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CURSO: PSICOPATOLOGIA, PSICANÁLISE E CLÍNICA

CONTEMPORÂNEA TURMA: 2 - Online (2022/2023)


ALUNA: Renara Raiana Fagundes Novais
MÓDULO DO CURSO: A Psicanálise e as ciências médicas

INTRODUÇÕES SOBRE A PSICOPATOLOGIA, CONTEMPORANEIDADE E A


METAPSICOLOGIA FREUDIANA: uma resenha crítica com base nas explanações de
Beer e Maron

Nesta resenha buscarei comentar algumas nuances sobre a Psicopatologia e a


Metapsicologia freudiana, considerando, sobretudo, as nuances socioeconômicas e, também,
políticas presentes nos processos psicopatológicos contemporâneos. Para tanto, tomo como
base as aulas dos professores Willian Mac-Cormick Maron e Paulo Antonio de Campos Beer.
Maron é Psicólogo, Psicanalista e possui mestrado e doutorado voltados para o estudo da
Filosofia da Psicanálise, pela PUC/PR, na qual, opta por pensar a teoria sob um aparato crítico
e alinhado às questões de hoje, ou seja, democratizando os jargões e reconhecendo a teoria
política e social desenvolvida por Freud. Por outro lado, Beer é Psicólogo, Psicanalista e
Doutor em Psicologia Social pela USP. Desse ponto de partida o docente estuda a verdade na
Psicanálise e na Filosofia da Ciência, traçando considerações sobre o embate estabelecido
entre a Psiquiatria hegemônica e o campo metapsicológico.
Para introduzir, cabe retornar a Freud. Na obra Introdução ao Narcisismo, ensaios de
metapsicologia e outros textos (1914-1916), o teórico adverte que embora haja a exigência de
que uma ciência deva ser edificada sobre conceitos fundamentais claros e bem definidos,
nenhuma ciência começa com tais definições. Uma atividade científica pressupõe descrição de
fenômenos, que depois são agrupados, ordenados e relacionados entre si. Deste modo, o autor
entende que “o progresso do conhecimento também não tolera definições rígidas” (1915/2010,
p.39) e embasa a ideia na física, tendo em conta que os conceitos tidos como fundamentais, ao
longo do tempo, experimentam uma constante mudança e quebra de paradigmas. Logo,
entendo que a metapsicologia científica é um saber aberto, aberto à experiência, refutações,
revisões sistemáticas e decorre do uso e da utilidade dos conceitos.
Desse ponto, Beer (2022), tece que a Psicanálise está implicada em debater sobre a
etiologia, melhor dizendo, em produzir uma teoria sobre a causa e a origem daquilo que é visto
na clínica e, assim, diverge dos manuais diagnósticos em uso atualmente, visto que eles
assumem um posicionamento mais convencionalista, tentando amalgamar muitas teorias em
um espaço que descreve sintomas, sem unificá-los, o que produz um material reducionista, por
excelência.
O DSM tende a reduzir as explicações etiológicas e abarca a Psiquiatria hegemônica,
ou seja, as teorias que tentam explicar o sofrimento a partir de mecanismos fisiológicos,
neuroquímicos e biológicos, dessa forma, acaba por produzir uma hipertrofia diagnóstica e
patologizações distanciadas do campo social. Ainda segundo Beer, na falta de unificação, os
manuais acabam trabalhando com uma autonomia muito grande dos sintomas, dessa forma,
cada sintoma passa a ser potencialmente um novo quadro psicopatológico. Questiona-se,
então, a serviço do quê ou quem está essa produção de patologias na contemporaneidade?
Fatos curiosos se interpõem. No momento de publicação da quinta edição do DSM, o
Instituto Nacional de Saúde Mental (instituição americana) se opôs ao modo como o manual
fora construído, acusando-o de não ser científico. Na época, o presidente da instituição chegou
a apontar para o excesso de sintomas e evidenciou a falta de relação com a casualidade na
construção diagnóstica. Entretanto, a solução colocada permanece na mesma lógica do manual
diagnóstico criticado ao defender que a casualidade dos adoecimentos deve ser procurada
unicamente considerando fatores biológicos. Essa ideia reforça pelo menos duas coisas: a
visão hegemônica que se adota da ciência, na qual, a validação do científico ocorre a partir de
determinações e reconhecimento dos fatos empíricos e observáveis. Também, traça-se uma
concepção de homem e sujeito que afirma que o sofrimento é originado no biológico (BEER,
2015).
O docente ainda exemplifica alguns equívocos que o determinismo biológico pode
produzir ao comentar sobre um estudo recente guiado pela doutora Joanna Moncrieff (2022),
no qual a pesquisadora conclui que não há evidências convincentes de que a depressão seja
causada por anormalidades da serotonina, muito menos, pela baixa de seus níveis,
contradizendo os discursos médicos mais influentes. A pesquisa ainda aponta a relevância dos
placebos, pois eles produzem efeitos de melhora nos sujeitos. A pesquisa, dessa forma, reforça
a necessidade de estudo sobre as causalidades e o psiquismo.
Outro exemplo utilizado foi a criação do quadro psicológico da depressão no Japão.
Explico melhor: até 1990, a depressão não era reconhecida como doença mental no Oriente.
No referido ano, entretanto, uma empresa farmacêutica responsável pelo Prozac deu a ela o
nome de “kokoro no kaze”, em tradução livre, “resfriado da alma” com a finalidade de criar
abertura para o mercado de antidepressivos. Atualmente, o país vive uma “epidemia” de
depressão e o
suicídio acaba sendo associado, quase exclusivamente, ao quadro depressivo. Mas, a
curiosidade mesmo está em como a depressão no Oriente consegue ser datada por estar a
serviço de uma indústria e, não necessariamente, do biológico. Nesse caso, uma pergunta que
se faz possível é: quem define o que é normal e patológico dentro de uma sociedade?
Antes de mais nada, acredito ser válido marcar uma diferenciação sobre as concepções
de ser humano para as Neurociências e a Psicanálise. Enquanto a primeira pressupõe uma
epistemologia de humano biologicamente determinado, que tem necessidades fisiológicas e
representações mentais, a Psicanálise defende uma concepção diferente. Para ela, o ser
humano é um construto de recalque, repressão, desejo, linguagem. Em suma, para a
Psicanálise o ser se constitui na linguagem e no laço com o outro. Logo, para Freud é
impossível pensar uma patologia sem pensar os campos do social, da moral, da repressão e dos
laços estabelecidos (MARON, 2022).
Nesse sentido, percebo que os pensamentos de Miriam Debieux Rosa (2018) e Mac
Cormick Maron (2022) convergem. A autora ainda complementa que os discursos que
circulam em um dado tempo indicam modos de pertencimento possíveis para cada sujeito.
Esses discursos são permeados de valores, lugares e posições no laço. Muitas vezes,
equiparam-se ao campo simbólico da cultura e da linguagem, naturalizando essas atribuições e
evitando dar visibilidade aos embates sociais e políticos presentes em sua base. Daí, se
produzem muitas patologias, pois a invisibilidade dos conflitos gerados pelo laço social recai
sobre o sujeito, individualizando seus impasses, patologizando suas saídas.
Com isso em mente, articulo os pensamentos de Maron (2022), sobre como a lógica
neoliberal tem se acentuado e colaborado para o aumento das patologias nos manuais
diagnósticos e na vida cotidiana. O liberalismo é uma construção moderna que pressupõe que a
liberdade de mercado sem a intervenção estatal seria mais benéfica para a Economia. Nessa
lógica, indústrias e empresários se regulariam. O neoliberalismo, por sua vez, reforça essa
ideia, incutindo que os espaços privados e os espaços cuidados pelos governos devem
funcionar pela mesma lógica das empresas, privilegiando as relações de consumo e produção.
Dessa forma, seguindo essa lógica, não basta ser um sujeito que sente medo, angústia,
tristeza... É primordial que os sujeitos estejam aptos para produzir e consumir. Qualquer ser
humano que transgrida esse imperativo é colocado na espera psicopatológica.
Minha intenção não é a de demonizar o capital ou biologia, mas de tentar articular
criticamente que nessa lógica discursiva as relações perdem o laço e, não raro, culpabiliza-se o
adoecido pelo seu adoecimento. Logo, não são as relações de trabalho que são ruins e
adoecedoras, mas o sujeito que não dá conta de suas demandas. Logo, ele é afastado,
medicalizado e o social espera que no menor intervalo de tempo possível, ele esteja de volta
trabalhando e reproduzindo a lógica que o adoece.

REFERÊNCIAS:
BEER, A. C de. Questões e tensões entre psicanálise e ciência: considerações sobre
validação. São Paulo, 2015. 131 f. Dissertação (Mestrado – Programa de Pós-Graduação em
Psicologia. Área de Concentração: Psicologia Social e do Trabalho) – Instituto de Psicologia
da Universidade de São Paulo.
FREUD, S. Os Instintos e seus destinos (1915). In: FREUD, S. Introdução ao narcisismo,
Ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916). Trad. Paulo César de Souza. São
Paulo: Companhia das Letras, 2010. v. 12, p. 225.
MÓDULO 1 - A PSICANÁLISE E AS CIÊNCIAS MÉDICAS E PSICOPATOLÓGICAS.
Psicopatologia e Metapsicologia. 2022. Disponível em:
<https://espe.app.toolzz.com.br/play/player/98223627?
start=1&institution=espe&school=pos graduacao>. Acessado em 18 fev.2022.
MÓDULO 1 - A PSICANÁLISE E AS CIÊNCIAS MÉDICAS E PSICOPATOLÓGICAS.
Psicopatologia e Metapsicologia II. 2022. Disponível em:
<https://espe.app.toolzz.com.br/play/player/98223627?
start=1&institution=espe&school=pos graduacao>. Acessado em 18 fev.2022.
MONCRIEFF, J et al, The serotonin theory of depression: a systematic umbrella review of
the evidence, Molecular Psychiatry, 2022. Disponível em:
<https://www.nature.com/articles/s41380-022-01661-0#Sec1>. Acessado em: 18 fev.2023.
ROSA, M. D. A clínica psicanalítica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento.
São Paulo: Escuta/FAPESP, 2018, p.200.
INSTITUTO ESPE – ENSINO SUPERIOR EM PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO
CURSO: PSICOPATOLOGIA, PSICANÁLISE E CLÍNICA CONTEMPORÂNEA
DEVOLUTIVA DA RESENHA CRÍTICA

NOTA GERAL: 9

Resposta às
Fundamentação
questões
teórica,
norteadoras ou Utilização da Referencial
embasamento e
relação com as norma bibliográfico
articulação
disciplinas do
conceitual
módulo
5 2 1 1

CONSIDERAÇÕES:

A resenha faz um percurso com bases nas aulas. Apesar de abordar o tema, a aluna poderia ter
aprofundado mais teoricamente, produzindo um texto mais autoral e menos descritivo. O texto
faz relações entre autores distintos, comentando a existência de pontos em comum, mas não
são citadas as convergências e divergências entre eles, deixando as informações pressupostas.
Verifique se os parágrafos mantêm entre si relações de continuidade/progressão.

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