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Destaque - Canto IV

A droga de Helena e as imagens de Homero

Foi então que ocorreu outra coisa a Helena, filha de Zeus.


220 No vinho de que bebiam pôs uma droga que
causava a anulação da dor e da ira e o olvido de todos os males.
Quem quer que ingerisse esta droga misturada na taça,
no decurso desse dia, lágrima alguma não verteria:
nem que mortos jazessem à sua frente a mãe e o pai;
225 nem que na sua presença o irmão ou o filho amado
perante seus próprios olhos fossem chacinados pelo bronze.
Tais drogas para a mente tinha a filha de Zeus,
drogas excelentes, que lhe dera Polidamna, a
esposa egípcia de Ton, pois aí a terra dadora de
cereais faz crescer grande
230 quantidade de drogas: umas curam quando misturadas;
mas outras são nocivas. Lá cada homem é médico;
seus conhecimentos superam os dos outros homens,
232b porque são todos da raça de Peéon.
Misturada a droga, ordenou que se servisse o vinho.
Destaque - Canto IV
Menelau conta sobre o cavalo de madeira e a métis
("astúcia") de Odisseu

Três vezes contornaste a côncava cilada, sentindoa com o tato,


e chamavas alto pelos reis dos Dânaos,
dizendo os seus nomes e imitando a voz das esposas de todos os Argivos.
280 Então eu, o filho de Tideu e o divino Odisseu
estávamos ali sentados e ouvíamos como chamavas.
Nós dois estávamos desejosos de nos levantarmos
e de sairmos; ou então de responder lá de dentro.
Mas Odisseu impediu-nos e reteve-nos, à nossa revelia.
285 Todos os filhos dos Aqueus se mantiveram em
silêncio; só Ânticlo queria responder à tua voz.
Mas Odisseu tapou-lhe a boca com grande firmeza,
utilizando as suas mãos fortes; e assim salvou todos os Aqueus.
Assim o reteve, até que Palas Atena te levasse para longe.»
Estrutura - Canto V

1-42. Uma nova assembleia dos deuses, a pedido de Atena, decide


pelo retorno de Odisseu.

43-147. Hermes leva a calipso a ordem dos deuses de deixar


Odisseu partir.

148-227. Calipso anuncia a Odisseu que deve construir uma


jangada, mas tenta, sem sucesso, dissuadi-lo de partir.

282-423. Odisseu constroi a embarcação, viaja e chega, a nado,


no 18º dia à terra dos Feaces, após ter sua jangada destruída.
Ele chega exausto, se esconde sob folhagens junto a um rio, e
adormece.
Destaque - Canto V
Odisseu surge pessoalmente na história

Porém Hermes não encontrou na gruta o magnânimo Odisseu:


na praia estava ele sentado, a chorar no sítio do costume,
torturando o coração com lágrimas, tristezas e lamentos.
E com os olhos cheios de lágrimas fitava o mar nunca
vindimado.
85 A Hermes assim falou Calipso, divina entre as deusas,
depois que o sentara num trono resplandecente
Destaque - Canto V
Símile: desespero de Odisseu sozinho e sem jangada no
mar

Durante duas noites e dois dias foi levado à deriva pelas escuras ondas;
e muitas vezes diante do coração lhe surgiu a morte.
390 Mas quando o terceiro dia trouxe a Aurora de
belas tranças, foi então que parou a ventania;
sobreveio uma acalmia sem sopro de vento.
Viu que já estava perto da terra ao olhar de relance em frente,
enquanto o elevava uma grande onda.
Tal como é bem-vindo um sinal de vida no pai que os filhos
395 viram acamado e sofrendo grandes dores
durante muito tempo, definhando, e já quase o
tocara a divindade detestável,
mas depois os deuses o libertam da sua doença —
assim a Odisseu a terra e as árvores pareciam uma amável visão.
E nadou com mais afinco, desejoso de pôr pé em terra firme.
Funções para a narrativa - Canto V

Alteração da história de Telêmaco para Odisseu;

Profunda caracterização de Odisseu: sofredor, paciente,


astuto, amado por Atena;

Apresentação das "mulheres fatais" que querem dissuadir


Odisseu do retorno, neste caso, Calipso;

Grande teste de lealdade à Penélope e de profundo


desejo de voltar para casa: Odisseu recusa as ofertas
tentadoras de Calipso.
Destaque - Canto VIII
O sofrimento é o caminho para a revelação da
identidade

Foi este o canto do celebérrimo aedo. Mas Odisseu


derretia-se a chorar: das pálpebras as lágrimas
humedeciam-lhe o rosto.
Tal como chora a mulher que se atira sobre o
marido que tombou à frente da cidade e do seu povo, no esforço
525 de afastar da cidadela e dos filhos o dia impiedoso,
e ao vê-lo morrer, arfante e com falta de ar, a ele
se agarra, gritando em voz alta, enquanto atrás dela os
inimigos lhe batem com as lanças nas costas e nos ombros
para a arrastar para o cativeiro, onde terá trabalhos e dores,
530 e murchar-lhe-ão as faces com o
pior dos sofrimentos — assim Odisseu deixava cair
dos olhos um choro confrangedor.
Funções para a narrativa - Canto VIII

Odisseu afirma as suas credenciais heroicas:


- exímio atleta
- rei merecedor de presentes valiosos, o que
prepara a sua relevação de identidade no Canto
seguinte;
- e sobretudo: Odisseu vira objeto de canto!

Questão decisiva é formulada (por Alcínoo) para a


revelação da identidade de Odisseu, que se dará no
Canto seguinte.

Poeta revela(?) a sua própria arte: o canto de Demódoco


Aventuras de Odisseu e seus companheiros
(3 anos)

Canto IX
Cícones - Lotófagos - Ciclopes

Canto X
Éolo - Lestrigões - Circe

Canto XI
Descida ao Hades

Canto XII
Sereias - Bois de Hélio - Chegada em Calipso
Destaque - Canto X
Odisseu e Circe

325 “Quem és e donde vens? Que cidade é a tua? Quem são teus
pais?
Estou espantada por teres bebido a poção sem ficares
enfeitiçado.
Nenhum homem jamais resistiu a esta droga
depois que a bebesse e que ela lhe passasse a
barreira dos dentes.
Mas a tua mente não pode ser enfeitiçada.
330 És na verdade o versátil Odisseu, que sempre me
dizia aportar aqui um dia o Argeifonte da vara dourada,
regressando de Troia na sua escura nau veloz.
Mas repõe a tua espada, pois iremos agora
para a nossa cama, para que nos unamos em amor
335 e possamos confiar um no outro.”
Destaque - Canto X
Tensão entre Odisseu e seus comandados

Só Euríloco tentou refrear os outros companheiros;


430 e assim falou, dirigindo-lhes palavras
apetrechadas de asas: “Infelizes! Aonde vamos?
Porque vos enamorais destas desgraças?
Vamos para o palácio de Circe, para que ela
nos transforme em porcos, lobos ou leões,
para guardarmos à força a sua grande casa?
435 Foi o que aconteceu com o Ciclope, quando em
sua morada entraram os nossos companheiros, e
com eles o audaz Odisseu!
Pereceram por causa da loucura deste homem.”
Funções para a narrativa - Canto X

Aprofundamento da tensão entre Odisseu e seus


comandados

Diminuir o contigente de 12 para apenas 1 nau (a


de Odisseu)

Sugerir outros desenvolvimentos para a pergonagem


de Odisseu: agora é, também, o homem do prazer.

Delineamento de outra ameaça feminina: Circe.


Leituras de aprofundamento
Canto X - motivo da ida ao Hades

Então virá ao teu encontro o adivinho, ó Condutor


das Hostes, que te indicará o caminho,
a distância da viagem (μέτρα κελεύθου)
540 e o teu regresso, como navegarás sobre o mar
repleto de peixes.
trad. Frederico Lourenço

Então o adivinho logo virá até ti, ó líder de


tropa, para dizer-te a rota, os pontos do trajeto
540 e o retorno, como voltarás no mar piscoso’.
trad. Christian Werner
Resumo - Canto XI
Destaque - Canto XI
Profecia de Tirésias no Hades

100 “Procuras saber do doce regresso (νόστον .. μελιηδέα), ó


glorioso Odisseu (φαίδιμ' Οδ̓ υσσεῦ),
mas o deus fá-lo-á difícil; pois não julgo que fugirás
ao deus que abala a terra, que acumulou cólera
no coração porque lhe cegaste o querido filho.
Ainda assim podereis regressar, embora muitos
males sofrendo,
105 se refreares o teu espírito e o dos
companheiros quando pela primeira vez fundeares
a nau bem construída
na ilha de Trinácia, fugindo ao mar cor de violeta,
e encontrares a pastar os bois e as robustas ovelhas
do Sol, que tudo vê e tudo ouve.
110 Se deixares o gado incólume e pensares no
regresso, podereis chegar a Ítaca, embora muitos
males sofrendo.
Destaque - Canto XI
Profecia de Tirésias no Hades

Mas se lhe fizerdes mal, então prevejo a desgraça,


tanto para a nau como para os companheiros; e se
tu próprio escapares, regressarás tarde, tendo
perdido todos os companheiros,
115 na nau de outrem; e sofrimentos encontrarás em casa:
homens arrogantes, que os bens te devoram,
fazendo a corte à tua esposa divina e oferecendo presentes.
Mas na verdade vingar-te-ás da sua violência ao chegares.
Porém quando no teu palácio tiveres matado os pretendentes,
120 quer por dolo ou às claras com o
bronze afiado, deverás partir com um remo de bom manejo,
até que chegues junto daqueles que o mar não conhecem,
homens que na comida não misturam o sal,
nem conhecem as naus de rebordos vermelhos,
125 nem os remos de bom manejo, que às naus dão asas.
Destaque - Canto XI
Profecia de Tirésias no Hades

E dar-te-ei um sinal claro, que não te escapará:


quando outro viandante te encontrar e te disser
que ao belo ombro levas uma pá de joeirar,
então deverás fixar no chão o remo de bom manejo,
130 oferecendo belos sacrifícios ao soberano Posídon,
um carneiro, um touro, um javali que acasalou com porcas;
depois regressa a casa e oferece sagradas hecatombes
aos deuses imortais, que o vasto céu detêm,
a todos por ordem; e do mar sobrevirá para ti
135 a morte brandamente, que te cortará
a vida já vencido pela opulenta
velhice; e em teu redor os homens
viverão felizes: é esta a verdade
que te digo.
Destaque - Canto XI
Encontro de Odisseu e Aquiles no Hades

“Filho de Laertes, criado por Zeus, Odisseu de mil


ardis, homem duro! Que coisa ainda maior irás congeminar?
475 Como ousaste descer até ao Hades, onde moram
os mortos sem
entendimento, fantasmas de mortais estafados?”
Assim falou; a ele dei então a seguinte resposta:
“Aquiles, filho de Peleu, de longe o mais forte dos Aqueus!
Vim para consultar Tirésias, para o caso de me dar
480 algum conselho sobre como poderei regressar a Ítaca rochosa.
Pois ainda não cheguei perto da Acaia, nem a minha terra
pisei; mas sofro sempre desgraças, ao passo que não foi,
nem será, nenhum homem mais bem-aventurado que tu, ó Aquiles!
Pois antes, quando eras vivo, nós Argivos te
dávamos honras 485 iguais às dos deuses; e agora
reinas poderosamente sobre os mortos, tendo
vindo para aqui: não te lamentes por teres morrido, ó Aquiles.
Destaque - Canto XI
Encontro de Odisseu e Aquiles no Hades

“Não tentes reconciliar-me com a morte, ó glorioso Odisseu.


Eu preferiria estar na terra, como trabalhador agrícola de outro,
490 até de homem sem herança e sem grande sustento, a reinar sobre
todos os mortos falecidos".
Funções para a narrativa - Canto XI

Odisseu passa a conhecer detalhes da situação em Ítaca


e de como chegará em Ítaca (só e com muitos
sofrimentos). A relevância dessa função, contudo, é
atenuada no Canto seguinte, pois Circe anuncia para o
herói o essencial do que foi dito por Tirésias sobre
seu retorno.

Mais um desenvolvimento do paradigma da morte de


Agamêmnon: dessa vez, a culpa pelo destino funesto
deste é atribuída a Egisto e a Clitmenestra (em
contraste com o relato de Menelau no Canto IV, que só
enfatiza Egisto).
Funções para a narrativa - Canto XI

O paradigma de Agamêmnon reforça a explicação da razão


de Penélope ser preterida no plano de vingança uma vez
Odisseue em Ítaca (ver os versos 440-43).

Algumas partes são de difícil identificação da sua


função. Por exemplo, o "Catálogo das Mulheres" (versos
225 em diante).
Destaque - Canto XII
Odisseu conta aos companheiros o plano para
evitar as Sereias

Falei então aos companheiros, com tristeza no


coração: “Amigos, não é justo que apenas um ou dois conheçam
155 os oráculos que proferiu Circe, divina entre as deusas.
Falarei, para que todos saibamos se morreremos
ou se, evitando a morte e o destino, conseguiremos fugir.
Primeiro foi o som das Sereias divinamente inspiradas
e seu prado florido que nos aconselhou a evitar.
160 Disse para ser só eu a ouvi-las: devereis amarrarme com
ásperas cordas, para que fique onde estou,
de pé junto ao mastro; e que as cordas sejam atadas ao mastro.
E se eu implorar e vos ordenar que me liberteis,
devereis amarrar-me com mais cordas ainda.
Londres, Museu Britânico
Por volta de 470 a.C.
Destaque - Canto XII
Circe anuncia o plano para escapar das Sereias

Às Sereias chegarás em primeiro lugar, que todos


40 os homens enfeitiçam, que delas se aproximam.
Quem delas se acercar, insciente, e a voz ouvir das
Sereias, ao lado desse homem nunca a mulher e os filhos
estarão para se regozijarem com o seu regresso;
mas as Sereias o enfeitiçam com seu límpido canto,
45 sentadas num prado, e à sua volta estão
amontoadas ossadas de homens decompostos e suas peles
marcescentes.
Prossegue caminho, pondo nos ouvidos dos companheiros
cera doce, para que nenhum deles as oiça.
Mas se tu próprio quiseres ouvir o canto,
50 deixa que, na nau veloz, te amarrem as mãos e os
pés enquanto estás de pé contra o mastro; e que
as cordas sejam atadas ao mastro, para que
deleitado oiças a voz das duas Sereias.
E se a eles ordenares que te libertem,
então que te amarrem com mais cordas ainda
Destaque - Canto XII
Circe anuncia o plano para escapar das Sereias

Às Sereias chegarás em primeiro lugar, que todos


40 os homens enfeitiçam, que delas se aproximam.
Quem delas se acercar, insciente, e a voz ouvir das
Sereias, ao lado desse homem nunca a mulher e os filhos
estarão para se regozijarem com o seu regresso;
mas as Sereias o enfeitiçam com seu límpido canto,
45 sentadas num prado, e à sua volta estão
amontoadas ossadas de homens decompostos e suas peles
marcescentes.
Prossegue caminho, pondo nos ouvidos dos companheiros
cera doce, para que nenhum deles as oiça.
Mas se tu próprio quiseres ouvir o canto,
50 deixa que, na nau veloz, te amarrem as mãos e os
pés enquanto estás de pé contra o mastro; e que
as cordas sejam atadas ao mastro, para que
deleitado oiças a voz das duas Sereias.
E se a eles ordenares que te libertem,
então que te amarrem com mais cordas ainda
Recepção da Odisseia na nossa cultura
Destaque - Canto XII
O conteúdo do canto das Sereias a Odisseu

“Vem até nós, famoso Odisseu, glória maior dos Aqueus!


(πολύαιν' Ὀδυσεῦ, μέγα κῦδος Ἀχαιῶν)
185 Retém a nau, para que nos possas ouvir! Pois
nunca por nós passou nenhum homem na sua escura nau
que não ouvisse primeiro o doce canto das nossas
bocas; depois de se deleitar, prossegue caminho, mais sabedor.
Pois nós sabemos todas as coisas que na ampla Troia
190 Argivos e Troianos sofreram pela vontade dos
deuses; e sabemos todas as coisas que acontecerão na terra fértil.”
Destaque - Canto XVI
Reconhecimento Telêmaco e Odisseu
Não passou despercebido a Atena que Eumeu se
afastara do casebre, pois logo se aproximou,
assemelhando-se no corpo a uma mulher bela e
alta, conhecedora de gloriosos trabalhos.
Colocou-se de pé à entrada do casebre, visível
apenas para Odisseu.
160 Mas Telémaco não a viu nem se apercebeu da sua
presença, porque não é a todos que os deuses
aparecem com evidência.
Mas viu-a Odisseu e viram-na os cães, que sem
ladrar se retiraram a ganir, amedrontados, para o
outro lado da propriedade.
A deusa deu-lhe sinal com o sobrolho; o divino Odisseu
165 percebeu e saiu da sala; foi até ao grande muro do
recinto e colocou-se junto dela. A ele falou em
seguida Atena:
Destaque - Canto XVI
Reconhecimento Telêmaco e Odisseu
«Filho de Laertes, criado por Zeus, Odisseu de mil ardis!
Agora conta ao teu filho o teu segredo e não o ocultes,
para que depois de terdes planeado a morte e o destino
170 dos pretendentes vos dirijais à cidade famosa; não
estarei longe de ti, pois pela minha parte estou
preparada para a refrega.»
Assim disse; e logo com a vara dourada lhe tocou Atena.
Primeiro vestiu-lhe o peito com uma capa e uma túnica
bem lavada: aumentou-lhe a estatura e restituiulhe a juventude.
175 De novo ficou de pele negra, encheram-se-lhe as
faces e a barba escureceu em torno do seu queixo.
Tendo operado a transformação, a deusa partiu. E Odisseu
voltou para o casebre. Maravilhou-se o seu filho amado:
estarrecido, desviou os olhos, com medo de que fosse um deus.
180 E falando dirigiu-lhe palavras apetrechadas de
asas: «Muito diferente, ó estrangeiro, me pareces
tu agora: as roupas que vestes são outras; e outra é a tua pele.
Destaque - Canto XVI
Reconhecimento Telêmaco e Odisseu
A ele deu resposta o sofredor e divino Odisseu:
«Não sou um deus. Porque me assemelhas aos imortais?
Sou o teu pai, aquele por causa de quem tanto gemeste
e tantas dores sofreste, subjugado pela violência daqueles homens.»
190 Assim falando, beijou o filho; e das suas faces uma
lágrima caiu para o chão, pois até aí as tinha retido corajosamente.
Mas Telémaco — não acreditava que se tratasse do pai —
voltou a tomar a palavra e respondendo-lhe assim disse (...)

e Telémaco abraçou o nobre pai, chorando e vertendo lágrimas.


215 E do coração de ambos surgiu o desejo de chorar.
Gemeram alto, os seus gritos mais acutilantes que os
de corvos-marinhos ou abutres de recurvas garras, a quem
os lavradores roubaram as crias antes de lhes
crescerem as asas: assim deploravelmente dos
olhos se lhes derramavam as lágrimas.
Funções - Canto XVI

Reconhecimento de Odisseu e Telêmaco

preparação da entrada no palácio e do plano


de vingança

Reapresentação da situação em Ítaca:


pretendentes e Penélope
Odisseu na cabana do porqueiro Eumeu
(3 dias efetivamente narrados)

Cantos XIV, XV e XVI


Canto XVII
Funções para a narrativa
Primeira vez que as ramificações da intriga são articuladas no
mesmo ambiente: Odisseu e suas aventuras, Telêmaco e a depredaçao
dos bens de Odisseu e a cobiça de Penélope pelos pretendentes.

O encontro entre as partes da intriga é ocasião para o poeta


desenvolver possibilidades de ironia, descrição de personagens e
tensões.

Penélope passa a ouvir informações mais concretas sobre Odisseu


ainda que divergentes, preparando seu próprio encontro com ele
(enquanto mendigo): Odisseu estaria em Calipso (dito por
Telêmaco), Odisseu estaria já em Ítaca (profetizado por
Teoclímeno), Odisseu estaria na terra dos Tesprócios (dito por
Eumeu a partir do falso relato de Odisseu, o cretense).

Todo o aprendizado de Odisseu em termos de auto-controle e de


saber ocultar seu heroísmo ativo manifesta-se quando os
pretendentes o maltrata. Odisseu está ao mesmo tempo sendo
testado e testando o comportamento dos seus adversários.
Canto XVIII
Destaque
Palavras de Odisseu à Penélope antes de partir para
Troia

Na verdade, quando ele deixou a amada terra pátria,


na mão me pegou pelo pulso e estas palavras me disse:
“Mulher, não penso que nós Aqueus de belas cnémides
260 regressemos de Troia todos ilesos às nossas casas.
Pois diz-se que os Troianos são homens aguerridos:
lanceiros, peritos no arco e na flecha, e condutores
de cavalos velozes, que rapidamente dirimem a
grande contenda de uma guerra, na qual
264b se peleja em igualdade de circunstâncias.
265 Por isso não sei se o deus me fará regressar, ou se
morrerei em Troia. Presta atenção a estas coisas:
trata bem do meu pai e da minha mãe aqui no palácio,
como agora, mas mais ainda depois de eu partir.
E quando vires que o meu filho tiver a barba a despontar,
270 desposa quem tu quiseres. Então deixa a tua casa.”
Canto XVIII
Funções para a narrativa

São anunciadas, por Penélope, as palavras de Odisseu quando


deixou Ítaca: ela deveria se casar assim que Telêmaco tivesse
barba. Penélope entra no salão e insinua que está próximo o tempo
de se casar novamente. Penélope fala seriamente ou astutamente?

Inicia o tópico das servas infiéis: Melanto é o exemplo


paradigmático.

Luta entre Odisseu-mendigo e o mendigo Iro e mais abusos dos


pretendentes contra Odisseu. Dessa vez, o abuso é especialmente o
riso.
Canto XIX
RESUMO
Canto XIX
DESTAQUE
Euricleia reconhece Odisseu

Tocou no queixo de Odisseu e logo lhe dirigiu


estas palavras: «És Odisseu, meu querido filho! E
eu que não te reconheci 475 , antes de tocar com as
minhas mãos no corpo do amo!»
Assim falou; e os seus olhos apontaram para Penélope,
querendo indicar-lhe que regressara a casa o marido amado.
Mas Penélope nem olhou para ela nem se apercebeu,
pois Atena lhe desviara a mente. Porém Odisseu
480 agarrou com a mão direita na garganta da velha;
com a outra mão puxou-a para junto dele e disse:
«Ama, queres matar-me? Foste tu que me amamentaste,
com o teu próprio peito. Agora, depois de padecer
muitas desgraças, chego à terra pátria no vigésimo ano.
485 Mas já que percebeste o que um deus te pôs no
espírito, cala-te, para que mais ninguém no palácio se aperceba.
E isto te direi agora, coisa que se cumprirá: se em meu
benefício um deus subjugar os orgulhosos pretendentes,
não te pouparei, embora tenhas sido minha ama; e com
490 as demais escravas te matarei aqui no palácio.»
Canto XIX
DESTAQUE
Entrevista de Penélope e Odisseu
Estrategema do tear
Daí por diante trabalhava de dia ao grande tear,
150 mas desfazia a trama de noite à luz das tochas.
Assim durante três anos ocultei o engano e convenci os Aqueus.
Mas quando sobreveio o quarto ano, volvidas as estações,
gastaram-se os meses e os dias cumpriram o seu termo.
Foi então que com ajuda das minhas escravas — cadelas tonta
155 s! — eles me apanharam, e com altos gritos me repreenderam.
Tive pois de acabar a veste, embora não quisesse, à força.
Agora já não consigo fugir ao casamento, nem encontro
outro estratagema. Insistem os meus pais para
que eu voltea casar-me; e preocupa-se o meu filho, ciente de
que outros
160 lhe devoram os haveres. Na verdade ele já é um
homem, capaz de governar uma casa, à qual Zeus cede honrarias.
Mas conta-me qual é a tua linhagem e donde vens.
Não nasceste de carvalho lendário nem de pedra.»
Canto XIX
DESTAQUE
Entrevista de Penélope e Odisseu
Estrategema do tear
Daí por diante trabalhava de dia ao grande tear,
150 mas desfazia a trama de noite à luz das tochas.
Assim durante três anos ocultei o engano e convenci os Aqueus.
Mas quando sobreveio o quarto ano, volvidas as estações,
gastaram-se os meses e os dias cumpriram o seu termo.
Foi então que com ajuda das minhas escravas — cadelas tonta
155 s! — eles me apanharam, e com altos gritos me repreenderam.
Tive pois de acabar a veste, embora não quisesse, à força.
Agora já não consigo fugir ao casamento, nem encontro
outro estratagema. Insistem os meus pais para
que eu voltea casar-me; e preocupa-se o meu filho, ciente de
que outros
160 lhe devoram os haveres. Na verdade ele já é um
homem, capaz de governar uma casa, à qual Zeus cede honrarias.
Mas conta-me qual é a tua linhagem e donde vens.
Não nasceste de carvalho lendário nem de pedra.»
Canto XIX
DESTAQUE
Entrevista de Penélope e Odisseu
Teste do arco

Agora outra coisa te direi; tu guarda-a no teu


espírito: está perto a malfadada Aurora, que me
afastará da casa de Odisseu.
Estabelecerei pois um concurso, o dos machados,
que o meu esposo enfileirava na sala de banquetes,
como costelas de nau em construção, doze ao todo.
575 Colocando-se à distância, fazia passar uma seta pelo meio deles.
Proporei este concurso aos pretendentes.
Quem com mais facilidade armar o arco nas mãos
e fizer passar a seta pelo meio dos doze machados,
a esse eu seguirei, e deixarei esta casa da minha vida
580 de casada: uma casa bela, cheia de riquezas; que
sempre recordarei, penso, até em sonho.»
Canto XIX
Funções

Primeiro encontro face a face de Penélope e Odisseu (sob


disfarçe) desde 20 anos.

Sinais da iminente chegada de Odisseu e consequente vingança se


acumulam: afirmações, presságios, sonhos...

Penélope, ainda assim, mostra-se cética. Tão cética que propõe o


teste do arco: ela genuinamente pensa que se casará com o
vencedor do teste ou o propõe porque sabe que o mendigo com quem
está conversando é, na verdade, seu marido?

O Canto mantém o suspense sobre o momento da revelação final de


Odisseu à sua esposa.

Caracterização de personagens secundários: Euricleia, ama de


Odisseu, é a segunda pessoa (terceiro ser vivo..) a reconhecer
Odisseu.
Canto XX
Funções

Mais presságios da morte dos pretendentes

Odisseu não sabe ainda como irá se vingar e Penélope


extremamente cética acredita que ele morreu.

Poeta segue contrastando personagens? Filécio x


Melanteu; o "bom pretendente" Agelau x Ctesipo

Pretendentes, completamente ignorantes da força


subterrânea que sufocará seus destinos, desfrutam do
que será o último banquete.
Canto XXI-XXIV - Resumo
Canto XXI - Funções

Canto totalmente dominado pelo teste do arco.

O arco de Odisseu tem uma história própria, que


remete ao heroísmo juvenil de Odisseu. Ao voltar para
o seu dono, Odisseu reassume suas armas e sua
identidade heroica.
Canto XXI - Extrato
Penélope anuncia a prova do Arco

«Ouvi-me, orgulhosos pretendentes, que esta casa


escolhestes para nela comerdes e beberdes sem
nunca cessar,
70 uma vez que o dono está ausente há muito tempo.
Nem outra desculpa fostes capazes de expressar,
além do desejo de me desposardes e terdes como
mulher.
Mas agora, ó pretendentes, tendes o prémio à
vossa frente.
Estabeleço como certame o arco do divino
Odisseu:
75 quem com mais facilidade armar o arco nas mãos
e fizer passar a seta pelo meio dos doze machados,
a esse eu seguirei, e deixarei esta casa da minha
vida
de casada: uma casa bela, cheia de riquezas;
que sempre recordarei, penso, até em sonho.»
Canto XXI - Extrato
Odisseu arma o arco
o astucioso Odisseu,
405 após ter levantado o grande arco e de o ter
examinado, tal como um homem conhecedor da
lira e do canto
facilmente estica uma corda a partir de uma
cravelha nova,

atando bem a tripa torcida de


ovelha de um lado e
de outro —
assim sem qualquer esforço
Odisseu armou o
grande arco.
Canto XXII - Funções

A vingança de Odisseu!

Este Canto pode ser visto como o clímax da


Odisseia, pois a punição aos pretendentes com a
devida revelação da identidade heroica - e ativa
- de Odisseu foi preparada desde o início do
poema.
Passagem do heroísmo passivo ao ativo
Canto XXII - Extrato
Atena admoesta Odisseu:
onde está o herói da Ilíada?

e muito se encolerizou Atena no coração,


225 e com palavras furiosas repreendeu Odisseu: «Já
não tens, ó Odisseu, a força firme nem a coragem
que mostraste quando por causa de Helena de alvos braços
combateste durante nove anos contra os Troianos
sem cessar, e muitos homens mataste em combates terríveis,
230 e graças ao teu conselho a cidade de Príamo foi saqueada.
Como é que agora, tendo regressado a casa e aos
teus haveres, te lamentas por teres de mostrar a
tua força aos pretendentes?
Não, amigo, chega-te ao pé de mim e observa o que eu faço,
para que saibas como no meio de homens inimigos
235 Mentor, filho de Álcimo, devolve as benesses recebidas.»
Canto XXII - Extrato
Símile da morte dos pretendentes

E Odisseu também olhou por toda a parte, não


fosse ter escapado vivo algum pretendente,
escondido, a evitar a escuridão da morte.
Mas viu que todos estavam mortos, caídos no meio
do sangue e da terra, todos eles, como peixes que
os pescadores
385 tiraram do mar cinzento nas suas redes e
deixaram na praia de orla sinuosa, todos
amontoados em cima da areia,
desejosos de voltar para as ondas do mar salgado,
mas o Sol resplandecente lhes tira a vida —
assim jaziam os pretendentes, uns sobre os outros.
Canto XXII - Extrato
A morte de Melanteu - o vil boieiro

Depois arrastaram Melanteu através da porta e do pátio.


475 Cortaram-lhe as narinas e as orelhas com o bronze
impiedoso e arrancaram-lhe os testículos para os cães
comerem, crus.
E na sua fúria deceparam-lhe ainda as mãos
e os pés.
Canto XXIII - Funções

O tão aguardando reconhecimento de Penélope e


Odisseu! Por isso, outro candidato a clímax da
Odisseia

Resumo das aventuras de Odisseu (310-343)

Preparação para o Canto XXIV: a) Medo da retaliação


dos pretendentes 113-122) e b) Odisseu diz a Penélope
que irá ao campo encontrar seu pai, Laertes.
Canto XXIII - Extrato
Sinais de reconhecimento

Mas Telémaco tomou a palavra e repreendeu a mãe:


«Minha mãe, mãe terrível, dura de coração!
Porque te manténs distante de meu pai, e não te sentas
ao lado dele, para lhe falares e dirigires todas as perguntas?
100 Nenhuma outra mulher se manteria afastada com
tal dureza do marido que, tendo padecido tantos sofrimentos,
regressa no vigésimo ano à terra pátria.
Mas o teu coração sempre foi mais duro que uma pedra.»
A ele deu resposta a sensata Penélope:
105 «Meu filho, tenho o coração no peito cheio de
espanto; não consigo proferir palavra alguma, nem perguntar nada,
nem sequer olhar para ele, olhos nos olhos. Mas se ele é
na verdade Odisseu chegado a sua casa, sem dúvida ele e eu
nos reconheceremos de modo mais seguro, pois temos
110 sinais [termo: σῆμα], que também nós sabemos, escondidos dos
outros.»
Canto XXIII - Extrato
Penélope reconhece Odisseu

A ele deu resposta a sensata Penélope:


«Homem incompreensível, não sou orgulhosa nem te desdenho.
175 Também não me espanto, pois lembro-me bem
como eras quando partiste de Ítaca na tua nau de longos remos.
Vai lá, ó Euricleia, e faz-lhe a cama robusta,
fora do quarto bem construído, que ele próprio fez.
Depois de teres tirado para fora a robusta cabeceira,
180 põe cobertores, velos e mantas resplandecentes.»
Assim falou, para pôr à prova o marido. Mas
Odisseu encolerizou-se e assim disse à esposa fiel:
«Mulher, na verdade disseste uma palavra dolorosa!
Quem é que mudou o lugar da minha cama? Difícil seria
185 até para quem tivesse grande perícia, a não ser
que tenha vindo um deus, que facilmente a colocou noutro lugar.
Mas não há homem vivo entre os mortais, ainda que jovem,
que fosse capaz de tirar de lá a cama, pois um
sinal notável foi incorporado na cama trabalhada
que eu (e mais ninguém!) fiz.
Canto XXIII - Extrato
Penélope reconhece Odisseu

A ele deu resposta a sensata Penélope:


«Homem incompreensível, não sou orgulhosa nem te desdenho.
175 Também não me espanto, pois lembro-me bem
como eras quando partiste de Ítaca na tua nau de longos remos.
Vai lá, ó Euricleia, e faz-lhe a cama robusta,
fora do quarto bem construído, que ele próprio fez.
Depois de teres tirado para fora a robusta cabeceira,
180 põe cobertores, velos e mantas resplandecentes.»
Assim falou, para pôr à prova o marido. Mas
Odisseu encolerizou-se e assim disse à esposa fiel:
«Mulher, na verdade disseste uma palavra dolorosa!
Quem é que mudou o lugar da minha cama? Difícil seria
185 até para quem tivesse grande perícia, a não ser
que tenha vindo um deus, que facilmente a colocou noutro lugar.
Mas não há homem vivo entre os mortais, ainda que jovem,
que fosse capaz de tirar de lá a cama, pois um
sinal notável foi incorporado na cama trabalhada
que eu (e mais ninguém!) fiz.
Canto XXIV - Funções

A Odisseia acaba em XXIII 296?

O canto XIV restaura completamente o oikos


(família) de Odisseu (incluindo a reitegração
de Lartes) e resolve, por intervenção divina,
o conflito com os pais dos pretendentes
assassinados.
Qual a função da segunda cena do Hades (1-
204)?

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