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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL
CURSO DE ENGENHARIA AMBIENTAL

SÍLVIA BARACHO ROSADO

ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS DA FOZ DA LAGUNA DE


GUARAÍRAS, RN/BRASIL

NATAL – RN
2019
SÍLVIA BARACHO ROSADO

ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS DA FOZ DA LAGUNA DE


GUARAÍRAS, RN/BRASIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Universidade Federal do Rio Grande do Norte
como parte dos requisitos para a obtenção do grau
de Engenheiro Ambiental.

Orientador: Prof. Dr. Venerando Eustáquio Amaro

Coorientadora: Dra. Maria de Fátima Alves de


Matos

NATAL – RN
2019
SÍLVIA BARACHO ROSADO

ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS DA FOZ DA LAGUNA DE


GUARAÍRAS, RN/BRASIL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Universidade Federal do Rio Grande do Norte como
parte dos requisitos para a obtenção do grau de
Engenheiro Ambiental.
Orientador: Prof. Dr. Venerando Eustáquio Amaro
Coorientadora: Dra. Maria de Fátima Alves de Matos

Aprovada em: ____/____/________

____________________________________________________
Prof. Dr. Venerando Eustáquio Amaro
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Orientador

____________________________________________________
Dra. Maria de Fátima Alves de Matos
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Membro da Banca

____________________________________________________
Profa. Dra. Ada Cristina Scudelari
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Membro da Banca

____________________________________________________
Prof. Msc. Paulo Victor do Nascimento Araújo
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte
Membro da Banca
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede

Rosado, Sílvia Baracho.


Alterações morfológicas da Foz da Laguna de Guaraíras,
RN/Brasil / Sílvia Baracho Rosado. - 2019.
46f.: il.

Monografia (Graduação)-Universidade Federal do Rio Grande do


Norte, Centro de Tecnologia, Departamento de Engenharia Civil,
Natal, 2019.
Orientador: Dr. Venerando Eustáquio Amaro.
Coorientadora: Dra. Maria de Fátima Alves de Matos.

1. DSAS - Monografia. 2. Dinâmica Costeira - Monografia. 3.


Erosão Costeira - Monografia. 4. Sensoriamento Remoto -
Monografia. 5. Geoprocessamento - Monografia. I. Amaro,
Venerando Eustáquio. II. Matos, Maria de Fátima Alves de. III.
Título.

RN/UF/BCZM CDU 624:551.4

Elaborado por Raimundo Muniz de Oliveira - CRB-15/429


AGRADECIMENTOS

Inicialmente gostaria de agradecer ao meu orientador, Venerando Amaro, um


professor muito querido e atencioso, sempre disposto a ajudar com seus conhecimentos e com
sua boa energia.
Agradecer a minha coorientadora, Maria de Fátima, por toda paciência e atenção em
me ensinar, pelas mais diversas conversas, risadas e companhias no laboratório, por cada
conselho valioso. Com todo o meu carinho, serei eternamente grata.
A professora Ada Scudelari pela confiança de me conceder a oportunidade de crescer
com o ingresso no Laboratório de Geotecnologias Aplicadas, Modelagens Costeira e Oceânica
(GNOMO). Obrigada pela atenção e apoio, professora.
Ao GNOMO pela estrutura e apoio para a realização deste trabalho.
Fazer um agradecimento especial à minha família. Minha mãe Rosângela, que não
mede esforços quando se trata em amparar suas filhas, todo o caminho percorrido só foi
possível graças a você. Espero um dia conseguir retribuir todo o amor e dedicação. Minha
irmã Renata que me serve de inspiração por toda sua determinação e dedicação.
E, a João Victor, por sua vontade incessante de ajudar em tudo e a todos. Obrigada por
ter feito esses dias incertos de fim de curso mais leves.
“O sábio não escolhe os alimentos
mais abundantes, senão os mais
saborosos. Pois faze tu o mesmo:
almeja a vida mais intensa.”
Epicuro de Samos
RESUMO

No litoral sul do Estado do Rio Grande do Norte, nordeste do Brasil, está localizado a Laguna
de Guaraíras. Esta laguna, nas últimas décadas, tem mostrado mudanças significativas em seu
comportamento morfodinâmico e hidrodinâmico. Fatores como alterações no escoamento
superficial, assoreamento e erosão das margens da desembocadura, já são evidentes e
comprometem o funcionamento de todo o sistema. Alinhado a estes fatores, na região ao
entorno da laguna há forte presença da atividade de carcinicultura, representando 9% da
produção nacional, gerando assim, grande relevância para a economia local e regional. Nesse
contexto, o presente estudo tem como objetivo analisar o comportamento morfodinâmico da
embocadura da Laguna de Guaraíras, a partir da aplicação de técnicas de geoprocessamento
para quantificar a taxa de erosão e deposição da área de estudo. Para os procedimentos
metodológicos o trabalho contou com a análise multitemporal das variações da linha de praia,
por meio de imagens de satélite da série LANDSAT, entre os anos de 1984 e 2018, e
aplicação de análises geoestatísticas (End Point Rate - EPR, Linear Regression Rate - LRR e
Net Shoreline Movement - NSM) para quantificação da taxa de erosão/deposição das
alterações que ocorreram neste período de análise (1984 - 2018). Com base nos resultados
obtidos pelo valor do EPR, ocorreu uma intensa taxa de erosão de 6,4 m/ano e 0,34 m/ano de
deposição da margem esquerda da desembocadura da laguna de Guaraíras. A margem à
direita da desembocadura apresentou uma variação de 1 m/ano de erosão e uma taxa de 1,34
m/ano de deposição. Na faixa de praia ao sul da embocadura houve 1,5 m/ano de erosão e um
1 m/ano de deposição e na porção norte da embocadura uma taxa de 3 m/ano de erosão com
1,57 m/ano de deposição. Considerando os resultados obtidos verificou-se uma forte
tendência erosiva na desembocadura da laguna de Guaraíras, totalizando um recuo na margem
esquerda de -217,82 m em relação a 11,67 m de deposição. Na margem direita a tendência foi
deposicional, significando 45,6 m de acreção em relação a -31 m de erosão.
Palavras-chave: DSAS, Dinâmica Costeira, Erosão costeira, Sensoriamento remoto,
Geoprocessamento;
ABSTRACT

In the south coast of state of Rio Grande do Norte, northeast of Brazil, is situated the
Guaraíras Lagoon. This lagoon has shown significant changes in its morphodynamic and
hydrodynamic behavior in the last decades. Factors such as changes in superficial runoff,
silting and erosion of embankment margins are already evident and compromise whole
functioning system. Added to thesefactors, there is a strong presence of shrimp farming in the
area around the lagoon, representing 9% of national production, thus generating great
relevance for the local and regional economy. In this context, the present study aims to
analyze the morphodynamic behavior of the mouth of the Guaraíras Lagoon, based on the
application of geoprocessing techniques to quantify the rate of erosion and deposition of the
study area. For the methodological procedures the work counted on the multitemporal
analysis of variations of beach line, using satellite images of the LANDSAT series, between
1984 and 2018, and the application of geostatistical analyzes (End Point Rate - EPR, Linear
Regression Rate - LRR e Net Shoreline Movement - NSM) for quantification of the
erosion/deposition rate of the changes that occurred during this period of analysis (1984 -
2018). Based on the results obtained by the EPR, an intense erosion rate of 6.4 m/year and
0.34 m/year of deposition of the left embankment margins of Guaraíras Lagoon occurred. The
margin to the right of the embouchure presented a variation of 1 m/year of erosion and a rate
of 1.34 m/year of deposition. In the beach strip south of the embouchure there was 1.5 m/year
of erosion and 1 m/year of deposition and in the northern portion of the mouth a rate of 3
m/year of erosion with 1.57 m/year of deposition. Considering the results obtained, there was
a morphological instability at the mouth of the Guaraíras Lagoon, with a strong erosive
tendency in the left margin, resulting a decrease of -217.82 m in relation to 11.67 m of
deposition; and on the right bank the trend was depositional, corresponding to 45.6 m increase
in relation to -31 m of erosion. Thus, through the geoprocessing techniques applied, it was
possible to quantify the rate of erosion/deposition at the mouth of the Guaraíras Lagoon
during the period studied (1984 - 2018).
keywords: DSAS, Coastal Dynamics, Coastal Erosion, Geoprocessing;
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Mapa de Localização da Laguna de Guaraíras, área de estudo ............................... 14

Figura 2 – Mapa Geológico da Laguna de Guaraíras. Fonte: Base de dados IBGE ................ 16

Figura 3 – Mapa Geomorfológico da Laguna de Guaraíras. Fonte: Base de dados IBGE ...... 17

Figura 4 – Uso e Ocupação no entorno do sistema Lagunar de Guaraíras. Fonte: IDEMA


(2014) ............................................................................................................................................ 18

Figura 5 – Mata de manguezal da Laguna .................................................................................. 19

Figura 6 – Cobertura vegetal no entorno da Laguna .................................................................. 19

Figura 7 – Precipitação Acumulada – Natal. Fonte: INMET (2019) ........................................ 21

Figura 8 - Fluxograma das atividades desenvolvidas no processo metodológico ................... 22

Figura 9 – Diagrama de conversão do DN da imagem de 2018 do sensor Operational Land


Imager (OLI) - LANDSAT 8 ...................................................................................................... 24

Figura 10 – Processos de conversão de valores DN em mediadas de radiância pelo software


ENVI. A) Aplicação do método de correção radiométrica em Radiometric Calibration: B)
Definição da correção para as bandas multiespectraias do senso LANDSAT; C) parâmetros de
calibração de saída do arquivo .................................................................................................... 27

Figura 11 – Procedimentos da correção dos efeitos atmosféricos no sistema ENVI. A) Módulo


de correção FLAASH Atmospheric Correction; B) e C) Parâmetros de e varáveis ................ 29

Figura 12 – Aplicação da função para corrigir os valores de reflectância de 0 a 1. A)


Ferramenta Band Algebra para inserir a função; B) Digitação da função diretamente na opção
Band Math; C) Variáveis aplicadas a todas as bandas multiespectrais .................................... 29

Figura 13 – Aplicação do índice de água NDWI nas imagens multiespectrais. A) Ferramenta


Band Algebra para inserir o índice; B) Expressão matemática do índice NDWI no sistema
ENVI; C) Variáveis aplicadas especificamente as bandas do verde (GREEN) e do
Infravermelho (NIR) .................................................................................................................... 31
Figura 14 – Vetorização da Linha de praia com imagem NDWI .............................................. 32

Figura 15 – Representação dos 3 elementos básicos do DSAS, linha de costa, transectos e


linha de base ................................................................................................................................. 33

Figura 16 – Parâmetros estabelecidos para geração das variáveis estatísticas. 1) Parâmetros


estabelecidos para a linha de base. 2) Parâmetros estabelecidos para as linhas de praia ........ 33

Figura 17 – Variáveis geoestatísticas .......................................................................................... 34

Figura 18 - Classificação das cores quanto aos intervalos dos parâmetros analisados............ 35

Figura 19 - Mapa de Dinâmica Costeira na região frontal à embocadura da Laguna de


Guaraíras para o período de 1984 a 2018 ................................................................................... 36
Figura 20 - Análise qualitativa da área a partir da taxa EPR nos períodos interdecadais........ 38
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Características dos sensores imageadores da série LANDSAT para o período de


1984 a 2018 .................................................................................................................................. 23
Tabela 2 – Imagens INPE georreferenciadas e seus respectivos erros ..................................... 30
Tabela 3 – Análise da embocadura a partir da taxa EPR ........................................................... 37
Tabela 4 – Análise interdecadal da área de estudo a partir da taxa EPR para o Setor 1 .......... 39
Tabela 5 - Análise interdecadal da área de estudo a partir da taxa EPR para o Setor 2........... 39
SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................... ii
EPÍGRAFE (OPCIONAL) ....................................................................................................... iii
RESUMO ...................................................................................................................................... iv
ABSTRACT .................................................................................................................................. v
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................................. vi
LISTA DE TABELAS .............................................................................................................. vii
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12
2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO .............................................................. 13
2.1 Contexto Geológico-Geomorfológico .................................................................................. 15
2.2 Cobertura e uso do terra ......................................................................................................... 17
2.3 Caracterização Hidrodinâmica da Área de Estudo .............................................................. 20
2.4 Aspectos Climatológicos ....................................................................................................... 20
2.5 Aspectos Socioeconômicos ................................................................................................... 21
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...................................................................... 21
3.1 Seleção de Imagens ................................................................................................................ 22
3.2 Pré-Processamento Digital de Imagens ................................................................................ 23
3.3 Correção Radiométrica .......................................................................................................... 24
3.4 Correção Atmosférica ............................................................................................................ 27
3.5 Correção Geométrica ............................................................................................................. 30
3.6 Processamento Digital de Imagens ....................................................................................... 30
3.7 Extração das Linhas de Praias ............................................................................................... 32
3.8 Cálculo Geoestatístico das Linhas de Praia .......................................................................... 32
3.9 Agrupamento e Classificação dos Dados ............................................................................. 34
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES ........................................................................................ 36
4.1 Análise Evolutiva e Taxa de Variação da Linha de Praia entre os Anos de 1984 a 2018 . 36
4.2 Análise Evolutiva e Mobilidade da Linha de Praia no período Interdecadal ..................... 37
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 40
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................... 42
1. INTRODUÇÃO

Os estuários são ambientes sedimentares costeiros cuja evolução depende da interação


entre parâmetros geomorfológicos, sedimentares e hidrodinâmicos, sendo a atividade
biológica uma condicionante fundamental na manutenção deste sistema. Também se destacam
entre os principais ambientes deposicionais costeiros de história geológica recente, possuindo
uma diversidade de morfologias devido as diferentes formas de interação dos fluxos de
energia gerados pelas ondas, marés, e descarga fluvial (MIRANDA et al., 2002).
Nos últimos anos, por englobar variados recursos, a zona costeira tem sido alvo da
ampliação das atividades humanas, se dando nos ambientes estuarinos o palco dessas
transformações (SOUZA, 2004).
Uma das formas de impacto ambiental inerentes a zona estuarina, com destaque para
as atividades portuária, de navegação, de ampliação de áreas urbanas, de extração salineira, de
carcinicultura, entre outras, que implantadas de forma desordenada, é a alteração dos padrões
de circulação e de deposição de sedimentos do estuário e ambientes adjacentes. Acredita -se
que este fato visto de forma sistêmica entre os processos físicos, químicos e biológicos, ainda
está muito distante de se medir e prever suas conseqüências a longo prazo (MIRANDA et al.,
2002).
No litoral sul do estado do Rio Grande do Norte, nordeste do Brasil, está localizada a
Laguna de Guaraíras. A constante interação dos processos naturais e antrópicos vêm causando
riscos à integridade do ecossistema. Esta Laguna nas últimas décadas tem mostrado mudanças
significativas em seu comportamento morfodinâmico e hidrodinâmico. Isso determinou uma
crescente atenção ao estudo referente às mudanças, principalmente, ocorridas na embocadura
da laguna. Fatores como alterações no escoamento superficial, assoreamento e erosão das
margens da embocadura, já são evidentes e comprometem o funcionamento de todo o sistema.
Num contexto em que a erosão da praia é considerada inevitável, a compreensão do
comportamento da costa e elementos contribuintes para a erosão costeira são de grande
importância para cientistas, engenheiros e gestores costeiros (DOUGLAS e CROWELL,
2000). Com isso, obter conhecimento sobre os fatores que estimulam as mudanças no litoral
auxiliam a capacidade de lidar com os impactos gerados. A análise da mudança de linha de
costa é um campo bem desenvolvido que evoluiu com rigoroso processamento de dados e
protocolos analíticos (THIELER et al., 2009).

12
As condições de estabilidade nas embocaduras dependem predominantemente das
marés, do clima de ondas, do transporte litorâneo ao longo da praia adjacente, da descarga
fluvial e das características morfológicas e do clima na região. Estes fatores são responsáveis
por processos erosivos complexos, que provocam alterações no canal da embocadura a partir
de vários tipos de movimentos de massas nas encostas (AMARAL et al., 2003).
No entanto, a quantificação de tendências no comportamento do sistema costeiro é
apenas uma parte do problema. É essencial realizar uma análise dos dados históricos
disponíveis para melhor compreensão da problemática. Nesse contexto, com interesse pelo
balanço sedimentar relacionado aos processos costeiros, este trabalho foi desenvolvido
buscando o entendimento da dinâmica sedimentar estuarina conectada ao ambiente costeiro
adjacente e analisar o comportamento morfodinâmico da embocadura da Laguna de
Guaraíras, a partir da aplicação de técnicas de geoprocessamento para quantificar a taxa de
erosão e deposição da área de estudo. O conhecimento das taxas de erosão e deposição irá
fornecer importantes informações sobre a largura efetiva e o grau de perda da embocadura da
laguna.

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

De acordo dos mapas históricos das incursões holandesas no século XVII, a então
laguna de Guaraíras, não havia registro de comunicação direta com o mar. A influência
marinha na mesma, se dava por intermédio do rio Trairí, através das lagoas de Nísia Floresta e
Papeba. Nessa época, o rio Trairí tinha sua foz na barra do Camurupim, porção NE da área. Já
neste século, o DNOS publicou um mapa onde se mantinham, praticamente, os mesmos
aspectos anteriores, porém a laguna de Guaraíras já apresentava um in let de comunicação
com o mar, embora com pouca dimensão. O que permitia que o fluxo das águas fosse mantido
no sentido norte, com a desembocadura do complexo ainda na barra do Camurupim (MELO,
2000).
Foi provavelmente uma enchente ocorrida no de 1974, a responsável pelo alargamento
do canal de ligação da laguna de Guaraíras com o mar, e um dos fatores desencadeantes do
processo de colmatagem da foz do rio Trairí, que aliados aos ventos alísios de SE,
remobilizando os sedimentos das dunas móveis atuais, terminaram por fechar completamente
a antiga foz do referido rio. Com isso, o fluxo das águas no complexo lagunar sofreu inversão,
passando a desembocar, definitivamente, na laguna de Guaraíras, hoje com ampla
comunicação com o mar (MELO, 2000).

13
A Laguna de Guaraíras (Figura 1) se conecta ao mar no litoral oriental do estado do
Rio Grande do Norte, a cerca de 42km ao sul de Natal entre os municípios de Tibau do Sul
(no limite Sul) e Georgino Avelino (no limite Norte). Sua embocadura se situa nas
coordenadas 6°10’48”Sul e 35°5’32”Oeste e corresponde a um trecho da Faixa Litorânea
Leste de Escoamento Difuso, segundo o plano estadual de recursos hídricos da SERHID/RN
de 1998.

Figura 1 - Mapa de Localização da área de estudo, a .Laguna de Guaraíras no litoral oriental do Estado do Rio
Grande do Norte (RN).

A Laguna de Guaraíras faz parte de um complexo estuarino-lagunar situado,


parcialmente, em outros três munícipios: Nísia Floresta, Arês e Goianinha; e que compreende
outras duas lagoas, a de Nísia Floresta e Papeba, que são conectadas por dois canais artificiais,
Boqueirão e Surubajá. A Laguna de Guaraíras é a mais expressiva das três e corresponde à
zona de estuário dos rios Jacu e Trairi no litoral oriental do RN, formando uma vasta planície
aluvionar e propiciando a formação de extensos manguezais. Apresenta fisiografia em
formato de Y, com extensões de aproximadamente 7,0 km na direção do seu eixo principal,
NE-SO, e 4,0 km na direção NO-SE. Tais direções estão relacionadas com o padrão regional

14
de drenagens, encaixadas em uma depressão esculpida nos sedimentos da Formação Barreiras
(MELO, 200)
Na margem sul existe falésias de até 7,0 m de altura, com evidentes traços de erosão
em sua base devido à ação das correntes, das ondas e da oscilação da maré, acarretando o
solapamento da base do talude. Concomitantemente à ação hidrodinâmica na base, as chuvas
geram infiltração e escoamento superficial no topo das falésias, acelerando mais ainda o
processo erosivo e o recuo da encosta (AMARAL et al., 2003) (SCUDELARI et al. 2001).
A área de estudo está inserida na Área de Proteção Ambiental Bonfim-Guarairas foi
criada através do Decreto Estadual N° 14.369 de 22 de Março de 1999, com o objetivo de
proteger os ecossistemas de dunas, mata atlântica, manguezais, praias, rios e lagoas, além de
espécies vegetais e animais presentes nos municípios de Tibau do Sul, Goianinha, Arês,
Senador Georgino Avelino, Nísia Floresta e São José de Mipibu, no litoral oriental do estado.
Com uma área superior a 42 mil hectares (ver mapa), a APA Bonfim-Guarairas configura-se
como a maior Unidade Estadual de Conservação em área emersa do estado, assegurando a
preservação ambiental de uma extensa área de tabuleiros, dunas, dezenas de lagoas, bem
como o importante Complexo Lagunar de Bonfim e Papeba-Guarairas, região com intensa
atividade turística e presença do cultivo de camarão (IDEMA, 2017).
BENTES (2006) estudou os sedimentos de fundo do Sistema Lagunar de Guaraíras,
comparando as características granulométricas de sedimentos coletados nos anos de 2000 e de
2005, com estudos desenvolvidos por CARVALHO (1978), SILVEIRA (1981) e
CARVALHO (1982). A autora constatou diferentes padrões deposicionais em cada momento
analisado, indicando que o sistema vem sofrendo alterações na sua hidrodinâmica.
De forma geral, destaca-se uma redução da competência de transporte de sedimentos
ao longo do tempo, evidenciada pelo aumento de frações de sedimentos finos. Seguindo a
classificação proposta pela EMBRAPA (1997), verificou-se que na Laguna de Guaraíras,
principalmente nas proximidades da desembocadura, predominam frações de areias, ao passo
que no interior, próximo às cabeceiras do estuário e às áreas de manguezal, estão presentes
também frações expressivas de siltes (ROVERSI, 2018).

2.1 Contexto Geológico-Geomorfológico


A área de estudo está inserida, geologicamente, na Província Borborema, sendo
constituída pelos sedimentos do Grupo Barreiras (ENb), dos depósitos Colúvio-eluviais
(N23c), Flúvio-lagunares (N34flc), Mangues (N23m), Aluvionares (N4a), Eólicos Litorâneos

15
de paleodunas (N34elp) e de Dunas Móveis (N4lpd) (CPRM, 2005), que formam solos
altamente permeáveis e lixiviados, como pode ser observado na Figura 2.

Figura 2 – Mapa Geológico da Laguna de Guaraíras. Fonte: Base de dados IBGE.

Acompanhando a faixa litorânea estão depositados os sedimentos areno-quartzosos,


denominados de Depósitos de Praias, compostos de areias finas a grossas, com níveis de
cascalho, associadas às praias atuais e dunas móveis; arenitos e conglomerados com cimento
carbonático, definindo cordões de beachrocks. Também de origem marinha transportada. Em
alguns pontos da faixa litorânea expõe-se material pertencente ao Grupo Barreiras, formando
falésias de até 12 m de altura. Margeando a Laguna Guaraíra encontram-se Depósitos de
Lagoas formados por pelitos arenosos e carbonosos, planície fluviomarinha área plana
resultante da combinação de processos de acumulação fluvial e marinha, geralmente sujeita a
inundações periódicas, com vegetação de mangues (IDEMA, 2008).
A área de estudo é caracterizada por dois domínios morfológicos bem distintos,
conforme podem ser vistos na Figura 3: os platôs do litoral leste (domínio dos tabuleiros), e
seus vales encaixados (incluindo as várzeas terraços fluviais e os ambientes lagunares), não

16
ultrapassando os 150 metros de altitude. Esses platôs compreendem superfícies de
aplainamento, correspondentes ao domínio dos sedimentos da Formação Barreiras.
Limita-se a oeste com o embasamento cristalino e a leste estendem-se até a costa, por
vezes, são interrompidas abruptamente formando falésias. No geral, são superfícies planas e
suavemente onduladas com declives entre 0 e 5%, exceto próximo as linhas de drenagens
onde estes são consideravelmente mais acentuados; o outro domínio corresponde a área
litorânea, envolvendo principalmente os mangues, os cordões de dunas e as praias (MELO,
2000).

Figura 3 – Mapa Geomorfológico da Laguna de Guaraíras. Fonte: Base de dados IBGE.

2.2 Cobertura e Uso da Terra


A área do entorno da laguna vem sendo historicamente ocupada e preenchida pelas
mais diversas atividades humanas, agricultura, pastagem, área urbana e carcinicultura são
algumas das mais representativas, e sua existência e principalmente a atividade constante
causa sérios impactos ao meio ambiente, como a erosão costeira, visivelmente presente e

17
altamente susceptível a ser acentuada. No caso das áreas urbanas, construções sob a falésia
são em sua maioria irregulares o que aumenta a probabilidade de incidentes resultantes da
erosão, pelos mais variados fatores (GOMES, 2016).
De acordo com o Mapa de Uso e Ocupação do Solo elaborado pelo IDEMA (2014),
apresentado na Figura 4, atualmente a área total de viveiros de camarão instalados ao redor do
Sistema Lagunar de Guaraíras é de 1.477,86 ha. Esse valor é equivalente a 85% do espelho
d’água do sistema (que contabiliza 1.738,5 ha, considerando as lagoas e canais principais que
as conectam), e a 98% da área ocupada por manguezais. Estima-se ainda que o volume total
de água armazenado pelas fazendas seja equivalente a 70% do prisma de maré local.

Figura 4 – Mapa de Uso e Ocupação da APA Bonfim-Guaraíras. Fonte: IDEMA (2014).

Logo, considerando o volume significativo de água armazenado pela atividade


instalada na região, e as diferentes possibilidades de manejo de viveiros e de gerenciamento
hídrico utilizados no cultivo do camarão, acredita-se que a carcinicultura exerça influência
sobre a dinâmica do Sistema Lagunar de Guaraíras, em relação aos seguintes aspectos: i)
Modificação do prisma de maré e do comportamento hidrodinâmico das lagunas; ii)

18
Alterações em processos sedimentológicos e morfodinâmicos; e iii) Mudanças em padrões de
qualidade de água (ROVERSI, 2018).
Além da carcinicultura, as áreas urbanas – 2.018 ha em 2011 – e as áreas agrícolas –
9.217 ha em 2011 – existentes ao redor do Sistema Lagunar de Guaraíras representam também
expressivas fontes de poluição hídrica (IDEMA, 2014).
A vegetação da área prevalece sendo do tipo manguezal (Figura 5) - sistema ecológico
costeiro tropical dominado por espécies vegetais - mangues e animais típicos, aos quais se
associam outras plantas e animais, adaptadas a um solo periodicamente inundado pelas marés,
com grande variação de salinidade. E também pela Formação Tabuleiros Litorâneos –
vegetação encontrada cobrindo os Tabuleiros Costeiros, geralmente são áreas onde ocorreu
intervenção humana (IDEMA, 2008).

Figura 5 – Mata de manguezal da Laguna de Guaraíras.

A cobertura vegetal presente na região pode ser dividida nas seguintes variedades:
costeira, composta por vegetação fixadora de dunas, árvores de pequeno porte e gramíneas;
mata de manguezais, matas de várzeas, onde ocorrem plantas que circundam as drenagens,
como gramíneas e ciperáceas; além de porções de mata atlântica, nas quais ocorrem árvores
de médio porte, associadas à vegetação rasteira, como mostra a Figura 6 (AMARAL, 2003).

19
Figura 6 – Cobertura vegetal no entorno da Laguna de Guaraíras.

2.3 Caracterização Hidrodinâmica da Área de Estudo


O regime de mares predominantes é de mesomarés e energia mista (no sentido de
Hayes,,1975; 1979), semi-diurna, com altura máxima das marés entre 3,3m e 2,5m,
respectivamente durante marés de sizígia e quadratura (VITAL et al., 2008). Os ventos alísios
alcançam a zona costeira durante todo o ano e atingem em média intensidade máxima de 9
m/s entre agosto e outubro e mínima de 4 m/s em abril, mas com máximas medidas in situ de
até 18 m/s (CHAVES et al., 2006).
Os processos hidrodinâmicos associados podem ser caracterizados da seguinte forma:
(1) entrada: corrente gerada pelo efeito combinado de propagação da maré com a corrente
transversal relacionada ao regime de ondas local, durante a preamar; e (2) saída: corrente
gerada pelo nível da laguna à montante (Papeba), influenciada pelo regime hídrico do rio
Trairí e Jacu, que atua tanto na baixamar, quanto na preamar (MELO, 2000).
Os períodos de maior atuação da erosão costeira (entre os meses de junho a janeiro)
estão relacionados ao aumento da energia de ondas, decorrente das variações climáticas
sazonais, com aumento da energia de onda e velocidade das correntes de marés durante os
meses de menor precipitação (VITAL et al., 2006).

2.4 Aspectos Climatológicos


A estação meteorológica utilizada para análise fica situada em Natal, a mais próxima
da área de estudo.
O clima é descrito como tropical sub-úmido, que atua no litoral oriental potiguar com
uma estação seca na primavera-verão e uma estação chuvosa no outono-inverno. A estação
seca vai de agosto a dezembro, com estiagem mais rigorosa nos meses de outubro a

20
novembro. A estação chuvosa tem início em março e se prolonga até julho, com precipitações
máximas de abril a junho (Figura 7).

Figura 7 – Precipitação Acumulada para a estação de Natal. Fonte: INMET (2019)

A precipitação pluviométrica média é de 1.400 mm/ano podendo chegar a máxima de


2.800 mm/ano ou a mínima de 340 mm/ano (EMPARN, 2003).
Os ventos apresentam uma predominância no quadrante sudeste (ventos úmidos), no
verão predominam os contra-alísios e os alísios, os quais não têm condições de penetrar muito
além do litoral (MELO, 2000).

2.5 Aspectos Socioeconômicos


A carcinicultura é considerada uma das principais atividades econômicas da região. De
acordo com dados da FAO (2018) e do IBGE (2018), no ano de 2015, a produção de camarão
gerada pelos cinco municípios ao redor do sistema lagunar representou 9% da produção
nacional, sendo seu valor monetário equivalente a 52% da produção agropecuária da região.
Durante o pico da produção nacional de camarão, em 2003, o setor local empregava cerca de
3.000 funcionários diretos (IDEMA, 2014). O plantio da cana-de-açúcar, a indústria
sucroalcooleira e o turismo – hotelaria, restaurantes e recreação – representam também
importantes segmentos da economia local (ROVERSI, 2018).

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente trabalho foi estruturado seguindo uma sequência de 4 etapas: seleção e


aquisição das imagens LANDSAT, pré-processamento e processamento digital das imagens,

21
extração das linhas de praia e aplicação no DSAS. Abaixo segue fluxograma metodológico
(Figura 8).

Figura 8 - Fluxograma das atividades desenvolvidas no processo metodológico.

3.1 Seleção de Imagens


A partir da análise espaço-temporal de imagens multiespectrais de satélite foram
selecionadas 8 cenas entre as datas de 1984 e 2018 totalizando um período de estudo de 34
anos. A partir do repositório do Earth Explorer do United States Geological Survey (USGS,
2019) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), foram selecionas 6 imagens do
sensor Thematic Mapper (TM) LANDSAT-5 e 2 imagens do sensor Operational Land Imager
(OLI) LANDSAT-8 (Tabela 1), todas de nível 1T (LANDSAT Product Generation System -
LPGS). Imagens com 30 m de resolução, obtidas na órbita/ponto 214/64 na zona 25 Sul com
Datum WGS-1984 e projeção Universal Transversa de Mercator (UTM).
Diante do conjunto de dados disponíveis, para a seleção das imagens, foi levado em
consideração a inexistência e/ou a menor influência de nuvens sobre o setor costeiro da área
de estudo. Além disso, a sazonalidade foi outra variável relevante em apreço, de modo a se
obter a melhor condição dos aspectos transparência da coluna d'água, espraiamento das ondas
na zona de arrebentação e sedimentos em suspensão. Seguindo esses critérios e na

22
disponibilidade das cenas para a região, foram selecionados sete períodos de tempo com
intervalos de 4 a 6 anos conforme são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Características dos sensores imageadores da série LANDSAT para o período de


1984 a 2018.
Satélite Sensor Data de Imageamento Horário (Brasília)
LANDSAT 5 TM 17/11/1984 11h58min
LANDSAT 5 TM 11/10/1988 11h59min
LANDSAT 5 TM 05/05/1994 11h48min
LANDSAT 5 TM 26/09/2000 12h07min
LANDSAT 5 TM 13/03/2004 12h07min
LANDSAT 8 OLI 25/03/2014 12h28min
LANDSAT 8 OLI 24/06/2018 12h27min

3.2 Pré-Processamento Digital de Imagens

As imagens de satélite da série LANDSAT são uma das mais importantes fontes de
dados para o estudo da evolução de diferentes tipos de cobertura do uso do solo e aplicações
ambientais ao longo das últimas 4 décadas (Bertucini Júnior e Centeno, 2016). Embora na
última década, com o lançamento do LANDSAT OLI-8, tenha ocorrido muitas melhorias na
detecção dos aspectos biofísicos da imagem em relação as versões anteriores, favorecido pela
inserção de duas novas bandas espectrais no sensor OLI: uma banda azul costeiro (0,433 –
0,453 µm) e uma banda cirrus (1,360 – 1,390 µm) e do aumento da resolução radiométrica
para 12 bits, que permite caracterizar melhor o ambiente costeiro por exemplo (Roy et al.,
2014; Acharya et al., 2016), contudo, os sensores não estão totalmente livres das distorções
introduzidas no momento de aquisição das imagens devidas à rotação, inclinação e curvatura
da Terra e devida à instabilidade da plataforma (Meneses et al., 2012; Bertucini Júnior e
Centeno, 2016).
Estas distorções, também chamadas de distorções sistemáticas de primeiro nível, são
corrigidas pela própria agência fornecedora da imagem, antes de serem disponibilizadas ao
usuário. Todavia, as correções de primeiro nível ainda não atendem totalmente as
características das unidades físicas, como por exemplo, radiância, reflectância ou temperatura
(Chen e Herz, 1996) e os padrões cartográficos para localização espacial local (correção
geométrica) sendo necessário fazer correções adicionais (Figura 9), ou de correções segundo
nível (Meneses et al., 2012).

23
Figura 9 – Diagrama de conversão do DN da imagem de 2018 do sensor Operational Land Imager (OLI) -
LANDSAT 8

Estudos voltados, por exemplo, para os ambientes costeiros, que envolve a análise
multitemporal das alterações morfológicas, se faz necessário efetuar técnicas para suavizar
e/ou reduzir o erro geométrico (georreferenciamento) para compatibilizar as imagens com a
cartografia existente, por meio de pontos de controle, utilizando o mesmo datum e sistema de
projeção da mesma região.
Assim, para esta etapa de pré-processamento das imagens foi utilizado o software
ENVI para as correções radiométrica e atmosférica e o ArcGis 10.3 para correção geométrica.

3.3 Correção Radiométrica


O método para realizar a correção radiométrica das imagens consiste em detectar, em
cada banda envolvida, as regiões mais claras (com alta intensidade e baixa saturação) e as
mais escuras (com baixa intensidade e alta saturação) Polidorio et al. (2005). Essas regiões,
normalmente, estão associadas com nuvens e sombras respectivamente. Esta técnica diminui
diferenças radiométricas entre imagens, causadas por inconsistências de condições de
aquisição, ao invés de mudanças reais de cobertura da terra (Yuan e Elvidge, 1996; Yang e
Lo, 2000).
Os produtos de dados de nível 1T da série LANDSAT são fornecidos em números
digitais ou digital number (DN) contidos em cada pixel representando os dados das bandas
multiespectrais e termais. O formato de DN, não são representativos das características das
unidades físicas (radiância, reflectância ou temperatura), necessitando por isso, serem
convertidos em valores de medida de radiância.

24
O cálculo da radiação espectral no sensor é a etapa fundamental na conversão de dados
de imagem de vários sensores e plataformas em uma escala radiométrica (Chander et al.,
2009). A calibração radiométrica dos sensores TM e OLI envolve o redimensionamento dos
números digitais brutos (Q) transmitidos do satélite para os números digitais calibrados
(Qcal)6, que possuem a mesma escala radiométrica para todas as cenas processadas no solo por
um período específico.
Durante a calibração radiométrica, os valores de pixel (Q) bruto, dados de imagem não
processados, são convertidos em unidades espectral de radiância absoluta usando cálculos de
pontos flutuante de 32 bits. Os valores de radiância absoluto são então redimensionados para
8 bits (TM, Qcalmax = 255) e 16 bits (OLI, Qcalmax = 32767) números representando Q cal antes
da saída para a mídia de distribuição (Chander et al., 2009).
Conversão de Qcal em produtos de Nível 1 de volta para espectral no sensor radiância
(Lλ) requer conhecimento dos limites inferior e superior dos fatores de redimensionamento
originais. A seguinte equação é usada para executar a conversão de Qcal em Lλ para produtos
de nível 1:

(Equação 1)

onde:

25
(Equação 2)

(Equação 3)

onde
radiância espectral na abertura do sensor [W/(m2 sr )]
= valor do pixel calibrado e quantificado [DN]
= correspondente ao valor mínimo do pixel calibrado e quantificado a [DN]
= correspondente ao valor máximo do pixel calibrado e quantificado a [DN]
= radiância espectral no sensor dimensionado para [W/(m2 sr )]
= radiância espectral no sensor dimensionado para [W/(m2 sr )]
= fator de ganho de reescalonamento específico da banda [(W/(m2 sr ))/DN]
= fator de viés de redimensionamento específico da banda [W/(m 2 sr )]

Historicamente, as informações de calibração do sensor TM são apresentadas em


unidades de radiação espectral de mW / (cm2 sr μm). Para manter a consistência com a
radiação espectral ETM + e outros sensores, são usadas unidades de W/(m2 sr μm) para
informações de calibração dos sensores anteriores. O fator de conversão é 1:10 ao converter
de mW/(cm2 sr μm) para W/(m2 sr μm) (Chander et al., 2009).
Desta forma, o sistema ENVI automatiza o processamento de conversões e lê os
valores das faixas dinâmica a partir dos arquivos de metadados de cada sensor (MTL.txt
metadata*) disponível durante o download das imagens (Chander et al., 2009). Através da
opção Radiometric Calibration (Calibração Radiométrica) (Figura 10A) o ENVI irá
transformar os valores de DN para medidas de radiância no topo da atmosfera para cada uma
das bandas multiespectral do sensor LANDSAT (MTL_MultiSpectral), conforme a Figura
10B. O sistema ENVI usando a seguinte formulação (Equação 4).

(Equação 4)

Onde Lλ: Radiância espectral na abertura do sensor (Watts/(m 2 * srad * µm)).

26
Nesta fase, é fornecido para a imagem os dados em ponto flutuante (.dat) e um
formato BIL (Band interleaved by pixel) de gravação de saída (Figura 10C). O ENVI
determina automaticamente o fator de escala correto para obter os dados nas unidades de
radiância espectral. Uma vez aplicado o algoritmo de calibração radiométrica, a próxima etapa
é converter os valores para reflectância no top da atmosfera.

Figura 10 – Processos de conversão de valores DN em mediadas de radiância pelo software ENVI. A) Aplicação
do método de correção radiométrica em Radiometric Calibration: B) Definição da correção para as bandas
multiespectraias do senso LANDSAT; C) parâmetros de calibração de saída do arquivo.

3.4 Correção Atmosférica

A atmosfera interage com a radiação eletromagnética, provocando significativas


alterações no fluxo radiante proveniente do alvo, e assim, torna-se uma das principais fontes
de degradação ou distorção radiométrica na imagem (Latorre et al., 2002). Tais evidências
desses efeitos sobre a imagem são a diminuição do brilho da superfície em regiões espectrais
específicas e a presença de névoa, com perda de nitidez, nas regiões dos menores
comprimentos de onda (Freire, 1996), exigindo uma correção quanto a esse efeitos, ou na
prática, transformar os valores de radiância para reflectância na superfície e/ou no reflectância
no topo da atmosfera – TOA, em números inteiros (Matthew et al., 2000).
Ao comparar imagens de diferentes sensores, há três vantagens em usar a refletância
TOA. Primeiro, ele remove o efeito cosseno de diferentes ângulos do zênite solar devido à
diferença de tempo entre as aquisições de dados. Segundo a refletância de TOA compensa
valores diferentes da irradiância solar exoatmosférica decorrente de diferenças na banda
espectral. Terceiro, a refletância do TOA corrige a variação na distância Terra-Sol entre

27
diferentes datas de aquisição de imagens (Chander et al., 2009). A refletância TOA da Terra é
calculada de acordo com a equação 5:

(Equação 5)

onde:
pʎ = reflectância TOA planetária (sem unidade)
π = constante matemática igual a ~ 3.14159 (sem unidade)
Lʎ = radiância espectral na abertura do sensor (W/(m2 sr ))
d = distância Terra-sol (unidade astronômica)
ESUNʎ = média da irradiância solar exatmosférica (W/(m2 ))
s = ângulo zênite solar (graus9)

Na prática existem diversos métodos para realizar a correção atmosférica em dados


multiespectrais (Agrawal e Sarup, 2011), entre eles destaca-se o método FLAASH (Fast Line-
of-Sight Atmospheric Analysis of Spectral Hypercubes), executado pelo sistema ENVI (Figura
12A). O FLAASH é um código de transferência radiativa MODTRAN4 (Moderate Resolution
Atmospheric Radiance and Transmittance Model). Para esta correção, o FLAASH necessita
de alguns parâmetros básicos de entrada (Figura 12B), os quais são: vapor d'água; hora e data
do imageamento; definição do espectro de espalhamento; o ângulo azimutal e de elevação do
sensor; a elevação da superfície da área; tamanho do pixel (Soares, 2015).
Além destes, outros parâmetros atmosféricos relevantes aplicados foram baseados em
um módulo de temperatura da superfície da latitude sazonal de acordo com uma tabela de
consultafornecida pelo ExelisHelp® (Yang et al., 2015). Os dados de profundidade óptica de
aerossóis (AOD) utilizados foram baixados e processados a partir dos dados do Nível 2.0
fornecidos pela AERONET (Aerosol Robotic Network) (NASA, 2012; Yang et al., 2015)
(Figura 11C).
Assim, para obter a radiância espectral do pixel de sensor, L, é expressa pela Equação
6:

(Equação 6)

onde:
, é a radiância no sensor,

28
 é a reflectância do pixel na superfície,
é a média da reflectância da região ao entorno do pixel,
é o albedo esférico da atmosfera,
é a radiação espalhada pela atmosfera e A e B são os coeficientes que dependem da
geometria e das condições atmosféricas.

O primeiro termo da Equação 6, explica a radiação refletida pela superfície que chega
ao sensor, o segundo termo, explica a radiação refletida que é espalhada pela superfície e
chega ao sensor (Soares, 2015). Além desta equação, através da ferramenta do sistema ENVI,
Band Math, situada na opção Band Algebra, para transformar os valores de reflectância de 0 a
1, o FLAASH multiplica os valores de reflectância por 10.000 (Figura 12). O motivo dessa
multiplicação é para converter os dados de reflectância para números inteiros.

Figura 11 – Procedimentos da correção dos efeitos atmosféricos no sistema ENVI. A) Módulo de correção
FLAASH Atmospheric Correction; B) e C) Parâmetros de e varáveis

Figura 12 – Aplicação da função para corrigir os valores de reflectância de 0 a 1. A) Ferramenta Band Algebra
para inserir a função; B) Digitação da função diretamente na opção Band Math; C) Variáveis aplicado a todas as
bandas multiespectrais.

29
3.5 Correção Geométrica

A correção geométrica foi realizada após as correções radiométrica e atmosférica.


utilizando ortoimagens e pontos de controle de terreno determinados por GPS de precisão
centimétrica uniformemente distribuídos em toda a imagem, no software ArcGIS 10.3 para
estabelecer um mapeamento entre coordenadas de imagem e coordenadas geográficas.

As imagens dos anos de 2004, 2008, 2014 e 2018 foram corrigidas geometricamente e
ortorretificadas pelo United States Geological Survey (USGS), com precisão superior a 0,4
pixels, valor considerado aceitável para precisão espacial das imagens da série LANDSAT de
resolução espacial moderada (Acharya et al., 2016). Essas imagens serviram de suporte para o
georreferenciamento das restantes, que foram obtidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE). Assim, os erros decorrentes da correção das imagens do INPE são
incrementados aos erros das imagens do USGS.

O método utilizado foi um polinômio de segunda ordem (quadrático). Após a


retificação, verificou-se que o erro quadrático médio da raiz (RMSE) não excedia 1 pixel,
revelando uma alta correspondência geométrica das imagens.

Tabela 2 – Imagens INPE georreferenciadas e seus respectivos erros.


Data de RMS/Erro
Satélite Georreferenciamento
Imageamento acumulado
LANDSAT 5 17/11/1984 Polinomial Quadrático (2014) 0.273
LANDSAT 5 11/10/1988 Polinomial Quadrático (2014) 0.128
LANDSAT 5 05/05/1994 Polinomial Quadrático (2014) 0.147
LANDSAT 5 26/09/2000 Polinomial Quadrático (2014) 0.312
LANDSAT 5 13/03/2004 Ortorretificado 0.241
LANDSAT 5 05/02/2008 Ortorretificado 0.280
LANDSAT 8 25/03/2014 Ortorretificado 6.796
LANDSAT 8 24/06/2018 Ortorretificado 9.132

3.6 Processamento Digital de Imagens

Após etapa de pré-processamento, as imagens foram submetidas às técnicas de realce


com composições coloridas entre as bandas espectrais no sistema de cores Red-Green-Blue
(RGB).

Neste trabalho, para auxiliar na extração da linha de praia foi empregado o método de
Normalized Difference Water Index (NDWI). O NDWI tem como objetivo delinear ambientes
de águas abertas, automatizando a determinação do limiar entre a água e a terra (limite seco-

30
úmido, vegetação terrestre, solo, estruturas, construções), o que permite maximizar a
reflectância típica da água usando o comprimento de onda da luz verde (G de Green),
minimizar a baixa reflectância dos corpos d´água no infravermelho-próximo (NIR de Near
Infrared) e realçar o contraste entre a água e a superfície terrestre (McFeeters, 1996), dada
pela função básica:

(Equação 7)

Com base na equação (7), o NDWI produz o valor 1 para corpos d’água e próximo de
-1 para as demais feições. Na prática, devido aos baixos valores de brilho registrado na
imagem NIR, o valor NDWI oscila em torno de zero para corpos d’água e -1 para outras
feições morfológicas (Polidorio et al. 2004).

No sistema ENVI, a aplicação do NDWI é inserida através da ferramenta Band Math,


situada na opção Band Algebra (Figura 13), onde é diretamente expressada a função (Equação
8).

(Equação

8)

Figura 13 – Aplicação do índice de água NDWI nas imagens multiespectrais. A) Ferramenta Band Algebra para
inserir o índice; B) Expressão matemática do índice NDWI no sistema ENVI; C) Variáveis aplicadas
especificamente as bandas do verde (GREEN) e do Infravermelho (NIR).

31
3.7 Extração das Linhas de Praia
Segundo Amaro et al. (2012), há vários fatores que interferem na definição precisa da
linha de costa, como por exemplo, resolução do sensor remoto, extensão do trecho da zona
costeira e condições de maré.
Diferentes indicadores têm sido usados para a definição do termo linha de praia,
sobretudo em zonas costeiras influenciadas por mesomarés e macromarés (Boak e Turner
2005). Nesse trabalho a linha de praia foi estabelecida como a linha que na face de praia
separa a área seca da molhada (zona saturada), compreendida como a última posição de maré
mais alta no momento do imageamento (Amaro et al., 2014).
Após a etapa de pré-processamento e processamento digital, as imagens realçadas são
inseridas em ambiente SIG com o software ArcGis 10.3 para extração das linhas de praia
sobre o qual o limite mar (água)-terra é identificado após aplicação do NDWI (Figura 14),
separando as porções úmidas (periodicamente submersas) e secas (emersas) no instante do
imageamento.
Em seguida, as linhas de praia foram compiladas como shapefiles e depois importadas
para um geodatabase. A linha molhada/seca identificada nas imagens aéreas é definida como a
linha associada a uma mudança de cor/tom entre a areia úmida e seca.

Figura 14 – Vetorização da Linha de praia com imagem NDWI.

3.8 Cálculo Geoestatístico das Linhas de Praia

As linhas de praia extraídas foram submetidas ao Digital Shoreline Analysis System


(DSAS) para os cálculos da sua evolução e que estende as funcionalidades ao software

32
ArcGIS. O DSAS utiliza-se principalmente de 3 elementos (Figura 15): as linhas de costa; as
linhas de base e os transectos [THIELER et al. (2009)].

Figura 15 – Representação dos 3 elementos básicos do DSAS, linha de costa, transectos e linha de base.

As linhas de base foram feitas de maneira mais paralela possível em relação as linhas
de praia, para atender com maior precisão a variação da linha do litoral em relação ao tempo
(FRANCO et al., 2012) e os transectos, que são linhas perpendiculares as linhas de base,
tiveram seus espaçamentos arbitrados dependendo da extensão do setor estudado, variando de
50m para as seções de embocadura à 80m para as faixas de praia (Figura 16).

Figura 16 – Parâmetros estabelecidos para geração das variáveis estatísticas. 1) Parâmetros estabelecidos para a
linha de base. 2) Parâmetros estabelecidos para as linhas de praia.

Após vetorização das linhas de praia, linha de base e criação dos transectos foi gerado
as variáveis geoestatísticas (Figura 17).

33
Figura 17 – Variáveis geoestatísticas.

Na análise da mobilidade da linha de praia mais antiga para a mais recente foi
empregado o método Net Shoreline Movement (NSM). Essa abordagem requer apenas duas
faixas de praia para permitir o cálculo (THIELER, 1994). Neste estudo, as faixas de praia
disponíveis foram examinadas em pares e em ordem sequencial (1984-1988, 1988-1994,
1994-2000, 2000-2004, 2004-2008, 2008-2014, 2014-2018).

Para a análise da amplitude geral de variação da linha de praia independente dos


processos de deposição/erosão que podem ter ocorrido entre os períodos, utilizou-se o
Shoreline Change Envelope (SCE), que consiste no cálculo da distância entre a faixa de praia
mais próxima e mais distante da linha de base (THIELER, 1994).

Para a taxa de variação média de erosão/deposição ao longo dos anos foi utilizado o
método End Point Rate (EPR). Foi aplicado também o método de Linear Regression Rate
(LRR) onde Y = tempo e b= espaço em metros, que fornece uma relação entre uma variável
quantitativa pode ser explicada a partir de outra (Franco et al., 2012). Os valores de LRR são
utilizados na caracterização, validação e no prognóstico.

(2)

3.9 Agrupamento e Classificação dos Dados

Para melhor interpretação e discussão dos dados utilizados para caracterização da área
de estudo, foram agrupados os dados em 2 tipos de classificação. A primeira classificação

34
teve como objetivo retratar a evolução da linha de praia em termos de amplitude e mobilidade,
nessa categoria foram utilizados o SCE e NSM. Cada um desses parâmetros foi então
classificado, avaliado e correlacionado com estudos prévios sempre que possível (Prudêncio
et al., 2019).

A segunda classificação foi realizada para os dados que mostram a evolução da linha
de praia em termos de taxas anuais, no caso, diagnóstico (EPR) e prognóstico (LRR) e sua
classificação dos intervalos adaptada de Rangel-Buitrago et al. (2015).

Os resultados foram codificados por cores, sendo as cores verdes indicando acreção, a
cor amarela para estabilidade e as cores vermelha e laranja para erosão (Figura 18). Devido ao
comprimento das linhas de praia, optou-se por subdividir a área de estudo em dois setores
para que pudesse ser melhor analisado espacialmente. Sendo o Setor 1 a porção Norte e o
Setor 2 a porção Sul (Figura 19).

Figura 18 - Classificação das cores quanto aos intervalos dos parâmetros analisados.

35
Figura 19 - Mapa da Dinâmica Costeira na região frontal à desembocadura da Laguna de Guaraíras para o
período de 1984 a 2018.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1 Análise Evolutiva e Taxa de Variação da Linha de Praia entre os Anos de 1984 a
2018

Mudanças no litoral foram medidas nos 250 transectos distribuídos no Setor 1 e nos
234 transectos distribuídos no Setor 2. Analisando o período que compreendeu toda a
extensão temporal (34 anos) com a taxa LRR, notou-se que mais de 70% dos transectos

36
gerados para o Setor 1 revelou uma tendência erosiva totalizando 4,14km de extensão da área
e uma predominância de acreção relativamente baixa, com apenas 10% de sua extensão.

Para o Setor 2, foi identificada uma menor tendência erosiva, com valor de LRR
variando entre -1,51 m/ano e 1,34 m/ano, havendo assim uma dinâmica relativamente estável,
com a área que sofre o processo erosivo sobrepondo em 12,30% a área estável e com
deposicão de sedimentos.

A partir da análise das variáveis geoestatísticas geradas pelo DSAS, foi identificada
uma intensa variação da margem esquerda da embocadura da Laguna de Guaraíras. A taxa
EPR apresentou uma taxa de recessão de -6,41 m/ano, totalizando -217,94 m ao longo do
período de estudo em relação a deposição de 1,57 m/ano (Tabela 4), totalizando 53,38 m, o
que resulta num significativo recuo da margem com um balanço geral negativo de 164,56 m.

A margem à direita da embocadura mostrou uma tendência levemente deposicional em


poucos pontos específicos com uma acreção de 1,34 m/ano, total de 45,56 m em relação a
erosão de -1,00 m/ano, total de -34 m, resultando num balanço positivo total de 0,34 m/ano e
de 11,56 m no total de 34 anos (Tabela 2).

Tabela 3 – Análise da embocadura a partir da taxa EPR

Setores Acreção (m/ano) Erosão (m/ano) Balanço (m/ano)

Setor 1 1.57 -6.41 -4.84


Setor 2 1,34 -1,00 0,34

4.2 Análise Evolutiva e Mobilidade da Linha de Praia no período Interdecadal

No estudo interdecadal a área apresentou dois períodos (2000-2004 e 2008-2014) bem


marcados por um alto processo erosivo para os dois setores (Figura 20). Para a margem à
esquerda da embocadura foi notório o seu contínuo recuo ao longo dos anos, ficando evidente
o seu constante desgaste, enquanto que para a margem à direita da embocadura apresentou
uma maior dinâmica com períodos erosivos, deposicionais e um pouco de estabilidade
comparado a outra margem.

Para o Setor 1, a linha de praia respondeu com processos intercalados entre os períodos,
porém com o balanço da porcentagem de erosão sempre superior aos de deposição (Tabela 3),
havendo um saldo negativo na maior parte de seu comprimento no final do período (1984-
2018). Deve-se destacar os períodos entre 2000-2004 e 2008-2014 em que atingiram,
37
respectivamente, 97,1% e 85,5% de processo erosivo em sua extensão, totalizando uma faixa
de 5,0km e 4,19km de erosão nesses intervalos.

38
Figura 20 - Análise qualitativa da área a partir da taxa EPR nos períodos interdecadais.

39
Tabela 4 – Análise interdecadal da área de estudo a partir da taxa EPR para o Setor 1.

Erosão Alta Erosão Estabilidade Acreção Acreção Alta


Setor
1 Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec.
(km) (%) (km) (%) (km) (%) (km) (%) (km) (%)
1984-
0,59 21.92 0,13 2.74 0,13 2.74 0,31 8.22 2.96 64.38
1988
1988-
4,38 87.32 -- -- 0,18 1.41 0,18 1.41 0,31 9.86
1994
1994-
0,80 20.00 0,14 2.86 -- -- 0,23 4.29 3,83 72.86
2000
2000-
4,99 97.10 0,10 1.45 -- -- 0,09 1.45 -- --
2004
2004-
0,56 17.14 0,28 11.43 0,19 1.43 0,35 4.29 2,96 65.71
2008
2008-
3,83 78.26 0,36 11.59 0,22 5.80 0,14 4.35 -- --
2014
2014-
0,46 15.71 0,13 5.71 0,27 7.14 0,83 24.29 2,17 47.14
2018

Para o Setor 2, a faixa de praia apresentou três períodos consecutivos de


predominância erosiva (1988-1994, 1994-2000, 2000-2004), possuindo um balanço de
transectos negativo entre 42,42% e 57,14% porém, em seguida, teve um significativo processo
deposicional de 90,48% de toda sua extensão com apenas 7,94% de erosão, ocorrendo dessa
forma um relativo equilibro da linha de praia (Tabela 4).

Tabela 5 - Análise interdecadal da área de estudo a partir da taxa EPR para o Setor 2.

Erosão Alta Erosão Estabilidade Acreção Acreção Alta


Setor 2 Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec. Ext. Transec.
(km) (%) (km) (%) (km) (%) (km) (%) (km) (%)
1984-
0,35 16.42 0,22 5.97 1,1 26.87 0,1 2.99 2,13 47.76
1988
1988-
3,17 62.12 0,39 7.58 0,16 3.03 0,23 4.55 0,6 22.73
1994
1994-
2,20 55.38 0,70 16.92 0,18 3.08 0,47 10.77 0,61 13.85
2000
2000-
2,58 61.90 0,26 12.70 0,11 7.94 0,19 9.52 0,11 7.94
2004
2004-
-- -- 0,40 7.94 0,22 1.59 0,48 11.11 3,14 79.37
2008
2008-
1,73 46.88 0,46 21.88 0,18 6.25 0,54 12.50 0,54 12.50
2014
2014-
0,24 6.15 0,72 24.62 0,10 4.62 0,69 18.46 2,04 46.15
2018

40
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na margem ao norte da foz, foi onde apresentou maior evidência do processo de recuo
com os dados de EPR mostrando erosão em 93,1% da área chegando a uma mobilidade
máxima de 217,94 m de sedimentos erodidos e taxa de EPR média de -3.65 m/ano, porém em
pontos específicos da foz com média de erosão -6,64 m/ano, principalmente pela sua
composição de sedimentos dunares, fazendo com que esse trecho seja mais vulnerável ao
processo erosivo pela ação dos ventos e correntes de vazante que utilizam estoques
sedimentares das zonas de berma.

Para a margem ao sul da foz, apresentou maior dinâmica de erosão/deposição,


expressando maior estabilidade com 56,41% dos transectos de erosão. Porém também
ocorrendo processo deposicional com 43,59% dos transectos gerados. Média de taxa EPR
levemente erosiva com -0,08 m/ano e apresentando alguns pontos deposicionais com 1,34
m/ano. Esse comportamento se deve a sua composição morfológica de falésia possuir uma
maior resistência mecânica ao processo erosivo, porém em sua base há traços da ação das
correntes, das ondas e da oscilação da maré, acarretando o solapamento do talude.

A análise a partir do LRR para evolução das faixas de praia tanto da porção norte
quanto ao da porção sul no período de 1984 a 2018, apresentou faixas relativamente estáveis
(-0,64 m/ano – norte; -0,08 m/ano – sul), exibindo na maioria dos transectos variação da linha
de praia de até três metros por ano. No entanto, a partir da observação dos módulos SCE
(média de 37,9 m para porção norte e média de 31,2 m para porção sul) e NSM (média de -
13,05 m porção norte e média de -7,25 m porção sul) foi possível observar que apesar de sua
aparente estabilidade, essa área apresentou grande amplitude e mobilidade de variação da
linha de praia nesse período. Por esse motivo foram necessárias análises interdecadais para
então se constatar que na área ocorreram tanto eventos de erosão como eventos de deposição
que alternaram entre si ao longo do tempo.

Após analisar a variação da linha de praia de forma interdecadal, com os períodos de


1984 a 1988, 1988 a 1994, 1994 a 2000, 2000 a 2004, 2004 a 2008, 2008 a 2014 e 2014 a
2018, foi possível concluir que, apesar da área ter mostrado inicialmente um quadro de
relativa estabilidade, trata-se de uma área com tendência moderada a erosão, mostrando uma
média de taxa de variação de linha de praia de -0,65 m/ano para a faixa ao norte e de -0,05
m/ano para a faixa ao sul.

41
Por fim, as linhas de praia apresentaram um cenário de movimentos intercalados e de
modelamento do litoral caracterizado pela dinâmica costeira e identificados a partir do uso dos
módulos NSM e SCE. Estes processos juntos mantêm um equilíbrio entre a adição e a
remoção de areia, resultando numa linha de praia aparentemente estável, mas que, na
realidade, há uma permuta constante do material arenoso.

Os resultados obtidos através de técnicas de sensoriamento remoto, SIG e aplicação do


DSAS permitiram a identificação dos principais trechos de recuo da área de estudo indicando
um cenário geral de erosão, com destaque para a embocadura da Laguna de Guaraíras. Essas
informações podem ser utilizadas como subsídios técnicos qualitativos ao gerenciamento
costeiro.

Para continuação do trabalho é recomendável realizar o adensamento para os períodos


curtos com imagens de alta resolução, levantamento da área de estudo através de Global
Navigation Satellite System (GNSS) para calibração dos dados, monitoramento do nível da
maré com medidor de nível, atualização de batimetria e por fim realizar um estudo de
vulnerabilidade costeira (IVC).

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