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Como exercer um outro tipo de paternidade — Gama Revista https://gamarevista.uol.com.br/semana/homens-e-agora/como-exercer-...

Homens, e agora?

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Como exercer um outro tipo de


paternidade
Homens, e agora?

Para especialistas, pais e mães, a paternagem ativa e afetuosa é


herdeira dos feminismos e mantê-la em pauta na sociedade é
obrigação dos homens

Dolores Orosco
07 de Maio de 2023

@GAMAREVISTA / COMPORTAMENTO / SOCIEDADE

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R E P ORTAG E M

Como exercer um outro


tipo de paternidade
Dolores Orosco
07 de Maio de 2023

@GAMAREVISTA / COMPORTAMENTO / SOCIEDADE

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Como exercer um outro tipo de paternidade — Gama Revista https://gamarevista.uol.com.br/semana/homens-e-agora/como-exercer-...

Homens, e agora?

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Para especialistas, pais e mães, a paternagem ativa e afetuosa é


herdeira dos feminismos e mantê-la em pauta na sociedade é
obrigação dos homens

As mães solo no país somam, de acordo com o IBGE, 11,6 milhões de mulheres e,
conforme dados apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça, 5,5 milhões de
crianças brasileiras não têm o nome paterno na certidão de nascimento. Com
base nesses números, vem o questionamento: como é possível realmente
transformar, entre aqueles que �cam ao lado das parceiras, o estereótipo do pai
sisudo, autoritário, distante e frio em um novo modelo de paternidade, com
homens mais presentes, participativos e afetuosos na criação dos �lhos?

Ainda que o verbo ajudar (no caso, a companheira, nas tarefas relacionadas às
crias) possa, em algumas realidades, ser substituído pela palavra dividir, o
caminho para uma divisão totalmente igualitária entre paternar e maternar
segue árduo na maioria das famílias do Brasil. X

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Diante dessa realidade, Gama ouviu especialistas para traçar os principais


pontos que precisam ser revistos para entrarmos em um processo de mudança
de comportamento.

Os direitos das mulheres e os deveres dos pais


A arquiteta, urbanista, escritora e feminista Joice Berth acha que o grande
avanço em relação à paternidade ativa, por enquanto, é o maior espaço que as
Homens, e agora?

mulheres têm tido para expor questões sobre o tema.

“A gente tem uma abertura na mídia que vai, aos poucos, alterando aquilo que já
está consolidado no senso comum da sociedade. Não tem como fazer mudanças
do tipo da noite para o dia. Então, cabe a nós, mulheres, falar, principalmente às
mulheres que vivem na condição de sobrecarga com �lho pequeno, com a casa
toda para cuidar e que, infelizmente, não contam com o semancol do parceiro e
de outras instituições, como a escola, que sempre a aciona ao invés de contatar o
companheiro, por exemplo”, discorre ela.

Psicólogo, escritor e apresentador do podcast Cartas de um Terapeuta, Alexandre


Coimbra Amaral lembra que a reação à ascensão feminista e,
consequentemente, aos novos exemplos de paternagem, se deve, sobretudo, à
“expansão dos ganhos de direitos”. “No fundo, a discussão é toda sobre poder.
Porque, para que uma nova paternidade aconteça, primeiro esse homem precisa
entender que o lugar de poder que ele ocupa não é merecido, é estrutural, já que
ele retira outros lugares de poder, e, ainda, existe uma perda da vida dele ao
ocupar sozinho esse lugar de poder. Ele perde um pedaço da vida. E essa
consciência tem construído essa nova paternidade”, conta.

Joice fala que enquanto as transformações grandiosas não acontecem, cabe à


mulher, “lamentavelmente, o papel questionador de mostrar que o mundo
mudou”. “Às vezes, precisamos bancar a chata e explicar que o pai pode ser
acionado da mesma forma que a mãe; temos que ir impondo essas
responsabilidades para que a coisa chegue no equilíbrio.”

O importante, segundo Joice, é iniciar o debate. “Quando abrimos a discussão,


encontramos esses gatos pingados desses pais que já têm uma outra
mentalidade. Assim como o meu falecido marido tinha, alguns outros homens
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espalhados por aí também já têm uma outra consciência e aí eles mesmos vão
pautando para um outro homem um novo olhar sobre a paternidade, sobre as
relações familiares e tudo mais”, desenvolve a escritora.
Homens, e agora?

“Às vezes, precisamos bancar a chata e


explicar que o pai pode ser acionado da
mesma forma que a mãe

Mãe de quatro �lhos já adultos, ela conta que quando o primogênito nasceu, em
1996, ela tinha 20 anos e, apesar de jovem, tinha consciência de várias coisas,
mas foi a sogra que a fez enxergar que os deveres de pai e mãe deveriam ser
iguais. “Eu me deparei com uma sogra que não sabia da existência da palavra
feminismo, mas tinha uma postura de ensinar os �lhos a terem um outro tipo
de comportamento, um outro olhar para a realidade. Ela trabalhava fora e
organizou a vida familiar dentro dessa lógica. Não interessava se era homem,
mulher, todos da família precisavam contribuir para que a casa �casse
organizada, limpa, cada um tinha a sua função.”

A nova paternidade é herdeira dos


feminismos X

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Nesse sentido, o psicólogo Alexandre Coimbra Amaral diz que as movimentações


para o novo paternar não começaram com o desejo do pai. “Esse movimento foi
iniciado a partir da reivindicação da mulher. A nova paternidade é herdeira dos
Homens, e agora?

feminismos. Então, uma vez que a gente ganha consciência de que as mulheres
abriram esse caminho, nós, como homens, temos a obrigação de dar sustentação
a essa nova cultura. Chega de dar trabalho para as mulheres.”

Atenção às ideias patriarcais e às pautas reacionárias


Coimbra ressalta que, da mesma forma que esse novo pai está nascendo, há o
crescimento de uma contraofensiva a essa �gura, com o recrudescimento das
pautas reacionárias. “A identidade conservadora se baseia na adoção, sem
nenhum reparo, da masculinidade patriarcal. Então, ao mesmo tempo em que a
bolha [da nova paternidade] cresce, existe uma resposta do patriarcado, que diz:
‘Não é assim que deve ser’. É aí que entram todos esses movimentos
masculinistas. Não é por acaso que eles estão aparecendo.”

É preciso se abrir para um outro tipo de paternidade


“É uma entrega a uma experiência incerta, difícil de ser aprendida pela
masculinidade mais tradicional, pois a nova paternidade não está alicerçada
em autoritarismo, pelo contrário, ela quer fugir da hierarquização
autoritária. Portanto, quando essa nova masculinidade precisa se aproximar
afetivamente dos �lhos, a via de aproximação é a horizontalidade: eu só me
aproximo do outro de forma horizontal se, primeiramente, eu abrir mão da
verticalização do poder”, explica o psicólogo.

O homem que deseja construir uma paternidade não violenta, conforme elucida
Coimbra, precisa passar por um processo de rompimento com essa identidade.
”O afeto recebido dos �lhos quando quebramos a hierarquia autoritária é
importante e restaurador para a alma masculina. Os homens estão descobrindo
isso. O autoritarismo é como um muro que impede o carinho, o amor. E, na
hora que esse escudo é quebrado, o homem ganha um afeto que o redesenha.”
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Para Coimbra, o grupo que segue essa nova forma de paternagem está
desconstruindo algumas pautas identitárias. Ele salienta, ainda, que é preciso
colocar na discussão a interseccionalidade de raça e classe porque há um sem-
número de homens que não têm a oportunidade de mergulhar nessa
desconstrução. São os “pais pretos e periféricos”.

Eles �cam de fora da mudança “porque precisam trabalhar muito para garantir a
Homens, e agora?

sobrevivência básica da família”. “Existe uma dor desses pais, que sentem por
não terem energia e disponibilidade afetiva para realizar essa desconstrução.
Por isso, acho que nós, privilegiados, temos a responsabilidade de construir um
mundo que não fale só de paternidade, mas que foque em direitos. Porque se os
direitos forem assegurados a esse homem, ele ganhará mais espaço e tempo
cronológico na vida para poder viver essas experiências com os �lhos, e isso
melhora a vida de toda a sociedade”, pontua Coimbra.

Em abril de 2022, no programa “Roda Viva”, da TV Cultura, Lázaro Ramos falou


sobre o pai e contou como algumas desconstruções na relação entre eles, dois
homens de diferentes gerações, o ajudaram a se abrir para um relacionamento
mais afetuoso e próximo com os �lhos, João e Maria.

“Primeiro, eu tive um entendimento sobre a maneira com que meu pai


demonstrava afeto. Ele não foi um homem de muitos abraços porque também
não recebeu muitos abraços. A maneira dele demonstrar afeto era se mostrar um
cara responsável, ter permanecido em casa, o que é muito valioso num país onde
muitos pais não registram os �lhos e não �cam em casa. No dia em que a gente
se deu um abraço, assim, de carinho, a gente chorou muito e eu entendi que
também queria aquele abraço, e agora a gente se abraça muito”, iniciou o ator,
escritor e diretor.

Ramos continuou dizendo que o gesto causou uma transformação importante,


antes mesmo que ele se tornasse pai. “Aquilo me libertou para eu exercitar um
outro modelo de paternidade. Porque o modelo que eu recebia, às vezes, era o
da rigidez, o da correção. E eu quis ser diferente. Primeiro, foi uma produção
racional, não foi natural, foi uma produção racional: ‘Eu tenho que ser um pai
do meu tempo, tenho que falar eu te amo, tenho que carregar, tenho que
conversar’. Fico desesperado de �car muito tempo fora de casa porque sinto
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falta do contato com os meus �lhos, de conversar com eles, que são pessoas
incríveis de se estar perto. Hoje em dia, faz muita falta e virou um processo
natural, mas começou por aqui [ele aponta para a cabeça]”.

O caminho começa pela aproximação emocional


Um processo bastante parecido ocorreu com Fabiano Passos, fundador da
Estopim Records, selo musical e audiovisual, co-organizador do livro
Homens, e agora?

“Paternagem Punk” (Estopim, Revelia Livros e Analógica Edições, 2022) e pai do


Fábio, 7. A obra reúne diversos ensaios de pais, seguidores do movimento punk,
com textos em que re�etem sobre como encaram a paternidade.

Ele relembra da infância e conta que o seu genitor sempre esteve presente, mas
“era aquele modelo de pai provedor e um pouco distante emocionalmente”.
“Cada �lho encara isso de uma maneira, e eu sempre fui sensível nesse ponto.
Não posso reclamar do meu pai, que me apoiou em muitas coisas, e seria até
injusto comparar a minha realidade com a de inúmeras pessoas que não tiveram
ou não têm contato com a �gura paterna, no entanto, não nego que sentia essa
falta. Ao mesmo tempo, sei que ele passou para mim o que o pai dele passou
para ele”, diz.

Assim, desde que pensou em se tornar pai, a primeira resolução de Passos foi a
de ser presente afetivamente na vida do �lho. E, até aqui, tem conseguido. Por
trabalhar em horários �exíveis, é ele quem passa a maior parte do dia com Fábio,
cuidando das necessidades do garoto e quem também organiza a rotina
doméstica – a companheira de Passos é médica e tem um cotidiano agitado.

Diariamente eu tento educar meu filho


com a minha bagagem, a partir dos
questionamentos que o punk traz
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No decorrer da paternagem, Passos conta com as trocas com amigos e colegas do


punk, os mesmos que participaram da coletânea, por meio de um grupo no
WhatsApp, descrito como uma rede de apoio, em que compartilham dicas,
Homens, e agora?

pensamentos, frustrações e alegrias sobre paternidade e informações a respeito


do cuidados com a casa.

“Não é fácil, mas diariamente eu tento educar meu �lho com a minha bagagem, a
partir dos questionamentos que o punk traz, sobre religião, gênero e
alimentação, por exemplo. A grande di�culdade é educá-lo dentro do que eu
acredito, vivendo em uma sociedade que acredita em outras coisas.”

Um assunto a cada sete dias

C A PA
Homens, e agora?

1
C ON V E RS A S
J.J. Bola: 'A violência é mais comum do que o afeto por outros
homens'

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R E PO RTAG EM
Como surgem os novos machistas?

3
R E PO RTAG EM
Como exercer um outro tipo de paternidade
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4
P OD C A ST DA SE M A N A
Lola Aronovich: 'O masculinismo é um tipo de fake news'

5
B LO C O DE NOTAS
As dicas da redação sobre o tema da semana
Homens, e agora?

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