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FINANÇAS CORPORATIVAS
ASPECTOS JURÍDICOS
E ESTRATÉGICOS
■ O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada
poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação,
sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998).
Quem vender, expuser à venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra
ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem,
proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem, será solidariamente responsável
com o contrafator, nos termos dos artigos precedentes, respondendo como contrafatores o
importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior (art. 104 da Lei n. 9.610/98).
Finanças corporativas: aspectos jurídicos e estratégicos / Alexandre Couto Silva ... [et al.] ;
coordenação Sérgio Brotel, Henrique Barbosa. – 1. ed. – São Paulo: Atlas, 2016.
ISBN 978-85-970-0349-9
OPÇÕES DE FINANCIAMENTO
DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA
1. INTRODUÇÃO
O capítulo tem por objetivo apresentar breves apontamentos sobre a es-
trutura de capital de uma companhia, ou seja, capital próprio ou de terceiros –
patrimônio ou dívida.
Como se verá, a escolha de uma das alternativas de financiamento – patri-
mônio ou dívida – é uma decisão financeira e estratégica da companhia. Assim,
neste capítulo, analisam-se algumas opções de financiamento disponíveis no
mercado que podem abranger: (i) o acesso ao mercado de capitais por meio de
emissão pública de valores mobiliários aos investidores, seja com a emissão de
ações e aumento de capital social da companhia, ou de emissão de instrumentos
de dívida como debêntures ou notas promissórias no mercado acionário brasileiro,
ou com a emissão de bonds no mercado internacional; ou (ii) a contratação de
financiamento bancário, com linhas de crédito tradicionais ou linhas de finan-
ciamento governamentais.
O mercado de capitais é baseado no investimento em valores mobiliários (ações
e debêntures, commercial papers e letra financeira no Brasil e bonds no mercado
internacional). Esse mercado possibilita às companhias a captação de recursos dire-
tamente do público investidor em condições algumas vezes mais vantajosas do que
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460 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
1
Relacionado à maximização dos lucros (resultados) e à maximização do valor de mercado,
ver: MODIGLIANI, Franco; MILLER, Marton. The cost of capital: Corporation finance
and the theory of investment. American Economic Review, v. 48(3), June 1958, p. 262.
2
MODIGLIANI, Franco; MILLER, Marton. The cost of capital: Corporation finance and
the theory of investment. American Economic Review, v. 48(3), June 1958, p. 288.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 461
3
A afirmação não pode ser interpretada como se os administradores ou controladores
não tenham fundamento para escolher um tipo de financiamento a outro, ou que não
há nenhuma polícia ou pontos técnicos em um financiamento no nível da companhia.
MODIGLIANI, Franco; MILLER, Marton. The cost of capital: Corporation finance and
the theory of investment. American Economic Review, v. 48(3), June 1958, p. 292.
4
MODIGLIANI, Franco; MILLER, Marton. The cost of capital: Corporation finance and
the theory of investment. American Economic Review, v. 48(3), June 1958, p. 295-296.
5
MODIGLIANI, Franco; MILLER, Marton. The cost of capital: Corporation finance and
the theory of investment. American Economic Review, v. 48(3), June 1958, p. 261-297.
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462 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
taxa de desconto das ações alavancadas e das ações não alavancadas não poderia
ser a mesma, em razão de o investidor em ações alavancadas exigir um retorno
esperado superior para compensá-lo pelo risco. A alavancagem aumenta o risco
associado ao empreendimento, mesmo quando não há risco de inadimplemento.
Apesar de a dívida ter custo menor considerada isoladamente, esta pode aumen-
tar o custo de capital próprio. Nesse sentido, nos mercados de capitais perfeito, o
acionista exigirá um retorno mais alto que a dívida.
Por seu turno, no valor do patrimônio líquido a mercado (no mercado de
capitais perfeito), o valor das ações é igual ao valor de mercado dos ativos menos
o valor de mercado da dívida e outros passivos, critério econômico utilizado no
art. 264 da LSA para se avaliar e comparar os patrimônios líquidos das sociedades
controladora e controladoras ou de sociedades sob controle em comum.
No que tange ao orçamento de capital, este deverá ser elaborado levando-se
em consideração o custo médio ponderado de capital. O custo médio ponderado
de capital, sem imposto (WACC), pode ser assim representado: rwacc = (fração
do valor da empresa financiada por ações) × (custo de capital próprio) + (fração
do valor da empresa financiado por dívida) × (custo de capital de terceiros). No
mercado de capitais perfeito, o WACC de uma empresa é independente de sua
estrutura de capital, será igual ao seu custo de capital próprio se não for alavancada,
e corresponderá ao custo de capital de seus ativos. No mercado de capitais perfeito,
a lei do preço único induz que todas as transações financeiras terão um NPV (net
presente value) igual a zero (nem criam e nem destroem valor).
A alavancagem aumenta o risco e o custo do capital próprio. Entretanto, o
seu custo médio ponderado de capital (WACC), o seu valor total e o preço de suas
ações permanecem inalterados em consequência de tal mudança, devido ao fato
de a estrutura de capital de uma companhia não ser importante no mercado de
capitais perfeitos.6
Não obstante, as diferenças subsistem no que tange à estrutura de capital
decorrentes das diversas opções de financiamento, devido à imperfeição do
mercado. Como exemplo, no Brasil, as despesas com pagamento de juros de
empréstimo são dedutíveis da base de cálculo do imposto de renda e da contri-
buição social sobre lucro líquido. Isso cria um incentivo para o uso de capital
de terceiros. Cabe salientar ainda que a escolha da estrutura de capital de uma
companhia pode, em razão da imperfeição do mercado, afetar os custos em razão
de proximidade de falência,7 alterar os incentivos aos gerentes e sinalizar infor-
6
BERK, Jonathan; DEMARZO, Peter. Finanças empresariais essencial. Porto Alegre: Book-
man, 2010.
7
As companhias próximas da falência têm apetite para grandes riscos, porque utilizam
recursos financeiros de terceiros; entre duas alternativas de projeto, preferem o de alto
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 463
risco do que outro de baixo risco, assim tendem a aceitar o de alto risco por proporcionar
retorno maior ao acionista. Isso ocorrerá mesmo se o valor esperado do projeto de baixo
risco for maior, devido ao fato de que o projeto de alto risco aumenta o valor da empresa.
Destarte, os acionistas se apropriariam da riqueza dos credores ao selecionarem um projeto
de alto risco, aumentando o valor da empresa.
8
Haverá conflito de interesses, por exemplo, quando a decisão de investimento tenha
consequências divergentes para o acionista e o credor, o que poderá fazer com que o ad-
ministrador opte pelo acionista.
9
BERLE, Adolf; MEANS, Gardiner C. The modern corporation and private property. 7. ed.
New Brunswick: Transaction, 2005.
10
BERK, Jonathan; DEMARZO, Peter. Finanças empresariais essencial. Porto Alegre: Book-
man, 2010. p. 524.
11
BERK, Jonathan; DEMARZO, Peter. Finanças empresariais essencial. Porto Alegre: Book-
man, 2010. p. 534.
12
BERK, Jonathan; DEMARZO, Peter. Finanças empresariais essencial. Porto Alegre: Book-
man, 2010. p. 535.
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464 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
nhia não tem participação. Portanto, o mercado secundário oferece liquidez aos
títulos emitidos no mercado primário.
Assim, o mercado de capitais é um sistema de distribuição de valores mo-
biliários que visa a proporcionar liquidez a tais valores mobiliários e viabilizar a
captação de recurso por instrumentos de dívida – debêntures ou nota promissória
comercial – ou por aumento de capital social da companhia.
Os investidores, no mercado de capitais, ao emprestarem seus recursos di-
retamente para as companhias, adquirem valores mobiliários que representam as
condições estabelecidas no negócio. Os valores mobiliários podem ser instrumentos
ou títulos de dívida em que se estabelece uma relação creditícia entre as partes
tomadora e investidora, como nas debêntures, ou podem ser títulos patrimoniais,
como nas ações, em que os investidores se tornam acionistas da companhia. Os
investidores podem adquirir esses valores mobiliários diretamente, ou indireta-
mente, por meio de estruturas de investimento coletivo, como os fundos ou clubes
de investimento.
As instituições financeiras que atuam como prestadoras de serviços não
assumem a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações estabelecidas e
formalizadas entre as companhias emissoras e os investidores. A responsabilidade
pelo pagamento dos juros e do principal de uma debênture é da emissora, e não
da instituição financeira que a tenha assessorado ou participado do processo de
colocação dos títulos no mercado.
Devido à importância do mercado de capitais como forma de financiamento
da companhia, cabe analisar as características gerais dos principais valores mobi-
liários negociados, como: (i) as debêntures; (ii) notas promissórias; (iii) bônus de
subscrição; (iv) ações; e (v) instrumentos híbridos (que conjugam características
patrimoniais e de dívida). Além disso, cabe tecer breves comentários acerca da ala-
vancagem da companhia por meio da captação de recursos no mercado de capitais.
3.1.1 Debêntures
As debêntures são instrumentos de dívida, de médio e longo prazo, emiti-
dos pela companhia que conferem aos seus titulares direito de crédito contra a
companhia emissora, nas condições deliberadas pela assembleia geral e constan-
tes da escritura de emissão e, se houver, do certificado. No Brasil, as debêntures
constituem uma das formas mais antigas de captação de recursos por meio de
valores mobiliários. As características das debêntures estão definidas na escritura
de emissão como prazo, remuneração, dentre outros.
A debênture, como é conhecida hoje, no Brasil, surgiu com a promulgação
da Lei no 1.083, de 22 de agosto de 1860, sob a denominação de “obrigações ao
portador”, emitidas pela sociedade. À época, era necessário que houvesse autori-
zação do poder legislativo para que as sociedades pudessem emitir quaisquer tipos
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 467
13
Conforme a seguinte disposição em seu art. 1º, § 5º: “Não se fará emissão de obrigações
sem prévia deliberação da assembleia geral dos acionistas adotada por tantos sócios quantos
representem, pelo menos, metade do capital social, em reunião a que assista número de
acionistas correspondente a três quartos dele, pelo menos”.
14
EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada. São Paulo: Quartier Latin, 2011. v. 1, p. 317.
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468 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
15
Nesse sentido, Lucena afirma que “compete privativamente à assembleia geral, que há de
ser extraordinária (art. 131), autorizar a emissão de debêntures (art. 122, IV), ressalvada
a competência do conselho de administração, na companhia aberta, para deliberar sobre
emissão de debêntures simples, não conversíveis em ações e sem garantia real (art. 159, §
1º) [...]. Assembleia, contudo, ao deliberar, deve obedecer ao que eventualmente dispuser
o estatuto social sobre a emissão de debêntures. Ou seja, o estatuto é a lei suprema da
companhia: o que nele se contenha é ius cogens a ser seguido pela assembleia. Se houver
alguma disposição estatutária que não convenha à emissão, cabe, antes desta, ser o estatu-
to reformado, para somente então ser adotada” (LUCENA, José Waldecy. Das sociedades
anônimas: comentários à lei. Rio de Janeiro: Renovar. 2009. p. 628-629).
16
Modesto Carvalhosa afirmar que: “A causa geradora da emissão, com efeito, é apenas a
deliberação da assembleia geral (art. 59) e a escritura de emissão e suas averbações (arts.
61 e 62, § 3º), e que, por ser causa sempre mutável, vincula definitivamente o título (art.
71). [...] As deliberações da assembleia geral referente à emissão e à instituição das cláu-
sulas da escritura de emissão formam um ato normativo, tornando-se, desde logo, pactum
contrahendi” (CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedade anônimas. São
Paulo: Saraiva, 2011. v. 1, p. 839).
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 469
17
Art. 177 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973.
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470 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
para o investidor são que os rendimentos desse valor mobiliário são estabelecidos
no ato societário que aprovou a emissão e na escritura das debêntures e têm li-
quidez no mercado secundário, caso o investidor queira recuperar o dinheiro da
aplicação antes das datas contratadas.
As debêntures pagam o valor principal investido no vencimento (desde que
acima de um ano) ou em parcelas (amortizações) pagas periodicamente ao longo
de anos. Comumente, são realizados pagamentos periódicos de juros.
A debênture poderá conter cláusula de correção monetária, com base nos
coeficientes fixados para a correção de títulos da dívida pública, na variação da taxa
cambial ou em outros referenciais não expressamente vedados em lei. A debênture
poderá assegurar ao seu titular juros, fixos ou variáveis, participação no lucro da
companhia e prêmio de reembolso.
A escritura de debênture poderá assegurar ao debenturista a opção de escolher
receber o pagamento do principal e acessórios quando do vencimento, amortização
ou resgate, em moeda ou em bens avaliados.
A época do vencimento da debênture deverá constar da escritura de emissão
e do certificado, podendo a companhia estipular amortizações parciais de cada
série, criar fundos de amortização e reservar-se o direito de resgate antecipado,
parcial ou total, dos títulos da mesma série.
A debênture poderá ser conversível em ações nas condições estabelecidas na
assembleia geral constantes da escritura de emissão, que especificará: (i) as bases
da conversão, seja em número de ações em que poderá ser convertida cada debên-
ture, seja como relação entre o valor nominal da debênture e o preço de emissão
das ações; (ii) a espécie e a classe das ações em que poderá ser convertida; (iii) o
prazo ou época para o exercício do direito à conversão; e (iv) as demais condições
a que a conversão acaso fique sujeita.
Os acionistas terão direito de preferência para subscrever a emissão de
debêntures com cláusula de conversibilidade em ações, observado o disposto nos
arts. 171 e 172 da LSA.
Enquanto puder ser exercido o direito à conversão, dependerá de prévia
aprovação dos debenturistas, em assembleia especial, ou de seu agente fiduciário,
a alteração do estatuto para: (i) mudar o objeto da companhia; (ii) criar ações
preferenciais ou modificar as vantagens das existentes, em prejuízo das ações em
que são conversíveis as debêntures.
A captação de recursos para investimentos por meio de debêntures é
uma alternativa aos financiamentos bancários, abrindo para a companhia um
amplo espectro de investidores potenciais, tanto no Brasil quanto no exterior.
A remuneração das debêntures, a ser paga aos debenturistas, pode ser inferior
àquela que seria paga na contratação de um empréstimo junto a uma instituição
financeira.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 471
3.1.4 Ações
No que tange ao capital próprio, a companhia, nos termos da Lei de Socie-
dades por Ações, terá o capital social dividido em ações, e a responsabilidade dos
acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.
O estatuto social fixará o número das ações em que se divide o capital social. O
capital social da companhia pode ser dividido em ações ordinárias e preferenciais.
As ações ordinárias da companhia fechada e as ações preferenciais da com-
panhia aberta e fechada poderão ser de uma ou mais classes. O número de ações
preferenciais sem direito a voto, ou sujeitas a restrição no exercício desse direito,
não pode ultrapassar 50% do total das ações emitidas.
As ações ordinárias de companhia fechada poderão ser de classes diversas,
em função de: (i) conversibilidade em ações preferenciais; (ii) exigência de na-
cionalidade brasileira do acionista; ou (iii) direito de voto em separado para o
preenchimento de determinados cargos de órgãos administrativos. Caso não haja
previsão no estatuto de diversidade de classes, eventual alteração da diversidade
de classes, se não for expressamente prevista, e regulada, requererá a concordância
de todos os titulares das ações atingidas.
No Reino Unido, a existência de classes de ações ordinárias, negociadas em
Bolsa de Valores, com diferença na proporção dos votos, é comum, enquanto que
nos Estados Unidos, recentemente, tem se intensificado a igualdade na proporção
dos votos nas ações ordinárias, movimento conhecido como “uma ação, um voto”.
Entretanto, a Ford Motor Company, por exemplo, tem Classes A e B de ações
ordinárias, sendo que a Classe B representa 40% do capital votante (apesar de re-
presentar apenas 10% do capital total), que não é negociada em bolsa, pertencendo
aos membros da família Ford.
As ações ordinárias classe B da Berkshire Hathaway têm 1/200 dos votos da
classe A. Cada ação da classe A pode ser convertida em 30 ações classe B. Outros
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474 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
exemplos, como Comcast e Google, também adotam duas classes de ações ordiná-
rias. O objetivo desse tipo de estrutura de capital é fazer com que o controle fique
nas mãos de um grupo de acionistas, como na família Ford, ou dos fundadores e
administradores da Google.
No Brasil, apesar de permitir classes diversas para as ações ordinárias de
companhias fechadas, a LSA adota o sistema de uma ação ordinária, um voto. A
cada ação ordinária corresponde um voto nas deliberações da assembleia geral (art.
110 da LSA). Assim, não há diferença na qualidade do voto das ações ordinárias
de companhias fechadas, exceto no caso do direito de voto em separado para o
preenchimento de determinados cargos de órgãos administrativos que pode gerar
o fato de que uma determinada classe possa eleger a maioria dos membros dos
órgãos de administração e controlar a companhia, contudo, sem diferenciar nas
assembleias gerais os direitos de votos dos acionistas nas demais matérias a eles
submetidas.
Assim, as ações ordinárias não gozam de qualquer preferência ou prioridade
no recebimento de dividendos e/ou reembolso de capital no caso de falência ou
liquidação da companhia. As preferências ou vantagens das ações preferenciais
podem consistir em prioridade: (i) na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo;
(ii) no reembolso do capital, com prêmio ou sem ele; ou (iii) na acumulação dessas
preferências e vantagens.
O direito de voto das ações preferenciais tem que ser expressamente excluído,
com precisão e minúcia, no estatuto, bem como outras preferências ou vantagens
que sejam atribuídas aos acionistas sem direito a voto, ou com voto restrito. A
emissão de ações preferenciais sem direito de voto pressupõe a atribuição de uma
vantagem de natureza patrimonial em compensação à exclusão do direito político
(de voto).
As ações preferenciais sem direito de voto ou com restrição ao exercício desse
direito, independentemente do direito de receber ou não o valor de reembolso do
capital com prêmio ou sem ele, somente serão admitidas à negociação no mer-
cado de valores mobiliários se a elas for atribuída pelo menos uma das seguintes
preferências ou vantagens: (i) direito de participar do dividendo a ser distribuído,
correspondente a, pelo menos, 25% do lucro líquido do exercício, calculado na
forma do art. 202, da LSA, de acordo com o seguinte critério: (a) prioridade no
recebimento dos dividendos mencionados nesse inciso correspondente a, no mí-
nimo, 3% do valor do patrimônio líquido da ação; e (b) direito de participar dos
lucros distribuídos em igualdade de condições com as ordinárias, depois de a estas
assegurado dividendo igual ao mínimo prioritário estabelecido no item a acima;
ou (ii) direito ao recebimento de dividendo, por ação preferencial, pelo menos 10%
maior do que o atribuído a cada ação ordinária; ou (iii) direito de serem incluídas
na oferta pública de alienação de controle, nas condições previstas no art. 254-A,
da LSA, assegurado o dividendo pelo menos igual ao das ações ordinárias.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 475
A ação ordinária com super direito de voto não é admitida na LSA, mas permite a pos-
18
pagamento desses dividendos prioritários, nos termos do art. 17, § 6o, e do art. 200,
da LSA, ou seja, o estatuto poderá conferir às ações preferenciais com prioridade
na distribuição de dividendo cumulativo o direito de recebê-lo, no exercício em
que o lucro for insuficiente, à conta das reservas de capital (estabelecida no art.
182 da LSA). Assim, as reservas de capital poderão ser utilizadas para pagamento
de dividendos a ações preferenciais com dividendo prioritário.
Salvo disposição em contrário no estatuto social, o dividendo prioritário não é
cumulativo. O direito de cumulatividade assegurado no estatuto social significa que
caso a companhia deixe de pagar os dividendos devidos em determinado exercício,
estes sejam cumulados para os exercícios seguintes. Quando a companhia voltar
a realizar lucro, a ação preferencial dotada desse direito receberá integralmente
os dividendos cumulados.
O dividendo prioritário fixo é a parcela do lucro previamente quantificada no
estatuto social com base (i) em um valor em reais ou (ii) percentual determinado
do valor nominal da ação preferencial ou do valor do capital social (valor nominal
intrínseco das ações quando estas forem sem valor nominal). Essas ações com
dividendo fixo participam dos lucros até o montante estatutariamente predeter-
minado, não participando dos lucros remanescentes. Os dividendos dessas ações
assemelham-se a juros prefixados com base no capital investido pelo acionista,
entretanto, sujeitos à existência de lucro.
O dividendo prioritário mínimo também é previamente definido no estatuto
social, com base em critérios de cálculo semelhantes ao dividendo fixo, com prio-
ridade de recebimento da parcela do lucro que, após o seu pagamento, participa
dos lucros distribuídos em igualdade de condições com as ordinárias, depois de a
essas ações preferenciais ser assegurado dividendo igual ao mínimo.
Na mesma hipótese e sob a mesma condição do § 1o do art. 111 da LSA, as
ações preferenciais com direito de voto restrito terão suspensas as limitações ao
exercício desse direito.
Por outro lado, as ações com dividendos majorados, diferentemente daquelas
com dividendos prioritários, têm prioridade no reembolso do capital e direito a
receber dividendos 10% superiores aos pagos aos titulares de ações ordinárias.19
Entretanto, não gozam do direito de aquisição de votos no caso de não pagamento
dos dividendos. Não se trata de prioridade no recebimento de dividendos.
Cabe notar que a Lei das Sociedades por Ações permite a emissão de ações
preferenciais com dividendos prioritários, mínimos ou fixos, cumulativos, além
de prioridade no reembolso de capital, que possuem métodos de remuneração
“[E]sse direito era obrigatório para quaisquer ações preferenciais sem voto, desde que os
19
20
Notas promissórias, ou commercial papers, são títulos de curto prazo emitidos pelas com-
panhias para financiar seu capital de giro.
21
Debêntures são títulos de dívida, de médio e longo prazo, que conferem a seu titular um
direito de crédito contra a companhia emissora. O debenturista se torna credor dessas
companhias. As debêntures constituem uma das formas mais antigas de captação de recur-
sos por meio de títulos no mercado brasileiro. Todas as características desse investimento,
como prazo, remuneração etc., são definidas na assembleia geral que aprova a emissão e
na escritura de emissão.
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484 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
22
O project finance é o financiamento de longo prazo de infraestrutura e projetos industriais,
com base nos fluxos de caixa projetados. A estrutura de financiamento do projeto envolve
uma série de investidores em ações, conhecidos como “patrocinadores”, bem como um
“sindicato” de bancos ou outras instituições financeiras que oferecem empréstimos para
a operação. Eles são mais comumente empréstimos não recorrentes, que são garantidos
por ativos do projeto e pagos inteiramente a partir do fluxo de caixa do projeto, ao invés
de ativos gerais ou creditícia dos patrocinadores do projeto, uma decisão em parte apoiada
pela modelagem financeira.
23
Financiamento específico para a aquisição de um ativo, como planta industrial, maqui-
nário etc.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 485
24
Capex ou capital expenture são despesas de capital para investimento de ativos não circu-
lantes.
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486 FINANÇAS CORPORATIVAS – Sérgio Botrel • Henrique Barbosa
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Swingline facilities são empréstimos concedidos pelas instituições financeiras para acesso
a recursos financeiros com a finalidade de cobrir eventuais necessidades de caixa para
cumprir outros compromissos de dívida.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 487
(i) ponto de contato (o agente mantém contato com o mutuário, além de repre-
sentar o sindicato); (ii) monitoramento (acompanhamento do cumprimento dos
termos do empréstimo pelo mutuário); (iii) representante e pessoa que controla as
informações do sindicato (o agente deverá ser notificado pelo mutuário), agente
recebedor (o mutuário deverá fazer todos os pagamentos de juros e amortizações
de principal e quaisquer outros pagamentos exigidos nos termos do Contrato de
Empréstimo, passando os recursos para os bancos, da mesma forma, os bancos,
através do agente, adiantam recursos ao mutuário).
É importante que haja no contrato de empréstimo sindicalizado a inclusão de
procedimentos claros e eficientes para atuação e tomada de decisões. O contrato
de empréstimo sindicalizado dá poderes ao agente para realizar os papéis descritos
acima, em troca de uma remuneração. Porém, muitas estruturas de sindicalização
têm utilizado uma instituição financeira que exerce o papel de agente, para ser o re-
presentante dos credores junto à companhia, de forma a garantir um relacionamento
equilibrado durante a vigência do contrato. Todas as decisões de natureza material
(por exemplo, a concessão de um waiver ou liberação de obrigação) normalmente
devem ser tomadas por maioria, se não pela totalidade do sindicato. Enquanto o
agente exerce as funções padrão e responsabilidades de qualquer representante ou
administrador de bens de terceiros, o contrato de empréstimo conterá disposições
para delimitar a relação do agente com sindicato de credores e com o mutuário.
Assim, o agente analisará a operação de forma criteriosa, na visão de um terceiro, a
fim de garantir a viabilidade do procedimento pretendido pelas partes.
A tomada de decisão pelo sindicato de credores é realizada por maioria.
Esse grupo consiste geralmente de membros do sindicato, de forma a assegurar
uma determinada percentagem do total de recursos do empréstimo. Os votos são
mensurados de acordo com o percentual da contribuição para os empréstimos
pelas instituições financeiras. A figura do agente é importante para o acompanha-
mento do dia a dia do empréstimo e para apresentar à companhia, ou a terceiros,
uma posição unificada dos credores. Seu papel de conciliador confere aos bancos
integrantes do sindicato a tranquilidade necessária para a condução dos negócios
e a certeza de rapidez e segurança no relacionamento com a companhia durante
o prazo do empréstimo.
Entretanto, para alguns, a eficácia, a redução de custo e a segurança de todos
os participantes do empréstimo sindicalizado pode ser inatingível. A atuação dos
agentes tem sido utilizada em razão da complexidade das operações na busca
de alternativas interessantes, mais pragmáticas e baratas para a viabilização dos
empréstimos sindicalizados, com a minimização dos conflitos de interesses (in-
dividualizados entre cada participante, o grupo e o agente) que eventualmente
possam surgir.
A estrutura tailor-made (diferentes instrumentos, moedas, prazos, garantias e
representações) está entre uma das maiores vantagens para o tomador, bem como
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 489
4. CONCLUSÃO
No Brasil, existem diversas opções de financiamento da companhia. Podemos
exemplificar, dentre as principais opções de financiamento disponíveis no mer-
cado, aquelas decorrentes do mercado de capitais, tais como emissão de ações ou
emissão de instrumentos de dívida, debêntures ou notas promissórias, ou ainda
emissão de bonds no mercado internacional.
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Cap. 20 • OPÇÕES DE FINANCIAMENTO DA COMPANHIA E SUA ESTRUTURA 493
As companhias próximas da falência têm apetite para grandes riscos, porque utilizam
26
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Joanna. Financial law. New York: Oxford, 2007.
BERK, Jonathan; DEMARZO, Peter. Finanças empresariais essencial. Porto Alegre: Book-
man, 2010..
BERLE, Adolf; MEANS, Gardiner C. The modern corporation and private property. 7. ed.
New Brunswick: Transaction, 2005.
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