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Perez, O. C., Vaz de Moura, J. T., & Melo, C. B. de B. (2023). Protests for Women’s
Rights and against the Bolsonaro Administration. Latin American Perspectives, 50(1),
165–178. https://doi.org/10.1177/0094582X221150442
Joana Tereza Vaz de Moura - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),
vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais.
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-9561-1063
RESUMO: Este trabalho analisa protestos em defesa dos direitos das mulheres. A partir
de notícias e de documentos produzidos principalmente por movimentos sociais
feministas, são analisadas as pautas de três protestos: “#EleNão”, aqueles que ocorreram
no último dia internacional das mulheres (08 de março) e a Marcha das Margaridas de
2019. Em geral, os protestos defendem os direitos das mulheres e criticam o atual governo
liderado pelo presidente Jair Bolsonaro. O trabalho demonstra mudanças na relação entre
movimentos sociais e governo, bem como alterações nas estratégias dos movimentos
sociais, que estão indo para as ruas reivindicarem direitos e em defesa da democracia.
Palavras-chave: Protestos. Movimentos sociais. Feminismos. Governo Bolsonaro.
INTRODUÇÃO
meados de 2016 com Dilma Rousseff). Em 2016, antes de concluir seu segundo mandato,
Dilma Rousseff foi destituída do cargo após controverso processo de impeachment. Em
seu lugar assumiu Michel Temer (do Partido do Movimento Democrático Brasileiro,
PMDB, depois nomeado Movimento Democrático Brasileiro, MDB, partido à direita no
espectro político). Temer era vice de Dilma e ocupou a presidência do Brasil de 2016 a
2018. Antes das eleições de 2018 o candidato com maior intenção de votos, o ex-
presidente Lula, foi preso, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em 2018
foi eleito Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal, PSL) marcando a ascensão de um
governo refratário à participação e pautas de movimentos sociais progressistas, tais como
os feministas.
A ascensão do projeto político liderado por Bolsonaro não acontece sem
resistências, inclusive em grandes protestos. Alguns deles foram liderados por ativistas e
movimentos sociais feministas, tais como: o protesto conhecido como “#EleNão”,
realizado em setembro de 2018 como oposição à eleição de Bolsonaro, aqueles que
ocuparam as ruas em 8 de março de 2019, dia internacional da Mulher, e a Marcha das
Margaridas, que reuniu na capital federal milhares de mulheres trabalhadoras em agosto
de 2019. São esses os objetos de reflexão do presente trabalho. Em que pese o tamanho e
importância desses protestos, pelo fato de serem recentes, ainda não há literatura sobre os
mesmos.
Mas já há conhecimento acumulado sobre os ciclos de confrontos brasileiros da
última década. Embora os ciclos brasileiros tenham variações, impossibilitando a
associação com um único protesto, pauta ou ator, os mais emblemáticos deles foram
chamados de Jornadas de Junho de 2013. Em meados de Junho de 2013 milhares de
brasileiros foram para às ruas com pautas diversas, que pediam desde a concretização de
direitos sociais, incluindo direitos para as mulheres, até mudanças no sistema político
(Tatagiba, 2014; Bringel e Pleyers, 2015; Tavares, Roriz e Oliveira, 2016; Alonso e
Mische, 2016; Alonso, 2017; Purdy, 2017; Tatagiba e Galvão, 2019; Almeida, 2019).
Muitos outros protestos aconteceram depois das Jornadas, alguns deles inclusive
apoiando o projeto político liderado pelo atual presidente Bolsonaro (Tatagiba, 2017,
2019; Tatagiba, Trindade e Teixeira, 2015; Cruz, Kaysel e Codas, 2015). A forte defesa
de pautas feministas nos grandes protestos de rua ou nas redes sociais digitais foi chamada
por parte da mídia brasileira de “primavera feminista no Brasil” (Piscitelli, 2017).
Os protestos não aconteceram somente no Brasil. Em meados de 2010 grandes
protestos ocorreram em outros lugares do mundo, como as jornadas da Praça Tahir no
3
Egito, o Occupy Wall Street nos Estados Unidos e os Indignados na Espanha (Pleyers e
Glasius, 2013). Protestos feministas também aconteceram em outros lugares do mundo.
Em 2015, ocorreu o protesto chamado de “Ni una a menos”, na Argentina pelo fim da
violência contra a mulher. Na internet diversas mulheres denunciaram episódios de
assédio, inclusive cometidos por celebridades, o chamado #Yotambién argentino, em
referência ao #MeToo americano. No México, em 2016, foi lançada a campanha
#Miprimeroacoso, inspirada na hashtag brasileira contra o assédio (Agência Patrícia
Galvão, 2018).
De acordo com Alonso e Mische (2016), nos protestos de Junho de 2013 os
atores utilizaram ferramentas de repertórios globais, adaptando-as e as transformando. As
autoras argumentam que os manifestantes construíram performances híbridas,
aproveitando três repertórios: socialista, patriótico e autonomista. Os dois primeiros
foram herdados de ciclos anteriores, enquanto a novidade foi o repertório autonomista.
Junho de 2013 tinha pequenos movimentos sociais horizontalmente organizados,
rejeitando a forma hierárquica e formal das lideranças políticas.
Os protestos como o “#EleNão”, o do dia internacional da Mulher e a Marcha
das Margaridas têm em comum a utilização do confronto como estratégia dos ativistas.
Todos eles buscaram de maneira clara e central se opor aos possíveis rumos que as
políticas públicas e direitos conquistados pelas lutas feministas poderiam tomar.
A literatura sobre confronto político ajuda a entender a relação entre o contexto
político e os protestos. Tarrow (2009:25) explica que os ciclos de confrontos acontecem
“uma vez que os recursos para uma ação coletiva se tornam disponíveis para as pessoas
comuns e para as pessoas que diziam representá-las [...] produzindo os períodos de
turbulência e reorganização”. Quando iniciado o ciclo, há uma redução dos custos da ação
coletiva para outros atores e uma difusão dos quadros interpretativos e de modelos de
ativismo. Ainda segundo Tarrow (2009: 18): “o confronto político é desencadeado
quando oportunidades e restrições políticas em mudança criam incentivos para atores
sociais que não têm recursos próprios”. Conforme essa perspectiva, o sistema político é
essencial para a compreensão dos ciclos de confronto e dos repertórios dos movimentos
sociais. Os ativistas são "estranhos nos portões", uma vez que operam nos limites entre
as políticas instituídas, os aspectos culturais e as instituições (Tarrow, 2012). Ainda
segundo Tarrow (2012), os ativistas atuam na fronteira entre o confronto político e de
rotina, ou seja, escolhem seus repertórios e frames de acordo com as relações que
estabelecem com o campo político. Neste sentido, são parte de um sistema mais amplo
4
de conflito e cooperação (Tarrow, 2012), ao mesmo tempo que podem cooperar com o
Estado também podem participar de processos conflitivos para pautar suas demandas na
arena política.
Com base no referencial sobre confronto político, este trabalho responde à
seguinte pergunta: como os movimentos feministas e suas pautas vêm se alterando em
consonância com o contexto político? Para responder essa pergunta o trabalho retoma,
por um lado, posicionamentos do governo Bolsonaro em relação aos direitos das
mulheres, por outro as pautas de protestos em prol desses direitos.
Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva. Primeiramente foram
retomados estudos sobre as relações entre movimentos sociais e governo nas gestões
petistas. Em segundo lugar foram reunidas diretrizes e posições do governo Bolsonaro a
respeito dos direitos das mulheres. Tais posicionamentos foram coletados na grande
imprensa brasileira, em especial do jornal Folha de S. Paulo, entre os meses de agosto e
outubro de 2019. Os resultados da pesquisa sobre algumas posições do governo atual em
relação aos direitos das mulheres encontram-se na seção 1 deste trabalho intitulada
“Mudanças nas diretrizes do governo federal em relação aos direitos das mulheres”.
Para verificar a pauta dos protestos que respondem de certa forma às provocações
de Bolsonaro, foram escolhidos protestos a favor dos direitos das mulheres e organizados
em um contexto político de ascensão do atual presidente. Com base nesses critérios, os
primeiros protestos analisados são conhecidos pelo símbolo que se espalhou nas redes
sociais: “#EleNão”. Eles ocorreram no dia 29 de setembro de 2018, entre o primeiro e o
segundo turno das eleições presidenciais no Brasil. A segunda série de protestos
aconteceu no dia 08 do março de 2019, dia internacional das mulheres. O mais recente
protesto abordado neste trabalho é a “Marcha das Margaridas”, ocorrida em agosto de
2019 em Brasília, capital federal do Brasil. As pautas destes protestos foram coletadas
entre agosto e outubro de 2019 em documentos e entrevistas produzidos pelas
organizadoras dos mesmos1. As pautas desses três conjunto de protestos são expostas na
segunda seção do trabalho: “Os protestos de mulheres contra o governo Bolsonaro”.
A análise de eventos de protesto (AEP), tem sido uma técnica de investigação
utilizada no campo de estudos de movimentos sociais. Esses estudos geralmente
1 Mudanças nas diretrizes do governo federal em relação aos direitos das mulheres
Em 2002, Luís Inácio Lula da Silva, filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), foi
eleito presidente do país e reeleito em 2006. O PT permaneceu no poder com a eleição de
Dilma Rousseff em 2010, também reeleita, em 2104.
A gestão petista aproximou movimentos sociais do Estado em pelo menos dois
sentidos: primeiro, com a ampliação das Instituições de Participação (IPs) em que
membros da sociedade civil decidem junto ao governo diretrizes para políticas públicas.
São exemplos de IPs os Orçamentos Participativos (conhecidos pela sigla OP, em que os
cidadãos definem como gastar parte do orçamento municipal), Conselhos Gestores
(responsáveis pela formulação de políticas públicas a partir da decisão de membros da
sociedade civil e do governo) e Conferências de Políticas Públicas (em que membros da
sociedade civil formulam diretrizes para políticas públicas em diversas áreas, desde a
assistência social, educação e saúde, passando por cultura, meio-ambiente,
desenvolvimento regional até os direitos de segmentos sociais tradicionalmente
desprivilegiados, como jovens, idosos, afrodescendentes, indígenas, mulheres e Lésbicas,
Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros, conhecidos pela sigla LGBT)
(Lima e Silva, 2012; Pogrebinschi, 2012; Nogueira, 2013; Teixeira, 2013; Araújo, 2014;
Avritzer, 2016; Oliveira, 2016). Na área das políticas para as mulheres, as Conferências
tiveram a importância de legitimar as demandas por equidade de gênero, especialmente
por transformar em “questão de governo” temáticas que tradicionalmente eram vistas
como de cunho intimista e privado (Santos, Perez e Szwako, 2017).
Em segundo lugar, a aproximação entre movimentos sociais com a gestão pública
ocorreu nos governos petistas por meio da escolha de lideranças de movimentos sociais
para cargos centrais na burocracia federal, fenômeno chamado de ativismo estatal (Pires
e Vaz, 2014; Cayres, 2017). Essa aproximação também ocorreu no campo dos direitos
das mulheres, com a ida de feministas para cargos da burocracia federal, o que ficou
conhecido como feminismo estatal (Bohn, 2010; Matos e Paradis, 2014). As interações
entre movimentos sociais e Estado nas gestões petistas resultou em importantes avanços
legislativos para as os direitos das mulheres, como a aprovação da Lei Maria da Penha,
Lei nº 11.340/2006 de 7 de agosto de 2006 (Congresso Nacional, 2006), a qual diz
respeito ao combate à violência doméstica de gênero e da Lei do Feminicídio, Lei nº
13.104/2015 de 9 de março de 2015 (Congresso Nacional, 2015), que converteu em crime
hediondo o assassinato de mulheres em virtude de seu “sexo”. Outro resultado foi a
formulação de políticas públicas mais afinadas com as demandas de movimentos sociais
(Santos, Perez e Szwako, 2017).
7
Esse candidato, Jair Bolsonaro, foi eleito em 2018 e assumiu “as pautas dos
costumes [...] agradando às forças cristãs do Congresso Nacional” (Almeida, 2019:
200). Ainda conforme Goldstein (2019: 257), não é possível se referir a essa nova ordem
de direita como ditadura, e ainda assim não pode se referir a ele como totalmente
democrático, trata-se de uma democracia cujos potencialidades tem sido mutiladas.
A gestão de Bolsonaro deixa bem evidente a diferença que tem em relação ao
período governado pelo PT, especialmente na área dos direitos das mulheres. Na sua
gestão, a Secretaria Nacional dos Direitos das Mulheres, que na maior parte dos governos
petistas tinha status de Ministério, com burocracia e orçamento próprio, foi transferida
para o recém-criado Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
(MMFDH). O próprio nome dado ao novo ministério (Mulher, Família e Direitos
Humanos) indica a direção do projeto bolsonariano: a mulher aparece ao lado da família.
8
Bolsonaro”. O grupo conseguiu reunir 3,8 milhões de mulheres (Cafardo, 2018). Dentro
da página foram combinados protestos contra a candidatura de Jair Bolsonaro.
Uma das suas particularidades foi o fato dos protestos inicialmente não terem sido
convocados por movimentos sociais. Outra diferença desse protesto deve-se à recusa de
vinculação partidária por parte das organizadoras do grupo. A própria criadora do grupo
declarou que nunca participou ativamente do movimento feminista, nem se filiou a
nenhum partido (Cafardo, 2018). O Manifesto do grupo “Democracia Sim” (2019, s/p.)
ressalta a diversidade e o fato de não estarem vinculada a nenhum partido: “votamos em
pessoas e partidos diversos. Defendemos causas, ideias e projetos distintos.” Essa é uma
resposta e forma de aglutinar mais ativistas em um contexto descrença nos partidos
políticos. Tal descrença foi já estava expressa nas Jornadas de Junho de 2013 (Tatagiba,
2014; Tatagiba e Galvão, 2019). Tal posicionamento também remonta ao repertório
autonomista, descrito por Alonso e Mische (2016) para ajudar a compreender os protestos
de Junho de 2013.
Desenvolveimento Ooooooooooooooooooooooooooooooooooo
Conclusao Comentário
Conforme Silva
00000000000000000000000000
março são variadas: aconteceram aulas públicas, cerimônias, assim como protestos, em
especial nas grandes capitais.
Segundo informações da um importante movimento social feminista, a Marcha
Mundial das Mulheres (2017a), em São Paulo (SP), o lema “Mulheres contra Bolsonaro!
Vivas por Marielle, em Defesa da Previdência, por Democracia e Direitos” reuniu mais
de 80 mil pessoas na Avenida Paulista. No Rio de Janeiro (RJ), o ato reuniu mais de 30
mil mulheres. As mulheres também organizaram manifestações em outras partes do
Brasil.
Embora com variações, em geral as pautas se opunham à: “proposta de reforma
da Previdência, o aumento da militarização, a criminalização dos movimentos sociais, a
política de ‘entreguismo’ dos recursos naturais que afeta a soberania nacional [...] o
machismo, a violência de gênero, a desigualdade, o racismo e o preconceito contra
pessoas LGBTs.” (CUT, 2019). A vereadora carioca Marielle Franco, assassinada há um
ano, foi lembrada em diversos atos. As manifestações também denunciaram ainda o
avanço da onda conservadora, os ataques à democracia e a escalada da violência contra
às mulheres (Marcha Mundial das Mulheres, 2017a).
O protesto foi considerado pela Marcha Mundial das Mulheres como responsável
por abrir “o calendário de manifestações de massa contra as reformas e a retirada de
direitos propostas pelo governo de Jair Bolsonaro”. (Marcha Mundial das Mulheres,
2017a, s/p). Logo, os protestos tiveram, além da tradicional defesa dos direitos das
mulheres, críticas ao atual governo.
A crítica ao avanço de um novo projeto no Brasil já apareceu em anos anteriores.
Em 2017 os protestos pediam a saída do presidente interino Michel Temer sob o slogan
“Fora Temer”, mas a pauta central era a oposição à Reforma da Previdência (Marcha
Mundial das Mulheres, 2017b). Em 2018, os protestos do 8 de março foram marcados por
manifestações por democracia e aposentadoria (Marcha Mundial das Mulheres, 2018).
Já nos protestos de 2019 a crítica ao Bolsonaro e ao projeto político por ele
apresentado é que se destacaram. Sônia Coelho, da coordenação nacional da Marcha
Mundial das Mulheres, declarou que: “O sentido desse 8 de março foi mostrar que as
mulheres continuam em resistência contra Bolsonaro, contra o conservadorismo e
fundamentalmente contra a reforma da previdência que vai penalizar mais as mulheres
pobres, as mulheres negras. Nesse sentido, as manifestações cumpriram seu objetivo,
trazendo inclusive de volta, as pessoas que estiveram presentes no #EleNão”. (Marcha
Mundial das Mulheres, 2017a, s/p).
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A primeira Marcha aconteceu em agosto do ano de 2000 e tinha como lema: “2000
razões para marchar: contra a fome, a pobreza e a violência sexista”. Com Fernando
Henrique Cardoso no comentado do governo federal, a Marcha teve um forte caráter de
denúncia do modelo de desenvolvimento rural do país e de como a política de Estado
neoliberal impactava a vida das/os trabalhadoras/es rurais. Mesmo assim, pela primeira
vez na história, o governo brasileiro se dedicou a negociar e analisar uma pauta específica
das trabalhadoras rurais, ainda conforme informações do Movimento (Observatório
Marcha das Margaridas, 2019).
Em agosto de 2003, no início do primeiro mandato do governo Lula, as mulheres
trabalhadoras rurais realizaram a segunda Marcha das Margaridas com pautas
semelhantes ao da marcha anterior (“2003 Razões para Marchar contra a fome, a pobreza
e a violência sexista”). A Marcha posterior, em 2007, manteve o sentido do lema do
protesto anterior. Pela intensa relação entre movimentos sociais e gestões petistas,
exploradas na seção anterior deste trabalho, naquele momento a pauta dos protestos se
centrava nos direitos e diminuição de desigualdades sociais.
Em 2011 a bandeira foi em prol de “2011 Razões para Marchar por:
desenvolvimento sustentável com justiça, autonomia, igualdade e liberdade” passando a
ressaltar a luta por desenvolvimento sustentável com justiça, autonomia, igualdade e
liberdade. O mesmo correu na Marcha de 2015. Mas em 2015, o tema da democracia se
juntou aos anteriores, em uma clara resposta à ameaça de afastamento de Dilma Rousseff
do cargo de presidente da República. (“Margaridas seguem em marcha por
desenvolvimento sustentável com democracia, justiça, autonomia, igualdade e
liberdade”).
Já em 2019, sob o governo Bolsonaro, a sexta Marcha das Margaridas passou a
ser “Margaridas na luta por um Brasil com soberania popular, democracia, justiça,
igualdade e livre de violência”. A soberania do povo, diante de um governo refratário à
interlocução com movimentos sociais que defendem a ampliação de direitos, passou a ser
um dos motes dos protestos, assim como a oposição à violência contra a mulher.
Entre 2000 e 2015, a Marcha elaborou duas pautas dirigidas ao Estado com vistas
a negociação das mesmas. Tais pautas incluíam demandas por políticas de acesso à terra
para mulheres, políticas de crédito, políticas sociais para o campo, como saúde, educação
e moradia de qualidade. Já em 2019, a Marcha optou por não elaborar uma pauta política
para o Estado, por entender que o atual governo não negociaria as demandas políticas das
Margaridas. Como alternativa, lançaram um documento intitulado “Plataforma Política -
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A pauta do protesto era também contra Bolsonaro e alguns dos seus projetos, tais
como: a reforma da previdência (considerada um ataque aos direitos dos trabalhadores,
em especial das mulheres), as políticas de flexibilização de agrotóxicos e a abertura de
possibilidades para que terras indígenas e zonas protegidas sejam abertas para a
exploração. Mais do que a defesa das mulheres, a marcha das Margaridas pedia a volta
dos direitos para todos os trabalhadores, considerado sob ameaça no contexto político
atual.
No encerramento do ato, Sonia Coelho, da coordenação da MMM, declarou que:
“É para isso que estamos lutando e que vamos voltar para cada canto desse país, para cada
comunidade, cada sindicato, cada grupo de mulheres para dizer: Fora Bolsonaro, Fora
Bolsonaro!” (Marcha Mundial das Mulheres, 2019, s/p). Logo, o protesto se transformou
em uma crítica ao governo Bolsonaro.
A Plataforma Política elaborada pelas chamadas Margaridas (ativistas que
participam da Marcha) também denuncia a mudança do projeto político em curso no país
e em partes do mundo: “Após vivenciarmos um período importante de governos da
esquerda latinoamericana, verificamos recentemente uma guinada mais à direita [...]”.
Resta entender o que é essa nova (ou velha) direita.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho analisou posições do atual governo brasileiro comandado por Jair
Bolsonaro, em relação aos direitos das mulheres e as resistências organizadas por
movimentos sociais e ativistas para a garantia desses direitos. Especificamente foram
analisados três protestos com pautas a favor dos direitos das mulheres e que se
contrapõem às diretrizes do atual presidente do Brasil.
Na conjuntura atual, as possibilidades de participação foram diminuídas da agenda
política e os movimentos operam nas "franjas" do Estado, utilizando táticas de reação às
ações de um Estado autoritário. Logo, uma das estratégias dos movimentos sociais tem
sido a ocupação nas ruas.
O trabalho também mostra como as pautas dos protestos têm se alterado conforme
o contexto político assumindo um caráter de confronto ao governo Bolsonaro e em defesa
da democracia. Esse é um indicativo importante para compreender a situação atual do
Brasil: o que esta é em jogo não é mais a ampliação dos direitos, mas a própria
preservação de um regime em que haja a possibilidade de discuti-los.
No entanto, é preciso fazer algumas ressalvas. Os protestos existiram mesmo antes
de Bolsonaro. Por outro lado, a aposta no conflito observada nas pautas dos protestos não
significa o abandono das vias institucionais. As Instituições de Particpação (tais como
Conselhos Gestores e Conferências de Direitos) cresceram na gestão petista. Em que pese
uma tentativa de desmonte por parte do governo Bolsonaro, muitas experiências estão
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resistindo. Ademais, a defesa da pauta das mulheres e outros grupos com mais dificuldade
de acesso a direitos tem sido feita também no Parlamento.
As estratégias dos movimentos sociais são múltiplas, assim como a própria
constituição deles. Por isso sugere-se que os pesquisadores atentem para aquelas que mais
têm ganhado a atenção, como os protestos, sem desconsiderar as outras formas de
atuação, como aquelas exercidas nas instituições de participação e de representação.
Consideramos que é por meio de um olhar ampliado que poderemos entender e fomentar
as diversas formas de resistência da sociedade civil.
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