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FICHAMENTO: HARTOG, François. Tempo e patrimônio.

VARIA HISTÓRIA, Belo


Horizonte, vol. 22, nº 36: p.261-273, Jul/Dez 2006.

- O artigo discute a memória e o patrimônio dentro de um novo regime de historicidade


do ocidente, que surgiu após a queda do muro de Berlim. Teria surgido um novo regime
de historicidade focada no presente? Para o autor há um crescimento da categoria
presente, na qual se vive entre o esquecimento completo e a vontade de nada esquecer.
- Historiador não tem pensado o tempo. Naturalizou e instrumentalizou sem refletir
sobre. O presente se torna onipresente presentismo. Como exemplo ele usa a
história do tempo presente.
- Sobre Reinhart Koselleck ele destaca as experiências temporais de “como em cada
presente, as dimensões temporais do passado e do futuro tinham sido postas em
relação”. Campo de exercício – experiência/ e horizonte de expectativa.
- O regime de historicidade pode ser definido como.” Em uma acepção restrita, é como
uma sociedade trata seu passado. Em uma acepção ampla, regime de historicidade
serviria para designar “a modalidade de consciência de si de uma comunidade humana”
p. 03
- Reflete a partir da experiência da queda do muro de Berlim “Que relações manter com
o passado, os passados, é claro, mas também, e fortemente, com o futuro? Sem esquecer
o presente ou, inversamente, correndo o risco de ver somente a ele: como, no sentido
próprio do termo, o habitar? Que destruir, que conservar, que reconstruir, que construir e
como? São decisões e ações que impõem uma relação explícita ao tempo. Quem se cega
a tal ponto que não consegue vê-lo?” p. 04
- Apagar o passado (queda do muro) ao mesmo tempo em que ainda se tem fragmentos,
restos e marcas de tempo. O muro foi destruído com sua instantânea museificação,
associada a mercantilização.
- Memória e patrimônio são tratados no artigo como conceitos que buscam produzir
sentido no tempo – são sentidos e sintomas da nossa relação com o tempo. Seriam
assim: “indícios, sintomas também de nossa relação com o tempo — formas diversas de
traduzir, refratar, seguir, contrariar a ordem do tempo: como testemunham as incertezas
ou uma “crise” da ordem presente do tempo. Uma questão nos acompanhará: um novo
regime de historicidade, centrado sobre o presente, estaria se formulando?”
- Assim, o autor questiona o que a universalização e ampliação do patrimônio causou no
tempo. O gosto pelo passado seria uma nostalgia por um antigo regime de historicidade
fora de uso?
- O apogeu da extensão do patrimônio fez substituir a história-memória pela história-
patrimônio, no caso da França. Patrimônio é a memória da história e símbolo de
identidade e nação. Assim, ele está circunscrito no campo da memória e e do território
operando como vetores da identidade. Não são as identidades rígidas e seguras, mas as
inquietas, que correm risco de se apagar. Não é a identidade que se possui mas a que se
é, seja sem saber ou sem ter podido saber. É o dever da memória o remorso
obrigação do patrimônio
- discussão interessante entre as dicotomias do conservar versus atualizar
Conservar: manter determinado tempo congelado. Fazer durar determinado bem
material como um vestígio a partir das ideias de autenticidade/originalidade e
cópia.
Atualizar: O que importa é a forma como o bem cultural se insere no presente –
caso dos templos de madeira chineses que são refeitos de tempos em tempos, ou
ou sacralização de um saber fazer. Ou seja, o objeto material conta menos do que
a produção intangível que o envolve. É importante pela relação com o tempo que
não é linear e que tem outras relações com o vestígio.
A vaga patrimonial em sintonia com a memória foi ampliada até o extremo. “Tudo
patrimônio”. Isso leva a uma aproximação do patrimônio com o presente. Ou seja, há
um presente que se historiciza. Outros sintomas: os projetos de reabilitação urbanas de
monumentos e prédios históricos. Museifica mantendo vivos e em uso os prédios.
“O patrimônio é constituído de testemunhos, grandes ou pequenos. Como em relação a
todo testemunho, nossa responsabilidade é de saber reconhecê-los em sua autenticidade,
mas além disso nossa responsabilidade se encontra engajada em relação às gerações
futuras.” P. 09/269
Declínio da ideia de monumento histórico com o crescimento do patrimônio. História
memória nacional é testada e posta em cheque pelas memórias setoriais, particulares,
setoriais. Patrimônios locais que associam memória e território
“O Estado-nação não impõe mais os seus valores, mas preserva mais rápido o que, no
presente, imediatamente, mesmo na urgência, é tido como “patrimônio” pelos diversos
atores sociais.16 O próprio monumento tende a ser suplantado pelo memorial: menos
monumento do que lugar de memória, onde se esforça para fazer viver a memória, a
mantê-la viva e a transmiti-la” p. 10/270
O patrimônio tornou-se um ramo da indústria do turismo, ou seja, está no ritmo da
economia e do mercado.
“Daí vem este olhar museológico lançado sobre o que nos cerca. Nós gostaríamos de
preparar, a partir de hoje, o museu de amanhã e reunir os arquivos de hoje como se fosse
já ontem, tomados que estamos entre a amnésia e a vontade de nada esquecer. Para
quem? Para nós, já.” P 11/271
“Do ponto de vista da relação ao tempo, de que esta proliferação patrimonial é sinal?
Ela é sinal de ruptura, seguramente, entre um presente e um passado, o sentimento
vivido da aceleração sendo uma forma de fazer a experiência: a mudança brusca de um
regime de memória para um outro, do qual Pierre Nora fez o ponto de partida de sua
interrogação. O percurso da noção mostrou indubitavelmente que o patrimônio jamais
se nutriu da continuidade, mas, ao contrário, de cortes e da problematização da ordem
do tempo, com todos os jogos de ausência e presença, do visível e do invisível, que
marcaram e guiaram as incessantes e sempre mutantes formas de produzir semióforos.
Começando pela intrusão deste ausente inaugural que foi Jesus naquilo que se tornou,
há muito tempo e por muito tempo, a tradição ocidental, com a imposição de uma nova
ordem do tempo.” P. 12/272

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