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na Bolsa
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Revisão
Tarsila Quercia
Versão 2.0
A minha amada esposa que,
Essas lições não devem ser tomadas como um guia para enriquecer na bolsa
de valores. Devem ser encaradas como um manual de direção defensiva. Não
têm o intuito de orientar quanto à escolha dos melhores papéis, dos fundos
imobiliários mais promissores, nem das opções mais rentáveis. Apesar de
descrever minha estratégia de investimento, a intenção não é versar sobre
análise técnica ou fundamentalista. As lições tratam de um conjunto de
medidas de segurança com um único objetivo: evitar que você, estimado
leitor, dilapide seu patrimônio, sua mente e seus relacionamentos.
*****
Introdução
A bolsa é para você? Talvez sim, talvez não. Entender e aceitar o significado
de renda variável é o primeiro ponto. Nesse sentido é um desfavor à
sociedade o que muitos jornalistas, periódicos e sites especializados praticam.
Não apenas os meios de comunicação, mas também muitos agentes do
mercado, como analistas, bancos e corretoras não se preocupam em preparar
ou formar investidores.
Na literatura existem inúmeros livros sobre renda variável e na Internet é
possível encontrar uma infinidade de sites sobre o tema. O essencial destas
leituras é entender que aplicar em renda variável significa dizer que é
impossível determinar o retorno do investimento no momento da aplicação, e
aceitar que o valor aplicado pode variar positiva ou negativamente. Simples,
em números, invista R$ 1 mil agora e esteja certo que não saberá quanto
possuirá dentro de doze meses. Quando o assunto é renda variável, você está
no campo das perspectivas futuras, nunca das certezas.
Nos momentos de euforia da bolsa há muito equívoco com respeito a esses
conceitos. Não é incomum a perspectiva dar lugar à certeza. Um exemplo
disso foi o que o Brasil presenciou a partir de 30 de abril de 2008, quando a
agência de risco Standard & Poor’s elevou a nota de crédito de moeda
estrangeira do Brasil e passamos a testemunhar o noticiário diário do ótimo
momento do mercado acionário.
Telejornais, normalmente alheios ao mercado de ações, anunciavam as boas-
novas: agora todos poderiam ganhar com a Bolsa. Analistas e corretoras
estavam otimistas ao extremo, e previsões eram divulgadas como fatos a se
concretizar e não como possibilidades. Os riscos inerentes à renda variável ou
ao mercado de capitais eram, sistematicamente, ignorados. A certeza
mesclara-se à perspectiva, e já não havia diferença entre elas.
Blogs e fóruns fervilhavam. Muitas pessoas se desfizeram de seus
automóveis e de suas próprias casas para comprar ações, tamanha era a
convicção dos ganhos. Quantos postaram em fóruns a realização de
empréstimos pessoais para não perder a oportunidade. Nessa época participei
de uma palestra e recordo de um participante afirmar que era impossível
perder com Vale e Petrobras. Quando mencionado o tema gestão de risco,
praticamente todos os participantes eram unânimes em sustentar que o
momento não oferecia risco. Ledo engano.
*****
1. Há vida além da bolsa
“Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe. ”
–Oscar Wilde
Hoje a Bolsa é tão somente uma ferramenta, um meio para nos ajudar a
chegar onde queremos, ou seja, usamos o mercado em nosso proveito e não o
contrário.
Para pensar…
Os investimentos estão ocupando um espaço muito grande na sua vida? Você
tem aplicativos no celular para acompanhar cotações ou seguir “gurus” do
mercado? Seja franco, em sua opinião a expressão “mercado de ações” está
associada a sucesso e planejamento, ou a emoção e aventura?
Se a prática como investidor não está contribuindo para seu crescimento ou
está prejudicando, talvez seja a hora de puxar o freio de mão. Não seja
extremista, investir deve ser algo que te dê prazer. Busque equilíbrio.
Poupar e investir é formidável, mas relaxar e curtir a vida também. Sair com
sua mulher, passear com seus filhos, viajar e cuidar do seu corpo são
exemplos de coisas que você não deve colocar em segundo plano. É
importante comemorar as pequenas vitórias e não apenas as grandes. Zerou
uma posição com lucro? Convide sua esposa para um jantar romântico. Os
investimentos são os meios, nunca os fins.
*****
2. Seu trabalho é a verdadeira fonte de riqueza
“Com trabalho, inteligência e economia só é pobre quem não quer ser rico.
” – Marquês de Maricá
Para pensar...
Seu dia a dia no mercado acionário tem prejudicado seu trabalho? Você tem
se dedicado mais tempo ao estudo de empresas do que a sua vida familiar e
profissional? Constantemente você coloca de lado suas atividades no trabalho
para ver assuntos relacionados à bolsa? Seu objetivo é viver dos ganhos da
renda variável?
Caso tenha respondido sim a uma dessas perguntas, você pode estar
equivocado quanto à função do mercado de ações. Os investimentos
constituem um componente importante na acumulação de riqueza, mas
sozinhos não são capazes de enriquecer um indivíduo. O trabalho é o
verdadeiro protagonista na peça dos homens e mulheres bem-sucedidos.
*****
3. Quem é você? Descubra seu perfil
Para pensar...
Qual seu critério para compra e venda ações? Por que investe nessas
empresas? Seu objetivo é o longo prazo, mas vibra com as oscilações do dia a
dia? É fundamental definir seu perfil como investidor ou operador do
mercado. Essa indefinição é a causa raiz de muitos se frustrarem na bolsa e
de seus pífios resultados. Pesquise os diferentes tipos de perfis existentes.
Teste suas estratégias com capital reduzido. Ao sentir-se seguro, dedique
mais tempo e aumente de forma gradual sua exposição, e junto a confiança
descobrirá seu perfil.
*****
4. Curto, médio e longo prazo
“É possível ser jovem sem ter dinheiro, mas não se pode ser velho sem ele. ”
– Tennessee Williams
Creio que a essa altura você é capaz de adivinhar as cenas dos próximos
capítulos. A ganância prevaleceu. Giovani não arredou o pé, e no ano
seguinte a Bolsa padeceu. Os meses se passaram e a festa de casamento para
300 pessoas, agora contava com, no máximo, 200 convidados. Giovani, que
chegou a gabar-se do lucro na bolsa, agora pagava por conselhos sobre o que
fazer. Há meses de arcar com os compromissos viu-se obrigado a vender
pouco a pouco os papéis que possuía. Não perdeu muito se comparado ao que
investiu, mas deixou escapar a chance de ter embolsado um bom lucro.
Provisões
Ao aplicarmos em renda variável, precisamos nos ater a principal
característica desse investimento, que é sua variação ao longo do tempo. Não
bastasse a proximidade de importantes compromissos, Giovani estava
emocionalmente envolvido com a iminência de seu casamento e não tomou
as decisões corretas para proteger seu patrimônio. Ao investir nunca se
exponha dessa forma. A probabilidade de você perder é altíssima.
Para pensar...
Quero propor um exercício de reflexão para você, caro leitor. Numa folha de
papel, ou no Bloco de Notas, escreva todos seus compromissos, objetivos e
planos dentro dos próximos três anos, ou seja, dentro do curto prazo. Os
compromissos e metas de sua esposa também devem ser listados, afinal vocês
compõem o mesmo núcleo familiar.
Pronto? Prossigamos. Dentre os compromissos, existem empréstimos ou
financiamentos? Caso afirmativo, você tem condições de quitar ou amortizar
esses compromissos com o capital que deseja investir? Caso a resposta seja
sim, recomendo que o faça; caso contrário, melhor é economizar e aplicar em
renda fixa para no momento oportuno quitar essas obrigações. Dificilmente
conseguirá do mercado uma remuneração melhor que o desconto na
antecipação do pagamento das dívidas.
Você conta com o capital que deseja investir para atender algum objetivo ou
plano nos próximos três anos? Caso esteja poupando para seu casamento,
festa de 15 anos de sua filha, para sua viagem internacional, ou qualquer
outro plano, não aplique em renda variável, por mais tentador que pareça ser.
Não exponha seu capital a risco desnecessário, invista em alguma modalidade
de renda fixa de acordo com o horizonte de tempo das suas metas.
Pondere, seja frio. Seu investimento em renda variável deve ser coerente com
seus planos e objetivos. Investir em ações com o propósito de comprar sua
casa própria dentro de dez anos, ou para complementar sua aposentadoria é
perfeitamente razoável, pois se trata de um investimento de médio ou longo
prazo, de acordo com nossa formulação. Restrições de curto prazo tornarão
você vulnerável às intempéries do mercado, e, consequentemente, não
desfrutará das benesses dessa modalidade de investimento.
*****
5. Invista somente o que não precisará
“A maioria das pessoas não planeja fracassar, fracassa por não planejar. ”
– John Berkeley
O fato de saber que precisaria daquele dinheiro o inquietou de tal forma que
comprometera sua capacidade de decisão tornando-o mais ansioso e propenso
ao erro. Isso o fez vender quando os experientes gestores de carteiras
passaram a comprar o papel e o mercado brasileiro retomava o crescimento.
Na ocasião, ao ouvir sua história, sabia que o mercado se recuperara do
tombo, mas preferi não comentar. Quis poupá-lo, pois certamente isso lhe
doeria até a alma. Talvez o mercado de ações não fosse para ele.
Lição: Invista somente aquilo que você não precisará nos próximos anos. Isto
é, aquela economia para a qual você não tem planos. Nunca compre ações
sabendo que precisará vendê-las em um, dois ou três anos. A chance de você
protagonizar uma história semelhante é muito alta.
Objetivos ou compromissos pessoais não podem ser o estopim para venda de
um ativo. Compre e venda ações de acordo com critérios técnicos, seja
através da análise técnica, fundamentalista ou qualquer outro critério que
considere confiável. Não aplique na bolsa por que pretende comprar um carro
melhor com o ganho de capital, isso é uma roubada. Para estas pessoas o
mercado é implacável.
Para pensar...
Não comprometa o dinheiro que sabe que precisará em breve. Não tenha
planos pelos próximos cinco anos para o capital aplicado na bolsa de valores.
Tem plano para o dinheiro a ser aplicado na bolsa? Pretende se casar ou
comprar sua casa própria? Caso afirmativo, pare e pense duas vezes. Lembre-
se da Lei de Murphy, se aplicar capital comprometido, mesmo que para um
compromisso distante, algo certamente dará errado.
*****
6. Corretoras querem corretagem
Para pensar...
É bem atendido por sua corretora? Os depósitos e retiradas são efetuados
rapidamente? As taxas de sua corretora estão em linha com o mercado? O
homebroker atende suas necessidades? Seja correntista de uma corretora que
atenda seus interesses, não o contrário. Não aceite pagar a mais por um
serviço que todas prestam. Priorize aquelas que possuem os canais de
comunicação mais rápidos, pois um dia você precisará de agilidade.
*****
7. Preço médio não serve pra nada
Trabalhei durante alguns anos como office-boy para meu pai em sua modesta
joalheria, situada no edifício Joaquim de Paula, em Belo Horizonte. Era
adolescente e assistíamos a transição dos governos de José Sarney e Fernando
Collor de Mello. Um tempo marcado por hiperinflação.
Hoje compramos dólares para viajar, os tempos mudaram, mas nem sempre
foi assim. Todo mês procurava um doleiro a pedido de meu pai para trocar
cruzados ou cruzeiros por dólares. Uma prática, muito difundida em períodos
de inflação, que servia como proteção, uma tentativa de não perder o poder
de compra.
O dólar, assim como qualquer outra moeda, possui algumas semelhanças com
ações. Toda moeda é negociada, pode ser comprada ou vendida, possui preço
de compra e preço de venda, e pode-se, por exemplo, calcular o preço médio
de aquisição, isto é, o quanto se pagou em média pela quantidade de moeda
comprada.
Suponhamos que mês passado você adquiriu U$ 100 ao preço de R$ 2, e este
mês comprou outros U$ 100 ao preço de R$ 3 – o dólar subiu forte. Qual o
preço médio de aquisição dos U$ 200? Simples, neste caso, R$ 2,5. Noutras
palavras, você já desembolsou R$ 500 pelos U$ 200 que está guardando
embaixo do colchão.
Pois bem, qual a relevância dessa informação para quem guarda dólares
embaixo do colchão? Nenhuma. Não serve para absolutamente nada, tanto
para você quanto para meu pai naquela época. Ele nunca possuiu este
controle, apesar de possível, por que sua intenção era acumular dólares,
apenas isso. Quem possui U$ 1 mil, seja para viajar ou para proteger-se das
destemperanças da economia, sabe apenas que possui U$ 1 mil naquele
momento. Não é importante o quanto desembolsou por essa quantia.
De forma análoga, o mesmo raciocínio vale para ações. Se você possui em
carteira 1.000 ações ordinárias da Cemig compradas por R$ 40, você não tem
necessariamente R$ 40 mil agora neste momento. Tem nada mais nada
menos que 1.000 papéis da Cemig, que correspondem a um valor (cotação)
definido pelo mercado em um dado momento.
É frequente encontrarmos iniciantes, ou mesmo “macacos velhos”, confusos
com esse simples conceito de preço médio. Essa confusão ocorre com todos
os perfis, independente de investidores ou operadores. O problema reside em
focar no preço médio em vez de dedicar o devido valor à estratégia ou à
operação.
Para os (candidatos a) traders o erro clássico consiste em fazer preço médio
visando à saída de um papel. Compram ações sem saber o que estão fazendo
exatamente. Seus planos preveem estritamente ganhos, perder não é uma
alternativa, pois na cabeça deles em renda variável o preço oscila somente
para cima.
O indivíduo, quando muito, elabora sua operação com pontos de entrada e
saída “bem definidos”, mas na hora de acionar o stop, de pular fora do barco,
não o faz.
― Vou baixar um pouco mais meu stop para não ser acionado ― diz consigo
mesmo inseguro. O papel continua sua queda. ― Fico mais um dia, pois
amanhã vai subir com certeza! ― insiste o emotivo trader. E não sobe, pelo
contrário, cai mais. É quando reconhece inconscientemente seu erro e
“decide” enfim abraçar a empresa e ser “sócio”.
Essa situação se repete todos os dias, e os erros não param por aí. Como não
bastasse não ter seguido sua estratégia ou ter entrado no jogo sem nem
conhecer suas regras, passa a fazer preço médio para sair mais rápido, o
famoso “empate”.
Fazer preço médio significa comprar mais por preços mais baixos, pois
sempre que se adquirem mais ações, moedas, títulos, ou qualquer outro bem
por um preço mais baixo que o preço de compra médio, o novo preço
resultante será menor, e em tese quanto mais baixo for seu preço de entrada,
mas rápido será sair quando o papel voltar a subir.
O que todos esquecem é que ao proceder dessa forma está colocando-se mais
dinheiro novo e seu patrimônio está reduzindo. Não existe nenhuma garantia
que tal ação retornará a determinada cotação, o papel pode simplesmente
descer indefinidamente e estagnar por anos, ou os fundamentos da empresa
podem mudar drasticamente e caminhar para a recuperação extrajudicial:
último passo antes da cova.
Já no caso do investidor, quando o indivíduo tem – ou deveria ter – o desejo
de permanecer sócio de uma empresa por tempo indeterminado, muitos têm a
visão embaciada pela questão do preço médio. O foco do investidor é
aumentar sua posição, possuir mais ações de boas empresas e tê-las embaixo
do colchão, assim como o comprador de dólares. As oscilações do presente
em nada afetam a carteira de um investidor, muito menos saber se seus papéis
estão sendo cotados acima ou abaixo do preço médio de aquisição de suas
ações. O objetivo de aumentar a posição continuamente é receber mais
dividendos, juros sobre capital próprio, bonificações, dentre outros, ou seja, é
ser participante da distribuição dos ganhos da empresa.
Não seja o último dos moicanos
A esperança é a causa de muitos homens e mulheres perderem na bolsa.
Quando compramos ações de uma empresa passamos a ser sócios da mesma,
mas não estamos destinados a sermos para sempre.
Vamos imaginar um caso concreto. Maria tornou-se sócia do salão Carioca’s
Hair. Para que fora possível essa decisão certamente Maria refletiu muito. Ela
avaliou os prós e contras e concluiu ser um bom negócio ao ponto de ser
sócia. Sem sombra de dúvida ela calculou as despesas e receitas, investigou
as dívidas e a saúde financeira do salão, e estimou as benfeitorias
indispensáveis para melhorar a prestação dos serviços e atrair mais clientes.
Em outras palavras, Maria não se tornou sócia do salão de olhos fechados.
Ela buscou fundamentar sua decisão de investimento, afinal o objetivo dela é
ganhar com a aquisição.
O mesmo vale para Bolsa, mas muitos têm grande dificuldade em aceitar essa
simples analogia. Tal qual Maria, ao comprar ações de uma empresa, o
indivíduo está declarando ser sócio de uma boa empresa, bem administrada,
que respeita os acionistas minoritários, com lucros constantes, saúde
financeira estável e perspectivas de investimentos e crescimento em longo
prazo.
Entretanto as coisas podem mudar. Os fatores que levaram Maria a tornar-se
sócia do Carioca’s Hair ontem, amanhã podem não se os mesmos. No dia a
dia das empresas, sócios vão e vem a todo o momento. Ninguém está
disposto a perder dinheiro com uma empresa incerta que dá preocupação e
prejuízo.
Mais uma vez, para muitos a analogia não se aplica na bolsa. Há inúmeros
investidores “casados” com seus papéis, que preferem amargar perdas ao
“divórcio”. Com efeito, o artigo Finanças comportamentais no Brasil: um
estudo comparativo5, do professor Pablo Rogers destaca que:
Investidores no mercado financeiro tendem a não aceitar perdas relutando a
se desfazer de posições em que tenham prejuízos enquanto liquidam
rapidamente posições vencedoras: corroborando essa assertiva Odean (1998)
mostrou [...] que investidores realizaram ganhos em uma proporção 68%
maior do que realizaram perdas – isso significa que uma ação com retorno
positivo tem 68% mais chance de ser vendida do que uma ação com retorno
negativo.
São pessoas que, mesmo diante da deterioração dos fundamentos das
empresas, são incapazes de fazer qualquer negócio com as mesmas. Não é
incomum encontrar pessoas que, por desenvolverem um sentimento por suas
ações, permanecem estáticas ao assistirem seu patrimônio reduzir.
A realidade da empresa endividada, não lucrativa, e sem perspectivas não é
capaz de suplantar o passado vitorioso no qual o investidor tornou-se sócio. A
negação de que a empresa estimada mudou e a esperança por dias melhores,
transforma o investidor em um legítimo capitão que prefere afundar com a
empresa a abandoná-la, como se fosse desonroso fazê-lo.
Esse pensamento é equivocado. Uma das grandes vantagens da bolsa é a
possibilidade de nos tornarmos sócios de boas empresas de uma forma
simples, assim como também sairmos da sociedade. Não somos nós que
estamos a serviço das empresas, pelo contrário, somos sócios por que
desejamos usufruir dos benefícios de boas empresas.
Quando deixamos de gozar desses benefícios, não temos razão para
permanecermos sócios, independentemente do tempo ou de quão boa era a
empresa quando a compramos. Nesse sentido Nietzsche estava certo ao
afirmar que a “esperança é o derradeiro mal; é o pior dos males, porquanto
prolonga o tormento”.
Para pensar...
Preço médio é um cálculo, uma consequência. Não o faça intencionalmente.
A única função do preço médio é para Declaração do Imposto de Renda. Se
seu investimento ou trade vai mal não pense em reduzir seu preço médio, saia
disso.
Sempre existirão oportunidades. Tão logo você aceite a perda, mais cedo
recuperará o tempo e capital perdido. Aproveite de toda a flexibilidade que a
Bolsa oferece-lhe.
*****
8. Seja menos ganancioso
Infelizmente, ocorreu comigo o mesmo que ocorre com todo jogador, não
quis parar de prever o resultado dos dados lançados pelo croupier6. A
oscilação positiva, dia após dia, hora após hora, minuto após minuto era meu
ópio. Queria mais. ― Quando chegar em R$ 15, eu saio ― dizia para mim
mesmo. No outro dia ― Agora que chegou em R$ 15, é fácil chegar em R$
16 ― exclamava radiante. Inacreditavelmente estava estático diante de um
lucro de 50%, e o mercado foi impiedoso.
Recordo como se fosse ontem. Estava trabalhando em São Paulo e com
acesso restrito à Internet, quando assisti pasmo o derretimento do papel. Uma
sucessão de leilões levou o papel a cair mais de 60% em determinados
momentos. Fiquei paralisado diante do computador. Mal podia acreditar no
que estava vendo. ― Por que estão vendendo a esses preços? ― lamentei na
minha ignorância (na época desconhecia o mecanismo de venda a
descoberto).
Somente no dia seguinte reuni forças e resolvi sair, vender. Deixei de
embolsar um lucro de 50% devido a minha teimosia. Mais que isso, minha
ganância me fez perder R$ 8 mil de ganho fácil. Joguei as boas cartas, mas
não sai da mesa; descobrira tardiamente que eu era o pato7.
Traçando um paralelo com o mercado de ações, diríamos que meu pai fez all-
in. A expressão vem do pôquer e descreve a ação de apostar todo o jogo em
uma única mão, empurrando todas as fichas para o centro da mesa. Fazemos
isso sempre que aplicamos numa única companhia, ignorando as
consequências e riscos de todas as nossas fichas estarem numa única
empresa, que pode tanto ser muito bem-sucedida no longo prazo como
também atravessar algum infortúnio, comprometendo todo seu capital
aplicado.
O amador adora a perspectiva de ganhar rapidamente uma pilha de fichas, e
feliz arrisca tudo com este objetivo, mesmo quando a probabilidade está
contra ele. Por outro lado, o investidor prudente não faz all-in, pois sua
intenção é mitigar ao máximo os diversos tipos de riscos (risco de mercado,
liquidez, sistêmico, setorial, etc.) com uma distribuição mais inteligente do
capital em mais de uma empresa. O oposto dessa concentração é a
diversificação, que será abordada com mais detalhes na próxima lição. Por
ora, não compre ações de uma única empresa. Esta não é uma boa estratégia
para proteger aquilo que mais importa no mundo dos investimentos: seu
patrimônio.
Para pensar...
Não coloque todo seu dinheiro numa única empresa. A relação risco/ganho é
extremamente perigosa, em especial se a empresa não possuir tag along9.
Não seja sócio torcedor de uma empresa, distribua seu capital. Porque ganhar
com uma se é possível ganhar com várias? Não seja ganancioso, o mercado
não dá nada de graça para ninguém.
*****
9. Diversificação: os dois lados da moeda
*****
10. Fuja dos fóruns de discussão
“Há falsidades disfarçadas que simulam tão bem a verdade, que seria um
erro pensar que nunca seremos enganados por elas. ” – François La
Rochefoucauld
Um ano, dois meses e vinte e cinco dias. Esse foi o inestimável tempo da
minha vida que desperdicei em fóruns de discussão e afins. Quatrocentas e
quarenta e cinco noites nas quais poderia ter desfrutado a agradável
companhia da minha esposa, ter lido bons livros, ter ido ao cinema, ter
realizado exercícios físicos, ou simplesmente ter descansado. Mas não, ao
invés disso, eu me entreguei às discussões inócuas de pessoas que não sabiam
onde estavam nem aonde queriam ir.
Um dos grandes erros do investidor iniciante é esse, de buscar refúgio e
reforço positivo para suas escolhas nas palavras de outros investidores. O
iniciante peca por não se preparar adequadamente para investir no mercado
de ações. Em vez de investir tempo em conhecimento, acha mais fácil
encontrar algum fórum de discussão ou rede social para acompanhar o
mercado e as oportunidades mais “quentes” por meio da opinião de
amadores.
Há todos os tipos de pessoas nesses lugares. Desde estudantes e curiosos até
investidores e operadores. São pessoas como nós, que têm algum tempo
durante o dia ou mesmo somente à noite para transitarem anônimos nas
diversas seções.
É possível contar o número de pessoas que realmente edificam discussões
nessas redes. A maioria esmagadora não investe de fato e, quando investem,
o foco está longe de aumentar o patrimônio. Pouco a pouco o interesse pelo
conhecimento das empresas dá lugar a bate-bocas e a desentendimentos
movidos pela sustentação de opiniões cegas e inflexíveis. Uma verdadeira
briga de egos.
Todos os dias são laçados pela aventura da interpretação de um personagem.
O nome da peça teatral? “Como ser mais esperto que os tubarões”. Tal qual
numa mesa de bar discutindo uma partida de futebol, assim são os foristas
interessados em inflar o ego e ficar rico rapidamente no mercado acionário.
No decorrer dos meses, nos quais estive presente todos os dias nesses lugares,
desenvolvi uma vida paralela. Durante o dia era um consultor de gestão de
projetos; respeitado, sereno e sério. Já à noite, um forista ansioso, impulsivo e
orgulhoso. Meus colegas de trabalho não tinham a menor ideia da pessoa que
existia por trás da minha aparência de homem prudente, racional e sensato.
Eu ruía minhas unhas, ao ponto de praticamente não tê-las. Comprava ações
visando “longo prazo”, mas todos os dias deixava-me inflar pelas palavras
calorosas dos demais foristas. Meu hobby era acompanhar a montanha-russa
das cotações das minhas ações no homebroker. No fundo estava inseguro
com minhas escolhas e, inconscientemente, não acreditava no logo prazo,
pois se cresse saberia que as oscilações do dia a dia são insignificantes.
Os analistas passionais
Tomei péssimas decisões nessa época. Recordo-me, com calafrios, das
compras motivadas por brados como “Está em promoção”, “É agora ou
nunca” ou “Agora ninguém segura”. Quantas vezes, convencido por
comentários de foristas influentes, resolvi comprar ou vender; o que
obviamente resultou em muitas perdas. Havia um forista chamado Pokerstars
que publicava textos bem embasados sempre sobre a mesma empresa (na
verdade ele possuía somente ações dessa empresa). Toda a comunidade
respeitava muito sua opinião, apesar de a empresa não ter prestígio, ser
criticada pela mídia e ter péssimos fundamentos. Mesmo assim esse forista
influenciou muitos, sendo um dos mais seguidos. O que essa multidão não se
dava conta é que seus comentários serviam aos seus próprios interesses.
Os fóruns, blogs e rede sociais, além de promoverem a discussão e troca de
informações, são palco de exposição dos casamentos entre investidores e
empresas. Noções como objetividade, clareza e imparcialidade passam longe
das narrativas dos participantes.
Pokerstars acreditava mesmo que poderia influenciar o sobe e desce das
cotações por meio de suas palavras dirigidas a algumas centenas de pessoas.
Talvez até plausível para empresas cuja cotação gira na casa dos centavos,
conhecidas como penny stocks no mercado norte-americano, mas impensável
para companhias com alta liquidez, como era o caso.
A bolsa está apinhada de amadores malsucedidos que veem nas redes sociais
a oportunidade de recuperar o prejuízo influenciando outros a tomarem as
mesmas decisões. Nessas ocasiões lembre-se do dito popular (adaptado)
“Mostre-me o extrato de sua corretora e direi quem és”.
A metáfora dos tubarões e das sardinhas
Uma das maiores, quiçá a maior, loucura incutida na mente do iniciante no
mercado de ações é a dicotomia entre os tubarões e as sardinhas. A metáfora
versa sobre dois grupos de participantes do mercado: de um lado os grandes
regentes denominados Tubarões, e do outro extremo as marionetes, as
Sardinhas. Trata-se de uma classificação bipolar das pessoas envolvidas na
bolsa de valores, sobre tudo na visão das sardinhas.
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11. Corra dos “micos”
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12. Day trading não é para amadores
Dois milhões e setenta e nove mil e seiscentos e setenta e dois reais. Este é o
valor das operações realizadas por mim, durante minhas primeiras férias após
aprender os mecanismos básicos do mercado de ações, graças ao altíssimo
limite de crédito (alavancagem) oferecido pela corretora na qual era cliente.
Valor de dar inveja a qualquer corretor de valores, se não fosse o pífio
resultado.
Nos meses que antecederam minhas tão aguardadas férias conheci a Bolsa de
valores e a escola de análise técnica quase que simultaneamente.
Considerava-me um homem muito inteligente que absorveria em passo
acelerado os complexos conceitos do mercado e que ganharia muito dinheiro
tão logo estivesse munido de todo o ferramental que a análise técnica oferecia
sem cobrar nada.
Nutria uma grande empatia pelo assunto (provavelmente devido à
proximidade da minha formação em Matemática), pela literatura, e pelos
testemunhos das pessoas que mudaram de vida ou que conseguiram
independência financeira por meio da bolsa. Dia após dia meu desejo de
colocar em prática aqueles conceitos crescia, e de certa forma fui bem-
sucedido nos primeiros meses.
Entretanto, ganhar R$ 3 mil por mês não era suficiente – o que representava
na época um ganho de aproximadamente 10% ao mês frente ao meu capital
em ações. ― Por que aguardar um mês se posso ganhar isso em três dias? Por
que não realizar as mesmas operações vitoriosas numa janela de tempo
menor? ― pensava comigo cogitando day trading (que nada mais é que
comprar e vender, ou vice-versa, um ativo no mesmo dia). Ideia sedutora não
fosse um problema: tempo. Sabia que ao realizar operações no intraday não
poderia desviar minha atenção do homebroker, seria como dirigir de olhos
fechados. Tracei um plano. Continuar estudando e aguardar minhas férias
para realizar meu objetivo em ser daytrader.
As semanas se passaram e com elas a proximidade de levar a cabo meu
plano. Passava os dias elaborando estratégias e escolhendo os melhores
papéis para as mesmas. Os simulados sinalizavam que estava no caminho
certo.
Finalmente, eis que estava de férias e poderia colocar em prática (leia-se
ganhar uma fortuna em pouco tempo) meus vastos conhecimentos técnicos.
Além dos estudos, investi em infraestrutura: montara uma estação para day
trading com dois grandes monitores, um poderoso computador e Internet
mais veloz para não correr riscos.
Segunda-feira, o primeiro dia de operações. Tudo correu exatamente como
planejei pelo menos nas primeiras quatro horas. Nessa manhã ganhei o
equivalente a uma semana de trabalho. Estava em êxtase. Acompanhei cada
tick das ações operadas de tal forma que mal piscara os olhos. Beber ou
comer? Nem passava pela minha cabeça. Recordo-me como se fosse hoje, de
como aquelas operações mexeram com meu ego. ― A tarde não será
diferente, o dia está apenas começando! ― disse a mim mesmo exultante.
Não continuou conforme esperava. Nos dias seguintes muitas operações mal
sucedidas. Já não estava “acertando a mão” como no primeiro dia. Os
indicadores divergiam, comprando quando não era o momento e vendendo
quando não deveria. Titubeava entre seguir os indicadores e minha intuição.
Foi então que fatores psicológicos começaram a pesar. Ansiedade,
nervosismo, apreensão, impaciência, dentre outros sentimentos, passaram a
ditar o ritmo das operações. Senti um burburinho de emoções que nunca
havia experimentado.
De forma paulatina o trader deu lugar ao jogador. Num dado momento passei
a comportar-me como aquele jogador no cassino que aposta mais e mais no
afã de recuperar suas perdas, e cada vez mais se enterra em seus erros e em
sua irresistível vontade de continuar. Nunca estive num cassino ou numa
mesa de pôquer, mas posso afirmar categoricamente que entendo o que um
jogador compulsivo sente.
Essa passagem marcou para sempre minha trajetória como investidor ao
provar que estava enganado, nunca fora um profissional do mercado como eu
equivocadamente acreditei ser. Day trading não era para mim. Certa vez li um
artigo que dizia que day trading era a forma mais rápida de arruinar-se na
bolsa de valores. Considerei um exagero, mas depois dos acontecimentos
entendi o que o autor quis dizer.
Muitos analistas técnicos e traders alegam que day trading é como um trade
normal, com a diferença residindo na timing, sendo que as mesmas
estratégias podem ser usadas. Discordo veementemente. A tomada de
decisão, a pressão e ruídos no intraday minam ótimas estratégias aplicadas a
janelas de tempo maiores como no diário ou semanal. Quando se opera em
gráficos semanais há um final de semana inteiro para que uma decisão seja
tomada, enquanto no intraday minutos, ou mesmo segundos, são a diferença
entre ganhar ou perder. Isso sem considerar a disponibilidade de tempo para
análise e boas ferramentas para envio de ordens.
No frigir dos ovos movimentei mais de R$ 2 milhões de forma impulsiva em
sete dias, fazendo a alegria da CBLC, da BM&F Bovespa e da minha
corretora. Terminei minha jornada como daytrader com o módico prejuízo de
pouco menos de R$ 2 mil, irrisório comparado ao montante movimentado.
Poderia ter sido muito, muito pior. Felizmente aprendi minha lição e
continuei colhendo os frutos do mercado como um investidor.
Cuidado com análise técnica
Não é minha intenção acusar ou defender a eficácia da análise técnica no
mercado de ações, mas sim advertir sobre os riscos da mesma. A ideia de
ganhar na bolsa sem precisar estudar os fundamentos das empresas, sem
esmiuçar os resultados trimestrais ou as perspectivas da economia é
tentadora, mas requer muita cautela.
É inevitável. Não há no mercado de ações quem não tenha tido contato ou
estudado, pelo menos, um pouco o assunto. Em qualquer busca que façamos
no Google, a análise técnica desponta como a forma mais rápida de sucesso,
o menor caminho entre o operador e o primeiro milhão. Sites estampando
bonitas mulheres e homens bem-sucedidos demonstram em minutos como
realizar um trade de sucesso.
Centenas de pessoas são iludidas diariamente pelas promessas de ganho fácil
dos “experts”, que apresentam a análise técnica como um conjunto de
indicadores capazes de prever o comportamento futuro dos preços.
De olho nesse crescente nicho de mercado, corretoras e analistas têm
investido pesado na divulgação do assunto, oferecendo apostilas, cursos,
palestras e taxas convidativas em operações via homebroker. O fácil acesso
aos softwares de análise técnica e ao amplo material na Internet também
contribuem significativamente para o número de seguidores.
A análise técnica é válida e requer muito estudo, suor e disciplina. Mas o que
deveria servir como ferramenta para auxiliar na tomada de decisão torna-se
um vício para muitos. Para estes o foco não é aumentar patrimônio, mas sim
determinar os melhores padrões, as mais adequadas combinações de
indicadores e osciladores, as linhas de tendências mais confiáveis, os stops
mais curtos, ou seja, o meio transformando-se no fim.
Trata-se da análise técnica pela análise técnica.
Durante dois anos me debrucei sobre o assunto. Ser matemático facilitou
muito, aliou a fome à vontade de comer – desculpe o jargão. Adquiri os
melhores livros e aprendi a utilizar os softwares mais avançados, assinei os
melhores periódicos internacionais e dediquei muito, muito tempo.
Sou suspeito quando me refiro à análise técnica. Apesar de não ser para mim,
acredito que existem muitas coisas válidas que devem ser aplicadas com
critério e bom senso. Não se deixe enganar por charlatões que só querem
aproveitar-se do entusiasmo e desconhecimento dos iniciantes.
Para pensar...
Você tem sido bem-sucedido nas operações comuns e acha que pode fazer o
mesmo com operações de day trading? Você tem disponibilidade para
acompanhar homebroker um dia inteiro caso necessário? Você lida bem com
suas emoções? É frio com dinheiro ou fica com o coração na mão quando
seus investimentos estão no vermelho? Os fatores decisivos para um
daytrader de sucesso são, além de conhecimento técnico, autocontrole
emocional, disponibilidade de tempo e dinheiro próprio. Se você não atende
esses requisitos, mantenha distância de day trading.
Você tem afinidade pela análise técnica? Qual a assertividade dos seus
métodos? Já realizou back testings de suas estratégias com dados históricos
dos últimos 10 anos das ações escolhidas? Quais seus resultados na bolsa?
Os melhores traders da atualidade são ótimos programadores. Lógica e
conhecimento aritmético são pré-requisitos para aqueles que pretendem
aprofundar-se no assunto. Bons analistas técnicos possuem ótima
escrituração. Anote tudo, desde simulações até as operações reais. Operar
através da análise técnica é um processo de melhoria contínua. Sem esses
pré-requisitos você será presa fácil nas garras do mercado e dos vigaristas.
Seja meticuloso e cuidadoso, e estude, estude e estude.
*****
13. Grandes quedas não implicam grandes altas
Com o perdão da expressão, mas que atire a primeira pedra quem nunca viu
deslumbrado o gráfico de uma ação que despencou na bolsa de valores e
pensou: ― Para voltar ao mesmo valor, essa ação subirá muito! ― Tropecei
em muitas pedras no mercado de ações, mas provavelmente o maior tropeço
no início da minha carreira como investidor foi acreditar que grandes quedas
precediam grandes altas.
Mas por quê? A resposta pode parecer simples, mas vamos tentar desvendar
um pouco o que se passa no coração, ou melhor, na cabeça de um jovem
investidor. Ao dar os primeiros passos ele é bombardeado por falsas
impressões a respeito do mercado de ações.
Sejamos francos, quando pensamos na expressão bolsa de valores, o que vem
à nossa mente? Se você pensou em Wall Street, na emblemática Nova Iorque
ou em homens de terno ganhando milhões de dólares, você não é diferente da
maioria das pessoas. A todo o momento são oferecidas as ilusões de riqueza e
sucesso rápido, expresso. Nas salas de cinema, no aconchego do lar
assistindo televisão, enquanto navegamos pela Internet ou simplesmente ao
lermos um jornal no metrô, lá estão os estímulos para participar do rally
acionário.
Para pensar...
Seu objetivo é dobrar seu capital em um ano? Cuidado, você pode estar sendo
ganancioso. Se não obteve uma rentabilidade semelhante em outras
aplicações ou operações, pense bem. Você enxerga padrões no
comportamento dos preços? O preço não vai disparar só por que está vendo
uma bandeira12 no gráfico.
Você comprou ações de empresas que caíram mais de 50% nos últimos 12
meses? Este é o clássico erro. Em primeiro lugar, você sabe por que a ação
caiu tanto? Trata-se de uma oportunidade ou de uma “canoa furada” que você
não consegue sair? Fazer preço médio para “reduzir” seu prejuízo também é
um sinal que está no caminho errado.
Se você é trader, tem critérios de saída bem definidos? Você iniciou algum
trade e ao ver os preços derreterem resolveu tornar-se investidor? Outro erro
comum. Traders são disciplinados e não se tornam investidores em operações
mal sucedidas. Isso pode ser sinal de falta de estudo ou falta de conhecimento
sobre o que você deseja do mercado.
Você investe em ações com bons fundamentos ou prefere comprar apenas
ações “baratas”? Mais uma vez, cuidado com a falsa oportunidade. Uma
empresa só pode ser considerada barata se, e somente se, seus preços estão
atraentes e possui bons fundamentos.
*****
14. Invista em empresas que você conhece
― Não sou investidor, não me casarei com nenhuma ação, não preciso perder
meu tempo lendo ou pesquisando sobre nenhuma empresa. Quando uma
operação dá errado, meu stop é acionado e estou fora, só isso. ― dizia o
grafista.
Nunca desisti de discordar. Insistia com ele que o sucesso de várias de suas
operações beirava a sorte e não a assertividade de sua técnica. ― Pense bem,
colocar seu dinheiro numa empresa que você não faz ideia do que está se
passando na mesma não o deixa um pouco incomodado? ― questionei
surpreso. De nada adiantou, na verdade acreditava ser uma grande vantagem,
uma espécie de agilidade para ganhar dinheiro na bolsa.
Entretanto houve um divisor de águas nesse pensamento simplista de Álvaro.
Os 2012 e 2013 da bolsa brasileira foram marcados por muita volatilidade.
Um paraíso para especuladores e traders, mas que tem suas armadilhas. Isso
se acentua ainda mais quando se tratam de empresas pequenas com ações
negociadas na casa dos centavos ou com saúde financeira delicada.
Infelizmente essas empresas são verdadeiros ímãs de investidores e
operadores distraídos ou gananciosos.
Uma dessas empresas que se destacou em 2013 foi a trading agrícola
Agrenco, uma empresa com potencial para firmar-se no agronegócio
brasileiro, mas que viu sua situação financeira entrar em colapso a partir de
2008, após a Operação Influenza da Polícia Federal ser deflagrada contra os
executivos da companhia.
Em meados de 2013 a empresa era destaque devido à tramitação da
aprovação do Plano de Recuperação Judicial (PRJ) que poderia reverter a
situação da empresa. O fato vinha causando verdadeira comoção no meio de
uma legião de pequenos especuladores por acreditarem que a aprovação do
PRJ provocaria uma subida desenfreada no preço da ação da empresa, que na
época era negociada por poucos centavos.
Nesses dias Álvaro alardeou pelo Twitter que havia rastreado uma excelente
operação em seu radar, com possibilidade de ganho de 50%, e informara que
os interessados deviam entrar em contato (era comum ele vender
recomendações para os seguidores).
― Mas se algo der errado meu stop zera a posição. Qual o problema? ―
alegou cético.
― O problema é que não há garantia que você consiga sair desse papel caso
as coisas não deem certo na Justiça para a empresa. Um conselho de amigo?
Espere a poeira baixar.
― Okay. Vamos marcar um almoço e conversarmos mais, pode ser? ―
respondeu evasivo.
― Claro. ― respondi duvidoso que meu conselho surtira efeito. Vida que
segue, tentei esquecer esse assunto, afinal tinha outros afazeres.
Uma semana depois, recebi para minha surpresa uma mensagem do Álvaro
na qual dizia: “Cara, obrigado! ”. Achei estranha a mensagem depois de uma
semana, e pesquisei para verificar se algo havia acontecido. Descobri que a
Justiça decretara a falência da Agrenco. O pior aconteceu, além da situação
da empresa agravar-se com a recusa dos credores, a negociação dos papéis na
bolsa fora suspensa. Centenas de pessoas desavisadas ficaram com dinheiro
congelado na empresa, sem perspectivas de quando, ou se poderiam, se
desfazer desse papel podre. Agora a mensagem fazia sentido. Fiquei muito
feliz, não por estar certo, mas por ter ajudado meu amigo.
Esse episódio ilustra como é importante conhecer a contexto das empresas
que se pretende investir. Alguém compra um carro sem o conhecer?
Concorda que todos verificam a motorização, a flexibilidade quanto a
gasolina ou ao álcool, os acessórios, se nacional ou importado, o ano de
fabricação, se continua sendo produzido ou se há multas no DETRAN? O
mesmo aplica-se aos imóveis. Compramos um apartamento sem conhecer os
detalhes do mesmo? Não checamos a localização, a vizinhança, a metragem,
o acabamento, a idade do empreendimento, se o condomínio está em dia ou
se há algum impedimento nos cartórios?
Então por que razão muitos investidores não procuram conhecer melhor as
empresas que estão colocando seu precioso dinheiro? ― Um especulador não
precisa conhecer a empresa. ― alguns podem alegar, mas eu digo que estão
enganados. Se um especulador de automóveis, para ter sucesso naquilo que
faz, precisa ter certo domínio sobre automóvel e mecânica, por que um
investidor de ações poderia abrir mão de conhecer seu objeto de estudo?
Eu e minha esposa vamos a fundo nesse quesito. Não é suficiente para nós
sabermos que a BM&F Bovespa (BVMF3) é uma boa empresa. Para
colocarmos dinheiro nela precisamos saber como a Bovespa tem lucro, ou
seja, de onde vem sua receita, quais são suas metas de crescimento, qual a
interferência do Estado nos negócios da empresa, em quais cenários a
empresa é beneficiada ou não, quais as perspectivas em longo prazo, dentre
outros fatores. Sem esse conhecimento não nos sentimos seguros para
investir.
O investidor não precisa ser como nós, mas deve saber, pelo menos, qual o
NEGÓCIO DA EMPRESA e sua SAÚDE FINANCEIRA.
Isso me lembra um episódio engraçado. Certa vez um novato divulgou no
fórum um link para o YouTube de um vídeo gravado por ele no qual
descrevia sua análise (técnica) para a ação BTOW3. Em determinado
momento do vídeo ele afirma que “o papel é desconhecido, mas que possui
bom volume negociado”. Ora, como um papel desconhecido tem alto volume
de negócios? E quais parâmetros ele usou para afirmar que o ticket é
desconhecido? Há algo errado nessa afirmação. Foi inevitável, tornou-se
motivo de chacota no fórum. Isso apenas evidenciou o quão despreparado era
o jovem, que se propôs a fazer uma análise de uma empresa sem ter ideia que
estava falando simplesmente da maior empresa de varejo on-line do país.
Para pensar...
Você conhece o modelo de negócio das empresas que investe? Quais os
setores de atuação? São empresas cíclicas? Têm lucros crescentes nos últimos
anos? Qual o crescimento da receita líquida nos últimos cinco anos?
*****
15. Não invista com dinheiro dos outros
Mesmo para aqueles que investem com método, não recomendo investirem
para terceiros, por duas razões. Primeiro essas pessoas não são investidores.
Pessoas que não conhecem renda variável não estão preparadas para
receberem a notícia que seu capital reduziu em 10% no último mês, por
exemplo. Isso causaria um grande transtorno. Seu cunhado ou amigo quer
que você invista por que confia no seu “taco”? Então o ensine a pescar, não
seja tolo.
Em segundo lugar, o envolvimento emocional com outras pessoas pode
comprometer sua capacidade de decisão. Uma coisa é realizar um prejuízo
próprio, outra totalmente diferente é realizar um prejuízo de familiares ou
amigos. Se tivesse comprado ações para seus pais, você teria o mesmo
calculismo para enviar a ordem de venda realizando o prejuízo ou deixaria a
operação prosseguir na esperança de sair com lucro?
Não alavanque
A alavancagem é um limite de crédito disponibilizado no homebroker pelas
corretoras, que permite comprar ou vender a descoberto, para operações de
day trade13. Possibilita ganhos maiores, assim como traz riscos maiores.
A gestão de riscos não é uma tarefa fácil, mas se torna mais difícil quando
combinada à alavancagem. O limite é aplicado de acordo com seu patrimônio
em ações custodiadas ou em dinheiro na conta depósito da corretora. Hoje há
corretoras que disponibilizam alavancagem de 10x, 15x, até 20x o financeiro
do correntista. Suponha que um correntista possua R$ 10 mil em ações do
Bradesco e R$ 2 mil em dinheiro na corretora, e que a alavancagem para esse
papel seja 10x sem nenhuma restrição. Essa alavancagem permitiria ao
correntista realizar uma compra ou venda a descoberto no valor de até R$ 120
mil. Por isso o uso da expressão “alavancar” que significa aplicar força
adicional para impulsionar, incrementar ou melhorar o desempenho.
Entretanto quanto maior a alavancagem, maior a exposição do patrimônio do
operador ao risco. O ganho de 1% em uma operação de R$ 120 mil é de R$
1,2 mil, muito bom para quem tinha apenas R$ 12 mil em ações e dinheiro,
no entanto, a perda de 1% significaria um prejuízo de 10% no patrimônio do
correntista. Sempre ao se utilizar alavancagem, o risco é multiplicado pelo
mesmo fator.
Para pensar...
Você investe por outras pessoas? Faz uso de conta margem ou dinheiro de
terceiros para alavancar suas operações? Acredita que sua estratégia é
inovadora? Não existe nada de novo debaixo do sol.
Invista ou opere somente com seu capital. Não envolva outras pessoas além
de sua companheira em seus investimentos. Não comprometa sua capacidade
de decisão, nem aumente sobre si o risco inerente à atividade de investir em
renda variável. Caso não possa ou não tenha o suficiente, não invista. Essa
conversa de “perder o último trem” é para principiantes.
*****
16. Cuidado com conselhos de quem se deu bem
Para pensar...
Você ouve os conselhos de outros investidores? Segue alguma analista nas
redes sociais? Você deixa de comprar ou vender uma ação dependendo da
opinião de algum milionário? Acha que sua opinião não é suficiente?
Sempre suspeite de pessoas que apresentam números exuberantes de suas
atuações no mercado financeiro ou que ganharam muito em pouco tempo.
Desconfie de previsões infundadas sobre empresas, mesmo que essas
previsões partam de pessoas com credibilidade. Intuir que ações cairão ou
subirão é um verdadeiro achismo que não merece confiança.
Existem muitas formas de lograr o sucesso na bolsa de valores, mas a melhor
forma é a sua. Estude, tome suas próprias decisões. Não se guie pela opinião
dos outros, por mais sábios que aparentam ser. O que deu certo para eles,
poderá não dar para você. Caminhe com suas próprias pernas, mesmo que
erre, você saberá por que errou e não terá o sentimento de que alguém o fez
tropeçar.
*****
17. Converse com sua companheira
“Se queremos ser estimados, devemos viver com pessoas estimadas. ” – Jean
de La Bruyère
Extraí muitas lições das minhas escolhas na bolsa de valores, mas a mais
importante lição foi não deixar de compartilhar com minha companheira as
decisões de investimento. Eu e minha esposa sempre experimentamos
cumplicidade em todos os aspectos de nosso relacionamento, mas
curiosamente essa cumplicidade não se estendia às finanças.
Não é um fato isolado o que se passava em nosso casamento, pelo contrário,
é uma característica de boa parte dos casais brasileiros. Particularmente
atribuo isso a dois fatores, um sexista e outro cultural. O homem num
contexto machista é convencido a não compartilhar as decisões financeiras
com uma mulher, no caso sua companheira. Em segundo lugar, nossa
deficitária educação financeira não prepara homens e mulheres para lidar com
dinheiro de uma forma clara, objetiva e racional.
Não é incomum a decisão da compra de um automóvel ser dirigida somente
pelo homem. É como se para este tipo de assunto ele tivesse a prerrogativa de
decidir sozinho, quando na verdade ambos, marido e mulher, deveriam estar
de comum acordo, pois é uma decisão que diz respeito ao casal e não
somente a uma parte da relação, independente do automóvel ser usado
somente pelo homem ou pela mulher.
Não se trata de submissão masculina. Ouvir a opinião da sua companheira
nas decisões financeiras é uma expressão de compromisso e respeito. Assim
como a mulher não pode omitir sua opinião, não cabe ao homem decidir
como aplicar o dinheiro da família de forma unilateral.
― Minha esposa não conhece nada sobre investimentos. Como proceder? ―
você me pergunta. Eu respondo: ― Divida seu ponto de vista com ela. Seja
didático, elabore uma apresentação sobre os pontos fortes e fracos da sua
estratégia de investimento. Exponha a ela os detalhes da empresa que você
pretende investir. Seja imparcial, pense que defenderá sua tese de
investimento para sua “sócia”. É um ótimo exercício. Quem sabe você
mesmo não muda de ideia ao expor seu ponto de vista? Estereótipos a parte,
mulheres têm ótimas perspectivas de empresas de consumo, por exemplo.
Certa vez estávamos comprados em uma empresa de varejo têxtil que julgava
ser excelente, mas ao conversar com minha esposa sobre nossa carteira ela
disse que estava percebendo queda de público e qualidade dos produtos.
Genial! Eu, preocupado com balanços e resultados trimestrais, nem me dera
conta que a empresa estava passando por esse momento. Ela, com a visão
atenta de uma consumidora perspicaz, foi capaz de fazer uma leitura da
empresa que não estava estampada em nenhuma apresentação para
investidores. Mediante essa valiosa informação, decidimos que o melhor era
zerar nossa posição e partir para uma empresa com melhores perspectivas.
Semanas depois assistimos a companhia perder continuamente valor de
mercado, enquanto os analistas passaram a revisar suas recomendações para
venda.
Esse episódio exemplifica como subestimamos nossas companheiras.
Incorporar a visão da minha esposa, fazendo dela coparticipante nas decisões
de investimento transformou a forma como lidava com ações. Eu ignorava ou
não dava o devido valor ao caráter complementar da nossa relação entre
marido e mulher. Minhas decisões de investimento, unilaterais, careciam do
apoio e da opinião de minha esposa, pois havia desprezado seu perfil em
nosso relacionamento no tocante às finanças. Conhecia a análise
fundamentalista bem, sabia discernir entre boas e más empresas, mas por
estar emocionalmente envolvido não conseguia decidir. O simples fato de
envolver minha esposa e relatar os motivos das minhas escolhas ampliaram
meus horizontes e trouxe a razão à tona. Perdi muito na bolsa por acreditar
que as cotações de minhas empresas voltariam aos altos patamares, mesmo
vendo seus fundamentos se deteriorarem, por não enxergar o óbvio: que
havia passado da hora de vendê-las. Nesse sentido minha esposa
desempenhou um papel fundamental ao dizer o que meu ego não queria
ouvir, isto é, que eu havia errado e precisava mudar de direção urgentemente.
Hoje não invisto sozinho. Tenho uma ajudadora com quem divido minhas
estratégias. Não carrego a responsabilidade integral de gerir nosso
patrimônio. Revisamos semestralmente nossos investimentos e somos
cúmplices nos acertos e nos erros. Ela assumiu o papel que negara muitos
anos e eu anulei meu egoísmo e orgulho que me impedia de dividir com ela a
tomada de decisão. Ela passou a estudar e analisar as empresas que mantemos
posição e eu a ensinei os princípios de análise de empresas. Dividimos a
responsabilidade para renovarmos nossa comunhão e acertarmos o passo
nessa área tão importante na vida de um casal.
Para pensar...
Para os casados e noivos. Vocês dialogam sobre suas finanças? Seu cônjuge
sabe onde estão aplicadas as economias domésticas? Você mantém em
segredo algo de seu cônjuge? Invista em conjunto com sua esposa ou marido,
isso é essencial para o sucesso da sua estratégia, seja como investidor ou
como operador. Não oculte nada, afinal o patrimônio pertence ao casal, e
você precisará de apoio nos momentos difíceis.
*****
18. Nossa estratégia de investimento
“É sempre prudente olhar em frente, mas é difícil olhar para mais longe do
que se pode ver. ” – Winston Churchill
Seja qual for sua estratégia sugiro fortemente que respeite as três premissas
descritas há pouco. Claro, os solteiros podem desconsiderar a questão
conjugal. Entretanto recomendo que os noivos façam o exercício completo,
pois quando casados precisarão tomar decisões em conjunto, logo é bom
começarem desde já.
Independente de outros fatores é fundamental que sua forma de investir
transmita segurança, confiança e tranquilidade. Se este tripé não estiver
presente no seu método de investimento, a primeira ventania o soprará para
fora da bolsa.
Para ilustrar uma estratégia de investimento, descreverei o modus operandi
que desenvolvemos ao longo do tempo. São quatro pontos que, se
obedecidos, ajudarão muito o casal a crescer na vida conjugal e financeira.
Quanto ao método, cada casal ou indivíduo deverá adaptá-lo ao seu perfil de
acordo com seus objetivos e necessidade, sem esquivar dos Quatro Pontos a
seguir:
Ponto Um: Agenda
Da mesma forma que as empresas definem um calendário anual para as
reuniões do Conselho de Administração, nas quais serão tomadas as decisões
estratégicas para a companhia, o casal deve reunir-se para avaliar seus
investimentos e os próximos passos. A existência de uma agenda é
importante para que o casal não banalize seus investimentos com discussões
rotineiras. A fixação desses marcos, sejam semestrais ou anuais, imprime um
caráter mais solene à discussão, afinal é o futuro do casal que será tratado.
Caso o casal julgue que seis meses é muito tempo para reavaliar seus
investimentos, podem passar a se reunirem de três em três meses. Mas não
recomendo menos que isso. Quanto maior a frequência das reuniões, maior a
exposição do casal aos devaneios do mercado. Isso só levaria a mais
ansiedade e poderia comprometer a capacidade de análise. Em suma, a
ocorrência desses encontros está associada ao perfil psicológico do casal.
Pessoas mais sossegadas preferirão discutir seus investimentos uma vez por
ano, enquanto que os mais inquietos duas ou mais vezes.
A vantagem dessa agenda é a tranquilidade de não sermos absorvidos pelo
mercado e, consequentemente, não ficamos ansiosos com os ruídos do dia a
dia.
Hoje, nossa agenda é semestral. Mas na proximidade de novas políticas
econômicas pós-eleições presidenciais, ou outros eventos que possam
ameaçar o fundamento de nossos investimentos, adotamos uma postura mais
proativa realizando encontros trimestrais. Uma vez passado o cenário adverso
voltamos à periodicidade semestral.
Ponto Dois: Pauta
Do mesmo modo que nos preparamos para uma reunião, treinamento ou
apresentação no trabalho, o casal deve preparar-se para o encontro sobre as
finanças. De nada adiantaria uma agenda sem uma pauta a ser discutida. Uma
pauta nada mais é que uma relação de assuntos que um ou outro, ou ambos,
desejarão conversar a respeito.
O quanto conseguiram poupar no período, a avaliação dos resultados, a
inclusão ou exclusão de papéis da carteira, uma mudança no critério de
seleção de ações, a alteração da agenda, a decisão sobre previdência privada,
entre outros, são exemplos de assuntos que podem ser abordados.
Observe que a pauta pressupõe preparação. É importante que cada um estude,
prepare e busque um posicionamento sobre o assunto levantado. Se alguém
deseja incluir uma nova ação na carteira, então este alguém argumentará as
razões dessa proposta, inclusive expondo os prós e contras da mesma.
Eu e minha esposa procuramos fechar a pauta três semanas antes de cada
reunião. Assim temos tempo para estudar cada assunto, para que ambos
possamos contribuir ativamente na discussão. Para facilitar, pense na seguinte
analogia: o matrimônio sendo um fundo de investimento com dois cotistas,
você e seu cônjuge, e cada qual deve convencer o outro sobre quais as
melhores aplicações. Isso só será possível se cada um souber bem o que está
falando.
Ponto Três: Critério
Este é um assunto sobre o qual o casal precisa debruçar-se um pouco mais. O
consenso sobre quais ações deverão integrar sua carteira é um dos passos
mais desafiadores que o casal precisará dar. Mas é necessário. Existem
muitos meios para avaliar uma ação, mas seja qual for o critério adotado,
ambos deverão compreendê-lo perfeitamente.
Note que o propósito desse livro não é, nem de longe, abordar análise de
empresas, pois é um tema extenso. Aconselho ao casal estudarem juntos os
conceitos mais importantes, assim como os principais múltiplos da análise
fundamentalista. Não há como fugir desses conceitos, toda empresa faz uso
dos mesmos em seus releases de resultados e apresentações institucionais. O
casal precisará ter um pouco de familiaridade com esses termos. Mas não se
preocupe, a Internet é um campo permeado de bons materiais: há ebooks,
artigos, vídeos, sites, etc. Comece com o YouTube, há muitos vídeos
didáticos. Posteriormente, se desejar conhecer mais profundamente, adquira
um bom livro. Não tenha pressa, não se precipite, o melhor investimento que
pode fazer nessa fase é aprender. Sem tempo não é possível assimilar bem
esses conhecimentos.
Dentro da minha estratégia de investimento em ações, considero elegíveis as
empresas com alta previsibilidade de receita, boa margem líquida (>10%) e
pagadora de dividendos (>6%). Sendo este último critério incluído a pedido
de minha esposa. São preferências conservadoras, que excluem muitas boas
empresas, mas que nos deixam confortáveis em ir adiante.
Compreenda que não estou sugerindo utilizar esses critérios para escolher
suas ações. Esses critérios nos atendem, mas não a todos, certamente. Cabe a
cada um determinar seus parâmetros mais adequados. Há quem prefira alto
Retorno sobre o Patrimônio (ROE, do inglês Return on Equity) aliado a um
baixo Preço/Lucro (P/L, preço da ação dividido pelo lucro por ação). Para
alguns a liquidez do papel é pré-requisito, mas eu e minha esposa lidamos
bem com papéis com menos liquidez. Outros não aceitam ações de empresas
muito alavancadas (endividadas), mas isso não chega a ser um problema no
nosso caso porque é comum empresas com alta previsibilidade de receita ter
dívidas maiores, logo é algo que nós temos que aceitar.
Existem ainda aqueles que optam por uma análise de alto nível, considerando
aspectos de macroeconomia e as perspectivas futuras de uma empresa ou
setor. Exemplo, em um cenário com dólar em alta, a escolha de empresas
exportadoras pode ser uma boa estratégia, pois se beneficiarão no curto prazo
dessa tendência de alta da moeda estrangeira.
Contudo, é comum utilizamos outras características como critério para
desempate. Privilegiamos em nossa carteira empresas subprecificadas, para
tanto levamos em consideração o Valor Patrimonial por Ação (VPA) ou
mesmo alguma informação presente em um comunicado oficial que nos leve
a crer, por exemplo, que haverá algum evento não recorrente. Claro, este caso
requer mais estudo, talvez uma simples leitura não seja suficiente.
Os critérios são muitos e variados. Não há uma fórmula mágica para seleção
das empresas mais promissoras dentro de um, cinco ou dez anos. Mas com
estudo e dedicação o casal será capaz de desenvolver as habilidades
necessárias aos bons investidores.
A vantagem de critérios bem definidos é que ao mesmo tempo em que são
filtros para a escolha das empresas, são gatilhos para rejeição das mesmas, ou
seja, são critérios de entrada e saída. Portanto, o tempo de permanência em
uma ação pode ser indeterminado. Enquanto o papel continuar atendendo os
critérios de seleção, o mesmo permanecerá na carteira. Em nosso caso, se no
encontro verificarmos que algum papel deixou de atender um critério, o
mesmo é colocado em “quarentena” e não recebe novos aportes até a próxima
reunião. Se nesta verificarmos novamente que o papel continua a não atender
todos os critérios, então a permanência na empresa chega ao fim,
independente lucro ou prejuízo.
Daí a seriedade do investidor respeitar os critérios definidos. É comum o
investidor acatar as regras de entrada, mas vacilar ao sair. Este é mais um
sublime momento no qual o casal tem vantagem sobre o investidor
individual. Pois se um vacilar, haverá sempre outro para avigorá-lo.
Ponto Quatro: Balanceamento da carteira
Nem só em renda variável serão os investimentos. Há inúmeras razões para a
existência de um equilíbrio entre os investimentos em renda fixa e variável.
Existem diversos estudos sobre alocação de capital que demonstram de forma
comparativa o desempenho de várias composições de carteiras. De modo
geral as carteiras compostas por investimentos em renda fixa e variável tem
desempenho melhor no longo prazo do que carteiras formadas por apenas
renda fixa ou renda variável. Noutras palavras, existe a possibilidade de uma
carteira composta somente por ações ter desempenho muito inferior a uma
formada por ações e aplicações em renda fixa.
A explicação para isso é simples: o preço das ações é variável. Ao alocar todo
seu capital em ações, o mesmo estará sujeito às oscilações dos preços ao
longo do tempo, diferente das aplicações em renda fixa. Ao distribuir em
partes iguais sua capital em ações e renda fixa, combinamos as características
de ambas as modalidades de investimento, tirando proveito disso.
Significa que nos momentos em que as ações caírem, podemos restaurar o
equilíbrio retirando uma parte da renda fixa para adquirir mais ações. De
forma análoga, nos períodos de euforia da bolsa, quando a parcela em ações
subir consideravelmente em relação ao montante em renda fixa, poderemos
vender ações e aplicar em renda fixa com a finalidade de reestabelecer o
equilíbrio.
Esse movimento de manutenção do equilíbrio entre renda variável e fixa é
denominado balanceamento.
Existem pessoas que acrescentam a modalidade moeda à carteira de
investimento, ou seja, dólares, euros, ouro, prata, e assim por diante. Eu e
minha esposa optamos por não alocar capital nesse tipo de ativo. Mesmo o
dólar e o ouro sendo considerados refúgios em tempos de crise, nós não os
classificamos como investimentos no sentido estrito da palavra por não serem
remunerados. 100 g de ouro hoje continuarão a ser exatamente 100g de ouro
daqui dez anos, diferente das empresas que além de crescerem, distribuem
proventos, provocando um efeito cascata no capital do investidor.
Hoje em dia procuramos dividir nosso capital em 50 - 50, metade em
portfólio de ações e metade em aplicações de renda fixa. Há, pelo menos,
dois benefícios dessa alocação. O primeiro é sermos favorecidos tanto num
cenário de aumento da taxa básica de juros, quanto em outro com a Bolsa em
alta. O segundo, mitigamos consideravelmente o risco e volatilidade da
carteira.
Quanto ao balanceamento, este pode ser realizado basicamente de duas
formas. A primeira, nas ocasiões da agenda, quando o casal avaliará sua
posição e, caso necessário, redistribuirá o capital de modo a atingir o
equilíbrio de novo. A segunda, que não exclui a primeira, consiste em efetuar
os aportes, normalmente mensais, na direção do investimento mais defasado.
Por exemplo, suponha que a composição carteira esteja 43% e 57% em ações
e renda fixa, respectivamente. Logo, deverá aportar dinheiro novo no
portfólio de ações. Neste caso compre somente papéis da empresa que está
mais defasada em relação ao portfólio. Evite realizar mais de uma ou duas
operações no mês, caso contrário poderá surpreender-se no final do ano com
a quantia gasta com corretagem e emolumentos.
Em regra, só os aportes são suficientes para manter a carteira equilibrada.
Evidente, tudo dependerá do valor da carteira e dos aportes, e do quão
eufórico ou depressivo o mercado estará. Também não é necessário
preocupar-se em ter exatamente a mesma quantia em ações e renda fixa, a
alocação é uma meta desejável, pois sempre haverá uma pequena distância
entre os ativos.
Para pensar...
Sua companheira ou companheiro sabe onde são aplicados os rendimentos da
família? Vocês falam sobre isso? Compartilham os mesmos objetivos? Não
transforme os investimentos em um fardo para sua vida.
Aplicar os rendimentos de sua família de qualquer forma não garantirá um
futuro melhor. Envolva sua família e esposa nas decisões de investimento, do
mesmo modo que os envolveria na compra de um imóvel novo. Ao ser
solitário nos investimentos você está trazendo para si uma responsabilidade
que não é apenas sua. Aprenda a dividir para viver melhor e mais feliz.
*****
19. Você é responsável por seus atos
“O inimigo mais perigoso que você poderá encontrar será sempre você
mesmo. ” – Nietzsche
Portanto, inicie suas operações com uma fração do seu capital, em especial os
operadores. No caso destes, aumente moderadamente a grandeza de suas
operações à medida que os resultados se provarem confiáveis. No primeiro
mês envie ordens de um lote, no segundo mês de dois lotes, no terceiro mês
de três lotes, e assim sucessivamente. Somente quando sentir-se seguro envie
ordens maiores.
Um raciocínio análogo aplica-se ao investidor, iniciando com pouco capital e
realizando aportes mensais. Não caia na conversa de analistas e gurus que o
“momento de comprar é agora” ou “se não comprar vai perder a oportunidade
da década”. Sempre há e sempre haverá oportunidade. Não queira ganhar
muito rapidamente, antes de ganhar é preciso não perder. Primeiro, prepare
sua psique. É inevitável, em algum momento você estará perdendo, isto é,
com menos que aplicou. Se você não se sentir confortável com uma oscilação
negativa pequena, em termos absolutos, que dirá operando capital maior.
Perdi dinheiro por não querer ficar para trás. Literalmente apostei todas
minhas fichas e paguei um alto preço pela minha precipitação. Não obstante a
perda financeira foi preciso muito trabalho e tempo para cicatrizar minha
certeza de que o mercado de ações era o melhor caminho.
Pague primeiro as dívidas
No começo do “boom” imobiliário em Belo Horizonte, eu e minha esposa
realizamos, de forma despretensiosa, um bom investimento. Com uma
pequena entrada, compramos um singelo apartamento de dois quartos na
planta, mas bem localizado. A princípio nossa intenção era morar no imóvel,
mas meses depois mudamos para o Rio de Janeiro e decidimos desfazer-nos
do imóvel. Felizmente não apuramos nenhum prejuízo, ao contrário.
Para pensar...
Suas opções de investimento são realmente suas ou você tem confiado a
decisão a outras pessoas? Você se deixa influenciar facilmente? Seja firme, o
responsável por seu sucesso ou fracasso é você mesmo. Não delegue esse
privilégio a ninguém. Não se esconda atrás de seu planejador financeiro, de
seu gerente, de seus amigos ou parentes. Se lhe falta firmeza para assumir
seus atos, ainda não está preparado para bolsa de valores.
Está prestes a receber uma grana e pretende aplicar em uma empresa? Não há
justificativas para um investidor de longo prazo, ou mesmo um operador,
entrar na bolsa de valores com todo seu capital de uma vez. Defina um plano
de entrada e siga-o. Mantenha o foco e realize aportes mensais, ignorando as
oscilações do dia a dia. Siga sua estratégia fielmente.
Seja renda fixa ou variável, investir significa colocar o dinheiro a seu favor.
Pressupõe que você parou de trabalhar para seu capital, ou seja, que não está
mais pagando juros nenhum. Regularizar sua vida financeira é o primeiro
passo rumo aos investimentos. É injustificável separar uma importância em
dinheiro visando ganhos futuros, quando existem assuntos a serem resolvidos
no presente. Salde empréstimos e financiamentos, e sinta-se livre para decidir
sobre como aplicar seus rendimentos.
Em minha opinião, a única exceção à regra é o financiamento da casa própria.
Desde que a prestação se encaixe bem no orçamento familiar, não vejo
problema em conciliar o pagamento do imóvel e os aportes mensais em
ações. Claro, havendo a oportunidade de quitá-lo, ótimo, afinal normalmente
não é uma soma pequena e é um compromisso de longo prazo.
É sempre bom frisar: o propósito do mercado de ações para o pequeno
investidor é ser um catalisador para o crescimento de seu patrimônio, mas
não pagar juros é evitar a erosão de seu patrimônio.
*****
20. Cuidado com o autoengano
Semana após semana mais e mais argumentos surgiam a favor a empresa. Ele
estava tranquilo diante dos comunicados e dos resultados trimestrais. Recebia
por e-mail quase que diariamente links de sites e artigos que reforçavam sua
opinião. Tratava as projeções da empresa como fatos.
Pouco a pouco passou a ficar mais arredio ao tocar no assunto. Seu suspeito
bom humor e excesso de segurança começaram a denotar que não era a mim
que ele queria convencer, mas a ele mesmo.
Semanas depois dos revezes da OGX, seus argumentos não me convenciam
mais. A verdade veio à tona por meio da situação financeira da empresa e dos
seus reais números emblemáticos. Resolvi dar um basta e partir para outra
após minha aplicação minguar consideravelmente. Mal sabia eu que aquela
decisão selaria minha amizade com Lucca. Num de nossos últimos encontros
tentei dissuadi-lo a permanecer comprado na empresa, que repensasse sua
estratégia e usasse o bom senso. Não adiantou nada, já não se comportava
com investidor há tempo. Havia se casado com a empresa.
― Eu tenho uma estratégia, e você nenhuma! ― disse balançando a cabeça
de maneira incisiva como quem repreende alguém que está fazendo algo
errado. A tal estratégia nada mais era que continuar comprando para baixar
seu preço médio, na doce ilusão que os preços se recuperariam.
― Não, estou sendo racional. Essa empresa está afundando e você não está
percebendo ― respondi calmamente.
Não almoçamos mais juntos, apenas nos víamos devido às nossas relações de
trabalho. Tento certeza que o orgulho, e posteriormente a vergonha, o
impediram de voltar a conversar comigo. Permaneceu preso à “oportunidade
dourada”, da qual não tinha coragem de largar, enquanto assistia seu
patrimônio aplicado derreter. Não aceitara que percorreu um caminho errado.
*****
21. Não tenha sentimentos pelo dinheiro
Sofremos devido ao apego pelo dinheiro que não temos mais ao investir. Sim,
ao adquirimos ações, por exemplo, deixamos de ter o dinheiro em espécie. Se
adquirirmos 1.000 ações por R$ 50 mil não possuímos mais R$ 50 mil, mas
apenas 1.000 ações ao preço que estão sendo cotadas. Suponha que a cotação
esteja no momento em R$ 55 e seu patrimônio resuma-se a essas 1.000 ações.
Qual o valor de seu patrimônio? A resposta correta seria dizer que possui
1.000 ações de certa empresa, mais nada.
Acompanhar diariamente a cotação de seu patrimônio, alocado em ações, é
motivo pelo qual tantos sofrem e descabelam-se no mercado.
Deveríamos adotar a mesma analogia a imóveis. Se possuísse um
apartamento na Barra da Tijuca, e ao ser indagado sobre seu patrimônio, o
que diria? Que possui um apartamento localizado na Barra da Tijuca.
Simples. Não dizemos que temos R$ 750 mil, não convertemos o bem imóvel
de acordo com sua cotação.
O preço de um apartamento pode oscilar ao longo do tempo, entretanto não
nos preocupamos ou não nos damos conta desse fato. Isso ocorre por que não
é simples ou rápido tomar a cotação de um apartamento, ao contrário de uma
ação.
No caso da bolsa de valores, a cotação dos papéis negociados está espalhada
na Internet, podendo ser acessada a qualquer momento nos tablets ou
smartphones. Essa facilidade tem prós e contras. Mais contras a meu ver,
sobretudo para o investidor de longo prazo. Imagine receber um SMS diário
com a cotação de seu apartamento. Isso geraria ansiedade? Provavelmente
não, por tratar-se de um bem no qual você deseja permanecer muitos anos
(observe o conceito de longo prazo). Devemos ter a mesma atitude com
respeito a ações. Se miramos o longo prazo, qual a justificativa para a
ansiedade com os acontecimentos recentes ou com a cotação do dia?
Ser passional em seus investimentos é como observar os preços de seus
papéis no intraday, vibrando a cada subida e suspirando a cada baixa. Pessoas
assim não devem operar na bolsa, pois estão destinadas a tomar atitudes
precipitadas ou a perder. O medo de perder e a ganância de ganhar são
principais sentimentos que conduzem ao fracasso financeiro.
Para pensar...
Você acompanha todos os dias a cotação de suas ações? Qual sua reação
diante de uma oscilação -5%? Fica inquieto, ansioso? Procura descobrir a
razão nos fóruns e sites especializados? Vende por que todos estão falando
que vai cair? Cuidado, seu coração pode estar pregando uma peça em você.
Não desenvolva sentimentos por seu dinheiro, não dê nome a seus
investimentos e nem os humanize. Se você refere-se a uma aplicação como
“minha passagem para Europa”, ou “meu carro zero”, ou “minha
sementinha”, etc., você está no caminho errado. Atitudes como estas farão
apenas você sofrer.
Investidores de sucesso são frios com seus investimentos. Tratam estes
meramente como valores aplicados de acordo com critérios racionais. Sim,
pode não ser simples mudar, mas todos podem lidar melhor com seu
dinheiro. Infelizmente não somos como Spock, não alcançamos o seu nível
de controle das emoções. A paixão desenfreada nos investimentos é uma
verdadeira patologia para a qual o investidor precisa procurar tratamento.
*****
22. Não gire seu patrimônio
Para pensar...
Todo seu patrimônio está na bolsa de valores? Você sabe o valor do seu
patrimônio líquido, ou seja, a diferença entre o total de seus bens e seus
compromissos? É fundamental ter resposta a essa questão antes de iniciar ou
reavaliar seus investimentos.
Caso especule no mercado, qual o valor do seu capital alocado a risco? Você
altera sua carteira de ações todos os meses? Segue alguma carteira sugerida
por corretora? Investe sob a opinião de algum amigo ou familiar? Esteja
atento, você pode estar girando seu patrimônio e não o acumulando. O
mercado de ações é mais um meio para acumular patrimônio, assim como o
investimento em imóveis. Por que não giramos o patrimônio imobiliário? Da
mesma forma não devemos girar nosso patrimônio em ações.
*****
23. É bom observar a conjuntura econômica
Para pensar...
Você acompanha seus investimentos? Reavalia pelo menos semestralmente
sobre suas aplicações? Lê os resultados trimestrais? Você se mantém a par da
legislação que regula o setor de atividade sua empresa? Conseguiria
descrever o atual cenário econômico e os riscos para suas empresas? Você
sabe quais são os acionistas majoritários das ações das empresas que possui?
Você compra ações sem fazer uma pesquisa sobre a empresa que está
adquirindo? Tem visto seu patrimônio reduzir de forma sistemática e alega
que são apenas oscilações de curto prazo? Lembre-se, buy-and-holder deve
ser entendido como comprar e manter racionalmente, e não como comprar e
esquecer levianamente.
*****
24. Estraguei tudo, o que faço?
Sem isso você nunca encontrará paz para ser bem-sucedido nos negócios. É
muito diferente quando se está fazendo um investimento com o apoio da sua
esposa, quando sabe que não há garantia de sucesso, mas está simplesmente
junto a ti.
Relaxe
Não tem jeito, depois daquelas provas pesadas na escola, daquele mês
estressante no trabalho, ou daquela semana cuidando dos familiares que
chegaram de surpresa, precisamos descansar. Recarregar as baterias para
continuarmos é imprescindível.
Diversão faz parte. Você se estressou, desgastou-se e frustrou-se. Imagine
como está sua cabeça? Você se recorda da razão pela qual investe? Para
aumentar seu patrimônio e assegurar um futuro mais confortável para você e
sua família. Para seu bem-estar. Essa é a finalidade dos investimentos. Ora, se
essa é a finalidade dos investimentos, como podem os mesmos deixar você
prostrado? Está errado, relaxe, separe um dia para você se descontrair com
sua esposa e família, namorada ou com seus amigos, o que for melhor para
você. Procure retomar o leme da sua saúde física e mental.
Lembro-me da atmosfera tensa na semana em que conversei com minha
esposa sobre nossa posição financeira. Estava com uma grande ressaca moral
quando ela propôs em fazermos um pequeno passeio para conhecermos
Niterói (morávamos no Rio de Janeiro há pouco tempo).
Foi um passeio singelo, mas com muito significado. Um dia lindo de céu
azul. Cruzamos de balsa a Baía de Guanabara rumo à cidade de Arariboia, e
visitamos os alguns pontos turísticos. Conhecemos o Museu de Arte
Contemporânea (MAC) projetado por Niemeyer, a praia de Icaraí, a Ilha de
Boa Viagem, e ainda, no caminho às barcas, descobrimos a Feira de
Antiguidades da Praça XV, no Rio. Vale a pena conferir.
Não me vem à mente um passeio tão revigorante com esse, não tocamos em
nenhum assunto relacionado a investimentos, dinheiro ou finanças.
Espairecemos, rimos bastante e nos divertimos muito. Viajar é uma ótima
higiene mental, mesmo que o destino seja pertinho.
Sua saúde mental é muito importante. Seu bem-estar, e de sua esposa, devem
ser prioritários. Independente de sucesso ou não nos negócios, não podemos
nos descuidar. Precisamos constantemente oxigenar nossas ideias e sonhos.
Estes são os formidáveis componentes de uma vida com realizações, afinal
sem sonhos qual o propósito dos investimentos?
Reflita
Reflexão é o exercício do autoconhecimento. É olharmos para dentro de nós
mesmos em busca de sabermos quem na verdade somos. Quando alguém lhe
pergunta quem é você, a resposta correta vai muito além de dizer seu nome,
idade, estado civil ou profissão. Da mesma forma sua experiência com a
Bolsa. Alegar simplesmente que perdeu dinheiro, ou que foi péssima, não diz
nada em si.
Durante muitos anos acreditei piamente que a resposta a essa pergunta era
“sim”, para quaisquer pessoas. Mas com o tempo, e depois que tudo que
passei, estou convicto que aplicar em renda variável não é para todos (ao
contrário do que apregoava a campanha da BM&F Bovespa).
Isso não está relacionado a ser pequeno ou grande investidor, ou a ter poucas
ou muitas reservas para investir, ou a ser jovem ou velho, mas se relaciona
puramente com o perfil de cada um de nós como investidores. E não existe
problema nisso, assim como sou livre para não investir na bolsa, também o
sou para não aplicar na Poupança.
Caso sua resposta seja “não, não é para mim”, não há nada que se
envergonhar, ao contrário, você deu um importante passo em seu
autoconhecimento, parabéns! Nesse caso, existem boas opções e
investimento em renda fixa, sobretudo com as atraentes taxas de juros do
país. Caberá a você encontrar aquelas mais aderentes ao seu perfil.
Se todo investidor agisse com sinceridade para com ele mesmo,
preocupando-se em responder perguntas como “Quem eu sou na bolsa?”,
“Estou feliz investindo no mercado de ações?”, “Quais meus objetivos?” ou
“Estou alcançando meus objetivos?”, não teríamos tantas pessoas insatisfeitas
e decepcionadas com suas aplicações e com elas mesmas.
Caso sua resposta seja “sim, a Bolsa continua uma boa opção para mim”,
meus cumprimentos por sua conclusão. Nesse caso, atenção, para continuar
na bolsa você deve se policiar para não incorrer nos mesmos erros. Não
aceite protagonizar aquele participante debilitado do mercado. Retorne a
investir com estratégia, método, e foco em você, sua família e seu patrimônio.
Precisei chegar à beira do abismo para sondar meu íntimo e obter essa
resposta. Graças a isso hoje sou um investidor tranquilo e consciente do meu
papel no mercado e do papel deste na minha vida.
Não me admiro, assusto ou emociono com os solavancos do dia a dia. Para
ser franco nem tomo conhecimento da maioria desses ruídos.
Hoje meu foco está em aumentar meu patrimônio de modo sistemático, seja
com meu trabalho ou com os frutos de meus investimentos, e em viver uma
vida plena e próspera com minha esposa. Graças a Deus tenho conseguido.
*****
Notas
[←1]
Neófito é um principiante ou novato; pessoa que está aprendendo alguma coisa. No
contexto do mercado de ações é um iniciante nos investimentos.
[←2]
De modo geral, subprime é um crédito de risco concedido a alguém que não oferece
garantia suficiente para usufruir de uma taxa juros mais vantajosa. Subprime também
pode ser designado como um crédito hipotecário destinado a tomadores de empréstimos
mais arriscados. Nessa modalidade de crédito o tomador oferece sua residência como
garantia, e normalmente é um crédito casado com a aquisição de algum produto
bancário.
[←3]
Estar comprado ou operar comprado (long, em inglês) significa ter uma posição na qual
se ganha com a alta. Estar vendido ou operar vendido (short, em inglês) é o oposto, ou
seja, ganhar com uma posição com a baixa.
[←4]
Venda a descoberto (short selling, em inglês) trata-se de vender uma ação que não possui
ou que tenha tomada emprestada. A venda a descoberto é motivada pela crença de que o
preço do papel cairá. Poder ser usada como especulação, investimento ou estratégia de
gerenciamento de risco para contrapor uma posição comprada. O risco de uma venda a
descoberto é relativamente mais alto do que uma operação normal, pois o preço de uma
ação pode subir indefinidamente, em tese, e com isso trazer grande prejuízo ao vendedor.
[←5]
ROGERS, Pablo et al. Finanças comportamentais no Brasil: um estudo comparativo.
Congresso de Contabilidade e Controladoria. In: VII CONGRESSO USP DE
CONTROLADORIA E CONTABILIDADE, 2007, São Paulo.
[←6]
A croupier é alguém nomeado em uma mesa de jogo para ajudar na condução do
mesmo, especialmente na distribuição de apostas e pagamentos. Croupiers são
normalmente empregados por casinos.
[←7]
Trata-se de um ditado famoso no Texas Hold'em (modalidade mais popular de pôquer)
que diz que “se você não sabe quem é o pato na mesa, é porque o pato é você”.
[←8]
Uma trattoria é um estilo italiano de estabelecimento para comer, menos formal do que
um ristorante, mas mais formal do que uma osteria. Geralmente não existem cardápios
impressos, o serviço é informal, o vinho é vendido em jarras ou taças, os preços são
baixos, e a ênfase está em uma clientela fixa.
[←9]
Tag along é um mecanismo de proteção ao acionista minoritário de uma empresa, que
garante o direito de sair da sociedade nos mesmos termos dos novos acionistas
majoritários.
[←10]
As expressões altista (bull market, em inglês) e baixista (bear market, em inglês)
referem-se às tendências ascendente e descendente, respectivamente. Podem estar
relacionadas ao mercado de ações como um todo ou às ações de uma empresa específica
ou commodity.
[←11]
No mercado de ações, são as ações que apresentam as melhores recomendações dos
analistas.
[←12]
Bandeira é um padrão gráfico (figura) da análise técnica que, supostamente, sinaliza a
consolidação dos preços antes da retomada do movimento anterior.
[←13]
Considera-se day trade a operação ou a conjugação de operações iniciadas e encerradas
em um mesmo dia, com o mesmo ativo, em uma mesma instituição intermediadora, em
que a quantidade negociada tenha sido liquidada, total ou parcialmente. Art. 54, §1º, I da
Instrução Normativa RFB nº 1.022, de 5 de abril de 2010.
[←14]
Custo de oportunidade é aquilo que se deixa de ganhar na segunda alternativa por se
escolher a primeira. Um exemplo prático, ao comprar um carro financiado você está
comprometendo uma fatia de sua renda mensalmente por um período. Este recurso
poderia ter outro fim como, investir em uma aplicação de renda fixa. Sempre há uma
escolha envolvida, quando nos referimos a custo de oportunidade.
[←15]
RADWAN, Farouk. Why do people deceive themselves?