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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE TECNOLOGIA
FACULDADE DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL
DISCIPLINA: Tratamento de Esgoto Sanitário
PROFESSOR: André Coelho

Critérios de projeto para unidades de tratamento de lodo de excesso


NOTA: ESTAS NOTAS DE AULA FORAM ELABORADAS COM BASE EM TEXTOS ADAPTADOS DA
APOSTILA DIDÁTICA DE AUTORIA DO PROF. ROQUE PASSOS PIVELI, DA USP. NÃO CONSTITUINDO,
PORTANTO, MATERIAL ORIGINAL. DESTINAM-SE EXCLUSIVAMENTE AO APOIO DIDÁTICO. ASSIM,
PARTE OU O TODO DESTE TEXTO NÃO DEVE SER CITADO EM ARTIGOS, DISSERTAÇÕES, TESES,
MONOGRAFIAS OU QUALQUER OUTRO TIPO DE MATERIAL TÉCNICO E/OU CIENTÍFICO.

1- Considerações iniciais

O tratamento de esgotos em última instância culmina com aumento da fase


sólida, ou seja, com a produção de lodo de excesso. Lodos reatores aeróbios são
separados principalmente em decantadores primários ou secundários. Aliás, a
produção de lodo constitui importante diferencial na escolha do sistema de
tratamento. Enquanto que sistemas exclusivamente aeróbios de alta taxa podem
produzir de 0,6 a 0,8 kgSST/kgDQO aplicada, a produção de lodo em um reator
UASB é de cerca de apenas 0,2 kgSST/kgDQO aplicada. Mesmo o sistema misto
anaeróbio/aeróbio leva a uma menor produção de lodo que um sistema
exclusivamente aeróbio. Essa vantagem é muito importante nos dias de hoje, uma vez
que além de reduzir as necessidades de tratamento, reduz as dificuldades com o
transporte e disposição final do lodo.

2- Etapas do tratamento de lodo

O tratamento de lodo pode ser subdivido em três etapas principais, que são (em
sequência) o adensamento (ou espessamento), a digestão (ou estabilização) e a
desidratação (ou secagem). Dependendo do sistema de tratamento de esgotos adotado
algumas delas podem ser suprimidas ou mesmo outras etapas acrescentadas.
Quando o lodo apresenta partículas sólidas muito finas, pode ser necessária a
aplicação de um processo físico-químico que vise o aumento de tamanho (e peso)
destas partículas, chamado de condicionamento. Esta etapa quando necessária é
aplicada antes da desidratação, principalmente quando esta é relizada de forma
mecanizada.
Os lodos descartados de reatores anaeróbios são considerados estabilizados e
com isso dispensam adensamento e digestão complementar. Assim, estes lodos
podem ser encaminhados diretamente para a etapa de desidratação.
O adensamento de lodo pode não ser obrigatório em filtros biológicos
percoladores (FBP) de baixa taxa. No entanto, exceto em sistemas de pequeno porte
sua inclusão pode ser aplicada pelos benefícios trazidos às unidades posteriores de
tratamento de lodo, pois reduz consideravelmente o volume de lodo de excesso.
Quando o tratamento de esgotos é feito por processos de lagoas de
estabilização, este sistema opera de forma que os lodos adensam e digerem nos
próprios fundos destes reatores.

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Dependendo do uso a ser feito do lodo a ser retirado da estação de tratamento de
esgotos, outras etapas de tratamento podem ser necessárias, como a higienização que
visa a eliminação dos patogênicos contidos no lodo, para sua aplicação em solo
agrícola.
O objetivo do adensamento de lodo é reduzir o seu teor de umidade, remover
água e assim, reduzir seu volume aumentando o teor de sólidos. Em um FBP o lodo
de excesso é gerado com teor de sólidos entre 1,0 e 1,5%, com elevação para cerca de
4% pós adensamento. Isto permite uma redução considerável de volume dos
digestores de lodo (etapa seguinte do tratamento de lodo).
O objetivo da desidratação final é a remoção de água de forma a atingir-se
teores de sólidos superiores a 20%. Isto reduz drasticamente o volume de lodo a ser
transportado e o compatibiliza para aplicações, tais como, disposição em aterros
sanitários ou na agricultura (se higienizado).
Nesta apostila serão abordados critérios para dimensionamento de unidades de
adensamento (por gravidade), digestão anaeróbia do lodo e desidratação por leitos de
secagem.

2.1- Adensamento por gravidade

Os adensador por gravidade, ilustrado na Figura 1, é uma unidade semelhante


ao decantador de seção circular, sendo alimentado com o lodo pelo centro e na parte
superior do tanque. O liquido sobrenadante escoa pelos vertedores perimetrais
posicionados à superfície do adensador, devendo ser encaminhado para a entrada da
ETE (tratamento preliminar).

Figura 1- Corte com detalhes de adensador por gravidade

O principal fator de dimensionamento dos adensadores por gravidade é a taxa


de aplicação de sólidos (TAS), que é o fluxo de massa de sólidos aplicado por
unidade de área superficial do tanque. Isto depende do tipo de lodo a ser adensado,
sendo que a NBR 12209/11 recomenda os seguintes valores máximos de acordo com
a Tabela 1.

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Tabela 1- Parâmetros para dimensionamento de adensadores por gravidade
Tipo de lodo TAS (KgSST/m2.d) TAH (m3/m2.d) Teor de sólidos (%)
Primário 150 30 08
Filtro biológico 50 8 05
Lodos ativados 30 8 03
Primário + filtro 60 12 06
biológico
Primário + lodos 50 12 05
ativados

2.1.1- Área

Com base na TAS (adotada através da Tabela 1) e do número de unidades de


adensamento (deve ser adotado pelo menos 2 unidades), pode-se obter a área
necessária através da Equação 01 a seguir:

!!" ! !!"
𝐴!" = !"# . !!"
(01)

Onde:
Aad: Área necessária para cada adensador (m2);
Pdp: Produção de lodo no decantador primário (kgSST.d-1);
Pds: Produção de lodo no decantador secundário (kgSST.d-1);
TAS: Taxa de aplicação de sólidos (KgSST. m-2. d-1);
Nad: número de adensadores (un).

A TAS deverá ser o fator mais restritivo na determinação da área superficial


dos adensadores, porém, a taxa de aplicação hidráulica (TAH), obtida através da razão
entre a vazão de lodo e a área superficial dos adensadores, deverá preferencialmente
ser controlada dentro dos valores máximos constantes na Tabela 1.

2.1.2- Volume

Pode-se obter o volume de cada tanque através da Equação 02 a seguir:

𝑉!" = 𝐻!" . 𝐴!" (02)

Onde:
Vad: Volume de cada adensador (m3);
Had: Altura de cada adensador (m).

A NBR 12209/11 faz ainda recomendações adicionais, tais como, profundidade


útil mínima dos adensadores igual a 3,0 m ; tempo de detenção hidráulica máximo de
24 horas e obrigatoriedade de remoção mecanizada de lodo quando se utilizam
diâmetros superiores a 3,0 m. O limite máximo de tempo de detenção hidráulica do
lodo no adensador deve-se à possibilidade de o mesmo entrar em decomposição
anaeróbia e, com isso, o risco exalar maus odores devido ao sulfeto gerado pela
decomposição anaeróbia. Além disto, o biogás anaeróbio pode dificultar o
adensamento.

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O TDH no adensador pode ser verfificado através da Equação 3:

!!" . !!"
𝑇𝐷𝐻!" = !!"# ! !!"#
(03)

Onde:
TDHad: tempo de detenção hidráulica no adensador (d);
Qldp: Vazão de lodo no decantador primário (m3.d-1);
Qlds: Vazão de lodo no decantador secundário (m3.d-1).

2.1.3- Vazão de lodo adensado

No adensador haverá uma aumento no percentual da concentração de sólidos


secos, principalmente no lodo oriundo do decantador secundário. Assim, pode-se
obter o volume de cada tanque através da Equação 04 a seguir:

!!" ! !!"
𝑄!"# = !!" . !!"
(04)

Onde:
Qlad: Vazão de lodo na saída do adensador (m3.d-1);
gad: Densidade do lodo no adensador (1.030 Kg/m3);
Cad: Concentração de sólidos secos no lodo do adensador (6 %).

2.2- Digestão anaeróbia de lodo

De acordo com a NB12209/11, os digestores anaeróbios podem ser


classificados como:

Ø Convencionais não homogeneizados (sem misturador);


Ø Convencionais homogeneizados (com misturador);
Ø Alta taxa (com misturador e possibilidade de aquecimento).

Os digestor não homogeneizado também é chamado de digestor de baixa taxa e


pode ser visualizado na representação da Figura 2, enquanto que a Figura 3 apresenta
o digestor de alta taxa.

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Figura 2- Digestor anaeróbio de lodo com baixa taxa (não homogeneizado)

Figura 3- Digestor anaeróbio de lodo de alta taxa com aquecimento

Os principais critérios técnicos para o dimensionamento dos digestores


anaeróbios de lodo são a taxa de aplicação de sólidos suspensos voláteis (TASv) e o
tempo de detenção hidráulica (ou de digestão). A Tabela 2 apresenta as principais
recomendações para estes critérios.

Tabela 2- Principais critérios para dimensionamento de digestores anaeróbios de


lodo
Tipo de digestor TASv (KgSSV/m3.d) Tempo de digestão (d)
Convencional não ≤ 0,5 ≥ 45
homogeneizado
Convencional homogeneizado 0,5 – 1,2 ≥ 30
Alta taxa sem aquecimento 1,2 – 4,8 ≥ 22
Alta taxa com aquecimento 1,2 – 4,8 ≥ 18

No caso de digestores com sistema de mistura é importante a utilização de um


segundo tanque chamado de pulmão (ou segundo estágio), para armazenamento do
lodo, novo adensamento e remoção de sobrenadante. O tanque pulmão deverá ter
tempo de detenção hidráulica mínimo de 12 h e o sobrenadante retirado deve ser
encaminhado para a entrada da ETE (tratamento preliminar). A Figura 4 apresenta

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uma representação de um sistema de dois estágios, onde o segundo estágio representa
o tanque pulmão.

Figura 4- Digestor anaeróbio com dois estágios

2.2.1- Volume do digestor

O volume do digestor pode ser obtido através da Equação 05, onde o TDH (ou
tempo de digestão deve ser adotado com base na Tabela 2. No caso de digestores de
dois estágio é recomendado que o tanque com mistura tenha 2/3 do volume total
calculado.

𝑉!" = 𝑇𝐷𝐻 . 𝑄!"# (05)

Onde:
Vdg: Volume do digestor (m3);
TDH: Tempo de detenção hidráulica (ou de digestão) no digestor de lodo (d).

2.2.2- Área

Adotando-se a altura útil do tanque de digestão é possível a obtenção de sua


área. Recomenda-se a adoção de pelo menos duas unidades de digestão.
!!"
𝐴!" = !!"
(06)

Onde:
Adg: Área do digestor (m2);
Hdg: Altura do digestor (m).

Preferencialmente o digestor deve ter formato cilíndrico.

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2.2.3- Massa e vazão de sólidos na saída do digestor

A digestão de lodo irá ocorrer somente sobre a fração orgânica do mesmo.


Assim, primeiramente devem ser calculadas a frações de sólidos suspensos voláteis
(SSV) e fixos (SST) no lodo de alimentação.

𝑃!!" = 𝐹𝑉 . (𝑃!" + 𝑃!" ) (07)

𝑃!!" = 𝑃!" + 𝑃!" − 𝑃!!" (08)

Onde:
PSSV: Produção de sólidos suspensos voláteis (KgSSV.d-1);
FV: Fração de sólidos voláteis no lodo (cerca de 80%);
PSSF: Produção de sólidos suspensos fixos (KgSSF.d-1).

A eficiência de remoção de SSV no digestor dependerá sobretudo da aplicação


de temperaturas mínimas de 30oC. Em média, considera-se que ocorra a remoção de
45%. Assim, as massas de sólidos na saída do digestor podem ser calculadas através
das equações abaixo:
,
𝑃!!" = 1 − 𝐸 . 𝑃!!" (09)
,
𝑃!" = 𝑃!!" + 𝑃!!" (10)

Onde:
Pdg: Produção de sólidos no digestor (KgSST.d-1).
P'SSV: Produção de sólidos suspensos voláteis na saída do digestor (KgSSV.d-1);
E: Eficiência de remoção de sólidos voláteis no digestor.

!!"
𝑄! !" = !!" .!!"
(11)

Onde:
Qldg: Vazão diária de lodo na saída do digestor (m3/d);
gdg: Densidade do lodo no digestor (1.030 Kg/m3);
Cdg: Concentração de sólidos secos no lodo do digestor (4 %).

3- Leito de Secagem

O leito de secagem é uma forma eficiente e barata para a desidratação do lodo


de excesso. É a alternativa mais indicada para este fim, desde que a ETE possua a
área necessária (tendo em vista a alta demanda).
De posse da produção diária de lodo estimada, o lodo de excesso do reator
UASB deverá ser encaminhado a leitos de secagem, onde passará pelo processo de
desidratação.

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Para a região amazônica, onde os índices pluviométricos são relativamente altos
quando em comparação com os índices de outras regiões brasileiras, pode ser
necessário à adoção de leitos de secagem cobertos.
Outra questão é o tempo necessário para que o lodo atinja teor de umidade
baixo o suficiente para que possa ser lançado em aterros sanitários. Usualmente adota-
se o tempo de permanência (Tp) da ordem de 20 dias, embora em cidades com altos
índices pluviométricos sejam adotados Tp superiores. É necessário também que se
leve em consideração o tempo necessário para limpeza do leito (Tl). O ideal é que este
tempo seja de no máximo 5 dias. Assim, o tempo de permanência somado ao tempo
de limpeza formam o ciclo operacional de um leito de secagem.
Desta forma, o volume da unidade de secagem (VS) deverá ser de:

VS = Vlodo .(T p + Tl ) (m3) (12)

Deve-se então adotar uma altura útil para o leito de secagem. O ideal é que esta
não seja superior a 0,30 m. Logo a área (AS) será de:

AS = Vs / 0,3 (m2) (13)

Segundo a NBR 12209 o leito de secagem deve possuir no mínimo duas células
(ou câmaras) a fim de facilitar sua operação. Assim, dividindo-se esta área em células,
cada uma deverá ter a área mínima (Asc) de:

Asc = As / N cel (m2) (14)

Onde: Ncel = número de células (un).

Após a definição do formato e dimensões das células deve-se efetuar a correção


das áreas e volumes.

Segundo a NBR 12209 a taxa de aplicação de sólidos (TS) não deve exceder a
carga de sólidos em suspensão totais de 15 kgSST/m2.d. Assim, a TS no leito poderá
ser calculada através da seguinte fórmula:

!!"#" ! (!! ! !! )
𝑇𝑆 = !!
(15)

TS ≤ 15 kgSST.m-2.d-1

Por medida de funcionalidade operacional pode-se adotar uma célula extra de


secagem, a fim de se garantir a permanência do lodo pelo período de secagem
estipulado, em caso de manutenção em uma das células.
O fundo do leito de secagem deve ter declividade mínima de 1% e deve ser
composto das seguintes camadas, conforme Figura 5:

- Camada suporte;
- Soleira Drenante;
- Sistema de drenagem.

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Figura 5- Detalhes do fundo do leito de secagem

Camada Suporte

- Composta de tijolos recozidos ou outro material resistente e assentados com areia


grossa com juntas de 2 a 3 cm.

Soleira Drenante

- Permite que parte da água contida no lodo percole por camadas sucessivas de areia e
pedregulho com diferentes granulometrias, crescentes de cima para baixo.

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Sistema de Drenagem

- Constituído de tubos com juntas abertas e/ou perfurados com diâmetro mínimo de
100 mm.

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