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AFINAL, O QUE É SER MODERNO NO BRASIL?

Aproveitando as discussões sobre a ‘Semana de Arte Moderna’, professor de Filosofia


mergulha em um debate atual que está sendo deixado de lado em meio às comemorações do
centenário do evento

[conteúdo exclusivo Continente Online]


Muito do que se viu das recentes polêmicas por ocasião do centenário da Semana de
1922 alternou entre disputas com tons bairristas e aquelas ligadas ao alinhamento político dos
seus integrantes. Uma miscelânea de fatos, mitos e anedotas. Há ao menos duas formas de
reagir a elas. 
Uma primeira seria sucumbir à mesma tentação bairrista – já que escrevo do Recife –, ao
lembrar que, por aqui, já havia um modernismo insurgente desde que os irmãos Fedora,
Joaquim e Vicente do Rego Monteiro foram estudar pintura em Paris, em 1913, sendo eles dos
poucos brasileiros a expor nos  famosos salões de arte parisienses.   

Lembrar fatos como estes contribuem para deslocar o eixo em torno do qual girou a narrativa
que fez com que autores como Lima Barreto fossem escanteados e outros movimentos fossem
reduzidos ao rótulo de regionalistas, enquanto o que ocorria em São Paulo passava a ser
símbolo de identidade nacional. A Semana catalisou uma relação de centro e periferia.
América do Sul, Joaquim do Rego Monteiro, óleo sobre tela, 73 x 92 cm. Imagem: Reprodução

Para além do fato e do mito, a imagem que melhor ajuda a descrever o efeito que o evento
causou na historiografia nacional é a do eixo gravitacional de um buraco negro: ela fez girar em
torno de si narrativas que foram se multiplicando a ponto de a imensa diversidade “periférica”
acabar por ser negligenciada ou absorvida por uma imagem de Brasil moderno que dificilmente
conseguia ser questionada. 
Por outro lado – e aqui um outro efeito colateral dos seus efeitos orbitais – chega a ser
sintomático que tenhamos chegado ao ponto de novamente defender a importância de Mário,
Oswald ou Heitor para a cultura brasileira. É por conta desse estado de coisas que vale a pena
darmos um passo atrás, tomando uma certa distância não apenas temporal dos fatos, como os
100 anos que nos separa dos eventos do Theatro Municipal, mas mesmo do próprio vocabulário
que temos disponível e que faz com que 1922 esteja mais próximo de nós do que parece. 

O nosso imaginário (cultural, social, político) permanece essencialmente moderno e a questão


ligada à sua recepção no Brasil se deu muito mais no sentido de se perguntar como se daria uma
modernidade especificamente brasileira, sendo quase que assumido de antemão o imperativo
de modernidade. Mas o que, afinal, é ser moderno? E, sobretudo, em que medida queremos ser
modernos? 

As confusões começam pelas dificuldades do uso de conceitos como “modernidade”,


“moderno” ou “modernismo”. Ao invés de adotar definições estáticas e essencialistas, a
semântica de um conceito é indissociável de sua incorporação de sentido, ou seja, da
compreensão do nosso uso desse conceito. Essa polissemia refere-se não apenas a tentativas de
definição da modernidade, como também na autocompreensão de seu tempo. Afirmar que
somos ou não modernos dependeria, assim, tanto da definição daquilo que entendemos por
este conceito, como da clareza de um diagnóstico de época: enquanto algumas correntes aliam-
se ao sentido de “pós-modernidade” (como Lyotard), outros autores entendem a modernidade
enquanto projeto inacabado (Habermas), modernidades múltiplas (Eisenstadt), ou mesmo
propondo que jamais fomos modernos (Latour). 
Este duplo sentido envolvido na polissemia de “modernidade” – o da definição do conceito, por
um lado, e do diagnóstico de época, por outro – compreende a especificidade e a recorrente
atração por esse debate, cujas raízes remontam a uma tradição filosófica em que tentativas de
precisão conceitual e de autocompreensão se entrecruzam. Ao menos desde o século VII, falar
em “moderno” significava assumir-se como estar em sincronia com o seu tempo. Mas isso passa
a se colocar como um problema no final do século XVII, na França, na Querelle des Anciens et
des Modernes. A questão ali era se a arte moderna (ou seja, a arte contemporânea aos
franceses daquela época) deveria ou não se orientar pela antiguidade. Contrário a um retorno
nostálgico, o conceito de modernidade foi logo associado ao de progresso, a um movimento de
ir em frente. Isso acabou orientando o discurso filosófico da própria modernidade. Foi assim que
Kant viu os critérios para uma autocompreensão do iluminismo em termos de modernidade e
progresso.

Devaneio, Di Cavalcanti, óleo sobre tela, 99,5 x 156 cm (1927). Imagem: Reprodução
Em seu conhecido texto O que é o iluminismo, o filósofo da cidade alemã de Königsberg (de
onde, aliás, nunca saiu) busca compreender o seu tempo como acontecimento filosófico,
tentando discernir aquilo que, no presente, seria relevante para uma reflexão filosófica.
Referindo-se aos acontecimentos revolucionários do seu país vizinho, a França, Kant propôs que
um dos critérios centrais para definir um sentido legítimo de progresso seria o sentimento
de entusiasmo, não só dos atores da Revolução, mas principalmente de quem estava “de fora”
como “espectador” (por coincidência, os alemães). 
Mas é somente com Hegel que a modernidade passa a ser propriamente tematizada enquanto
problema filosófico. Se para Kant o iluminismo e a época moderna eram vistos a partir de uma
autocompreensão de progresso, Hegel passa a colocar em questão uma visão
fundamentalmente positiva, deslocando o foco para os critérios de autocertificação da
modernidade (como diz Habermas, “Hegel não é o primeiro filósofo que pertence aos tempos
modernos, mas o primeiro para o qual a modernidade se tornou um problema”). Para Hegel, a
modernidade “pensa” a partir de si mesma, seja como noção de progresso ou como autocrítica,
de modo que o vínculo entre racionalidade e modernidade passa a ser uma orientação
obrigatória. 

Já com Nietzsche, vê-se o rompimento com o projeto da concepção de modernidade como


progresso da racionalidade, em que as duas noções centrais desse processo, modernidade e
racionalidade, sofrem seus mais duros golpes. Como diagnosticava Nietzsche de maneira
incisiva, “pois de nós mesmos, nós, os modernos, não temos absolutamente nada”. 

Fica claro como o pensamento filosófico sobre a modernidade vinculou-se, por um lado, a
conceitos como “autoconsciência”, “subjetividade”, “autonomia” e, por outro, a uma reflexão
crítica sobre o projeto iluminista, considerando ambivalências internas a esse projeto. A esse
segundo sentido crítico referem-se Adorno e Horkheimer naquilo que denominaram “dialética
do esclarecimento” – a saber, a ligação entre o ideal da autonomia, de um lado, e a ideia de
poder e a razão instrumental, de outro –, ou ainda, em uma outra vertente importante do
pensamento filosófico sobre a modernidade, as assim chamadas teorias da “pós-modernidade”
– em grande parte inspirada por Lyotard.

A sua expressão “o fim das metanarrativas” (em francês: métarécits) simboliza, de certa forma,
uma outra dimensão da crítica de modernidade: enquanto posições próximas de uma crítica do
iluminismo tentam regularmente salvar um projeto da modernidade, posições pós-modernas
dissolvem a crença em tal projeto num relativismo que se despede da ideia de progresso como
realidade e ideal normativo. É esta ambivalência que, de um modo ou de outro, orienta a
reflexão sobre a modernidade, persistindo até os nossos dias, seja na busca por sua definição,
seja na tentativa de compreendermos se somos ou não moderno e, não menos importante, na
defesa ou crítica dessas noções de modernidade como projeto. 
O problema é que todo esse debate, como se vê, surge como um problema essencialmente
europeu, uma questão de um continente onde o conceito de modernidade foi ligado, ainda que
sob tensões, à ideia de uma crescente individualização, industrialização e racionalização. Esse
processo de modernização ambivalente acabou por legitimar um recorte estético e político de
quem podia falar em nome da razão, costurando uma cartografia de centro-periferia cujos
efeitos de legitimação de projetos colonizadores e racistas não é mais possível de serem vistos
como questões secundárias ou meros acidentes de percurso. Não se pode mais negligenciar que
foram aquelas mesmas forças que se autocertificaram como modernas que viam como
justificado que as potências europeias se reunissem em 1884, em Berlim, para organizarem
quais desses países modernos e iluminados iriam levar a modernidade a uma África pré-
moderna.

BRASIL: MODERNIDADE PARA QUEM?


Certamente, a recepção brasileira da modernidade não se deu de maneira inequívoca e livre de
disputas, sendo também apropriada entre nós de modo ambivalente, como se vê em autores
como Roberto Schwarz, Mário Pedrosa ou Paulo Arantes. Mas as particularidades e contradições
dessa recepção ainda giram em torno desse mesmo conceito, tornando difícil conseguirmos
vislumbrar o que seria um projeto nacional mais democrático e inclusivo que absorvesse aquelas
vozes que não se reconheciam e não pertenciam a esse Brasil moderno. Uma imensa massa de
pessoas que estava, por assim dizer, fora da modernidade, em uma forma de partilha do tempo
que fazia com que entre contemporâneos uns fossem vistos como mais modernos do que
outros. 
Os esforços de se buscarem expressões de uma identidade nacional – como se vê, de maneiras
distintas, desde a Semana de 22, ou nos manifestos Poesia Pau-Brasil, de 1924, e o
Antropofágico, de 1928 – já revelam que há toda uma forma de produção tornada invisível que,
por si só, não poderia ser alçada a essa expressão de brasilidade. Ainda que Oswald de Andrade
tenha inspirado conceitos como o de perspectivismo ameríndio de Viveiros de Castro, como este
reconhece, raramente aquela perspectiva “outra” chegava a ser incluída como formas de
produção artística em primeira pessoa. 
Podemos então reconstruir a Semana de 22 movendo o foco do que ali era fato ou mito para
como esse recorte de narrativas reproduzia contradições semelhantes à modernidade europeia.
É onde se vê um aspecto que dá origem a muitas das confusões e às formas mais explícitas de
desiquilíbrio estético em seu modo de visibilidade: a diferença entre a ampliação do que é
representado e a questão de quem representa. Lembra-se, aqui, da clássica distinção sugerida
por Gayatri Spivak entre dois sentidos do verbo representar no vocábulo alemão: um enquanto
substituir, falar pelo outro (vertreten) e outra de exibir a si próprio, falando por si (vorstellen).
Parece-me que pouco podemos avançar se essa diferença não for bem compreendida. 
Pois, apesar da ampliação do horizonte estético da representação, os eventos no Theatro
Municipal continuaram reproduzindo aquelas mesmas formas de injustiças epistêmicas vistas no
projeto da modernidade europeia. Se perdermos isso de vista, continuaremos a insistir no fato
de que o campo do representado se expandiu e assumiu feições próprias de uma modernidade
brasileira – negligenciado o fato de que quem representa escancara, na verdade, um recorte
explícito de uma sociedade profundamente desigual. 

Tropical, Anita Malfatti, óleo sobre tela, 77 x 102 cm (1917). Imagem: Reprodução
É inócuo querer olhar retrospectivamente para 1922 apenas querendo encontrar heróis ou
vilões, quando aqueles dias traziam um diagnóstico de Brasil com todas as suas contradições –
modernas ou não. A Semana representava, assim, um retrato não do Brasil “real”, mas de como
ele performa, de como seu imaginário foi criado historicamente através de quem pertence e de
quem é excluído de sua construção. Significa reconhecer que, independente da imagem que traz
Mário de Andrade no poema final de Paulicéia desvairada, da população paulistana reunida no
vale do Anhangabaú para cantar um “oratório profano”, nem todos podiam (e isso não por
razões estéticas) subir aos palcos do Theatro Municipal. 
O entusiasmo pelo moderno, como sabemos, era ali protagonizado por uma elite que se
apropriava não somente de padrões estéticos, mas que seguia um modo de concentração
econômica aristocrática que se reproduzia nos salões de arte, como o próprio Mário de Andrade
reconheceria em sua famosa conferência de 1942, O movimento modernista, na ocasião dos 20
anos do evento. São formas de pertencimento e partilha – estética e econômica – que ainda
atravessam nosso vocabulário e imaginário social, que permanece essencialmente moderno.
Nisso, mantém-se em um jogo paradoxal de querer afirmar uma identidade nacional, de querer
incluir o que é outro, mas já partindo de um recorte específico de modernidade periférica,
sobretudo para aqueles que historicamente foram vistos fora do cânone e dos critérios que
definiram o que é ser “moderno”. 
Como diz Allan da Rosa em debate com José Miguel Wisnik, simbolicamente naquele mesmo
Theatro Municipal: “Quem era essa cidade? Onde estavam as pessoas pretas dessa cidade?
Quando vemos uma visão de povo como inocente, hoje vemos que inocente é essa visão, bem
formada por uma razão que contempla a sensibilidade, mas que ao mesmo tempo é uma razão
branca”. 

Pastor,  Vicente do Rego Monteiro, óleo sobre tela, 94 x 130 cm (1929). Imagem: Reprodução
É possível olhar retrospectivamente para 1922 sem purismos nem cancelamentos, mas
assumindo contradições. Sem precisar ridicularizar sua importância, tampouco blindá-la de suas
ambivalências em assumir um protagonismo estético que tem como efeito um recorte de
pertencimento e visibilidade. Ao invés de escolher entre a historiografia oficial e suas críticas
bairristas, precisamos radicalmente de outras histórias, contadas por outras pessoas, e hoje o
vocabulário moderno de que dispomos é mais obstáculo do que alavanca para isso. O que
emerge desse vocabulário ainda não é, certamente, o que surge a partir das vozes que
historicamente estiveram fora do cânone da modernidade, para quem o modernismo
certamente não pode ser colocado no mesmo plano estético e político do afro-futurismo. 

São muitas as formas de apagamento e algumas permanecem como disputas historiográficas;


outras sequer são candidatas a essas disputas. É essa ambivalência que permite criar novas
narrativas – como as contadas sobre 1922, enquanto outras não conseguem ser erigidas ao
status de polêmica dos grandes jornais. Quando aquelas mesmas pessoas que não tinham voz e
possibilidade de falar por si dentro do espaço do Theatro Nacional hoje insistem em levantar
críticas, é o momento de ouvi-las. Ouvi-las de maneira desarmada, sem necessariamente
precisar refutá-las. Já em relação aos nomes que hoje compõem o cânone de cultura nacional,
difícil imaginar que precisem da mesma defesa. Daí corre-se facilmente o risco de cair numa
postura reacionária, pois se continua salvando quem já está salvo.   

Olhar retrospectivamente para 1922, 100 anos depois, é mais do que uma disputa bairrista. Os
mesmos recortes centro-periferia, de quem está dentro, quem está fora, quem é visível ou
quem é invisível, persistem e se reproduzem no que se mantém dos processos profundamente
ambivalentes de modernização. É uma boa oportunidade de trazer para o centro de suas
questões todas aquelas contradições de um Brasil que queria ser moderno, mas deixou de se
perguntar por quem estava, e continuaria fora da modernidade, seja aos olhos dos europeus,
seja à vista dos brasileiros que tanto queriam sê-lo. 
FILIPE CAMPELLO, doutor em Filosofia pela Universidade de Frankfurt (Alemanha). É professor
de Filosofia da Universidade Federal de Pernambuco. Foi pesquisador visitante na New School
for Social Research (Nova York).

Análise sobre o filme "Tempos Modernos" de Karl Marx


Neste artigo iremos apresentar uma analise do filme “Tempos Modernos”, do ano de 1936,
com base nos conceitos do filósofo Karl Marx, nascido em 1818.

Marx é conhecido como o fundador da doutrina comunista. Ao contrário dos outros filósofos,
não buscava compreender o mundo, mas sim modifica-lo por meio da luta de classes, esse
seria o grande motor da história. Sobre o poder politico, dizia que era “o poder organizado de
uma classe social para a opressão de outra”, mas especificamente era o poder concentrado
nas mãos de uma minoria, a burguesia, utilizado para manter seus interesses econômicos,
oprimindo a maioria, os proletariados. Porém, Marx acreditava que quando a classe social
oprimida tomasse conhecimento de que poderiam modificar o mundo, tomariam o poder,
instaurando o socialismo.

Dentro deste conceito de ebulição social, explicado por Marx, é feito o filme “Tempos
Modernos”, que conta a história de Carlito, um trabalhador fabril que acaba alienado por seu
trabalho. O filme se passa no inicio da Revolução Industrial, onde a maquina a vapor além de
desencadear uma revolução tecnológica provocou mudanças drásticas nos hábitos, costumes e
valores dos trabalhadores da época.

Em sua jornada, Carlito encontra uma jovem órfã de mãe, com duas irmãs pequenas e o pai
desempregado, tem que realizar pequenos furtos para sobreviver. Juntos, começam a
alimentar o sonho de serem felizes e para isso teriam que ter um bom emprego e uma casa
própria (ideais capitalistas). O filme segue com as personagens tentando realizar seu sonho,
dispostos a tudo, Carlito acaba preso cinco vezes e falha em todos os trabalhos que consegue.

Relação dos conceitos de Karl Marx com o filme “Tempos Modernos”


“Tempos Modernos”, foi feito em 1936 e faz uma analogia à época da Revolução Industrial.
Nesta época o artesão é substituído pelo operário que não tem mais noção do que a sua força
de trabalho produz, já que desempenhava uma função isolado processo global de fabricação
de um determinado bem material. Segundo Marx, o operário recebia um salário tão baixo que
nem ao menos dava para adquirir aquilo que passou dias produzindo na esteira fabril. Esta
diferença entre o valor final do produto e o valor da força de trabalho do operário é
denominada de mais valia por Marx.

O filme tem inicio com Chaplin trabalhando em uma metalúrgica, sua função na linha de
montagem era apertar parafusos. Após reproduzir tal tarefa inúmeras vezes, o trabalhador
acaba alienado e com uma crise nervosa, para Marx isso é extremamente contraditório, pois o
trabalho deveria ser fonte de realização para o ser humano. Essa cena demonstra como o
homem era submisso ao ritmo imposto pela máquina (esteira de montagem).

O fato de a personagem, Carlito, sair do ambiente de trabalho, reproduzindo o mesmo


movimento realizado na esteira fabril, faz uma metáfora sobre como o homem se transforma
em uma mera extensão da máquina e assim, é desumanizado pelo sistema capitalista, pois
perde sua capacidade de discernimento e, portanto, é incapaz de pensar. Funciona como uma
engrenagem do sistema e, ainda, perde a autoria sobre o produto final.

Em meio ao drama vivido por Carlito, estão acontecendo diversas greves protagonizadas por
operários desempregados, uma verdadeira ebulição social. Marx acreditava na filosofia da
história, onde o proletariado, cansado de ser oprimido pelo capitalismo, se revoltaria,
instaurando um estado forte e socialista para mais tarde acabar com o próprio Estado e com
qualquer meio de dominação sobre o povo, essa fase seria o Comunismo. Porém só seria
possível derrubar o sistema capitalista com as greves e revoltas dos operários, em outras
palavras, a luta de classes seria o motor da história.

O filme é muito interessante nesse sentido: de demonstrar a dialética predominante na época.


Consistia em operários oprimidos trabalhando para burgueses opressores. Ai está o motor da
história, como Marx o definiu. Para Marx, essa época seria um terreno fértil para revolução,
onde quanto mais opressão, mais forte seria a tomada de consciência do proletário, como se
vê numa das cenas de protesto em que Carlito é preso.

Essa exploração desenfreada da época era sem dúvida fruto do Liberalismo Econômico, teoria
criada por Adam Smith, um dos três principais rivais de Marx. Claramente se vê o conceito
marxista de alienação aplicado ao trabalho, quando dele depende a sobrevivência da
esmagadora maioria da população. O burguês, o dono da fábrica e opressor, possui os frutos
do trabalho do proletário, através de uma relação de mais-valia, em que o burguês enriquece à
medida que explora o operário, portanto ele possui sua sobrevivência, possuindo-o por
conseguinte.

Após perder o emprego devido a sua crise nervosa, provocada pela alienação ao trabalho
continuo, Carlito é preso ao ser confundido com o líder de uma manifestação comunista. A
personagem, durante seu tempo na prisão, conquista a confiança dos policiais aos poucos e
acaba ganhando regalias, entre elas, uma cela mais confortável. No dia de ser posto em
liberdade, Chaplin, ao contrario do esperado, fica triste, pois iria ter que abrir mão de sua cela
confortável e da comida que recebia para voltar ao trabalho opressor do qual fazia parte
antes.

Quando os proletários percebessem que estavam em maioria e poderiam derrubar a


burguesia, instaurado o seu próprio governo, haveria uma grande revolta, porém, Marx
acreditava na existência dos lupemproletariados, eram aqueles que por estarem fora do
mercado formal de trabalho e não possuírem qualquer tipo de consciência de classe, lutariam
a favor do capitalismo e da burguesia atuando como uma massa de manobra. Carlito se
enquadra nesta classe social, pois além de desempregado, não compreende a crueldade do
sistema em que está inserido, acabando alienado por ele.

Em sua jornada, Carlito conhece uma jovem órfã (cujo pai morreu durante um protesto de
desempregados). A menina sobrevive roubando comida. A história segue com ela e Carlito
sonhando em adquirir uma casa própria, os dois imaginam como seria ter uma propriedade.
Essa parte é importante, pois durante sua “imaginação”, Carlito se vê como um burguês, ao
tirar o leite da vaca, por exemplo, o leite sai sozinho. Na visão de Marx, o burguês não trabalha
para ter aquilo que possui, alguém sempre faz o serviço por ele. Para obter sua casa, Carlito
fica determinado a arranjar um emprego: “Vou ter uma casa, nem que eu tenha que trabalhar
para isso”. A personagem consegue um emprego como vigia noturno de um shopping e leva a
menina para lhe fazer companhia durante a noite. Ambos ficam fascinados com os produtos
existentes e fazem uso deles, andam de patins e a mulher dorme em uma cama confortável.
Cabe nessas cenas, o conceito de propriedade de Marx, para ele, Carlito e a jovem nunca iriam
possuir aqueles objetos do qual estavam fazendo uso, apesar de vigia-los. Os bens eram
destinados à burguesia, pois eram os únicos com capital suficiente para adquiri-los, nem
mesmo quem produziu a cama e os patins, poderiam tê-los. Em outras palavras o homem que
detém os bens, os possui devido à essência do trabalho de outro homem, o trabalhador
proletariado, este jamais conseguirá adquirir aquilo que produziu, apesar de acreditar que irá
conseguir, é alienado. O capitalismo trabalha em cima dessa alienação. Como segue no
esquema a baixo:

Homem Burguês -> Trabalhador Proletário -> Essência -> Propriedade ->Essência
Carlito é preso mais uma vez após dormir durante seu trabalho como vigia noturno. Ao sair da
prisão sua companheira informa que havia encontrado uma casa para eles morarem, vale
ressaltar que não adquiriram a propriedade por meio do trabalho, apenas a encontraram
abandona. Porém, residência estava caindo aos pedaços. O casal, ainda sim, não perde as
esperanças de um futuro melhor. Ao ver um anuncio no jornal dizendo que as fabricas
reabriram, Carlito corre para arranjar um novo emprego, prometendo uma moradia mais
confortável.

O filme segue com a jovem e o Carlito em busca de seus sonhos, porém, após cinco prisões da
personagem principal e as incontáveis vezes que falhou em seus trabalhos, “Tempos
Modernos” chega ao fim. O final é tão inteligente quanto o restante do enredo: a jovem,
desolada e sem esperanças restantes, diz para Carlito que nunca vão conseguir alcançar seus
tão almejados sonhos para serem felizes e que não faz mais sentido continuarem tentando.
Nessa hora, Chaplin, diz para não desistirem, pois sempre há esperanças e oportunidades.
Ambos, alienados pelo ideal do sistema capitalista, levantam e seguem em frente sorrindo.

Essa cena final reflete a ideia de economia para Marx. O filme se passa em uma sociedade
capitalista, por isso todas as outras esferas sociais, se baseiam no capitalismo, inclusive a
moral dos personagens, inteiramente influenciada pela ética do capital. Onde os proletários
são levados a crer que um dia serão burgueses, se trabalharem duro para isso.
No início da Revolução Industrial, acreditava-se que o aumento da produção iria gerar a
igualdade social, mas, ao contrário, a abundância e as novas tecnologias ficaram restritas há
poucos e só os mais ricos usufruíam dos seus benefícios.

Hoje em dia, ao contrário do que é apresentado no filme, enfrentamos o problema da falta de


emprego e não o excesso dele. A máquina, considerada por muitos como a "grande vilã",
reduziu aos poucos, os postos de trabalho e invadiu nossas casas e os locais de trabalho. Um
dos melhores exemplos para explicar isso é a aposentadoria da máquina de escrever. Em
nossas casas encontramos aparelhos de todos os tipos, como: liquidificador, batedeira,
máquina de lavar e secar roupas, forno de microondas, televisão e uma infinidade de produtos
param se apertar botões. Sem contar os portáteis e os games que invadiram um espaço
enorme e precioso para as pessoas: o lazer. Precioso porque, o lazer é o espaço reservado à
liberdade individual, no qual poderemos nos dedicar ao desenvolvimento intelectual.

Infelizmente, isso pouco acontece; por comodidade e facilidade, preferimos nos restringir
apenas a assistir um programa na TV, jogar vídeo game ou navegar horas a fio pela internet. O
que parece uma evolução natural que beneficia a humanidade pode nos escravizar e nos
alienar. Tudo nos é apresentado rápido, fácil e vantajoso, mas temos que pensar sobre as
facilidades e comodidades promovidas pelo capitalismo moderno e estabelecer um limite para
o uso consciente das tecnologias em nosso dia a dia.

“Tempos Modernos” é um filme que produz conhecimento, pois nos faz pensar. Atualmente,
devido a Indústria Cultural, está cada vez mais difícil encontrar obras como as de Chaplin, já
que tudo é padronizado, visando o lucro. Nesse sentido o filme de 1936, nos liberta,
proporcionando reflexões intensas sobre a sociedade industrial, ética capitalista e ainda,
demonstra como certos conceitos de Marx podem ser tão úteis e atuais para explicar a
sociedade moderna.

Autores deste artigo: Eduardo Morello Santos, Letícia Tiemi Sartório Anzai, Maria Fernanda
Bernardo Giorgi, Nathalia da Silva Justino e Thamirys da Silva Scapin.

Análise crítica do filme tempos modernos com Charles Chaplin

PEDAGOGIA
O filme tempos modernos, mostra a vida de operários com a revolução industrial, em que houve
a passagem da produção artesanal, para a produção em série. Os operários se submetiam a uma
forma de produção em que não era mais de acordo com suas condições físicas e psicológicas,
mas sim uma forma de produção que visavam maior lucro independente das condições de seus
trabalhadores.
Chaplin vivia o personagem Carlitos, em que era trabalhador em uma grande indústria, fazia em
seu trabalho sempre a mesma coisa, diferenciando dos dias de hoje em que o mercado de
trabalho quer profissionais polivalentes, mesmo realizando sempre a mesma atividade, o
mercado exige que essa profissional conheça o produto final e outras diversas atividades dentro
da indústria.
Não só Carlitos, como muitos outros operários viviam a exploração dentro das fábricas devido à
busca do lucro pelos proprietários, fazendo com que eles fizessem suas atividades muito mais
rápidas para obter um produto final em menos tempo, fazendo seu trabalho de acordo com a
máquina.
Na realização de sempre a mesma atividade, Carlitos teve um colapso nervoso, não conseguindo
mais parar de fazer os movimentos que fazia muito rapidamente dentro da fabrica, sendo
levado a um hospital. Após Carlitos sair do hospital curado, encontra a fábrica fechada, e ao
buscar outro emprego é confundido com líder comunista e vai para cadeia. Na cadeia ele frustra
uma tentativa de fuga de outros presos e é liberado da prisão conseguindo uma carta de
recomendação por uma autoridade. Porém, mesmo com uma boa recomendação, Carlitos não
conseguia se manter em outro emprego, pois na fábrica em que trabalhava, era alienado
fazendo sempre o mesmo trabalho, desta forma não sabia fazer mais nada além de apertar
parafusos.
Carlitos ao conseguir outro emprego, ao realizar uma tarefa fácil de encontrar um pedaço de
madeira parecido com o que possuía em mãos, tarefa tão fácil quanto apertar parafusos, mas
não usando raciocínio, essa tarefa trouxe consequências desastrosas.  Não conseguindo assim
outro emprego, Carlitos fazia de tudo para voltar para a prisão.
Retratado no filme, uma sociedade em caos, Carlitos conheceu uma moça que vivia grande
miséria, roubando comida para sobreviver, não tinha mãe e seu pai estava desempregado, seu
pai foi morto, mostrando também a violência nas ruas na época. Para não ir para um abrigo, ou
adoção ela foge.
Carlitos ao conseguir emprego de volta na fabrica, logo depois os funcionários entram em greve
novamente, e em meio à confusão ao jogar sem querer uma pedra em um policial, Carlitos é
preso novamente.
Ao sair da prisão, Carlitos se encontra novamente com a jovem, que havia conseguido emprego
como dançarina em um restaurante mostrando o trabalho infantil até mesmo noturno em que
hoje existem leis a serem seguidas mediante contratação de menor. Retratando também nessa
parte do filme a inserção da mulher no mercado de trabalho. A jovem consegue também um
emprego no restaurante para Carlitos, porém a jovem tida como vagabunda, foi procurada pela
policia, mas conseguiu fugir com Carlitos.
As greves e manifestações dos empregados eram agressivamente reprimidas pelas autoridades,
defendendo dessa forma os interesses capitalistas. Mas a partir de greves hoje existem
melhores remunerações, diminuição da jornada de trabalho e melhores condições para o
trabalhador.
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trajetória, desde o surgimento do cinema até os dias atuais.

“Tempos modernos”, de Charles Chaplin, ainda tão atual 10 de junho de 2015 652
COMPARTILHAMENTOS COMPARTILHE Imprima este artigo Tempos Modernos, de Charles
Chaplin, é um dos filmes mais utilizados pelos professores para discutir com os alunos os efeitos
sociais da Revolução Industrial. Filmado em 1936, quase sem som, e em branco e preto, o filme
ainda hoje agrada os adolescentes mesmo os mais aficionados pela alta tecnologia. Por seu
conteúdo, importância e sua magia hipnotizadora, Tempos Modernos merece ser melhor
estudado e contextualizado, assim como o genial Chaplin. ***No final do artigo, atividades para
trabalhar em sala de aula.*** CONTEÚDO Charles Chaplin e sua obra Contexto histórico de
Tempos Modernos Trabalhando o filme em sala de aula Respostas comentadas das questões
Extra: Chaplin era comunista? Fonte Charles Chaplin e sua obra O londrino Charles Spencer
Chaplin (1889-1977) nasceu em uma família de artistas. Seus pais eram atores e cantores do
music-hall e se separaram antes de Chaplin completar três anos. Ainda criança, Chaplin estreou
em teatros populares do Reino Unido mas teve uma infância difícil. Por diversas vezes, Chaplin e
os irmãos passaram fome e foram internados em asilos. A mãe perdeu o emprego devido a uma
infecção na laringe e a problemas mentais, e o pai, alcoólatra, acabou morrendo de cirrose no
fígado. Em outubro 1912, Chaplin embarcou para os Estados Unidos com uma trupe de
comediantes. Ali conheceu os estúdios da Keystone Film Company onde foi chamado para
substituir um ator no filme Making a living (1914). Desde então não parou mais de trabalhar.
Naquele ano, ele fez 35 filmes para a Keystone Film trabalhando como ator e, em parte deles,
também como roteirista e diretor. Eram filmes curtos, comédias na maioria. Charles Chaplin
interpretando seu personagem mais famoso: “o Vagabundo” (The Tramp), mais conhecido no
Brasil como Carlitos. Não fazia nem vinte anos que o cinema tinha sido inventado, e ele já se
popularizara nas grandes cidades dos Estados Unidos e da Europa. Foi nessa onda inicial que
Chaplin lançou seu personagem mais famoso – Carlitos, o vagabundo – um andarilho pobretão e
bondoso, de maneiras refinadas como um cavaleiro. Usando um bigodinho e chapéu côco, ele
vestia um paletó apertado, calças largas e sapatos desgastados e largos e, na mão, levava uma
bengala. Chaplin o definia como “um cavaleiro, um poeta, um sonhador sempre à espera do
amor”. Surgido em 1914, Carlitos foi um enorme sucesso protagonizando numerosos filmes. Um
dos mais aplaudidos foi “O garoto” (The Kid, de 1921) quando Carlitos se vê envolvido nos
cuidados de um bebê. As cenas de ternura entre eles se tornaram antológicas. A última
apresentação de Carlitos foi em “Tempos Modernos” (Modern Times,1936) onde ele aparece
como operário na linha de produção de uma grande fábrica. Trabalhando em outros estúdios,
Chaplin estrelou dezenas de filmes como ator, diretor, roteirista e produtor.  Em 1919, junto
com outros artistas, ele fundou a United Artists com o intuito de fazer frente às grandes
corporações cinematográficas da época. Foi por essa companhia que, entre 1923 e 1952
produziu seus longas-metragens, entre eles: “A corrida do ouro” (1925), “O circo” (1928), “Luzes
da Cidade” (1931), “Tempos Modernos” (1936), “O grande ditador” (1940) e “Luzes da Ribalta”
(1952). Cena do “O garoto” (1921) com Chaplin e o pequeno Jackie Coogan que, anos depois,
interpretaria o gordo e careca Tio Fester em “A Família Addams”. Contexto histórico de Tempos
Modernos Pode-se dizer que “Tempos Modernos” nasceu “velho”, pois Chaplin insistiu usar uma
tecnologia que estava em declínio: o filme é praticamente mudo (tem elementos sonoros) e em
branco e preto. O filme falado já tinha sido lançado há quase dez anos, em 1927, e o filme
colorido, em teste desde 1922, já tinha estreado em longa metragem em 1935. Os sons de
“Tempos Modernos” são sutis limitando-se a ruídos, como fechar portas, puxar alavancas e
passos. Já quase ao final do filme, Chaplin canta – é primeira vez que sua voz é ouvida no cinema
– interpretando a música cômica Je cherche après Titine, de Léo Daniderff . A letra não tem
sentido,  misturando palavras francesas e italianas, deliberadamente incompreensíveis para
efeito cômico. Chaplin temia que dar voz a Carlitos, o Vagabundo destruísse o mistério e o
romantismo do personagem além de afastar seu público dos países que não falavam inglês. Ao
ser lançado, em 5 de fevereiro de 1936, “Tempos Modernos” foi considerado uma involução
pelos críticos. Não fez o sucesso esperado e os valores de bilheteria mal cobriram os custo da
produção. Só seria consagrado como um filme revolucionário na reprise, em 1954. Mas nessa
época, Chaplin já não vivia mais nos Estados Unidos, exilara-se na Suíça. Em sua autobiografia,
Chaplin conta a respeito de “Tempos Modernos”: “Lembrei-me da entrevista que concedi a um
jovem e brilhante repórter do World, de Nova York. Ao dizer-lhe que ia visitar Detroit, explicou-
me o sistema de trabalho na linha de montagem dos automóveis – uma história angustiante da
grande indústria, atraindo jovens sadios que deixavam o campo e que, ao fim de quatro ou cinco
anos, se viam reduzidos a uns frangalhos nervosos. Foi a tal conversa que me deu a ideia para
“Tempos Modernos”: como invenção para poupar tempo, utilizei um aparelho de levar comida à
boca, de modo que até almoçando os operários pudessem continuar o serviço. A sequência da
fábrica fundia-se na figura de Carlitos em desesperada crise histérica. (…) Depois de curado, o
vagabundo é preso e encontra a malandrinha que também fora detida pelo furto de um pão. (…)
Daí por diante é a história de dois coitados tentando acomodarem-se aos tempos modernos.
Veem-se às voltas com a depressão, greves, barulhos de rua e o desemprego.” (CHAPLIN, p. 385-
386) O comentário de Chaplin explica o subtítulo do filme inserido na abertura, logo após o
título: “Uma história sobre a indústria, a iniciativa individual, a cruzada da humanidade em
busca da felicidade”. Trata-se de uma mordaz crítica à sociedade industrial capitalista
especialmente em relação à maneira desumana e cruel com que o trabalhador é tratado. O
filme situa-se no contexto da Grande Depressão que se seguiu à crise de 1929 quando os altos
índices de desemprego e a expulsão dos trabalhadores agrícolas de suas terras aumentaram a
exploração do trabalho nas cidades. A exploração do trabalho, por sua vez, fortaleceu o
movimento operário e sindical sob a égide da esquerda comunista e anarquista, e que se fez
sentir por meio de demonstrações de massa, como greves, motins e petições.  O filme situa essa
questão na cena em que o personagem de Chaplin é confundido com um líder comunista. Uma
ousadia para a época, foi o filme mostrar o tráfico de drogas nas cadeias. Durante o almoço na
cadeia, um traficante que era procurado pelos inspetores de polícia, esconde a cocaína no
saleiro. Chaplin sem saber sacode o saleiro sobre seu prato e ingere excessiva quantidade da
droga. Em seu delírio subsequente, ele se depara com presos em fuga e, aturdido, derruba-os
impedindo sua  fuga. Ele é saudado como herói e recebe tratamento especial na cela. Estreia do
filme “Tempos Modernos”, em Nova York, 1936. Trabalhando o filme em sala de aula O cinema
pode ser um eficiente recurso pedagógico se bem trabalhado antes, durante e depois da aula
em que foi inserido. Veja a respeito aqui. “Tempos Modernos” é comumente discutido nas aulas
sobre Revolução Industrial, em especial, a Segunda Revolução Industrial. O filme, contudo, tem
maior relevância e significado histórico se abordado em seu próprio contexto, isto é, a década
de 1930, o turbulento período entreguerras, da Grande Depressão e do confronto de
movimentos comunistas e nazifascistas. É o primeiro filme abertamente político de Chaplin. Faz
uma sátira da linha de montagem e uma denúncia contra o desemprego e as condições de vida
e trabalho de grande parte da população, imposta pelos avanços capitalistas da época. Os
dilemas e dramas humanos que tanto inspiraram Chaplin acabaram sendo sua punição. Anos
depois, em 1952, ele foi suspeito de apoiar ideias comunistas – situação que o levou ao exílio
voluntário com a família até o fim de sua vida (Veja a respeito no final do artigo) O filme permite
discutir as seguintes temáticas: As relações entre o homem e a tecnologia. A imposição do
tempo fabril marcando o ritmo da vida humana. A organização, as condições e a exploração do
trabalho. A desigualdade social e seus efeitos: miséria, fome, furtos, criminalidade etc. A ideia
de felicidade supostamente garantida pelo consumo e prosperidade material.  Para download
das atividades, inscreva-se abaixo. Material do download Fotogramas do filme acompanhados
de 22 questões (3 páginas) RESPOSTAS COMENTADAS DAS QUESTÕES Comentamos a seguir 11
cenas dos primeiros 20 minutos do filme. Muitas estão repletas de metáforas, críticas e
denúncias da exploração do trabalho e da desigualdade social. Os comentários servem de guia
de resposta das questões para discussão do filme. As questões estão no texto para download. 1.
Ficha técnica de “Tempos Modernos” Cartaz do filme “Tempos Modernos”, de 1936. Direção:
Charlie Chaplin Gênero: comédia dramática e romântica Produção: Charlie Chaplin Roteiro:
Charlie Chaplin Atores principais: Charlie Chaplin (operário) e Paulette Goddard (órfã) Música:
Charlie Chaplin Idioma: Inglês Data de lançamento: 5 de fevereiro de 1936, em Nova York
Companhia Produtora: Unidet Artists Distribuição: Charlie Chaplin Film Corporation Tempo de
execução: 87 minutos Custo de produção: US$ 1,5 milhão Bilheteria: US$ 1,4 milhão (nos
Estados Unidos) Interessante observar o nome de Charlie Chaplin em quase todas as etapas de
criação, produção e distribuição do filme. Ele concentrava em si quase todas as tarefas: era o
diretor, produtor, roteirista, ator, compositor e distribuidor do filme. Chaplin era também
escritor, dançarino e empresário. Por todas essas habilidades e pela genialidade de sua obra,
Chaplin é considerado o maior cineasta de todos os tempos. Sua carreira no ramo do
entretenimento durou mais de 75 anos, desde suas primeiras atuações quando ainda era
criança nos teatros do Reino Unido até quase sua morte aos 88 anos de idade. 2. Abertura do
filme Um enorme relógio que marca seis horas (da manhã) lembra a máxima do espírito
capitalista “tempo é dinheiro”. O fundo musical, com predomínio de metais, destoa de uma
comédia aproximando-se mais de um filme de suspense ou terror. Seria proposital para
preparar o público ao drama humano retratado pelo filme? O subtítulo – “Uma história sobre a
indústria, a iniciativa individual, a cruzada da humanidade em busca da felicidade” – induz a
perguntar qual seria a relação entre indústria e busca da felicidade. 3. Saída do metrô Um
rebanho de ovelhas brancas e tosquiadas avança em direção ao espectador. Observe que há
uma única ovelha negra entre elas: é Carlitos. Sobrepondo-se ao rebanho, vê-se uma multidão
saindo do metrô: são trabalhadores que caminham rápido para a fábrica. Uma clara metáfora às
pessoas “domesticadas” que correm para a fábrica-matadouro. Observe que o grupo é
constituído exclusivamente por homens. Eles são a maioria no trabalho fabril. Nessa época, as
mulheres já estavam presentes no mercado de trabalho mas, quase sempre, em uma situação
temporária. Raras seguiam uma carreira profissional. A maioria deixava de trabalhar fora de
casa quando se casava. A cena do rebanho de ovelhas, no início do filme, funde-se à imagem da
multidão saindo do metrô: uma clara metáfora às pessoas domesticadas pelo trabalho nas
fábricas. Cena de “Tempos Modernos”, 1936. 4. Na fábrica Os trabalhadores batem o cartão de
ponto (talvez seja necessário explicar a função desse instrumento para os alunos) e se dirigem
aos seus postos de trabalho. O ambiente amplo da fábrica é tomando por máquinas gigantescas.
Repare que os trabalhadores não usam equipamentos de segurança que, na época, não eram
exigidos. Pode-se imaginar como deveriam ser comuns e graves os acidentes de trabalho. 5. Sala
do presidente O presidente da empresa está completando um quebra-cabeças que parece ser
um mapa da Europa: seria uma alusão da abrangência do capitalismo? De sua sala ele comanda
todo o trabalho da fábrica por meio de um enorme monitor de televisão. Por meio de seu
monitor, o presidente dá ordens para aumentar a velocidade das máquinas. Não existia esse
aparelho, na época. Chaplin faz, aqui, uma projeção futurista do uso da tecnologia para controle
dos trabalhadores. A televisão era uma invenção recente (a primeira projeção ocorreu em
1926).  Somente as famílias mais ricas possuíam televisores em casa, mas eles começavam a se
popularizar. Em 1936, ano do lançamento do filme, ocorreram as transmissões, pela televisão,
dos Jogos Olímpicos de Berlim. 6. Linha de montagem Carlitos vestindo macacão e junto a
outros operários trabalha na esteira na repetitiva tarefa de apertar parafusos. A cena é cômica
com Carlitos se esforçando para não perder o ritmo mesmo com coceiras e uma mosca
enervante. Aumenta a velocidade da esteira. Bom momento para falar sobre a produção em
série. Inventada pelo engenheiro norte-americano Frederick Taylor, em 1884, o taylorismo
triplicou a produção industrial. Em 1913, método semelhante foi aplicado pelo industrial Henry
Ford em sua indústria automobilística e daí falar-se em taylorismo-fordismo. Na linha de
montagem, Carlitos realiza a repetitiva tarefa de apertar parafusos. Cena de “Tempos
Modernos” (1936). 7. Banheiro monitorado Carlitos sai da seção de trabalho repetindo, de
maneira autônoma, os gestos da esteira. Bate o cartão: é meio-dia. Completou metade da
jornada de trabalho e o banheiro é o único local em que pode relaxar. Repare que o banheiro
não tem espelhos nem bancos, mas há grades na janela: é quase um presídio. A pausa para o
banheiro é curta: ela não pode comprometer a produtividade e o trabalhador tem que voltar
logo à fábrica. Carlitos é surpreendido pelo presidente que aparece em uma enorme tela e exige
que retorne ao trabalho. Ele sai, bate o cartão novamente e retorna à esteira. O cartão de ponto
controla o tempo do trabalhador: marca a hora que ele entra na fábrica, vai ao banheiro,
almoça, retorna à seção e termina o dia de trabalho. No banheiro, Carlitos é surpreendido pelo
presidente da fábrica que aparece em um telão e ordena que ele volte ao trabalho. Cena de
“Tempos Modernos” (1936). 8. A máquina de comer É apresentada, ao presidente da empresa,
a máquina de comer. Interessante chamar a atenção dos alunos para essa cena. Em tempos pré-
Power Point, a apresentação é feita por meio de uma vitrola que faz o áudio e dos assistentes
que mostram o funcionamento da máquina. O objetivo da máquina é reduzir o tempo de parada
do operário para o almoço e, portanto, aumentar a produtividade. Carlitos  é convocado para
experimentar a máquina de comer. A cena é famosa: a máquina encrenca e Carlitos fica em
apuros. O presidente desiste de adotar a máquina alegando que o equipamento “não é prático”.
Isso merece uma discussão: o presidente não se sensibilizou pelo sofrimento do operário,
deteve-se apenas em observar a máquina. Preso à mesa, Carlitos é obrigado a se submeter ao
ritmo da máquina de comer. Cena de “Tempos Modernos” (1936). 9. Devorado pela máquina
Dia seguinte e próximo ao final do expediente, o presidente manda acelerar um pouco mais as
máquinas. Carlitos enlouquece e acaba entrando nas engrenagens da máquina onde continua a
repetir os mesmos gestos de apertar parafuso. A cena é repleta de significados: o homem
moderno lutando com uma máquina assustadora, com engrenagens gigantescas. O trabalhador
se torna um apêndice da máquina. Ela dita seu ritmo furioso, desumaniza os indivíduos cujo
comportamento se assemelha ao de um robô que, ao final, acaba devorado pela máquina e
descartado quando perde sua utilidade. Cena antológica do cinema em que Carlitos é engolido
pela máquina. “Tempos Modernos” (1936). 10. Colapso nervoso Em sua loucura, Carlitos
confunde botões de roupa com parafusos e sai atrás da secretária na fábrica e, depois, de uma
mulher, na rua. Perseguido por um policial volta a entrar na fábrica, mas, antes, lembra de bater
o cartão de ponto! Na fábrica, Carlitos aciona alavancas provocando uma pane geral nas
máquinas. Ele é demitido, virou uma “máquina descontrolada” e é jogado fora do mundo
produtivo. Carlitos enlouquece e ameaça os companheiros e a secretária. Cena de “Tempos
Modernos”, 1936. 11. Manifestação operária Desempregado, Carlitos vaga pelas ruas quando vê
uma bandeira de segurança cair de um caminhão de carga. Não vemos a cor da bandeira (o
filme é em preto/branco) mas, certamente, é vermelha. Carlitos pega a bandeira e agita-a
fazendo sinais para o caminhoneiro. Neste exato instante, atrás dele se aproxima um grupo de
grevistas com cartazes de “Liberdade e União”. Quando a polícia chega e dispersa os grevistas,
Carlitos é preso confundido como líder do movimento comunista por estar portando a bandeira
vermelha comunista. Carlitos, sem saber, envolve-se em uma greve e acaba sendo confundido
como líder de movimento. Cena de “Tempos Modernos”, 1936. Extra: Chaplin era comunista?
Chaplin sempre foi muito atento aos problemas econômicos e sociais de sua época. Em 1931,
declarou: “Desemprego, essa é a questão-chave. As máquinas devem melhorar o bem-estar da
humanidade, em vez de causar tragédia e desemprego”.  Por suas posições frente à exploração
do trabalho e à desigualdade social, Chaplin foi suspeito de defender ideias esquerdistas. Assim
foram entendidos seus filmes “Tempos Modernos” e “O Ditador”. Quando terminaram as
filmagens de “Luzes da Ribalta“, em 1952, rumou com a família de férias para a Europa. Lá
recebeu a notícia que o FBI ameaçava-o com uma devassa em sua vida buscando provas de suas
ligações com o comunismo internacional. Nada foi provado. Eram os tempos da Guerra Fria e da
impiedosa perseguição macarthista a qualquer um que demonstrasse simpatia aos perigosos
“vermelhos”. As suspeitas contra Chaplin provinham da ajuda que ele dera para a fundação da
revista Liberator, de linha pró-comunista. Foi o suficiente para ser perseguido. Chaplin não
regressou mais aos Estados Unidos. Optou pelo exílio e fixou residência na Suíça. Só retornou
aos Estados Unidos em 1972, em uma viagem rápida para receber o Oscar por sua obra. Poucos
anos depois, na noite de natal de 1977, ele faleceu em sua casa no interior da Suíça. O alegado
comunismo de Chaplin foi uma lenda acalentada com intenções diversas, por macarthistas e
comunistas. Os relatórios do FBI dos anos 1940 o definiam como “comunista enrustido”.  A CIA,
por anos a fio, continuou investigando suas correspondências e as pessoas que o
visitavam. Sérgio Augusto esclarece a respeito do pensamento de Chaplin: “Sua ideologia,
vagamente socialista, era tão inconsequente quanto a passeata que o operário Carlitos lidera
sem querer, ao pegar no meio da rua uma bandeira vermelha, em Tempos modernos.”
(CHAPLIN, p. XV). Chaplin interpretou diversas figuras populares – garçom, padeiro, juiz de luta
de box, pedreiro, alfaiate, vidraceiro – mas é difícil extrair desses personagens “contradições do
capitalismo” ou uma “luta de classes”. Sua divisão do mundo em ricos e pobres, patrões e
empregados é por demais ingênua. O lado mau da sociedade é representado, quase sempre,
pela polícia que, diante de Carlitos, é ridicularizada pelas mirabolantes fugas do vagabundo.
Chaplin queria, acima de tudo, ser engraçado. Fonte CHAPLIN, Charlie. Minha vida. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1989.
Obrigado por compartilhar. Lembre-se de citar a fonte: https://ensinarhistoria.com.br/tempos-
modernos-ainda-tao-atual/ - Blog: Ensinar História - Joelza Ester Domingues

Tempos (ainda) modernos, 80 anos depois?


Cena icônica do filme “Tempos modernos”, de Charles Chaplin. Fotografia: Reprodução/IMDb

Lorena Holzmann
Há oitenta anos, foi lançado o clássico Tempos modernos, de Charles Chaplin. O filme foi feito
quando ainda se faziam sentir os nefastos efeitos da crise de 1929, que resultou em milhões de
trabalhadores jogados à miséria devido ao desemprego. No capitalismo, o ônus de qualquer
crise recai sobre grupos específicos da população, enquanto outros se beneficiam de seus
resultados. Quem é favorecido são os setores com poder de decisão, financistas e seus aliados,
que engordam suas fortunas sobre a desgraça da grande maioria, integrada por trabalhadores
assalariados, pequenos proprietários rurais e urbanos, entre outros segmentos da população.
Esses contextos de crise desaguam numa reorganização de todos as esferas da vida econômica,
social e política.

Focamos aqui a introdução de inovações nos processos de trabalho e de produção que


encontram, em contextos de crise, terreno fértil para sua implantação e que aceleram a
acumulação de capital, somando vantagens aos proprietários de empresas de qualquer
segmento da economia. Devido a altas taxas de desemprego que caracterizam esses momentos,
a resistência e a capacidade de luta coletiva dos trabalhadores tendem a enfraquecer diante de
qualquer iniciativa do capital que possa impor condições de trabalho inovadoras, que tem
significado, sempre, prejuízo aos trabalhadores.

Tempos modernos aborda uma dessas inovações, a produção na linha de montagem automática,


criada duas décadas antes nas fábricas de automóveis de Henry Ford. Esse sistema, que veio a
se difundir sob o conceito de fordismo, estava, então, em franca expansão em quase todo o
mundo que se industrializava.

As inovações de Ford intensificam, avançam sobre as proposições de Taylor, engenheiro


americano que reformulou profundamente o modo de organizar a produção e o trabalho no
início do século XX. Segundo o taylorismo, cada operário executa sempre a mesma tarefa,
fragmentada, resultando em pequenos ciclos operatórios, cumpridos em tempos e movimentos
preestabelecidos pela gerência.

Para fazer cumprir as normas prescritas, foi necessário uma estrutura superdimensionada de
controle e de poderes dentro das empresas. O modo de trabalhar usual antes dessa implantação
assegurava aos trabalhadores grande poder de controle sobre a produção, os ritmos de trabalho
e os modos de fazer, caracterizando o que um autor chamou de “a opressão do trabalho sobre o
capital”, a que a máquina pôs fim. E isso tem a ver com a mais importante inovação de Ford: a
esteira móvel, que fixava cada trabalhador no seu posto de trabalho, executando tarefas
fragmentadas na velocidade do mecanismo, independentemente de sua intervenção. Se com
Taylor o modo de execução de cada tarefa era prescrita, com Ford esse modo é imposto pela
velocidade da esteira. É a submissão do homem à máquina. Com Ford, foi iniciada a produção
em massa, caracterizada pela fabricação de grandes lotes de produtos iguais, com pequenas
variações, e com base tecnológica eletromecânica.

Na concepção global de Ford (que inclui uma ideia de sociedade nova a ser criada, sem bancos,
sem sindicatos, sem influências que ele chamava de orientalismos, remetendo à primitiva
sociedade americana que ele acreditava ter existido), há outros elementos decisivos, que
acabaram sendo abandonados em sua difusão em ambientes distintos de sua origem,
preservando-se o sistema de organização dos processos de trabalho e de produção, paradigma
hegemônico no século XX.

Carlitos, o personagem do filme, consegue um emprego numa fábrica (o que se produz lá?) e
ocupa um posto de trabalho ao longo de uma esteira móvel. Deve ajustar parafusos que se
sucedem a sua frente em velocidade tal que não lhe permite espantar um inseto que o perturba
em sua tarefa. A esteira é frequentemente acelerada por um sujeito fora do chão da fábrica, a
fim de elevar a produtividade. A máquina devora o homem, tritura-o e o regurgita.

O trabalho repetitivo, fragmentado, de curto ciclo operatório, o modo e a velocidade em que


deve ser executado, definido pela gerência sem levar em conta as condições dos
operadores/operários, provoca no protagonista perturbações mentais que o fazem confundir
botões das roupas das mulheres com quem cruza na empresa ou na rua com os parafusos que
deve ajustar na linha de montagem. Seu ataque às mulheres com as tenazes que são seu
instrumento de trabalho leva-o a ser internado num manicômio.

Desde a década de 1970, o capitalismo vem passando por transformações em todos os âmbitos,
desde a organização nos locais de trabalho até a definição de políticas macroeconômicas, sociais
e políticas. Os argumentos da pretensa superação do modelo fordista se espelham na
experiência do chamado “modelo japonês”, conjunto de princípios, técnicas e protocolos
iniciados nos anos 1950 na fábrica Toyota, no Japão, daí o conceito de toyotismo que o
identifica. Do ponto de vista político e social, uma atribuída rigidez do fordismo (tanto em
termos tecnológicos como nas relações contratuais entre capital e trabalho) é quebrada pela
inovação tecnológica de base eletroeletrônica e pela flexibilidade propiciada pelas políticas
neoliberais que vão se expandindo e consolidando a partir dos anos 1980 em âmbito mundial.
Esse conjunto de fatores favorece a reestruturação produtiva em curso.

As mudanças nos processos de trabalho e de produção, sob a égide do toyotismo, substituem o


trabalho individualizado pelo trabalho em equipe, reduzem os níveis hierárquicos nas empresas,
delegando aos próprios trabalhadores as funções de controle sobre o desempenho de cada um,
quebrando possíveis relações de solidariedade nos integrantes das equipes, pois a avaliação de
desempenho do conjunto é o resultado do esforço de cada um, controlado e cobrado pelos
demais. O alcance de metas definidas pela empresa e sempre reatualizadas se torna o acicate
do dia-a-dia de trabalho. A especialização extrema nos sistemas taylorista e fordista – cada
trabalhador executa sempre e repetidamente a mesma operação fragmentada e opera somente
uma máquina – dá lugar, no toyotismo, a requerer de cada trabalhador que seja capaz de
executar diferentes tarefas e operar mais de uma máquina que integram a célula de
manufatura. É a demanda de polivalência. Investigações têm apontado a intensificação do
trabalho, isto é, ele torna-se mais comprimido, requerendo mais esforço dos executantes e uma
redução dos tempos mortos ou da porosidade da jornada de trabalho, pequenos fragmentos de
tempo em que o trabalhador não está produzindo.

Há mudanças expressivas na terminologia no mundo do trabalho. O empregados passam a ser


colaboradores, pretendendo o fim do confronto de classe entre trabalho e capital; os
colaboradores são estimulados à participação propondo permanentemente melhorias nos
processos produtivos, buscando soluções no momento em que possíveis problemas sejam
detectados, por meio de programas como CCQ, 5 S, caixas de sugestões, grupos de melhorias
contínuas, entre outros.

Segundo o discurso gerencial, esse conjunto de mudanças garante um trabalho mais desafiador,
gratificante e menos alienante. Uma numerosa literatura tem evidenciado que a realidade não
corresponde a esse discurso. Um estudo realizado por uma grande equipe de pesquisadores
espanhóis constatou que essas inovações são uma versão renovada do taylorismo-fordismo,
pois as contribuições dos trabalhadores avaliadas positivamente e adotadas pelas empresas
retornam a eles como normas a serem cumpridas obrigatoriamente.

Considerando, no contexto dessa reestruturação, apenas aspectos relacionados ao processo de


trabalho, há críticas a eles que apontam-na como um conjunto de estratégias do capital para
potencializar sua acumulação. Mas os resultados positivos que têm sido obtidos fazem desse
novo modelo de organização a referência para as transformações introduzidas nas empresas,
levando à formulação de teses do fim do fordismo.

A defesa desta tese – enquanto organização do trabalho – baseia-se na observação da ampla


aceitação e difusão desse novo modelo, considerando, por vezes, como se ele já fosse, hoje, a
forma exclusiva de organização da produção e do trabalho. Essa tese parece desconhecer a
sobrevivência do “antigo” e sua capacidade de se combinar com as inovações em curso, tanto
no âmbito das empresas como na economia global.

Cartaz estadunidense do filme “Tempos modernos”. Fotografia: Reprodução/IMDb


Diante da atualidade da acumulação flexível que identifica o toyotismo, os Tempos modernos de
Carlitos são o “antigo”, superado por inovações técnicas e organizacionais que trazem benefícios
aos trabalhadores, levando à superação do trabalho alienado e alienante da linha de montagem,
valorizando o “saber operário” que o taylorismo-fordismo tornara obsoleto dentro das
empresas.

Contradizendo a tese, a antigo vivenciado por Carlitos sobrevive em todo o mundo. Novas
regiões de produção industrial integradas ao mercado mundial, como alguns países asiáticos, ou
empreendimentos nas mais importantes cidades do mundo, têm reproduzido condições de
trabalho semelhantes às vividas pelo personagem. Milhares de homens e mulheres trabalham
em condições as vezes muito próximas às de escravidão, executando tarefas fragmentadas,
repetitivas, relegados a uma vida degradada, com repercussões sobre sua saúde física e mental.
O taylorismo-fordismo está vivo, mesmo no interior de empresas consideradas modernas, que
combinam diferentes sistemas de organização do trabalho, em consonância com seus interesses
e suas metas de produtividade.

Ainda que mudanças significativas no mundo do trabalho foram difundidas e adotadas em


grande escala no mundo todo, a ficção de Tempos modernos continua sendo, passados 80 anos,
uma realidade incontestável.

Lorena Holzmann é Socióloga, Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo.


Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Sociologia/UFRGS.

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