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p o e ma s
do Japão
do
Antigo
seleções do
Kokin’wakashû
古今和歌集抄
tradução e notas
Andrei Cunha
CLASS
2020
Kajita Hanko,
“Episódio de O Romance do Genji”
(1905)
poemas
p o e m as
do Japão
do
Antigo
seleções do
Kokin’wakashû
古今和歌集抄
Seleção, tradução, introdução, notas e outros paratextos:
Copyright © 2020 Andrei dos Santos Cunha
古今和歌集抄
見るもの聞くものにつけて言ひ出せるなり。
ことわざしげきものなれば、心に思ふことを、
の言の葉とぞなれりける。世の中にある人、
やまとうたは、人の心を種として、よろづ
Ki no Tsurayuki,
“Prefácio
em hiragana”
(séc. X)
Charles Baudelaire,
“Correspondances” (1857)
大和には 群山あれど とりよろふ
天の香具山 登り立ち 国見をすれば
国原は 煙立ち立つ 海原は
鴎立ち立つ うまし国ぞ 蜻蛉島
大和の国は
florestas de símbolos
A partir do século IX, a poesia em japonês começa a
apresentar um estilo diferente — algo que viria, justa-
mente, a ser chamado de “estilo Kokin’wakashû” — pro-
duto de uma síntese que adotava temas e procedimentos
da cultura continental chinesa e os aplicava à literatura
vernácula.
É interessante notar que, em vez de emular a poesia
da China T’ang (618–907), sua contemporânea, os autores
japoneses da era Heian escreviam em um chinês literário
mais arcaico, reverenciando uma fase anterior da litera-
tura do continente — a era das Seis Dinastias (222–589).
Esse período da literatura chinesa tem por característica
uma predileção pelo artifício, pela alusão, pelo subenten-
dido, pelo uso de figuras de linguagem e de jogos imagé-
ticos e lexicais.
Se, por um lado, a poesia da era Heian valorizava a na-
tureza como tema, por outro, os nobres não saíam quase
nunca de casa. O contato com a natureza não era direto
— ocorria por meio dos jardins dos palácios, de pinturas,
desenhos, poemas e relatos. Ou seja, a “natureza”, na vida
dos nobres do período clássico, se encontrava em toda
parte, tanto espacial como psicologicamente, mas se tra-
tava em grande parte de uma natureza reconstruída.
Trata-se de um fenômeno que Shirane Haruo (2012)
denomina de “natureza secundária”, fator decisivo na
construção do imaginário e da estética dos japoneses. A
ênfase não está em como a natureza é e, sim, em como
ela deveria ser: graciosa e elegante. A tão difundida no-
ção de que os japoneses são um povo em harmonia com
18 poemas ro iapvo aãutno
as formas do waka
Os dois principais tipos de waka (“poesia em japonês”)
são o chôka (“poema longo”) e o tanka (“poema curto”). O
chôka ou nagauta tem um número indeterminado de es-
trofes com dois versos (de 5 e 7 sílabas, alternadamente),
terminando sempre com dois versos de sete sílabas viii.
O tanka tem sempre cinco versos e um total de 31 sílabas
com a disposição da métrica obedecendo ao esquema
5-7-5-7-7 ix.
Além do tanka e do chôka, encontramos a forma sedôka,
com dois tercetos de 5-7-5 sílabas cada (5-7-7/5-7-7) x.
Alguns poemas do livro 19 são chamados de haikai xi,
mas essa palavra tinha um significado diferente na
Antiguidade: ela era usada para poemas com o mesmo
número de versos e sílabas que um tanka, mas que não
seguiam as muitas regras do bom gosto exigido na corte,
sendo considerados como “poemas de brincadeira”, sem
viii
Por exemplo, o poema 1002.
ix
Com exceção de alguns exemplos do livro 19, todos os poemas desta
antologia são na forma tanka.
x
Essa forma foi usada na Era Nara, mas depois do século VIII tornou-
se praticamente extinta. O primeiro ideograma de sedôka significa
“retornar” ou “circular”. No exemplo incluído neste volume, o “retorno”
se refere ao fato de que o poema 1008 responde a pergunta proposta
pelo poema 1007.
xi
Por exemplo, os poemas 1011 e 1012.
poemasriva 23
花の色は 移りにけりな
いたづらに
我身世にふる ながめせしまに
a flor da cerejeira
perdeu sua cor em
vão minha juventude
passou enquanto eu
distraída olhava a chuva
paratexto e hors-texte
A escrita japonesa é fruto de um longo processo de de-
senvolvimento. As primeiras duas grandes obras da lite-
ratura do Japão, o Kojiki xviii e o Man’yôshû xix, ambas com-
piladas no século VIII, foram escritas usando caracteres
chineses para representar os sons da língua japonesa. A
partir desse complexo sistema foram criados, nos três sé-
culos seguintes, dois silabários nacionais — as kana. Um
deles, as katakana, é composto de pedaços de caracteres
chineses; o outro, as hiragana, de simplificações cursivas
desses mesmos símbolos. Os textos da vida pública eram
escritos em chinês clássico.
As primeiras hiragana surgem em correspondência
xviii
Texto que combina o pseudo-histórico, o histórico e os mitos de
formação do Japão (cosmogonia e mitologia). Compilado por Ô no
Yasumaro, baseado na obra incompleta de Hieda no Are. Compilação
terminada em 712 (era Nara).
xix
Cf. primeira seção desta Introdução.
poemasriva 31
xx
Diário poético escrito no início do século XI por Izumi Shikibu.
32 poemas ro iapvo aãutno
sobre a tradução
A presente tradução começou a tomar forma no se-
gundo semestre de 2019 como material didático para a
disciplina de Literatura Japonesa em Tradução I do Ba-
charelado Tradutor Japonês-Português do Instituto de
Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Aproveitei diversos textos que eu havia escrito em dife-
rentes épocas sobre o assunto, mas as traduções dos po-
emas em si são em sua maioria inéditas. A preparação
do manuscrito ocupou os meses de janeiro e fevereiro de
2020 (as férias de verão); a revisão foi feita no início de
março; e a Introdução está sendo escrita enquanto esta-
mos todos confinados a nossas casas em virtude da pan-
demia.
Apresento aqui uma seleção de 165 exemplos de um
universo de 1.111 poemas — ou seja, menos de 20% do to-
tal de textos da antologia japonesa. A tradução integral
dos poemas do Kokin’wakashû exigiria uma dedicação de
tempo e de foco que raramente um tradutor brasileiro
teve ou terá o luxo de reservar a um projeto não remune-
rado. Meu objetivo com esta publicação é bem mais mo-
desto: oferecer ao leitor brasileiro um vislumbre de um
mundo que ele não conhece. Como esse mundo é distan-
te no tempo e no espaço, optei pelo antimodernismo em
minha abordagem editorial: desde o princípio, tive por
intenção criar um almanaque idiossincrático da cultura
japonesa da Antiguidade, incluindo na edição notas pa-
poemasriva 39
Andrei Cunha
Porto Alegre, 28 de junho de 2020.
ki no ts ur ay uk i
仮名序
prefácio em
hiragana
Este prefácio é um dos textos fundadores da estética
japonesa. O texto de Tsurayuki vem acompanhado
de uma série de notas encontradas na maioria das
cópias mais antigas. Esses comentários e interpolações
teriam sido acrescentados posteriormente, por
um comentarista anônimo. A maioria das edições
contemporâneas trata essas notas como parte
integrante do documento, fazendo a distinção entre
o texto de Tsurayuki e o do comentarista por meio de
diferentes elementos tipográficos.
prefácio
em hiragana
ki no tsurayuki
A
poesia japonesa brota do
coração humano, que é a sua
semente, e suas folhas crescem
como dez mil palavras. Neste
mundo, as pessoas têm muitos interesses diferentes.
Aquilo que pensam em seu coração, expressam em
poesia, quando falam sobre as coisas que viram e
escutaram. Basta ouvir o rouxinol do Japão, que
canta em meio às flores, ou a voz do sapo que vive
na água, para entender que todos os seres vivos
produzem algum tipo de poesia. A poesia é aquilo
que, sem esforço, move o céu e a terra e emociona até
os ogros e deuses que nossos olhos não podem ver.
Ela harmoniza as relações entre homem e mulher e
consola mesmo o coração de ferozes guerreiros i.
i
as notas de rodapé assinaladas com números romanos em
caixa-baixa são de autoria do tradutor. Este prefácio incorpora
diversos procedimentos normalmente vistos em poesia, como
makurakotoba, intertextualidade, alusão, metáforas fixas relacionadas
às estações, etc. Para mais detalhes, vide Introdução.
poemasri ev apãon oto 47
qual é a origem da
poesia japonesa? ii as glosas assinaladas
com algarismos indo-
arábicos são as notas
A poesia japonesa existe antigas acrescentadas
ao manuscrito por um
desde que o céu é céu e desde comentarista anônimo.
que o mundo é mundo 1.No vas-
to céu iii, quem criou a poesia foi 1
referência à canção que
a princesa Shitateru 2.Na firme Izanagi e Izanami cantaram um
para o outro quando se casaram
terra iv, o primeiro poema foi sob a flutuante ponte celeste.
composto pelo deus Susanoo 3.
Na Idade dos Deuses, no
2
a princesa shitateru era
esposa do príncipe Amewaka.
tempo de sua fúria v, não havia A canção que ela compôs era
métrica e os sentimentos eram um elogio ao seu irmão mais
expressos de maneira mais di- velho. Essas canções não tinham
métrica nem correspondiam ao
reta; no entanto, ao contrário que depois veio a se considerar
do que se imaginaria, essas como a forma do poema japonês.
canções de forma livre eram de 3
susanoo era o irmão mais
mais difícil compreensão. novo da deusa Amaterasu.
Enquanto construía um palácio
ii
As perguntas que servem de intertítulos para sua esposa, na província
seguem a divisão do texto em partes de Izumo, ele viu nuvens de oito
argumentativas adotada pelos livros cores no céu, e compôs o seguinte
didáticos contemporâneos e não
poema:
constavam do manuscrito de Tsurayuki.
iii
“Vasto” é uma proposta de tradução para 八雲立つ 出雲八重垣
hisakata, que é um makurakotoba para 妻ごめに 八重垣つくる
“céu”. その八重垣を
iv
“Firme” é uma proposta de tradução
para arakane, um makurakotoba de “terra”. em Izumo
Segundo a narrativa do Kojiki, Izanagi e oito nuvens no céu
Izanami são as divindades que se uniram, para minha esposa
no início dos tempos, para gerar os outros vou fazer oito cercas
deuses.
oito cercas
v
Chihayaburu, “impetuoso, cheio de fúria”,
é um makurakotoba para kami, “deuses”. A yakumo tatsu / izumo yaegaki /
“Idade dos Deuses” (kamiyo) é uma era da tsumagome ni / yaegaki tsukuru /
mitologia japonesa, antes do nascimento sono yaegaki wo
do imperador Jinmu (século VI a.C.).
48 po em asrivãrpo
em Naniwa
florescem as ameixeiras!
acabou o inverno nublado
agora é primavera
florescem as ameixeiras!
naniwazu ni / saku ya ko no hana / fuyugomori / ima wa harube to / saku ya ko no hana
viii
Poema do monte Asaka (Man’yôshû, 3807): 安積香山 影副所見 山
井之 浅心乎 吾念莫國 “não penses meu amado / que meu amor
seja raso / como a fonte cristalina / em que vimos nosso reflexo / na
montanha de Asaka” (asaka yama / kage sae miyuru / yama no i no / asaki
kokoro wo / waga omowanaku ni; escrito por uma dama da corte).
ix
Os “seis tipos de poesia japonesa” seriam uma adaptação de três
termos técnicos da retórica chinesa e de outros três conceitos estéticos
da música clássica da China. Para mais detalhes, vide Introdução.
x
Soeuta (“poema adjacente” ou “de oculta persuasão”, そえ歌), em
que um significado implícito estaria “lado a lado” com um significado
explícito.
50 po em asrivãrpo
O quarto tipo é o
7
Essa categoria se refere a poemas
que expressam sentimentos
tatoeuta xiv: por meio de imagens de plantas,
árvores, pássaros e outros
わが恋は よむともつきじ animais. Não há um significado
荒磯海の 浜の真砂は “escondido”. Essa descrição vale também
よみつくすとも 7 para a primeira categoria, soeuta. A
diferença é mínima, algo a ver com o
se alguém se dispusesse estilo. Eis um exemplo melhor (poema
708 desta antologia):
a de amor medir-me as penas
須磨の海人の
seria como se quisesse 塩焼く煙 風をいたみ
em praia de mar bravo 思はぬ方に たなびきにけり
contar os grãos de areia fumaça das algas
que o pescador queima
waga koi wa / yomu tomo tsukiji / arisoumi no
hama no masago wa / yomitsukusu tomo
na praia de Suma
o vento te leva
para bem longe
O quinto tipo é o
tadagotouta xv (poema 712): suma no ama no / shio yaku keburi
/ kaze wo itami / omowanu kata ni /
tanabikinikeri
いつはりの なき世なりせば
いかばかり 8
Estes são poemas que retratam um
人の言の葉 うれしからまし 8 mundo de ordem e de harmonia.
O poema proposto não se enquadra
se este não fosse nessa definição. Eis um exemplo melhor
(poema de Taira no Kanemori):
um mundo de desilusão
que feliz eu seria 山桜 あくまで色を
見つるかな
ao ouvir as promessas 花散るべくも 風吹かぬ世に
de amor do meu amado
cerejeira da montanha
itsuwari no / naki yo nariseba / ika bakari / hito no contemplei as tuas cores
koto no ha / ureshikamarashi por horas e horas
neste mundo de calma
o vento não te despetala
xiv
Tatoeuta (“poema exemplificativo” ou
“de figuração evocativa”, たとえ歌). yamazakura / aku made iro wo /
xv
Tadagotouta (“poema de tom elevado”, mitsuru kana / hana chiru beku mo /
ただごと歌). kaze fukanu yo ni
52 po em asrivãrpo
春日野に
若菜摘みつつ como foi o
よろづ世を
いはふ心は desenvolvimento da
神ぞ知るらむ poesia japonesa?
quais são seus temas?
nos prados de Kasuga
colhemos as jovens ervas
e felizes festejamos O mundo de hoje está cheio de di-
os teus muitos anos ferentes cores e estímulos e os cora-
os deuses por testemunha ções das pessoas se tornaram flores
kasugano ni / wakana efêmeras e volúveis. Em consequên-
tsumitsutsu / yorozuyo wo cia, os poemas atuais são infrutífe-
/ iwau kokoro wa / kami zo
shiruran ros e sem valor. A poesia se tornou
ofício de galantes que só produzem
palavras vazias — palavras que não
creio poder concluir interessam a ninguém e serão es-
que, na verdade, não
existem seis tipos de
quecidas como troncos sob a terra. A
poesia japonesa. poesia japonesa se tornou coisa para
aposentos privados, longe da vida
pública, qual penachos de eulálias
que só desabrocham em segredo.
Iwaiuta (“elogio” ou “poema comemorativo”, い
xvi
わひ歌).
poemasri ev fi stchct chfch5 3
11
poemas do monge henjô (poemas
27, 165, 226):
浅緑 糸よりかけて
白露を 玉にもぬける
春の柳か
12
poemas de ariwara no
narihira (poemas 747, 879, 644):
月やあらぬ 春や昔の
春ならぬ わが身一つは
もとの身にして poemas de fun’ya no
13
14
poema do monge kisen (poema 983):
わが庵は 都のたつみ
しかぞ住む
世をうぢ山と
人はいふなり
casinha de palha
no sudeste da capital
as pessoas chamam
o lugar onde moro
de Morro do Casmurro
waga io wa / miyako no tatsumi / shika zo sumu /
yo wo uji yama to / hito wa iu nari
poemasri ev ffi 61
15
poemas de
ono no komachi 16
poema da princesa sotôri
(poemas 552, 797, 938): (poema 1110):
思ひつつ 寝ればや人の わがせこが 来べきよひなり
見えつらむ ささがにの くものふるまひ
夢と知りせば かねてしるしも
さめざらましを
aventurada esta noite
pensando nele em que tu vens me ver
adormeci e ele vejo nas patas da aranha
me apareceu que já bailam e tecem
se soubesse que era sonho o teu presságio
não tinha me acordado
waga seko ga / kobeki yoi nari /
omoitsutsu / nureba ya hito no / sasagami no / kumo no furumai
mietsuran / yume to shiriseba / kanete shirushi mo
samezaramashi wo
poemas de ôtomo no
17
わびぬれば 身をうき草の 鏡山 いざ立ちよりて
根をたえて 誘ふ水あらば 見てゆかむ 年へぬる身は
いなむとぞ思ふ 老いやしぬると
xxiv
As pegadas de passarinhos são uma metáfora da escrita.
seleções do
Kokin’wakashû
古今和歌集抄
livro 1
primavera i
巻第一 春歌上
A narrativa de chegada da estação começa
com a “neve de primavera”, sob a qual já se pode
pressentir a volta das plantas. Em seguida, o
rouxinol, que durante o inverno se encontrava
escondido nas montanhas, vales e bosques, volta à
Capital para anunciar a primavera com seu canto.
Desce das montanhas também a neblina, trazendo
consigo uma nova atmosfera. Os salgueiros
verdejam e as ameixeiras florescem.
年のうちに 春は来にけり ひととせを
quando a primavera começou
antes do fim do ano
去年とやいはむ 今年とやいはむ
nem é Ano-Novo
e já veio a primavera
será que estamos
no ano passado? ou
no ano que vem?
1
在原元方
Ariwara no Motokata
ainda há neve
quando chega a primavera
chora o rouxinol
a sua lágrima de gelo
agora derrete
4
二条
Dona Nijô
梅がえに きゐるうぐひす はるかけて
sem título
なけどもいまだ 雪はふりつつ
no galho da ameixeira
grita o rouxinol
chegou a primavera
e no entanto
ainda cai a neve
5
Autoria desconhecida
chegada a primavera
vem o rouxinol ver
se a neve nos ramos
da ameixeira
não são brancas flores
6
素性法師
Monge Sosei
心ざし ふかくそめてし をりければ
sem título
きえあへぬ雪の 花と見ゆらむ
arranquei este ramo
com a alma tão tingida
da cor forte da paixão
que a neve que ali repousa
desabrochou em flores
7
Autoria desconhecida
春の日の ひかりにあたる 我なれど
nevava em sua cabeça. quando veio
o sol e a neve começou a derreter,
かしらの雪と なるぞわびしき
a imperatriz ordenou que ele
fizesse um poema sobre a situação
eu aqui banhado
na luz da primavera
fico bem chateado
de carregar na cabeça
esta coroa nevada
8
文屋康秀
Fun’ya no Yasuhide
春きぬと 人はいへども うぐひすの
é primavera
dizem mas
enquanto o rouxinol
não cantar
acho que não
11
壬生忠岑
Mibu no Tadamine
imperatriz
鶯さそふ しるべにはやる
はるのきる かすみの衣 ぬきをうすみ
sem título
山風にこそ みだるべらなれ
veste a primavera
seu manto de névoa
seda tão tênue
que o vento das serras
esgarça e espalha
23
在原行平
Ariwara no Yukihira
sobre os salgueiros
de nishi no ôtera
浅緑 糸よりかけて 白露を
玉にもぬける 春の柳か
やどちかく 梅の花うゑじ あぢきなく
sem título
まつ人のかに あやまたれけり
perto da soleira
não plantes ameixeiras
seu aroma traiçoeiro
se confunde com o cheiro
daquela que esperas
34
Autoria desconhecida
ameixeira a um amigo
色をも香をも 知る人ぞ知る
se não a ti
a quem mostraria
a flor da ameixeira?
tu que sabes de flores
de aromas e de cores
38
紀友則
Ki no Tomonori
人はいさ 心も知らず ふるさとは 花ぞ昔の 香ににほひける
florido de ameixeira e mandou que
entregassem ao homem com este
poema
Arakawa
Kamejirô, “Ki
no Tsurayuki”
(1903)
紀貫之
Ki no Tsurayuki
superfície da
a cada primavera água, tenta
fito o rio e vejo alcançá-las,
mas era tudo
flores na correnteza uma ilusão.
e molho minhas mangas As “mangas
molhadas do
mas só colho as águas quimono” eram
43 uma metáfora
伊勢 fixa para o
Dona Ise choro (e, por
extensão, para
haru goto ni / nagaruru kawa wo / hana to mite o sofrimento
orarenu mizu ni / sode ya nurenan amoroso).
os salgueiros e as cerejeiras
se misturam
e a Capital se torna
um brocado de primavera
56
素性法師
Monge Sosei
A “muda
da cigarra”
空蝉の 世にもにたるか 花ざくら
sem título
さくと見しまに かつちりにけり
(utsusemi) é
um makura-
kotoba de muda o mundo
“mundo” (yo).
As coisas como a muda da cigarra
mudam como assim a cerejeira
a cigarra,
tudo está em mal a vemos florida
permanente e já é pétala no chão
mudança. Aqui 73
há um diálogo Autoria desconhecida
com o budismo,
que considera utsusemi no / yo ni mo nitaru ka / hanazakura
o mundo dos saku to mishi ma ni / katsu chirinikeri
homens uma
efêmera ilusão.
névoa de primavera
por que escondes
as flores da cerejeira?
preciso ver
o seu despetalar
79
紀貫之
Ki no Tsurayuki
a se despetalar
Segundo boa
parte da crítica,
este é um ao ver as flores que caem
dos melhores
waka de toda na luz tranquila
a antologia. A
teia sonora do de um dia tão claro
久方の 光のどけき 春の日に しづ心なく 花の散るらむ
poema japonês de primavera
se baseia na
repetição do por que caem inquietas
/h/ aspirado as pétalas das cerejeiras?
(cinco vezes) 84
e do /k/ (sete 紀友則
vezes). Alguns Ki no Tomonori
interpretam
essas aliterações hisakata no / hikari nodokeki / haru no hi ni
como a falta de shizukokoro naku / hana no chiruran
fôlego de um
coração aflito.
Utagawa
Kuniyoshi,
“Poema de
Ki no Tomonori”
(1840?)
poema 2 81
flores da cerejeira
que o vento despetala
memórias flutuam
no céu sem água
cheio de vagas
89
紀貫之
Ki no Tsurayuki
na ora deserta
Nara que era
outrora capital
as cores de antes
nas flores de agora
90
ならのみかど
Mikado de Nara
春霞 色のちくさに 見えつるは
imperatriz, no período kanpyô
たなびく山の 花のかげかも
os muitos matizes
das serras nubladas
são como se a névoa
da primavera se tingisse
da cor das floradas
102
藤原興風
Fujiwara no Okikaze
a névoa chega
Tatsu
(“levantar” ou das serras chega
“começar”) é um a primavera ainda
kakekotoba:
pode tanto se que distante a brisa
referir a kasumi tem o aroma das flores
(“névoa”) 103
como a haru 在原元方
(“primavera”). Ariwara no Motokata
Exemplo do
uso de engo
ao ver as flores que caem (“palavras
花見れば 心さへにぞ うつりける
associadas”).
いろにはいでじ 人もこそしれ
Há um trio:
teu coração iro (“cor”),
muda inconstante hana (“flor”)
e utsurikeru
como murcha a flor (“murchar,
cala e cuida que não morrer” ou
“ser volúvel”).
se te veja na cor Iro está ainda
104 fazendo serviço
凡河内躬恒 triplo: “cor da
Ôshikôchi no Mitsune flor”, “cor do
amor” e “cor das
hana mireba / kokoro sae ni zo / utsurikeru faces”: “que não
iro ni wa ideji / hito mo koso shire se te veja na
cara que estás
enamorado”.
ちる花の なくにしとまる 物ならば
sem título
se bastasse chorar
我鶯に おとらましやは
para impedir
a queda das flores, O verbo naku
meu pranto seria significa tanto
“cantar” como
como o canto do rouxinol “chorar”.
107
春澄洽子
Harusumi no Amaneiko
Um dos poemas
mais célebres da
antologia. sem título
O verbo furu quer
花の色は 移りにけりな いたづらに 我身世にふる ながめせしまに
dizer “chover”,
mas também a flor da cerejeira
“envelhecer”. perdeu sua cor em
Nagame quer
dizer “tempo vão minha juventude
de chuva”, mas passou enquanto eu
também “olhar
contempla- distraída olhava a chuva
tivamente”. 113
Itazura ni 小野小町
significa Ono no Komachi
“distraída”, mas
também “em vão”. hana no iro wa / utsurinikeri na / itazura ni
A flor da cerejeira waga mi yo ni furu / nagame seshi ma ni
que perde a cor é
uma metáfora do
envelhecimento.
Suzuki Harunobu,
“Ono no Komachi”
(1766)
livro 2 85
em viagem
nas serras de primavera
quando fui dormir
mesmo em sonhos
chuva de flores
117
紀貫之
Ki no Tsurayuki
As glicínias
formam um
quando um passante parou para mar de lilás,
わがやどに さける藤波 たちかへり
e descem ao
meu jardim sabor do vento.
A glicínia (em
mar de lilás japonês, fuji)
vagas de glicínias é um elemento
importante do
quem passa código poético
não deixa de olhar da Antiguidade,
120 devido à sua cor
凡河内躬恒 (o lilás é, até
Ôshikôchi no Mitsune hoje, a “mais
bela das cores”) e
waga yado ni / sakeru fujinami / tachikaeri à sua associação
sugigate ni nomi / hito no miruran com a casa
imperial e com o
clã Fujiwara.
86 primavera ii
Yamabuki (rosinha-
春雨に にほへる色も あかなくに
amarela ou rosinha- sem título
da-montanha) é
かさへなつかし 山吹の花
uma flor típica da não canso de olhar
primavera.
as rosinhas da montanha
seu aroma e sua cor
ainda mais vivos
na chuva de primavera
122
Autoria desconhecida
山ぶきは あやななさきそ 花見むと
sem título
うゑけむ君が こよひこなくに
Nishimura Hodô,
“Rosinhas amarelas”
(1939) rosinha amarela
que inútil desabrocha
sem motivo para florir
aquele que te plantou
esqueceu de ti e de mim
123
Autoria desconhecida
濡れつつぞ しひて折りつる 年の内に
enviado no último dia de
primavera com um ramo de
glicínias colhido na chuva
春はいくかも あらじと思へば
mesmo molhado
quis te trazer flores
neste ano sabe lá
Suzuki Kiitsu,
quanto nos resta “Bambu e glicínias”
de primavera (primeira metade
133 do séc. XIX)
在原業平
Ariwara no Narihira
わがやどの 池の藤波 さきにけり
sem título
山郭公 いつかきなかむ
as glicínias em flor
no lago do meu jardim
são vagas de um mar lilás
cuco da montanha!
quando nos visitarás?
135
Autoria desconhecida
sem título
まだしきほどの こゑをきかばや
五月こば なきもふりなむ 郭公
“Maio” é uma
licença poética
do tradutor. depois de maio
No poema já não vai mais ser
japonês, o termo
é satsuki, a estação do cuco
“quinto mês enquanto é hora
do calendário
lunar”, que queria ouvir seu canto
começa mais ou 138
menos no fim 伊勢
de maio e vai Dona Ise
até meados de
junho. satsuki koba / naki mo furinan / hototogisu
madashiki hodo no / koe wo kikabaya
poema 3 91
sem título
さつきまつ 花橘の かをかげば
昔の人の 袖のかぞする
o perfume da tachibana
esperando maio A tachibana é
associada ao fim
lembra o cheiro do quarto mês
da roupa de um amor do calendário
lunar e o cuco
que eu tive é associado ao
139 quinto mês.
Autoria desconhecida
sem título
やよやまて 山郭公 事づてむ
我世中に すみわびぬとよ
なにをうしとか よただなくらむ
五月雨の そらもとどろに 郭公
águas de maio
céu escuro
canta o cuco
que motivo terá
para essa voz triste?
160
紀貫之
Ki no Tsurayuki
Ohara Koson,
“Flor de lótus”
(início do
ao ver o orvalho no lótus はちすばの にごりにしまぬ 心もて
séc. XX)
なにかはつゆを 玉とあざむく
塵をだに すゑじとぞ思ふ 咲きしより
A cravina
não posso deixar japonesa é um
que nada aconteça símbolo do
feminino. A flor
ao leito de cravos no canteiro é
onde eu e minha esposa comparada à
primeira vez
deitamos juntos em que o poeta
167
se deitou com
凡河内躬恒
a esposa.Há
Ôshikôchi no Mitsune também um
jogo de palavras
chiri wo dani / sueji to zo omou / sakishi yori com tokonatsu
imo to waga nuru / tokonatsu no hana (“cravina”), toko
(“chão”, “leito”
ou “canteiro”) e
natsu (“verão”).
夏と秋と 行きかふそらの かよひぢは
verão e outono
encontram-se
na encruzilhada dos céus
anuncia o frio vento
do outro lado do cruzamento
168
凡河内躬恒
Kôno Bairei,
Ôshikôchi no Mitsune
“Cravina” (fim do
séc. XIX)
natsu to aki to / yukikau sora no / kayoiji wa
katae suzushiki / kaze ya fukuran
livro 4
outono i
巻第四 秋歌上
秋来ぬと 目にはさやかに 見えねども
composto no início do outono
風の音にぞ おどろかれぬる
já é outono?
ainda não se mostra
aos olhos mas
o som frio do vento
de repente me assusta
169
藤原敏行
Fujiwara no Toshiyuki
河風の すずしくもあるか うちよする
composto em uma excursão ao rio
kamo no primeiro dia de outono
浪とともにや 秋は立つらむ
o vento do rio
frio e vital
me dá calafrios
junto com as ondas
vem o outono
170
紀貫之
Ki no Tsurayuki
わがせこが 衣のすそを 吹き返し
sem título
うらめづらしき 秋のはつ風
sem título
いなばそよぎて 秋風の吹く
sem título
あまのかはらに たたぬ日はなし
秋風の 吹きにし日より 久方の
desde a primeira brisa
outonal não houve dia
O Tanabata,
que hoje é em que não te esperasse
comemorado no às margens da Via Láctea
dia 7 de julho,
na Antiguidade no vasto céu noturno
173
caía no
sétimo dia do Autoria desconhecida
sétimo mês
do calendário akikaze no / fukinishi hi yori / hisakata no
lunar — ama no kawara ni / tatanu hi wa nashi
marcando o fim
do verão.
O costume se
baseia em uma
lenda chinesa. O 久方の あまのかはらの わたしもり
sem título
君わたりなば かぢかくしてよ
Imperador dos
Céus era o pai da
Princesa Tecelã barqueiro se um dia
(identificada às margens da Via Láctea
como a estrela
Vega). Ela tecia no vasto céu noturno
noite e dia tu trouxeres meu amor
brocados para o
seu pai. esconde depois os remos
174
Autoria desconhecida
sem título
天河 紅葉をはしに わたせばや
たなばたつめの 秋をしもまつ
Como punição,
きり立ちわたり あけずもあらなむ
わたりはてねば あけぞしにける
天河 あさせしら浪 たどりつつ
os varões da corte escrevessem
poemas
esperar o ano
seguinte.
Tecelã cruel
que me prometeste amar
uma rara noite no ano —
acaso chamas esse nosso
encontro de encontro?
178
藤原興風
Fujiwara no Okikaze
年ごとに あふとはすれど たなばたの
na noite de tanabata
ぬるよのかずぞ すくなかりける
apesar da promessa
do encontro anual
raras são as noites
de Tanabata em que eu
durmo com meu amor
179
凡河内躬恒
Ôshikôchi no Mitsune
na noite de tanabata
織女に かしつる糸の 打ちはへて
年のをながく こひやわたらむ
こよひこむ 人にはあはじ たなばたの
sem título
ひさしきほどに まちもこそすれ
amanhã já não vem
quem eu tanto desejo
terei eu de esperar
até a próxima
noite de Tanabata?
181
素性法師
Monge Sosei
けふよりは いまこむ年の きのふをぞ
voltará a acontecer
a noite de ontem
no ano que vem?
terei de esperar
pelo próximo Tanabata?
183
壬生忠岑
Mibu no Tadamine
sem título
このまより もりくる月の 影見れば
蟋蟀 いたくななきそ 秋の夜の
grilos
長き思ひは 我ぞまされる
grilo, não chores
na noite de outono
se te achas triste
é que não sabes
das minhas dores
196
藤原忠房
Fujiwara no Tadafusa
A palavra
kirigirisu
kirigirisu / itaku na naki so / aki no yo no
designava
nagaki omoi wa / ware zo masareru
o grilo na
Antiguidade;
hoje, ela se
refere ao
gafanhoto. あき萩も 色づきぬれば きりぎりす
sem título
わがねぬごとや よるはかなしき
na lespedeza de outono
com suas folhas tingidas
o grilo canta
e não me deixa dormir
que noite bem triste
198
Autoria desconhecida
ひぐらしの なく山里の ゆふぐれは
sem título
風よりほかに とふ人もなし
selvagens
なきこそわたれ 秋のよなよな
minhas melancolias
formam fila no céu
como gansos selvagens
que grasnam tristonhos
noite a noite no outono
213
凡河内躬恒
Ôshikôchi no Mitsune
秋はぎに うらびれをれば あしひきの
sem título
山したとよみ しかのなくらむ
A lespedeza
(hagi) é um contemplando o outono
arbusto associado nas cores da lespedeza
ao outono. Na
Antiguidade, o veado macho
veio a formar um no sopé da montanha
par poético com
o veado japonês chora por sua amada
(shika). O veado 216
é relacionado à Autoria desconhecida
melancolia do
outono, porque aki hagi ni / urabire oreba / ashihiki no
supostamente o yama shita to yomi / shika no nakuran
bramir do veado
macho em busca
da fêmea soa como
um canto triste de
saudades.
秋はぎを しがらみふせて なくしかの
sem título
めには見えずて おとのさやけさ
名にめでて をれるばかりぞ をみなへし
poema escrito ao cair do cavalo
nos prados de saga
我おちにきと 人にかたるな
flor de valeriana
que me seduziste
com teu nome de mulher
não digas por aí que pequei
contra a minha castidade
226
僧正遍照
Ominaeshi
Monge Henjô (“valeriana”
ou “patrínia”)
na ni medete / oreru bakari zo / ominaeshi é uma das
ware ochiniki to / hito ni kataru na “sete plantas
do outono”.
Os caracteres
de seu nome em
composto no período kanpyô, na japonês se leem
花にあかで なに帰るらむ 女郎花
吹くからに 野辺の草木の しをるれば
O poesia realizado no palácio do
ideograma príncipe koresada
de
むべ山風を 嵐といふらむ
“tormenta”
嵐 o vendaval vem da serra
é derruba a relva
uma
combinação
e as árvores do outono...
da juntos, “montanha” e “vento”
“montanha”
são a “tormenta”
山 249
com 文屋康秀
o Fun’ya no Yasuhide
“vento”.
風 fuku kara ni / aki no kusaki no / shiorureba
mube yama kaze wo / arashi to iuran
as relvas e as árvores
mudaram de cores
só as flores das vagas
cruzando alvas os mares
não têm outonos
250
文屋康秀
Fun’ya no Yasuhide
あきのつゆ いろいろごとに おけばこそ
sem título
山のこのはの ちくさなるらめ
o orvalho do outono
deita mil tons
nas folhas das árvores
que várias e multicores
cobrem a serra
259
Autoria desconhecida
As “vinhas da
planta sagrada”
nem as vinhas são o kudzu
da planta sagrada ou araruta.
Chihayaburu
do portal dos deuses (“em fúria”,
podem em sua fúria “terríveis”) é
um makura-
deter as cores do outono kotoba de kami
262 (“deuses”),
紀貫之 “os deuses
Ki no Tsurayuki e sua fúria”.
はあまつほしとぞ あやまたれける
poeta compusesse algo sobre
久方の 雲のうへにて 見る菊
crisântemos
vento de outono
que açoita na praia
os brancos crisântemos
não sei mais se são
flores ou ondas
272
菅原道真
Sugawara no Michizane
um poema acompanhando
秋をおきて 時こそ有りけれ 菊の花
flores para o ex-imperador,
que residia no templo de ninna
うつろふからに 色のまされば
ao fim do outono
há nova glória
para os crisântemos
depois de secos
mais bela é sua cor
279
平定文
Taira no Sadafun
竜田河 もみぢみだれて 流るめり
sem título
O rio Tatsuta
わたらば錦 なかやたえなむ
é associado
ao outono rio Tatsuta
porque seu coberto de folhas
nome significa
“brocado de rubras à deriva
seda”; além minha travessia rasga
disso, na época
das folhas o brocado em dois
tingidas, ele fica 283
coberto de cores Mikado de Nara
outonais (“como
um brocado”). tatsutagawa / momiji midarete / nagarumeri
wataraba nishiki / naka ya taenan
poema 5 117
秋風に あへずちりぬる もみぢばの
sem título
ゆくへさだめぬ 我ぞかなしき
as folhas tingidas
não resistiram
ao vento de outono
e vagam à toa sem destino
tristes como a minha vida
286
Autoria desconhecida
sem título
道ふみわけて とふ人はなし
o outono chegou
cobriu de folhas tingidas
o chão do meu pátio
tapete alto intocado
pelos pés de visitas
287
Autoria desconhecida
秋の月 山辺さやかに てらせるは
sem título
おつるもみぢの かずを見よとか
lua de outono
que clara iluminas
as matas das serras
tanta é tua luz que contamos
quantas folhas caíram
289
Autoria desconhecida
竜田ひめ たむくる神の あればこそ
canção de outono
秋のこのはの ぬさとちるらむ
O brocado de
folhas rubras sem título
しぐれの雨を たてぬきにして
sobre o rio
竜田河 錦おりかく 神な月
Tatsuta é
uma imagem o rio Tatsuta se cobre
do outono; a de um brocado de folhas
chuva gelada,
do inverno. Este no mês sem deuses
poema faz a a fria trama em que tece
transição entre
o fim do outono é o chuvisco do inverno
e o início do 314
inverno. O “mês Autoria desconhecida
sem deuses” é
o décimo mês tatsutagawa / nishiki orikaku / kannazuki
do calendário shigure no ame wo / tatenuki ni shite
lunar.
aldeia da montanha
inverno e solidão intensos
os olhos que eu amo
e o verde dos campos
ausentes
315
源宗于
Minamoto no Muneyuki
ゆふされば 衣手さむし みよしのの
sem título
よしのの山に み雪ふるらし
monte Yoshino
coberto de branco
alguém pisou aqui
atravessou a neve
e nem me visitou
327
壬生忠岑
Mibu no Tadamine
ゆきふりて 人もかよはぬ みちなれや
enquanto nevava
あとはかもなく 思ひきゆらむ
deserto o caminho
cai a neve
depois derrete
desaparece
como minhas ilusões
329
凡河内躬恒
Ôshikôchi no Mitsune
あらたまの 年のをはりに なるごとに
no fim do ano
雪もわが身も ふりまさりつつ
é sempre assim
todos os anos
chegam ao fim
acumula-se a neve
e a minha idade
339
在原元方
Ariwara no Motokata
o imperador pediu
um poema de fim de ano
見るかげさへに くれぬと思へば
Este poema
encerra o livro do
no ano que se vai inverno, fazendo
tive alguns pesares referência ao
fim do ano e
mas tudo passa remetendo ao
o brilho do espelho primeiro poema
da primavera,
meu reflexo nele cujo tema é
342 o Ano-Novo.
紀貫之 Renova-se o
Ki no Tsurayuki ciclo das quatro
estações.
yuku toshi no / oshiku mo aru kana / masukagami
miru kage sae ni / kurenu to omoeba
livro 7
comemorações
巻第七 賀歌
わが君は 千代に八千代に 細れ石の
sem título
巌と成りて 苔のむすまで
viva o meu senhor
mil anos, oito mil anos
até que as pequenas pedras
se tornem grandes rochas
Este poema, em cobertas de musgo
uma versão um
343
pouco diferente, Autoria desconhecida
é a letra do
“Hino do Japão” waga kimi wa / chiyo ni yachiyo ni / sazareishi no
(Kimigayo). iwao to narite / koke no musu made
A melodia foi
criada ao final
do século XIX
e incorpora
elementos
rítmicos da 君がよは 千代に八千代に 細れ石の
hino do japão
música europeia
巌と成りて 苔のむすまで
a uma escala
pentatônica o reino do meu senhor
tradicional dure mil anos, oito mil anos
japonesa.
até que as pequenas pedras
se tornem grandes rochas
cobertas de musgo
Autoria desconhecida
príncipe motoyasu
flores da ameixeira
primeiras da primavera
enfeitem nossas cabeças
para festejarmos
o nosso príncipe
352
紀貫之
Ki no Tsurayuki
em comemoração do aniversário
de quarenta anos do ministro da
いはふ心は 神ぞ知るらむ
direita
たらちねの おやのまもりと あひそふる
para ser vice-governador da
província de michinoku
心ばかりは せきなとどめそ
guarda da barreira!
abra o portão
para passar meu coração
só tenho isso a dar
como proteção
368
小野千古母
Mãe de Ono no Chifuru
sem título
A expressão
não me venha falar 唐衣 たつ日はきかじ あさつゆの
おきてしゆけば けぬべき物を
o vento da montanha
despetala as cerejeiras
em rosado redemoinho
que a dança das flores
atrase tua despedida
394
僧正遍照
Monge Henjô
fonte da montanha
as gotas caem das mãos
nublando a água
cristalina mas rasa
como este encontro fugaz
404
紀貫之
Ki no Tsurayuki
天の原 ふりさけ見れば 春日なる 三笠の山に 出でし月かも
No monte vasto firmamento
Mikasa,
mencionado olhando ao longe
no poema em revejo o Japão
japonês, estava
o santuário de por detrás daquela serra
Kasuga, aonde a mesma lua
os enviados de 406
embaixada iam 阿倍仲麻呂
rezar antes de Abe no Nakamaro
partirem para o
exterior. O navio Conta-se que há muitos séculos
em que Abe
Nakamaro foi enviado à China pelo
no Nakamaro
tentou voltar
imperador para realizar seus estudos.
à terra natal Depois de muitos anos sem poder
naufragou e regressar, permitiram que ele embarcasse
ele retornou em um navio de embaixada de volta ao
à China, Japão. No porto de Ming, de onde partiria
onde morreu a embarcação, os chineses fizeram uma
septuagenário, festa de despedida em sua homenagem. O
sem nunca rever poema foi composto ao anoitecer, quando
o Japão. Nakamaro viu a lua surgir.
sem título
北へ行く かりぞなくなる つれてこし
cantam os gansos
かずはたらでぞ かへるべらなる
de volta ao norte
do número
que viera ao sul
está faltando um
412
浪のうつ せみればたまぞ みだれける ひろはばそでに はかなからむや
O poema
japonês esconde
utsusemi
(“muda da
cigarra”
ou apenas muda da cigarra
“cigarra”) entre
o primeiro e o onda que enrolada torna
segundo verso.
A comparação brilhante e já mudada
é entre o canto siga rápida e qual cigarra
da cigarra, tido
por efêmero, e as cante e num instante suma
ondas do mar, no mar como se nada
que brilham 424
como joias, se 在原滋春
despejam na Ariwara no Shigeharu
areia e somem.
O poeta tenta nami no utsu / semireba tama zo / midarekeru
recolher as hirowaba sode ni / hakanakaran ya
ondas com as
mangas do
quimono, mas
a água salgada
se lhe esvai pelo
pano.
poema 10 141
O poema
japonês esconde
obana, nome
antigo da
ありとみて たのむそかたき うつ蝉の よをはなしとや 思なしてん
eulália, um tipo
de gramínea
cuja flor lembra
um penacho,
semelhante ao
nosso capim-
eulália dos-pampas (o
nome moderno
da planta é
ao ver a muda da cigarra susuki). A
muda e abandonada comparação é
entre a muda
eu lá lia que o nada da cigarra, tida
desta vida repetia por símbolo da
transitoriedade
o vazio daquela casca da vida, e a
443 desolação
Autoria desconhecida do mundo.
É comum
ari to mite / tanomu zo kataki / utsusemi no encontrar em
yo oba nashi to ya / omoinashiten culturas com
forte influência
do budismo
o argumento
de que o ser é
um sonho, ou
ainda de que a
existência não é
concreta, e sim
apenas uma
ilusão.
livro 1 1
amores i
巻第十一 恋歌一
sem título
あやめもしらぬ こひもするかな
郭公 なくや五月の あやめぐさ
canta o cuco
florescem os lírios
e eu aqui lírico
desatinado
me apaixonei
469
Autoria desconhecida
kasuga
sem título
吉野河 岩きりとほし ゆく水の
音には立てじ 恋ひは死ぬとも
rio Yoshino
silenciosa correnteza
atravessa as rochas
como meu amor
mudo até a morte
492
Autoria desconhecida
人しれぬ 思ひやなぞと あしかきの
sem título
まぢかけれども あふよしのなき
não entendo
mesmo vivendo cerca
como trama de juncos
do meu amor nada sabe
o meu amado
506
Autoria desconhecida
rio de lágrimas
não preciso procurar
a sua nascente
quando penso no meu amor
a água brota de mim
511
Autoria desconhecida
たねしあれば いはにも松は おひにけり
sem título
恋をしこひば あはざらめやも
em havendo semente
mesmo na nua rocha
nasce o pinheiro
se eu amar — de tanto amar
talvez faça o amor brotar
512
Autoria desconhecida
sem título
いかにねし夜か 夢に見えけむ
こむ世にも はや成りななむ 目の前に
sem título
つれなき人を 昔とおもはむ
vem, morte!
vem rápido, reencarnação!
que eu possa logo pensar
que este amor tão cruel
é só alguém do passado
520
Autoria desconhecida
sem piedade
sou maltratado
à montanha
vou soluçar
responde o eco
521
Autoria desconhecida
ゆく水に かずかくよりも はかなきは
sem título
おもはぬ人を 思ふなりけり
menos certo
que escrever números
na água que corre
é amar alguém
que não nos quer
522
Autoria desconhecida
sem título
くるしき物と 人にしらせむ
se eu pudesse trocar
o meu coração pelo teu
tu saberias da dor
de amar alguém
que não te quer
540
Autoria desconhecida
思ひつつ ぬればや人の 見えつらむ
sem título
夢としりせば さめざらましを
pensando nele
adormeci e ele
me apareceu
se soubesse que era sonho
não tinha me acordado
552
小野小町
Ono no Komachi
no crepúsculo
assomam-se os pirilampos
ardem como meu coração
mas é luz que não se vê
minha amada é cruel
562
紀友則
Ki no Tomonori
sem título
わがごとく 物やかなしき 郭公
時ぞともなく よただなくらむ
sofrerá o cuco
como eu da dor
de viver no mundo?
não é verão e ainda assim
ele canta noite adentro
578
藤原敏行
Fujiwara no Toshiyuki
sem título
涙のみこそ したにながるれ
秋なれば 山とよむまで なくしかに
poesia realizado na residência do
我おとらめや ひとりぬるよは
príncipe koresada
chega o outono
e as serras ecoam
o triste bramir dos veados
meu pranto no leito
é ainda mais saudoso
582
Autoria desconhecida
sozinho e triste
os campos de outono
não me consolam
sussurra o arrozal
mas não é a minha amada
584
凡河内躬恒
Ôshikôchi no Mitsune
わがこひは ゆくへもしらず はてもなし
sem título
逢ふを限と 思ふばかりぞ
meu amor
não tem destino
não tem limite
meu único desejo:
estar contigo
611
凡河内躬恒
Ôshikôchi no Mitsune
sem título
あふにしかへば をしからなくに
おきもせず ねもせでよるを あかしては
chuva de primavera, após uma noite
secreta com a amada
春の物とて ながめくらしつ
nem desperto
nem sonhando
a manhã me encontra
distraído contemplando
a chuva e o amor
616
在原業平
Ariwara no Narihira
しののめの ほがらほがらと 明けゆけば
sem título
おのがきぬぎぬ なるぞかなしき
きみやこし 我や行きけむ おもほえず
seguinte, estava ele procurando
alguém que pudesse servir de
夢かうつつか ねてかさめてか
mensageiro para enviar um poema
à dama, quando chegou-lhe este
poema
na escuridão
do meu coração
não consigo enxergar
se foi sonho ou verdade
futuros leitores decidirão
646
在原業平
Ariwara no Narihira
夢ぢには あしもやすめず かよへども
sem título
うつつにひとめ 見しごとはあらず
em sonho percorro
sem cansar o caminho
que me leva ao meu amado
mais amor teria
se o visse acordada
658
小野小町
Ono no Komachi
sem título
ちりならぬなの そらにたつらむ
みちのくの あさかのぬまの 花かつみ
sem título
かつ見る人に こひやわたらむ
as raras flores dos
juncos do pântano
crescem como meu amor
nas raras noites que
juntos passamos
677
Autoria desconhecida
nem em sonho
ouso me mostrar a ele
pois dia após dia
meu rosto matinal
me envergonha no espelho
681
伊勢
Dona Ise
月夜よし 夜よしと人に 告げやらば
来てふに似たり 待たずしもあらず
sem título
A praia de Suma
須磨の海人の 塩焼く煙 風をいたみ
salinas. Pelo
fumaça das algas método antigo,
que o pescador queima queimavam-
se as algas
na praia de Suma marinhas e de
o vento te leva suas cinzas se
extraía o sal. O
para bem longe poema compara
708 o amado que
Autoria desconhecida parece cada dia
mais distante
suma no ama no / shio yaku keburi / kaze wo itami à fumaça que
omowanu kata ni / tanabikinikeri se afasta das
salinas.
166 poemas ri
思ひ出でて 恋しき時は 初雁の
なきてわたると 人はしらずや
selvagens
sinto saudades
e quero te ver
os gansos selvagens
atravessam o vasto céu
e você tudo ignora
735
大友黒主
Ôtomo no Kuronushi
A planta
do poema sem título 山がつの かきほにはへる あをつづら
人はくれども ことづてもなし
japonês
(aotsuzura) se assoma da cerca
é uma
trepadeira da morada da serra
nativa que verde, uma rama de hera
não existe no
Brasil. Ela mas quando ele passa
forma um não chama “ó de casa”
kakekotoba 742
com “mas 寵
quando ele Utsuku
passa” (a
planta se yamagatsu no / kakio ni haeru / aotsuzura
assoma, mas hito wa kuredomo / kotozute mo nashi
ele não).
poema 14 167
あふまでの かたみとてこそ とどめけめ 涙にうかぶ もくづなりけり
月やあらぬ 春や昔の 春ならぬ わが身ひとつは もとの身にして
o modelo leste. no entanto, por volta do dia
do perfeito dez do ano-novo, ela se mudou.
cavalheiro — ele conseguiu descobrir onde ela
galante, bonito, estava, mas não pôde vê-la, pois
nobre e grande era um lugar muito vigiado. na
poeta. Após primavera seguinte, quando as
sua morte, ameixeiras se puseram em flor,
vinculou-se a em uma noite de magnífico luar,
seu nome um o poeta foi até o palácio onde
aglomerado de antes vivera sua amada. olhou
mitos e histórias ao seu redor e tudo lhe pareceu
apócrifas, diferente. lançou-se ao chão e
muitas delas chorou, até que a lua começou a
criadas para dar se pôr por detrás das montanhas.
contexto aos então, ele compôs este poema
seus poemas —
como neste caso, nem a lua é aquela
em que o título
ultrapassa nem aquela
o número de a primavera
palavras do
poema em só meu corpo, eu apenas
si. Muitas sou aquele de antes
das histórias 747
associadas a 在原業平
Narihira estão Ariwara no Narihira
reunidas nos
Contos de Ise. tsuki ya aranu / haru ya mukashi no / haru naranu
wa ga mi hitotsu wa / moto no mi ni shite
poema 15 171
須磨の海人の 塩焼衣 筬をあらみ
sem título
間遠にあれや 君が来まさぬ
sem título
なくゆふぐれは たちまたれつつ
冬がれの のべとわが身を 思ひせば
amado, ao ver as fogueiras nos
campos
もえても春を またまし物を
desertos no inverno os campos
como meu corpo sem o teu
mas mesmo mortos os campos
ardem pela primavera
que tarda em mim
791
伊勢
Dona Ise
corações e corpos
neste mundo de dor
são como a flor
no vaso morre
e não se lhe vê na cor
797
小野小町
Ono no Komachi
período kanpyô
つれなき人の 心なりけり
flor do esquecimento
onde terá brotado
a tua semente? A “flor do
decerto no coração esquecimento”
(wasuregusa)
de quem mal me quer é o lírio-de-um-
802
dia. Essa flor
素性法師
é associada ao
Monge Sosei verão ou ao mal
de amor.
wasuregusa / nani wo ka tane to / omoishi wa
tsurenaki hito no / kokoro narikeri
はつかりの なきこそわたれ 世中の
sem título
o ganso selvagem
人の心の 秋しうければ
なく涙 雨とふらなむ わたり河
水まさりなば かへりくるがに
as lágrimas que choro
sejam chuva
transbordem caudalosas
o Rio dos Mortos
e a tragam de volta
829
小野篁
Ono no Takamura
sobe a neblina
no vale de relva alta
cobre tudo de sombras
esconde o poente
que dia mais triste
846
文屋康秀
Fun’ya no Yasuhide
亡き人の 宿に通はば ほととぎす
sem título
かけて音にのみ 泣くと告げなむ
cuco, se tu fores
aonde está meu amado
no Reino dos Mortos
diz a ele que como tu
passo a vida a lamentar
855
Autoria desconhecida
em resposta ao escárnio de
かたちこそ 深山がくれの 朽木なれ
algumas damas
心は花に なさばなりなむ
o corpo é feio
como os troncos podres
nos bosques absconsos
mas o coração
dá flores a quem quiser
875
兼芸法師
Monge Kengei
vamos lá em caminhada
até o Morro do Espelho
para dar uma espiada
e averiguar se este corpo
está mesmo assim tão velho
899
大友黒主
Ôtomo no Kuronushi
世中は なにかつねなる あすかがは
sem título
きのふのふちぞ けふはせになる
há algo neste mundo
que seja para sempre?
amanhã é um rio
ontem, águas fundas
hoje, baixios
933
Autoria desconhecida
sem título
世をうぢ山と 人はいふなり
casinha de palha
no sudeste da capital
as pessoas chamam
o lugar onde moro
de Morro do Casmurro
983
喜撰法師
Monge Kisen
もたえず
よりくれ竹の世世に
ちはやぶる神のみよ
INTRODUÇÃO
chihayaburu desde a idade dos deuses
kami no miyo yori desde a era de sua fúria
kuretake no ao longo de mais gerações
yoyo ni mo taezu do que há nos bambus nós
みだれて
山のはるがすみ思ひ
あまびこのおとはの
PRIMAVERA
amabiko no cantamos com poemas
otowa no yama no se a bruma de primavera
harugasumi envolve os montes
omoimidarete e sentimos que a vida é bela
くごとにたれもねざめて
さよふけて山ほととぎすな
さみだれのそらもとどろに
VERÃO
samidare no quando chove no verão
sora mo todoro ni e ruge no céu o trovão
sayo fukete quando no meio da noite
yama hototogisu escutamos o canto
naku goto ni dos cucos da montanha
tare mo nezamete e acordamos
poema 19 189
見てのみしのぶ
の山のもみぢばを
からにしきたつた
OUTONO
e quando vemos kara nishiki
maravilhados as cores tatsuta no yama no
do brocado de folhas momijiba wo
tingidas do monte Tatsuta mite nomi shinobu
INVERNO
ゆきの猶きえかへり
の夜の庭もはだれにふる
神な月しぐれしぐれて冬
COMEMORAÇÕES
quando todos os anos toshi goto ni
renova-se o ciclo do tempo toki ni tsuketsutsu
se pedem os sentimentos aware chô
cantamos o que sentimos koto wo iitsutsu
e pedimos mil anos de vida kimi wo nomi
e glória ao imperador chiyo ni to iwau
る思ひも
がのふじのねのもゆ
世の人のおもひする
AMORES
se a gente deste mundo yo no hito no
sofre de paixão omoi suruga no
quando queima a emoção fuji no ne no
como arde a lava do Fuji moyuru omoi mo
190 poemas rpmias
みだ
わかるるな
あかずして
ADEUSES
akazu shite quando choramos
wakaruru namida em despedidas doídas
に
くさのことのはごと
藤衣おれる心もやち
LAMENTOS
fujigoromo quando o luto
oreru kokoro mo nos parte o coração
yachi kusa no se este mundo
koto no ha goto ni nos enche de dor
たまの
とすれどたまのをのみじかき心思ひあへず猶あら
といせの海のうらのしほがひひろひあつめとれり
すべらぎのおほせかしこみまきまきの中につくす
DEDICATÓRIA
suberagi no eu recebi do divino
ôse kashikomi imperador a tarefa
maki maki no de juntar rolo por rolo
naka ni tsukusu to estas folhas de relva
ise no umi no como na costa de Ise
ura no shiogai juntam conchas
hiroiatsume os pescadores na praia
toreri to suredo juntei os poemas
tama no o no como contas preciosas
mijikaki kokoro mas sendo eu sem talento
omoiaezu e de pouca inteligência
nao aratama no não ficou como devia
poema 19 191
らむ
さおふるいたまあらみふる春さめのもりやしぬ
つかふとてかへりみもせぬわがやどのしのぶぐ
年をへて大宮にのみひさかたのひるよるわかず
QUEIXA
os anos passam toshi wo hete
e eu não deixo o palácio ômiya ni nomi
a serviço do meu senhor hisakata no
sem saber se é dia ou noite hiru yoru wakazu
sem nunca abandonar tsukaru tote
a lida nem sentir kaerimi mo senu
saudades de casa waga yado no
a erva daninha cresce shinobugusa ouru
nas fendas do telhado itama arami
e as goteiras inundam furu harusame no
meu quarto frio e vazio mori ya shi nuramu
1002
紀貫之
Ki no Tsurayuki
192 poemas rpmias
SEDÔKA
そのそこに しろくさけるは なにの花ぞも
うちわたす をち方人に 物まうすわれ
sem título
ei você
aí do outro lado
quero te perguntar
que flor é essa
A resposta
que desabrocha tão branca
da pergunta nos campos de lá?
é “a flor da 1007
ameixeira”. Autoria desconhecida
No entanto,
especula-se que uchiwatasu / ochikatabito ni / mono môsu ware
esta dupla de sono soko ni / shiroku sakeru wa / nani no hana zo mo
poemas se refira
a algum ritual まひなしに ただなのるべき 花のななれや
epitalâmico, resposta à anterior 春されば のべにまづさく 見れどあかぬ花
a flor sendo
um símbolo do
feminino.
esta flor
é a primeira a abrir
na primavera de cá
respeite a beleza da flor
não fique em vão indagando
só por perguntar
1008
Autoria desconhecida
HAIKAI
sem título
人く人くと いとひしもをる
梅花 見にこそきつれ 鶯の
sem título
とへどこたへず くちなしにして
O Departamento Imperial de
Poesia era responsável por preservar
os textos dos rituais da corte e de
outras cerimônias religiosas. No final
deste livro, há um adendo de poemas
que o importante poeta Fujiwara no
Teika (séc. XIII) preservou de cópias
manuscritas mais antigas. Dessa
sequência, traduzi o poema 1110, da
princesa Sotôri, personagem de uma
fase muito anterior da história do Japão
(séc. V).
O deus Naobi
あたらしき 年の始に かくしこそ
poema para o deus naobi
ちとせをかねて たのしきをつめ
tinha o poder de
transformar o
azar em sorte. que por mais mil anos
O Kojiki relata
que nasceu de se prolonguem as alegrias
um ritual de como a lenha da fogueira
purificação
de Izanagi. que juntos empilhamos
Durante a festa no novo Ano-Novo
do deus Naobi, 1069
o imperador Autoria desconhecida
oferecia um
banquete e se atarashiki / toshi no hajime ni / kakushi koso
acendia uma chitose wo kanete / tanoshiki wo tsume
grande fogueira.
しもやたび おけどかれせぬ さかきばの
Em português,
o sakaki canção para um ritual xintoísta
たちさかゆべき 神のきねかも
se chama
“japoneira
templária”, qual as folhas do sakaki
devido ao que estão sempre vivas
fato de ser
uma árvore mesmo debaixo da neve
frequentemente as sacerdotisas do culto
encontrada
no pátio de permanecem sempre jovens
santuários. 1075
A religião Autoria desconhecida
xintoísta
dá especial shimo ya tabi / okedo karesenu / sakakiba no
importância às tachisayaku beki / kami no kine ka mo
plantas perenes.
poema 20 197
ちはやぶる かものやしろの ひめこまつ
O Festival de
Inverno de Kamo
jovem pinheiro era realizado
do santuário de Kamo anualmente,
mas não tinha
os deuses e sua fúria data fixa. Os
preservem o teu verde pinheiros, que
permanecem
por mais dez mil anos verdes mesmo
1100 no inverno, são
藤原敏行 um símbolo de
Fujiwara no Toshiyuki longevidade e
constância.
chihayaburu / kamo no yashiro no / hime komatsu
yorozu yo fu tomo / iro wa kawaraji
para o imperador
くものふるまひ かねてしるしも
referências
BORGES, J.L. Biblioteca CUNHA, A. Cem poemas de
personal. Madri: Alianza, cem poetas: a mais querida
2008. antologia poética do Japão.
Porto Alegre: Bestiário /
BROWER, R.; MINER, E.
Class, 2019.
Japanese Court Poetry.
Stanford: Stanford CUNHA, A. O Livro de
University, 1988. Travesseiro: questões
de autoria, tradução e
CARTER, S. Traditional adaptação. 2016. 296
Japanese poetry: an p. Tese (Doutorado em
anthology. Stanford: Literatura Comparada)
Stanford University, 1991. — Programa de Pós-
Graduação em Letras,
CUNHA, A. Alguns
Universidade Federal do
aspectos literários do
Rio Grande do Sul, Porto
culto à natureza no
Alegre.
Japão. In: SCHMIDT, R.;
MANDAGARÁ, P. (orgs.). GOGA, H. M.; ODA, T.
Sustentabilidade: o que Natureza – berço do
pode a literatura?. 1ed. haicai: kigologia e
Santa Cruz do Sul: UNISC, antologia. São Paulo:
2015, p. 191–210. Diário Nippak, 1995.
poeopmasriv 199
A (séculos IX–X).Filho do
governador da província
de Chikuzen. Poemas 1, 103,
339, 630 (4).
Abe no Nakamaro ♂ (698?
– 770?). Foi enviado Ariwara no Narihira ♂
muito jovem à China, (825–880). Neto do
como membro de uma imperador Heizei (o
embaixada do Japão, Mikado de Nara) por parte
para que realizasse seus de pai e do imperador
estudos. Mais velho, Kanmu por parte de mãe.
tentou voltar à terra natal, Recebeu o sobrenome
mas seu navio naufragou e Ariwara para ser excluído
ele retornou à China, onde da linha de sucessão
morreu septuagenário. imperial. Inspirou o
Mencionado no “Prefácio”. personagem Hikaru Genji
Poema 406 (1). de O Romance do Genji,
de Murasaki Shikibu (séc.
Akahito. V. Yamabe no XI). Sua figura, em parte
Akahito. baseada em fatos reais,
Amaneiko. V. Harusumi no em parte em mito e lenda,
Amaneiko. é associada à excelência
em poesia, à grande
204 poemas ro iapvo aãutno
C
incluídos na antologia não
tem autoria especificada.
Isso se deve a vários
motivos. Alguns são de
poetas muito antigos Chisato. V. Ôe no Chisato.
que tiveram seu nome
poemas rorivãumar-tmrncvçmar
2 05
D Fujiwara no Toshiyuki ♂
(?– c. 901). Era poeta e
calígrafo. É um dos “36
Gênios Poéticos”. Poemas
Dona Ise ♀ (c. 875 – c. 938). 169, 269, 578, 1100 (4).
Possui um total de 170
poemas em antologias Fujiwara no Yoruka ♀ (fim
imperiais. Está entre os “36 do séc. IX). Dama da corte.
Gênios Poéticos”. Poemas Poema 80 (1).
43, 138, 676, 681, 791 (5). Fun’ya no Yasuhide ♂
Dona Nijô ♀ (842–910). (século IX). Era Segundo
Consorte do imperador Diretor do Guarda-
Seiwa e mãe do imperador Roupa Imperial. Um
Yôzei. Teve um caso com dos “6 Gênios Poéticos”.
o monge Zen’yû e foi Mencionado no “Prefácio”.
afastada da corte. Seu Poemas 8, 249, 250, 849 (4).
título foi restabelecido
postumamente. Poema 4
(1).
H
F Harusumi no Amaneiko
♀ (séc. IX). Serviu como
Fujiwara no Okikaze ♂ dama de honra no palácio
(séculos IX–X). É um imperial. Poema 107 (1).
dos “36 Gênios Poéticos”.
Heizei, Heizei Tennô. V.
Poemas 102, 301, 745 (3).
Mikado de Nara.
Fujiwara no Tadafusa ♂
Henjô. V. Monge Henjô.
(? –928). Célebre por seu
talento como flautista. Hitomaro. V. Kakinomoto
Poema 196 (1). no Hitomaro.
206 poemas ro iapvo aãutno
I Ki no Tomonori ♂ (? – c.
905). Um dos compiladores
do Kokin’wakashû. Primo
Imperador Heizei. V. de Ki no Tsurayuki. Possui
Mikado de Nara. 67 poemas em antologias
Imperador Monmu. V. imperiais. Mencionado no
Mikado de Nara. “Prefácio”. Poemas 13, 38, 84,
177, 178, 562, 615 (7).
Ise. V. Dona Ise.
Ki no Tsurayuki ♂
(868–945). Foi um dos
K compiladores da antologia
Kokin’wakashû e autor
do importantíssimo
“Prefácio em hiragana”.
Kakinomoto no Hitomaro
Foi diretor da Biblioteca
♂ (c. 660 – c. 720).
Imperial. É um dos “36
Juntamente com Yamabe
Gênios Poéticos” e uma das
no Akahito, é considerado
mais importantes figuras
um dos “2 Deuses da
literárias da história do
Poesia”. Também faz parte
Japão. Autor do “Prefácio”.
do grupo dos “36 Gênios
Poemas 42, 79, 89, 117, 160,
Poéticos”. É um dos poetas
170, 262, 342, 352, 404, 804,
mais importantes da era
1002 (12).
do Man’yôshû. Escrevia
tanto tanka como chôka. Kisen, Kisen Hôshi. V.
Mencionado no “Prefácio”. Monge Kisen.
Poema 324 (1).
Kiyohara no Fukayabu ♂
Kanemi-no-ôkimi. V. (séculos IX–X). Bisavô de
Príncipe Kanemi. Sei Shônagon, a autora de
O Livro de Travesseiro.
Kanemori. V. Taira no
Possui 41 poemas em
Kanemori.
antologias imperiais.
Kengei, Kengei Hôshi. V. Poema 581 (1).
Monge Kengei.
poemas rorivãumar-tmrncvçmar
2 07
poetas do século IX e
possui uma antologia
individual. É um dos “36
N
Gênios Poéticos”. Poemas Nakamaro. V. Abe no
27, 165, 226, 394 (4). Nakamaro.
Nara no Mikado. V. Mikado
Monge Kengei ♂ (fim do séc.
de Nara.
IX). Um monge da região
Narihira. V. Ariwara no
de Shirogami, na província
Narihira.
de Yamato. Poema 875 (1).
Nijô. V. Dona Nijô.
Monge Kisen ♂ (século
O
IX). Um dos “6 Gênios
Poéticos”. Não se sabe
quase nada de sua
biografia. Mencionado no Ôe no Chisato ♂ (séculos IX–
“Prefácio”. Poema 983 (1). X). Sobrinho de Ariwara no
Yukihira e de Ariwara no
Monge Sosei ♂ (séculos IX– Narihira. Poema 271 (1).
X). Filho de Henjô. Poeta
Okikaze. V. Fujiwara no
e calígrafo. É um dos “36 Okikaze.
Gênios Poéticos”. Poemas 6,
Ono no Chifuru ga Haha. V.
56, 181, 357, 802, 1012 (6). Mãe de Ono no Chifuru.
Monmu, Monmu Tennô. V. Ono no Komachi ♀
Mikado de Nara. (primeira metade do
século IX). Uma das mais
Motokata. V. Ariwara no importantes poetas da
Motokata. Antiguidade. Seu estilo
é único no contexto do
Muneyuki. V. Minamoto no Kokin’wakashû. Era capaz
Muneyuki. de expressar extrema
poemas rorivãumar-tmrncvçmar
2 09
Shigeharu. V. Ariwara no
Shigeharu.
Shitateru-hime-no-mikoto.
T
V. Princesa Shitateru.
Tadafusa. V. Fujiwara no
Sôjô Henjô. V. Monge Henjô. Tadafusa.
Sosei, Sosei Hôshi. V. Tadamine. V. Mibu no
Monge Sosei. Tadamine.
Sotôri-hime. V. Princesa Taira no Kanemori ♂ (? –
Sotôri. 990). Possui 87 poemas em
Sugano no Takayo ♂ (início antologias imperiais e uma
do séc. IX). Pouco se sabe coletânea individual. É um
de sua biografia. Poema 81 dos “36 Gênios Poéticos”.
(1). Mencionado no “Prefácio”.
poemas rorivãumar-tmrncvçmar2 11
W
Taira no Sadafun ♂ (871?
– 931). Secretário do
governador da província
de Mikasa. Poemas 238, 279
(2). Wani ♂ (séc. IV?). Autor
da “Canção de Naniwa”.
Takamura. V. Ono no
Sábio coreano que trouxe
Takamura.
a primeira cópia dos
Takayo. V. Sugano no Analectos de Confúcio
Takayo. para o Japão. Mencionado no
Tomonori. V. Ki no “Prefácio”.
Tomonori.
Toshiyuki. V. Fujiwara no
Toshiyuki. Y
Tsurayuki. V. Ki no
Tsurayuki. Yamabe no Akahito ♂
(século VIII). Atuou como
poeta na corte durante a
Yoruka. V. Fujiwara no
Yoruka.
Yukihira. V. Ariwara no
Yukihira.
sobre
o tradutor
Andrei Cunha nasceu em 1973 em Pelotas (RS),
filho de um casal de professores de literatura.
Morou sete anos em Tóquio, onde desenvolveu
uma obsessão crônica pelo grupo musical Pizzicato
Five e fez graduação em Direito e mestrado em
Relações Internacionais na Universidade de
Hitotsubashi. De volta ao Brasil, defendeu tese de
Doutorado em Literatura Comparada na UFRGS
sobre a obra de Sei Shônagon. Tem traduções
publicadas de Ogawa Yôko, Nagai Kafû, Inoue
Yasushi, Tawada Yôko e Tanizaki Jun’ichirô e atua
como professor de Língua, Cultura e Literatura
Japonesa na UFRGS desde 2010. Em 2019, lançou
uma edição comentada de Cem poemas de cem
poetas (Ogura hyakunin isshu) pela Bestiário/Class.
Vive em Porto Alegre com o marido Marcelo, com
quem tem três gatos: Cecília (como a Meireles),
Bette Davis e Sugawara no Michizane.
poemas do Japão antigo
seleções do Kokin’wakashû
古今和歌集抄
EX ORIENTE LUX
Acabou-se de compor
em Alegreya e EPSON 行書体