Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Contents
Nota da Autora
Playlist
Prólogo
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
Capítulo Cinco
Capítulo Seis
Capítulo Sete
Capítulo Oito
Capítulo Nove
Capítulo Dez
Capítulo Onze
Capítulo Doze
Capítulo Treze
Capítulo Quatorze
Capítulo Quinze
Capítulo Dezesseis
Capítulo Dezessete
Capítulo Dezoito
Capítulo Dezenove
Capítulo Vinte
Capítulo Vinte e Um
Capítulo Vinte e Dois
Capítulo Vinte e Três
Capítulo Vinte e Quatro
Capítulo Vinte e Cinco
Capítulo Vinte e Seis
Capítulo Vinte e Sete
Capítulo Vinte e Oito
Capítulo Vinte e Nove
Capítulo Trinta
Capítulo Trinta e Um
Capítulo Trinta e Dois
Capítulo Trinta e Três
Capítulo Trinta e Quatro
Capítulo Trinta e Cinco
Capítulo Trinta e Seis
Capítulo Trinta e Sete
Capítulo Trinta e Oito
Epílogo
Agradecimentos
About The Author
Books By This Author
Para meu futuro marido, seja lá onde você esteja, esta obra fez
parte do meu processo de te esperar.
E para todas as garotas que cresceram na igreja e nunca
conseguiram se identificar com nenhuma protagonista de romance.
Nosso momento chegou!
Após o culto terminar, tentei enrolar Júlia ao máximo, mas ela não se
rendeu às minhas desculpas esfarrapadas. A garota quase me arrastava
enquanto andávamos.
Senti o coração acelerar ao ver o meu destino: o grupo de jovens.
Desde que cheguei à igreja, a única pessoa com quem eu havia conversado
ali era a Júlia, e apenas porque a mãe dela era amiga da minha, então fomos
obrigadas a conviver, e graças a Deus nos aproximamos, senão eu ainda
estaria sozinha.
Por ser mais fechada, eu raramente frequentava o culto de jovens. Na
verdade tinha ido apenas uma vez, mas tive a “grande sorte” de ir justo
quando várias igrejas se juntaram, deveria ter mais de cinquenta pessoas ali,
mal acabou e voltei para casa, ignorando todos os outros insistentes convites
de Júlia.
Contudo, pelo jeito, a garota conseguiu a situação perfeita para me forçar
a me aproximar deles. No mesmo instante, eles pararam de conversar e uma
voz lá no fundinho da minha cabeça sussurrou que era por minha causa.
— Oie — Júlia cumprimentou a todos de forma geral. — Gente, essa é a
Marta, aquela amiga sobre quem comentei!
Mordi o lábio, envergonhada, sem saber como reagir, por isso apenas
acenei sem jeito. Foi Gabriel quem teve a iniciativa da rodinha para me
cumprimentar.
Olhando-o de perto, percebi algumas características nele semelhantes às
de Júlia. Além de que ele também não era tão diferente do descrito pela
minha amiga, mais ou menos alto, com cabelos loiros e olhos claros, cuja cor
eu não conseguia identificar olhando rápido. E, apesar de ter repreendido
esse pensamento um segundo depois, admiti que ele realmente era bonito.
— Olá, Marta, prazer! — o Mendes estendeu a mão para mim. Estava tão
nervosa que não percebi seu gesto e apenas acenei com a cabeça,
cumprimentando-o.
— Oi, Marta! — Uma outra jovem se aproximou animada e me
cumprimentou com um beijo no rosto. — Eu sou a Mariana, mas pode me
chamar de Mari — ela falava enquanto ia se afastando um pouco. — Seja
bem-vinda à nossa igreja, espero que tenha gostado do culto!
Abaixei a cabeça, pensando em como falar que na verdade eu já estava há
vários meses na igreja, mas, graças a Deus, a Júlia interveio por mim.
— Mari, na verdade a Marta está há uns seis meses aqui — ela explicou
embaraçada.
O rosto de Mari começou a tomar um tom avermelhado, era visível como
ela ficou sem jeito com a situação.
— Mil desculpas, é que e-eu…
— Tudo bem — ousei falar, pela primeira vez até então, para acalmá-la.
— Eu fico no canto mesmo, normal você não perceber. — Tentei ser o mais
gentil possível no meu tom de voz.
O que não era uma mentira, eu nunca me envolvi em nenhum grande
evento da igreja; quando eu ajudava, era na casa de Júlia para produzir
alguma coisa da decoração ou alimentação. Então, seria difícil alguém me
perceber.
— Nem pensar, isso é uma falha minha. Como filha do pastor e
principalmente filha de Deus, eu devo ser gentil com os irmãos. Depois vou
querer conversar a sós com você, tudo bem?
Assenti, concordando, mas por dentro torcendo para ela esquecer isso e
seguir a vida como foi nesse tempo todo.
A realidade é que, apesar de entender o lado da Mariana e saber que ela
procurava resolver a situação constrangedora, eu me sentia cada vez mais
deslocada naquele ambiente. Para mim parecia óbvio o quanto estava
atrapalhando a conversa deles e como só estavam esperando eu sair para
voltar aos seus assuntos. Além do mais, eu só queria ir para a minha casa
logo e me refugiar no quarto junto de um livro.
— Bom, então vou apresentar o pessoal para você conhecer. — Até tentei,
mas, antes que conseguisse protestar, Mari já estava falando. — Como eu
disse, sou a Mari, e aquela magrinha lá — Ela apontou para uma menina que
estava afastada, conversando com outras garotas. —, é minha irmã, a Luísa,
mas ela você já deve conhecer, a Lu vive ajudando papai nos cultos.
Assenti, concordando. Na realidade eu já sabia sobre as duas e os nomes
de todos os outros, pois sempre ouvia Júlia comentando. Mas a deixei falar,
já que era sua vontade ser receptiva.
— Esse é o Gabriel, que você acabou de conhecer. Esse cheio de tranças
aqui — ela puxou um rapaz pelo moletom —, é o David. David, dá oi para a
Marta — ordenou.
— Oi, Marta! — Ele acenou constrangido pela atitude da amiga.
— Oi — respondi.
— E seja bem-vinda ao nosso clube das Luluzinhas!
— Mariana! — os dois rapazes chamaram a atenção da moça ao mesmo
tempo.
— Tá bom, tá bom. — Ela revirou os olhos. — Seja bem-vinda ao clube
das Luluzinhas e dos Bolinhas!
— Seja bem-vinda a essa loucura que são esses daqui — Gabriel falou,
rindo. Porém sua atenção foi captada por alguma coisa, ou alguém, atrás de
mim. — Gente, com licença, já volto. — E saiu na direção da pessoa.
Comecei a estalar os dedos, tentando dissipar o nervosismo. Eles, então,
passaram a conversar sobre alguma festa de casamento que estava para
acontecer. E novamente me senti jogada de lado, mesmo com as várias
tentativas da Mariana em me envolver, eu não entendia o assunto, nem ao
menos estava prestando muita atenção, afinal, não seria convidada mesmo.
Quando eu ia me virar para a Júlia pedindo para sairmos dali, outra pessoa
se aproximou e fui obrigada a esperar mais um tempo.
— Olha, tem gente nova aqui — Luísa chegou referindo-se a mim.
— Oi, Lu, essa é a Marta. Ela chegou recentemente na igreja. — Mariana
começou a nos apresentar. — Recentemente entre aspas, tem uns meses já —
disse com um sorriso amarelo.
— Ah, sim, é aquela guria[3] quietinha, lembro de ter visto algumas vezes.
Oi, Marta, prazer, eu sou a Luísa, mas pode me chamar de Lu! — Ela
chegou da mesma forma que a irmã, me cumprimentando com um beijo no
rosto.
Então, embarcamos em uma conversa sobre vários assuntos. Dessa vez, a
Luísa fazia questão de me incluir, sempre perguntando minha opinião,
falamos sobre livros, filmes, as revistas de que mais gostávamos, etc. Ela
tomava cuidado em manter a conversa sempre em uma linha em que eu não
ficaria de fora.
— Aproveitando que está quase todo mundo aqui — Mariana chamou
atenção para si. —, estou pensando em realizar um culto de jovens na praça
no próximo mês, vocês vão, né?
— Claro, até lá a Nina já vai ter chegado, ela pode ajudar também —
David comentou.
— Sério, Dave? — Pela expressão de alegria da Mari, ela era
superpróxima dessa moça. — Ai, estou com saudades dela.
Pensei em perguntar quem era Nina, porém achei melhor ficar quieta; se
ela viesse, eu descobriria. Ou eu poderia falar com Júlia depois.
— Sim, na verdade ela já está no Brasil, mas foi passar uns dias na casa
dos parentes lá em São Paulo, e, se não acontecer nenhum contratempo,
chega ainda esta semana — ele explicou.
— Será uma bênção, todo mundo sabe que a Nina tem um dom
maravilhoso para tocar e cantar — Luísa adicionou e todos concordaram.
— Eu me lembro da última vez, ela fez um dueto lindo com o Gabriel,
precisamos refazer — Mari falou. — Estou contando com a ajuda de vocês.
— Pode confirmar a minha presença, da Júlia e da Marta!
Ao ouvir a fala de Gabriel, levei um susto. Rapidamente virei o corpo para
prestar contas da sua confirmação sem falar comigo antes.
Porém não contava com a presença dele centímetros atrás de mim. No que
me movi, acabei trombando no rapaz, derrubando o copo de café de sua mão
e, por consequência, molhando a sua roupa.
— Ai, meu Deus, perdão — pedi desesperada.
Peguei um lenço que tinha na bolsa e esfreguei para secar a blusa dele,
mas parei ao constatar o quão imprópria tinha sido a minha atitude e o quão
próxima estava do rapaz.
E, ao perceber que todos me encaravam chocados, acabou só piorando o
nervosismo que eu já estava sentindo.
Pedindo desculpas e licença, saí rumo ao banheiro, mas a minha
verdadeira vontade era me enfiar em um buraco no chão.
Capítulo Dois
“Não me olha assim
Com esse ar de quem sonhou
A vida inteira em me encontrar
Porque eu vou acreditar.”
(Aline Barros - Por Toda a Minha Vida)
O
letreiro em neon escrito “Nonna’s Pizzaria” denunciava que havíamos
chegado ao estabelecimento. Os donos já pareciam conhecer o pessoal, pois
cumprimentaram a todos com um abraço e uma mulher nos encaminhou para
um lugar que ela disse ser o favorito deles.
— Agora conte as ideias, Mari — Nina pediu ao sentarmos.
— Bom, eu estava pensando em começarmos um evangelismo à tarde,
para convidar as pessoas para o culto à noite. Aí, teria alguma coisa com
crianças, poderíamos tocar uns louvores, essas coisas, para atrair atenção,
sabe?
— Sim, eu e a Ju ficamos responsáveis pelos pequenos, como sempre —
Luísa se candidatou.
— Você vai querer fazer alguma coisa, Marta? — Mariana me questionou
sem desviar os olhos do seu caderno.
Neguei. Mesmo que quisesse, não sabia fazer nenhum desses grandes
trabalhos igual a eles.
— Tudo bem, então, mas, se tiver alguma ideia, não fique com receio de
opinar, tá? — Ela deu uma piscada e concordei com a cabeça.
Então, eles engajaram na conversa, discutindo sobre quem faria o que
durante o dia do culto. Mas, em determinado momento, o garçom se
aproximou, interrompendo-os.
— Vai ser o de sempre? — ele questionou.
— Sim — Gabriel respondeu devolvendo os cardápios. — Ah, não,
espera! Marta — Ele se virou para mim. —, você quer algum sabor
específico? Nós vamos pedir uma de frango, uma de quatro queijos, uma
bolonhesa, uma napolitana e talvez uma doce de chocolate branco.
Abri a boca, surpresa pelo número de pizzas, fazendo um cálculo rápido,
daria em torno de oito pedaços para cada um.
— Sem problemas, podem ser esses mesmo — falei e o garçom assentiu,
afastando-se.
— Esses dois vão competir por quem come mais — Luísa se direcionou a
mim, explicando.
— Como?
— Sim, da última vez eu comi doze pedaços — Gabriel se gabou,
encostando-se na cadeira.
— Doze?! — questionei abismada.
Eu não conseguia me imaginar passando de três pedaços, e isso era
quando eu estava com muita fome.
— Isso aí é magro de ruim. — Mariana bufou, jogando uma bolinha de
guardanapo no rapaz.
— Eu tenho corpo atlético. — Ele ergueu os ombros, sorrindo. —
Brincadeira, ou não, mas realmente faço bastante esforço nas construções, aí,
por consequência, como mais.
David, então, declarou que dessa vez iria vencer, o que desencadeou uma
“discussão” sobre quem era o melhor nisso.
— Vocês dois podem fazer o favor de agirem como os adultos que
aparentam ser? — Nina elevou a sua voz com um tom bravo, mas ambos
apenas gargalharam na cara dela. — Misericórdia — ela murmurou com um
olhar de repreensão.
Eu estava surpresa e encantada pela amizade deles, a sinceridade dos dois
em rirem dela e ela levando tudo na brincadeira. Era admirável aquele laço e
união que tinham.
— Gente, papo firme, vocês não acham melhor cuidar da saúde, não?
Porque no momento os dois estão na fase do metabolismo acelerado ainda,
mas vai vir a idade e as consequências dessas competições bestas vão
aparecer — Nina voltou a falar, séria. Gabriel e David abaixaram a cabeça
concordando. — Além do mais, quem precisa te fazer engordar sou eu
quando for sua esposa, David, não o pizzaiolo!
Gabriel tentou segurar a risada, mas não conseguiu e contagiou toda a
mesa.
— Quero só ver quando for a sua vez, Gabriel — David o repreendeu.
— No momento quem está com um casamento às portas é você, meu
amigo. — Ele deu “leves” tapinhas nas costas de David.
— Mas você também tem que pensar em encontrar uma esposa, formar
uma família, alguém para te auxiliar, sabe? — O outro rebateu.
— Ah, caso seja da vontade de Deus, eu não reclamaria.
— E o que você procura em uma mulher? — Mari questionou,
envolvendo-se no assunto.
— Ah — ele coçou a nuca, pensando —, que ela seja uma cristã genuína,
que busque a Deus, que goste de evangelizar, falar do evangelho, seja uma
mulher ativa na obra, sei lá, essas coisas básicas.
Mordi o lábio, pensando em como eu não teria qualquer possibilidade com
ele, pois não cumpria muitos requisitos devido à vergonha e timidez. Não era
como se eu quisesse, de forma alguma, mas precisaria avisar minha mãe para
ela perder suas esperanças, pois ela estava bem mais animada para um futuro
entre nós dois do que eu.
No momento em que ele falou, vi os olhos de Luísa se abaixarem, com um
pequeno sorriso tímido surgindo e, pela sua expressão, percebi que ele já era
o dono das afeições de alguém.
— E você, Mariana? — Gabriel rebateu com um sorriso para a morena.
— Você sabe muito bem que nem penso nisso. — Ela ergueu o queixo,
demonstrando seriedade, mas dava para ver que estava segurando a risada.
— Ai, Mari, não sei como você não quer se casar — Júlia falou rindo. —
Eu fico me imaginando entrando na igreja de branco, com a marcha nupcial
ao fundo e Gabriel me levando em direção ao amor da minha vida. Então,
daremos nosso primeiro beijo e entraremos na escola oficial de santificação
e teste de paciência — ela narrou, suspirando.
— Pelo menos não perco meu tempo sonhando acordada e consigo me
dedicar cem por cento à obra do Senhor — a morena se defendeu. — Não é
que eu não queira casar, não reclamaria, mas também não tenho problemas
em morrer solteira servindo a Deus.
— Vemos claramente que não somos nem um pouco parecidas nesse
quesito — Luísa murmurou, levando todos a darem risada do seu jeito.
— Vemos claramente quem puxou a parte romântica da família. —
Mariana brincou e abraçou a irmã de lado. — Mas sério, gente, se, se — ela
reforçou — eu chegar a ter um marido, tenho pena do coitado. Capaz de ser
mil vezes mais romântico que eu, mesmo sendo homem.
— Gabriel não tem esse problema, meu Deus, a esposa dele vai ser
sortuda, pensa em um cara romântico. — Júlia falava e me lembrei da
brincadeira na vinda para a igreja. — Sério, vira e mexe ele aparece com
buquê de flores para mim e minha mãe, compra chocolate, dá presente. Tudo
com esse jeito palhaço dele.
— Júlia — o rapaz, com uma expressão séria, chamou sua atenção.
Ela soltou um “desculpa” e se calou, envergonhada por ter levado uma
repreensão em público, mas poucos segundos depois ela já voltou a sorrir
com seu jeito costumeiro.
— E você, Marta? — Levei um susto ao ouvir Mariana falando comigo.
— E-eu? — gaguejei.
— Sim, como você está na questão de expectativas? Agora voltadas ao
casamento.
— Ah, eu… — Fiz uma pausa, tentando organizar os pensamentos para
falar sem revelar muito de mim. — Essa é uma ansiedade minha, sonho em
encontrar um homem piedoso para ser meu esposo, mas estou entregando
nas mãos de Deus, não tenho controle disso.
Até pensei em lhes falar sobre as minhas cartas e como elas me ajudavam
a orar por ele, mas isso se encaixaria na parte do revelar demais, por isso
achei melhor ficar quieta.
— É o jeito, né? Infelizmente não temos como prever o futuro — Luísa
falou dando de ombros. — Vamos aproveitar um dia de cada vez.
O grupo, então, entrou em uma animada conversa sobre a palavra de mais
cedo, trazendo diversos versículos extras e discutindo sobre os mais diversos
tipos de ansiedade.
Eu não cheguei a me envolver, mas também não fiquei tão deslocada
como das outras vezes que tinha vindo. Fiquei feliz por ter conseguido me
enturmar um pouco, pensando se teria a chance de vir na próxima semana.
E, principalmente, se teria coragem de admitir ter curtido estar ali.
— Pai, desculpe pela hora — pedi assim que cheguei em casa e vi meu pai
sentado no sofá da sala assistindo Chacrinha.
Ele bateu a mão no ar, como se me dissesse para relaxar.
— Gabriel falou comigo — respondeu sem desviar o olhar da televisão.
— Falou? — Fechei a porta e encostei-me nela, esperando a resposta. —
Pai! — Chamei ao ver que ele não prestava a mínima atenção.
— Desculpa — Ele finalmente se virou para mim. —, mas, então, ele veio
aqui à tarde, você estava no quarto e até ofereci para te chamar, mas ele disse
que queria conversar comigo mesmo. Confesso ter ficado nervoso...
— Pai… — interrompi, indicando para chegar logo ao ponto principal.
Ele tinha uma mania terrível de contar toda a história e acontecimentos
anteriores.
— Enfim, ele veio pedir permissão para te levar ao culto, também avisou
que vocês poderiam sair depois e chegariam tarde, por isso te dei o dinheiro.
Rapaz de ouro aquele.
Após agradecer, caminhei para o quarto pensando no quanto meus
sentimentos estavam mudando, mesmo sem a minha permissão, em menos
de uma semana.
Capítulo Seis
“Eu me exalto, me consolo
Pinto um quadro com meu rosto
Eu levanto meu bom nome
E no fim a queda é grande
Eu assumo um lugar alto
Usurpando esse trono
Que nem mesmo o melhor de nós
É digno de assentar”
(Doxologia Primitiva - Filipenses, O Avesso)
No domingo eu acordei mais animada, feliz por saber que minha mãe ao
menos tentaria não ser tão direta. Suspirando, criei coragem para levantar da
cama. Havia chegado o tão esperado almoço da minha mãe.
Após os cuidados básicos matinais, peguei meu material e me dirigi à
cozinha, procurando algo para comer. Ao chegar lá, vi mamãe andando de
um lado para o outro preocupada.
— Filha, me ajuda, você viu onde está a farinha?
— Mãe, são nove da manhã — argumentei bocejando. — Você deveria
estar fazendo o café, não se preocupando com o almoço.
— Marta! Precisamos ter certeza de que todos os ingredientes estão certos,
pois, caso falte algo, posso te pedir para ir buscar. Aliás, não seria mal, vai
que você acaba encontrando sua amiguinha de novo? — Sorriu, piscando
para mim.
Desviei o olhar sem comentar nada, pois não havia nem ao menos contado
sobre o fato de já ter visto Carina na igreja, sabia que ela iria “surtar”, então
preferi enrolar mais um pouco.
— Tenho certeza de que você comprou tudo — desconversei, pegando a
lista da mão dela e ajudando a conferir se faltava algo.
Após confirmarmos que tínhamos tudo, peguei um pão com uma xícara de
chá e fui me sentar no jardim para fazer o devocional.
Uma hora depois, encerrei-o com uma oração, surpresa com como todas
as vezes Deus me mostrava algo diferente na leitura. Vendo ainda ter tempo,
aproveitei para fazer uma leitura bíblica. Estava envolvida na história de
Davi, quando ele fugia do próprio filho e...
— Marta!
Levei a mão ao coração, sentindo-o a mil pelo grito de Júlia. Minha amiga
estava encostada no portão e segurava o riso por causa de como reagi.
Olhando-a feio, caminhei até lá, apoiando meu corpo do lado de dentro da
grade.
— O que foi? — questionei séria e fingindo-me de brava.
— Vim ficar com você até o almoço, não posso mais? — Ela fez uma voz
dramática, preparando-se para ir embora.
Revirando os olhos, abri o portão e ela entrou dando pulinhos de alegria.
— Você já terminou seu devocional? — perguntou preocupada ao ver
minha Bíblia e meu caderno no chão. Assenti e ela desembestou a falar: —
Massa, estou tão animada. Você sabe como queria esse almoço faz tempo,
não é?
— Uhum — murmurei, pegando minhas coisas. — Mãe, estou no quarto
com a Júlia — gritei ao entrar em casa.
No mesmo instante, minha mãe surgiu enxugando as mãos no pano de
prato e cumprimentou a minha amiga.
— Oi, Julinha, como você está?
— Estou bem, tia Lisa, obrigada. Marta, vamos?
Assim que fechei a porta do quarto, Júlia se jogou na cama, dando risada.
Fiz careta para sua reação e fui guardar meu material. Diferente de mim,
Júlia era uma garota toda alegre, risonha e sempre conseguia arrancar um
sorriso meu, nem que fosse pelas besteiras faladas.
— Amiga, você não se esqueceu do meu aniversário mês que vem, não,
né? — perguntou quando sentei ao seu lado.
— E tem como esquecer? Você só fala dele há meses.
— Vai saber, né? — Deu de ombros. — Eu estou tão animada, enfim
dezoito anos.
Suspirei sem falar uma palavra, já havia avisado que tudo continuaria
igual, chegar à maioridade não mudava nada.
— Eu estava com medo de o Biel não chegar a tempo, mas graças a Deus
deu tudo certo. Agora, me ajuda, qual cor você acha que combina mais
comigo? Rosa ou azul? — Ela ergueu duas bexigas, uma de cada lado do
rosto, e eu fui obrigada a ver qual ficava melhor com seu tom de pele.
Enquanto ela tagarelava sobre sua tão esperada festa, eu apenas ia
concordando e opinando sobre a decoração ou músicas a serem tocadas. E,
nesse clima, o tempo passou tão rápido que me assustei quando mamãe
apareceu chamando nós duas para ajudarmos a arrumar a mesa.
— Filha, você pode lavar a louça, por favor? — minha mãe me pediu ao
findar do almoço.
Como eu estava querendo sair logo dali antes de me enfiarem em outro
constrangimento, concordei. Levantei-me e fiz sinal para Júlia ir comigo,
mas Carla segurou minha amiga, alegando que precisavam conversar sobre a
festa. Como minha mãe era confeiteira, iria fazer o bolo e, de acordo com
elas, precisavam decidir os detalhes sobre isso e sobre a decoração.
Meu pai sumiu com Jonas, afirmando que aquilo era papo de mulherzinha.
Pegando algumas louças, segui para a cozinha e, quando estava voltando
para pegar as outras, vi Gabriel entrando com a panela.
— Vou te ajudar com a louça, quero fugir da conversa de aniversários e
bolos coloridos — explicou revirando os olhos. — Eu pego o resto, pode ir
agilizando aí.
Poucos minutos depois, ele chegou trazendo o resto dos utensílios e me
ajudou a organizar na pia.
Gabriel havia se oferecido para enxugar enquanto eu lavava, assim
diminuindo o trabalho e o tempo. Aceitei e na mesma hora o rapaz pegou o
pano de prato; eu colocava no escorredor, ele já pegava para secar.
— Achei interessante o que você falou sobre missões. — Tentei quebrar o
silêncio.
— Ah, sim, sua mãe comentou domingo passado sobre seu interesse. —
Olhei para ele e o vi segurando a risada, recordando aquela situação.
— Não me lembre daquilo. — Abaixei a cabeça, envergonhada. — Ela às
vezes, quase sempre — murmurei —, perde o limite e exagera.
— Ela não fez por mal.
— Eu sei — Dei uma risada baixa, lembrando as diversas situações
constrangedoras em que ela me enfiou. —, eu sei que ela tem boas intenções,
mas eu não sou a menina espontânea sonhada e idealizada por ela. — Mordi
o lábio, nervosa e surpresa, nunca havia falado sobre isso com ninguém e, de
repente, solto para um cara que conheci há uma semana. — Desculpe, você
não tá aqui para ouvir meus dramas. — Senti as bochechas queimarem de
vergonha.
Era por motivos assim que eu preferia ficar na minha e não conversar,
sempre soltava algo inadequado.
— Tudo bem, eu não vou contar para ela, é normal o desabafo. Sua
personalidade é mais introvertida mesmo. — Parei de lavar a louça e encarei
a pia, respirando fundo para tentar me controlar. — Eu estava conversando
com a minha mãe e com a Júlia sobre você, e elas comentaram mesmo desse
seu jeito mais retraído.
Franzi a testa, questionando-me sobre o motivo de eles falarem sobre
mim.
— Mas você deveria tentar interagir mais — ele continuou e eu revirei os
olhos, vendo o rumo da conversa. — Ei, é sério, sabia que timidez em
muitos casos é um egocentrismo?
— Como é que é? — questionei, abismada pela ousadia dele. Pelo pouco
tempo que o conhecia, já tinha percebido como Gabriel era bem direto na
hora de falar, e nem sempre isso era bom.
— Sim, apesar de as pessoas introspectivas alegarem preferir ficar fora do
centro das atenções, na verdade elas sempre pensam que o mundo gira ao
redor delas e todos prestam atenção nos seus movimentos. É uma coisa meio
inconsciente, mas mesmo assim um pecado, pois nos colocamos acima de
Jesus — ele se explicou. — Não sei se você já reparou em Apocalipse 21:8,
lá está escrito que os incrédulos, homicidas, prostitutos, feiticeiros,
mentirosos e, inclusive, os tímidos — Ele deu ênfase à palavra. —, irão para
o lago que arde com fogo e enxofre.
Ele fez uma pausa, esperando eu digerir, antes de continuar. Na verdade,
eu estava mais pronta para revirar os olhos, não era como se fosse a primeira
vez que eu escutava aquelas palavras.
— É interessante analisarmos como a timidez está incluída entre tantos
outros pecados abomináveis, sabe por quê? Os tímidos, ou podemos chamar
de covardes, têm vergonha de testemunhar sua fé publicamente, sempre
pensando na opinião do outro. Sua estima em si mesmos é tão elevada que
não conseguem considerar outra pessoa. Têm vergonha de evangelizar, de
falar aos outros sobre Jesus. Pensamos tanto em nós mesmos a ponto de
esquecer das outras almas indo para o inferno por nossa culpa, pois não
apresentamos Cristo a elas.
— Até parece que você estudou para dar esse sermão… — Revirei os
olhos, entregando-lhe uma vasilha.
— Pior que estudei mesmo, foi a minha pregação domingo retrasado.
Apoiei a mão na pia, respirando fundo, e por fim me rendi a uma risada
incrédula. Gabriel era inacreditável mesmo.
Apesar da armadura, precisei admitir que eu fui confrontada, em parte,
pelo discurso dele. Era algo novo para mim? Não, mas me incomodava todas
as vezes que ouvia.
— Desculpe se eu forcei algo. — Aproximando-se, fez um carinho no
meu ombro, após ver que continuei séria. — Ai, meu Deus, me perdoa! —
Ele se afastou, constrangido. — Acaba sendo automático tocar, eu me
esqueci, desculpe.
— Tudo bem, Gabriel. — Sorri para ele, tranquilizando-o, mas na verdade
tentava controlar as batidas do meu próprio coração.
Confessei para mim mesma o fato de, diferente da primeira vez que ele me
tocou, eu ter gostado, foi uma sensação estranha, algo que nunca tinha
sentido antes.
— Obrigada pela conversa, eu vou orar para Deus trabalhar mais isso em
mim — admiti dando de ombros.
— Ei, mas você não precisa mudar e ser uma pessoa totalmente diferente,
extrovertida, é a sua personalidade e gosto desse seu jeito. — Ele apoiou-se
na mesa e abriu um sorriso de lado, olhando para mim. — Só não deixe um
traço da sua personalidade se tornar um pecado e tente conversar mais com
as pessoas, pelo seu próprio bem, ninguém vai te morder.
Soltei risada com a última sentença dele. Era estranho como a forma com
que Gabriel agia conseguia quebrar um lado meu, eu sentia liberdade para
ser mais “Marta” com ele.
Só precisava tomar cuidado para traçar bem os limites disso.
— Mas, então, me conte como é ser missionário, você comentou um
pouco no almoço, mas eu queria saber mais sobre essa realidade — pedi
sorrindo enquanto voltávamos à nossa tarefa.
Então Gabriel começou a narrar sobre sua vida em campo, sobre seu
trabalho construindo casas e sobre as famílias a que se apegou lá. Também
relatou algumas situações, entre outras coisas. Seus olhos brilhavam
enquanto falava, demonstrando um verdadeiro amor pela obra.
Naquele momento me dei conta de que precisava aumentar minhas
orações para Deus guardar meu coração, senão correria sérios riscos de me
machucar.
Capítulo Sete
“Se eu pudesse no tempo voltar
Pouparia meu coração de se machucar
E o diria para se acalmar
Pediria pra não chorar
Quando vi o amor errado se acabar”
(Marcela Taís - Espera por Mim)
— O quê? — Minha voz deve ter saído um pouco, muito, mais alta que
o normal, pois algumas pessoas em volta nos olharam. — De onde você
tirou isso? — perguntei em um tom mais baixo.
— Ah, vocês saíram juntos e ele ficou com um sorriso bobo. Mas vocês
devem estar de rolo, então? Quem diria, hein? Gabriel de maio[5]
com
alguém…
— Eu e Gabriel não estamos de rolo — falei com horror só de pensar
nessa possibilidade. Um dos meus princípios básicos era não sair por aí
beijando um monte de bocas antes do altar. — Somos apenas amigos, só
isso.
— Eita, desculpa, bicho, foi só uma suposição, não precisava ficar assim.
Bufando, assim que terminei a contagem, saí dali antes de me estressar
mais ainda.
Tudo que eu mais queria no momento era fugir do meu próprio coração,
mas as pessoas ficavam criando suposições bobas, levando-me a cair cada
vez mais nele.
— Tudo bem, Marta? — Mari perguntou assim que eu cheguei perto dela.
— Sim, por quê?
— Você está com cara de quem lambeu limão azedo. O Mah não é dos
mais agradáveis, mas não sabia que seria tão ruim assim.
Balancei a cabeça negando e entreguei a lista, não iria lhe explicar o
conteúdo da nossa conversa, nem louca. Após conferir, ela me dispensou
dizendo apenas para prestar atenção para o caso de alguém precisar de ajuda.
O resto da tarde foi tranquila, eu era chamada com as pessoas pedindo
água, ou para repor o estoque das Bíblias, ou apenas para baterem um papo e
desestressarem das histórias ouvidas.
Essa última parte foi a mais difícil para mim. Estranhei quando Nina me
pediu uma garrafa de água e aproveitou a oportunidade para desabafar sobre
o relato de uma das mulheres abordadas, em que ela contou traumas sofridos
na infância. A garota à minha frente começou a chorar de repente e eu não
soube reagir ou falar, então apenas a reconfortei, dedicando meu tempo a
ouvir.
A experiência da tarde foi boa, pois compreendi que uma guerra não se
fazia apenas da linha de frente. Outras pessoas “menos importantes” também
eram essenciais para a vitória, havia a necessidade de enfermeiros ajudando
os soldados, de gente para socorrê-los.
Meio emocionada com a minha nova descoberta, sentei-me em um dos
bancos e fiz uma oração sincera, pedindo a Deus para me fortalecer e dar
sabedoria nisso. Quantas vezes queria dar bons conselhos, mas as palavras
não saíam da minha boca, eu tentava falar, mas não me sentia sábia para isso
e, quando dizia algo, não parecia ser suficiente para ajudar.
Ao erguer a cabeça, meus olhos foram direcionados a Gabriel. Eu me
arrependi de não ter aproveitado nossa interação mais cedo para entregar o
papel com o meu poema, mas, tomando uma dose de coragem, fui até onde
ele estava.
— Gabriel? — chamei-o com um tremor na voz.
Eu ainda não estava certa da minha decisão, mas a nossa conversa sobre
me arriscar pela Palavra se repetia a todo momento na minha cabeça.
— Oi.
— Podemos conversar a sós? — pedi, arrependendo-me logo depois.
Ele me encarou confuso, mas, após se despedir das pessoas com quem
conversava, assentiu, caminhando comigo até um lugar mais afastado da
multidão, onde teríamos privacidade para conversar — mas ainda à vista de
todos.
— Aconteceu alguma coisa? — questionou preocupado.
— Sim, não, mais ou menos. — Suspirei e fiz uma pausa para organizar
meus pensamentos. Eu estava nervosa e meu corpo mostrava isso, como o
suor nas mãos, o coração disparado e as pernas tremendo. — E-eu vou
querer fazer uma apresentação pro evangelismo.
A reação de Gabriel foi imediata, ele arregalou os olhos e abriu a boca,,
mostrando não esperar aquilo.
— É que e-eu escrevi um negócio e... — Percebi, então, como era inútil
aquilo, eu não iria conseguir. — Quer saber? Esquece, desculpa por tomar
seu tempo — falei já me afastando.
Porém senti Gabriel segurando minha mão e puxando-me de volta para
ele. Mas, ao invés de soltá-la, o rapaz continuou a segurando. Por
consequência, senti meu coração disparar e não sabia dizer se era culpa do
nervosismo pelo pedido que fiz ou da nossa proximidade.
— Ei, me fala, o que você escreveu? — pediu olhando nos meus olhos.
Desviei o olhar e o abaixei para o meu bolso, retirando, com a mão livre,
um papel dobrado de lá. Engoli em seco antes de começar a me explicar:
— Eu gosto de escrever, e estava pensando muito sobre a nossa conversa
naquele almoço lá em casa, em que você falou sobre a timidez e o nosso
pecado. — Fiz uma pausa, para ver se Gabriel me acompanhava, e ele
assentiu, indicando para eu continuar. — Então pensei em escrever um
poema, não sei se é uma coisa infantil, mas só queria tentar, sabe? Tentar
falar um pouco sobre Cristo. — Mordi o lábio e o olhei de esguelha,
esperando sua reação.
— Posso ler? — ele questionou, estendendo a mão para o papel.
Entreguei e abaixei meus olhos, sem coragem para encará-lo. Gabriel,
então, soltou meus dedos, para poder segurar com firmeza o papel. Comecei
a esfregá-los, sentindo um formigamento no local que ele segurou.
Seus olhos passaram de um lado para o outro da página por alguns
segundos, mas que para mim pareceram horas de espera. Após terminar, o
rapaz dobrou a folha com cuidado.
— Marta, isso está incrível.
— Sério? — questionei desacreditada.
Ele era a primeira pessoa a ver qualquer tipo de escrito meu e, para mim,
isso ainda era algo estranho. Em todos esses anos, Gabriel também foi a
primeira pessoa em que eu confiei para mostrar algo tão íntimo assim.
— Sim, está, muito. — Ele abaixou a cabeça, buscando meu olhar. Ao
encará-lo, vi sinceridade em sua fala e tive um sentimento estranho no peito.
— Eu posso lê-lo? Ou você prefere ler?
— Então, esse era um outro pedido que gostaria de fazer, eu queria que
fosse anônimo.
— Mas...
— Gabriel — Interrompi antes de ouvir seus argumentos. —, eu já estou
me arriscando demais, nunca ninguém tinha lido nada meu, então, por favor,
não conte para ninguém quem escreveu. Talvez no futuro eu tenha coragem
de me revelar, mas agora prefiro que isso fique só entre nós dois.
— Tudo bem, obrigado por dividir esse segredo comigo. — Ele abriu um
sorriso e guardou o poema em sua calça. — Me sinto extremamente feliz e
honrado por isso, milady — brincou.
Gabriel, então, fez um gracejo e depositou um beijo na minha mão,
finalizando com uma pequena reverência. Eu ri da bobagem dele antes de o
rapaz se afastar em direção aos amigos.
Balancei a cabeça e fui terminar de me preparar para o culto dali a alguns
minutos.
Enquanto procurava um lugar para me sentar, me veio o pensamento de
Gabriel acabar contando quem era a autora do poema, por causa de sua
ousadia tão comum. Mas fechei os olhos, procurando pensar em outra coisa,
torcendo para que ele não fizesse isso.
O culto estava prestes a começar e eu já havia arranjado um lugar em um
banco de madeira para poder assistir.
Gabriel caminhou em direção ao microfone e o vi retirando o poema de
seu bolso. Nesse momento, senti o coração disparar, quase saindo pela boca,
comecei a esfregar as mãos na roupa, tentando disfarçar o nervosismo. Eu
torcia para ele não falar nada sobre a autoria, realmente esperava por isso.
— Boa noite, irmãos, sejam todos bem-vindos ao nosso culto na praça.
Bom, enquanto o grupo de louvor se prepara, gostaria de ler um poema para
iniciar o culto.
Ele limpou a garganta antes de começar a ler em voz alta:
— “Ao sair nas ruas
Meu guia Tu és, ó Senhor
Sobre as Tuas maravilhosas obras
Contarei aonde eu for
Pessoas cruzam o meu caminho
Algumas estão perdidas em si mesmas
Outras não sabem bem o que fazem aqui
Mas de uma coisa eu sei
Apenas Cristo poderá alcançá-las e trazer a esperança do que está por
vir
Ainda não sei o que o Senhor viu em alguém como eu
Pobre, pecador e miserável
Mas, um dia, a Tua luz raiou,
Tirou-me do fundo do poço e me socorreu
Hoje eu vivo para Ti
Vivo para levar o Teu amor
Àqueles que perdidos estão
E necessitam de um Salvador
O Evangelho é pregado nas ruas
Teus filhos cumprem a missão
Os que receberam a Tua Graça
Compartilham com o mundo as
Boas novas de Salvação
‘Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura’
Essa foi a ordem que o Senhor nos deu
E eu farei o que for preciso
Para levantar o necessitado e o abatido
Na força do Teu poder e para a glória do Deus bendito
Ajuda-me a confiar
Ajuda-me a obedecer-Te
Ajuda-me a perseverar
Quero conhecê-lO e fazê-lO conhecido
Quero levar Tua palavra a quem nunca a ouviu
Falar a todos que És onipotente,
Onipresente, Deus forte, Príncipe da Paz
E ser útil ao Teu reino enquanto o ar entrar em minhas narinas
E depois descansarei desta vida
Tendo a certeza de que minha missão foi cumprida
Não quero mais desperdiçar nenhum dia
Longe da Tua obra
Sei que vidas serão transformadas
E não vai ser mérito meu
Pois é tudo pela Graça
A graça que me envolveu”[6]
Meus ouvidos se fecharam quando ele terminou de recitar o poema. Eu
fiquei com tanto pavor e medo das opiniões que parei de ouvir tudo ao redor.
Meu coração batia alto o bastante para sobrepor as conversas.
Só percebi o passar do tempo ao ver o grupo de louvor se organizando,
entre eles estavam Gabriel, Luísa e Nina, além de membros de outras igrejas.
Após três músicas, David iniciou a pregação sobre os perdidos.
O rapaz falou com desenvoltura e em uma linguagem jovial sobre as
Doutrinas da Graça, exemplificando cada um dos pontos, desde a nossa
depravação total até a necessidade de um salvador e nossa incapacidade de
procurá-lO sozinhos.
A forma como David explicava atraía a atenção, pois era um conteúdo
bem teológico, mas saía na linguagem daqueles que não conheciam os
jargões “gospel”. Porém ele não enfeitou o evangelho, apenas simplificou-o
para leigos.
Quando percebemos, a praça estava bem mais cheia do que no começo,
muitos se amontoavam para tentar ver quem era o jovem a pregar.
E, mesmo sem um discurso emocionalista carregado de idealismos fofos,
muitos dos ouvintes começaram a chorar, dando-se conta do seu estado.
Claro, também foram muitos a ignorar aquilo, ou a sair reclamando sobre
estar tendo algo em praça pública. Porém nosso propósito inicial era que, se
ao menos uma alma fosse tocada, já teria valido todo o esforço.
— Bom, não sei quem você é, não conheço sua vida nem seu passado,
mas, mesmo com tudo isso, Cristo morreu na cruz por todos os seus pecados.
Não somos justos por obras da lei, somos declarados justos pela fé. Então,
caso você tenha se encontrado como um dos injustos, reconhecendo ser um
pecador miserável que carece da graça de Deus, e queira conversar, procure
um de nós. Somos a patota [7]com blusa preta de cruz. — David segurou na
própria camiseta para mostrar.
Aos poucos o público foi se dispersando. Vários foram embora, mas
outros ficaram e procuraram a equipe.
Como eu estava na equipe de apoio, graças a Deus não iria me envolver
com a parte de conversar, até as camisetas eram diferentes para não me
confundirem com a equipe do evangelismo.
De longe eu observava todos, prestando atenção se em algum momento
seria solicitada minha ajuda. Os grupos foram divididos de duas em duas
pessoas, sendo sempre um homem e uma mulher juntos.
Em determinado momento, vi Gabriel sinalizando para mim. Estranhando,
caminhei até o rapaz.
— Marta, você pode ficar rapidinho comigo? A Júlia precisou dar uma
saída e não podemos ficar sozinhos.
Assenti, sem saber como reagir, não havia me preparado nem participado
do “treinamento” para aquilo. Após alguns segundos, uma moça se
aproximou querendo conversar e me vi entrando em desespero.
Gabriel, vendo meu estado, segurou com calma minha mão. De forma
mágica ele conseguiu me passar segurança e tranquilidade, tanto com aquele
gesto quanto com seu olhar.
A mulher começou a desabafar, deixei tudo no encargo de Gabriel para
questionar, ficando apenas a ouvir.
Ela contou sobre sua relação com os pais, sobre quando o pai a expulsou
de casa por ter começado a namorar aos quatorze anos e sobre o quanto ela
sofria na mão do esposo agora. Em poucos segundos, ela começou a chorar e
eu, sabendo que seria indelicado para o Gabriel, por ser homem, fiz o
sacrifício e passei com carinho a mão em suas costas, mostrando estar ali.
O Mendes entrou apresentando versículos bíblicos e ele não poupou em
mostrar o pecado dela ao desobedecer os pais envolvendo-se tão nova em
um relacionamento, porém também mostrou o erro dos pais dela ao não
saberem ensiná-la da maneira correta.
— Você, como cresceu em um lar evangélico, conhece sobre Adão e Eva,
certo? — Ela assentiu. — Então, a partir do momento em que os dois, sendo
os representantes de toda a humanidade, comeram do fruto proibido, eles
caíram em pecado e trouxeram isso para toda a sua descendência. Como o
rapaz disse agora há pouco — Gabriel apontou para onde David havia
pregado. —, todos pecamos e carecemos da glória de Deus. E esse pecado se
mostra em tudo, desde a sua desobediência até o erro dos seus pais. E o
único capaz de nos salvar é Cristo! Por isso você deve se arrepender, pois,
mais do que ter pecado contra seus pais, você pecou contra o próprio Deus.
Nesse momento, a mulher se encontrava aos prantos e me abraçou de lado,
aconchegando-se. Apertei-a, pensando em quanto tempo ela deveria estar
sem receber um abraço sincero ou um carinho sem segundas intenções.
— E-eu fiz tantas coisas erradas, blasfemei contra Deus, não sei se tenho
perdão, nem ao menos o mereço.
Nesse momento, senti um incômodo, um aperto no coração empurrando-
me para falar. Mesmo lutando contra esse ímpeto, quando vi já estava
falando.
— Sabe, quando Jesus morreu na cruz, Ele levou todos — Dei ênfase. —
os nossos pecados, não apenas os que nós pensamos ser os mais leves ou os
piores, mas todos eles. E, a partir do momento em que achamos que não
temos perdão, estamos invalidando o sacrifício dEle, dizendo que não foi
suficiente para nos salvar. Claro, devemos ter consciência de que estamos,
sim, ofendendo a Santidade quando caímos e erramos, mas também devemos
entender que fomos perdoados para a glória de Deus. Não, nós não
merecemos perdão, mas ele nos foi dado, é a graça. Lembra a passagem da
mulher adúltera? Jesus não a condenou, Ele impediu os líderes de matá-la a
pedrada, porém também declarou a ela: “Vá e não peques mais.” Ela foi não
apenas perdoada como também chamada ao arrependimento. Confesse seus
pecados a Ele, peça perdão e arrume a sua vida.
Ao terminar de falar, eu estava surpresa comigo mesma e com a forma
como as palavras saíram da minha boca, sem o meu controle ou sem eu
pensar nos detalhes de cada uma delas, como fazia normalmente.
Gabriel, então, tomou a frente, completando a minha fala e, por fim,
fizemos uma oração pela vida dela. Ele lhe disse para procurar uma igreja
onde pudesse ter acompanhamento e aconselhamento nessa caminhada.
Antes de ir embora, a mulher me deu um forte abraço, agradecendo e
dizendo que fomos instrumentos de Deus na vida dela.
Assim que ela se retirou, um peso saiu de mim e eu me dei conta do que
havia acabado de fazer.
— Muito bom, Marta — Gabriel falou sorrindo ao me ver em choque.
— Eu não sei como falei aquilo, é sério.
— Deus usa quem Ele quer e onde Ele quer. E, como ela disse, Ele te usou
para falar com aquela mulher, te dando sabedoria nas palavras. Eu amo essa
sensação, sei bem como é!
Capítulo Dez
"O amor não é cor, ele é simples demais
Como a brisa ele vem no frescor da manhã
Mas foi no teu olhar então
Que eu pude perceber
Que as cores do amor vejo em você"
(Fernanda Brum - As Cores do Amor)
Há alguns anos, aprendi com minha bisavó a costurar roupas, então fiz
questão de fazer minha fantasia, de forma a não gastar tanto dinheiro dos
meus pais. Foi um árduo trabalho desde que comecei a fazê-la no final de
setembro, mas no fim tinha gostado do resultado.
Encarando meu reflexo no espelho, eu fiquei feliz por ter chegado ao
menos perto de como pretendia estar, e esperava muito que outras pessoas
me reconhecessem.
— Então? — Virei para Júlia, esperando o comentário dela.
— Uau, primeira-dama da Reforma Protestante, está podendo, hein — ela
brincou.
Levei a mão à boca, feliz e chocada por ter sido reconhecida ao menos por
alguém.
Como nós duas estávamos prontas, caminhamos rumo à sala da casa dos
Mendes, que era onde aconteceria a festa. Pelo fato de Júlia ser a
aniversariante, tínhamos chegado alguns minutos antes do horário de início,
para ela conseguir recepcionar bem a todos.
Algumas pessoas já haviam chegado, como a família pastoral. Seguindo o
roteiro, Mari vestia trajes remetendo aos tempos bíblicos com um cajado em
mãos e Luísa estava em um típica fantasia de ovelhinha a ser pastoreada.
Eu estava indo cumprimentá-las quando vi Gabriel entrando no salão.
— Ah, não… — murmurei ao vê-lo em trajes típicos de um monge, em
uma clara referência a Martinho Lutero.
Não sei dizer ao certo quanto tempo passei em choque, encarando o rapaz,
mas despertei ao ouvir Júlia gritando do meu lado:
— Eu não acredito que vocês combinaram de vir fantasiados de casal!
Que lindo! Por isso não me contaram, né? Queriam fazer surpresa para todo
mundo.
— Júlia, não, cala a boca! — briguei com ela. Com o canto do olhar, eu
via Luísa nos encarando.
Eu não a julgava, o que ela poderia estar pensando de mim? Há algumas
semanas, a garota me confessara seu sentimento pelo rapaz e hoje nós dois
estamos simplesmente com fantasias combinando.
Respirei fundo, tentando me controlar e decidir o que fazer, ainda mais em
relação a ela.
— Eu não fazia ideia da fantasia do Gabriel — comecei a falar em tom
baixo para fazer a Júlia calar a boca. — Foi uma terrível coincidência.
— Ou nem tão terrível assim, vai que Deus…
— Júlia! — Chamei-lhe a atenção.
— Tá bom! — A garota ergueu as mãos, rendendo-se.
Para minha sorte, Gabriel ainda não tinha percebido nada. Ele estava
conversando com um outro rapaz. Após alguns minutos sem saber como
reagir, o homem ao lado dele indicou com a cabeça para o nosso lado e os
dois começaram a caminhar.
— Eu não acredito nisso — Júlia murmurou.
Eu iria perguntar o que, mas eles já estavam próximos demais para isso.
— Oi, Juju — ele a cumprimentou sorrindo animado.
— Olá, Nicolas.
Aproveitando que eu não era o centro das atenções, fiz uma análise rápida
do rapaz. Ele era da mesma altura do Gabriel, mas os cabelos eram negros,
além de usar um par de óculos no rosto. Então, só depois percebi o motivo
do choque de Júlia, ele estava fantasiado de rei, combinando com ela, de
rainha.
— Ei, gostaria de te dar seu presente de aniversário.
Ela, após receber a permissão do Gabriel, se retirou com ele em direção
aos jardins da casa.
— Então — Gabriel começou a falar após alguns minutos em silêncio. —,
primeira-dama da Reforma Protestante, né?
— Martinho Lutero, né? — respondi na mesma brincadeira.
Ambos ficamos nos encarando com um sorriso nos lábios, achando
divertida a terrível coincidência de estarmos nos completando. Eu estava
perdida em seu olhar e levei um susto quando fomos interrompidos por um
flash.
— Ai, que lindos! — Mariana murmurou após retirar a máquina
fotográfica do rosto. — Gostei da combinação da fantasia, ficou supimpa.
— Não foi combinado — Gabriel respondeu por nós dois, incomodado
com o tom de voz dela. — Ficamos surpresos em ver a coincidência.
— Jura? — Ela se surpreendeu. — Ia falar uma coisa, mas, além de
crente, sou misteriosa. Tchau, tenho outros casais, ops, pessoas para tirar
fotos! — Ela se afastou antes de conseguirmos dar-lhe uma repreensão.
— Vamos mesmo precisar ficar aguentando essas piadinhas? — questionei
irritada.
— Relaxa, logo passa. Daqui a pouco encontram outra coisa para encher o
saco.
Eu estava para me retirar em busca de um refúgio, mas uma aparição na
porta chamou a atenção de todos da festa.
— Ah, não, desta vez eles se superaram — Gabriel falou, rindo.
Nina e David entravam no salão fantasiados de nada mais, nada menos do
que os Smilinguidos. Eles usavam uma roupa toda preta, com luvas e sapatos
amarelos, ela com coturno e David apenas de meias. Além de uma tiara com
as anteninhas das formigas.
Por onde eles passavam, desfilando com pompa, arrancavam risadas do
pessoal com a criatividade.
— Muito meu casal de formigas missionárias — Gabriel zombou quando
eles vieram para perto da gente.
— Vocês dois também não estão nada mal! — Nina respondeu, rindo. —
Amei a ideia de virem de casal.
— Não foi combinado — murmurei, já exasperada com aquelas
insinuações.
Eu não os julgava, realmente parecíamos um casal fantasiados lado a lado
dessa forma.
— Oi, Marta! — Luísa se aproximou e vi a chateação explícita em seu
olhar.
Durante os minutos seguintes, conversamos sobre amenidades, sem
profundidade nenhuma. Luísa elogiou a fantasia de Smilinguido dos nossos
amigos, falamos sobre a dela, falamos sobre tudo, exceto sobre eu e Gabriel
estarmos combinando.
Por fim, após os assuntos terem acabado, Luísa se virou para nós, dizendo:
— Vocês deveriam desfilar, formam um bom casal!
— Luísa… — comecei a falar, mas ela me interrompeu.
— Eu estou falando sério. E — ela fez uma pausa e vi seus olhos
enchendo-se de água —, desculpe, com licença.
Antes que pudéssemos fazer qualquer coisa, a menina se retirou correndo
em direção aos banheiros.
Nesse momento eu me culpei, a última coisa que queria era magoá-la. Eu
me arrependi da fantasia escolhida, por ter feito suspense com ela e por não
ter um plano B para me trocar.
— Droga, sabia que em algum momento isso iria acontecer — Gabriel
murmurou, esfregando o rosto. — Já volto, gente! — O rapaz caminhou na
mesma direção para onde ela tinha ido.
— Marta — Nina me chamou ao ver o meu estado —, não foi sua culpa.
Olhei-a, notando que estávamos sozinhas, ela deveria ter pedido para
David sair e nem percebi.
— Todo mundo já falou para a Luísa que ela e o Gabriel não vão ficar
juntos, eu mesma já perdi as contas de quantas vezes a aconselhei. Além do
mais, ele nunca deu nenhum tipo de sinal para ela. Te garanto, conheço os
dois há anos e ela se iludiu sozinha.
Balancei a cabeça, sinalizando compreender, mas ainda não conseguia
aceitar minha atitude. Tudo bem, não foi proposital, mas eu não queria
magoá-la.
Nessas últimas semanas, fiz o possível para me afastar, e afastar meus
sentimentos, de Gabriel. Sim, não me distanciei completamente, procurava
dizer a mim mesma que manteríamos uma relação cordial, pois eu gostava
da amizade do rapaz, tinha apreço por conversar com ele.
Mas naquele momento me questionei se fiz o correto e se não deveria ter
cortado de vez qualquer interação, por respeito à Luísa.
Não sei dizer quanto tempo eu e Nina ficamos conversando até uma Júlia
corada aparecer na nossa frente. Ergui a sobrancelha, questionando-a em
silêncio, mas ela apenas deu de ombros, ignorando-me.
— Cadê o Gabriel? — perguntou olhando em volta.
— Conversando com a Luísa, acho eu — Nina respondeu, como se não
fosse nada demais.
— Sobre?
— Assuntos dos dois! — A moça deu de ombros. — Ai, Ju, quando isso
aqui vai animar?
— Estamos só esperando o restante dos convidados chegarem.
No mesmo momento, ela se afastou para cumprimentar mais algumas
pessoas, senão seria considerada uma péssima anfitriã, de acordo com suas
palavras. Nina também saiu, alegando que precisava procurar David.
E, enfim, consegui ficar sozinha com meus pensamentos. Aproveitando o
momento, sentei em um dos bancos e fiquei lá por longos minutos apenas
apreciando a festa.
Eu realmente não me importava de ficar isolada, gostava de observar as
pessoas sem ser parte do centro das atenções. Um dos meus “hobbies” —
por assim dizer — era ficar tentando adivinhar quais seriam as conversas
analisando apenas as expressões corporais.
Júlia mesmo, pela sua cara e a forma como interagia com a mulher à sua
frente, parecia conversar com alguém que não via há um bom tempo. Os
longos fios loiros da mulher denunciavam que ela deveria ser uma Mendes
também; pelo meu chute, uma tia ou prima de Jacarezinho.
Minha amiga me contou uma vez que Josué, o pai dela e do Gabriel, tinha
muitos irmãos e parentes, então, após a morte dele, os três não ficaram em
nenhum momento desamparados. Principalmente nos primeiros meses,
sempre tinha alguém os visitando para fazer companhia.
Nas minhas observações, vi Gabriel voltando ao salão e tentei adivinhar
como estavam seus sentimentos, mas sua postura não denunciava nada. Ele
procurava algo e pareceu encontrar quando avistou meus olhos o
observando.
Envergonhada por ter sido pega em flagrante, abaixei meu olhar para
minhas mãos até ouvi-lo me cumprimentando.
— Posso me sentar ao seu lado?
Assenti com a cabeça, sem ter nenhuma palavra para falar. Ficamos alguns
minutos em silêncio antes de ele quebrá-lo.
— Como você está? — questionou com um tom carinhoso na voz. Sua
pergunta poderia ter mil interpretações, mas eu entendi muito bem a que ele
se referia.
— Estou bem, vocês se resolveram?
Nesse momento, Luísa entrou pela porta, ela estava bem mais silenciosa
que o normal e, mesmo me vendo, não ousou se aproximar. Na verdade
desviou com um semblante quase de nojo e caminhou até algum lugar fora
do meu campo de visão.
— Não se preocupa, logo ela para de birra — Gabriel falou ao ver minha
reação perante a atitude dela.
— Por que ela está assim?
Olhei para Gabriel e o vi comprimindo os lábios com uma expressão
culpada, porém não deu mais explicações em um primeiro momento.
— A Luísa ainda é uma criança em muitos pontos, principalmente na falta
de maturidade — ele disse. — Por ser a caçula e por alguns outros motivos
da infância dela, o pastor sempre a mimou muito, quase nunca lhe dizendo
não. Então digamos que agora ela está aprendendo a duras penas que nem
tudo é como deseja, ainda mais quando envolve outras pessoas — murmurou
a última frase, mas acabou sendo alto o suficiente para eu ouvir.
Uma curiosidade sem igual tomou conta de mim diante daquilo e do
porquê de ela estar brava justo comigo, mas consegui me controlar, o medo
da descoberta era maior do que a vontade de saber.
O rapaz, então, decidiu mudar de assunto e começamos a comentar sobre
as outras fantasias da festa.
Ele apontou, rindo, para um dos seus primos. O garoto tinha o corpo
inteiro enrolado de gaze e uma placa escrita “Lázaro” na frente e, quando ia
andar, imitava um zumbi.
— Sua família também não foi nada mal no quesito criatividade.
Balancei a cabeça, ainda envergonhada por eles com suas fantasias.
Papai estava de Abraão, usava uma longa barba artificial branca, roupas da
época e um cajado em mãos. Mamãe vestia-se assemelhando-se a um anjo.
Já meu irmão havia vindo como Isaque e carregava uma ovelha de pelúcia
no colo.
— Na hora do desfile, eles vão encenar o quase sacrifício de Isaque —
comecei a explicar diante de um olhar curioso dele —, e creio que as
fantasias já são autoexplicativas.
— E você não quis participar desse lindo e amoroso momento familiar? —
Gabriel perguntou, zombando da minha cara.
— Eu não, eles queriam que eu fosse a ovelha para Jonas interpretar a
mesa de pedra, mas nem preciso dizer que neguei veementemente, né?
Nunca pagaria um mico desse em público.
— É, eu iria me surpreender se te visse ali na frente — brincou. — Aliás,
você vai não querer mesmo desfilar comigo?
— Nem louca — respondi rapidamente, e acabei sendo seca demais.
— Desculpa, não queria te pressionar, é só porque seria legal.
— Eu sei, mas realmente não quero.
Abracei-me e olhei para Luísa, temendo magoar mais ainda a menina se
fizesse aquilo.
Capítulo Doze
“Pra que ganhar o mundo, e não te achar aqui dentro?
Se for pra te amar, eu vou fazer isso direito
Pra que ganhar o mundo, e não te achar aqui dentro?
Se for pra te amar, eu vou fazer isso direito
Tira de mim toda idolatria”
(Marcela Taís - Idolatria)
[1] Mauro Fraga
[2] Darrel e Márcia
Capítulo Dezessete
“Pra maior festa da vida quem convida é o amor
O céu acende luzes e nos faz um favor
Sinceridade no olhar, linda canção vai embalar
Quero encontrar meu par pra minha dança começar
Segura a minha mão, você terá que me cuidar
É teu meu coração, se você for meu par
Ninguém gosta de solidão, mas escolhi te esperar
Fiz uma oração pra este dia chegar
Fiz uma oração para encontrar meu par!”
(Escolhi te Esperar – Marcela Taís)
[1 mês depois]
Domingo era a nossa folga, foi engraçada a correria das meninas para
lavar roupas. Quem morava aqui na cidade também nos levou para passear e
pudemos conhecer um pouco mais daquele lugar tão lindo. O culto havia
sido de manhã, por consequência ouvimos várias reclamações de quem
esperava poder acordar tarde, mas também foi bom, pois não ficamos
neuróticos no passeio para voltarmos a tempo do culto.
Obviamente os líderes tinham ido junto e era difícil não rir quando
baixava o guia turístico em Gabriel, mesmo ele não sabendo quase nada
sobre o local.
Todavia a noite de segunda-feira não tardou a chegar e, com ela, mais uma
vez um balde de água fria nos meus sentimentos.
O responsável pela pregação era Igor, fiquei animada, pois, além de ser
meu líder, as palavras dele eram excelentes. O tema não havia sido revelado
anteriormente, como era de costume, por isso estávamos todos curiosos para
saber o que viria.
— Bom, não vou ficar falando muito sobre mim, pois o foco da noite é a
Palavra — falou quando terminou a breve apresentação sobre si mesmo. —
Peço que abram em Cânticos 8:4.
Folheei com gosto a Bíblia, ainda admirando cada pedacinho dela, e não
pude evitar o longo suspiro quando vi qual era o versículo.
“Prometam, ó mulheres de Jerusalém, que não despertarão o amor antes
do tempo.”
Capítulo Vinte e Quatro
“Faz de mim pequeno cristo
Digno de ser filho teu
Anunciando as boas novas
Salvação que vem de Deus”
(Oração - Purples)
Quando fiz a inscrição, não contei nada para a Sarah, Júlia, Nina, nem
qualquer outra pessoa. Aproveitei quando estavam todos tomando banho e
desci para o hall onde as fichas estavam em cima da mesa.
Desde que Larissa falou do sorteio, algo me incomodava para preencher o
formulário. Mesmo que ganhasse, ainda teria metade da Escola para pagar, e
era uma alta quantia.
Mas e se…?
Eu tinha medo, muito medo, ainda mais depois do acontecimento da tarde.
Contudo uma força parecia me empurrar para ali, algo inexplicável me
incentivava a preencher aquele simples papel.
Como era algo mais provisório, apenas para o sorteio, não era a ficha
completa ainda. Se eu fosse escolhida, iriam me chamar para fornecer
minhas demais informações, além de também pedirem para meu pastor
preencher a recomendação da liderança.
A parte boa de os líderes da base de Florianópolis estarem aqui era que
não teríamos todo o trabalho de enviar a ficha pelo correio, esperar a
resposta e só depois arrumar minha mala. Tudo bem, os telefones
residenciais facilitariam esse contato, mas ainda era muita burocracia.
— Onde você estava? Saí do banho e não te vi no quarto — Júlia
perguntou uns dez minutos após minha volta, mas vi como, durante todo
esse período, ela me olhava de esguelha com a curiosidade estampada no
rosto.
— Coisa pessoal. — Não queria magoá-la, mas também não queria
compartilhar esse desejo no momento. — Obrigada por mais cedo. — Não
precisei explicar, ela entendeu sobre o que estava falando e apenas sorriu em
troca.
Eu fiquei pensando, se eu fosse selecionada — uma chance ínfima diante
do número de inscritos —, o que falaria para meus pais? Será que eles
liberariam? E Sarah, Gabriel e tantos outros? Quais seriam as suas reações?
Quando descemos para o auditório para a programação da noite, era
visível meu nervosismo, várias vezes fui parada por conhecidos
questionando se eu estava bem, pois estava pálida além do normal, segundo
eles.
Apenas com um balançar de cabeça, eu desconversava. Já sentada, minha
atenção não se fixava no cara falando.
Hoje era uma noite com o propósito de ser mais descontraída, não focada
em uma pregação ou aula específica. Era um bate-papo com alguns
missionários mais antigos e, apesar de não ser antigo, Gabriel estava sentado
junto na roda, representando o pai e os anos que ele serviu em missões.
Vendo Gabriel descontraído e rindo, era difícil não deixar meus
sentimentos aflorarem, aqueles que eu tanto tentava sufocar a todo custo. As
palavras de Sarah repetiam-se na minha cabeça, ecoando sobre a idolatria do
casamento e o meu desejo do príncipe de cavalo branco para me resgatar.
Júlia ao meu lado demonstrava abertamente sua animação, ela também
havia sido convidada para o bate-papo, mas, surpreendendo a todos, preferiu
deixar os holofotes apenas no seu irmão.
— Talvez seja uma pergunta muito íntima, então, se preferir não
responder, fique à vontade. Como é a sua relação com missões e a morte do
seu pai? Ainda mais levando em conta que tudo aconteceu durante uma
viagem missionária. E, novamente, meus sentimentos a vocês — o
apresentador olhou para Júlia — pela grande perda.
O semblante de Júlia, antes alegre, ficou sério. Conhecia minha amiga e
sabia bem como ela não gostava de relembrar a morte do pai nem os eventos
posteriores com a ida do irmão.
— Bom, confesso que imaginei uma pergunta nesse sentido, mas ainda é
difícil pensar em uma resposta para dar — Gabriel começou. — Primeiro,
sobre meu pai. Quando o perdemos, foi um baque, mas ter me tornado
missionário integral não esteve ligado à morte dele, eu já tinha planos sobre
isso, porém eles incluíam meu pai em cada passo, o que foi duramente
alterado depois daquele 14 de novembro. Talvez eu apenas tenha me tornado
mais dedicado a isso como forma de honrar a Josué Mendes, tem sido algo
no qual tenho refletido muito ultimamente. Mas me contento em saber que
ele está hoje no lugar onde tanto sonhava e pregava.
— Enquanto Gabriel se tornou mais apaixonado por missões, eu fui
pegando pavor — Júlia pensou alto, mas só eu escutei, então preferi ignorar
no momento.
Um silêncio se fez enquanto o rapaz tomava uma água.
Eles fizeram mais algumas perguntas sobre os projetos e planos futuros do
Mendes antes de chamarem outro missionário de carreira.
— Agora — Mica pegou no microfone depois do fim das entrevistas —,
lembram-se sobre o anúncio de uma bolsa parcial para a Escola na base de
Florianópolis? Vamos ao sorteio?!
Um silêncio tenso preencheu o salão, milhares de cabeças espichadas para
descobrirem se teriam essa graça ou não. Enquanto Júlia lixava as unhas sem
o mínimo interesse, Mari estava frenética, pois ela também tinha se inscrito.
Naquele momento comecei a torcer por ela, seria a chance que tanto
sonhava.
— E o grande sortudo ou sortuda é…
Ele puxou uma ficha e abriu o papel para ler. De repente gritos começaram
a ecoar quando o nome finalmente foi lido.
— Marta Carolina Almeida!
Com amor,
Marta.
14 de fevereiro de 1987
Capítulo Vinte e Cinco
“A como é grande todo esse amor
Por isso eu canto alegre e sorridente
Que para ser feliz com a gente
Tem que amar como Ele amou”
(Seguindo Seus Passos – Sem Fronteiras Music)
Duas semanas tinham se passado, acho que nunca orei tanto quanto
durante esses 15 dias. Acordava e orava, almoçava e orava, dormia e orava,
respirava e orava. Nunca obedeci tanto a Paulo quanto agora, quando ele nos
aconselhou para estarmos no Espírito em todas as circunstâncias.
Eu sabia que não deveria procurar a paz, pois nosso coração é enganoso e
corrupto, mas ao mesmo tempo não queria ficar nessa dúvida, com o medo
de estar fazendo algo errado.
Nesse momento eu estava em um discipulado na casa de Sarah, pedindo
misericórdia e socorro a Deus pela vigésima vez durante esse período.
— Marta, vamos lá, quando estamos orando por alguém em relação a um
casamento, não vai cair um raio do céu nem vamos ouvir uma voz como de
trovão falando que deve ser ele o cara ou não. Mas, nas Escrituras, nosso
manual de vida, Deus deixou diversas instruções implícitas e explícitas em
relação ao casamento. Eu fiz uma lista com elas, algumas são bem óbvias,
visto que já conheço o Gabriel, mas mesmo assim quero te levar a refletir.
Assenti, ajeitando a postura, enquanto ela pegava um caderninho e uma
caneta.
— Ele é cristão? Vocês compartilham a mesma fé e visão teológica?
— Sim? — Parei por alguns segundos, pensando principalmente na linha
teológica, mas, por todas as nossas conversas, a resposta era óbvia. — Sim,
fiquei em dúvida por causa da visão teológica — expliquei, vendo seu olhar
arregalado.
— Hum, próxima. Vocês têm o mesmo chamado?
— Sim! — Antes eu até poderia ter dúvidas, mas as nossas conversas
desde junho deixaram bem claro que ambos fomos chamados para a mesma
área, até para o mesmo país.
— É esse o homem com quem você quer passar o resto da vida? Isso
significa todos os dias de todas as semanas de todos os meses de todos os
anos desde o presente momento até a morte de um de vocês. Você está
disposta a ser submissa a ele?
Meu olhar ficou distante por um bom tempo e, graças a Deus, Sarah não
me apressou, essa era uma das perguntas que eu não esperava receber.
Primeiro, foquei na parte inicial, se eu estava disposta a passar o resto da
vida com Gabriel. Fechei os olhos, tentando imaginar como seria acordar
daqui a dez anos ao lado dele, ao mesmo tempo em que era muito estranho,
também me dava borboletas no estômago só de pensar. Mesmo diante do que
já conheci dele, inclusive a personalidade extremamente extrovertida que me
irritava de vez em quando, sim, eu não me incomodaria de morrer ao seu
lado.
E sobre a questão da submissão, sim, eu admirava muito Gabriel como um
homem cristão, admirava a forma como ele tratava a mãe e a irmã, como
tratava as pessoas ao seu redor.
— Sim! — respondi, finalmente, sem perceber o sorriso bobo em meus
lábios após pensar em um futuro assim.
— Por último, mas muito importante. Qual a opinião da sua família sobre
ele? E da família dele sobre você?
Dessa vez eu não precisava nem pensar, já era muito óbvio bem antes de
eu chegar a cogitar alguma coisa.
Uns dois dias depois da declaração, aproveitei que meu irmão estava na
escola e sentei para conversar com meus pais. Chamei apenas os dois para
poder desabafar, pedindo o conselho deles, não importava quão doidinhos
eram, também eram meus pais e as pessoas que mais me conheciam no
mundo. Foi um momento sério, até me surpreendi com as respostas.
— Filha, você sabe o quanto eu aprovo esse relacionamento, o quanto
admiro o Gabriel, principalmente após ele ter nos procurado antes mesmo de
falar com você. Porém não queremos te obrigar a nada. Sim, vocês têm a
nossa bênção, mas, se Deus falar contra, seremos os primeiros a ficar ao seu
lado e nunca mais tocar no assunto — papai falou.
Após isso, nós oramos juntos e eles pediram para, quando eu tivesse a
confirmação, não esquecer de contar para eles, como se fosse possível não
falar.
— Eles aprovam, com certeza!
— Bom, agora você praticamente já tem a sua resposta. Coloque tudo que
a gente acabou de conversar diante de Deus, vou deixar você a sós e me
conta depois qual a sua decisão.
Sarah depositou um beijo na minha testa e, antes de me deixar sozinha na
sala da casa dela, entregou o caderno com a caneta na minha mão.
Não sei quanto tempo fiquei ali encarando aquelas palavras, não sabia
nem como orar sobre o assunto. Tinha tantos medos, mas ao mesmo tempo
tinha também um sentimento até então desconhecido, parecido com uma
alegria boba e um aperto gostoso no coração. Vendo várias folhas em branco
no caderno, aproveitei uma delas para escrever para alguém muito especial.
“Querido futuro marido,
Acho que te encontrei, mas ao mesmo tempo tenho medo de não ser você.
Fico me questionando se deveria mesmo escrever isso, talvez jogue fora,
porém sei que, quando você me conhecer, também precisa conhecer todas as
minhas camadas e o meu passado. Mas espero muito que realmente seja
você o mesmo cara de quem estou falando…”
Eu não sabia como procurar Gabriel para conversar.
Ele tinha deixado claro que estaria aguardando a minha resposta e não me
pressionaria quanto a ela.
Já tinham passado dois dias desde que tive a certeza dos meus
sentimentos, mas não o vi mais depois disso.
Hoje teria culto de jovens e orava para ele comparecer.
Sentindo-me arrumada demais para o meu normal, entrei na igreja
procurando aqueles cabelos loiros, mas não os encontrei em lugar algum.
— Procurando alguém? — Kim perguntou por trás, fazendo-me levar um
susto.
Nesses últimos dois anos, o grupo de jovens cresceu em peso. Se antes
éramos sete, agora estávamos na faixa de vinte e cinco. A jovem coreana
fazia parte dessa leva.
— Você viu o Gabriel?
— Ele foi lá pra fora, mas está sentado naquele banco. — Indicou uma das
cadeiras.
Quando cheguei perto, reconheci a sua Bíblia toda surrada e cheia de
marcações. Olhei rapidamente em volta e, não o vendo, abri em qualquer
página e só enfiei o bilhete dentro. Quando sentei no meu lugar, meu coração
parecia que ia sair pela boca a qualquer momento.
Estava folheando a minha própria Bíblia em busca de me distrair quando
vi Gabriel entrando, mantive meus olhos para baixo, mas pela visão
periférica acompanhei-o sentando em seu lugar. Segurei a respiração
enquanto ele conversava com Mariana, com o livro no colo, sem nem fazer
ideia do conteúdo ali dentro.
— Boa tarde, patotinha, bora começar?
Iniciando o culto, David pediu para abrirmos em alguma passagem que
mal prestei atenção, estava nervosa, com medo de Gabriel não achar o papel,
mas, ao mesmo tempo, pensando em como ele reagiria ao ler. Não precisei
sofrer muito nessa agonia, porque, quando o rapaz ficou de pé, ele logo se
agachou para pegar algo que caiu no chão e entendi ser o bilhete, pelo fato
de seu olhar ter instantaneamente procurado algo pelo salão e parado ao me
encontrar.
Com o rosto queimando, mantive meu olhar virado para frente, nem
percebendo o sorriso aberto em minha direção.
Sem dúvida foi o culto mais longo da minha vida, eu até me esforcei, mas
minha mente não conseguia se concentrar. Como eu falaria para ele? Pensei
em mil formas de contar, mas nenhuma parecia boa o suficiente.
E se ele tivesse desistido? Talvez tenha se arrependido? Mudado de ideia?
Estava tão distante que Nina precisou me dar um cutucão no braço,
alertando que o pessoal estava saindo.
Eles haviam criado um combinado de, toda primeira sexta-feira do mês,
sair para algum momento de comunhão e o escolhido do dia foi o boliche.
— Vamos?
Eu estava envergonhada só de pensar em olhar para Gabriel, por isso,
quando David ofereceu uma carona, aceitei na hora, mesmo sendo obrigada
a sentir o olhar atento do rapaz em todo o percurso até o carro.
Não era como se eu quisesse evitá-lo, só não sabia como reagir em sua
presença.
Gabriel havia dado um jeito de se sentar na minha frente, obrigando-me a
fixar os olhos em qualquer coisa, menos no seu sorriso debochado. Contudo
constantemente nossos olhares se encontravam e ambos desviavam
rapidamente. Eu já tinha terminado de comer quando ele foi me passar o
guardanapo e junto deixou o bilhete embaixo, mas com um rabisco dele logo
abaixo da minha letra.
“Podemos conversar?
Ass. Marta
Me encontra em cinco minutos lá fora.
Ass. Gabriel”
Senti a bile queimar pela garganta ao ler suas palavras, ele pediu licença,
indo primeiro, para tentar disfarçar o fato de ambos sairmos juntos.
Ao final do período estipulado, ao invés de me dirigir para a porta, eu
entrei no banheiro, agradecendo aos céus por estar sozinha.
Conferi mais uma vez minha imagem no espelho, eu me sentia bonita, mas
não o suficiente. Durante aqueles minutos, analisei os detalhes que tanto me
incomodavam, como os olhos sem graça, bem diferentes dos olhos dos
Mendes, meus cabelos escorridos e cheios de frizz, o nariz proeminente e até
o corpo, que, mesmo me considerando magra, era estranho.
Apertei as unhas na palma da mão com força, até sentir aquela dor
incômoda. Sabia que, se ficasse mais tempo ali, desistiria de tudo. Então,
sem pensar duas vezes, arrumei a jaqueta nos ombros e, munida de uma
garrafinha de água, dei a volta no salão, por onde conseguiria sair sem passar
pelas mesas do pessoal da igreja.
Gabriel estava encostado no muro e, ao me ver, ajustou a postura.
— Oi! — sussurrou quando cheguei.
— Oi — respondi sem coragem de olhá-lo.
O Mendes começou a andar rumo à pracinha perto do estabelecimento,
que era a coisa mais fofa, ainda mais com um senhor tocando o último
lançamento do Roupa Nova na viola.
— E então? — ele perguntou após me ajudar a sentar em um dos
banquinhos de madeira.
Eu já era envergonhada por natureza, mas naquele momento não saía nada
da minha boca, simplesmente nada. Tentei diversas vezes murmurar algo,
mas não conseguia abri-la para que isso acontecesse, esqueci todo o discurso
criado após horas. Por isso apenas balancei a cabeça em sinal de positivo,
esperando que ele pegasse a mensagem.
— Isso é um… Sim? — Com um sorriso insinuador, ele gentilmente
pegou minhas mãos.
Com o olhar cravado em nossos dedos unidos, analisei o contraste dos
meus delicados com os dele, mais robustos. Era estranho como um simples
toque, que eu considerava inocente há menos de um mês, ganhou tanto
significado após uma simples confirmação.
— Marta?
— Sim, Gabriel, e-eu aceito casar com você! — consegui por fim falar,
resultando naquele sorriso e nas velhas borboletas no estômago.
— Eu nunca cheguei a essa parte, não sei o que fazer — ele confessou,
desviando seu olhar.
— Bem, eu também não. — Comprimi os lábios, sorrindo ao ver Gabriel
Mendes constrangido. — É a minha primeira vez também nessa parte.
Ainda me direcionando aquele sorriso, ele cruzou nossos dedos, brincando
com eles. Fiquei congelada, admirando a diferença das nossas peles e a
forma como se encaixavam perfeitamente.
— Quero te dar uma coisa, é simples, mas espero que goste.
Ao pegar um pacote no bolso, Gabriel retirou um cordão, que entendi ser
uma pulseira quando ele prendeu gentilmente no meu pulso. Apesar dos
diversos pingentes, como de mapas, globos e livros, ela não deixava de ser
simples e principalmente a minha cara.
— Eu amei — sussurrei, erguendo o pulso até a altura dos olhos, mexendo
nas pecinhas.
— Que bom, se não gostasse, aprenderia a gostar, comprei com todo o
cuidado. — Apesar da pose de soberbo, eu o conhecia bem e era fácil
perceber que estava tirando com a minha cara.
Cruzando as pernas, ainda sem tirar minha mão da dele, apoiei as costas
no banco e virei o rosto para ele.
— Noivos, então, né? — Tentei quebrar o silêncio.
— Noivos. Bom, temos muita gente para avisar e convidar para o nosso
casamento no próximo mês.
Justo nesse momento, eu aproveitei para tomar água e acabei engasgando
com o líquido. Ele, desesperado, me ajudou enquanto eu estava com os
braços erguidos, tentando voltar ao normal.
— Falei algo errado?
— Óbvio, nem louca vou casar mês que vem, pelo amor.
— Quando você quer casar, então, futura Marta Mendes? Por favor, não
fica me enrolando.
— Ei, eu só disse que em novembro não dava — Me defendi.
— Pode ser no próximo mês, então? Dezembro é uma boa data…
— Pelo amor de Deus, Gabriel.
Revirei os olhos, irritada com as provocações dele, seria uma longa e
longa vida de provocações pelo jeito e, lá no meu íntimo, eu estava animada
para ver isso, confesso.
— Não sei se você lembra — falei —, mas tenho família que mora em
uma cidade longe, precisa ser pelo menos depois das férias de janeiro, para
eu avisar e prepará-los, né?
Os minutos seguintes foram sobre entrar em consenso de quando seria o
casamento, dias do mês e da semana, datas importantes em que não poderia
acontecer e quais eram as mais propícias antes da próxima Escola. Apesar de
ter tirado esse semestre sabático para cuidar da família, o rapaz já estava
doido para voltar ao campo; eu também tinha feito um compromisso de dois
anos como obreira, então precisava me preparar com as próximas datas da
turma.
Era estranha a sensação de estar ali ao lado dele, parecia que a qualquer
momento eu acordaria de um sonho, um delicioso e lindo sonho. O cheiro, o
vento e até a textura das nossas peles pareciam algo totalmente novo.
Para mim, aquele dia ficou marcado pelo cheiro da grama recém-cortada
do canteiro, sempre lembraria dele quando sentisse o aroma.
Estávamos em uma conversa sobre nossos chamados, deixando bem claro
qual era o de cada um para não haver discussões mais para a frente quando
resolvi ter a brilhante ideia de olhar o horário.
— Misericórdia!
— O que foi? — Gabriel já se levantou, colocando-me atrás dele, e
precisei levar as mãos à boca para me impedir de gargalhar alto.
— Não sei se você se lembra, Mendes, mas temos alguns amigos lá dentro
e estamos aqui há meia hora.
Quando levantei para ficar ao seu lado, percebi seu coração ainda
acelerado. Achei fofa a forma como ele rapidamente ficou de prontidão para
me proteger, ao menos perigo por negligência eu não passaria.
— Posso orar por nós antes?
Fiquei surpresa com o seu pedido, mas concordei. Gabriel gentilmente me
puxou pela mão, abraçando-me.
Era engraçado pensar que, há quase dois anos, esse abraço acontecia em
outras circunstâncias e foi justo naquele dia que percebi estar apaixonada por
ele. Tanta coisa aconteceu depois disso, inclusive em relação aos meus
sentimentos, mas estar nos braços de Gabriel continuava a mesma sensação,
e multiplicada até.
Deitei em seu peito e ele apoiou o queixo em cima da minha cabeça,
denunciando claramente a nossa diferença de tamanho.
— Pai, eu quero orar pelo meu relacionamento com a Marta. Tantas coisas
aconteceram e creio que, se hoje estamos aqui, foi com a sua bênção e a sua
permissão. Oro para que mantenhamos nossos olhos focados na cruz, que
esse noivado e casamento não sejam fruto para idolatria dos nossos corações.
Oro para nunca esquecermos do nosso propósito, do nosso chamado pessoal
e ministerial. Peço que o Senhor seja o centro e nos dê sabedoria para te
glorificarmos em cada ação. Acima de tudo, agradeço por ter nos abençoado,
principalmente a mim, com essa mulher linda, por ter me presenteado com
mais do que merecia. Em tudo te louvo, em nome de Jesus, amém.
Disfarçadamente, enxuguei uma lágrima que escorreu durante a oração
dele, eu definitivamente estava emocionada e até perdi o controle das
reações do meu corpo. Antes de se afastar, Gabriel deixou um beijo na
minha testa. Por alguns segundos, cogitei se ele queria falar mais alguma
coisa, mas ele apenas se afastou.
Eu, com certeza, ficaria revivendo cada uma daquelas lembranças pelo
resto da vida.
— Posso te levar ou você quer ir antes?
— Eu não sei, o povo pode ver…
— E qual o problema de verem, estou com algum defeito?
Dei um tapa em seu braço, era óbvio que Gabriel estava doido para sair
por aí exibindo o nosso relacionamento aos quatro ventos.
— Homens… — murmurei, deixando-o com a testa franzida.
Antes de irmos, peguei a minha garrafa de água no banco. Ele entrelaçou
nossas mãos e seguimos assim até a porta do boliche. Aquele simples gesto
me deixava toda boba, ainda não tinha caído a ficha.
— Então, vou entrar… — falei, ficando de frente para ele, mas sem a
coragem de me afastar.
— Prefere contar no culto amanhã, então?
Assenti, afastando-me, apesar do desejo de ainda continuar em seus
braços.
O pessoal já tinha ido para a pista de boliche e estava uma disputa feia
entre David e Júlia para ver quem conseguiria o primeiro lugar. Conforme
me aproximei, vi algumas trocas de olhares entre Nina e Mariana; seria
estranho se ninguém desconfiasse do que aconteceu, visto nossos mais de
trinta minutos do lado de fora.
Encostei em um canto, observando a brincadeira, mas com a mente no
momento que havia acabado de passar.
Pelo resto da noite, me obriguei a manter distância de Gabriel, ainda sem
acreditar que poderia chamá-lo de “meu noivo”.
Capítulo Trinta e Três
“Foi melhor deixar a vida nos mostrar
Que o amor não se acaba no tempo
Deixa Deus te ensinar a sonhar
Te provar que somente com amor
Vale a pena esperar.”
(Grupo Versos - Vale a Pena Esperar)
— Cunhadinha!!!
Eu mal tinha aberto os olhos direito quando ouvi o grito de Júlia com ela
jogando-se ao meu lado na cama. Murmurei alguma coisa mal-humorada por
ter sido acordada assim, mas ela ignorou e me abraçou de lado.
— Para — reclamei, empurrando-a.
— Vish, era para você estar feliz, soltando fogos de artifício, e não careta
assim.
Ignorando sua indireta, eu passei a mão no rosto, forçando-me a despertar,
ela não me deixaria voltar aos meus sonhos de qualquer forma.
— Como foi? Me conta tudo! — pediu, batendo palmas.
— Ah, pronto, vou marcar uma reunião com todo mundo e contar no
palanque, pelo amor de Deus, é a única pergunta que vocês têm para fazer?
— Levantei para trocar o pijama.
Desde ontem, o único assunto da minha casa era esse, meus pais não
tiraram o nome de Gabriel da boca por um único segundo. Não é como se eu
não gostasse, entretanto era algo muito novo ainda para mim, não sabia lidar
com a exposição.
— Vish, tinha esquecido como você fica chata quando acorda, vou
precisar avisar o Gabriel, porque, né?, coitado dele, acordando todo dia do
seu lado.
Após pegar um vestido simples, já que, depois dos longos meses de
temperatura abaixo de 10ºC, estava calor, fui para o banheiro me trocar.
Tive muitas crises climáticas desde que voltei de Porto das Rosas. Quando
vim para o Brasil, lá estava calor e cheguei sendo recepcionada pelo
maravilhoso inverno de Curitiba.
Agora aqui estava esquentando, mas, quando voltasse para lá, chegaria
direto na neve.
— Gabriel foi em uma reunião de sei lá o que, mas disse que à noite te
encontraria — a Mendes falou quando voltei para o quarto.
Tentei evitar, mas não consegui impedir o sorriso bobo de surgir em meus
lábios. Eu sempre amei estar com Gabriel, agora, mais do que nunca, queria
a presença dele.
E, obviamente, isso não passou despercebido por Júlia, pois ela deu
pulinhos de alegria.
— Ai, eu estou amando ver vocês dois apaixonadinhos. O Gabriel chegou
ontem sorrindo até para o vento e não queria de forma nenhuma me contar
nada, o jeito foi ameaçar jogar a Bíblia dele na piscina — contou espalhada
na cama enquanto lixava as unhas. — Agora me conta sobre como foi o
pedido do príncipe encantado do cavalo branco, vulgo meu irmão mais
velho.
Coloquei a mão na cintura, fingindo estar brava, mas ela me olhava
ansiosa e cheia de expectativas por uma resposta.
— Tá bom, sim, ele foi romântico, não, não foi do jeito que você sonhava,
não teve joelhos no chão, nem flores nem algo do tipo. Foi exatamente como
eu sonhava. Feliz?
— E quais foram exatamente as palavras dele? Nem me vem com essa de
não lembrar, eu te conheço, dona Marta Carolina, deve ter ficado revivendo
as memórias a noite inteira.
Não mentiu. Após a conversa com mamãe, eu realmente passei horas
olhando para o teto, pensando na nossa história.
Revirei os olhos e fui contando de pouquinho em pouquinho os
acontecimentos, deixando-a cada vez mais ansiosa. Não revelei tudo, nem
meus sentimentos na hora, apenas o básico para a garota se contentar.
Nós ficamos conversando até perto do almoço, chamei-a para comer aqui,
mas ela negou, explicando que a mãe a queria em casa para não ficar sozinha
durante a refeição.
Gabriel apertou minha mão com força, força até demais. Ele estava sério,
com os olhos arregalados estampando o susto ao entrar na casa e se deparar
com aquela cena.
E eu? Eu queria me esconder em qualquer lugar bem longe dali. Abaixei a
cabeça com o rosto, pescoço, corpo, tudo parecendo um pimentão, e
respirava fundo, tentando não entrar em surto por culpa deles. Minha
vontade era bater em cada um com aqueles pedaços de madeira, mas,
obviamente, não fiz isso.
— Então você é o famoso Gabriel Mendes? — vovô questionou, sério,
fazendo meu noivo engolir em seco.
Tentei falar que era brincadeira, mas estava tão abismada com a ousadia
deles que não saiu uma palavra da minha boca. E Gabriel provavelmente
sabia disso, mas também se chocou um pouco.
— Sim, senhor, prazer! — Ele se aproximou, apertando a mão dele.
Seu Rodrigo, exagerado como era, soltou uma gargalhada alta por causa
da tensão de Gabriel.
— Relaxa, rapaz, aqui você é bem-vindo e muito admirado por ter
conquistado essa mocinha aí! — respondeu, abraçando-o e dando tapinhas
nas costas dele.
Gabriel sorriu sem graça e foi obrigado a cumprimentar um por um, e
todos falavam a mesma coisa. Eu fiquei no meu lugar, com as mãos cruzadas
e esperando acabar logo aquilo, envergonhada por causa da atitude infantil
deles.
Júlia, que até então tinha ficado quieta, fazendo-me esquecer da sua
existência, se aproximou do meu ouvido sussurrando: “Já gostei deles”.
Ignorei sua provocação, permanecendo com a cabeça baixa.
Após longos minutos, Gabriel se aproximou, constrangido, explicando que
os homens o chamaram para apresentar a fazenda, perguntando se podia ir.
Bruna e Júlia foram as primeiras a dar a permissão, antes de eu pensar
direito. Com meus protestos, ambas me empurraram escada acima com
minha prima guiando-nos até “meu” quarto.
— Misericórdia, aqui é muito quente! — A loira resmungou já deitando
no chão na frente do ventilador.
Eu admirava a espontaneidade de Júlia, ela mal chegou, não conhecia
Bruna, e já agia como se estivesse no ambiente mais familiar do mundo.
Sentei-me na cama, aproveitando o silêncio para pensar direito. Devido à
euforia da chegada dos Mendes, nem tinha parado para me perguntar o
motivo de eles estarem aqui.
Questionei minha amiga e ela se sentou, cruzando as pernas para explicar.
— Foi mamãe quem teve a ideia. Nós estávamos conversando e Gabriel
falou sobre precisar dar um jeito de conhecer seus parentes antes do
casamento. Aí ela sugeriu que, como passamos o Ano Novo em Assis
Chateaubriand, lá na minha tia, aproveitássemos que era quase caminho e
passássemos aqui para ir embora com vocês no domingo.
— Vocês vão dormir aqui? — Bruna perguntou, mas era a mesma dúvida
que a minha.
— Uhum, sei lá, tia Lisa deve ter visto tudo isso já e não contou para fazer
surpresa para a Marta.
Deitando na cama, ficamos nós três conversando sobre assuntos
aleatórios, achei engraçado como variaram desde literatura, teologia e
chegaram em, mais uma vez, meu relacionamento.
Naquela conversa animada, nos surpreendemos quando tia Paula, mãe da
Bru, veio nos chamar para o almoço. Conforme descia as escadas, senti um
frio na barriga ao pensar em ver Gabriel novamente.
Quando nos encontramos, o rapaz abriu um singelo sorriso, estendendo
gentilmente a mão. Com vergonha da minha família e com medo das
piadinhas, preferi não matar a saudade como realmente desejava. Posicionei-
me ao seu lado e ele pareceu perceber meus temores, pois apenas ficou ali
perto sem forçar nada.
Vovô fez um longo discurso sobre a família e a alegria em dar a netinha
para um rapaz como Gabriel. Apesar de ter ficado encabulada, também senti
felicidade por ver a aprovação da minha família ao meu noivo, sabendo que
isso era mais uma forma de Deus responder às minhas tantas dúvidas.
Aproveitando o momento, Gabriel conseguiu se aproximar e entrelaçar
nossos dedos. Eu apreciava demais aquele pequeno gesto, os inúmeros
sentimentos que ele transbordava em mim, significava muito mais do que
um beijo ou qualquer coisa que o mundo estava começando a considerar
normal.
Como patriarca, vovô fez a oração do almoço, agradecendo ao Senhor por
Seu contínuo cuidado em nossa vida.
— Estou morrendo de fome — Gabriel sussurrou no meu ouvido quando
anunciaram que finalmente poderíamos nos servir.
— Por que não falou? Eu tentaria conseguir algo para vocês comerem —
falei preocupada, sentindo-me uma péssima anfitriã por não ter perguntado
isso.
— Imagina, tava guardando estômago para o almoço mesmo, esse cheiro
de churrasco tá uma delícia — explicou, dando um beijo de supetão na
minha cabeça.
Olhei-o brava, principalmente vendo meus parentes segurando um sorriso,
mas ele deu de ombros, pegando um prato.
— Meu Deus, nunca vi meu pé tão sujo — Júlia resmungou quando tirou
os sapatos para deitar na rede.
Meu avô se apegou extremamente a Gabriel e quis apresentar aos Mendes
os cafezais da fazenda. Eu os acompanhei, fazendo comentários uma vez ou
outra sobre a história da cidade.
Compreendi a animação do meu noivo no dia lá no Barigui, era gostoso
explicar sobre algo da nossa história de que sentíamos orgulho.
Por consequência, nossos pés estavam completamente sujos da terra
vermelha da região.
— Um dos motivos pelos quais amei Curitiba é que é um horror varrer
aqui, imagina passar pano, então?
— Imagino, isso aqui sai do pé? — Júlia dramatizou, tentando limpar com
a mão.
— Depois de uma semana e olha lá — Bruna falou, sentando-se no chão.
— Não é à toa que vocês, curitibanos, apelidaram o povo daqui de pé-
vermelho.
— Como assim? — Gabriel, que estava sentado na cerca, tomando caldo
de cana, perguntou, curioso.
— Diz a lenda… — Bruna começou com uma voz de suspense. —
Brincadeira, mais ou menos. É uma das explicações que ouvi e faz sentido.
Enfim — Cruzou as mãos após uma pausa para se organizar. —, contam que
os caipiras daqui iam para Curitiba com os aviões e tal, mas, como antes era
tudo barro, chegavam lá com as botas cheinhas daquela terra vermelha,
sujando tudo. Aí, o povo da capital falava “Alá os pé-vermelho chegando”,
por causa da cor no piso. E, assim, surgiu o nosso termo patrimônio cultural
pé-vermelho!
— Amei, mas, mudando de assunto, acho tão fofinho o sotaque de vocês!
— Júlia falou, apertando os dedos como se fossem bochechas imaginárias.
— Nós não temos sotaque — Bruna respondeu, séria.
— Têm, sim, eu fico todo gamado quando, nos raros momentos de
discurso da Marta, ela começa a falar e fica aquele sotaque do interior —
Gabriel falou, fazendo-me ficar vermelha com a declaração.
Ele abriu um sorriso de lado para mim, comprovando que seu objetivo era
mesmo me provocar.
— Eu não tenho sotaque — me defendi, ignorando-o.
— Fala "porteira"!
— Porteira?
— Olha aí! — Júlia deu um gritinho, apontando para mim. — O R é todo
puxadinho, porrrrrteira! — imitou.
— Falou a "leite quente dá dor nos dente", né? — Bruna entrou na
discussão, imitando o jeito curitibano de falar com o “e” bem marcado.
— Respeita, porque pelo menos a gente dá o devido respeito ao português
falando as letras exatamente como se escrevem. É leitE quentE e não leiti
quenti — Gabriel debochou, saindo da cerca e sentando-se ao meu lado na
rede. — Mas vocês sabiam que tem um motivo também?
Aproveitando a companhia, encostei levemente a cabeça no seu ombro,
esperando-o explicar.
— Como a Bruna diz, é o que conta a lenda. Curitiba, no início, teve
povos de diferentes nacionalidades, desde portugueses aos italianos,
poloneses, ucranianos, e por aí vai. Por isso os nativos precisaram começar a
falar pausadamente, exatamente como escreve, para serem entendidos,
forçando principalmente o “e” no final das palavras. Então nós honramos a
nossa língua, além de sermos receptivos com os outros povos.
— E se acham também — murmurei apenas para ele, mas, escandaloso do
jeito que era, Gabriel jogou a cabeça para trás, gargalhando alto.
As meninas questionaram o motivo para aquilo, mas ele não explicou,
deixando-as curiosas.
Gabriel começou a afagar a minha mão inconscientemente e, apreciando
aquele carinho do qual eu sentira tanta saudade, continuamos a conversa até
meu avô aparecer para roubar o novo neto preferido novamente.
Meu noivo se levantou e, mesmo com meus resmungos, deu um beijo na
minha testa antes de seguir alegremente o mais velho. Mas eu ficava feliz
com isso, o único neto de vovô era meu irmão e ele não se interessava muito
em ajudá-lo, então acabou sendo natural o vovô se apegar a Gabriel, que
também amava conversar e se sentir útil.
— Ah, pronto, agora vai ficar se metidando com beijinhos na testa,
carinhos, e blá-blá-blá — Bruna debochou quando Gabriel já estava longe.
— Mudando de assunto, Marta, será que a gente consegue levar os dois para
tomar a vitamina da Sergipe amanhã cedo?
— Apoio, lá pertinho também tem o Museu Histórico, Gabriel gostaria de
conhecer.
Júlia e a minha prima tinham se dado bem de primeira, então deixei a Bru
explicando sobre a loja de vitamina e pastel, que, junto ao suco da
rodoviária, eram os patrimônios culturais da cidade.
Aproveitando estar só, deitei na rede, impulsionando um leve balançar ao
empurrar a mão no chão.
Aos poucos, meus olhos ficaram pesados e não percebi quando acabei
cochilando. Meus sonhos foram tomados por um certo rapaz de cabelos
loiros e um sorriso que me encantava, estávamos nós dois caminhando pelos
campos de café quando ouvi uma voz longe chamando por mim.
— Amor, acorda!
Bocejando, abri meus olhos com pesar e aos poucos a visão foi
desembaçando. Gabriel estava ajoelhado ao lado da rede e acariciava meu
rosto com delicadeza. Levada por aquela deliciosa sensação, voltei a tentar
dormir, e esta tentativa foi fracassada com sucesso quando ele me chamou
novamente.
— O que foi? — resmunguei.
— Quero aproveitar um pouco a sós a minha noiva, não posso?
Assenti, sentando para dar espaço a ele, recostei a cabeça em seu peito e
ele passou o braço por trás, abraçando-me. Ficamos algum tempo em um
silêncio gostoso, apenas contemplando a natureza à nossa frente, até eu ter a
brilhante ideia de falar algo.
— Gabriel, posso te fazer uma pergunta? — questionei receosa.
— Lá vem, fala.
Graças a Deus, na posição em que eu estava, não podia ver seu rosto, nem
ele o meu.
— Então — mordi o lábio, pensando em como falar sem demonstrar tanto
a curiosidade —, digamos que talvez eu tenha ouvido falar sobre a época em
que você e a Mari oraram juntos.
Fechei os olhos, esperando a resposta.
Gabriel brincava com as nossas mãos, mas parou no mesmo instante.
— Quem te falou sobre isso?
— É errado eu descobrir? — falei na defensiva já, logo me arrependendo e
acalmando os nervos.
Por mais que a Luísa tivesse falado que nunca deu em nada, um bichinho
chamado ciúmes continuava remoendo aquilo dentro de mim, repeti diversas
vezes que era besteira. Porém, quando menos queria, acabava lembrando
daquilo, querendo entender melhor as nuances daquele quase
relacionamento.
— Não, eu só quero saber quem te contou e o propósito da pessoa — ele
respondeu e também deu para perceber uma irritação da parte dele.
Respirei fundo para me controlar, não queria uma discussão por ciúmes,
ainda mais por algo ocorrido há anos já. Frustrada por ter feito isso, levantei-
me e me preparei para me afastar, achando melhor do que ficar e acabar
falando o que não devia.
— Ei. — Senti Gabriel puxando-me de volta para ele e, vendo ter perdido
a luta, me aconcheguei no seu abraço novamente. — Por mais que eu não
goste desse assunto, é um direito seu saber. E só queria descobrir quem te
contou, pois o único propósito da pessoa era criar contenda.
— Não, isso aconteceu há mais de dois anos e a pessoa falou sem querer,
ela até me explicou que foi devido às insinuações da igreja. Eu que fiquei
remoendo mesmo, desculpa.
Ele me apertou e senti um beijo no topo do meu cabelo, fechei os olhos
apreciando a sensação de ser amada.
— Bom, não sei até onde essa pessoa falou, mas vou te explicar em
resumo a história.
Então ele me contou basicamente a mesma coisa que Luísa e Mari
falaram. Ambos eram jovens, piedosos e já em idade para casar, vendo isso,
os irmãos da igreja começaram a jogar um para cima do outro, fazendo-os
cogitarem a ideia de casamento — até então nem pensada por nenhum dos
dois.
— Foi meu pai quem me fez perceber o erro, sabia? — Neguei com a
cabeça. Ouvi seu suspiro antes de ele continuar, agora com a voz carregada
de emoção. — Ele era minha maior inspiração, então obviamente o procurei
para conversar sobre isso. E ele me explicou que não era porque a Mariana
era uma mulher piedosa que eu deveria me casar com ela. E, amor — eu me
derretia toda vez que o ouvia me chamar assim —, eu realmente só tinha
sentimento de irmão por ela. Não passou de um fogo de duas semanas, além
disso, a forma como conduzimos aquele tempo de oração foi bem errada. A
única pessoa a roubar meu coração foi uma certa morena envergonhada que
derruba café na roupa dos caras — ele falou, gracejando.
Com as bochechas quentes, escondi meu rosto em sua camisa ao relembrar
de quando nos vimos pela primeira vez.
— Obrigada pela sinceridade — murmurei, sem coragem de olhar para
ele, envergonhada por ter ressuscitado a conversa. — E me desculpa por
isso.
— Tudo bem, foi bom relembrar um dos últimos momentos com meu pai.
— Ele ficou em silêncio e, ao olhá-lo, vi uma lágrima solitária escorrendo
pelo seu rosto.
Eu sabia que ele sentia falta do pai; sempre, ao comentar sobre ele,
Gabriel falava com emoção no olhar. Ele já me contou sobre o quanto o
admirava e como foi o seu principal exemplo de ser humano.
— Aliás, ele amaria te conhecer — voltou a falar depois de alguns
segundos, mas agora sorria, olhando distante, provavelmente lembrando do
progenitor.
— Ah, é? — questionei com interesse em ouvir mais.
— Sim, ele sempre orou muito pela minha futura esposa e sempre me
guiava sobre como prosseguir no momento certo. Além disso, vocês dois se
dariam bem, ambos tímidos e envergonhados.
— Você tá de brincadeira? — Olhei em seus olhos, buscando a resposta.
— Você é filho de gente tímida? Não consigo imaginar.
Então Gabriel jogou a cabeça para trás, rindo alto, e eu amava ouvir a
risada dele, considerava um dos melhores sons do mundo.
— Não, ele realmente era mais reservado. Então imagine o desespero em
ter dois filhos sem vergonha nenhuma na cara. Saudades do seu Josué. —
Sua expressão se alterou, ele não chegou a ficar triste, mas o semblante
nostálgico permanecia. — 14 de novembro de 1982, nem parece que já se
passaram cinco anos desde aquele dia… — sussurrou mais para si mesmo do
que para mim.
Abracei-o com força, buscando demonstrar minha presença com ele a todo
instante. De repente, toda a atmosfera mudou, quando senti os dedos de
Gabriel passeando gentilmente por meu rosto.
— Eu já disse que te amo? — ele sussurrou com a voz alterada.
Fechei meus olhos, apreciando o carinho, e meu erro foi abri-los de novo e
encarar o olhar de Gabriel. O frio na barriga veio quando seus dedos
desceram, fazendo todo o contorno do meu rosto e pescoço. Naquele
momento senti um enorme desejo de ser beijada por ele, por segundos todos
os meus pensamentos sumiram.
— Marta!
De repente o grito de Júlia soou de dentro da casa e nos separamos
rapidamente, cada um sentando em uma ponta da rede. Sentia meu rosto
pegando fogo e as batidas do coração em disparada, Gabriel também estava
atordoado, pois não ousou me encarar e puxava os cabelos enquanto
mantinha os cotovelos apoiados no joelho.
— Está tudo bem? Vocês estavam brigando? — minha amiga questionou,
confusa.
Quase falei que preferia que estivéssemos. Seria menos constrangedor e
perigoso.
Pela primeira vez na vida, fiquei contente com a interrupção de Júlia, ao
menos dessa vez foi muito bom ouvir seus gritos estridentes.
— Sua mãe estava te chamando.
Assentindo, levantei e fui para a cozinha, ainda sem coragem de olhar para
Gabriel.
Mamãe queria ajuda para preparar a janta e não hesitei, tentando ocupar ao
máximo a cabeça. Quanto mais se aproximava nosso casamento, mais tensas
ficavam algumas questões, minha própria mãe tinha me alertado dos perigos
de ficarmos a sós, mas eu, pela emoção do momento, não lhe dei ouvidos.
Depois da refeição, Gabriel me chamou para conversar, eu hesitei, um
tanto receosa, por causa da situação de mais cedo. Ele disse que seria rápido
ao ver minha demora.
— Eu quero te pedir perdão mais uma vez.
Abri a boca, surpresa pela atitude dele, não esperava por aquilo, cada dia
admirava mais o caráter de Gabriel e a forma como, apesar da cabeça dura,
quando ele percebia estar errado, não titubeava em nos procurar para se
retratar.
— Se não fosse a minha irmã, eu sei muito bem o que poderia ter
acontecido, sei o quanto deixei minhas emoções tomarem conta e não fui o
cavalheiro que prometi a você, ao seu pai e principalmente a Deus.
Realmente quero começar a evitar essas situações, Marta, faltam poucas
semanas para o casamento, não quero pecar contra você faltando tão pouco
tempo para não precisarmos nos preocupar mais com isso.
Assenti, sem coragem para falar, ainda morrendo de vergonha por tudo
aquilo. Meu noivo, então, pegou minha mão e a segurou, orando por nós e
pedindo para o Espírito Santo nos guiar em pureza por esse tempo.
Já começando a cumprir o acordo, dessa vez ele não me abraçou, apenas
deixou um beijo no dorso da minha mão, o que foi tão significativo quanto.
Fim!
Agradecimentos
Enfim terminamos, nem sei como descrever o que estou sentindo neste
momento.
São quase 4 anos com o Gabriel e a Marta na cabeça e pouco mais de 3
desde que comecei a realmente escrever a primeira versão.
"Uma Oração de Amor" foi construído por muitas mãos, não apenas as
minhas, que escreveram. E, para alguém detalhista e jovem emocionada
como sou, vai ser impossível não citar todas as pessoas que fizeram parte
disso tudo — ou ao menos tentar (quando digo muitas são muitas mesmo
kkkk)
Acima de tudo, quero agradecer a Deus, aquEle que me acompanhou em
cada processo de escrita deste livro, desde aquele sonho jamais saído do
papel até a última vírgula. Foi durante a escrita deste livro que Ele trabalhou
muitas coisas dentro de mim, então posso dizer que também sou uma Marta
por aí.
Depois, aos meus pais, por sempre acreditarem em mim, me incentivarem
e investirem nos meus sonhos. Este livro não teria saído sem o
empurrãozinho de vocês
Ao projeto Revelando Autoras: Maina, Aline e Dulci. Meninas, muito
obrigada por terem pegado na minha mão e me guiado na escrita, com
certeza eu jamais teria conseguido estruturar tudo isso. E principalmente à
Aline, que betou o começo de UOA, Line, obrigada por acreditar, puxar
minha orelha e me empurrar, você faz parte disto tudo.
À Thays, você sabe como foi importante neste processo. Você foi a
primeira a me ouvir falar e, literalmente, se não fosse você, os Mendes nunca
teriam vindo ao mundo. Obrigada por ter aguentado cada surto, ter me
incentivado, aconselhado e betado a primeira versão. Agradeço a Deus pela
sua vida!
À Lau! Muito obrigada por ter aceitado, do nada, betar o livro, por cada
conselho sincero, elogios e incentivo. Nem consigo imaginar o que seria da
história se não fosse a sua ajuda (na real consigo, sim, e seria péssimo kkkk).
Obrigada, Ana Luiza e Lavínia, por terem betado toda a história, me
aconselhado sobre detalhes que eu deveria mudar e por cada surto com os
comentários, foram muito importantes para continuar.
Ao Closet, amo vocês, meninas, obrigada por terem suportado meus
momentos surtada, pelos puxões de orelhas, pelas lágrimas, elogios e
alegrias.
À Vivi, quase certeza que você nunca vai ler isto, mas, se ler, vai entender
bem o porquê deste agradecimento. Obrigada por ter me escutado e
aconselhado nos momentos que eu mais estava perdida sobre o que fazer da
vida, obrigada por ter sido um exemplo de discipuladora. Apesar de nunca
ter atuado diretamente no livro, você foi mais do que importante na minha
construção (cof, cof, Marta), amo sua vida!
À Bruna, amiga, não tenho palavras para dizer o quão grata sou pela sua
amizade. Agradeço a Deus pelo momento que tive a ideia repentina de te
enviar o livro para betar (eu amo a aleatoriedade daquele dia) e por todo o
seu apoio em cada momento, pela sinceridade nas opiniões e incentivo nos
momentos que eu queria simplesmente desistir de tudo.
À Wildymara, obrigada pela sua betagem na primeira parte do livro e pela
sua sinceridade. Foram seus comentários que me enfiaram em uma crise de
identidade por longos meses e tornaram este livro ainda melhor.
À Débora. Muito obrigada por aceitar o desafio da revisão e ir muito além
das minhas expectativas, pelo seu carinho e sua dedicação com a Marta e
com o Gabriel. Este livro só está como está graças a suas mãos habilidosas.
Às leitoras do Wattpad: vocês são incríveis! Obrigada por abraçarem
“Uma Oração de Amor” mesmo com seus 1000 defeitos, votarem,
comentarem e me incentivarem. Espero não ter tirado nenhuma cena favorita
de ninguém kkkk.
Ao Clube dos Mendes, amo vocês, gurias. Obrigada por todo o apoio.
Temos muitos outros nomes que trabalharam indiretamente neste livro,
mas seria impossível citar todos. Obrigada a cada um que me incentivou na
escrita, mesmo que de forma indireta.
E, por fim, a você que está lendo neste momento (se chegou até aqui, rs):
obrigada por ter dedicado seu tempo e dinheiro para conhecer mais da Marta
e do Gabriel.
Minha oração é para que este livro possa tocar de alguma forma a vida de
cada um que leu, que vocês tenham sempre Cristo como centro dos seus
corações e nunca se esqueçam de que Ele deve ser nosso maior Amor.
[1] Termo equivalente a “menino, rapaz”.
[2] Walkman® é uma marca popular de uma série de tocadores ou leitores de áudio portáteis
pertencente à Sony. O termo Walkman também é utilizado para se referir a aparelhos portáteis
similares de reprodução de áudio estéreo de outros fabricantes.
[3] Termo equivalente a “menina”
[4] Termo muito comum em Curitiba e região, equivalente a “menino”
[5] Termo dos anos 80 equivalente ao nosso “ficar” atual.
[6] Esse poema foi escrito por Abigail Hillary exclusivamente para o livro.
[7] Uma patota é uma turma de amigos, equivalente ao “galera” de hoje em dia.
[8] Salgadinho feito de milho
[9] Jogo típico paranaense, onde, em resumo, se usa dois tacos para rebater a bola. Quando o
participante larga eles no chão, significa que desistiu de jogar.
[10] Sinônimo de mentira. Alguém que dá um “dolangue” está inventando histórias.
[11] O termo significa que alguém está dizendo algo sem sentido algum.
[12] Refrigerante típico da região leste do Paraná
[13] Termo usado para uma comida com aparência estranha.
[14]
Escatologia é o estudo dos acontecimentos do fim dos tempos descritos na Bíblia. A palavra
escatologia significa "estudo das últimas coisas". O fim dos tempos é um tema que surge em muitos
livros da Bíblia e a escatologia procura organizar e interpretar essa informação.
[15] Ficar de bode é o mesmo que estar de mau humor.
[16]
WILSON, Douglas. Sua Filha em Casamento. 2. ed. [S. l.]: Editora Clire, 2019. 126 p.
[17] Significa uma pessoa muito chata, insuportável. Essa expressão surgiu por causa das
galochas de borracha, que as pessoas colocavam por cima dos sapatos em dias de chuva para não sujá-
los. A gíria surgiu em referência às pessoas que entravam na casa dos outros sem tirar essas galochas,
sujando tudo no caminho.
[18]
Significa o mesmo que nada, coisa nenhuma.
About The Author
Lyta Racielly
Martin Halley se viu viúvo cedo demais. Com o título de rei de Porto das
Rosas sobre seus ombros, a necessidade de casar novamente não podia mais
ser adiada e um recomeço se impõe a ele.
Grace não quer casar. Martin precisa fazer isso. Uma aliança entre os reinos
é selada e assim os caminhos dos dois se unem em um casamento arranjado.
Agnus Dei
Uma noite especial, duas vidas e uma canção que ressoa no mais profundo
da alma.
Mas não pense que a história é sobre elas, na verdade é sobre alguém muito
mais importante: o Cordeiro do Rei, que tira o pecado do Além-Reino.
Só me resta Confiar
Casar era o sonho de Elisabeth. A moça estava com quase tudo certo, ao
menos o básico do básico ela já tinha: o noivo!
Porém, nem tudo eram flores. Como missionários, eles tinham uma
“pequena” dificuldade na área financeira para o casamento, e uma grande
cartela de amigos para convidar.