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O que é Gestalt?

Se você estuda ou estudou psicologia, comunicação, design ou arquitetura, com certeza


já se deparou e até aprofundou seus conhecimentos sobre Gestalt. A Gestalt é uma
teoria fundada pelo psicólogo Max Wertheimer como uma pesquisa de orientação,
compreensão e interpretação da nossa visão e da forma como enxergamos as coisas.
Como nosso cérebro utiliza parâmetros de leitura visual, ao enxergarmos um composto
de elementos (sejam eles objetos, pessoas, paisagens, animais ou textos), a tendência é
agrupar características que sejam semelhantes, de forma que sua interpretação seja a
mais rápida possível. Logo, quanto mais complexo for o item, menos os detalhes vão ser
processados a princípio. Um exemplo clássico é tentar escutar a nota de uma canção e
comparar com a melodia inteira. Observe a imagem abaixo:

Se a primeira definição que lhe veio à cabeça foi uma máquina de escrever, e não um
conjunto de teclas, engrenagens, peças de metal e papel, você está pensando como a
Gestalt afirma.
Segundo a Gestalt, ao observarmos um objeto, primeiro o compreendemos como um
todo, antes de notar seus elementos separadamente. De todos os princípios da Gestalt,
essa é premissa básica da teoria, a Lei da Pregnância, que veremos mais à frente.
Há oito princípios da Gestalt que são essenciais na área da criação e que estão
presentes no cotidiano. Você pode até mesmo notá-los em seu meio, ou aplicá-los sem
ter ideia do que representam ou quais suas definições.
Princípio 1: Lei da Pregnância (ou boa forma)

Como já falamos no tópico acima, a Gestalt afirma que sempre compreendemos o todo


de um composto visual, antes de aprofundar nos seus detalhes. Dentro do compilado, há
elementos que seu cérebro consegue destrinchar com rapidez e outros mais complexos
que você não associa tão rapidamente.
O nível de facilidade com que identificamos e compreendemos visualmente uma peça é
mensurado através da pregnância. Dado esse fato, a pregnância de um objeto é que vai
definir o quão rápido ele é percebido e assimilado, e também a eficiência da
comunicação da mensagem para com o receptor.
Observe o anúncio da Lego:
Rápido e intuitivo: primeiro você enxerga 5 conjuntos de blocos, depois processa as
cores. Com um pouco de raciocínio, já está imaginando os personagens dos Simpsons,
como o anúncio pede: “imagine”. A peça acima tem alta pregnância.
Agora este anúncio da Gazeta Mercantil:
São vários elementos contidos na peça. O que traduz a composição é a frase logo
abaixo: “Entenda o valor real do dinheiro”. A moeda retratada acima é o Yen e o
arranjo de elementos retrata parte do contexto do Japão. Por conter inúmeros
elementos em conflito e por necessitar de mais tempo de compreensão para digerir o
anúncio, essa peça é de menor pregnância, porém de fácil interpretação.
Sendo assim, até mesmo uma peça de pouca pregnância pode atingir o seu objetivo, se
utilizada com propriedade para que o público selecionado capte a mensagem. Para o
resultado eficiente na mensagem, o designer precisa pensar na questão estrutural da
peça como um todo, se sua interpretação realmente faz sentido ao juntar todas as partes
da composição.
Princípio 2: Lei da Unidade
Complementando a lei da pregnância, temos a unidade, que pode ser traduzida por um
elemento identificado de acordo com suas características como a parte irredutível em
um compilado, seja por sua cor, forma, ou dimensão. É muito comum que os elementos
únicos se combinem em função de uma unidade maior, tornando-se assim subunidades.
Como segunda lei dos princípios da Gestalt, a lei da unidade é essencial na criação,
pois se faz presente na organização e disposição de elementos, permitindo composições
originais e criativas a partir de unidades já existentes.

Marca da Adidas, feita em uma combinação de faixas retangulares cortadas


Anúncio da Heinz utilizando pedaços de tomate para compor o formato de uma garrafa
de ketchup tradicional. A proposta do anúncio é evidenciar o frescor e a saúde que o
tomate puro sem conservantes traz consigo.
Princípio 3: Lei da Segregação
A terceira lei dos princípios da Gestalt dita que nosso cérebro tem a capacidade de
diferenciar ou evidenciar objetos, ainda que sobrepostos. Isso se deve à variação de
forma e estética que um elemento tem em comparação com outro. Desse modo, os
estímulos visuais de cada unidade também são diferentes. A segregação ocorre de
várias maneiras: pontos, linhas, planos, volumes, sombras, brilhos, texturas, relevos,
entre outras formas.
No campo do design é sempre bom estar atento aos contrastes de elementos. O
contraste permite uma melhor leitura visual e entendimento do fluxo da mensagem pelo
público. A segregação ainda trabalha na questão da hierarquia de importância dos
objetos. É possível dar maior peso a uma parte da mensagem em relação à outra.
Anúncio do MC Donald’s, que realiza um jogo de interpretação ao substituir os
ingredientes do sanduíche por livros de culinária

Anúncio da Land Rover, destacando hipopótamos e o carro Freelander ao fundo,


ambos dentro da água.
Princípio 4: Lei da Proximidade
De acordo com a Gestalt, elementos muito próximos uns dos outros, se encaixando
harmoniosamente, são processados em nosso cérebro como elementos conjuntos, ou
unidades. É o princípio da proximidade. Além disso, se tais elementos são semelhantes
reforçam ainda mais nosso cérebro para a leitura de um só objeto.
Os designers utilizam muito o princípio na criação de identidades visuais,
principalmente em tipografias e elementos que, em tese, seriam comuns, mas com um
recurso simples se tornam vários elementos. O resultado geralmente se torna uma
unidade sólida e criativa.

IBM: listras presas em silhuetas formam o logotipo da empresa.


O símbolo em forma de U da Unilever. Um exemplo de elementos diferentes mas
harmoniosos entre si pela proximidade.

O logo da NBC é formado por 6 formas coloridas em proximidade; nos espaços


vazados forma-se a silhueta de um pavão.
Princípio 5: Lei da Semelhança

Elementos semelhantes em cor ou forma tendem a ser agrupados pelo cérebro em uma
só unidade. Isso faz com que objetos aproximados, apenas com uma característica
semelhante, se unam aos olhos do leitor. É a quinta lei da Gestalt, a semelhança.
Em um emaranhado de objetos, se o criativo deseja que o receptor da mensagem
identifique grupos de elementos mais facilmente, ele deve prezar pela igualdade de tons
e formatos entre as unidades. A semelhança é também utilizada para criar formas a
partir de outras formas.
Anúncio da Shootz Cafe & BillIards, no qual dois grupos de bolas de sinuca de cores
semelhantes se agrupam para formar uma nova composição.
Anúncio de Natal da Nespresso, que utiliza xícaras de café para formar uma árvore
natalina.
Princípio 6: Lei da Unificação
Um objeto formado por várias unidades pode ser harmoniosamente simétrico ou não.
Quando ocorre um peso igual de pregnância, proximidade, unidade e semelhança entre
objetos de um mesmo composto, podemos dizer que há uma unificação perfeita. Assim
como a lei da segregação, existem níveis de classificação que variam de uma pior ou
melhor organização de forma.
Um exemplo de unificação perfeita são as mandalas, que utilizam na proporção
balanceada dois princípios da Gestalt – semelhança e proximidade – para criar
composições simétricas e agradáveis. 
Composições da Mercedes Benz, onde  há duas unificações diferentes percebidas. Cada
uma separa o lado emocional e racional do nosso cérebro. Cria-se assim duas
unidades.
Princípio 7: Lei da Continuidade

A sétima lei dos princípios da Gestalt, a lei da continuidade diz respeito à


maneira como a percepção do fluxo e sequência dos elementos funciona em nosso
cérebro. Trata-se da tendência dos objetos em seguir uma linha de fluidez visual
gradativa. Isso é feito através de formas, linhas, cores, profundidade, planos, etc. Se
você enxerga elementos em uma composição de modo ininterrupto, essa peça tem uma
boa continuidade.
A prioridade da continuidade é estabelecer sempre a melhor forma possível aos olhos.
Há inúmeros exemplos concretos de aplicação da lei da continuidade: a  arquitetura de
edifícios, escala de cores, estradas, diagramação de textos em revistas e livros.
Estádios de futebol são um ótimo exemplo de continuidade. O Mineirão repete as
formas e linhas de maneira sequencial em todo o seu contorno.
O anúncio da FedEx mostra sequencialmente o movimento de despacho e recebimento
de um produto por meio da empresa.
Princípio 8: Lei do Fechamento
 

O último, porém um dos mais


interessantes princípios da Gestalt. O fechamento estabelece que o nosso cérebro tem
a inclinação de fechar ou concluir formas que vemos inacabadas ou abertas. Isso se deve
a padrões sensoriais e de ordem espacial que temos em nossa mente.
Ou seja, ao se guiar pela continuidade de uma forma, prevemos toda a sua estrutura. Um
exercício que fazíamos de fechamento quando crianças é o famoso “ligue os pontos”.
Antes de terminar o desenho já imaginávamos o resultado do fechamento das linhas.

E aí, o que você vê?


Tenha cuidado ao utilizar esta lei na criação de peças, para não gerar duplo sentido.
Nem todos possuem o mesmo entendimento em relação a uma composição visual. Nós
possuímos experiências diferentes quanto à percepção de objetos. Se você nunca teve
contato visual com um elemento, certamente sua mente vai projetar a forma de outro
item semelhante.
Este anúncio simples da Coca-Cola simula uma garrafa entre talheres. Sem sua
silhueta completa, possuímos a forma em nossa memória. Pois se trata de um objeto
simples e famoso que se faz presente em nossa cultura.
 
Anúncio da Absolut Vodka, no qual a garrafa é formada pela disposição dos barcos de
comerciantes.
Qual o efeito dos princípios da Gestalt na área
da criação?
Vivemos cercados de estímulos visuais da propaganda (anúncios, vídeos, embalagens de
produtos, fachadas de lojas, marcas estampadas e identidades visuais). Estas, por sua
vez, influenciam e atraem nossos olhares.
Um bom designer, conhecedor dos princípios da Gestalt, manipula os elementos em sua
composição de forma que sua peça se sobressaia às demais, ou apenas que convença o
público de que é um material interessante a ser visto.
Seja pela cor de um call to action bem escolhida, seja por uma composição de texto e
imagem harmônica, o leitor passa a conduzir seu olhar assim como o artista deseja. Essa
indução pode reproduzir vários sentimentos, entre eles quatro dos mais significativos:
Harmonia: 
A peça é tão simétrica, balanceada e agradável que estimula o público a admirá-la.
Desordem:
Por ser fora do padrão de ordem criado pelo cérebro, uma peça desordenada também
atrai a atenção de quem a observa. É sempre bom ressaltar que a desordem ainda assim
pode ser harmônica e ter um significado diferente de caos.

Lembrança:
Mesmo sem nunca ter visto a arte anteriormente, o observador se familiariza com
elementos que remetem a uma memória ou uma sensação.
Curiosidade pelo oculto:
Ao enxergar um elemento que causa a sensação de falta ou omissão de algo, somos
desafiados a completar ou imaginar o outro objeto que o completa.
Assim, ao possuir conhecimento e técnicas de persuasão visual, o profissional de
criação tem a Gestalt e seus princípios como uma forte aliada para elaborar suas
composições de maneira autêntica e privilegiada das demais. O olhar também fica mais
apurado. Cada detalhe conta, ele está sempre à frente da percepção de senso comum. 
Como consequência, mais preparado para o desafio diário de criar, reinventar e, acima
de tudo, cativar seu cliente e o público.
É importante ressaltar que a Gestalt é apenas uma das diretrizes para a criação de uma
boa peça. Aprofundar conhecimentos em psicologia das cores, regras de proporções, e
também pesquisa de mercado, público-alvo, consumir cultura e boas leituras são
essenciais antes de elaborar bons conteúdos visuais.

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