branco como resposta
à série temporal de interesse, toda a estrutura de dependência temporal contida na série terá
sido capturada pelo filtro e este fornecerá previsões com erro médio quadrático mínimo. Essa
metodologia assume que a série temporal de interesse foi gerada por um processo estocástico
estacionário na média e na variância.

Figura 5.30 – Filtro linear como um modelo para a série temporal (Fonte: ONS)

5.11.3 – Modelos Autorregressivos (AR)


O modelo Autorregressivo (AR) de ordem p é descrito pela equação 5.12:

I! = δ Y!&S + 1 − δ I!"# (5.12)


!

7  O processo estocástico mais simples é o chamado ruído branco ou puramente aleatório, composto por uma
sequência de variáveis aleatórias independentes com média nula e variância constante.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   245 

onde m é uma constante, os termos fi são coeficientes reais do modelo autorregressivo e


et é um ruído branco. Definindo-se o operador de retardo B, tal que: BkYt = Yt-k, o modelo pode
ser reescrito tal como a equação 5.13:

1 − ϕ! B − ⋯ − ϕ" B " Y# = µ + e# (5.13)

O polinômio F(B) = (1 - f1B - … - fpBp) chamado de operador autorregressivo e o mo-


delo pode ser resumido, assumindo a forma da equação 5.14:

ϕ(B)Y! = µ + e! (5.14)

5.11.4 – Modelos de Médias Móveis (MA)

O Mmodelo Médias Móveis (MA) de ordem q é descrito pela equação 5.15:

Y! = µ + e! + θ" e!#" + ⋯ + θ$e!#$ + (5.15)

onde μ é uma constante, os termos θi são coeficientes reais do modelo médias móveis e et
é um ruído branco. Do mesmo modo que no modelo auto regressivo, definindo-se o operador
de retardo B, tal que: Bket = et-k, o modelo pode ser reescrito tal como a equação 5.16:

Y! = µ + e! 1 − θ" B − ⋯ − θ#B # (5.16)

O polinômio q(B) = (1 - q1B - … - qqBq) é chamado de operador Médias Móveis e o mo-


delo pode ser resumido, assumindo a forma da equação 5.17:

Y! = µ + θ(B)e! (5.17)

5.11.5 – Modelos autorregressivos e de médias móveis (ARMA)

O modelo ARMA(p,q) possui os termos AR(p) e MA(q) simultaneamente, e é descrito


pela equação 5.18:

Y! = µ + ϕ" Y!#" + ⋯ + ϕ$ Y!#$ + θ" e!#" + ⋯ + θ%e!#% + e! (5.18)


246    Previsão de carga

onde μ é uma constante, os termos fi eqi são, respectivamente, os coeficientes reais do mo-
delo autorregressivo e de médias móveis e et é um ruído branco. Tal como nos modelos anteriores,
dado os polinômios (operadores) F(B) = (1 - f1B - … - fpBp) e q(B) = (1 - q1B - … - qqBq)
e os operadores de retardo B, tal que: BkYt = Yt-k e Bket = et-k, então o modelo ARMA pode ser
descrito de forma reduzida tal como a equação 5.19:

ϕ(B)Y! = µ + θ(B)e! (5.19)

5.11.6 – Modelos autor regressivos e de médias móveis sazonal (SARIMA)


Os processos encontrados na prática, além de raramente serem estacionários, apresentam
muitas vezes componentes sazonais. Assim Box & Jenkins formularam seus modelos para
séries temporais não estacionárias e com componentes sazonais conforme a equação 5.20,
dando origem aos modelos SARIMA, cujo denominação é: SARIMA(p,d,q)x(P,D,Q).

ϕ(B)Φ(B !)∇" # !
! ∇ Y$ = µ + θ(B)Θ(B )e$ (5.20)

Onde:
ϕ(B): operador não sazonal auto regressivo.
ϕi: parâmetros autorregressivos não sazonais.
∆d
= (1 –B)d: operador diferença não sazonal de ordem d.
Φ(Bs):operador sazonal autorregressivo.
Φi: parâmetros autorregressivo sazonais.

Ds = (1 –Bs)D: operador diferença sazonal de ordem D.
θ(B): operador não sazonal de médias móveis.
θi: parâmetros de médias móveis não sazonais.
Θ(Bs): operador sazonal de médias móveis.
Θi: parâmetros de médias móveis sazonais.

Um exemplo desse modelo pode ser visto na Figura 5.31, cuja aplicação foi: previsão
7-dias à frente da carga média diária do Subsistema SE/CO, a mesma do caso anterior. O
modelo também foi estimado através do software Forecast Pro XE ® versão 6.0.1.3, cujos re-
sultados serão comparados com o do modelo anterior.
O gráfico da Figura 5.31 exibe os valores observados da série, valores ajustados pelo
modelo e as previsões 7-dias à frente envolta pelo respectivo intervalo de confiança, estima-
do com 95% de probabilidade. A tabela exibe a estrutura do modelo estimado, no caso um
SARIMA (2,1,1)x(1,1,2), e os respectivos coeficientes estimados. No entanto, os parâmetros
vêm acompanhados de um teste estatístico (teste-t) para avaliar a significância dos mesmos,
ou seja, se o coeficiente é estatisticamente diferente de zero (válidos). No caso do exemplo,
todos os parâmetros são válidos.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   247 

Sobre as estatísticas de ajuste do modelo, o MAPE informa que o modelo apresentou um


erro médio absoluto percentual in-sample de 2,09% e que pelo RMSE equivale a ±1.169 MW-
médio, ou seja, menor do que o obtido pelo modelo anterior. Quanto ao Ljung-Box, a estatís-
tica não indicou a existência de autocorrelação nos erros in-sample, assim como o gráfico de
autocorrelação dos erros (não mostrado aqui). Logo, comparando-se ambos os modelos, pode-
-se dizer que o modelo SARIMA apresentou melhores resultados do que o de Amortecimento
Exponencial, embora este modelo tenha 3 parâmetros a mais do que o anterior além de duas
diferenciações (para transformar a série temporal em estacionária). Além disso, a estatística
BIC (Bayesian Information Criterion), normalmente utilizada para comparar modelos (quanto
menor melhor), indica o modelo atual como o melhor. Por fim, cabe dizer que este modelo
também tem seu uso limitado para horizontes de previsão de curto prazo, tornando-se útil na
previsão da carga diária.

Figura 5.31 – Modelo SARIMA – Carga média diária Subm SE/CO (Fonte: Forecast Pro)
248    Previsão de carga

5.11.7 – Modelos com variáveis exógenas (regressão dinâmica)


Os modelos de regressão dinâmica combinam a dinâmica de séries temporais e o efeito de
variáveis explicativas. Atenta-se que o termo “regressão dinâmica” não indica que os parâme-
tros do modelo evoluem no tempo, ao invés disso, a palavra “dinâmica” significa um modelo
de regressão no qual se inclui a estrutura de dependência de uma série temporal. Modelos de
regressão dinâmica devem ser usados quando existe uma estrutura de dependência entre a
variável de interesse e possíveis variáveis causais e, ao mesmo tempo, quando a estrutura de
correlação da série dependente indicar que não se pode supor a independência dos erros.
Nos modelos de regressão dinâmica, a variável dependente é explicada por seus valores defa-
sados e pelos valores atuais e passados de variáveis causais ou exógenas. Os modelos de regres-
são dinâmica são definidos conforme as equações 5.21 e 5.22 (modelo de Cochrane & Orcutt):

ϕ(B)Y! = βX ! + e! (5.21)

ϕ B Y! = βX ! + W!
P(B)W!= e! (5.22)

Onde:
Yt = variável dependente (endógena) no instante t;
β = vetor de coeficientes das variáveis causais, que vai ser estimado por mínimos quadrados;
Xt = vetor de variáveis causais (exógenas) no instante t;
εt = ruído aleatório associado ao modelo, onde supomos que os et ~ NID(0,s2);
Wt = ruído associado ao modelo geral, porém com uma estrutura autorregressiva (AR);
ϕ(B) = polinômio autorregressivo de ordem p;
P(B) = polinômio autorregressivo de ordem p1.

A estrutura do modelo de regressão dinâmica permite considerar como elementos de Xt


variáveis causais e também suas defasagens. A presença do polinômio ϕ(B) no modelo traz
uma grande flexibilidade, mas, ao mesmo tempo, dificulta a procura por um modelo adequa-
do. Observa-se que, se ϕ(B) = 1, não existem defasagens da variável dependente, e a interpre-
tação do modelo é muito simples, pois as variáveis causais influenciam diretamente a variável
endógena. Ao contrário, quando ϕ(B) ≠ 1, o modelo pode ser usado para representar relações
bastante complicadas. O modelo de regressão dinâmica geral pode ser considerado um caso
particular do modelo de Cochrane & Orcutt.
O processo de modelagem da regressão dinâmica requer uma estratégia, que pode ser vi-
sualizada na Figura 5.32. Essa estratégia é denominada bottom-up, pois parte de um modelo
mais simples até chegar num modelo mais elaborado. Assim, partindo de um modelo inicial,
os testes estatísticos para os parâmetros indicam se eles devem ou não ser excluídos no mode-
lo e o diagnóstico indica se o modelo deve ou não ser incrementado, seja por variáveis exóge-
nas (defasadas ou não) ou pela variável endógena defasada. O processo é finalizado quando os
diagnósticos e as estatísticas de desempenho indicam que o modelo está satisfatório.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   249 

Um exemplo desse modelo pode ser visto na Figura 5.33, cuja aplicação foi: previsão
7-dias à frente da carga média diária do Subsistema SE/CO, a mesma do caso anterior. O
modelo também foi estimado através do software Forecast Pro XE® versão 6.0.1.3, cujos
resultados serão comparados com os anteriores.

Figura 5.32 – Processo de modelagem da regressão dinâmica

A Figura 5.33 exibe os valores observados da série, valores ajustados pelo modelo e as
previsões 7-dias à frente envolta pelo respectivo intervalo de confiança, estimado com 95%
de probabilidade. A tabela exibe a estrutura do modelo e os respectivos coeficientes estima-
dos. Os parâmetros também vêm acompanhados de um teste estatístico (teste-t) para avaliar a
significância deles. No caso do exemplo, todos os parâmetros são válidos. O modelo estimado
segue a equação 5.23 abaixo, ou seja, a Carga no instante t, depende de uma constante, da
variável dummy no instante t indicando se o dia é feriado ou não (0 = não, 1 = sim), da tempe-
ratura média diária no instante t, das cargas verificadas nos instantes t-1 e t-14, além dos erros
cometidos pelo modelo nos instantes t-7 e t-14. Cabe destacar que as variáveis exógenas dos
modelos são: temperatura e feriado, portanto, para fins de previsão, ambas devem ser dadas
ou previstas antecipadamente.

Y! = β" + β# Fer! + β$ Fer!%# + β& TM! + β' Y!%# + β( Y!%#' + β) e!%* + β) e!%#' + e! (5.23)

Sobre as estatísticas de ajuste do modelo, o MAPE informa que o modelo apresentou


um erro médio absoluto percentual in-sample de 1,69% e que pelo RMSE equivale a ±878
MWmédio, ou seja, menor do que o obtido pelos modelos anteriores. Todavia, a estatística
Ljung-Box indicou a existência de autocorrelação nos erros in-sample, assim como o gráfico
de autocorrelação dos erros (não mostrado aqui), ou seja, sugerindo que o modelo pode ser
aperfeiçoado. Deste modo, comparando-se este modelo com o SARIMA, pode-se dizer que a
Regressão Dinâmica apresentou melhores resultados devido, principalmente, à presença das
variáveis exógenas, pois a carga diária varia de acordo com as temperaturas e que os feriados
e os dias pontes reduzem a carga e, por isso, devem ser tratados separadamente (por uma
variável dummy). Por fim, cabe dizer que esse modelo também tem seu uso limitado para ho-
rizontes de previsão de curto prazo, tornando-se útil na previsão da carga diária.
250    Previsão de carga

Figura 5.33 – Modelo regressão dinâmica – carga média diária Subm SE/CO (Fonte: Forecast Pro)

5.11.8 – Modelos não-lineares de redes neurais

Redes neurais artificiais são  modelos  matemáticos inspirados no cérebro humano cuja
principal finalidade é o aprendizado de máquina e o reconhecimento de padrões.8 Essas redes
geralmente são representadas como neurônios interconectados que computam valores de en-
tradas e produzem saídas desejadas. A aprendizagem ocorre quando a rede neural atinge uma
solução generalizada para uma classe de problemas. Isso é feito através de um processo inte-
rativo de ajustes aplicado aos seus parâmetros (também chamados pesos ou sinapses).

8  O aprendizado de máquina refere-se ao processo pelo qual os modelos desenvolvem a capacidade de aprender
continuamente com os dados, podendo fazer ajustes e previsões sem serem especificamente programados para isso,
permitindo que os modelos se adaptem a novos cenários de forma independente.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   251 

O processo de aprendizagem é um conjunto de regras bem definidas para a solução de um


determinado problema – como um algoritmo. Outro fator importante é a maneira pela qual
uma rede neural se relaciona com o ambiente. Nesse contexto, existem os seguintes paradig-
mas de aprendizagem: Supervisionada, quando é utilizado um agente externo que indica à
rede as respostas desejadas para cada padrão de entrada; Não supervisionada ou Auto-organi-
zação, quando não existe tal agente externo indicando as respostas para os padrões de entrada;
e, Por Reforço, quando um crítico externo avalia a resposta fornecida pela rede.
Um modelo de neurônio artificial pode ser visto nas Figuras 5.34 e 5.35, representado
através da equação 24 e pelas respectivas funções de ativação. De acordo com o modelo, o
somatório dos sinais de entrada, ponderadas pelos respectivos pesos sinápticos, é aplicado na
entrada da função de ativação do neurônio afim de gerar um valor de saída. Dependendo do
tipo de função, o neurônio pode produzir uma saída linear, não linear ou apenas um valor fixo
(quando o valor de entrada da função atingir um valor limiar b).
Modelos mais complexos normalmente são representados por camadas de neurônios in-
terconectados, numa arquitetura definida por: camada de entrada, camada escondida e camada
de saída; sendo que a camada escondida pode ser única ou não. Esse tipo de rede neural é co-
nhecido como MLP (Multi-layer Perceptron) e o método comumente utilizado na estimação
dos pesos é o chamado backpropagation ou retropropagação dos erros. Esse tipo de arquite-
tura pode ser aplicado em diversos tipos de problemas, dentre eles, aproximação de função,
onde normalmente apenas uma camada escondida é suficiente, variando-se somente o número
de neurônios nesta camada. Outras arquiteturas de redes neurais são mais eficazes em determi-
nadas tarefas, por exemplo, em classificação e reconhecimento de padrões as redes neurais de
Kohonen são normalmente aplicadas ao invés das MLP. Para mais detalhes, a Ref. [13] aborda
o tema Redes Neurais de forma ampla.

Figura 5.34 – Modelo de neurônio artificial (Fonte: ONS)


252    Previsão de carga

y! = φ u! + θ! = φ ( w!" x# + b! + θ! , ∀p, m (5.24)


!

Figura 5.35 – Funções de ativação (Fonte: ONS)

No que tange ao processo da consolidação da carga diária, o ONS utiliza o modelo de re-
des neurais desenvolvido pelo EPRI (Electric Power Research Institute) chamado ANNSTLF
(Artificial neural-network short-term load forecaster). Este modelo está encapsulado em um
software licenciado para o ONS e vem sendo utilizado para realizar previsões de carga diária
para os subsistemas Sudoeste, Centro-Oeste, Sul, Nordeste e Norte. A arquitetura desta rede
está dividida em 3 (três) módulos, conforme ilustra a Figura 5.36: Rede C(D)LF (Change or
Delta Load Forecaster), responsável pelo aprendizado e previsão das variações diárias da
carga hora a hora; Rede B(R)LF (Base or Regular Load Forecaster), responsável pelo apren-
dizado e previsão do perfil diário da carga; além do módulo RLS (Recursive Least Squares),
responsável pela combinação linear das saídas das redes C(D)LF e B(R)LF e pelo resultado
final do modelo. Além dos dados de carga horária, o modelo também leva em consideração as
temperaturas verificadas e previstas hora a hora, além do tipo de dia da semana. O aprendiza-
do da rede é do tipo supervisionado, ou seja, para cada entrada é fornecida a saída desejada
para o ajuste dos parâmetros.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   253 

A Figura 5.37 exibe a imagem do ANNSTLF, onde se nota, por exemplo, os dados de
entrada de carga que foram fornecidos pelo operador até às 8hs do dia 3/4/17 e as previsões
horárias subsequentes 9-dias à frente. Detalhes deste modelo estão descritos na Ref. [14]. Es-
sas curvas de cargas previstas são utilizadas no processo da consolidação como referências.
Além do ANNSTLF o ONS também conta com outros modelos de previsão de carga de curto
prazo para fins de referência, formando, portanto, um ensamble de modelos.

Figura 5.36 – Arquitetura da rede neural EPRI-ANNSTLF (Fonte: EPRI)

Figura 5.37 – Software EPRI-ANNSTLF (Fonte: EPRI)


254    Previsão de carga

O tópico seguinte trata do processo da consolidação da carga diária. Este é um processo


decisório que considera sistemas, modelos, planilhas, ferramentas de análise de dados, inter-
venção/decisão do analista responsável e todos os dados e informações tratados neste proces-
so ficam registradas para fins avaliação e auditoria.

5.12 – O processo da consolidação da carga diária

O processo da consolidação da carga diária vem sendo efetuado para os subsistemas Su-
doeste, Centro-Oeste, Sul, Nordeste, Norte e áreas de controle. Esse processo utiliza sistemas
computacionais para a obtenção dos dados de cargas e temperaturas verificadas e previstas,
planilhas eletrônicas para a manipulação dos dados, ferramentas estatísticas para análises e
um ensamble de modelos de previsão de carga de curto prazo para gerar cenários de carga.
A leitura/gravação dos dados é feita de forma automática através dos sistemas corporativos,
porém os modelos de previsão de carga são executados a comando do usuário. Durante o
processo decisório, o analista responsável pela consolidação poderá intervir nos resultados,
reprocessando rotinas e/ou modificando valores em razão de informações meteorológicas adi-
cionais de cunho qualitativo e quantitativo. Outra informação relevante são as cargas verifica-
das nas áreas e subsistemas monitoradas on-line pela operação em tempo real.
A Figura 5.38 exibe uma visão do processo da consolidação da carga diária. De acordo
com o fluxograma, o ONS recebe diariamente dados previstos pelos agentes para as respec-
tivas áreas de concessão em intervalos de meia hora, além das temperaturas verificadas e
previstas em intervalos horários, sendo que as verificadas são provenientes de estações meteo-
rológicas instaladas nos principais aeroportos das capitais brasileiras e as previstas são prove-
nientes dos modelos do CPTEC/INPE, no horizonte de previsão de 15-dias à frente, por áreas
reticuladas para todo o território brasileiro. As temperaturas verificadas e previstas precisam
ser compatibilizadas, isto é, as temperaturas previstas para os aeroportos referem-se à área
reticulada na qual o aeroporto se insere. Logo, se dois ou mais aeroportos estiverem dentro
de uma mesma área reticulada, esses terão o mesmo valor previsto, embora tenham valores
verificados diferentes. Pelo fato dos modelos de previsão utilizados pelo ONS considerarem
a temperatura de vários aeroportos para um subsistema, área de controle e até mesmo para
agentes, houve a necessidade de se representar a temperatura dos mesmos. Assim, foi definido
no ONS o conceito de “Temperatura Equivalente”, que representa a temperatura de um subsis-
tema, área de controle ou agente. Essa temperatura é definida como a combinação linear das
temperaturas verificadas nos aeroportos que estão contidos na respectiva área e os pesos da
combinação são aqueles que maximizam a correlação linear ou, opcionalmente, a informação
mútua, entre a carga verificada na área e as temperaturas verificadas nos aeroportos contidos
nela. As correspondentes “Temperaturas Equivalentes Previstas” são obtidas aplicando-se os
mesmos pesos estimados.
Os dados de cargas verificadas originais são provenientes das bases de dados da opera-
ção do ONS e todos os valores obtidos de cargas e temperaturas são armazenados numa base
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   255 

de dados de simulação, após sofrerem tratamento de missings e outliers (dados faltantes e


aberrantes).

Figura 5.38 – Visão do processo decisório da consolidação da carga diária (Fonte: ONS)

O processo da consolidação da carga diária, portanto, consiste na validação das previsões


de cargas enviadas pelos agentes distribuidores e consumidores livres para o dia da operação,
cujos objetivos são: (a) verificar e corrigir eventuais outliers causados por erros de digitação;
e (b) reduzir os desvios de previsão de carga nas áreas e subsistemas atendendo aos requisi-
tos de qualidade, segurança e modicidade tarifária, definidos pelo ONS. A gerência do ONS
responsável por esta tarefa é a Gerência de Previsão e Acompanhamento da Carga (PEC),
subordinada à Gerência Executiva de Planejamento Energético (PE), da Diretoria de Planeja-
mento (DPL). Conforme dito acima, as normas que regem o processo da consolidação estão
registradas nos Procedimentos de Rede 5.4, que são os documentos de caráter normativo
elaborado pelo ONS, com participação dos agentes, e aprovados pela ANEEL, que definem
os procedimentos e os requisitos necessários à realização das atividades de planejamento da
operação eletroenergética, administração da transmissão, programação e operação em tempo
real no âmbito do SIN.
Os agentes informam suas previsões de carga com os demais dados pertinentes à PDE
através de um sistema Web, cujos dados são geração por usina (hidroelétrica e termoelétrica),
intercâmbios, manutenções, restrições, inflexibilidades etc. Esses dados são gravados direta-
mente na base do sistema da programação para serem utilizados posteriormente pelas demais
rotinas do processo e também por outros aplicativos, em particular, o que dá acesso à PEC às
256    Previsão de carga

previsões de carga dos agentes. Esse aplicativo exibe em forma de planilha as previsões de
carga dos agentes agrupadas por subsistema, além de uma estimativa das perdas de demanda
de energia elétrica na Rede Básica (rede de transmissão definida e regulamentada pela ANE-
EL). Assim, a previsão de carga para cada subsistema será a soma dos valores previstos pelos
agentes acrescida das estimativas de perdas, e a previsão para o SIN será a soma total das pre-
visões para os subsistemas. O horizonte de previsão varia de 2 a 7-dias à frente, dependendo se
o dia da operação será dia útil, final de semana, ou ambos, precedido ou seguido de feriados.
A consolidação das previsões dos agentes é efetuada antes da consolidação dos subsis-
temas. O processo é feito comparando-se as previsões dos agentes com as dos modelos de-
senvolvidos pelo ONS. A tomada de decisão consiste em aceitar ou ajustar as previsões dos
agentes. Os ajustes, se necessários, são estimados em razão das diferenças encontradas entre
as previsões dos agentes e as dos modelos do ONS, podendo ser aplicado de forma percentual
em toda a curva de carga ou em valores de energia, hora a hora, a critério do analista respon-
sável. A transparência do processo é garantida com a manutenção dos desvios de previsão de
carga obtidos com as previsões dos agentes separados dos desvios cometidos pela PEC. A
Figura 5.39 ilustra um exemplo de planilha de consolidação da carga diária para o Subsistema
SE/CO e as Figuras 5.40a e 5.40b ilustram as previsões 5-dias à frente geradas pelo ensamble
de modelos desenvolvidos em linguagem R pelo ONS.
Na planilha, a primeira coluna representa o somatório das previsões dos agentes que com-
põe o subsistema, já consolidadas; outras colunas exibem curvas de cargas verificadas selecio-
nadas pelo analista para fins de referência – no caso, as referências são curvas de cargas veri-
ficadas do histórico cujas temperaturas verificadas naquele dia foram semelhantes às previstas
para o dia da operação; na sequência, há as colunas com previsões provenientes dos modelos
do ONS escolhidas pelo analista consolidador, do ANNSTLF e as perdas estimadas para o
subsistema, em termos percentuais e em valores em MW. As duas últimas colunas são, res-
pectivamente, a previsão consolidada (agentes consolidado + perdas) e a soma das previsões
dos modelos do ONS para os agentes que compõe o subsistema também escolhidas pelo ana-
lista consolidador. As previsões do ONS são escolhidas do ensamble de modelos, conforme
ilustram as Figuras 5.40a e 5.40b. Por fim, após análises, verificações, simulações e alterações
nas curvas de cargas dos agentes e do subsistema com base nas informações disponíveis, as
previsões consolidadas para os agentes e para as perdas no subsistema são gravadas automa-
ticamente no sistema da programação, finalizando, portanto, o processo da consolidação da
carga diária para o dia da operação.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   257 

Figura 5.39 – Planilha de consolidação da carga diária (Fonte: ONS)

Por fim, a consolidação da previsão da carga diária é fundamental para o processo da PDE,
principalmente quando os cenários de curto prazo apontam para mudanças bruscas nas variá-
veis exógenas que afetam diretamente o comportamento da carga no sistema. Outra situação
que vem exigindo maior atenção em relação à previsão da carga de curto prazo são os cená-
rios de altas temperaturas combinados com baixo volume de água nos reservatórios durante
períodos de crescimento econômico. Em ambos os casos o parque térmico gerador é acio-
nado com maior frequência, exigindo que as previsões de carga de curto prazo não desviem
consideravelmente dos valores observados, sob pena de tornar sem efeito o planejamento da
operação, além de prejudicar a operação do sistema em tempo real. Daí a necessidade cada
vez maior de insumos para a previsão de carga de curto prazo, sobretudo de variáveis climá-
ticas previstas com maior precisão. Avanços tecnológicos em termos computacionais também
são fundamentais para dar agilidade ao processo, a fim de permitir que um número maior de
dados e de modelos possam ser analisados e processados para reduzir os desvios de previsão.
Diante disso, pode-se dizer que os desafios do planejamento de curto prazo do ONS é o de
promover e sustentar redes de desenvolvimento tecnológico para a melhoria das atividades da
consolidação.
258    Previsão de carga

Figura 5.40a – Ensamble de modelos para a consolidação da carga diária (Fonte: ONS)

Figura 5.40b – Ensamble de modelos para a consolidação da carga diária (Fonte: ONS)
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   259 

REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

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Demanda de Eletricidade, maio/2019.
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tema Interligado Sul/Sudeste. Dissertação de mestradodo – PUC; 1996.
6
PREVISÃO E GERAÇÃO DE CENÁRIOS DE VAZÕES

O parque gerador de energia elétrica brasileiro, no âmbito do Sistema Interligado Nacional


(SIN), é predominantemente de base hidroelétrica. Mesmo com a crise hídrica, ocorrida a partir
de 2013 em diversas importantes bacias hidrográficas brasileiras, e com a crescente participação
de geração eólica, cerca de 70% do total de energia média produzida no período 2016/2018 foi de
origem hidroelétrica. Em razão dessa característica, é necessário um esforço constante na busca
de aprimoramentos da previsão e da geração de cenários de vazões naturais e de energias naturais
afluentes – ENAs – nos aproveitamentos hidroelétricos, para uso nos modelos de programação e
planejamento da operação eletroenergética do SIN.
Este capítulo aborda os principais dados hidrológicos necessários para a utilização dos mo-
delos de previsão de vazões, bem como uma descrição metodológica básica desses modelos.

6.1 – Dados hidrológicos

Os modelos de previsão/geração de cenários utilizam, como principal dado de entrada,


as vazões naturais afluentes a cada local de interesse. As vazões naturais podem ser obtidas a
partir de vazões observadas em estações fluviométricas e/ou de vazões afluentes calculadas a
partir de balanço hídrico do reservatório. No processo de reconstituição de vazões naturais são
ainda consideradas as estimativas de vazões de usos consuntivos na bacia hidrográfica e de
evaporação líquida da área do reservatório. Modelos desenvolvidos mais recentemente utili-
zam, em geral, dados meteorológicos como a chuva observada e prevista e a evapotranspiração.

6.1.1 – Vazão natural


Os cursos-d’água apresentam, em condições naturais, um regime fluvial com variações
típicas, associadas às características da bacia hidrográfica contribuinte e ao regime de chuva
nesta mesma bacia, com períodos de maior ou menor disponibilidade hídrica. As ações antró-
picas – ações do homem sobre o ambiente – que ocorrem em uma determinada bacia hidrográ-
fica afetam o regime fluvial de seus cursos-d’água. Entre essas ações, podem ser destacadas
como mais relevantes para o regime fluvial: os desmatamentos, a implantação e operação de
reservatórios, as transposições de vazões e as captações para usos consuntivos – conjunto de
atividades, como irrigação, criação de animais e abastecimentos urbano, rural e industrial, em
que o uso da água provoca uma diminuição dos recursos hídricos disponíveis.
Os desmatamentos, na maioria das bacias, afetam o comportamento das cheias, tornando
seus picos mais altos, principalmente quando a redução na cobertura vegetal é acompanhada
262    Previsão e geração de cenários de vazões

pela impermeabilização das superfícies, como é o caso de áreas urbanas. Seus efeitos sobre o
regime fluvial são mais importantes nas grandes cidades.
A implantação e operação de reservatórios e as transposições de vazões são as ações mais
facilmente identificadas e suas influências no regime fluvial em locais abaixo dos reservató-
rios, ou pontos de captação, podem ser determinadas pelo monitoramento nesses locais e pelo
registro de seus dados operacionais.
As captações de água para usos consuntivos são distribuídas em diversos locais nas bacias
hidrográficas e apresentam, portanto, uma dificuldade maior de identificação e de quantifica-
ção. Essas captações vêm sendo implantadas de forma gradativa, com impacto crescente nos
regimes fluviais.
A implantação de reservatórios integrados a usinas hidroelétricas modifica a distribuição
espacial e temporal das vazões. Os maiores reservatórios, em geral, acumulam água nos perí-
odos de maior disponibilidade e liberam o volume acumulado em períodos de menor disponi-
bilidade hídrica, o que provoca um efeito de regularização dos cursos-d’água onde estão im-
plantados, de forma a garantir, ao longo de um período, uma capacidade de geração necessária
para atender à demanda de energia elétrica do SIN. Assim, a vazão em determinado instante
em um ponto de controle de um curso-d’água, a jusante de um reservatório, normalmente,
não é mais aquela que ocorreria caso a bacia contribuinte permanecesse em suas condições
naturais.
Além da operação de acumulação e liberação de água, os reservatórios apresentam outras
alterações no regime natural, como as alterações na quantidade de água evaporada em razão
da implantação do reservatório. A área do reservatório, que anteriormente apresentava uma
perda de água por evaporação do solo e transpiração das plantas, passa a apresentar uma
evaporação de superfície líquida que, dependendo do tamanho do reservatório, das condições
climáticas regionais e da cobertura vegetal original, pode representar uma alteração significa-
tiva, positiva ou negativa.
O setor elétrico tem adotado o termo vazão natural para identificar a vazão que ocorreria
em uma seção do rio se não houvesse as ações antrópicas em sua bacia contribuinte, e o termo
vazão afluente para caracterizar a vazão que chega de fato a um aproveitamento hidroelétrico
ou estrutura hidráulica,sendo influenciada pelas obras de regularização e demais ações antró-
picas existentes na bacia hidrográfica.
A vazão afluente a um aproveitamento, normalmente, é calculada pelo balanço hídrico do
seu reservatório, que corresponde ao balanço das entradas e saídas de água no seu interior,
consideradas as variações efetivas de acumulação. A vazão natural em uma seção de um rio
cuja bacia contribuinte está sujeita ao efeito das ações antrópicas é obtida por meio de um pro-
cesso de reconstituição, que considera a vazão observada no local e as informações relativas
às ações antrópicas na bacia.
São facilmente perceptíveis as influências das ações antrópicas nas bacias mais densa-
mente ocupadas pelo homem, por meio da análise visual das vazões naturais e afluentes a um
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   263 

aproveitamento. Destacamos, como exemplo, na Figura 6.1, as vazões naturais e as vazões


afluentes ao aproveitamento de Jupiá, no rio Paraná, durante os anos 2017 e 2018. Observam-se,
de forma clara, as alterações no regime do rio. Durante o período chuvoso, existe uma redução da
vazão afluente em relação à natural, que corresponde, principalmente, aos volumes de água que
são acumulados nos reservatórios localizados a montante na bacia. Já no período de estiagem,
com o esvaziamento parcial dos reservatórios para geração de energia em atendimento à carga,
verifica-se um aumento das afluências em relação às condições naturais. Além disso, a operação
dos reservatórios promove uma oscilação nas vazões afluentes devido ao atendimento às neces-
sidades de geração para suprimento de energia, que seguem ciclos já estabelecidos, alternando
períodos com maior e menor consumo de energia ao longo do dia, semana, ano etc.

Figura 6.1 – UHE Jupiá (Rio Paraná) – Vazões naturais e afluentes em 2017 e 2018

A reconstituição das vazões naturais, elaborada diariamente pelo ONS, é essencial para
resgatar as características originais de magnitude e variabilidade dessas séries, o que possibi-
lita seu uso nos modelos de previsão e geração de cenários de vazões e de ENAs, bem como
em diversos outros estudos hidrológicos como o de controle de cheias.
Entre 2002 e 2010, sob a coordenação do ONS, e com participação da Agência Nacional
de Energia Elétrica (ANEEL), da Agência Nacional de Águas (ANA), do Ministério de Mi-
nas e Energia (MME) e dos Agentes de geração hidroelétrica, foram desenvolvidos projetos
de revisão das séries de vazões naturais de todas as usinas em operação e em expansão com
horizonte de até cinco anos, na época do início de cada projeto [1] [2].
Os projetos visaram o desenvolvimento e aplicação de metodologias padronizadas para
o tratamento de dados pluviométricos, fluviométricos e operativos, para a elaboração de esti-
mativas de vazões de usos consuntivos, vazões de evaporação líquida dos reservatórios e as
devidas incorporações dessas estimativas nas vazões naturais.
264    Previsão e geração de cenários de vazões

Cabe ressaltar que é prevista para o final de 2020 a disponibilização oficial, por parte da
ANA, de novas estimativas de vazões de usos consuntivos e de curvas cota-área-volume atu-
alizadas dos reservatórios do SIN. A partir dessas novas informações, o ONS irá desenvolver
um novo projeto de revisão das séries de vazões naturais, com previsão de término no final
de 2022.
O processo de reconstituição das vazões naturais diárias começa a partir do cálculo das
vazões afluentes conforme a expressão a seguir:

Q A$l = Q Def + Q Der + D Vol30,0864 (6.1)

Onde:
Q Afl = vazão afluente diária ao reservatório (m3/s);
Q Def = vazão defluente total do reservatório, liberada a jusante do aproveitamento, atra-
vés de turbina, vertedouro, descarregador de fundo, eclusa ou escada de peixe (m3/s);
Q Der = vazão derivada no reservatório, por meio de canal, túnel, estação de bombeamen-
to etc. (m3/s); e
D Vol = variação diária do volume acumulado no reservatório, obtida a partir da tabela
Cota x Volume do reservatório (hm3).

A seguir são calculadas as vazões naturais incrementais brutas referentes à bacia situada
entre o aproveitamento e o(s) aproveitamento(s) de montante:

Q Inc = Q A(l − Q Def !"# %&"% + Q Ucons + Q Evap Liq. (6.2)

Onde:
Q Inc = vazão natural incremental bruta entre o aproveitamento e o(s) aproveitamento(s)
de montante (m3/s);
Q Afl = vazão afluente ao reservatório (m3/s);
Q Def mon prop = vazão defluente do(s) reservatório(s) de montante, devidamente propaga-
da(s) em condição de reservatório (m3/s);
Q Ucons = vazão relativa aos usos consuntivos da bacia incremental (m3/s); e
Q Evap Líq = vazão relativa à evaporação líquida do reservatório (m3/s).

Para os reservatórios de maior porte, ou para reservatórios com bacias incrementais rela-
tivamente pequenas, o cálculo das vazões incrementais por balanço hídrico diário pode levar
a hidrogramas de aspecto não natural, com variações bruscas de vazão, mesmo em épocas de
pouca ou de ausência de chuva.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   265 

Em algumas bacias incrementais chegam a ocorrer vazões incrementais negativas, de for-


ma esporádica ou sistemática. Essas variações ocorrem em razão das aproximações realizadas
nos cálculos dos volumes acumulados a partir dos níveis da água dos reservatórios, que são
registrados com precisão de 1 cm, e aparecem amplificadas nos hidrogramas de vazões incre-
mentais. Além disso, eventualmente, essas leituras de níveis da água podem não ser repre-
sentativas, devido a problemas com o sensor, ocorrência de vento ou influência da operação
do vertedouro, ou de um determinado conjunto de turbinas. É possível ainda a existência de
relativa imprecisão na obtenção das vazões turbinadas ou vertidas de um dos reservatórios que
participam do cálculo das vazões incrementais.
Para evitar a reprodução dessas variações bruscas ou a ocorrência de valores negativos, é
realizado um processo de tratamento das vazões naturais incrementais, cuja metodologia e parâ-
metros estão disponíveis em [3]. Na Figura 6.2, são mostrados os hidrogramas de vazões naturais
incrementais brutas e consolidadas para o ano de 2008 na UHE Serra da Mesa, no rio Tocantins.

Figura 6.2 – UHE Serra da Mesa – Vazões incrementais brutas e consolidadas – 2008

O processo de reconstituição de vazões naturais se encerra com o cálculo da vazão natural


nos locais dos aproveitamentos, conforme a seguinte expressão:

QNat = QNatmom prop + QInccons (6.3)

Onde:
QNat = vazão natural no local do aproveitamento (m3/s);
QNat mon prop = vazão natural do(s) reservatório(s) de montante, devidamente propagada(s)
em condição natural (m3/s); e
QInc cons = vazão natural incremental consolidada da bacia entre o local do aproveitamento
e o(s) reservatório(s) de montante (m3/s).
266    Previsão e geração de cenários de vazões

As metodologias empregadas no processo de propagação de vazões defluentes e naturais


do reservatório de montante são também descritas em [3].
O ONS, para suas funções de programação e planejamento da operação do SIN, possui
uma cadeia de modelos para a otimização da operação eletroenergética, os quais utilizam sé-
ries de vazões naturais médias diárias, semanais e mensais.
As séries diárias e semanais destinam-se aos modelos de programação da operação de
curto prazo e aos modelos de previsão de vazões e controle de cheias, utilizados apenas para
o conjunto de aproveitamentos em operação. A série semanal também serve de insumo à gera-
ção de cenários. As séries mensais destinam-se aos modelos de planejamento da operação de
médio e curto prazo, destacando-se os seus usos para a geração de vazões e energias naturais
afluentes aos aproveitamentos e às regiões de Reservatórios Equivalentes de Energia (REEs).
Nesse caso, devido ao horizonte de planejamento considerado, que pode se estender até cinco
anos à frente, as séries de vazões devem estar disponíveis não só para todos os locais de apro-
veitamentos em operação, como também para todos os locais de aproveitamentos com entrada
em operação prevista dentro desse horizonte.

6.1.2 – Vazão de usos consuntivos


As estimativas de vazões de usos consuntivos da água foram originalmente obtidas em
dois projetos coordenados pelo ONS e com participação da ANA, ANEEL e MME. As es-
timativas abordaram as cinco principais atividades de usos consuntivos da água: irrigação,
abastecimento urbano, rural e industrial, e criação de animais.
O primeiro projeto de estimativa de vazões de usos consuntivos [4] abrangeu o período de
1931 a 2010, e considerou as oito principais bacias do SIN em termos de produção de energia.
A partir de 2003 foram gerados três cenários de evolução das vazões de usos consuntivos,
sendo adotado o cenário “A – tendencial” como cenário para uso no âmbito do setor elétrico.
O segundo projeto [5], relativo ao restante das bacias do SIN, abrangeu também o período de
1931 a 2010 e adotou o cenário tendencial a partir de 2004.
Para o desenvolvimento dos estudos, utilizou-se, como referência principal, dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da ANA. Foram ainda obtidas infor-
mações do Ministério de Integração Nacional (MI); Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA); Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG); Institu-
to Nacional de Meteorologia (INMET); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Em-
brapa); Secretarias estaduais de Planejamento e de Recursos Hídricos; Companhia de Sanea-
mento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp); e Companhia de Desenvolvimento dos Vales
do São Francisco e Parnaíba (Codevasf).
As vazões de usos consuntivos foram obtidas a partir das seguintes expressões:

Q Ucons = Q Ucons!"" + Q Ucons#"$ + Q Ucons"#" + Q Ucons%&! + Q Ucons!&' (6.4)

Q Ucons!!! = Q Retirada!!! − Q Retorno!!! (6.5)


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   267 

Onde:
Q Ucons = vazão relativa aos usos consuntivos totais da bacia (m3/s);
Q Ucons irr = vazão relativa aos usos de irrigação na bacia (m3/s);
Q Ucons urb = vazão relativa aos usos de abastecimento urbano na bacia (m3/s);
Q Ucons rur = vazão relativa aos usos de abastecimento rural na bacia (m3/s);
Q Ucons ani = vazão relativa aos usos de criação animal na bacia (m3/s);
Q Ucons ind = vazão relativa aos usos de abastecimento industrial na bacia (m3/s);
Q Retirada xxx = vazão captada na bacia para a atividade xxx (m3/s); e
Q Retorno xxx = vazão de retorno na bacia para a atividade xxx (m3/s).

A vazão de retorno corresponde à parcela não consumida da vazão de retirada e a vazão de


usos consuntivos corresponde à parcela efetivamente consumida da vazão de retirada.
Na Figura 6.3 e na Figura 6.4, respectivamente, são apresentadas a evolução das vazões
médias anuais de usos consuntivos estimadas para o período 1931 a 2010, e a variação sazonal
das vazões de usos consuntivos estimadas para 2010, para o rio São Francisco na UHE Xingó.

Figura 6.3 – Evolução das vazões de usos consuntivos da água – UHE Xingó
268    Previsão e geração de cenários de vazões

Figura 6.4 – Variação sazonal das vazões de usos consuntivos em 2010 – UHE Xingó

É importante ressaltar que as estimativas de vazões de usos consuntivos são incorporadas


nas séries de vazões naturais respeitando sua cronologia, como já apresentado no item 6.1.1,
expressão (6.2). Da mesma forma, para uso nos modelos de programação e planejamento da
operação são considerados os valores futuros previstos para até cinco anos.
Ressalta-se, ainda, que a ANA desenvolve um projeto de atualização de novas estimativas
de vazões de usos consuntivos da água para todas as bacias hidrográficas brasileiras, incor-
porando alguns aprimoramentos metodológicos, principalmente na atividade relacionada à
irrigação. A Agência prevê que essas novas estimativas serão oficializadas, por meio de reso-
luções, até o final de 2020.

6.1.3 – Vazão de evaporação líquida dos reservatórios


A avaliação das perdas de água nos reservatórios devido à evaporação tem um papel fun-
damental, tanto nos estudos de planejamento como na operação hidráulica dos reservatórios,
e uma boa estimativa dessas perdas é de suma importância, especialmente em aplicações da
hidrologia.
Informações quantitativas desses processos, que se constituem em importante fase do ci-
clo hidrológico, são utilizadas na resolução de numerosos problemas que envolvem o manejo
da água. O planejamento de áreas agrícolas, a previsão de vazões e a operação de reservatórios
requerem dados confiáveis de evaporação e/ou de evapotranspiração. Entretanto, informações
obtidas por medidas diretas de diferentes locais e em condições meteorológicas distintas não
existem em quantidade suficiente. Assim, estimativas baseadas em princípios físicos e prin-
cipalmente em equações empíricas são utilizadas como alternativas para suprir essa carência.
Nos estudos de planejamento da operação e da expansão energética, os dados de eva-
poração são utilizados de duas formas principais: nos estudos para obtenção das séries de
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   269 

vazões naturais nos locais de aproveitamentos hidrelétricos, conforme comentado no item


6.1.1, expressão (6.2) e nos modelos de programação e planejamento da operação de reserva-
tórios. Nestes processos, referentes à quantificação da vazão consumida por evapotranspira-
ção e evaporação nas áreas de reservatórios, esse montante se traduz de forma linear em perda
energética nas usinas hidrelétricas. Daí a importância e a preocupação em se desenvolver boas
estimativas dessas variáveis para todas as usinas em operação e em expansão do SIN.
A implantação de um reservatório altera as condições de evaporação na região do lago.
Antes da formação do reservatório, ocorria um processo de evapotranspiração da água nessa
área, que correspondia a um processo de evaporação da água retida em vegetações, em de-
pressões do terreno e no próprio solo e a um processo de transpiração da vegetação existente.
De forma geral, a parcela de evapotranspiração é bastante significativa em relação ao total
de precipitação e seu valor médio de longo termo pode ser avaliado por meio de balanço hídri-
co de bacia. Na tabela 6.1 é apresentada uma estimativa da evapotranspiração real obtida por
esse método em algumas bacias do SIN. Pode-se verificar a magnitude da parcela da chuva
que é consumida pela evapotranspiração, sendo esta maior do que a parcela que se transforma
em vazão, para todas as bacias.
Precipit Deflúvio Evapotr
Área Vazãomé-
Bacia Local Período média P médio D média E D/P (%) E/P (%)
(km2) dia (m3/s) (mm) (mm) (mm)
São Francisco Xingó 610.544 1941/2001 2.869 990 148 842 15 85
Jequitinhonha Itapebi 68.383 1961/1995 393 950 181 769 19 81
Paraná (Incr.) Itaipu 340.624 1931/2001 3.502 1.340 324 1.016 24 76
270    Previsão e geração de cenários de vazões

Tietê Três Irmãos 71.221 1931/2001 800 1.320 354 966 27 73


Tocantins Tucuruí 757.577 1931/2001 11.010 1.620 458 1.162 28 72
Paranaíba São Simão 171.474 1974/2001 2.582 1.480 475 1.005 32 68
Grande Água Verm. 139.437 1944/1999 2.118 1.450 479 971 33 67
Paranapanema Rosana 100.799 1963/1997 1.463 1.350 458 892 34 66
Jamari Samuel 14.878 1973/2007 351 2.050 744 1.306 36 64
Uatumã Balbina 18.899 1976/2006 579 2.292 966 1.326 42 58
Iguaçu Salto Caxias 56.977 1963/1997 1.464 1.680 810 870 48 52
Tabela 6.1 – Estimativa de evapotranspiração real em algumas bacias do SIN (mm)

pondente ao lago e é substituído por um processo de evaporação da superfície da água. Assim,


Com a implantação de um reservatório, o processo de evapotranspiração da área corres-
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   271 

a evaporação líquida a ser considerada na reconstituição de vazões naturais e nos modelos de


programação e planejamento da operação pode ser estimada a partir da seguinte expressão:

Evap. Liq. = Evapor. − Evapot. (6.6)

Onde:
Evap.Liq. = evaporação líquida na área do reservatório, a ser considerada na reconstitui-
ção de vazões naturais e nos modelos de programação e planejamento da operação (mm);
Evapo. = evaporação da superfície da água no reservatório (mm); e
Evapot. = evapotranspiração real que ocorreria na área do reservatório, caso o mesmo não
fosse implantado (mm).

Os valores da evaporação da superfície da água no reservatório e da evapotranspiração real que


ocorreria na área do reservatório foram estimados a partir da metodologia desenvolvida por Morton,
a qual considera as características topográficas e meteorológicas da região onde o reservatório está
localizado, sendo essas últimas obtidas por meio das normais climatológicas derivadas de medições
de grandezas meteorológicas em estações com longo período de observações [6] e [7].
A aplicação da metodologia de Morton para várias usinas do semiárido nordestino resul-
tou em valores médios para a evapotranspiração real maiores do que os correspondentes totais
médios anuais de precipitação, o que mostra uma inconsistência metodológica. Assim, para as
usinas do Baixo São Francisco, foi utilizado o processo de Thortwaite & Matter para subsidiar
o cálculo da evaporação líquida nos reservatórios de Sobradinho, Itaparica, Moxotó, Comple-
xo Paulo Afonso e Xingó. Mais detalhes dessas metodologias podem ser obtidos em [8].
Na tabela 6.2 são apresentados os resultados de evaporação líquida para três reservatórios
do SIN. Pode-se notar que, para o reservatório de Salto Santiago, no rio Iguaçu, a evaporação
da superfície da água no reservatório, em alguns meses, é menor do que a evapotranspiração
real que ocorreria na área do reservatório, o que resulta em valores negativos de evaporação
líquida. Essa característica é frequente em reservatórios das regiões Sul e Norte do Brasil.
Os valores de evaporação líquida a serem utilizados nos modelos hidroenergéticos são
atualizados a partir da publicação de novas normais climatológicas pelo Instituto Nacional de
Meteorologia (INMET).
Local Grandeza (mm) Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Ano
Evaporação do lago 142 122 137 124 112 93 85 88 99 119 126 154 1.401
Rio Grande em
Evapotransp. real 129 120 112 84 60 42 42 46 60 101 114 127 1.037
UHE Furnas
272    Previsão e geração de cenários de vazões

Evaporação líquida 13 2 25 40 52 51 43 42 39 18 12 27 364


Evaporação do lago 168 151 167 144 129 103 89 93 107 117 133 165 1.566
Rio Paraná em
Evapotransp. real 150 124 125 86 50 32 29 33 49 103 125 137 1.043
UHE Jupiá
Evaporação líquida 18 27 42 58 79 71 60 60 58 14 8 28 523
Rio Iguaçu em Evaporação do lago 148 144 156 134 115 91 75 68 70 80 98 128 1.307
UHE Salto San-
tiago Evapotransp. real 140 117 102 58 36 24 28 35 52 92 115 134 933
Tabela 6.2 – Resultados de evaporação líquida para três reservatórios do SIN
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   273 

6.2 – Modelos de previsão de vazões

Modelos de previsão de vazões podem receber diversas classificações [9], em razão da


transformação, do tipo e das relações existentes entre as variáveis consideradas na modela-
gem, bem como da existência de relações espaciais e de dependências temporais.
• Transformação Chuva-Vazão ou Vazão-Vazão: O modelo chuva-vazão utiliza dados
de chuva observada e prevista no processo de obtenção da vazão. Nos modelos Vazão-
-Vazão tais dados não são considerados.
• Estocástico ou Determinístico: O modelo é estocástico quando ao menos uma variável
tem caráter aleatório e o conceito de probabilidade é considerado em sua formulação.
No modelo determinístico, esse conceito não é considerado e, mantendo-se fixas as
condições iniciais, um valor de entrada sempre resultará em um mesmo valor de saída.
• Conceitual ou Empírico: O modelo é conceitual quando as funções empregadas em
sua formulação consideram os processos físicos da transformação da chuva em vazão
(precipitação, infiltração, percolação, evapotranspiração, escoamento superficial, es-
coamento subterrâneo, propagação de vazões etc.). No modelo empírico, as funções
utilizadas não têm qualquer relação com os processos físicos envolvidos, mas permi-
tem retratar a saída do sistema (vazão) em função da entrada (vazão, precipitação etc.).
• Distribuído ou Concentrado: No modelo concentrado as variáveis de entrada e saída
são representativas de toda a bacia estudada, não considerando suas variabilidades
espaciais. Todos os parâmetros e variáveis do sistema são representados pela média
espacial. O modelo distribuído permite representar a variabilidade espacial das carac-
terísticas físicas da bacia hidrográfica, ou seja, os parâmetros do modelo dependem do
espaço e suas variáveis dependem do tempo e do espaço.

Os modelos de previsão de vazões que são/foram utilizados pelo ONS podem ser dividi-
dos em dois grupos. O primeiro, desenvolvido pelo Centro de Pesquisas de Energia Elétrica –
Eletrobrás Cepel, é formado pelos modelos PREVIVAZH e PREVIVAZ e utiliza informações
de vazão para a previsão de vazão. O segundo grupo, desenvolvido para o ONS com apoio de
diversas entidades e consultoras, utiliza informações de chuva observada e prevista para a pre-
visão de vazões da primeira semana operativa. Esse grupo é formado pelos modelos MPCV/
PREVIVAZ, MGB, SMAP/MEL, Fuzzy, Neuro e SMAP/ONS.
O ONS, desde sua criação, vem buscando sistematicamente a melhoria da modelagem
hidrológica, bem como de seus principais insumos. Nesse contínuo aprimoramento, pode-se
destacar a utilização do modelo MPCV/PREVIVAZ para a bacia do rio Iguaçu, em 2006, e
para a bacia do rio Uruguai, em 2007, considerando, pela primeira vez no ONS, a precipita-
ção observada e prevista na bacia e a modelagem chuva-vazão para a previsão de vazões da
primeira semana operativa.
274    Previsão e geração de cenários de vazões

Nesse período, o ONS realizou um processo de concorrência de modelos hidrológicos,


que culminou, em 2008, na entrada oficial dos modelos MGB (bacia incremental à UHE São
Simão), SMAP-MEL (bacia incremental à UHE Itaipu) e Fuzzy (bacia do rio Iguaçu). Após a
entrada desses modelos houve ainda a incorporação dos modelos Neuro, em parte da bacia do
rio São Francisco, e SMAP/ONS, utilizado inicialmente nas bacias dos rios Grande, Paranaíba
(a montante da UHE Itumbiara), Paranapanema e Paraná (bacia incremental à UHE Itaipu).
Nas bacias restantes do SIN, continuou-se a utilizar o modelo PREVIVAZ.
Essa variedade de modelos foi importante para que o ONS fizesse, ao longo de vários
anos, uma avaliação aprofundada das metodologias e dos desempenhos das previsões, assim
como uma análise dos aspectos operacionais como tempo de processamento, facilidade de
absorção da tecnologia e possibilidade de integração com ferramentas de gerenciamento do
processo da previsão de vazão. Essa análise permitiu concluir que o uso de modelos com di-
versas metodologias ocasionava uma série de dificuldades.
Do ponto de vista da execução dos modelos, o maior empecilho era a necessidade da cria-
ção e manutenção de diferentes interfaces que auxiliassem no processamento dos modelos.
Já para o desenvolvimento tecnológico, a necessidade de o ONS desenvolver expertise em
diversas metodologias tornava o processo de absorção e evolução mais vagaroso e custoso.
Somava-se a isso a dificuldade dos agentes de processar modelos distintos com diferentes
arquivos de entrada e saída e diferentes formas de pós-processamento, o que tornava a repro-
dutibilidade da previsão de vazão do ONS mais complexa e menos transparente.
Para mitigar tais dificuldades, o ONS passou a adotar, desde 2012, apenas o modelo
SMAP/ONS na expansão da modelagem chuva-vazão em bacias do SIN. Na elaboração do
Programa Mensal da Operação (PMO) de março/2019, cerca de 60% da ENA do SIN prevista
para a primeira semana operativa era realizada com o modelo SMAP/ONS, com perspectivas
de expandir esse valor para 100% em 2021.
A escolha do modelo SMAP/ONS como principal modelo de previsão da vazão da primei-
ra semana operativa se deve a inúmeros fatores, dentre os quais se podem destacar:
• Sua abordagem conceitual do processo de transformação da chuva em vazão, que
permite a separação da vazão total em parcelas de escoamento superficial e de escoa-
mento subterrâneo;
• Maior facilidade de uso para horizontes superiores a uma semana;
• Simplicidade e facilidade de compreensão metodológica;
• O domínio de sua tecnologia e a possibilidade de aprimoramento pelo ONS;
• Sua adaptabilidade a bacias com comportamentos hidrológicos distintos;
• Código aberto e livre, o que permite sua programação em diversas linguagens; e
• Bons resultados na previsão de vazões em todas as bacias para as quais ele foi imple-
mentado, comprovados pela redução dos desvios médios da previsão de vazões quan-
do comparados com os dos modelos vigentes anteriores.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   275 

As características principais de cada modelo e o horizonte de uso no processo de previsão


de vazões do ONS são mostradas na tabela 6.3.

Tabela 6.3 – Características principais dos modelos de previsão de vazões utilizados pelo ONS
Modelo Características principais Uso
PREVIVAZH Vazão-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Diário Eventual (*)
PREVIVAZ Vazão-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Semanal 1º mês
MPCV/PRE-
Chuva-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Semanal 1ª semana
VIVAZ
MGB Chuva-Vazão Determinístico Conceitual Distribuído Diário 1ª semana (**)
SMAP Chuva-Vazão Determinístico Conceitual Concentrado Diário 1ª semana (**)
MEL Chuva-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Diário 1ª semana (**)
Fuzzy Chuva-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Diário 1ª semana (**)
Neuro Chuva-Vazão Estocástico Empírico Concentrado Diário 1ª semana (**)
SMAP/ONS Chuva-Vazão Determinístico Conceitual Concentrado Diário 1ª semana (**)
CPINS (***) Vazão-Vazão Determinístico Empírico Concentrado Diário 1ª e 2ª semanas
* – Uso não prioritário, ver item 6.2.1
** – Inclui previsão dos dias finais da semana em curso
*** – Modelo de propagação de vazões

A evolução da modelagem em cada bacia hidrográfica, com o ano da mudança do modelo,


é apresentada na Figura 6.5.

Figura 6.5 – Modelos utilizados na elaboração das previsões de vazões para o PMO
276    Previsão e geração de cenários de vazões

6.2.1 – O processo de previsão de vazões naturais do ONS


Por convenção, a semana operativa utilizada pelo setor elétrico se inicia no sábado e ter-
mina na sexta-feira, e o mês operativo começa sempre na semana que contém o dia 1. O ONS
elabora semanalmente as previsões de vazões naturais a todos os aproveitamentos do SIN.
Até setembro de 2014, como regra geral, a previsão do PMO era realizada na quarta-feira da
última semana operativa do mês anterior e as previsões para as revisões semanais na quinta-
-feira da semana operativa anterior. A partir do PMO de outubro de 2014, todas as previsões
passaram a ser realizadas às quintas-feiras, como mostra o esquema da Figura 6.6.

Figura 6.6 – Esquema de elaboração das previsões de vazões para o PMO

Os processos e modelos utilizados para previsão variam de acordo com a agregação tem-
poral utilizada: diária ou semanal.
Os modelos diários (MGB, Fuzzy, SMAP-MEL e SMAP/ONS) preveem não só as vazões
diárias da primeira semana operativa, como também as vazões dos dias restantes da própria
semana em curso, ou seja, em geral as vazões relativas à quinta e à sexta-feira. Para os mode-
los semanais (MPCV/PREVIVAZ e PREVIVAZ), essas vazões são estimadas, em ordem de
prioridade, pelas previsões dos agentes responsáveis pela operação das usinas, pelas previsões
provenientes do modelo PREVIVAZH e pela média das vazões diárias observadas na semana
em curso.
Os modelos chuva-vazão utilizam a chuva observada e prevista para a previsão da primei-
ra semana operativa. A chuva observada é proveniente das estações telemétricas operadas, em
sua maioria, pelos agentes de geração e pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e da
rede de estações relacionadas ao METAR (Meteorological Aerodrome Report), em aeroportos
brasileiros. Para a chuva prevista são utilizadas, desde 2008, as previsões do modelo ETA-40,
fornecidas pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   277 

Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O modelo ETA-40 fornece uma previsão determinís-
tica de precipitação com horizonte de até dez dias.
A partir de 2017, em razão de bons resultados obtidos em diversos testes de desempenho,
passou-se a utilizar também a previsão do modelo GEFS 1°, fornecida pelo National Centers
for Environmental Prediction (NCEP). Esse modelo utiliza a técnica de previsão por conjunto
e gera 21 cenários de chuva prevista com horizonte de até 14 dias, a partir de perturbações nas
condições iniciais estabelecidas para a atmosfera.
As previsões de ambos os modelos passam por um processo de remoção de viés e de
eventual aplicação de limites máximos para os valores previstos de chuva diária e de chuva
acumulada de dez dias. A chuva prevista, a ser utilizada pelos modelos de previsão de vazões
da primeira semana operativa, é obtida a partir da combinação da previsão do modelo ETA-40
e da média das previsões do modelo GEFS 1°, com uso de pesos proporcionais aos desempe-
nhos obtidos por cada modelo, para cada dia do horizonte da previsão e para cada sub-bacia
envolvida. Maior detalhamento dessa metodologia pode ser obtido em [10].
Em razão de seu bom desempenho, é prevista, em 2020, a incorporação das previsões
de precipitação do modelo por conjunto do ECMWF (European Centre for Medium-range
Weather Forecasting), na combinação de modelos para geração das vazões previstas para a
primeira semana operativa.
As vazões naturais das demais semanas operativas do primeiro mês são previstas pelo
modelo PREVIVAZ, exceto para a segunda semana da bacia do rio São Francisco onde é uti-
lizado o modelo de propagação de vazões CPINS.

6.2.2 – Modelo PREVIVAZH


Conforme [11], o modelo PREVIVAZH, desenvolvido pelo Cepel, visa a obtenção das
previsões de vazões diárias, até 13 dias à frente. As previsões são baseadas na desagregação,
em intervalos diários, das previsões de afluências semanais obtidas pelo modelo PREVIVAZ.
A metodologia de desagregação não paramétrica das afluências semanais faz uso das últimas
afluências diárias e de séries sintéticas de vazões diárias. Por meio de metodologia adotada
para geração das sequências de afluências diárias, utilizadas no processo de desagregação das
vazões semanais, garante-se a preservação das características da série diária que apresenta es-
truturas complexas de dependência temporal, com diferenças marcantes entre os períodos de
ascensão e recessão, além de distribuições marginais significativamente assimétricas.

6.2.3 – Modelo PREVIVAZ


O modelo Vazão-Vazão PREVIVAZ [12], desenvolvido pelo Cepel, visa a obtenção das
previsões de afluências semanais, até seis semanas à frente. O modelo analisa a série histórica
de afluências semanais de cada aproveitamento hidrelétrico e seleciona, para cada semana, o
modelo de melhor desempenho dentre diversas alternativas de modelagem estocástica. Essas
alternativas baseiam-se nos modelos de séries temporais propostos por Box e Jenkins, mais
278    Previsão e geração de cenários de vazões

especificamente, em modelos autorregressivos com ou sem componente de média móvel (AR


e ARMA, respectivamente). Esses modelos são construídos como função da informação pas-
sada em diferentes passos de tempo (lags), podendo ou não apresentar estrutura de correla-
ção periódica. A estrutura de correlação temporal da série de vazões semanal é definida em
intervalos de diferentes durações (semanal, mensal, trimestral e semestral). Além disso, os
parâmetros desses modelos são estimados segundo diferentes metodologias (método dos mo-
mentos, regressão). A definição das alternativas de modelagem pode ser feita a partir de uma
transformação prévia (Box-Cox e/ou logarítmica) da série de vazões semanais.
No modelo PREVIVAZ, as alternativas de modelagem são testadas segundo um procedi-
mento no qual a série histórica é dividida em duas metades. Inicialmente, apenas a primeira
metade é utilizada para a estimação dos parâmetros, e a segunda é usada para o cálculo de
erros de previsão (etapa de verificação). Em seguida, a estimação dos parâmetros passa a ser
feita com a segunda metade da série histórica, ficando a primeira parte apenas para cálculo dos
erros de previsão. Para cada parte da série, computa-se o erro médio quadrático de previsão,
obtendo-se, a seguir, a média dos valores de erro calculados segundo cada metade da série.
Adotar-se-á para previsão a alternativa de modelagem que apresentar o menor erro médio
quadrático.

6.2.4 – Modelo SMAP/ONS


O modelo chuva-vazão SMAP/ONS é baseado no modelo SMAP e contém aprimoramen-
tos metodológicos e diferenças de aplicação em relação ao modelo original, a saber:
• Uso de coeficientes de representação temporal da precipitação;
• Uso de coeficientes de ajuste da precipitação e da evapotranspiração potencial;
• Utilização de um quarto reservatório (reservatório de planície);
• Possibilidade de utilização de até dois coeficientes de recessão do reservatório de es-
coamento superficial; e
• Processo de assimilação de dados e otimização, de forma que, em sua fase operacio-
nal, o modelo possa ajustar suas variáveis de estado com o objetivo de diminuir o des-
vio entre as vazões calculadas e observadas em um período anterior ao dia da previsão.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   279 

Na Figura 6.7 é apresentada a estrutura do modelo SMAP/ONS.

Figura 6.7 – Estrutura do modelo SMAP/NOS

Os dados de entrada do modelo no modo operacional são os totais diários de precipitação


previstos e observados, os totais climatológicos diários de evapotranspiração potencial – Ep(t)
e as vazões médias diárias observadas – Qobs(t) no período de assimilação de dados.
Para a precipitação observada, o modelo calcula um total diário de precipitação média na
bacia – Pb(t) ponderando o peso de cada estação pluviométrica a partir da seguinte expressão:

Pb ! = P1 ! ∗ ke" + P2 ! ∗ ke# + P3 ! ∗ ke$ + ⋯ + Pn ! ∗ ke% (6.7)

Considerando que:

ke! + ke" + ke# + ⋯ + ke$ = 1 (6.8)

Onde:
Pb(t) = precipitação média na bacia, no instante de tempo t (mm).
P1(t); P2(t); ...;Pn(t) = precipitação observada nos postos pluviométricos considerados na
bacia, no instante de tempo t (mm).
ke1;ke2; ...; ken: coeficientes de representação espacial de cada posto pluviométrico.
No caso da precipitação prevista, o valor de Pb(t) é considerado como a média aritmética dos va-
lores previstos nos pontos de grade dos modelos de previsão de precipitação representativos da bacia.
Após isso, o modelo calcula a precipitação considerada como representativa do dia t – Pd(t) sendo ela
composta por uma ponderação de Pb(t) de diferentes tempos, conforme expressão a seguir:
𝑃𝑃d !
𝑃𝑃d ! = Pb !"# ∗ kt "# + Pb !"#$% ∗ kt "#$% + ⋯ + Pb ! (6.9)
= Pb ∗!"#
kt &∗ kt
+ "#
Pb !$%
+ Pb ∗ !"#$%
kt % + Pb !$' ∗+
∗ kt "#$% kt
⋯ '+ Pb !
∗ kt & + Pb !$% ∗ kt % + Pb !$' ∗ kt '
280    Previsão e geração de cenários de vazões

Onde:
Pd(t) = precipitação representativa do instante de tempo t (mm).
kt(-n); kt(-n+1); kt(0); kt(+1); kt(+2) = coeficientes de representação temporal.

Essa consideração é necessária devido aos seguintes motivos:


• Em bacias com maiores tempos de concentração pode haver uma defasagem temporal
entre os picos de precipitação e de vazão;
• O modelo, em sua concepção, produz uma defasagem temporal de um dia, uma vez
que para evitar referências circulares, os escoamentos são calculados com o estado
dos reservatórios do estágio de tempo anterior. Além disso, em geral, as medidas de
precipitação nos postos pluviométricos são realizadas às 7h, ou seja, a maior parte
da precipitação ocorrida no dia t só é medida e computada no dia t+1. Dessa forma,
principalmente em bacias com tempo de concentração relativamente pequeno, a vazão
média do dia t pode ser influenciada pela precipitação medida no dia t+2.

Por fim, o valor de Pd(t) é multiplicado pelo fator Pcof, que ajusta o volume de precipita-
ção na bacia para garantir o equilíbrio hídrico da bacia, conforme a seguinte expressão:

P ! = Pd ! ∗ Pcof (6.10)

Onde:
P(t) = precipitação média na bacia a ser considerada pelo modelo no tempo t (mm).
Pcof = coeficiente de ajuste da precipitação.

A evapotranspiração potencial fornecida – Epf(t) muitas vezes é estimada a partir de equa-


ções empíricas ou medidas em locais distantes e ajustadas para a bacia de interesse. Dessa
forma, também com vistas à garantia do balanço hídrico da bacia, é necessário ajustar a eva-
potranspiração potencial – Ep(t) com as seguintes expressões:

Ep ! = Epf ! ∗ Ecof (6.11)

Emarg ! = Epf ! ∗ Ecof2 (6.12)

Onde:
Ep(t) = evapotranspiração potencial a ser considerada pelo modelo no tempo t (mm).
Epf(t) = evapotranspiração potencial diária estimada para a bacia no tempo (mm).
Ecof = coeficiente de ajuste da evapotranspiração potencial média da bacia.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   281 

Emarg(t) = evaporação da planície de inundação no tempo (mm).


Ecof2 =  coeficiente de ajuste da evapotranspiração potencial média da planície de
inundação.

O modelo SMAP/ONS se baseia na divisão da vazão em escoamento superficial e em


escoamento subterrâneo, uma vez que eles possuem características distintas. Essa divisão é
similar à equação de runoff (Curve Number) do Soil Conservation Service (SCS) dos Estados
Unidos, sendo cada parcela armazenada em reservatórios fictícios que são responsáveis por
descrever a forma e a duração dos escoamentos.
A parcela do escoamento superficial – Es é transferida para o reservatório de superfície
onde são calculados, a partir do nível do reservatório Rsup, os escoamentos superficiais – Ed
e Ed3 assim como a transferência da água – Marg para o reservatório de planície. A partir do
nível desse reservatório – Rsup2 é calculado o escoamento superficial de planície – Ed2 e a
parcela de evaporação – Emarg.
A parcela que infiltra – P-Es é transferida para o reservatório de solo onde, a partir do
nível do reservatório Rsolo, é computada a parcela de evapotranspiração real – Er e a trans-
ferência para o reservatório subterrâneo através da recarga do aquífero – Rec, desde que não
tenha sido atingida a capacidade de campo do solo – Capc. A partir do nível do reservatório
Rsub é calculado o escoamento subterrâneo (Eb).
As variáveis de estado de cada um dos quatro reservatórios são atualizadas a cada instante
de tempo, de acordo com as seguintes expressões:

Rsolo(t ) = Mín { Rsolo(t-1) + P(t ) - Es(t) - Er(t) - Rec(t) ; Str } (6.13)

Rsub(t) = Rsub(t-1) + Rec(t) - Eb(t) (6.14)

Rsup(t) = Rsup(t-1) + Es(t) - Marg(t) - Ed(t) - Ed3(t)


(6.15)
+ Máx { 0 ; [(Rsolo(t-1) + P(t) - Es(t) - Er(t) - Rec(t)) - Str ] }

Rsup2(t) = Rsup2(t-1) + Marg(t) - Ed2(t) - Emarg(t) (6.16)

Onde:
Rsolo(t): nível do reservatório de solo no instante de tempo t (mm).
Rsub(t): nível do reservatório subterrâneo no instante de tempo t (mm).
Rsup(t): nível do reservatório de superfície no instante de tempo t (mm).
Rsup2(t): nível do reservatório de planície no instante de tempo t (mm).
P(t): precipitação média, a ser considerada no instante de tempo t (mm).
Es(t): escoamento para o reservatório de superfície no instante de tempo t (mm).
282    Previsão e geração de cenários de vazões

Er(t): evapotranspiração real do solo no instante de tempo t (mm).


Rec(t): recarga subterrânea no instante de tempo t (mm).
Eb(t): escoamento de base no instante de tempo t (mm).
Marg(t): extravasamento pelas margens no instante de tempo t (mm).
Emarg(t): evaporação da planície de inundação no instante de tempo t (mm).
Ed(t): primeiro escoamento superficial no instante de tempo t (mm).
Ed3(t): segundo escoamento superficial no instante de tempo t (mm).
Ed2(t): escoamento de planície no instante de tempo t (mm).
Str: capacidade de saturação do solo (mm).
t: instante de tempo (1 dia).

As funções de transferência são calculadas a cada passo de tempo de acordo com as se-
guintes expressões:

#
% ! # &'
#
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑃𝑃 " > 𝐴𝐴𝐴𝐴 =>𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑃𝑃
𝑆𝑆 = 𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆 − 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅
=> 𝑆𝑆 "#$ ; 𝐸𝐸𝐸𝐸
= 𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆 " =%
− 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅
% # &'
; 𝐸𝐸𝐸𝐸 𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑃𝑃
= % !# &' ( ) ≤ 𝐴𝐴𝐴𝐴 =>
(6.17)
" 𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑃𝑃
" > 𝐴𝐴𝐴𝐴 ! # &' ( ) "
"#$ " ≤ 𝐴𝐴𝐴𝐴 =>
# !
&' 𝐸𝐸𝐸𝐸 "" = 𝐴𝐴𝐴𝐴0 => 𝐸𝐸𝐸𝐸
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑃𝑃 ≤ " =0
&' ( )

Se P ! − Es ! > Ep ! => Er ! = Ep !
Se P ! − Es ! ≤ Ep ! => (6.18)
Er ! = P ! − Es ! + Ep ! − P ! − Es ! ∗ Tu !

𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# > ∗ 𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆 =>
100
𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶 𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶𝐶 (6.19)
𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 ! = ∗ 𝑇𝑇𝑇𝑇 ! ∗ 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# − ∗ 𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆
100 100
$%&'
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# < #(( ∗ 𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆𝑆 => 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 ! = 0

#
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# > 𝐻𝐻 => 𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀 ! = (𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# −𝐻𝐻) ∗ 1 − 0.5 %#!
(6.20)
𝑆𝑆𝑆𝑆 𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅𝑅 !"# ≤ 𝐻𝐻 => 𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀𝑀 ! = 0

#
Ed ! = Menor (Rsup !"# − Marg ! ; H1) ∗ 1 − 0.5 %&! (6.21)

#
Ed3 ! = Maior (Rsup !"# − Marg ! − H1; 0) ∗ 1 − 0.5 %&!& (6.22)
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   283 

#
Ed2 ! = Rsup2 !"# ∗ 1 − 0.5 %&! (6.23)

#
Eb ! = Rsub !"# ∗ 1 − 0.5 %%! (6.24)

Rsolo !"#
Tu ! = (6.25)
Str

Onde:
Ai: abstração inicial (mm).
Ep(t): evapotranspiração potencial (mm).
Tu(t): teor de umidade do solo (adimensional).
Capc: capacidade de campo (%).
Crec: parâmetro de recarga subterrânea (%).
H: altura representativa para transbordamento para planícies (mm).
H1: altura representativa para início do segundo escoamento superficial (mm).
K1t: constante de recessão do escoamento para planícies (dia).
K2t: constante de recessão do primeiro escoamento superficial (dia).
K2t2: constante de recessão do segundo escoamento superficial (dia).
K3t: constante de recessão do escoamento de planícies (dia).
Kkt: constante de recessão do escoamento básico (dia).

As constantes de recessão – K1t, K2t, K2t2, K3t e Kkt são associadas à duração do inter-
valo, medido em dias, no qual a vazão do correspondente reservatório cai pela metade de seu
valor, não considerando nova recarga nesse período. O eventual transbordo do reservatório do
solo é transferido para o reservatório de escoamento superficial.
O cálculo da vazão total é dado pela seguinte expressão:

(Ed ! + Ed2 ! + Ed3 ! + Eb ! ) ∗ Ad


Qcalc ! = (6.26)
86,4

Onde:
Qcalc(t): vazão total calculada pelo modelo no instante de tempo t (m³/s).
Ad: área de drenagem da bacia considerada (km²).
284    Previsão e geração de cenários de vazões

Os parâmetros do modelo são calibrados a partir das vazões diárias observadas nos locais
de interesse, como usinas hidroelétricas e estações fluviométricas, e dos registros de estações
pluviométricas (telemétricas e convencionais). Desde que possível, são utilizados, no mínimo,
dez anos de anos de dados observados para a etapa de calibração do modelo. Os valores dos
parâmetros obtidos na calibração do modelo SMAP/ONS podem ser obtidos em [13].
Na fase operacional, o modelo SMAP/ONS, assim como a maioria dos modelos conceitu-
ais de previsão de vazões, realiza uma etapa prévia denominada assimilação de dados. Nessa
etapa, o modelo recebe dados de um período anterior ao da previsão e procura uma melhor
estimativa das condições hidrológicas da bacia e, se necessário, corrige suas variáveis de esta-
do com o objetivo de diminuir os desvios entre as vazões calculadas pelo modelo e as vazões
observadas. Tal processo busca preservar a compatibilidade entre as tendências de comporta-
mento dos hidrogramas observado e previsto, além de impedir a ocorrência de descolamentos
excessivos entre a última vazão observada e a primeira vazão prevista. No caso do modelo
SMAP/ONS, essa correção das condições da bacia é realizada utilizando um algoritmo de
otimização heurística bioinspirada na ecolocalização de morcegos (Bat Algorithm). Esse al-
goritmo ajusta, dentro de uma faixa estabelecida, os valores iniciais de escoamento de base
– Ebin e de escoamento superficial – Supin, além da precipitação observada – P(t) de acordo
com limites estabelecidos. Maiores informações sobre este processo podem ser encontradas
no Manual de Metodologia do Aplicativo SMAP/ONS [14].

6.2.5 – Modelo CPINS


O modelo Vazão-Vazão CPINS é um modelo de propagação de vazões ao longo do rio
São Francisco desenvolvido com base na metodologia do módulo de escoamento em rios e
reservatórios do modelo SSARR (StreamFlow Sinthesis and Reservoir Regulation). O modelo
CPINS simula o efeito do amortecimento das ondas de cheia e o retardamento de sua propa-
gação ao longo do rio São Francisco entre a UHE Três Marias, as estações fluviométricas de
São Romão, São Francisco, Carinhanha e Morpará e a UHE Sobradinho.

6.2.6 – Outros modelos utilizados


Conforme mencionado no item 6.2, diversos modelos do tipo chuva-vazão foram utili-
zados e, posteriormente, substituídos pelo modelo SMAP/ONS no processo de previsão de
vazões da primeira semana operativa. Uma breve descrição de cada um desses modelos é
realizada a seguir.
• Modelo MPCV/PREVIVAZ: Desenvolvido pelo ONS e utilizado na bacia do rio
Iguaçu entre 2006 e 2008 e na bacia do rio Uruguai entre 2007 e 2018, o modelo
MPCV, com base em informações de chuva observada e prevista, utiliza técnicas de
mineração de dados e de rede neurais bayesiana para a seleção da melhor previsão do
modelo PREVIVAZ, dentre as diversas previsões fornecidas por este modelo.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   285 

• Modelo MGB: Desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Uni-


versidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e utilizado entre 2008 e 2018 na
bacia incremental da UHE ,São Simão, no rio Paranaíba, o modelo MGB é um mo-
delo conceitual e distribuído, onde a bacia hidrográfica é discretizada em células ou
minibacias, cada qual com sua característica de tipo e uso do solo. O modelo baseia-se
no balanço de água no solo, na evapotranspiração, nos escoamentos em e entre cada
minibacia e nos escoamentos da rede de drenagem. Atuam também sobre o modelo a
temperatura e a umidade relativa do ar, o vento, a pressão e a insolação.
• Modelo SMAP/MEL: O modelo SMAP/MEL é uma composição entre os modelos
SMAP e MEL. O modelo chuva-vazão SMAP, desenvolvido por Lopes, Braga e Co-
nejo [15], é um modelo conceitual e concentrado, sendo constituído por três reser-
vatórios lineares hipotéticos representando: o reservatório de solo; o reservatório de
superfície, correspondente ao escoamento superficial da bacia; e o reservatório subter-
râneo, correspondente ao escoamento subterrâneo da bacia (escoamento de base). As
variáveis de estado, ou seja, os níveis de cada um dos três reservatórios são atualizados
a cada intervalo de tempo (dia). Funções de transferência são utilizadas para a separa-
ção do escoamento superficial, para definição da evapotranspiração real, para cálculo
da recarga do reservatório subterrâneo e para cálculo das vazões diárias provenien-
tes do escoamento superficial e do escoamento subterrâneo. O modelo chuva-vazão
MEL, desenvolvido pela Fundação Centro Tecnológico de Hidráulica (FCTH), é um
modelo estocástico linear, autorregressivo integrado de médias móveis (ARIMA), no
qual a vazão prevista é função de vazões observadas no local e em eventuais locais de
controle a montante, além da precipitação observada e prevista na bacia hidrográfica.
Em cada local de previsão é determinada a melhor estrutura estocástica do modelo e
seus parâmetros são estimados por meio de técnicas clássicas de análise multivariada.
A previsão do modelo SMAP/MEL é obtida por meio de uma combinação linear das
previsões dos modelos SMAP e MEL, com base no desempenho histórico de cada um
dos dois modelos.
• Modelo Fuzzy: Desenvolvido pela Universidade Federal Fluminense (UFF), o mo-
delo chuva-vazão Fuzzy é um modelo de inteligência artificial que utiliza técnicas de
mineração de dados. A metodologia desenvolvida é composta por quatro módulos:
modelo de análise de incerteza; modelo de imputação de dados; modelo de dados
(cubo OLAP); e modelo de previsão de vazões. A chuva e a vazão observada/previs-
ta são classificadas em cinco faixas conforme sua intensidade: Muito pouca; Pouca;
Média; Grande; e Muito Grande. Para a previsão de vazões é utilizada modelagem de
transferências não lineares, tendo como dados de entrada a chuva observada e prevista
e as vazões observadas em período recente.
• Modelo Neuro: O modelo chuva-vazão Neuro, desenvolvido por Valença e adaptado
pelo ONS, é um modelo de inteligência artificial baseado na técnica de redes neu-
rais. Como dados de entrada são considerados dados de chuva observada e prevista,
286    Previsão e geração de cenários de vazões

vazões em estações fluviométricas e vazões incrementais nos locais de interesse. No


processo de treinamento da rede neural é utilizado o método de validação cruzada,
onde os dados são divididos para uso nas fases de treinamento, de validação e de teste.
No processo de validação cruzada, os pesos são ajustados em função dos dados de
treinamento, ficando os dados de validação apenas para determinação do momento da
parada do treinamento, evitando que a rede neural sobreajuste os pesos e não seja ca-
paz de proporcionar bons resultados quando lhe forem apresentados um novo conjunto
de dados. O modelo permite a alteração de diversos parâmetros do algoritmo (taxa de
aprendizagem, semente para geração e momentum) e de critérios de parada, bem como
o uso de várias configurações de redes neurais.

6.3 – Modelo de geração de cenários de vazões e de ENAs

Os modelos estocásticos de planejamento e programação fornecem uma política de ope-


ração que minimiza uma função do custo de operação levando em conta as incertezas. Como
em geral, para variáveis aleatórias contínuas, não é possível calcular analiticamente a função
de custo futuro como a esperança das funções de custo total, aproxima-se a respectiva distri-
buição por uma distribuição discreta finita dada por uma árvore de cenários para representar
as incertezas. No problema de planejamento da operação do SIN, a geração dos cenários de
vazões é realizada utilizando modelos estocásticos periódicos autorregressivos, conhecidos
como modelos PAR(p). Nesta classe de modelos, a vazão em um determinado período é obti-
da como uma combinação dos valores das vazões de períodos passados e uma parcela aleató-
ria, que confere a incerteza ao processo. A parcela aleatória pode ser representada por ruídos
aditivos, como na formulação empregada no modelo GEVAZP atualmente em uso no setor, ou
através de ruídos multiplicativos. Neste item serão abordadas estas duas formas de construção
dos cenários.

6.3.1 – Conceitos básicos


As hipóteses fundamentais em modelagem de séries temporais são a estacionariedade e a
ergodicidade. De modo geral, a ideia de estacionariedade está relacionada às propriedades da
série temporal que são invariantes no tempo, como: média, desvio padrão e outros momentos
ou a distribuição conjunta das variáveis da série temporal. Já a ergodicidade corresponde à
capacidade de se estimar algumas estatísticas (momentos, tipicamente) da série a partir de
seus análogos amostrais.
A seguir, define-se alguns termos associados a um processo aleatório, por exemplo, e o
conceito de estacionariedade e ergodicidade.
Um processo aleatório é dito:
• Univariado – se a grandeza observada at é um escalar, at ∈ R, e não um vetor;
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   287 

• Periódico – se as propriedades estatísticas invariantes ao longo do tempo possuem


𝔼𝔼 adocumento
uma periodicidade fixa, denotada neste ! = 𝔼𝔼 apor!"𝕊𝕊 ;
• Estacionário de segundaCovordema!–, ase!"$ = Cov ainvariantes
as propriedades !"𝕊𝕊 , a!"𝕊𝕊"$
são a esperança e a
covariância entre as variáveis do processo. No contexto periódico, a estacionariedade
de segunda ordem (também chamada de correlação periódica) é enunciada como:

𝔼𝔼 a! = 𝔼𝔼
𝔼𝔼 aa!!"𝕊𝕊= 𝔼𝔼 a!"𝕊𝕊 (6.27)
Cov a!, a!"$
Cov =a!, Cov
a!"$ a= , a!"𝕊𝕊"$
!"𝕊𝕊 Cov a!"𝕊𝕊 , a!"𝕊𝕊"$

para todo inteiro t e k, isto é, a respectiva esperança é constante módulo 𝕊𝕊 e a covariância


módulo 𝕊𝕊 entre as variáveis só depende do lag k. Ao longo deste capítulo, o termo estacioná-
rio é usado para se referir à estacionariedade periódica de segunda ordem.
Para enfatizar as propriedades estatísticas de cada tempo é oportuno introduzir a ideia
de estação. Uma estação m é um índice entre 1 e 𝕊𝕊 que classifica cada tempo t em grupos,
de modo que em um dado grupo todas as variáveis associadas possuem o mesmo valor de
esperança e covariância (fixado o lag k). Em uma notação matemática, o tempo t associado à
estação m pode ser escrito como em (6.28) para algum índice ν ∈ ℤ! .

t = m + ν𝕊𝕊, (6.28)

Da definição de estacionariedade (6.27) e do conceito de estação, decorre um enunciado


mais explícito de estacionariedade de acordo com (6.29) para toda estação m e índice ν ∈ ℤ! ,
ou seja, em cada estação m a esperança é constante e a covariância só depende do lag k.

𝔼𝔼 a! = 𝔼𝔼𝔼𝔼aa!"#𝕊𝕊
! = 𝔼𝔼 a!"#𝕊𝕊 (6.29)
Cov a!, a!"%
Cov =
a! Cov
, a!"%a!"#𝕊𝕊 , a!"#𝕊𝕊"%
= Cov a!"#𝕊𝕊 , a!"#𝕊𝕊"%

Uma outra hipótese de modelagem fundamental do processo aleatório é a ergodicidade,
isto é, a capacidade de se estimar consistentemente estatísticas do processo aleatório a partir
de observações. Um processo aleatório estacionário e periódico é dito ergódico se valem os
limites dados em (6.30).

!! ()
1 !! ()
𝑙𝑙𝑙𝑙𝑙𝑙 1' a$%&𝕊𝕊 = 𝔼𝔼 a$
!! →# 𝑙𝑙𝑙𝑙𝑙𝑙N$ ' a$%&𝕊𝕊 = 𝔼𝔼 a$ (6.30)
!! →# N&*+ $
!",! () &*+
1 !",! ()
lim 1 ' a,%&𝕊𝕊 a$%&𝕊𝕊 = 𝔼𝔼 a, a$
limN,,$
!",! →# ' a,%&𝕊𝕊 a$%&𝕊𝕊 = 𝔼𝔼 a, a$
!",! →# N,,$ &*+
&*+
288    Previsão e geração de cenários de vazões

onde Nm é o número de amostras da estação m e Nl,m é o menor valor entre Nm e Nl. Em


outras palavras, as médias temporais de (6.30) convergem com probabilidade 1 para as respec-
tivas esperanças conforme o número de amostras aumenta.
A Vazão Mensal Natural Afluente em cada posto hidrológico e a Energia Mensal Natural
Afluente em cada subsistema são exemplos de fenômenos modelados por processos aleatórios
estacionários periódicos. Neste caso, cada registro é uma observação mensal e o período 𝕊𝕊
da série temporal é igual a doze (anual). A Figura 6.8 ilustra o comportamento sazonal da série
de energias naturais afluentes ao subsistema Sudeste.

Figura 6.8 – Energia natural afluente para o Subsistema SE (MWmês)

6.3.2 – Modelo periódico autorregressivo PAR(p)

6.3.2.1 – Formulação
Um modelo PAR é, em essência, um modelo autorregressivo (AR) para cada estação
m. Em modelos autorregressivos, a observação é explicada por uma combinação linear das
observações passadas mais um erro aditivo ϵt descorrelacionado. Formalmente, um processo
aleatório a! %$!"#$ é dito Periódico Autorregressivo de período 𝕊𝕊 e ordem (Pm) ordem p =
(p1,...,pm), PAR(p), se vale a relação em (6.31) para todo tempo t, onde m é a estação associada
ao tempo t.
&!
𝑎𝑎! = ζ" + % ϕ",$a!%$ + ϵ! (6.31)
$'(
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   289 

Os erros aditivos ϵ! %$
!"#$ do modelo PAR são descorrelacionados e cada componente
possui média zero e variância que depende apenas da estação m, assim como os coeficientes
e a ordem do PAR.
O modelo PAR está em sua forma centrada e reduzida se a relação (6.31) é válida para a
série formada pela variável at subtraída da média μt e dividida pelo desvio padrão σt, de acordo
com (6.32).
&!
a! − µ! a − µ!%$
= & ϕ",$ !%$ + ϵ! (6.32)
σ! σ!%$
$'(

Vale ressaltar que a nova série (a! − µ! )⁄σ! %$!"#$


possui, para todo t, média zero e desvio
ζ
padrão um, resultando em um intercepto ! igual a zero. Embora ambas as representações se-
jam equivalentes, o erro ϵt e os coeficientes ϕm,ν‘s das equações (6.31) e (6.32) são diferentes.
Uma propriedade importante para justificar o método de estimação de parâmetros Yule-
-Walker, a saber o teste de significância da autocorrelação parcial periódica e a estacionarie-
dade do processo aleatório gerado pelo PAR, é a condição de causalidade. O modelo PAR é
dito causal se por substituições sucessivas infinitas da expressão (6.31) ou (6.32) em cada at-ν
é possível obter a relação apresentada em (6.33)
&

𝑎𝑎! = # ψ",$ ϵ!%$ , (6.33)


$'(
$

onde os coeficientes ψm,l convergem absolutamente, i.e., ! 𝜓𝜓!,# < ∞


#%&
que é a condição para

que a expressão (6.33) defina uma variável aleatória com média finita. Decorre de (6.33) a
propriedade de descorrelação entre o erro ϵt e cada variável passada at-ν, dado em (6.33).
'

Cov a!"#, ϵ! = ( ψ$,& ϵ!"#"& , ϵ! = 0. (6.34)


&()

Observa-se que uma condição necessária e suficiente para a causalidade do PAR, mais
facilmente verificável do que a definição (6.33) é o polinômio característico induzido pelos
coeficientes ϕm,l possuir todas as raízes complexas fora do círculo unitário [16].

6.3.2.2 – Estimação dos parâmetros do modelo

Podemos citar três métodos de estimação de parâmetros: o método de Yule-Walker, o mé-


todo de mínimos quadrados e o método de mínimos quadrados com restrição nos coeficientes.
290    Previsão e geração de cenários de vazões

O método de Yule-Walker para estimação dos parâmetros do modelo PAR(p) se baseia


em construir um sistema linear para os coeficientes do modelo PAR a partir de sua definição e
propriedades. Esta construção é feita de modo que o número de equações seja igual ao número
de incógnitas e com isso seja explícito o cálculo deste estimador. Na seção a seguir, deduz-se o
sistema linear utilizado para calcular o estimador de Yule-Walker para o caso univariado. Uma
dedução para o caso univariado pode ser encontrada em [17].
O método dos mínimos quadrados é uma técnica de estimação de parâmetros que busca
o “melhor” ajuste do modelo aos dados. Em particular, o critério que mede a qualidade deste
ajuste é a soma das diferenças ao quadrado entre o valor realizado e o previsto em cada amos-
tra, de acordo com (6.35).

, (! +

min $ a$ − ζ% + $ ϕ%,&a$'& (6.35)


!! ,#!,#
$)* &)*

Assim, quanto menor o valor do critério mais bem ajustado é o modelo em relação a
esta medida. Observe que, se o problema de otimização (6.35) resultar em algum coeficiente
ζ"!, ϕ
& !,# , ϕ
& !,$ , … , ϕ
& !,% negativo, ainda será possível obter um valor negativo para a pre-
!
visão, conforme (6.36).
'!
Prev a!|a !"# = ζ)$ + + ϕ
- $,&a!"& (6.36)
&(#

Portanto, os coeficientes ζ"!, ϕ


& !,# , ϕ
& !,$ , … , ϕ
& !,% precisam ser todos positivos para se
!
garantir que as previsões sejam sempre positivas.
O método dos mínimos quadrados com restrições nos coeficientes consiste em uma abor-
dagem capaz de garantir que a previsão seja sempre positiva por meio de restrições nos coe-
ficientes, conforme (6.37).
/ +! .

min $ a' − ζ( + $ ϕ(,)a'*) (6.37)


!! "#, &!,#$%
',- ),-

Supondo que todos os coeficientes ζ"!, ϕ & !,# , ϕ


& !,$ , … , ϕ
& !,% sejam positivos então a
!

previsão é sempre positiva, pois supõe-se que o vetor at sempre o é. Admitindo que qualquer
valor positivo de afluência possa ocorrer então os coeficientes serem positivos é uma condição
necessária e suficiente para produzir previsões sempre positivas. Mais detalhes acerca destas
duas opções para estimação dos parâmetros podem ser encontrados em [18].
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   291 

6.3.2.3 – Determinação dos resíduos


O erro (ou ruído) do modelo PAR é definido como a diferença entre o valor observado e o
previsto, calculado de acordo com (6.38).
&!
ϵ! = a! − ζ" + ( ϕ",$a!%$ (6.38)
$'(

Como os valores verdadeiros dos parâmetros da equação (6.38) não são conhecidos a
priori, o ruído ϵt é não observável. O resíduo, por outro lado, é uma estimativa observável do
erro aditivo ϵt e é definido como a diferença entre o valor observado e o previsto estimado,
conforme (6.39).

&!
ϵ"! = a! − ζ(" + * ϕ
, ",$a!%$ (6.39)
$'(

Vale ressaltar que os resíduos ϵ"! para t de 1 até T são, em geral, dependentes, enquanto
os erros ϵt são, por hipótese, independentes.
Um dos principais usos dos resíduos é na estimação de quantidades que dependem dos
ruídos ϵt. Na próxima seção, descrevem-se alguns modelos de distribuição do ruído ϵt.

6.3.2.4 – Estimação da distribuição dos ruídos


Uma das hipóteses do modelo PAR é a distribuição do erro aditivo . Nesta seção, serão
discutidas duas opções de modelagem para a densidade de probabilidade do erro:

1. ϵ! ~𝒩𝒩(0, σ"! ), ou seja, o erro ϵ! segue uma distribuição normal com


média 0 e variância σ"! . Segue da hipótese de homocedasticidade do
modelo PAR que a variância dos erros são iguais módulo 𝕊𝕊, σ"! = σ"!#𝕊𝕊 ,
e, por isso, o erro ϵ! têm (módulo 𝕊𝕊) a mesma distribuição.

2. ϵ! ~ln𝒩𝒩 ∆! , u! , σ"! = Δ! + ln𝒩𝒩 u! , σ"! , ou seja, o erro ϵ! segue uma


distribuição lognormal com parâmetros u! e σ"! deslocada por um valor
Δ! . Segue da propriedade de que os parâmetros da lognormal são iguais
módulo 𝕊𝕊, ∆! , u! , σ"! = ∆!#𝕊𝕊 , u!#𝕊𝕊 , σ"!#𝕊𝕊 , que ϵ! têm (módulo 𝕊𝕊) a
mesma distribuição.
292    Previsão e geração de cenários de vazões

"
A primeira opção de modelagem, ϵ! ~𝒩𝒩(0, σ! ) , admite que o erro aditivo possa assumir
qualquer valor real. Com isso, sempre existe a possibilidade de uma sequência de erros nega-
tivos resultar em um valor negativo para at. Nas simulações que consideram esta distribuição
do erro, valores negativos para são observados.
"
A segunda opção de modelagem, ϵ! ~ Δ! + ln𝒩𝒩 u!, σ! , surgiu como uma forma de pro-
duzir valores sempre positivos de at. A proposta de [20] utiliza uma regra para a obtenção de
Δt que depende das observações passadas até t-1, a[t-1] ∶= ( a1,a0,… at-1 ).

6.3.2.5 – Identificação do modelo

Critério da autocorrelação parcial periódica


O critério da autocorrelação parcial periódica é um método para identificação de modelos
aplicável à seleção da ordem do modelo PAR univariado. A autocorrelação parcial perió-
dica de lag k e estação m para uma série temporal periodicamente estacionária a! %$ !"#$
é definida como o k-ésimo coeficiente ϕm,kk do ajuste de um PAR centrado e reduzido com
ordem k para a estação m, dado por (6.40), ondet = s,
t = s, s + 𝕊𝕊,
s +… 𝕊𝕊,
, s…+, sq+
! 𝕊𝕊 q
; !q𝕊𝕊sS; μt = E[at]; e
"/$
σ! = Var a! e ϵ! é um erro independente e identicamente distribuído módulo com mé-
dia 0 e variância 1.
%
a! − µ! a!&$ − µ!&$
= & ϕ",$% + ϵ! (6.40)
σ! σ!&$
$'(

Por uma questão de notação, é conveniente acrescentar a informação da ordem k do mo-


delo PAR como subíndice dos coeficientes em (6.40) ou seja, ϕm,ν= ϕm,νk .
Um modo de calcular o valor da autocorrelação parcial periódica ϕm,kk é via sistema de
Yule-Walker, mostrado a seguir. Ao multiplicar por a!"# − µ!"# %σ!"# ambos os lados da
equação (6.40) do modelo PAR e tomar o valor esperado, obtém-se a identidade mostrada em
(6.41).
'
a! − µ! a!"# − µ!"# a!"& − µ!"& a!"# − µ!"#
𝔼𝔼 = ' ϕ$,&'𝔼𝔼
σ! σ!"# σ!"& σ!"#
&() (6.41)
a!"# − µ!"#
+ 𝔼𝔼 ϵ! .
σ!"#

Cada termo da equação (6.41) envolvendo apenas as variáveis refere-se à autocorrelação


periódica, que é definida por (6.42).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   293 

Cov a!, a!"# 𝔼𝔼 a! − µ! a!"# − µ!"#


ρ! j = $⁄%
= (6.42)
Var a! $⁄% Var a!"# σ!σ!"#

Supondo a condição de causalidade, tem-se que o erro ϵt é descorrelacionado de at-j para


todo j maior do que ou igual a 1. Consequentemente, a equação (6.41) pode ser escrita como
em (6.43).
%

ρ! j = $ ϕ",$%ρ!&' ν − j , ∀ ≥ 1. (6.43)
$()

Variando j entre 1 e k é possível montar o sistema linear em (6.44) envolvendo os coefi-


cientes do modelo PAR.

ρ! 1 ρ!"# 0 ρ!"# 1 ρ!"# k − 1 ϕ&,#%


⋯ ϕ&,$%
ρ! 2 ρ!"$ −1 ρ!"$ 0 ρ!"$ k − 2
= (6.44)
⋮ ⋮ ⋮ ⋱ ⋮ ⋮
ρ! k ρ!"% 1 − k ρ!"% 2 − k ⋯ ρ!"% 0 ϕ&,%%

Pela propriedade ρt (j) = ρt-j (-j), pode-se reescrever (6.44) como (6.45),

ρ! 1 ρ!"# 0 ρ!"# 1 ρ!"# k − 1 ϕ&,#%


⋯ ϕ&,$%
ρ! 2 ρ!"# 1 ρ!"$ 0 ρ!"$ k − 2
= (6.45)
⋮ ⋮ ⋮ ⋱ ⋮ ⋮
ρ! k ρ!"# k − 1 ρ!"$ 2 − k ⋯ ρ!"% 0 ϕ&,%%

ou seja, a matriz que multiplica os coeficientes de (6.44) é simétrica, o que reduz o número
de valores que precisam ser estimados. O sistema de equações dado por (6.45) é chamado de
sistema de Yule-Walker. Define-se a autocorrelação parcial periódica ϕm,kk da estação m e lag
k como a última componente da solução do sistema de Yule-Walker.
Na prática, para se estimar o valor da autocorrelação parcial ϕm,kk é preciso antes estimar
os valores da autocorrelação ρt(j). Em (6.46) sugere-se uma forma de estimar ρt(j):
294    Previsão e geração de cenários de vazões

+! "$
( a!, a!"#
Cov 1
ρ"! j = , σ ( a! , a!
,! = Cov $⁄% , µ"! = 1 a'()𝕊𝕊 ,
σ
,! σ
,!"# N'
),-
+",! "$ (6.46)
1
( a!, a!"#
Cov = 1 a'()𝕊𝕊 − µ"! a.()𝕊𝕊 − µ"!"# ,
N.,'
),-

onde m e l são as estações associadas a t e t - j; Nm e Nl são o número de amostras da es-


tação m e l; Nl,m é o mínimo entre Nl, e Nm. Pela hipótese de ergodicidade, esses estimadores
"
são consistentes. Com isso, define-se o estimador da autocorrelação parcial periódica ϕ!,##
de lag k para a estação m como a última componente da solução do sistema de Yule-Walker
dado em (6.47) com as autocorrelações periódicas estimadas ρ"! j :

ρ"! 1 ρ"!"# 0 ρ"!"# 1 ρ"!"# k − 1 - &,#%


ϕ
⋯ - &,$%
ρ"! 2 ρ"!"# 1 ρ"!"$ 0 ρ"!"$ k − 2 ϕ
= (6.47)
⋮ ⋮ ⋮ ⋱ ⋮ ⋮
ρ"! k ρ"!"# k − 1 ρ"!"$ 2 − k ⋯ ρ"!"% 0 -
ϕ&,%%

Uma consequência da autocorrelação parcial de uma série temporal que segue um modelo
PAR é que se a ordem do PAR em uma dada estação m é menor do que k, então o valor da
correspondente autocorrelação parcial ϕm,kk é zero. Com essa informação, tem-se a motivação
para usar a autocorrelação parcial para identificar a ordem de um modelo PAR univariado.
Note que, na prática, a variação aleatória amostral e o número finito de dados faz com que o
estimador ϕ " !,## seja não nulo para todo k. Adicionalmente, o respectivo estimador ϕ " !,##
dividido pela raíz quadrada do número de amostras associadas à estação s converge para uma
distribuição normal de média 0 e variância 1, como enunciado pelo teorema a seguir.
%$
Teorema: Seja a! !"#$ um processo aleatório PAR(p) causal de ordem para a estação
m. Então, a autocorrelação parcial periódica estimada ϕ " !,## na escala apropriada converge
em distribuição para a normal padrão, para todo k maior do que pm:

ρ"! 1 ρ"!"# 0 ρ"!"# 1 ρ"!"# k − 1 - &,#%


ϕ
⋯ - &,$%
ρ"! 2 ρ"!"# 1 ρ"!"$ 0 ρ"!"$ k − 2 ϕ

=
⋱ ⋮
(6.48)
⋮ ⋮ ⋮
ρ"! k ρ"!"# k − 1 ρ"!"$ 2 − k ⋯ ρ"!"% 0 -
ϕ&,%%

onde Nm é o número de amostras da estação m.


Essa propriedade do estimador de autocorrelação parcial periódica permite construir o
seguinte teste de hipótese para a identificação da ordem do modelo PAR:
H0: O processo aleatório é um PAR de ordem para a estação m.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   295 

H1: O processo aleatório não é um PAR de ordem para a estação m.


O teste estatístico consiste em rejeitar a hipótese nula H0 se N! " ϕ$!,## > z$&% , onde α é o ta-
manho do teste e zα é o α-quantil superior da distribuição normal padrão, ou seja, zα = F-1 (1 - α)
tal que é a função distribuição acumulada da normal padrão. Isso quer dizer que se α é igual a
0,05, este critério irá sugerir em 5% das vezes que ϕ " !,## é significativo quando na verdade não é.
A justificativa dessa afirmativa é dada pelo resultado seguinte:

Teorema: Assintoticamente, o teste acima possui tamanho α, ou seja:

)! →+
ℙ % !,## > z %⁄& H( é válida
N! # ϕ α (6.49)

A ordem pm do modelo PAR(p) univariado para a estação pode ser identificada aplicando
o teste acima para cada ordem candidata p =1,2,…,pmax e admitindo aquela que não for rejei-
tada pelo teste estatístico. Costuma-se utilizar para realizar este teste de hipótese, isto é, zα⁄(2
≈1,96. A Figura 6.9 ilustra a função de autocorrelação parcial correspondente a um modelo
autorregressivo de ordem 1. Observe que os valores de ϕm,kk são estatisticamente nulos para
valores de k maiores do que um.

Figura 6.9 – Função de autocorrelação parcial estimada para um modelo AR(1)

Existem dois procedimentos que são utilizados para definir a ordem do modelo PAR:
• percorrer as ordens candidatas de maneira crescente e sugerir como ordem do modelo
a anterior à primeira não rejeição da hipótese nula;
• percorrer as ordens candidatas de maneira decrescente e sugerir como ordem do mo-
delo a primeira que rejeita a hipótese nula.

Estas opções podem gerar resultados diferentes.


296    Previsão e geração de cenários de vazões

Estimação da variância do erro aditivo


Para que o modelo PAR esteja bem definido é necessário, além de estimar os parâmetros,
estimar também a variância do erro aditivo . Nesta seção, apresenta-se a equação que rela-
ciona a variância do erro e os parâmetros do PAR como uma decorrência natural da dedução
do sistema de Yule-Walker. Para j igual a zero, reescreve-se a equação (6.41) em razão das
autocorrelações periódicas ρt (∙),, de acordo com (6.50).

%
a! − µ!
ρ!(0) = & ϕ",$%ρ! 0 + 𝔼𝔼 ϵ! (6.50)
σ!
$&'

Substituindo a fórmula (6.40) do modelo PAR no argumento da esperança de (6.50), en-


contra-se uma expressão envolvendo os erros ϵt, conforme em (6.51).
% %
a!($ − µ!($
ρ!(0) = & ϕ",$%ρ! ν + & ϕ",$% 𝔼𝔼 ϵ! + 𝔼𝔼 ϵ!ϵ! . (6.51)
σ!($
$&' $&'

Supondo a causalidade do modelo PAR, tem-se que ϵt e (a!"# − µ!"#%⁄σ!"# são descorre-
lacionados, e consequentemente a esperança do produto dessas variáveis é zero. Como a au-
tocorrelação periódica ρt (0) é igual a 1 e Var[ϵt] é igual a E[ϵt2], pois a média do erro ϵt é zero,
conclui-se a equação que relaciona a variância do erro ϵt e os parâmetros do modelo PAR:
%

Var(ϵ!) = 1 − * ϕ",$%ρ! ν . (6.52)


$&'

A partir da equação (6.52) define-se o estimador da variância do erro ϵt por (6.53), onde
ρ"! ν é um estimador da autocorrelação periódica e ϕ " !,##
é um estimador do coeficiente ϕm,kk
do modelo PAR, dado por Yule-Walker, por exemplo.

%
$ (ϵ!) =
Var - ",$%ρ/! ν ,
1− +ϕ (6.53)
$&'

Critério de informação Bayesiano (BIC)


O Critério de Informação Bayesiano (BIC) é um critério para a escolha de modelos base-
ado em um índice que quantifica a qualidade dos respectivos ajustes. Por definição, o índice
associado ao BIC considera dois termos: o logaritmo da verossimilhança e uma penalidade no
número de parâmetros pressupostos pelo modelo.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   297 

A função de verossimilhança é definida como a probabilidade conjunta dos dados obser-


vados {a1,a2,… }, fixado o modelo estatístico em questão. Intuitivamente, a verossimilhança
mede o quão provável seria obter as mesmas observações se o modelo sugerido fosse o “ver-
dadeiro”. Em geral, quanto maior o número de parâmetros maior é o valor da verossimilhança,
porém modelos com muitos parâmetros podem produzir um sobreajuste. O sobreajuste ocorre
quando o modelo considera informações puramente aleatórias como parte de sua componente
determinística. Modelos com esta característica costumam ter uma péssima capacidade predi-
tiva, o que justifica o uso de um índice para a escolha de modelos que penalize o número de
parâmetros face ao valor da verossimilhança. O BIC é um exemplo de índice que pode ser usa-
do para a seleção da ordem do modelo PAR. Na prática o BIC classifica como bom o modelo
que possui um equilíbrio entre a explicação dos dados observados e o número de parâmetros.
A expressão do critério BIC para modelos lineares univariados é apresentada a seguir. De-
nota-se por M um dado modelo, por ϕ o vetor de parâmetros associados, por a[T] as respectivas
observações até o tempo T e por f a ! M, φ
' a função de verossimilhança. Com base nesta
notação, o índice BIC pode ser escrito como em (6.54), onde φ" é um estimador dos parâme-
tros, n φ
# é o número de parâmetros e T é o total de observações.

BIC ∶= −2 log f a ! M, φ
1 + n φ
1 log T (6.54)

Por uma convenção de sinal, quanto menor o valor do BIC melhor é o modelo em relação
a este critério.

6.3.2.6 – Geração de cenários


Um cenário é uma possível realização das variáveis aleatórias {a1,a2,… } definidas por um
modelo, isto é, um cenário é uma possível sequência de ocorrências definida pela modelagem
da série temporal. Supondo identificada a ordem do modelo PAR, estimados os respectivos
coeficientes e a distribuição dos ruídos, é possível simular o valor de a! apenas sorteando
ruídos ϵt e usando a definição do PAR, conforme (6.55), onde ζ"! é toda a parte determinística
do modelo.
&!
a! = ζ$" + & ϕ
( ",$a!%$ + ϵ!, (6.55)
$'(

Em seguida, sorteia-se o ruído e, por meio da mesma fórmula acima, calcula-se a realiza-
ção a partir dos valores das variáveis anteriores. Repetindo-se esse procedimento, obtém-se
uma realização

6.3.2.7 – Geração de cenários multivariados


O modelo PAR(p) acima descrito é um modelo univariado, isto é, ajusta-se um conjunto
de parâmetros para cada série disponível. Entretanto, o modelo de planejamento do Sistema
298    Previsão e geração de cenários de vazões

Interligado Nacional considera a correlação espacial que existe entre as séries de afluências na
distribuição conjunta dos ruídos e o procedimento adotado para isso é descrito abaixo.
Seja ϵt o vetor (multivariado) de resíduos serialmente descorrelatados, normalmente dis-
tribuídos com média 0 e matriz de covariância Σ estimada a partir dos resíduos históricos ob-
tidos a partir dos modelos univariados PAR(p) para cada uma das séries. O vetor ϵt incorpora
a dependência espacial, enquanto o modelo univariado PAR(p) incorpora a dependência se-
rial. Usando a decomposição de Cholesky na matriz de correlação espacial de vazão, Σ=CCT,
obtemos o vetor de erros espacialmente correlatados ϵt por meio da relação ϵt = Cr, onde r é
vetor de variáveis gaussianas padrão independentes. Se o modelo dos ruídos é uma lognor-
mal a três parâmetros, então além do procedimento descrito é somado ut a ϵt, exponenciando
cada componente do vetor resultante e somado Δt para obter o erro 𝛜𝛜"! que segue a lognormal
multivariada a três parâmetros. A partir disso, o procedimento de geração de cenários segue
como o usual.

6.4 – Perspectivas de aprimoramento da previsão e geração


de cenários de vazões

Como comentado no item 6.2, em 2021, a previsão de vazões para a primeira semana
operativa de todas as bacias hidrográficas do SIN deverá ser realizada exclusivamente pelo
modelo SMAP/ONS.
Em função de seu bom desempenho em todas as bacias nas quais o modelo SMAP/ONS
foi testado, o ONS iniciou, em 2018, estudos para testar a ampliação do horizonte de seu
uso até o final do primeiro mês operativo. O projeto deverá estar concluído em 2020, com o
desenvolvimento de metodologias e realização de testes comparativos de desempenho com
o modelo PREVIVAZ. Em caso de sucesso nesses testes, o modelo SMAP/ONS, de forma
gradativa entre 2020 e 2021, passará a ser o único modelo a ser utilizado para a previsão de
vazões do primeiro mês operativo.
Além disso, desde 2013, o ONS participa de reuniões sistemáticas sobre a crise hídrica das
bacias dos rios São Francisco, Tocantins, Paranapanema, Paranaíba e de rios da região Sul,
sob a coordenação da ANA, sob a coordenação da ANA e participação do Ministério de Minas
e Energia (MME), ANEEL, ONS e diversos usuários de água na bacia. Essas reuniões têm o
objetivo de promover a articulação entre os diferentes atores com atuação na bacia e viabilizar
a tomada de decisão para a mitigação de impactos. Cabe ressaltar que, desde dezembro/2017,
o modelo SMAP/ONS já é utilizado, com sucesso, na geração de cenários possíveis de vazões
afluentes aos principais reservatórios dessas bacias, para simulações de armazenamentos para
um horizonte de até nove meses à frente.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   299 

Dessa forma, a princípio, é possível o uso mais abrangente do modelo SMAP/ONS em


um futuro próximo, não só para a gestão de recursos hídricos, como também para subsidiar
a programação e o planejamento da operação do SIN, tanto para previsão de vazões a curto/
médio prazo, como também para geração de cenários de vazões/ENAs a longo prazo, com ou
sem incorporação de informações climáticas.
300    Previsão e geração de cenários de vazões

REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

1. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; Revisão das séries de vazões naturais nas principais
bacias do sistema interligado nacional – Relatório executivo; 2005.
2. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; Revisão das séries de vazões naturais em bacias do
sistema interligado nacional – Relatório executivo; 2011.
3. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; ONS/NT0144/2018; Metodologia de reconstituição e
tratamento das vazões naturais; 2018.
4. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; Consórcio Fahma/Dzeta, Estimativa das vazões para
atividades de uso consuntivo da água nas principais bacias do sistema interligado nacional – Metodo-
logia e resultados consolidados – Relatório final; 2003.
5. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; Consórcio Fahma/Dreer, Estimativa das vazões para
atividades de uso consuntivo da água em bacias do sistema interligado nacional – Metodologia e re-
sultados consolidados; 2005.
6. Morton FI. Operational Estimates of Lake Evaporation. Journal of Hydrology 1983;66(114):77-100.
7. Morton FI, Ricard F, Fogorasi S. Operational Estimates of Areal Evapotranspiration and Lake Evapo-
ration – Program WREVAP; National Hydrology Research Institute; Paper nº 24, Enviroment Canada;
1985.
8. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico, ONS/RE3/214/2004; Evaporações líquidas nas usinas
hidrelétricas.
9. Barth FT; Pompeu CT, Fill HD, Tucci CEM, Kelman J, Braga B P F. Modelos para gerenciamento de
recursos hídricos. Coleção ABRH de Recursos Hídricos, Nobel/ABRH; 1987.
10. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico, ONS/NT0156/2016; Uso de previsão de precipitação
por conjunto para a previsão de vazões da primeira semana operativa; Rev. 10;2019.
11. Eletrobras Cepel – Centro de Pesquisas de Energia Elétrica; Manual de referência do modelo PREVI-
VAZH: modelos computacionais para previsão de afluências diárias, semanais e mensais.
12. Eletrobras Cepel – Centro de Pesquisas de Energia Elétrica; PREVIVAZ – Modelo de previsão de
vazões semanais afluentes aos aproveitamentos hidroelétricos do sistema brasileiro – Manual de
metodologia.
13. ONS  –  Operador Nacional do Sistema Elétrico, ONS/NT0097/2018-RV3; Aplicação do modelo
SMAP/ONS para previsão de vazões no âmbito do SIN; 2019.
14. ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico; Aplicativo SMAP – Manual de metodologia; 2017.
15. Lopes JEG, Braga BPF, Conejo JGL. SMAP – A simplified hydrological model, applied modelling in
catchment hydrology. Ed. V.P. Singh, Water Resources Publications; 1982.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   301 

16. Brockwell PJ, Davis RA. Introduction to time series and forecasting; Springer Science & Business
Media; 2006.
17. Hipel KW, Mcleod AI. Time series modelling of water resources and environmental systems. Elsevier,
1994.
18. Cabral FG. Uma proposta de um modelo periódico multivariado autorregressivo multiplicativo para
geração de cenários de afluência aplicável ao modelo de planejamento do Setor Elétrico Brasileiro;
Dissertação de mestrado, Coppe/UFRJ; 2016.
19. Pereira MVF, Pinto LMVG. Multi-stage stochastic optimization applied to energy planning. Math.
Programming 1991;52(2);Ser. B:359-375.
20. Maceira MEPM, Penna DDJ, Damázio JM. Geração de cenários sintéticos de energia e vazão para o
planejamento da operação energética; cadernos do IME – Série Estatística, UERJ 2006; (21):11-35.
7
PREVISÃO DE GERAÇÃO EÓLICA E FOTOVOLTAICA

A crescente expansão da capacidade instalada de usinas eólicas especificamente nas re-


giões Nordeste e Sul do Brasil e fotovoltaicas nas regiões Nordeste e Sudeste, impuseram
ao Operador Nacional do Sistema Elétrico - ONS duas necessidades: aperfeiçoar os estudos
elétricos para fazer face à geração de alta variabilidade e prever com a necessária precisão a
geração de fonte eólica e solar para a programação diária e operação em tempo real, de for-
ma a reduzir a necessidade de reserva de potência operativa e possibilitar o melhor uso dos
recursos.
O desenvolvimento do modelo de previsão de geração eólica foi iniciado em março de
2016, com o objetivo inicial de prover, até o final deste mesmo ano, a previsão de geração de
fonte eólica para a programação diária do subsistema Nordeste. Em 2017, o desenvolvimento
ficou voltado para o tempo real e para a programação diária do subsistema Sul. O modelo de
previsão solar fotovoltaica, no entanto, está em fase de construção, iniciada em 2019.

7.1 – Dados disponíveis para previsão de fonte eólica e solar

No levantamento das informações necessárias para o desenvolvimento dos modelos, veri-


ficou-se que os dados necessários estavam distribuídos em diversas instituições do setor elé-
trico: na Empresa de Pesquisa Energética (EPE), na Câmara de Comercialização de Energia
Elétrica (CCEE), na Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL); e o próprio Operador
Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Sendo assim, foi constituída uma Base de Dados de
Eólica-Solar unificada com todos os dados necessários para o desenvolvimento dos modelos
de previsão dessas fontes.

7.1.1 – Dados observados das usinas eólicas e solares


Conforme já mencionado, os dados disponíveis para previsão são oriundos da base de
dados, de uso do ONS. Os dados observados/verificados de geração, velocidade e direção do
vento, temperatura, irradiância, entre outros, são obtidos da base histórica de tempo real do
Sistema de Supervisão e Controle do ONS (discretização de 4 em 4 segundos), denominado
PI/REGER. A geração verificada também é obtida pelo Sistema de Medição e Faturamento da
CCEE (discretização em intervalos 5 minutos e 1 hora). Os dados observados/verificados da
velocidade do vento também são obtidos do Sistema Acompanhamento das Medições Anemo-
métricas da EPE (discretização em intervalos 10 minutos).
304    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

7.1.2 – Modelos de previsão numérica do tempo

Modelos de previsão numérica de tempo são equações que descrevem os movimentos


atmosféricos a partir do estado real do sistema oceano-atmosfera. A solução dessas equações,
resolvidas por métodos numéricos, são as previsões de variáveis meteorológicas em escala
temporal que varia de horas a aproximadamente uma ou duas semanas, e em escala espacial
que varia de metros a centenas de quilômetros. As resoluções temporal e espacial dos modelos
dependem do tipo de sistema meteorológico em questão. Idealmente, como exemplo para a
previsão solar fotovoltaica, a variação de nebulosidade deve ser resolvida em escala temporal
de minutos ou horas (microescala) e resolução espacial de poucos quilômetros enquanto o fe-
nômeno El Niño pode ser resolvido em escalas temporais e espaciais maiores (grande escala
ou escala global).
De maneira geral, modelos globais têm resolução espacial de centenas de quilômetros de
extensão, modelos regionais de dezenas de quilômetros e modelos de mesoescala de alguns
quilômetros de extensão. Cada um desses modelos tem foco de previsão em diferentes esca-
las ou resoluções temporais. Modelos globais focam a previsão para o médio prazo enquanto
modelos de mesoescala têm como objetivo principal o nowcasting ou curtíssimo prazo. A
performance de cada desses modelos depende da qualidade das observações do estado atual
atmosférico utilizadas como entrada nos modelos (condição inicial), da dificuldade da repre-
sentação completa do sistema terrestre devido a processos complexos e não lineares, aliada às
parametrizações, tornando complicada a previsão de algumas variáveis, tais como radiação e
nebulosidade.
Usualmente, é necessária a aplicação de modelos estatísticos de pós-processamento, onde
a saída dos modelos NWPs é tratada usando dados das observações, tentando encontrar al-
guma relação estatística e, dessa forma, corrigir o desvio. Exemplo de tal aplicação pode ser
encontrada em [1], onde os autores criaram um mecanismo de assimilação dos dados de vento
previsto e verificado e em [2], onde foi realizado um refinamento estatístico das previsões
horárias de temperatura a 2 m do modelo numérico Eta em estações do Nordeste do Brasil.
Atualmente, as séries de vento previsto provêm dos seguintes modelos meteorológicos:
• Eta, do CPTEC (Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos), com resolução
espacial de ~15 km e temporal de 1h, estendendo a previsão para o dia corrente e mais
5 dias à frente. Esse modelo foi descontinuado, recentemente, pelo CPTEC e substitu-
ído pelo modelo Eta~5 km, mantendo-se a discretização temporal de 1h, estendendo a
previsão para o dia corrente e mais 2 dias à frente. Há uma perspectiva de que o mode-
lo Eta~5 km também será descontinuado pelo CPTEC e substituído pelo modelo WRF
(Weather Research and Forecasting), com discretização espacial de aproximadamente
5 km e temporal de 1h, com previsões para o dia corrente e mais 2 dias à frente.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   305 

• GFS (Global Forecast System), do NOAA (National Oceanic and Atmospheric Admi-
nistration), com resolução espacial de ~25 km e temporal de 1h, estendendo a previsão
para o dia corrente e mais 4 dias à frente.
• HRES (High Resolution) e Ensemble, do ECMWF (European Centre for Medium
– Range Weather Forecasts), com resolução espacial de ~20 km e temporal de 3h,
estendendo a previsão para o dia corrente e mais 5 dias à frente.
• BAM, do CPTEC com resolução espacial de ~20 km e temporal de 1h, estendendo a
previsão para o dia corrente e mais 10 dias à frente.

A expectativa é utilizar os mesmos modelos usados para previsão de geração de fonte eó-
lica na previsão de solar fotovoltaica. Entretanto, para os testes iniciais, os primeiros dados a
serem utilizados para a previsão de geração por fonte solar foram do modelo GFS. No futuro,
pretende-se utilizar o modelo regional WRF e ECMWF.
A Figura 7.1 ilustra um resumo da base de dados construída no ONS para dar suporte as
previsões eólicas e fotovoltaicas.

Figura 7.1 – Base de dados de fontes renováveis eólica e fotovoltaica do ONS

7.2 – Modelo de previsão de geração eólica

O desenvolvimento metodológico foi dividido em três módulos, conforme mostra a Figu-


ra 7.2. O Módulo 1 está relacionado aos processos de tratamento e preparação dos dados para
a etapa de previsão (Módulo 2). O Módulo 3 trata de algoritmos de análises e de impressão de
dados para processos internos do ONS.
306    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Resumidamente, os dados obtidos no Módulo 1, após passar pela triagem inicial (não
representada na Figura 7.2), passam por processo de limpeza, em que valores espúrios são eli-
minados. Em seguida, as lacunas são preenchidas, resultando no melhor histórico possível dos
dados verificados de geração e velocidade do vento. Adicionalmente, a velocidade do vento
prevista passa por ajustes, para retirada de viés.
O histórico verificado de vento e geração alimenta um modelo de criação dinâmica das
curvas Vento x Potência. Essas curvas e o vento previsto ajustado são então utilizados pelo
modelo de previsão de geração de fonte eólica (Módulo 2). É gerada então uma previsão com-
binada das previsões resultantes de todos os modelos meteorológicos.
Ao final do processo, tem-se a previsão de geração de fonte eólica para o Nordeste e Sul,
para o dia corrente e para n dias à frente. Cabe aqui um esclarecimento: considerando a apli-
cação da previsão tanto para o Tempo Real quanto para a Programação Diária, o dia corrente é
alvo de previsão. Dessa forma, tal como no Tempo Real, o dia corrente é designado pela letra
D. Em razão disso, os dias posteriores são representados por D+1, D+2 etc. Na Programação
Diária, por sua vez, o alvo é o dia seguinte, que é designado pela letra D. Disso decorre que
para o dia D da Programação Diária se utiliza a previsão de geração eólica para D+1.

Figura 7.2 – Etapas da metodologia de previsão de geração de fonte eólica da programação


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   307 

7.2.1 – Tratamento de dados


Para compor os dados históricos relativos às séries temporais de velocidade de vento e
geração de fonte eólica, consideram-se dados relativos à informação de velocidade do vento
verificada e prevista, bem como os dados de geração eólica verificada provenientes das diver-
sas fontes de informação.
São três os tipos de dados necessários para os modelos de previsão: os dados de geração
verificada, os dados de vento verificado e os dados de vento previsto, sendo que todos pos-
suem diferentes características, necessitando de tratamentos diferenciados.

7.2.1.1 – Tipos de dados e triagem


Para compor os dados históricos relativos às séries temporais de velocidade do vento e
de geração de fonte eólica, armazenam-se os dados relativos à informação de velocidade do
vento verificada e prevista, bem como os dados de geração eólica verificada provenientes das
diversas fontes de informação. Como a discretização temporal é diferente, dependendo da
origem, todos os dados históricos foram transformados para discretização de 30 minutos, utili-
zando médias dos intervalos quando a discretização original é menor que 30 minutos e através
de interpolação linear quando a discretização original é maior que 30 minutos.
Os dados de geração verificada, obtidos da base histórica de tempo real do ONS, possuem
indicadores de qualidade das medidas coletadas e, adicionalmente, valores estimados advin-
dos de estimadores de estado. Assim sendo, esses dados apresentam boa qualidade. Neste
contexto, o processo de tratamento causa menor impacto nos dados de geração verificada.
Entretanto, em alguns momentos, os estimadores e a própria medida apresentam-se em falha.
Os dados de vento verificado obtidos do sistema de supervisão e controle do ONS pos-
suem, também, indicadores de qualidade das medições. No entanto, por não ser uma medida
elétrica, não existem estimadores capazes de reproduzir os valores nos momentos de erros na
coleta dos dados. Consequentemente, nesta situação, a aplicação do tratamento é bem mais
atuante, uma vez que existem muitos dados comprometidos.
O ONS criou um processo que realiza a identificação dos dados de geração considerados
espúrios [3]. Tal processo pode ser resumido nas seguintes etapas:
• Correlacionar dados do ONS com dados da CCEE de 1h.
• Eliminar resultados ruins do Estimador de Estados do nos.
• Eliminar dados onde: Ge r< 0MW ou Ger>1.1∙Pinst MW.
• Eliminar dados congelados (ao longo dos dias e das horas).
• Eliminar dados dos dias com menos de 2,5 horas válidas.

O processo de seleção dos dados válidos de vento verificado pode ser resumido da seguin-
te forma:
308    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

• Correlacionar os dados de vento verificado do PI com o vento verificado da EPE e com


a geração da CCEE1h.
• Eliminar dados onde: Ven<0 m/s ou Ven>30 m/s.
• Eliminar dados congelados (ao longo dos dias e das horas).
• Eliminar dados dos dias com menos de 2,5 horas válidos.

Maiores detalhes sobre o algoritmo de identificação de dados espúrios podem ser encon-
trados na Nota Técnica do Operador Nacional do Sistema Elétrico [3].
Uma vez que há redundância de informações de geração verificada, do ONS e da CCEE, e
de vento verificado, do ONS e da EPE, é possível montar uma série histórica de geração verifi-
cada em intervalos de 30 minutos com os melhores dados possíveis. Ainda assim, nem sempre
é possível obter os dados medidos para todos intervalos de tempo a partir destas fontes. Para
tanto, foram criados alguns processos de reconstrução das informações de geração verificada.
A Figura 7.3 destaca os processos para composição do Melhor Histórico de Geração (MHG).

Figura 7.3 – Processo de montagem do melhor histórico de geração verificada

O processo de montagem do MHG apresentado na Figura 7.3 considera quatro possibili-


dades para preenchimentos de falhas nos históricos de geração, sendo que os dados provenien-
tes do PI já passaram pelo processo de identificação de dados espúrios, descrito anteriormente.
Desta forma, em cada intervalo de discretização, o dado é preenchido sequencialmente da
seguinte forma:
(I) Dados da CCEE.
(II) Dados do PI/REGER.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   309 

(III) Físico Estimado – Se após os passos anteriores o histórico de geração ainda apre-
sentar falhas, uma terceira opção é realizada. De posse do histórico parcial da 1ª e 2ª opção,
calibra-se para esta usina um conjunto de 48 equações que relacionam vento e geração, uma
para cada intervalo de meia-hora do dia. Para isso é necessário um conjunto mínimo de pontos
(geração e vento). A condição necessária para obtenção destes pontos é o histórico possuir
trinta dias com medidas válidas (vento e geração) para cada intervalo de meia hora. No caso
de geração nula, o par vento-geração é sempre considerado como inválido, uma vez que, de
forma geral, representa alguma operação atípica, com restrições. A ordem de escolha do his-
tórico de vento mínimo segue a seguinte ordem: (a) Vento verificado da EPE; (b) Vento veri-
ficado do PI; (c) Vizinhança – se após os passos (a) e (b) ainda não for possível a constituição
de um histórico mínimo de acordo com a condição necessária, são utilizados dados de vento
verificado de usinas próximas, considerando-se até 9 usinas mais próximas em um raio de 7
km, na mesma ordem dos itens (a) e (b). Aplica-se o processo para cada usina i=1 a 9, pela
ordem de proximidade, avançando sempre que a condição necessária não é atendida.

Para o ajuste matemático das curvas do parque, optou-se pelo uso de regressões logísticas,
uma vez que estas se adequam muito bem à curva Vento x Potência. A equação da regressão
logística é escrita como:
T−B
Ger = B + (7.1)
1 + 10! "!"# #"$% &

onde: B e T são parte inferior e superior das assíntotas, respectivamente, b e Vmid são a
inclinação e a coordenada x do ponto de inflexão, respectivamente, e s é um coeficiente.

(IV) Média – se as opções 1, 2 e 3 não forem suficientes para completar todos os dados
faltantes do histórico, estes são calculados tomando a média aritmética dos valores de 3 dias
anteriores e 3 dias posteriores para aquele determinado intervalo em falta do dia. Esta opção é
um último recurso para tornar a série temporal completa. Espera-se, portanto, que seja muito
menos utilizada que as demais, de forma a não comprometer a qualidade do histórico.

A montagem do melhor histórico de vento apresenta características similares à montagem


do melhor histórico de geração. Para tanto, são utilizadas as informações advindas do PI e da
EPE. Como ocorre na geração, há necessidade de alguns processos de reconstrução das infor-
mações de vento verificado, uma vez que nem sempre é possível obter os dados medidos para
todos intervalos de tempo com estas fontes. A Figura 7.4 destaca os processos para composi-
ção do Melhor Histórico de Vento (MHV).
310    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.4 – Processo de montagem do melhor histórico de vento verificado

O processo de montagem do MHV ilustrado na Figura 7.4 consiste em 5 possibilidades


para preenchimentos de falhas nos históricos de vento. Destaca-se que os dados provenientes
do PI já passaram pelo processo de identificação de dados espúrios. Sendo assim, cada inter-
valo de tempo tem seu dado faltante preenchido sequencialmente da seguinte forma:
(I) Dados da EPE.
(II) Dados do PI/REGER.
(III) Físico Estimado Reverso – caso o histórico de vento, após os passos 1 e 2, ainda
apresentar falhas, uma terceira opção é realizada. De posse do histórico parcial da 1ª e 2ª op-
ção, calibra-se uma equação para cada intervalo de meia-hora do dia. Para calibração destas
curvas é necessário um conjunto mínimo de pontos (geração e vento). A condição necessária
para obtenção destes pontos é o histórico possuir trinta dias de medidas válidas (vento e gera-
ção) para cada intervalo de meia-hora. No caso de geração nula, o par vento-geração é sempre
considerado como inválido, uma vez que de forma geral representa alguma operação anormal,
com restrições. A ordem de escolha do histórico de vento mínimo segue a mesma ordenação
apresentada para a montagem do MHG.
Para o ajuste matemático das curvas da usina optou-se pelo mesmo processo que o MHG,
utilizando regressões logísticas, entretanto a regressão logística (7.1) obtida após a calibra-
ção é invertida, uma vez que, conhecida a geração para um determinado instante de tempo, é
possível estimar o vento correspondente. A equação da regressão logística inversa é dada por:

Ger − B $%⁄&
ln T−B −1 (7.2)
Ven = V!"# −
b - ln[10]
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   311 

(IV) Vizinhança – se o vento verificado do ponto em questão não for preenchido pelas
opções anteriores, são utilizados dados de vento verificado de usinas próximas, considerando-
-se até 9 usinas mais próximas em um raio de 7 km, na mesma ordem dos itens (a) e (b) para
montagem do melhor histórico de geração.
(V) Média – se as opções 1, 2, 3 e 4 não forem suficientes para completar todos os dados
faltantes do histórico, estes são calculados tomando-se a média aritmética dos valores de 3
dias anteriores e 3 dias posteriores para aquele determinado intervalo em falta do dia. Esta
opção constitui um último recurso para tornar a série temporal completa. Espera-se, portanto,
que seja muito menos utilizada que as demais, de forma a não comprometer a qualidade do
histórico.

7.2.1.2 – Resultados dos processos de tratamento


Da Figura 7.5 são mostrados alguns exemplos de históricos de geração e vento verificados
com problemas, apresentando uma visão geral dos dados aproveitados e descartados dos históri-
cos das respectivas usinas. Adicionalmente, é apresentado como são constituídos o MHG e MHV.
Para a Figura 7.5, os quatro gráficos da esquerda representam a dispersão de Vento x Po-
tência da usina combinando as duas fontes de geração (CCEE e PI) e as duas fontes de vento
(EPE e PI). Os dados passaram apenas pela primeira triagem, ou seja, os dados de geração
inconsistentes foram substituídos pelos dados do estimador de estado (de acordo com o flag
de qualidade do próprio PI). Os quatro gráficos à direita ilustram as mesmas dispersões, porém
com os dados do PI, após retirada dos dados espúrios. Nestes gráficos estão apenas os valores
que foram considerados válidos.

Figura 7.5 – Dispersão Vento x Potência para identificação de dados espúrios


312    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Como pode ser observado na Figura 7.5, os gráficos à direita que plotam a dispersão Vento
x Potência utilizando o vento do PI estão em branco. Isso significa que o histórico de vento
do PI desta usina foi completamente eliminado. Embora os gráficos à esquerda mostrem que
o histórico possui valores válidos, como o histórico de vento do PI desta usina apresenta mais
de 80% de dados inválidos, todo este histórico foi descartado.
Já a Figura 7.6 apresenta as curvas de geração e vento para dois dias visando ilustrar o
comportamento de alguns dos problemas ilustrados na Figura 7.5. Para os gráficos superio-
res da Figura 7.6, a curvas representam: em vermelho, o vento do PI; em rosa, o vento do PI
após processo de eliminação de dados espúrios (para os dois dias essa curva é inexistente,
uma vez que todo o histórico de vento do PI foi eliminado); em verde, o vento da EPE; e, em
preto, o melhor histórico de vento. Os gráficos inferiores da Figura 7.6 apresentam as curvas
de geração, sendo: em vermelho, a geração do PI; em rosa, a geração do PI após processo de
eliminação de dados espúrios (para os dois dias essa curva está exatamente alinhada com a
curva em vermelho, dado que os dados estavam coerentes); em verde, a geração da CCEE de
cinco minutos; em azul, a geração da CCEE no patamar de uma hora; e, em preto, o melhor
histórico de geração.

Figura 7.6 – Identificação de dados espúrios e resultado do melhor histórico

7.2.2 – Processo de ajuste da previsão de vento


As previsões de vento recebidas pelo ONS apresentam desvios em relação ao vento que
de fato ocorre. Observa-se, no entanto, comportamento de desvio típico, ou seja, a previsão
de vento apresenta em quase todos as usinas eólicas um viés em relação ao vento verificado,
o que felizmente propicia um tratamento vantajoso para a previsão de geração de fonte eólica.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   313 

Os arquivos de vento previsto são recebidos por quadrícula, sendo assim é necessário
associar cada usina à sua respectiva quadrícula. Há um algoritmo que gera arquivos associan-
do cada usina à sua correspondente quadrícula em relação aos arquivos de vento previsto. A
Figura 7.7 ilustra as quadrículas para o Sul e Nordeste, respectivamente, advindas do modelo
GFS. Nestas Figuras são marcados pontos em vermelho representando exemplos de usinas
eólicas consideradas pelo ONS.

Figura 7.7 – Quadrículas do modelo GFS para o Sul e Nordeste

Existem usinas litorâneas cujos centroides dos modelos de vento previsto encontram-se
no mar. Neste caso, são utilizados centroides vizinhos, em terra, para essas usinas. Primeira-
mente, é calculada a distância euclidiana dessa usina com os centroides das quadrículas vizi-
nhas, sendo utilizado o centroide de menor distância, conforme:

' '
dist = lat !"#$ − lat "%& + long !"#$ − long "%& (7.3)

7.2.2.1 – Metodologia para ajuste das previsões de vento


A metodologia empregada na correção da previsão do vento consiste em um ajuste de
regressões lineares, para cada um dos 48 períodos considerados ao longo do dia. Metodologia
semelhante foi utilizada em [2], para refinamento estatístico das previsões horárias de tempe-
ratura a 2 m do modelo Eta em estações do Nordeste do Brasil. A metodologia, denominada
MOC (Model Output Calibration), proposta em [4], baseia-se em uma correção através do
ajuste de regressões lineares multivariadas.
A correção utilizada em [2] baseou-se na correlação de cada variável do modelo com o
desvio da previsão de temperatura, sendo que a correlação linear que apresentou em média
maior redução dos desvios da previsão foi geralmente 0,6. A correção realizada pelo ONS é
teoricamente mais simples, pois as regressões lineares são ajustadas utilizando o vento verifi-
cado e o vento previsto apenas, uma vez que não se tem disponibilidade de todas as variáveis
314    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

envolvidas nos modelos Eta, GFS, ECMWF e BAM. Outra particularidade utilizada em [2] é
que, após o cálculo dos coeficientes de correlação e dos coeficientes da equação da regressão
multivariada, são construídas vinte e quatro equações para cada hora do dia. Todavia, obje-
tivando a previsão de geração de fonte eólica, que requisita de uma discretização distinta, de
meia-hora, são construídas quarenta e oito equações de correção a serem aplicadas no vento
previsto.
A grande vantagem desta metodologia é a de produzir bons resultados, necessitando de
um histórico de dados para estimação do modelo relativamente pequeno, diferentemente de
outras metodologias, como redes neurais, que necessitam de longas séries. O período de cali-
bração adotado em [2] foi de vinte e oito dias, enquanto a correção foi aplicada no período de
trinta dias. No caso da correção de vento do ONS, as regressões foram ajustadas com histórico
de trinta dias e a correção foi realizada para a previsão do dia atual e dos nove dias à frente.
Foram testados tamanhos diferentes de históricos, tendo se constatado que uma quantidade
muito pequena de dias do histórico torna a regressão muito volátil. Por outro lado, históricos
muito longos podem não refletir o viés que acomete a previsão de vento mais recente.
Caso o vento previsto fosse exatamente igual ao vento verificado, traçando um gráfico de
dispersão entre eles se tem uma reta de coeficiente angular igual a um e linear igual a zero,
ou seja, y = α∙ x + b, sendo a = 1 e b = 0. Portanto, quanto melhor a previsão do vento, mais
próximo de uma reta é a dispersão destes dados. Isso a princípio justificaria a escolha pela
regressão linear.
Na prática, a relação entre o vento previsto e o verificado não é tão boa, aproximando-se
desta equação quanto melhor a qualidade do vento previsto. Ainda assim, poderia ser a relação
entre o vento previsto e verificado regida por alguma função não linear. Isto posto, foram tes-
tadas algumas regressões não lineares, como polinômios de vários graus, exponenciais, logís-
ticas. Porém, os melhores resultados confirmaram a opção pelas regressões lineares simples.
Outra dificuldade para um bom ajuste ocorre quando o coeficiente angular é muito alto, ou
seja, o ângulo formado pela reta se aproxima de 90. Essa circunstância é muito ruim do ponto
de vista da correção, pois, depois de ajustada a regressão, qualquer desproporção brusca no
vento previsto em relação aos dados de vento previsto que foram usados para o treinamento
pode acarretar valores absurdos. Dessa forma, há necessidade de tratamento quando da ocor-
rência desta situação. Isso ocorre quando no período dos trinta dias a previsão do vento para
aquele determinado horário não sofre muita variação. Quando essa situação acontece, é iden-
tificada e, através de uma heurística, o tamanho da amostra é aumentado. A heurística analisa
se o valor em módulo do coeficiente angular da regressão é maior do que um equivalente para
uma reta de 75°, e ainda se o desvio padrão dos dados desses últimos dias é muito pequeno,
de acordo com a equação:
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   315 

75π
|a| > | tan!" |
180
(7.4)
ou

σ dados! < 0,2

Onde: dados corresponde ao conjunto de dados dos últimos dias de um período i e σ(da-
dosi) ao desvio-padrão desses dados. O processo de aumento do histórico se repete até que
as restrições sejam atendidas ou se chega a um limite pré-estabelecido. Estes valores foram
escolhidos empiricamente, com base em alguns testes.
Geralmente, o arquivo do dado de vento previsto é recebido na parte da manhã do dia,
sendo fornecido para o dia atual, denominado D, e para os dias D+1, D+2 a D+n, em horário
GMT, devendo os horários ser convertidos para o horário de Brasília, que são a referência para
a previsão a ser feita.
Para que seja feita a correção do vento previsto, os modelos de previsão de geração neces-
sitam do histórico de previsão de vento e de vento verificado. As regressões são ajustadas para
cada intervalo tomando como base o histórico terminando no dia D-1 e iniciando em D-30.
A correção do vento previsto é feita de forma correspondente ao dia da previsão. A corre-
ção do vento previsto para D+2, por exemplo, é feita de acordo com a regressão ajustada com
base no histórico de vento previsto para D+2.

7.2.2.2 – Resultados do ajuste da previsão de vento


Para avaliação da melhora destas correções foram construídos os boxplot dos desvios
brutos cometidos, equação (7.5), para cada um dos intervalos, considerando um determinado
número de dias.

Erro! = Ven"#$!% ! − Ven&$#"! (7.5)

Onde: Erroi, Venverifi, Venprevi, são o erro, o vento verificado e vento previsto respectiva-
mente, para o período i, sendo que i=1 a 48.

A Figura 7.8 ilustra as características dos desvios brutos dos valores previstos e os resul-
tados da correção do vento do tipo D+1, modelo numérico GFS, para uma determinada usina.
As curvas em vermelho representam a velocidade do vento e as curvas em azul e verde repre-
sentam, respectivamente, o vento bruto do GFS e o vento corrigido. Adicionalmente, é apre-
sentado um boxplot com os desvios para algumas horas. O viés varia conforme o intervalo do
dia e períodos do ano, conforme pode ser visto. Esta é então outra razão para uma modelagem
por intervalo, o que acarreta resultados melhores na previsão
316    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.8 – Desvios brutos do vento previsto para previsões D+1 de uma usina

Cada região apresenta um viés característico. A Figura 7.9 ilustra para o estado do Rio
Grande do Norte as curvas médias para o vento verificado, previsto Eta e previsto Eta corri-
gido, reforçando as características dos vieses da previsão do vento. Embora, com base nestas
curvas, a correção pareça resolver o problema com extrema qualidade, ainda existe um desvio
significativo, o que não é muito percebido nas curvas médias. A Figura 7.10 ilustra a dispersão
no vento previsto para os estados do Rio Grande do Norte, considerando o mesmo horizonte
de tempo utilizado para o cálculo das séries médias.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   317 

Figura 7.9 – Vento médio verificado, previsto e previsto corrigido para o RN

Figura 7.10 – Dispersão do vento previsto médio para o RN

Apesar de não apresentado os resultados para os outros estados, observa-se que os dois
estados que apresentam maior dificuldade para a previsão do vento são a Bahia e Pernambuco.
Isso ocorre devido a vários fatores físicos.

7.2.3 – Modelo de previsão de geração de fonte eólica


Testes realizados no decorrer do desenvolvimento levaram à conclusão que as previsões
para agrupamentos de usinas apresentam resultados melhores que a previsão para usinas indi-
vidualizadas. Sendo assim, a previsão é feita por conjuntos de usinas. Para atender à Progra-
mação Diária, as usinas foram agrupadas inicialmente em 73 conjuntos. Para a previsão no
Tempo Real, as usinas foram agrupadas inicialmente em 25 pontos de conexão à Rede Básica.
318    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

A análise dos resultados mostrou que a previsão para os 73 conjuntos e para os 25 pontos de
conexão apresentaram desvios muito similares para o total do Nordeste, indicando que o im-
pacto desta consideração não é a mais relevante no processo de previsão. Entretanto, a melhor
escolha é o agrupamento por similaridade de vento..

7.2.3.1 – Criação dinâmica das curvas Vento x Potência


Esta modelagem consiste em estimar a curva que relaciona vento à geração. Esta curva é sempre
disponibilizada pelo fabricante para cada aerogerador. A potência extraída do vento possui natureza
cúbica. Isso significa que um desvio na velocidade poderia ser potencializado no caso do uso da cur-
va diretamente. A equação (7.6) relaciona a potência extraível do vento de um aerogerador:
1
P(v) = ( ρ ( A ( v ! ( C" ( η# ( η$ (7.6)
2
onde: A é a área de interseção (m²); ρ é a densidade do ar (kg/m³); e v é velocidade do
vento (m/s); Cp é o coeficiente de potência da turbina eólica; ηm é a eficiência da transmissão
mecânica da caixa multiplicadora; ηg é a eficiência do gerador elétrico.
Por esta função, a geração aumentaria infinitamente com o vento. Levando em conta, porém,
as limitações do gerador em transformar vento em potência, considera-se a curva Vento x Po-
tência fornecida pelo fabricante. Embora o uso da curva fornecida pelo fabricante possa parecer
retratar bem a relação entre vento e potência, pode haver discrepâncias entre a curva dada pelo
fabricante e os dados verificados, em razão dos diversos fatores, sendo preferível estimar essa
curva a partir de dados verificados. O vento previsto que será utilizado para compor a previsão
de geração é o mesmo para a usina como um todo. Sendo assim, não há necessidade de levantar
uma curva para cada aerogerador, bastando estimar uma curva para o parque como todo.
Há vários métodos para estimação da curva Vento x Potência. Poderia se utilizar, por
exemplo, ajustes polinomiais, com os mais variados graus, sendo mais intuitivo o uso até o de
terceiro grau, pela relação ao cubo do vento com a geração. Poderia ajustar a curva utilizando
redes neurais, uma rede simples que levasse a bons resultados. Todavia, optou-se pelo uso de
uma regressão logística bem conformada à relação Vento x Potência. Na equação (7.1) foi
apresentado os parâmetros da regressão logística.
Existe, no entanto, uma série de características que tornariam o uso de apenas uma curva
muito pobre do ponto de vista da previsão. Assim sendo, é estimada uma curva para cada in-
tervalo de discretização. Isso significa que, se uma discretização de meia-hora for utilizada,
para cada dia tem-se quarenta e oito valores, sendo ajustadas então quarenta e oito curvas. As
características distintas do vento reforçam a escolha por trabalhar com curvas distintas para
cada intervalo. Uma significativa vantagem desta discretização é observada em parques onde
a direção do vento muda em determinados horários e os parques eólicos não conseguem apro-
veitar o vento com a mesma eficiência.
A forma mais natural, portanto, para se utilizar a curva de potência seria ajustá-la com todo
o histórico de vento e geração verificada, e assim realizar a previsão de posse do vento previsto.
Todavia, a utilização do histórico completo para estimação dos parâmetros da regressão logística,
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   319 

além de não ser necessária para um bom ajuste, pode capturar algumas características indeseja-
das. Todo equipamento possui uma vida útil e geralmente vai perdendo rendimento com o passar
dos anos. Isso pode alterar as características da curva Vento x Potência. Além disso, outros fato-
res contribuem para mudanças na curva de potência, como equipamentos em falhas, substituição
destes por outros com características levemente diferentes, e ainda fatores de curto prazo, como
quedas de linhas e torres dos aerogeradores, que podem fazer com que as gerações tomem valo-
res diferentes do esperado. Alguns desses efeitos, se conhecidos pelo usuário do previsor eólico,
podem ser mitigados. Entretanto, se não conhecidos, podem causar enormes desvios na previsão.
De forma a mitigar estes efeitos negativos, optou-se por estimar os parâmetros da regres-
são logística com apenas 180 dias. Isso reduz desvios cometidos pela ocorrência de fenôme-
nos que ocorreram fora destes intervalos e não estão presentes quando se faz a previsão. Fo-
ram feitos testes visando observar se essa consideração pioraria a qualidade da curva ajustada.
Concluiu-se que não houve aumento de desvios para o ajuste, e que foram observados ganhos,
como era o esperado.
Embora possa parecer que o número de pontos usados para representar o equacionamento
seja insuficiente, estes refletem melhor o comportamento para o dia seguinte, uma vez que são
as ocorrências mais recentes. Desta forma, caso tivesse ocorrido um fenômeno que distorcesse
a curva num tempo distante, esta não comprometeria a previsão atual.
Para ilustrar um possível efeito indesejado caso o histórico de dados apresentasse algum com-
portamento de geração diferente num passado mais distante para os dias mais recentes, construiu-se
a Figura 7.11. Para simular este efeito considerou-se um ano de dados, sendo que para os primeiros
duzentos e noventa dias a potência produzida foi reduzida pela metade, e a partir do dia duzentos e
noventa e um até os trezentos e sessenta e cinco dias a geração pôde atingir o total da capacidade da
usina. Mesmo não tendo se baseado em condições reais, o exemplo mostra possíveis situações em
que uma usina opera com um certo número menor de aerogeradores em determinados períodos, ou
períodos em que há restrições elétricas devido, por exemplo, a quedas de torres.
A Figura 7.11 apresenta então os pontos plotados até o dia 275 (pontos em vermelho),
e para os dias de 275 a 365 (pontos em azul claro), dado um horizonte de 90 dias. Existem
15 dias dos 90 que estão com a metade da geração para compor os dados para a estimação
da regressão logística. A previsão foi realizada para o próximo dia (pontos em azul), sendo,
portanto, 48 pontos. O gráfico esquerdo da Figura representa a previsão realizada levando
em conta a estimação da regressão logística utilizando todo o histórico, ou seja, com os 365
dias. O gráfico à direita representa a estimação da regressão apenas com os últimos 90 dias. É
possível afirmar com base nesta Figura que o gráfico à esquerda apresenta uma previsão po-
bre do ponto de vista do que está ocorrendo na usina, uma vez que os pontos estimados estão
entre uma curva que seria da usina com a metade da capacidade e outra que seria operando
a plena capacidade. O gráfico à direita, no entanto, já apresenta uma coerência muito maior
na previsão, como pode ser notado, pois, apesar da geração de 15 dias do histórico utilizado
para estimação da curva de potência estar reduzida pela metade, os outros 75 dias estão em
condições que refletem o comportamento atual.
320    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.11 – Estimação da curva de potência com considerações de histórico diferentes

A dispersão Vento x Potência apresenta uma série de características que exigem um tra-
tamento necessário para uma boa estimação da equação de cada usina. A técnica descrita em
[5] visa eliminar os pontos da curva que não representam valores plausíveis, tentando manter
o maior número de pontos corretos.
Sendo assim, cria-se uma função superior e uma inferior, de forma a considerar apenas os
dados que estão dentro desses limites. A criação desses limites é feita com funções sigmoides
– equação (7.7), sendo os parâmetros Ymin, Ymax, X01, Xmax1, X02 e Xmax2. Detalhes em [5].
Y!$% − Y!"# Y!$%
f x = Y!"# + ' − ' (7.7)
& ) *#$%&' &((" & ) *#$%&' &(()
1+ e (!" 1+ e (!)
onde:

t s1 = X max1 − X 01 t s2 = X max2 − X 02 (7.8)

X #$%" + X &" X #$%' + X &'


t !" = t !' = (7.9)
2 2

De posse dos parâmetros Ymin, Ymax, X01, Xmax1, X02 e Xmax2 é possível, portanto, a criação
dos limites inferiores e superiores para filtragem dos dados. Entretanto, esses parâmetros de-
vem ser estimados tomando as próprias curvas de dispersão dos dados verificados, uma vez
que os parâmetros teóricos nem sempre são compatíveis com os estimados pela curva de dis-
persão real.
Os dados eliminados nem sempre representam problemas de medição. Muitos dados po-
dem ser medições precisas e serem cortados por não estarem dentro dos limites calculados.
Esses dados podem ser originais de restrições operativas diversas, tais como máquinas em
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   321 

manutenção, equipamentos em falha ou restrições de transmissão. Esses fatores fazem com


que mesmo com a disponibilidade de recurso (vento) a usina não gere a respectiva energia.
Isto posto, embora os dados que estão sendo eliminados possam ser reais, não é interessante
mantê-los na calibração dos modelos, dado que o que importa são os pontos em que o parque
opera em condições usuais.
Em situações normais, a dispersão da curva de potência verificada não é muito alta, e neste
caso as limitações impostas apenas melhoram a qualidade do ajuste. A Figura 7.12 destaca
situações que aparentam restrições operativas, que é como se houvesse mais de uma curva de
potência dentro da mesma figura. Nestes dois casos muito provavelmente a causa se relaciona
a restrições de: transmissão, que limitam o escoamento da potência ativa gerada nestas usinas;
momentos de constrained-off causado pela operação do sistema; ou ainda manutenções dos
aerogeradores. Obrigando o não aproveitamento de ventos mais fortes. O gráfico do lado es-
querdo desta Figura ilustra a curva Vento x Potência dos dados verificados, bem como o limite
superior (curva em verde) e o limite inferior (curva em azul). O gráfico à direita apresenta os
dados verificados selecionados do total da amostra. Em verde é mostrada a superposição das
quarenta e oito regressões logísticas ajustadas.

Figura 7.12 – Dispersão com curvas limites e aplicação da regressão logística

Considerando o exposto nos itens anteriores, os processos de formulação dinâmica das


curvas Vento x Potência seguem as seguintes etapas.
Inicialmente, são criadas séries de geração verificada média por agrupamento de usinas.
O mesmo é feito para o vento verificado e o vento previsto de cada fonte meteorológica. Em
seguida, são normalizados os dados de geração média através da geração máxima e mínima
destes dados, conforme a equação:
322    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Ger − Ger!"#
NGer = (7.10)
Ger!$% − Ger!"#

De forma similar ao feito para a geração, normalizam-se os dados de vento médio. Porém,
neste caso, a normalização é feita com o vento médio e o desvio padrão dessa série temporal,
de acordo com a equação:

Ven − Ven
NVen = (7.11)
σ!"#

Posteriormente, ajustam-se os parâmetros da seguinte equação logística:


T−B
NGer = B + (7.12)
1 + 10! "!"# #$"%& '

Em seguida, é necessário retornar os valores de geração . Assim, utilizam-se as equações


(7.11) e (7.12), resultando em:
T−B
Ger = B + Ven−Ven
∙ Germax − Germin + Germin (7.13)
b Vmid −
(1 + 10 σVen )s

Como a equação anterior foi construída em torno de uma série de geração e vento médios,
ainda é necessária a etapa de conversão em geração total. Conforme explicado no item ante-
rior, essa etapa é realizada com um ajuste de uma regressão linear, entre os dados médios e
totais de alguns dias recentes, de acordo com a seguinte equação:

Ger tot = α ∙ Ger + β (7.14)

Dessa forma, a equação de Vento x Potência, que é utilizada para conversão do vento previsto
corrigido em potência, pode ser escrita como:

T−B
Ger !"! = α & B+ ) & Ger*+, − Ger*-' + Ger*-' + β
$&'%$&'
# $!"# % (
(7.15)
1+ 10 $%&

onde: B e T são parte inferior e superior das assíntotas da logística, respectivamente;


os parâmetros b e Vmid são a inclinação e a coordenada x do ponto de inflexão da logística,
respectivamente; s é um coeficiente da logística a ser ajustado; Germax e Germin são a geração
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   323 

T−B
Ger !"! = α & B+ ) & Ger*+, − G
máxima e mínima da série de geração média do grupo de usinas, respectivamente; $&'%$&' e σvem
# $!"# % (
são o vento médio e desvio padrão da série de vento médio do grupo1 + de
10 usinas; α e$%&
β referem-
-se ao coeficiente angular e linear, respectivamente, da regressão ajustada entre a série total e
média da geração do grupo.

7.2.3.2 – Características dos algoritmos


Para as simulações que serão apresentadas, surgiram algumas necessidades de tratamen-
tos e considerações das informações disponíveis para realizar a previsão de geração de fonte
eólica. Algumas das dificuldades surgidas serão destacadas nesta seção, bem como a forma
com que foram considerados.
As séries de geração verificada nos pontos apresentam valores crescentes ao longo dos
anos. Isso não é justificado pelo potencial dos ventos, mas sim pela capacidade instalada
que vem aumentando nos últimos anos. Além disso, muitos pontos operam com restrição de
transmissão, que eventualmente deixam de existir, ou seja, é como se a capacidade de geração
deste ponto fosse alterada. Sendo assim, a calibração dos modelos deve levar em consideração
essas séries crescentes no tempo, cujo crescimento não segue um padrão e é diferente para
cada ponto.
A Figura 7.13 apresenta outro ponto de conexão em que a potência instalada vem au-
mentando gradativamente nos últimos anos. Dessa forma, os modelos devem considerar essa
variação, dado que a característica dos ventos não segue esse aumento artificial, apresentando
apenas as variações naturais.

Figura 7.13 – Evolução da capacidade instalada de um determinado ponto


324    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Dado que as séries históricas necessárias ao modelo de previsão foram transformadas em


séries médias, ao final do processo de previsão todas as previsões devem estar em seus pata-
mares totais. Para isso, foi ajustado uma regressão linear entre a geração verificada e a geração
verificada média dos últimos cinco dias. Esse número de dias foi escolhido por ser um número
pequeno, mas que oferece um ajuste suficiente. Ser um número de dias pequeno é fundamen-
tal pelo fato de muitos pontos operarem com restrição. Sendo assim, caso uma restrição seja
eliminada, o programa irá tratar totalmente essa mudança na série de geração após cinco dias,
tendo um problema apenas nessa fase de transição.

7.2.4 – Modelo de combinação


O ONS utiliza previsões de vento provenientes de diferentes modelos meteorológicos
(Eta ou WRF, GFS, ECMWF e BAM), que resultam, por sua vez, em diferentes previsões
de geração de fonte eólica. De forma a se obter uma única previsão de geração, é necessário
combinar essas previsões.
Isso pode ser feito através de média aritmética simples ou por média ponderada. A meto-
dologia utilizada como embasamento teórico de combinação foi proposta em [6] e se baseia
na combinação linear entre previsões, com pesos distintos.
Um conjunto de fatores de combinação é obtido para cada agrupamento de usinas e hori-
zonte de previsão. O método para obtenção destes fatores pode ser separado em três etapas,
seleção de insumos, determinação dos desvios e cálculo dos fatores de combinação.
A primeira etapa consiste em selecionar as bases de comparação para avaliação dos des-
vios de previsão. Em condições normais, são utilizados os últimos três dias de geração verifi-
cada para comparação. Ocasionalmente, pode ocorrer de não ser realizada a previsão de gera-
ção com base um ou mais modelos meteorológicos, por razões diversas. Torna-se necessário,
assim, um método para seleção dos dias com base nos quais se compara previsão e verificado.
Para cada horizonte contemplado na combinação, é avaliado se a previsão para os últimos
cinco dias, com cada modelo meteorológico, foi realizada com sucesso. São escolhidos prefe-
rencialmente os três mais recentes dos cinco dias. A Figura 7.14 ilustra um exemplo de ava-
liação, da escolha dos dias a serem usados na criação dos fatores, para previsões do tipo D+1
e do tipo D+9. Como pode ser observado para o tipo D+1, a lógica é utilizar informações das
previsões desse tipo dois a seis dias atrás, dado que esse é o último período de cinco dias que
existe informação da geração verificada e da previsão do tipo D+1. Para o tipo D+9, busca-se
informações das previsões desse tipo 10 a 14 dias atrás.

Figura 7.14 – Escolha dos dias para combinação


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   325 

Após selecionados os dias e modelos meteorológicos a serem utilizados para obtenção


dos fatores de combinação para cada horizonte de previsão, inicia-se a etapa de cálculo dos
desvios médios de previsão. Para cada horizonte e cada modelo meteorológico, calcula-se o
desvio entre a geração verificada e prevista nos dias selecionados a cada meia hora, isto é,
48 valores de desvio por dia. Dentre estes desvios, valores positivos e negativos são pesados
de forma diferente. Aos valores positivos, em que a geração verificada supera a previsão, é
atribuído peso 0,3 e aos valores negativos é atribuído peso 0,7. Uma das razões para esta di-
ferenciação é que, caso a geração se verifique muito inferior à previsão, pode ser necessário o
despacho de outras fontes de geração não programadas previamente, encarecendo a operação.
A seguir, para a previsão proveniente de cada modelo meteorológico, calcula-se o desvio mé-
dio ponderado dos dias anteriores para cada meia hora da previsão.
Em essência, o cálculo dos fatores de combinação consiste em atribuir a cada modelo me-
teorológico uma participação na combinação, inversamente proporcional a seu erro. Se feito
para cada meia hora isoladamente, este cálculo resultaria em valores extremamente voláteis
de fatores, dos quais decorreria uma previsão combinada muito instável. Para contornar este
problema, aplica-se uma correção no erro ponderado com base nas meias horas precedentes
e seguintes. A base deste procedimento é que um modelo não varia seu comportamento tão
abruptamente num intervalo de trinta minutos. Logo, não se justifica que os fatores o façam.
O método então busca seis meias-horas à frente e atrás daquela para qual se está calculando os
fatores e determina uma média ponderada dos erros destas 13 meias-horas, atribuindo pesos
que seguem uma distribuição linear.
Após esta suavização dos desvios de cada modelo, calcula-se o fator inversamente pro-
porcional à participação deste desvio no valor de desvio total cometido por todos os modelos
meteorológicos.
1
Erro"
!
f!" = , i = 1, 2, . . . , 48 (7.16)
1
∑"# ∈ &
Erro"#
!

onde: i representa cada intervalo do dia e m referência cada modelo meteorológico.


Por fim, munidos de quarenta e oito fatores de combinação para cada modelo num dado
dia, é possível obter a previsão combinada segundo a equação:
! !
Prev!"#$% = & Prev!$ ×f!$ , i = 1, 2, . . . , 48 (7.17)
$& ∈ )

A grande vantagem da combinação de modelos é extrair características positivas de cada


um dos modelos. Estudos difundidos na literatura demonstram que os resultados da combina-
ção são melhores que os obtidos pelos modelos de previsão individualmente.
326    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

A Figura 7.15 apresenta um exemplo da combinação dos modelos de previsão para um


determinado dia para o total do Nordeste. Nesta mesma Figura é ilustrado também o compor-
tamento dos fatores para cada uma das previsões. Vale salientar que os fatores respondem de
forma particular para cada um dos intervalos do dia. Como o dia aconteceu em 2017, o modelo
BAM ainda não estava sendo considerado.

Figura 7.15 – Aplicação da combinação dos resultados do modelo de previsão para o NE

7.2.5 – Metodologia de separação das previsões por usinas


Um processo intuitivo faria a separação da previsão de geração eólica por usinas propor-
cionalmente à potência instalada. Mais adequado, no entanto, é fazê-lo proporcionalmente à
potência instalada multiplicada pelo fator de capacidade da usina, ou geração média. A Figura
7.16 mostra a vantagem da separação pelo fator de capacidade em relação à separação apenas
pela potência instalada.

Figura 7.16 – Comparação da separação da separação das usinas para o Grupo 1


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   327 

Vale salientar que as potências instaladas das Usina A e V são idênticas.

7.2.6 – Resultados
Esta seção tem por objetivo descrever alguns resultados obtidos pelo uso operacional do
modelo de previsão de geração eólica.

7.2.6.1 – Métricas utilizadas para avaliação dos desvios da previsão


Várias métricas são utilizadas para avaliação de desempenho do modelo de previsão,
apresentando características positivas e negativas. Dependendo da análise em questão, uma
ou outra pode ser mais apropriada. As equações de (7.18) a (7.23) apresentam as métricas
utilizadas. A primeira delas é o erro médio (mean error):

1 '
ME = & P $
− P&#"!$ (7.18)
N $() !"#$%

O erro absoluto médio (mean absolute error) é calculado como segue:


1 '
MAE = ' |(P!"#$% $ − P&#"!$ )| (7.19)
N $()

O erro percentual absoluto médio (mean absolute percentage error):

1 ' P!"#$% $ − P&#"!$


MAPE = ( |( )| ⋅ 100 (7.20)
N $() P!"#$% $

Outra métrica muito importante é o erro médio quadrático (root mean square error), des-
crito na equação:

1 (
𝑅𝑅MSE = ( )P!"#$% $ − P&#"!$ )
' (7.21)
N $)*

É utilizado também o erro percentual médio normalizado (normalized absolute per-


centage error). Normalizado pela potência instalada:

1 ,
NMAPE!"#$% = %&% ) |(P'()"* " − P+)('" )| ⋅ 100 (7.22)
N ⋅ P"#$% "-.
328    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Também é utilizado o erro percentual médio normalizado pela potência instalada vezes o
fator de capacidade:

1 ,
NMAPE!"#!"# = #'# + |(P()*$! $ − P+*)($ )| ⋅ 100 (7.23)
N ⋅ P$%&# ⋅ fc $-.

A métrica do MAPE dada na equação (7.20) é muito útil na análise de desvios de previsão.
Entretanto, deve-se ter cuidado com seu uso, uma vez que é um somatório de frações onde o
denominador é a geração verificada. O inconveniente disso é que muitas vezes a usina eólica
pode apresentar geração muito baixa, levando à superestimação do valor do somatório. Por-
tanto, o uso do MAPE para usinas individuais ou pequenos conjuntos não é indicado. Porém,
para avaliação de desvios de um conjunto agregado maior de usinas, como por exemplo a
avaliação de desvios por ponto de conexão, por estado, ou para uma região, seu uso pode ser
recomendado.
Outro problema do MAPE é o fato de um mesmo desvio absoluto levar a considerações
de desvio percentual bem distinto. A Figura 7.17 ilustra uma previsão real para o NE onde
a geração verificada é muito maior do que a previsão do modelo utilizando o vento do Eta.
Vale salientar que em um determinado horário o erro chega a 80%, de acordo com o MAPE.
A Figura 7.18 representa um desvio onde a geração é menor que a previsão, sendo que em um
determinado instante o erro chega a 220% de acordo com o MAPE, porém o erro em MW é
menor do que ao apresentado na Figura 7.17. Apesar de a curva do modelo utilizando o Eta ser
mais aderente na Figura 7.18 em relação à Figura 7.17, o desvio médio para o dia é de 65% na
Figura 7.18 contra 30% na Figura 7.17.

Figura 7.17 – Exemplo de erro com geração verificada superior à previsão


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   329 

Figura 7.18 – Exemplo de erro com verificado mais baixo que a previsão

Para análise dos desvios do subsistema Nordeste, o MAPE pode ser considerado, mesmo
com suas peculiaridades. Todavia, para o subsistema Sul, seu uso não é recomendado, apesar
de nesse capítulo esta métrica ser apresentada. A justificativa deve-se ao fato da geração eólica
no Sul se aproximar de zero com muita frequência gerando desvios altos em percentual, mesmo
que tais desvios sejam baixos em MW (megawatt). A Figura 7.19 ilustra um caso, de 3/4/2018
a 9/4/2018, sendo um período de geração eólica muito baixa, como pode ser observado existem
erros que ultrapassam 2000% segundo a métrica do MAPE, e pelo NMAPE o erro é baixo.
330    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.19 – Exemplo de erro para um período do Sul

Dado o exposto, pode-se concluir que o uso de apenas uma métrica pode não ser recomen-
dável. O ideal é utilizar todas, de forma a observar o que cada uma está indicando. A preferên-
cia por uma métrica vai depender do objetivo de uso da previsão de geração eólica.

7.2.6.2 – Análise de desempenho das previsões eólicas


O modelo de previsão de geração de fonte eólica está em operação desde o início de 2017.
Inicialmente, o modelo dispunha apenas dos dados do modelo Eta. Posteriormente, a previsão
passou a contemplar também o modelo americano GFS. Em maio de 2017, a previsão pas-
sou a contar também com informações do modelo europeu ECMWF. Finalmente, em 2018,
entrou em teste o modelo BAM. No início da entrada de cada modelo de previsão numérica,
por ausência de histórico, as respectivas previsões de geração de fonte eólica ficaram compro-
metidas. À medida em que são formados os históricos, as previsões se tornam mais estáveis.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   331 

Sendo assim, para avaliar as previsões de geração de fonte eólica com cada um dos modelos
meteorológicos, optou-se por desconsiderar as previsões iniciais.
Deve ser observado que, a menos quando explicitado, todos os gráficos e valores apresen-
tados são relativos às previsões do tipo D+1.
A seguir são apresentados gráficos da avaliação dos desvios de previsão segundo diversas
métricas. Cada gráfico é uma avaliação mensal dos desvios, no período de janeiro de 2017 a
novembro de 2018, para os subsistemas Nordeste e Sul. Esse período foi selecionado por con-
ter o modelo já em funcionamento estável para o subsistema Nordeste, bem como para o Sul,
cuja entrada em operação ocorreu em outubro de 2017. Os gráficos de cada métrica possuem
eixos fixos para ambos os subsistemas, apesar de possíveis grandes diferenças de valores, para
facilitar a comparação entre desvios.
Da Figura 7.20 à Figura 7.21 são exibidos os Erros Médios Absolutos Percentuais (Mean
Average Percentage Error – MAPE). Este erro é obtido de forma similar ao MAE, sendo ex-
presso como um percentual da geração verificada na mesma meia hora, dando uma dimensão
do desvio em relação ao verificado. A análise desta métrica evidencia as vastas diferenças
no regime de vento nas duas regiões. Inicialmente, pode ser notado que, apesar de analisado
em uma janela de tempo mais curta, o subsistema Sul não apresenta sazonalidade do erro tão
acentuada quanto o Nordeste.
Em relação aos erros, observam-se valores muito mais elevados no subsistema Sul. Neste
subsistema, a geração varia bruscamente, indo a quase zero com frequência. Pela formulação
do MAPE disposta na equação (7.20), conforme já mencionado, esta métrica torna-se extre-
mamente sensível e volátil para erros em valores de geração baixos, tornando-se um indicador
fraco para avaliação da previsão no subsistema Sul.

Figura 7.20 – Erro absoluto médio percentual mensal da previsão eólica para o Nordeste
332    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.21 – Erro absoluto médio percentual mensal da previsão eólica para o Sul

Da Figura 7.22 à Figura 7.23 são apresentados os Erros Médios Quadráticos Percentuais
Normalizados (Normalized Mean Absolute Percentage Error – NMAPE). A normalização
nestas análises é feita pela potência instalada de cada subsistema. A normalização contem-
plada nesta métrica pretende dar uma visão sistêmica do impacto do desvio, diferente do
MAPE, cuja abordagem é observar o desvio sob a perspectiva do valor verificado, não tra-
zendo nenhuma informação sobre o impacto na operação do sistema. Apesar de duas formas
de normalização foram consideradas: um considerando todo o período de estudo, a potência
instalada final; outra com os valores de desvio normalizados pela potência instalada na época
da geração, na Figura 7.22 e na Figura 7.23 é ilustrado essa última forma de normalização.

Figura 7.22 – Erro médio absoluto percentual, normalizado pela potência instalada evolutiva ao longo do período de estu-
do, mensal da previsão eólica para o Nordeste
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   333 

Figura 7.23 – Erro médio absoluto percentual, normalizado pela potência instalada evolutiva ao longo do período de estu-
do, mensal da previsão eólica para o Sul

A normalização pela potência final oferece uma referência fixa, sendo todos os valores de
desvio percentuais da mesma constante. Por outro lado, em razão da potência instalada final
ser maior do que aquela ao início do período de estudo, é notável um amortecimento, uma re-
dução artificial dos valores de desvio no início do período avaliado, que induzem a conclusão
de que os desvios vêm crescendo ao longo do tempo na região Nordeste. A segunda forma, por
empreender uma normalização por valores variáveis ao longo do período de estudo, apresenta
desvios cujos valores não representam percentuais da mesma constante. Entretanto, estes er-
ros são muito mais realistas que aqueles da primeira abordagem, exibindo o comportamento
real de tendência decrescente do erro ao longo do tempo, refletindo a evolução da modelagem.
É possível utilizar variações da métrica NMAPE, de forma a trazer outras informações de
igual relevância às métricas apresentadas anteriormente. Uma proposta é normalizar o desvio
pelo produto entre fator de capacidade e potência instalada. Esta forma de cálculo apresenta a
vantagem de ser mais realista que a anterior, uma vez que, na geração eólica, a potência insta-
lada está longe de ser a geração que geralmente ocorre. Para esta normalização, foi utilizado
o produto do fator de capacidade diário, mensal e anual de cada registro do período contem-
plado, multiplicado pela potência instalada à época em que o desvio foi verificado. Foram uti-
lizadas, portanto, três métricas NMAPEs utilizando fator de capacidade. Os resultados serão
apresentados em tabelas mais à frente.
Anteriormente, foram mencionadas sucessivas vezes a sazonalidade da geração eólica no
subsistema Nordeste e a alta variabilidade no subsistema Sul, causa de desvios mais elevados
no Sul em relação ao Nordeste. Nas Figuras 7.24 e 7.25 são evidenciadas estas características.
O primeiro e o terceiro gráfico de cada Figura apresentam caixas mensais e diárias, respectiva-
mente, com a borda superior indicando a geração máxima, a borda inferior a geração mínima
e a média pela listra em preto. Para enfatizar e poder comparar entre anos a geração média,
no segundo gráfico, é ilustrado barras de cada mês e cada ano que o modelo de previsão está
em operação.
334    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

No último gráfico é ilustrado, com discretização semi-horária, a série de geração. A área


sombreada cobre o espaço entre o máximo e mínimo de cada dia. A linha vermelha representa
a potência instalada para referência da geração.

Figura 7.24 – Variação da geração verificada no subsistema Nordeste

Confirma-se então que a geração no subsistema Nordeste, Figura 7.24, é fortemente mar-
cada por um comportamento sazonal, diretamente correspondente ao MAPE e NMAPE pela
potência instalada, tendo períodos com maior e menor grau de dificuldade da previsão, em
torno de setembro e abril, respectivamente.
No subsistema Sul, Figura 7.25, por outro lado, conforme já pontuado, é praticamente
imperceptível uma variação sazonal da geração. Além disso, a produção de energia vai brus-
camente a zero frequentemente, oscilando entre próximo de sua potência instalada e zero rapi-
damente. Este comportamento e a baixa potência instalada (em comparação ao Nordeste) con-
ferem ao MAPE baixa confiabilidade como métrica de precisão da geração neste subsistema.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   335 

Figura 7.25 – Variação da geração verificada no subsistema Sul

A seguir são apresentadas diversas tabelas com todas as métricas apresentadas para cada
um dos subsistemas. O período considerado para obtenção de cada tabela não é o mesmo que
aquele contemplado nos gráficos. Este período, desde janeiro de 2017, incorpora épocas em
que nem todos os modelos encontravam-se ativos, tornando uma comparação consolidada
entre eles injusta.
Em seguida é apresentado, para o SIN como um todo. As tabelas contemplam dois anos,
capturando dois períodos fechados da sazonalidade anual. A tabela 7.1, a tabela 7.2 e a tabela
apresentam os valores das métricas de desempenho para previsões realizadas no dia para o
próprio dia (D), para um dia à frente (D+1) e dois dias à frente (D+2), respectivamente.
336    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Tabela 7.1 – Desvios de previsão de geração de fonte eólica do SIN no período de set/2017 a ago/2019
para previsões do tipo D
Métrica Combinado CPTEC GFS ECMWF1 ECMWF2 BAM
ME (MW) 90,1 119,7 137,5 88,6 102,0 -196,0
MAE (MW) 468,8 840,7 518,4 504,0 493,6 1572,9
MAPE (%) 11,3 19,9 12,3 11,9 11,6 52,2
RMSE (MW) 468,8 840,7 518,4 504,0 493,6 1572,9
NMAPEpf (%) 3,4 6,0 3,7 3,6 3,5 11,3
NMAPEpe (%) 3,7 6,5 4,1 3,9 3,9 12,5
NMAPEfcd (%) 10,7 18,5 11,8 11,3 11,1 46,4
NMAPEfcm (%) 10,1 17,0 11,2 10,7 10,5 37,1
NMAPEfca (%) 8,8 15,2 9,6 9,3 9,1 29,5

Os índices dos erros médios quadráticos percentuais normalizados (NMAPE) explicitam


a forma de normalização: pf – normalizado pela potência instalada final do período de estudo;
pe – normalizado pela potência instalada evolutiva ao longo do período de estudo; fcd – nor-
malizado pelo produto entre fator de capacidade diário e potência instalada evolutiva; fcm
– normalizado pelo produto entre fator de capacidade mensal e potência instalada evolutiva;
fca – normalizado pelo produto entre fator de capacidade anual e potência instalada evolutiva.

Tabela 7.2 – Desvios de previsão de geração de fonte eólica do SIN no período de set/2017 a ago/2019
para previsões do tipo D+1
Métrica Combinado CPTEC GFS ECMWF1 ECMWF2 BAM
ME (MW) 114,1 139,2 183,3 113,3 142,2 -183,0
MAE (MW) 543,4 906,4 610,8 570,6 559,8 1552,7
MAPE (%) 13,3 22,1 14,9 13,9 13,4 52,5
RMSE (MW) 543,4 906,4 610,8 570,6 559,8 1552,7
NMAPEpf (%) 3,9 6,5 4,4 4,1 4,0 11,1
NMAPEpe (%) 4,3 7,1 4,9 4,6 4,5 12,4
NMAPEfcd (%) 12,5 20,5 14,2 13,1 12,8 46,8
NMAPEfcm (%) 11,8 18,7 13,5 12,3 12,1 36,7
NMAPEfca (%) 10,3 16,8 11,5 10,8 10,6 29,3

Tabela 7.3 – Desvios de previsão de geração de fonte eólica do SIN no período de set/2017 a ago/2019
para previsões do tipo D+2
Métrica Combinado CPTEC GFS ECMWF1 ECMWF2 BAM
ME (MW) 187,33 84,19 216,04 167,36 183,66 695,84
MAE (MW) 570,78 742,56 626,37 571,50 564,60 1485,06
MAPE (%) 13,87 18,83 15,32 13,92 13,65 42,56
RMSE (MW) 570,78 742,56 626,37 571,50 564,60 1485,06
NMAPEpf (%) 4,64 6,03 5,09 4,64 4,59 12,07
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   337 

Métrica Combinado CPTEC GFS ECMWF1 ECMWF2 BAM


NMAPEpe (%) 4,91 6,35 5,39 4,92 4,86 12,63
NMAPEfcd (%) 13,29 17,74 14,73 13,34 13,21 39,48
NMAPEfcm (%) 12,83 16,73 14,24 12,99 12,89 34,72
NMAPEfca (%) 11,20 14,50 12,30 11,22 11,09 28,82

É importante destacar que o modelo BAM entrou em teste a partir de janeiro de 2018,
sendo assim não abrange todos os dias do período apresentado como os demais modelos.
As tabelas anteriores ilustraram desvios para previsões até dois dias à frente. A título de
comparação, na Figura 7.26 são apresentados os NMAPEs, normalizado pela potência instala-
da evolutiva ao longo do período de estudo, mensais das previsões de tipo D até D+9 do SIN
para o período de avaliação de novembro de 2017 a setembro de 2019.

Figura 7.26 – Comparação do NMAPE mensal da previsão eólica de tipos D a D+9 para o SIN

Há previsões do tipo D+1 desde o início de 2017, porém para os outros horizontes não
há previsões em todo o período, como pode ser observado na Figura 7.26. O motivo da falta
destas previsões deve-se ao fato do modelo de previsão de geração eólica ter operado, incial-
mente, com o objetivo de atender à Programação Diária, fazendo previsão para apenas um dia
à frente. Ainda nesta Figura é possível observar uma degradação relevante nas previsões D+6
à D+9, isso é devido ao fato de nestes horizontes as previsões foram feitas apenas com mode-
lo BAM. Recentemente, as previsões D+6 e D+7 passou a contar com os dados do ECMWF,
melhorando o desempenho nestes horizontes.
Nas Figuras 7.27 e 7.28, é apresentado NMAPE normalizado pela potência instalada evo-
lutiva ao longo do período de estudo, separadamente para os subsistemas Nordeste e Sul,
respectivamente. Considerando o período de 2 anos de previsões, estendendo de setembro de
2017 até agosto de 2019. Devido o volume de informações, serão descritas análises apenas
para previsões um dia à frente (D+1).
338    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.27 – NMAPE normalizado pela potência instalada evolutiva ao longo do período de estudo para o Nordeste

Figura 7.28 – NMAPE normalizado pela potência instalada evolutiva ao longo do período de estudo para o Sul

A seguir, são apresentadas Figuras com informações complementares às últimas tabelas


e figuras, para um entendimento do desempenho do modelo ao longo do ano, sendo assim
são apresentados nas Figuras 7.29 e 7.30 os boxplot dos erros mensais para o Nordeste e Sul,
respectivamente. São ilustradas nestas Figuras as características dos desvios brutos, em MW,
para a previsão de geração eólica com cada um dos modelos meteorológicos utilizados, bem
como com o modelo combinado. São considerados os erros para os meses de janeiro de 2017
a setembro de 2019, compreendendo um período de quase três anos de análises para a previsão
com quase todos os modelos meteorológicos.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   339 

Figura 7.29 – Erro bruto mensal do subsistema Nordeste (jan/2017 – nov/2019)


340    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.30 – Erro bruto mensal do subsistema Sul (jan/2017 – nov/2019)

Os eixos dos boxplot apresentados nas Figuras 7.29 e 7.30 estão limitados a 60% da po-
tência instalada simulada.
As Figuras 7.31 e 7.32 apresentam como informação adicional a distribuição dos erros
brutos para o Nordeste e o Sul, respectivamente. O período considerado é o mesmo das últi-
mas duas figuras, de janeiro de 2017 a novembro de 2019.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   341 

Figura 7.31 – Distribuição dos erros brutos do subsistema Nordeste

Figura 7.32 – Distribuição dos erros brutos do subsistema Sul


342    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

O eixo das abcissas dos gráficos das Figuras 7.31 e 7.32 estão limitados a 70% da potência
instalada simulada.
Como pode ser observado, em ambas a maior frequência de erros está centralizada em
torno de zero, conforme o esperado.
Em complementação às análises anteriores, na Figura 7.33 e na Figura 7.34 são apresenta-
das as dispersões entre o valor verificado e o previsto, para o Nordeste e o Sul, respectivamen-
te. Nestas Figuras estão ilustradas as dispersões para previsões de geração eólica para cada
modelo meteorológico.
São marcados em cores diferentes os pontos de horizontes distintos: os pontos em preto
relacionam dados de janeiro de 2017 a novembro de 2019, ou seja, compreende o período de
previsão desde o início de operação até próximo à elaboração da figura; os pontos desenhados
em cinza descrevem dados dos últimos 180 dias deste mesmo período; os pontos em vermelho
descrevem dados dos últimos 30 dias deste mesmo período. Adicionalmente, é apresentada
nestas Figuras uma reta de 45°, curva em azul escuro, e uma reta em azul claro proveniente de
uma regressão linear com os dados totais.
Com o intuito de observar numericamente as características lineares dos dados previs-
tos em relação aos dados observados, é adicionado nestas Figuras o coeficiente de deter-
minação R².

Figura 7.33 – Correlação dos dados previstos e verificados para o Nordeste


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   343 

Figura 7.34 – Correlação dos dados previstos e verificados para o Sul

Vale salientar que nessas Figuras os modelos apresentam um bom coeficiente de deter-
minação, com exceção do modelo BAM, que ainda deve passar por ajustes para melhoria de
seus resultados.
Dado as características dos modelos numéricos apresentando anteriormente, é possível con-
cluir que os dois principais modelos são o GFS e ECMWF. A Figura 7.36 ilustra os desvios
acumulados dos principais modelos. Como pode ser observado, embora existam erros maiores, a
grande maioria está abaixo de 1000 MW, sendo a potência instalada total maior que 14000MW.

Figura 7.35 – Desempenho das previsões de geração eólica dos principais modelos
344    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

7.3 – Modelo de previsão de geração solar fotovoltaica

A importância da geração fotovoltaica, aliada a seu potencial de crescimento na matriz


energética brasileira, fazem com que a acurácia da previsão de geração desse tipo de fonte
torne-se extremamente importante para a operação do sistema, especialmente em tempo real,
pois, por ser uma fonte não controlável, desvios de previsão necessariamente implicam em
redespacho de outras fontes.
As previsões para horizontes de várias horas, e até vários dias, são necessárias aos ope-
radores de rede para o planejamento do despacho das centrais geradoras. Estas previsões são
caracterizadas como de curto prazo e são, comumente, baseadas em modelos de previsão nu-
mérica do tempo (NWP – Numerical Weather Prediction).
O modelo de previsão solar está em fase de construção, portanto, serão apresentados ape-
nas algumas características do modelo em construção, e algumas sugestões futuras do modelo.

7.3.1 – Informações disponíveis para os modelos de previsão de geração fotovoltaica


Além dos dados disponíveis nas instituições do setor elétrico, ONS, CCEE e EPE. Diver-
sos tipos de dados podem ser utilizados para previsão de geração fotovoltaica. Geralmente,
são utilizados dados de satélites, imagens capturadas em superfície, sensores distribuídos nos
parques solares, medições de grandezas elétricas e físicas em tempo real e insumos de mode-
los de previsão numérica do tempo.
A qualidade da previsão de geração fotovoltaica está intimamente relacionada à qualidade
da irradiância prevista pelos modelos NWPs. Esta não é uma tarefa simples, dado que a ra-
diação incidente na superfície terrestre sofre grandes variações, em curtos períodos de tempo,
causados por fenômenos de difícil previsibilidade, como os movimentos, o tipo e caracterís-
ticas das nuvens, poluição atmosférica, grandes incêndios, tempestades de poeira, vapor de
água etc.
Será utilizado no decorrer das próximas seções o termo irradiância e radiação. A irradiân-
cia se refere à quantidade de energia que atinge determinada superfície por unidade de área
por unidade (W/m2). Em meteorologia denomina-se radiação a transferência de energia em
forma de ondas eletromagnéticas. A radiação também é medida em W/m2. A radiação integra-
da em um intervalo de tempo é definida como irradiação solar e é medida em Wh/m².
Para os testes iniciais do modelo de previsão solar fotovoltaica foi utilizado o modelo
numérico GFS. Como as informações necessárias começaram a ser coletadas recentemente,
a falta de longos históricos permite avaliações simplificadas das variáveis a serem utilizadas.
Até o momento, as variáveis utilizadas no processo de previsão de energia fotovoltaica são:
Radiação solar (total) na superfície [W/m2]; Pressão reduzida ao nível médio do mar [Pa];
Umidade relativa a 2m [%]; Cobertura total de nuvens na atmosfera [%]; Temperatura a 2m
[K]. Pretende-se avançar em análises mais extensas dos dados disponíveis, visando consolidar
as variáveis que mais impactam a previsão de geração por fonte solar.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   345 

Os dados de cobertura de nuvens serão avaliados de forma cuidadosa. As previsões de


nebulosidade dos modelos NWPs geralmente se dividem em camadas inferior, média e alta.
Ainda existe uma quarta informação que é a cobertura total de nuvens na atmosfera, cuja apli-
cação deve ser avaliada com profundidade apesar de, como demonstrado por muitos autores
e até agora confirmado com os dados já utilizados, essas informações apresentarem desvios
muito altos.

7.3.2 – Dificuldades para o uso dos dados observados e previstos


Informações brutas observadas geralmente necessitam de tratamentos a fim de retirar va-
lores incoerentes das séries de dados, evitando erros durante a estimação dos parâmetros dos
modelos de previsão. Este trabalho não contemplará a metodologia de tratamento de dados,
apenas serão apresentados tipos de dados, bem como as justificativas das necessidades de de-
senvolvimento de modelos de tratamentos de dados.
Os dados de geração utilizados serão compostos por informações do ONS e da CCEE. As
informações que serão apresentadas no próximo subitem demonstram a necessidade de tra-
tamento e criação de históricos consistidos de dados verificados. Embora os dados da CCEE
apresentem boa qualidade, sua frequência de recebimento possui defasagem de poucos dias para
uso pelo ONS. Tal situação não inviabiliza o uso dessas informações, porém só são aplicáveis
para correções dos históricos de geração verificada. Para qualquer uso que necessite de dados
mais atualizados, a única fonte de informação será o sistema de supervisão e controle do ONS.
Recentemente, um significativo grupo de usinas fotovoltaicas centralizadas entrou em
operação comercial. Tal grupo representa quase a totalidade desse tipo de usina no Sistema
Elétrico Brasileiro (SEB). Sendo assim, os históricos de produção de energia são relativamen-
te curtos. Aliado a esse problema, existe uma variedade de dados de geração verificada, tem-
peratura verificada e irradiância verificada com problemas de medição. Esses dois problemas
devem ser tratados, apesar da reconhecida dificuldade para tanto.
A Figura 7.36 ilustra quatro gráficos, dois de dispersão entre a geração verificada e irradi-
ância verificada, e dois de dispersão entre a geração verificada e temperatura verificada. Cada
dois pares de gráficos de dispersão apresentados são para o histórico total de dados e para os
últimos 30 dias da criação da figura.
Na Figura 7.37 é exemplificado um caso de uma usina com dispersões de características
singulares. Como pode ser observado no gráfico superior à esquerda, na dispersão entre a
geração verificada e a irradiância verificada é possível discernir três relações lineares. Dessa
forma, a estimativa de um modelo linear entre essas duas grandezas pode ficar completamente
comprometida, o que exige um tratamento específico para esse tipo de falha nos dados.
Ainda na Figura 7.36 são observados múltiplos pontos com valores de geração para um
mesmo valor de irradiância. Isso ocorre também para a relação entre a geração verificada e
a temperatura verificada. Os dois problemas ainda se verificam na dispersão dos dados dos
últimos 30 dias, indicando a persistência do problema.
346    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.36 – Dispersão para geração verificada x irradiância verificada e geração verificada x temperatura verificada de
uma usina com dados inconsistentes

Para justificar as imperfeições nos dados da Figura 7.36 usou-se a Figura 7.37, que traz
curvas de cada uma das grandezas apresentadas. Nota-se na parte inferior esquerda, relativa
à geração verificada, que, apesar da geração verificada do ONS (curva em vermelho) apre-
sentar coerência, quando comparada com os dados da CCEE 1h e 5 min (curva azul e verde,
respectivamente), verifica-se a incompatibilidade entre as duas informações. O mesmo se
verifica na parte inferior direita da figura. Os dados de irradiância e temperatura também estão
incoerentes.

Figura 7.37 – Irradiância, temperatura e geração verificada para uma usina com dados inconsistentes
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   347 

7.3.3 – Dados previstos do modelo GFS


O ONS já passou a armazenar em seu banco de dados as informações do modelo de pre-
visão numérica do tempo – GFS. Tais Informações contemplam: irradiância solar (total) na
superfície; pressão reduzida ao nível médio do mar; umidade relativa a 2 m; cobertura total em
camada baixa, média e alta de nuvens na atmosfera; temperatura a 2 m.
Os históricos armazenados destas variáveis, apesar de curtos, já permitem a realização de
algumas análises. A Figura 7.38 ilustra a dispersão, bem como os valores de correlação entre
todas as grandezas. Quando é dito cobertura, refere-se à cobertura total de nuvens, ou seja,
considerando atmosfera com apenas uma camada.
Ela apresenta dados verificados de geração e dados previstos de irradiância, umidade,
cobertura de nuvens e temperatura de um grupo de usinas. Vale salientar que os dados veri-
ficados são aqueles supervisionados pelo ONS, sem qualquer correção, e os dados previstos
provenientes do modelo GFS, de forma que apresentam dispersões associadas a erros de da-
dos, bem como desvios de previsão do GFS.
Observando a Figura 7.38, nota-se uma boa correlação entre a geração verificada e a irra-
diância prevista, bem como entre a geração verificada e a temperatura prevista. Ainda há uma
negativa correlação entre a geração verificada e a umidade prevista pelo GFS. Quando a aná-
lise é feita em relação as informações de cobertura de nuvens, notam-se relações ínfimas entre
ela e a geração. Como a cobertura de nuvens tem forte impacto na geração e o modelo GFS
não prevê essa grandeza com qualidade, é necessário tratamento ou uso de outras informações
para suprir essa deficiência na modelagem.
Ressalta-se que os pontos considerados na Figura 7.38 são apenas para períodos do dia em
que se tem geração, ou seja, período que há radiação solar suficiente para geração de energia.
Como a série temporal da grandeza irradiância tem uma característica típica, de acordo com o
movimento do Sol, ela traz apenas informações qualitativas, dado que na parte da manhã e fi-
nal do dia a radiação é sempre mais baixa. As variáveis meteorológicas temperatura, umidade
e, principalmente, cobertura de nuvens, por outro lado, não apresentam comportamento com
características similares, o que justifica as altas dispersões observadas nos gráficos.
348    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.38 – Correlação das principais variáveis do modelo GFS para a previsão de geração fotovoltaica
de um determinado grupo de usinas do NE

A Figura 7.39 apresenta uma comparação dos dados de geração verificada do ONS e irra-
diância prevista do modelo GFS para um determinado grupo de usinas do Nordeste do Brasil.
Esses dados são plotados sem nenhuma adequação, ou seja, são utilizados apenas para se ter
uma ideia do comportamento e tipos de falhas envolvidas. As curvas não estão sempre em
fase devido às mudanças de curso do Sol ao longo dos dias, meses e às informações do ONS
serem armazenadas em um banco de dados em horário de Brasília, ou seja, ora em GMT-2,
ora em GMT-3. Para uma comparação mais precisa é necessário colocar em fase todas as
curvas, porém o objetivo desta análise preliminar é avaliar o comportamento e em que estado
os dados brutos se encontram e, assim, conseguir estabelecer as regras de tratamento dessas
informações.
Há três elipses (em verde), marcando alguns possíveis erros de medição no gráfico da
parte superior da Figura 7.39, relativo à geração. As duas elipses superiores indicam valores
congelados de dados, enquanto a elipse inferior demonstra valores muito próximos de zero, e
até mesmo negativos, o que indica falha de coleta ou transmissão da informação. Este gráfico
carrega a informação das curvas de geração para diferentes horizontes passados. As curvas em
rosa escuro referem-se a dados dos últimos 600 dias referentes ao dia que a Figura foi cons-
truída. As curvas em rosa claro ilustram informações dos últimos 200 dias. Destacam-se em
vermelho as curvas de geração para os últimos 60 dias de dados. Adicionalmente, em amarelo,
estão as curvas dos últimos dez dias e uma estimativa da geração para o dia seguinte utilizando
informações das previsões do GFS para aquele dia (em roxo).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   349 

Na parte inferior da Figura são apresentadas, considerando a mesma discretização de ho-


rizonte, as curvas de irradiância do modelo GFS. Como os dados do modelo são horários,
percebe-se pequenos segmentos nestes dados, o que não indica problema, pois as mudanças
no perfil das curvas ocorrem rapidamente. Entretanto, esses dados apresentam algumas carac-
terísticas não justificadas pela irradiância medida. No gráfico da irradiância prevista, a elipse
(em verde) ilustra um comportamento que pode estar relacionado a uma possível inércia da
radiação à medida que o Sol se põe, aparentemente um erro sistemático do GFS.

Figura 7.39 – Comparação dos dados de geração verificada do ONS e irradiância prevista do modelo GFS
para um grupo de usinas do NE

A Figura 7.40 explicita a dispersão entre geração verificada do ONS e irradiância prevista
do modelo GFS para um grupo de usinas do Nordeste do Brasil. Como pode ser observado
nas marcações das elipses (em verde), os dados podem ser associados a três grupos de dados
diferentes. O comportamento aparentemente pode ser comparado ao da Figura 7.36, que mos-
tra a dispersão para geração verificada x irradiância verificada, porém a razão não é a mesma,
embora parte desse problema possa vir de erros de medição. Essa característica peculiar se
deve a alguns fatores, tais como: os dados de geração podem carregar limitações operativas;
distorção em relação à irradiância, dado que algumas usinas podem ter rastreadores da posição
do Sol, sendo que a irradiância não segue este efeito; discretização horária do modelo GFS;
comportamento ilustrado na Figura 7.39 para os dados de irradiância no final do dia.
350    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.40 – Dispersão entre geração verificada do ONS e irradiância prevista do modelo GFS para
um grupo de usinas do NE

A Figura 7.41 exemplifica a dispersão entre geração verificada do ONS e temperatura prevista
do modelo GFS para um grupo de usinas do Nordeste do país. Para estes dados verifica-se uma
dispersão menor, indicando uma boa correlação entre os dados de temperatura prevista e gera-
ção verificada. A dispersão ainda existente deve-se ao fato da temperatura não possuir o mesmo
comportamento típico da geração fotovoltaica, ou seja, por mais que se tenha uma sazonalidade
característica durante o dia, esta não se apresenta da mesma forma que aquela da irradiância. A
análise desse tipo de Figura deve ser sempre cuidadosa, levando-se em conta a existência um com-
portamento típico, bem linear, entre a curva de irradiância, temperatura e geração. Sendo assim, a
Figura confirma um comportamento linear, mas esse efeito pode não ser generalizado, dado que a
correlação para os dados em um determinado intervalo do dia pode não ser tão relevante.

Figura 7.41 – Dispersão entre geração verificada do ONS e temperatura prevista do modelo GFS para um grupo de usinas
do NE
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   351 

Finalmente, a Figura 7.42 demonstra a dispersão entre geração verificada do ONS e umi-
dade prevista do modelo GFS para um grupo de usinas do Nordeste. Como os valores de
umidade possuem características diferentes entre os períodos do ano, a dispersão dos dados é
extremamente elevada. Todavia, tal situação não inviabiliza um possível uso desta variável no
modelo de previsão de fonte fotovoltaica. Se para um determinado intervalo do dia a umidade
prevista apresentar alguma correlação com a geração verificada, essa informação poderá ser
utilizada.
O uso da dispersão apresentada na Figura 7.42, com todos os intervalos do dia que pos-
suem geração, serve apenas para se ter uma ideia da complexidade da modelagem de trata-
mento das informações. Estas Figuras trazem noções básicas de que o modelo de previsão de
geração fotovoltaica deverá contemplar características de depuração de dados.

Figura 7.42 – Dispersão entre geração verificada do ONS e umidade prevista do modelo GFS para um grupo de usinas do NE

7.3.4 – Modelos baseados em métodos estatísticos


Existem muitos modelos de previsão com base estatística aplicados nas mais variadas áre-
as do conhecimento. Há uma classe de métodos clássicos como: Box-Jenkins, regressões múl-
tiplas e exponencial. Adicionalmente, estão sendo utilizados extensivamente métodos mais
sofisticados baseados em inteligência artificial, como: redes neurais artificias (ANN – Artifi-
cial Neural Network), máquina vetor de suporte (SVM – Support Vector Machine), sistemas
de inferência fuzzy, algoritmos genéticos (GA – Genetic Algorithm),entre outros.

7.3.4.1 – Modelos de séries temporais


Os métodos de Box – Jenkins [7] para a previsão se baseiam no ajuste de modelos com
valores observados da série temporal, de forma que a diferença entre os valores gerados pelos
352    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

modelos e os valores observados resulte em séries de resíduos de comportamento aleatório


em torno de zero.
Esses métodos podem, para facilitar a compreensão, ser separados em modelos
complementares:
• Modelo autorregressivo (AR): o nome autorregressivo se deve ao fato de que gt no ins-
tante t é função dos g's nos instantes anteriores a t. O primeiro somatório da equação
(7.24) mostra a componente de um modelo AR de ordem (p).
• Modelo médias móveis (MA): neste modelo gt é uma função soma algébrica pondera-
da dos εt que se movem no tempo. O segundo somatório da equação (7.24) apresenta
um modelo de média móvel de ordem (q).

Estes modelos geralmente são utilizados em séries não estacionárias. Para torná-las es-
tacionárias, deve-se transformar a série. Isso é feito, normalmente, diferenciando a série, o
que gera um outro parâmetro do modelo (d). A junção desses modelos é denominada Arima
(Autorregressivo Integrado de Médias Móveis).
Dado o exposto, o método Arima é denotado por Arima (p, d, q): onde p está relacionado
ao número de componentes autorregressivos; d o número de diferenciações necessárias para
tornar a série estacionária; e q é a ordem da média móvel.
Os métodos Arimax (Autorregressivo Integrado de Médias Móveis com Variáveis Exóge-
nas) possuem os mesmos parâmetros do método Arima, adicionada a consideração de variá-
veis exógenas, com o número de variáveis exógenas consideradas no modelo [8]. O método
é explicitado na equação (7.24).
$ & (
𝑔𝑔! = k + % ϕ" g !#" + % ϴ% ε!#% + % β'v' +ε! (7.24)
" % '

sendo: gt a geração eólica/solar no tempo t; k é uma constante; ϕi é o parâmetro da parte


autorregressiva; gt-i é a geração defasada por i passos; θj é o parâmetro relacionado a médias
moveis; εt-j é o erro no tempo t defasado de j passos; βk coeficiente do termo das variáveis exó-
genas; vk representa as variáveis exógenas; ε!~N(0, σ" ) , erro normal de média 0 e variância
constante.
Através da série temporal original é possível obter uma aproximação que explique o pro-
cesso gerador da série, através das funções de autocorrelação ACF (Autocorrelation Function)
e autocorrelação parcial PACF (Partial Autocorrelation Function), assim definidas: autocor-
relação mede o comprimento e a memória de um processo, ou seja, a extensão para o qual
o valor tomado no tempo depende daquele tomado no tempo t-i; autocorrelação parcial:
correlação entre duas observações seriais eliminando a dependência dos termos intermediá-
rios. Tais funções ajudam na escolha da ordem dos modelos através da significância de um
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   353 

determinado lag. Os lags, por sua vez, são definidos como o número de períodos de tempo que
separa os dados. Detalhes podem ser encontrados em [7].

7.3.4.2 – Modelos de inteligência artificial


Podem ser encontrados diversas técnicas de inteligência artificial e Machine Learning.
Essas técnicas têm por característica extrair informações úteis de grandes bancos de dados.
São capazes de encontrar relações não lineares complexas, dificilmente representadas analiti-
camente. Sendo assim, sua aplicação em modelos de previsão é muito apropriada.
As redes neurais artificiais são um subconjunto das técnicas de Machine Learning, sendo
muito utilizadas nos tempos atuais. Há diversos tipos e redes, entretanto para aplicação como
regressão destacam as redes do tipo Multilayer Perceptron (MLP). Muitos trabalhos podem
ser encontrados utilizando essas redes para previsão, como [9]. Existem um conjunto de redes,
denominadas Deep Recurrent Neural Network (DRNN), que apresentam bons resultados para
aplicação em series temporais [10].
Outra técnica que está sendo cada vez mais utilizada, encontrando aplicações de sucesso,
é o Support Vector Machine (SVM). São similares à ANN, que utiliza métodos de aprendizado
supervisionado em análise de regressão. Em [11] pode ser encontrado um exemplo de aplica-
ção de SVM para previsão solar de curto prazo.

7.3.5 – Modelos de regressão multivariada


Em razão da relação linear entre a geração solar fotovoltaica e as grandezas necessárias,
do modelo GFS, necessárias para a previsão, optou-se por um modelo de regressão linear
multivariada. A equação (7.25), descreve a regressão.

g ! = α + β" & x"! + β# & x#! + ⋯ + β$ & x$! + ε! (7.25)

sendo: g a variável dependente ou regressando; 𝑥 a variável independente ou regressor; 𝛼


a interseção ou constante do modelo; 𝛽 o coeficiente angular do modelo; ε o erro, ou variação
de g não explicada pelo modelo.
O objetivo, portanto, é minimizar Erro Quadrático, fazendo !"#
= 0,
!"#
'! = 0,
!"#
'"
!"#
= 0 e e !&' = 0,
!$
% !& !& #
da equação (7.26).
"
𝐄𝐄𝐐𝐐 = $ 𝐞𝐞&𝐭𝐭 " = $ 𝐲𝐲𝐭𝐭 − 𝛂𝛂 ,# - 𝐱𝐱# + 𝛃𝛃
& + 𝛃𝛃 𝐭𝐭
," - 𝐱𝐱" + ⋯ + 𝛃𝛃
𝐭𝐭
,𝐧𝐧 - 𝐱𝐱𝐧𝐧
𝐭𝐭
(7.26)

A Figura 7.43 apresenta o hiperplano ajustado para quando só é utilizado a irradiação e


temperatura para previsão da geração.
354    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.43 – Hiperplano ajustado para variáveis solares

7.3.6 – Resultados
Dos modelos apresentados nas seções anteriores, serão mostrados resultados preliminares
de previsão com modelo de séries temporais Arimax e regressão multivariada utilizando o
modelo numérico GFS. É apresentado também o resultado da combinação desses modelos,
seguindo os conceitos apresentado para a combinação da previsão de geração eólica.
As Figuras 7.44 e 7.45 ilustram as curvas de geração solar fotovoltaica para o Nordeste e
Sudeste, respectivamente. As curvas em vermelho representam a geração verificada do ONS
de todas as usinas simuladas; as curvas em vermelho-escuro a geração verificada do ONS de
todas as usinas solares, incluindo as usinas em testes; as curvas em verde e azul a geração
verificada da CCEE, de 5 min e 1h, respectivamente; as curvas em rosa o melhor histórico
de geração considerado os dados do ONS e CCEE; as curvas em roxo a previsão para o dia
seguinte com o modelo Físico Estimado (regressão multivariada); a curva em azul claro a
previsão com o modelo Arimax; e em preto o modelo combinado.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   355 

Figura 7.44 – Curvas de previsão do total da geração solar fotovoltaica para o Nordeste

Figura 7.45 – Curvas de previsão do total da geração solar fotovoltaica para o Sudeste

Em seguida, é apresentado na Figura 7.46 o conjunto de métricas (percentuais). As métricas


são calculadas utilizando um ano de dados, capturando um período fechado da sazonalidade
356    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

anual. As previsões utilizadas para os cálculos foram para um dia à frente (D+1) para previ-
sões do Sistema Interligado Nacional (SIN).

Figura 7.46 – Desvios de previsão de geração de fonte solar do SIN no período de setembro de 2018 a
agosto de 2019 para previsões do tipo D+1

Como a geração verificada no início da manhã e ao fim da tarde é praticamente nulo, o


MAPE da previsão solar fotovoltaica é extremamente elevado, conforme pode ser observado
no gráfico da Figura 7.46, o que é justificado pela normalização com a geração observada.
Sendo assim, a Figura não permite nenhuma diferenciação da ordem de grandeza dos desvios
percentuais. A tabela 7.4 ilustra os desvios para o modelo combinado, sendo possível identifi-
car a ordem de grandeza dos desvios.
Métrica Combinado
MAPE (%) 147,1
NMAPEpf (%) 5,3
NMAPEpe (%) 6,1
NMAPEfcd (%) 13,1
NMAPEfcm (%) 12,7
NMAPEfca (%) 12,7
Tabela 7.4 – Desvios de previsão de geração solar fotovoltaica do SIN do modelo combinado para previsões do tipo D+1

A seguir, na Figura 7.47, é apresentado o NMAPE normalizado pela potência instalada


evolutiva ao longo do período de estudo, para subsistema Nordeste. Considerando todo o
período que se iniciou as previsões, estendendo de março de 2018 até setembro de 2019. São
ilustradas apenas previsões para um dia à frente (D+1). Nesta Figura é comparado o desempe-
nho das previsões do Físico Estimado (Regressão Multivariada com modelo numérico GFS)
com as previsões do Arimax (modelo de séries temporais com variáveis exógenas do modelo
numérico GFS). Adicionalmente, é inserido o resultado da combinação dos dois modelos.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   357 

Figura 7.47 – NMAPE normalizado pela potência instalada evolutiva da geração fotovoltaica do Nordeste

Estão sendo utilizados os resultados do modelo GFS para previsões apenas até cinco dias
à frente, sendo assim, tanto o modelo Físico Estimado quanto o Arimax realizam previsões
até cinco dias à frente. Para o horizonte de D+6 até D+9, as previsões são realizadas com um
modelo Arima, sem a variáveis meteorológicas exógenas. A Figura 7.48 retrata o NMAPE nor-
malizado pela potência instalada evolutiva da geração fotovoltaica do Nordeste para todos os
horizontes até D+9.

Figura 7.48 – NMAPE normalizado pela potência instalada evolutiva da geração fotovoltaica do Nordeste de D a D+9 do
modelo combinado

7.4 – Sumário do capítulo

As fontes eólicas e fotovoltaicas possuem benefícios importantes para o setor energético


do país, porém apresentam desafios, principalmente para a operação do sistema elétrico. A
358    Previsão de geração eólica e fotovoltaica

Figura 7.49 ilustra a alta variabilidade da fonte eólica. A marcação em azul destaca uma ram-
pa crescente de aproximadamente 7000 MW na geração observada (curva em vermelho) em
poucos dias. A marcação em roxo denota uma rampa descendente de aproximadamente 8000
MW também em um curto período de tempo. A previsão (curva em preto), no entanto, deverá
conseguir acompanhar essas variações abruptas.

Figura 7.49 – Variabilidade da geração eólica

A alta variabilidade da geração eólica e fotovoltaica evidenciam a dificuldade de se prever


a geração dessas fontes, a Figura 7.50 ilustra a alta variabilidade das duas fontes num mesmo
gráfico. Mesmo com capacidade instalada de eólicas no Nordeste de 11.640 MW, no período
de construção do gráfico, e de solar fotovoltaica de 1.210 MW, a geração solar fotovoltaica
pode superar, pelo menos em alguns períodos, a geração eólica.

Figura 7.50 – Geração eólica x fotovoltaica


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   359 

O desenvolvimento dos modelos de previsão de geração eólica e fotovoltaica são ativi-


dades consideradas estratégicas para o ONS, uma vez que o Operador deve possuir expertise
nessa área, reduzindo a dependência externa de tais previsões.
O modelo de previsão de geração solar fotovoltaica está em fase de construção. Já foram
levantadas as principais informações e modelos disponíveis, sendo subsídio para o estabeleci-
mento de quais dados e métodos devem ser utilizados. Algumas metodologias já apresentaram
resultados satisfatórios, e outras a partir de pesquisa na literatura disponível de várias autorias
ainda devem ser testadas, conforme os requisitos de resolução espacial e temporal.
Para previsões em horizontes da programação, várias horas ou dias à frente, o uso dos
NWPs é mais indicado. Os NWPs possuem uma vantagem adicional que é tornar possível a
realização das previsões mesmo para locais com ausência ou precariedade de redes de medi-
ções. Dentre os modelos mais utilizados se destacam os métodos de séries temporais como
MA, AR, ARMA, ARMAX, ARIMA, ARIMAX, entre outros e métodos de inteligência arti-
ficial tais como ANN, SVM, Fuzzy, GA, entre outros. Alguns destes modelos podem ser mais
ou menos adequados de acordo com as informações disponíveis, mesmo que outros modelos
possam apresentar resultados melhores na literatura. Um exemplo disso é a aplicação de redes
neurais artificiais, que apresentam bons desempenhos para soluções de vários problemas não
lineares de previsão, estocásticos e multivariados, porém necessita de amplo histórico de da-
dos, o que nem sempre está acessível, uma vez que o mercado de energia fotovoltaica ainda
está em fase inicial de desenvolvimento no Brasil.
O modelo de previsão eólica está em operação há quase três anos, com desempenho satis-
fatório. Sendo assim, os resultados do modelo até o momento demonstram acerto na escolha
das técnicas utilizadas, sejam elas para o tratamento dos dados, a estimação dinâmica das
curvas Vento x Potência e a correção do viés da previsão de vento. Entretanto, os bons resul-
tados estimulam ainda mais o prosseguimento do avanço dos estudos visando a melhoria do
processo de previsão da geração de fonte eólica.
REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

1. Nascimento PSDC, et al. Desenvolvimento e implantação no ONS de um modelo de previsão de gera-


ção de fonte eólica com customização temporal. Rio de Janeiro: Brazil WindPower; 2017.
2. Chou SC, et al. Refinamento estatístico das previsões horárias de temperatura a 2 m do modelo Eta em
estações do Nordeste do Brasil. Rev Bras Meteorologia.
3. Modelos de previsão de geração eólica. Operador Nacional do Sistema Elétrico. Rio de Janeiro. 2018.
4. Mao Qi, et al. An Optimal Model Output Calibration Algorithm Suitable for Objective Temperature
Forecasting; Weather and forecasting 1999;14(2):190-202.
5. Rolo MNM. Previsão de produção eólica com modelização de incertezas; 2014.
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Energy 2013;52:118-127.
8
PRODUTOS E PROCESSOS PARA O PLANEJAMENTO
E PROGRAMAÇÃO ENERGÉTICA

8.1 – Plano da Operação Energética – PEN

O Plano da Operação Energética (PEN) tem como objetivo apresentar as avaliações das
condições de atendimento ao mercado previsto de energia elétrica do Sistema Interligado
Nacional (SIN) para o horizonte do planejamento da operação energética, cinco anos à fren-
te, subsidiando assim o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico –(CMSE) e a Empresa
de Pesquisa Energética (EPE) quanto à eventual necessidade de estudos de planejamento da
expansão para adequação da oferta de energia aos critérios de garantia de suprimento preco-
nizados pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
As análises contidas no PEN tomam por base o Programa Mensal de Operação (PMO)
do mês de maio, no que diz respeito à oferta, aos condicionantes referentes à segurança ope-
rativa e as restrições ambientais e de uso múltiplo da água, existentes e previstas nas bacias
hidrográficas. A expansão da oferta de geração teve como referência os cronogramas de obras
definidos pelo MME/CMSE/DMSE para o PMO de maio. Com relação à previsão de carga,
os valores de energia e demanda correspondem às projeções elaboradas para a 1ª Revisão
Quadrimestral da Carga do ano.
A elaboração do PEN após o final da estação chuvosa do SIN permite mitigar a influência
das incertezas do comportamento das vazões ao longo dessa estação do ano e, consequente-
mente, dos armazenamentos iniciais das usinas hidroelétricas, que normalmente são os maio-
res valores observados no primeiro ano da avaliação energética do PEN. Neste momento,
estão definidos quais são os montantes armazenados em cada subsistema que poderão ser
utilizados de forma a garantir o suprimento adequado ao menor custo possível.
As principais diretrizes para a execução das avaliações energéticas (entre as quais a aná-
lise de desempenho do SIN – com base nos riscos de déficit e custos marginais de operação
estão em consonância com os Procedimentos de Rede, Submódulo 7.2 – Planejamento anual
da operação energética e Submódulo 23.4 – Diretrizes e critérios para estudos energéticos,
aprovados pela Resolução Normativa ANEEL nº 756/16 de 16/12/2016.

8.1.1 – Visão geral do PEN


As avaliações das condições de atendimento do PEN foram divididas em dois horizontes:
362    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

1. No primeiro horizonte, os dois primeiros anos, foram feitas análises conjunturais de-
terminísticas e probabilísticas, destacando-se as evoluções de armazenamentos de
cada subsistema do SIN. Em geral, nesse período as configurações de usinas e linhas
de transmissão estão definidas e dificilmente há possibilidade de incorporação/anteci-
pação de novos empreendimentos.
2. No segundo horizonte, que compreende os três anos restantes e apresenta um caráter
mais estrutural, são avaliados indicadores como riscos de déficit e custos marginais
de operação. Destaca-se que, nesse período, a expansão da geração e da transmissão
é preponderante para aumentar a segurança do atendimento ao mercado de forma es-
trutural. Mesmo com o equilíbrio entre a oferta de garantia física e a carga prevista
(equilíbrio estrutural), premissa do modelo institucional vigente, situações conjuntu-
rais desfavoráveis de suprimento energético podem ocorrer, em grande parte devido à
conjugação de situações hidrológicas adversas com a gradativa redução da capacidade
de regularização do sistema hidroelétrico brasileiro, fruto da evolução da matriz de
energia elétrica. Nesse contexto, apesar da oferta já estar contratada através dos leilões
de energia nova, pelo princípio básico do modelo institucional vigente, o ONS deve,
se necessário, recomendar ao CMSE/EPE estudos de viabilidade da expansão adicio-
nal e/ou antecipação da oferta já contratada para aumentar a margem de segurança do
sistema, à luz dos critérios de segurança da operação e do nível de reserva energética
que possa ser necessário para enfrentar situações climáticas adversas.

A Figura 8.1 resume a sistemática básica utilizada nos estudos de planejamento da opera-
ção de médio prazo, com horizonte futuro de cinco anos, período no qual a ampliação da ofer-
ta de geração considerada já está contratada, através dos leilões de expansão ao menor custo.

Figura 8.1 – Sistemática básica dos estudos de planejamento da operação


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   363 

Nos dois primeiros anos, o desempenho do sistema depende basicamente das condições
hidroenergéticas de curto prazo, principalmente dos níveis de partida ao final da estação chu-
vosa. Considerando-se que nesse período qualquer alteração da oferta depende essencialmen-
te da viabilidade da antecipação de obras já em andamento, seja de geração ou transmissão, as
ações sistêmicas para a segurança do atendimento à carga se limitam a “proteger” o sistema
para diferentes hipóteses de severidade das estações seca (maio a novembro) e chuvosa (de-
zembro a abril do segundo ano), através do uso de ações operativas de curto prazo.
Para o primeiro ano desse horizonte são realizadas avaliações prospectivas com o modelo
DECOMP, utilizando previsões de afluências com o modelo SMAP. Dessa maneira, são obti-
das as evoluções dos armazenamentos dos principais reservatórios do SIN e dos subsistemas
equivalentes.
Para o segundo ano desse período, análises probabilísticas e determinísticas, com séries
sintéticas e históricas de energia natural afluente, devem subsidiar eventuais recomendações
de ações operativas de curto prazo e/ou avaliações pelo CMSE/EPE da viabilidade de anteci-
pação de projetos em andamento. Não obstante, reforça-se a necessidade de especial atenção
ao uso das métricas de natureza probabilística, em particular os riscos de déficit, uma vez que
estes são cada vez mais influenciados pelas condições de armazenamento inicial e pela ten-
dência hidrológica do passado recente, como já mencionado anteriormente.
Este é um ponto de destaque nas avalições probabilísticas para o horizonte de médio prazo.
A experiência de 2014 e a avaliação da estação chuvosa de 2015, com um quadro hi-
droenergético bastante desfavorável para diversas bacias hidrográficas das regiões Sudeste/
Centro-Oeste e Nordeste, mostrou claramente que os riscos de déficit sofrem variações no in-
tervalo de até cinco anos, dependendo dos armazenamentos iniciais, mesmo no caso de simu-
lações com função de custo de déficit de um patamar. Avaliando-se os resultados dos PMOs de
2014 e 2015, verificou-se maior impacto nos dois primeiros anos, quando os riscos de déficit
oscilaram dentro e fora do critério de garantia preconizado pelo CNPE. Esta é uma das razões
pelas quais, a partir do PEN 2014, foram apresentadas avaliações de cenários determinísticos
de energias naturais afluentes para os dois primeiros anos, com objetivo de ter-se uma análise
de desempenho do SIN com maior estabilidade e praticidade.
Com relação aos três últimos anos do horizonte de análise, apesar da oferta já estar contra-
tada através dos leilões de energia nova, pelo princípio básico do modelo institucional vigente,
o ONS deve, se necessário, recomendar ao CMSE/EPE estudos de viabilidade da expansão
adicional e/ou antecipação da oferta já contratada para aumentar a margem de segurança do
sistema, à luz dos critérios de segurança da operação e do nível de reserva energética que pos-
sa ser necessário para enfrentar situações climáticas adversas.
Nesse horizonte, ainda são feitas avaliações com cenários sintéticos e históricos de ener-
gias naturais afluentes, utilizando-se o Modelo Newave, avaliando-se a frequência relativa de
séries com algum déficit de energia em cada ano e em cada subsistema para diferentes percen-
tuais de corte da carga projetada – análise de risco. Cabe destacar que, embora nesse horizonte
364    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

ainda sejam percebidas variações dos riscos de déficit em razão dos armazenamentos iniciais,
estas têm uma variabilidade bem inferior aos dois primeiros anos de estudo, em razão, basi-
camente, das estações chuvosas subsequentes, que podem permitir reenchimentos dos reser-
vatórios, mesmo que parcialmente. Além de que, como tradicionalmente os riscos de déficit
são avaliados para a ocorrência de qualquer série com déficit no ano de análise, à medida que
o tempo avança no ano em curso a estatística de risco de déficit tende a sofrer reduções pelo
menor do período de análise (número menor de meses) conforme se aproxima a estação seca,
quando as incertezas são menores.

8.1.2 – Características da oferta do SIN


O Sistema Interligado Nacional é predominantemente hidroelétrico e composto por um
conjunto significativo de usinas hidroelétricas programadas e despachadas centralizadamente,
várias delas com grandes reservatórios de regularização plurianual. A maioria dessas usinas
está localizada longe dos centros de carga, o que exige um extenso sistema de transmissão
interconectando-as aos centros de consumo.
As interligações inter-regionais propiciam a transferência de grandes blocos de energia
entre os subsistemas, permitindo que o ONS, através da operação integrada do SIN, explore
a diversidade hidrológica entre regiões, o que resulta em ganhos sinérgicos consideráveis e
aumento da segurança do atendimento ao mercado. A integração entre subsistemas contribui
para a expansão da oferta de energia e para a otimização dos recursos energéticos, através da
complementaridade energética existente entre os referidos subsistemas.
Sistemas elétricos com essas características apresentam, ao contrário de sistemas térmicos
ou sistemas hidrotérmicos com baixa regularização de vazões afluentes, uma singularidade
operativa, qual seja: as decisões imediatas de operação no presente afetam as condições ope-
rativas futuras, na medida em que o uso maior dos estoques de água armazenada, em detri-
mento da geração térmica complementar, pode comprometer a qualidade de suprimento no
futuro, caso as energias naturais afluentes às usinas hidroelétricas não sejam suficientes para o
atendimento ao mercado. Por outro lado, as decisões operativas presentes são tomadas tendo
por base as expectativas de evolução de variáveis fundamentais no futuro, tais como a carga,
a expansão da oferta, os limites das interligações inter-regionais e a disponibilidade de gera-
ção, reflexo da disponibilidade de combustível para as usinas térmicas e água para as usinas
hidroelétricas.
Esse processo de decisão operativa pode ser entendido como decisão acoplada no tempo,
ou seja, o futuro traz informações para melhor operar no presente. Se a operação no presente
for desacoplada dessas informações do futuro, as condições de suprimento poderão ficar com-
prometidas pelo uso inadequado de recursos que poderão fazer falta no futuro, como estoque
de água nos reservatórios. O horizonte de decisão será tão mais distante do presente quanto
maior for o grau de regularização do sistema ou a quantidade de energia que pode ser estocada
nos reservatórios.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   365 

Tendo em vista a duração do período crítico do SIN, cerca de 60 meses, e a elevada capa-
cidade absoluta de armazenamento do sistema hidroelétrico, da ordem de 300.000 MWmed,
que requer afluências favoráveis para seu pleno reenchimento, os estudos de planejamento e
programação da operação contemplam um horizonte de decisão de cinco anos.
Cabe destacar que a expansão da oferta do SIN vem sendo composta por hidroelétricas
com baixa ou nenhuma capacidade de regularização e por uma quantidade expressiva de ter-
moelétricas, cujo custo para despacho relativamente elevado tende a retardar seu acionamen-
to. Esta característica da nova oferta, aliada ao crescimento da carga, tem reduzido gradati-
vamente a capacidade de regularização plurianual do SIN, acentuando seu deplecionamento
ao final da estação seca e aumentando sua dependência das estações chuvosas subsequentes.
Além disso, registra-se a crescente participação da fonte eólica na matriz energética do SIN,
trazendo desafios ligados principalmente à intermitência dessa fonte.
Essa mudança de paradigma no planejamento e programação da operação, em que o esto-
que de energia nos reservatórios aumentou significativamente seu peso na segurança do aten-
dimento energético, especialmente nos dois primeiros anos do horizonte, vem sendo abordada
pelo ONS através da implementação de mecanismos operativos de segurança, descritos no
Capítulo 4.
Nos Planos da Operação Energética recentes, vem-se apontando como um fato relevante
a mudança de paradigma que já se faz necessária na operação do SIN, em razão, basicamente,
dos seguintes aspectos:
• Desde o final da década de 1990 não entram em operação usinas hidroelétricas com
reservatórios de regularização plurianual.
• O uso da geração termoelétrica tem sido mais intenso, mesmo com a ocorrência de
anos hidrológicos próximos à média de longo termo (MLT).
• A continuidade da expansão da transmissão se apresenta como de fundamental impor-
tância, permitindo a importação e/ou exportação de grandes blocos de energia entre
regiões, tirando proveito da diversidade hidrológica existente entre bacias e/ou regiões
e mesmo entre as fontes de geração, como a eólica e a biomassa, fator importante para
a garantia do abastecimento e da redução dos custos de operação.
• A geração termoelétrica também vem sendo necessária para complementação do aten-
dimento à demanda máxima ao final de cada estação seca, em razão da perda de po-
tência por deplecionamento dos reservatórios nas usinas hidroelétricas, bem como no
verão, devido à elevação da temperatura com um consequente aumento no consumo
de energia elétrica.
• A entrada em operação de grandes hidroelétricas a fio-d´água na Amazônia com acen-
tuada sazonalidade, apresentando montantes significativos de geração na estação chu-
vosa e baixa produção na estação seca.
• A expressiva expansão da geração eólica para os próximos cinco anos, exigindo ações
operativas mitigadoras dos potenciais impactos sistêmicos e locais decorrentes da
366    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

forte variabilidade/intermitência, intrínseca dessa fonte, bem como da sua baixa pre-
visibilidade de geração.

Todos esses aspectos conduzem a mudanças na definição das estratégias de operação do


sistema, com custos de operação mais elevados em decorrência do significativo despacho tér-
mico. Portanto, tornam-se necessárias algumas reflexões sobre os atributos da Matriz de Ener-
gia Elétrica desejada para o futuro, sendo que neste contexto as seguintes reflexões devem ser
consideradas para a definição das diretrizes gerais quanto à expansão do SIN:
• Embora as condições topográficas da região Amazônica, onde está a maior parte do
potencial hidroelétrico remanescente, não favoreçam a construção de reservatórios
de regularização, sugere-se a inclusão na Matriz de novas usinas hidroelétricas com
algum grau de regularização. Entende-se que estas usinas serão importantes para a res-
tauração da capacidade do SIN de suportar períodos hidrológicos desfavoráveis e para
a mitigação das consequências das variabilidades/intermitências da geração de fontes
não convencionais, como eólica e solar, num futuro próximo;
• É importante destacar que, embora exista maior constância dos ventos da Região Nor-
deste, quando comparados com os ventos de rajada na Região Sul e com os ventos em
outros países, será cada vez mais importante a geração de backup. Hoje, a variabilida-
de/intermitência da geração eólica no Brasil está sendo mitigada pelo recebimento de
energia pela Região Nordeste, pelas usinas hidráulicas disponibilizadas no Controle
Automático de Geração – CAG em outras regiões e com usinas térmicas locais de alto
custo de operação. Na medida em que a parcela de fontes renováveis variáveis/inter-
mitentes adquira maior participação na Matriz de Energia Elétrica brasileira, maio-
res demandas por geração de backup serão necessárias, quer com usinas hidráulicas
no CAG quer com usinas térmicas de rápida tomada de carga, as chamadas “usinas
flexíveis”.
• A ampliação dos grandes troncos de transmissão, em especial entre regiões, deve con-
siderar inclusive o critério N-2 de confiabilidade em seu planejamento e, se necessá-
rio, na operação, como forma de mitigar o impacto da eventual ocorrência de grandes
perturbações decorrentes das adversidades climáticas presentes no Brasil.
• O aumento da participação de fontes térmicas convencionais (carvão mineral e gás
natural) no médio prazo, para a complementação da geração hidroelétrica com sinal
locacional pré-definido.
• A viabilidade da expansão do parque nuclear no longo prazo, visto que são usinas ti-
picamente de base e podem contribuir para atenuar a perda crescente de regularização
do SIN.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   367 

8.1.2.1 – A sazonalidade
A expansão da hidroeletricidade na Amazônia, com características de grande capacidade
de produção no período chuvoso, sem reservatório de acumulação, e baixa produção no perí-
odo seco, ocasiona uma acentuada sazonalidade da oferta, à semelhança da usina de Tucuruí,
em operação, no rio Tocantins.
Os projetos do Complexo Madeira, Santo Anto Antônio e Jirau, a UHE Teles Pires e a
UHE Belo Monte estão localizados longe dos grandes centros de carga, exigindo extensos
sistemas de transmissão para o transporte de grandes blocos de energia nas estações chuvosas
e pequenos montantes durante as estações secas, aumentando, sobremaneira, a complexidade
operativa do SIN em termos de segurança eletroenergética.
Conforme análise desenvolvida pelo ONS em estudos específicos da integração dessas
usinas da Região Norte, observa-se que no segundo semestre da cada ano, quando a geração
das usinas a fio-d’água da região Amazônica encontra-se em patamares bastante reduzidos,
a geração térmica flexível e a geração de usinas não simuladas individualmente (inflexíveis)
apresentam-se em patamares mais elevados, compensando, juntamente com o depleciona-
mento dos reservatórios do SIN, a redução da geração hidráulica. Essa operação confirma o
papel importante das fontes alternativas complementares na segurança operativa do SIN.
Cabe destacar que a oferta significativa de energia elétrica de origem hidráulica com perfil
altamente sazonal e abundante proveniente das usinas da região Amazônica resulta também
em modificações dos perfis atuais da operação do SIN, com uma tendência de se atingir níveis
cada vez mais baixos de armazenamento ao final de cada estação seca.

8.1.2.2 – Complementaridade da oferta


Fato importante diz respeito ao perfil de geração das fontes alternativas, como biomassa e
eólicas, que apresentam maior disponibilidade exatamente nas estações secas do SIN, sendo,
portanto, complementares à oferta hídrica, ou seja, fontes que desempenham o papel de ver-
dadeiros “reservatórios virtuais”.
Este fato explica as Resoluções Normativas da Aneel (440/2011 e 476/2012), revogadas
pela Resolução Normativa 843/2019, que buscam melhor representação dessas fontes através
da previsão com base no histórico de performance de cada fonte não simulável, para cada
subsistema. Dentro desse contexto, ressalta-se a melhoria metodológica proposta pelo ONS
através da nota técnica ONS 0046/2016 e aprovada para uso a partir do PMO de maio/2016
pela Aneel, através do Ofício nº 096/2016-SRG/Aneel de 19 de abril de 2016, e, portanto,
utilizada a partir do PEN 2016.
Para as usinas térmicas convencionais flexíveis ou não, cabe destacar que também de-
sempenham papel importante na segurança operativa do SIN, na medida em que possam ser
acionadas para garantir os estoques de segurança durante o período seco. Vale também lem-
brar que o período seco do SIN é coincidente com períodos de temperaturas mais altas no
368    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Hemisfério Norte, o que permite uma complementaridade de oferta de geração com o GNL,
e vice-versa.
As fontes eólicas, embora estas sejam representadas de forma “inflexível”, abatidas dire-
tamente da carga, apresentam características marcantes de intermitência, em razão do perfil
dos ventos, o que traz desafios importantes, em termos operativos, sendo necessário o provi-
sionamento de energias de backup quando das suas indisponibilidades e/ou reserva operativa
suficiente.
Com relação às fontes a biomassa, embora, em geral, não estejam disponíveis durante o
ano inteiro, ficam sujeitas às safras agrícolas (principalmente bagaço de cana), sendo, no en-
tanto, influenciadas pelas condições climáticas a cada estação. No caso do subsistema Sudes-
te/Centro-Oeste, por exemplo, uma usina a biomassa movida a bagaço de cana de açúcar tem
disponibilidade de combustível em aproximadamente sete meses do ano, durante o período de
safra, de maio a novembro.
A Figura 8.2 ilustra a complementaridade anual das diversas fontes, ou seja, a diversidade
de produção ao longo de um mesmo ano permite mitigar o efeito da sazonalidade da oferta
hídrica, compensando a perda gradual de regularização, desde que suas ofertas sejam firmes e
em montantes equivalentes à redução da oferta hídrica, ou seja, é extremamente importante a
avaliação dessas disponibilidades para efeito de planejamento da operação.

Figura 8.2 –Complementaridade anual das diversas fontes

Destaca-se ainda a inserção da energia fotovoltaica na matriz elétrica brasileira, com


a evolução da capacidade instalada desta fonte dos atuais 952 MW (ano de 2019) para
3.638 MW em 2022, o que representa uma participação de 2,1% da matriz elétrica. Embora
esta fonte seja representada, assim como as eólicas, de forma “inflexível”, abatida diretamente
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   369 

da carga, sua crescente expansão demandará uma representação mais fidedigna com o seu
perfil de geração, que possui diferença relevante de valores entre os patamares leve, médio e
pesado.

8.1.2.3 - Redução do grau de regularização


Embora a hidroeletricidade continue sendo predominante em nossa matriz, o acréscimo
desse tipo de fonte tem se dado atualmente por usinas com baixo ou nenhum grau de regula-
rização anual ou plurianual (usinas com pequeno ou nenhum reservatório de regularização).
Esse fato se deve às restrições de ordem ambiental, com requisitos de ações mitigadoras
cada vez mais rigorosos, o que acaba por inviabilizar a construção de reservatórios de regu-
larização e/ou a inviabilidade econômica de formação de grandes reservatórios em regiões
como a Amazônia, por exemplo, caracterizada por potenciais hidroelétricos de baixa queda e
altas vazões no período chuvoso, o que exigiria investimentos antieconômicos para o represa-
mento das vazões nas estações úmidas.
Em razão dessa característica, o Grau de Regularização do SIN – GR tem apresentado
uma tendência de redução gradativa para os próximos anos, na medida em que o crescimento
da carga não seja acompanhado pela agregação de novas usinas com reservatório de regula-
rização e/ou por montantes equivalentes proporcionados por outras fontes complementares
inflexíveis.
Importante destacar que quanto menor o GR de um sistema como o SIN, com acentuada
sazonalidade das vazões naturais afluentes aos reservatórios, maior será a dependência de
períodos chuvosos para o seu reenchimento a cada ciclo hidrológico anual e maior será o seu
esvaziamento a cada final de estação seca, aumentando a necessidade de fontes complemen-
tares nesses períodos e/ou mecanismos operativos de segurança específicos para a garantia
de atendimento ao mercado, impactando diretamente no custo final da energia produzida, em
favor da segurança operativa.
Essa afirmação serve para ratificar a tese de que as restrições às construções de reser-
vatórios de regularização tornam as fontes complementares cada vez mais importantes para
atenuar a redução gradativa do GR do SIN.

8.1.2.4 – Custo e relevância da oferta térmica


A necessidade de atendimento a uma carga crescente, associada à redução gradativa da ca-
pacidade de armazenamento no SIN e à tendência de oferta hidroelétrica abundante apenas no
período chuvoso (como a oferta da Amazônia, com sazonalidade acentuada), obriga a comple-
mentação da geração hidroelétrica no período seco de cada ano, seja por usinas térmicas con-
vencionais e/ou pelas fontes alternativas (eólicas/biomassa/solar). Assim, o parque térmico e
as fontes alternativas passam a ter, cada vez mais, o papel de “reservatório virtual” do SIN.
370    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

As usinas termelétricas convencionais, flexíveis ou não, passam a desempenhar um pa-


pel importante na segurança do SIN. O montante de geração térmica disponível e seu custo
para despacho são fatores determinantes no novo perfil da oferta no SIN. A Figura 8.3, a
seguir, apresenta a distribuição, por fonte, dos Custos Variáveis Unitários – CVUs do parque
termoelétrico previsto para entrar em operação até 2023. Pode-se observar, além da grande
interseção entre os custos das diversas fontes, uma elevada dispersão – UTEs com custos para
despacho variando de 11 (Carvão) e 16 (Biomassa) até 54 (óleo combustível e diesel) vezes
superior ao da mais barata (nuclear).

Figura 8.3 – Distribuição dos Custos Variáveis Unitários por Fonte [R$/MWh] (Referência – maio/2019)

Outra característica relevante do parque térmico é sua inflexibilidade para despacho, onde
tipicamente, as fontes mais flexíveis são as de CVU mais elevado: GNL, óleo combustível e
óleo diesel. Destaca-se, ainda, que em nossa matriz de energia elétrica não temos incremento
de potência significativo para as térmicas com valores de CVU acima de 800 R$/MWh, o que
acaba colaborando para a volatilidade dos CMOs quando do despacho de geração térmica nes-
sa faixa de custo, o que inclusive pode explicar a alteração de bandeiras tarifárias entre PMOs
ao longo de cada ano, a Figura 8.4 ilustra esse fato.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   371 

Figura 8.4 – Potência térmica do SIN (MWmed) x CVU (R$/MWh)

8.1.3 – Representação a subsistemas e das interligações


Nos estudos do PEN, objetivando avaliar as condições de atendimento ao SIN com base
em uma configuração representativa da prática operativa, são representados como subsistemas
independentes, além do Sudeste/Centro-Oeste, Sul, Nordeste e Norte, os subsistemas Manaus,
Amapá, Belo Monte e Itaipu.
A Figura 8.5 esquematiza a configuração eletroenergética adotada no PEN 2019, incluin-
do os nós fictícios Imperatriz, Xingu, Jurupari e Ivaiporã. Esses nós não possuem geração ou
carga associados.

Figura 8.5 – Configuração eletroenergética – Referência PEN 2019


372    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

As interligações inter-regionais propiciam a transferência de grandes blocos de energia


entre os subsistemas, permitindo que o ONS, através da operação integrada do SIN, explore
a diversidade hidrológica entre regiões, o que resulta em ganhos sinérgicos consideráveis e
aumento da segurança do atendimento ao mercado. A integração entre subsistemas contribui
para a expansão da oferta de energia e para a otimização dos recursos energéticos, através da
complementaridade energética existente entre os referidos subsistemas.
Não obstante, grandes interligações com transferências de grandes blocos de energia au-
mentam sobremodo a complexidade do planejamento, da programação e da operação elétrica
do SIN, no que diz respeito à segurança operativa.

8.1.4 – Principais resultados

8.1.4.1 – Avaliações energéticas


A avaliação das condições de atendimento pode ser dividida em dois períodos. Nos dois
primeiros anos do horizonte de estudo, a oferta está definida e, em geral, não é mais possível a
incorporação/antecipação de novos empreendimentos. Neste período, o atendimento ao mer-
cado depende basicamente dos níveis de armazenamento dos reservatórios, das afluências às
usinas hidroelétricas e da disponibilidade de geração térmica complementar.
Nos três anos restantes, a expansão da geração e da transmissão é preponderante para
aumentar a segurança do atendimento ao mercado de forma estrutural. Mesmo com equilíbrio
entre a oferta de energia e a carga prevista, premissa do modelo setorial, situações desfavorá-
veis de suprimento energético podem ocorrer, em grande parte devido à gradativa redução da
capacidade de regularização do sistema hidroelétrico.
A análise deste período permite ao ONS encaminhar propostas para a tomada de decisões
estratégicas, tais como antecipações de obras; necessidade de avaliação, pelo MME/CMSE –
EPE, da implantação de oferta adicional ao programa de expansão definido para os primeiros
cinco anos; ou mesmo a constituição de Reserva de Geração e/ou Energia de Reserva, nos
termos da Lei nº 10.848, de 15/03/2004 e do decreto nº 6.353, de 16/01/2008.
Dessa forma, para as avaliações energéticas do PEN, são considerados dois tipos de aná-
lises, denominadas conjuntural e estrutural, conforme descrito a seguir.

8.1.4.1.1 – Análise conjuntural


Nos primeiros dois anos da análise das condições de atendimento, o desempenho do sis-
tema depende basicamente das condições hidroenergéticas de curto prazo, em especial dos
níveis de partida ao final da estação chuvosa (mês de maio do primeiro ano) e dos níveis al-
cançados ao final da estação seca (novembro do primeiro ano).
Considerando-se que nesse período qualquer alteração da oferta depende essencialmente
da viabilidade da antecipação de obras já em andamento, seja de geração ou transmissão, as
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   373 

ações sistêmicas para a segurança do atendimento à carga se limitam a proteger o sistema para
diferentes hipóteses de severidade das estações seca (maio a novembro) e chuvosa (dezembro
a abril do segundo ano), através do uso de ações operativas de curto prazo.
Desta forma, estas análises têm como objetivo avaliar as condições de atendimento à
carga do SIN a partir das atuais condições energéticas do sistema. Para tal, a influência da
situação hidroenergética conjuntural é um fator de grande relevância face a proximidade do
final da estação seca e a transição para a próxima estação chuvosa. Logo, o uso de cenários
sintéticos de ENA condicionados ao passado recente é também importante.
Dentre as avaliações conjunturais podem ser feitos os seguintes estudos:
1. Avaliação Prospectiva para o primeiro ano: composta por simulações utilizando diver-
sos cenários de afluência, onde avalia-se a probabilidade de ocorrência dos níveis de
armazenamento previstos para o final do período seco (novembro).
2. Avaliação Prospectiva para o segundo ano: avaliações de requisitos de ENAs em di-
ferentes períodos que permitiriam o atingimento de níveis mínimos de segurança (por
exemplo: 10, 20 e 30% EARmáx) capazes de garantir o atendimento da carga do se-
gundo ano. A Figura 8.6 ilustra esse tipo de avaliação.

Figura 8.6 – Nível de segurança período úmido e ENA necessária

8.1.4.1.2 – Análise estrutural


As Análises Estruturais iniciam seu horizonte de planejamento ao final do período úmido,
com os níveis iniciais considerados no PMO de maio do primeiro ano, e com a geração dos
cenários sintéticos de ENA não condicionados ao passado recente. O objetivo dessa análise
é avaliar as condições de atendimento à carga do SIN estruturalmente, com foco no horizonte
para os três últimos anos do horizonte de análise, onde a expansão da geração e da transmissão
são preponderantes na segurança operativa do SIN.
Nesse horizonte, a metodologia usual de avaliação de desempenho do SIN está calcada na
identificação dos riscos de déficit de energia, adotando-se a função de custo de déficit de um
patamar e a geração de cenários sintéticos de ENAs não condicionados ao passado recente.
374    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Além dos riscos de déficit, são avaliados os custos marginais de operação (valores médios
anuais obtidos com simulações com 2.000 séries sintéticas de energias afluentes e com séries
históricas), os congestionamentos nas interligações, os balanços estáticos de energia e o ba-
lanço estático de demanda.

8.1.4.2 – Balanço estático de energia


Um balanço estático de energia compara a oferta de energia prevista com a carga projeta-
da no horizonte de análise. No caso do Balanço Estático de Energia apresentado neste item, a
oferta corresponde:
1. Para as usinas hidroelétricas e termoelétricas, os certificados de garantia física dos em-
preendimentos em conformidade com os documentos formais do Poder Concedente.
2. Para as usinas não simuladas individualmente considera-se a expectativa de geração
de acordo com a Resolução Normativa Aneel n° 843/2019, que substituiu as Reso-
luções Normativas Aneel nº 440/2011 e nº 476/2012 e que adota como referência o
histórico de geração das usinas em operação comercial.

Quando o resultado deste balanço é positivo, ou seja, a oferta de energia é superior à


carga, considera-se que o sistema está em uma situação de sobra de energia. Caso contrário,
quando a carga é superior à oferta, o sistema encontra-se numa situação de déficit de energia.
Todavia, sempre se destaca que o balanço de energia tem significado apenas indicativo da
oferta estrutural de energia elétrica do SIN, na medida em que não considera as transferências
de energia entre os subsistemas ao longo do ano e a redução de disponibilidade de energia das
usinas hidráulicas em situações hidrológicas desfavoráveis. A Garantia Física de uma usina
independe da sua geração real e está associada às condições que cada usina pode fornecer ao
sistema no longo prazo, assumindo um critério específico de atendimento do mercado.
Dessa forma, balanços estáticos de energia não são, por si só, métricas suficientes para
avaliar as condições de atendimento à carga de sistemas elétricos como o brasileiro, mas per-
mitem qualificar e/ou quantificar algumas situações estruturais, como a plena contratação da
carga prevista pelos agentes distribuidores, segundo as regras do atual modelo institucional
(100% de contratação), ou situações típicas de condições extremas de atendimento, podendo
orientar decisões mitigadoras de planejamento.
A Figura 8.7 permite visualizar uma avaliação onde há sobras de energia no SIN, resulta-
do do PEN 2019, uma vez que a oferta estática de energia é superior à carga própria projetada
em todo horizonte de análise.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   375 

Figura 8.7 – Evolução da oferta estática de energia e da carga 2019-2023 (MWmed)

8.1.4.3 – Atendimento à ponta


A avaliação das condições de atendimento à demanda máxima do sistema no horizonte
quinquenal é uma das atividades que integram o escopo do planejamento da operação do Sis-
tema Interligado Nacional (SIN) e tem sido objeto recorrente de aperfeiçoamentos metodoló-
gicos nas últimas edições do Plano da Operação Energética (PEN), inclusive com interações
com as equipes de planejamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), no sentido de
subsidiar as decisões com relação aos aspectos regulatórios e de investimentos que terão que
ser direcionados para a garantia de atendimento a esse requisito.
Os principais aperfeiçoamentos considerados nas últimas edições do PEN foram resultan-
tes da busca de uma representação topológica cada vez mais detalhada do SIN e a considera-
ção, dentro do possível, de uma abordagem probabilística.
Até 2013, os estudos de atendimento à demanda máxima eram realizados considerando-se
o detalhamento apenas dos quatro subsistemas tradicionais (Sudeste/Centro-Oeste, Sul, Nor-
deste e Norte) e a disponibilidade de potência das usinas hidroelétricas, inclusive das PCHs,
admitindo-se a hipótese de perdas por deplecionamentos das usinas com reservatórios de re-
gularização, segundo a experiência operativa de 2001/2002, quando ocorreu o racionamento
de energia e os reservatórios excursionaram em níveis bastante reduzidos.
A partir do Ciclo de 2014, a avaliação de atendimento à demanda máxima passou a con-
templar um maior detalhe na representação topológica do SIN com a separação de usinas e
áreas, tais como: Manaus/Amapá, Belo Monte, Teles Pires, Madeira e Acre/Rondônia. Além
disso, a função de perdas por deplecionamento de cada subsistema passou a ser estimada a
partir de uma regressão por mínimos quadrados nos pontos de perdas por deplecionamento
versus energia armazenada, obtidos de uma simulação a usinas individualizadas com o mo-
delo SUISHI, resultando em uma função mais precisa em relação a anteriormente utilizada.
376    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Entre 2015 e 2017, foi considerada uma representação ainda mais detalhada da interli-
gação Norte/Sul, da UHE Itaipu e dos limites de transmissão associados, que passaram a ser
representados de forma explícita, além de serem adotados cenários probabilísticos de dispo-
nibilidade hidroelétrica, para cada usina do SIN, através de simulação hidrotérmica com o
programa SUISHI (séries históricas) e, para cada um desses cenários, calculados os balanços
estáticos de demanda máxima.
O balanço de ponta tem como objetivo avaliar o atendimento aos requisitos da demanda
máxima em cada subsistema, considerando condições eletroenergéticas conjunturais e aspec-
tos estruturais relevantes, permitindo, assim, uma análise de cunho estratégico, levando-se em
consideração as capacidades de intercâmbios entre as diversas regiões do SIN.
A análise consiste num balanço estático onde são confrontados os requisitos de demanda
com as disponibilidades de potência das diversas fontes de energia que compõem o SIN. O
balanço é denominado estático por não considerar o acoplamento temporal das decisões entre
os meses, o que significa que não será feita a coordenação de recursos hidroelétricos para
atendimento à demanda máxima no período seguinte.
No Ciclo de Planejamento de 2018, considerou-se a nova abordagem, que permitiu me-
lhor caracterização da geração eólica e fotovoltaica no atendimento aos requisitos de deman-
da, uma vez que essas fontes têm acentuada variabilidade e eventual intermitência local ao
longo do dia. Nesta abordagem, em vez de identificar-se a priori a hora de ponta de cada mês
e a contribuição das fontes eólica e fotovoltaica para o atendimento à demanda nessa hora,
elaborou-se, para cada mês e subsistema, uma curva de carga diária típica, baseada no histó-
rico recente. Desta forma, pode-se avaliar o atendimento aos requisitos de demanda para cada
uma das 24 horas diárias.
Além disso, com esta abordagem, puderam ser avaliados cenários de geração eólica e fo-
tovoltaica e, eventualmente, identificados problemas no atendimento aos requisitos de deman-
da não necessariamente na hora de ponta do sistema, mas em momentos de baixa contribuição
das fontes eólica e fotovoltaica ao longo do dia.
No PEN 2019, seguindo o processo contínuo de aperfeiçoamento do processo, foram
ampliados os cenários de geração eólica e fotovoltaica, que continuam tendo como base o
histórico de geração supervisionada pelo ONS do último ano para estas fontes.
Desta forma, será descrito o processo de avalição para o atendimento à demanda máxima
do SIN aplicado no PEN 2019, bem como os resultados.
A análise consiste num balanço estático onde são confrontados os requisitos de demanda
com as disponibilidades de potência das diversas fontes de energia que compõem o SIN. O
balanço é denominado estático por não considerar o acoplamento temporal entre os meses, o
que significa que não será feita a coordenação de recursos hidroelétricos para atendimento à
demanda máxima no período seguinte.
A metodologia proposta está resumida no fluxograma apresentado na Figura 8.8.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   377 

Figura 8.8 – Fluxograma para Atendimento à Demanda – MWmed

A aplicação da metodologia proposta possibilita analisar o atendimento à demanda ao


longo de um dia, para cada mês do horizonte de cinco anos, fornecendo ainda o cálculo da
disponibilidade de potência e o custo adicional ao despacho por ordem de mérito – encargos,
identificando-se, ainda, possíveis congestionamentos nos intercâmbios entre os subsistemas.
Os subitens, a seguir, descrevem, de forma detalhada, cada etapa do processo apresentado
na Figura 8.8:
• Requisitos de demanda.
• Disponibilidade de potência das usinas hidroelétricas.
• Disponibilidade de potência das usinas termoelétricas.
• Disponibilidade de potência das usinas eólicas e fotovoltaicas.
• Disponibilidade de potência das PCHs e BIOs.
• Reserva operativa de potência.

8.1.4.3.1 – Requisitos de demanda


As previsões de demanda para o horizonte de abrangência do planejamento da operação,
assim como as previsões de energia, são elaboradas em conjunto pela EPE/MME, ONS e
CCEE. A título de exemplo, a Figura 8.9 ilustra os valores de projeção de demanda máxima
integrada do subsistema Sudeste/Centro-Oeste no horizonte 2019/2023.
378    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.9 – Previsão mensal de demanda máxima integrada dos subsistemas do SIN(MWh/h)

Para avaliação do atendimento à demanda horária, elaborou-se uma curva de carga diária
típica para cada mês e subsistema, baseada no histórico recente. Para elaboração dessas curvas
típicas, inicialmente foi realizado um levantamento das curvas de carga diárias dos dias úteis
em cada mês e subsistema, como exemplificado na Figura 8.10. As curvas de diferentes cores
representam os perfis de demanda horária verificados nos dias úteis de um determinado mês
e subsistema no passado recente. O perfil de demanda típico (linha pontilhada escura) é obti-
do a partir da média dos perfis de demanda horários levantados, normalizados pela demanda
máxima.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   379 

Figura 8.10 – Levantamento das curvas de carga diárias para cada mês e subsistema

A definição do perfil típico mensal é obtida a partir da normalização de uma curva identi-
ficada como representativa pela demanda máxima.
Multiplicando-se os valores de demanda máxima mensal pelos valores das curvas de car-
ga diárias típicas obtêm-se os valores de carga, em MWh/h, para cada hora do dia e, dessa
forma, pode-se avaliar as condições de atendimento para cada hora do dia. A título de exem-
plo, a Figura 8.11 apresenta a curva de carga de demanda horária calculada para o mês de
janeiro/2020 para os quatro subsistemas. Admite-se que, para cada mês e subsistema, os perfis
de carga típicos não se alteram nos próximos anos.
380    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.11 – Curva de Carga de Demanda Resultante (MWh/h)

8.1.4.3.2 – Disponibilidade de potência das usinas hidroelétricas


A potência disponível para as usinas hidroelétricas é resultante de uma simulação hidro-
térmica com o modelo SUISHI, considerando a simulação da geração hidráulica individua-
lizada por patamar. Para as grandes usinas a fio-d’água da região Amazônica (Jirau, Santo
Antônio e Belo Monte) é considerada a disponibilidade também em razão da vazão afluente
aos reservatórios destas usinas.
Buscando uma avaliação mais conservadora das condições de atendimento à demanda
máxima do SIN, considerou-se um cenário crítico de potência disponível para as usinas hi-
droelétricas do SIN, correspondente à repetição das afluências do ano de 2016 em cada ano
do horizonte 2019-2023. A série histórica de 2016 é caracterizada como uma série crítica,
especialmente para as usinas a fio-d’água, como a UHE Belo Monte.
A disponibilidade utilizada para cada ano resulta da simulação do modelo SUISHI para
uma sequência da série histórica de vazões na qual o ano de interesse coincide com as vazões
históricas do ano de 2016. Assim sendo, por exemplo, para identificação da potência disponí-
vel das usinas hidroelétricas em 2023, a simulação seguiu a sequência 2019 coincidindo com
os registros históricos de vazões de 2012, 2020 com 2013, 2021 com 2014, 2022 com 2015 e
2023 com 2016.
Com relação ao subsistema Nordeste, foi considerada, como disponibilidade hidroelétri-
ca, um montante de potência equivalente à operação das usinas hidroelétricas do rio São Fran-
cisco em uma defluência fixa de 800m³/s, podendo essas usinas operar em uma vazão maior
apenas como o último recurso para o atendimento da demanda horária.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   381 

8.1.4.3.3 – Disponibilidade de potência das usinas termoelétricas


A contribuição das usinas termoelétricas para o atendimento dos requisitos de demanda é
compatível com a inflexibilidade, despacho por ordem de mérito e disponibilidade resultantes
das simulações dos cenários de disponibilidade hidráulica com o modelo SUISHI.
Dessa maneira, durante a avaliação do atendimento à demanda, pode ser necessário fazer
uso de montantes de geração termoelétrica acima daqueles definidos por mérito, ou seja, que
não foram despachados na simulação energética do modelo SUISHI.

8.1.4.3.4 – Disponibilidade de potência das usinas eólicas e fotovoltaicas


Nos últimos anos tem-se observado um forte aumento da oferta de energia proveniente de
fonte eólica e, para os próximos anos, está prevista também uma taxa de crescimento signifi-
cativa da participação da fonte fotovoltaica na oferta total de energia.
Devido às suas características técnicas específicas e visando representar a disponibilidade
de geração eólica e fotovoltaica de uma forma mais realista, foi realizada uma avaliação, ten-
do como base o histórico de geração supervisionada pelo ONS do último ano (2018) para estas
fontes, para fins de aplicação nos estudos de atendimento aos requisitos de demanda.
Assim como para os requisitos de demanda, foi realizado um levantamento, para as fontes
eólica e fotovoltaica, da geração horária verificada e os respectivos fatores de capacidade no
ano de 2018, em cada mês e subsistema.
Porém, diferentemente do ciclo passado quando as séries verificadas foram clusterizadas
em três grupos distintos, conforme os perfis diários identificados, no ciclo atual serão realiza-
dos balanços para todas as séries diárias de geração eólica/fotovoltaica verificadas em 2018.
Dessa maneira, é possível avaliar o comportamento da geração eólica e fotovoltaica acopladas
temporalmente e geograficamente entre os subsistemas.
A Figura 8.12 exemplifica cenários de fator de capacidade por subsistema, em p.u., para
as fontes eólica e fotovoltaica no mês de janeiro.

Figura 8.12 – Fatores de capacidade da energia eólica e fotovoltaica


382    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

8.1.4.3.5 – Disponibilidade de potência das PCHs e PCTs


Disponibilidade de Potência das PCHs e das PCTs consideradas iguais aos valores de
energia mensal adotados nas simulações do PEN 2019 que são resultantes da aplicação da Re-
solução Normativa ANEEL nº 843/2019 uma vez que estas não apresentam comportamento
intermitente típico, como as eólicas e as fotovoltaicas.

8.1.4.3.6 – Reserva de potência operativa


Pode-se definir a Reserva de Potência Operativa – RPO como a quantidade de geração que
deve estar disponível, sincronizada de forma a assegurar o controle adequado da frequência
do sistema elétrico e dos intercâmbios, insumo fundamental para a manutenção da segurança
operacional elétrica, pois mitiga os riscos de não atendimento e garante margem para atuação
eficaz do controle automático de geração.
A metodologia proposta considera a reserva de potência operativa equivalente à 4% da
demanda dos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e Norte, e 15% da demanda do subsistema
Sul. Estes montantes são dimensionados para suprir a perda de unidades geradoras e os des-
vios relacionados à previsão de carga e, no caso do subsistema Sul, ainda incorporam desvios
relacionados à previsão de geração eólica. A reserva operativa está alocada nas seguintes
usinas participantes do Controle Automático de Geração (CAG): UHE Água Vermelha, UHE
Capivara, UHE Emborcação, UHE Ilha Solteira, UHE Marimbondo, UHE Nova Ponte, UHE
São Simão, UHE Furnas, UHE Luiz Carlos Barreto.
Com relação ao subsistema Nordeste, considerou-se uma reserva operativa para absorver,
além dos desvios na previsão de carga e perdas em unidades geradoras, os desvios da geração
eólica prevista. Essa reserva é feita através dos limites de recebimento de potência pela Re-
gião Nordeste (RNE), em montante igual a 5% da demanda do subsistema Nordeste mais 6%
da previsão da geração eólica, conforme política operativa adotada na programação diária da
operação.

8.1.4.3.7 – Premissas gerais


A avaliação de atendimento à demanda máxima foi realizado para os subsistemas Sudeste/
Centro-Oeste, Sul, Nordeste e Norte, interligados topologicamente conforme observado na
Figura 8.13. As UHEs Itaipu e Belo Monte foram modeladas separadamente para possibilitar
maior detalhamento das restrições dos fluxos de intercâmbios entre as regiões. Além disso,
também foi modelada separadamente a geração das usinas hidroelétricas que injetam energia
entre o nó Imperatriz e o subsistema Sudeste/Centro-Oeste, a saber: UHEs Serra da Mesa,
Cana Brava, São Salvador (no subsistema S. Mesa) e UHEs Peixe Angical e Lajeado (no sub-
sistema Gurupi).
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   383 

Figura 8.13 – Subsistemas e interligações do estudo de atendimento à demanda máxima

A política adotada para priorização das fontes no atendimento aos requisitos de demanda
é apresentada na Figura 8.14.

Figura 8.14 – Priorização das fontes no atendimento aos requisitos de demanda


384    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Para cada mês do horizonte de estudo, foram realizadas simulações com cenários diários
de geração, construídos a partir da combinação das séries coincidentes de geração eólica e fo-
tovoltaica de diferentes subsistemas, conforme ilustrado na Figura 8.15. Dessa forma, consi-
dera-se em torno de 30 cenários mensais de geração eólica e solar horária, variando de acordo
com a quantidade de dias de cada mês.

Figura 8.15 – Cenários de geração renovável

Nesta avaliação, foram consideradas as perdas de potência das usinas hidroelétricas em


razão da alteração na altura de queda e da disponibilidade hídrica (para usinas em rios sem
capacidade de regularização), e o despacho das usinas termoelétricas para atendimento ener-
gético com os respectivos custos marginais de operação, através de simulações de cada cená-
rio hidrológico com o programa SUISHI. Dessa forma, além da avaliação da viabilidade de
atendimento à demanda horária, também é possível fazer uma estimativa do custo de operação
adicional para esse atendimento, mensurando os encargos decorrentes do despacho termoelé-
trico acima do mérito econômico.

8.1.4.3.8 – Principais resultados do balanço de demanda


Primeiramente, na Figura 8.16 é identificada para cada mês do horizonte de estudo a hora
do dia em que foi registrada a menor sobra, por mais vezes, dentre os cenários analisados.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   385 

Figura 8.16 – Horas de menor folga no SIN

Observa-se, na Figura 8.16 que entre os meses de maio e agosto a menor folga no atendi-
mento aos requisitos de demanda do SIN ocorre às 18 horas, enquanto que nos demais meses,
entre setembro e abril, ocorre no período vespertino entre as 14 e as 15 horas. Excepcional-
mente, durante o ano de 2023, as menores sobras foram verificadas às 21h para o mês de
fevereiro, e 20h para o mês de novembro.
As avaliações de atendimento à demanda horária realizadas a partir da série hidrológica
de 2016, considerando os cenários de geração eólica e fotovoltaica estabelecidos, não apre-
sentaram nenhum déficit no atendimento à demanda. Entretanto, a baixa disponibilidade de
potência da UHE Belo Monte, em razão de suas vazões naturais afluentes, alterou a operação
do subsistema Sudeste/Centro-Oeste, como será apresentado a seguir.
As Figuras 8.17 e 8.18 apresentam os despachos termoelétricos das usinas a gás e a óleo
combustível, respectivamente, considerando o horário em que foram observadas as menores
folgas de potência do SIN. As barras na cor mais escura indicam o despacho por ordem de
mérito para o atendimento à carga mensal de energia e as barras na cor clara indicam o des-
pacho termoelétrico adicional médio para o fechamento da demanda horária. Adicionalmente,
há barras de erro, indicando o maior e o menor montante despachado para o fechamento da
demanda. As linhas pontilhadas nos gráficos indicam o montante de disponibilidade de potên-
cia a cada mês do horizonte.
386    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.17 – Despacho termoelétrico para o atendimento à demanda – Gás

Figura 8.18 – Despacho termoelétrico para o atendimento à demanda – Óleo combustível


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   387 

Observa-se nestas Figuras que houve despacho termoelétrico adicional no subsistema


Nordeste e, eventualmente, nos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e Norte.
A Figura 8.19 apresenta o montante estimado do custo de geração térmica. A parte mais
escura do gráfico representa o custo de operação (custo de geração termoelétrica) resultante
da simulação com o programa SUISHI para o atendimento ao mercado de energia. A parte
clara do gráfico representa o montante do custo de operação médio associado ao despacho
termoelétrico adicional para o pleno atendimento da demanda horária. Como foram simulados
aproximadamente 30 cenários de geração eólica/fotovoltaica para cada mês, as linhas de erro
das partes clara das barras representam o maior e o menor custo.

Figura 8.19 – Custo diário de geração térmica – milhões de reais

Observa-se que há custos adicionais de geração termoelétrica ao longo de boa parte dos
meses do horizonte de simulação, especialmente entre os meses de dezembro e maio, quando
a geração eólica tende a ser mais baixa no Nordeste. Destaca-se que, conforme observado
anteriormente, esse subsistema é onde se verificam os maiores montantes de despacho termo-
elétrico acima do mérito.
A Figura 8.20 apresenta o gráfico contendo as probabilidades mensais de montantes de re-
cebimento (RNE) e/ou fornecimento (FNE) de potência pela Região Nordeste, destacando-se
as situações em que há violação da reserva operativa destinada à perda de unidades geradoras,
desvios de previsão de carga e desvios de previsão de geração eólica e/ou fotovoltaica.
388    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.20 – Probabilidade do Recebimento de Potência pela Região Nordeste

Vê-se que nos meses de dezembro a junho de cada ano há predominância de importação
de potência pela Região Nordeste (barras em verde-claro e verde-escuro), tendo havido pou-
cas séries nas quais foi necessário utilizar a reserva operativa do RNE (barras verde-escuro).
Apesar de haver pouca invasão da folga na limitação do RNE, eventuais atrasos no programa
de reforços de transmissão nessa interligação poderão estender essa condição operativa crítica.
Os resultados da avaliação do atendimento à demanda máxima mostram que, para os ce-
nários simulados, há a necessidade de despachos termoelétricos adicionais aos estabelecidos
pelo modelo de otimização energética, em alguns casos de usinas a óleo/diesel, o que indica
a oportunidade de ações de planejamento para a adequação da matriz de geração térmica com
relação aos custos operativos. A redução dos CVUs do parque térmico não só reduziria o
impacto econômico dos despachos para o fechamento do balanço de atendimento à demanda
máxima, mas também evitaria um excessivo deplecionamento dos reservatórios em condições
hidroenergéticas desfavoráveis.

8.1.4.4 – Indicadores de segurança energética – ISEN


O racionamento em 2001/2002 levantou dúvidas quanto à suficiência e eficácia da política
de minimização de custos de operação para a segurança do atendimento dos requisitos de ener-
gia elétrica e o atual modelo institucional, estabelecido pela lei 10.848/2004, deu destaque à
preservação da segurança eletroenergética do SIN e à modicidade tarifária, ambas garantidas,
respectivamente, pela otimização da operação do SIN na forma de despacho centralizado e
pela competição na expansão da oferta, via leilões de geração e transmissão pelo menor preço.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   389 

No contexto da segurança eletroenergética do SIN, o estoque de energia armazenada nos


reservatórios tem se tornado progressivamente mais relevante, sendo a variável de estado de-
terminante para a indicação de ações de segurança do atendimento à carga.
Os fatores que causam essa característica são: a dificuldade de se quantificar a oferta
futura de água no SIN devido à sua natureza aleatória, a gradual perda da capacidade de re-
gularização plurianual do sistema de reservatórios do SIN e, ainda, a intensificação do uso
da geração hidroelétrica em substituição à maior presença de geração termoelétrica de custo
variável de operação elevado.
Neste contexto, a medida da segurança do atendimento pode se traduzir pelo posiciona-
mento do estoque de energia em relação a curvas de requisitos de armazenamento definidas
para condições hidroenergéticas de segurança do atendimento, previamente fixadas.
Essa abordagem de avaliação das condições de atendimento, através da valorização dos
estoques de segurança no curto e médio prazos, define os chamados Indicadores de Segurança
Energética – ISEN, que poderão servir de referência para dar maior robustez às avaliações de
segurança de suprimento energético em curto e médio prazos, que atualmente são calcadas em
métricas como riscos de déficit de energia, cujo patamar máximo preconizado pela Resolução
CNPE 01/2004 é de 5% em cada ano, em cada subsistema, e os custos marginais de opera-
ção – CMOs, que na condição da expansão ótima, definida nos estudos de longo prazo, pelo
MME/EPE, devem estar igualados ao custo marginal de expansão – CME.
Os ISEN podem se constituir em elementos de acompanhamento da evolução dos arma-
zenamentos de cada subsistema para cada estação climática, permitindo a tomada de decisões
que visam garantir o atendimento ao mercado, segundo protocolos que deverão ser previa-
mente ajustados pelo Comitê de Monitoramento do Sistema Elétrico – CMSE.
Assim sendo, as condições de atendimento do SIN, avaliadas para cada subsistema por
meio de simulações da operação, podem ser caracterizadas pelas estimativas das probabili-
dades de ocorrência dos estoques de energia do reservatório equivalente de cada subsistema,
em relação a elementos de referência estabelecidos como metas ou restrições de segurança do
atendimento.
Esses elementos de referência delimitam, no reservatório equivalente de cada subsistema,
ao longo de cada ano, três distintas regiões: a primeira, superior, caracterizada como “NOR-
MALIDADE”; a segunda, intermediária, caracterizada como “ALERTA”; a terceira, caracte-
rizada como “CRÍTICA”.
O nível caracterizado como CRÍTICO para os subsistemas Sudeste/Centro-Oeste, Sul e
Norte, é de 10% EARmáx. O nível caracterizado como ALERTA é de 30% EARmáx. Grafi-
camente, esses elementos de referência para o subsistema Sudeste/Centro-Oeste, Sul e Norte
estão representados na Figura 8.21.
390    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.21 – Faixas de armazenamento: SE/CO, Sul e Norte

Para o subsistema Nordeste, foram consideradas as mesmas faixas de operação para os


reservatórios Três Marias e Sobradinho definidas conforme Resolução ANA nº 2081 de 4 de
dezembro de 2016. Segundo a resolução, esses reservatórios podem ser classificados nas se-
guintes faixas de operação:
1. Faixa de Operação Normal: quando seus armazenamentos forem iguais ou superiores
a 60% de seus respectivos volumes úteis.
2. Faixa de Operação de Atenção: quando seus armazenamentos forem inferiores a 60%
de seus respectivos volumes úteis e o reservatório de Três Marias for superior a 30%
do seu volume útil ou o reservatório de Sobradinho for superior a 20% do seu volume
útil.
3. Faixa de Operação de Restrição: quando o armazenamento do reservatório de Três
Marias for inferior a 30% do seu volume útil ou o reservatório de Sobradinho for infe-
rior a 20% do seu volume útil.

Com base nessa classificação, os estados de alerta, normalidade e crítico foram definidos
a partir da conversão desses montantes de armazenamento em energia. Esse resultado é apre-
sentado na Figura 8.22.

Figura 8.22 – Faixas de armazenamento: NE


O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   391 

Delimitadas as faixas, os Indicadores de Segurança Energética são definidos como:


• indicador vermelho: Frequência de energia armazenada em estado crítico superior a
10% durante o período compreendido entre março e novembro.
• indicador amarelo: Frequência de energia armazenada em estado de alerta superior a
20% durante o período compreendido entre março e novembro; e
• indicador verde: Frequência de energia armazenada em estado de normalidade supe-
rior a 70% durante o período compreendido entre março e novembro.

Essas definições para os indicadores de segurança também estão representadas grafica-


mente através do diagrama da Figura 8.23.

Figura 8.23 – Representação gráfica da definição dos Indicadores de Segurança

As avaliações das condições de atendimento de curto prazo através dos ISEN devem ser
realizadas a cada PMO da estação chuvosa (janeiro a maio), considerando apenas os resulta-
dos obtidos do primeiro ano de simulação. Essa premissa se justifica pela maior variabilidade
dos cenários hidrológicos nessa estação.
Com a aplicação dos ISEN, para o ano de 2019, foram obtidos os resultados apresentados
na Figura 8.24 e na Figura 8.25, para o subsistema Sudeste/Centro-Oeste e para o subsistema
Nordeste, respectivamente.
392    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

Figura 8.24 – Avaliação dos Indicadores de Segurança no Curto Prazo – SE/CO

Figura 8.25 – Avaliação dos Indicadores de Segurança no Curto Prazo – NE

Na Figura 8.24, observa-se que os ISEN estão em estado verde no mês janeiro, passando
para o estado amarelo nos meses subsequentes, para o subsistema Sudeste/Centro-Oeste.
Com relação ao subsistema Nordeste, o diagrama da Figura 8.25 indica que a situação
hidrológica dessa região permanece crítica, sendo o indicador em estado vermelho entre fe-
vereiro e abril.
Nas Figuras 8.26 e 8.27 são mostrados gráficos contendo uma avaliação mais estrutu-
ral das condições de atendimento energético do SIN, através dos indicadores de segurança.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   393 

Nesses gráficos são mostradas as probabilidades dos níveis de armazenamento se situarem


nas regiões delimitadas acima, bem como os indicadores de segurança resultantes, onde ob-
serva-se para o subsistema Sudeste/Centro-Oeste que a probabilidade de armazenamentos em
estado de normalidade (acima de 30% EARmáx) é superior a 95% em todos os anos. Por outro
lado, a probabilidade de armazenamentos em estado crítico (abaixo de 22,5% EARmáx) para
o subsistema Nordeste foi superior a 10% em todos os anos, caracterizando sinal vermelho.

Figura 8.26 – Avaliação dos Indicadores de Segurança no Médio Prazo – SE/CO

Figura 8.27 – Avaliação dos Indicadores de Segurança no Médio Prazo – NE


394    Produtos e processos para o planejamento e programação energética

REFERÊNCIAS DO CAPÍTULO

1. ONS DPL-REL-0182/2019 – Plano da Operação Energética 2019/2023 – PEN 2019.


9
PROGRAMA MENSAL DA OPERAÇÃO ENERGÉTICA

9.1 – Visão geral

O Programa Mensal da Operação Energética (PMO) tem como objetivo principal estabe-
lecer as diretrizes energéticas de curto prazo da operação coordenada do Sistema Interligado
Nacional (SIN), assegurando a otimização dos recursos de geração disponíveis para atendi-
mento da carga.
O PMO é elaborado e coordenado pelo ONS, com apoio da CCEE e participação dos
agentes setoriais, em reunião mensal. As atividades de programação da operação têm como
insumo as estratégias de operação calculadas no planejamento da operação energética, infor-
mações atualizadas sobre o cronograma de expansão da geração e transmissão, o estado atual
de armazenamento dos reservatórios, previsões atualizadas de carga de energia por patamar,
a análise das condições meteorológicas verificadas e previstas nas principais bacias do SIN e
previsões de afluências aos aproveitamentos hidrelétricos.
Os estudos de otimização e simulação da operação do SIN são realizados em base mensal,
com discretização em etapas semanais e por patamar de carga, conforme ilustrado na Figura
9.1. Estabelecem políticas de geração térmica e intercâmbios inter-regionais para as semanas
analisadas e fornecem metas e diretrizes a serem seguidas pela Programação Diária da Ope-
ração Eletroenergética e pela Operação em Tempo Real. São realizadas regularmente revisões
semanais que incorporam informações atualizadas sobre o estado do sistema, as condições
meteorológicas e as previsões de carga e afluências.

Figura 9.1 – Cronologia do PMO


396    Programa mensal da operação energética

9.2 – Cálculo da política de operação hidrotérmica

A política de operação hidrotérmica do SIN é realizada com o objetivo de determinar, em


cada período, uma meta de operação para cada unidade geradora do sistema que minimize o
custo esperado de operação ao longo do período de planejamento. Como o sistema brasileiro
possui estoques limitados de energia hidroelétrica, as decisões operativas tomadas em cada
estágio de tempo possuem consequências futuras. Além disso, o problema de operação hidro-
térmica é estocástico, pois as afluências futuras ao sistema de reservatórios são desconhecidas
no instante de tomada de decisão operativa. Devido ao porte e complexidade desse problema,
é necessária a sua divisão em diferentes etapas, abrangendo estudos nos horizontes de médio
prazo, curto prazo e programação diária. O Programa Mensal da Operação Energética utiliza
os modelos NEWAVE e DECOMP na definição das políticas ótimas de operação.
Na etapa de médio prazo são realizados estudos para horizontes de até 5 anos à frente com
o objetivo de definir quais serão as parcelas de geração que minimizam o valor esperado do
custo de operação. O modelo NEWAVE é utilizado no planejamento da operação de médio
prazo, representando o parque hidroelétrico de forma agregada através de 12 reservatórios
equivalentes de energia, conforme apresentado na Figura 9.2.

Figura 9.2 – Reservatórios equivalentes de energia na configuração do PMO

Da mesma forma, as vazões afluentes também são representadas de forma equivalente,


com o ajuste de modelos estocásticos PAR(p) (autorregressivos periódicos), que tem ordem
máxima igual a seis, e a utilização de uma modelagem probabilística na simulação das vazões
afluentes futuras. Dessa forma, através da Programação Dinâmica Dual Estocástica, o modelo
NEWAVE é responsável pela construção da Função de Custo Futuro (FCF), que valora a água
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   397 

armazenada nos reservatórios do SIN em cada estágio de simulação, trazendo esse custo ao
valor presente.
Na etapa de curto prazo, a partir da FCF do modelo NEWAVE, o modelo DECOMP deter-
mina as metas individuais de geração das usinas hidráulicas e térmicas do sistema, bem como
os intercâmbios de energia entre subsistemas. O modelo DECOMP representa de forma deta-
lhada as restrições físicas e operativas associadas ao problema de planejamento da operação
(conservação da água, limites de turbinamento, defluência mínima, armazenamento, atendi-
mento à demanda etc.). A incerteza acerca das vazões afluentes aos diversos aproveitamentos
do sistema é representada através de cenários hidrológicos.

9.3 – Descrição do processo

No âmbito regulatório, o PMO é regido pela Resolução Normativa ANEEL nº 843/2019


e pelo Submódulo 7.3 dos Procedimentos de Rede. O Processo descrito nestes instrumentos
define que o PMO deve ser elaborado em base mensal, discretizado em etapas semanais e
por patamar de carga, provendo metas e diretrizes a serem seguidas pelos responsáveis da
Programação Diária da Operação e da Operação em Tempo Real. Com relação à expansão da
geração a ser considerada no PMO, a Resolução CNPE nº 07/2016 aponta que seja utilizada a
oferta definida nas Reuniões Mensais de Monitoramento, coordenadas pelo Departamento de
Monitoramento do Sistema Elétrico – DMSE, e homologadas pelo Comitê de Monitoramento
do Setor Elétrico – CMSE.
Na configuração utilizada para o PMO, o estudo de médio prazo realizado mensalmente
tem o horizonte de cinco anos, com discretização mensal. A modelagem do parque gerador hi-
dráulico se dá a partir de reservatórios equivalentes de energia (REEs), e o cálculo da política
ótima de operação é baseado em Programação Dinâmica Dual Estocástica, considerando-se
a aleatoriedade das afluências através da simulação de 2.000 cenários hidrológicos sintéticos
gerados com base no histórico.
São considerados quatro subsistemas na configuração dos modelos utilizada no PMO,
correspondentes às regiões geoelétricas: Sul, Sudeste/Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Há
uma interligação em Imperatriz, representada através de um nó fictício, desprovido de ge-
ração e carga. Esse nó fictício liga-se aos subsistemas vizinhos, permitindo representar nos
modelos os limites de intercâmbio na interligação Norte/Sul com derivação na subestação de
Imperatriz para os subsistemas Norte, Nordeste e Sudeste/Centro-Oeste. A Figura 9.3 mostra
a conexão dos subsistemas.
398    Programa mensal da operação energética

Figura 9.3 – Subsistemas na configuração do PMO

O objetivo da aplicação do modelo de otimização de médio prazo no PMO é minimizar o


custo global de operação, que consiste na média do custo presente de cada cenário hidrológico
simulado, para todo horizonte. O valor atribuído aos custos apresentados está associado ao
Custo Variável Unitário (CVU) das usinas térmicas que foram despachadas, ao custo de déficit
em caso de corte de carga e aos custos futuros associados ao valor da água determinados pela
derivada da FCF, que é função do armazenamento futuro dos reservatórios.
No contexto do PMO, as principais variáveis e restrições representadas no modelo de
médio prazo são listadas a seguir:
• características das usinas hidráulicas, contém o cadastro das características individuais
de cada usina;
• vazões, compreende o histórico por posto fluviométrico;
• níveis iniciais dos reservatórios, de acordo com os valores enviados pelos agentes para
a 1ª semana operativa do DECOMP;
• controle de cheias, considera um volume de espera para eventos de chuvas ou afluên-
cias muito elevadas em intervalos curtos de tempo;
• defluência mínima/máxima, necessidades de manter uma vazão defluente em um tre-
cho do rio em um valor determinado, tendo como objetivo de manter o percurso do rio,
ecossistemas, hidrovias, entre outros;
• usos múltiplos da água, representa os usos consuntivos como irrigação, captação de
água, consumo humano, turismo, entre outros;
• enchimento de volume morto, considera a perda energética decorrente do enchimento
de reservatórios de acumulação;
• fluxo máximo de intercâmbios entre subsistemas, visa manter os valores do modelo
energético alinhados com os montantes viáveis eletricamente;
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   399 

• geração mínima/máxima por usina, atende a necessidade de representação de restri-


ções individuais, que limitam ou exigem a injeção de energia em determinados pontos
do SIN;
• geração máxima por conjunto de usinas hidroelétricas, representa restrições sistêmi-
cas, que limitam a injeção de energia em determinados pontos do SIN;
• disponibilidade de geração térmica e hidráulica, considerando manutenções previstas
e taxas de indisponibilidade programada e forçada;
• carga de energia, valores de carga de energia elaborados em conjunto pelo ONS, EPE/
MME e CCEE;
• cronograma de expansão, de acordo com o previsto nas Reuniões Mensais de Monito-
ramento coordenadas pelo MME;
• inflexibilidade das usinas termoelétricas, devido às características técnicas e/ou condi-
cionantes contratuais de suprimento de combustível;
• Custos Variáveis Unitários (CVU) das usinas termoelétricas, conforme atualização
realizada pela CCEE para as usinas vendedoras em leilões e aprovados pela ANEEL
para as demais usinas.

Em razão da grande complexidade para uma adequada representação do SIN, o PMO é


operacionalizado em duas etapas. Após a utilização do modelo NEWAVE, e a consequente
obtenção da FCF, que nos permite estimar valores e uma política energética futura, temos
condições para tomar decisões mais adequadas e detalhadas do momento presente, utilizando
o modelo DECOMP.
O objetivo do DECOMP no PMO é determinar as metas de geração individualizada, por
usina, de um sistema hidrotérmico sujeito a afluências estocásticas, de forma a minimizar o
custo de operação ao longo do período de planejamento de curto prazo. Na configuração utili-
zada no PMO, o modelo de otimização de curto prazo abrange um horizonte de estudo de dois
meses, possibilitando dessa forma um maior grau de detalhamento do problema. A principal
diferença do modelo de curto prazo, em relação ao de médio prazo, é a representação de reser-
vatórios individualizados ao invés de reservatórios equivalentes de energia.
Na utilização proposta para o PMO, as principais variáveis adicionalmente representadas
no modelo de curto prazo, em relação àquelas já presentes no modelo de médio prazo, são
listadas a seguir:
• Usinas individualizadas;
• Vazão deplecionada mínima;
• Restrições de balanço hídrico por patamar para as usinas a fio-d’água;
• Produtividade variável, que condiciona a disponibilidade de geração da usina à altura
de queda;
• Tempo de viagem da água, entre reservatórios na mesma cascata;
400    Programa mensal da operação energética

• Contratos de importação/exportação de energia.

Nas simulações que são base para o PMO, o primeiro mês da simulação é dividido em
etapas semanais e as afluências nestas semanas são consideradas conhecidas, com o problema
sendo considerado determinístico. A partir do estado de armazenamento atingido ao final do
primeiro mês, são abertas as diversas hipóteses na árvore de afluências, como ilustrado na
Figura 9.4. O acoplamento entre os modelos acontece na transição do segundo para o terceiro
mês de simulação, onde os cenários estocásticos do segundo mês do DECOMP acessam a
FCF, que foi calculada com base em um mesmo passado comum.

Figura 9.4 – Acoplamento dos modelos energéticos na configuração do PMO

9.4 – Insumos para formação do PLD

Tanto a CCEE como o ONS utilizam os mesmos modelos matemáticos, NEWAVE e DE-
COMP, porém as finalidades são distintas: o ONS busca a melhor forma de operar o sistema
elétrico, ou seja, suprir integralmente a demanda pelo menor custo possível para o sistema,
sendo o despacho térmico fornecido pelo DECOMP a base para a Programação diária da Ope-
ração; já a CCEE, visa determinar o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), por submer-
cado e por patamar de carga, que será utilizado na contabilização do mercado de curto prazo
(mercado spot).
Tendo em vista estes diferentes objetivos, são realizadas alterações nos dados de entrada
que a CCEE utiliza na aplicação dos modelos. Essas alterações compreendem a base de dados
do modelo NEWAVE, de periodicidade mensal, e também na base de dados do modelo DE-
COMP, de periodicidade semanal.
O planejamento da operação energética no sistema interligado nacional   401 

A CCEE realiza alterações nos dados de entrada fornecidos pelo ONS, suprimindo as
restrições elétricas internas a cada submercado. São exceções os casos em que a restrição im-
pacta na capacidade de intercâmbio entre submercados, e a eliminação da restrição depende
de solução de planejamento ou a previsão de recomposição seja superior a um mês.
As restrições elétricas internas aos submercados são retiradas dos dados de entrada para
que, na determinação do Custo Marginal de Operação (CMO), a energia comercializada seja
tratada como igualmente disponível em todos os pontos de consumo do submercado. Isso é
necessário para que o CMO seja o mesmo em todos os pontos do submercado. Dessa forma, o
modelo fornece para esse submercado, sem restrições internas, a produção em todas as usinas
e o CMO correspondente.
As eventuais diferenças de custos entre o despacho sem restrições e o despacho real são
tratadas pela CCEE quando se realiza o cálculo dos Encargos de Serviços de Sistema por Res-
trições de Operação, que devem ser pagos mensalmente pelos Agentes da CCEE que possuem
carga.
Realizadas as modificações e efetuado o processamento, a CCEE analisa os resultados
a partir dos relatórios de saída dos modelos e obtém um Custo Marginal de Operação por
submercado, diferentes daqueles obtidos pelo ONS. O PLD é este CMO obtido pela CCEE,
submetido às restrições de valores máximo e mínimo estabelecidos anualmente pela Aneel.
ORGANIZADOR
Francisco José Arteiro de Oliveira

AUTORES
Capítulo 1
Mário Daher

Capítulo 2
Paulo Eduardo Martins Quintão
Rodrigo Jose Coelho Pereira

Capítulo 3
Mário Daher
Alberto Sérgio Kligerman
Joari Paulo da Costa
Débora Dias Jardim Penna
Alessandra Mattos Ramos de Oliveira
Maria Alzira Noli Silveira
Luiz Guilherme Barbosa Marzano

Capítulo 4
Mário Daher
Vitor Silva Duarte
Joari Paulo da Costa
Filipe Goulart Cabral

Capítulo 5
Fausto Pinheiro Menezes
Márcia Pereira dos Santos
Evandro Luiz Mendes
Capítulo 6
Rogério Guimarães Saturnino Braga
Joari Paulo da Costa
Filipe Goulart Cabral

Capítulo 7
Paulo Sérgio de Castro Nascimento

Capítulo 8
Maria Aparecida Martinez
Alex Nunes Almeida
Nestor Bragagnolo Filho
Vitor Silva Duarte

Capítulo 9
Maria Aparecida Martinez
Nestor Bragagnolo Filho
Paulo Gerson Cayres Loureiro
Vitor Silva Duarte

Este livro foi impresso


em maio de 2020
para Artliber Editora

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