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Capítulo 4

O Potencial Elétrico e a Energia


Potencial Elétrica

Suponha que uma carga de teste q seja abandonada em um ponto P pertencente ao campo
elétrico gerado por uma carga fonte Q fixa no espaço, ambas de mesmo sinal sem perda de
generalidade. Se levarmos em conta apenas a interação elétrica entre as cargas, notamos que
a carga de teste é acelerada devido à força elétrica repulsiva produzida pelo campo elétrico
gerado por Q em P . Do ponto de vista energético, podemos dizer que, após o abandono,
a carga de teste ganhou energia cinética (energia de movimento), veja ilustração na Figura
4.1.

Figura 4.1: Ao ser posicionada em P a carga de teste q é eletricamente repelida pela carga
fonte Q.

Sabemos que a energia não pode ser criada do nada. A energia cinética adquirida pela carga
teste q resulta da transformação de uma outra modalidade de energia. Dessa forma, nessa
linha de raciocínio, podemos dizer que ao posicionar a carga de teste q em P , ela armazena
uma quantidade de energia de energia só pelo fato de ter sido posicionada naquele ponto

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P que, quando liberada, se transforma em energia cinética (energia de movimento). Esse


tipo de energia latente que se transforma em energia de movimento ao ser liberada recebe o
nome de energia potencial e, como neste caso, ela é armazenada num campo elétrico, ela é
chamada de energia potencial elétrica que simbolizaremos por U . Dessa forma, podemos
dizer que um campo elétrico é um reservatório de energia potencial elétrica.

Ao ser posicionada no ponto P de um campo elétrico, a carga


de teste q armazenou uma modalidade de energia potencial
denominada energia potencial elétrica (U ) que se transforma,
quando liberada, em energia cinética.

Essa energia potencial elétrica U pertence ao sistema composto pela carga fonte Q e pela
carga de teste q. Isso significa que, se a carga fonte Q não estivesse fixa, a energia potencial
elétrica seria convertida em energia cinética tanto para a carga fonte Q quanto para a carga
de teste q. Quando a carga fonte Q está fixa, como é o caso proposto, toda a energia
potencial elétrica fica atribuída a carga de teste q. A existência dessa energia potencial
elétrica é uma manifestação do caráter conservativo da força elétrica e, consequentemente,
do campo elétrico

4.1 Potencial elétrico


O valor da energia potencial elétrica armazenada por uma carga de teste depende da posição
em que ela é colocada no campo elétrico. Dessa forma, torna-se necessário introduzir uma
grandeza que indique a quantidade de energia potencial elétrica que qualquer carga de teste
pode armazenar ao ser colocada num ponto P do campo elétrico, ou seja, que indique o
potencial de armazenamento energético de P .
Em cada ponto P do campo elétrico gerado por uma carga fonte Q, associamos uma
grandeza escalar1 VP chamada de potencial elétrico do ponto P , ou seja,

∀P ∈ campo elétrico 7→ VP
VP indica a quantidade de energia potencial elétrica que uma carga de teste pode
armazenar, por unidade de carga, ao ser posicionada em P . A unidade de potencial
elétrico no SI é o
joule por coulomb = volt = V.
Por exemplo, quando dizemos que VP = 200 V significa que qualquer carga de teste posicionada
em P terá um acréscimo de 200 J/C na sua energia potencial. Logo, se posicionarmos uma
carga de teste q em P , a energia potencial elétrica armazenada será dada por

U = q · VP

1
O potencial elétrico só precisa de um valor algébrico para ser completamente especificado.

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Retomando o exemplo anterior, se uma carga de teste de 3 C for posicionada no ponto P


com VP = 200 V, essa carga armazenará U = 3C × 200 CJ = 600 J de energia potencial
elétrica.

Exemplo 15 Os potenciais elétricos nos pontos A e B de um campo elétrico são VA = 5, 0


V e VB = −1, 0 V. Qual a energia potencial elétrica adquirida por uma partícula com carga
igual a 2, 0 µC colocada em A? Qual seria essa energia se a carga fosse posicionada em B?
Solução: Se a partícula for colocada em A temos

UA = q · VA = (2, 0 × 10−6 C) · (5, 0 V) → UA = 1, 0 × 10−5 J .

Se a partícula for colocada em B temos

UB = q · VB = (2, 0 × 10−6 C) · (−1, 0 V) → UB = −2, 0 × 10−6 J .

Os valores do potencial elétrico (e consequentemente da energia potencial elétrica) são


sempre definidos tomando algum ponto do campo elétrico como um ponto de referência,
ou seja, um ponto no qual o potencial elétrico (e, consequentemente, a energia potencial
elétrica) vale zero2 . A escolha de qual ponto será o ponto de referência é completamente
arbitrária.

Exemplo 16 Suponha que num certo ponto P de um campo elétrico a energia potencial
elétrica armazenada por uma carga de teste seja U = −2, 0 × 10−6 J. Qual o significado
desse resultado negativo de energia?

Solução: Isso significa que, em P , a carga de teste possui 2, 0 × 10−6 J a menos do que se estivesse no ponto
de referência (onde a energia potencial elétrica é zero). Assim, para ser levada até o ponto de referência, a
partícula precisa ganhar 2, 0 × 10−6 J.

Embora os valores dos potenciais elétricos dos pontos de um campo elétrico estejam
vinculados a uma escolha arbitrária do ponto de referência, a diferença de potencial
elétrico (ou d.d.p.) entre os pontos é sempre a mesma independente da escolha de referência.

Exemplo 17 A figura a seguir mostra três pontos, A, B e C, de um campo elétrico e os


seus valores do potencial elétrico tomando A como referência (VA = 0).
(a) Determine VA e VB tomando C como referência
(VC = 0)

(b) Determine VA e VC tomando B como referência


(VB = 0).

2
Tal procedimento é análogo ao que fazíamos no curso de Física I ao calcular a energia potencial
gravitacional (Ug = mgh) de um corpo. Adotávamos como referência (Ug = 0) o plano a partir do qual era
definida a altura h do corpo.

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Solução: Para resolver esse exercício devemos levar em consideração que, embora a mudança no ponto
de referência mude o valor do potencial elétrico em cada ponto, a diferença de potencial entre os pontos
permanece constante, ou seja, independente da escolha do ponto de referência, devemos sempre ter VB −VC =
80 V, VB − VA = 100 V e VC − VA = 20 V.

(a) Tomando VC = 0. Notamos que

VB − VC = 80 V ⇒ VB − 0 = 80 V ⇒ VB = 80 V

e
VC − VA = 20 V ⇒ 0 − VA = 20 V ⇒ VA = −20 V.

(b) Tomando VB = 0. Notamos que

VB − VC = 80 V ⇒ 0 − VC = 80 V ⇒ VC = −80 V

e
VB − VA = 100 V ⇒ 0 − VA = 100 V ⇒ VA = −100 V.

Tanto o potencial elétrico VP quanto o vetor campo elétrico E(P ~ ) são propriedades de
cada ponto P de um campo elétrico e essas grandezas estão conectadas por um gradiente3 ,
ou seja,
 
~ ) = −∇V ~ P ~ )=− ∂V P ~i + ∂V P ~j + ∂V P ~k
E(P ⇔ E(P
∂x ∂y ∂z

4.2 Trabalho da força elétrica


Considere dois pontos A e B de um campo elétrico
representado na figura ao lado pelas suas linhas
de campo e uma carga de teste q inicialmente
posicionada em A. Vamos considerar um transporte
(ou deslocamento) da carga de teste q desde o ponto
A até o ponto B. Em cada ponto, ao longo da
trajetória percorrida (na figura ao lado representamos
três exemplos de trajetória), o campo elétrico E ~ exerce
em q uma força elétrica F~ = q · E~ e essa força elétrica
(que é, em geral, variável já que o campo elétrico pode
variar ao longo dos pontos da trajetória) realiza trabalho
sobre a carga de teste q. Denotaremos esse trabalho por
e`
WA→B .
Pode-se demonstrar que, independente da trajetória descrita pela carga de teste q entre
e`
os pontos A e B, o valor do trabalho realizado pela força elétrica WA→B será sempre o
mesmo, ou seja,

3
O conceito de vetor gradiente será trabalhado na disciplina Cálculo Diferencial e Integral II.

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e`
WA→B independe da trajetória que liga A até B,
ou seja, qualquer que seja o caminho para ir de A
até B, o trabalho realizado pela força elétrica será
o mesmo.
Toda força que possui essa propriedade recebe o nome de força conservativa4 . Esse fato
nos mostra que trabalho realizado pela força elétrica só vai depender do ponto de de partida
(A) de q e do ponto de chegada (B), não importando a forma ou o comprimento da trajetória
realizada. Essa dependência é revelada pelo teorema a seguir:
e`
Teorema 1 O trabalho WA→B realizado pela força elétrica no transporte (deslocamento) de
uma carga de teste q desde um ponto A até um ponto B pertencente a um campo elétrico
é igual à diferença entre as energias potenciais elétricas armazenadas por q em A e B, ou
seja,
e`
WA→B = UA − UB .
Levando em conta ainda que UA = q · VA e UB = q · VB segue que

e` e`
WA→B = q · VA − q · VB ⇔ WA→B = q · (VA − VB )

onde VA − VB é a diferença de potencial elétrico (d.d.p.) entre os pontos A e B.


Exemplo 18 Num campo elétrico, uma carga puntiforme q = 5, 0 µC é levada de um
ponto A até um ponto B do campo elétrico. O trabalho da força elétrica atuante em q é de
−1, 0 × 10−4 J. Determine (a) a diferença de potencial elétrico entre os pontos A e B e (b)
o potencial elétrico de A, adotando-se B como ponto de referência (VB = 0).
Solução:
(a) Da expressão do trabalho da força elétrica:
e`
e` WA→B
WA→B = q · (VA − VB ) ⇒ VA − VB =
q
e`
Sendo WA→B = −1, 0 × 10−4 J e q = 5, 0 µC = 5, 0 × 10−6 C segue que
e`
WA→B −1, 0 × 10−4 J
VA − VB = = ∴ VA − VB = −20 V
q 5, 0 × 10−6 C

(b) Fazendo VB = 0 (potencial de referência), temos

VA − VB = −20 V → VA − 0 = −20 V ∴ VA = −20 V

4.2.1 Conservação da energia no movimento espontâneo de uma


carga de teste num campo elétrico
O Teorema 1 acima traz uma consequência muito importante para um tipo específico de
movimento de cargas de teste num campo elétrico chamado de movimento espontâneo.
4
Outros exemplos de forças conservativas são a força peso e a força de deformação elástica.

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Um movimento é dito espontâneo quando a carga de teste q se desloca entre dois pontos, A
e B, apenas sob a ação da força elétrica gerada pelo campo elétrico, ou seja, não há agente
externo aplicando força em q para promover ou dificultar o seu movimento.
De acordo com Teorema do Trabalho-Energia (ou Teorema da Energia Cinética), o
trabalho Wtotal realizado pela força resultante atuante em q é igual a sua variação de energia
cinética entre os pontos A e B, ou seja, Wtotal = ∆K = KB −KA . Se desprezarmos os efeitos
gravitacionais nesse movimento, a força elétrica é a única força atuante em q de modo que
e`
Wtotal = WA→B e, consequentemente,
e`
WA→B = KB − KA .
e`
Por outro lado, como WA→B = UA − UB identificamos a seguinte igualdade

K B − KA = U A − U B

que nos conduz à relação de conservação da energia num movimento espontâneo entre os
pontos A e B de um campo elétrico:

m · vA2 m · vB2
KA + UA = KB + UB ⇔ + q · VA = + q · VB
2 2

4.2.2 Relação entre a diferença de potencial elétrico e o campo


elétrico
Aqui vamos obter uma relação fundamental entre a diferença de potencial elétrico (d.d.p.)
entre dois pontos e o campo elétrico que preenche todo o espaço. Essa relação estabelece
uma conexão entre o “mundo das energias” representado pela diferença de potencial elétrico
(devemos lembrar que o potencial elétrico mede a quantidade de energia potencial elétrica,
por unidade de carga, que pode ser armazenada por uma caga de teste posicionada num
ponto) e o “mundo das forças” representado pelo campo elétrico (que é a entidade que produz
força elétrica na carga de teste). A grandeza física que faz essa “ponte” entre o “mundo das
energias” e o “mundo das forças” é o trabalho. Desse modo, torna-se conveniente obter uma
expressão mais geral que permita o cálculo de trabalho de forças variáveis (por exemplo, a
força elétrica).

Trabalho de uma força variável: o caso da força elétrica


No curso de Física Geral e Experimental I aprendemos a calcular o trabalho de uma força
F~ constante5 ao longo de uma trajetória retilínea. Para relembrar esse cálculo, considere o
deslocamento de um bloco desde um ponto A até um ponto B ao longo de uma superfície
plana horizontal sob a ação de uma força F~ constante, veja Figura 4.2. Se denotarmos por ∆~`
o vetor deslocamento que liga o ponto de partida A ao ponto de chegada B, então o trabalho
5
Uma força é dita ser constante ao longo de um deslocamento se sua intensidade, sua direção e seu sentido
não mudam, ou seja, suas características vetoriais permanecem inalteradas ao longo do deslocamento.

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W realizado pela força F~ ao longo desse deslocamento é dado por W = |F~ | · |∆~`| · cos θ com
θ sendo o ângulo definido entre F~ e ∆~`. Note que essa expressão representa um produto
escalar6 entre os vetores F~ e ∆~`, ou seja,

W = F~ · ∆~` (F~ constante)

Figura 4.2: Deslocamento de um bloco ao longo de uma superfície plana horizontal entre os
pontos A e B sob a ação de uma força F~ constante.

Agora queremos determinar uma expressão mais geral que permita calcular o trabalho
realizado por uma força variável 7 ao longo de uma trajetória qualquer. Para isto, vamos
considerar o deslocamento de uma carga de teste q submetida a ação de uma força elétrica
F~ ao longo de uma trajetória arbitrária entre os pontos A e B de um campo elétrico, veja
Figura 4.3(a).

Figura 4.3: (a) Deslocamento de uma carga de teste q ao longo de uma trajetória qualquer
ligando os pontos A e B. Em (b) é mostrado como as características vetoriais da força
elétrica atuante na carga de teste q vão variando ao longo da trajetória.

A Figura 4.3(b) mostra como a força elétrica atuante na carga de teste q vai variando
ao longo da trajetória. Isso ocorre porque, em geral, o campo elétrico vai mudando ao
longo dos pontos da trajetória. Dessa forma, para calcular o trabalho realizado pela força
elétrica não podemos utilizar, por questões óbvias, a expressão do trabalho de uma força
6
A Geometria Analítica nos ensina que A ~·B~ = |A|
~ · |B|
~ · cos θ com θ sendo o ângulo entre os vetores A~
~
e B.
7
Uma força é dita variável ao longo de um deslocamento se algum de seus atributos vetoriais (intensidade,
direção, sentido) se altera ao longo do deslocamento.

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constante já que a força elétrica é variável. Entretanto, podemos utilizá-la como ingrediente
na construção de uma expressão mais geral.
Vamos começar particionando a trajetória que liga A até B em uma infinidade de vetores
deslocamento infinitesimais que denotaremos por d~` como mostra a Figura 4.4. Como cada
d~` é um deslocamento retilíneo infinitesimal, a força elétrica F~ , nesse pequeno deslocamento é
praticamente constante, ou seja, num movimento infinitesimal a variação de F~ é desprezível.
Assim, num deslocamento infinitesimal, o trabalho dW realizado pela força elétrica pode ser
calculado pela expressão do trabalho de uma força constante, ou seja,

dW = F~ · d~`

Figura 4.4: Partição da trajetória que liga os pontos A e B em uma infinidade de vetores
deslocamentos infinitesimais d~`.

Se somarmos continuamente os trabalhos dW realizado pela força elétrica em cada


e`
deslocamento infinitesimal ao longo da trajetória completa obtemos o trabalho total WA→B .
Assim, utilizando a linguagem de intergração, temos
ˆ B ˆ B
e`
WA→B = dW ⇔ e`
WA→B = F~ · d~`
A A

Esse tipo de integral é chamado no Cálculo de integral de linha (ou integral de trajetória)
porque ela é realizada ao longo de uma trajetória que liga os pontos de partida e de chegada.
Note ainda que, se levarmos em conta que F~ = q · E, ~ segue que
ˆ B ˆ B ˆ B
e`
WA→B = ~ ~
q · E · d` = q · ~ ~ e`
E · d` ⇔ WA→B = q · E~ · d~`
A A A

A relação fundamental

O Teorema 1 diz qual é o resultado dessa integração. Como a força elétrica (e, consequentemente,
e`
o campo elétrico) é conservativa, o resultado do WA→B independe da trajetória que conecta
os pontos A e B dependendo apenas da diferença de potencial elétrico entre esses pontos,
e`
ou seja, WA→B = q · (VA − VB ). Assim,
ˆ B ˆ B
q · (VA − VB ) = q · ~ · d~`
E ∴ VA − VB = ~ · d~`
E
A A

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4.3 O potencial elétrico do campo de uma carga fonte


puntiforme: o potencial coulombiano
Queremos aqui determinar o potencial elétrico de um ponto pertencente ao campo elétrico
gerado pelo tipo mais simples de carga fonte que é a carga fonte puntiforme. Vale destacar
que o procedimento que iremos utilizar pode ser usado para qualquer tipo de carga fonte tais
como as macroscópicas. Discutiremos as propriedades desse potencial elétrico, definiremos
as superfícies equipotenciais da carga fonte puntiforme e finalizaremos discutindo a energia
potencial elétrica total armazenada num sistema de cargas puntiformes.

4.3.1 Potencial elétrico criado por uma carga puntiforme


Vamos considerar, sem perda de generalidade, uma carga fonte puntiforme Q positiva e dois
pontos, A e B, pertencentes ao campo elétrico gerado cujas distâncias de Q sejam rA e rB ,
respectivamente, veja Figura 4.5.

Figura 4.5: Determinação da diferença de potencial elétrico entre dois pontos A e B


pertencentes ao campo elétrico gerado por uma carga fonte puntiforme Q > 0.

Queremos calcular a diferença de potencial elétrico V´A − VB entre os pontos A e B e,


B ~
para isto, utilizaremos a relação fundamental VA − VB = A E · d~`. Como o campo elétrico
é conservativo e, portanto, o resultado dessa integral independe da forma da trajetória,
somos livres para escolher qualquer caminho que liga os pontos A e B como, por exemplo,
o ilustrado na Figura 4.5.
Para realizar a integração, começamos inicialmente desenvolvendo o produto escalar
~ · d~` no integrando. Para isto, vamos selecionar qualquer ponto contido na trajetória, por
E
exemplo, o ponto destacado na Figura 4.5 que está a uma distância r de Q. Representamos,
nesse ponto, o vetor campo elétrico E~ e um particular vetor deslocamento d~` que forma um
ângulo φ com E. ~ Dessa forma,

~ · d~` = |E|
E ~ · |d~`| · cos φ.

Por um lado, já sabemos que a intensidade do vetor campo elétrico num ponto que está a

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~ = k · |Q| k·Q
uma distância r de Q vale |E| = (aqui removemos o módulo por estarmos
r2 r2
assumindo Q > 0). Por outro, note que se projetarmos ortogonalmente o vetor d~` na
direção da distância radial r na qual está contido o vetor campo elétrico identificamos
uma componente radial d~r de deslocamento de modo que, no triângulo retângulo formado,
|d~r| dr
identificamos que cos φ = = , ou seja, |d~`| · cos φ = dr. Logo,
|d~`| |d~`|

E ~ · |d~`| · cos φ = k · Q dr
~ · d~` = |E| ⇒ ~ · d~` = k · Q dr.
E
r2 r2
Observe que o desenvolvimento do produto escalar revelou que a variável de integração é a
distância radial r. Isso significa que fazer uma integração ao longo de uma trajetória entre os
pontos A e B equivale, na variável r, a uma integral ao longo da trajetória desde a distância
radial rA (que localiza o ponto A em relação à Q) até a distância radial rB (que localiza o
ponto B em relação à Q). Introduzindo essa informação na integração,
ˆ B ˆ rB
~ · d~` = k·Q
VA − VB = E dr
A rA r2

identificamos uma integral definida cuja resolução é trivial já que a primitiva principal é de
tabela8 . Resolvendo a integral:
ˆ rB ˆ rB  rB  
k·Q 1 1 1 1 k·Q k·Q
2
dr = k · Q · 2
dr = k · Q · − =k·Q· − + = − ,
rA r rA r r rA rB rA rA rB

finalmente concluímos que


k·Q k·Q
VA − VB = −
rA rB
O resultado obtido nos permite estabelecer uma importante correspondência entre os 1o e
2o membros. Comparando ambos os membros, podemos estabelecer as igualdades
k·Q k·Q
VA = e VB = .
rA rB
Podemos, dessa forma, estabelecer um resultado geral:

Seja Q uma carga fonte puntiforme e P um ponto do campo elétrico localizado a


uma distância r de Q. O potencial elétrico em P é dado por

k·Q
VP =
r

´ 1 ´ −2 r−2+1 1
8
2
dr = r dr = + const. = −r−1 + const. = − + const.
r −2 + 1 r

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O potencial elétrico de um ponto vai depender do meio (representado pela constante eletrostática
k), do valor algébrico da carga fonte Q (importante destacar que aqui não entra o módulo
de Q e sim seu valor algébrico que carrega sinal) e da distância r.

4.3.2 Representação gráfica do potencial coulombiano como função


da distância: V = V (r)
Aqui vamos analisar a dependência do valor do potencial elétrico V com a distância r do
ponto à carga fonte Q. Para isto utilizaremos a representação gráfica da função V (r) = k·Q r
cujo gráfico é uma curva que recebe o nome de hipérbole equilátera, veja a Figura 4.6 onde a
curva é mostrada nos casos Q > 0 e Q < 0. Observe na Figura 4.6 que para Q > 0 notamos
que os valores de potencial elétrico são todos positivos, ou seja, V (r) > 0. Já para Q < 0 os
valores de potencial elétrico são todos negativos, ou seja, V (r) < 0.

Figura 4.6: Hipérbole equilátera que representa o gráfico de V (r) para os casos Q > 0 e
Q < 0.

• Comportamento de V (r) para pontos muito próximos de Q:


Quando consideramos pontos muito próximos de Q, que numa ideia de limite significa
r → 0+ , notamos pelo gráfico que o potencial elétrico diverge em ambos os casos
(Q > 0 e Q < 0). Enquanto que para Q > 0 a divergência ocorre para +∞ (ou seja,
os valores de V crescem ilimitadamente), para Q < 0 a divergência ocorre para −∞
(ou seja, os valores de V decrescem ilimitadamente). Assim:
  (
k·Q +∞ se Q > 0
lim+ V (r) = lim+ =
r→0 r→0 r −∞ se Q < 0

• Comportamento de V (r) para pontos muito afastados de Q:


Quando tomamos pontos muito afastados de Q, que numa ideia de limite significa
r → +∞, notamos pelo gráfico que o potencial elétrico tende a zero em ambos os
casos (Q > 0 e Q < 0). Assim:
 
k·Q
lim V (r) = lim = 0.
r→+∞ r→+∞ r

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Esse resultado revela um fato importante: o ponto de referência do potencial elétrico


coulombiano está no infinito, ou seja, num ponto muito afastado da carga fonte
Q onde suas influências elétricas sobre as cargas de teste se tornam desprezíveis.
Representamos esse ponto de referência como

V∞ = 0.

Claro que essa é uma ideia limite que diz que quanto mais longe estivermos da carga
fonte Q, o armazenamento energético tende à zero.

4.3.3 Diminuição do potencial elétrico no sentido de uma linha de


campo elétrico
Outra propriedade importante é o comportamento dos valores do potencial ao longo do
sentido de uma linha de campo elétrico.

Ao percorrer uma linha de campo elétrico, seguindo o seu sentido, os valores do


potencial elétrico ao longo se seus pontos decrescem.

Para verificar esse fato, vamos considerar, separadamente, duas cargas fontes puntiformes,
Q > 0 e Q < 0, e para cada um delas representamos apenas uma particular linha de campo
elétrico, veja Figura 4.7.

Figura 4.7: Diminuição do valor do potencial elétrico ao longo do sentido de uma linha de
campo elétrico.

• Caso Q > 0
Note na Figura 4.7 que se caminharmos no sentido da linha de campo, no caso da
carga fonte Q > 0, estamos nos afastando dela (r → +∞). O potencial elétrico tem
sempre valores positivos que divergem para +∞ quando estamos muito perto da carga

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fonte (V0 = +∞) e vai para zero quando estamos indo cada vez mais no sentido do
ponto de referência (V∞ = 0). Logo, ao seguir o sentido da linha, sentido de +∞ para
zero, temos diminuição do potencial elétrico.

• Caso Q < 0
Note na Figura 4.7 que se caminharmos no sentido da linha de campo, no caso da carga
fonte Q < 0, estamos no aproximando dela (r → 0+ ). O potencial elétrico tem sempre
valores negativos que divergem para −∞ quando estamos muito perto da carga fonte
(V0 = −∞) e vai para zero quando estamos indo cada vez mais no sentido do ponto
de referência (V∞ = 0). Logo, ao seguir o sentido da linha, sentido do zero para −∞,
temos diminuição do potencial elétrico.

Logo, percorrendo uma linha de campo, tanto para Q > 0 quanto para Q < 0, seguindo
seu sentido, sempre ocorrerá decrescimento dos valores do potencial elétrico ao longo de seus
pontos.

4.3.4 Potencial elétrico gerado por uma distribuição discreta de


cargas fontes puntiformes

Considere um sistema composto por N cargas fontes


puntiformes fixas no espaço: Q1 , Q2 , Q3 , · · · , QN .
Suponha um ponto P pertencente ao campo elétrico
gerado por essa distribuição discreta de cargas fontes,
veja figura ao lado.

O potencial elétrico VP é dado pela soma algébrica dos potenciais elétricos que as
cargas fontes original separadamente em P , ou seja,

N
X
VP = V1P + V2P + V3P + . . . + VN P ∴ VP = ViP
i=1

k · Qi
onde a parcela ViP = é o potencial elétrico criado por Qi no ponto P .
riP

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Exemplo 19 Duas cargas fontes puntiformes, Q1 =


2, 0 µC e Q2 = −3, 0 µC, geram um campo elétrico
em todo o espaço. Determine o trabalho realizado pela
força elétrica para transportar uma carga de teste q =
5, 0 µC desde o ponto A até o ponto B no campo
elétrico.

Solução: O trabalho realizado pela força elétrica no transporte de uma carga de teste q desde A até B é
e`
dado por WA→B = q · (VA − VB ). Temos q = 5, 0 µC mas precisamos calcular a d.d.p. VA − VB . Como temos
duas cargas fontes puntiformes, Q1 e Q2 , vimos que o potencial elétrico de um ponto pertencente ao campo
elétrico gerado por essas duas cargas é dado pela soma algébrica dos potenciais criados separadamente por
Q1 e Q2 no ponto. Então:
(9,0×109 Nm2 /C2 )·(2,0×10−6 C)
(
V1A = k·Q
r1A =
1
3,0×10−2 m = 6, 0 × 105 V
VA = V1A + V2A 9 2 2
(9,0×10 Nm /C )·(−3,0×10 C)−6 ⇒ VA = 6, 0 × 104 V
V2A = k·Q
r2A
2
= 5,0×10−2 m = −5, 4 × 10 5
V

(9,0×109 Nm2 /C2 )·(2,0×10−6 C)


(
k·Q1
V1B = = 5,0×10−2 m = 3, 6 × 105 V
VB = V1B + V2B r1B
k·Q2 9 2 2
(9,0×10 Nm /C )·(−3,0×10 C)−6 ⇒ VB = −5, 4 × 105 V
V2B = r2B = 3,0×10−2 m = −9, 0 × 105 V

onde as distâncias r2A e r1B , que possuem o mesmo valor, foram obtidas pelo teorema de Pitágoras uma
vez que são medidas das hipotenusas de dois triângulos retângulos idênticos de catetos com medidas iguais
3,0 cm e 4,0 cm. Logo, o trabalho da força elétrica é dado por

e`
WA→B = q · (VA − VB ) = (5, 0 × 10−6 C) · [6, 0 × 104 V − (−5, 4 × 105 V)] ∴ e`
WA→B = 3, 0 J

4.3.5 Superfícies equipotenciais do campo elétrico de uma carga


fonte puntiforme
O conjunto de todos os pontos do campo elétrico
gerado por uma carga fonte puntiforme que estão
a uma mesma distância r da carga puntiforme
Q possuem o mesmo valor do potencial elétrico
V (r) = k·Qr
. Esse conjunto de pontos forma no
espaço tridimensional uma particular superfície de
nível da função potencial elétrico V (r) e recebe o
nome de superfície equipotencial. Como essa
superfície corresponde a um conjunto de pontos
equidistantes da carga fonte Q então a superfície
equipotencial é uma superfície esférica de centro na
carga fonte Q e raio igual à distância r dos pontos
a carga fonte, veja figura ao lado.
Para cada valor possível de potencial elétrico (e, portanto, para cada valor possível
de distância r) temos uma superfície equipotencial associada, ou seja, uma carga fonte

68
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

puntiforme tem infinitas superfícies esféricas equipotenciais (uma para cada possível valor de
V ) concêntricas à carga fonte Q. Além disso, as linhas de campo elétrico são perpendiculares
9
às superfícies equipotenciais como pode ser observado na figura acima.

Podemos verificar que em qualquer deslocamento de uma carga de teste q entre dois
pontos pertencentes a uma mesma superfície equipotencial a força elétrica não realiza trabalho,
ou seja, se q for transportado de um ponto A até um ponto B, ambos pertencentes a uma
mesma equipotencial, segue
e`
WA→B = q · (VA − VB ) = 0 pois VA = VB .

Assim, a força elétrica só realizará trabalho no transporte de uma carga de teste q entre dois
pontos pertencentes a equipotenciais diferentes.

Exemplo 20 A figura abaixo mostra três superfícies


equipotenciais de uma carga fonte Q. Qual o trabalho
realizado pela força elétrica no transporte de uma
carga de teste q = 1, 0 µC do ponto A até o ponto
C através da trajetória ABC?

Solução: No desenho temos três esferas equipotenciais: uma de 6,0 V, uma de 3,0 V e uma de 1,0 V.
Queremos calcular o trabalho realizado pela força elétrica no transporte de uma carga de teste q = 1, 0 µC
desde A até C através da trajetória ABC. Veja que essa trajetória segue um caminho AB contido na esfera
equipotencial de 3,0 V e depois salta para o ponto C contido na equipotencial de 1,0 V. Como a força elétrica
é conservativa, o trabalho realizado pela força elétrica não depende da forma da trajetória e sim dos pontos
de partida (A) e de chegada (C). Levando em conta que VA = 3, 0 V e VC = 1, 0 V então:

e`
WA→C = q · (VA − VC ) = (1, 0 × 10−6 C) · (3, 0V − 1, 0V) ∴ e`
WA→C = 2, 0 × 10−6 J

9
Tal fato pode ser facilmente verificado pelas propriedades do vetor gradiente estudados na disciplina de
Cálculo Diferencial e Integral II. Se V (r) = constante ao longo de uma equipotencial, então em qualquer
ponto da superfície a taxa de variação de V (r) em qualquer direção é nula, ou seja, para todo ponto da
equipotencial temos ∂V
∂~u = 0 com ~u sendo um versor qualquer tangente à equipotencial no ponto. Por outro
∂V
lado, levando em conta que ∂~u = ∇V~ · ~u e que E~ = −∇V~ segue

∂V ~ · ~u = 0 ~ · ~u = 0 ~ · ~u = 0 ~ · ~u = 0 ~ ⊥ ~u.
= ∇V ⇒ ∇V ⇒ −E ⇒ E ⇒ E
∂~u
~ é perpendicular à equipotencial.
Logo, E

69
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

4.3.6 Energia potencial elétrica total armazenada em um sistema


de cargas puntiformes
Suponha que estejamos interessados em montar um sistema eletrostático no vácuo constituído
por uma coleção de N partículas eletrizadas. Qual deve ser a quantidade mínima de energia
necessária para montar tal sistema? Para responder essa questão precisamos aprender a
determinar qual a energia potencial elétrica total contida em um conjunto discreto composto
por um número N de cargas puntiformes. Começaremos com o caso mais simples:
• Caso simples: N = 2 cargas puntiformes
Suponha que estamos querendo montar um sistema eletrostático composto por duas
cargas puntiformes Q1 e Q2 separadas entre si por uma distância r constante. Primeiro
fixamos a carga puntiforme Q1 num certo ponto do vácuo, como mostra a Figura 4.8(a).
Note que num ponto localizado a uma distância r de Q1 , o potencial elétrico vale V1 = k·Q
r
1
.
Em seguida, fixamos a carga puntiforme Q2 exatamente nesse ponto que dista r de Q1 como
mostra a Figura 4.8(b). Sabemos que a energia potencial elétrica armazenada por Q2 , nesse
ponto, é dada por
k · Q1 k · Q1 · Q2
U = Q2 · V1 ⇒ U = Q2 · ⇒ U= .
r r

Figura 4.8: Montagem de um sistema eletrostático com N = 2 cargas puntiformes, Q1 e Q2 ,


separadas entre si por uma distância r constante. Começamos fixando Q1 e em seguida Q2
a uma distância r de Q1 .

É possível mostrar que essa energia também pertence a carga puntiforme Q1 . Para isto,
vamos repetir a montagem só que primeiramente fixando a carga puntiforme Q2 , veja Figura
4.9(a). Veja que num ponto localizado a uma distância r de Q2 (onde tínhamos fixado a
carga puntiforme Q1 na primeira montagem) o potencial elétrico vale V2 = k·Q r
2
. Fixamos,
agora, a carga puntiforme Q1 exatamente nesse ponto que dista r de Q2 , veja Figura 4.9(b).
A energia potencial elétrica armazenada por Q1 , nesse ponto, é dada por
k · Q2 k · Q1 · Q2
U = Q1 · V2 ⇒ U = Q1 · ⇒ U= ,
r r
70
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

ou seja, é a mesma quantidade de energia armazenada por Q2 .

Figura 4.9: Montagem de um sistema eletrostático com N = 2 cargas puntiformes, Q1 e Q2 ,


separadas entre si por uma distância r constante. Aqui começamos fixando Q2 e em seguida
Q1 a uma distância r de Q2 .

Logo, concluímos que a quantidade de energia potencial elétrica obtida corresponde a


energia potencial elétrica que pertence ao par de cargas puntiformes interagentes Q1 e
Q2 . Podemos então simbolizar essa energia por U12 onde o índice 12 reforça a ideia que essa
energia potencial elétrica pertence ao par de cargas puntiformes Q1 e Q2 , ou seja,

k · Q1 · Q2
U12 =
r12

com r12 sendo a distância de separação entre Q1 e Q2 .

• Caso geral: N > 2 cargas puntiformes

No caso simples tratado anteriormente aprendemos a determinar a energia potencial elétrica


armazenada num par de cargas puntiformes. Esse resultado pode ser adequadamente utilizado
para a determinação da energia potencial elétrica total armazenada num sistema com N > 2
cargas puntiformes.

A energia potencial elétrica total Utotal armazenada num sistema composto por N >
2 cargas puntiformes é a soma das energia potenciais elétricas referentes a todas as
interações de pares de cargas puntiformes que compõem o sistema.

Na Figura 4.10 temos exemplos de sistemas compostos por N > 2 cargas puntiformes.
Na Figura 4.10(a) temos um sistema com N = 3 cargas puntiformes. Por um processo
combinatório, é possível verificar que a quantidade de maneiras distintas que podemos
escolher duas cargas (que formam um par) nesse sistema de 3 cargas é igual a 3, ou seja,
temos 3 pares possíveis de cargas que vão contribuir para a energia potencial elétrica total
do sistema: (Q1 , Q2 ), (Q2 , Q3 ) e (Q1 , Q3 ) e perceba que as distâncias de separação entre as
cargas de cada par, r12 , r23 e r13 , formam, nesse sistema, os lados de um triângulo. Logo, a

71
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

energia potencial elétrica total armazenada nesse sistema é a soma das energias potenciais
elétricas armazenadas nesses pares de carga, ou seja,

Utotal = U12 + U23 + U13 (N = 3 cargas)

k · Q1 · Q2 k · Q2 · Q3 k · Q1 · Q3
⇒ Utotal = + +
r12 r23 r13

Figura 4.10: Exemplos de sistemas compostos por N > 2 cargas puntiformes. Em (a) temos
N = 3 cargas puntiformes e em (b) temos N = 4 cargas puntiformes.

Outro exemplo, que aparece na Figura 4.10(b), é um sistema com N = 4 cargas puntiformes.
Note que, por um processo combinatório, a quantidade de maneiras distintas que podemos
escolher duas cargas (que formam um par) nesse sistema de 4 cargas é igual a 6, ou seja,
temos 6 pares possíveis de cargas que vão contribuir para a energia potencial elétrica total
do sistema. Temos 4 pares cujas distâncias de separação formam os lados do quadrilátero
(Q1 , Q2 ), (Q2 , Q3 ), (Q3 , Q4 ) e (Q1 , Q4 ) e 2 pares cujas distâncias de separação formam as
diagonais: (Q1 , Q3 ) e (Q2 , Q4 ). Logo, a energia potencial elétrica total armazenada nesse
sistema é a soma das energias potenciais elétricas armazenadas nesses pares de carga, ou
seja,
Utotal = U12 + U23 + U34 + U14 + U13 + U24 (N = 4 cargas)
k · Q1 · Q2 k · Q2 · Q3 k · Q3 · Q4 k · Q1 · Q4 k · Q1 · Q3 k · Q2 · Q4
⇒ Utotal = + + + + +
r12 r23 r34 r14 r13 r24

Assim, para um sistema com um número N ≥ 2 cargas puntiformes, o número de pares


de cargas puntiformes (npares ) que contribuem para a energia potencial elétrica total do
sistema é a quantidade de formas distintas que podemos escolher 2 cargas em um sistema
constituído por N cargas, ou seja, é uma combinação simples de N elementos tomados 2 a 2
dado pelo numero binomial de ordem N e classe 2,
 
N N N!
npares = C2 = = ,
2 (N − 2)! · 2!

72
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

onde o fatorial de um número é o produto de todos os inteiros positivos menores ou iguais


a esse número, ou seja, a! = a · (a − 1) · (a − 2) · . . . · 3 · 2 · 1. Por exemplo, para um
sistema de N = 5 cargas puntiformes, o número de pares que contribuem para a energia
potencial elétrica total do sistema é a combinação simples de 5 cargas tomadas 2 a 2, ou seja,
5!
C25 = 3!·2! = 10, ou seja, 10 pares de cargas10 contribuem para a energia potencial elétrica
total armazenada num sistema com N = 5 cargas puntiformes.

Exemplo 21 Determine a energia potencial elétrica total de um arranjo eletrostático linear


composto por um elétron e dois prótons fixados ao longo do eixo Ox nas posições indicadas
na figura a seguir. Dado: a = 1, 0 × 10−3 m.

Solução: Como o sistema possui N = 3 cargas puntiformes, a quantidade de pares de cargas que contribuem
para a energia potencial elétrica total é uma combinação simples de 3 cargas tomadas 2 a 2, ou seja, 3 pares
de cargas. Observando o esquema do arranjo identificamos os pares: (q1 , q2 ), (q2 , q3 ) e (q1 , q3 ). Logo, a
energia potencial elétrica total do sistema é a soma das energias potenciais elétricas desses três pares,

Utotal = U12 + U23 + U13 .

Calculando essas três parcelas:

k · q1 · q2 k · (−e) · (+e) k · e2
U12 = = ⇒ U12 = −
r12 a a

k · q2 · q3 k · (+e) · (+e) k · e2
U23 = = ⇒ U23 =
r23 a a
k · q1 · q3 k · (−e) · (+e) k · e2
U13 = = ⇒ U13 = −
r13 2a 2a
Então:
k · e2 k · e2 k · e2 k · e2 (9, 0 × 109 Nm2 /C2 ) · (1, 6 × 10−19 C)2
Utotal = − + − ⇒ Utotal = − ⇒ Utotal = −
a a 2a 2a 2 · (1, 0 × 10−3 m)

Logo:

Utotal = −1, 2 × 10−25 J

10
O cálculo dessa combinação pode ser feito diretamente na calculadora usando a função do botão nCr.
Por exemplo, se eu quero calcular a combinação de 5 cargas tomadas 2 a 2 basta ir na calculadora e fazer
a seguinte operação: aperte sequencialmente o botão 5, o botão nCr, o botão 2 e o botão = obtendo o
resultado 10.

73
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

4.4 Diferença de potencial num campo elétrico uniforme


4.4.1 O campo elétrico uniforme (C.E.U.)
Considere uma placa plana infinita (que fisicamente quer dizer ilimitada), uniformemente
eletrizada com uma densidade superficial de cargas σ (que sem perda de generalidade vamos
assumir positiva), veja Figura 4.11(a). Essa densidade superficial informa como as cargas
estão distribuídas ao longo da área da placa e como temos uma distribuição uniforme então
essa densidade é constante.

Figura 4.11: Campo elétrico gerado por uma placa plana infinita uniformemente eletrizada
com uma densidade superficial de cargas σ > 0.

Essa imensa placa divide o espaço tridimensional em dois semi-espaços. Por exemplo,
para uma placa plana infinita horizontal, veja Figura 4.11(b), temos o semi-espaço acima da
placa e o semi-espaço abaixo da placa. Pode-se mostrar que essa placa plana infinita gera,
em todos os pontos de cada semi-espaço, um campo elétrico com as seguintes características:

• Direção: perpendicular à placa;

• Sentido: “aponta contra” uma placa positivamente carregada e “aponta para” uma
placa negativamente carregada.

• Intensidade (ou módulo):


~ = |σ|
|E|
2 · 0
com 0 sendo a chamada permissividade do vácuo que é um parâmetro do vácuo que,
em unidades SI, vale 0 = 8, 85 × 10−12 C2 /N · m2 e está contida dentro da constante
1
de Coulomb k = 4π 0
como vimos na Lei de Coulomb. Observe que a intensidade
do campo elétrico possui um valor constante ao longo de todos os pontos do campo
elétrico, ou seja, todos os vetores campo elétrico possuem o mesmo tamanho.

Se focarmos nossa atenção em um dos semi-espaços, por exemplo, o definido acima


da placa plana infinita, veja Figura 4.11(b), notamos que nesse semi-espaço os vetores
~ possuem a mesma direção (todos são perpendiculares à placa), o mesmo
campo elétrico E

74
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

sentido (todos apontam para cima) e a mesma intensidade (todos os vetores possuem o
mesmo tamanho). Tais características definem um tipo particular de campo que chamamos
de campo elétrico uniforme (ou C.E.U.). Dessa forma, num campo elétrico uniforme
todos os vetores campo elétrico são vetores constantes, ou seja, suas características vetoriais
(direção, sentido e intensidade) permanecem inalteradas ao longo dos pontos do campo
elétrico. Note que o campo elétrico definido no semi-espaço abaixo da placa plana infinita
também pode ser classificado como um campo elétrico uniforme pois todos os vetores E ~
possuem a mesma direção (perpendicular à placa), mesmo sentido (todos apontam para
baixo) e mesma intensidade (vetores do mesmo tamanho). Por outro lado, se visualizarmos
o campo elétrico gerado pela placa infinita agora considerando todo o espaço (ou seja,
considerando simultaneamente os dois semi-espaços), não podemos classificá-lo como um
~ tenham a mesma direção (perpendicular
campo elétrico uniforme pois, embora todos os vetores E
à placa) e a mesma intensidade (vetores do mesmo tamanho), ocorre uma quebra de uniformidade
no sentido desses vetores (acima da placa todos apontam para cima e abaixo da placa todos
apontam para baixo).
Podemos então estabelecer uma definição de um campo elétrico uniforme:

Um campo elétrico é dito ser um campo elétrico uniforme (C.E.U.) se o vetor campo elétrico
em cada ponto for um vetor constante, ou seja,

a mesma direção

~ ) possui o mesmo sentido
E(P para todo ponto P pertencente ao campo elétrico.

e mesma intensidade

Nos pontos de um campo elétrico uniforme


os vetores campo elétrico possuem a mesma
direção, o mesmo sentido e a mesma intensidade,
veja figura ao lado. Como consequência, as
linhas de campo elétrico são retas orientadas que
possuem as seguintes características: são paralelas
(caracterizando que todos os vetores possuem a
mesma direção), possuem o mesmo sentido (já
que todos os vetores apontam no mesmo sentido)
e são igualmente espaçadas (a intensidade do
campo é a mesma em qualquer região e, portanto,
não podemos encontrar linhas de campo mais
concentradas numa região do que em outra). Na
figura ao lado temos a representação das linhas de
um campo elétrico uniforme.

75
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

4.4.2 Produzindo um campo elétrico uniforme


Embora não exista, na prática, uma placa plana infinita, o campo elétrico gerado por uma
placa plana finita (limitada) e uniformemente eletrizada é praticamente uniforme nos pontos
de sua região central. Na Figura 4.12(a) é mostrada a determinação experimental das linhas
de campo elétrico geradas por uma placa plana finita eletrizada. No experimento, uma placa
plana finita eletrizada encontra-se posicionada perpendicularmente ao plano de uma cuba
que contém pequenas fibras de tecido suspensas em óleo. Essas fibras quando submetidas
ao campo elétrico gerado pela placa finita mostram a forma das linhas representativas desse
campo elétrico. Uma representação gráfica de algumas dessas linhas de campo é mostrada
na Figura 4.12(b) para o caso de uma placa finita positivamente carregada. Observe que nos
pontos situados na região central, as linhas de campo possuem o comportamento aproximado
das linhas de um campo elétrico uniforme. Junto às bordas e nas regiões mais distantes, o
campo sofre variações que não podem ser desprezadas. Essas variações recebem o nome de
efeitos de borda.

Figura 4.12: Campo elétrico gerado por uma placa plana finita (limitada) uniformemente
eletrizada. Em (a) temos a verificação experimental das linhas de campo geradas pela placa
finita e em (b) temos uma representação gráfica de algumas linhas de campo.

Uma das maneiras mais comuns de se conseguir


um campo elétrico uniforme numa região do
espaço é utilizar duas placas condutoras planas
e iguais, paralelas entre si e eletrizadas com
cargas de mesma magnitude e sinais contrários,
veja figura ao lado. Esse dispositivo é chamado
de um capacitor de placas planas paralelas
que estudaremos com mais detalhes no próximo
capítulo. Numa placa as cargas positivas se
distribuem uniformemente ao longo de sua área
com uma densidade superficial +σ e na outra placa
as cargas negativas se distribuem uniformemente
ao longo de sua área com uma densidade superficial
−σ.

76
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

Vamos descrever o campo elétrico gerado pelo capacitor de placas planas paralelas. Para
isto, consideraremos uma situação idealizada na qual as placas utilizadas são infinitas, veja
Figura 4.13(a). Observe que ficam determinadas três regiões distintas: uma entre as placas
e duas externas a elas. Consideremos três pontos arbitrários, cada um pertencente a uma
região definida pelo sistema montado. Em cada um desses pontos, queremos obter o vetor
campo elétrico resultante produzido pelas duas placas infinitas.

Figura 4.13: Cálculo do campo elétrico gerado pelo capacitor de placas planas paralelas.

Começamos desenhando, em cada ponto, os vetores campo elétrico E ~+ e E~ − gerados


pelas placas positiva e negativa, respectivamente, como mostrado na Figura 4.13(a). Esses
desenhos foram feitos levando em conta que o vetor campo elétrico possui direção perpendicular
à placa, sentido apontando “contra” a placa positiva e “para” a placa negativa e intensidade
constante
~ − | = |σ| .
~ + | = |E
|E
2 · 0
Como as intensidades dos campos gerados pelas placas positiva e negativa são iguais note
que, tanto no ponto da esquerda quanto no ponto da direita o campo elétrico resultante é
nulo pois numa soma vetorial, vetores opostos de mesma intensidade se cancelam. Como
isso é verdade para qualquer ponto nessas duas regiões, então concluímos que não existe
campo elétrico na região externa ao sistema, veja Figura 4.13(b). Por outro lado, no ponto
do meio, os vetores campo elétrico possuem o mesmo sentido, logo não se cancelam, eles se
combinam de modo que a intensidade do campo elétrico resultante é a soma das intensidades

77
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

dos campos elétricos gerados pelas placas positiva e negativa,

~ = |E
|E| ~ − | = |σ| + |σ|
~ + | + |E ⇒ ~ =
|E|
|σ|
,
2 · 0 2 · 0 0

ou seja, para todo ponto na região intermediária o campo resultante é um vetor de direção
perpendicular às placas, sentido da placa positiva para a placa negativa e intensidade
|σ|
constante igual a . Logo, concluímos que na região entre as placas planas infinitas temos
0
um campo elétrico uniforme, veja Figura 4.13(b).
Claro que, na prática, não é possível montar um capacitor utilizando placas planas
infinitas. Entretanto, em um capacitor montado com placas planas finitas como esquematizado
na Figura 4.14, notamos que nos pontos situados na sua região central o campo elétrico é
aproximadamente uniforme. Junto às bordas já observamos os efeitos de borda onde o campo
sofre variações que não podem ser desprezadas desviando completamente do comportamento
uniforme (quebra da uniformidade).

Figura 4.14: Efeitos de borda num capacitor de placas planas paralelas finitas.

Na Figura 4.15 temos a realização experimental de um capacitor de placas planas paralelas


finitas. Na Figura 4.15(a), as placas ainda não foram eletrizadas. Na Figura 4.15(b),
as placas estão eletrizadas com cargas de mesma magnitude e sinais opostos. Em (b),
podemos observar na região intermediária (região entre as placas) a formação das linhas de
um campo elétrico praticamente uniforme e nas proximidades das bordas temos os desvios
da uniformidade (efeitos de borda). Nas regiões externas praticamente não há linhas de
campo porque o campo elétrico nessas regiões é praticamente nulo.

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Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

Figura 4.15: Determinação experimental das linhas de campo elétrico geradas por um
capacitor de placas paralelas finitas. Em (a) as placas estão ainda descarregadas. Em
(b) as placas estão uniformemente eletrizadas com cargas de mesma magnitude mas sinais
contrários.

4.4.3 Cálculo da diferença de potencial entre dois pontos de um


campo elétrico uniforme
Considere dois pontos, A e B, pertencentes ao campo elétrico uniforme gerado entre as
placas de um capacitor, veja Figura 4.16.

Figura 4.16: Determinação da diferença de potencial elétrico entre dois pontos A e B


pertencente a um campo elétrico uniforme.

Queremos calcular a diferença de potencial elétrico V´ AB − VB entre os pontos A e B e,


para isto, utilizaremos a relação fundamental VA − VB = A E ~ · d~`. Como o campo elétrico é
conservativo e, portanto o resultado dessa integral independe da forma da trajetória, somos
livres para escolher qualquer caminho que liga os pontos A e B. Vamos escolher aqui a
trajetória mais simples possível, que é uma reta de comprimento LAB ligando os pontos A
e B, como mostrada na Figura 4.16.

79
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

Para realizar a integração, desenvolvemos inicialmente o produto escalar E ~ · d~` para


identificar a variável de integração do problema. Para isto, tomamos um ponto qualquer
contido nessa trajetória retilínea, por exemplo, o ponto indicado na Figura 4.16 que é a
intersecção entre uma linha de campo elétrico e a trajetória retilínea. Representamos, nesse
ponto, o vetor campo elétrico constante E ~ que tem direção e sentido da linha de campo e
~
um particular vetor deslocamento d` que forma um ângulo φ com E. ~ Dessa forma,

~ · d~` = |E|
E ~ · |d~`| · cos φ.

O fato de estarmos lidando com um campo elétrico uniforme e o fato de termos escolhido
uma trajetória retilínea facilitará drasticamente nossos cálculos. Observe que independente
do ponto considerado ao longo da trajetória retilínea, o vetor E ~ e o ângulo φ não mudam
~ 11
e, como consequência, |E| e cos φ são constantes ao longo da trajetória retilínea que liga
os pontos A e B. Por outro lado, o vetor deslocamento infinitesimal d~` está vinculado
a trajetória e não pode ser tratado com constante. Introduzindo essas informações na
integração:
ˆ B ˆ B ˆ B
VA − VB = ~ ~
E · d` = ~ ~ ~
|E| · |d`| · cos φ = |E| · cos φ · |d~`|
A A A
ˆ B
O que significa a integral |d~`|? Para a trajetória retilínea utilizada, o vetor d~` representa
A
um trecho infinitesimal dessa trajetória. Assim, essa integração está somando continuamente
os tamanhos dos trechos infinitesimais que compõem a trajetória completa, ou seja, essa
´ B no comprimento total LAB da trajetória retilínea que liga os pontos A e B.
soma resulta
Assim, A |d~`| = LAB de modo que

~ · cos φ · LAB .
VA − VB = |E|

Esse é o resultado da diferença de potencial elétrico entre os pontos A e B.


Entretanto, a expressão obtida pode ser reescrita numa forma mais conveniente da qual
poderemos extrair informações físicas relevantes sobre as propriedade do campo elétrico
uniforme. Vamos começar dando um significado geométrico mais conveniente para o produto
cos φ · LAB . Para isto, introduziremos duas superfícies planas (não materiais), cada uma
contendo um dos pontos (A e B), paralelas entre si e que cortam perpendicularmente as
linhas de campo elétrico, veja Figura 4.17. Denotaremos por d a distância de separação
entres esses planos. Na visão lateral do sistema, mostrada na Figura 4.17(a), os planos são
representados pelas linhas tracejadas roxas. Na Figura 4.17(b) temos uma visão ligeiramente
afastada da visão lateral onde ficam evidentes os planos matemáticos.

11
A constância do campo elétrico vem do fato do campo ser uniforme e a constância do ângulo vem do
fato da trajetória escolhida ser retilínea.

80
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

Figura 4.17: Os pontos A e B pertencem a dois planos matemáticos paralelos, paralelos


entre si, que cortam perpendicularmente as linhas de campo. A distância de separação entre
os planos é d.

Observe na Figura 4.17(a) que podemos extrair um triângulo retângulo no qual LAB é a
medida da sua hipotenusa e d é a medida do cateto adjacente ao ângulo φ. Segue que
d
cos φ = ⇒ d = cos φ · LAB
LAB
de modo que, finalmente, obtemos

~ ·d
VA − VB = |E|

com d sendo a distância dos dois planos paralelos onde estão localizados os pontos A e B.
A expressão obtida nos permite identificar uma unidade oficial importante de intensidade
~ =
de campo elétrico no SI. Veja que, se isolando essa intensidade na expressão obtemos |E|
VA −VB
d
indicando podemos medir a intensidade de campo elétrico em volt por metro (V/m),

~ = volt por metro = V


[|E|]
m
Vamos extrair algumas informações físicas relevantes do resultado obtido para a diferença
de potencial entre dois pontos de um campo elétrico uniforme.

4.4.4 Planos equipotenciais do campo elétrico uniforme


Aqui vamos estabelecer a interpretação física de um plano perpendicular às linhas de campo
como aqueles dois que introduzimos na demonstração anterior. Essa interpretação será
possível a partir da análise das consequências geométrica e eletrostática de fazer a distância
d zerar.

81
Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

• Consequência geométrica:
Fixe o plano que contém o ponto A. Diminuir a distância d significa fazer o plano que
contém o ponto B se aproximar do plano que contém o ponto A, veja 4.18(a). Quando
a distância zerar (d = 0), A e B estarão localizados no mesmo plano perpendicular,
veja Figura 4.18(b). Essa é a consequência geométrica de fazer d = 0.

Figura 4.18: Fixado o plano que contém A, a diminuição de d significa que o plano que
contém B está se aproximando do plano que contém A. No momento em que d = 0, os
pontos A e B estarão contidos no mesmo plano perpendicular às linhas de campo elétrico.

• Consequência eletrostática:
Por outro lado, fazer d = 0 na expressão da diferença de potencial VA − VB implica

VA − VB = 0 ⇒ VA = VB ,

ou seja, a consequência eletrostática de zerar a distancia d é que o potencial elétrico


de A será igual ao potencial elétrico de B.
As consequências geométrica e eletrostática de fazer d = 0 nos levam então a seguinte
conclusão:

Todos os pontos pertencentes ao mesmo plano perpendicular às linhas de campo elétrico de um


campo uniforme possuem o mesmo valor de potencial elétrico. Logo, um plano perpendicular
corresponde a um plano equipotencial.

Dessa forma, as equipotenciais de um campo elétrico uniforme são planos paralelos,


perpendiculares às linhas de campo e d representa a distância entre planos equipotenciais.
Observe que as placas planas que geram o campo elétrico também são superfícies planas
equipotenciais.

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Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita

4.4.5 Diminuição do potencial elétrico no sentido de uma linha de


campo elétrico
Se percorrermos o campo elétrico no sentido de uma linha de campo, verificaremos que os
valores o potencial elétrico decrescem ao longo dos pontos da linha. Esse comportamento é
o mesmo que verificamos para o caso da carga fonte puntiforme. Essa propriedade é bem
geral e ocorre para todo tipo de campo elétrico.
A demonstração dessa propriedade para um campo elétrico uniforme é trivial. Vamos
analisar a expressão VA − VB = |E| ~ · d. Note que a intensidade do campo elétrico (por se
tratar do módulo de um vetor) é sempre positiva (|E| ~ > 0). A distância d de separação
entre os planos equipotenciais (pensando em planos distintos) também é positiva (d > 0).
Como o produto de duas grandezas positivas também é positiva então segue que

VA − VB > 0 ⇒ VA > VB ,

ou seja, no percurso ao longo do sentido da linha de campo o potencial elétrico vai diminuindo.
Por exemplo, quando dizemos que um campo elétrico uniforme tem intensidade de 200 V/m
significa que ao percorrer uma linha de campo, no sentido dela, o potencial elétrico diminui
200 V a cada metro percorrido.

O sentido das linhas de campo elétrico é sempre do potencial maior para o potencial menor.

A Figura 4.19 mostra três planos equipotenciais de um campo elétrico uniforme ilustrando
a diminuição do potencial elétrico ao longo do sentido das linhas de campo. VA que é o
potencial associado ao primeiro plano equipotencial é maior do que VB que é o potencial
associado ao segundo plano equipotencial que, por sua vez, é maior que VC que é o potencial
associado ao terceiro plano equipotencial. Levando em conta todo o dispositivo, o maior
potencial elétrico está na placa plana positivamente eletrizada e o menor potencial elétrico
está na placa plana negativamente eletrizada.

Figura 4.19: Os valores do potencial elétrico vão decrescendo no sentido das linhas de campo.

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Capítulo 4 – O Potencial Elétrico e a Energia Potencial Elétrica Prof. Dr. Eduardo T. Matsushita
Exemplo 22 Na figura ao lado,
representamos as linhas de um campo
elétrico uniforme. Sejam VA = 80 V e
VB = 40 V os potenciais elétricos dos pontos
A e B, respectivamente. As distâncias AC
e AB valem, respectivamente, 0,60 m e
1,0 m. Determine (a) o potencial elétrico
do ponto C e (b) a intensidade do campo
elétrico uniforme.
Solução:

(a) Notamos pelo desenho, que mostra a visão lateral das linhas de campo elétrico, que os pontos A e C
estão contidos numa mesma reta perpendicular às linhas de campo. Essa reta é a visão lateral de um
plano equipotencial. Logo A e C são pontos que pertencem ao mesmo plano equipotencial de modo que

VC = VA ⇒ VC = 80V

~ do campo elétrico uniforme. Sabemos que essa informação está


(b) Queremos encontrar a intensidade |E|
contida na expressão da d.d.p. entre dois pontos pertencentes a equipotenciais distintas. Então vamos
considerar os pontos C e B. Como VC > VB então

~ ·d ~ = VC − VB
VC − VB = |E| ⇒ |E|
d
com d sendo a distância de separação entre as equipotenciais nas quais estão contidas os pontos C e B.
Note que d corresponde à medida do cateto de um triângulo retângulo cuja hipotenusa é o segmento AB
que mede 1,0 m e o outro cateto é o segmento AC que mede 0,60 m. Aplicando o teorema de Pitágoras,
facilmente encontramos que d = 0, 80 m. Logo,

~ = VC − VB 80V − 40V ~ = 50V/m


|E| = ⇒ |E|
d 0, 80m

Exemplo 23 Um próton é libertado do


repouso, num campo elétrico uniforme de
8, 0 × 104 V/m, paralelo ao eixo Ox positivo
como mostra a figura ao lado. O próton
efetua um deslocamento de 0,50 m na
direção do vetor campo elétrico. (a) Achar
a d.d.p. entre os pontos A e B. (b)
Achar a velocidade do próton, depois de ter
percorrido, a partir do repouso, a distância
de 0,50 m. Dados do próton: q = +e e
m = 1, 67 × 10−27 kg.

Solução:

(a) Uma vez que nós conhecemos a intensidade do campo elétrico uniforme, |E|~ = 8, 0 × 104 V/m, e a
distância entre os pontos A e B (que corresponde a distância das equipotenciais associadas a esses

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pontos), d = 0, 50 m, então

~ · d = (8, 0 × 104 V/m)(0, 50 m)


VA − VB = |E| ⇒ VA − VB = 4, 0 × 104 V

(b) Vamos utilizar o princípio da conservação da energia

KA + UA = KB + UB

Como o próton parte do repouso em A então KA = 0. Queremos achar a velocidade do próton em B e


essa informação está de KB . Isolando KB e abrindo as expressões das energias:
2 2
m · vB m · vB
KB = UA − UB ⇒ = q · VA − q · VB ⇒ = q · (VA − VB )
2 2
Isolando vB :
r s
2q · (VA − VB ) 2 · (1, 6 × 10−19 C) · (4, 0 × 104 V)
vB = = ⇒ vB = 2, 8 × 106 m/s
m 1, 67 × 10−27 kg

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