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A DOUTRINA

DA APLICAÇÃO
DA REDENÇÃO
SUMÁRIO
AULA 01 A Graça Comum - Quais são as bênçãos que Deus dá a todas
as pessoas, tanto a crentes como a incrédulos?
05
AULA 02 O Chamado do Evangelho e o Evangelho Eficaz - Qual é a
mensagem do evangelho? Como ela se torna eficaz? 11
AULA 03 Regeneração - O que significa nascer de novo?
15
AULA 04 Conversão (Fé e Arrependimento) - O que é o verdadeiro
arrependimento? Que é fé salvífica? Podem as pessoas aceitar
Jesus como Salvador, mas não como Senhor?
19
AULA 05 Justificação (Direito Legal de estar diante de Deus) -
Como e quando obtemos o direito legal
de estar diante de Deus?
25
AULA 06 Adoção (Filiação na Família de Deus) - Quais são os benefícios
de ser membro da família de Deus? 31
AULA 07 Santificação (Tornar-se Semelhante a Cristo) - Como avançamos
em direção à maturidade cristã? Quais são as bênçãos
do crescimento cristão?
37
AULA 08 A Perseverança dos Santos (Conservar-se Cristão) - Como saber
se realmente nascemos de novo? 43
AULA 09 A Morte e o Estado Intermediário - Qual o propósito da morte
na vida cristã? O que acontece com o nosso corpo e
com a nossa alma quando morremos?
49
AULA 10 Glorificação (Receber o Corpo Ressurreto) - Quando
receberemos o corpo ressurreto? Como será esse corpo? 57
AULA 11 A União com Cristo - Que significa
estar "em Cristo" ou "unido a Cristo"? 63
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AULA 01
A Graça Comum - Quais são as
bênçãos que Deus dá a todas as
pessoas, tanto a crentes como
a incrédulos?
Introdução:
Quando Adão e Eva pecaram, tornaram-se merecedores de punição e
separação eternas da parte de Deus (Gn 2.17). Do mesmo modo, quando seres
humanos hoje pecam tornam-se sujeitos à ira de Deus e à punição eterna: “O
salário do pecado é a morte” (Rm 6.23). Isso significa que um a vez que as
pessoas pequem, a justiça de Deus só pode requerer que sejam eternamente
separadas dele, impedidas totalmente de experimentar qualquer benefício
de sua parte, e que vivam para sempre no inferno apenas recebendo eterna-
mente sua ira.
Mas de fato Adão e Eva não morreram imediatamente. A execução total
da sentença de morte foi adiada por muitos anos. Além disso, até hoje milhões
de seus descendentes não morrem e vão para o inferno assim que pecam, mas
continuam a viver por muitos anos, usufruindo de incontáveis bênçãos neste
mundo. Como pode ser isso? A resposta a essas perguntas é que Deus outorga
a graça comum. Podemos definir graça comum da seguinte maneira: Graça
comum é a graça de Deus pela qual ele dá às pessoas inumeráveis bênçãos que
não fazem parte da salvação.
A graça comum é diferente da graça salvífica em seus resultados (ela não
conduz à salvação), em seus recebedores (ela é dada igualmente a crentes e
incrédulos), e em sua fonte (ela não flui diretamente da ação resgatadora de
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Cristo, porque para os incrédulos a morte de Cristo não representou remissão


alguma; portanto, tampouco eles se tornaram merecedores das bênçãos da
graça comum).

Exemplos de graça comum


Podemos distinguir as diversas categorias específicas nas quais a graça
comum é vista.

1) O domínio físico.
Os incrédulos continuam a viver neste mundo unicamente por causa da
graça comum de Deus - toda vez que alguém respira, isso se dá pela graça,
porque o salário do pecado é morte, não vida. Além disso, a terra não produz
somente cardos e abrolhos (Gn 3.18), nem permanece como um deserto resse-
cado, mas pela graça comum de Deus ela produz alimento e material para
roupa e abrigo, frequentemente em grande abundância e diversidade. Jesus
disse: “Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem; para que vos
torneis filhos de vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus
e bons e vir chuvas sobre justos e injustos ” (Mt 5.44-45).
O Antigo Testamento também fala sobre a graça comum de Deus que
chega tanto aos incrédulos como aos crentes. Davi fala de uma maneira muito
abrangente a respeito de todas as criaturas que Deus fez: “O Senhor é bom
para todos, e suas ternas misericórdias permeiam todas as suas obras. [...]
Em ti esperam os olhos de todos, e tu, a seu tempo, lhes dás o alimento. Abres
a mão e satisfazes de benevolência a todo vivente” (SI 145.9, 15-16).
Vemos evidências da graça comum de Deus até na beleza do mundo
natural. A beleza das flores multicoloridas, dos gramados e florestas, dos rios,
lagos, montanhas e praias ainda permanece como um testemunho diário da
incessante graça comum de Deus. Os incrédulos não merecem usufruir dessa
beleza, mas pela graça de Deus eles podem usufrui-la por toda a vida.

2) O domínio intelectual:
Os seres humanos no mundo atual, mesmo incrédulos, não são total-
mente inclinados para a mentira, para a irracionalidade e para a ignorância.
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Todas as pessoas conseguem compreender alguma medida da verdade; certa-


mente alguns têm grande inteligência e entendimento. Isso também deve ser
visto como um dos resultados da graça de Deus. João fala de Jesus como “a
verdadeira luz que ilumina a todo homem” (Jo 1.9).
A graça comum de Deus no domínio intelectual é vista no fato de que
todas as pessoas têm um conhecimento de Deus: “Porquanto, tendo conheci-
mento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças” (Rm
1.21). Isso significa que há uma percepção da existência de Deus e frequente-
mente um desejo de conhecê-lo.
Essa graça comum no domínio intelectual também resulta na capacida-
de para compreender a verdade e distingui-la do erro e em experimentar
crescimento em conhecimento, que pode ser usado na investigação do univer-
so e na tarefa de dominar a terra. Isso significa que toda ciência e tecnologia
executada por não-cristãos é um dos resultados da graça comum, que lhes
concede fazer descobertas e invenções inacreditáveis, desenvolver os recursos
da terra em muitos bens materiais, produzir e distribuir tais recursos e ter habi-
lidade em seu trabalho produtivo.

3) O domínio moral:
Deus também, por meio da graça comum, limita as pessoas para que não
sejam tão más quanto poderiam ser. No caso da maioria dos seres humanos
eles não caem até as profundezas onde seu pecado os levaria porque Deus
intervém e põe freios sobre sua conduta. Uma das mais eficazes restrições é a
força da consciência. Paulo diz: “Quando, pois, os gentios, que não têm lei,
procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem
eles de lei para si mesmos. Estes mostram a norma da lei gravada no seu
coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamen-
tos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se” (Rm 2.14-15).
Essa percepção interna do certo e do errado, que Deus dá a todas as
pessoas, significa que elas normalmente aprovarão os padrões morais que
refletem muitos dos padrões morais das Escrituras. As pessoas frequentemen-
te estabelecem leis ou têm costumes que respeitam a santidade do matrimô-
nio e da família, protegem a vida humana e proíbem o roubo e a falsidade no
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falar. Por causa disso, as pessoas com frequência vivem de maneira correta e
estão exteriormente de acordo com os padrões morais encontrados na Palavra
de Deus. Apesar de sua conduta moral, não podem merecer recompensa da
parte de Deus (visto que as Escrituras claramente dizem que “pela lei, ninguém
é justificado diante de Deus”, G1 3.11, e “Todos se extraviaram, à uma se fizeram
inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer”, (Rm 3.12).
Naturalmente, nas áreas onde o evangelho teve grande influência e a
igreja é forte, haverá na sociedade uma influência moral mais forte do que nos
lugares onde o evangelho nunca chegou, ou onde tem influência limitada (por
exemplo, em sociedades canibalescas - ou até mesmo na moderna sociedade
ocidental onde tanto a crença no evangelho como os absolutos morais têm
sido abandonados pela cultura dominante).

4) O domínio criativo:
Deus tem permitido medidas significativas de talento nas áreas artísticas
e musicais, bem como em outras esferas nas quais a criatividade e o talento
podem ser expressos, tais como atividades atléticas, arte culinária, literatura e
assim por diante. E nessa área, bem como nos domínios físico e intelectual, as
bênçãos da graça comum são às vezes derramadas sobre os incrédulos até
mais abundantemente do que sobre os crentes. Contudo, em todos os casos é o
resultado da graça de Deus.

5) O domínio social:
A graça de Deus também é evidente na existência de várias organizações
e estruturas na sociedade humana. Vemos isso primeiramente na família
humana, atestada pelo fato de que Adão e Eva permaneceram como marido e
mulher depois da queda e então tiveram descendentes, tanto filhos como
filhas (Gn 5.4). A família perdura hoje não simplesmente como uma instituição
para crentes, mas para todas as pessoas.
O governo humano também é resultado da graça comum. Ele foi instituí-
do por Deus como um princípio depois do dilúvio (veja Gn 9.6), e se diz clara-
mente que é concedido por Deus em Romanos 13.1: “Não há autoridade que
não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituí-
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das”. Um dos principais expedientes que Deus usa para restringir o mal no
mundo é o governo humano. As leis humanas, as forças policiais e os sistemas
judiciais proporcionam um poderoso restringente às ações do mal, e essas
coisas são necessárias porque existe no mundo muito mal irracional que só
pode ser restringido pela força e não pela razão ou educação.

6) O domínio religioso:
Até mesmo no domínio da religião humana, a graça comum de Deus
produz algumas bênçãos para pessoas incrédulas. Jesus nos ordena: “Amai os
vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” (Mt 5.44).
Quando visamos o bem dos incrédulos, isso está em harmonia com a
prática do próprio Deus de conceder luz solar e chuva “sobre justos e injustos”
(Mt 5.45) e se harmoniza com a prática de Jesus durante seu ministério terres-
tre, quando ele curou todas as pessoas que eram levadas até ele (Lc 4.40). Não
há indicação de que ele exigisse que elas acreditassem nele ou concordassem
que ele era o Messias antes de lhes conceder a cura física. Será que Deus respon-
de às orações dos incrédulos? Embora Deus não tenha prometido responder às
orações deles (como prometeu responder às dos que oram em nome de Jesus)
e embora não tenha a obrigação de respondê-las, ainda assim ele pode, por
causa da sua graça comum, ouvir e atender as orações deles, demonstrando
assim sua misericórdia e sua bondade também dessa maneira.

Razões da graça comum:

1) Para redimir os que serão salvos:


Pedro diz que o dia do juízo e da execução final da punição está sendo
adiado porque há ainda mais pessoas que serão salvas: “Não retarda o
Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada; pelo contrário,
ele é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão
que todos cheguem ao arrependimento. Virá, entretanto, como ladrão, o
Dia do Senhor” (2Pe 3.9-10).
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2) Para demonstrar a bondade e a misericórdia de Deus:


Quando Deus “é benigno até com os ingratos e maus” (Lc 6.35), sua
benignidade é revelada no universo, para sua glória. Davi diz: “O Senhor é
bom para todos, e as suas ternas misericórdias permeiam todas as suas
obras” (SI 145.9).

3) Para demonstrar a justiça de Deus:


Quando Deus repetidamente convida os pecadores a que se acheguem
à fé, e quando eles repetidamente recusam seu convite, a justiça de Deus ao
condená-los é percebida muito mais claramente. Paulo adverte que aqueles
que persistem na incredulidade estão simplesmente acumulando mais ira
para si mesmos (Rm 2.5).

4) Para demonstrar a glória de Deus:


A glória de Deus é demonstrada de muitas maneiras através das ativida-
des dos seres humanos em todas as áreas na quais a graça comum atua. Ao
desenvolver e exercitar o domínio sobre a terra, homens e mulheres demons-
tram e refletem a sabedoria de seu Criador.
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AULA 02
O Chamado do Evangelho e o
Evangelho Eficaz - Qual é a
mensagem do evangelho?
Como ela se torna eficaz?
Introdução:
“Aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a
esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou”.
(Rm 8.30)

Essa passagem de romanos nos mostra a ordem exata na qual as bênçãos


da salvação chegam até nós. Embora há muito tempo, antes de o mundo ter
sido feito, Deus nos tenha “predestinado” para sermos seus filhos e para sermos
conformes a imagem de seu Filho, Paulo indica que no atual processo da reali-
zação de seu propósito em nossa vida Deus nos “chamou”. Então segue-se a
justificação e a glorificação, mostrando que estas vêm depois do chamado.
Paulo informa que há uma ordem definida no propósito de Deus ao nos salvar.

O chamado eficaz:
Quando Paulo diz “Aos que predestinou, a esses também chamou; e aos
que chamou, a esses também justificou” (Rm 8.30), indica que o chamado é
um ato de Deus. Outros versículos descrevem mais plenamente o que é esse
chamado. Quando Deus chama as pessoas dessa maneira poderosa, ele as
chama “das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2.9); ele as chama “à
comunhão de seu Filho” (1Co 1.9; cf. At 2.39) e “para o seu reino e glória” (1Ts
2.12; cf. 1Pe 5.10, 2Pe 1.3).
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Esses versículos indicam que nenhum chamado impotente, meramente


humano, está em vista. Esse chamado é, antes, um tipo de “convocação” feita
pelo Rei do universo e tem tanto poder que induz à resposta que exige do
coração das pessoas. E um ato de Deus que garante uma resposta, porque
Paulo especifica em Romanos 8.30 que todo aquele que foi “chamado” foi
também “justificado”. Esse chamado tem a faculdade de nos tirar do reino das
trevas e nos conduzir ao reino de Deus para que tomemos parte na plena comu-
nhão com ele.
Essa poderosa ação de Deus é frequentemente referida como chamado
eficaz para distingui-la do convite geral do evangelho que é para todas as
pessoas, das quais algumas o rejeitam. De fato, o chamado eficaz de Deus vem
através da pregação humana do evangelho. Naturalmente, há muitos que
ouvem o chamado geral da mensagem do evangelho e não respondem. Mas
em alguns casos o chamado do evangelho é feito de forma tão eficaz pela obra
do Espírito Santo no coração das pessoas que elas respondem.
Devemos definir o chamado eficaz da seguinte maneira: o chamado
eficaz é um ato de Deus Pai, falando através da proclamação humana do
evangelho, pelo qual ele convoca as pessoas para si mesmo de tal modo que
elas respondem com fé salvífica. A oração, portanto, é muito importante na
evangelização eficaz. A não ser que Deus trabalhe no coração das pessoas para
tornar a proclamação do evangelho eficaz, não haverá resposta salvífica
genuína. Jesus disse: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o
trouxer” (Jo 6.44). Um exemplo do chamado do evangelho operando eficaz-
mente é visto na primeira visita de Paulo a Filipos. Quando Lídia ouvia a mensa-
gem do evangelho o “Senhor lhe abriu o coração para atender às coisas que
Paulo dizia” (At 16.14).

Os elementos do chamado do evangelho:


Distinto do chamado eficaz, que é um ato inteiramente de Deus, pode-
mos falar sobre o chamado do evangelho. Esse chamado do evangelho é ofere-
cido a todas as pessoas, mesmo a quem não o aceita. As vezes esse chamado
do evangelho é referido como chamado externo ou chamado geral. O chama-
do do evangelho é geral, externo e frequentemente rejeitado, enquanto o
chamado eficaz é particular, interno e sempre eficaz.
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Na pregação do evangelho, três elementos importantes devem


ser incluídos:

1) Explicação dos fatos concernentes à salvação:

a) Todas as pessoas pecaram (Rm 3.23);


b) A pena pelos nossos pecados é a morte (Rm 6.23);
c) Jesus Cristo morreu para pagar a pena pelos nossos pecados (Rm 5.8).

Entretanto, entender esses fatos e mesmo concordar que eles são verda-
deiros não é suficiente para uma pessoa ser salva.

2) Convite para aceitar Cristo pessoalmente com arrependimento e fé:

Quando o Novo Testamento fala sobre pessoas recebendo salvação, fala


em termos de uma resposta pessoal a um convite da parte do próprio Cristo.
“Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos
aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso
e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu
jugo é suave, e o meu fardo é leve” (Mt 11.28-30).
Todo não cristão ao ouvir essas palavras deve sentir-se encorajado a pen-
sar nelas como palavras do próprio Jesus Cristo. Ele é um Salvador que está
agora vivo no céu, e todo não cristão deve pensar em Jesus como falando dire-
tamente a ele, dizendo “Vinde a mim [...] e encontrareis descanso” (Mt 11.28).
João também fala a respeito da necessidade da resposta pessoal quando
diz: “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o
receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que
crêem no seu nome” (Jo 1.11-12). Ao enfatizar a necessidade de “receber” Cristo,
João também aponta a necessidade de uma resposta individual.

3) Uma promessa de perdão e vida eterna:

A principal promessa na mensagem do evangelho é o perdão dos peca-


dos e a vida eterna com Deus. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira
que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas
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tenha a vida eterna” (Jo 3.16). E também Pedro ao pregar o evangelho diz:
“Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos
pecados” (A.t 3.19; cf. 2.38). Aliada à promessa de perdão e vida eterna deve
estar a garantia de que Cristo aceitará todo aquele que se achega a ele com
arrependimento sincero e fé buscando a salvação: “E o que vem a mim, de
modo nenhum o lançarei fora” (Jo 6.37).
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AULA 03
Regeneração -
O que significa nascer de novo?

Explicação e Base Bíblica:


Podemos definir regeneração da seguinte maneira: Regeneração é um
ato secreto de Deus pelo qual ele nos concede nova vida espiritual. Isso é às
vezes chamado “nascer de novo” (na linguagem de João 3.3-8).

A regeneração é uma obra exclusivamente de Deus.


Em alguns componentes da aplicação da redenção desempenhamos
uma parte ativa (por exemplo, no que diz respeito à conversão, santificação e
perseverança). Mas na obra de regeneração não desempenhamos papel
algum. Ao contrário, é uma obra exclusivamente de Deus. Vemos isso, por
exemplo, quando João fala a respeito daqueles a quem Cristo deu poder de se
tornarem filhos de Deus - eles “não nasceram do sangue, nem da vontade da
carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1.13).
Não escolhemos nos tomar fisicamente vivos e também não escolhemos
nascer - é algo que nos aconteceu; semelhantemente, essas analogias nas
Escrituras dão a entender que somos inteiramente passivos na regeneração.
Essa obra soberana de Deus na regeneração também foi predita na profe-
cia de Ezequiel. Por meio dele Deus prometeu que haveria um tempo no futuro
quando ele daria nova vida espiritual a seu povo: Dar-vos-ei coração novo e
porei dentro de vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei
coração de carne. Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que andeis nos
meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis (Ez 36.26-27).
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Qual é a relação entre o chamado eficaz e a regeneração? As Escrituras indicam


que a regeneração deve vir antes que possamos responder ao chamado eficaz
com fé salvífica. Portanto podemos dizer que a regeneração vem antes do
resultado do chamado eficaz (nossa fé). Portanto, chamado eficaz é Deus Pai
falando a nós poderosamente, e regeneração é Deus Pai e Deus Espírito Santo
operando em nós poderosamente, para nos dar vida.

A natureza exata da regeneração é um mistério para nós:


Sabemos que de algum modo nós, que estivemos espiritualmente mor-
tos (Ef 2.1), fomos vivificados por Deus e num sentido muito verdadeiro “nasce-
mos de novo” (Jo 3.3, 7; Ef 2.5; Cl 2.13). Mas não entendemos como isso ocorre ou
o que exatamente Deus faz para nos dar essa nova vida espiritual. Jesus diz: “O
vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para
onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito” (Jo 3.8).
O fato de a regeneração ser uma obra de Deus dentro de nós pela qual ele
nos dá vida nova nos faz concluir que é um evento instantâneo. Ocorre uma
única vez. Num momento estamos espiritualmente mortos, e depois no outro
temos nova vida espiritual da parte de Deus. Todavia, nem sempre sabemos
exatamente quando essa mudança instantânea ocorre.
Em muitos casos, os resultados podem ser vistos de imediato - confiança
sincera em Cristo no tocante à salvação, garantia de que seus pecados foram
perdoados, desejo de ler a Bíblia e orar, prazer em adorar, desejo de reunir-se
com outros cristãos, sincero desejo de ser obediente à Palavra de Deus revelada
nas Escrituras e vontade de falar de Cristo aos outros.

Nesse sentido de “regeneração”, ela vem antes da fé salvífica:


Definimos a regeneração como o ato de Deus de despertar a vida espiritu-
al dentro de nós, trazendo-nos da morte espiritual para a vida espiritual. De
fato, é essa obra de Deus que nos dá capacidade espiritual para responder a
Deus com fé. Entretanto, quando dizemos que ela vem “antes” da fé salvífica, é
importante lembrar que elas aparecem tão juntas que geralmente nos parece-
rá que estão ocorrendo ao mesmo tempo. Assim que Deus nos dirige o chama-
do eficaz do evangelho, ele nos regenera, e respondemos com fé e arrependi-
mento a esse chamado. Assim, da nossa perspectiva é difícil perceber qualquer
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diferença no tempo, especialmente porque a regeneração é uma obra espiritu-


al que não podemos perceber com nossos olhos nem mesmo entender com
nossa mente.
Há diversas passagens que nos falam que essa obra de Deus secreta e
oculta em nosso espírito se dá de fato antes que respondamos a Deus com fé
salvífica. Ao falar sobre a regeneração com Nicodemos, Jesus disse: “Quem não
nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus” (Jo 3.5).
Entramos no reino de Deus quando nos tornamos cristãos pela conversão.
Nossa incapacidade de ir a Cristo por nós mesmos, sem uma obra inicial de
Deus dentro de nós, é também enfatizada quando Jesus diz: “Ninguém pode
vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer” (Jo 6.44), e “Ninguém poderá vir
a mim, se, pelo Pai, não lhe for concedido” (Jo 6.65).

A regeneração genuína deve produzir resultados na vida:


João diz: “Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo é nascido de Deus” (ljo
5.1). Mas também há outros resultados da regeneração, muitos dos quais espe-
cificados na primeira epístola de João. Por exemplo: “Todo aquele que é nasci-
do de Deus não pratica o pecado, porque a semente de Deus permanece nele;
ele não pode estar no pecado, porque é nascido de Deus” (1Jo 3.9). Aqui João
explica que a pessoa que nasceu de novo tem essa “semente” espiritual dentro
dela, e que isso tudo mantém-na levando uma vida isenta do pecado contínuo.
Naturalmente, isso não significa que a pessoa terá uma vida perfeita, mas que o
padrão da vida não será de contínua indulgência em pecado.
Um genuíno amor semelhante ao de Cristo será um resultado específico
na vida: “Aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus” (1Jo 4.7). Outro
efeito do novo nascimento é vencer o mundo: “E os seus mandamentos não são
pesados. O que é nascido de Deus vence o mundo” (1Jo 5.3-4). Aqui João explica
que a regeneração nos dá capacidade para vencer as pressões e tentações do
mundo, que de outra maneira nos impediriam de obedecer aos mandamentos
de Deus e de seguir suas veredas.
Finalmente, João menciona que outro resultado da regeneração é a
proteção contra o próprio Satanás: “Sabemos que todo o que é nascido de
Deus não está no pecado; aquele que nasceu de Deus [Jesus] o protege, e o
Maligno não o atinge” (1Jo 5.18). Embora possa haver ataques da parte de
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Satanás, João nos tranquiliza ao dizer que “aquele que está em vocês é maior
do que aquele que está no mundo” (1Jo 4.4), e esse poder maior do Espírito
Santo dentro de nós mantém-nos a salvo do mal espiritual definitivo da parte
do Maligno.
Outros resultados da regeneração são listados por Paulo quando ele fala
do “fruto do Espírito”, isto é, o resultado na vida produzido pelo poder do
Espírito Santo trabalhando no interior de todo crente: “Mas o fruto do Espírito
é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade,
mansidão, domínio próprio” (G1 5.22-23). Se houver verdadeira regeneração,
então esses elementos do fruto do Espírito estarão cada vez mais evidentes
na vida da pessoa.
Jesus nos adverte que no dia do juízo muitos lhe dirão: “Senhor, Senhor!
Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não
expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes
direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a
iniquidade” (Mt 7.22-23). Profecia, exorcismo, muitos milagres e obras podero-
sas no nome de Jesus (sem falar dos outros tipos de atividade eclesiástica
intensiva na força da carne no decorrer de décadas da vida de uma pessoa) não
fornecem evidência convincente de que uma pessoa é verdadeiramente nasci-
da de novo. Mas o genuíno amor por Deus e seu povo, obediência sincera a seus
mandamentos e traços de caráter semelhantes aos de Cristo, os quais Paulo
chama de fruto do Espírito, demonstrados sistematicamente no decorrer de
um período de tempo na vida de uma pessoa, simplesmente não podem ser
produzidos por Satanás ou pela obra do homem ou da mulher natural em sua
própria força. Isso só pode acontecer pela obra do Espírito de Deus em nosso
interior, concedendo-nos vida nova.
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AULA 04
Conversão (Fé e Arrependimento) -
O que é o verdadeiro arrependimento?
Que é fé salvífica? Podem as pessoas aceitar
Jesus como Salvador, mas não como Senhor?

Explicação e Base Bíblica:


Podemos definir conversão da seguinte maneira: Conversão é nossa
resposta espontânea ao chamado do evangelho, pela qual sinceramente nos
arrependemos dos nossos pecados e colocamos a confiança em Cristo para
receber a salvação. A palavra conversão significa “volta” - aqui ela representa
uma volta espiritual, voltar-se do pecado para Cristo. O voltar-se do pecado é
chamado arrependimento, e o voltar-se para Cristo é chamado fé.

A verdadeira fé salvífica inclui conhecimento, aprovação e confi-


ança pessoal:

1) Mero conhecimento não basta:


Fé salvífica pessoal envolve mais do que apenas conhecimento.
Naturalmente é necessário que tenhamos algum conhecimento de quem
Cristo é e do que ele fez, porque “como crerão naquele de quem nada ouvi-
ram?” (Rm 10.14). Mas conhecimento sobre os fatos da, vida, morte e ressurrei-
ção de Jesus não é o bastante para nós, porque as pessoas podem conhecer os
fatos, mas rebelar-se contra eles ou não gostar deles. Por exemplo, Paulo nos
fala que muitas pessoas conhecem as leis de Deus mas sentem aversão por
elas: “Ora, conhecendo eles a sentença de Deus, de que são passíveis de morte
os que tais coisas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os
que assim procedem” (Rm 1.32). Até mesmo os demônios conhecem quem é
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Deus e os fatos a respeito da vida e das obras salvíficas de Jesus, porque Tiago
diz: “Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios creem e tremem”
(Tg 2.19). Mas esse conhecimento certamente não significa que os demônios
são salvos.

2) Conhecimento e aprovação não são suficientes:


Meramente conhecer os fatos e aprová-los ou concordar que eles são
verdadeiros não é suficiente. Nicodemos sabia que Jesus tinha vindo de Deus,
porque disse: “Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus; porque
ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele” (Jo
3.2). Nicodemos tinha avaliado os fatos da situação, incluindo os ensinos de
Jesus e seus milagres notáveis, e chegado a uma conclusão correta a partir
desses fatos: Jesus era um mestre vindo de Deus.
Mas isso somente não significa que Nicodemos tinha fé salvífica, porque
ele ainda tinha de depositar sua confiança em Cristo para receber a salvação;
ele ainda tinha de “crer nele”. O rei Agripa fornece outro exemplo de conheci-
mento e aprovação sem fé salvífica. Paulo percebeu que o rei Agripa conhecia e
aparentem ente via com aprovação as Escrituras judaicas (o que agora chama-
mos de Antigo Testamento). Quando Paulo estava em julgamento diante de
Agripa, ele disse: “Acreditas, ó rei Agripa, nos profetas? Bem sei que acreditas”
(At 26.27). Contudo, Agripa não tinha fé salvífica, porque disse a Paulo: “Por
pouco me persuades a me fazer cristão” (At 26.28).

3) Preciso decidir depender de Jesus para me salvar:


Além do conhecimento dos fatos do evangelho e da aprovação deles, a
fim de ser salvo, preciso decidir depender de Jesus para me salvar. Ao fazer isso,
deixo a posição de um observador interessado nos fatos da salvação e nos
ensinos da Bíblia para tornar-me alguém que entra num a nova comunhão
com Jesus Cristo como uma pessoa viva. Podemos, portanto, definir fé salvífica
da seguinte maneira: Fé salvífica é confiança em Jesus Cristo como uma pessoa
viva visando ao perdão dos pecados e à vida eterna com Deus.
Podemos sintetizar as duas principais preocupações da pessoa que aceita
Cristo como “perdão dos pecados” e “vida eterna com Deus”. Naturalmente,
vida eterna com Deus envolve assuntos como uma declaração de retidão
diante de Deus, adoção, santificação e glorificação, mas a principal coisa que
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 21

preocupa um incrédulo que se chega a Cristo é o fato de que o pecado o sepa-


rou da comunhão com Deus para a qual fomos feitos. O incrédulo chega-se a
Cristo em busca da remoção do pecado e da culpa e do ingresso numa comu-
nhão genuína com Deus, que durará para sempre.
A definição enfatiza confiança pessoal em Cristo, não apenas acreditar
nos fatos a respeito dele. A razão é que podemos “crer” que algo seja verdadeiro
mesmo que pessoalmente não nos comprometamos com isso nem haja
alguma dependência envolvida. Eu posso crer que Canberra seja a capital da
Austrália, ou que 7x6 é igual a 42, mas não tenho compromisso pessoal ou
dependência alguma disso quando simplesmente creio nesses fatos.
A palavra confiança representa bem a ideia bíblica, visto que estamos
familiarizados com pessoas que todos os dias confiam. Quando conhecemos
uma pessoa que demonstra um comportamento na vida que justifica a confi-
ança, percebemo-nos confiando nela, nas suas promessas e no que ela pode vir
a fazer. João 3.16 promete-nos que todo o que nele crê não perece, mas tem a
vida eterna. Aqui João usa uma frase surpreendente, porque não diz apenas
“todo o que crê no que ele diz” (isso é, crer que o que ele diz é verdadeiro e por
isso merece confiança), mas “todo o que nele crê”. Leon Morris pode dizer: “Fé,
para João, é uma atividade que arrebata os homens para fora de si mesmos e os
tom a um com Cristo”. Fé não é apenas assentimento intelectual, mas inclui
“um elemento moral de confiança pessoal”.
Jesus fala sobre “vir a ele” em diversos lugares. Ele diz: “Todo aquele que o
Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei
fora” (Jo 6.37). Ele também diz: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba” (Jo
7.37). De modo semelhante, ele diz: “Vinde a mim, todos os que estais cansados
e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de
mim, porque sou manso e humilde de coração ; e achareis descanso para a
vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve” (Mt 11.28-30).
Nessas passagens temos a ideia do que é ir a Cristo e pedir aceitação, água da
vida para beber, descanso e instrução. Tudo isso fornece um quadro intensa-
mente pessoal do que está envolvido na fé salvífica.
Podemos agora perceber que quando uma pessoa vem a confiar em
Cristo, todos os três elementos devem estar presentes. Tem de haver algum
conhecimento básico ou entendimento dos fatos do evangelho. Tem de haver
também aprovação, concordância com esses fatos. Tal concordância inclui
22 | AULA 04

uma convicção de que os fatos do evangelho são verdadeiros, especialmente o


fato de que “eu sou um pecador que necessita de salvação e somente Cristo
pagou a penalidade pelo meu pecado e me oferece salvação”. Mas tudo isso
ainda nada acrescenta à verdadeira fé salvífica, que vem somente quando eu
decido por minha própria vontade depender de Cristo ou nele exercer confian-
ça como meu Salvador. Essa decisão pessoal de depositar minha confiança em
Cristo é algo feito com meu coração, faculdade central de todo o meu ser que
assume compromissos por mim como uma pessoa integral.

4) A fé deve aumentar à medida que nosso conhecimento aumente:


Quando as pessoas têm informações verdadeiras sobre Cristo, elas estão
mais bem capacitadas a depositar sua confiança nele. Além disso, a maioria de
nós conhece algo sobre ele e sobre o caráter de Deus que é completamente
revelado nele; a maioria de nós tem todos os motivos para depositar nossa
confiança nele. Assim, a fé não é enfraquecida pelo conhecimento, mas deve
aumentar com mais conhecimento verdadeiro.
No caso da fé salvífica em Cristo, nosso conhecimento dele vem quando se crê
em um testemunho confiável sobre ele. Aqui, o testemunho confiável no qual
acreditamos são as palavras das Escrituras. Visto serem as genuínas palavras de
Deus, são completamente confiáveis, e adquirimos conhecimento verdadeiro
a respeito de Cristo através delas, porque a “fé vem por ouvir a mensagem, e a
mensagem é ouvida mediante a palavra de Cristo” (Rm 10.17).

A fé e o arrependimento devem vir juntos:


Podemos definir arrependimento da seguinte maneira: Arrependimento
é uma sincera tristeza por causa do pecado, é renunciá-lo e comprometer-se
sinceramente a abandoná-lo, e prosseguir obedecendo a Cristo.
Essa definição indica que o arrependimento é algo que ocorre em um
momento específico do tempo, que não corresponde necessariamente ao
momento da visível transformação no padrão de vida da pessoa. O arrependi-
mento, assim como a fé, é um entendimento intelectual (de que o pecado é
errado), uma aprovação emocional dos ensinos das Escrituras concernentes ao
pecado (uma tristeza por causa do pecado e uma aversão a ele), e uma decisão
pessoal de afastar-se dele (um renunciar ao pecado e uma decisão resoluta de
abandoná-lo e de levar uma vida de obediência a Cristo).
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 23

Naturalmente, o genuíno arrependimento resultará numa vida transfor-


mada. De fato, uma pessoa verdadeiramente arrependida começará imediata-
mente a viver uma vida transformada, e podemos chamar essa vida transfor-
mada de fruto do arrependimento. O arrependimento é algo que ocorre no
coração e envolve a pessoa como um todo na decisão de afastar-se do pecado.
É importante perceber que a mera tristeza ou até o profundo remorso por
causa dos atos praticados não constitui genuíno arrependimento, a menos que
isso seja acompanhado de uma sincera decisão de abandonar o pecado que se
está praticando contra Deus. Paulo pregou a respeito do “arrependimento para
com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus [Cristo]” (At 20.21). Ele disse que se
alegrava com relação aos coríntios, não porque haviam sido contristados, mas
porque haviam sido “contristados para arrependimento [...]. Porque a tristeza
segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz
pesar, mas a tristeza do mundo produz morte” (2Co 7.9-10).
Essa espécie de tristeza do mundo pode produzir grande aflição a
alguém por causa de suas ações e provavelmente também envolva o temor
da punição, mas nunca a genuína renúncia ao pecado ou o compromisso de
abandoná-lo. Hebreus 12.17 conta-nos que Esaú chorou com as consequênci-
as de suas ações, mas assim mesmo não se arrependeu. Além disso, como
2Coríntios 7.9-10 indica, até mesmo a verdadeira tristeza segundo Deus é
apenas um dos fatores que conduzem ao genuíno arrependimento; portan-
to, tal tristeza por si só não é a sincera decisão de coração na presença de
Deus que tom a genuíno o arrependimento.
As Escrituras colocam o arrependimento e a fé juntos como aspectos
diferentes daquele ato único de voltar-se para Cristo em busca de salvação.
Não se trata de primeiro uma pessoa afastar-se do pecado e depois confiar em
Cristo nem primeiro confiar em Cristo e depois afastar-se do pecado, mas as
duas coisas ocorrem ao mesmo tempo. Quando nos voltamos para Cristo em
busca de salvação dos nossos pecados, estamos simultaneamente afastando-
nos dos pecados e pedindo a Cristo que nos salve. Se isso não fosse verdadeiro a
nossa ação de afastar-nos do pecado em direção a Cristo dificilmente seria
uma conversão genuína e dificilmente nossa confiança nele seria verdadeira.
Arrependimento e fé são simplesmente duas faces diferentes da mesma
moeda, ou dois diferentes aspectos do mesmo evento da conversão.
24 | AULA 04

Tanto a fé como o arrependimento continuam por toda vida:

Embora consideremos a fé e o arrependimento iniciais como os dois


aspectos da conversão no começo da vida cristã, é importante compreender
que eles não se limitam ao começo da vida cristã. Ao contrário, são atitudes do
coração que continuam por toda a nossa vida como cristãos. Jesus diz a seus
discípulos que orem diariamente: “E perdoa-nos os nossos pecados assim
como temos perdoado àqueles que pecam contra nós” (Mt 6.12, tradução do
autor), uma oração que, se for legítima, certamente envolverá tristeza diária por
causa do pecado e arrependimento genuíno. E o Cristo ressurreto diz à igreja
em Laodicéia: “Eu repreendo e disciplino a quantos amo. Sê, pois, zeloso e
arrepende-te” (Ap 3.19; cf. 2Co 7.10).
Com respeito à fé, Paulo nos diz: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperan-
ça e o amor, estes três; porém o maior destes é o amor” (ICo 13.13). Ele certamen-
te quer dizer que esses três permanecem por todo o curso desta vida, mas
provavelmente também quer dizer que eles permanecem por toda a eternida-
de: se fé é confiar em Deus quanto ao suprimento de todas as nossas necessida-
des, então essa atitude nunca cessará, nem mesmo na era do porvir.
A cada dia deve haver sincero arrependimento pelos pecados que come-
temos e fé em Cristo quanto ao suprimento do necessário e à capacitação para
vivermos a vida cristã.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 25

AULA 05
Justificação
(Direito Legal de estar diante de Deus) -
Como e quando obtemos o direito legal
de estar diante de Deus?

Explicação e Base Bíblica:


O próximo passo no processo de se nos aplicar a redenção é que Deus tem
de responder à nossa fé e fazer o que prometeu, isto é, realmente declarar que
nossos pecados foram perdoados. Esta tem de ser uma declaração legal con-
cernente à nossa comunhão com as leis de Deus, segundo a qual estamos
completamente perdoados e não mais sujeitos à punição.
Uma visão correta da justificação é absolutamente crucial para a fé cristã
como um todo. A questão principal da Reforma Protestante foi uma disputa com
a Igreja Católica Romana sobre a justificação. Mesmo atualmente, uma verdadei-
ra visão sobre a justificação é a linha divisória entre o evangelho bíblico da salva-
ção somente pela fé e todos os falsos evangelhos baseados nas boas obras.
O que seria exatamente a justificação? Podemos defini-la da seguinte
maneira: Justificação é um ato instantâneo e legal da parte de Deus pelo qual
ele (1) considera os nossos pecados perdoados e a justiça de Cristo como per-
tencente a nós e (2) declara-nos justos à vista dele.

Justificação inclui uma declaração legal da parte de Deus:


O uso na Bíblia da palavra justificar indica que a justificação é uma
declaração legal da parte de Deus. No Novo Testamento o verbo justificar (em
grego, dikaioõ) tem uma variedade de significados, mas um sentido muito
comum é “declarar justo”. A idéia de que a justificação é uma declaração legal
26 | AULA 05

fica também totalmente óbvia quando a justificação é contrastada com a


condenação. Paulo diz: “Quem intentará alguma acusação contra os eleitos de
Deus? E Deus quem os justifica. Quem os condenará?” (Rm 8.33-34). “Condenar”
alguém é declarar tal pessoa culpada. O oposto da condenação é a justificação,
que, nesse contexto, tem de significar “declarar alguém inocente”.
Nesse sentido de “declarar justo” ou “declarar inocente” Paulo frequente-
mente usa a palavra para falar da nossa justificação por parte de Deus, sua
declaração de que nós, embora pecadores culpados, somos justos à sua vista. É
importante enfatizar que essa declaração legal por si só não transforma nossa
natureza interior ou caráter. Nesse sentido de “justificar”, Deus emite uma
declaração legal sobre nós. E por isso que os teólogos também têm dito que a
justificação é forense, em que a palavra forense significa “relacionada com
processo legal”.
John Murray faz uma importante distinção entre regeneração e justifica-
ção: “Regeneração é um ato de Deus em nós; justificação é um julgamento de
Deus a nosso respeito. A distinção é como a diferença entre o ato de um cirur-
gião e o ato de um juiz. O cirurgião, ao remover um câncer interno, faz algo em
nós. Isso não é o que um juiz faz - ele dá um veredicto concernente à nossa
condição judicial. Se somos inocentes ele o declara de acordo com isso.”

Deus nos declara justo à vista dEle:


Na declaração legal de justificação da parte de Deus, ele declara especifi-
camente que somos justos à vista dele. Essa declaração envolve dois aspectos.
Primeiro, significa que ele declara que nós não temos penalidade a pagar pelo
pecado, incluindo os pecados do presente, do passado e do futuro.
Romanos 8.1 diz: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que
estão em Cristo Jesus”. Nesse sentido aqueles que estão justificados não têm
penalidade a pagar pelo pecado. Isso significa que nós não estamos sujeitos a
nenhuma acusação ou condenação: “Quem intentará acusação contra os
eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará?” (Rm 8.33-34).
A ideia de perdão total dos pecados é proeminente quando Paulo discute a
justificação somente pela fé em Romanos 4. Paulo cita Davi pronunciando
uma bênção sobre aquele “a quem Deus atribui justiça, independentemente
de obras”. Ele então lembra as palavras de Davi: “Bem-aventurados aqueles
cujas iniquidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos; bem-
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 27

aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado” (Rm 4.6-8).


Essa justificação, portanto, claramente envolve o perdão dos pecados.
Mas se Deus apenas nos declarasse perdoados de nossos pecados pas-
sados, isso não resolveria inteiramente nossos problemas, porque só nos
tomaria moralmente neutros diante de Deus. Estaríamos no mesmo estado
de Adão antes de fazer qualquer coisa certa ou errada à vista de Deus - ele
não era culpado diante de Deus, mas tampouco tinha obtido um atestado de
justiça diante de Deus.
Devemos antes mover-nos de um ponto de neutralidade moral para um
ponto de justiça positiva diante de Deus, a justiça de uma vida de perfeita
obediência a ele. Portanto, o segundo aspecto da justificação é que Deus deve
declarar-nos não meramente neutros à sua vista. De fato, deve declarar-nos
possuidores de méritos de perfeita justiça diante dele.
Paulo fala mais especificamente sobre isso no Novo Testamento. Como
uma solução para nossa necessidade de justiça, Paulo informa-nos que “sem
lei, se manifestou a justiça de Deus testemunhada pela lei e pelos profetas;
justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos os que creem” (Rm
3.21-22). Ele diz: “Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça”
(Rm 4.3; citando Gn 15.6). Isso se deu por meio da obediência de Cristo, por-
que Paulo diz no fim dessa extensa discussão sobre a justificação pela fé que
“por meio da obediência de um só, muitos se tomarão justos” (Rm 5.19). O
segundo aspecto da declaração de Deus na justificação, então, é que nós
temos os méritos da perfeita justiça diante dele. Entretanto, algumas ques-
tões podem ser levantadas: Como pode Deus declarar que não temos penali-
dade a pagar pelo pecado e que temos os méritos da perfeita justiça, se
somos de fato pecadores culpados? Como pode Deus nos declarar inocentes
e justos quando de fato somos injustos?

Deus pode declarar-nos justos porque ele nos imputa a


justiça de Cristo:
Quando dizemos que Deus nos imputa a justiça de Cristo, queremos dizer
que Deus considera a justiça de Cristo como pertencente a nós. Ele a “credita”
em nossa conta. Lemos: “Abraão creu em Deus, e isso lhe foi creditado como
justiça” (Rm 4.3, citando Gn 15.6). Paulo explica: “Mas, ao que não trabalha,
porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça”. E
28 | AULA 05

é assim que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui
justiça, independentemente de obras” (Rm 4.5-6). Desse modo, a justiça de
Cristo tomou-se nossa. Paulo diz que somos os que recebemos “o dom da
justiça” (Rm 5.17).
Esta é a terceira vez ao estudar as doutrinas das Escrituras que depara-
mos com a ideia de imputar culpa ou justiça a outra pessoa. Primeiro, quan-
do Adão pecou, sua culpa foi imputada a nós; Deus Pai a viu como pertencen-
te a nós, e, portanto, assim se deu. Segundo, quando Cristo sofreu e morreu
pelos nossos pecados, nosso pecado foi imputado a Cristo; Deus o conside-
rou como pertencente a ele, que então pagou a pena do pecado. Agora, na
doutrina da justificação, vemos a imputação pela terceira vez. A justiça de
Cristo é imputada a nós, e, portanto, Deus a considera pertencente a nós. Não
se trata de nossa própria justiça, mas da justiça de Cristo generosamente
concedida a nós. Paulo diz que seu alvo é ser achado em Cristo, “não tendo
justiça própria, que procede da lei, senão a que é mediante a fé em Cristo, a
justiça que procede de Deus, baseada na fé” (Fp 3.9).
Isso é o que Martinho Lutero viu tão claramente e deu tão grande motiva-
ção à Reforma. Quando as boas novas do evangelho verdadeiramente se torna-
ram as boas novas da salvação totalmente gratuita em Jesus Cristo, então se
espalharam rapidamente por todo o mundo civilizado. Mas isso foi simples-
mente um restabelecimento do evangelho original, que declara que “o salário
do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é vida eterna em Cristo Jesus,
nosso Senhor” (Rm 6.23), e insiste que “agora, pois, já nenhuma condenação há
para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1).

A justificação chega a nós inteiramente pela graça de


Deus, não por causa de algum mérito em nós mesmos:
“... pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados
gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus”
(Rm 3.23-24). A “graça” de Deus significa seu “favor imerecido”. Porque nós
somos completamente incapazes de merecer o favor de Deus, a única maneira
pela qual poderíamos ser declarados justos é se Deus gratuitamente nos pro-
porcionasse a salvação pela graça, totalmente à parte de nossas obras.
Paulo explica: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 29

de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9; cf. Tt
3.7). A graça, claramente contrastada com as obras ou os méritos, é a razão pela
qual Deus deseja justificar-nos. Deus não tem obrigação alguma de imputar
nossos pecados a Cristo ou de imputar a justiça de Cristo a nós; foi unicamente
por causa de seu favor imerecido que ele fez isso. Lutero e os outros reformado-
res insistiram que a justificação vem somente pela graça, não pela graça mais
algum mérito de nossa parte.

Deus nos justifica por meio de nossa fé em Cristo:


“Temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé em
Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado”
(G12.16). Aqui Paulo indica que a fé vem primeiro com o propósito de sermos
justificados. Ele também diz que Cristo é “propiciação, mediante a fé” e que
Deus “é o justificador daquele que tem fé em Jesus” (Rm 3.25, 26). O capítulo 4
inteiro de Romanos é uma defesa do fato de que somos justificados pela fé, não
por obras, assim como Abraão e Davi o foram. Paulo diz: “Justificados, pois,
mediante a fé” (Rm 5.1).
Nunca devemos pensar que nossa fé por si só merece o favor de Deus.
Antes, as Escrituras dizem que somos justificados “mediante” nossa fé, dando
a entender que a fé é o instrumento pelo qual a justificação nos é dada, mas
em nenhuma hipótese uma atividade que nos obtenha o favor de Deus. Ao
contrário, nós somos justificados unicamente por causa dos méritos da obra
de Cristo (Rm 5.17-19).
A fé é aquela atitude do coração que é o oposto exato do depender de si
mesmo. Quando vamos a Cristo com fé, dizemos em essência o seguinte: “Eu
me entrego! Não mais dependerei de mim mesmo ou de minhas próprias
obras. Eu sei que jamais me tornarei por mim mesmo justo diante de Deus.
Portanto, Jesus, eu confio em ti e dependo de ti completamente para me
conceder uma posição justa diante de Deus”. Desse modo a fé é o oposto exato
de confiar em si mesmo e, portanto, é a atitude perfeitamente apropriada para
com a salvação que não depende em hipótese alguma de nossos próprios
méritos, mas inteiramente do dom gratuito da graça da parte de Deus.
Paulo explica isso quando diz: “Essa é a razão por que provém da fé, para
que seja segundo a graça, a fim de que seja firme a promessa para toda a
30 | AULA 05

descendência” (Rm 4.16). E por isso que os reformadores, desde Martinho


Lutero, foram tão firmes em sua insistência de que a justificação vem não
através da fé e de algum mérito ou boas obras da nossa parte, mas apenas
exclusivamente por meio da fé. “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé;
e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se
glorie” (Ef 2.8-9).
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 31

AULA 06
Adoção (Filiação na Família de Deus) -
Quais são os benefícios de ser
membro da família de Deus?

Explicação e Base Bíblica:


Na regeneração Deus nos dá uma nova vida espiritual interior. Na justifica-
ção dá-nos o direito legal de estar diante dele, mas na adoção Deus nos faz
membros de sua família. Portanto, o ensino bíblico sobre a adoção concentra-
se muito mais na comunhão pessoal com Deus e com o seu povo que a salva-
ção nos dá.

1) Evidências bíblicas da adoção:


Podemos definir adoção da seguinte maneira: adoção é um ato de Deus
por meio do qual ele nos faz membros de sua família. João menciona a adoção
no começo do seu evangelho, em que diz: “Mas, a todos quantos o receberam,
deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que creem no seu
nome” (Jo 1:12).
Em contraste com isso, aqueles que não creem em Cristo não são filhos de
Deus nem adotados na sua família, mas são “filhos da ira” (Ef 2:3) e “filhos da
desobediência” (Ef 2:2; 5:6). Embora aqueles judeus que rejeitaram a Cristo
tentaram alegar que Deus era o pai deles (Jo 8:41), Jesus disse-lhes: “Se Deus
fosse, de fato, vosso pai, certamente, me havíeis de amar [...]. Vós sois do diabo,
que é vosso pai, e quereis satisfazer-lhes os desejos” (Jo 8:42-44).
Paulo explica que esse estado de adoção como filhos de Deus não foi
totalmente realizado no antigo pacto. Ele afirma que “antes que viesse a fé,
32 | AULA 06

estávamos sob a tutela da lei [...] a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo,
a fim de que fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não perma-
necemos subordinados ao aio. Pois todos vós sois filhos de Deus mediante a
fé em Cristo Jesus” (Gl 3:23-26). Isso não quer dizer que o Antigo Testamento
omitiu completamente que Deus é nosso Pai, porque Deus chamou a si
mesmo Pai dos filhos de Israel e chamou-os seus filhos em diversos lugares
(Sl 103:13; Is 43:6-7; Ml 1:6; 2:10). Mas ainda que houvesse uma consciência de
Deus como Pai de todo o povo de Israel, os plenos benefícios e privilégios de
ser membro da família de Deus e a plena realização desse processo de filia-
ção não ocorreu até que Cristo viesse e o Espírito do Filho de Deus fosse derra-
mado em nosso coração, dando testemunho com nosso espírito de que
somos filhos de Deus.
Que evidência vemos em nossa vida de que somos filhos de Deus? Paulo
vê clara evidência no fato de que o Espírito Santo dá testemunho em nosso
coração de que somos filhos de Deus: “Vindo, porém, a plenitude do tempo,
Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os
que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção de filhos. E, porque
vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração o Espírito de seu Filho, que clama:
Aba, Pai! De sorte que já não és escravo, porém filho; e, sendo filho, também
herdeiro por Deus” (Gl 4:4-7).
A primeira epístola de João enfatiza nossa condição de filhos de Deus:
“Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chama-
dos filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus [...]. Amados, agora, somos
filhos de Deus” (I Jo 3:1-2; João várias vezes dirige-se a seus leitores como
“filhos” ou “filhinhos”).
Embora o Novo Testamento diga que agora somos filhos de Deus (I Jo
3:2), devemos notar que há outro sentido no qual nossa adoção é ainda futura
porque não receberemos os plenos benefícios e privilégios da adoção até
que Cristo retome e nós ressuscitemos. Paulo fala sobre esse sentido mais
pleno e posterior da adoção quando diz: “Porque sabemos que toda a cria-
ção, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora. E não somente ela,
mas também nós, que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos
em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção do nosso corpo”
(Rm 8:23 – Grifo Nosso).
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 33

2) A Adoção segue a Conversão e é resul tado da


Fé Salvífica:
Podemos inicialmente pensar que nos tornaríamos filhos de Deus pela
regeneração, visto que a imagem de ser “nascido de novo” na regeneração faz-
nos pensar a respeito de filhos nascidos numa família humana, mas o Novo
Testamento nunca associa a adoção com a regeneração: de fato a ideia de
adoção é oposta à ideia de ser nascido em uma família!
Antes, o Novo Testamento associa adoção com a fé salvífica e diz que em
resposta à nossa confiança em Cristo, Deus nos adota em sua família. Paulo diz:
“Pois todos vós sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus” (Gl 3:23-26).
João escreve: “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem
feitos filhos de Deus, a saber, aos que creem no seu nome” (Jo 1.12).2 Esses dois
versículos tomam claro que a adoção vem depois da conversão e que é a res-
posta de Deus à nossa fé.
Pode-se levantar objeção a isso com base na seguinte declaração de
Paulo: “E, porque vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração o Espírito de seu
Filho, que clama: Aba, Pai!” (Gl 4:6). Alguém pode entender esse versículo como
significando que primeiro Deus nos adotou como filhos e depois nos deu o
Espírito Santo para trazer regeneração ao nosso coração. Porém poucos versí-
culos antes Paulo tinha dito que somos feitos filhos de Deus “mediante a fé” (Gl
3:26). Portanto a declaração de Paulo em Gálatas 4:6 é mais bem entendida
não como se referindo à concessão do Espírito Santo na regeneração, mas
antes a outra atividade do Espírito Santo, na qual ele começa a dar testemunho
ao nosso espírito e a garantir-nos que somos membros da família de Deus. Essa
obra do Espírito Santo dá-nos garantia de nossa adoção, e é nesse sentido que
Paulo diz que, depois de sermos feitos filhos, Deus faz com que seu Espírito
Santo dentro de nosso coração clame “Aba, Pai” (cf. Rm 8:15-16).

3) A Adoção é algo distinto da Justificação:


Embora a adoção seja um privilégio que vem a nós ao mesmo tempo em que
nos tornamos cristãos (Jo 1:12; Gl 3:26; I Jo 3:1-2) é, contudo, um privilégio distinto
da justificação e da regeneração. Na regeneração nos tornamos espiritualmen-
te vivos, capazes de falar com Deus em oração e adoração e capazes de ouvir
sua Palavra com coração receptivo. Porém, é possível que Deus tenha criaturas
espiritualmente vivas e que, contudo, não são membros de sua família e não
34 | AULA 06

compartilham os privilégios especiais de membros da família - os anjos, por


exemplo, aparentemente se enquadram nessa categoria.
Além disso, Deus poderia nos ter dado a justificação sem os privilégios da
adoção em sua família, porque poderia ter perdoado nossos pecados e nos
dado o direito legal de estar diante dele sem tomar-nos seus filhos. É importan-
te entender isso porque nos ajuda a reconhecer quão grandes sãos os nossos
privilégios na adoção. A regeneração tem que ver com nossa vida espiritual
interior. A justificação tem que ver com nossa posição diante da lei de Deus.
Contudo, a adoção tem que ver com nossa comunhão com Deus como nosso
Pai, e por causa da adoção nos são dadas muitas das maiores bênçãos, das
quais nos lembraremos por toda a eternidade. Quando começamos a perceber
a excelência dessas bênçãos e compreendemos que Deus não tem a obrigação
de nos dar nenhuma delas, então somos capazes de dizer com o apóstolo João:
“Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados
filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus” (l Jo 3:1).

Os Privilégios da Adoção:
Os benefícios ou privilégios que acompanham a adoção são vistos primei-
ramente no modo como Deus se refere a nós e também no modo como nós
nos referimos uns aos outros como irmãos e irmãs na família de Deus.
a) A possibilidade de falar com Deus e de nos referirmos a Ele como um
Pai Bom e Amoroso:
Nós oramos: “Pai nosso, que estás nos céus” (Mt 6:9), e compreendemos
que “já não somos escravos, porém filhos” (Gl 6:7). Portanto, agora nos dirigi-
mos a Deus não como um escravo se dirige ao senhor de escravos, mas como
um filho se dirige ao pai. De fato, Deus nos dá um testemunho interno oriun-
do do Espírito Santo que faz com que instintivamente chamemos Deus de
nosso Pai. “Mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos:
Aba, Pai. O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de
Deus” (Rm 8:15-16).
Certamente é verdade que Deus é nosso Criador, nosso Juiz, nosso Senhor
e Mestre, nosso Instrutor, Provedor e Protetor, aquele que por meio de seu
cuidado providencial sustenta nossa existência. Contudo, o papel mais íntimo
e que transmite os mais altos privilégios de associação com Deus pela eternida-
de é o seu papel como nosso Pai celestial.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 35

O fato de Deus referir-se a nós como um Pai mostra muito claramente


que Ele amor nos tem concedido (l Jo 3:1), que Ele nos entende (“como um pai
se compadece de seus filhos, assim o Senhor se compadece dos que o
temem. Pois ele conhece a nossa estrutura e sabe que somos pó” [SI 103:13-
14]) e que Ele toma cuidado de nossas necessidades (“Porque os gentios é
que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que necessitais
de todas elas”, Mt 6:32). Além disso, nos seu papel de nosso Pai, Deus nos dá
muitas boas dádivas: “Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas aos
vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos
que lhe pedirem?” (Mt 7:11). De fato, não são apenas dádivas nesta vida que
Deus nos dá, mas também uma grande herança no céu, porque temo-nos
tornado herdeiros junto com Cristo.
b) O privilégio de ser guiado pelo Espírito Santo é também um benefí-
cio da adoção:
Paulo indica ser esse um benefício moral pelo qual o Espírito Santo põe
em nós o desejo de obedecer a Deus e de viver conforme sua vontade. Ele diz:
“Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus (Rm 8:14), e
ele concede isso como a razão pela qual os cristãos devem “mortificar os feitos
do corpo” por meio do Espírito Santo trabalhando dentro deles (v. 13; observe o
“pois” no começo do v. 14). Ele vê o Espírito Santo conduzindo e guiando os
filhos de Deus pelas veredas da obediência ao Pai.
c) O fato de que Deus nos disciplina como seus filhos:
O autor de Hebreus explica: “(Deus vos trata como filhos); pois que filhos há
que o pai não corrige? [...] Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a
fim de sermos participantes da sua santidade” (Hb 12:7-10). Assim como os
filhos naturais crescem em obediência e justiça quando disciplinados de
modo próprio por seus pais humanos, também crescemos em justiça e santi-
dade quando disciplinados por nosso Pai celestial.
d) Como filhos de Deus e herdeiros junto com Cristo, temos o privilégio de
compartilhar tanto de seus sofrimentos como de sua glória posterior:
Assim como “convinha que o Cristo padecesse e entrasse na sua glória” (Lc
24:26), também Deus nos dá o privilégio de percorrer o mesmo caminho que
Cristo percorreu, suportando sofrimentos nesta vida para que possamos tam-
bém receber grande glória na vida do porvir: “... se somos filhos, somos também
36 | AULA 06

herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, se com ele sofremos,


também com ele seremos glorificados” (Rm 8:17).
e) Também temos os privilégios da adoção que afetam a maneira pela qual nos
referimos um ao outro e afetam nossa própria conduta pessoal:
Muitas vezes o Novo Testamento se refere aos cristãos como “irmãos” e
“irmãs” em Cristo (Rm 1:13; 8:12; I Co 1:10; 6:8; Tg 1:2; Mt 12:50; Rm 16:1; I Co 7:15; Fp
1:2; Tg 2:15). A designação “irmão” é tão comum nas epístolas que parece ser a
maneira predominante pela qual os autores do Novo Testamento dirigem-se
aos outros cristãos a quem estão escrevendo. Isso indica a forte consciência
que eles tinham da natureza da igreja como família de Deus.
Esse conceito de igreja como família de Deus deve dar-nos uma nova
perspectiva sobre a obra da igreja; é “trabalho em família”, e os vários membros
da família nunca devem competir uns com os outros ou atrapalhar uns aos
outros, mas devem encorajar uns aos outros e ser gratos por todo e qualquer
bem ou progresso que qualquer membro da família receba, porque todos
estão contribuindo para o bem da família e para a honra de Deus, nosso Pai. De
fato, assim como os membros de uma família terrena frequentemente têm
momentos de alegria e comunhão quando trabalham juntos num mesmo
projeto, também nossos momentos trabalhando juntos ao edificar a igreja
devem ser momentos de grande alegria e comunhão uns com os outros.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 37

AULA 07
Santificação (Tornar-se Semelhante a Cristo) -
Como avançamos em direção à maturidade
cristã? Quais são as bênçãos
do crescimento cristão?

Explicação e Base Bíblica:


Chegamos à uma parte da aplicação da redenção que é uma obra progressiva,
que continua por toda nossa vida na terra. Também é uma obra na qual Deus e
o homem cooperam, cada um desempenhando papéis distintos. Essa parte da
aplicação da redenção é chamada santificação, assim definida: santificação é
uma obra progressiva da parte de Deus e do homem que nos toma cada vez
mais livres do pecado e semelhantes a Cristo em nossa vida presente.

Diferenças entre a Justificação e a Santificação :

JUSTIFICAÇÃO SANTIFICAÇÃO
Posição Legal Condição interna
De uma vez por todas Continua por toda a vida
Obra inteiramente de Deus Nós cooperamos
Perfeita nesta vida Não perfeita nesta vida
A mesma em todos os cristãos Maior em alguns do que em outros

Os Três Estágios da Santificação:

1) A santificação tem um começo definido na regeneração:


Uma mudança moral definida ocorre em nossa vida no momento da
38 | AULA 07

regeneração, porque Paulo fala sobre o “o lavar regenerador e renovador do


Espírito Santo” (Tt 3:5). Uma vez nascidos de novo não podemos continuar
pecando como um hábito ou como um padrão de vida (I Jo 3:9), porque o
poder da nova vida espiritual em nós nos impede de nos rendermos à uma
vida de pecados. Essa mudança moral é o primeiro estágio na santificação.
Nesse sentido, há uma “coincidência” entre regeneração e santificação,
porque essa mudança moral é realmente uma parte dela. Mas quando a
vemos da perspectiva da mudança moral interior, podemos considerá-la o
primeiro estágio da santificação.
Esse passo inicial da santificação envolve uma ruptura definitiva com o
poder preponderante do pecado, bem como com o amor ao pecado, para que
o crente não mais seja regido nem dominado por ele e não mais ame o pecado.
Paulo diz: “Assim também considerem vocês mortos para o pecado, mas vivos
para Deus, em Cristo Jesus [...] Porque o pecado não terá domínio sobre vós”
(Rm 6:11-14). Em termos práticos, isso significa que devemos afirmar duas
verdades. Por um lado, nunca seremos capazes de dizer: “Estou completamen-
te livre do pecado”, porque nossa santificação nunca estará completa (veja
abaixo). Só que, por outro lado, um cristão nunca deve dizer por exemplo: “Este
pecado me derrotou. Eu desisto. Faz 37 anos que tenho um péssimo tempera-
mento, e o terei até o dia em que eu morrer, e as pessoas têm de me aceitar do
jeito que eu sou!” Dizer essas coisas seria o mesmo que dizer que o pecado foi
vitorioso e permitir que ele reine em nosso corpo, admitindo a derrota e negan-
do a verdade das Escrituras.

2) A santificação aumenta por toda a vida:


Ainda que o Novo Testamento fale sobre um começo definido da santifi-
cação, também a vê como um processo que continua por toda nossa vida
cristã. Embora Paulo diga que seus leitores foram libertados do pecado (Rm
6:18) e que estão “mortos para o pecado, mas vivos para Deus” (Rm 6:11), ele
todavia reconhece que o pecado permanece na vida deles; por essa razão,
aconselha-os a não deixá-lo reinar e a nem se renderem a ele (Rm 6:12-13).
Portanto, o dever deles como cristãos é crescer cada vez mais na santificação,
assim como antes cresciam cada vez mais em pecado: “Assim como ofereces-
tes os vossos membros para a escravidão da impureza e da maldade para a
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 39

maldade, assim oferecei, agora, os vossos membros para servirem a justiça,


para a santificação” (Rm 6:19).
Paulo diz que por toda a vida cristã “todos nós [...] somos transformados,
de glória em glória, na sua própria imagem” (2 Co 3:18). Gradualmente nos
tomamos cada vez mais semelhantes a Cristo, conforme avançamos na vida
cristã. Portanto, ele diz: “Esquecendo- me das coisas que para trás ficam e
avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prê-
mio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Fp 3.13-14); em outras pala-
vras, embora Paulo não houvesse ainda alcançado a perfeição, prosseguia para
alcançar todos os propósitos pelos quais Cristo o salvara (v. 9-12).

3) A santificação se completará na morte (em nossa alma) e quando o


Senhor retornar (em nosso corpo):
Por causa do pecado que ainda permanece em nosso coração, embora
tendo-nos tornado cristãos (Rm 6:12-13; I Jo 1:18), nossa santificação nunca se
completará nesta vida. Mas uma vez que morramos e estejamos com o Senhor,
então nossa santificação se completa nesse sentido, porque nossa alma é
libertada do pecado que habita em nós aperfeiçoada. Entretanto, quando
consideramos que a santificação envolve a pessoa toda, incluindo nosso corpo
(veja 2 Co 7:1; I Ts 5:23), então compreendemos que ela não se completará intei-
ramente antes que o Senhor retome e ressuscitemos. Nós esperamos a vinda
de nosso Senhor Jesus Cristo do céu, quando ele “transformará o nosso corpo
de humilhação, para ser igual ao corpo da sua glória” (Fp 3:21). E “na sua vinda” (I
Co 15:23) que seremos vivificados com o corpo da ressurreição e então iremos
levar conosco plenamente “a imagem do celestial”.

Santidade
Perfeita

3 Morte

Crescimento
em
Santidade
2 Vida Cristã

Escravos Não 1 Conversão


do cristãos
Pecado
40 | AULA 07

Deus e o homem cooperam na Santificação:

1) O papel de Deus na Santificação:


Visto que a santificação é principalmente uma obra de Deus, a oração
de Paulo torna-se apropriada: “O mesmo Deus da paz vos santifique em
tudo” (I Ts 5:23). Um papel específico de Deus Pai na santificação é seu
processo de nos disciplinar como seus filhos (veja Hb 12:5-11). Paulo diz aos
filipenses que “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar,
segundo a sua boa vontade” (Fp 2:13), mostrando assim um pouco da manei-
ra como Deus os santifica - tanto causando neles o querer sua vontade como
dando-lhes poder para fazê-la.
O papel de Deus Filho, Jesus Cristo, na santificação é, primeiro, que Ele
conquistou nossa santificação para nós. Portanto, Paulo podia dizer que Deus
fez com que Cristo se nos tornasse “sabedoria, e justiça, e santificação, e reden-
ção” (I Co 1:30). Além disso, no processo de santificação, Jesus é também nosso
exemplo, porque corremos a carreira da vida “olhando firmemente para o
Autor e Consumador da fé, Jesus” (Hb 12:2). Pedro fala a seus leitores: “Também
Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus
passos” (I Pe 2:21). Também João diz: “Aquele que diz que permanece nele, esse
deve também andar assim como ele andou” (I Jo 2:6).
Mas é especificamente Deus Espírito Santo quem atua dentro de nós para
nos transformar e nos santificar, dando-nos maior santidade na vida. É o
Espírito Santo quem produz em nós o “fruto do Espírito” (Gl 5:22), os traços de
caráter que geram santificação cada vez maior. Se crescemos na santificação,
andamos “no Espírito” e somos “guiados pelo Espírito” (Gl 5:16-18; cf. Rm 8:14),
isto é, somos cada vez mais susceptíveis aos desejos e às orientações do Espírito
Santo em nossa vida e caráter. O Espírito Santo é o espírito da santidade e
produz santidade dentro de nós.

2) O nosso papel na Santificação:


O papel que desempenhamos na santificação é tanto passivo, pelo
qual dependemos de que Deus nos santifique, como ativo, pelo qual nos
esforçamos para obedecer a Deus e dar os passos que aumentarão a
nossa santificação.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 41

Primeiro, aquele que pode ser chamado papel “passivo” que desempe-
nhamos na santificação é visto em textos que nos encorajam a confiar em
Deus ou a orar pedindo que ele nos santifique. Paulo compreende que
somos dependentes da obra do Espírito Santo para crescer na santificação,
porque ele diz: “Se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamen-
te, vivereis” (Rm 8:13).
Esse papel ativo que devemos desempenhar é indicado quando Paulo
fala aos filipenses: “Assim, pois, amados meus, como sempre obedecestes, não
só na minha presença, porém, muito mais agora, na minha ausência, desenvol-
vei a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é quem efetua em vós o
querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.12-13). Paulo os incen-
tiva a obedecer até mesmo mais do que faziam quando ele estava presente. Ele
diz que a obediência é o modo pelo qual eles “desenvolvem a [própria] salva-
ção”, querendo dizer que eles “desenvolvem” a concretização dos benefícios da
salvação na vida cristã.
Muitas passagens específicas do Novo Testamento incentivam atenção
detalhada a vários aspectos da santidade e da piedade na vida (veja Rm 12:1-
14; Ef 4:17; 6:20; Fp 4:4-9; Cl 3:5; 4:6; I Pe 2:11; 5:11). Devemos desenvolver conti-
nuamente padrões e hábitos de santidade, porque essa medida de maturi-
dade é que faz com que os cristãos maduros tenham “as suas faculdades
exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal” (Hb 5:14).
O Novo Testamento não sugere quaisquer atalhos pelos quais possamos
crescer na santificação, mas simplesmente nos encoraja repetidamente a
dedicar-nos à “antiga” e consagrada fórmula de leitura da Bíblia e meditação
(SI 1:2; Mt 4:4; 17:17), oração (Ef 6:18; Fp 4:6), adoração (Ef 5:18-20), testemunho
(Mt 28:19-20), comunhão cristã (Hb 10:24-25) e autodisciplina ou domínio
próprio (Gl 5:23; Tt 1:8).

A Santificação afeta a pessoa como um todo:


Percebemos que a santificação afeta nosso intelecto e nosso conheci-
mento quando Paulo diz que nos revestimos do novo homem “que se refaz
para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Cl 3:10).
Ele ora para que os filipenses possam ver seu próprio amor aumentando “mais
e mais em pleno conhecimento e toda a percepção” (Fp 1:9). E roga aos cristãos
romanos que se transformem “pela renovação da vossa mente” (Rm 12:2).
42 | AULA 07

Embora nosso conhecimento de Deus seja mais do que conhecimento


intelectual, há certamente um componente intelectual nele, e Paulo diz que
esse conhecimento de Deus deve continuar aumentando durante nossa vida:
uma vida “de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado” é uma vida que
está continuamente “crescendo no pleno conhecimento de Deus” (Cl 1:10). A
santificação de nosso intelecto envolverá crescimento em sabedoria e conhe-
cimento à medida que levamos “cativo todo pensamento à obediência de
Cristo” (2 Co 10:5), constatando assim que nossos pensamentos são cada vez
mais os pensamentos que o próprio Deus nos concede pela sua palavra.
Além disso, o crescimento na santificação afetará nossas emoções.
Perceberemos gradualmente em nossa vida emoções como “amor, alegria,
paz, longanimidade” (Gl 5:22). Seremos cada vez mais capazes de obedecer à
ordem de Pedro de nos abstermos “das paixões carnais, que fazem guerra
contra a alma” (I Pe 2:11). Perceberemos realmente que não estamos amando “o
mundo nem as coisas que há no mundo” (I Jo 2:15), mas que nós, à semelhança
de nosso Salvador, estamos nos deleitando em fazer a vontade de Deus. Cada
vez mais seremos capazes de “obedecer de coração” (Rm 6:17) e descartaremos
as emoções negativas associadas a “amargura, e cólera, e ira, e gritarias, e blas-
fêmias” (Ef 4:31).
Além disso, a santificação terá um efeito sobre a nossa vontade, nossa
faculdade de tomar decisões, porque Deus é quem efetua em nós “o querer
como o realizar, segundo a sua boa vontade (Fp 2:13). Assim como crescemos
na santificação, também nossa vontade será cada vez mais moldada à vontade
de nosso Pai celestial. A santificação também afetará nosso espírito, a parte
não-física do nosso ser. Devemos purificar-nos “de toda impureza, tanto da
carne como do espírito, aperfeiçoando a nossa santidade no temor de Deus”
(2Co 7.1); Paulo diz que a preocupação com as coisas do Senhor significa dar
atenção a como ser santo “assim no corpo como no espírito” (I Co 7.34).
Finalmente, a santificação afeta nosso corpo físico. Paulo diz: “O mesmo Deus
da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e corpo sejam conserva-
dos íntegros e irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (l Ts 5:23).
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 43

AULA 08
A Perseverança dos Santos
(Conservar-se Cristão) - Como saber se
realmente nascemos de novo?

Explicação e Base Bíblica:


O tema da perseverança dos santos trata dessas questões. Pela perseve-
rança dos santos, todos aqueles que verdadeiramente nasceram de novo serão
guardados pelo poder de Deus e perseverarão como cristãos até o final da vida,
e só aqueles que perseverarem até o fim realmente nasceram de novo. Essa
definição tem duas partes. Indica primeiro que há uma garantia a ser dada
àqueles que realmente nasceram de novo, pois lembra-lhes de que o poder de
Deus irá conservá-los cristãos até a morte e que certamente viverão com Cristo
para sempre. Por outro lado, a segunda metade da definição deixa claro que a
perseverança na vida cristã é uma das evidências de que a pessoa realmente
nasceu de novo.

Todos os que verdadeiramente nasceram de novo perse-


verarão até o fim:
Muitas passagens pregam que aqueles que verdadeiramente nasceram
de novo, que são realmente cristãos, continuarão na vida cristã até a morte, e
então viverão com Cristo no céu. Diz Jesus:
Eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade
daquele que me enviou. E a vontade de quem me enviou é esta: que nenhum
eu perca de todos os que me deu; pelo contrário, eu o ressuscitarei no último
dia. De fato, a vontade de meu Pai é que todo homem que vir o Filho e nele crer
tenha vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia (Jo 6:38-40).
44 | AULA 08

Aqui diz Jesus que todos os que creem nele terão vida eterna. Diz que irá
ressuscitar essa pessoa no último dia - o que, nesse contexto de crer no Filho e
ter vida eterna, significa claramente que Jesus ressuscitará essa pessoa para a
vida eterna ao lado dele (não somente a ressuscitará para juízo e condenação).
Parece difícil evitar a conclusão de que todos os que verdadeiramente creem
em Cristo permanecerão cristãos até o dia da ressurreição final para as bênçãos
da vida na presença de Deus. Além disso, esse texto enfatiza que Jesus faz a
vontade do Pai, ou seja, “que nenhum eu perca de todos os que me deu” (Jo
6:39). Reafirma-se então: os que foram dados ao Filho pelo Pai não se perderão.
Os textos de Paulo e outras epístolas do Novo Testamento também trazem
elementos que indicam que os que verdadeiramente nascem de novo perseve-
rarão até o fim. “Já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”
(Rm 8:1); portanto, seria injusto que Deus reservasse algum tipo de castigo
eterno para os cristãos - nenhuma condenação há para eles, pois a penalidade
dos seus pecados já foi expiada integralmente.
Outras provas de que Deus guarda os que nascem de novo para a eterni-
dade é o “selo” que Deus coloca em nós. Tal “selo” é o Espírito Santo que habita
em nós, que também funciona como “penhor” divino de que receberemos a
herança que nos foi prometida: “Em quem também vós, depois que ouvistes a
palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido,
fostes selados com o Santo Espírito da promessa; o qual é o penhor da nossa
herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória” (Ef 1:13-14).
A palavra grega traduzida como “penhor” nessa passagem (arrabõn) é um
termo legal e comercial que significa “primeira prestação, depósito, entrada,
caução” e representa “um pagamento que obriga a parte contratante a fazer
novos pagamentos”. Quando Deus nos concedeu o Espírito Santo, ele se com-
prometeu a dar as outras bênçãos da vida eterna e uma grande recompensa no
céu ao lado dele.
Outro exemplo da garantia de que os crentes perseverarão até o fim se
encontra na declaração de Paulo aos filipenses: “Estou plenamente certo de
que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de
Cristo Jesus” (Fp 1.6). O plural “vós” (gr. hymas) indica que Paulo se refere aos
cristãos da igreja filipense em geral, mas mesmo assim ele fala dos crentes aos
quais escreve e diz que a boa obra que Deus começou neles continuará e será
completada no dia da volta de Cristo.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 45

Pedro diz aos seus leitores que são eles os que são “guardados pelo poder de
Deus, mediante a fé, para a salvação preparada para revelar-se no último tem-
po” (I Pe 1:5). A palavra “guardados” (gr. phroureõ) pode significar tanto “impedi-
dos de fugir” quanto “protegidos de ataque”, e talvez os dois sentidos estejam
implícitos aqui: Deus impede que os crentes fujam do seu reino, e os protege
de ataques externos. Assim podemos definir o sentido do versículo dizendo
que “Deus está continuamente usando o seu poder para guardar o seu povo
mediante a fé desse povo”, uma declaração que parece implicar que o poder
divino na verdade fortalece e continuamente sustenta a fé do indivíduo. No
entanto, o poder de Deus age continuamente “mediante” a sua fé. E se os cren-
tes quiserem saber se Deus os está guardando? Ora, se eles persistem na fé em
Deus por meio de Cristo, Deus atua para guardá-los e por isso merece reconhe-
cimento. Essa ênfase na proteção de Deus combinada à nossa fé proporciona
uma transição natural à segunda metade da doutrina da perseverança.

Aqueles que acabam se afastando podem dar muitos sina-


is exteriores de conversão:
Será sempre fácil distinguir os membros da igreja que têm autêntica fé
salvífica daqueles que têm apenas um convencimento intelectual da verdade
do evangelho, mas não a autêntica fé no coração? Não, nem sempre é fácil, e a
Bíblia afirma em várias passagens que descrentes em aparente comunhão
com a igreja podem dar alguns sinais ou indicações exteriores que os façam
parecer crentes verdadeiros. Por exemplo, Judas, que traiu Cristo, deve ter
agido quase exatamente como os outros discípulos durante os três anos em
que esteve com Jesus.
Tão convincente era a sua conformidade à conduta dos outros discípulos
que ao final dos três anos de ministério de Jesus, quando ele declarou que um
dos seus discípulos o trairia, nem todos suspeitaram de Judas, mas “começa-
ram um por um a perguntar-lhe: Porventura, sou eu, Senhor?” (Mt 26:22; cf. Mc
14:19; Lc 22:23; Jo 13:22). Porém, Jesus sabia que não havia fé genuína no coração
de Judas, pois disse a certa altura: “Não vos escolhi eu em número de doze?
Contudo, um de vós é diabo” (Jo 6:70). João mais tarde escreveu no seu evange-
lho que “Jesus sabia, desde o princípio, quais eram os que não criam e quem o
havia de trair” (Jo 6:64), mas os discípulos mesmos não sabiam.
46 AULA 08

Podemos ver isso também na declaração de Jesus sobre o que acontecerá


no juízo:
Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas
aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia,
hão de dizer- me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em
teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fize-
mos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci.
Apartai-vos de mim, os que praticais a iniquidade (Mt 7:21-23).
Embora essas pessoas profetizassem, expulsassem demônios e fizes-
sem “muitos milagres” em nome de Jesus, a capacidade de fazer tais obras
não garantia que eram cristãs. Diz Jesus: “Nunca vos conheci”. Não diz: “Eu
vos conheci um dia, mas já não vos conheço” nem “Eu vos conheci um dia,
mas vos afastastes de mim”, e sim: “Nunca vos conheci”. Nunca foram cren-
tes de verdade.
Finalmente, há uma passagem de Hebreus que também afirma que
aqueles que acabam se afastando podem dar muitos sinais exteriores de
conversão e parecer cristãos em muitos aspectos. Escreve o autor:
É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados, e prova-
ram o dom celestial, e se tomaram participantes do Espírito Santo, e provaram
a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro, e caíram, sim, é impos-
sível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão cruci-
ficando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia (Hb 6:4-6).
O autor diz que “uma vez foram iluminados” (Hb 6:4), mas essa ilumina-
ção significa simplesmente que eles compreenderam as verdades do evan-
gelho, não que tenham respondido a essas verdades com genuína fé salvífi-
ca, provaram a bondade da Palavra de Deus, mas depois, apesar de tudo isso,
se “caíram [...] crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à
ignomínia” (Hb 6:6), então rejeitaram deliberadamente todas essas bênçãos
e se voltaram decididamente contra elas. E possível que todos conheçamos
(às vezes pela sua própria confissão) pessoas que estão há muito tempo na
comunhão da igreja sem ser cristãs nascidas de novo. Há muito tempo pon-
deram o evangelho, mas continuam a resistir ao chamado do Espírito Santo,
talvez por causa da relutância em entregar a sua soberania a Jesus, preferin-
do apegar-se a si mesmas.
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 47

O que pode dar ao crente a plena segurança?

1) Será que confio hoje na salvação de Cristo?


Paulo diz aos colossenses que eles serão salvos no último dia, “se é que
permaneceis na fé, alicerçados e firmes, não vos deixando afastar da esperança
do evangelho que ouvistes” (Cl 1:23). Portanto, a pessoa deve perguntar-se:
“Será que hoje confio em que Cristo perdoará os meus pecados e me levará
inculpável ao céu, para a eternidade? Será que tenho no meu coração a fé de
que ele já me salvou? Se eu fosse morrer hoje à noite e comparecesse perante o
tribunal de Deus, e se ele me perguntasse por que haveria de me admitir no
céu, será que eu pensaria nas minhas boas ações, confiando nelas, ou sem
hesitar diria que confio nos méritos de Cristo, com absoluta certeza de que ele é
o meu pleno Salvador?”

2) Há porventura no meu coração provas da obra regeneradora do


Espírito Santo?
Primeiro, há a ação subjetiva do Espírito Santo dentro do nosso coração,
testemunhando que somos filhos de Deus (Rm 8:15-16; I Jo 4:13). Esse testemu-
nho será geralmente acompanhado de um senso da orientação do Espírito
Santo pelos caminhos da obediência à vontade de Deus (Rm 8:14).
Além disso, se o Espírito Santo estiver realmente ativo em nós, ele produzi-
rá as virtudes que Paulo chama de “fruto do Espírito”. Ele lista várias atitudes e
virtudes geradas pelo Espírito Santo: “amor, alegria, paz, longanimidade,
benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gl 5:22-23). É
claro que a questão não é “será que exemplifico perfeitamente todas essas
virtudes?”, mas sim “será que essas coisas caracterizam em geral a minha vida?
Será que sinto no meu coração essas virtudes? Será que os outros (especial-
mente os mais próximos de mim) veem em mim essas virtudes? Venho por
acaso me aperfeiçoando nelas ao longo dos anos?”
Outra prova da obra do Espírito Santo é continuar a crer e aceitar o bom
ensinamento da igreja. Aqueles que começam a negar importantes doutrinas
da fé dão graves sinais negativos a respeito da sua salvação: “Todo aquele que
nega o Filho, esse não tem o Pai [...] Se em vós permanecer o que desde o princí-
pio ou vistes, também permanecereis vós no Filho e no Pai” (I Jo 2:23-24). João
48 | AULA 08

também diz: “Aquele que conhece a Deus nos ouve; aquele que não é da parte
de Deus não nos ouve” (I Jo 4:6).

3) Será que percebo uma tendência constante de crescimento na


minha vida cristã?
Pedro dá mais um tipo de teste que podemos fazer para verificar se somos
crentes autênticos. Ele nos diz que há algumas virtudes que, cultivadas conti-
nuamente, garantem que não tropeçaremos “em tempo algum” (2 Pe 1:10). Ele
aconselha aos seus leitores acrescer à sua fé “virtude [...] conhecimento [...]
domínio próprio [...] perseverança [...] piedade [...] fraternidade [...] amor” (2 Pe
1:5-7). Depois diz que essas coisas devem existir nos seus leitores, “aumentando”
continuamente (2 Pe 1:8). Pedro ainda acrescenta que eles devem procurar
“com diligência cada vez maior, confirmar a [...] vocação e eleição [deles]” e diz
depois que “procedendo assim (literalmente, “fazendo essas coisas”, com
referência às virtudes mencionadas nos v. 5-7), não tropeçareis em tempo
algum” (2 Pe 1:10).
O modo de confirmar a vocação e eleição é, então, continuar crescendo
“nessas coisas”. Isso implica que a nossa certeza de salvação pode crescer ao
longo do tempo.
O resultado dessas três perguntas que podemos fazer a nós mesmos deve
ser uma certeza mais firme para os verdadeiros crentes. Dessa forma a doutrina
da perseverança dos santos será uma doutrina tremendamente tranquilizado-
ra. Ninguém que tenha tal certeza deve perguntar-se: “Serei capaz de perseve-
rar até o final da vida, sendo, portanto, salvo?” Todos os que adquirem essa
certeza por meio desse exame de consciência devem pensar de outro modo:
“Verdadeiramente nasci de novo; logo, com toda a certeza perseverarei até o
final, pois sou guardado 'pelo poder de Deus' que age por intermédio da minha
fé (I Pe 1:5) e, portanto, jamais me perderei. Jesus me ressuscitará no último dia
e entrarei no seu reino para sempre” (Jo 6:40).
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 49

AULA 09
A Morte e o Estado Intermediário -
Qual o propósito da morte na vida cristã?
O que acontece com o nosso corpo e
com a nossa alma quando morremos?

Explicação e Base Bíblica:


Nossa abordagem sobre a aplicação da redenção não pode deixar de
considerar a morte, e a questão de como o cristão deve encarar sua própria
morte e também a de outros. É necessário também que perguntemos o que
acontece conosco entre o momento de nossa morte e a volta de Cristo, quando
ele nos dará nosso corpo ressurreto.

Por que cristãos morrem?

1) A morte não é um castigo para os cristãos:


Paulo diz-nos claramente que “nenhuma condenação há para os que
estão em Cristo Jesus” (Rm 8:1). Toda a pena dos nossos pecados já foi paga.
Portanto, embora saibamos que os cristãos morrem, não devemos ver a morte
do cristão como um castigo de Deus ou como resultado da punição devida dos
nossos pecados. É verdade que a morte é a punição do pecado, todavia essa
punição não se aplica mais a nós - não em termos de morte física, nem em
termos de morte espiritual ou separação de Deus. Tudo já foi pago por Cristo.
Portanto, se queremos entender por que os cristãos morrem, devemos procu-
rar alguma outra razão que não seja o castigo dos nossos pecados.

2. Em um mundo caído, a morte é o desfecho da vida:


Em sua grande sabedoria, Deus decidiu que não estenderia a nós os
50 | AULA 09

benefícios da obra redentora de Cristo de uma só vez. Em vez disso, escolheu


estender gradualmente a nós os benefícios da salvação. De igual modo,
Deus não quis eliminar de imediato todo o mal do mundo, mas sim esperar
até o juízo final e o estabelecimento dos novos céus e da nova terra. Em
resumo, ainda vivemos em um mundo caído, e nossa experiência da salva-
ção ainda é incompleta.
O último aspecto do mundo caído a ser eliminado é a morte. Paulo afirma:
E então virá o fim, quando ele entregar o reino a Deus e Pai, quando houver
destruído todo principado, bem como toda potestade e poder. Porque con-
vém que ele reine até que haja posto todos os inimigos debaixo dos pés. O
último inimigo a ser destruído é a morte (I Co 15.24-26).
Quando Cristo voltar,
... então, se cumprirá a palavra que está escrita:
“Tragada foi a morte pela vitória.”
“Onde está, ó morte, a tua vitória?
Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (I Co 15.54-55).
Todavia, enquanto esse tempo não chega, a morte permanece uma reali-
dade até mesmo na vida dos cristãos. Embora a morte não nos atinja como
punição pelos nossos pecados pessoais (pois eles foram pagos por Cristo), ela
nos alcança como resultado de viver em um mundo caído, onde as consequên-
cias do pecado não foram eliminadas completamente.

3. Deus usa a experiência da morte para completar a nossa santificação:


Em toda nossa vida como cristãos, sabemos que nunca temos de pagar
pelo pecado, pois tudo foi pago por Cristo (Rm 8:1). Portanto, quando experi-
mentamos dor e sofrimento na vida, nunca devemos pensar que Deus está-nos
castigando (para nos causar algum mal). As vezes o sofrimento é apenas resul-
tado de uma vida pecaminosa, de um mundo caído, e muitas vezes passamos
por sofrimento porque Deus está-nos disciplinando (para o nosso bem), mas
em todos os casos temos certeza, conforme Romanos 8:28, de que “Deus age
em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, que foram chamados de
acordo com o seu propósito”.
A compreensão de que a morte não é de forma alguma um castigo do
pecado, mas apenas algo que Deus nos causa para tomar-nos mais semelhan-
tes a Cristo, deve servir de grande incentivo para nós e livrar-nos do temor da
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 51

morte que apavora a mente dos descrentes (Hb 2:15). Todavia, embora Deus
nos beneficie através do processo da morte, precisamos ainda lembrar que a
morte não é natural; é algo estranho, e em um mundo criado por Deus é algo
que não deveria existir. Trata-se de um inimigo, o qual Cristo finalmente
destruirá (I Co 15:26).

4. Nossa experiência da morte completa nossa união com Cristo:


Outra razão por que Deus nos permite passar pela morte, em vez de levar-
nos diretamente para o céu quando nos tomamos cristãos, é que através da
morte imitamos a Cristo no que ele fez, experimentando assim uma união
mais íntima com ele. Paulo pode afirmar que somos herdeiros com Cristo: “Se
com ele sofremos, também com ele seremos glorificados” (Rm 8:17). E Pedro
diz aos seus leitores que não se surpreendam com a prova de fogo que estão
enfrentando, antes, anima-os, dizendo: “Alegrai-vos na medida em que sois
co-participantes dos sofrimentos de Cristo, para que também, na revelação
de sua glória, vos alegreis exultando” (I Pe 4:13). Como observamos, essa união
com Cristo no sofrimento inclui também união com ele na morte (veja Fp
3:10). Jesus é o “autor e consumador de nossa fé” (Hb 12:2), e nós somos os seus
seguidores enquanto corremos a corrida da vida. Pedro escreve: “... pois que
também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes
os seus passos” (I Pe 2:21).

5. Nossa obediência a Deus é mais importante do que a preservação de


nossa vida:
Se Deus usa a experiência da morte para aprofundar nossa confiança
nele e aumentar nossa obediência a ele, é importante que nos lembremos de
que o alvo do mundo de preservar a vida a todo custo não é o principal alvo
do cristão: obediência e fidelidade a Deus em qualquer circunstância é
muito mais importante. Foi por essa razão que Paulo podia dizer: Estou
pronto não só para ser preso, mas até para morrer em Jerusalém pelo nome
do Senhor Jesus” (At 21.13; cf. 25.11). Ele disse aos líderes de Éfeso: “Porém em
nada considero a minha vida preciosa, contanto que complete a minha
carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar do
evangelho da graça de Deus” (At 20.24).
52 | AULA 09

A certeza de que podemos honrar a Deus mesmo diante da morte e de


que ser fiel a ele é muito mais importante do que preservar a vida tem dado
coragem e motivação aos mártires através da história da igreja. Quando diante
da escolha entre preservar a própria vida ou pecar, ou entre entregar a vida ou
ser fiel, eles escolhiam entregar a vida - “mesmo em face da morte, não ama-
ram a própria vida” (Ap 12.11). Mesmo em tempos quando não há perseguição e
há pouca possibilidade de martírio, seria bom que guardássemos essa verdade
na mente de uma vez por todas, pois se estamos dispostos a entregar até a vida
para sermos fiéis a Deus, acharemos muito mais fácil entregar tudo o mais por
amor a Cristo.

Como devemos entender nossa própria morte e a morte


dos outros?

1) A nossa morte:
O Novo Testamento incentiva-nos a ver nossa própria morte não com
temor, mas com alegria na esperança de estar com Cristo. Paulo diz: “Preferin-
do deixar o corpo e habitar com o Senhor” (2 Co 5:8). Quando estava preso, sem
saber se iria morrer ou ser libertado, ele pôde afirmar:
Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro. Entretanto se o
viver na carne traz fruto para o meu trabalho, já não sei o que hei de escolher.
Ora, de um e outro lado, estou constrangido, tendo o desejo de partir e estar
com Cristo, o que é incomparavelmente melhor.
Os cristãos não precisam temer a morte, pois as Escrituras garantem-nos
repetidamente que nem mesmo a “morte poderá separar-nos do amor de
Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8:38-39). Na verdade, Jesus
morreu para que “livrasse a todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à
escravidão por toda a vida” (Hb 2:15). Esse versículo lembra-nos de que nossa
postura nítida de tranquilidade diante do medo da morte expressará um
tremendo testemunho para os cristãos em uma época em que se procura
evitar falar da morte e em que não há respostas para ela.

2) A morte dos amigos e parentes cristãos:


Embora possamos ver nossa própria morte com a feliz expectativa de
estar na presença de Cristo, nossa atitude será um pouco diferente quando
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 53

enfrentarmos a morte de amigos e parentes cristãos. Nesses casos haveremos


de experimentar verdadeira tristeza - mas acompanhada também de alegria
pelo fato de eles terem partido para estar com o Senhor.
Não é errado expressar verdadeira tristeza pela perda da comunhão com
nossos amados que morreram, bem como pelo sofrimento e pela dor pelos
quais passaram antes de falecer. As vezes os cristãos pensam que é falta de fé
lamentar profundamente a morte de um irmão ou de uma irmã na fé. Porém
as Escrituras não concordam com essa ideia, pois quando Estêvão foi apedreja-
do, lemos que “alguns homens piedosos sepultaram Estêvão e fizeram grande
pranto sobre ele” (At 8:2).
Todavia, a tristeza que sentimos está claramente mesclada com esperan-
ça e alegria. Paulo diz aos tessalonicenses que de modo nenhum deveriam
entristecer-se por seus amados que haviam morrido, mas escreve: “... para não
vos entristecerdes como os demais, que não têm esperança” (l Ts 4:13) - eles não
deveriam ficar tristes da mesma maneira, com o mesmo desespero amargo
que os descrentes têm. Mas, com certeza deveriam entristecer- se. Ele lhes
garante que Cristo “morreu por nós para que, quer vigiemos, quer durmamos,
vivamos em união com ele” (l Ts 5:10), encorajando-os com o fato de que aque-
les que morreram estão com o Senhor. É por isso que as Escrituras podem
dizer: “Bem-aventurados os mortos que, desde agora, morrem no Senhor [...]
pois as suas obras os acompanham” (Ap 14:13). De fato, as Escrituras até chegam
a dizer-nos: “Preciosa é aos olhos do Senhor a morte dos seus santos” (SI 116:15).

3) A morte dos descrentes:


Quando os descrentes morrem, a tristeza que sentimos não é acompa-
nhada da alegria da certeza de que eles foram estar com o Senhor para sempre.
Essa tristeza, especialmente com respeito àqueles que estão mais próximos de
nós, é muito profunda e real. Apesar disso, também pode ser dito que muitas
vezes nós não temos certeza absoluta de que determinada pessoa tenha
persistido rejeitando a Cristo até ã hora da morte. A convicção da morte imi-
nente muitas vezes faz com que a pessoa à beira da morte busque a Deus de
coração, e às vezes textos bíblicos ou testemunhos de cristãos ouvidos há
muito tempo vêm à mente e aquela pessoa pode chegar ao arrependimento e
à fé verdadeiros.
54 | AULA 09

No entanto, depois que um descrente morre, será um erro sugerir a


outros a idéia de que o falecido tenha ido para o céu. Isso serviria apenas de
informação enganosa e de falsa segurança, contribuindo para diminuir a
urgência da necessidade de crer em Cristo por parte daqueles que ainda
estão vivos. E muito melhor, quando há oportunidade, concentrar-se no fato
de que a tristeza que sentimos pela perda de alguém a quem amamos leva-
nos também a refletir sobre nossa própria vida e sobre nosso próprio destino.
De fato, os momentos quando temos condições de falar como amigo aos
queridos de um descrente que faleceu são muitas vezes ocasiões quando o
Senhor nos dá oportunidades de compartilhar o evangelho com aqueles que
ainda estão vivos.

O que acontece depois da morte?

1) A alma dos cristãos vai imediatamente para a presença de Deus:


A morte é a interrupção temporária da vida no corpo e a separação da
alma do corpo. Quando o cristão morre, embora o corpo permaneça na terra e
seja sepultado, no momento da morte a alma (ou o espírito) vai imediatamente
para a presença de Deus, cheia de alegria. Quando Paulo pensa em morte, ele
afirma: “Preferindo deixar o corpo, e habitar com o Senhor” (2 Co 5:8). Deixar o
corpo é estar com o Senhor, no lar. Ele também diz que seu desejo é “partir e
estar com Cristo” (Fp 1:23). Jesus também disse ao ladrão que estava morrendo
ao lado dele na cruz: “Hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23:46). O autor de
Hebreus diz que quando os cristãos se reúnem para o culto eles não estão
apenas na presença de Deus no céu, mas também na presença dos “espíritos
dos justos aperfeiçoados” (Hb 12.23).7 Todavia, como veremos mais detalhada-
mente no próximo capítulo, Deus não deixará nosso corpo sem vida na terra
para sempre, pois quando Cristo voltar, a alma dos cristão será reunida ao
corpo. O corpo dos cristãos será levantado dentre os mortos, e eles viverão
eternamente com Cristo.

2) A alma dos descrentes vai imediatamente para o castigo eterno:


A Bíblia nunca nos incentiva a pensar que haverá segunda chance de
aceitar Cristo depois da morte. Na verdade, o quadro é exatamente o oposto. A
passagem em que Jesus fala do rico e de Lázaro não dá esperanças de que seja
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 55

possível passar do inferno para o céu depois da morte, apesar de ter o rico
clamado no inferno: “Pai Abraão, tem misericórdia de mim! E manda a Lázaro
que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou
atormentado nesta chama”. E Abraão respondeu: “E, além de tudo, está posto
um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui
para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós” (Lc 16:24-26).
O livro de Hebreus relaciona a morte com a consequência do juízo na
seguinte ordem: “E, assim como aos homens está ordenado morrerem uma só
vez, vindo, depois disto, o juízo...” (Hb 9:27). Além do mais, a Bíblia nunca apre-
senta o juízo final como dependente de algo feito depois da morte, mas
somente do que aconteceu nesta vida (Mt 25:31-46; Rm 2:5-10; cf. 2 Co 5:10). A
condenação não vem somente por causa de uma rejeição deliberada de Cristo,
mas também por causa dos pecados que cometemos e da rebelião contra
Deus, representada em tais pecados (veja Jo 3:18).
Ainda que os descrentes passem para um estado de castigo eterno imedi-
atamente depois da morte, o corpo deles não ressuscitará antes do dia do juízo
final. Naquele dia, o corpo deles será ressuscitado e reunido à alma, e eles
estarão de pé diante do trono de Deus para o juízo final, que será pronunciado
sobre eles, ressurretos em um corpo (veja Mt 25:31-46; Jo 5:28-29; At 24:15 e Ap
20:12,15).
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A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 57

AULA 10
Glorificação
(Receber o Corpo Ressurreto) - Quando
receberemos o corpo ressurreto?
Como será esse corpo?

Explicação e Base Bíblica:


Quando Cristo nos redimiu, ele não redimiu apenas o nosso espírito (ou
alma), mas inteiramente, como pessoa, o que inclui a redenção do nosso
corpo. Portanto, a extensão da obra redentora de Cristo em nosso favor não
estará completa até que nosso corpo seja inteiramente libertado dos efeitos
da queda e levado ao estado de perfeição para o qual Deus nos criou. Na
verdade, a redenção do nosso corpo acontecerá somente quando Cristo
voltar e nos ressuscitar dentre os mortos. dia quando seremos glorificados
será um dia de grande vitória porque naquele dia o último inimigo, a morte,
será destruída, conforme predizem as Escrituras: “Pois ele reinará até que
tenha posto todos os inimigos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser
destruído é a morte” (I Co 15.25-26).
Portanto, podemos definir glorificação da seguinte forma: glorificação é o
passo final da aplicação da redenção. Ocorrerá quando Cristo voltar e levantar
dentre os mortos o corpo de todos os cristãos que morreram, de todas as épo-
cas, reunindo-o com a alma de cada um, e mudar o corpo de todos os cristãos
que estiverem vivos, dando assim, ao mesmo tempo, a todos os cristãos um
corpo ressurreto como o seu.

A prova da glorificação no Novo Testamento:


A principal passagem do Novo Testamento sobre a glorificação ou a
ressurreição do corpo é 1 Coríntios 15:12-58. Paulo afirma: “Também em Cristo
todos serão vivificados. Mas cada um por sua vez: Cristo, as primícias, e então na
sua vinda os que pertencem a Cristo” (v. 22-23). Ele então conclui a passagem
58 | AULA 10

dizendo que nem todos os cristãos morrerão, mas que alguns que permanece-
rem vivos quando Cristo voltar terão o corpo imediatamente transformado em
novo corpo ressurreto, que nunca poderá envelhecer, enfraquecer nem morrer:
Digo-vos um mistério. Nem todos dormiremos, mas todos seremos transfor-
mados, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao soar da última trombe-
ta. Pois a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós sere-
mos transformados (I Co 15:51-52).
Paulo explica melhor em 1 Tessalonicenses que as almas dos que tiverem
morrido e partido para estar com Cristo voltarão e serão reunidos aos seus
corpos naquele dia, pois Cristo os trará consigo: “Se cremos que Jesus morreu e
ressuscitou, também, através de Jesus, Deus trará com ele os que tiverem
dormido” (I Ts 4:14). Assim esses cristãos que morreram com Cristo também são
ressuscitados para encontrar-se com Cristo (Paulo diz no v. 17: “Seremos arreba-
tados nas nuvens para o encontro com o Senhor nos ares”). Isso só faz sentido se
referir-se às almas dos cristãos que tiverem ido à presença de Cristo e que
voltarem com ele, e aos corpos deles ressuscitados dentre os mortos para
serem reunidos com suas almas, e assim subirem para estar com Cristo.
Além desses textos de 1 Coríntios 15 e 1 Tessalonicenses 4, vários outros
textos do Novo Testamento afirmam a realidade da doutrina da glorificação.
Jesus afirma: “A hora vem quando todos os que estiverem no túmulo ouvirão a
sua voz e sairão, os que tiverem feito o bem para a ressurreição da vida, e os que
tiverem feito o mal para a ressurreição do juízo” (Jo 5:28-29). Jesus também diz:
“Esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum daqueles
que ele me deu, mas ressuscite-os no último dia. Pois esta é a vontade de meu
Pai, que todo aquele que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna; e eu o ressus-
citarei no último dia” (Jo 6:39-40).
Paulo afirma: “Aquele que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivi
ficará os vossos corpos mortais através do seu Espírito que habita em vós” (Rm
8:11; cf. 2 Co 5:1-10). Ele deixa claro que os cristãos devem viver na expectativa
ansiosa da volta de Cristo e da transformação de nosso corpo, que se tomará
como o próprio corpo perfeito de Cristo. Ele afirma: “Mas a nossa pátria está no
céu, de onde aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará
nosso corpo vil à semelhança do seu corpo glorioso, pelo poder que o capacita
a sujeitar todas as coisas a si mesmo” (Fp 3:20).

A base da glorificação no Antigo Testamento:


Às vezes fala-se que o Antigo Testamento traz pouca ou nenhuma evidên-
cia da esperança de uma futura ressurreição do corpo. Todavia, há na verdade
mais evidência veterotestamentária dessa esperança do que possamos imagi-
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 59

nar. Em primeiro lugar, mesmo antes de Jesus ressuscitar dos mortos, o Novo
Testamento indica que muitos judeus da época de Cristo tinham alguma
esperança de uma futura ressurreição do corpo. Quando Jesus foi à casa de
Lázaro, depois da morte deste, e disse à Marta: “Teu irmão vai ressuscitar”, Marta
responde: “Eu sei que ele há de ressuscitar na ressurreição do último dia (Jo
11:23-24). Além disso, quando Paulo estava no tribunal, disse a Félix que ele
tinha uma “esperança em Deus que estes mesmos [seus acusadores judeus]
aceitam, que haverá uma ressurreição de justos e de injustos” (At 24:15).
Também lemos que muitos santos do Antigo Testamento “todos morre-
ram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudan-
do-as, e confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra [...] Mas,
agora, aspiram a uma pátria superior, isto é, celestial Por isso, Deus não se
envergonha deles, de ser chamado o seu Deus, porquanto lhes preparou uma
cidade” (Hb 11:13-16). O autor chega até a dizer que Abraão “considerou que
Deus era poderoso até para ressuscitá-lo dentre os mortos” (Hb 11:19).
Quando olhamos para os próprios ensinos do Antigo Testamento, há
indicações de que seus autores tinham forte expectativa da ressurreição futura.
Embora os salvos do Antigo Testamento de certo não tivessem muitos detalhes
sobre a natureza da ressurreição ou sobre o modo que ela aconteceria por meio
do Messias, e ainda que não tivessem uma base tão clara para a confiança na
ressurreição como nós temos no evento real da ressurreição corporal de Cristo,
ainda assim, como pudemos ver, havia com certeza uma expectativa do dia
futuro da ressurreição corporal.

Com que se parecerá o corpo da ressurreição?


Se Cristo ressuscitará o nosso corpo dentre os mortos na ocasião de sua
volta, e se o nosso corpo será semelhante ao corpo ressurreto de Cristo (I Co
15:20, 23, 49; Fp 3:21), com que se parecerá o nosso corpo ressurreto?
Usando o exemplo do plantio da semente no solo com a devida espera
até que ela cresça e se transforme em algo muito mais maravilhoso, Paulo
prossegue para explicar com mais detalhes com que se parecerá o corpo
da ressurreição:
Semeia-se o corpo na corrupção, ressuscita na incorrupção. Semeia-se em
desonra, ressuscita em glória. Semeia-se em fraqueza, ressuscita em poder.
Semeia-se corpo natural, ressuscita corpo espiritual. Se há corpo natural, há
também corpo espiritual [...] E, assim como trouxemos a imagem do que é
terreno, devemos trazer também a imagem do celestial (I Co 15:42-44,49).
O fato de que o nosso corpo será “incorruptível” significa que ele não se
desgastará, não envelhecerá e não estará sujeito a nenhuma enfermidade ou
60 | AULA 10

doença. Será para sempre um corpo plenamente saudável e forte. Além disso,
visto que o envelhecimento gradual faz parte do processo pelo qual o nosso
corpo está agora sujeito à “corrupção”, é certo pensar que o corpo da ressurrei-
ção não terá sinais de envelhecimento, mas terá perpetuamente as caracterís-
ticas da juventude acompanhadas de maturidade como homens e mulheres.
Não haverá sinal de doença nem de dor, pois todos seremos perfeitos. O nosso
corpo ressurreto mostrará o cumprimento da plena sabedoria de Deus ao criar-
nos como seres humanos, ápice de sua criação, portadores adequados de sua
imagem e semelhança. Nesse corpo ressurreto veremos o que Deus pretendia
que fôssemos enquanto seres humanos.
Paulo também afirma que o nosso corpo será ressuscitado “em glória”.
Quando esse termo aparece em contraste com “desonra”, como é o caso aqui, há
uma sugestão de como seremos belos e atraentes no novo corpo. Não haverá
mais algo “desonroso” ou desprezível, mas o corpo parecerá “glorioso” em sua
beleza. Além disso, visto que a palavra “glória” é tantas vezes usada na Bíblia para
se referir ao brilho resplandecente e radiante que envolve a presença do próprio
Deus, esse termo sugere que haverá também um tipo de brilho ou resplendor à
volta de nosso corpo que será um sinal externo apropriado da nossa posição de
exaltação e domínio, dado a nós por Deus sobre toda a criação.
Finalmente, Paulo afirma que o corpo ressuscitará “corpo espiritual” (I Co
15:44). Nas epístolas paulinas, a palavra “espiritual” (gr. pneumatikon) nunca
tem o sentido “não físico”, mas sim “consonante com o caráter e a atividade do
Espírito Santo” (veja, por exemplo, Rm 1:11; 7:14; I Co 2:13, 15; 3:1; 14:37; Gl 6:1 [“vós,
que sois espirituais”]; Ef 5.:9). Uma paráfrase mais clara seria: “Semeia-se em
corpo natural sujeito às características e desejos dessa era, regido por sua pró-
pria vontade pecaminosa, mas ressuscita-se corpo espiritual, inteiramente
sujeito à vontade do Espírito Santo e sensível à direção desse Espírito”. Esse
corpo nada tem de “não físico”, mas é um corpo físico elevado ao grau de perfei-
ção que Deus originalmente pretendeu que tivéssemos.
Concluindo, quando Cristo voltar, Ele nos dará um novo corpo ressur-
reto para ser semelhante ao seu próprio corpo. “Quando ele se manifestar
seremos semelhantes a ele” (I Jo 3:2; essa afirmação é verdadeira não
somente no sentido ético mas também com referência ao corpo físico; cf. I
Co 15:49 e Rm 8:29).

Toda a criação também será renovada:


Quando Adão pecou Deus amaldiçoou a terra por causa dele (Gn 3:17-19),
de maneira que ela passou a produzir cardos e abrolhos e só daria alimento útil
para o homem por meio de trabalho árduo. Mas Paulo afirma que “a própria
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 61

criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos


filhos de Deus” (Rm 8:21). Ele explica que isso acontecerá quando recebermos o
corpo da ressurreição - de fato, ele afirma que a criação anseia, de algum modo,
por aquele dia: “A ardente expectativa da criação aguarda a revelação dos filhos
de Deus [...] Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e supor-
ta angústias até agora. E não somente ela, mas também nós, que temos as
primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguardando a
adoção de filhos, a redenção do nosso corpo” (Rm 8:19,22-23).
Nessa criação renovada, não haverá mais cardos e abrolhos, nem enchen-
tes ou secas, nem desertos ou selvas inabitáveis; nem terremotos ou furacões,
nem cobras venenosas ou abelhas que picam ou cogumelos que matam.
Haverá uma terra produtiva, terra que florescerá e dará alimento com fartura
para o nosso deleite.
62 | AULA 10
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 63

AULA 11
A União com Cristo - Que significa
estar "em Cristo" ou "unido a Cristo"?

Explicação e Base Bíblica:


Como veremos abaixo, todo aspecto do relacionamento de Deus com os
salvos está de certo modo ligado ao nosso relacionamento com Cristo. Dos
desígnios divinos na eternidade passada, antes da criação do mundo, à nossa
comunhão com Deus no céu na eternidade futura, incluindo ainda cada aspec-
to do nosso relacionamento com Deus nesta vida - tudo ocorreu e ocorre em
união com Cristo.
Podemos definir a união com Cristo do seguinte modo: união com Cristo é
uma expressão usada para resumir diversas relações distintas entre os crentes
e Cristo, por meio das quais os cristãos recebem todos os benefícios da salva-
ção. Entre essas relações se incluem: estamos em Cristo, Cristo está em nós,
somos semelhantes a Cristo e estamos com Cristo.
Como indica a definição, quatro diferentes aspectos da nossa união com
Cristo podem ser determinados com base na Bíblia. Examinaremos cada um
desses quatro separadamente:

1. Estamos em Cristo.
2. Cristo está em nós.
3. Somos semelhantes a Cristo.
4. Estamos com Cristo.

Estamos em Cristo:
1) No plano eterno de Deus:
Efésios 1:4 nos diz que Deus nos escolheu em Cristo “antes da fundação do
mundo”. Foi “nele” (em Cristo) que fomos predestinados “para louvor da sua
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glória” (v. 1:11-12). Mais tarde ele “nos salvou e nos chamou” por causa da “sua
própria determinação” e por causa também da graça que nos deu “em Cristo
Jesus, antes dos tempos eternos” (2 Tm 1:9).
Como não existíamos antes da fundação do mundo, esses versículos
indicam que Deus, perscrutando o futuro e sabendo que iríamos existir, conce-
beu-nos numa relação especial com Cristo. Ele não nos escolheu primeiro para
só depois decidir nos relacionar com Cristo. Antes, ao nos escolher, ao mesmo
tempo nos concebeu pertencentes a Cristo de um modo especial, “em Cristo”.
Portanto, ele nos concebeu como titulares do direito de, no fim, partilhar das
bênçãos da obra de Cristo.

2) Durante a vida de Cristo na terra:


Ao longo de toda a vida de Cristo na terra, desde o momento do seu nasci-
mento até a hora da sua ascensão ao céu, Deus nos concebeu vivendo “em
Cristo”. Ou seja, tudo o que Cristo fez como nosso representante, Deus contou
como sendo algo que também nós fizemos. E claro que os salvos não estavam
conscientemente presentes em Cristo, pois a maior parte deles nem sequer
existia ainda quando Cristo estava na terra. Tampouco estavam os salvos pre-
sentes em Cristo de algum modo misterioso, espiritual (como se, por exemplo,
as almas de milhares de crentes estivessem de algum modo presentes no
corpo de Cristo durante a sua vida na terra). Antes, os crentes estavam presen-
tes em Cristo apenas nos pensamentos de Deus, que nos concebeu passando
por tudo aquilo que Cristo passou, pois ele era o nosso representante.
Como Jesus exibiu uma perfeita obediência a Deus durante toda a sua
vida, Deus considerou que nós também obedecemos. “Por meio da obediência
de um só, muitos se tomarão justos” (Rm 5:19). Assim, Cristo é a nossa fonte de
justiça (I Co 1:30; Fp 3:9). Como Deus nos concebeu “em” Cristo, também pôde
conceber que os nossos pecados pertenciam a Cristo: “Aquele que não conhe-
ceu pecado, ele [Deus] o fez pecado por nós” (2 Co 5:21) e “o Senhor fez cair sobre
ele a iniquidade de nós todos” (Is 53:6).

3) Durante a nossa vida hoje:


Uma vez que nascemos e existimos como pessoas reais no mundo, a
nossa união com Cristo já não pode ser algo que exista só na mente divina. E
preciso também que sejamos levados a um relacionamento efetivo com Cristo,
por meio do qual os benefícios da salvação possam ser realizados em nós pelo
Espírito Santo. A riqueza da nossa vida atual em Cristo pode ser vista em duas
perspectivas ligeiramente distintas:
A DOUTRINA DA APLICAÇÃO DA REDENÇÃO | 65

1. Morremos e ressuscitamos com Cristo: A morte, o sepultamento e a


ressurreição de Jesus agora exercem efeitos reais sobre nós. “[Fostes] sepulta-
dos, juntamente com ele, no batismo, no qual igualmente fostes ressuscitados
mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos” (Cl 2:12).
Aqui as referências de Paulo ao batismo e à fé sugerem que a nossa morte e
ressurreição com Cristo ocorrem nesta vida mesmo, no momento em que nos
tornamos cristãos.
2. Temos nova vida em Cristo: Podemos pensar não só na obra redentora
que Cristo realizou no passado, mas também na sua vida presente no céu, no
fato de ele possuir todos os recursos espirituais de que precisamos para viver
a vida cristã. Como toda bênção espiritual foi conquistada por ele e lhe per-
tence, o Novo Testamento diz que essas bênçãos estão “nele”. Assim, só estão
disponíveis para os que estão “em Cristo”, e se estamos em Cristo, essas bên-
çãos são nossas.
3. Todos os nossos atos podem ser realizados em Cristo: Tornar-se cristão
é entrar na novidade do porvir e sentir até certo ponto os novos poderes do
reino de Deus afetando cada aspecto da nossa vida. Estar “em Cristo” é estar
no novo reino regido por Cristo. Isso significa que cada ato nosso pode ser
executado “em Cristo”, desde que executado no poder do seu reino e de um
modo que o honre.
4. Todos os cristãos juntos formam um único corpo em Cristo: Não esta-
mos simplesmente em Cristo como pessoas isoladas. Como Cristo é o cabeça
do corpo, que é a igreja (Ef 5:23), todos os que estão em união com Cristo estão
também ligados uns aos outros no corpo de Cristo. Essa ligação nos faz “um só
corpo em Cristo e membros uns dos outros” (Rm 12:5; I Co 10:17; 12:12-27). Assim,
“se um membro sofre, todos sofrem com ele; e, se um deles é honrado, com ele
todos se regozijam” (I Co 12:26). Os elos de comunhão são tão fortes que os
cristãos podem se casar só “no Senhor” (I Co 7:39). Nesse corpo de Cristo desa-
parecem as antigas hostilidades, ruem as divisões pecaminosas entre as pesso-
as, e os critérios terrenos de posição social não valem mais, pois “não pode
haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher;
porque todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gl 3.28).

Cristo está em nós:


Jesus falou de um segundo tipo de relação quando disse: “Quem perma-
nece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto” (Jo 15:5). Não só é verdade que
estamos em Cristo; ele também está em nós, para nos dar força para viver a vida
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cristã. “Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo
vive em mim” (Gl 2:19-20). O fator que determina se alguém é cristão ou não é se
Cristo está nele (Rm 8:10; 2 Co 13:5; Ap 3:20).
O sábio plano divino, oculto como mistério por gerações, era salvar
tanto os gentios como os judeus. Portanto, Paulo diz aos seus leitores genti-
os que o mistério de Deus é “Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl 1:27). A
lembrança disso destrói o nosso orgulho, nos dá um constante sentimento
de profunda dependência de Cristo e nos proporciona grande confiança,
não no ego, mas em Cristo que age em nós (Gl 2:20; Rm 15:18; Fp 4:13). Essa
permanência de Cristo em nós afeta o modo como reagimos aos necessita-
dos. Tudo o que fazemos para ajudar um irmão cristão, o fazemos a Cristo
(Mt 25:40). Se guardamos os mandamentos de Jesus, isso é uma indicação
de que ele está em nós, e o Espírito Santo também nos dá testemunho de
que Cristo está em nós (l Jo 3:24).

Somos semelhantes a Cristo:


Um terceiro aspecto da união com Cristo é a imitação dele. “Sede meus
imitadores, como também eu sou de Cristo” (I Co 11:1). João exorta: “Aquele que
diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou” (l Jo
2:6). Portanto a união com Cristo implica a imitação de Cristo. A nossa vida deve
assim espelhar a vida dele, para que lhe rendamos honra em tudo o que faça-
mos (Fp 1:20). A imitação de Cristo é especialmente evidente no sofrimento. Os
cristãos são chamados a suportar com paciência o sofrimento, “pois que tam-
bém Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os
seus passos” (I Pe 2:21).
A imitação de Cristo não deve ser concebida, porém, como mera mímica
dos atos de Jesus. O propósito, muito mais profundo, é que nessa imitação nos
tornemos cada vez mais como ele: quando agimos como Cristo, tornamo-nos
semelhantes a Cristo. Crescendo na maturidade em Cristo (Ef 4:13, 15), “somos
transformados, de glória em glória, na sua própria imagem” (2 Co 3:18). No final
seremos perfeitamente semelhantes a Cristo, pois Deus nos predestinou para
sermos “conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8:29; I Co 15:49), e “quando ele
se manifestar, seremos semelhantes a ele” (I Jo 3:2). Quando isso acontecer,
Cristo será plenamente glorificado em nós (2 Ts 1:10-12; Jo 17:10).

Estamos com Cristo:

1) Comunhão pessoal com Cristo:


Outro aspecto da união com Cristo diz respeito à nossa comunhão pessoal com
ele. Pouco importa se dizemos que estamos com Cristo ou que Cristo está
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conosco, pois ambas as frases representam a mesma verdade. Cristo prome-


teu: “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio
deles” (Mt 18:20) e “Estou convosco todos os dias até à consumação do século”
(Mt 28:20). Convém lembrar novamente que, como o corpo humano de Jesus
ascendeu ao céu (Jo 16:7; 17:11; At 1:9-11), esses versículos falam necessariamente
da sua natureza divina presente conosco. Porém é assim mesmo uma presen-
ça bastante pessoal, na qual cooperamos com Cristo (2 Co 6:1), o conhecemos
(Fp 3:8, 10), somos consolados por ele (2 Ts 2:16-17), ensinados por ele (Mt 11:29) e
vivemos toda a nossa vida na sua presença (2Co 2:10; I Tm 5:21; 6:13-14; 2 Tm 4:1).
Tornar-se cristão é ser chamado “à comunhão de seu Filho Jesus Cristo, nosso
Senhor” (I Co 1:9). Porém essa comunhão pode variar de intensidade, pois a
bênção de Paulo aos cristãos — “O Senhor seja com todos vós” (2 Ts 3:16) - só
pode expressar a esperança de comunhão ainda mais íntima com Cristo e de
uma consciência mais profunda da sua presença.
Em todas as nossas orações somos ouvidos por Jesus e temos comunhão
com ele (l Jo 1:3), nosso sublime sumo sacerdote, que entrou “no mesmo céu,
para comparecer, agora, por nós, diante de Deus” (Hb 9:24; 4:16). A nossa comu-
nhão com ele será maior quando morrermos (2 Co 5.8; Fp 1.23; ITs 5.10), e ainda
maior quando da volta de Jesus (I Ts 4:17; 1 Jo 3:1). Saber que Cristo realmente
deseja nos ter ao seu lado é algo que nos dá grande alegria (Jo 17:24).

2) A união com o Pai e com o Espírito Santo:


Como estamos em união com Cristo nessas várias relações, também
somos levados à união com o Pai e com o Espírito Santo. Estamos no Pai (Jo
17:21; I Ts 1:1; 2 Ts 1:1; l Jo 2:24; 4:15-16; 5:20) e no Espírito Santo (Rm 8:9; I Co 3:16;
6:19; 2 Tm 1:14). O Pai está em nós (Jo 14:23) e o Espírito Santo está em nós (Rm
8:9-11). Somos semelhantes ao Pai (Mt 5:44-45, 48; Ef 4:32; Cl 3:10; I Pe 1:15-16) e
semelhantes ao Espírito Santo (Rm 8:4-6; Gl 5:22-23; Jo 16:13). Temos comunhão
com o Pai (l Jo 1:3; Mt 6:9; 2 Co 6:16-18) e com o Espírito Santo (Rm 8:16; At 15:28; 2
Co 13:14; Ef 4:30).
Essas outras relações não se confundem, porém, num êxtase indistinto e
místico. Agora como na eternidade nos relacionamos com o Pai segundo o seu
papel único de nosso Pai celeste; com o Filho segundo o seu papel único de
nosso Salvador e Senhor; e com o Espírito Santo segundo o seu papel único de
Espírito que nos fortalece e continuamente nos dispensa todos os benefícios
da salvação.
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