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Sobre Intolerância (Revista Psiquê)

Conference Paper · May 2015

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1 author:

Joao Angelo Fantini


Universidade Federal de São Carlos
3 PUBLICATIONS 0 CITATIONS

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Available from: Joao Angelo Fantini


Retrieved on: 08 October 2016
04/06/2015 Portal Ciência & Vida ­ Filosofia, História, Psicologia e Sociologia ­ Editora Escala.

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João Angelo Fantini
Cotas resgatam grupos excluídos historicamente Gmail
Edição nº 112
João Angelo Fantini analisa causas e efeitos de fenômenos como racismo, xenofobia, sexismo, preconceitos e
Favoritos
outras manifestações de intolerância, sob os aspectos das teorias psicanalíticas, com o objetivo de desvendar
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quais os mecanismos responsáveis por comportamentos quase irracionais
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Por: Lucas Vasques/ Fotos: Otávio Valle
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 MATÉRIA DE CAPA
Racismo, xenofobia, sexismo, preconceito religioso,
social ou político e outras manifestações de intolerância  REPORTAGENS
podem ser analisados sob diversos ângulos. Um deles, e
talvez o mais fascinante, é o aspecto da Psicanálise. Que  CONSULTÓRIO
mecanismos são responsáveis por comportamentos
quase irracionais e pela divulgação de verdadeiros  EDIÇÕES ANTERIORES
discursos de ódio, em pleno século XXI, era da
informação e do conhecimento?  EXPEDIENTE

Quem tenta desvendar essas questões é João Angelo
Fantini, psicólogo, psicanalista e professor do curso de
Psicologia da Universidade Federal de São Carlos, com
pós­doutorado pela University of London (Birkbeck
 FILOSOFIA
College). Ele acaba de lançar a coletânea Raízes da
Intolerância, pela EdUFSCar, obra na qual psicólogos e
 LEITURAS DA HISTÓRIA
psicanalistas brasileiros e ingleses abordam o assunto
sob diferentes perspectivas.
 PSIQUE
Fantini também é professor convidado no curso de
Semiótica Psicanalítica da Pontifícia Universidade de São  SOCIOLOGIA
Paulo (PUC), onde edita a revista Leitura Flutuante, sobre
a produção de subjetividade e os sintomas na clínica  AGENDA
psicanalítica. Suas publicações mais recentes em livro
incluem: Raízes da Intolerância (EdUFSCar, 2014),  ARTIGOS
Semiótica Psicanalítica: Clínica da Cultura (Iluminuras,
2013), Imagens do Pai no Cinema: Clínica da Cultura  
Contemporânea (EdUFSCar, 2009), O Feitiço do Cinema
(Editora Arx/Saraiva, 2009); além de artigos em jornais e
revistas acadêmicas.
 Palavras­chave
O que a Psicanálise oferece para além das razões históricas para pensar a intolerância em uma fórmula inversa: nosso
ódio ao outro não é fruto do fato desse outro ser “menos”, mas – pelo contrário – sustentada pela crença de que esse
outro possui algo a mais  

De que maneira racismo, xenofobia, sexismo, preconceito religioso, social ou político podem ser explicados sob as  
teorias psicanalíticas?
João Angelo Fantini: Essas formas de intolerância podem ser pensadas como subprodutos de uma reivindicação ontológica:
não há sujeito sem o outro, ainda que essa afirmação diga muito sobre a separação. Nossas histórias de vida são fragmentadas Quero acessar...
pela presença do outro, onde as fronteiras eu­outro são sempre frágeis. Toda forma de exclusão para a Psicanálise (e aqui me
refiro a Sigmund Freud e Jacques Lacan, especialmente) pode ser pensada desde os primeiros momentos nos processos Publicidade
psíquicos de separação, que, ao final, resultam naquilo que nos faz diferente do outro, sejam nossos vizinhos ou nossos Adicionar Favorito
próprios familiares. Essa lógica que produz a diferença, e não podemos esquecer o quanto essa diferença é importante para Links Úteis
todos nós, está na raiz dos processos que produzem a intolerância. Por essa razão, a Psicanálise está sempre atenta, não  

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04/06/2015 Portal Ciência & Vida ­ Filosofia, História, Psicologia e Sociologia ­ Editora Escala.
apenas aos sintomas individuais que aparecem nos consultórios, mas também aos discursos que circulam na sociedade para
dar conta desse mal­estar. O que a Psicanálise oferece para além das razões históricas para pensar a intolerância em uma
fórmula inversa: nosso ódio ao outro não é fruto do fato desse outro ser “menos”, mas – pelo contrário – sustentada pela crença
de que esse outro possui algo a mais. Um exemplo triste, que não deveríamos esquecer, é o racismo. Quando se estudam as
execuções da Ku Klux Klan, nos Estados Unidos, se descobre que a maioria era justificada como “crimes de natureza sexual”,
isto é, a crença amplamente compartilhada da suposta “superpotência sexual” dos negros reflexivamente propiciou que os mais
íntimos desejos reprimidos, sádicos e masoquistas fossem exteriorizados e projetados sobre o negro na forma de transformá­
los numa ameaça sexual (lembrando que os homens eram enforcados e muitas das mulheres estupradas por esse grupo
racista).
Coma isso e
A intolerância, de forma geral, deve ser abordada como um simples fenômeno comportamental ou tem raízes mais
perca peso
profundas? 
Nutricionista: É o
Fantini: Para além do comportamento explícito, e aí me parece estão as formas mais difíceis de detectar o problema, há milagre do
formas sutis que estão arraigadas de maneira profunda no psiquismo humano e que por isso são de certa forma partilhadas, emagrecimento.
sejam por grupos ou culturas. Isto é, há uma espécie de modelo de segregar o outro pronto para operar a todo momento, não NoviSaude.​
com
apenas quanto aos estranhos, mas também aos mais próximos, esperando, apenas, por pequenos sinais que vão construindo
uma forma de estranheza dirigida ao outro.

Em que medida a intolerância tem a ver com relação de poder, necessidade de dominação?
Fantini: Veja o caso da sexualidade. Há uma lógica invertida de projeções, onde a sexualidade pode ser exercida como uma
forma de poder, como no machismo, por exemplo: o machista pode ser pensado como aquele que teme o avanço do poder
feminino na sociedade, pois evoca nele um sentimento de insegurança. Nessa lógica reflexiva ele pode passar ao assédio
sexual, passando o exercício da sexualidade a ser submetido ao poder e à dominação. Como vinha dizendo, esse processo de
reconhecimento, tão importante para a construção de cada um e da sociedade como um todo, não é produzido sem tensão. Há
uma lógica nesse reconhecimento que pode provocar ódio: como posso sentir que sou reconhecido, de fato, se o
reconhecimento do outro é igual para todos? Quando falamos do amor romântico normalmente podemos identificar facilmente
essa questão, pois para amar romanticamente alguém seria necessário excluir todos os outros, que poderiam não ficar felizes
com isso (embora, claro, sempre houve práticas diferentes para contornar a questão). Quando passamos, por exemplo, ao
mundo do trabalho, ser reconhecido pode implicar na prática ter uma posição de superioridade sobre os outros (normalmente
indicada por dinheiro e posição de comando), que coloca essa pessoa não apenas numa relação privilegiada de poder, mas,
também, como possível alvo de ódio, inveja ou mesmo admiração em relação aos demais. Quando vamos ao campo da
política, esses elementos estão quase sempre exacerbados e incrementados por demandas pessoais e históricas, que,
frequentemente, se confundem, resultando não apenas em dominação pura e simples dos outros, mas, às vezes, no desejo de
eliminar aquele que não me reconhece.

Ainda seguindo seu raciocínio, esses processos podem ser ameaçadores em relação ao aspecto social, que é o que
determina a civilização. É preciso entender isso para ajudar a evitar ou, pelo menos, minimizar conflitos originados
por essas manifestações de intolerância? 
Fantini: O desafio a ser enfrentado é que essa necessidade individual que funda a humanidade ganha contornos sociais, ou
seja, esse processo de diferenciação pode ser elevado a formas de construção de grupos, sociedades e nações. Quando isso
toma essa dimensão, a opacidade do sujeito, em relação às suas demandas narcísicas individuais, tende a ser ofuscada pela
participação na massa de pessoas, resultando no processo de tomar um grupo ou sociedade como essencialmente diferente e
ameaçador, o que pode implicar em ações violentas justificadas sob a garantia de defender a minha própria extinção ou a do
meu grupo.

Há uma lógica invertida de projeções, onde a sexualidade pode ser exercida como uma forma de poder, como no
machismo, por exemplo: o machista pode ser pensado como aquele que teme o avanço do poder feminino na
sociedade, pois evoca nele um sentimento de insegurança

Como você analisa as políticas de igualdade, especialmente em relação ao sistema de
cotas observado no Brasil? As cotas são um mal necessário? 
Fantini: Acredito que são um bem e que resgatam grupos historicamente excluídos,
especialmente em relação ao ensino superior, mas não somente lá. O problema, a meu ver,
pode aparecer na medida em que não se estabeleça um momento de retirada gradual desse
processo. A razão disso não é somente a possibilidade de indignação de outros grupos não
contemplados, mas uma possível perpetuação de uma percepção intolerante em relação aos
grupos escolhidos para receber essas cotas. Em muitos casos que acompanhei, na minha
pesquisa descrita no capítulo que escrevi, essa preocupação existe por parte das agências
promotoras, isto é, que, em algum momento, essas ações sejam gradualmente diminuídas
até sua extinção. Uma questão é saber se esse tempo será tolerado pelos não incluídos ou
se haverá pressão de parte a parte, seja pela diminuição desse tempo ou pela extensão.
Essas são questões que estão postas na agenda política, mas que ainda não atraem a
maioria da população, embora eu acredite que o farão nos próximos anos. Veja o caso das
cotas raciais, por exemplo. Temos um problema inicial, pois, ao contrário dos Estados
Unidos e de países anglo­saxônicos de predominância protestante, raça no Brasil refere­se,
principalmente, à cor da pele ou à aparência física, com um grau relativamente
indeterminado de referência à ancestralidade. Isso gerou uma série de problemas,
especialmente nas cotas para o ensino superior.

Pode explicar por que acha que reservamos as emoções mais violentas e raivosas não As execuções da Ku Klux Klan eram
a quem é diferente, mas às pessoas que mais nos recordam e nos ameaçam por baseadas na crença da suposta
semelhanças? `superpotência sexual’ dos negros, o
Fantini: Partindo da sua teoria do Narcisismo, Freud abordou os mecanismos de que propiciou a exteriorização de
segregação existentes na cultura para explicar como humanos, vivendo em sociedades, desejos sádicos e masoquistas
teriam propensão à agressão uns contra os outros. Para isso, diz ele, haveria um processo
no sentido de estigmatizar o outro, com pequenas diferenças que construiriam o estranhamento desse outro e a segregação nos
grupos. Esse “outro racializado” (isto é, estigmatizado pelas suas diferenças) funciona como uma ponte que incorpora algo
percebido como “estranho” ao próprio sujeito intolerante. Dito de outro modo, essa opacidade do outro só pode ser percebida
como estranha, na medida em que a própria opacidade do sujeito não é colocada em jogo.

Ainda no livro, você af irma que as mais estranhas manifestações de intolerância são guardadas para pessoas
estranhas, que tentam agir e fa lar como aqueles que se julgam “cidadãos natos”. Diante desse conceito, o que os
casos de intolerância recentes revelam sobre o Brasil? 
Fantini: O processo, que muitas vezes é cruel para o alvo da intolerância, é que quanto mais esses “estranhos” tentam emular
e imitar, isto é, quanto mais eles tentam “pertencer” ao mundo do intolerante, mais feroz aparece a rejeição. No Brasil, temos

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uma relação singular em relação aos estrangeiros, não muito comum no mundo, de tentar incorporar o estrangeiro, canibalizá­lo
(obrigá­lo a comer nossa comida, frequentar nossa casa etc.), pode­se até arriscar dizer que grande parte dos brasileiros parece
padecer de xenofilia (amor ou estima às pessoas e coisas estrangeiras). No entanto, na medida em que o país, nos últimos
anos, tem recebido estrangeiros de países mais pobres ou em guerra (penso nos bolivianos e nos haitianos), temos assistido a
crescentes manifestações agressivas contra essas pessoas. O que já é mais antigo no país, entretanto, é a discriminação que
funciona como uma forma de “xenofobia interna”, identificada, especialmente, por uma divisão forçada (porque não
necessariamente geográfica) entre Sul e Norte, mais especificamente ainda manifestada contra os nordestinos, que, muitas
vezes, são tratados como “estrangeiros”, uma forma de segregação imaginária. Esse modelo parece ter sido ampliado nas
últimas décadas com a chegada de consumidores das camadas economicamente excluídas da população brasileira às
universidades e ao mercado mais amplo de consumo, o que parece ter acentuado a intolerância em relação às diferenças
étnicas e sociais.

Partindo da sua teoria do Narcisismo, Freud abordou os mecanismos de segregação existentes na cultura para explicar
como humanos, vivendo em sociedades, teriam propensão à agressão uns contra os outros. Para isso, diz ele, haveria
um processo no sentido de estigmatizar o outro

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