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A insurreição do crato e as cartas de Thomaz de Araújo Pereira III

A sedição ou insurreição do Crato foi um movimento, que teve como palco


algumas Províncias no nordeste agreste do Brasil. Foi uma revolta de caráter social e
com os acontecimentos políticos que culminaram com a abdicação do Imperador D.
Pedro I, transformou-se em movimento político, que via como fundamental a
restauração do Imperador, contra a Regência. Essa insurreição, desenrolou-se na região
do Cariri, em 1831-1832 sul da Província do Ceará, tendo seus combates iniciados em
27 de dezembro de 1831, e terminados em outubro de 1832, com a rendição dos dois
chefes, o Coronel Joaquim Pinto Madeira, comandante das forças rebeladas e o Padre
Antonio Manuel de Souza, Vigário da Vila do Jardim-CE, o qual foi figura muito
importante no movimento.

A sedição do Crato gerou preocupação nas autoridades das Províncias vizinhas,


especialmente da Paraíba e do Rio Grande do Norte e essa preocupação aumentou
quando aconteceram alguns incidentes na Villa de Souza e Pombal ambas na Paraíba.
Na Ribeira do Seridó, inicia-se uma discussão entre os moradores de Acary e da Villa
do Príncipe (Caicó), lideradas pelo fazendeiro acariense Thomaz de Araújo Pereira III,
que em 1824 havia sido Presidente da Provincia, cargo semelhante ao de Governador do
Estado nos dias atuais.

Em 1824, Thomaz havia sido acusado de ser simpatizante da Confederação do


Equador e desta feita para dissipar qualquer duvida de sua lealdade ao Império tomou a
frente nas ações preventivas que visavam armar e preparar os seridoenses de Acary e
Caicó para um possível combate. Para além disso também arregimentou homens para
participar dos combates contra as tropas rebeldes comandadas por Joaquim Pinto.
Sabemos que entre os soldados que formavam o batalhão do Acary, estava Cipriano
Bezerra Galvão, pai do coronel Silvino Bezerra e seu irmão Cipriano Lopes Galvão.

As atitudes e ações de Thomaz de Araújo Pereira III, estão narradas em três


ofícios que ele enviou ao então presidente da Provincia do Rio Grande do Norte
Joaquim Vieira da Silva e Souza. Os escritos são ricos de detalhes e seguem fielmente
transcritos abaixo:
Carta I

- Ilust. E Excel Snr. Do Officio do Tenente Coronel Joze Teixeira da Fonseca, verá V.
Exc. O andamento deste importante negocio té o dia 27 do passado Junho. E da copia
d’Acta inclusa, o que se resolveo no acontecimento de minha grave moléstia; porque
tendo oficiado á V. Exc. No dia 26 de pretérito, no seguinte se descedio a moléstia de
câimbras de sangue, que já há mais dias sofria, com tanto rigor, que se me não julgava
muitos momentos de vida: graças a providencia; que do quinto dia em diante a sua
declinação afiançou melhores esperanças; e hontem á noite foi, que tive lugar de ouivir
o Officio de V. Exc. D’ 11 do passado Junho que guiava aa cincoenta e cinco
granadeiras, e sete mil cartuxos, que de ordem do Capitão Manoel Varella Barca forão
entregues na Villa do Principe no dia 26 do citado mez. Fico entregue da Tabeella, que
serve de governo para o pagamento dos Officaes, faltando me esclarecimento sobre a
paga dos Commissariados. Fico de cama em uso de remédios, porém mais livre para
cumprir as Ordens de V. Exc., que Deos Guarde como nos he mister.

Povoção do Acari, 5 de Julho de 1831. Ao Illust. E Excl. Presidente Joaquim Vieira da


Silva e Souza.

Thomaz de Araújo Pereira.

Carta II

- Ilust. E Exm. Senhor – Tendo em data de hontem oficiado a V. Exc., remetendo o


officio do Tenente Coronel Joze Teixeira da Fonseca e a Acta da Camara deste
Município: recebo oje pelo meio dia o officio junto do Juiz de Paz desta Villa,
acompanhado de outro do Juiz de Paz da Villa de Pombal com os documentos inclusos,
que mostão com evidencia o estado de desesperação, e frenezia, q que se achão
reduzidos os facciosos, e rebeldes Joaquim Pinto, e JOze Dantas, os quaes sempre
encontrado uma coragem decedida da parte das nossas Forças, com grande mortalidade
dos seos sequazes, prova não equivoca de que a Providencia Abençoa a Causa que
defendemos. Tive hontem noticia, por carta particular do Tenente Coronel das Guardas
Nacionaes do Brejo d’ Areia Joze da Costa Machado, que ali se achava um Official da
Paraiba reunindo duzentos homens para se incorporar na Villa da Campina, com outros
duzentos da Capital, que se conduzem duas Peças, e uma Comissão composta por João
de Albuquerque Maranhão, Silveiro da Costa Cirne, e do Major Barreto, e marcharem
para o Rio do Peixe; pelo que apreço-me a remeter ao dito Tenente Coronel a copia do
Officio dos Commandantes das Forças estacionadas em S. João, ao Sargento Mor
Commandante Manoel Reixeira de Souza, para activarem a sua marcha. A nossa Villa
está quase inerme, e na posse somente das 14 grandeiras, e pouco cartuxame, como V.
Exc. Verá da Acta da Camara, e é de receiar, que os rebeldes tentem fazer-nos algum
atque, em disforço de nós havermos decedido abertamente contra eles. E quanto me
incumbe participar a V. Exc. Que dará as providencias, que julgar necessárias.

Deos Guarde a V. Exc. Acari 6 de Julho de 1832- Illm. E Exm Senhor Presdiente
Joaquim Vieira da Silva e Souza- Thomaz de Araujo Pereira.

Carta III

Illust. E Exc. Sr.- Quando recebi o Officio de V. EX. de 2 do que corre, já se achavão na
Villa do Principe as cincoenta Granadeiras, e seis mil cartuxos, remetidos pelo Capitão
Manoel Varella Barca, experimentando o mesmo destranque das mais por chegarem
com huma baioneta quebrada, duas coronhas, e vinte cinco desconcertadas. A`25 do
passado Julho recebi o que V. Ex. dirigio ao Tenente Coronel José Teixeira, datado de
18 do mesmo, o qual imediatamente o fiz marchar por hum Soldado: á 5 do que corre
recebi o primeiro dos dous do msmo, que agora remeto á V.Ex., e porque a minha
participação, posto que agradável, não pedisse recurso abreviado, tomei o expediente de
esperar pela resposta do Officio de V. Ex., entendendo, que nesta ocasião já ganhasse as
alviçaras do consumo do Pinto, José Dantas, O padre Antonio Manoel, e a Camara da
Barra do Jardim, pois os dous últimos indicados, só forão aparecidos no ultimo ataque,
que vierão fazer á Villa de Souza. A 9 do que corre fiz remessa ao citado Tenente
Coronel do Officio de V. Ex. datado em 2 do que corre, acompanhado de três mil
cruzados em moeda para o fornecimento da Caixa Militar, dez alqueires de farinha, e
vinte bois, que remetteu o Juiz de Paz da Serra Negra: eis que hoje he que chega a
resposta do Officio de V. Ex. de 18 do próximo passado julho, remetido por min á 25 do
mesmo, dando por causa a demora de dezessete dias, resposta de hum officio que fez ao
Alferes Canuto. A vista do andamento deste importante negocio, tão abençoado por
Deos, como bem regido por V. Ex., espero á cada momento a agradável noticia da
conclusão dele, ou alias , que se tenhão debandado os fugitivos malvados, o que
cumprirá á cada Provincia procurar dar-lhes fim em seos territores, cortando assim as
incalculáveis despesas, que se estão fazendo aos Cofres com tanto barulho de gente
desnecessária donde muito se deve receiar etiquetas, como tem acontecido mesmo entre
a do Ceará: isto posto dista muito do meu animo lembrar a V. Ex. o mais leve
pensamento , e só ob-decer cegamente ao que me for determinado. Já tenho a Tabella,
pela qual devo pagar aos Officiaes, e Soldados, menos aos Commisariados; porem
offereme a duvida seguinte: José Teixeira da Fonseca, era Capitão, passou á Tenente
Coronel das Guardas as quaes ainda não forão confirmadas; Pedro Paulo de Medeiros,
Comissariado, era Sargento Mor de ordenaças, e no mesmo posto sahio nas Guardas; os
quatro Commandantes de Companhias forão por mim escolhidos por corajosos, dos
quaes dou serão Soldados, e dous Alferes, e cada huma companhia de cicoenta praças; e
porque tenho por grande gloria pereguntar, para não erra, V. Ex me mandará hum
esclarecimento capaz de desterrar a minha dúvida.

Deos Guarde a V. EX. como tanto nos he mister para o Escudo do Brasil. Acari
12 de Agosto de 1832.- Illust. E Excel. Sr Presidente Joaquim Vieira da Silva e Souza-
Thomaz de Araújo Pereira.

Fontes: Império do Brasil. Diário do Governo. Nº 2, Vol. XX, 3 de julho de 1832. Diário do
Pernambuco, Nº 436, 27 de julho de 1832.

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