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original:
Hold Me Tight
Copyright © 2012 by Sue Johnson
1ª edição – Agosto de 2012
Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no
Brasil em 2009
Editor e Publisher
Luiz Fernando Emediato (LICENCIADO)
Diretora Editorial
Fernanda Emediato
Produtor Editorial
Paulo Schmidt
Assistente Editorial
Erika Neves
Capa
Silvana Mattievich
Projeto Gráfico
Alan Maia
Diagramação
Kauan Sales
Preparação
Josias Andrade
Revisão
Marcia Benjamim
Dados Internacionais de Catal ogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Johnson, Sue
Abrace-me Apertado : sete conversas para um amor duradouro / Sue Johnson ; [tradução Samuel Dirceu]
-São Paulo : Jardim dos Livros, 2012.
Título original: Hold me tight : seven conversations for a lifetime of love.
eBook ISBN 978-85-63420-23-7
Print ISBN 978-85-63420-24-4
1. Amor 2. Comunicação interpessoal 3. Comunicação no casamento 4. Homem-mulher -
Relacionamento 5. Intimidade (Psicologia).
12-05662 CDD: 158.24
Dance comigo por entre o pânico até que me sinta seguro e coeso
Erga -me, como um galho de olivas, e seja a pomba que me leva de regresso à
casa
— LEONARD COHEN
Sumário
Introdução
PARTE UM
Uma nova visão do amor
Amor — uma nova visão revolucionária
Para onde foi o nosso amor? Perdendo a conexão
Receptividade emocional — A chave para uma vida inteira de amor
PARTE DOIS
Sete conversas transformadoras
CONVERSA 1: Reconhecendo os diálogos do demônio
CONVERSA 2: Localizando os pontos frágeis
CONVERSA 3: Revisitando um momento instável
CONVERSA 4: Abrace-me — apertado — engajando e conectando
CONVERSA 5: Perdoando ofensas
CONVERSA 6: Criando vínculo por meio do sexo e do contato físico
CONVERSA 7: Mantendo vivo seu amor
PARTE TRÊS
O poder de Abrace-me Apertado
Curando feridas traumáticas — o poder do amor
A conexão definitiva — o amor como a fronteira final
Agradecimentos
Glossário
Bibliografia
Sobre a autora
Introdução
empre fui fascinada pelos relacionamentos. Cresci na Inglaterra, onde
S
meu pai tinha um pub, e passei muito tempo observando as pessoas se
encontrando, conversando, bebendo, brigando, dançando, namorando.
Mas o ponto focal de minha juventude foi o casamento de meus pais. Eu
observava, impotente, enquanto eles destruíam seu casamento e a si
mesmos. Contudo, eu sabia que eles se amavam profundamente. Em seus
últimos dias meu pai chorou lágrimas doloridas pela perda de minha mãe,
embora eles estivessem separados havia mais de 20 anos.
Minha resposta ao sofrimento de meus pais foi jurar que Nunca me casaria. O
amor romântico, decidi, era uma ilusão e uma armadilha. Eu ficaria muito
melhor sozinha, livre e desembaraçada. Depois, naturalmente, me apaixonei e
casei. O amor me enredou, ainda que eu o estivesse afastando de mim.
Afinal, o que era essa emoção misteriosa e poderosa, que derrotou meus pais,
complicou a minha vida, e que parecia ser o ponto central de alegria e
sofrimento para tanta gente? Será que haveria um caminho nesse labirinto que
levasse a um amor duradouro?
E esse meu fascínio pelo amor e as ligações amorosas me levaram até ao
aconselhamento e à psicologia. Como parte do meu treinamento, estudei a
descrição desse enredo, feita por poetas e cientistas. Lecionei para crianças
desajustadas às quais o amor tinha sido negado. Aconselhei adultos que lutavam
contra a perda de uma relação amorosa. Trabalhei com famílias cujos membros
amavam uns aos outros, mas que não conseguiam reunirse e não conseguiam
viver separados. O amor continuou sendo um mistério.
Então, na fase final de obtenção de meu doutorado em aconselhamento
psicológico na Universidade de British Columbia, em Vancouver, comecei a
trabalhar com casais. Fiquei imediatamente hipnotizada pela intensidade de suas
brigas e pela maneira como, muitas vezes, falavam de seu relacionamento em
termos de vida ou morte.
Eu tinha conseguido um considerável sucesso tratando de in-divíduos e
famílias, mas aconselhar dois parceiros em guerra me derrotou. E nenhum dos
livros disponíveis na biblioteca, ou as técnicas que estava aprendendo, pareciam
ajudar. Meus casais não ligavam para as revelações sobre suas relações na
infância. Eles não queriam ser lógicos e nem aprender a negociar. Eles,
certamente, não queriam que lhes ensinássemos regras para lutar mais
efetivamente.
Parecia que o amor era tudo, menos negociável. Não se pode regatear pela
compaixão, a conexão. Essas não são reações intelectuais; são respostas
emocionais. Então simplesmente comecei a me ater às experiências dos casais, e
deixálos me ensinar seus ritmos emocionais e seus passos na dança do amor
romântico. Comecei a gravar minhas sessões com os casais e revêlas repetidas
vezes.
Enquanto eu observava os casais gritando e chorando, e batendo boca e se
fechando em copas, comecei a entender que havia momentoschave emocionais,
negativos e positivos, que definiam uma relação. Com a ajuda de meu orientador
de tese, Les Greenberg, comecei a desenvolver uma nova terapia para casais, e
que era baseada nesses momentos. Nós a chamamos de Terapia Focada nas
Emoções, ou TFE, abreviadamente.
Desenvolvemos um projeto de pesquisa dando a alguns casais uma versão em
desenvolvimento da TFE; a outros, uma terapia comportamental, ensinando-lhes
habilidades de comunicação e de negociação, e a outros, terapia nenhuma. Os
resultados da TFE foram espantosamente positivos, melhor do que tratamento
nenhum ou que a terapia comportamental. Os casais brigavam menos, sentiamse
mais próximos, e a satisfação com suas relações aumentou. O sucesso desse
estudo me guindou a uma posição acadêmica na Universidade de Ottawa, onde,
com o passar dos anos, pude desenvolver mais estudos com tipos diferentes de
casais em consultórios de aconselhamento, centros de treinamento e clínicas
hospitalares. Os resultados continuaram sendo surpreendentemente bons.
A despeito desse sucesso, percebi que eu ainda não entendia o drama
emocional que se apossava de meus casais. Eu estava navegando pelo labirinto
do amor, mas ainda não tinha alcançado o seu âmago. E tinha milhares de
indagações. Por que em minhas sessões os casais angustiados estavam repletos
de emoções tão fortes? Por que as pessoas lutavam tanto para conseguir que a
pessoa amada correspondesse? Por que a TFE funcionava, e como poderíamos
melhorála ainda mais?
Então, em meio a uma conversa com um colega em um pub, o lugar onde eu
primeiramente começara a aprender o que eram as ligações humanas, tive um
desses cliques de inspiração e entendimento sobre os quais a gente lê. Meu
colega e eu estávamos discutindo o porquê de tantos terapeutas acreditarem que
relações amorosas saudáveis são apenas acordos racionais. O raciocínio é que
todos nós buscamos o máximo de benefícios com o menor custo possível.
Eu disse que sabia porque muito mais do que isso estava acontecendo em
minhas sessões com os casais. “Tudo bem”, meu colega desafiou, “se as relações
amorosas não são acordos, o que são, afinal?” Então me ouvi dizer, com uma
voz descontraída: “Ora, são laços emocionais. São parte da necessidade inata de
uma conexão emocional segura. Exatamente aquilo sobre o que John Bowlby
[psiquiatra britânico] fala em sua teoria do apego no que diz respeito a mães e
filhos. A mesma coisa está acontecendo com os adultos”.
A discussão pegou fogo. De repente vi a lógica sutil por trás de todas as
queixas apaixonadas e a desesperada atitude defensiva dos casais. Eu sabia o que
eles almejavam, e entendi como a TFE transformava as relações. O amor
romântico significa necessidade de apego e vínculo emocional. Significa nossa
necessidade programada de ter alguém de quem depender, um amor que possa
oferecer conexão e conforto emocional confiáveis.
Acreditei que tinha descoberto, ou redescoberto, o significado do amor, e
como podemos restaurálo e fazêlo durar. Logo que comecei a usar a abordagem
do apego e do vínculo, passei a ver o enredo envolvendo os casais angustiados
muito mais claramente. Também vi meu casamento muito mais claramente.
Compreendi que nesses enredos somos envolvidos por emoções que fazem parte
de um programa de sobrevivência desenvolvido por milhões de anos de
evolução. Não há como fugir dessas emoções e necessidades sem nos
desfigurarmos. Compreendi que o que estava faltando à terapia de casais era
uma visão científica clara do amor.
Mas quando tentei publicar minhas ideias, a maioria dos meus colegas
absolutamente não concordou com elas. Primeiro, disseram que as emoções
eram alguma coisa que os adultos deveriam controlar. Sem dúvida, emoção
demais era o problema básico na maioria dos casamentos. A emoção deveria ser
vencida, e não atendida ou tolerada. Mas o que era mais importante, eles
argumentavam, é que os adultos saudáveis eram autossuficientes. Só as pessoas
disfuncionais precisam depender das outras. Nós tínhamos nomes para essas
pessoas: elas eram emaranhadas, codependentes, fundidas, amalgamadas. Em
outras palavras, elas eram confusas. Cônjuges excessivamente dependentes uns
dos outros é que arruinavam os casamentos!
Os terapeutas, meus colegas decidiram, deveriam encorajar as pessoas a
andarem por suas próprias pernas. Isso era como o conselho do Dr. Spock sobre
como os pais deveriam lidar com seus filhos — agradar uma criança birrenta é o
caminho para criar um adulto fraco, ele advertia. O problema é que o Dr. Spock
estava redondamente enganado no que dizia respeito às crianças. Da mesma
forma que os meus colegas, quanto aos adultos.
A mensagem da TFE é simples: esqueça a necessidade de aprender a discutir
melhor, analisando sua primeira infância, fazendo grandes gestos românticos, ou
experimentando novas posições sexuais. Em vez disso, reconheça e admita que
você está emocionalmente ligado e é dependente de seu par da mesma forma que
uma criança é dependente dos pais para a educação, cuidado e proteção. Os
vínculos adultos podem ser mais recíprocos e menos centrados no contato físico,
mas a natureza do vínculo emocional é a mesma. A TFE foca a criação e o
fortalecimento desse vínculo emocional entre parceiros ao identificar e
transformar os momentoschave que estimulam uma relação amorosa adulta:
estar aberto, sintonizado e receptivo, um em relação ao outro.
Hoje, a TFE está revolucionando a terapia de casais. Estudos rigorosos feitos
nos últimos 15 anos mostram que de 70% a 75% dos casais que se submetem à
TFE se recuperam da angústia e estão felizes em seus relacionamentos. Os
resultados parecem ser duradouros mesmo no caso de casais que estão correndo
um grande risco de divórcio. A TFE foi reconhecida pela American
Psychological Association como uma fórmula empiricamente comprovada de
terapia de casais.
Existem milhares de terapeutas treinados na TFE na América do Norte, e mais
centenas na Europa, Inglaterra, Austrália e Nova Zelândia. A TFE está sendo
ensinada na China, em Taiwan e na Coreia. Mais recentemente, grandes
organizações, entre elas as Forças Armadas dos Estados Unidos e do Canadá, e o
Corpo de Bombeiros de Nova York, buscaram minha ajuda para a introdução da
TFE a seus membros com problemas de relacionamento com seus pares.
A crescente aceitação e aplicação da TFE também gerou no público uma
percepção cada vez maior dessa abordagem. Progressivamente, eu fui sendo
assediada por solicitações de uma versão simples e popular da TFE, que pudesse
ser lida pelas pessoas e aplicada por elas mesmas. Aqui está ela.
Abrace-me Apertado está projetada para ser utilizada por todos os parceiros,
sejam jovens, velhos, casados, noivos, coabitando, felizes, angustiados,
heterossexuais ou gays; em resumo, todos os pares que aspirem uma vida de
amor. É para mulheres e homens. É para pessoas de todos os estratos sociais e
todas as culturas; todo mundo neste planeta tem as mesmas necessidades básicas
de ligação afetiva. Não é para pessoas envolvidas em relações ofensivas ou
violentas, nem para aquelas com dependências, ou em affairs de longa duração;
essas atividades comprometem a habilidade de se engajar positivamente com os
parceiros. Nessas circunstâncias, um terapeuta é o melhor recurso.
Dividi o livro em três partes. A Parte Um responde à velha indagação sobre o
que é o amor. Ela explica por que muitas vezes escorregamos para a separação e
perdemos nosso amor, a despeito das melhores intenções e das mais nobres
percepções. Também documenta e sintetiza a maciça explosão de estudos
recentes sobre as relações amorosas. Como Howard Markman, do Center for
Marital and Family Studies da Universidade de Denver, afirma: “Este é o
momento oportuno para a terapia e educação de casais”.
Estamos, finalmente, construindo uma ciência de relações amorosas. Estamos
mapeando como nossas conversas e ações refletem nossas necessidades e
temores mais profundos, e constroem, ou destroem, nossas mais preciosas
ligações com os outros. Este livro oferece aos que se amam um novo mundo,
uma nova percepção sobre como amar, e como amar bem.
A Parte Dois é a versão simplificada da TFE. Apresenta sete conversas que
captam os momentos determinantes numa relação amorosa e instrui você, leitor
ou leitora, a como formatar esses momentos para criar um vínculo seguro e
duradouro. Relatos de casos e sessões de Jogue e Pratique em cada conversa
trazem as lições da TFE ao seu relacionamento.
A Parte Três trata do poder do amor. O amor tem a imensa habilidade de
ajudar a cicatrizar as devastadoras feridas que a vida, algumas vezes, nos inflige.
O amor também amplia nosso sentido de conexão com o mundo em geral. A
capacidade de resposta do amor é o fundamento de uma sociedade humanitária e
civilizada.
Para ajudálo a ler o livro, incluí no final um glossário de termos importantes.
Devo o desenvolvimento da TFE a todos os casais que atendi ao longo dos
anos, e faço uso generoso de suas histórias, mascarando nomes e detalhes para
proteger sua privacidade, no decorrer de todo o livro. Todas as histórias são
misturas de muitos casos, e são simplificados para refletirem as verdades gerais
que aprendi com os milhares de casais que atendi. Elas ensinarão a você, da
mesma forma que me ensinaram. Este livro é minha tentativa de passar à frente
esse conhecimento.
Comecei a atender casais no início dos anos 1980. Passados 25 anos ainda me
surpreendo como me sinto intensamente entusiasmada quando me sento numa
sala para trabalhar com um casal. Ainda fico feliz quando os pares, de repente,
entendem as mensagens sinceras de um para o outro, e tentam se estender a mão.
Sua luta e determinação diariamente me iluminam e inspiram a manter vivas
minhas conexões com os outros.
Todos nós vivemos o drama da ligação e da separação. Agora podemos fazer
isso com entendimento. Espero que este livro vá ajudálo e ajudála a transformar
sua relação numa aventura gloriosa. A caminhada delineada nestas páginas fez
exatamente isso comigo.
“O amor é tudo o que se diz dele”, escreveu Erica Jong. “Vale a pena lutar por
ele, enfrentálo, arriscar tudo por ele. E o problema é que, se você não arrisca
tudo, você arrisca ainda muito mais.” Concordo integralmente.
PARTE UM
Uma nova visão do amor
Amor — uma nova visão revolucionária
“Nós vivemos na proteção um do outro.”
PROVÉRBIO CELTA
A
língua. Escrevemos volumes e volumes sobre o amor, dedicamoslhe
poemas inteiros. Cantamos o amor e rezamos por ele. Lutamos por ele
(veja-se Helena de Troia), e erigimos monumentos a ele (veja-se o Taj
Mahal). Subimos ao céu na sua declaração (“Eu te amo!”), e
despencamos na sua dissolução (“Eu não te amo mais!”). Nós
pensamos no amor, e falamos nele — incessantemente.
Mas o que é realmente o amor?
Estudiosos e profissionais divergem há séculos sobre sua definição e
entendimento. Para alguns observadores mais insensíveis, o amor é uma aliança
mutuamente benéfica baseada na troca de favores, um acordo do tipo dar e
receber. Outros, mais historicamente inclinados, consideramno um costume
social sentimental criado pelos menestréis da França do século XIII. Biólogos e
antropólogos o veem como uma estratégia para garantir a transmissão dos genes
e a descendência.
Mas para a maioria das pessoas o amor tem sido e continua a ser uma emoção
mística fugidia, aberta à descrição, mas desafiadora de uma definição. Por volta
dos anos 1800, Benjamin Franklin, um arguto estudioso de tantas áreas, somente
conseguiu considerar o amor como sendo “mutante, transitório e acidental”.
Mais recentemente, Marilyn Yalom, em seu ensaio sobre a história da esposa,
admitiu a derrota, e chamou o amor de “uma inebriante mistura de sexo e
sentimento que ninguém consegue definir”. A descrição da mãe da garçonete
inglesa do pub de que o amor “são cinco minutos divertidos”, é também
apropriada, embora um pouco mais cínica.
Hoje, contudo, não podemos mais nos permitir definir o amor como uma força
misteriosa acima de nossa compreensão. O amor ficou muito importante. Para o
bem ou para o mal, no século XXI, um relacionamento amoroso se tornou a
ligação emocional na vida da maioria das pessoas.
Uma razão é que estamos vivendo cada vez mais em isolamento Bowling ,
observam que sofremos de uma perigosa perda de “capital social”. (Essa
expressão foi cunhada em 1916 por um educador de Virgínia, que observou a
contínua ajuda, solidariedade e camaradagem que os vizinhos ofereciam uns aos
outros.) A maioria de nós não vive mais em comunidades solidárias, tendo à mão
nossas famílias de origem, ou amigos de infância. Trabalhamos cada vez mais
horas, moramos cada vez mais distantes do trabalho, e dessa forma temos cada
vez menos oportunidades de desenvolver relações mais próximas.
Em grande parte dos casos, os casais que atendo em minha prática vivem
numa comunidade de duas pessoas. A maioria das pessoas consultadas numa
pesquisa feita pela National Science Foundation em 2006, informou que o
número de pessoas de seu círculo de amigos íntimos estava caindo, e um número
crescente relatou que não tinha absolutamente ninguém em quem confiar. Como
o poeta irlandês John O’Donohue afirma: “Há um isolamento imenso e pesado
como chumbo, envolvendo cada vez mais pessoas como um inverno gélido”.
Inevitavelmente, agora pedimos das pessoas a quem amamos a ligação
emocional e o sentido de dependência que minha avó podia obter de uma
povoação inteira. E misturandose a isso está a celebração do amor romântico
estimulada por nossa cultura popular. Os filmes, tanto quanto as novelas e o
teatro, nos saturam com imagens do amor romântico como o fim e o objetivo de
todos os relacionamentos, enquanto os jornais, as revistas e os noticiários de tevê
relatam avidamente a busca incessante do romance e do amor entre atores e
celebridades. Portanto, não é nenhuma surpresa que as pessoas ouvidas
recentemente nos Estados Unidos e no Canadá elegessem uma relação amorosa
satisfatória como seu objetivo número um, acima do sucesso financeiro e de uma
carreira bem-sucedida.
Portanto, é imperativo que compreendamos o que o amor é, como
desempenhálo, e como fazêlo durar. Felizmente, nas últimas duas décadas, um
novo, excitante e revolucionário entendimento do amor está emergindo.
Nós agora sabemos que o amor é, na realidade, o apogeu da evolução, o
mecanismo de sobrevivência mais irrefutável da espécie humana. Não porque
nos induz a acasalar e a reproduzir. Nós conseguimos acasalar sem amor! Mas
porque o amor nos impele a ligarnos emocionalmente com uns poucos que nos
oferecem um refúgio seguro nas tempestades da vida. O amor é nosso baluarte,
projetado para nos dar proteção emocional a fim de podermos enfrentar os altos
e baixos da existência.
Esse impulso para nos ligar emocionalmente — encontrar alguém para quem
podemos nos virar e dizer “Abrace-me Aperta-do” — está programado em
nossos genes e em nossos corpos. É tão básico para a vida, saúde e felicidade
quanto a nossa atração pela comida, abrigo ou sexo. Nós precisamos de vínculos
emocionais com uns poucos insubstituíveis para estarmos física e mentalmente
saudáveis — para sobreviver.
Pistas sobre o verdadeiro sentido do amor vêm circulando há muito tempo. Por
volta de 1760, um bispo espanhol, em carta a seu superior em Roma, observou
que crianças de orfanatos, embora tivessem regularmente alimento e abrigo,
“morriam de tristeza”. Nos anos 1930 e 1940, nos corredores de hospitais
americanos, crianças órfãs, desprovidas apenas de afagos e contato emocional,
morriam em massa. Psiquiatras também começaram a identificar crianças que
eram fisicamente saudáveis, mas que pareciam indiferentes, insensíveis, e
incapazes de se relacionar com outras. David Levy, relatando suas observações
num artigo de 1937 no American Journal of Psychiatry, atribuiu o
comportamento desses jovens à “carência emocional”. Nos anos 1940, o
psicanalista americano René Spitz cunhou a expressão “déficit de crescimento”
para crianças separadas de seus pais e submetidas a uma tristeza debilitante.
Mas coube a John Bowlby, um psiquiatra britânico, explicar exatamente o que
estava acontecendo. Deixeme ser honesta. Como psicóloga e ser humano, se eu
tivesse que dar um prêmio para o melhor conjunto de ideias que alguém jamais
teve no quesito “entender as pessoas”, eu daria para John Bowlby sem o menor
acanhamento, e não a Freud ou mais quem quer que seja. Ele pegou os fios de
observações e relatórios e os teceu numa teoria coerente e magistral do apego.
Nascido em 1907, Bowlby, filho de um baronete, foi criado, à maneira das
classes ricas, por babás e governantas. Seus pais só permitiram que se juntasse a
eles à mesa do jantar depois que ele completou 12 anos, e mesmo assim apenas
para a sobremesa. Ele foi enviado para um internato e depois estudou no Trinity
College, em Cambridge. A vida de Bowlby afastouse da tradição quando foi
trabalhar como voluntário nas inovadoras escolas residenciais para crianças
desajustadas, e que estavam sendo criadas por visionários como A. S. Neil. Essas
escolas procuravam focar no oferecimento de apoio emocional, e não na
disciplina austera usual.
Fascinado por suas experiências, Bowlby estudou medicina, e depois se
aprofundou em psiquiatria, o que incluiu submeterse a sete anos de psicanálise.
Seu analista aparentemente o achou um paciente difícil. Influenciado por
mentores como Ronald Fairbairn, que sustentava que Freud tinha subestimado a
necessidade de relacionamento com outras pessoas, Bowlby se rebelou contra a
máxima profissional segundo a qual o ponto decisivo dos problemas dos
pacientes residia em seus conflitos internos e fantasias inconscientes. Bowlby
insistia que os problemas eram predominantemente externos, radicados em
relacionamentos reais com pessoas reais.
Trabalhando com crianças emocionalmente desajustadas na Child Guidance
Clinics, em Londres, ele começou a acreditar que as relações deterioradas com
os pais as tinham deixado apenas com modos negativos de lidar com os
sentimentos e as necessidades básicas. Mais tarde, em 1938, como um clínico
iniciante sob a supervisão da famosa psicanalista Melanie Klein, Bowlby foi
incumbido de atender um adolescente hiperativo e que tinha uma mãe
extremamente ansiosa. Mas ele não obteve permissão para falar com a mãe, pois
apenas as projeções e as fantasias do jovem eram consideradas de interesse. Isso
enfureceu Bowlby. Sua experiência o estimulou a formular sua própria teoria,
segundo a qual a qualidade da ligação com os entes amados, e uma precoce
privação emocional, são a chave para o desenvolvimento da personalidade e para
a maneira habitual como os indivíduos se relacionam com os outros.
Em 1944, Bowlby publicou o primeiro livro a tratar da terapia familiar, Forty
Four Juvenile Thieves, no qual observou que “por trás da máscara da indiferença
existe um sofrimento inesgotável, e por trás da aparente insensibilidade existe
desesperança”. As queixas dos jovens pacientes de Bowlby foram congeladas na
atitude “nunca mais vou ser atingido” e paralisadas em desesperança e raiva.
Logo depois da Segunda Grande Guerra, Bowlby foi incumbido pela
Organização Mundial da Saúde de fazer um estudo sobre as crianças europeias
que o conflito deixou sem lar ou órfãs. Suas descobertas confirmaram sua crença
na realidade da privação emocional, e sua convicção de que o contato afetuoso é
tão importante quanto a nutrição física. Com seus estudos e observações,
Bowlby ficou impressionado com as ideias de Charles Darwin sobre como a
seleção natural favorece respostas que ajudam a sobrevivência. Bowlby chegou à
conclusão de que manter pessoas queridas próximas é uma brilhante técnica de
sobrevivência programada pela evolução.
A teoria de Bowlby era radical e foi estrepitosamente rejeitada. Na verdade,
ela quase o fez ser expulso da British Psychoanalytic Society. A sabedoria
convencional estabelecia que ser mimado pelas mães ou outros membros da
família gerava jovens sem iniciativa, ultradependentes, e que se transformavam
em adultos incompetentes. Manter uma distância racional antisséptica era a
maneira correta de criar filhos. Essa postura objetiva prevalecia mesmo quando
os jovens estavam angustiados e fisicamente doentes. Na época de Bowlby não
era permitido que os pais ficassem no hospital com os filhos e filhas doentes;
eles tinham que se despedir deles na porta de entrada.
Em 1951, Bowlby e um assistente social, James Robertson, fiZeram um filme
chamado “A Two-Year-Old Goes to Hospital”, mostrando graficamente o
protesto irado, o terror e o desespero de uma menininha ao ser deixada sozinha
num hospital. Robertson mostrou o filme à Royal Society of Medicine, em
Londres, na esperança de que os médicos compreendessem a tensão provocada
na criança pela separação de seus entes queridos, e sua necessidade de conexão e
consolo. O filme foi repudiado como uma fraude e quase banido. E ainda nos
anos 1960, na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, os pais só tinham permissão
para visitar seus filhos hospitalizados apenas uma hora por semana.
Bowlby precisava encontrar outra maneira de demonstrar ao mundo aquilo de
que tinha convicção. Uma pesquisadora canadense, Mary Ainsworth, que se
tornou sua assistente, mostrouhe como fazer isso. Ela desenvolveu uma
experiência simples para analisar os quatro comportamentos que Bowlby e ela
acreditavam ser básicos para a ligação: que nós monitoramos e manTemos a
ligação emocional e física com aqueles que amamos; que nós procuramos essa
pessoa quando estamos inseguros, angustiados ou nos sentindo deprimidos; que
nós sentimos falta dessa pessoa quando estamos separados; e que nós precisamos
contar que essa pessoa esteja presente quando saímos pelo mundo afora.
A experiência foi chamada de A Situação Estranha e gerou literalmente
milhares de estudos científicos, e revolucionou a psicologia do desenvolvimento.
Um pesquisador convida mãe e filho para uma sala não familiar a eles. Depois
de alguns minutos a mãe deixa o filho sozinho com o pesquisador, que tenta
oferecer consolo à criança, se necessário. Três minutos depois a mãe volta. A
separação e a reunião são repetidas uma vez mais.
A maioria dos filhos fica incomodada quando a mãe sai; agitamse, choram,
jogam brinquedos no chão. Mas alguns demonstram ser emocionalmente mais
flexíveis. Acalmamse rápi-da e efetivamente, reconectamse facilmente com as
mães quando elas retornam, e rapidamente recomeçam a brincar ao mesmo
tempo em que verificam se a mãe ainda está lá. Parecem estar confiantes de que
a mãe estará lá se precisarem dela. Crianças menos flexíveis, contudo, são
ansiosas e agressivas, ou desligadas e distantes quando a mãe retorna. As
crianças que podem se acalmar geralmente têm mães mais afetuosas e mais
receptivas, ao passo que as mães das crianças zangadas são imprevisíveis em seu
comportamento, e as mães das crianças desligadas são mais frias e indiferentes.
Nesses estudos simples de separação e reencontro, Bowlby viu o amor em ação e
começou a codificar seus padrões.
A teoria de Bowlby ganhou ainda mais aceitação uns poucos anos mais tarde,
quando ele produziu uma famosa trilogia sobre a ligação humana, a separação e
a perda. Seu colega Harry Harlow, um psicólogo da Universidade de Wisconsin,
também chamou a atenção para o poder do que ele chamou “conforto do
contato” ao relatar sua dramática pesquisa sobre bebês macacos separados de
suas mães no nascimento. Ele descobriu que os filhotes isolados ficavam tão
ávidos de conexão, que quando lhes era dada a oportunidade de escolher entre
uma “mãe” feita de arame, e que lhes dava comida, e outra feita de pano macio e
que não dava comida, eles escolheriam quase invariavelmente a de pano. De
maneira geral, as experiências de Harlow mostravam a perniciosidade de um
isolamento prematuro: filhotes de primatas fisicamente sadios que eram
separados de suas mães durante o primeiro ano de vida se tornavam adultos
socialmente desajustados. Os macacos eram incapazes de desenvolver habilidade
para solucionar problemas ou compreender as sinalizações dos outros.
Tornavamse deprimidos, autodestrutivos e incapazes de acasalar.
A teoria do apego, de início ridicularizada e menosprezada, acabou
revolucionando os métodos de criação de crianças na América do Norte. (Agora,
quando vou dormir ao lado da cama de meu filho enquanto ele se recupera de
uma operação de apendicite, agradeço a John Bowlby.) Hoje é amplamente
aceito que os filhos têm absoluta necessidade de segurança, de contínua
proximidade emocional e física, e que só com um grande custo ignoramos isso.
AMOR E ADULTOS
Bowlby morreu em 1990. Ele não viveu o bastante para testemunhar a segunda
revolução estimulada pelo seu trabalho: a aplicação da teoria do apego ao amor
adulto. O próprio Bowlby tinha insistido que os adultos têm a mesma
necessidade de apego — ele tinha estudado as viúvas da Segunda Grande
Guerra, e descoberto que elas exibiam padrões de comportamento similares
àqueles das crianças sem lar — e que essa necessidade é a força que modela as
relações adultas. Mas novamente as suas ideias foram rejeitadas. Ninguém seria
capaz de imaginar que um inglês tradicionalista, das classes superiores, fosse
solucionar o mistério do amor romântico! E de qualquer forma, achávamos que
já sabíamos tudo o que era preciso saber para entender o amor. O amor é
simplesmente uma paixão passageira, disfarçada de atração sexual — o instinto
básico de que fala Freud — um pouco enfeitado. Ou um tipo de necessidade
imatura de depender dos outros. Ou, amor é uma postura moral — um sacrifício
abnegado que tem tudo a ver mais com o dar do que com o necessitar ou receber.
Mais importante, contudo, a visão do amor como apego era, e ainda talvez
seja, radicalmente uma contradição em relação a nossas ideias culturais, sociais e
psicológicas estabelecidas sobre a idade adulta: que a maturidade significa ser
independente e autossuficiente. A noção do guerreiro invulnerável que enfrenta a
vida e o perigo sozinho está há muito enraizada em nossa cultura. Veja o caso de
James Bond, o herói simbólico impenetrável, ainda um ícone depois de quatro
décadas. Os psicólogos usam palavras como indiferenciado, codependente,
simbiótico, ou mesmo amalgamado, para descrever as pessoas que parecem ser
incapazes de ser autossuficientes, ou de se impor perante os outros. Em
contraste, Bowlby falava de “dependência efetiva”, e de como ser capaz, “do
berço ao túmulo”, de virarse para os outros em busca de apoio emocional, um
sinal e fonte de força.
Pesquisas documentando os vínculos adultos começaram um pouco antes da
morte de Bowlby. Os psicólogos sociais Phill Shaver e Cindyn Hazan, da
Universidade de Denver, decidiram fazer perguntas a homens e mulheres sobre
suas relações amorosas, para ver se exibiam as mesmas respostas e os mesmos
padrões que mães e filhos. Eles formataram um questionário amoroso que foi
publicado no jornal local Rocky Mountain News. Em suas respostas, os adultos
falaram da necessidade de proximidade emocional da parte do par amoroso, de
estarem seguros de que o par responderia quando estivessem angustiados, de
ficarem deprimidos quando se sentiam separados e distantes, e sentiremse mais
confiantes de explorar o mundo quando sabiam que o par os apoiava. E também
indicaram maneiras diferentes de lidar com seus pares. Quando se sentiam
seguros em relação à pessoa amada, podiam buscar e fazer contato facilmente;
quando se sentiam inseguros, ou ficavam ansiosos, com raiva e dominadores,
evitavam completamente o contato e permaneciam distantes. Justamente o que
Bowlby e Ainsworth tinham encontrado nas relações entre mães e filhos.
Hazan e Shaver deram seguimento à pesquisa com estudos formais sérios que
reforçaram as descobertas do questionário e as teorias de Bowlby. Esses estudos
provocaram uma avalanche de pesquisas. Centenas de estudos agora confirmam
as previsões de Bowlby sobre as ligações dos adultos, e eles serão citados ao
longo de todo o livro. A conclusão geral: uma sensação de conexão segura entre
pares românticos é básica para uma relação amorosa positiva e uma enorme
fonte de força para os indivíduos nessas relações. Entre as descobertas mais
importantes:
• Quando nos sentimos geralmente seguros, isto é, estamos confortáveis com a proximidade e
confiantes em podermos depender das pessoas amadas, somos melhores em procurar apoio — e
também em dar apoio. Num estudo feito pelo psicólogo Jeff Simpson, da Universidade de Minnesota,
cada um de 83 casais preencheu questionários a respeito de sua relação e depois foi para uma sala. A
parceira feminina tinha sido advertida de que logo participaria de uma atividade que fazia a maioria
das pessoas ficar muito ansiosa (a atividade não era revelada). As mulheres que se descreviam como
seguras nas relações amorosas nos questionários foram capazes de compartilhar abertamente sua
infelicidade com relação ao exercício seguinte, e de pedir apoio a seus pares. As mulheres que
geralmente negaram suas necessidades de apego, e evitavam a proximidade, se afastavam mais nesses
momentos. Os homens reagiam a suas parceiras de duas formas: quando se descreviam como seguros
com as relações, ficavam ainda mais apoiadores do que o normal, tocando e sorrindo para as parceiras
e oferecendo conforto; se se descreviam como desconfortáveis, tornavamse claramente menos
simpáticos quando suas parceiras expressavam suas necessidades, subestimando a angústia delas, e
tocandoas menos.
• Quando nos sentimos seguramente ligados aos nossos pares, suportamos mais facilmente as feridas
que eles inevitavelmente infligem, e somos menos propensos a sermos agressivamente hostis quando
nos irritamos com eles. Mario Mikulincer, da Bar-Han Universidade em Israel, dirigiu uma série de
estudos fazendo aos participantes perguntas sobre o quanto se sentiam conectados nos
relacionamentos, e como lidavam com a irritação quando os conflitos surgiam. A frequência cardíaca
dos participantes era monitorada enquanto eles respondiam a situações de conflito. Aqueles que se
sentiam mais próximos, e podiam depender das pessoas amadas, revelaram sentirse menos irritados
com elas, e lhes atribuíam intenções menos malintencionadas.Descreviamse como expressando
irritação de uma maneira mais controlada, e expressando objetivos mais positivos, tais como
solucionar problemas e religarse a seus pares.
• Conexão segura com a pessoa amada nos fortalece. Num grupo de estudos, Mikulincer mostrou que
quando nos sentimos seguramente ligados aos outros nós nos compreendemos melhor e gostamos mais
de nós. Quando lhes era mostrada uma lista de adjetivos, para escolherem os que melhor as
descreviam, as pessoas mais seguras escolhiam qualidades positivas. E quando questionadas sobre seus
pontos frágeis, prontamente diziam que se sentiam aquém de seus ideais, mas mesmo assim se sentiam
bem consigo mesmas.
A ciência, em todas as áreas, nos diz muito claramente que não somos apenas
animais sociais, mas animais que necessitam de um tipo especial de ligação mais
próxima com os outros, e negamos isso por nossa conta e risco. Na verdade,
historiadores há muito tempo observaram que, nos campos de extermínio da
Segunda Grande Guerra, a unidade de sobrevivência era o par, não o indivíduo
solitário. Também já se sabe há muito tempo que homens e mulheres casados
geralmente vivem mais do que solteiros.
Ter ligações próximas com os outros é vital para cada aspecto de nossa saúde
— mental, emocional e física. Louise Hawkley, do Center for Cognitive and
Social Neuroscience da Universidade de Chicago, calcula que a solidão aumenta
a pressão arterial até o ponto em que o risco de um ataque cardíaco é duas vezes
maior. O sociólogo James House, da Universidade de Michigan, afirma que o
isolamento emocional é um risco mais perigoso para a saúde do que o fumo ou a
pressão alta, e agora nós alertamos todo mundo para esses dois riscos! Talvez
essas descobertas reflitam a frase consagrada pelo tempo: “Sofrer é uma certeza;
sofrer sozinho é intolerável”.
Mas não se trata apenas de termos ou não relacionamentos em nossas vidas —
a qualidade desses relacionamentos também importa. Relações negativas
solapam nossa saúde. Em Cleveland, pesquisadores da Universidade Case
Western Reserve perguntaram a homens com histórico de angina e pressão alta:
“Sua mulher demonstra amor por você”? Aqueles que responderam “não”
sofreram, nos próximos cinco anos, duas vezes mais episódios de angina do que
os que responderam “sim”. O coração das mulheres também é afetado. As que
acham que seu casamento está estremecido, e têm interações hostis regulares
com seus pares, são mais suscetíveis a ter pressão arterial significativamente
elevada, e altos índices de hormônios causadores de estresse, em comparação
com as que têm casamentos felizes. Outro estudo revelou que mulheres que
tinham sofrido um ataque cardíaco tinham três vezes mais chances de sofrer
outro se havia discórdia em seus casamentos.
Mas não se trata apenas de termos ou não relacionamentos em nossas vidas —
a qualidade desses relacionamentos também importa. Relações negativas
solapam nossa saúde. Em Cleveland, pesquisadores da Universidade Case
Western Reserve perguntaram a homens com histórico de angina e pressão alta:
“Sua mulher demonstra amor por você”? Aqueles que responderam “não”
sofreram, nos próximos cinco anos, duas vezes mais episódios de angina do que
os que responderam “sim”. O coração das mulheres também é afetado. As que
acham que seu casamento está estremecido, e têm interações hostis regulares
com seus pares, são mais suscetíveis a ter pressão arterial significativamente
elevada, e altos índices de hormônios causadores de estresse, em comparação
com as que têm casamentos felizes. Outro estudo revelou que mulheres que
tinham sofrido um ataque cardíaco tinham três vezes mais chances de sofrer
outro se havia discórdia em seus casamentos.
Em homens e mulheres diagnosticados com insuficiência cardíaca congestiva,
o estado do casamento do paciente é um indicador de sobrevivência, após quatro
anos, tão bom quanto a severidade dos sintomas e o grau de dano, afirma Jim
Coyne, um psicólogo da Universidade da Pensilvânia. Os poetas que fizeram do
coração o símbolo do amor certamente sorririam diante da conclusão dos
cientistas de que a saúde do coração das pessoas não pode ser separada da força
de suas relações amorosas.
O sofrimento numa relação afeta adversamente nossos sistemas imunológico e
hormonal, e até nossa capacidade de sarar. Numa experiência fascinante, a
psicóloga Janice Kiecolt-Glaser, da Ohio State University, fez com que recém-
casados brigassem, e depois colheu sangue para testes nas horas seguintes. Ela
descobriu que quanto mais beligerantes e altivos eram os parceiros, maior era o
nível de hormônios provocadores de estresse e mais deprimido era o sistema
imunológico. Os efeitos persistiam por até 24 horas. E num estudo ainda mais
impressionante, Kiecolt-Glaser utilizou uma bomba de vácuo para produzir
pequenas bolhas nas mãos de mulheres voluntárias, e depois as fez brigarem
com os maridos. Quanto mais desagradável era a briga, mais tempo era preciso
para a pele sarar.
A qualidade de nossa relação amorosa também é um grande fator para a nossa
saúde mental e emocional. Temos uma epidemia de ansiedade e de depressão em
nossas sociedades mais afluentes. Conflito com as pessoas amadas, ou crítica
hostil delas, aumentam nossas dúvidas e geram um sentimento de desamparo,
gatilhos clássicos para a depressão. Nós precisamos de aprovação da parte das
pessoas que amamos. Pesquisadores afirmam que a angústia conjugal aumenta
10 vezes o risco de depressão.
Tudo isso são notícias ruins — mas há também notícias boas.
Centenas de estudos mostram agora que ligações amorosas positivas com os
outros nos protegem do estresse e nos ajudam a enfrentar melhor os desafios e
traumas da vida. Pesquisadores de Israel indicam que casais com uma ligação
emocional segura são muito mais capazes de lidar com perigos como os ataques
de mísseis Scud1 do que outros casais menos conectados. Eles são menos
ansiosos e têm menos problemas depois dos ataques.
Simplesmente segurar a mão da pessoa amada pode nos afetar profundamente,
literalmente acalmando os neurônios que provocam turbulência em nosso
cérebro. O psicólogo Jim Coan, da Universidade de Virgínia, disse às mulheres,
suas pacientes cujos cérebros estavam passando por uma ressonância magnética,
que quando se acendesse uma pequena luz vermelha no aparelho, elas poderiam
receber um pequeno choque elétrico nos pés — ou não receber. Essa informação
ligava os centros de estresse no cérebro das pacientes. Mas quando os parceiros
seguravam suas mãos, as pacientes registravam menos estresse. E quando
recebiam os choques, sentiam menos dor. Esse efeito era ainda mais
intensamente percebido nas relações mais felizes, aquelas cujos parceiros tinham
índices maiores nas medidas de satisfação, e que os pesquisadores denominavam
de Supercasais. O contato com a pessoa amada atua literalmente como um
atenuador de choques, estresse e dor.
As pessoas que nós amamos, assevera Coan, são os reguladores de nossos
processos corporais e de nossa vida emocional. Quando o amor não funciona,
sentimos dor. Sem dúvida, “sentimentos feridos” é uma expressão
completamente precisa, de acordo com a psicóloga Naomi Eisenberger, da
Universidade da Califórnia. Seus estudos de imagens de cérebros demonstram
que rejeição e exclusão ligam os mesmos circuitos, nas mesmas partes do
cérebro — o córtex cingulado anterior — que a dor física. De fato, essa parte do
cérebro desperta toda vez que somos emocionalmente separados daqueles que
são próximos a nós. Quando li esse estudo, lembro-me de ter ficado chocada
com a minha própria experiência de tristeza. Quando soube que minha mãe tinha
morrido, sentime golpeada, como se tivesse sido literalmente atropelada por um
caminhão. E quando estamos próximos, tocando ou fazendo sexo com a pessoa
amada, somos inundados pela oxitocina e vasopressina, os “hormônios do
amor”. Esses hormônios parecem ativar os centros de “recompensa” do cérebro,
inundandonos com substâncias calmantes e geradoras de felicidade, como a
dopamina, e bloqueando os hormônios do estresse, como o cortisol.
Percorremos um longo caminho no nosso entendimento sobre o que é o amor
e sua importância. Em 1939, as mulheres indicavam o amor como o quinto fator
para a escolha de um marido. Mas em 1990, já era o primeiro fator da lista, tanto
para as mulheres quanto para os homens. E os estudantes universitários agora
afirmam que sua expectativa básica no casamento é a “segurança emocional”.
O amor não é a cereja do bolo da vida. É uma necessidade primária básica,
como o oxigênio e a água. Uma vez que compreendamos e aceitemos isso,
poderemos chegar mais rapidamente ao coração dos problemas de
relacionamento.
Para onde foi o nosso amor?
Perdendo a conexão
“Nunca somos mais vulneráveis do que quando
estamos amando.”
SIGMUND FREUD
“Ofato básico é que Sally não entende nada de dinheiro”, Jay afirma. “Ela é
muito emocional e tem problema em confiar em mim e me deixar
administrar o dinheiro.” Sally explode: “Sim, claro. Como sempre o
problema sou eu. Como se você realmente entendesse de dinheiro! Acabamos
saindo e comprando aquele ridículo carro que você queria. O carro de que não
precisamos e não temos como manter. Você só faz o que quer. De qualquer
forma, minha opinião sobre as coisas não tem importância para você. Na
verdade, eu não tenho importância para você, ponto”.
Chris é um “pai desumano, rígido e indiferente”, acusa Jane. “Os meninos
precisam ser cuidados, não é? Eles precisam da sua atenção, e não apenas das
suas normas!” Chris vira a cabeça para o lado. Ele fala calmamente da
necessidade de disciplina e acusa Jane de não saber impor limites. Eles vão e
vêm, discutindo. Finalmente, Jane põe o rosto entre as mãos e lamenta: “Eu não
sei mais quem é você. Você virou um estranho”. Outra vez Chris se afasta.
Nat e Carrie sentamse num silêncio obstinado até que Carrie rompe o mutismo
e põe para fora, em choro, o quanto se sente chocada e traída com o affair de
Nat. Ele, com um ar de frustração, relata suas razões para o affair. “Já te falei,
dezenas de vezes, por que aconteceu. Fui sincero. E, por Deus, foi dois anos
atrás! É coisa do passado! Já não está na hora de você passar uma borracha e me
perdoar?” “Você não sabe o significado de ‘ser sincero’”, Carrie fala meio
gritado. Depois sua voz vira um sussurro. “Você não liga para mim, para meu
sofrimento. Você só quer que tudo volte a ser como antes.” Ela começa a chorar,
e ele olha para o chão.
Pergunto a cada casal o que eles acham que seja o problema básico na relação
deles, e qual poderia ser a solução. Eles pensam um pouco e oferecem algumas
ideias. Sally diz que Jay é muito controlador e que precisa ser ensinado a
compartilhar o poder de maneira mais equânime. Chris sugere que ele e Jane têm
personalidades tão diferentes, que um acordo sobre como cuidar dos filhos é
impossível. Eles poderiam resolver a divergência fazendo um curso sobre como
educar os filhos com um “especialista”. Nat está convencido de que Carrie tem
algum tipo de grilo sexual. Talvez devessem procurar um terapeuta sexual a fim
de que pudessem voltar a ser felizes na cama.
Esses casais estão se esforçando bastante para entender o seu sofrimento, mas
suas formulações fogem do ponto central. Muitos terapeutas concordariam que
suas explicações são apenas a ponta do iceberg, a crista superficial tangível de
um monte de problemas. Então, qual é o “problema real” que continua
escondido?
Se eu perguntar a terapeutas, muitos dirão que esses casais estão envolvidos
em lutas destrutivas pelo poder, ou em padrões de brigas cáusticos, e que
precisam aprender a negociar e a melhorar suas habilidades de comunicação.
Mas os analistas, também, estão ignorando o ponto crucial do problema. Eles
apenas desceram para a linha da água.
Temos que mergulhar abaixo para descobrir o problema básico: esses casais
estavam desconectados emocionalmente; não se sentiam emocionalmente
seguros uns com os outros. O que os casais e os terapeutas muitas vezes não
veem é que as brigas, em sua maioria, realmente são protestos contra a
desconexão emocional. Por baixo de todo o sofrimento, os parceiros estão
pedindo a cada um: Posso contar com você, depender de você? Você está
disponível para mim? Você responderá a mim quando eu precisar, quando eu
chamar? Eu importo para você? Sou valorizado e aceito por você? Você precisa
de mim, confia em mim? A irritação, a crítica, as reclamações, realmente são
brados para seus amados, chamados para mexer com seus corações, para
recuperar seus cônjuges emocionalmente e restabelecer uma sensação de
conexão segura.
UM PÂNICO PRIMAL
A teoria do apego nos ensina que a nossa pessoa amada é nosso abrigo na vida.
Quando essa pessoa está emocionalmente indisponível ou impassível, nós nos
sentimos desamparados, sozinhos e indefesos. Somos tomados por emoções —
irritação, tristeza, dor, e acima de tudo, medo. Isso não chega a ser tão
surpreendente quando nos lembramos de que o medo é o nosso sistema de
alarme inerente; ele se ativa quando nossa sobrevivência está ameaçada. Perder a
conexão com a pessoa amada coloca em risco nosso sentido de segurança. O
alarme se desativa na amígdala do cérebro, ou Central do Medo, como o
neurocientista Joseph LeDoux, do Center for Neural Science, da Universidade de
Nova York, batizou. Essa área do cérebro em forma de uma amêndoa
desencadeia uma resposta automática ao medo. Nós não pensamos; nós
sentimos, nós agimos.
Todos nós experimentamos algum tipo de medo quando temos
desentendimentos ou discussões com a pessoa amada. Mas para aqueles de nós
com vínculos seguros, tratase de uma angústia momenânea. O medo é rápida e
facilmente contido quando percebemos que não existe uma ameaça real, e que
nosso par vai nos tranquilizar se pedirmos. Mas para aqueles de nós com
vínculos mais frágeis ou esgarçados, o medo pode ser opressivo. Nós somos
inundados pelo que o neurocientista Jaak Panksepp, da Washington State
University, chama de “pânico primal”. Então, geralmente fazemos uma de duas
coisas: ou nos tornamos impositivos e nos aferramos a um esforço de obter
conforto e tranquilização da parte do outro, ou nos retiramos e nos isolamos
numa tentativa de nos acalmar e proteger. Independentemente das palavras
exatas, o que estamos realmente expressando com essas reações é: “Perceba-
me.Fique comigo. Preciso de você”. Ou, “Não vou deixar você me magoar. Vou
ficar calmo, tentar ficar no controle”.
Essas estratégias de lidar com o medo de perder a conexão são inconscientes,
e funcionam, pelo menos no início. Mas quando parceiros angustiados recorrem
a elas com frequência, elas geram espirais de incerteza que apenas os fazem ficar
cada vez mais distantes. E então mais e mais episódios ocorrem, em que nenhum
dos parceiros se sente seguro, ambos se tornam defensivos, e cada um fica
supondo o pior a respeito do outro e da relação.
Se nós amamos os nossos pares, por que simplesmente não ouvimos os
chamamentos de cada um por atenção e conexão, e reagimos com carinho?
Porque na maior parte do tempo não estamos em sintonia com eles. Estamos
distraídos e absorvidos com a nossa própria agenda. Não sabemos como falar a
linguagem do apego, não emitimos mensagens claras sobre as nossas
necessidades ou o quanto nos importamos. Muitas vezes falamos hesitantemente,
porque nos sentimos ambivalentes sobre as nossas necessidades. Ou emitimos
chamamentos para conexão com um quê de irritação e frustração, porque não
nos sentimos confiantes e seguros em nossos relacionamentos. Acabamos
exigindo, e não pedindo, o que com frequência leva a brigas pelo poder, e não a
abraços. Alguns de nós tentam minimizar nosso anseio natural de estarmos
emocionalmente ligados, e em vez disso, focamos em ações que dão apenas uma
expressão limitada de nossa necessidade. O mais comum: focando o sexo.
Mensagens camufladas e distorcidas impedem que demonstremos todos os
nossos anseios, mas também tornam difícil para nossos amados responderem.
OS DIÁLOGOS DO DEMÔNIO
T
motivo de estarem ali. Tudo o que sabe, ele diz, é que ele e Sarah tiveram
uma briga violenta. Ela o acusou de ignorála numa festa, e está
ameaçando pegar a filha deles e ir morar com a irmã. Ele não entende.
Eles têm um bom casamento. Sarah está sendo “muito imatura” e “quer
sempre mais”. Ela não percebe o quanto ele está pressionado no trabalho,
nem por que não consegue sempre se lembrar das “partes ditosas e sentimentais
do casamento”. Tim vira-se na cadeira e olha fixamente pela janela com uma
expressão de “o que se pode fazer com uma mulher dessas?” no rosto.
As queixas de Tim acordam Sarah de um transe angustiado. Ela anuncia, num
tom ácido, que Tim não é tão esperto quanto acha que é. Na verdade, ela fala
para ele: “é cretino quando se trata de comunicação”, e tem “zero de
habilidades”. Mas a tristeza toma conta dela, e Sarah murmura numa voz que
mal posso ouvir, que Tim é uma “pedra” que se afasta quando ela está
“morrendo”. E que nunca deveria ter se casado com ele. Ela chora.
Como eles chegaram a esse ponto? Sarah, de cabelos escuros e pequena, e
Tim, elegante e bem vestido, estão casados há três anos. Foram colegas de
trabalho de sucesso, e felizes parceiros de brincadeiras, e bem integrados em
habilidades e energia. Têm uma casa nova e uma filha de 18 meses, e para cuidar
dela Sarah tirou licença do trabalho. E agora estão brigando o tempo todo.
“Tudo que ouço é que chego em casa muito tarde, e que estou trabalhando
muito”, Tim fala com exasperação. “Mas estou trabalhando por nós, você sabe.”
Sarah resmunga que não existe nenhum “nós”. “Você fala que não me conhece
mais”, Tim continua. “Bem, é assim que o amor dos adultos é. É fazer
concessões e virar amigos.”
Sarah morde o lábio e retruca: “Você nem ao menos tirou uma licença para
ficar comigo quando sofri o aborto. Com você são sempre negócios e
compromissos...”. Ela balança a cabeça. “Eu me sinto tão sem esperança quando
não consigo te fazer entender. Nunca me senti tão solitária, nem quando morava
sozinha.”
O tom da mensagem de Sarah é de urgência, mas Tim não percebe. Ele a acha
“muito emotiva”. E aí está o problema. Quando nosso relacionamento amoroso
mais importante está ameaçado ficamos muito emotivos. Sarah precisa
desesperadamente se reconectar com Tim. Ele está desesperadamente temeroso
de ter perdido sua intimidade com Sarah — a conexão é vital para ele da mesma
forma. Mas sua necessidade de reconectar-se está mascarada pela conversa de
comprometerse e virar adulto. Ele tenta descartar as preocupações de Sarah
quanto a manter tudo “calmo e no caminho certo”. Podem eles começar a ouvir
um ao outro “emocionalmente”? Podem eles ficar sintonizados outra vez? Como
eu posso ajudálos?
O COMEÇO DA TFE
Minha percepção sobre como ajudar casais como Sarah e Tim começou
lentamente. Eu sabia que ouvir, e trabalhar com as principais emoções, era
essencial para a mudança das pessoas que vinham me procurar para
aconselhamento. Então, quando comecei a trabalhar com casais angustiados nas
tardes quentes de Vancouver, no Canadá, no início dos anos 1980, reconheci as
mesmas emoções, e como os casais pareciam criar a música para a dança entre
eles. Mas minhas sessões pareciam balançar entre o caos emocional e o silêncio.
E logo eu estava passando todas as manhãs na biblioteca da universidade
buscando um caminho, um mapa onde alocar os enredos que eram exibidos em
meu consultório. A maior parte do material que encontrei dizia que o amor ou
era irrelevante ou era impossível de ser entendido, e também que emoções fortes
eram obviamente perigosas, e melhor seria deixálas em paz. Oferecer novas
percepções aos casais, como alguns daqueles livros sugeriam, percepções sobre
como parecemos repetir com as pessoas que amamos o relacionamento que
tivemos com nossos pais, não parecia trazer muita mudança. Minhas tentativas
de fazer os casais praticarem habilidades de comunicação geraram comentários
de que esses exercícios realmente não chegavam ao cerne do problema. Eles não
atingiam o alvo.
Decidi que os casais tinham razão — e que eu, de alguma forma, também
estava errando o alvo. Mas eu estava fascinada, tão fascinada, que me sentava e
ficava horas e horas vendo os vídeos das sessões. Decidi então que ficaria vendo
até que realmente entendesse aqueles dramas de amor que deram errado. Até que
eu aprendesse o que era o amor! Finalmente o quadro começou a tomar forma.
Eu me lembrei de que nada une mais as pessoas do que um inimigo comum.
Percebi que poderia ajudar os casais a ver seus padrões negativos de interação —
seus Diálogos do Demônio — como o inimigo, e não cada um. Comecei
recapitulando as conversas dos casais em minhas sessões, ajudando os parceiros
a ver a espiral em que estavam enredados, e não apenas focar na última resposta
do outro e reagir a ela. Se compararmos com game, e não apenas do serviço ou
do voleio que jogou a bola com efeito do outro lado da rede. Os clientes
começaram a ver o diálogo inteiro, e como ele tinha vida própria e estava
machucando os dois. Mas por que esses padrões eram tão fortes? Por que eles
eram tão convincentes e tão angustiantes? Mesmo quando ambos os parceiros
reconheciam sua natureza prejudicial, esses diálogos continuavam se repetindo.
Os parceiros pareciam ser puxados de volta por suas emoções, mesmo quando
entendiam os padrões e como eles os prendiam na armadilha. Por que essas
emoções eram tão potentes?
Eu me sentava e ficava ouvindo casais como Jamie e Hugh. Quanto mais
Jamie ficava com raiva, mais ela criticava Hugh, e mais silencioso ele ficava.
Depois de dezenas de perguntas gentis, ele me disse que por baixo do seu
silêncio ele se sentia “derrotado” e “triste”. A tristeza nos faz desacelerar e
sofrer, e então Hugh começou a lamentar seu casamento. E, naturalmente,
quanto mais ele se fechava, mais Jamie exigia ser ouvida. Sua queixa raivosa era
a senha para o sentimento dele de derrota silenciosa, e seu silêncio era a senha
para mais queixa raivosa dela. Sempre e sempre. Os dois estavam empacados.
Quando desaceleramos o “rodopio” dessas danças circulares, emoções mais
brandas, como tristeza, temor, constrangimento e vergonha, sempre apareciam.
Falar dessas emoções, talvez pela primeira vez, e ver como o seu padrão os fazia
cair na armadilha, ajudou Jamie e Hugh a se sentirem mais seguros um com o
outro. Jamie não pareceu tão perigosa quando foi capaz de dizer a Hugh o
quanto ela se sentia sozinha. Nenhum dos dois tinha de ser o bandido aqui. Eles
começaram a ter novas maneiras de conversar, e sua estreita troca de repreensões
e distanciamento silencioso abrandou. Ao compartilharem emoções mais suaves,
eles começaram a ver um ao outro de forma diferente. Jamie admitiu: “Eu nunca
via o retrato inteiro. Apenas sabia que ele não estava próximo de mim. Eu o via
como indiferente. Agora vejo como ele estava se desviando de minhas balas e
tentando me acalmar. Eu atiro quando fico desesperada e não consigo reagir de
outro jeito”.
Agora eu estava chegando a algum lugar em minha prática. Os casais estavam
mais gentis uns com os outros. O enredo das emoções dolorosas não parecia
mais ser tão opressivo. Esses padrões negativos sempre começavam quando um
parceiro tentava se aproximar do outro e não conseguia fazer um contato
emocional seguro. Esse era o momento em que os Diálogos do Demônio
começavam. Uma vez que um casal entendia que os dois estavam sendo vítimas
do diálogo, e eram capazes de se revelar mais, de arriscar, compartilhar emoções
mais profundas, então os conflitos se acalmavam e eles se sentiam um pouco
mais próximos. Então tudo estava indo muito bem. Estava mesmo?
Meus casais diziam que não. Jamie me disse: “Somos mais gentis um com o
outro e brigamos menos. Mas de qualquer forma nada realmente mudou. Se
pararmos de vir aqui, tudo vai começar de novo. Sei que vai”. Outros me falaram
a mesma coisa. Qual era o problema? Ao rever as gravações, vi que emoções
mais profundas como tristeza e “terror” concreto, como um cliente destacou,
realmente ainda não tinham sido ataca-das. Meus casais ainda estavam vigiando
as suas costas.
Emoção vem da palavra latina emovere, que significa mover. Falamos de
sermos “movidos” pelas nossas emoções, e somos “movidos” quando aqueles a
quem amamos expressam seus sentimentos mais profundos em relação a nós. Se
era para os parceiros se reconectarem, eles realmente precisavam deixar suas
emoções os levarem a novas maneiras de responder. Meus clientes tinham que
aprender a tomar riscos, a mostrar os seus lados mais gentis, os lados que eles
aprenderam a esconder nos Diálogos do Demônio. Percebi que quando os
parceiros fechados eram capazes de confessar seus temores de perda e
isolamento, eles então podiam falar de seus desejos de carinho e conexão. Essa
revelação “moveu” seus pares queixosos a responderem mais afetuosamente, e a
compartilhar suas próprias necessidades e temores. Era como se as duas pessoas
de repente ficassem cara a cara, desnudadas, mas fortes, e buscassem uma à
outra.
Momentos como esses eram maravilhosos e dramáticos. Eles mudavam tudo,
e davam início a uma nova espiral de amor e conexão. Casais me disseram que
esses momentos eram absolutamente transformadores. Eles não podiam apenas
escapar dos Diálogos do Demônio, podiam mover-se para um novo tipo de amor
com receptividade, segurança e proximidade. Eles podiam então criar uma nova
narrativa, e planejar, numa atmosfera de fácil cooperação, como cuidar da sua
relação e salvaguardar sua nova aproximação. Mas eu ainda não compreendia
por que esses momentos eram tão poderosos!
Eu fiquei tão fascinada por essa série de descobertas, que persuadi meu
orientador de tese, Les Greenberg, a fazermos o primeiro estudo para testar essa
abordagem e chamála de terapia focada, ou Terapia Focada na Emoção. Nós
queríamos enfatizar como certos sinais emocionais alteravam a conexão entre
pessoas que se amam. O primeiro estudo confirmou todas as minhas expectativas
de que essa forma de trabalhar com relacionamentos não apenas ajudava as
pessoas a se afastarem de padrões negativos, mas criava um novo sentido de
conexão amorosa.
Então, nos próximos 15 anos, meus colegas e eu faríamos cada vez mais
estudos sobre a TFE, e descobriríamos que ela ajudou mais de 85% dos casais
que vieram nos procurar com o objetivo de fazer mudanças significativas em
seus relacionamentos. Essas mudanças também pareciam ser duradouras, mesmo
no caso de casais que enfrentavam fatores estressantes terríveis, como um filho
com uma doença crônica séria. Descobrimos que a TFE e para heterossexuais,
para casais de muitas e variadas culturas, para casais em que as mulheres
consideravam o marido “inexpressivo” e os homens chamavam as mulheres de
“raivosas” e “impossíveis”. Em contraste com outras abordagens de terapia de
casais, o nível de angústia que expressavam quando chegavam para a terapia não
parecia fazer muita diferença no nível de satisfação que demonstravam ao final.
Qual a razão? Eu queria descobrir, mas antes havia outros quebra-cabeças a
esclarecer.
Afinal, no que consistia esse drama emocional? Por que os Diálogos do
Demônio eram tão comuns e tão poderosos? Por que esses momentos de
conexão transformavam completamente os relacionamentos? Era como se eu
tivesse encontrado um caminho numa terra estranha, mas eu ainda não tinha um
mapa, ou entendia realmente onde estava. Eu tinha visto casais saírem de um
estado de ameaça de divórcio para se apaixonarem novamente, e até tinha
descoberto como encorajar e conduzir a mudança. Mas as respostas a essas
questões me escapavam.
Pequenos momentos são definidores em nossas vidas, tanto para casais com
relações amorosas quanto para jovens terapeutas como eu. E um dia, quando um
colega me indagou que, se “as relações amorosas não eram trocas, acordos de
perdas e ganhos, então o que eram?”, ouvime dizer, casualmente: “Oh, são laços
emocionais... Não se pode pensar o amor logicamente, nem regatear por amor. É
uma resposta emocional”. E de repente minha mente deslizou para um novo
lugar.
Voltei e revi minhas fitas, prestando particular atenção às necessidades e
temores sobre os quais as pessoas falavam. Observei aqueles momentos
dramáticos que transformaram os relacionamentos. Eu estava vendo vínculos
emocionais em ação! Então eu entendi. Eu estava vendo a receptividade
emocional que John Bowlby dizia ser a base para amar e ser amado. Como não
fui capaz de perceber? Foi porque tinham me ensinado que esse tipo de vínculo
termina na infância. Mas essa era a dança do amor adulto. Corri para casa para
escrever e levar essa percepção para meu trabalho com os casais.
A teoria do apego respondeu às três questões que tinham me atormentado.
Muito simplesmente, ela me disse que:
1. As poderosas emoções que tinham aflorado em minhas sessões com os casais eram tudo, menos
irracionais. Elas faziam completo sentido. Os parceiros agiam como se estivessem lutando por suas
vidas na terapia, porque era justamente isso o que eles estavam fazendo. O isolamento e a perda
potencial da conexão amorosa estão codificados no cérebro humano como uma resposta do pânico
primal. Essa necessidade de conexão emocional segura em relação a uns poucos amados está
codificada por milhões de anos de evolução. Parceiros angustiados podem usar palavras diferentes,
mas estão sempre fazendo a mesma pergunta básica: “Você está disponível para mim?”, “Eu sou
importante para você?”, “Você virá quando eu precisar de você, quando eu chamar?”. O amor é o
melhor mecanismo de sobrevivência que existe, e sentirse de repente afastado de um parceiro,
desconectado, é aterrorizante. Precisamos reconectar, expressar nossas necessidades de uma forma que
estimule o parceiro a responder. Esse desejo de conexão emocional com os mais próximos é nossa
prioridade emocional, eclipsando até o impulso para a alimentação ou o sexo. O drama do amor é
essencialmente essa fome de conexão emocional, um imperativo de sobrevivência que
experimentamos do berço ao túmulo. A conexão do amor é a única segurança que a natureza nos
oferece.
2. Essas emoções e necessidades de ligação eram a trama por trás das interações negativas como os
Diálogos do Demônio. Agora eu entendi por que esse tipo de padrão era tão irresistível e interminável.
Quando a conexão segura parece perdida, os parceiros vão para o modo lutar-ou-lutar.Eles culpam, e
ficam agressivos na busca de uma resposta, qualquer resposta, ou se fecham e tentam não se importar.
Os dois estão aterrorizados; mas apenas estão se comportando de maneira diferente. O problema é que
quando começam esse círculo queixa-distanciamento,ele confirma todos os seus temores e se soma à
sua sensação de isolamento. Leis emocionais tão velhas quanto o tempo determinam essa dança;
habilidades racionais não a alteram. A maior parte das queixas nesses diálogos é um grito desesperado
por apego, um protesto contra a desconexão. E que só pode ser acalmado pela pessoa amada movendo-
se emocionalmente para abraçar e reafirmar apoio. Nada mais servirá. Se essa reconexão não ocorrer, a
briga continua. Um parceiro tentará freneticamente obter uma resposta emocional do outro. O outro,
ouvindo que ele ou ela fracassou no amor, vai estacar. A imobilidade em face do perigo é uma maneira
codificada de lidar com a sensação de desamparo.
3. Os momentoschave da TFE foram os momentos de vínculos com segurança. Nesses momentos de
afinação e conexão, ambos os parceiros podem ouvir o grito do outro por apego, e responder com
carinho, forjando um vínculo que pode resistir às diferenças, feridas, e ao teste do tempo. Esses
momentos formatam a conexão segura, e isso muda tudo. Eles fornecem uma resposta tranquilizadora
para a pergunta “Você está disponível para mim?”. Uma vez que os pares saibam como expressar suas
necessidades, e trazer o outro para perto, toda provação que passem juntos simplesmente fará seu amor
ficar mais forte. Não é estranho que esses momentos criem uma nova dança de conexão de segurança
para os casais submetidos à TFE. Nem tampouco que possam se fortalecer como indivíduos. Se você
sabe que a pessoa amada está disponível e atenderá quando chamar, você estará mais seguro de sua
importância, de seu valor. E o mundo é menos amedrontador quando se tem outro com quem contar e
sabemos que não estamos sozinhos.
A.R.E.
A base da TFE são sete conversas que têm por objetivo encorajar um tipo
especial de receptividade emocional, que é a chave para um amor duradouro
entre casais. Essa receptividade emocional tem três componentes principais:
• Acessibilidade: Posso aproximar-me de você?
Isto significa permanecer aberto para o seu par, mesmo quando você tem
dúvidas e se sente inseguro. Muitas vezes sig-nifica estar desejoso de falar
racionalmente de suas emoções, de modo que elas não sejam tão opressivas.
Então você pode evitar a desconexão e colocarse em sintonia com os sinais de
afeto da pessoa amada.
• Receptividade: Posso contar com você para me apoiar emocionalmente?
Isto significa entrar em sintonia com seu parceiro e mostrar que as emoções
dele, ou dela, especialmente as necessidades de apego e os temores da separação,
têm impacto sobre você. Signi-fica aceitar e dar prioridade aos sinais emocionais
que o seu parceiro expressa, e mandar sinais claros de conforto e afeto quando
seu parceiro precisar deles. A capacidade de reação afetiva sempre nos toca
emocionalmente e nos acalma no nível físico.
• Engajamento: Eu sei que você vai me valorizar e continuar disponível?
JOGUE E PRATIQUE
O questionário e os exercícios mostrados abaixo vão ajudar você a ver seu
relacionamento através das lentes do apego.
O QUESTIONÁRIO A.R.E.
Talvez você se sinta mais confortável refletindo sobre pontos gerais do que
usando o questionário. Você pode simplesmente refletir sobre as questões
listadas abaixo, ou querer anotálas num diário e então aprofundar sua reflexão
sobre elas. Você também talvez queira compartilhar e discutir suas respostas com
seu par em algum momento.
• A história de Tim e Sarah faz sentido para você? Ela parece familiar? Qual parte realmente pareceu
importante para você, e como chegou a isso?
• Quais mensagens sobre amor/casamento você recebeu de seus pais? Da sua comunidade? Fazer
contato com os outros, ou confiar, era visto como uma força e um amparo?
• Antes do seu atual relacionamento você experimentou uma relação segura e amorosa com alguém em
quem confiava, sentia-se próximo/próxima, ou podia apoiar-se se necessário? Você tem na mente uma
imagem do que isso representa, um modelo que pode ajudar enquanto você desenvolve sua atual
relação? Pense num momento alegre ou típico que retrate essa relação e o partilhe com seu par.
• Seu relacionamento anterior lhe ensinou que as pessoas amadas não eram confiáveis e que você tinha
que ser vigilante e lutar para se fazer notar e obter receptividade? Ou você aprendeu que depender dos
outros é perigoso, e que é melhor se distanciar, para não necessitar dos outros e evitar proximida-de?
Essas estratégias básicas, muitas vezes, afloram quando sentimos que a pessoa amada está distante ou
desconectada. Que estratégia você usou em relacionamentos passados, digamos com seus pais, quando
as coisas começaram a dar errado?
• Você pode se lembrar de um momento em que realmente precisava saber se a pessoa amada estava do
seu lado? Se ele ou ela não estava, como lidou com a situação e o que aprendeu com isso? Como você
superou a situação? Isso causa impacto nos seus relacionamentos agora?
• Se para você é difícil procurar e confiar nos outros, deixálos se aproximar quando realmente precisa
deles, o que você faz quando a vida fica muito complicada ou quando se sente sozi-nho/ sozinha?
• Nomeie duas coisas concretas e específicas que uma pessoa amada que fosse segura, acessível,
receptiva e engajada numa relação com você faria num dia típico, e como essas coisas fariam você
sentirse naquele momento.
• Na sua atual relação você pode pedir ao seu par, deixar que ele ou ela perceba que você precisa de
intimidade ou conforto? Isso é fácil ou difícil para você? Talvez imagine que isso é um sinal de
fraqueza, ou talvez pareça muito arriscado para você? Avalie sua dificuldade de fazer isso numa escala
de 1 a 10. Uma avaliação mais alta significa que é muito difícil para você. Par-tilhe isso com seu par.
• Quando se sente desconectado ou sozinho na sua atual relação, você possivelmente vai ficar muito
sensível ou mais ansioso e forçar seu parceiro a responder? Ou é mais provável que você vá se fechar e
tentar não sentir sua necessidade de conectar-se? Você pode se lembrar de um momento em que isso
aconteceu?
• Pense numa época em seu relacionamento quando perguntas como “Você está disponível para mim?”
estavam pairando no ar e você acabou se enredando numa briga por um problema corriqueiro. Partilhe
isso com seu par.
• Você pode pensar em momentos de seu relacionamento em que um dos dois procura e o outro
responde de uma maneira que faz com que os dois se sintam emocionalmente conecta-dos, e seguros,
um com o outro? Partilhe isso com seu par.
Agora que você tem uma visão do que o amor e a criação de uma dependência
positiva realmente são, as conversas transformadoras dos capítulos seguintes vão
lhe mostrar como criar esse tipo de vínculo com a pessoa amada. As quatro
primeiras conversas lhe ensinam como limitar as espirais negativas que deixam
vocês dois desconectados, e como sintonizar um com o outro de uma maneira
que gera receptividade emocional dura-doura. As duas conversas seguintes
demonstram como você pode forjar vínculos emocionais por meio do perdão a
ofensas e da intimidade sexual. A conversa final lhe mostra como cuidar
diariamente do seu relacionamento.
PARTE DOIS
Sete conversas transformadoras
Conversa 1: Reconhecendo os diálogos
do demônio
“A rixa é melhor do que a solidão.”
PROVÉRBIO IRLANDÊS
ara todos nós, a pessoa que mais amamos no mundo, aquela que pode nos
P
mandar alegremente para os céus, é também a que pode nos devolver
esborrachando de encontro à terra. Tudo que é preciso é virar o rosto para
o outro lado, ou fazer uma descuidada observação. E não existe
proximidade sem esse tipo de reação. Se nossa conexão com o cônju-ge é
segura e forte, podemos lidar com esses momentos de sensibilidade. Na
verdade, podemos usálos para trazer nosso par ainda para mais perto. Mas
quando não nos sentimos seguros e conectados, esses momentos são como uma
fagulha numa floresta ressecada. Eles incendeiam a relação inteira.
Isso foi o que aconteceu nos primeiros três minutos de uma explosiva sessão
com Jim e Pam, casados havia muito tempo, e que estavam experimentando um
sério declínio na relação, embora ainda percebessem as qualidades atrativas de
um e do outro. Jim tinha me dito várias vezes em sessões anteriores que o cabelo
louro e os olhos azuis de Pam o “enfeitiçavam”, e Pam muitas vezes observou
que ele era um bom marido e bom pai, e até um “pouquinho” atraente.
A sessão começa de forma bastante inocente, com Pam dizendo que ela e Jim
passaram um agradável final de semana juntos, e que tinha decidido tentar
apoiálo mais toda vez que percebesse que ele estava se sentindo estressado por
causa do trabalho. Ela também diz que gostaria que ele fosse capaz de falar toda
vez que precisasse de apoio emocional. Jim ri com desdém, move os olhos, e
gira a cadeira para longe da mulher. Naquele momento juro que podia sentir uma
lufada de vento quente passando pelo consultório.
Pam explode: “Que diabos você quer dizer com essa ridícula expressão? Fiz
muito mais esforço para dar apoio nessa relação do que você, seu presunçoso
filho da puta. Aqui estou eu te oferecendo apoio, mas você prefere ficar com
esse ar superior, como sempre”. “Lá vem você esbravejando”, Jim retruca. “Eu
nunca vou te pedir apoio. E a razão está aí. Você iria simplesmente me censurar.
Você vem fazendo isso há anos. É essa a razão para estarmos nessa confusão,
para início de conversa.”
Eu tento acalmálos,mas estão gritando tão alto, que não me ouvem. Eles
finalmente param quando digo que é triste que tudo tenha começado com Pam
sendo positiva e oferecendo uma imagem amorosa. Pam então irrompe em
lágrimas e Jim fecha os olhos e suspira. “Isso é o que sempre acontece conos-
co”, Jim fala, e ele está certo. E é aí que podem começar a modificar o que
sempre acontece. A mudança começa quando se vê o padrão, e se foca no jogo, e
não só na bola.
Nós ficamos enredados em três padrões básicos — eu os chamo de Diálogos
do Demônio — quando não conseguimos nos conectar em segurança com nosso
par. De quem é a Culpa é o beco sem saída de acusações mútuas que
efetivamente mantém um casal completamente distanciado, bloqueando o
reencontro e a criação de refúgio seguro. Os casais dançam a um metro de
distância. É o que Jim e Pam estão fazendo quando passam a culpar um ao outro
pela relação aflitiva. Alguns casais caem nesse padrão por períodos curtos, mas é
difícil mantêlo por anos a fio. Para a maioria, De quem é a Culpa é o breve
prelúdio para a dança mais comum e traiçoeira da afli-ção. Muitos pesquisadores
chamaram a esta próxima dança de Ataque-Fuga ou CriticarDefender.Eu a
chamo de Polca do Protesto, porque a vejo como uma reação, ou mais
exatamente, um protesto contra a perda do sentimento de ligação segura que
todos necessitamos num relacionamento. A terceira dança é estacar e Fugir, ou
como muitas vezes a chamamos na TFE, Fugir-Fugir.Isso geralmente acontece
quando a Polca do Protesto está sendo dançada há algum tempo, quando os
dançarinos se sentem tão desesperançados, que começam a desistir e colocam
suas emoções e necessidades no congelador, deixando de fora apenas
entorpecimento e distanciamento. Ambos os parceiros recuam, para escapar do
sofrimento e do desespero. Em termos de dança, de repente nenhum dos
parceiros está no salão; ambos estão sentados. Essa é a dança mais perigosa de
todas.
Em algum momento de nossas relações amorosas todos nós somos apanhados
por uma ou todas essas interações negativas. Para alguns são danças breves,
porém arriscadas, em conexões de outra forma seguras. Para outros, com
conexões menos seguras, elas se tornam respostas habituais. Depois de algum
tempo, tudo o que é preciso é um toque de negativismo de um dos parceiros para
desencadear um Diá-logo do Demônio. Eventualmente os padrões prejudiciais
podem se tornar tão arraigados e permanentes, que minam o relacionamento,
bloqueando todas as tentativas de entendimento e reconexão.
Nós temos só duas maneiras de nos proteger e preservar as conexões com os
pares quando não nos sentimos seguros e receptivos. Um caminho é evitar o
engajamento, ou seja, tentar amortecer nossas emoções, fecharnos e negar nossas
necessidades de afeto. O outro é ouvir a nossa ansiedade e lutar pelo seu
reconhecimento e pela resposta.
Qual estratégia nós adotamos quando nos sentimos desconectados —
tornandonos exigentes e críticos ou recuando e nos fechando — reflete
parcialmente nosso temperamento, mas na maioria das vezes ela é ditada pelas
lições que aprendemos nos relacionamentos básicos de nosso passado e presente.
Além do mais, porque aprendemos com toda nova relação, nossa estratégia não é
fixa. Podemos ser críticos numa relação e indiferentes numa outra.
Se eu não tivesse intervindo no caso de Jim e Pam durante a sessão, eles
provavelmente teriam passado por todos os três Diálogos do Demônio,
impotentes, exauridos, alienados, e sem esperança; e depois teriam voltado para
o Diálogo que eles conheciam melhor. Inevitavelmente, eles fariam julgamentos
condenatórios de sua relação, os quais iriam turvar as intera-ções futuras e
destruir pouco a pouco a confiança mútua. Cada vez que fazem isso e não
conseguem encontrar um caminho para conexões seguras, a relação se torna cada
vez mais tênue. Nas circunstâncias, tudo o que fizemos na sessão foi acalmar as
coisas um pouco. Jim e Pam sugerem que eu dê jeito no problema. Claro que,
para cada um deles, isso significa dar um jeito no outro parceiro. A trégua dura
apenas 30 segundos antes que se lancem novamente na busca de De quem é a
Culpa.
JOGUE E PRATIQUE
JOGUE E PRATIQUE
A história de Ken e Mia lhe parece familiar? Você reconhece partes dessa dança
no seu relacionamento? Você é capaz de lembrar qual foi a última vez que essa
polca assumiu o controle do seu relacionamento? Você pode colocar seus óculos
de apego e ver além das discussões sobre fatos ou problemas, e perceber a luta
pela conexão entre vocês dois? Por exemplo, a discussão era realmente sobre
reconstruir o chalé, aonde um dos parceiros gosta de ir para pintar, ou era sobre
segurança na ligação? Talvez o parceiro que é deixado para trás seja exata-mente
isso — deixado para trás. Talvez um de vocês estivesse realmente falando sobre
a falta de uma ligação segura e intimi-dade entre os dois, ou tentando que o outro
reafirmasse a liga-ção, mas a conversa ficou focada em temas pragmáticos.
No seu atual relacionamento, o que você tende a fazer quando se sente
desconectado ou inseguro? Tente pensar com qual pessoa você se identifica nas
histórias dos casais mostradas neste capítulo. Você também pode se lembrar da
última discussão, ou episódio doloroso, em seu relacionamento. Se você
fingirFly Gazette,2 o que lhe parece a dança e quais seriam seus principais
movimentos nela? Você se queixa ou se retira? Você acha que está ficando
crítico e tentando mudar a pessoa amada? Ou talvez você se feche, e diga a si
mesmo que qualquer anseio de reafirmação é coisa arriscada e não deveria ser
atendido? Todos nós fazemos todas essas coisas de vez em quando.
A flexibilidade e a capacidade de ver seus próprios movimentos e seu impacto
nos outros é a chave nessa hora. Estou encorajando você a ser corajoso ou
corajosa, a olhar com atenção, e identificar a sua resposta habitual. É aquela que
irrompe depois que você dá uma respirada. Essa é a resposta que pode enredar
você num círculo vicioso de desconexão com a pessoa que você mais ama. Essas
respostas podem também ser diferentes em diferentes relacionamentos. Mas por
ora, pense apenas na sua conexão mais significativa, e em como você responde a
essa pessoa nos momentos em que surgem incertezas e problemas no
relacionamento.
A atitude de distanciamento é, algumas vezes, aquela que é mais difícil de
percebermos, se somos a pessoa que se distancia. Talvez o seu estilo seja recuar
para dentro de si mesmo e tentar se acalmar deixando o mundo do lado de fora?
Isso pode ser muito útil. A menos que comece a fazer isso automaticamente, e
ache cada vez mais difícil manter-se aberto e receptivo. Então esse
distanciamento predispõe você a dançar a Polca do Protesto. Não demora, e seu
parceiro vai precisar de você e se sentir ignorado, abandonado e excluído.
Você é capaz de lembrar um incidente específico em que o distanciamento e a
ausência de resposta funcionaram para você num relacionamento? O que
aconteceu depois de seu distanciamento? Na maioria das vezes pensamos nessa
estratégia como sendo capaz de prevenir uma briga que vai se intensificar e
ameaçar o relacionamento. Agora, você pode lembrar momentos em que se
afastar e se fechar parece não funcionar? O que acontece depois desse
distanciamento, para você e na sua dança com o seu par?
Se você se sente confortável, veja se pode partilhar suas respostas a algumas
destas questões com o seu par. Há momentos em que vocês dois ficam enredados
na polca? Veja se consegue determinar os movimentos de cada pessoa. Você
consegue ver toda a espiral de realimentação? Descreva-a com bastante
simplicidade preenchendo o espaço, com uma palavra, na sentença seguinte.
Quanto mais eu ........., tanto mais você ........., e depois mais e assim continuamos girando.
Use o seu próprio nome para essa dança e veja se cada um pode compartilhar
o quanto isso corrói a sensação de conexão segura no seu relacionamento. Como
isso muda a música emocional entre vocês?
Por exemplo, Todd conta que seu modo principal de conectar-se é por meio do
sexo. Ele fica muito mais seguro de si na cama quando está discutindo
sentimentos com a mulher. E identifica seu principal movimento na polca: “Eu te
procuro pelo sexo. Mas não é só pelo orgasmo. É a maneira que eu sei de ser
íntimo. Quando você me rejeita, te procuro mais e te ‘atormento’ por
explicações. E quanto mais faço isso, mais você se afasta e defende o seu
espaço”.
A mulher dele, Bella, retruca: “Sim, e quanto mais criticada e interpelada me
sinto, mais sufocada eu fico. Então eu me afasto de você cada vez mais. E você
fica mais agressivo e desesperado, e a coisa só continua. É isso?”. Todd
concorda que isso é o esboço da polca para eles. Eles decidem chamála de
Vórtex. Para eles, o nome expressa o quão obcecado Todd fica com a
disponibilidade sexual da mulher, e o quão obcecada ela fica com a defesa de seu
espaço. Todd então é capaz de revelar que se sente cada vez mais rejeitado e
nervoso, e Bella declara que se sente “paralisada” e sozinha no casamento. E
como é para você e a pessoa amada falarem sobre seus movimentos na sua Polca
do Protesto?
Mesmo que você fique atolado na Polca do Protesto, há momentos em que
pode abandonála, desligála,e ir para outra maneira de interação? Há momentos
em que você pode arriscar pedir intimidade e consolo abertamente, ou revelar
seus sentimentos e necessidades para seu cônjuge, e não se afastar? O que é que
torna possível estes momentos? O que você faz para manter a polca sob
controle? Veja se vocês podem encontrar uma expli-cação juntos. Há uma
maneira de fazer cada um se sentir seguro de modo que um sentimento de
desconexão não passe imediatamente a conduzir essa dança? Muitas vezes isso
aparece no reconhecimento de sinais de apego escondidos na polca. Por
exemplo, Juan descobriu que apenas falar à sua esposa, Ana, “Vejo que você está
realmente angustiada e precisa de alguma coisa de mim, mas não sei o que
fazer”, foi o suficiente.
JOGUE E PRATIQUE
O padrão Estacar e Fugir lhe parece familiar? Se parece, onde você aprendeu a
ignorar e reduzir suas necessidades de conexão emocional? Quem lhe ensinou a
fazer isso? Quando você se sente mais sozinho ou sozinha? Você ousa partilhar
as respostas a essas perguntas com seu par? Saber como correr riscos e iniciar
esse tipo de compartilhamento é como tomar um antídoto contra o
amortecimento ou a fuga de suas necessidades de apego. Existe alguma maneira
de seu par ajudálo a fazer isso?
Você pode partilhar com ele ou ela uma deixa que ative a dança do
distanciamento? Ela pode ser tão simples quanto um virar de cabeça num dado
momento. Você pode identificar com exatidão quando afasta seu parceiro ou
torna perigoso para ele ou ela chegar mais perto?
O que você diz quando se afastou emocionalmente para justificar a separação,
e para desencorajar uma reaproximação com o par? Algumas vezes são
declarações sobre o que é o amor, e como deveríamos agir nas relações
amorosas, segundo fomos ensinados por nossos pais e até mesmo pela nossa
cultura. Você pode partilhar essas coisas com seu par?
Você pode fazer uma lista de tudo o que essa dança retirou de você?
Normalmente temos vislumbres de proximidade emocional quando nos
apaixonamos pela primeira vez e queremos correr todos os riscos para estar perto
dele ou dela. Vamos nos lembrar desses momentos da mesma forma que nos
lembramos de nossas esperanças e anseios. E até que ponto essa dança negativa
as deteriorou?
Como um exercício final para este capítulo, você pode identificar quais desses
três padrões — De quem é a Culpa, Polca do Protesto, e Estacar e Fugir —
ameaça mais seu atual relacionamento amoroso? Lembrese de que os fatos de
uma briga (quer seja uma briga referente aos horários dos filhos, sua vida sexual,
suas carreiras) não são o problema principal. A preocupação verdadeira sempre é
a força e a segurança do vínculo emocional que você tem com o par. É sobre a
acessibilidade, a receptividade e o engajamento emocional. Veja se pode resumir
o padrão que assume o controle do seu relacionamento, preenchendo os espaços
das afirmações seguintes. Depois, escreva-os num parágrafo que melhor se
encaixe em você e no seu relacionamento. Em seguida, partilhe com o par.
Quando ............, não me sinto conectado seguramente com você. Preencha com a situação que
inicia a música da desconexão, quando você diz que está muito cansado para fazer sexo, e não o
fazemos há semanas, quando brigamos a respeito da minha maneira de lidar com as crianças, quando
Nenhuma declaração grandio-sa, ou abstrata, ou reclamação disfarçada é permitida aqui; então você
não pode dizer coisas como “quando você está simplesmente sendo difícil, como sempre”. Isso é
trapacear. Seja concreto e específico.
Eu tendo a ............... Eu me movimento assim em nossa dança tentando superar os sentimentos
difíceis e encontrar uma maneira de me conectar com você. Escolha uma palavra que queixar,
criticar, marcar território, ignorar, correr, afastar-se.
Faço isso na esperança de ................ Declare a esperança que o impulsiona para a danãa, por
exemplo: nós vamos evitar mais conflitos ou eu vou persuadir você a me responder mais.
À medida que esse padrão continua, eu sinto .............. Identifique um sentimento. Os mais comuns
que as pessoas podem identificar nessa altura sçofrustração, raiva, entorpecimento, sensação de vazio,
ou confusão.
O que então digo a mim sobre a nossa relação é .................. Resuma a conclusão mais catastrófica
que você possa imaginar, por exemplo: “Você não liga para “Não sou importante “Nunca consigo
agradála”.
Meu entendimento da dança circular que torna mais difícil para nós nos conectarmos com
segurança é que, quando me movimento da maneira descrita acima, você parece então .................
Escolha uma palavra de ação, um verbo, por exemplo: fechar-se, pressionar-me a responder.
Quanto mais eu ..............., mais você ................... Somos então apanhados em dor e isolamento.
Insira verbos que descrevam os seus movimentos e os de seu par na dança.
Talvez possamos nos alertar quando essa dança começar. Nós podemos chamála de ..................
Ver a dança é nosso primeiro passo para sair do círculo de desconexão.
* * *
Uma vez que você possa identificar esses ciclos negativos e reconhecer que eles
enredam os dois, você está pronto para aprender como sair deles. A conversa
seguinte explora mais profundamente as emoções fortes, principalmente a
ansiedade da separação, as quais mantêm essa dança negativa em ação.
Conversa 2:
Localizando os pontos frágeis
“Interrupções no apego são perigosas... como uma
córnea descolada, rupturas no relacionamento produzem
sofrimento.”
THOMAS LEWIS, FARI AMINI E RICHARD LANNON,
A GENERAL THEORY OF LOVE
odos nós somos vulneráveis no amor; uma coisa anda junto da outra.
T
Somos emocionalmente mais desarmados com aqueles a quem amamos e
então, inevitavelmente, às vezes ferimos um ao outro com palavras ou
ações descuidadas. Embora essas ocasiões firam, a dor, muitas vezes, é
superficial e passageira. Mas quase todos nós temos uma sensibilidade
delicada — um ponto frágil em nossa pele emocional — que é delicada
ao toque, facilmente arranhada e muito dolorida. Quando esses pontos frágeis
sofrem atrito, podem sangrar por sobre todo o nosso relacionamento, fazendonos
perder o equilíbrio emocional, e lançandonos nos Diálogos do Demônio.
O que exatamente é um ponto frágil? Eu o defino como uma
hipersensibilidade formada por momentos do passado, ou no relacionamento
atual de uma pessoa, quando uma necessidade de apego foi repetidamente
negligenciada, ignorada, ou rejeitada, resultando para a pessoa num sentimento
que eu chamo de “os 2 Ds” — destituído e desamparado no plano emocional. Os
2 Ds são pontos frágeis universalmente potenciais para os apaixonados.
Essas sensibilidades surgem frequentemente de relacionamentos machucados
com pessoas importantes de nosso passado, principalmente os pais, que nos dão
o modelo básico para as relações amorosas; irmãos e irmãs e outros membros de
nossa família; e, naturalmente, pessoas a quem amamos no passado ou no
presente. Por exemplo, recentemente quando as pálpebras dos olhos de meu
marido, John, começaram a cerrar enquanto eu falava com ele, subi às paredes,
furiosa. Ele estava cansado e sonolento, mas aquilo me levou de volta aos dias
quando um exparceiro caía imediatamente no sono toda vez que eu tentava
começar uma conversa séria. Cochilar não era uma maneira sutil de afastar-se,
desconectando-se de um relacionamento. Essa experiência me fez ficar
supercautelosa — um sono inoportuno para mim sinaliza desamparo emocional.
François, um dos meus clientes, é altamente sensível a qualquer insinuação de
que sua mulher, Nicole, talvez não o deseje, ou esteja desenvolvendo interesse
por outro homem. Em seu primeiro e doloroso casamento sua mulher foi
abertamente infiel várias vezes. Agora, ele entra num pânico completamente
cego quando Nicole sorri para um amigo seu numa festa, ou quando ela não está
em casa quando ele espera que ela esteja.
Linda se queixa que fica realmente magoada quando seu marido, Jonathan,
“evita me dizer o quanto eu pareço bonita ou que fiz um bom trabalho. É como
ser instantaneamente inundada de sofrimento, e então eu fico ressentida e crítica
em relação a você”, ela lhe diz. Linda recua sua sensibilidade até a mãe. “Ela se
recusava a me cumprimentar ou elogiar por alguma coisa, e sempre dizia que eu
não tinha atrativos. Uma vez ela me disse que pensava que se você elogiasse as
pessoas, elas deixariam de se esforçar. Eu queria ardentemente o seu
reconhecimento, e me magoava o fato de ela o negar. E hoje, imagino, desejo o
mesmo de você. E então, quando me apronto e pergunto como estou, e você me
ignora, sofro. Você sabe que necessito do seu elogio, mas você o nega. Pelo
menos é assim que sinto. Simplesmente não consigo ver com clareza, me dói
muito.”
As pessoas podem ter diversos pontos frágeis, embora normalmente um seja o
predominante em termos de desencadear num casal o impulso de ciclos
negativos. Steve se sente como um fracassado em dose dupla quando sua mulher,
Mary, diz que gostaria de fazer sexo mais vezes. Um pedido desses poderia ser
interpretado de maneira muito positiva. Mas para Steve, a declaração é como um
míssil teleguiado que destrói sua confiança sexual; sua amígdala grita
“invadindo” e ele mergulha no chão. Steve reage a Mary, fechando-se em copas
e a excluindo. “É como se de repente tivesse voltado ao meu primeiro
casamento, ouvindo que eu era uma completa decepção e ficando ansioso a
respeito de minha performance geral, mas principalmente na cama.” Uma
lembrança de sua infância realça ainda mais seu ponto frágil. Steve era a criança
mais franzina da classe, e seu pai constantemente perguntava a ele, diante dos
colegas: “Estou falando com Steve ou com Stephanie?”. Aquela experiência o
deixou com a sensação de que não era suficientemente macho para nenhuma
mulher.
Mas os pontos frágeis nem sempre são uma lembrança de feridas do passado;
podem surgir numa relação atual, mesmo numa normalmente feliz, se nos
sentimos emocionalmente destituídos e desamparados. Pontos frágeis podem
ocorrer durante grandes transições ou crises — nascimento de um filho, uma
doença ou a perda do emprego — quando a necessidade de apoio do par é
intensa, e ele não acontece. Podem também se desenvolver quando um dos
parceiros é cronicamente indiferente, o que produz um sofrimento opressivo que
depois passa até para aspectos menos importantes. A incapacidade de nosso
amado em responder arranha a nossa pele viva emocional.
Jeff e Milly tinham uma excelente relação até que o melhor amigo de Jeff foi
promovido para o lugar que Jeff tinha trabalhado tanto para conseguir, e isso o
deixou numa depressão profunda. Em vez de oferecer conforto e tranquilizálo,
uma Milly ansiosa o pressionou a “esquecer o assunto”.
Eles conseguiram superar a crise e restabeleceram o relacionamento, mas a
experiência deixou Jeff hipersensível à reação de sua mulher a qualquer
manifestação de angústia da sua parte. Seus ímpetos de raiva repentinos e
aparentemente irracionais, quando sente que Milly não o está apoiando, fazem
com que ela se coloque na defensiva e se sinta fracassada como esposa. Podese
prever o que acontece depois. Eles se enredam nos seus Diálogos do Demônio.
Helen ficou devastada quando foi acusada por um terapeuta de ser a
responsável pelo problema de bebida do filho adolescente. Durante uma sessão
de avaliação, Sam, o marido de Helen, normalmente afetuoso, repetiu o ponto de
vista do terapeuta.
Mais tarde, quando Helen expressou sua mágoa, Sam enredou-se na tentativa
de justificar sua opinião, e seguiu-se uma série de doloridas discussões. Helen
então decidiu colocar de lado aquele sofrimento “insensato” e concentrar-se nas
coisas boas de seu casamento, e acredita que tenha conseguido.
Mas suprimir emoções importantes é difícil fazer, e muitas vezes acaba
envenenando as relações. A mágoa de Helen começa a vazar. Ela azucrina Sam
por suas opiniões a respeito de tudo o que ela faz, e Sam, inseguro sobre o que
dizer, fala cada vez menos. De repente eles estão brigando por qualquer coisa.
Sam acusa Helen de estar ficando cada vez mais parecida com a sua mãe
“paranoica”. Helen se sente cada vez mais perdida e sozinha.
Os pontos frágeis de Jeff e Helen estão sendo arranhados, mas eles não
percebem. Surpreendentemente, muitos de nós também não percebemos. Na
verdade, nem sequer admitimos que tenhamos pontos frágeis. Somos apenas
conscientes de nossa reação secundária à irritação — entorpecimento defensivo e
isolamento, ou reação irada. O distanciamento e a raiva são as marcas dos
Diálogos do Demônio, e mascaram as emoções que são básicas na
vulnerabilidade: tristeza, vergonha, e principalmente, medo.
Se acontece de você ficar continuamente aferrado aos Diálogos do Demônio
com a pessoa amada, pode apostar que isso está sendo ativado por tentativas de
lidar com uma ferida, ou mais provavelmente, feridas nos dois. E, infelizmente,
seus pontos frágeis quase inevitavelmente arranham um ao outro. Arranhe um
ponto frágil na pessoa amada, e a reação dele ou dela, muitas vezes, vai irritar
um ponto frágil seu.
Observemos Jessie e Mike, que não têm feito nada a não ser brigar desde que
a filha de 12 anos de Jessie veio morar com eles. Jessie diz: “De repente, da
noite para o dia, Mike transformou-se de um homem terno e carinhoso neste
tirano. Ele dá ordens, estabelece regras para minha filha. Na maior parte do
tempo que fica em casa ele está gritando. Ele se parece com todos os homens
agressivos da minha família. Simplesmente não posso suportar alguém gritando
e dando ordens. Ninguém me protegeu, mas posso proteger minha filha”.
Mike oscila entre protestos tristes sobre o quanto ama a mulher, mesmo que
ela se recuse a falar com ele por dias a fio, e altos discursos indignados sobre
como nunca quis ser pai da filha dela, impossível e maleducada. Ele fica
transtornado quando fala de quanto mimou Jessie durante anos, e agora
descobriu que “não existe mais quando a filha está por perto”. Mike lembra de
quando contraiu herpes, mas Jessie, ele diz, estava muito preocupada com a filha
para “confortálo”.Arranhar os pontos frágeis de cada um acabou por enredálos
na Polca do Protesto.
Os pontos frágeis de Tom e Brenda os mandaram para um Diálogo do
Demônio diferente, o Estacar e Fugir. Brenda está obcecada com o bebê recém-
nascido. As tentativas de Tom de conseguir alguma atenção para ele irritam
Brenda, e uma noite ela explode. Ela está cansada de suas reclamações, ela diz, e
o chama de “obsessivo sexual” e de “patético”. Tom fica arrasado. Embora seja
um homem muito atraente, ele é bastante tímido e inseguro com as mulheres.
Sempre precisou sentirse desejado por Brenda.
Ele revida: “Tudo bem. Obviamente você não gosta mais de mim, e tudo o que
passamos juntos esses anos foi uma simulação. Não preciso dos seus abraços.
Não preciso estar ao seu lado. Vou sair para dançar, e você pode ficar cuidando
do bebê”. Ele deixa sinais pela casa indicando que está flertando com uma
mulher de seu grupo de dança. Brenda cresceu se sentindo uma garota simples, e
sempre se indagou por que Tom, sendo atraente e bem-sucedido, tinha escolhido
a ela. Aterrorizada, ela se volta mais para o bebê. Tom e Brenda mal se falam.
Ao protegerem constantemente seus pontos frágeis, eles destroem a
receptividade amorosa que os dois tanto desejam.
Interromper estas situações destrutivas depende não apenas de identificar e
refrear os Diálogos do Demônio (Conversa 1), mas também descobrir e acalmar
nossos pontos frágeis, e ajudar a pessoa amada a fazer o mesmo. Aqueles que
cresceram no refúgio de uma relação amorosa segura terão mais facilidade para
curar esses arranhões. Seus pontos frágeis são poucos, e não muito profundos. E
uma vez que compreendam o que está subjacente às suas interações negativas
com a pessoa amada, são mais capazes de livrar-se delas rapidamente e acalmar
as feridas.
Para outros, contudo, que ficaram traumatizados ou foram abandonados por
quem tinham amado ou de quem dependiam, o processo é mais longo e mais
árduo. Seus pontos frágeis são tão grandes e tão doloridos, que avaliar seus
medos e confiar no apoio da pessoa amada é um desafio enorme. Kal, um
sobrevivente de vários insultos e veterano do exército, diz: “Eu sou apenas um
grande ponto frágil. Eu clamo por carícias, mas muitas vezes quando minha
dama me toca não sei dizer se é uma carícia ou outro corte”.
Contudo, não somos prisioneiros do passado. Podemos mudar para melhor.
Recente pesquisa feita pela psicóloga Joanne Davila, da State University of New
York, em Stony Brook, bem como outras, confirmam o que eu vejo em minhas
sessões: que podemos curar até vulnerabilidades profundas com a ajuda de um
cônjuge amoroso. Podemos “ganhar” uma sensação básica de conexão segura
com a ajuda de um parceiro receptivo, que nos ajuda a lidar com sentimentos
dolorosos. O amor realmente nos transforma.
Há dois sinais que indicam quando um ponto frágil seu ou da pessoa amada foi
tocado. Primeiro, há uma mudança radical repentina no tom emocional da
conversa. Há poucos momentos você e a pessoa amada estavam gracejando, mas
agora você está contrariado ou irritado, ou, de modo oposto, indiferente ou
reservado. Você foi tirado do seu equilíbrio. É como se as regras do jogo
tivessem mudado, e ninguém tivesse comunicado a você. O parceiro ferido está
enviando novos sinais, e o outro tenta entender a mudança. Como Ted me diz:
“Estamos num carro conversando calmamente e de repente o gelo invade o
interior do carro. Ela está olhando para fora do carro, com os lábios apertados,
carrancuda, como se desejasse que eu não existisse. E de onde surgiu isso?”.
Em segundo lugar, a reação a uma suposta ofensa muitas vezes parece
desproporcional. Marla diz: “Normalmente fazemos amor nas noites de sexta-
feira. Então eu estava aguardando Pierre, mas fui apanhada num telefonema de
minha irmã, que estava angustiada. A ligação durou uns 15 minutos, acho. Pierre
desceu a escada e ficou furioso. E entramos na briga usual. Ele está
simplesmente não sendo razoável, quando faz isso”. Não, é que Marla ainda não
entende a lógica do amor, e Pierre não consegue explicar sua irritação nem a ele
nem à mulher. Ele fala a ela: “Minha mente diz ‘Por que você está tão chateada?
Relaxe’. Mas já estou subindo pelas paredes”.
Esses sinais mostram as necessidades fundamentais de apego e os medos que
de repente atravessam a linha. São as nossas mais profundas e mais poderosas
emoções repentinamente assumindo o controle. Para realmente entender nossos
pontos frágeis, precisamos olhar mais atentamente as emoções mais profundas e
que são básicas para essa sensibilidade, e desvendálas de uma forma que nos
ajude a lidar com elas. Se não fizermos assim, precipitaremos nossa reação
defensiva, usualmente raiva ou indiferença, o que passa à pessoa amada uma
mensagem completamente equivocada. Em relações inseguras mascaramos as
nossas vulnerabilidades, de modo que nosso parceiro nunca nos vê como somos.
Vejamos por partes o que acontece quando um ponto fraco é arranhado.
1. Um sinal de necessidade de apego prende nossa atenção e aviva nosso sistema emocional, nossos
anseios e medos. Um sinal de necessidade de apego é um estímulo que nos desperta emocionalmente.
Pode ser um olhar, uma frase, uma mudança no tom emocional de uma interação com a pessoa amada.
Esses sinais tanto podem ser positivos quanto negativos, provocando bons ou maus sentimentos. Um
sinal que irrita um ponto frágil dispara um alarme tipo “uh”, “oh”. “Alguma coisa estranha, ruim ou
dolorosa está se aproximando”, diz nosso cérebro. Seu alarme pode disparar quando você perceber um
tom “crítico” na voz da pessoa amada, ou quando seu par se afasta na hora em que você quer
abraçálo.Marie fala a seu marido, Eric: “Sei que você está tentando ser afetuoso. E você está certo.
Você fala comigo sobre meus problemas. E vai tudo bem até que você diz ‘Veja bem’ naquele tom,
como se eu fosse uma garotinha estúpida que não sabe de nada. É como enfiar uma agulha na minha
pele. Percebo que você está exasperado comigo. Você pensa que sou estúpida. E isso magoa”. Isso é
novidade para Eric; ele pensava que estavam discutindo porque ela não gostava de nenhuma de suas
ideias.
2. Nosso corpo responde. As pessoas dizem: “Meu estômago revira e minha voz fica esganiçada”, ou
“Fico frio e paralisado”. Algumas vezes a única maneira de sabermos como nos sentimos é ouvindo
nosso corpo. Emoção forte mobiliza o corpo. Coloca-o no modo de sobrevivência na velocidade de um
raio. Cada emoção tem uma assinatura psicológica específica. Quando estamos com medo o fluxo de
sangue aumenta em direção às pernas; quando estamos com raiva, o fluxo aumenta na direção das
mãos.
3. Nosso intelecto, localizado atrás da fronte, no córtex préfrontal do cérebro, é um pouco lento. Agora
ele emparelha com o nosso cérebro emocional, nossa amígdala, e sai procurando o significado de tudo
isso. Isso acontece quando analisamos nossa percepção inicial e decidimos o que o sinal de
necessidade de apego está nos informando sobre a segurança de nosso vínculo. As catastróficas
conclusões de Carrie se confirmam na hora. Ela diz: “Quando parece que estamos a ponto de fazer
amor e você diz que está cansado, fico muito chateada. É como se você não me desejasse. Como se eu
fosse igual a uma de suas colegas. Simplesmente não sou especial para você”. Seu marido, Derek, fala:
“Será que não posso ficar cansado?”. Carrie responde: “Não quando você passou a noite inteira me
paquerando e provocando todos os tipos de expectativas. Então, se não vão resultar em nada, eu
preciso de um pouco de ajuda para lidar com isso. Não quero só ficar sentindo raiva”.
4. Somos preparados para nos mover de um modo determinado, seja na direção, nos afastando, ou
contra a pessoa amada. Essa presteza de agir está programada em qualquer emoção. A raiva nos manda
aproximar e lutar. A vergonha nos manda afastar e esconder. O medo nos manda fugir ou ficar estático,
ou em extremos reais, virar e contra-atacar. A tristeza nos prepara para lamentar e deixar para lá.
Hannah fala de suas brigas com o marido: “Só quero sair correndo. Preciso ir embora. Vejo seu rosto
enfurecido e dou o fora. Ele diz que o repudio, mas vejo a sua raiva e meus pés já estão se movendo.
simplesmente não dá para ficar e ouvir”.
Tudo isso acontece num nanossegundo. Charles Darwin, que era fascinado
pelo poder da emoção e seu papel na luta pela sobrevivência, queria saber quanto
de controle ele tinha sobre suas emoções. Costumava ficar na frente de uma
parede de vidro no zoológico de Londres, onde uma gigantesca víbora estava
aloja-da, e tentava várias vezes não recuar quando a víbora dava um bote. Nunca
conseguiu. Seu corpo sempre regia de medo, mesmo que a mente consciente lhe
dissesse que estava seguro.
Nas relações, uma versão dessa história pode ser que, em meio a um momento
de intensa ternura, repentinamente eu ouça meu par fazer um comentário crítico.
Sinto meu corpo congelar. O registro da mágoa e do recuo instantâneo
provavelmente levou menos do que dois centésimos de segundo (esse é mais ou
menos o tempo que os cientistas estimam que o rosto leva para registrar uma
emoção). O momento de ternura foi perdido. As emoções nos dizem o que
importa. Elas nos orientam e dirigem, como uma bússola interna.
JOGUE E PRATIQUE
IDENTIFICANDO SEUS PONTOS FRÁGEIS
Você é capaz de localizar com precisão o momento, em sua relação atual, em que
repentinamente perdeu o equilíbrio, quando uma resposta rápida ou falta de uma
resposta pareceu alterar sua sensação de segurança em relação à pessoa amada,
ou quando se viu totalmente compelido a reagir de uma maneira que sabia que
iria enfiálo nos Diálogos do Demônio? Talvez você tenha consciência de um
momento em que se viu reagindo com muita raiva ou indiferença. Busquemos
abaixo da superfície dessa reação as emoções mais profundas, e desvendemos
esse incidente.
• O que estava acontecendo na relação? Qual foi o sinal negativo, o gatilho que deflagrou em você um
sentimento de desconexão emocional? Como estava se sentindo na fração de segundo antes de reagir e
ficar nervoso ou tolhido? O que o seu parceiro disse ou fez especificamente para ativar essa resposta?
Anne diz: “Fico muito agitada. Reajo como uma gata tendo um ataque de
histeria. Patrick diria que eu fiquei louca. É isso o que ele vê. Mas lá no fundo,
aquele sentimento agitado me torna mais abalada, mais assustada”.
• O que seu cérebro decide a respeito do significado de tudo isso? O que você se diz quando isso
acontece?
Anne diz: “Na minha cabeça, digo a mim mesma, ‘Ele está me julgando’.
Então fico furiosa com ele. Mas não é bem assim. É mais do tipo ‘Ele não está
comigo agora. Tenho que fazer tudo sozinha’. Minha necessidade de apoio não
tem importância para ele. Isso é assustador”.
• O que você fez, então? Como se coloca em ação?
Anne diz: “Oh, eu berrei e gritei e disse a ele que era um canalha por não me
ajudar, e que podia ir para o inferno. Não precisava dele, de qualquer forma.
Então fiquei silenciosamente aborrecida alguns dias. É como se estivesse
bebendo veneno quando faço isso. É como tentar contornar meus sentimentos
mais profundos. E decidi que não se pode confiar em ninguém, seja lá como for.
As pessoas não estarão disponíveis, se você precisar”.
• Veja se você pode juntar todos esses elementos, preenchendo os espaços abaixo:
Neste incidente o deflagrador de meu sentimento foi ............................. . Na superfície,
provavelmente demonstrei ....................... Mas no fundo, senti (escolha uma das emoções negativas
básicas, como tristeza, raiva, vergonha, medo). O que eu mais queria era.................... . A principal
mensagem que senti sobre nosso vínculo, sobre mim ou nosso amor foi ....................
Anne diz: “Não posso lidar com meu ponto frágil quando preciso dele e digo
que preciso de ajuda e ele parece me rejeitar. Ele até me diz que eu não deveria
querer ou precisar de ajuda. Por dentro me sinto muito assustada”.
Veja se você pode identificar outros momentos em que esse ponto frágil foi
arranhado.
• O ponto frágil que você descreveu é o único nessa relação ou há outros? As pessoas podem ter mais
de um ponto frágil, mas normalmente há um sinal de necessidade de apego principal que ocorre em
situações diferentes.
• Pense na sua história. O seu ponto fraco emergiu na sua relação com os pais,
seus irmãos e irmãs, em outra relação romântica, mesmo na sua relação com
colegas e amigos? Ou é uma sensibilização que nasceu na sua atual relação?
Outra maneira de pensar nisso é se perguntar, quando sentir dor provocada por
um ponto frágil, se existem fantasmas por trás da pessoa amada. De uma ou
outra maneira, você pode localizar uma resposta danosa no seu passado e
entender isso como o início da vulnerabilidade?
Anne diz: “Minha mãe sempre me disse que eu não valia muita coisa, e que
minha irmã era a única que chegaria a algum lugar. Eu estava sozinha naquela
casa. Meus sonhos eram irrelevantes. Quando conheci Patrick ele parecia
acreditar em mim. Pela primeira vez me senti segura. Mas agora, quando
percebo que ele fica crítico e indiferente quando preciso de apoio, volto a ter
aquela sensação de que ninguém me dá importância. Toda aquela mágoa retorna.
• Você acha que seu parceiro percebe essa vulnerabilidade? Ou ele só vê o sentimento superficial ou a
reação?
Anne diz: “Oh, não. Não deixo que ele veja meu ponto frágil. Isso nunca me
ocorre. Ele apenas me vê ficar furiosa e aí começa a me repreender”.
• Você pode imaginar um ponto frágil em seu par? Você sabe exatamente o que faz para irritálo?
JOGUE E PRATIQUE
Pense se cada um pode lembrar um momento em que com-partilharam uma
percepção de vulnerabilidade, ou um sentimento de mágoa, e a pessoa amada
respondeu de um jeito que os ajudou a se aproximarem. O que ela fez que
realmente foi a diferença?
Agora vejam se podem concordar a respeito de um recente e típico incidente
em que os dois se sentiram desconectados e acabaram envolvidos por um tempo
num Diálogo do Demônio. Nessa situação, quem aumentou a temperatura
emocional, e quem a reduziu para evitar fortes emoções? Diga uma frase que
descreva como, normalmente, você lida com os sentimentos mais vulneráveis
nas interações difíceis e a partilhe com o parceiro. Viro uma pedra, fico gelado,
preparo um ataque, corro e me escondo.
Se você lida habitualmente com o parceiro dessa forma, pro-vavelmente é
porque lhe pareceu a única opção viável nos últimos relacionamentos amorosos.
Como essa forma de lidar com a emoção funcionou para manter intacto o
relacionamento mais importante de sua vida? Por exemplo, essa atitude ajudou a
chamar a atenção da pessoa amada ou fazer com que ela demonstrasse menos
obviamente rejeição ou indiferença?
Em suas interações recentes com um parceiro você ficou nos sentimentos
reativos superficiais, ou no final foi capaz de explorar e compartilhar
sentimentos mais profundos? Avalie com seu parceiro, numa escala de um a dez,
o quanto foi difícil para você falar de suas emoções mais vulneráveis. E como é
falar delas nesse momento? Existe alguma forma de seu par ajudálo a
compartilhar mais esses sentimentos? Não se esqueça: estamos todos no mesmo
saco de incompetentes, tentando entender nossas vidas emocionais à medida que
ela transcorre, fazendo o melhor possível, e errando.
Quando você pensa nessa interação em que os dois ficaram presos, vocês
podem identificar a deixa que os fez perder o equilíbrio emocional e precipitálos
numa espiral de insegurança? Tente comentar isso com o seu par como um
simples fato. Sem nenhuma acusação. Anne diz: “É que enquanto eu chorava
você ficou mudo”. Patrick responde: “Vi seu rosto. A mágoa em seu rosto. Por
dentro me senti muito mal. Não sei o que fazer nessas horas”.
Há muitas variações na ferida que se manifesta nos pontos frágeis. Veja se
pode usar as palavras e frases abaixo para descrever à pessoa amada os
sentimentos mais frágeis que surgiram em sua interação recente. Se é difícil
falar, você pode fazer um círculo e mostrar a seu parceiro.
Nesse episódio, se ouço meus sentimentos mais vulneráveis, me senti: sozinho/sozinha,
rejeitado/rejeitada e sem importância, frustrado/ frustrada e desamparado/desamparada, na defensiva
e desconfortável, assustado/assustada, magoado/magoada, desesperançado/desesperançada,
desamparado/desamparada, intimidado/intimidada, ameaçado/ameaçada, em pânico,
repudiado/repudiada, como se não fosse importante, ignorado/ignorada, inadequado/inadequada,
excluído/excluída e isolado/isolada, confuso/confusa e perdido/perdida, constrangido/constrangida,
envergonhado/envergonhada, vazio/ vazia, temeroso/temerosa, chocado/chocada, triste,
abandonado/abandonada, desapontado/desapontada, isolado/isolada, desiludido/desiludida,
tolhido/tolhida, humilhado/humilhada, oprimido/oprimida, pequeno/pequena ou insignificante, não
desejado/desejada, vulnerável, preocupado/preocupada.
Você consegue partilhar esse sentimento com seu par? Se é muito difícil falar
disso agora, é possível então compartilhar a imagem mais catastrófica
imaginável caso você falasse? Você pode falar a seu parceiro:
Quando penso em falar com você dos meus sentimentos mais frágeis, não consigo. Minha pior
fantasia é que o que vai acontecer é ...........................
Você pode perguntar a seu parceiro como ele ou ela se sente quando você fala?
Como ele ou ela o ajuda a se sentir suficientemente seguro para falar? Que
impacto vocês dois acham que esse tipo de revelação tem na relação?
Juntos, podem criar uma nova versão daquela interação Difícil com que você
começou este exercício? Cada um, do seu lado, pode descrever a maneira básica
com que se moveu naquela dança (por exemplo, fecho-me e evito) e nomear os
sentimentos superficiais que eram óbvios para os dois (por exemplo, sentime
desconfortável e nervoso/nervosa, como se quisesse escapar. Apenas
incomodado/incomodada)?
Meu movimento na dança foi ….................... e me senti .....................
REDUZINDO A DESCONEXÃO
Reproduzamos este pequeno drama e vejamos como o casal pode criar um novo
tipo de dança. Aqui estão os passos que podem recolocálos no caminho de uma
maior harmonia:
1. Interrompendo o Jogo. Na discussão, Claire e Peter ficaram totalmente envolvidos em atacar e
defender: quem está certo, quem está errado; quem é a vítima, quem é o vilão. Eles são adversários,
utilizando os pronomes “eu” e “você” quase exclusivamente. “Tenho direito a ser bem tratada”, Claire
declara de maneira beligerante. “E se você não puder fazer isso, posso me arranjar sozinha.” A vitória,
contudo, é um pouco vazia, pois não é isso o que ela quer. Peter responde calmamente: “Não podemos
parar com isso? Não estamos os dois perdendo nessa espiral?”. Ele mudou o pronome para “nós”.
Claire suspira. E altera sua perspectiva e seu tom. “Sim”, responde, pensativa. “Nós sempre chegamos
a esse ponto. Sempre caímos na armadilha. Nós dois queremos ter a razão, e continuamos assim até
que acabamos completamente exaustos.”
2. Reivindicando seus próprios movimentos, Claire se queixou de que Peter a ignorou, não tentou
entender seu ponto de vista quando as coisas esquentaram entre eles. Eles falam juntos de seus
movimentos. Claire pensa e diz: “Começou quando me queixei e fiquei com muita raiva. E você, o que
você fez?”. “Tratei de me defender, atacando de volta”, ele responde. Claire continua: “Então perdi o
controle e te acusei ainda mais; na realidade, eu estava protestando contra a sua indiferença”. Peter,
mais calmo, arrisca uma ironia: “Você se esqueceu de uma coisinha. Você ameaçou, lembra? Aquela
parte de como você poderia se virar sem mim?”.
Claire sorri. Juntos, os dois fizeram um breve resumo de seus
movimentos. Claire se enfurece enquanto Peter banca o impenetrável;
Claire grita e o ameaça; Peter a acusa de ser impossível e tenta se afastar.
Peter ri: “O rochedo impenetrável e a sujeita mandona. Que conversa, hein?
Bem, acho que falar com um rochedo deve ser frustrante”. Claire segue a
deixa e admite que sua raiva e tom crítico provavelmente deflagram sua
atitude defensiva e contribui para o afastamento dele depois dessas brigas.
Os dois concordam que é difícil ser sincero.
3. Reivindicando seus próprios sentimentos. Claire agora é capaz de falar de seus sentimentos, em vez
de, como ela diz, “concentrar-me em Peter e mascarálos com uma enorme recriminação”. Ela pondera:
“Ainda tenho raiva. Parte de mim quer falar ‘Bem, se sou de tão difícil convivência, vou mostrar. Você
não pode me atingir’. Mas me sinto muito abalada por dentro. Você sabe o que quero dizer?”. Peter
murmura: “Sim, sei, conheço a sensação”. O reconhecimento de Claire dessas enervantes emoções
superficiais, de raiva e confusão, é o começo para se fazer acessível ao seu amado. Algumas vezes a
linguagem das “partes” ajuda a reconhecer essas confissões. Parece que nos ajuda a admitir aspectos
de nós mesmos de que não nos orgulhamos, e também nos ajuda a expressar sentimentos ambíguos.
Peter poderia dizer: “Parte de mim está dormente. É minha resposta automática quando ficamos
emperrados desse jeito. Mas acho que parte de mim também fica abalada”.
4. De como influenciar os sentimentos de seu parceiro. Se nós estamos conectados, meus sentimentos
naturalmente irão afetar os seus. Temos de reconhecer que nossas maneiras habituais de lidar com
nossas emoções desequilibram nosso par e desencadeiam temores de separação ainda mais profundos.
Se nós estamos conectados, meus sentimentos naturalmente irão afetar os seus. Mas perceber o
impacto que temos sobre a pessoa amada pode se tornar muito difícil no momento em que ficamos
presos nas nossas emoções, especialmente se o medo está reduzindo a lente. Na briga, tudo acontece
tão depressa, que Claire fica tão chateada, que não consegue ver como seu tom crítico e a expressão
“aceitar” atingiram Peter num ponto frágil e deflagraram sua indiferença. Na verdade, ela afirma que o
comportamento dele se deve a suas falhas pessoais. Ele é um canalha!
No momento, Peter não consegue ver como sua afirmação de que não
queria falar com a “chefe dos serviços domésticos” leva Claire a fazer uma
escalada de ameaças de se virar sem ele. Para assumir realmente o controle
dos Diálogos do Demônio e acalmar os pontos frágeis, ambos os parceiros
precisam reconhecer como arrastam o outro para espirais negativas e criam
sofrimento para os dois. Agora Peter pode proceder assim. Ele diz: “Nessas
brigas, eu me defendo e depois paro de falar. É quando meu retraimento
pega você toda baratinada, não é? Você começa a imaginar que não estou
disponível para você. Eu me fecho. Não sei mais o que fazer. Só quero
parar de ouvir o quanto você está com raiva de mim”.
5. Perguntar ao outro sobre suas emoções mais profundas. Durante a briga e o período de
distanciamento que normalmente se segue, Peter e Claire estão ocupados demais para sintonizar as
emoções profundas e reconhecem que estão tocando nos pontos frágeis um do outro. Mas quando
podem olhar o quadro inteiro, e se acalmar um pouco, podem também ficar curiosos a respeito das
emoções subjacentes mais agradáveis do outro, em vez de ficarem ouvindo seus sofrimentos e medos,
e imaginando o pior a respeito do amado.
Agora Peter vira-se para a mulher e diz: “Fico pensando que você está
pronta para me deixar. Mas nessas horas você não está só com raiva, está?
Debaixo de todo esse barulho e raiva você está sofrendo, não está? Entendo
isso agora. Percebo que seu ponto sensível é o medo de ser deixada e
abandonada. Não quero que você sofra. Acho que me acostumei a ver você
como a chefe íntegra preocupada em demonstrar o quanto eu era
imprestável como marido”. Quando Claire pergunta a Peter sobre os
sentimentos mais suaves que lhe ocorreram nessa briga, ele é capaz de olhar
para dentro de si e localizar como a expressão “aceitar” incendiou todos os
seus medos de fracasso.
E Claire, lembrando todas as conversas sobre os pontos vulneráveis,
acrescenta: “Então, o que quer que você faça vai me trazer desapontamento.
E isso dá uma sensação tão ruim, que a gente quer só desistir e correr”.
Peter concorda. É claro que nessa hora realmente ajuda se os parceiros
foram capazes de se abrir completamente sobre seus pontos frágeis nas
conversas anteriores. Mas também ajuda se você tiver grande impacto sobre
o parceiro e for efetivamente curioso a respeito das vulnerabilidades dele ou
dela.
6. Expressar suas próprias emoções mais profundas e mais suaves. Embora expressar as emoções mais
profundas, implique, algumas vezes a tristeza e a vergonha, mas na maioria das vezes ansiedade de
separação, possa ser o passo mais difícil para você, é também o mais gratificante. Deixe seu par
perceber o que realmente está em jogo quando você discute. Muitas vezes deixamos de perceber as
necessidades e os medos que estão escondidos em batalhas recorrentes sobre temas do dia a dia.
Revelar momentos de desconexão como esse ajuda Claire a explorar seus próprios sentimentos e
arriscarse a partilhálos com Peter. Claire respira fundo, e fala a Peter: “Estou sofrendo, mas é difícil
contar isso. Tenho essa sensação de horror. Posso sentir um nó na garganta. Se eu parasse de ir até
você, tentando chamar sua atenção, talvez você ficasse nos vendo à deriva, e cada vez mais distantes.
Ou ficasse vendo nossa relação escurecendo até sumir da tela. E isso é assustador”. Peter ouve e
concorda com a cabeça. Ele diz: “Quando você me conta isso, me ajuda. Sintome como se a
conhecesse de uma perspectiva diferente quando fala assim. Você fica, de alguma forma, mais igual a
mim. É mais fácil me sentir próximo. E me faz querer tranquilizála.Algumas vezes eu posso impor
uma barreira, mas não a deixaria afastar-se de mim”.
7. Ficando unidos. Adotar os passos acima cria uma parceria renovada e verdadeira entre os pares.
Agora um casal tem um terreno comum e uma causa comum. Não se veem mais como adversários,
mas como aliados. Podem controlar a escalada das conversas negativas que alimentam sua
insegurança, e enfrentar juntos essas inseguranças. Peter fala à esposa: “Gosto quando a gente pode
parar e diminuir o volume. Gosto quando nós dois concordamos que essa conversa é difícil, que está
fora de controle e nos assustando. É muito confortador sabermos que não vamos ficar mais emperrados
como ficávamos. Mesmo que não saibamos exatamente o passo seguinte, isso é muito melhor. Não
temos mais que ficar presos naquele obstáculo todo o tempo”.
Mas tudo isso não significa que Peter e Claire se sintam realmente
sintonizados e conectados um com o outro num vínculo seguro. Mas significa
que sabem como interromper um desentendimento antes que ele se transforme
num abismo intransponível. Ambos estão conscientes de dois elementos de
desescalada: primeiro, como a forma de um parceiro reagir em momentochave
de conflito e desconexão pode ser profundamente dolorosa e ameaçadora para o
outro; e segundo, que a reação negativa de um pode ser uma tentativa
desesperada de lidar com as ansiedades de separação.
Os casais nem sempre serão capazes de aplicar esse conhecimento e os passos
específicos de desescalada toda vez que se desconectarem. É preciso prática,
repassar um episódio passado inquietante até que ele faça um sentido coerente, e
que, ao contrário do evento original, possa gerar uma possível resposta
apoiadora do outro parceiro. Uma vez que os casais tenham dominado isso, eles
podem começar a integrar esses passos no ritmo diário de seu relacionamento.
Quando divergirem ou se sentirem distantes um do outro, poderão dar um passo
atrás e perguntar: “O que está acontecendo agora?”.
Mesmo com prática, os casais nem sempre serão capazes de fazer isso; a
angústia pode ser muito forte em certos momentos. Normalmente, quando meu
marido não percebe meus sinais de conexão, posso dar um passo atrás e refletir
sobre nossa interação. Ainda estou equilibrada e posso escolher como responder.
Mas algumas vezes fico tão frágil e vulnerável, que o universo imediatamente
encolhe para o que parece uma luta de vida ou morte. Reajo rudemente, para
criar uma sensação de controle que limite a minha impotência. Tudo o que meu
marido vê é minha hostilidade. Quando fico mais calma eu o procuro
novamente. “Humm, podemos voltar atrás e começar outra vez?”, eu pergunto.
Então apertamos a tecla mental de rebobinar e repetimos o incidente.
Fazendo assim, os casais desenvolvem um agudo sentido para perceber
quando estão pisando em terreno acidentado. Sentem o terreno instável com
mais antecedência e são capazes de fugir dele mais rapidamente. E desenvolvem
confiança na sua habilidade de assumir o controle dos momentos de desconexão
e assim criam um relacionamento seguro. Vai custar um pouco, contudo, antes
que os casais desenvolvam a linguagem abreviada, quase taquigráfica, de Tia
Doris e Tio Sid.
Numa outra sessão, Kerrie e Sal estão revisitando outro momento conturbado,
que aconteceu quando Kerrie pediu a opinião de Sal sobre um vestido que ela
estava planejando usar num casamento a que ela não estava à vontade para
comparecer. Kerrie queria seu apoio, mas Sal não percebeu a sinalização. Em
vez de apoio, ele ficou vagamente crítico, dando a entender que ela já sabia que
ele não gostava do vestido, e que a sua opinião, ou o que achava mais atraente,
não tinha nenhuma importância. A divergência escalou rapidamente para uma
discussão sobre a qualidade da vida sexual deles. Voltaram à antiga dança em
que Kerrie se fechava e evitava um Sal cada vez mais irritado. Mas agora,
conhecendo o ciclo, eles repassaram a discussão e recolheram entendimentos
sobre como suas ansiedades de separação os joga na desesperança e no
distanciamento.
“Bem, você me perguntou sobre o seu vestido”, Sal diz. “‘Está bem?’, você
perguntou. “Dei a minha opinião, foi tudo.” Kerrie vira o rosto para a janela.
Luta para não chorar. Quando lhe pergunto o que está acontecendo, ela se vira e
investe contra Sal. “Sim, eu perguntei. E você sabe que era importante para mim
como me apresentar naquele grupo. Não me sinto segura com eles. Você poderia
apenas ter dito alguma coisa me apoiando. Mas não. Só recebi comentários
desdenhosos sobre como não me interesso em te agradar. Eu perguntei, não foi?
Eu queria apoio, não um monte de críticas. Que diabos você quer de mim? Não
faço nada certo. Este é um daqueles momentos em que gostaria de estar longe,
tipo ‘Beam me up Scotty!’.4 E no fim das contas, tudo se resume ao fato de que
você quer mais sexo.” Ela dá as costas para ele e fixa o olhar na parede oposta.
“Você tem razão”, ele responde com voz grave e tensa. “Você perguntou. Mas
desde quando minha opinião faz alguma diferença para nós? Você só vai ouvir o
que interessa a você. O que eu quero é irrelevante. Ah, sim, também não ajuda
você ser tão fria comigo na cama. Mas isso é só parte. Não se resume a eu querer
mais sexo.”
Convido Sal e Kerrie a fazerem uma pausa e apertar o botão de replay. O que
uma filmadora teria visto nos últimos minutos? Eu sei que eles podem conseguir.
Eu os vi saírem de um ciclo na semana passada. Sal sorri e recosta-se na
poltrona. Depois ele pinta um quadro sobre como ficaram enredados. “Sim,
vamos lá. Estamos de novo na história do eu pressiono, você recua. Mas acho
que não se trata do vestido, não é? Nem mesmo de sexo.”
Ouvilo dizer isso me entusiasma. Ele percebe que estão fugindo do ponto —
os sentimentos e necessidades de apego que desencadeiam o drama. Ele vê a
espiral negativa em ação. Agora ele precisa se afastar da postura crítica. Vira-se
para Kerrie. “Acho que estou ficando um pouco agressivo. Penso que ainda
estou magoado com a noite passada. Se você se lembra, sugeri que a gente
namorasse um pouco no estúdio. Mas você estava cansada.” Ele faz uma pausa e
olha para o chão. “Isso acontece um bocado.”
Sal acabou de alterar o nível da conversa de uma maneira poderosa. Volta a
atenção para a sua realidade e convida Kerrie a entrar. Agora aguardo para ver
como Kerrie vai reagir. Será que vai permanecer distante e inacessível, que vai
aproveitar a oportunidade para revidar com um comentário como “Oh, então
você está magoado. Ora, escute bem, meu camarada...”? Ou irá responder à
tentativa de Sal de escapar do círculo usual deles de perseguição ansiosa e fuga
ofendida?
Kerrie respira fundo e começa. Ela fala suavemente. “Muito bem. Trata-se de
você me procurar e eu estar cansada. Então, você fica magoado e amargo, e
depois eu não valorizo sua opinião e não estou disposta para afagos.”
Ela coloca junto a história do apego, o enredo por trás do drama do momento,
identificando o problema emocional na briga. Ela continua: “Eu pedi sua opinião
sobre o vestido, mas você ficou enredado na raiva, foi isso? Hei, passamos por
isso centenas de vezes antes. Já discutimos isso. Por que não podemos
interromper?”.
Não resisto observar que eles estão fazendo exatamente isso. Estão vendo o
quadro maior, ao invés de reduzilo à reação aos movimentos negativos do outro.
Kerrie agora dá outro passo na direção de criar mais segurança. Ela se inclina
para Sal. “Bem, acho que ainda estou aprendendo sobre os seus pontos frágeis.
Entendo que você pode ter sentido que eu estava fria na noite passada. Eu estava
completamente exausta. Acho que fiquei com medo de explicar isso para você.
Sabia que você queria fazer sexo. Talvez estivesse muito temerosa de que íamos
acabar discutindo. Então criei uma barreira.”
“Foi uma daquelas vezes”, Sal pergunta, “e que já comentamos, em que você
acha que só duas horas de sexo intenso é que vão me agradar? Daquelas vezes
em que você ficou se sentindo pressionada, de que não conseguiria atender às
minhas exigências?”
Essa resposta me surpreende. Uma vez que tinham acalmado seus Diálogos do
Demônio, abrese o espaço para a curiosidade, para a procura da realidade do
outro. Sal não está apenas tentando tipificar seus sentimentos; está se colocando
no lugar da mulher e sentir suas emoções.
Kerrie obviamente fica tocada com isso, e vejo que ela se inclina e tira os
sapatos vermelhos de salto alto, seus “sapatos insolentes”, como ela chama.
Esses sapatos anunciam para o mundo que ela é poderosa e deve ser reconhecida
como tal. Ela puxa a cadeira para mais perto. “Claro, senti a pressão. E acho que
coloquei a barreira. Mas nós dois sabemos agora que esse momento aterroriza
você, não é? Então você me procura e eu me afasto mais ainda. É assim que
normalmente acontece.”
Há uma nova música na sala. Cada parceiro está olhando para a dança e dando
nomes aos seus passos. Mas, mais do que isso, está vendo exatamente como são
arrastados à dança. Mas será que eles realmente veem o impacto, e como esse
ciclo os leva para o isolamento e o medo? Comento: “E é muito difícil para os
dois. E acabam sozinhos”.
“Sim”, Sal diz, “e depois vou para aquele lugar triste e aterrador, acho. Era
isso mais ou menos o que estava tentando dizer com meus comentários raivosos.
‘Por que ela pedia minha opinião, como se o que eu dissesse tivesse alguma
importância para ela?’ E quando essa sensação vem...” Ele fica parado e
silencioso.
“É aí que você fica com medo, inseguro quanto a ser importante para Kerrie”,
eu observo. “E é assim que acontece com todos nós. Aquele medo é parte do
amor. Mas é difícil aceitar e reconhecer, é mais fácil ficar raivoso.” Kerrie agora
está totalmente focada no marido, falando baixo, mas muito segura. “Então
aquele medo nos leva a esse lugar obscuro...” “Leva”, Sal responde, “e eu fico
nervoso, tentando lidar com ele. Acabo ficando furioso”.
“E aí, Sal, sua raiva deflagra os medos de Kerrie”, eu comento. “Isso mesmo”,
Kerrie concorda. “É quando eu fico deprimida por não poder agradar a esse
homem. Não sou o bastante. E o curioso é que gosto de namorar no sofá. Gosto
de como fazemos amor. E acabamos nos arrastando para essa dança idiota.”
Observo que os dois acabaram de agarrar o demônio do diálogo e o levaram à
lona. Enfrentaram seus medos de uma forma diferente, que acalma suas
ansiedades, em vez de exacerbálas. Mas Sal ainda tem uma coisa muito
importante a dizer. Ele parece ter crescido na cadeira, como se de repente se
achasse em terreno mais seguro. “Estamos começando a aprender a enfrentar
isso. Se pudermos ver onde ficamos enredados, e se pudermos fazer alguma
coisa a respeito desses pontos frágeis e como eles são ativados, bem, talvez
possamos ser capazes de ficar mais” — ele faz uma pausa e procura as palavras
certas — “bem... ainda mais unidos”, ele conclui e sorri. Kerrie ri e busca a mão
dele.
O que acabamos de ver Sal e Kerrie fazerem nestas duas últimas conversas?
• Eles começaram a ir além de apenas dar os passos na sua dança negativa, e a ver o padrão que ela
está gerando quando ela ocorre e começa a assumir o controle da sua relação.
• Reconheceram seus passos na dança.
• Começaram a ver como esses passos empurram cada um para o programa primal de necessidades de
apego e de ansiedades de separação. Estão começando a entender o incrível impacto que têm um sobre
o outro.
• Estão entendendo, expressando e compartilhando a dor da rejeição e os medos de desamparo que
impulsionam a dança.
Tudo isso significa que têm a habilidade de diminuir os conflitos. Mas, mais
do que isso, cada vez que agem assim estão criando uma plataforma de
segurança, na qual podem se basear para enfrentar as profundas emoções que são
parte do amor.
Agora que já sabem como essa desescalada funciona, chegou a hora de fazê-la
funcionar para a sua relação.
JOGUE E PRATIQUE
1. Junto de seu par, escolha um breve incidente angustiante (mas não muito penoso), ocorrido na
relação há duas ou três semanas, e faça uma descrição simples do que aconteceu como se você fosse
um observador invisível. O ideal é que ambos concordem com a descrição. Agora anote numa
sequência simples os movimentos que você adotou no incidente. Como seus movimentos se
relacionaram e provocaram os movimentos de seu parceiro? Compare as anotações e façam uma
versão conjunta sobre a qual estejam de acordo. E que seja simples e descritiva.
2. Acrescente os sentimentos que ambos tiveram e como cada um ajudou a desencadear a resposta
emocional do outro. Compartilhem as respostas e concordem numa versão conjunta. Agora pergunte
quais sentimentos mais profundos e suaves seu par sentiu. Seja curioso. A curiosidade traz informação
muito valiosa. Se seu par tem dificuldade para acessar seus sentimentos mais suaves, tente adivinhar
usando seu entendimento dos pontos frágeis do par como guia. Confirme ou revise com o parceiro
quais são os sentimentos mais profundos dele ou dela.
3. Usando a informação acima, veja se os dois podem comentar, ou escrever por extenso, o que teriam
dito a cada um ao final do incidente se pudessem permanecer juntos, e completar a anotação de
maneira que os dois se sentissem seguros. Que sensação você poderia ter sentido? Como se sentiriam
com relação ao outro, ou ao relacionamento?
4. Tente as três práticas anteriores com um incidente difícil e não resolvido. Se ficar emperrado, apenas
admita que uma parte determinada do exercício é difícil para você. Se o seu par acha difícil também,
pergunte se existe uma maneira de ajudálo ou ajudála naquele momento. Algumas vezes o que as
pessoas precisam para continuar com essa tarefa é um pequeno apoio.
5. Se você soubesse que poderia selecionar momentos de conflito e desconexão, e desarmálos ou
modificálos, que impacto isso teria sobre a sua relação em geral? Partilhe isso com o parceiro.
Com o que aprendeu nas três primeiras conversas, você agora é capaz de
diminuir os conflitos. Isso é excelente. Mas para se ter uma relação sólida,
amorosa e sadia, você precisa ser capaz não apenas de reduzir os padrões
negativos que geram insegurança na relação, de ouvir e aceitar os protestos do
outro, mas também de criar uma comunicação poderosa e positiva que estimule a
acessibilidade, a capacidade de reação, e o engajamento com o outro. É o que
você fará nas conversas seguintes.
Conversa 4: Abrace-me apertado —
engajando e conectando
“Quando alguém ama você, pronuncia seu nome de um
modo diferente. E você sabe que o seu nome está seguro
nos seus lábios.”
BILLY, DE QUATRO ANOS, DEFININDO O AMOR, COMO POSTADO
NA INTERNET.
E
momento em que duas pessoas se olham intensamente nos olhos,
aproximam seus braços vagarosamente, e começam a se movimentar em
perfeita sincronia. Sabemos instantaneamente que essas duas pessoas são
importantes uma para a outra, que estão conectadas.
Esses momentos vistos na tela indicam quase invariavelmente que um
par está nos inebriantes primeiros dias de um romance. Raramente são usados
para ilustrar um estágio mais maduro do amor. E é aí que Hollywood erra.
Porque esses momentos de receptividade intensa e de engajamento são vitais
durante toda a relação. Na verdade, são as marcas definidoras dos casais felizes e
seguros.
Quase todos nós somos atraídos de forma natural e espontâ-nea por nossos
parceiros quando estamos apaixonados. Somos completamente conscientes da
presença do outro, e intensamente sensíveis a toda ação e palavra, toda expressão
de sentimentos. Mas com o tempo muitos de nós ficamos menos atentos, mais
acomodados, e até aborrecidos, com o outro. Nossas antenas emocionais perdem
potência, ou talvez os sinais de nosso parceiro fiquem mais frágeis.
Para construir e manter vínculos seguros precisamos ser capazes de ter uma
sintonia com a pessoa amada tão forte quanto antes. Como fazemos isso?
Criando deliberadamente momentos de engajamento e de conexão. Nessa
conversa, você dará o primeiro passo nessa direção, e conversas subsequentes
vão lhe mostrar como provocar uma sensação de proximidade, de modo que
você poderá criar à vontade seus próprios “momentos hollywoodianos”.
A conversa Abrace-me Apertado cria a sensação de segurança que você e seu
par começaram a produzir como resultado das Conversas 1, 2 e 3, que lhe
ensinaram como interromper ou conter os padrões negativos de interação com a
pessoa amada, da mesma forma que identificar pelo menos um dos sentimentos
mais profundos que surgem em ciclos negativos e momentos de desconexão.
Sem uma plataforma básica de segurança, é difícil buscar uma conexão
consciente, e reagir com apoio. Nesta conversa você aprenderá como provocar
padrões positivos de aproximação e resposta à pessoa amada. Na verdade, você
aprenderá a falar a linguagem do apego.
Considere da seguinte forma: se as Conversas 1, 2 e 3 são como passear juntos
pelo parque, então a Conversa 4 é como dançar um tango. É um novo nível de
engajamento emocional. Todas as conversas anteriores são uma preparação para
esta, e todos os diálogos futuros dependem da capacidade do casal de criála. A
conversa Abrace-me Apertado é a ponte definitiva para ligar os espaços entre
duas solidões.
Afastarnos de nossa maneira usual de nos proteger, e admitir nossas
necessidades mais profundas, pode ser difícil e até doloroso. A razão para
assumir o risco é simples. Se não aprendemos a permitir que nosso par realmente
veja nossas necessidades de apego de uma maneira aberta, autêntica, as chances
de que elas sejam atendidas são minúsculas. Temos que enviar sinais altos e
claros para que nosso par receba a mensagem.
Se, geralmente, nos outros encontramos refúgios seguros e Temos vínculo de
confiança com a pessoa amada, então é mais fácil para nós manter nosso
equilíbrio emocional quando nos sentimos vulneráveis, ligarnos com nossos
sentimentos mais profundos, e expressar a necessidade de apego que faz sempre
parte de nós. Se nós estamos nos sentindo inseguros a respeito de nossa relação,
é mais difícil confiar em nossos desejos e arriscar nossa vulnerabilidade. Nessa
situação, alguns de nós tentamos manter o controle das emoções a todo custo, a
escondê-las, em lugar de pedir aquilo de que necessitamos. Outros negam que as
emoções e as necessidades sequer existam. Mas elas continuam aí. Como o vilão
do filme In the Cut5, arguto mas perverso, murmura para Meg Ryan, a heroína
que evita toda proximidade com os outros: “Você deseja tanto que dói”.
A Conversa 4 tem duas partes: a primeira — Do que mais tenho medo? —
requer mais exploração e acréscimo de detalhes aos sentimentos mais profundos
que você percebeu nas conversas anteriores. Nesses diálogos você estava
pegando o elevador que descia na direção de suas emoções. Para descobrir suas
prioridades de apego você deve agora ir até embaixo, no térreo.
A segunda parte — Do que mais necessito de você? — é crucial, o ponto de
inflexão da TFE. Envolve ser capaz de falar aberta e coerentemente de suas
necessidades, de modo a convidar seu par para um novo diálogo, marcado pela
acessibilidade, receptividade, e engajamento, uma conversa A.R.E.
UM CASAL EM APUROS
Essa parte da conversa visa obter mais clareza emocional. Pergunto a Charlie
como Kyoko pode ajudálo a recuperar o sentimento de segurança e amor que já
experimentaram na relação. “Bem, eu não ia mais ficar ansioso nem passar um
sermão se ela parasse de explodir”, ele responde. Então o convido a falar dele e
de seus sentimentos. Ele diz que não tem certeza sobre como começar. O mundo
do sentimento é “estranho” para ele. Mas agora ele percebe, e me dá um largo
sorriso, e diz que talvez haja uma “lógica” em conseguir ouvir os sentimentos e
revelálos. Ele se volta para Kyoko e diz que a vê como mais previsível, mais
“segura”, agora que entende que ela se sente rejeitada e punida pelos seus
conselhos. Mas não tem certeza sobre como entender seus próprios sentimentos
mais profundos.
Pergunto a ele como identificou seus sentimentos nas conversas anteriores.
Por onde ele começou? Ele é um homem muito inteligente, e me diz o que nós,
terapeutas, levamos anos para aprender. Ele diz: “Oh, procuro primeiro o que me
bloqueia, o que torna difícil focar nos sentimentos. Fixo-me naquele momento
em que me afasto dos sentimentos e volto-me para a mente, buscando fórmulas”.
Eu concordo, e Kyoko, prestativa, entra na conversa dizendo-lhe: “Deve ser
como eu aprendendo inglês. Se os sentimentos são uma língua estrangeira para
você, é difícil sentirse confortável. A gente tenta afastar-se do que é estranho. O
estranho é assustador”. Charlie ri e responde à mulher: “Sim. Eu me afasto dos
sentimentos porque eles são estranhos. Não me sinto no controle. É mais fácil
desenvolver um programa de melhoria para você”.
Ele se vira para mim e faz uma segunda afirmação. “Em nossas melhores
conversas, ajudou-me o que você chama de ‘alças’ e meditar sobre elas.” Alças
são imagens, palavras ou frases descritivas que muitas vezes abrem a porta para
seus sentimentos e vulnerabilidades mais íntimos, a sua realidade emocional.
Kyoko e eu lembramos a Charlie algumas das alças que ele usou para descrever
suas reações a Kyoko: coração arrasado, sufocado, ansioso, esquisito, e fugindo.
Charlie concorda com a cabeça, mas parece em dúvida. “Para mim, é difícil
acalmar-me e ficar com essas alças”, ele murmura, “Até mesmo me fazer
pesquisar. Ouvir os sinais que deflagram meus sentimentos e pensamentos. Não
sei aonde isso vai chegar. Acho melhor pensar. Mas talvez isso não seja o
suficiente.” Balanço a cabeça em concordância e pergunto qual alça chama a sua
atenção nesse momento. Ele diz, calmamente: “Oh, isso é ób-vio. Volto-me para
mim mesmo quando não consigo suportar o desassossego, um mau presságio”.
Kyoko e eu nos recostamos um pouco. “O que ‘desassossego’, este termo
abstrato, tem a ver com qualquer coisa?”, eu falo em voz alta. Aí Kyoko entra na
conversa. Ela aprendeu, em conversas anteriores, a “desembrulhar” termos
abstratos como esse, a fim de que eles não confundam a conversa. Ela se inclina
à frente e pergunta: “Charlie, é como se você se afastasse de suas emoções e das
minhas por causa de grandes ansiedades?”. Charlie fita o chão e concorda com a
cabeça, lentamente.
Ele suspira. “Só quero manter tudo sob controle, então acho que há enorme
ansiedade. Fico sufocado quando Kyoko se aborrece comigo, e aí começo a me
sentir perdido. Não sei o que fazer.” Nesse ponto desejo chegar à raiz dos medos
dos parceiros, e então pergunto: “E quais são as maiores catástrofes que
poderiam acontecer aqui, Charlie? Do que é que você tem mais medo?”. Mas
não preciso insistir. Charlie chega lá por iniciativa própria. “A palavra ‘arrasado’
fica martelando na minha cabeça”, ele diz. “Se permaneço e ouço como Kyoko
está aborrecida, eu vou ficar arrasado. Vou perder o controle. A explosão vai nos
matar.” Charlie revelou um bocado. Temos que minerar um pouco este
momento. Então, vou afastando pedra por pedra, ajudando Charlie a estender-se
sobre o tema. É sempre melhor começar identificando a emoção.
Pergunto: “Então, Charlie, a emoção básica que percebo é medo. Estou
certa?”. Ele balança a cabeça, solenemente concordando. “Eu o sinto mesmo
aqui”, e bate com a mão no peito. então eu continuo: “Mas o que esse medo diz a
você? Quais são os terríveis ‘e se’ ... nessa hora? Talvez, se você não ficar
totalmente calmo, Kyoko ficará ainda mais descontrolada? Talvez, você vá ouvir
que ela deseja alguma coisa que não sabe como dar? Se você ficar receptivo e
ouvir que sua mulher sofre, então você não foi o marido perfeito que deveria ter
sido? Então você poderia perdêla completamente?”. Charlie concorda
vigorosamente: “Sim, tudo isso. Tudo isso. Tentei o máximo. Mas o que sei fazer
não funciona. Quanto mais tento que ela fique razoável, mais tudo piora. Então
fico desamparado. Totalmente desamparado. Sou competente em tudo o que
faço. Sigo as regras. Mas agora...”. Ele abre as mãos num gesto de derrota.
Nós todos não queremos uma ou duas regras infalíveis para amar e ser
amado? Mas o amor é improvisação. E Charlie amputou seu melhor guia, as suas
emoções e as de sua mulher.
Pergunto a ele: “Percebendo agora esse sentimento de medo e de desamparo,
qual é a maior ameaça, a mensagem mais aterradora? Você pode contar a
Kyoko?”. Ele se empertiga na cadeira e fala em voz alta: “Eu não sei como fazer
isso. Não tenho ideia”. Ele se vira mais para Kyoko, e continua: “Não sei o que
fazer quando você não está feliz comigo. E você pode explodir a qualquer
momento. Com você nunca me senti seguro de mim. E preciso me sentir. Estou
muito triste. Cruzamos o mundo juntos. Se eu te perder...”. Ele chora. Kyoko
chora junto.
O que aconteceu agora? Charlie se enredou nas emoções mais profundas e
deixou-as expressar sua necessidade de uma ligação emocional segura com sua
mulher. Compôs uma mensagem de apego coerente tirada de seu torvelinho
emocional. Quando olho, ele está sorrindo para mim. Não parece sufocado ou
desamparado. Pergunto: “Como se sente, Charlie, depois de dizer tudo isso?”.
“Muito estranho”, ele responde.
“Sintome bem agora, ser capaz de dizer essas coisas. Não fiquei arrasado.
Kyoko ainda está aqui, e de alguma forma me sinto mais forte.” Quando
examinamos e damos um sentido à nossa experiência, ou como coloco,
“ordenamos e purificamos”, não importa o quanto seja doloroso o processo, há
uma sensação de alívio e fortalecimento.
Aquele é um Charlie novo, mais acessível. A maneira pela qual Kyoko
responde nesse momento é crítica. Muitas vezes, em relacionamentos infelizes,
quando uma pessoa assume o risco e se abre, a outra não percebe ou fica com
medo de confiar na revelação. Já ouvi parceiros rejeitar os novos passos da
pessoa amada com todo tipo de comentários, desde “Isso é ridícu-lo” até
“Vejamos se você pode provar”. E então voltam aos Diálogos do Demônio.
A verdade é que ninguém assume o risco de ser repudiado por se abrir, como
Charlie assumiu, se a outra pessoa não lhe importa muito. E algumas vezes os
parceiros que se expressam devem estar dispostos a ficar repetindo a mensagem
até que a pessoa amada comece a vêlos de outra maneira. Casais enredados em
Diálogos do Demônio também podem seguir adiante repetindo as Conversas 1, 2
e 3.
Felizmente, para Charlie e Kyoko, ela reage com apoio à abertura dele.
“Entendo muito mais agora como você se meteu naquele lugar frio e racional, e
acabou me dando instruções”, ela diz. “Nunca soube que era tão importante para
você para magoálo tanto. Respeito-o por estar fazendo esse tipo de revelação.
Fico muito mais unida a você.” Charlie apenas sorri e dá uma ou duas voltas na
cadeira.
A capacidade de prestar atenção nas revelações mais íntimas de nosso par é o
início de uma capacidade de reação emocional e de engajamento mútuos. A
expressão “prestar atenção” deriva do latim ad tendere, que significa “estender a
mão para”. Kyoko estendeu a mão para Charlie.
Agora é a vez de Kyoko revelar suas emoções e ver se Charlie presta atenção
nelas. Ela volta ao Momento Instável e diz a Charlie: “Quando você chegou em
casa, eu disse que estava aborrecida e você disse ‘Agora não fique furiosa
comigo’, e que se não parasse com meus acessos de raiva, você talvez tivesse
que me deixar. Isso foi o fundo do poço para mim. Eu nem sempre consigo ser
calma e racional”. Charlie parece desconfortável e sussurra um “desculpe” entre
dentes. Ele admite que realmente não entende a mágoa dela nessas horas.
Kyoko aperta o botão de descida do elevador emocional e desce mais alguns
andares. Ela começa: “Sintome muito triste de ver que já não podemos mais
continuar juntos”. Charlie faz que sim com a cabeça e responde: “Mas não
precisa ficar, pois estamos trabalhando nossa relação”. Ele pensa, balança a
cabeça, e continua: “Acho que vou tentar entender a sua mágoa. Qual foi o
momeno pior, o sentimento pior para você?”. É uma pergunta muito boa, e ao
fazê-la Charlie ajudou Kyoko a ir ao fundo da questão.
Mas Kyoko não pode responder. Ela fica sentada em silêncio, e grossas
lágrimas correm-lhe pelo rosto. Charlie acaricia seu joelho. “Só falo que você
está louca porque fico com medo dos pensamentos ruins entre nós”, ele sussurra.
Kyoko conta: “Os piores momentos foram quando você desligou o telefone e
quando disse que ia me abandonar. Eu era muito ‘insensata’, você disse”.
Charlie, agora bastante preocupado, diz: “Não sei como posso melhorar tudo.
O que devo fazer?”, ele pergunta, virando-se para mim. “Para melhorar, Kyoko
precisa sentir que você está ao lado dela”, respondi. “Deixála sentir que você se
preocupa com a sua dor.” Ele arregala os olhos com incredulidade. Ela continua:
“Se fico triste, assustada ou aborrecida, você simplesmente desliga. Você não me
consola. E agora não fazemos mais amor nem você me abraça. Justo quando
preciso de você, você se fecha em desaprovação. Você se afasta e me descarta.
Não sou a mulher que você deseja”.
É triste ouvir Kyoko expressar uma torrente de rejeição e desamparo. Não
estranha que às vezes ela perca o equilíbrio e fique enredada em protestos
raivosos ou em depressão. Mas nesse momento ela é clara e precisa: “Quando
você me ignora, e aferra-se às suas regras, é como se eu morresse. Nunca me
senti tão sozinha”. Agora ela olha diretamente para ele. “Charlie, você não está
disponível, não está junto de mim. Então entro em pânico. Você me entende?”
Ele procura as mãos dela e as prende entre as suas. Balança repetidas vezes a
cabeça: “Sim, sim, sim”. Calmamente, Charlie diz: “É triste, ouvir isso. Estou
triste”. E está. Sua presença emocional é tão palpável quanto a cadeira em que se
assenta. Kyoko transformou sua clara consciência dos sentimentos mais
profundos num nítido sinal de apego para o amado. Ela destilou a pior dor, o
código primal da perda e pânico que ecoa quando nosso amado não está
disponível, e ele a ouviu.
Os dois se conectaram às suas realidades emocionais e se revelaram para o
outro.
JOGUE E PRATIQUE
Charlie faz uma série de ações que fazem uma real diferença em como ele se
conecta e expressa suas emoções mais profundas. Veja se você pode se lembrar,
ou voltar, e encontrar exemplos do seguinte:
• Charlie começa a examinar o momento atual e como é difícil conectar com seus sentimentos. O que o
impede de dizer o que sente?
• Charlie identifica algumas alças de conversas anteriores e expõe à luz as imagens, frases ou
sentimentos. E quando olha atentamente, ele pode ver que na realidade elas são representações de
medo, vergonha, ou tristeza e perda.
• Charlie identifica terríveis “e se...”, as piores coisas que podem acontecer se ele reconhece os
sentimentos da parceira. Listar as consequências catastróficas revela seus medos mais arraigados: que
ele vai ficar desamparado e sozinho. Esse é um momentochave da Conversa 4.
• Charlie revela seus medos à mulher e reflete como é partilhar esses sentimentos profundos com ela.
• Agora observe as revelações de Kyoko e tente responder às seguintes questões:
• Qual foi o pior momento para Kyoko?
• Qual é a catastrófica conclusão a que ela chega?
• Nomeie quatro coisas que Charlie faz quando Kyoko está triste e assustada e que ampliam sua
ansiedade de separação. Kyoko as descreve com palavras de ação.
• Quais são as emoções mais arraigadas de Kyoko?
Minha pesquisa mostra que toda vez que um casal tem uma conversa Abrace-me
Apertado ocorre um momento de profunda conexão emocional. Os físicos falam
de “ressonância”, uma vibração de empatia entre dois elementos que lhes
permite sin-cronizar os sinais repentinamente e agir em uma nova harmonia. É a
mesma vibração que ouço nos clímaces de uma sonata de Beethoven, quando
uma centena de sons se juntam. Cada célula de meu corpo responde, fundindo-
me e à música numa coisa única. Quando observo momentos semelhantes entre
mãe e filho, entre pessoas que se amam, entre pessoas que buscam e encontram
uma conexão profunda, minha resposta é sempre a mesma: inunda-me uma
alegria repentina.
Essa sensação de conexão é expressa não apenas por nossos sentimentos, mas
por todas as nossas células. Quando os parceiros respondem com empatia entre
si, sei pelas minhas recentes pesquisas que células nervosas específicas,
chamadas de neurônios-espelho, no córtex préfrontal de seus cérebros, estão
zumbindo. Os neurônios parecem ser um dos mecanismos básicos que nos
permitem sentir efetivamente o que outra pessoa está experimentando. É um
nível de entendimento diferente de quando percebemos, por meio de nosso
intelecto, o que a outra pessoa sente. Quando observamos uma pessoa agir, essas
células cerebrais disparam, como se nós mesmos estivéssemos executando a
ação. Neurônios-espelho são parte de nossa herança “programada para
conectar”, e nos preparam para amar e ser amado.
Os neurocientistas descobriram os neurônios-espelho acidentalmente, em
1922, quando um pesquisador, que estava mapeando um cérebro de macaco e
tomando um sorvete, observou que o cérebro de macaco se iluminava como se
ele também estivesse tomando o sorvete. Os neurônios nos permitem interpretar
intenções e emoções, e literalmente trazer o outro para o nosso interior. Os
neurocientistas, tomando emprestada a física, agora falam de estados de
reverberação de ressonância empática. Isso soa muito abstrato. Mas significa
para os que amam, que existe um poder tangível no ato de olhar para o outro.
Ajudanos a estar emocionalmente presentes e captar os sinais não verbais do
nosso par. Isso cria um nível de engajamento e empatia que se perde numa
conversa menos direta. Neurônios-espelho nos permitem captar a emoção
expressa pelo outro, e sentir essa emoção dentro de nosso corpo. É a validação
científica do conceito de apego, segundo o qual a conexão autêntica com o outro
é “sentir o sentimento”.
No início das sessões, Charlie e Kyoko não mostravam empatia. Mal se
olhavam, e pareciam falar línguas diferentes. Durante a conversa Abrace-me
Apertado, contudo, quando os cantos da boca de Charlie se inclinavam para
baixo e suas pálpebras pendiam, as de Kyoko também começavam a pender.
Quando ele ria, ela sorria. A canção emocional dele virou um dueto. Esse tipo de
capacidade de reação emocional parece ser o coração da emoção com empatia,
em que nós literalmente sentimos com e para o outro, e daí naturalmente agimos
mais amorosamente.
Esse, certamente, é o mesmo tipo de engajamento de corpo, espírito e emoção
que os casais felizes sentem quando fazem amor, ou que a mãe e o bebê sentem
quando se olham, tocam e se arrulham. Eles estão se movendo em sincronia
emocional, sem pensamento consciente ou necessidade de palavras. Há
tranquilidade e alegria.
Mas os neurônios-espelho não são a explicação total. Um número
considerável de estudos recentes traz novas descobertas sobre a base
neuroquímica do apego. Essas pesquisas mostram que em momentos de
engajamento emocional intenso, nossos cérebros são inundados de oxitocina.
Apelidada de “hormônio do amor”, a oxitocina, que é produzida apenas pelos
mamíferos, está associada a estados de felicidade plena. O hormônio parece criar
uma cascata de prazer, bem-estar e calma.
Os pesquisadores descobriram o poder da oxitocina quando compararam os
hábitos de acasalamento de dois diferentes tipos de ratos do campo. Em uma
espécie, ratos machos e fêmeas são monógamos, cuidam dos filhotes juntos e
formam vínculos para toda a vida; em outra, machos e fêmeas se limitam a um
encontro e deixam que a prole cuide de si. Os roedores fiéis produzem oxitocina;
seus primos promíscuos, não. Contudo, quando cientistas deram aos monógamos
uma substância química que neutraliza a oxitocina, esses roedores faziam sexo,
mas não estabeleciam vínculos com os parceiros. E quando pesquisadores deram
aos mesmos roedores doses extras de oxitocina, eles estabeleciam fortes
vínculos, quer acasalassem ou não.
Nos humanos, a oxitocina é liberada quando estamos próximos, ou em contato
físico, com alguém por quem sentimos apego, especialmente nos momentos de
emoção intensificada, como o orgasmo e amamentação. Kerstin Uvnas-Moberg,
um neuroendocrinologista sueco, descobriu que o fato de apenas pensar na
pessoa amada gera liberação de oxitocina. A oxitocina também reduz a produção
de hormônios do estresse, como o cortisol.
Estudos preliminares indicam que a administração de oxitocina a humanos
aumenta a tendência a confiar e interagir com os outros. Essas descobertas
ajudam a explicar minhas observações segundo as quais quando parceiros
angustiados aprendem a abraçar o outro, eles continuam procurando o outro com
frequência, tentando criar esses momentos de transformação e satisfação.
Acredito que as interações A.R.E. ativam essa poção neuroquímica do amor,
aperfeiçoada por milhões de anos de evolução. A oxitocina parece ser a maneira
de a natureza promover o apego.
JOGUE E PRATIQUE
C
Apertado, e o ar está zunindo de tanta vibração emocional. “Deixeme
abraçála”,Conrad supli-ca. “Conte-me o que você deseja.” Helen vira-se
para ele e sorri, como se estivesse pronta para responder à indagação.
Mas num segundo seu rosto fica sem expressão. Ela fixa o olhar no
chão. E então, numa voz etérea, ela diz: “E eu estava lá, estava sentada
na escada, e disse a você, ‘O médico acha que provavelmente tenho a doença.
Câncer no seio. Estive esperando toda a minha vida, sabendo que iria acontecer.
Minha mãe morreu de câncer. Minha avó também. E agora é a minha vez’”.
Sua voz muda; ela parece atordoada. “E você chegou-se a mim e me tocou —
ela esfrega o ombro, como se ainda estivesse sentindo o toque — e disse
‘Anime-se!Não vale a pena atormentar-se e ficar angustiada se ainda não há
certeza. Fique calma, e vamos discutir isso mais tarde’. Você subiu as escadas
para o seu escritório e fechou a porta. E demorou demais a descer. Você me
deixou sozinha sentada na escada. Você me deixou morrendo na escada.”
Então sua voz muda novamente. Num tom animado e direto me diz que ela e
Conrad fizeram grande progresso na terapia e já não têm mais as terríveis brigas
que os fizeram vir me ver. De fato, as coisas estão tão bem, que provavelmente
não haja mais nada a discutir. Conrad está confuso e intrigado com o que acabou
de acontecer. A conversa na escada ocorreu há mais de três anos, e a
desconfiança do médico estava errada — Helen não tinha câncer de seio.
Ansioso por não alimentar o problema, ele rapidamente concorda com a
avaliação da esposa de que a terapia está indo muito bem e não há mais nada a
discutir.
Ted e Vera se moveram suavemente por esses passos. Mas outros casais
podem ter mais dificuldades. Se os Diálogos do Demônio são crônicos, e a
confiança e a segurança desceram a níveis baixos, a conversa Perdoando Ofensas
talvez tenha que ser repetida várias vezes. Da mesma forma, se houver múltiplos
eventos traumáticos. Mesmo nesses casos, contudo, uma ferida geralmente se
sobressai. E quando esta for curada as outras tombam como um castelo de cartas.
Por outro lado, certos eventos, principalmente os affairs, também complicam
o processo de perdão. Porque há muitos pontos de angústia. Mas também nesses
casos normalmente há um momeno que resume a ferida. Lembra-se de Francine
e Joseph? Foi a maneira como ele falou de sua infidelidade que a afastou dele. O
affair foi breve. Os affairs que duram muito tempo são muito mais espinhosos.
Os enganos intencionais de longa duração solapam a imagem que temos do
parceiro como alguém presente e digno de confiança. Como resultado, não
conseguimos definir a nossa realidade e ter segurança sobre o que é
“verdadeiro”. Como quando dizemos a nossos filhos: “É melhor não confiar em
estranhos. Nunca se sabe o que vão fazer”.
As feridas podem ser perdoadas, mas nunca desaparecem. No melhor dos
casos, contudo, integramse nas histórias de apego dos casais como
demonstrações de renovação e conexão.
JOGUE E PRATIQUE
1. O primeiro passo para a cura de uma ferida de apego é reconhecê-la e expressála. Pense numa época
ou num incidente passado quando você foi muito ferido por alguém que era importante, mas não seu
parceiro. O trauma pode ser um dos citados anteriormente ou uma ferida de menor significado. Qual
foi a razão principal da ferida? Foi uma observação, uma ação específica, ou falta de ação da parte do
outro? No incidente relatado acima, Vera diz que o pior momento foi quando percebeu que Ted podia
oferecer consolo a outros durante seus momentos de angústia, mas não a ela. No caso do seu incidente,
a que conclusão inquietante você chegou sobre essa pessoa importante na sua vida? Por exemplo, você
decidiu que ele ou ela simplesmente não se preocupava, e que você não era importante e poderia ser
abandonado? O que você estava desejando quando foi ferido? Se é difícil expressar, veja se pode
imaginar qual teria sido a resposta ideal. Quais movimentos de proteção você adotou? Por exemplo,
mudou de assunto ou saiu do recinto? Ou ficou agressivo e exigiu uma explicação?
Estas são respostas com valor simbólico, que algumas vezes podem funcionar
para feridas muito pequenas, mas geralmente no caso das feridas das quais
estamos falando, só aumentam a dor da pessoa ferida.
3. Você se lembra de uma vez em que feriu uma pessoa amada? Uma época em que ela pode ter se
sentido privada de seu apoio ou consolo, ou até abandonada? Em que você pode até ter parecido
perigoso/perigosa, ou rejeitado a pessoa amada?
Podese imaginar admitindo isso sinceramente a ela? O que você diria? O que
pode ser difícil ao assumir a ofensa? parceiros geralmente usam frases simples
quando falam de ter ferido a pessoa amada, como por exemplo:
• “Eu me afastei. Te deixei na mão.”
• “Não percebi sua dor nem o quanto você precisava de mim. Estava perdido, com medo, com raiva,
preocupado. Então me fechei.”
• “Eu não sabia o que fazer. Fiquei bloqueado/bloqueada me sentindo estúpido/estúpida e
preocupado/preocupada em fazer a coisa errada.”
Pense nos cinco elementos do pedido de desculpas de Ted a Vera. Ele diz que
se importa com a dor dela; que a dor é legíti-ma; assume a responsabilidade das
ações danosas; expressa vergonha por seu comportamento; e garante que vai
ajudála a curar-se. Das ações de Ted, qual seria a mais difícil para você levar a
cabo?
Como acha que a pessoa ferida vai se sentir quando você assumir a
responsabilidade? De que forma o gesto vai ajudála?
4. Agora passe a lidar com uma ferida específica de seu atual relacionamento. Você pode fazer isso
sozinho ou enquanto seu par ouve e tenta entender. Se o compartilhamento parece difícil, comece com
uma ofensa recente relativamente pequena. Depois, se quiser, pode repetir novamente com uma ofensa
mais significativa. Tente tornar tudo o mais específico possível. Feridas grandes e vagas são difíceis de
enfrentar. Talvez você tenha passado por um período difícil quando houve muitas feridas. Houve um
momento em que as feridas se cristalizaram? O que deflagrou a dor? Qual foi o sentimento principal?
Que decisões você tomou quanto ao relacionamento, e que ações desenvolveu para proteger-se?
“Foi na época em que estava começando todos esses cursos e estava muito
insegura”, Mary diz a Jim. “Uma noite, depois do jantar, reuni coragem e
perguntei o que você achava de toda a minha luta e do que tinha conseguido até
então. Queria muito que você reconhecesse que eu tinha conseguido muito e que
acreditava em mim. Mas você nem pareceu ouvir e me senti repudiada. E não
mostrei o quanto estava triste. O quanto eu precisava do seu encorajamento.
Então decidi criar sozinha o meu próprio sonho. E mantive toda essa parte da
minha vida separada, separada de nós.”
5. Veja se consegue dizer ao par qual era sua expectativa naquele incidente doloroso, e como se sentiu
ao não obter resposta. Você também pode dizer como se sente agora ao assumir o risco e expressar o
que você tanto desejava. E enquanto diz, tente evitar acusar o par de ter causado a dor. Isso só vai
sabotar a conversa. Como o par que ouve, tente ouvir as vulnerabilidades do outro e expresse o que
isso evoca em você. Normalmente, quando ouvimos alguém que amamos expressar que necessita de
nós, respondemos com carinho.
6. Se foi você quem feriu, veja se pode ajudar o par a entender por que respondeu da forma como
respondeu no momento da ferida. Talvez tenha que ir fundo e “descobrir” por si mesmo como esta
resposta evoluiu. Pense nisso como um passo para tornar suas ações mais previsíveis para seu par. Veja
se consegue ajudar seu par a sentirse suficientemente seguro para revelar seus sentimentos vulneráveis,
a fim de que você tenha um quadro completo do que o incidente significou em termos de necessidade
de apego.
7. Como o par que provocou a ferida, você é capaz de reconhecer o sofrimento e responsabilizar-se
pela dor infligida, e o mais importante, desculparse?Isso é difícil de fazer. É preciso coragem para
admitir que estamos desapontados com o nosso comportamento; é preciso humildade para confessar
que fomos insensíveis ou indiferentes. Talvez só possamos nos desculpar quando nos deixarmos
comover pela dor e os medos da pessoa amada. Se pudermos fazer isso com sinceridade, estaremos
dando ao amado um grande presente.
8. Como o par ferido você pode aceitar o pedido de desculpa? Se pode, isso coloca vocês dois num
novo patamar. A confiança pode começar a surgir novamente. Você pode buscar a reafirmação quando
lembranças dessa ferida ocorrerem no futuro, sabendo que a pessoa amada vai tentar responder com
sensibilidade. E o par que se desculpa agora pode oferecer o amor que se extraviou durante o evento
original.
9. Finalmente, resuma esse evento doloroso com o seu par, e faça um breve relato de como ele
provocou impacto na relação, de como os dois o superaram, e de como pretendem impedir que
aconteça novamente.
A
Praticamente toda palavra, olhar e toque vibram de ardente desejo. É a
maneira de a natureza fazer com que nos atraiamos. Mas depois do
ímpeto apaixonado de desejo, qual é o lugar do sexo numa relação?
Além de nos atrair, pode o sexo ajudar a nos manter unidos, a construir
uma relação duradoura? A resposta, enfática, é sim. De fato, o sexo é
uma poderosa experiência para o vínculo. A paixão da gamação é a apenas o
hors d’oeuvre. Sexo com amor numa relação de longo prazo é o prato principal.
Mas, de maneira geral, não pensamos no sexo dessa forma. Fomos
condicionados, por nossa cultura e uma miríade de gurus de relacionamento, a
encarar a paixão mais como uma sensação passageira do que uma força
duradoura. Dizemnos que os desejos sexuais que ardem com tanto fulgor no
início da paixão, inevitavelmente decaem, da mesma forma que a nossa relação,
outrora plena de excitação, inexoravelmente se transforma numa prosaica
amizade.
Além disso, fomos ensinados a ver o sexo como um fim em si mesmo.
Satisfazer o desejo, de preferência com um grande orgasmo, é o objetivo. Damos
ênfase à mecânica do sexo, às posições, técnicas, e brinquedinhos que possam
intensificar o êxtase físico. Acreditamos que sexo é principalmente satisfação
física imediata.
De fato, vínculo seguro e sexualidade completamente satisfatória andam de
mãos dadas; estimulamse e ampliamse mutuamente. A conexão emocional gera
ótimo sexo, e ótimo sexo gera conexão emocional. Quando os parceiros estão
emocionalmente acessíveis, receptivos, e engajados, o sexo se torna um jogo
íntimo, uma aventura segura. Parceiros emocionalmente seguros se sentem livres
e confiantes de experimentar toda a sensação nos braços do outro, de explorar e
realizar suas necessidades sexuais, e compartilham suas alegrias, desejos e
vulnerabilidades mais profundas. Quando acontece, fazer amor é realmente
“fazer o amor”.
Qual a efetiva importância de sexo satisfatório num relação amorosa? Sexo
prazeroso, sabe-se,faz parte, mas não é primordial para relacionamentos felizes.
Os educadores sexuais Barry e Emily McCarthy, da Universidade American, em
Washington, DC, fizeram um levantamento de pesquisas nessa área. Eles
concluíram que cônjuges satisfeitos atribuem apenas de 15% a 20% de sua
felicidade a uma vida sexual agradável; mas casais infelizes creditam de 50% a
70% de sua infelicidade a problemas sexuais. Parceiros satisfeitos veem o sexo
como uma das muitas fontes de prazer e intimidade, enquanto parceiros
desanimados automaticamente falam de sexo e o consideram a fonte principal de
problema.
Por que o sexo é um assunto tão importante para os parceiros insatisfeitos?
Porque geralmente é a primeira coisa a ser afetada quando a relação fraqueja.
Mas na verdade o sexo não é o problema verdadeiro. Considere a angústia sexual
como a versão do “canário da mina” do relacionamento. O que realmente está
acontecendo é que um casal está perdendo conexão; os parceiros não se sentem
emocionalmente seguros um com o outro. Por seu lado, isso leva a um declínio
no desejo e a um sexo menos satisfatório, e segue para menos sexo e mais
feridas, para uma conexão emocional frouxa, e assim por diante. Em resumo:
quando não há vínculo seguro, não há sexo; quando não há sexo, não há vínculo.
É fácil entender. Como Harry Harlow observou em seu livro Learning to
Love, os primatas se distinguem dos outros animais por praticarem um sexo
carinhoso cara a cara, durante o qual “expõem abertamente as mais vulneráveis
superfícies do corpo em posições comprometedoras”. Nós simplesmente não
estamos programados para sermos cautelosos e medrosos e ao mesmo tempo nos
excitarmos.
A segurança da nossa conexão emocional define nosso relacionamento tanto
na cama como fora dela. Dependendo do quanto estamos confortáveis com a
intimidade e com a segurança que sentimos com nosso desejo pelo amado,
teremos objetivos diferentes na cama. Chamo a esses três tipos diferentes de
sexo de Sexo Lacrado, Sexo Consolo e Sexo Sincrônico.
SEXO LACRADO
SEXO CONSOLO
SEXO SINCRÔNICO
JOGUE E PRATIQUE
APENAS VOCÊ
Houve algum comentário ou afirmação neste capítulo que fez você pensar na sua
própria vida sexual? Que sentimento então aflorou em você? Escreva. O que
esse sentimento, seja ele uma sensação corpórea ou uma emoção como raiva, lhe
diz sobre a sua própria vida sexual?
Na cama com o parceiro você geralmente se sente emocionalmente
seguro/segura e conectado/conectada? O que ajuda você a pensar assim? Quando
não se sente dessa maneira, como seu par pode ajudar?
Qual é o seu estilo sexual — Lacrado, Consolo ou Sincrônico? Em toda
relação os três estilos provavelmente ocorrerão algumas vezes. Mas se você
habitualmente tende ao Sexo Lacrado ou ao Sexo Consolo, isso revela alguma
coisa sobre seu sentimento de segurança no relacionamento.
Quais são suas quatro mais importantes expectativas na cama? Pense
cuidadosamente antes de responder. Algumas vezes não são as que vêm primeiro
à nossa mente. Parceiros já me contaram que sua mais importante expectativa
depois do sexo era ser abraçado e acariciado afetuosamente, mas nunca tinham
expressado esse desejo ao outro.
Você acha que acaricia e abraça o suficiente em seu relacionamento? Um
simples toque pode expressar conexão, consolo e desejo. Quando você desejaria
ser mais acariciado e abraçado?
Se escrevesse um Guia Breve para o parceiro sexual de ............, e colocasse
seu nome, o que você incluiria? Instruções básicas poderiam incluir respostas ao
seguinte: o que ajuda você a dispor-se emocional e fisicamente ao sexo? O que
excita mais antes e durante a relação sexual? O quanto você gostaria que os
estímulos sexuais preliminares e o ato durassem? Qual é a sua posição preferida?
Você gosta mais de sexo precedido de estímulos ou de sexo direto? Qual é a
maneira de seu parceiro excitar e estimular mais você a atingir ao mais profundo
engajamento na relação sexual? Você é capaz de pedir?
O que torna o sexo mais prazeroso para você? (Pode ser que não seja o
orgasmo, nem o ato.) Quando se sente mais inseguro/insegura ou desconfortável
durante o sexo? Quando se sente mais próximo/próxima de seu parceiro?
Se você é capaz de partilhar o exposto acima com o par, ótimo. Se não, talvez
você possa começar uma conversa sobre o quanto é difícil compartilhar esse tipo
de informação.
COM O PAR
Na maioria das vezes não contamos a nossos parceiros como eles nos comovem
com a espontaneidade de pequenos gestos e palavras, e criam uma sensação de
que somos parte. Fernando, com um pouco de constrangimento, confessa que
quando Inez, depois de tudo o que tinham passado, o apresentou a uma colega,
dizendo “Este é o meu amor, meu marido”, ele derreteu por dentro. Isso o fez
sentirse “precioso” para ela. E pensa nisso todo dia.
Ninguém esquece aqueles momentos em que o amor de repente assume um
papel mais importante. Esses momentos A.R.E. nos acompanham para sempre. E
é importante compartilhálos. Kay diz a Don: “Um momento marcante para mim,
para superar nossas divergências, foi aquela noite quando você, mesmo depois
de 45 anos de casados, me contou o quanto era importante para você que eu
segurasse sua mão. Você sempre estende a mão, e acho que algumas vezes a
seguro, e outras vezes não. Quando me contou o quanto era importante que eu
segurasse sua mão, pois para você isso significa que estamos juntos, e que
podemos fazer qualquer coisa, fiquei comovida. De repente vi você como
alguém que precisava de mim, e não como esse homenzarrão dominador que
gostava de estabelecer regras”.
Numa sessão com outro casal, estamos discutindo como a depressão de
Lawrence arruinou a sua vida. “Não acho que teria conseguido superála sem sua
ajuda”, ele diz a Nancy, sua mulher. “Mesmo quando estava tão isolado você
continuava disponível para mim. Aquele dia em que fui fazer uma entrevista
para um emprego, e deram o lugar para aquele outro sujeito, e voltei para casa
me sentindo o maior fracassado do mundo, lembra o que você disse?” Nancy
balança a cabeça. “Você me beijou e disse, ‘Você é o meu homem. Não importa
o que aconteça. Nós vamos superar isso. Eu o amo, mister’. Eu nunca vou
esquecer isso. E ainda me ajuda quando as coisas ficam difíceis e duvido de
mim.”
Mesmo quando os parceiros são apanhados nos Diálogos do Demônio, um
deles ainda pode descobrir uma empatia que me tira o fôlego. Eu os encorajo a
segurarem esse momento como se fosse uma luz na escuridão enquanto lutam
para renovar seu relacionamento. Maxine, que normalmente tem raiva de Ricky
por seu “silêncio”, de repente diz a ele numa voz baixa: “Eu acho que entendo.
Você parece tão calmo. Mas você está com medo. Você é aquele garotinho
solitário que vejo na fotografia que temos sobre a lareira. O mais solitário
garotinho do mundo. Você nunca estava confortável em lugar nenhum. E agora
está comigo, a mulher mais falastrona que existe, e eu fico te sufocando. Então
você simplesmente se vira para dentro e tenta se acalmar. Isso é tão triste. E deve
continuar sendo solitário, aí dentro”. Rick se lembra disso como o instante em
que de repente se percebeu visto e compreendido, e que embora sua mulher
estivesse com raiva dele, ela o amava.
Manter vivo um amor consiste, na maior parte, em reconhecer esses
momentoschave de conexão e mantêlos num lugar em que os dois possam vêlo,
da mesma maneira que fazemos com fotografias dos bons momentos da família.
Elas nos lembram de como nossa relação é valiosa, e de como é uma conexão
próxima. Elas nos lembram das maneiras singelas com as quais podemos
transformar o mundo do nosso par com o poder de nosso carinho.
Os rituais são uma parte importante da sensação de ser parte. São cerimônias
intencionais, e repetidas, que identificam um momento ou uma relação especiais.
Os rituais nos unem, emocional e fisicamente, de modo a nos fixar no momento
presente de uma maneira positiva.
A religião sempre usou os rituais. Lembro-me de um estudo famoso,
conduzido pelo psicólogo Alfred Tomatis, com um grupo de monges
diagnosticados com depressão. Depois de muitos exames, os pesquisadores
concluíram que a depressão do grupo foi provocada pelo fato de terem
abandonado o ritual de se reunirem duas vezes por dia para entoar cânticos
gregorianos. Eles tinham perdido o sentido de comunidade e o conforto de
cantarem juntos em harmonia. Criar belos momentos musicais era um
reconhecimento formal de sua conexão e de um momento de alegria
compartilhada.
Entre todos os primatas a reunião e a separação são momentoschave de apego.
Percebemos isso com nossos filhos quando eles são pequenos. Normalmente os
beijamos para nos despedir e os abraçamos quando voltam. E por que não
aproveitar esses momentos para reconhecer formalmente nossa relação com a
pessoa amada da mesma forma? Pequenos gestos habituais que contenham a
mensagem “você é importante para mim” fazem muito para manter uma relação
segura e sólida.
Os parceiros, às vezes, têm dificuldades para identificar os rituais de
separação e reencontro. Joel fica sem expressão quando peço que identifique
esses atos de liturgia em seu casamento com Emma. Ele me diz: “Diabos, sei que
toda vez que chego em casa e o cachorro fica em volta de mim abanando o rabo,
eu sempre me sento e dou nele uns tapinhas carinhosos. Mas acho que não sei
fazer isso com Emma. O que devo perceber e fazer deliberada e regularmente
todo dia para nos manter sempre unidos? Eu não tenho certeza”. Enquanto ele
coça a cabeça, Emma dá um risinho e o ajuda. “Bobinho, você não acaricia só o
cachorro! Exceto quando a gente fica meio estranho um com o outro, sempre que
entra na cozinha você me diz, bem carinhoso, ‘Como está o sol da minha vida?’
e depois também me dá uns tapinhas, normalmente no traseiro. E gosto disso de
montão. E conto com isso.” Joel parece aliviado e comenta: “Oh, certo. Ótimo.
Bem, de agora em diante talvez devêssemos transformar isso em duas palmadas
e um beijo. Em você, quero dizer, não no cachorro”.
O que você não percebe costuma desaparecer. Parceiros angustiados algumas
vezes se queixam amargamente da perda desses pequenos rituais. Cathy diz a
Nick: “Você não me abraça mais antes de sair toda manhã. Na verdade, você
nem se despede mais. É como se fôssemos apenas companheiros de quarto.
Moramos em mundos totalmente separados, e para você está ótimo”. Depois de
algumas sessões de conversas A.R.E., Cathy e Nick decidem restabelecer o
ritual, e embelezálo com algumas perguntas sobre o que o outro vai fazer durante
o dia. Algumas vezes estendemos esses rituais à vida da família. Lembro-me que
transformamos o jantar de domingo a dois numa reunião familiar quando meus
filhos começaram a crescer. Também me lembro de meu filho, muitos anos mais
tarde, se queixando; “Estou ocupado. Afinal, por que temos de ter esses jantares
de domingo?” Minha filha menor respondeu, com menosprezo: “Porque é
domingo e somos uma família e é especial, idiota”.
Ajudo casais a desenvolverem seus próprios rituais de ligação, principalmente
a reconhecerem os momentos de reencontro e separação, ou os momentoschave
de fazer parte. Esses são momentos deliberadamente estruturados e que
estimulam a futura conexão. Aqui estão alguns que surgem de tempos em
tempos.
• Regularmente, e deliberadamente, tocar, abraçar e beijar ao acordar, ir dormir, sair de casa, e voltar.
• Escrever cartas ou bilhetinhos para o outro, principalmente quando um vai se ausentar, ou quando o
casal se reconciliou depois de uma briga ou de um distanciamento.
• Participar de rituais espirituais ou de outra natureza, tais como reuniões formais para jantares
especiais da família, plantar as primeiras flores da primavera no jardim da casa, orar ou participar
juntos de eventos religiosos.
• Ligar habitualmente durante o dia para ter notícia ou falar com o outro.
• Criar um ritual pessoal de comunhão, isto é, um momento de compartilhar coisas pessoais e conectar-
se, mas não para falar de problemas ou discussões pragmáticas. Pete e Mara criaram um ritual diário
que começa quando um pergunta: “E então, como você está nesse momento?” Ou: “Então o que vamos
fazer juntos?”. O ritual é o sinal para mudarem o ritmo da conversa para outros assuntos. Sarah e Ned
criaram um momento específico semanal. Às sextas-feiras, depois do jantar, eles esticam o café em
pelo menos meia hora. Eles chamam esse momento de “tempo de compartilhar”.
• Destinar um momento especial para simplesmente ficar junto, por exemplo, tomar café na cama sem
os filhos, todo domingo, ou alterar horários para tomar café juntos todo dia.
• Criar rotina de saídas regulares à noite, mesmo que seja uma vez por mês.
• Uma vez por ano fazer um curso juntos, aprender alguma coisa, ou mesmo fazer um projeto juntos.
• Celebrar dias especiais, como datas comemorativas ou aniversários, de forma muito pessoal. Quando
me sinto tentada a comemorar essas celebrações com quem amo, sempre me lembro de que são
símbolos concretos de que você existe na mente de alguém, e que isso é o que significa apego seguro.
• Decidir reconhecer conscientemente os esforços e vitórias diários de seu par, e sempre valorizálos.
Como já dissemos, pequenos comentários como “Foi difícil, mas você conseguiu”, ou “Você lutou
tanto por aquele projeto, ninguém teria lutado mais”, ou “Realmente vi você lutando para ser um bom
pai”, quase sempre são mais efetivos do que um conselho concreto. Muitas vezes valorizamos esses
fatos em nossos filhos, mas nos esquecemos quando se trata do nosso par.
• Aproveitar as oportunidades para reconhecer publicamente o valor de seu par e da relação. Isso pode
ser conseguido sob a forma de uma cerimônia, como a renovação de promessas, ou pode ser um
simples “obrigado” a seu par na frente de amigos, por ele ter preparado um jantar maravilhoso, ou ter
ajudado a atingir um objetivo pessoal.
Quando casais são apanhados nos Diálogos do Demônio, muitas vezes não existe
uma história coerente, mas apenas uma confusão do tipo “O que está
acontecendo conosco?”. As histórias dos parceiros podem ser distorcidas e
unilaterais. Eles me dizem que tudo está bem na relação, e depois ficam
enfurecidos se um culpa o outro. Dizem que querem carinho, mas depois contam
uma história rejeitando as tentativas de aproximação do outro. A volatilidade
emocional destrói a coerência de sua história e sua habilidade de criar um fio
narrativo consistente. Mas quando os parceiros ficam sintonizados e se “sentem
sentidos”, isso os ajuda a alcançar um estado de equilíbrio, fisiológico e
emocional, de modo que possam ordenar a informação em suas mentes e criar
histórias coerentes de suas emoções e relacionamento.
Nós usamos as histórias para dar sentido às nossas vidas. E usamos as
histórias como modelo para nos guiar no futuro. Nós modelamos as histórias, e
depois elas nos modelam. Uma vez que os parceiros se sintam seguros uns com
os outros, eles podem criar uma história transparente de sua relação, e calcular
como se recuperar de desencontros e tornar o vínculo mais forte. O relato não
apenas resume o passado de uma maneira que tenha sentido, mas lhes dá um
projeto para o futuro.
Sua história de resiliência deveria recapitular como os dois ficaram atolados
na insegurança e depois descobrir maneiras de saírem juntos desse atoleiro.
Nicole e Bert relataram versões de seu relacionamento tão diametralmente
opostas quando vieram me procurar, que um não reconhecia nenhuma
legitimidade na versão do outro. estavam vivendo em casamentos diferentes, e
nenhuma de suas histórias fazia algum sentido. Mas uns meses depois, com a
conexão mais segura, eram capazes de criar uma história coerente e lógica de
como seus problemas se desenvolveram, e como recuperaram seu casamento.
Chamaram a história de “Como N&B Venceram os Demônios e o
Distanciamento e Criaram o Amor Definitivo”.
“Bem, nos apaixonamos instantaneamente”, Bert começa dizendo, “e mesmo
que não soubéssemos o que estávamos fazendo, pois nenhum de nós tinha
experiência de uma relação realmente boa, até com nossos pais, nos saímos
muito bem. Nós nos amávamos. Mas quando nasceram as três meninas, as coisas
ficaram muito sem graça e frias entre nós. O território de Nicole era a casa, e o
meu, o trabalho e os esportes. Depois, quando ela teve esses problemas de saúde
e paramos de fazer amor, realmente perdemos o contato. Acho que foi culpa
minha, de certo modo — não a apoiei o suficiente e me refugiei no trabalho e
nos encontros com os amigos.”
“Não foi só sua”, Nicole se interpõe. “Fiquei muito angustiada e comecei a
criar caso com tudo. Depois, entramos naquela dança tipo ‘Ataques de Nicole’ e
‘Zona de Exclusão de Bert’, até que a única coisa que podíamos ver era o quão
desagradável o outro era. Finalmente percebemos que estávamos perdendo um
ao outro, e passamos a trabalhar duro para compartilhar nossas feridas e
necessidades. Percebemos que nós dois nos sentíamos desesperadamente
solitários.”
Bert pega carona na história. “Acho que a coisa que mais nos ajudou foi
entender que não éramos tão diferentes assim. Estávamos apenas expressando
nossas angústias de modo diferente. Tive que entender que meu distanciamento
fazia Nicole se sentir vulnerável e amedrontada. Quando ela assumiu o risco de
me contar, passei a ter sentimentos novos em relação a ela.”
Nicole sorri para o marido e acrescenta: “Para mim o momentochave foi
quando você me disse que estava exausto de me ouvir falar de todas as falhas
que via em você, e que estava sofrendo e começando a admitir que eu não o
amava. Eu não queria que você pensasse isso. Então nós dois encontramos um
jeito de falar de nossos pontos frágeis, aproximarnos um do outro, e decidimos
nos dar uma outra chance. Quando relembramos e falamos daquela noite em que
nossa última filha nasceu, você me ajudou a superar toda aquela velha angústia e
ressentimento. Você aceitou que não ficou do meu lado contra aquele médico
como achei que você deveria. Aquilo foi muito importante para mim. Percebi
que podia começar a confiar novamente em você”.
Bert vira-se para mim e ri. “Acho que parecemos muito satisfeitos conosco
mesmos, mas é que nos sentimos como tendo feito uma proeza. Sinto que tenho
minha mulher de volta. Achamos que encontramos a maneira de nos aproximar,
e gosto de podermos falar e contar como o conseguimos. Isso me traz
confiança.”
Bert e Nicole não precisaram de muita ajuda para compartilhar o relato.
Algumas vezes preciso induzir um pouco alguns casais a alinhavarem os
elementos de sua história. Se precisarem de ajuda, sugiro que se unam para
incluírem na história o seguinte:
• três adjetivos ou imagens que descrevam sua relação quando ela ficou paralisada pela insegurança ou
pelas espirais negativas. num beco sem saída, exaurido/exaurida, ou campo minado.
• dois verbos que descrevam precisamente como cada um se movia na dança negativa e como foram
capazes de alterar todo eu pressionava, você me ignorava. Mas aprendemos a falar sobre o quanto
estávamos assustados e buscamos um ao outro.
• um momentochave em que se viram de maneira diferente, Eu me lembro daquele sábado de tarde
quando saí de casa angustiada. Voltei depois, entrei no quarto e vi você chorando. A expressão de seu
rosto realmente me emocionou. Senti nossa tristeza, me aproximei e disse que queria estar junto de
você novamente e precisava de sua ajuda. “Tivemos que nos ajudar a superar e conseguir”.
• três adjetivos, emoções ou imagens que expressem como é o relacionamento nesse instante. Muito
divertido, delicioso, abençoado, de mãos dadas.
• uma coisa que estejam fazendo para manter a conexão aberta Por exemplo: acariciar-nos quando
vamos dormir, beijar-nos quando acordamos.
Peço aos casais que imaginem sua história de amor futura. Falamos sobre quais
são seus sonhos pessoais para os próximos cinco ou dez anos. Quanto mais
sentimos um refúgio na pessoa amada, mais confiantes, assertivos e ousados
podemos ser. Quando a pessoa amada está do nosso lado tendemos a ter mais
confiança em nós mesmos, e podemos sonhar de maneira inovadora e ampliada.
Nesta história, os parceiros relatam sua visão do futuro do relacionamento.
Depois pedem apoio um ao outro e discutem como podem os dois tornar a
história uma realidade.
“Pessoalmente, gostaria de ter minha própria empresa”, Steve diz a Marion.
“Mesmo que ela fosse pequena. Mas não pode ser sem o seu apoio. E quero
fazer de modo que você se sinta incluída, não negligenciada. As suas ideias
realmente são muito úteis para mim.” Quando é a vez de Marion, ela diz que está
pensando em finalmente terminar sua graduação. E que fica muito grata por ele
ter se oferecido para cuidar das crianças durante suas aulas noturnas. E depois
menciona que dentro de uns cinco anos poderiam pensar em ter outro filho.
Steve revira os olhos e finge cair da cadeira quando ela fala em outro filho. Mas
concorda que poderão falar do assunto, embora ele tenha alguns temores. Ela
mantém o engajamento com ele e concorda em ouvir suas reservas.
Então falamos sobre como imaginam que será o futuro relacionamento. Os
dois querem manter a proximidade recém-conseguida, e se comprometem a
continuar colocando em prática o que desenvolveram para salvaguardar o tempo
que passam juntos. Marion diz a Steve que quer melhorar a vida sexual deles, e
quer que ele leia alguns livros sobre sexo juntamente com ela. Ele concorda. E
deseja que os dois passem mais tempo com os filhos e menos tempo com a
família dela. Isso é difícil, mas ela consegue ouvir seus argumentos e se colocar
disposta a ficar mais aberta à ideia. Então ela fala dos seus limites. Ela não
“pode deixar de passar” os feriados religiosos com a família dela, e ele respeita.
Ela me olha e diz: “Nada mal, hein? Há poucos meses não conseguíamos nem
concordar com a hora de fazer supermercado, muito menos com esse tipo de
alterações ou planos para o futuro”. Uma conexão emocional segura faz toda a
diferença.
Finalmente pergunto: quando ficarem bem velhinhos, o que gostariam de
poder contar aos bisnetos de sua vida em comum? Steve diz: “Gostaria de contar
que fui um bom marido, e que fiz muita força para fazer minha mulher feliz. Que
ela foi o sol da minha vida. Como é agora”. Nessa hora Marion não consegue
falar. Com lágrimas nos olhos, só murmura: “A mesma coisa”.
JOGUE E PRATIQUE
• Existe neste momento algum tipo de perigo emergente em seu relacionamento, ecos de pontos frágeis
e ansiedades que estão começando a se manifestar? Você pode identificar a última vez que ficou
consciente disso? Seu corpo envia a mensagem “algo não está bem”, e uma emoção súbita o invade.
Você pode dar um nome a essa emoção? Como seu par pode ajudálo? O que pode acalmar e
tranquilizar você e interromper o desenvolvimento do ciclo negativo? Você pode comentar isso com o
seu par?
• Você pode identificar pequenos momentos positivos em seu relacionamento? Eles podem ser muito
pequenos. Sempre que balançarem seu coração e fizerem aflorar um sorriso em seus lábios, eles são
importantes. Seu par sabe desses momentos? Diga a ele ou a ela.
• Você é capaz de selecionar momentoschave de sua relação quando ela passou para outro patamar, e
você ou seu par assumiram o risco de se tornarem mais abertos e mais receptivos? Como isso
aconteceu? O que você ou seu par fez e que permitiu acontecer? Algumas vezes nos lembramos de um
primeiro beijo, uma reconciliação depois de uma briga, ou um momento em que a pessoa amada se
aproximou e nos deu aquilo de que precisávamos.
• Vocês agora têm rituais marcando a capacidade de estarem disponíveis, a separação e o reencontro?
Vocês conscientemente se dizem alô e tchau? Veja se pode listar esses rituais com a ajuda de seu par.
Vocês poderiam criar um novo ritual diário para o vínculo, e que os faria ficar mais abertos, receptivos
e engajados um com o outro?
• Pensem numa discussão para acertar problemas e que sempre termina em frustração para você e o seu
par. Veja se podem anotar suas necessidades de apego e as ansiedades de separação que estão
subjacentes durante a discussão. Como você poderia expressálas a seu par? O que ele ou ela poderiam
fazer para ajudálo a superálas. Se obtiver essa ajuda, como você acha que afetaria a discussão?
• Com o parceiro, elabore os princípios de uma História de Relacionamento Resiliente. Inclua como
você uma vez ficou preso a um Diálogo do Demônio e como superou o diálogo, criou uma conversa
A.R.E., e renovou o sentimento de conexão. O que vocês dois aprenderam com a experiência? Se
vocês tiverem dificuldades para construir a história, discuta isso com o parceiro e use os elementos
mencionados anteriormente nessa conversa. Por exemplo, cite três adjetivos que descrevam o vínculo,
para ajudálo nesse momento. Discutir os exemplos dessa conversa também pode ajudar.
• Junto do parceiro, crie uma Future Love Story, uma descrição do tipo de relacionamento que pretende
ter nos próximos cinco ou dez anos. Escolha uma coisa que você, individualmente, pode fazer nesse
momento e que contribua para tornar o desejo mais próximo, e comente com o parceiro. Como o
parceiro pode ajudálo a tornar realidade seus sonhos pessoais?
• Identifique uma pequena coisa que possa fazer todos os dias para que seu parceiro sinta que você está
disponível para ele ou ela. Pergunte ao parceiro que impacto isso poderia ter na relação.
Vocês acabaram de fazer uma viagem na nova ciência do amor. Essa ciência
nos mostra que o amor é ainda mais importante do que preconizam as canções
mais inebriantes. Mas o amor não é uma força mística, misteriosa, que nos
arrebata, como essas canções sugerem. O amor é nosso código de sobrevivência,
e contém uma lógica depurada que agora podemos entender. Isso quer dizer que
uma relação amorosa resistente, profunda e prazerosa não é um sonho, mas um
objetivo alcançável para todos nós. E isso muda tudo.
PARTE TRÊS
O poder de Abrace -me Apertado
Curando feridas traumáticas — o poder
do amor
“Falar com minha mulher é um alívio das coisas que
acontecem aqui... Como aquele primeiro respiro depois
de muito tempo debaixo d’água.”
JOEL BUCHANNAN, SOLDADO AMERICANO NO IRAQUE,
WASHINGTON POST MAGAZINE, 22 DE FEVEREIRO DE 2006.
T
para tentar entender o mundo aparecem sempre monstros, dragões e
fantasmas. E sempre têm nomes, como a Velha Feiticeira do Norte, o
Dragão de Quatro Cabeças, ou o Anjo da Morte. Esses monstros refletem
nossa sensação de que a vida pode ser muito perigosa e imprevisível.
Quando esses monstros surgem, só temos um recurso — o apoio e o
consolo dos demais. Mesmo quando as coisas parecem irremediáveis, existe
conforto e fortaleza na conexão. Em sua canção “Goodnight Saigon”, Billy Joel
canta como um soldado no Vietnã. O refrão diz: “E todos vamos cair”. E a
canção termina soando como uma afirmação, e não um canto fúnebre. Soldados
reUnidos por vínculos de camaradagem e amor enfrentarão demônios que, caso
estivessem sozinhos, os teriam feito correr.
Minha infância, pagã no pub, mas católica nas salas de aula, foi bastante
segura. Contudo, havia sonhos com o Purgatório e um demônio de olhos
saltados, que se parecia bastante com Madre Tereza, a diretora do colégio,
quando me chamava para prestar contas de crimes como roubar a régua de
Tiffany Amos e golpeála alegremente quando ninguém estava olhando. Eu
costumava rezar para Todos os Santos, minha equipe pessoal de salvadores.
Todos estavam vestidos de azul e branco, e cada um se parecia exatamente como
minha pequena avó inglesa. Minha legião de avós nunca deixou de vir me acudir
e resgatar.
Quando a vida fica perigosa e imprevisível sabemos o quanto precisamos da
ajuda dos outros para enfrentar o desafio que o destino nos reserva. E depois da
luta, quando estamos doloridos e feridos, e toda a máscara de autossuficiência a
que nos aferramos despencou, nossa necessidade dos outros que nos querem bem
assume o papel central. A qualidade de nossos relacionamentos próximos afeta a
maneira como enfrentamos e nos curamos do trauma, e como tudo se move em
círculos, o trauma tem impacto nas relações com as pessoas que amamos.
A palavra trauma vem da palavra grega para ferir. A velha ideia na psicologia
dizia que poucos de nós realmente enfrentamos um trauma ao longo de nossas
vidas. Mas agora estamos começando a perceber que o estresse traumático é
quase tão comum quanto a depressão. Mais de 12% das mulheres nos Estados
Unidos, segundo uma recente pesquisa, relataram um estresse pós-traumático
significativo em algum momento de suas vidas.
Trauma é qualquer evento aterrorizador que instantaneamente modifica nossa
percepção do mundo, deixandonos desamparados e emocionalmente oprimidos.
Já discutimos os traumas causados nos relacionamento pelas pessoas que se
amam, mesmo inconscientemente, na Conversa 5, Perdoando Ofensas. Agora
vamos falar de feridas ainda mais profundas provocadas por pessoas ou eventos
externos às nossas relações amorosas. Ao longo dos anos meus colegas e eu
tratamos sobreviventes de abusos sexuais sofridos na infância, vítimas de
estupros ou violência, pais que sofreram a perda de um filho, e homens e
mulheres que enfrentaram doenças terríveis ou acidentes horrendos. Também
tratamos policiais angustiados com a morte de companheiros, bombeiros
arrasados pela sua incapacidade de salvar todos os que estão em perigo, e
soldados assombrados pelas lembranças das batalhas.
Se você tem um parceiro que responde com amor, você tem uma base segura
no caos. Mas se está emocionalmente sozinho, você está em queda livre. Ter
alguém em quem confiar para obter conexão e apoio torna a cura do trauma mais
fácil. Chris Fraley e seus colegas da Universidade de Illinois descobriram
evidências dessa necessidade no estudo que fiZeram com os sobreviventes do 11
de Setembro que estavam no World Trade Center ou nas imediações. Cerca de
18 meses depois, aqueles que evitaram depender dos outros estavam lutando
contra mais lembranças, hiperirritabilidade, e depressão, em comparação com os
que tinham vínculos seguros com as pessoas amadas. De fato, relatos de amigos
e parentes indicavam que os sobreviventes com essas ligações pareciam até estar
mais ajustados depois do ataque do que antes. Parecia que eles tinham sido
capazes de superar a situação e até crescer com a experiência.
Se não podemos conectar efetivamente com os outros, nossas lutas para
competir com o trauma se tornam menos efetivas, e nosso principal recurso,
nossa relação amorosa, muitas vezes começa a afundar sob o próprio peso. Por
outro lado, enfrentar o monstro tendo a pessoa amada ao nosso lado, nos dá mais
possibilidade de encontrar a força e a resiliência. E permanecer junto fortalece o
vínculo com nossos parceiros.
TRANCANDO OS SENTIMENTOS
Mesmo que num nível instintivo saibamos que precisamos de amor para curar as
feridas de um trauma, nem sempre é fácil abrir-se e buscar esse cuidado.
Muitas vezes, para sobreviver num momento de perigo, Temos que congelar
nossos sentimentos e simplesmente agir. Isso é particularmente verdadeiro para
aqueles que correm riscos em seu trabalho diário. Um bombeiro de Nova York
me diz: “Quando estamos indo para combater um incêndio, especialmente se é
dos grandes, eu vou a mil. Vamos pelas ruas com as sirenes ligadas para salvar
pessoas. E sabemos como salvar. No incêndio, a gente simplesmente age. Não há
lugar para medo ou dúvida. E mesmo que você sinta, simplesmente põe de lado”.
O problema vem depois. Algumas vezes é difícil para nós reconhecer que
estamos feridos. Pensamos que isso nos torna menores ou menos dignos de
admiração como seres humanos. Muitos de nós mantemos esses medos e dúvidas
presos dentro de nós, acreditando que deixar que os sintamos é um sinal de
fraqueza que vai minar nossa força quando o monstro reaparecer. Alguns pensam
que se fechar em si mesmos e manter o monstro isolado numa caixa é a única
maneira de proteger nossa vida familiar. Soldados falam de um código de
silêncio e sobre como têm de enterrar suas experiências de preparação para o
combate para proteger não apenas a eles, mas também as pessoas que amam.
Eles são encorajados a agir dessa forma. Um capelão do exército me diz:
“Falamos aos soldados para não contarem às esposas as más experiências, pois
só vão assustálas e ferilas.E pedimos às esposas que não façam perguntas sobre
as batalhas. Só vão trazer de volta aos maridos lembranças dolorosas”.
Mas os monstros não ficam nas caixas. Eles saem. Esses acontecimentos
alteram para sempre nossa percepção do mundo e a percepção de nós mesmos.
Os traumas destroem nossas presunções de que o mundo é justo e a vida,
previsível. Depois dessas experiências, a maneira como ficamos juntos de nossos
amados e os sinais emocionais que lhes mandamos serão diferentes. O fogo da
respiração do dragão nos muda para sempre.
Um soldado canadense das tropas da ONU encarregadas de manter a paz em
Ruanda, e que presenciou mulheres e crianças serem massacradas, ao voltar para
casa descobre que não consegue abraçar a mulher e filhos. Os filhos parecem ter
os rostos das crianças que morreram. Ele está muito confuso e envergonhado de
contar à mulher. Ele se fecha, por dentro e por fora. A mulher expressa sua
frustração de que “ele nunca voltou para casa”. Ele não está emocionalmente
presente, ela se queixa. Ela não pode “achálo”.
Um soldado, que voltou recentemente do Iraque, e está convalescendo em
casa de uma grande cirurgia, é invadido por uma raiva inexplicável quando sua
mulher sai para ir fazer compras. Ele diz à mulher que nunca mais vai confiar
nela; que a relação deles está acabada. Ela fica totalmente confusa, e depois,
desesperada. Sua confusão termina quando ele finalmente fala do ferimento
recebido no campo de batalha, ferimento que tinha subestimado com a família.
Estendido numa maca, recoberto de sangue, que na maior parte não era seu, ele
recebeu a extremaunção e depois foi deixado sozinho. De repente ela entende
como ele poderia se sentir “ferido” com a ausência dela. Também entende sua
recusa em tomar remédios contra a dor quando ele depois revela que acredita
que sua dor seja uma punição justa pelos “erros” cometidos enquanto em missão.
Temos que ser capazes de descongelar nossos sentimentos e partilhálos com as
pessoas amadas. Isso quer dizer que as pessoas amadas, por um momento,
também precisam ver a cara do dragão. Essa é a única maneira pela qual serão
capazes de entender nossa dor e necessidade, abraçarnos e ajudar a nos
curarmos. O soldado canadense e o soldado ferido no Iraque fizeram o que você
aprendeu a fazer neste livro. Com o apoio dos parceiros, conseguiram se permitir
tocar e compartilhar seus mundos emocionais. Eles não revelaram todos os
detalhes de sua provação, mas aprenderam a expressar o ponto central de sua dor
e de sua luta às pessoas que amavam.
Esses casais foram capazes de ver como a experiência do marido o havia
mudado, do que ele precisava para curar-se,e qual era a melhor maneira de ele
pedir à esposa conexão e consolo. As esposas foram capazes de compartilhar o
quanto foi difícil para elas a época do serviço militar, e o quanto se sentiram
desesperadas com o afastamento de seus parceiros e com a raiva que mostravam
quando voltaram. Quando trabalhamos com soldados e suas esposas, vemos os
dois como guerreiros; um luta numa guerra no exterior, a outra no campo de
batalha doméstico.
Quer compartilhemos explicitamente o que aconteceu ou não conosco, o
trauma é sempre um assunto do casal. Os parceiros sentem a ferroada e o
estresse quando seus amados competem com suas feridas, e também se afligem
com as relações alteradas. Marcie, cujo marido é bombeiro, me diz: “Depois
daquele incêndio quando quatro de seus companheiros morreram, comecei a ter
pesadelos. Eles sempre começavam com o telefone tocando, ou um policial
chegando à porta da casa. E aí eu saberia que Hal tinha morrido. Eu acordava
suando em bicas, e o abraçava na cama. E chorava silenciosamente, para não o
acordar. Eu sabia que ele estava sofrendo muito com o que tinha acontecido.
Ajudou muito quando começamos a nos abrir e a comentar o ocorrido. Ele me
disse que estava sangrando, mas que ainda gostava muito de ser bombeiro. Aí
pude dizer a ele como é difícil às vezes ser mulher de um bombeiro”.
Carol, que se viu envolvida num grande acidente de carro há dois anos, e
ainda sofre de dor crônica e ficou com sequelas físi-cas, fica muito impaciente
quando sua parceira, Laura, chora silenciosamente, mas se recusa a falar; Carol a
acusa de ser fria. Finalmente, em voz baixa, Laura admite: “Tudo bem, estou
perdida. Não consigo lidar com todas essas consultas, advogados, diagnósticos
diferentes, e ainda cuidar sozinha das crianças. E estou tão estressada, que acabo
ficando com raiva de você por ter se ferido. Como posso dizer que também fico
ferida quando você está sofrendo tanto? E que quando você fica irritadiça tudo o
que posso fazer é sair, para não explodir e deixar você ainda mais ferida. Talvez
eu precise que você entenda que o acidente não aconteceu só a você. Aconteceu
a nós duas. O acidente mudou a minha vida para sempre. Eu também preciso de
reconhecimento”.
Algumas vezes nossas emoções e os sinais que enviamos ficam confusos, porque
os efeitos do trauma são muito intensos. Essas repercussões também podem
assustar e confundir nosso parceiro. Imagens do passado, sensibilidade extrema e
reatividade exacerbada, irritabilidade e raiva, sensação de desamparo e
isolamento grave, são as marcas registradas dos traumas. As pessoas que estão
enfrentando os efeitos do trauma muitas vezes resistem a revelar aos parceiros o
que está acontecendo. Sentem que seriam capazes de superar os traumas
sozinhas, ou que o cônjuge não iria entender. O parceiro então vê nesses
sintomas alguma coisa pessoal e se torna angustiado e assume uma posição
defensiva.
Zena e Will estão tendo uma briga a respeito do que realmente aconteceu e
atrapalhou a relação sexual na noite anterior. Will está ofendido com a “rejeição”
de Zena, e Zena está em silêncio e em lágrimas. Finalmente Zena conta a Will
que, enquanto estava deitada na cama e ouviu os passos dele subindo as escadas,
viu-se de repente no estacionamento onde ela foi estuprada. Ela ouviu de novo
os passos pesados vindo por suas costas, e ficou inundada de medo. A última
coisa que ela queria, naquela hora, era fazer amor. Ao ouvir a revelação, o rosto
de Will transmuda de feroz ressentimento para compaixão e carinho. A confissão
de Zena é crucial. Evitou que Will tomasse a rejeição como uma afronta pessoal
e ficasse com raiva, o que teria confirmado para Zena sua necessidade de ficar
sempre em guarda. Zena explica que seu corpo reage como se ainda estivesse
correndo perigo, embora saiba que está segura em casa. Will é capaz de consolar
Zena enquanto ela chora com a sensação de perda de segurança e controle.
Para nosso sistema nervoso é natural excitar-se uns momentos com o choque
de ter encontrado o dragão. Nosso cérebro está sempre alerta, procurando sinais
de perigo, e apronta todas as defesas ao menor sinal de ameaça. Nós não temos
apenas imagens recorrentes, mas ficamos com a pilha a toda. Não podemos
dormir, e nos tornamos imprevisíveis e facilmente irritáveis. Infelizmente, essa
irritabilidade muitas vezes acaba sendo dirigida ao nosso parceiro. E ele por sua
vez também fica tenso e ansioso. O estresse traumático permeia toda a relação.
Ted, que serviu três anos no Iraque, perde a calma quando outro motorista o
fecha e o faz ir para o acostamento da estrada. Os acostamentos são territórios
muito perigosos no Iraque. Ted persegue o outro motorista por quilômetros, em
alta velocidade, até conseguir bater com o para-choque de seu carro no para-
choque traseiro do outro carro. E diz um palavrão e xinga a mulher, Doreen,
quando ela pede que ele diminua a velocidade e se acalme. Muito depois ele
consegue enxergar o que aconteceu e pede desculpas, e juntos, eles discutem
maneiras diferentes de lidar com esse tipo de situação. A linha divisória entre
ficar ansioso e explodir de raiva é tênue e facilmente ultrapassada, mesmo nos
melhores dos tempos. Depois de um trauma, ela fica ainda mais tênue. Ted
encontra dificuldades em aceitar a revelação de Doreen de que seu
temperamento a assusta. Eles discutem a dificuldade, e escolhem algumas frases
que Doreen pode usar para indicar a Ted que a “raiva e a pilha” estão assumindo
o controle, e que é hora de se acalmar. Agora eles se sentem mais próximos.
FICANDO ISOLADO
A
amorosas nos proporcionam uma rede de intimidade confiável que nos
permite enfrentar a vida e vivêla bem. E isso é o que dá sentido à nossa
vida. No leito de morte, para a maioria de nós o que mais importa é a
qualidade de nossa conexão com as pessoas que mais amamos.
Instintivamente, sabemos que aqueles que captam os imperativos do
apego vivem vidas melhores. Contudo, nossa cultura nos encoraja a competir, e
não a conectar. Mesmo que tenhamos sido programados por milhões de anos de
evolução a procurar implacavelmente afinidade e conexão, persistimos definindo
as pessoas saudáveis como aquelas que não precisam das outras. Isso é
especialmente perigoso numa época em que nosso sentido de comunidade está
sendo diariamente corroído por uma interminável preocupação em fazer mais em
menos tempo e encher nossas vidas com cada vez mais bens.
Estamos construindo uma cultura de separação que está em confronto com a
nossa biologia. Sabemos, como Thomas Lewis e seus colegas afirmam no livro
A General Theory of Love, que se “alimentarmos e vestirmos um bebê humano,
mas o privarmos de contato emocional ele morrerá”. Mas somos ensinados a
acreditar que os adultos são um animal diferente. Como conseguimos chegar até
aqui?
O psiquiatra Jonathan Sahy, em seu livro sobre o trauma dos combates,
Odysseus in America, lembranos que há “dois importantíssimos conceitos
universais humanos”: todos nós nascemos desamparados e independentes, e
todos nós somos mortais, e sabemos disso. A única maneira saudável de lidar
com essa vulnerabilidade é procurarmos o outro e apoiar-nos. Então, acalmados
e fortalecidos, podemos sair para o mundo.
A teoria do apego reconhece que a nossa necessidade de conexão emocional
com os outros é absoluta. Milhares de estudos sobre psicologia do
desenvolvimento com mães e filhos, pesquisas sobre vínculos entre adultos, e as
investigações da moderna neurociência, confirmam que quando mantemos
relacionamentos estreitos somos verdadeiramente interdependentes. Não somos
como pequenos planetas separados girando uns em redor dos outros.
Essa dependência sadia é a essência do amor romântico. Os corpos das
pessoas que se amam são ligados por um dueto neural. Uma pessoa envia sinais
que alteram os níveis hormonais, a função cardiovascular, os ritmos corpóreos, e
até o sistema imune do outro. Numa conexão amorosa a oxitocina, o hormônio
do amor, inunda os corpos dos amantes, gerando uma alegria calma e a sensação
de que tudo vai bem no mundo. Nossos corpos são programados para esse tipo
de vínculo.
Até a nossa identidade forma um tipo de dueto com os que estão mais
próximos de nós. Uma relação amorosa aumenta a sensação de quem somos e
nossa confiança em nós mesmos. Você não estaria lendo este livro se eu não
tivesse encontrado uma maneira de conectar com a crença de meu marido de que
eu poderia escrevêlo, e se minha capacidade de aferrar-me às palavras de apoio
dele não me tivesse impelido a continuar escrevendo, em vez de desistir. As
pessoas que amamos, sem dúvida, nos tocam o coração e a mente, e quando
fazem isso, elas nos transformam.
A qualidade do amor que recebemos nos coloca numa determinada trilha.
Segundo Jeff Simpson, da Universidade de Minnesota, se analisarmos o quanto
crianças de um ano são seguramente conectadas com suas mães quando
colocadas na situação estranha, poderemos prever o quanto essas crianças serão
socialmente capazes na escola primária, e o quanto suas amizades na
adolescência serão próximas. Uma relação segura com a mãe e a intensidade dos
vínculos das primeiras amizades também prenunciam a qualidade das relações
amorosas desses indivíduos quando tiverem 25 anos. Nós somos a história de
nossas relações.
Mesmo sabendo tudo isso, eu ainda tenho que repassar essas lições toda vez
que perco a conexão com um ser amado. Ainda tenho que enfrentar aquele
milésimo de segundo de dúvida: culpar, tentar e assumir o controle, rejeitar,
vingar, fechar-se e afastar-se, ou respirar profundamente e sintonizar as minhas
emoções e as da pessoa amada, arriscar, buscar, confiar, abraçar.
Quando os parceiros estão unidos por um vínculo forte e seguro, isso fortalece a
conexão mútua. O círculo da receptividade afetiva se amplia como as ondas
provocadas por uma pedra atirada num lago. Compartilhar um relacionamento
amoroso aumenta nosso carinho e compaixão pelos outros, tanto no âmbito de
nossa família quanto da nossa comunidade.
Numa pesquisa pioneira sobre o apego, Mary Ainsworth descobriu que já aos
três anos de idade, as crianças que se sentem mais seguras com as mães têm mais
empatia pelos outros. Não temos que nos preocupar com segurança em relação
às pessoas amadas, naturalmente temos mais energia a dar aos outros. Vemos os
outros mais positivamente, e estamos mais desejosos de nos engajar
emocionalmente. Quando nos sentimos mais seguros ficamos mais gentis e
tolerantes com os outros.
Os psicólogos Phill Shaver e Mario Mikulincer mostraram em seus estudos
que o simples fato de fazer uma pausa e rememorar os momentos em que alguém
se importou com você reduz instantaneamente sua hostilidade em relação a
pessoas que são diferentes de você, ainda que por um breve período. A
afirmação apoia o método de meditação budista que busca ampliar a compaixão
quando pensamos em como alguém é amado por um outro. A jornalista
especializada em ciência Sharon Begley, em seu livro sobre neurociência e
budismo, cita o Dalai Lama quando ele afirma que quando os tibetanos se
sentem em perigo eles gritam “Mãe” em busca de consolo. Isso parece pelo
menos tão útil quanto algumas frases mais agressivas que nós, americanos,
utilizamos!
AMOR ENTRE PARCEIROS, AMOR EM FAMÍLIA
SOCIEDADE
Famílias amorosas são a base da sociedade humana. Como o poeta Roberto Sosa
escreve: “Abençoados são os que amam, pois deles é o grão de areia que
sustenta o centro dos mares”. O círculo em expansão do engajamento e do
comprometimento em relação aos outros não termina nas pessoas amadas ou até
nas futuras famílias que elas geram. Ele continua a se expandir, para ajudar a
criar comunidades mais afetivas, e por fim, um mundo mais afetivo.
Entender nossa necessidade de amor, e como o amor funciona, é crucial se
desejamos construir um mundo que permita que essas necessidades sejam
correspondidas, e reflita o melhor da nossa natureza. O ser humano necessita, e
está programado, para conectar-se com os outros. É da nossa natureza
vincularnos intimamente com alguns poucos, mas depois, tendo aprendido as
lições da afinidade, conectarnos com outros, nossos amigos, colegas, nossa tribo.
Quando estamos tranquilos e serenos, oferecemos aos outros apoio e afeição,
porque reconhecemos que eles são exatamente como nós, humanos e
vulneráveis. De fato, vibramos com a camaradagem que nos retira de nosso
pequeno mundo e nos torna parte de um todo.
Eu cresci numa cidade pequena e pobre da Inglaterra depois da Segunda
Grande Guerra, onde a sensação de que todos devíamos nos unir para sobreviver
era tangível. Todos vinham ao pub — o clérigo, o comodoro, o jornaleiro, o juiz,
o médico, o balconista, a dona de casa, e as prostitutas. Os mais velhos passavam
a noite num canto jogando baralho e discutindo política. Vagabundos que
perambulavam de cidade em cidade recebiam abrigo, uma cerveja, e um enorme
prato de ovos com bacon que minha mãe preparava, antes de seguirem caminho.
Soldados com crise nervosa e sufocados pelas memórias da guerra eram levados
para um cômodo nos fundos, consolados e confortados. Os enlutados recebiam
um abraço, um uísque, e talvez uma canção alegre e desafinada tocada no piano,
uma cortesia de minha avó. Naturalmente havia também brigas, discussões,
preconceitos e crueldades. Mas no final havia a sensação de que todos estávamos
no mesmo barco. Sabíamos que precisávamos uns dos outros. E na maioria do
tempo sempre havia um ou dois de nós que conseguia demonstrar compaixão.
sentirse conectado, sentirse com alguém, vai sempre de mãos dadas com o
sentimento por essa pessoa. Podemos aprender a sentir solidariedade e
compaixão pelos outros com a Bíblia, o Corão e os ensinamentos de Buda. Mas
eu acho que primeiro temos que aprender por meio da ternura do abraço de um
pai ou da pessoa amada. Talvez então possamos passar de forma ativa e
intencional para círculos cada vez mais amplos do mundo todo.
De fato, durante séculos, poetas e profetas vêm nos assegurando de que todos
seríamos melhores se amássemos mais uns aos outros, e que deveríamos fazer
exatamente isso. Na maioria das vezes, essa mensagem nos é passada sob a
forma de regras morais e ideias abstratas. Mas o problema é que a mensagem
não parece ter muito impacto, a menos que ela nos toque emocionalmente, que
nos sintamos conectados pessoalmente a um outro ser humano. Então podemos
nos sintonizar com a dor e a tristeza do outro como se fossem nossas.
Como muitas pessoas, passei a contribuir com algum dinheiro para os fundos
de ajuda às vítimas de terremotos e outras catástrofes. Mas é difícil
comprometernos com problemas imensos ou com multidões sem rosto. Para
mim, é muito mais fácil e mais prazeroso doar mais dinheiro todos os meses às
famílias de duas meninas da Índia, que estão registradas num plano de pais
adotivos de uma agência humanitária do Canadá. Tenho retratos delas. Sei os
seus nomes e os nomes de suas cidades. Estou sabendo que uma das famílias
agora tem uma cabra e que a outra dispõe de água potável pela primeira vez.
Sonho em poder ir visitálas. Sintome ligada a essas mães estoicas que estão do
lado das filhas nas fotos que chegam de vez em quando. A moderna tecnologia
torna possível esse elo, e permite que alguém como eu, do outro lado do mundo,
possa estabelecer uma conexão e ajudar.
Três anos atrás, numa pequena e pitoresca comunidade de antigas casas de
madeira, às margens de um rio nas colinas próximas de Ottawa, surgiu uma
organização chamada Wakefield Grannies. Começou com uma pessoa, Rose
Letwaba, uma enfermeira sul-africana que fez uma palestra num domingo de
manhã, na igreja junto ao rio. Ela falou das avós de uma favela de
Johannesburgo que estão cuidando de seus netos, todos órfãos da AIDS, numa
pobreza tão acachapante, que as escovas de dente das crianças precisam ficar
sempre trancadas, dado o valor que têm. Umas doze avós de Wakefield se
juntaram e cada uma se conectou a uma avó sul-africana, e começaram a
contribuir com dinheiro para aquela família. Agora são 150 os grupos de Avó-a-
Avó, no Canadá e nos Estados Unidos.
O livro Three Cups of Tea, de Greg Mortenson, o alpinista e enfermeiro
americano, é o relato de uma conexão pessoal que se transformou numa ação
humanitária. Em 1993, Mortenson perdeu-se nas montanhas do Paquistão depois
de tentar escalar a Montanha K2. Ele acabou chegando ao pequeno povoado de
Korphe. Os moradores salvaram sua vida e criaram um vínculo especial com
Mortenson. Haji Ali, o líder do povoado, explicou que em Korphe “da primeira
vez que você partilha o chá com alguém, você é um estranho. Da segunda vez,
você é um convidado. Da terceira vez, você é da família”.
Mortenson se tornou membro da família. Seus sentimentos se fortificaram
com lembranças de sua irmãzinha, Christa, que tinha morrido depois de uma
longa luta contra a epilepsia. Ele a via nos rostos das crianças de Korphe. A vida
delas era uma luta constante, como tinha sido a de Christa. Ele quis visitar a
escola do povoado, e foi levado a um lugar onde 82 crianças se ajoelhavam no
chão gelado para rabiscar contas de multiplicar na poeira com o auxílio de
gravetos. A escola não tinha uma casa. E como o povoado não podia pagar o
salário de um dólar por dia, na maior parte do tempo não havia um professor.
“Meu coração ficou despedaçado”, Mortenson relata. Ele se virou para Haji
Ali e disse: “Vou construir uma escola, eu prometo”. Nos 12 anos seguintes,
Mortenson e o seu Central Asia Institute construíram mais de 55 escolas, muitas
só para meninas, nas montanhas do Paquistão e do Afeganistão. Mortenson
observa que pelo custo de um míssil é possível construir centenas de escolas que
ofereçam uma educação equilibrada. Essa é um tipo diferente de guerra contra o
eterno dualismo do “nós” contra o “eles” que alimenta o extremismo. O exemplo
de Mortenson enfatiza o poder da compaixão e da ligação afetiva.
Essas histórias me dão a esperança de que podemos aprender com o amor,
alimentálo com nossos parceiros e a família, e então, com a empatia e a coragem
que ele nos ensina, descobrir maneiras de leválo para o mundo e fazer a
diferença. A escritora Judith Campbell sugere: “Quando seu coração falar,
registre”. Essas histórias começaram com as pessoas se mostrando abertas e
receptivas ao sofrimento dos outros. Elas falam ao poder da capacidade de
reação emocional e da conexão pessoal para fomentar um mundo melhor.
As visões do amor e do afeto apresentadas neste livro coincidem com os
pensamentos do monge trapista e escritor Thomas Merton, que acreditava que a
compaixão tinha, no final das contas, de ser baseada numa “aguda consciência
da interdependência de todos os seres vivos, que fazem parte uns dos outros e se
envolvem uns nos outros”. Parece-me que, como espécie, se queremos realmente
sobreviver neste frágil planeta azul e verde, teremos de aprender a superar a
ilusão da separação e admitir que somos todos mutuamente dependentes.
Aprendemos isso com as nossas relações mais íntimas.
* * *
É difícil terminar um livro que fala de amor e afeto. Estas páginas detalharam a
nova ciência do amor e como ela auxilia as pessoas que se amam a criarem um
vínculo seguro. Mas nós nunca chegaremos a compreender completamente o
amor. Quanto mais descobrimos, mais saberemos o quanto nos falta descobrir.
Como o poeta E. E. Cummings observou: “Sempre uma bela resposta que sugere
uma bela pergunta”.
Agradecimentos
m primeiro lugar, quero agradecer a todos os casais com os quais tive a
E
honra de trabalhar durante os últimos 25 anos. Vocês me fascinaram,
cativaram e educaram. No drama da separação e da união em que
consiste uma sessão de terapia de casais, explorei com vocês a realidade
do que significa amar, ficar com o coração dolorido, e descobrir um
caminho para uma ligação profunda e enriquecedora.
Em segundo lugar, quero agradecer aos meus colegas do Ottawa Couple and
Family Institute e do International Center for Excellence em TFE, especialmente
à Dra. Alison Lee e a Gail Palmer. Sem elas, o Institute e o Center não
existiriam; com elas, fui capaz de criar uma família profissional.
Gostaria de agradecer a todos os meus maravilhosos alunos da School of
Psychology, da Universidade de Ottawa, e que se lançaram nos processos de
estudos dos resultados e mudanças em terapia de casais com uma paixão e um
comprometimento que se igualam aos meus. Eles assistiram comigo a milhares
de gravações de sessões de terapia.
Agradeço aos meus colegas da School of Psychology da Universidade de
Ottawa, os quais colaboraram comigo e me apoiaram, especialmente a Dra.
Valerie Whiffen. Também, aos colegas que ensinam a TFE comigo, e escolheram
esse caminho para ajudar casais do mundo todo, entre eles o Dr. Scott Woolley,
da Universidade Alliant, em San Diego, o Dr. Jim Furrow, o Dr. Brent Bradley, o
Dr. Martin North, Doug Tilley, a Dra. Veronica Kallos, Yolanda von Hockauf, a
Dra. Leanne Campbell, a Dra. Judy Makinen, e Ting Liu, que traduziu o livro
fundamental sobre a TFE para o chinês. Um agradecimento especial vai para o
Dr. Les Greenberg, que formulou comigo a primeira versão da TFE na
Universidade British Columbia.
E um obrigado especial vai para os meus colegas de psicologia social,
particularmente o Dr. Phill Shaver e o Dr. Mario Mikulincer, e outros que foram
pioneiros na aplicação da teoria do apego às relações entre adultos, e que
toleraram uma psicóloga aloucada em seu meio. Nos últimos 15 anos eles
produziram uma explosão de pesquisas e estudos e visões enriquecedoras —
conhecimento que eu levei para as minhas sessões com casais e usei para mudar
a vida das pessoas. Também agradeço ao meu querido colega John Gottmnan,
por todos os debates e discussões, e pelo maravilhoso apoio e encorajamento que
me deu ao longo dos anos.
Gostaria de agradecer a Tracy Behar, minha editora na Little; Brown, por seu
incansável entusiasmo e ousada confiança em mim e nesse projeto; a minha
agente, Miriam Altshuler, por seu completo profissionalismo e competente
orientação; à editora freelance Anastasia Toufexis, que leu e selecionou
cuidadosamente todos os rascunhos deste livro, evitando que o leitor tivesse que
fazer o mesmo.
Preciso agradecer também a meus três filhos Tim, Emma e Sarah, por terem
tolerado minha obsessão com este livro, e todos os amigos de Ottawa que
acreditaram em mim. Tive muita sorte de descobrir exatamente o que queria
fazer, como pesquisadora, professora, escritora e terapeuta, mas meu verdadeiro
aprendizado sobre o amor e os relacionamentos foi conseguido, naturalmente,
em minha própria família. Mas acima de tudo, e sempre, devo agradecer a meu
incrível companheiro, John Palmer Douglas, que é meu refúgio, minha base
segura, minha inspiração.
Glossário
2 Ds Termo usado para se referir a pontos sensíveis em todo relacionamento, ou
pontos frágeis, principalmente a sensação de estar destituído de conexão ou
carência emocional, e a sensação de estar desamparado e desdenhado como
indigno do amor pelas pessoas amadas. Os dois resultam no sentimento de
isolamento e vulnerabilidade.
A.R.E. Acrônimo para uma conversa que lida positivamente com a pergunta
“Você está disponível para mim?”. A teoria do apego, e pesquisas sobre o
tema, nos indicam que a Acessibilidade Emocional (Posso aproximar-me?
Você vai prestar atenção em mim?), a Reação Emocional (Posso depender de
você para se importar com meus sentimentos?), e Engajamento (Você vai me
valorizar, me colocar em primeiro lugar, e continuar ao meu lado?)
caracterizam interações entre pessoas unidas por um vínculo seguro.
Alarme de apego Qualquer sinal — de uma sensação interna, da pessoa amada,
ou de uma situação — que ativa nosso sistema de apego, ou emoções
orientadas para o apego, ou nosso sentimento de que precisamos dos outros.
Uma súbita sensação de dúvida de que um par se importa conosco, um
comentário depreciativo ou uma situação de ameaça, nos leva a questionar o
quão disponível e receptivo nossos pares são.
Alças Imagens, palavras ou frases descritivas que captam Nossos sentimentos e
vulnerabilidades mais íntimos. Uma vez que encontremos as alças, podemos
utilizálas para abrir a porta e explorar nosso mundo interior.
Amígdala Área com a forma de uma noz, situada no mesencéfalo, e associada a
rápidas respostas emocionais, especialmente no processamento do medo.
Parece desempenhar um papel crucial nas respostas do tipo “lute ou fuja”.
Quando você pula do caminho ao ver um carro se aproximando rapidamente,
a amígdala acabou de salvar sua vida.
Codependente Termo aplicado a uma pessoa que facilita, embora muitas vezes
não intencionalmente, o comportamento disfuncional da pessoa amada. Por
exemplo, o par de um alcoólico/alcoólica que deseja que ele pare de beber,
mas não insiste para que o problema seja enfrentado. A implicação é que a
dependência do par no relacionamento evita que ele ou ela enfrente o
alcoólico.
Conforto do contato Uma frase usada pelo psicólogo Harry Harlow para
descrever a resposta de bebês macacos com o contato físico como uma mãe
“macia”, feita de pano felpudo. Conforto do contato é, na visão de Harlow,
essencial para ajudar bebês a se acalmarem em momentos de estresse e
ansiedade. Em seus estudos, os bebês macacos procuravam o conforto do
contato antes da comida.
Conversa Neste livro, uma tentativa deliberada de falar com o par, de maneira
que cada um aprenda com a relação. As sete conversas transformadoras
ensinam como interagir, e não apenas como falar.
Cortisol Um importante hormônio do estresse, liberado pelas glândulas
suprarrenais para mobilizarem o corpo, particularmente a amígdala, para
enfrentar emergências. Reações críticas hostis dos pares desencadeiam
especialmente altos níveis de cortisol. Se produzido constantemente, ou em
excesso, pode causar danos ao corpo, principalmente ao coração e ao sistema
imunológico. Existem também evidências sugerindo que o cortisol destrói
neurônios do hipocampo, comprometendo a memória e o aprendizado, e
facilitando a supergeneralização de sinais de perigo. Por exemplo, sabemos
que ruas escuras na calada da noite são potencialmente perigosas, mas sob
estresse prolongado podemos começar a pensar que todas as ruas, a partir do
entardecer, são perigosas.
Dependência afetiva Um sentimento positivo de ligação segura que nos permite
sintonizar com a nossa necessidade dos outros, e pedir apoio e conforto, e
sermos atendidos. Este estado fomenta a conexão com os outros e nos ajuda a
enfrentar o estresse, como também explorar e lidar com o mundo.
Diálogos do Demônio Os três padrões de interação que geram ciclos de
feedback autoalimentados e fazem a conexão segura cada vez mais difícil.
Esses padrões são: De quem é a Culpa, ou críticas e queixas mútuas; a Polca
do Protesto, em que uma pessoa protesta contra a falta de uma conexão
emocional segura e a outra se defende e se afasta (a Polca também é
conhecida como o ciclo ataque/fuga); e Estacar e Fugir, em que os dois se
defendem se afastando em autodefesa.
Emaranhado Proximidade extrema, que impede funcionar separadamente, e
com autonomia. No passado, a falta de separação, muito mais do que a falta
de uma conexão segura e positiva, era considerada como o problema central
nas famílias conflituosas e nas relações dos casais. Sanidade era considerada a
capacidade de se separar dos outros, a permanecer objetivo e no controle das
emoções, e não permitir que as pessoas amadas tivessem tanta influência nas
decisões próprias.
Emoção Do latim emovere, cujo sentido inicial era de “mover para fora”.
Emoção é um processo fisiológico que nos orienta nos momentos mais
importantes de nosso mundo e nos prepara para agir. É mais bem entendida
como um processo. Consiste de uma percepção muito rápida de que alguma
coisa é muito importante, seguida de uma resposta do corpo, um esforço para
entender o significado do sinal, e a ação. As emoções, expressas
principalmente pela voz e pelo rosto, também mandam rápidos sinais para os
outros. Neste livro ora utilizo a palavra emoção, ora a palavra sentimento.
Ferida de apego Uma sensação de traição e/ou abandono num momentochave
de necessidade que, se não atendida ou curada, corrói a confiança e a conexão,
e desencadeia ou alimenta a angústia no relacionamento e a insegurança no
par.
Figura de apego Uma pessoa que amamos ou a que estamos emocionalmente
ligados e a quem vemos como um potencial refúgio seguro e fonte de
conforto. Normalmente, um dos pais, irmãos, par romântico, ou um amigo de
toda a vida. Num nível espiritual, Deus também pode ser uma figura de apego.
Indiferenciado Conceito utilizado em terapia familiar indicando que uma pessoa
é incapaz de distinguir entre sentimento e pensamento racional, e é mais
reativa nos relacionamentos, e menos capaz de escolhas próprias. A
implicação é que esta pessoa é muito dependente de outras em sua autoestima.
Se o terapeuta acredita que uma falta de diferenciação é o problema num
relacionamento angustiado, então a melhoria envolve ajudar os pares a
criarem limites claros um com relação ao outro, e focar em decisões
independentes.
Neurônios-espelhoCélulas nervosas que se ativam quando se estabelece
empatia, e na mesma área do cérebro das células nervosas da pessoa cujas
ações estamos observando. Essa parece ser a base psicológica da imitação,
nossa habilidade de participar das ações do outro. Esses neurônios nos ajudam
a perceber as intenções da outra pessoa, e nos ajudam a conectar, literalmente,
com o que ela sente. Captamos os sentimentos; ecoamos o estado. Os
cientistas sugerem que quanto mais ativado está o sistema de neurônios-
espelho de uma pessoa, mais capacidade de empatia ela tem.
Oxitocina O neurotransmissor mais associado com o vínculo entre mães e filhos
e entre parceiros sexuais. Também conhecido como “o hormônio do amor”, a
oxitocina é sintetizada na região do cérebro conhecida como hipotálamo, e
que só os mamíferos possuem. Desempenha um importante papel durante a
amamentação (ajuda a expelir o leite) e no trabalho de parto e orgasmo
(contrai o útero). Também parece estimular contato íntimo e comportamento
de afiliação com figuras de apego, como também na interação social positiva
no geral. Quanto maior nosso índice de oxitocina, tanto mais desejamos nos
aproximar e relacionarnos com os outros. A oxitocina parece inibir
comportamentos agressivos ou defensivos. Ela também deprime a produção
dos hormônios do estresse, como o cortisol. O contato da pele, o toque e as
carícias estimulam a produção da oxitocina.
Pânico primal O sentimento, muitas vezes provocado pela separação de uma
figura de apego importante. Esse pânico nos estimula a chamar, buscar, e
renovar o contato com a pessoa amada que proporciona proteção e um
sentimento de segurança. Jaak Panksepp, o teórico das emoções que cunhou o
termo, vê o pânico primal como um sistema específico de ansiedade no
cérebro que é especialmente aguçado entre os mamíferos. Ele se refere a ele
como um “código neural ancestral” que estimula nosso cérebro a produzir
hormônios do estresse, como o cortisol, diante de uma separação; e o
hormônio calmante oxitocina, quando estamos novamente em contato
próximo com a pessoa amada.
Protesto de apego Uma reação à separação percebida numa figura de apego.
Muitas vezes é a primeira resposta à desconexão emocional e física. O
protesto objetiva sinalizar angústia para as figuras de apego e fazê-las
responder. É caracterizado pela raiva e a ansiedade.
Ressonância Termo que na física denota uma vibração de empatia entre dois
elementos e que os leva a repentinamente sintonizarem sinais e igualar ritmo e
vibração. Isso cria uma resposta prolongada. Nos relacionamentos, existe
ressonância quando estamos sintonizados com o outro fisiologicamente.
Então, os estados emocionais convergem. Ficamos no mesmo comprimento de
onda, de modo que literalmente compartilhamos a experiência do outro. É
essa ressonância que deflagra uma onda de emoção numa multidão, por
exemplo, nos casamentos quando os votos são trocados e o feliz casal deixa a
igreja juntos, ou nos funerais de soldados quando o corneteiro toca o adeus.
Segurança adquirida Conceito de que nossas expectativas de apego e de
receptividade podem ser revisadas à medida que adquirimos experiência nos
relacionamentos. Mesmo que tenhamos uma história negativa, por exemplo
com pai ou mãe, se tivermos um par amoroso/amorosa, poderemos “adquirir”
a sensação de segurança em nosso relacionamento.
Simbiose Na teoria psicológica, um estado no qual uma pessoa está mental e
emocionalmente amalgamada com outra. Originalmente, por exemplo,
acreditava-se que um bebê se sentia como parte do corpo da mãe. Admitia-se
que crescer era principalmente um processo pelo qual se ficava cada vez mais
separado e autônomo. A inabilidade de separar-se poderia levar à doença
mental. Por exemplo, a esquizofrenia outrora era considerada o resultado de se
estar amalgamado, geralmente com a própria mãe. A ideia é parte da escola de
pensamento segundo a qual “a dependência e a proximidade são perigos para
a sua saúde mental”. Teorias mais recentes questionam a validade deste
conceito.
Sincronia Um estado de sincronia e receptividade emocionais mútuas.
Situação Estranha A célebre e fundamental experiência criada por Mary
Ainsworth e John Bowlby para estudar o apego entre mães e seus bebês.
Envolve separar um bebê de sua mãe num ambiente não familiar, onde o bebê
provavelmente vai se sentir indeciso e ansioso, e codificar suas respostas
emocionais quando a mãe retorna.
Vasopressina Um hormônio produzido no cérebro, intimamente relacionado à
oxitocina, e que tem efeitos similares. Em pesquisas com ratos do campo
machos, a vasopressina atinge o pico durante a excitação sexual; e a oxitocina,
durante a ejaculação. A vasopressina parece deflagrar uma preferência por
uma parceira determinada, e uma tendência agressiva de defendê-la de outros
pretendentes. Ela também parece deflagrar um cuidado mais intenso com a
prole.
Para mais informações sobre a TFE, ou para localizar um terapeuta treinado na
TFE, acesse www.eft.ca.
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Sobre a autora
Dra. SUE JOHNSON dirige o Couple and Family Institute and
A
International Center for Excellence in Emotionally Focused Therapy,
em Ottawa, no Cana-dá. É também docente da Clinical Psychology, na
Universi-dade de Ottawa and Research Professor at Alliant na
Universidade de San Diego, Califórnia. Ela é membro da American
Psychological Association e recebeu numerosas honrarias por seu
trabalho, entre elas o prêmio por Relevante Contribuição ao Campo da Terapia
de Casais e Famílias, da American Association for Marriage and Family
Therapy, e o prêmio de Pesquisa sobre a Família, da American Family Therapy
Academy. Ela treina aconselhadores em TFE no mundo todo, e é consultora do
Exército dos Estados Unidos e do Canadá, e do Departamento de Bombeiros de
Nova York. Ela mora em Ottawa, com o marido e três filhos e um ca-chorro.
Susan adora Gilbert and Sullivan, Monty Python, tango argentino, e andar de
caiaque nos lagos do norte do Canadá.
Powered by
1 N. do T.: Míssil balístico móvel, de curto alcance, desenvolvido pela exUnião
usada para indicar um observador não percebido, e “Fly Gazette”, para fazer um
trocadilho.
3 N. do T.: Tradicional sobremesa servida na Inglaterra no dia de Natal, cuja