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ANDRÉ DA ROCHA SILVA

CADEIA DE CUSTÓDIA PARA VEÍCULOS AUTOMOTORES


E SUA IMPORTÂNCIA NA SEGURANÇA PÚBLICA:
Uma proposta de aperfeiçoamento

Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia


apresentada ao Departamento de Estudos da
Escola Superior de Guerra como requisito à
obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos
de Política e Estratégia.

Orientador: CMG (R1) Guilherme Sandoval Góes.

Rio de Janeiro
2021
1

C2021ESG
Este trabalho, nos termos de legislação
que resguarda os direitos autorais, é
considerado propriedade da ESCOLA
SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É
permitida a transcrição parcial de textos
do trabalho, ou mencioná-los, para
comentários e citações, desde que sem
propósitos comerciais e que seja feita a
referência bibliográfica completa.
Os conceitos expressos neste trabalho
são de responsabilidade do autor e não
expressam qualquer orientação
institucional da ESG.

_________________________________
ANDRÉ DA ROCHA SILVA

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

S512c Silva, André da Rocha


Cadeia de custódia para veículos automotores e sua importância na
segurança pública: uma proposta de aperfeiçoamento / Perito criminal
André da Rocha Silva.- Rio de Janeiro: ESG, 2021.
51 f.

Orientador: CMG (R1) Guilherme Sandoval Góes


Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à
obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos Política e Estratégia
(CAEPE), 2021.

1. Investigação criminal - Brasil. 2. Prova pericial. 3. Crimes


transnacionais. 4. Veículos a motor – Brasil. I.Título.

CDD – 363.25

Elaborada pelo bibliotecário Antonio Rocha Freire Milhomens – CRB-7/5917


2

Aos meus pais Valdemar (in memoriam)


e Mirian, por me ensinarem os valores
que hoje moldam o meu caráter.
A minha esposa Marilu e a meus filhos
Gabriela e Izac, pela compreensão nos
momentos em que lhes furtei a minha
presença, dadas às atividades da Escola
Superior de Guerra.
3

AGRADECIMENTOS

Antes que o faça a qualquer pessoa, devo apresentar minha homenagem a


Deus, Supremo Arquiteto de todo o universo, sem a ajuda do qual, não seria
possível a conclusão desta obra.
À minha amada esposa Marilu por todas as palavras de encorajamento e
aos meus filhos Gabriela e Izac, pelo apoio incondicional durante toda a jornada do
ano em curso.
À Escola Superior de Guerra, pela oportunidade que me foi ofertada para a
realização do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia.
À todo o Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra pelo
conhecimento transmitido, em especial, ao meu orientador, professor Guilherme
Sandoval, o qual ajudou diretamente na conclusão do presente trabalho.

Por fim, aos colegas estagiários da Turma Superação Nacional, a turma das
galáxias, pelo companheirismo demosntrado em todos os momentos.
4

“Porquanto não há nada oculto que não


venha a ser revelado, e nada
escondido que não venha a ser
conhecido e trazido à luz.”

Jesus Cristo
5

RESUMO

A presente monografia aborda a cadeia de custódia como o elemento primordial na


garantia da idoneidade dos vestígios de um crime. O objetivo deste estudo é, a partir
do diagnóstico da situação da aplicação da cadeia de custódia no Brasil, fornecer
subsídios que sirvam de base para a implementação de uma metodologia para
cadeia de custódia de veículos automotores. A cadeia de custódia vinha sendo
negligenciada no Brasil, porém, recentemente, o conceito de cadeia de custódia foi
inserido no Código de Processo Penal através da Lei nº 13.964/2019. A execução da
cadeia de custódia, conforme definido na citada Lei, é realizada em várias etapas,
sendo que duas destas, o acondicionamento e o armazenamento, apresentam
embaraços a serem superados quando o artefato a ser periciado possui dimensões
avantajadas, tais como os veículos automotores e assemelhados. A cadeia de
custódia para tais objetos ainda é executada de forma que se torna inviável garantir
a idoneidade da prova material para este caso. É corriqueira a utilização de veículos
automotores na prática de diversos crimes, quando não, o próprio veículo é o objeto
do crime. Muitos destes crimes, como o tráfico de entorpecentes, são transnacionais,
gerando ameaças à segurança e à defesa nacionais. Considerando ser frequente a
utilização de veículos cujos sinais identificadores foram adulterados na prática
destes crimes, torna-se premente o aperfeiçoamento da cadeia de custódia de modo
a garantir a idoneidade da prova material. Neste estudo, o ponto de partida foi o
exame do estágio de implantação da cadeia de custódia nos órgãos responsáveis
pela sua execução, notadamente no acondicionamento e armazenamento de
veículos automotores, identificando suas dificuldades de ordem estrutural, logística e
de pessoal existentes. Em especial, foi realizada a análise do fluxo metodológico
empregado pela Polícia Científica do Rio Grande do Norte. Por fim, é proposta uma
metodologia exequível para a cadeia de custódia de veículos automotores e
assemelhados.
Palavras-chave: 1. Cadeia de custódia. 2. Polícia científica. 3.Veículos
automotores. 4. Crimes transnacionais. 5. Adulteração de sinais identificadores.
6

ABSTRACT

This monograph addresses the chain of custody as the primary element in


ensuring the suitability of the traces of a crime. The objective of this study is,
from the diagnosis of the situation of the application of the chain of custody in
Brazil, to provide subsidies that serve as a basis for the implementation of a
methodology for the chain of custody of automotive vehicles. The chain of
custody had been neglected in Brazil, however, recently, the concept of chain of
custody was inserted in the Code of Criminal Procedure through Law No.
13.964/2019. The execution of the chain of custody, as defined in the
aforementioned Law, is carried out in several stages, two of which, packaging
and storage, present obstacles to be overcome when the artifact to be inspected
has large dimensions, such as motor vehicles and the like. The chain of custody
for such objects is still carried out in such a way that it is impracticable to
guarantee the suitability of the material evidence for this case. It is common to
use motor vehicles in the commission of various crimes, when not, the vehicle
itself is the object of the crime. Many of these crimes, such as drug trafficking,
are transnational, generating threats to national security and defense.
Considering that the use of vehicles whose identifying signs were altered in the
commission of these crimes is frequent, it is urgent to improve the chain of
custody in order to guarantee the suitability of the material evidence. In this
study, the starting point was the examination of the implementation stage of the
chain of custody in the agencies responsible for its execution, notably in the
packaging and storage of motor vehicles, identifying its structural, logistical and
personnel difficulties. In particular, an analysis of the methodological flow
employed by the Scientific Police of Rio Grande do Norte was carried out.
Finally, a feasible methodology for the chain of custody of automotive and similar
vehicles is proposed.
Keywords: 1. Chain of custody. 2. Scientific police. 3. Automotive vehicles. 4.
Transnational crimes. 5. Tampering with identifying signals
7

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Existência ou previsão da institucionalização da cadeia de custódia.. 26

Gráfico 2 – Estado da implementação da cadeia de custódia para veículos


automotores............................................................................................................ 27

Gráfico 3 – Local de armazenamento de veículos apreendidos a serem


periciados nas unidades localizadas nas capitais.................................................. 28

Gráfico 4 – Local de armazenamento de veículos apreendidos a serem


periciados nas unidades localizadas no interior..................................................... 29

Gráfico 5 – Controle de acesso aos locais de armazenamento de veículos


apreendidos a serem periciados nas unidades da capital...................................... 30

Gráfico 6 – Controle de acesso aos locais de armazenamento de veículos


apreendidos a serem periciados nas unidades do interior..................................... 30
8

LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotografia 1 – Conurbação entre as sedes dos municípios de Barracão (PR) e


Dionísio Cerqueira (SC) e a localidade argentina de Bernardo de Irigoyen........... 23

Fotografia 2 – Condições de armazenamento de veículos na DEGEPOL............. 35

Fotografia 3 – Terreno da Polícia Civil localizado da Zona Norte de Natal............ 36

Fotografia 4 – Terreno da unidade regional do ITEP em Mossoró/RN.................. 37

Fotografia 5 – Imagem latente do NIV original, revelada no exame químico


metalográfico........................................................................................................... 38

Fotografia 6 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da


unidade regional do ITEP em Mossoró................................................................... 45

Fotografia 7 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da


unidade regional do ITEP em Pau dos Ferros........................................................ 45

Fotografia 8 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da


unidade regional do ITEP em Caicó....................................................................... 46
9

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Configuração da escala de serviço atual do SIV................................. 41

Quadro 2 – Configuração da nova escala de serviço proposta para o SIV............ 43


10

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Quantitativo de veículos furtados ou roubados apreendidos pela


PRF em estados fronteiriços nos anos de 2001, 2010 e 2020............................... 27
11

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CPP – Código de Processo Penal


CV – Comando Vermelho
DEGEPOL – Delegacia Geral de Polícia Civil do Rio Grande do Norte
DEICOR – Divisão Especializada em Investigação e Combate ao Crime Organizado
DEPROV - Delegacia Especializada de Defesa da Propriedade de Veículos e
Cargas
DETRAN – Departamento Estadual de Trânsito
IC – Instituto de Criminalística
IDESF – Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras
ISO – International Organization for Standardization
ITEP – Instituto Técnico-Científico de Perícia
NIV – Número de Identificação Veicular
PCC – Primeiro Comando da Capital
PRF – Polícia Rodoviária Federal
SESED – Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social
SIV – Setor de Perícias de Identificação Veicular
12

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13
1.1 Objetivos e delimitação do estudo ............................................................................. 13
1.2 Justificativas para o estudo da temática .................................................................... 14
2 BASES TEÓRICAS DO CONCEITO DA CADEIA DE CUSTÓDIA E SEU PAPEL
NO PROCESSO PENAL ....................................................................................... 16
2.1 A Polícia Científica e a Prova Pericial ....................................................................... 16
2.2 A Importância da Cadeia de Custódia no Processo Penal ........................................ 18
2.3 Conceito de Cadeia de Custódia ............................................................................... 19
3 A IMPORTÂNCIA DA CADEIA DE CUSTÓDIA NO APRIMORAMENTO DA
SEGURANÇA E DEFESA NACIONAIS NOS CRIMES TRANSNACIONAIS ........ 20
3.1 A relação entre as Organizações Criminosas e a prática de crimes transnacionais .. 20
3.2 A extensão das fronteiras como fator facilitador no cometimento de crimes
transnacionais ................................................................................................................... 22
3.3 A participação de veículos automotores nos crimes transnacionais .......................... 23
3.4 A necessidade do aperfeiçoamento da cadeia de custódia para veículos automotores
25
4 BREVE ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE ARMAZENAMENTO DE VEÍCULOS
AUTOMOTORES ENVOLVIDOS EM CRIMES NO BRASIL................................. 26
5 VULNERABILIDADES ENCONTRADAS NA METODOLOGIA EMPREGADA NO
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE.............................................................. 32
5.1 Passos iniciais........................................................................................................... 32
5.2 A inviabilidade do acondicionamento ........................................................................ 33
5.3 O transporte e o armazenamento .............................................................................. 34
5.4 O exame pericial ....................................................................................................... 37
5.5 A etapa do descarte e demais considerações ........................................................... 39
6 PROPOSTA DE APERFEIÇOAMENTO DA CADEIA DE CUSTÓDIA PARA
VEÍCULOS AUTOMOTORES ............................................................................... 40
6.1 Reconfiguração do Setor de Perícias de Identificação Veicular do ITEP ................... 41
6.1.1 Situação Atual ............................................................................................................. 41
6.1.2 Configuração Proposta ............................................................................................... 42
6.2 Estabelecimento de Centrais de Custódia para veículos nas unidades regionais do
ITEP 44
7 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 47
8 REFERÊNCIAS...........................................................................................................49
13

1 INTRODUÇÃO

Hodiernamente, a cadeia de custódia ganhou extrema relevância em função


da Lei nº 13.964/2019, que introduziu tal conceito no Código de Processo Penal
(CPP). Com efeito, a partir da regulação do conceito de cadeia de custódia no CPP,
percebe-se facilmente a grande discrepância que existe entre a prática dos
operadores da segurança pública e o conteúdo do texto normativo, daí a
necessidade de reformulação de políticas nos diversos órgãos de polícia científica
nacionais para implantá-la conforme imposto na lei.
A despeito das diferenças encontradas entre os procedimentos praticados
em cada Unidade da Federação, o fato é que objetos de grandes dimensões, tais
como, os veículos automotores, dificultam, em especial, duas das etapas da cadeia
de custódia, definidas na referida Lei: o acondicionamento e o armazenamento.
De fato, tais veículos automotores são, eventualmente, periciados por
estarem envolvidos em diversos crimes, uma vez que podem ser utilizados como
meio na execução do crime, como transporte de entorpecentes, ou serem o próprio
objeto no qual o crime foi perpetrado, como, por exemplo, na adulteração de sinais
identificadores.
A ausência da prática da cadeia de custódia, sobretudo, a partir de sua
regulação por lei, põe em dúvida a idoneidade dos vestígios analisados e
interpretados pela perícia, fragilizando a prova, podendo resultar na liberdade de
criminosos, ou até mesmo, na privação de liberdade de inocentes.

1.1 Objetivos e delimitação do estudo

Como a análise dos procedimentos previstos na cadeia de custódia podem


contribuir para o aprimoramento da segurança pública e da defesa nacional nos
crimes transfronteiriços?
Esta monografia propõe como objetivo formular políticas de aperfeiçoamento
da segurança pública e da defesa nacional nos crimes transfronteiriços a partir do
exame do presente estágio de implantação da cadeia de custódia nos órgãos
responsáveis pela sua execução, notadamente no acondicionamento e
armazenamento de veículos automotores, identificando suas dificuldades de ordem
estrutural, logística e de pessoal existentes.
14

Desta forma, o trabalho pretende identificar as principais definições a


respeito da cadeia de custódia e seus impactos na segurança pública, bem como,
avaliar a eficácia do fluxo metodológico empregado pelo Instituto Técnico- Científico
de Perícia do Rio Grande do Norte (ITEP) na cadeia de custódia relativa a veículos
automotores, identificando possíveis incoerências com o preceituado em lei e as
carências estruturais e de pessoal. Por fim, propor uma metodologia exequível para
a cadeia de custódia que garanta a confiabilidade das provas.
O estudo ficará restrito ao desenvolvimento e a implementação de uma
metodologia para a cadeia de custódia na sua vertente “identificação veicular”.
Com efeito, a análise da cadeia de custódia e seus impactos na segurança
pública e na defesa nacional está inclusa no escopo das ciências forenses, que é um
ramo epistemiológico, abarcando os diversos campos da ciência, tais como as
engenharias e as ciências naturais.
Assim, os diversos institutos responsáveis pelas perícias criminais são
divididos em núcleos, conforme o tipo de perícia executada: crimes contra a vida
e/ou contra o patrimônio, balística forense, engenharia e meio ambiente, perícias de
áudio e imagem, merceologia, documentoscopia e grafotecnia, crimes de trânsito,
perícias papiloscópicas, informática forense, identificação veicular, contabilidade
forense, genética forense e química forense, dentre outros.
Cada um dos diversos tipos de perícia acima explicitadas, possui
características únicas que demandam especificidades próprias no cumprimento do
fluxo da cadeia de custódia. O estudo da cadeia de custódia deve sempre ser
realizado considerando estas diferenças, tornando inviável o estudo da cadeia de
custódia para todas as áreas, considerando o espaço temporal disponível.

1.2 Justificativas para o estudo da temática

Levando-se em consideração que o conceito de cadeia de custódia abarca o


conjunto de ações que registram a origem, identificação, coleta, controle,
transferência, análise e eventual descarte de evidências, a relevância do presente
trabalho surge com a necessidade de examinar os mecanismos utilizados pelos
operadores de segurança pública que finalizam a garantia da integridade dos
vestígios de crime deixados em veículos automotores na prática de crimes diversos
que envolvam tais objetos, garantindo a confiabilidade dos resultados apresentados
15

nos laudos periciais e porque não dizer, de todo o processo, até que ele seja
concluído.
Por razões culturais, a cadeia de custódia vinha sendo negligenciada no
Brasil. A falta de confiabilidade nas provas, devido a impossibilidade de uma
rastreabilidade idônea, já foi responsável pela recusa, por parte dos juízes, em
aceitar tais provas. Muitas vezes, essa falta de provas confiáveis, pode resultar na
liberdade de criminosos.
Diversos doutrinadores têm reconhecido a cadeia de custódia como o elo
fraco das investigações. Desde logo, percebe-se um evidente prejuízo para a
segurança pública da localidade em que tais criminosos atuem. Porém, indo mais
adiante, um ou mais destes criminosos podem ter participação direta na execução
de crimes transfronteiriços, o que passa a ser também, preocupação para a Defesa.
Os crimes transfronteiriços são caracterizados por ações criminais
realizadas geralmente por grupos organizados, envolvendo entes em ambos os
lados da fronteira. Conforme, Santos e Santos (2020, p. 230), “o espaço fronteiriço é
questão central para o debate relacionado às políticas públicas, principalmente
quando se dá enfoque às políticas de segurança pública”
Mesmo antes do advento da Lei nº 13.964/2019, a qual instituiu formalmente
a cadeia de custódia, a maior parte dos objetos já possuía uma cadeia de custódia
bem definida. Entretanto, alguns objetos, tais como os veículos automotores, não
possuem ainda, na maioria das situações, um fluxo que garanta a rastreabilidade
deles. A definição de um fluxo para a cadeia de custódia de veículos automotores
reveste-se de importância na medida em que veículos furtados e/ou adulterados são
utilizados na prática de diversos crimes, dentre eles, o transporte de entorpecentes
ou até mesmo, como moeda de troca.
Assim sendo, percebe-se a importância deste projeto, na identificação das
carências existentes, no tocante à estrutura e à formação técnica adequada dos
servidores públicos envolvidos na cadeia de custódia, a fim de elaborar uma
proposta assertiva para a questão.
A correta execução de todos os procedimentos previstos na Lei nº
13.964/2019, referentes à cadeia de custódia contribui para o aperfeiçoamento da
segurança pública e da Defesa Nacional nos crimes transnacionais.
16

2 BASES TEÓRICAS DO CONCEITO DA CADEIA DE CUSTÓDIA E SEU


PAPEL NO PROCESSO PENAL

Diversos meios de prova são utilizados em um processo penal,


apresentados nos artigos 158 a 239 do CPP: a prova pericial (1), o interrogatório do
acusado (2), a confissão (3), a declaração do ofendido (4), o depoimento das
testemunhas (5), o reconhecimento de pessoas e coisas (6), a acareação (7), os
documentos (8) e os indícios (9).
Os meios 2, 3, 4, 5, 6 e 7, por dependerem diretamente do fator humano,
podem ser “contaminados” pela emoção, pela inabilidade ou até mesmo má índole
da pessoa em narrar os fatos, dentre outras razões. A prova testemunhal chega a
ser chamada de “a prostituta das provas”, uma alusão à moralidade duvidosa das
profissionais do sexo. Por outro lado, o meio 1 é processado por órgãos periciais,
utilizando metodologia científica, sendo, portanto, isenta do fator humano. Os meios
8 e 9, quando processados pelos órgãos periciais, são amalgamados com o meio 1,
sendo as conclusões dessa análise, também isentas.
Evidenciada a importância da prova pericial no sistema jurídico, era de se
esperar que a prática da cadeia de custódia fosse observada de forma criteriosa. No
entanto, conforme já pormenorizado, a realidade descortina-se como algo
preocupante.

2.1 A Polícia Científica e a Prova Pericial

Dentre todos os meios de prova do processo penal, com toda certeza a


prova pericial é a mais importante, ao garantir a maior veracidade dos fatos de forma
científica e isenta, tendo em vista a sua materialidade. Tendo em vista as limitações
das provas não materiais com relação à credibilidade, “a evidência material, quando
identificada e apropriadamente tratada, oferece a melhor perspectiva para prover
informações objetivas e confiáveis envolvendo o incidente sob investigação”
(UNODC, 2010, p. 4).
De acordo com Dorea; Stumvoll e Quintela (2012, p. 15):

A prova pericial é produzida a partir de fundamentação científica dos


elementos materiais deixados pela ação delituosa, enquanto a
formação das chamadas provas subjetivas depende de testemunho
ou interpretação de pessoas, podendo ocorrer uma série de erros,
17

desde a simples falta de capacidade da pessoa em relatar o fato, até


a situação de má-fé, onde exista intenção de distorcer os fatos para
não se chegar a verdade, contribuindo para condenar um indivíduo
por um crime que não tenha cometido, deixando de lado a justiça. A
Criminalística evidência métodos científicos que são usados para a
elucidação dos crimes e ressalta a importância da perícia em crimes
que deixam vestígios.

Assim, depreende-se que os diversos órgãos de polícia científica atuam


como órgãos de apoio ao sistema judiciário, produzindo provas a partir do exame
pericial de vestígios coletados em locais de crimes, utilizando-se para tal, de
metodologia explicitamente técnico-científica. Conforme Espíndula (2013. p. 3-4):

A perícia no Brasil iniciou com a Medicina Legal, entretanto, com o


avanço técnico-científico e com a consequente elevação da
complexidade do conhecimento científico, diversos tipos de produção
de prova se tornaram mais frequentes e o raio de aplicabilidade da
prova pericial tornou-se mais abrangente. Frente a tal expansão do
conhecimento, Institutos de Perícias estaduais passaram a surgir,
com o intuito de suprir a demanda pericial nos diversos entes
federativos.

É evidente que a produção da prova pericial cabe a Polícia Científica, porém,


apenas recentemente foi definido o guardião destas provas. No fim do ano de 2019,
foi sancionada a Lei n. 13.964, conhecida como “Pacote Anticrime”. que nasceu da
ideia de aperfeiçoar da Legislação Penal e Processual Penal combatendo o crime e
a impunidade.
A nova Lei estabeleceu, por meio da inserção do art. 158-E, o encargo da
manutenção da cadeia de custódia aos Institutos de Criminalística das Polícias
Científicas, conforme segue: “todos [...] deverão ter uma Central de Custódia
destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada
diretamente ao órgão central de Perícia Oficial de natureza criminal” (BRASIL,
2019).
Não é novidade que a prática da ciência demanda altos investimentos, os
quais não têm sido aportados nos órgãos de Polícia Científica na medida
necessária. De acordo com Espíndula (2013), diversas carências nesta área podem
ser verificadas, tais como a inexistência ou obsolência de equipamentos e a
quantidade de peritos em número insuficiente para o atendimento da demanda.
Indubitavelmente, um encargo a mais para a Polícia Científica aumenta o desafio na
gestão de recursos já insuficientes.
18

A título de exemplo, pode-se citar a falta de verbas para a simples aquisição


de embalagens adequadas para a coleta e armazenamento de vestígios coletados
em locais de crime. O óbice aqui apontado reflete-se nos coletados junto ao Sistema
Informatizado de Gestão de Perícias do ITEP, os quais dão conta que apenas no
ano de 2020, somente o núcleo de perícias externas do Instituto de Criminalística
recolheu 3.368 vestígios, todos acondicionados em embalagens inadequadas,
gerando insegurança processual.

2.2 A Importância da Cadeia de Custódia no Processo Penal

A cadeia de custódia, quando executada em sua plenitude, torna-se a


garantia de rastreabilidade e consequente credibilidade das provas, uma vez que
segue os vestígios desde a coleta executada em local de crime, até o descarte,
acompanhando-os em todos os trajetos e exames aos quais eles são submetidos.
Entretanto, se cuidados básicos na execução da cadeia de custódia de
vestígios encontrados (na cena de crime, em objetos utilizados no crime ou até
mesmo na vítima e suas vestes), não forem observados pelos diversos institutos que
compõem a polícia científica, seja por falta de condições técnicas do órgão em
garantir a integridade dos vestígios, seja por negligência do operador de segurança
pública, a idoneidade das provas poderá ser questionada (MARINHO, 2015).
Em meados de 1994, ganhou destaque a projeção em todas as mídias, em
especial nos Estados Unidos da América, o caso do ex-jogador de futebol americano
O. J. Simpson, celebridade naquele país, foi acusado do assassinato de sua ex-
mulher (Nicole Brown) e seu amigo (Ronald Goldman). Todas as provas materiais
apontavam de forma contundente para a culpabilidade de Simpson, no entanto, O. J.
foi absolvido. A defesa do ex-jogador apontou, conforme indicam Bernacchi e
Rodrigues (2018), diversas falhas nos procedimentos relativos à cadeia de custódia,
tais como a coleta mal executada, permitindo a contaminação dos vestígios, o que
desacreditava a prova material e que ainda tais evidências poderiam ter sido
plantadas.
Com respeito a fragilidade da prova material no Brasil, Machado (2017, p.
10) afirma que “a cadeia de custódia tem sido reconhecida como o elo fraco em
investigações criminais [...]. Falhas nos procedimentos da cadeia de custódia têm
sido detectadas até mesmo entre os profissionais forenses”.
19

2.3 Conceito de Cadeia de Custódia

Demonstrada a importância da cadeia de custódia, resta agora conceituá-la.


No Procedimento Operacional Padrão da Perícia Criminal, a cadeia de é definhada
como “o processo usado para manter e documentar a história cronológica dos
elementos materiais, que visa garantir a idoneidade e o seu rastreamento desde a
identificação e coleta, até sua destinação final” (BRASIL, 2013, p. 115).
Outra definição importante seria o “registro cronológico do manuseio e
armazenamento de um item desde o seu ponto de coleta até a sua restituição ou
descarte final”, conforme expresso na Norma nº 21.043 da Organização
Internacional de Normalização - ISO, que trata especificamente sobre Ciências
Forenses (ISO, 2018).
Por fim, no ano de 2019, a sanção da Lei n. 13.964, acima comentada,
positivou a definição de Cadeia de Custódia, in verbis:

Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os


procedimentos utilizados para manter e documentar a história
cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes,
para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento
até o descarte (BRASIL, 2019).

Com referência aos procedimentos da cadeia de custódia, encontramos


estabelecidas no art. 158-B do Código de Processo Penal, incluído pela Lei nº
13.964/2019, dez etapas, a seguir mencionadas: reconhecimento, isolamento,
fixação, coleta, acondicionamento, transporte, recebimento, processamento,
armazenamento e descarte.
20

3 A IMPORTÂNCIA DA CADEIA DE CUSTÓDIA NO APRIMORAMENTO DA


SEGURANÇA E DEFESA NACIONAIS NOS CRIMES TRANSNACIONAIS

Conforme já bem fundamentado, o objetivo da cadeia de custódia é garantir


que as evidências de crime encontradas pela polícia científica sejam aceitas no
tribunal. Para tanto, de acordo com Bonomi, Casini e Ciccotelli (2018), a cadeia de
custódia deve garantir a idoneidade das provas materiais durante todo o transcurso
do processo, ainda que sejam processadas em vários setores periciais e mesmo
durante o transporte para local diverso de seu depósito, caso necessário.
Quando o local ou objeto periciado ou a ser periciado é manipulado por
pessoa não autorizada e sem a expertise necessária, esta pode contaminar a prova,
tornando-a inidônea. “A qualidade da perícia depende, em grande parte, das
condições em que estiver o lugar ou objeto a ser periciado” (LOPES JR, 2018, pág.
427). Em alguns casos, quando o armazenamento é realizado sem as condições
necessárias, é possível que o objeto venha a ser extraviado, prejudicando
sobremodo o trabalho da polícia científica. Tais situações põem em risco a solução
do caso investigado e abre brecha para a liberdade de criminosos, em especial,
daqueles ligados a organizações criminosas.

3.1 A relação entre as Organizações Criminosas e a prática de crimes


transnacionais

Conforme acima explicitado, percebe-se como primordial a garantia das


provas materiais, pois sensação de impunidade gerada pela lacuna deixada pela
inobservância da cadeia de custódia presta-se de estímulo à prática da
criminalidade. Neste cenário, ganha destaque o avanço das facções criminosas no
Brasil, conforme assevera Passos (2021, pág. 15):

Analisando o atual cenário da criminalidade organizada no Brasil [...]


fica evidente que são as organizações criminosas [...] que melhor
representam a complexidade e periculosidade do crime organizado
no país. Exemplos desse tipo de organização são o Comando
Vermelho e o Primeiro Comando da Capital, que são as duas
maiores facções criminosas do país e que possuem fortes ligações
transnacionais.

O Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) são as


maiores facções criminosas do Brasil, sendo esta última, a maior delas. O PCC está
21

presente em todas as unidades da federação e em países vizinhos. Desde a sua


fundação, em 1993, o PCC passou de uma mera facção local, controlando apenas o
tráfico de drogas nas favelas de São Paulo, para uma facção transnacional,
experimentando um crescimento exponencial. Conforme Lacerda et al. (2017, p. 63),
o PCC “conta com 22,6 mil membros e controla operações que se estendem a
países como Paraguai, Bolívia, Peru e Colômbia”.
Uma clara demonstração do poderio das facções criminais é o fato de
possuírem armamentos militares. No Rio de Janeiro, “o primeiro fuzil apreendido
com traficantes foi em maio de 1992. Agora a polícia recolhe cerca de 80 por mês”
(AMORIM, 2018, p. 412).
O fortalecimento das facções criminais nas últimas décadas também pode
ser observado em cifras monetárias. Somente o PCC teve renda bruta em 2016 de
R$ 272.000.000,00 (Lacerda et al, 2017). “A economia paralela hoje é responsável
por algo em torno de 15% a 20% da riqueza global” (GLENNY, 2008, p. 14). Tanto o
PCC como também o CV, no afã de fortalecerem-se ainda mais, veem na expansão
de seus negócios, notadamente nos vizinhos sul-americanos produtores de drogas,
uma grande mola propulsora.
O avanço das facções criminosas também é facilitado pela aproximação
destas com o poder político. Conforme Alessi (2018), as facções criminosas
promovem a campanha de candidatos a mandatos eletivos e proíbem, sob ameaças,
que outros candidatos façam campanha nas comunidades dominadas em grandes
metrópoles brasileiras.
No Brasil, a expansão do PCC e do CV, dentre outras facções criminosas,
como também, das milícias, representa uma ameaça à Segurança Nacional, haja
vista os elevados índices de violência, as fissuras causadas pelo crime organizado
no seio da sociedade, o problemático aumento da população carcerária no país, o
aliciamento e corrupção de servidores públicos, o atingimento de postos políticos por
parte de faccionados e a expansão internacional das organizações criminosas
brasileiras.

“Ressalte-se que os crimes de tráfico de drogas e de armas, em


inúmeras hipóteses, estão atrelados aos roubos de carga, roubos de
agências bancárias, corrupção e homicídios, sendo, portanto, as
facções criminosas uma ameaça à Segurança Nacional. O domínio
de territórios por organizações criminosas e o estabelecimento de um
‘parapoder’ afeta a Segurança Interna. O empoderamento financeiro
22

e político das facções criminosas, aliado à expansão das mesmas


em outros países, representa um desafio e um risco para a
Segurança Externa. A transnacionalidade do CV e do PCC, bem
como a arregimentação de cunho ideológico dos faccionados torna o
problema, inclusive, um desafio para a Defesa. Nesse sentido, as
Operações de Garantia da Lei e Ordem que foram executadas nos
últimos anos pelas Forças Armadas reforçam que as facções
criminosas afetam a Defesa Nacional” (PIMENTEL, 2019).

3.2 A extensão das fronteiras como fator facilitador no cometimento de crimes


transnacionais

Outro importante fator a ser considerado é a grande extensão das fronteiras


do Brasil com os países vizinhos, possuindo limites terrestres com nove dos onze
países da América do Sul e com Guiana Francesa (Departamento Ultramarino da
República Francesa), numa extensão de 16.886 km. Apenas Rússia e China
possuem fronteiras terrestres maiores que a brasileira. Tal extensão torna-se um
desafio, em especial para as instituições responsáveis pela segurança e defesa
nacionais.
A Faixa de Fronteira, faixa interna de 150 km de largura, paralela à linha
divisória terrestre do território nacional, considerada área indispensável à Segurança
Nacional, conforme definido na Lei. 6.634 de 2 de maio de 1979 é uma região
“complexa e peculiar, onde há uma interação e integração cultural e socioeconômica
com povos de outra nacionalidade, não se limitando a apenas uma divisão
geográfica” (GOMES & CATANHEDE, 2018).
Na Faixa de Fronteira estão localizadas 33 cidades gêmeas, cidades
localizadas no limite internacional, podendo ou não apresentar conurbação com uma
cidade do país vizinho. Em muitas destas cidades pode-se cruzar a fronteira no
simples ato de atravessar uma rua. Tais fronteiras facilitam sobremodo a ação dos
criminosos, em especial, àqueles ligados às facções criminais. Nestas localidades,
veículos são furtados e facilmente trocados por entorpecentes na cidade vizinha. A
Fotografia 1 demostra, a título de exemplo, a conurbação entre as sedes dos
municípios de Barracão (PR) e Dionísio Cerqueira (SC) e a localidade argentina de
Bernardo de Irigoyen.
23

Fotografia 1 – Conurbação entre as sedes dos municípios de Barracão (PR) e


Dionísio Cerqueira (SC) e a localidade argentina de Bernardo de Irigoyen.

Bernardo de Irigoyen
(Argentina)

Dionísio Cerqueira (SC)


Barracão (PR)

Fonte: Google Maps. Acréscimo dos caracteres e marcações pelo autor.

3.3 A participação de veículos automotores nos crimes transnacionais

Embora não existam estatísticas precisas, os crimes de tráfico de drogas e


de armas, roubos de carga e de agências bancárias, muitas vezes entrelaçados
entre si, corriqueiramente são praticados com a utilização de veículos com sinais
identificadores adulterados.
A mídia é repleta de notícias a respeito do modus operandi acima
mencionado. Exemplificando, em 27 de julho do corrente ano, um homem foi
flagrado pela PRF transportando 44 kg de maconha escondida em compartimentos
da lataria de um veículo com sinais identificadores adulterados que fora furtado no
Rio de Janeiro (HOMEM..., 2021). Em 8 de março de 2016, um homem foi preso em
Sapucaia do Sul, Rio Grande do Sul, transportando uma carga roubada de cigarros
em um veículo com placas clonadas (HOMEM..., 2016).
24

Diariamente a Polícia Rodoviária Federal (PRF) realiza a apreensão de


veículos furtados ou roubados, a maioria deles com sinais identificadores
adulterados, nas fiscalizações que realiza. Consulta realizada à PRF revelou os a
seguintes valores, para veículos apreendidos nos estados fronteiriços:

Tabela 1 – Quantitativo de veículos furtados ou roubados apreendidos pela PRF em


estados fronteiriços nos anos de 2001, 2010 e 2020.

Ano Veículos apreendidos Variação em relação a 2001 Variação em relação a 2010


2001 849 --- ---
2010 1.509 + 78% ---
2020 2.925 + 244% + 94%
Fonte: PRF – Serviço de Informação ao Cidadão. SEI/PRF 33172299

Percebe-se que houve um aumento exponencial entre 2001 e 2020 no


quantitativo de veículos apreendidos com ocorrência de furto e roubo pela PRF.
Consoante publicação do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de
Fronteiras (IDESF), a utilização de veículos oriundos de furto ou roubo na prática de
outros crimes tem crescido. De acordo com o IDESF (2015), “a maior parte dos
carros apreendidos com contrabando [...] são procedentes de roubos e furtos”. Ainda
segundo a referida publicação, entre janeiro de 2014 e fevereiro de 2015, 71,51%
dos veículos com ocorrência de furto e roubo recuperados pela PRF, continham
carga de cigarros contrabandeados.
Outra publicação do mesmo Instituto afirma que os veículos apreendidos
com contrabando “foram objeto de crimes anteriores ao contrabando e em locais
afastados das áreas de fronteira, fator este, que contribui para um círculo vicioso
que se espalha por todo território brasileiro” (IDESF, 2018).
Embora as Polícias Civis das diversas Unidades da Federação
rotineiramente realizem apreensões de veículos roubados ou furtados, as
estatísticas incluem veículos (ou partes de veículos) recuperados em sucatas, como
também, os veículos recuperados junto às quadrilhas especializadas em ataques a
instituições financeiras em cidades do interior, ação conhecida como “cangaço
moderno”. Como tais atos podem ou não estar associados ao crime transnacional, o
presente estudo não levou em conta tais estatísticas.
25

3.4 A necessidade do aperfeiçoamento da cadeia de custódia para veículos


automotores

Apresentada a atuação das facções criminosas nos crimes transnacionais e


exposta a ampla utilização de veículos automotores roubados ou furtados, a grande
maioria deles com os sinais identificadores adulterados, no cometimento dos
referidos crimes, entende-se como necessária a definição de um fluxo para a cadeia
de custódia relativa à veículos automotores que garanta a idoneidade da prova
pericial produzida.
Identificadas ameaças à Segurança e a Defesa nacionais na prática de
crimes transnacionais, percebe-se a relevância da execução da cadeia de custódia
na repressão desta prática. Moraes (2007) assevera como um dos princípios
norteadores do direito penal a presunção de inocência, sendo obrigação do Estado a
comprovação da culpabilidade do acusado. Neste sentido, a não observância da
cadeia de custódia é utilizada com frequência nos tribunais na presunção da
inocência de acusados, posto que, tal inobservância “acarreta a falta de
confiabilidade do elemento probatório e, por consequência, sua ilicitude, impedindo a
sua valoração no processo” (MENEZES, BORRI & SOARES, 2018). A nulidade de
provas, ainda que robustas, advinda da quebra da cadeia de custódia, tem como
consequência a não condenação de potenciais criminosos.
26

4 BREVE ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE ARMAZENAMENTO DE VEÍCULOS


AUTOMOTORES ENVOLVIDOS EM CRIMES NO BRASIL

Nesta seção do estudo, são apresentados os resultados de uma pesquisa


suscinta realizada junto às Polícias Científicas das diversas Unidades da Federação,
objetivando verificar, em linhas gerais, as condições de armazenagem de veículos
automotores, tendo em vista o cumprimento do preceituado na cadeia de custódia,
conforme a Lei nº 13.964/2019.
A pesquisa foi realizada através do aplicativo de gerenciamento de
pesquisas Google Forms, sendo o link de acesso ao questionário, enviado aos
Setores de Identificação Veicular dos Institutos de Criminalística ou órgão
equivalente de cada uma das Unidades da Federação. Das 27 Unidades, apenas 2,
Tocantins e Roraima, não responderam ao questionário.
A primeira pergunta referia-se à existência de Cadeia de Custódia
institucionalizada. Dos 25 institutos, 17 (68%) responderam de forma positiva, seja
por já terem institucionalizado procedimentos relativos à cadeia de custódia ou por
terem previsão de sua institucionalização no curto prazo (até fins de 2022), conforme
apresentado no Gráfico 1:

Gráfico 1 – Existência ou previsão da institucionalização da cadeia de custódia.

O Instituto de Criminalística (ou órgão equivalente) possui


Cadeia de Custódia institucionalizada?

7; 28%
10; 40%

8; 32%
Sim
Não possui e não há previsão de implantação no curto prazo
Não, mas possui previsão de implantação até final de 2022

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.
27

Apreende-se que a maioria dos institutos possuem preocupação com os


procedimentos relativos à cadeia de custódia. O Rio Grande do Norte integra o
grupo dos 7 estados, quantidade significativa, que sequer possuem previsão para a
institucionalização da cadeia de custódia.
A segunda pergunta referia-se à previsão de capítulo específico a respeito
da guarda e preservação de veículos automotores na cadeia de custódia
institucionalizada ou a ser institucionalizada. Dos 17 institutos que responderam de
forma positiva à pergunta anterior, apenas o Estado de Minas Gerais informou haver
capítulo específico para o tratamento de veículos automotores nos procedimentos
relativos à cadeia de custódia a serem institucionalizados. O resultado desta
pergunta pode ser visualizado no Gráfico 2:

Gráfico 2 – Estado da implementação da cadeia de custódia para veículos


automotores.

A Cadeia de Custódia (implantada ou a ser implantada)


possui capítulo específico que trate da guarda e
preservação de veículos automotores?
1; 6%

16; 94%

Sim Não

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.

Em geral, a estrutura das unidades das instituições de segurança públicas


localizadas nas capitais é melhor que a estrutura encontrada nas unidades do
interior, razão pela qual, as quatro próximas perguntas solicitaram respostas
específicas para as unidades localizadas nas capitais e para as unidades localizadas
28

no interior. A terceira e a quarta perguntas referiam-se ao local de guarda dos


veículos a serem periciados e a demais perguntas, referiam-se a segurança quanto
ao acesso de indivíduos estranhos ao processo investigativo.
Consoante o esperado, houve uma discrepância relevante entre os
resultados. Nas capitais, 56% das unidades informaram que os veículos apreendidos
ficam armazenados no pátio da delegacia, contra 71% das unidades no interior.
Embora o pátio da delegacia apresente alguma segurança, a vigilância é falha, em
especial à noite, quando trabalham apenas plantonistas. Ainda que seja designado
um agente em especial para tal trabalho, geralmente ele fica só, tendo que vigiar
uma área extensa, deixando o local vulnerável.
Os resultados para a terceira e a quarta perguntas são apresentados nos
Gráficos 3 (unidades localizadas nas capitais) e 4 (unidades localizadas no interior):

Gráfico 3 – Local de armazenamento de veículos apreendidos a serem periciados


nas unidades localizadas nas capitais.

Nas capitais, onde geralmente ficam os veículos


apreendidos a serem periciados?
2; 8%
2; 8%

3; 12%

14; 56%

4; 16%

Estacionado no pátio da delegacia


No Instituto, guardado em local fechado (acesso controlado)
No pátio do Detran
No Instituto, estacionado em local aberto (acesso não controlado)
Depósito Judiciário ou equivalente

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.
29

Gráfico 4 – Local de armazenamento de veículos apreendidos a serem periciados


nas unidades localizadas no interior.

No interior, onde geralmente ficam os veículos


apreendidos a serem periciados?
1; 4%
2; 8%
2; 8%

2; 9%

17; 71%

Estacionado no pátio da delegacia


Depósito Judiciário ou equivalente
No pátio do Detran
No Instituto, estacionado em local aberto (acesso não controlado)
Estacionado em frente à delegacia

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.

Se considerarmos todos os locais que apresentem vulnerabilidades


evidentes na segurança (armazenamento no pátio ou em frente à delegacia ou em
locais com acesso não controlado no instituto), temos que 62% das unidades
informaram que os veículos apreendidos ficam armazenados no pátio da delegacia,
contra 83% das unidades no interior. Tal condição foi refletida nas respostas
enviadas relativas à segurança quanto ao acesso de indivíduos estranhos ao
processo investigativo nos locais que não o instituto, onde os veículos são
armazenados.
Quanto às capitais, 19 Estados informaram que os veículos apreendidos não
ficam armazenados no instituto. Destes, 8 Estados, o equivalente a 42%, afirmaram
não haver garantia de controle de acesso para pessoas não autorizadas e outros 6
Estados, o equivalente a 32%, responderam que talvez haja essa garantia. Relativo
ao interior, 22 Estados informaram que os veículos apreendidos não ficam
armazenados no instituto. Destes, 11 Estados, o equivalente a 50%, afirmaram não
haver garantia de controle de acesso para pessoas não autorizadas e outros 6
Estados, o equivalente a 26%, responderam que talvez haja essa garantia.
30

As respostas para a quinta e a sexta perguntas são apresentadas nos


Gráficos 5 (unidades localizadas nas capitais) e 6 (unidades localizadas no interior):

Gráfico 5 – Controle de acesso aos locais de armazenamento de veículos


apreendidos a serem periciados nas unidades da capital.

Na Capital, caso os veículos apreendidos não fiquem


armazenados no Instituto, há garantia de controle de
acesso ao local onde os mesmos ficam armazenados?

5; 26%
8; 42%

6; 32%

Não Talvez Sim

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.

Gráfico 6 – Controle de acesso aos locais de armazenamento de veículos


apreendidos a serem periciados nas unidades do interior.

No interior, caso os veículos apreendidos não fiquem


armazenados no Instituto, há garantia de controle de
acesso ao local onde os mesmos ficam armazenados?

6; 26%
11; 48%

6; 26%

Não Talvez Sim

Fonte: Confeccionado pelo autor de acordo com as respostas ao questionário enviado aos
diversos institutos de criminalística, conforme link: https://docs.google.com/forms/d/1MX-
sRuPbvPeNw-mLFhLaqdDO-2dWXSPkXNOexBrfl0k/edit#responses.
31

Se por um lado a breve pesquisa ora apresentada demonstra que a maioria


das instituições responsáveis pela produção das provas científicas tem tomado
medidas para o implemento de rotinas relativas à prática da cadeia de custódia, em
atitude diametralmente oposta, as rotinas apresentadas em geral não contemplam
ações específicas para veículos automotores.
32

5 VULNERABILIDADES ENCONTRADAS NA METODOLOGIA EMPREGADA


NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Neste capítulo é analisado o fluxo da cadeia de custódia aplicado pelas


forças de segurança pública, descrevendo, em linhas gerais, e quando necessário,
com maior riqueza de detalhes, os procedimentos executados pelos operadores de
segurança pública para veículos automotores, o qual possui algumas peculiaridades
que o fazem ser distinto do fluxo normalmente empregado.

5.1 Passos iniciais

O primeiro passo da cadeia de custódia é o reconhecimento, o qual ocorre


quando o operador de segurança pública percebe alguma incongruência em um ou
mais sinais identificadores do veículo em momento de vistoria, como em uma blitz de
trânsito realizada por policiais.
Em qualquer operação policial, sempre que um operador de segurança
pública reconhece este ilícito, ele comunica seus superiores que estejam na
operação, os quais providenciarão o segundo passo, o isolamento do veículo,
consistindo na designação de um operador de segurança pública para ficar de
guarda até que seja providenciado o transporte do veículo para o local de
armazenamento.
O terceiro passo do fluxo da cadeia de custódia definido na lei seria a
fixação, definida como a descrição do objeto conforme encontrado no local de crime.
No entanto, o exame pericial para a identificação das codificações verdadeiras de
sinais identificadores adulterados só é realizado por peritos criminais especialistas
em identificação veicular, os quais são em pequeno número e geralmente não estão
disposição a todo momento.
Dos atuais 75 peritos criminais do ITEP, apenas 4 são especialistas em
identificação veicular. Atualmente, apenas um deles possui dedicação exclusiva ao
setor. Dos outros três especialistas, um deles encontra-se afastado para frequência
a curso de qualificação profissional e os demais concorrem a escala de plantão,
tendo pouca disponibilidade para atender a ocorrências desta natureza. Portanto,
torna-se necessário alterar a ordem do fluxo e realizar o transporte do veículo para o
local de armazenamento antes mesma da fixação.
33

5.2 A inviabilidade do acondicionamento

Para realizar o transporte, antes o veículo deveria passar pela etapa de


acondicionamento. Conforme preceitua o Art. 158-B, inciso V, incluído no CPP pela
Lei nº 13.964/2019, o acondicionamento é o “procedimento por meio do qual cada
vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas
características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação
da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento”.
Inexistem no mercado embalagens para objetos do tamanho de um
automóvel. Diversas soluções poderiam ser propostas, tais como o
acondicionamento em containers, mas o custo com o próprio container, a logística
para o transporte do objeto ao local da apreensão do veículo e a falta de um local
estruturado para armazenar os containers, inviabilizaria economicamente e
logisticamente a ideia.
Desde a emissão da solicitação do exame pericial até a emissão do laudo,
há o transcurso de 10 dias corridos e após a comunicação da recuperação do
veículo ao proprietário, este tem 60 dias para receber o veículo. Passado este prazo,
em caso de não comparecimento do proprietário, o veículo segue para leilão. Desde
o aviso do leilão até a retirada do veículo pelo arrematador, são mais 60 dias. Não
foram computados outros lapsos temporais como o prazo necessário para a
organização do edital do leilão e eventuais contratempos.
Considerando apenas os prazos citados, percebe-que um veículo poderia
passar no mínimo de 130 dias em um container, ou seja, mais de 4 meses. Na
prática, há veículos que ficam armazenados por mais de um ano nos pátios
controlados pela Polícia Civil. Somente o Setor de Perícias de Identificação Veicular
(SIV) do ITEP examinou nos últimos 5 anos completos, um quantitativo acima de
400 veículos ao longo de cada ano. Em 2018 foram 506 veículos, uma média de 42
veículos por mês, isto, sem contar os veículos apreendidos envolvidos em outros
crimes.
Consulta à Delegacia Especializada de Defesa da Propriedade de Veículos e
Cargas (DEPROV) em 29/06/2021 revelou 211 veículos apreendidos somente por
adulteração de sinais identificadores sob a responsabilidade daquela especializada.
Desta forma, torna-se inviável saber quantos containers seriam necessários, mas
seguramente, somente no Estado do Rio Grande do Norte, algumas centenas.
34

5.3 O transporte e o armazenamento

Dadas às dificuldades acima expostas, os veículos não são submetidos a


etapa do acondicionamento, passando diretamente a etapa de transporte.
Idealmente os veículos apreendidos deveriam ser transportados em caminhões do
tipo reboque, mas a Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social
(SESED) possui apenas um veículo desse tipo. Assim, na maioria das vezes, um
operador de segurança pública transporta o veículo dirigindo-o, quando há esta
possibilidade, até o local de armazenamento. A etapa seguinte do fluxo da cadeia de
custódia é o recebimento no local de armazenagem, ato formal que deverá ser
documentado.
Com relação ao armazenamento o Art. 158-B, inciso IX, do CPP o define
como o “procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a
ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente”. A guarda do
veículo deveria ser realizada no Instituto de Criminalística (IC) do ITEP, conforme
definido no Art. 158-E do CPP:

Todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de


custódia destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão
deve ser vinculada diretamente ao órgão central de perícia oficial de
natureza criminal. Também não há uma central única de cadeia de
custódia, deixando cada um dos diversos setores, responsável por
fazer a guarda de vestígios coletados em locais de crime.

Em que pese a existência de um projeto para a implantação de uma central


de custódia no Instituto, inexiste cronograma de execução finalizando a implantação
da referida central, bem como a mesma contempla apenas os objetos coletados em
locais de crime contra a vida e contra o patrimônio.
O SIV não possui um local próprio para depósito de veículos apreendidos,
sendo necessário concorrer por espaço em um pequeno galpão com outros setores
que porventura queiram realizar a guarda de veículos apreendidos envolvidos em
outros crimes, utilizando-o apenas para exames eventuais. Desta forma, a maioria
dos veículos apreendidos ficam armazenados no terreno da Delegacia Geral de
Polícia Civil do Rio Grande do Norte (DEGEPOL).
35

Embora a passagem pelos portões da DEGEPOL seja controlada, o terreno


possui dimensões consideráveis, escapando ao controle do porteiro. Agrava-se a
situação pelo fato da inexistência de controle por câmeras, sendo bastante
corriqueira a ação de vândalos e criminosos, inviabilizando a garantia da idoneidade
da prova pericial. Na fotografia 2, observam-se veículos armazenados na
DEGEPOL, desprovidos de garantia de inviolabilidade.

Fotografia 2 – Condições de armazenamento de veículos na DEGEPOL.

Fonte: Arquivo pessoal do autor.

Dentre outros locais onde os veículos apreendidos são armazenados na


Região Metropolitana de Natal, destacam-se um terreno na Zona Norte de Natal
pertencente à Polícia Civil, o pátio do Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN)
e o pátio do Depósito Judiciário. Outros locais, como os pátios das delegacias
distritais são eventualmente utilizados, porém, estes são casos excepcionais.
O terreno na Zona Norte sofre com as mesmas deficiências observadas na
DEGEPOL. Já os pátios do DETRAN e do Depósito Judiciário possuem contratos
com empresas de vigilância particulares, as quais utilizam porteiro e ronda
36

motorizada, além de diversas câmeras de segurança. Na fotografia 3, observa-se a


vulnerabilidade que assiste aos veículos armazenados no terreno da Polícia Civil
localizado da Zona Norte de Natal.

Fotografia 3 – Terreno da Polícia Civil localizado da Zona Norte de Natal.

Fonte: Arquivo pessoal do autor.

Ao contrário dos pátios administrados pela Polícia Civil, os pátios do


DETRAN e do Depósito Judiciário são monitorados por câmeras de segurança
durante as 24 horas por dia, possuem acesso controlado e ronda armada. De toda
forma, nenhum dos locais citados, exceto o galpão do ITEP, é de responsabilidade
da Polícia Científica.
Todo o exposto acima refere-se ao armazenamento de veículos apreendidos
na Região Metropolitana de Natal. No restante do Estado os veículos apreendidos
ficam armazenados nos pátios das Delegacias Regionais, cuja segurança é
questionável em razão das mesmas fragilidades observadas no Pátio da DEGEPOL.
Na cidade de Mossoró, a 280 km da capital, há uma unidade regional do ITEP que
possui um terreno de dimensões razoáveis, onde também são armazenados
37

veículos apreendidos, porém, o controle de acesso é bastante frágil: os muros são


baixos, facilitando o acesso e não há vigilância, conforme depreende-se da
Fotografia 4.

Fotografia 4 – Terreno da unidade regional do ITEP em Mossoró/RN.

Fotografia: Arquivo pessoal do autor.

5.4 O exame pericial

Uma vez armazenado o veículo, somente então o ITEP é comunicado da


necessidade de perícia do veículo. Dada a grande demanda de serviços da SIV e
havendo poucos profissionais habilitados, tais exames são agendados, quando
possível, para a semana seguinte à chegada do pedido de exame pericial. No
comparecimento do perito criminal ao local de armazenamento serão realizadas as
etapas de fixação (acima já explicada) e de processamento, que é o exame pericial
propriamente dito.
A técnica mais utilizada pela polícia científica na perícia de veículos
apresentando sinais identificadores adulterados é o exame químico metalográfico,
no qual são utilizados reagentes específicos para a promoção da corrosão
controlada do metal base, sendo este, a peça específica onde o Número de
38

Identificação Veicular (NIV), conhecido no meio popular como número do chassi, é


gravado. Conforme explica Lima (2016), a reação na superfície onde o NIV é
gravado promove a corrosão mais intensa nas regiões com grãos cristalinos
deformados pela marcação original do NIV, devido a tensões residuais ainda
existentes do processo de gravação no metal base. Esse processo gera um
contraste ótico permitindo a observação dos caracteres suprimidos à vista
desarmada, sendo esta imagem chamada de codificação latente.
A visualização da imagem acima mencionada é por demais efêmera,
durando poucos minutos. Um eventual exame de contraprova torna-se bastante
dificultoso quando não inviável. Desta forma, a fixação da prova pericial nos casos
de exame de sinais identificadores onde foi utilizada a referida técnica se dá tão
somente através do registro fotográfico da imagem da codificação latente,
correspondente ao NIV original do veículo (caracteres mais tênues), conforme
ilustrado na Fotografia 5 abaixo apresentada.

Fotografia 5 – Imagem latente do NIV original, revelada no exame químico


metalográfico.

Fonte: Arquivo pessoal do autor.


39

5.5 A etapa do descarte e demais considerações

A última etapa da cadeia de custódia é o descarte. Para um veículo, essa


etapa pode ocorrer em duas situações, ambas após a emissão do laudo pericial:
recebimento do veículo pelo proprietário ou pela seguradora, casos nos quais o
veículo é identificado; recebimento para uso das forças policiais, quando há o
interesse destas e atendidos os requisitos legais ou o leilão, quando o veículo não
pôde ser identificado.
O ITEP ainda não possui documento que dê caráter formal à cadeia de
custódia. Não obstante, apresentado o fluxo da cadeia de custódia aplicado à
veículos automotores no Estado do Rio Grande do Norte, percebe-se, em linhas
gerais, que o fluxo da cadeia de custódia empregado pelo ITEP não difere muito
daquele apresentado no capítulo anterior, porém, depreende-se que o
acondicionamento e o armazenamento apresentam as maiores dificuldades para
serem cumpridos conforme preceitua a lei.
Em se tratando de veículos automotores, observadas as condições
impeditivas pelas quais o acondicionamento de veículos não é realizado e
considerando também, que a ausência do acondicionamento neste caso não macula
a integridade da prova, uma vez que, o isolamento, o transporte e o recebimento são
realizados sempre sob a supervisão de operadores de segurança pública,
garantindo idoneidade das condições prévias à fixação da prova, realizada no
exame pericial, entende-se que a preocupação com o acondicionamento dos
veículos é desnecessária.
Por fim, considerando que a execução do exame químico metalográfico
praticamente inviabiliza a realização de contraperícia, as atenções voltam-se para as
fragilidades observadas no armazenamento e para o baixo efetivo de peritos
criminais especialistas em identificação veicular.
40

6 PROPOSTA DE APERFEIÇOAMENTO DA CADEIA DE CUSTÓDIA PARA


VEÍCULOS AUTOMOTORES

No capítulo 4 foi observado de forma sucinta o estágio atual do implemento


da cadeia de custódia nos diversos Estados e no Distrito Federal. Ficou evidente
que na maioria das Unidades da Federação, procedimentos relativos à prática da
cadeia de custódia foram ou estão em vias de implementação, porém, dentre as 25
Unidades das quais foi possível obter informações, apenas o Estado de Minas
Gerais prevê procedimentos específicos para a cadeia de custódia relativos ao
armazenamento de veículos automotores com sinais identificadores adulterados.
Além da ausência da previsão de procedimentos específicos para a prática
da cadeia de custódia, a etapa do armazenamento foi entendida como crítica, dada
a não garantia da idoneidade da prova material, uma vez que inexiste a certeza do
não acesso de pessoas estranhas ao processo nos locais onde os veículos são
armazenados na maioria dos casos.
Por sua vez, no capítulo 5, foi esmiuçada a metodologia empregada no
Estado do Rio Grande do Norte na execução da cadeia de custódia relativa a
veículos automotores, sendo também entendida como crítica a etapa de
armazenamento, uma vez que a maioria dos veículos apreendidos ficam guardados
em local impróprio, permitindo o acesso de indivíduos estranhos ao processo.
Ainda de acordo com a análise da execução da cadeia de custódia, percebe-
se que, dada a especificidade da perícia relacionada à identificação veicular, salvo
exceções, um veículo com os sinais identificadores adulterados não é periciado no
local onde o mesmo é apreendido, uma vez que o efetivo de peritos criminais
especialistas na área é reduzido, sendo necessário o armazenamento do veículo
enquanto o exame pericial é agendado.
Considerando todo o exposto, foi entendido que o aperfeiçoamento da
execução da cadeia de custódia para veículos automotores se resume à eliminação
ou à mitigação de dois fatores críticos: a quantidade exígua de peritos criminais
especialistas em identificação veicular e os entraves identificados na etapa de
armazenamento na cadeia de custódia. Para ambas as situações são apresentadas
propostas na sequência do trabalho.
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6.1 Reconfiguração do Setor de Perícias de Identificação Veicular do ITEP

6.1.1 Situação Atual

Conforme já reportado, o SIV possui apenas quatro peritos que passaram


por treinamento específico para a realização de perícias de identificação veicular,
em especial, do exame químico metalográfico, sendo que um deles, encontra-se
afastado. O servidor afastado, ao retornar, deverá ser reintegrado ao setor, segundo
a previsão, em dedicação exclusiva. Porém, dois desses servidores, atualmente
integram a escala de plantão, prestando serviços ao SIV de forma eventual. Assim, o
quantitativo de servidores disponíveis em tempo integral ao setor é de apenas 2
peritos criminais.
A configuração do setor, já contando com o retorno do servidor afastado
conforme o previsto, deverá ser: na 1ª semana de trabalho, o Perito 1 realizará as
perícias agendadas enquanto o Perito 2 estará redigindo laudos. Na semana
seguinte, inverte-se, o Perito 2 realizará as perícias agendadas enquanto o Perito 1
estará redigindo laudos, conforme o Quadro 1.

Quadro 1 – Configuração da escala de serviço atual do SIV.

Servidor Semana 1 Semana 2


Perito 1 Realização de Exames Periciais Confecção de laudos
Perito 2 Confecção de laudos Realização de Exames Periciais
Fonte: Organizado pelo autor com base na escala de serviço do ITEP.

Não há espaço temporal para a realização, salvo em casos extraordinários,


de exames periciais no local onde o veículo é apreendido, ou para que o veículo, ato
contínuo à sua apreensão, seja encaminhado para exame no instituto. O perito que
realizará perícias na semana em curso tem para atender solicitações: da DEPROV,
da Divisão Especializada em Investigação e Combate ao Crime Organizado
(DEICOR), das diversas delegacias distritais e das delegacias localizadas no interior
do Estado, dentre outras solicitações.
Embora no interior os veículos apreendidos em uma região fiquem
concentrados preferencialmente nas Delegacias Regionais, dada a distância de
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algumas regionais, o atendimento das solicitações de exame pericial no interior do


Estado (cerca de 1/3 das solicitações) demanda viagens demoradas. A regional
mais longe, localizada no município de Pau dos Ferros, dista 392 km da Capital,
sendo necessárias cerca de 11 horas na estrada. Desta forma, os veículos são
acumulados para serem examinados em grandes lotes, serviço que é executado,
incluindo a viagem, envolvendo 2 ou 3 dias, conforme a demanda. Nesse período, o
perito criminal responsável pela realização de exames periciais na semana em
curso, fica indisponível para o atendimento de solicitações na Região Metropolitana.
O perito que estará na semana destinada à redação de laudos, necessita de
tempo adequado para a realização de tal atividade. Geralmente este perito não
consegue concluir os laudos dentro de sua carga horária, devido à alta demanda de
serviços, ficando no instituto após o horário regulamentar de serviço ou conclui os
laudos em sua residência. Muitas vezes, ocorre ainda que esse perito se vê
obrigado a redigir laudos durante a semana na qual está realizando exames
periciais. Desta forma, não é viável para esse perito assumir novos casos na
semana destinada à confecção de laudos.

6.1.2 Configuração Proposta

Sendo o volume se serviços no SIV de tal modo que os peritos criminais


estejam assoberbados de serviço, torna-se necessária uma reconfiguração onde
sejam acrescidos peritos criminais em dedicação exclusiva ao setor, sendo de bom
alvitre, a lotação de um perito criminal no regime de dedicação exclusiva em uma
das 3 unidades do interior. Neste caso, a escolha recai sobre unidade localizada em
Mossoró, a mais estruturada.
Logo, a configuração proposta para o SIV considera os quatro peritos
criminais especialistas no exame pericial de identificação veicular do ITEP
trabalhando com dedicação exclusiva ao setor. A nova configuração contempla 3
peritos criminais trabalhando na capital em revezamento de três semanas e um
perito criminal lotado na unidade regional de Mossoró.
Em Natal e na região coberta pela sede, a semana destinada à realização de
exames periciais é desdobrada em duas semanas: na semana 1, realização de
exames periciais na Capital, originadas no horário do expediente (segunda à sexta,
das 8 às 17 horas); na semana 2, realização de exames periciais agendados na
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capital e no interior, na região do Estado coberta pela capital. A semana destinada à


confecção de laudos permanece inalterada. Com relação ao perito criminal lotado na
unidade regional de Mossoró, este ficará responsável pelo atendimento dos exames
periciais solicitados às unidades regionais do ITEP localizadas em Mossoró, Pau dos
Ferros e Caicó. Assim, tem-se no Quadro 2, a configuração proposta para o SIV:

Quadro 2 - Configuração da nova escala de serviço proposta para o SIV.

Servidor Semana 1 Semana 2 Semana 3


Realização de exames
Realização de exames
periciais agendados
periciais originados na
Perito 1 na capital e no interior, Confecção de Laudos
Capital no horário de
na região do Estado
expediente
coberta pela capital
Realização de exames
Realização de exames
periciais agendados
periciais originados na
Perito 2 Confecção de laudos na capital e no interior,
Capital no horário de
na região do Estado
expediente
coberta pela capital
Realização de exames
Realização de exames
periciais agendados
periciais originados na
Perito 3 na capital e no interior, Confecção de laudos
Capital no horário de
na região do Estado
expediente
coberta pela capital
Atendimento das solicitações de exame pericial às unidades regionais de
Perito 4
Mossoró, Caicó e Pau dos Ferros
Fonte: Organizado pelo autor, com base na proposta de escala de serviço
apresentada.

Entende-se que a proposta reduzirá significativamente o tempo no qual os


veículos passam aguardando a realização da fixação, etapa da cadeia de custódia
na qual o vestígio é descrito detalhadamente conforme encontrado no corpo de
delito e “eternizado” por meio fotográfico, reduzindo, sensivelmente, o risco de
adulteração da prova material.
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Considerando a nova configuração, onde sempre existirá, salvo força maior,


um perito criminal à disposição para o atendimento de solicitações de exame pericial
originadas no horário de expediente, cerca 60% do quantitativo de veículos
apreendidos a serem periciados terão a etapa de fixação realizada antes da etapa
do armazenamento, onde se verificam as maiores vulnerabilidades.
Embora os veículos armazenados nas unidades policiais do interior
permaneçam sendo armazenados antes da etapa de fixação, o fato de existirem
peritos criminais disponíveis exclusivamente para a realização destes exames, o
tempo de espera nos pátios onde são armazenados e, consequentemente estando
vulneráveis a possíveis adulterações antes da etapa de fixação, será reduzido.

6.2 Estabelecimento de Centrais de Custódia para veículos nas unidades


regionais do ITEP

Visto que com a nova configuração do SIV proposta no item 6.1 a


possibilidade de adulteração da prova material antes da etapa de fixação é bastante
atenuada. Conforme já explanado, no interior do Estado os veículos apreendidos
ficam majoritariamente nos pátios das delegacias regionais, apresentando
segurança questionável.
Considerando o art. 158-E do CPP, o qual estabelece o encargo da
manutenção da cadeia de custódia aos Institutos de Criminalística e considerando
também, a existência de grandes espaços ainda isentos de construções nos próprios
terrenos das unidades regionais, conforme fotografias 6, 7 e 8, propõe-se a
construção de edificações em forma de galpões, destinadas à guarda de veículos
ainda não periciados, os quais funcionariam como Centrais de Custódia regionais.
Os galpões deverão contar com guarda patrimonial, de forma que o acesso aos
veículos seja controlado.
A unidade regional do ITEP em Mossoró possui um terreno de 3.376 m2,
sendo a área construída, de apenas 583 m2, sobrando ainda 2.793 m2 isentos de
construções. A área proposta a ser utilizada para o galpão ocuparia a área do
terreno da própria unidade regional do ITEP, conforme proposto na Fotografia 6. O
galpão teria o formato retangular, medindo 15 m X 30 m, totalizando 450 m2 de área
construída, podendo abrigar até 20 veículos de forma organizada.
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Fotografia 6 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da unidade


regional do ITEP em Mossoró.

Área proposta para a


Central de Custódia

Área da Unidade
Regional Mossoró

Fonte: Google Maps. Acréscimo dos caracteres e marcações pelo autor.

Fotografia 7 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da unidade


regional do ITEP em Pau dos Ferros.

Área da Unidade Regional


Pau dos Ferros

Área proposta para a


Central de Custódia

Fonte: Google Maps. Acréscimo dos caracteres e marcações pelo autor.


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Com relação à unidade regional de Pau dos Ferros, o terreno é de 3.464 m2,
sendo a área construída, de apenas 700 m2, sobrando ainda 2.764 m2 isentos de
construções. A área proposta a ser utilizada para o galpão também ocuparia a área
de terreno da própria unidade regional do ITEP, conforme pode ser observado na
Fotografia 7, sendo nos mesmos formato e tamanho do galpão a ser construído na
unidade regional de Mossoró.
Finalmente, a unidade regional de Caicó ocupa um terreno é de 5.975 m2,
sendo a área construída, de apenas 336 m2, sobrando ainda 5.639 m2 isentos de
construções. A área proposta a ser utilizada para o galpão, à exemplo das outras
unidades regionais, também ocuparia uma área de terreno da própria unidade
regional do Itep, nos mesmos moldes das anteriores, conforme apresentado na
Fotografia 8.

Fotografia 7 – Área proposta para a construção da Central de Custódia da unidade


regional do ITEP em Caicó.

Área proposta para a Área da Unidade


Central de Custódia Regional Caicó

Fonte: Google Maps. Acréscimo dos caracteres e marcações pelo autor.

Considerando ainda que nestes galpões pode ser implementado um


mezanino, este poderá ser utilizado para a guarda das demais provas materiais,
constituindo uma central de custódia única para cada unidade regional.
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7 CONCLUSÃO

O presente estudo propõe o aperfeiçoamento da cadeia de custódia para


veículos automotores utilizado na Polícia Científica através de duas medidas: a
reconfiguração do setor competente com a adição de servidores e a modificação da
rotina de trabalho; a implementação de centrais de custódia nas unidades regionais
de Polícia Científica localizadas no interior do Estado.
Demonstrados os objetivos e as justificativas para o estudo proposto,
inicialmente foram apresentadas as bases teóricas do conceito de cadeia de
custódia e o seu papel no processo penal, a importância da temática e o papel da
Polícia Científica na execução da cadeia de custódia. Esta seção foi complementada
com o conceito de cadeia de custódia.
Na fase seguinte, foi analisada a importância da cadeia de custódia no
aprimoramento da segurança e defesa nacionais nos crimes transnacionais. Nesta
etapa, foi analisada a participação das organizações criminosas nestes crimes e a
forma com a qual tais organizações utilizam veículos apresentando sinais de
identificação adulterados. Foi evidenciada como as dificuldades para o efetivo
controle das fronteiras brasileiras as tornam permeáveis, facilitando a prática de
diversos ilícitos.
Continuando o estudo, foi realizada uma breve análise das condições de
armazenamento dos veículos automotores envolvidos em crimes nas diversas
Unidades da Federação. Como metodologia, foi realizada uma pesquisa através do
aplicativo de gerenciamento de pesquisas Google Forms, contando com a
participação de 25 das 27 Unidades da Federação. Os resultados apresentados
demonstraram que nem todos as unidades de Polícia Científica possuem um
procedimento formal para a cadeia de custódia, e, mesmo dentre aquelas que
possuem, geralmente, não são observados procedimentos específicos para veículos
automotores. Verificou-se ainda na pesquisa, ser bastante comum o armazenamento
de veículos envolvidos em crimes em locais que não propiciam a segurança
adequada, sendo este fato, um fator potencial para o descrédito da prova material.
Na sequência, a metodologia aplicada ao fluxo da cadeia de custódia
empregado em veículos automotores no Estado do Rio Grande do Norte foi
analisada, buscando identificar as causas das vulnerabilidades existentes no
processo. Verificadas todas as etapas, o estudo então concentrou-se na principal
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dificuldade encontrada no armazenamento dos veículos apreendidos, visto que esta


era comum à encontrada na maioria das demais unidades da federação, em suma, a
inexistência de controle de acesso ao veículo armazenado, permitindo levantarem-
se dúvidas a respeito da idoneidade da prova material. A maioria dos veículos
apreendidos ficam armazenados no terreno DEGEPOL, local externo ao ITEP e com
guarda patrimonial deficitária.
Entendida a etapa de armazenamento como fator crítico, e, analisados o
quadro funcional e as peculiaridades que distinguem a unidade do ITEP localizada
na capital das unidades localizadas no interior, foi proposta uma reconfiguração do
SIV, mais especificamente na escala de trabalho, de modo o tempo no qual os
veículos passam aguardando a realização do exame pericial na unidade localizada
na capital, onde estão concentrados cerca de 60% do quantitativo de veículos a
serem periciados, poderá ser abreviado substancialmente, reduzindo,
sensivelmente, o risco de adulteração da prova material.
Por fim, tendo em vista que a reconfiguração do setor ainda não dirime o
lapso temporal existente entre a apreensão do veículo e a realização do exame
pericial nas 3 unidades localizadas no interior, foi proposta, aproveitando-se da
ociosidade dos terrenos onde estão localizadas as referidas unidades, a construção
de galpões para o armazenamento dos veículos apreendidos nos terrenos
pertencentes ao ITEP, junto ao prédio principal os quais funcionariam como centrais
de custódia. Nestes galpões, os quais contariam com a vigilância da guarda
patrimonial, o acesso poderia ser controlado, garantindo a idoneidade da prova
material.
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