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Assim como a filosofia e as ciências políticas, induzidas por uma "teoria standard"
centenária, empregam uma sinédoque para falar dos fenômenos do aliquid pro
aliquo ("este por aquele) das relações de poder e força nos coletivos humanos,
também as teorias do cinema e da comunicação social usam "documentário" no
lugar de "cinema documentário". E, assim com as teorias políticas, as teorias
culturais arriscam-se a deixar que esta sinédoque tenha efeitos perversos,
dirigindo as expectativas dos estudiosos, interessados em um fenômeno
abrangente, para uma região restrita do mundo: assim como as representações
políticas são muito mais pervasivas e dinâmicas do que aquelas que foram
cristalizadas nos modelos de democracia liberal da moderniade, também
"documentário" é um evento semiótico de ocorrência muito mais vasta do que a sua
corporificação no cinema industrial massivo, dito "clássico". Efetivamente, hoje há
práticas de teatro, rádio, quadrinhos, performance (e, com destaque,
videoperformance) que podem tranquilamente ser classificadas como
"documentárias".
Para deixar isso mais claro, nesta seção, vamos começar falando do que se pode
entender como "documentário" em sentido amplo e concluir mostrando o quanto as
"práticas documentárias" são decisivas para que inúmeras práticas expressivas
envolvidas no funcionamento das esferas públicas atuais tornem-se capazes de
lidar com seus próprios limites e desafios. Em síntese, nossa argumentação aqui é
que as práticas documentárias são aquelas que emprestam às enunciações a
reflexividade discursiva típica do modo público de endereçar-se ("public mode of
address")
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Com um grão de sal (de prata?), devemos nos recordar das lições de J. -L. Baudry,
sobre o "dispositivo de base" do cinema, a sala teatral escura: seu efeito imersivo,
causado pela aproximação com os automatismos do olhar humano (desde a
aplicação do código da perspectiva cônica, até a sedentarização de eixos de
continuidade de tempo, personagens, ação, espaço), o apassivamento dos
movimentos e a supressão das sensações corporais, a homogeneização das
sensações para a massa. Tudo, no arranjo "clássico", é orientado para instaurar
uma relação entre o público e as imagens em que aquele se faça espectador. Isso,
não apenas pelas percepções a que ele é conduzido, mas também - quiçã
principalmente - pela suposição (proveniente de informações colaterais dos
paratextos jornalísticos, publicitários, urbanísticos) de que as imagens provém de
centros de difusão autorizados, cuja produção é compartilhada igualmente por
receptores-como-eu. A ácida argumentação de Baudry, que coloca sérias
dificuldades para um uso efetivamente político do cinema, ecoa as hipóteses de
uma dominação pervasiva e constitutiva prevalecente através de outros
"dispositivos", o da dominação política do corpo (Foucault) e o da dominação
política da linguagem (nos aparelhos ideológicos de Estado, de Althusser e mesmo
em Barthes - que dizia que o fascismo da linguagem não reside naquilo que ela nos
impede de dizer, mas naquilo que ela nos leva a dizer).
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identificar o seu telos mais geral, aquele foco ou causa final para o qual todos os
traços atuais, passados e futuros das enunciações documentárias se dirigem. Um
primeiro traço, o da docência, já foi mencionado acima. Documentária é aquela
retórica que pretende nos ensinar algo - ou, numa chave mais democrática, uma
retórica que pretende nos levar a aprender algo, juntos, uns com os outros. Ao nos
endereçar como públicos, as enunciações documentárias nos fazem participar de
um público com características determinadas tanto pelos traços textuais quanto
pelos propiciamentos paratextuais. A retórica documentária é sempre
agorapoiésica, instauradora de relações de pertencimento a um publico cujos
membros são capazes de agir de modo articulado segundo as razões que eles
mesmos acham convincentes para cada um (neste sentido, a agorapoiese é um
traço fundamental da democracia, enquanto capacidade de ação).
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Arranjos/artefatos audiovisuais e
cibertextuais como propiciadores do
exercício de métodos documentários;
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expressio - a desprivatização da
percepção, o olho enmundado pelo
olhar corporificado >> as imagens-
de-corpo coletivas da partilha dos
juízos perceptuais
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